Teoria do Ordenamento Jurídico de Norberto Bobbio
Vinícius Antunes Araújo
Capítulo 1
Da norma jurídica ao ordenamento jurídico
1.Novidade do problema do ordenamento
Foi provado que as normas jurídicas nunca existiram isoladamente, mas sempre em um
contexto de normas com relações particulares entre si. Esse contexto de normas costuma ser
chamado de “ordenamento”.
Antigamente, os problemas gerais do Direito, eram estudados do ponto de vista da norma
jurídica, considerada como um todo que se bastava a si mesmo. Isso não quer dizer faltasse
àquelas obras a análise de alguns problemas característicos de uma teoria do ordenamento
jurídico, mas tais problemas vinham misturados a outros e não eram considerados
merecedores de uma análise separada e particular.
O isolamento dos problemas do ordenamento jurídico dos da norma jurídica e o
tratamento autônomo dos primeiros como parte de uma teoria geral do Direito foram obras
sobretudo de Hans kelsen. Ele é considerado um dos mais autorizados juristas de nossa
época, pois teve plena consciência da importância de problemas conexos com a existência
do ordenamento jurídico, e de ter dedicado a eles particular atenção. Tomando-se, por
exemplo, sua obra mais completa, a Teoria geral do Direito e do Estado. A análise da
teoria do Direito (aqui prescindimos da teoria do estado) está dividida em duas partes,
chamadas respectivamente de Nomostática e Nomodinâmica.
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A primeira considera os problemas relativos à norma jurídica; a segunda, os
relativos ao ordenamento jurídico. No sistema de kelsen, a teoria do ordenamento jurídico,
constitui uma das duas partes de uma completa teoria do Direito.
2.Ordenamento jurídico e definição do Direito
Segundo Norberto Bobbio, a teoria do ordenamento jurídico constituiu uma
integração da teoria da norma jurídica. Ele foi levado a essa integração em sua busca pela
definição do direito em sua obra anterior intitulada Teoria da norma jurídica. Para resumir
suas conclusões, digamos que não foi possível chegar a uma definição do Direito
considerando a norma jurídica isoladamente, mas sim ampliando seus horizontes afim de
que uma determinada norma se torne eficaz para que as pessoas devam exercê-las e a sua
execução possa ser cumprida. Essa organização é resultado do ordenamento jurídico.
Várias tentativas foram feitas para definir o Direito através da norma Jurídica.
Todas resultaram em sérias dificuldades. Assim , a única solução para a compreensão do
fenômeno jurídico, foi o reconhecimento da relevância do ordenamento jurídico.
Dentre as tentativas realizadas para caracterizar o Direito, quatro merecem uma
atenção particular:
O critério formal: “É aquele pelo qual se acredita poder ser definido o que é o Direito
através de qualquer elemento estrutural das normas que se costuma chamar de jurídicas.”
Com respeito à estrutura, as normas podem distinguir-se em positivas ou negativas,
categóricas ou hipotéticas, gerais (abstratas) ou individuais (concretas).
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Critério material: “É aquele critério que se poderia extrair do conteúdo das normas
jurídicas, isto é, das ações reguladas.”
Critério do sujeito que põe a norma: “Se refere à teoria que considera jurídicas as
normas postas pelo poder soberano, entendendo-se por “poder soberano” aquele acima do
qual não existe, num determinado grupo social, nenhum outro, e que, como tal, detém o
monopólio da força.”
Critério do sujeito ao qual a norma se destina: “Pode apresentar duas variantes,
conforme se considere como destinatário o súdito ou o juiz. Vejamos isso separadamente.”
Afirmar que a norma jurídica é dirigida aos súditos, não pode ser considerada como uma
conclusão, devido a sua generalidade. Ela é especificada com a determinação da atitude
através da qual os súditos a recebem.
A segunda variante do critério do destinatário é aquela pela qual as normas jurídicas são
destinadas ao juiz.
O juiz tem o dever de dar a razão para alguma parte, por isso não pode ficar restrito as
normas jurídicas, porque ficaria com opções reduzidas para certos tipos de situações.
Nessas horas, ele deve utilizar do ordenamento para completar sua decisão.
3.A nossa definição de Direito
Para que haja o Direito, segundo Bobbio, é necessário que haja, grande ou pequena,
uma organização, um completo sistema normativo. Isso significa, que para procurar uma
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definição para o Direito, não podemos nos restringir em um elemento da norma jurídica
mas sim em um conjunto de normas organizadas.
4.Pluralidade de normas
Para entendermos melhor a pluralidade de normas, é necessário obtermos antes um
conceito geral de ordenamento. Segundo Norberto Bobbio, ordenamento jurídico (como
todo sistema normativo), é um conjunto de normas.
Todo ordenamento deve ser composto por no mínimo duas normas, pois é impossível que
haja uma norma que abrange as principais modalidades normativas de ações do homem,
como por exemplo o que é obrigatório, o que é proibido e o que é permitido.
Sendo inconcebível um ordenamento que regule todas as ações possíveis com uma única
modalidade de normas, pode-se conceber um ordenamento que ordene ou proíba uma única
ação.
5.Os problemas do ordenamento jurídico
O ordenamento jurídico é um conjunto de normas. Os problemas do ordenamento
nascem das relações das diversas normas entre si.
Os principais problemas do ordenamento são:
Saber se essas normas constituem uma unidade e de que modo a constituem.O problema
que deve ser discutido a esse propósito é o da Hierarquia das normas. Será estudado no
segundo capítulo.
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Descobrir se o ordenamento jurídico constitui também um sistema. Esse problema é
discutido no terceiro capítulo quando falarmos das antinomias jurídicas.
“Todo ordenamento jurídico, unitário e tendencialmente (se não efetivamente) sistemático,
pretende também ser completo.” Esse problema será discutido ao estudarmos lacunas do
Direito no quarto capítulo.
Não existe entre os homens um só ordenamento, mas muitos e de diversos tipos. A relação
entre os diversos ordenamentos será discutido no quinto capítulo.
Capítulo 2
A unidade do ordenamento jurídico
1.Fontes reconhecidas e fontes delegadas
Considerar um ordenamento com apenas duas normas, como foi estudado no
capítulo anterior, é puramente acadêmico. O ordenamento é composto por uma infinidade
de normas, que são praticamente incontáveis. Os juristas reclamam da quantidade de
normas, mas há necessidade de criação constante destas, para atender a sempre variada e
insatisfeita vida social.
É difícil encontrar todas as normas jurídicas, pois geralmente elas não derivam de
uma única fonte.
Podemos distinguir o ordenamento jurídico em simples ou complexo.
A complexidade de um ordenamento jurídico é tamanha, que não existe nenhum
poder (ou órgão) em condições de satisfazê-la sozinho. Para conseguir satisfazê-la , o Poder
recorre a dois expedientes:
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“A recepção de normas já feitas, produzidas por ordenamentos diversos e precedentes.”
“A delegação do poder de produzir normas jurídicas a poderes ou órgãos inferiores.”
Típico exemplo de recepção , é o costume nos ordenamentos estatais modernos, onde a
fonte direta e superior é a lei. Agora, para exemplificar fonte delegada, basta simplesmente
dizer que é o regulamento com relação à lei.
2.Tipos de fontes e formação histórica do ordenamento
“Em cada ordenamento o ponto de referência último de todas as normas é o poder
originário, quer dizer, o poder além do qual não existe outro pelo qual se possa justificar o
ordenamento jurídico.” Esse poder originário é chamado de fonte das fontes. Se todas as
normas nascessem do poder originário, estaríamos frente a um ordenamento simples.
Mas na realidade, as coisas não são assim. As normas surgem através de diversos
canais, e depende historicamente de duas funções:
Um ordenamento nasce de valores religiosos, morais, sociais,usuais, de vários gêneros das
sociedades precedentes, onde os valores e os costumes eram diferentes. O novo
ordenamento nunca elimina a essência da sua origem e sim as trás para a realidade.
O poder originário, uma vez constituído, para manter as normas sempre atualizadas, entrega
o poder de estabelecer normas integradas aos órgãos executivos, que são subordinados aos
regulamentos. Isso é um resumo de limite interno, onde o poder soberano subtrai o seu
poder normativo para repartir a órgãos ou entidades dependentes dele.
3.As fontes do Direito
“Fontes do direito são aqueles fatos ou atos dos quais o ordenamento jurídico faz
depender a produção de normas jurídicas.”
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O ordenamento jurídico não só é essencial para controlar o comportamento das
pessoas, como também regula como as regras devem ser produzidas. Ele controla o estado
produzindo normas de conduta, dizendo o que é certo e como fazer o certo. Controla os
juízes, dando instruções dizendo como eles podem criar normas individuais e concretas,
que são as sentenças.
4.Construção escalonada do ordenamento
O ordenamento jurídico não passaria de um amontoado de normas, se não
tivéssemos considerado algo de unitário. Devemos considerar que existam normas
superiores e normas inferiores. Subindo das normas inferiores àquelas que se encontram
mais acima, até chegar na norma suprema, que não depende de nenhuma outra norma
superior, e sobre a qual repousa a unidade do ordenamento.
Cada ordenamento tem uma norma fundamental. Isso possibilita que todas as
normas espalhadas e de várias proveniências sejam um conjunto unitário que pode ser
chamado de “ordenamento”.
5.Limites materiais e limites formais
“Quando um órgão superior atribui a um órgão inferior um poder normativo, não
lhe atribuiu um poder ilimitado.”Esse limite que o poder superior restringe ao poder inferior
pode ser dividido em dois tipos:
* relativos ao conteúdo;
* relativos à forma.
Por isso fala-se em limites materiais e de limites formais.
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Limites materiais falam até onde o inferior pode mandar e os limites formais falam como
ele deve mandar.
6.A norma fundamental
O poder constituinte é o poder máximo dentro do ordenamento jurídico. Sendo o
poder último, devemos supor, uma norma que atribua ao poder constituinte o direito de
produzir normas jurídicas. Essa norma, denomina-se norma fundamental.
Uma norma só é válida quando pode ser inserida em uma norma fundamental, ou
seja, a norma fundamental é o critério que permite se uma norma pertence a um
ordenamento. Explicando com as palavras de Norberto Bobbio, é o fundamento de validade
de todas as normas do sistema.
7.Direito e Força
“Os detentores do poder são aqueles que tem a força necessária para fazer respeitar
as normas que deles emanam.” Essa frase indica que a força é um instrumento necessário
do poder.
Se o Direito é fundando em última instância sobre o poder, podemos concluir que o
Direito é um conjunto de regras aplicadas, que se apóia na força para ter o poder de se fazer
respeitar.
Capítulo 3
A coerência do ordenamento jurídico
1.Ordenamento jurídico como sistema
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Sistema é uma totalidade ordenada, um conjunto de entes entre os quais existem
uma certa ordem. Para que se possa falar de uma ordem, é necessário que os entes não
estejam relacionados somente com o todo, mas sim com uma coerência entre si.
Kelsen encontrou uma definição perfeita para o ordenamento jurídico como sistema
ao dizer, que esse ordenamento é dinâmico, ou seja, onde as normas que o compõe derivam
uma das outras através de sucessivas delegações de poder, isto é, não através de seu
conteúdo, mas através da autoridade que as colocou.
2. Três significados de sistema
O termo “sistema” em ordenamento jurídico é muito comum. Mas o verdadeiro
significado deste termo, nunca fica bem esclarecido.
“Sistema” é um daqueles termos com muitos significados que cada um usa
conforme suas próprias conveniências.
No uso histórico da filosofia do Direito os juristas encontraram três significados de
sistema.O primeiro foi baseado em sistema dedutivo , que fala que todas as normas
jurídicas daquele ordenamento são derivadas de alguns princípios gerais, igual ao postulado
científico.
Um outro significado de sistema, foi encontrado na ciência do Direito moderno, e
indica um ordenamento da matéria, sendo realizado através do processo indutivo, ou seja,
partindo da parte mais simples das normas até chegar a construir conceitos mais gerais.
O terceiro significado de sistema jurídico, “sistema” se equivale à validade do
princípio que exclui a incompatibilidade das normas, ou seja, um ordenamento jurídico
constitui um sistema porque não podem coexistir nele normas incompatíveis.
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3.As antinomias
Antinomias são normas presentes no mesmo ordenamento e que são incompatíveis.
Norberto Bobbio, cita um exemplo que exprime com clareza o significado de antinomia.
“O art. 27 da Constituição italiana, no qual se lê : “A responsabilidade penal é pessoal”,
está em oposição ao art. 57, § 2º, do C.P., o qual atribui ao diretor de jornal uma
responsabilidade para os delitos cometidos por meio da imprensa pelos seus colaboradores,
se se interpretar este artigo como configurante de uma responsabilidade objetiva (mas pode-
se interpretar também de outras formas que fazem desaparecer a antinomia).”
4.Vários tipos de antinomias
A antinomia, depois de estudada detalhadamente no capítulo anterior, pode ser
definida novamente como aquela situação que se verifica entre duas normas incompatíveis,
pertencentes ao mesmo ordenamento e tendo o mesmo âmbito de validade. As antinomias
assim definidas podem ser distintas em três tipos diferentes, dependendo do contraste entre
duas normas:
1) Se duas normas incompatíveis tem o mesmo valor a antinomia pode-se chamar total-
total: nenhuma norma pode ser aplicada sem entrar em conflito com a outra.
2) Se duas norma incompatíveis tem validade em parte igual e em parte diferente, a
antinomia subsiste somente para parte comum e é chamada parcial-parcial: Cada uma das
normas tem um campo de conflito parcial com a outra e um campo onde este conflito não
existe.
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3 Se duas normas incompatíveis tem o mesmo valor, mas a antinomia é total por parte da
primeira e parcial por parte da segunda, é chamada total-parcial: a primeira não pode ser
aplicada sem entrar em conflito com a segunda, e a segunda tem uma esfera de aplicação
que não entra em conflito com a primeira.
5.Critério para a solução das antinomias
Já conseguimos até agora identificar as antinomias dos ordenamentos jurídicos, mas
nada foi dito de como solucioná-las.
Os estudiosos desse assunto elaboraram algumas regras para a solução das
antinomias, mas essas regras não servem para resolver todos os casos possíveis.
As regras fundamentais para a solução das antinomias são três:
o critério cronológico, é aquele com base no qual, entre duas normas incompatíveis,
prevalece a norma posterior: lex posterior derogat priori.
o critério hierárquico, é aquele pelo qual, entre duas normas incompatíveis prevalece a
hierarquicamente superior: lex superior derogat inferiori.
o critério da especialidade, é aquele pelo qual, de duas normas incompatíveis, uma geral e
uma especial, prevalece a segunda: lex specialis derogat generali.
6. Insuficiência dos critérios
Os critérios estudados no capítulo anterior são falhos quando se tratam de antinomia
entre duas normas contemporâneas ou duas normas do mesmo nível ou ambas gerais.
Entende-se nesse caso que os três critérios não ajudam mais. Isso é mais requente do que se
possa imaginar.
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O critério utilizado tenta estabelecer uma graduação de prevalência entre as três
formas da norma jurídica, por exemplo, “se de duas normas incompatíveis uma é
imperativa ou proibitiva e a outra é permissiva, prevalece a permissiva.” Os juizes sempre
tendem a favorecer a liberdade em caso de dúvidas.
7.Conflito dos critérios
São três tipos de conflitos entre critérios:
Conflito entre critério hierárquico e o cronológico: O critério hierárquico prevalece sobre o
cronológico, pois o princípio lex posterir derogat priori não vale quando a lex posterior é
hierarquicamente inferior à lex prior. Se o critério cronológico prevalecesse sobre o
hierárquico, o princípio das normas hierárquicas seria todo vão, porque a norma superior
perderia o poder.
Conflito entre o critério de especialidade e o cronológico: a regra geral é lex posterior
generalis non derogat priori speciali. Com base nessa regra o conflito fica em favor do
primeiro critério: “ a lei geral sucessiva não tira do caminho a lei especial precedente.
Conflito entre o critério hierárquico e o de especialidade: Não existe uma regra geral
consolidada. Uma solução segura é impossível. O critério escolhido dependerá do
intérprete.
Quando a gravidade do conflito deriva do fato de que estão em jogo dois valores
fundamentais de todo ordenamento jurídico, o do respeito a ordem , que exige o respeito da
hierarquia e, portanto, o do critério da superioridade, e o da justiça, que exige a adaptação
do Direito às necessidades sociais, portanto, respeito do critério da especialidade.
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8. O dever da coerência
A coerência deve ser mantida para um juiz ao tomar uma decisão em um processo,
onde a antinomia esteja presente, levando em conta o critério hierárquico, por exemplo ,
para tentar se aproximar a uma decisão mais justa.
Os legisladores estão autorizados a formular normas que se opõe, de acordo com o
artigo 15 das Disposições preliminares, o que gera a legitimidade de uma lei posterior em
oposição a uma anterior.
Após perceber estas considerações podemos definir coerência como sendo aquela
propriedade pela qual nunca se dá o caso em que se possa demonstrar a pertinência a um
sistema e de uma certa norma e da norma contraditória.
Capítulo 4
A completude do ordenamento jurídico
1. O problema das lacunas
“Completude é a propriedade pela qual um ordenamento jurídico tem uma norma
para regular qualquer caso”. Completude significa também “falta de lacunas”, ou seja,
lacuna é a falta de uma norma.
O problema das lacunas, mediante que o juiz é obrigado a tomar decisões de
acordo com uma norma pertencente a uma sistema, fica impossibilitada se não existir uma
lei para cada caso. A completude é , portanto, uma condição sem a qual o sistema em seu
conjunto não poderia funcionar.
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2 .O dogma da completude
O dogma da completude é tido como positivista, pois baseado no direito romano,
defende que o Direito romano é o Direito por excelência, ou seja, não a nada para se
acrescentar e nada pra se retirar, pois contém tudo que um bom intérprete necessita para
resolver todos os problemas jurídicos apresentados ou por aparecer.
A cada grande codificação (código napoleônico por exemplo) os juristas tendem a
se ater-se cada vez mais aos códigos, e a crença que o mesmo basta-se completamente a
sim próprio,prova que não há lacunas: em uma palavra, o dogma do completude jurídica.
3.A crítica da completude
Os comentadores do Direito constituído acreditavam que o Direito não tivesse
lacunas e que o dever do intérprete era apenas tornar explícito o que estava implícito na
mente do legislador.
Entretanto, os estudiosos da escola do Direito livre afirmam que o direito
constituído está cheio de lacunas e, para preenchê-las era necessário confiar no poder
criativo do juiz.
4.O espaço jurídico vazio
O espaço jurídico vazio foi definido pelos positivistas assim: “ O âmbito da
atividade pode ser dividido, do ponto de vista do Direito, em dois compartimentos: aquele
no qual é regulado por normas jurídicas, e que poderemos chamar de espaço jurídico pleno,
e aquele no qual é livre, e que poderemos chamar de espaço jurídico vazio.”
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Na verdade essa teoria é falha. Não existe espaço jurídico vazio. Pois parece que a
afirmação do espaço jurídico vazio nasce da falsa identificação do jurídico com o
obrigatório.
5. A norma geral exclusiva
A norma geral exclusiva é aquela que regula todos os casos não-compreendidos na
norma particular, mas os regula de maneira oposta. Norma geral inclusiva é a de regular os
casos não-compreendidos, mas semelhantes a eles, de maneira idêntica.
A teoria da norma geral exclusiva tem um ponto fraco. Esse ponto fraco é: “ Aquilo
que diz, o diz bem, e com aparência de grande rigor, mas não diz tudo.”
Podemos concluir que não há falta de normas para serem aplicadas, mas sim falta de
critérios válidos para decidirmos qual norma deve ser aplicada.
6.As lacunas ideológicas
Lacunas ideológicas são aquelas que derivam não da consideração do ordenamento
jurídico como ele é, mas da comparação entre o ordenamento jurídico como ele é, e como
deveria ser.
Todo sistema jurídico existem lacunas ideológicas, pois nenhum ordenamento
jurídico é perfeito, pelo menos nenhum ordenamento positivo.
Concluímos portanto que quando os juristas sustentam, em nossa opinião, sem
razão, que o ordenamento jurídico é completo, isto é, não tem lacunas, referem-se às
lacunas reais e não às ideológicas.
7.Vários tipos de lacunas
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Completando as lacunas existentes no ordenamento jurídico podemos citar as
lacunas próprias e impróprias.
Lacuna própria, é uma lacuna do sistema ou dentro do sistema; a lacuna imprópria
deriva do sistema real com um sistema ideal.
As lacunas próprias, por sua vez, ainda possui duas sub divisões que são as lacunas
subjetivas e objetivas. A primeira, depende de alguns motivo imputável pelo legislador, e a
segunda depende do desenvolvimento das relações sociais, das novas invenções, de todas
aquelas causas que provocam um envelhecimento dos textos legislativos e que, portanto,
independentes da vontade do legislador. As lacunas subjetivas, podem dividir-se em
voluntárias e involuntárias. Involuntárias são aquelas que dependem de um descuido do
legislador, que faz parecer regulamentado um caso que não é, ou faz deixar de lado um caso
que talvez se considere pouco freqüente. Voluntárias são aquelas que o próprio legislador
deixa de propósito, quando a matéria é muito complexa e não pode ser regulada com regras
muito miúdas, e é melhor confiá-la, caso por caso, à interpretação do juiz.
8. Heterointegração e auto-integração
Estudamos até agora que o ordenamento pode ser maleável, ao ponto de podermos
de podermos penetrar em sua zona intermédia, e estender a esfera do regulamento em
confronto com o a do não-regulamento. Ao estender sua esfera, podemos dizer que o
ordenamento é completável se for dinamicamente considerado.
Para completar o ordenamento podo-se recorrer a dois métodos que podemos
chamar de heterointegração e auto-integração. O primeiro consiste na integração operada
através do recurso a ordenamentos diversos e recurso a fontes diversas daquela que é
dominante; o segundo consiste na integração cumprida através do mesmo ordenamento, no
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âmbito da mesma fonte dominante, sem recorrência a outros ordenamentos e com o mínimo
recurso a fontes diversas da dominante.
9.A analogia
Entende-se por “analogia” o procedimento pelo qual se atribui a um caso não-
regulamentado a mesma disciplina que a um caso regulamentado semelhante. A analogia é
o mais importante procedimento interpretativo de um determinado sistema normativo: é o
procedimento que estuda a tendência de cada ordenamento jurídico a expandir-se além dos
casos expressamente regulamentados.
10.Os princípios gerais do Direito
Para explicar os princípios gerais do Direito, basta citar um dos maiores estudiosos
do problema da interpretação, Betti, que afirma que “ um dos instrumentos ( de
heterointegração) é constituído pelos princípios gerais do Direito se e enquanto puder ser a
eles reconhecida uma força de expansão, não meramente lógica, mas axiológica, de tal
modo que possam ir além das soluções legislativas determinadas por suas valorações e,
portanto, transcendam o mero Direito positivo.”
Capítulo 5
As relações entre os ordenamentos jurídicos
1. A pluralidade dos ordenamentos
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Para que possamos falar da pluralidade, é necessário que haja mais de um
ordenamento.
Bobbio deixa de tratar o ordenamento em seu interior, e passa a tratar do problema
das relações entre os ordenamentos, ou ainda, dos problemas que nascem no exterior de
um ordenamento.
Os problemas mais discutidos são as relações entre o Direito positivo e Direito
natural
2.Vários tipos de relação entre ordenamentos
“Como as normas de um ordenamento podem ser dispostas em ordem hierárquica,
nada exclui que os vários ordenamentos estejam num relacionamento entre si de superior
para inferior. A pirâmide que nasce no interior de um ordenamento pode prolongar-se fora
do ordenamento, se alguns ordenamentos de um certo tipo são subordinados a um
ordenamento superior e este, por sua vez, a outro, e assim por diante. A imagem da
pirâmide das normas pode ser completada com a imagem da pirâmide dos ordenamentos.
Por isso as relações entre os ordenamentos pode ser feita com base no diferente grau de
validade que eles têm em relação ao outro”. Digamos assim:
*relações de coordenação;
*relações de subordinação
3 Estado de ordenamentos menores
“ Ordenamentos menores” são os que mantêm unidos os seus membros para fins
parciais e que, portanto, investem somente uma parte da totalidade dos interesses das
pessoas que compõem o grupo.
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No relacionamento entre os ordenamentos, ocupam lugar à parte as relações entre o
ordenamento estatal e certos ordenamentos menores, cuja vida se desenvolve no interior da
do Estado e se entrelaça de várias maneiras com esta.
4. Relações temporais
As relações que Bobbio emprega maior ênfase, são as que interpõem entre os
ordenamentos estatais, ou interpõem entre ordenamentos estatais, de um lado, aos quais e
atribuiu por comum consentimento caráter de ordenamentos jurídicos, como o ordenamento
internacional e o ordenamento da Igreja Católica.
Os aspectos mais importantes para que haja relações temporais são em particular
dos âmbitos temporal, espacial e material. Se dois ordenamentos se diferenciam com
respeito a estes três âmbitos, é provável que não tenham entre si, interferência alguma.
5. Relações espaciais
Explicando através de exemplos, relações espaciais aplica-se quando dois
ordenamentos de dois Estados cujas normas valem dentro de limites espaciais (o chamado
território) bem definidos, entram em “conflito” por um julgamento onde apenas uma das
normas pode ser aplicada. Nestes casos, no ordenamento moderno, as normas estrangeiras
são escolhidas.
6.Relações matérias
Ao contrário das relações espaciais que divide um estado de outro, as relações
matérias dividem um limite ideal, muito mais difícil de se determinar. No caso da Itália,
Bobbio exemplificou relações materiais entre o Estado e a Igreja. Entretanto deixou bem
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claro, que a segunda deve submeter se ao estado como parte integrante dele, mediante \ um
procedimento que se distingue tanto do reenvio quanto da recepção..
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