UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
O HOMEM, A ÉTICA E A MEDIAÇÃO
Por: Carlos Henrique da Silva
Orientador
Prof. William Rocha
Rio de Janeiro
2015
DOCUMENTO PROTEGID
O PELA
LEI D
E DIR
EITO AUTORAL
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
O HOMEM, A ÉTICA E A MEDIAÇÃO
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Mediação de Conflitos com
Ênfase em Família
Por: Carlos Henrique da Silva
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AGRADECIMENTOS
Agradecer não é algo tão simples de fazer, pois para se chegar a algum
lugar, você precisa da ajuda de outras pessoas. E várias as que me ajudaram.
Primeiramente quero agradecer a Deus que me deu forças para
continuar e vencer. Pelos meus pais, pela família onde fui concebido onde
aprendi valores, simples, mas tão cheios de esperança. Obrigado mãe,
obrigado pai. Vocês não estão mais entre nós, mas vai aqui meu muito
obrigado! Aos meus irmãos Jorge Luís e Paloma meu mais profundo e sincero
agradecimento. À minha linda esposa Elisangela, meu especial muito obrigado
pela sua imensa paciência, dedicação, pelo estímulo, sem o qual este trabalho
não seria possível.
Ao meu orientador, ilustríssimo prof. William Rocha, pelo aprendizado,
pelo apoio, meu muito obrigado.
Aos meus amigos de sala de aula e funcionários da AVM, agradeço pela
atenção dispensada e suporte nos momentos de necessidade.
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DEDICATÓRIA
À minha querida esposa Elisangela,
companheira de todos os momentos,
fáceis ou difíceis.
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RESUMO
A ética tem sido tratada desde os primórdios da existência humana. Ela
toma vulto com as sociedades antigas passando pela Grécia, Roma e tantos
outros povos. Está presente em tantos códigos antigos como atuais e a cada
dia necessita ser revisitada e proclamada, devido à não usual prática da
mesma por muitos. A ética necessita ser pregada e observada para que uma
sociedade possa desenvolver-se. Nesse contexto, a mediação não pode ser
praticada se não estiver alicerçada por parâmetros éticos. Ela não tem
qualidade e não sobrevive se não presentes estiverem os valores necessários
ao funcionamento deste instituto chamado mediação. Há tantos pólos onde a
mediação está sendo desenvolvida. Mas necessário é, que esta ferramenta de
resolução de conflitos, seja praticada observando os princípios éticos
constitucionais – onde nasce sua formalização – e, os dispositivos infra-
constitucionais nos quais se baseia. Seus profissionais também deverão
observar esses princípios, sem os quais estarão fadados ao fracasso e
dissabor. Assim, se a mediação for encarada de forma séria e em bases éticas
já mencionadas, o resultado será benéfico não somente para mediandos e
mediadores, mas a sociedade brasileira irá aferir ganho, possibilitando a
resolução litigiosa por um caminho bem mais excelente.
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METODOLOGIA
A metodologia utilizada no presente trabalho é a revisão bibliográfica,
sendo pesquisados livros, apostilas e textos utilizados em sala de aula,
anotações das aulas e publicações nas áreas de mediação, ética, psicanálise e
direito. Também há consultas da web. Autores como os filósofos Olinto A.
Pegoraro e Adolfo Sánchez Vázquez, David Zimerman e Antônio Carlos M.
Coltro suscitam o tema. A pesquisa bibliográfica tem como princípios a análise
textual, a contextualização e síntese pessoal.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - Ética através dos tempos 09
CAPÍTULO II - Ética e Constituição 21
CAPÍTULO III – Ética e Mediação 32
CONCLUSÃO 51
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 55
WEBGRAFIA 58
ÍNDICE 59
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INTRODUÇÃO
A pós modernidade produz dinâmicas que desafia a todos a repensar
as questões éticas. A tecnologia, o acúmulo de riquezas, a disseminação e
controle da informação associada a um paradigma do Estado como provedor
de bens necessários não se mostram suficientes para redução da violência,
exclusão da injustiça e oferecimento de uma alternativa ao modus vivendus
angustiante e conflituoso em que se encontra boa parcela da humanidade.
Essas questões são recorrentes à história do homem, pois envolvem a
felicidade, o sofrimento, potencialidade e condições efetivas de gerar bem
estar e não injustiças. Fazer prevalecer a solidariedade, a paz e a criatividade
inibindo a ignorância, os conflitos, a exclusão do próximo e evitar a destruição
do ambiente em que vive.
Certo é a impossibilidade de uma ética de abrangência que seja
compatível com os preceitos de todos os indivíduos e todas as sociedades. A
consciência moral pode variar de pessoa para pessoa, mas impossível deixar
de reconhecer um princípio ético mínimo, de validade geral e universal,
suficiente que possa ter aceitação em todas as culturas. Nas palavras de José
Renato Nalini1, “reconhecer o outro como igual, como igualmente merecedor
de tratamento compatível com a dignidade humana, é uma atitude ética.”
A Carta da República de 1988 possui vários elementos que se
integram à necessidade da ética quando inaugura um novo conjunto de
preocupações neste sentido. E a mediação não poderia ser diferente. Norteada
por princípios éticos, a mediação só terá êxito se tanto o mediador como
quanto a instituição onde ela se propaga possuírem postura ética com base
nos códigos de ética que a regulamentam e na observância do
comportamental mínimo social ético nas questões que envolvem a resolução
de conflitos numa sociedade tão litigiosa como a que se assiste no Brasil.
1 NALINI, José Renato. Aspectos Psicológicos na Prática Jurídica. Organizadores: David Zimerman e Antônio Carlos Mathias Coltro. Campinas, SP: 2002. p. 32.
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CAPÍTULO I
ÉTICA ATRAVÉS DOS TEMPOS
Não peço que me mostres o exemplo de um ato
justo, mas peço que me faças ver a essência por
força da qual todas as condutas justas são justas.
(Platão, filósofo.)
As relações entre os homens se desenvolveram em diferentes épocas e
sociedades, onde o comportamento foi influenciado pela realidade social,
histórica e moral. As doutrinas éticas não podem ser consideradas em si
mesmas, mas dentro de um contexto histórico de mudanças e de sucessão
quer sejam culturais, políticas ou sociais. Ética e história possuem íntima
relação, pois que, relacionam-se com a vida em sociedade e entre si mesmas,
já que cada momento ético histórico se relaciona com o anterior e se enriquece
ao longo do tempo.
1.1 – Considerações iniciais sobre a ética.
A palavra ética vem do grego ethos, que significa moral. Apesar da
mesma raiz em comum para ambos os termos, há de se fazer diferenciação
entre eles.
A moral se refere às ações, ou seja, à conduta real, individual ou
coletiva. É um sistema de normas, princípios e valores que regulam as
relações entre indivíduos e desses com a sociedade. São dotadas de caráter
histórico e social, acatadas por uma convicção coletiva, não mecânica, externa
ou impessoal. A ética, por sua vez, alude aos princípios ou juízos que
originaram essas ações. Pode-se dizer que, a ética e a moral,
respectivamente, correspondem à teoria e à prática, estando sempre
entrelaçadas entre si.
O ilustríssimo PROF. OLINTO A. PEGORARO explica, num
entendimento mais atual que, “A ética refere-se sempre à estrutura radical do
ser humano, ao núcleo subjetivo único e intransferível: a consciência e a
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liberdade. Neste reduto de acesso exclusivamente pessoal cada um decide,
assume suas opções e por elas responde”.2
1.2 – Ética e história.
Ao longo do tempo os princípios e valores encarnados na vida moral
entram em crise e exigem uma ética que atenda a necessidade de novas
reflexões com a justificativa de substituição de umas sobre as outras. Os
conceitos, valores e normas tornam-se problemáticos e buscam estar em
conexão com os anseios sociais dentro das suas estruturas. Diante disso tem-
se alguns desses conceitos a seguir.
1.2.1 – Ética no mundo greco-romano.
A Grécia do século V a.C – em muitas de suas cidades-estado – com a
vitória da democracia escravista, a democratização da vida política e uma
intensa vida pública, deram origem à filosofia política com as idéias dos
sofistas, de Sócrates, Platão, Aristóteles, estóicos e epicuristas.
O sofista reage contra a sabedoria do mundo, pois o considera sem
profundidade. Prefere saber sobre o homem, principalmente no que tange aos
campos político e jurídico. Protágoras relativiza o saber dizendo que “tudo é
relativo ao sujeito, ao homem, medida de todas as coisas”. Górgias prega que
“é impossível saber o que existe realmente e o que não existe.” Para alcançar
êxito, o cidadão da polis deve praticar a argumentação, a persuasão ensinada
pelos sofistas, que cobram por isto. A ética sofista perpassa pela arte de
persuadir e põe em dúvida a tradição e a existência de verdades e normas
válidas. Essas normas por serem humanas, no entendimento sofista, são
transitórias.
Sócrates possui uma ética racionalista onde bondade, conhecimento e
felicidade possuem estreito relacionamento. Com ele o homem tornou-se tema
2 PEGORARO, Olinto A. Ética é Justiça. Petrópolis, RJ, Vozes, 1995, p. 101.
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da reflexão ética e filosófica. O ser humano – homem - que age retamente é
aquele que conhece e pratica o bem. Agindo dessa forma, sente-se dono de si
mesmo e, como resultado, é feliz. Sócrates pregava a necessidade de
restauração da imagem do homem. Para tal deveria olhar para dentro de si
mesmo. Daí a máxima socrática “conhecer a si mesmo”. Esta é a base para a
existência de um bom cidadão numa polis justa. Assim, a ética nasce com os
temas centrais do bem, da virtude, do valor da pessoa e da sociedade justa.
Já para Platão, discípulo de Sócrates, a ética está intimamente ligada a
filosofia política, pois a polis é o lugar apropriado na prática de uma vida moral.
Alguns autores comungam que Platão é o “pai” da ética. Com efeito, ele
desenvolveu cerca de 350 anos a.C. um complexo sistema filosófico que
continua sendo extremamente popular até os dias de hoje. Ele desenvolveu
uma teoria racional sobre a constituição da alma humana como eterna,
estabelecendo a supremacia e autonomia da razão sobre as emoções e os
impulsos ou vontade [...]. (GOUVÊA, 2002, p. 54).
Porém, este não é o entendimento da maioria dos pensadores, pois
mesmo antes de Platão, já haviam outros sistemas que apresentavam
condutas a serem seguidas por todos, como o Código de Hamurábi.
Entretanto, inegável é a sua importância para o pensamento ético.
Platão entende que nós devemos decidir se desejamos chegar à uma
alma purificada e ter uma vida mais justa, seguindo o que é razoável, sem
julgamentos desnecessários. A virtude passa a ser praticada em nossas almas,
que são a sede de nossa consciência, não mais a busca através da harmonia
cósmica. Assim traz um sentido individualista para essa busca. Ele acredita
que a felicidade não deve ser buscada somente pelo indivíduo, mas por toda a
sociedade, pois a ética se encontra no meio social. E um indivíduo não pode
alcançar a felicidade minimamente ética em uma comunidade viciosa. A
coletividade deve alcançar a felicidade também, a fim de não incutir conceitos
duvidosos entre seus membros, que interagem todo tempo entre si.
Já Aristóteles, nascido em Estagira na Macedônia (384 – 322 a.C.) e,
discípulo de Platão, não aceita que a idéia exista separada dos indivíduos; se
opondo ao dualismo ontológico de Platão. A ética de Aristóteles está associada
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à filosofia política, ou seja, a comunidade social e política é o meio necessário
onde o homem pode encontrar a felicidade (eudaimonia). O homem não pode
levar uma vida moral isoladamente, mas como parte da sociedade.
Esta vida moral e ética não é um fim em si mesmo, mas condição para
se viver uma vida realmente humana na qual repousa esta felicidade. Numa
comunidade baseada na exclusão social, onde os escravos se mantem
excluídos da vida política e as mulheres são subjugadas, a verdadeira vida
moral pertence à uma elite, que pode realizar-se nela. Assim, o homem bom
(sábio) deve ser também, um bom cidadão formado para a justiça e
estabilidade (paz) na polis. Segundo ele, “ao homem não basta viver; ele quer
viver bem”.
No império romano, a ética filosófica clássica já estava em plena
decadência e ruína, face a perda da autonomia dos Estados gregos e
sucessiva queda de impérios: primeiro o da Macedônia; em seguida o próprio
império romano. No período dos imperadores romanos, o homem interior mais
se angustiava e os tempos eram ainda mais tormentosos. Chega-se a um
momento crítico de profunda decadência da sociedade onde ainda sobrevivem
as antigas escolas filosóficas; mas já em ruínas, se esgotam e caem umas
depois das outras, tendo como um dos motivos a expansão do Cristianismo. O
estoicismo, sobrevive neste mundo em decadência, por um tempo ainda e, tem
como seu principal expoente Zenão de Cítio, na Grécia e, Sêneca, Epíteto e
Marco Aurélio em Roma; o epicurismo tem como seu representante, Epicuro
na Grécia e, Tito Lucrécio Caro, em Roma.
Tanto para o estoicismo como para o epicurismo, a moral se define em
relação ao universo, não mais à polis. Assim, para ambos a física é a premissa
da ética, pois a mesma é colocada como pano de fundo da necessidade
material, física do mundo.
Para os estóicos, o mundo ou cosmos tem como seu coordenador um
único e grande Ser que tem Deus como princípio, alma ou razão. Tudo
acontece de acordo com Sua vontade. O acaso e a liberdade não existem. O
homem está sujeito à uma fatalidade e destino absolutos. A atitude do sábio é
aceitar o seu destino e condição. Assim, aceitando viver de acordo com a
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razão, com consciência de seu destino e função no universo, sem se deixar
levar por paixões, afetos ou coisas exteriores; praticando para tal, a apatia, o
sábio conquista a liberdade interior e sua autossuficiência absoluta. Como
resultado, o indivíduo se define moralmente sem necessidade da comunidade,
pois o estóico é cidadão do cosmos, não da polis.
Para os epicuristas, a existência de todas as coisas vem da formação a
partir do átomo, inclusive a alma, sem interferência divina nos fenômenos
físicos nem na vida do homem. Assim, o homem pode buscar o bem neste
mundo, que para Epicuro, é o prazer. O importante é escolher os prazeres que
sejam bons e duráveis, pois há muitos prazeres e nem todos são necessários
e úteis. Os prazeres corporais são fugazes e imediatos, mas os espirituais
contribuem para a paz da alma. O epicurista, retirado da vida social, então,
encontra em si mesmo a tranqüilidade da alma e a autossuficiência.
Desta feita, a ética epicurista e estóica surge numa época de
decadência e de crise social, onde a unidade da moral e políticas grega, se
dissolvem.
1.2.2 – Ética Medieval e sua Verticalização.
A ética na idade média é pautada na doutrina cristã. O mundo antigo
ruiu, a escravidão cede seu espaço à servidão e sobre a base da igreja
Romana aquela sociedade garante uma certa unidade social, pois a política
está na dependência da religião e a igreja exerce poder espiritual e social.
Os medievais adotaram o conceito grego de verdade como adequação
da mente com a coisa, mas por razões teológicas, desenvolveu-se com muito
cuidado o conceito de verdade ontológica, ou seja, a verdade de cada coisa
criada por Deus. A moral e a ética estão impregnadas de um conteúdo
religioso, encontrado em todas as manifestações sociais naquele momento.
O homem passa a olhar para o alto, na busca do Seu criador, Deus; e,
não mais para si mesmo ou para a sociedade, a polis greco-romana.
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Nesse contexto, a ética de Agostinho de Hipona (354 – 430) consiste
na busca da felicidade no gozo da suprema Verdade onde Deus é a única e
verdadeira alegria. Nos termos latinos uti et frui, Agostinho resume sua ética
cristã: frui, fruir, gozar, alegrar-se e uti, usar, servir-se. Ele explica a ética da
fruição dos bens divinos em harmonia com a utilização das coisas terrenas que
alimentam a vida material, a vida humana em direção ao verdadeiro bem e
única e suprema felicidade, que é estar após a morte com Deus.
Agostinho acredita na ordem natural das coisas como caminho da
transcendência divina e felicidade humana. Sempre sustentou a liberdade
como fundamento ético, negando as forças externas, os corpos celestes como
determinantes da vontade humana. Para Agostinho: “não há um “destino” que
nos impele fatalmente, como queriam os estóicos; o homem tem inteligência e
o dom da liberdade para decidir seu agir na direção da cidade celeste (Civ.,
X,5).
A ética agostiniana se coloca na ordem das essências, ou seja, Deus,
homem, animal, vegetal, mineral, que cria a ética da adoração a Deus, de
amor aos homens em Deus e, da utilização equilibrada das coisas materiais.
Já no século XIII, Tomás de Aquino (1226 - 1274) adota princípios
éticos gerais que coincidem com a ética aristotélica. Tomás viveu num século
de apogeu da ontologia, da ética e da política aristotélica como reação aos
agostinianos que perderam a hegemonia da filosofia platônica e neoplatônica.
A tese central de Aristóteles do agir humano virtuoso em vista de um
bem supremo na convivência política justa forma também as bases da ética
tomista. Porém, Aquino trata de “cristianizar” a sua moral onde Deus é o bem
objetivo ou fim supremo, cuja posse causa gozo ou felicidade.
A ética tomista se insere no âmbito da antropologia, da política e da
metafísica, não, porém como fizeram os gregos, mas como procedem os
cristãos que crêem num universo criado por Deus e orientado para a
eternidade.
O cerne da ética de Aquino se contextualiza no mundo real da vida
direcionado para seu Criador. A especificação da ética em virtudes morais,
intelectuais, vida política e regimes de poder são simples conseqüência.
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Fundamental é o movimento de retorno da criatura ao Criador, com auxílio das
virtudes humanas e da fé.
Tem-se então que, a ética de Tomás implica na razão como base e na
fé como coroamento transcendente. Cabe à ética criar normas de conduta
humana baseadas no entendimento da estrutura metafísica do homem como
animal racional e animal político por sua própria natureza.
1.2.3 – Ética Moderna e o Antropocentrismo.
A partir do século XVI até início do século XIX se cultiva na nova
sociedade que sucede à sociedade feudal a ética moderna, que se caracteriza
pela convivência com uma série de mudanças em vários aspectos.
Se incrementam as forças produtivas na economia impulsionadas pelo
desenvolvimento científico e se desenvolvem as relações capitalistas de
produção; na ordem social, se fortalece uma nova classe social, a burguesia,
que luta para impor seu domínio através de revoluções que se estendem por
várias regiões da Europa; no plano estatal, desaparecem os pequenos Estados
Feudais, que dão lugar a grandes Estados modernos, únicos e centralizados.
A religião deixa de ser a forma ideológica dominante e o homem
adquire um valor pessoal, não só como ser espiritual, mas também como ser
corpóreo, sensível. Dotado não somente de razão, mas também de vontade. A
contemplação dá lugar à ação.
Em Descartes (século XVII) já há a tendência de se basear a filosofia
no homem, ainda que como um abstrato eu pensante.
Um dos grandes pensadores da Era Moderna, representante do
Iluminismo, uma de suas maiores influências – havia outros grandes
pensadores no seu tempo tais como: Goethe, Fichte e Hegel - foi Immanuel
Kant (1724 – 1804).
A ética de Kant expressa da forma mais perfeita a expressão da ética
moderna. Suas obras que apareceram, não por acaso, anos imediatamente
anteriores à Revolução Francesa de 1789 são: Fundamentação da Metafísica
dos Costumes (1785) e Crítica da Razão Prática (1788).
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Kant defende que não é o sujeito que gira em torno do objeto, mas sim
ao contrário. O que o sujeito conhece é o produto de sua consciência. O
homem como sujeito moral é ativo, criador e está no centro tanto do
conhecimento quanto da moral. Sua ética parte do factum (o fato) da
moralidade. O comportamento moral pertence a um sujeito autônomo e livre,
ativo e criador. A ética kantiana é o ponto de partida na qual o homem se
define antes de tudo como ser ativo, produtor ou criador.
O problema da moralidade traz a questão do fundamento da bondade
dos atos, ou em que consiste o bom. Para Kant, o único bom em si mesmo é
uma boa vontade. A bondade de uma ação não se deve buscar em si mesma,
mas na vontade com que se fez.
O principal objetivo da ética kantiana é mostrar a existência de uma
razão pura prática capaz de determinar a vontade sem recorrer ao empirismo e
à sensibilidade; opera por si só, sendo portanto, anterior à experiência. Nisso
Kant se distancia dos gregos e medievais, quando afirma a distância entre a
razão empírica e a razão pura prática.
De acordo com Kant, não se exige o cultivo da moral para viver-se em
sociedade; basta que a liberdade seja exercida nos termos da lei.
Para Aristóteles, a virtude moral da justiça, por exemplo, é necessária
para a continuidade da sociedade; na ética kantiana, a moralidade subjetiva é
regulada pelo imperativo categórico e a lei social estabelece a compatibilidade
das liberdades que é o mútuo respeito. A moral kantiana se firma nas ações
externas livres e reguladas pelo direito. Os deveres de compaixão,
benevolência, caridade e outros gestos humanitários são exclusivamente atos
da virtude ética subjetiva e nada tem a ver com a ordem jurídica. São
exclusivamente morais e nunca legais, exatamente como as obrigações sociais
são sempre deveres legais e nunca morais.
De Kant em diante, a ética será normativa, ou seja, a ética da lei moral
substitui a ética das virtudes. A ética não será mais o comportamento virtuoso,
mas o cumprimento da lei moral.
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1.2.4 – Ética Contemporânea e sua Objetivação.
As doutrinas éticas posteriores a Kant surgem numa sociedade na qual
afloram revoluções sociais do século passado e presente. A ética
contemporânea surge num contexto de contínuos progressos científicos e
técnicos que vão desaguar num imenso desenvolvimento das forças
produtivas, que acabarão por ameaçar a própria existência humana diante das
guerras que se travarão.
A ética contemporânea se defronta com uma pluralidade de tendências
culturais e morais dentro de uma mesma sociedade, que se formam a partir
dos juízos de valores recebidos por cada um dos indivíduos dentro de seu
próprio contexto de convivência.
Assim, um novo pensamento começa a surgir contestando o
racionalismo absoluto e passa a assumir a existência de uma parte
inconsciente do ser humano. As principais correntes dessa ética
contemporânea são: o Existencialismo, o Pragmatismo, a Psicanálise, o
Marxismo, o Neopositivismo e a Filosofia Analítica.
Kierkegaard (1813 – 1855) é considerado o pai do Existencialismo.
Para ele, o que vale é o homem concreto, sua individualidade e subjetividade.
Diferentemente de Jean Paul Sartre (1905 – 1980), para quem Deus
não existe, tendo como conseqüência disso, a total liberdade do homem sem
nenhum vínculo com um possível criador; Kierkegaard, entende haver três
estágios na existência individual: estético, ético e religioso. O estágio superior
é o religioso, pois a fé é sustentada por uma relação pessoal, subjetiva com
Deus. O estágio ético está abaixo do religioso onde o indivíduo deve pautar
seu comportamento por normas gerais. E o estágio estético se situa num
degrau inferior ao ético, onde importa o prazer do momento, busca-se a alegria
momentânea3.
Nos Estados Unidos do último quarto do século passado nasce e se
difunde como doutrina ética o Pragmatismo tendo como seus principais
3 VASQUEZ, Adolfo Sánchez. Ética. 35ª edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013. p. 287.
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A mercantilização das diversas atividades humanas aliadas ao
progresso científico e técnico com o desenvolvimento do espírito
empreendedor nos E.U.A. propiciaram o surgimento e difusão de uma filosofia
antiespeculativa – o Pragmatismo - desconectada dos problemas no âmbito da
metafísica. Filosofia esta atenta às questões práticas com sentido utilitarista.
O Pragmatismo sinaliza identificação com o útil. A verdade é entendida
como aquilo que tem utilidade, ao que é bom. Isso é que leva ao êxito. Valores,
princípios e normas são considerados como nada e o bom vai depender da
atividade prática de cada um como sua variante.
Essa ética é marcada pelo egoísmo, pois reduz o comportamento
moral aos atos que levam ao êxito do indivíduo.
Ainda que não se possa se referir a uma ética psicanalítica strictum
sense também não há como negar que algumas das descobertas da
Psicanálise, como a confirmação da existência do inconsciente do homem,
contribuíram para que haja um julgamento ético diferenciado.
Sigmund Freud (1856 – 1939) fundou a psicanálise como corrente
psiquiátrica e psicoterapêutica onde o pressuposto básico é a afirmação de
que existe uma área da personalidade, da qual o ser humano não tem
consciência, que é o inconsciente. No inconsciente estão armazenadas as
recordações, desejos ou impulsos “proibidos” pelo consciente, que lutam para
escapar desse “lugar obscuro”, burlando a censura.
Freud chama a energia que se manifesta no inconsciente de libido, que
é de natureza sexual. Quando esta energia não pode ser canalizada ou
adaptada e é reprimida surge, por exemplo, a neurose, que é uma das formas
de perturbação psíquica. Freud empresta uma importante contribuição à ética,
pois se o ato moral é aquele no qual o sujeito age livre e conscientemente, os
atos praticados por uma motivação inconsciente devem ser excluídos do
campo moral.
De outra vista, a Psicanálise ajuda a se colocar no seu devido lugar
aquelas normas que são impostas ao sujeito de maneira absoluta.
A ética marxista explica e critica as morais do passado e,
simultaneamente, expõe as bases teóricas e práticas de uma nova moral. O
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Marxismo olha o homem como um ser produtor, transformador, criador,
inventivo, social e histórico. Mediante seu trabalho transforma a natureza
externa, nela se mistura e, ao mesmo tempo, cria um mundo de acordo com
suas necessidades e natureza humana.
Para o Marxismo, o homem é um ser essencialmente social, pois
somente ele produz relações sociais, tais como as relações de produção do
operariado. E também, é um ser histórico, tendo em vista que, as várias
relações que se formam num determinado período no espaço e tempo
constituem uma unidade econômico-social que muda de acordo com suas
contradições internas pautadas na base econômica e na superestrutura
ideológica, a moral.
Marx entende que o homem deve intervir na transformação social de
forma prática e consciente. A moral ou ideal deve atender ao cumprimento
desta participação humana, sem a qual ambos poderiam se transformar em
algo impotente, sem importância efetiva na vida do homem em sociedade.
O Neopositivismo e a Filosofia Analítica aglomeram as correntes éticas
contemporâneas que concentram sua atenção na análise da linguagem moral,
tratando o homem como algo que pode ser definido, defendendo também os
conceitos de obrigação, dever e justeza.
Como porta-vozes destas correntes se apresentam como seus
principais representantes, G. E. Moore (1873 – 1958) com a publicação de
Principia Ethica em 1903, Ayer, Stevenson, Hare, Nowell-Smith e Toulmim.
A partir dessas correntes, que aceitam a linguagem moral como o meio
pelo qual as relações efetivas se manifestam no mundo real, esses filósofos
entendem que o homem deve ser aceito como ser social que assume a
liberdade como algo que deve ser aproveitado juntamente com o outro.
Reduzida a tarefa da ética à análise da linguagem moral, abstrai-se
dela o seu aspecto ideal de juízos e termos morais, evitando-se as grandes
questões morais. Porém, o filósofo contemporâneo, Stevenson vê-se obrigado
a reconhecer que os grandes problemas morais começam onde esta
investigação termina. Defende os direitos essenciais a todos os seres
humanos, como o direito à vida e à educação.
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Ética é postura na ação diante do outro mediante princípios tais como
o respeito à subjetividade, à dignidade da pessoa, à diversidade. Ao longo dos
tempos, pôde-se observar que o prisma ético sofre mudanças de acordo como
essas posturas e posições são colocadas frente ao homem daquele tempo,
daquela sociedade.
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CAPÍTULO II
ÉTICA E CONSTITUIÇÃO
"Fora da Constituição, não há instrumentos nem meio que afiance a
sobrevivência democrática das instituições.” (Paulo Bonavides, jurista)
Os valores éticos numa sociedade correspondem a uma escolha
axiológica do grupo humano que compõe esta comunidade e seu
comportamento.
Superado o legalismo, que caracterizou regimes de exceção como o
fascismo e o nazismo, as constituições dos Estados Democráticos de Direito
trazem – quase que em sua totalidade – normas éticas vistas como primordiais
para a criação e manutenção do próprio Estado e o bem-estar de seus
cidadãos.
A Constituição é a ordem fundamental de um Estado, a expressão de
um povo para organizá-lo jurídico e politicamente.
2.1 – Constituição e Origem.
A evolução do homem sempre esteve associada à sua capacidade de
pensar e perceber; sua inteligência o torna superior aos animais. Não advinha
de sua força ou estatura, mas do seu raciocínio capaz de separar o bem do
mal.
Inicialmente, o homem primitivo vivia da caça, pesca, coleta de frutos e
raízes onde não havia propriedade privada nem acumulação de riquezas. As
atividades e o produto eram repartidos coletivamente.
Com o decorrer dos tempos, houve a complexidade da organização
social e a necessidade de regramento das relações sociais; para tal, inicia-se o
conceito do direito natural como norma constante e invariável garantindo a
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realização do melhor ordenamento da sociedade humana, possibilitando a vida
associada.
Com a positivação do direito, como o conjunto de regras que a maioria
das sociedades humanas reconhece, a despeito de elementos variáveis dos
quais nem todos os grupos sociais reconhecem, surgem as primeiras normas
escritas.
Os primeiros documentos escritos dos diversos povos tais como dos
sumérios, assírios, babilônios, fenícios, egípcios, palestinos, persas, assim
como os de Creta, Esparta, Atenas, Cartago, Roma entre tantos outros.
Paulino Jacques sublinha este aspecto dos primórdios do
constitucionalismo: “Eram mais instituições do que constituições, documentos
escritos, códigos políticos. Não escritos, consuetudinários, e, por ato de
modificação. Não se conheciam, ainda, o ‘poder constituinte’, de onde
emanam as Constituições escritas, mas tão-só o ‘poder legiferante ordinário’.
(JACQUES, 1974 apud PENNA, 2012, p. 156)
Pode-se considerar o Código de Hamurábi como umas das leis
escritas mais antigas do mundo e o mais antigo código penal da história,
baseado em antigas leis sumérias. Este código tinha suas leis sustentadas no
princípio “olho por olho, dente por dente”, conhecido como Lei de Talião.
Mas foram os gregos que vislumbraram primeiramente a importância
do Estado na vida prática de sua sociedade, compreendida na polis, onde
orbitava tanto a vida social como política e religiosa.
Conforme destacou Gruppi:
(...) o Estado é então a expressão da dominação de uma classe, é a
necessidade de regulamentar juridicamente a luta de classes, de manter
determinados equilíbrios entre as classes em conformidade com a correlação
de forças existentes, a fim de que a luta de classes não se torne dilacerante. O
Estado é a expressão da dominação de uma classe, mas também um
23
momento de equilíbrio jurídico e político, um momento de mediação.4 (grifo
nosso)
Assim como os gregos, os romanos estabeleceram o conceito de
Constituição como o centro de concentração de poder do Estado, fazendo
distinção entre a essa Constituição e as disposições legislativas particulares,
referindo-se à Lei Maior como rem publicam constituere. Para garantia de
direitos, assegurando a não intervenção de um indivíduo sobre o direito do
outro foram criadas inúmeras leis com destaque para a Lei das XII Tábuas,
que se baseava num direito costumeiro, do qual era necessária uma lei que
pudesse consolidar e impor as regras desse direito.
Com o passar do tempo, as Constituições Imperiais (constitutiones
principum), leis emanadas pelo príncipe (Imperador) vão obtendo importância
até se chegar à grande codificação de Justiniano (século VI), o Corpus Juris
Civilis que reuni as leis do Codex e as novas leis do próprio Imperador (as
Novellae), que imortalizaram o Direito Romano.
Na Idade Média, o Constitucionalismo passa a ser fortemente
influenciado pela Igreja Romana e pelo poder político do feudalismo, que
enfraqueceu o Estado e monopolizou o poder político.
Na Inglaterra, o rei João Sem Terra travava disputas contra o rei da
França, o Papa Inocêncio III e os nobres ingleses, sendo vencido e obrigado a
assinar em 1215 a Magna Carta, documento pelo qual o monarca se obrigava
a respeitar os direitos dos nobres e da Igreja, evitar os abusos da
administração e da Justiça e não estabelecer impostos sem o prévio
consentimento dos seus vassalos. Pode-se considerar esta a primeira
manifestação constitucional escrita.
Porém, foi a Constituição dos Estados Unidos da América, promulgada
na Convenção da Filadélfia em 1787, considerada a primeira constituição
escrita. Esta constituição conjuntamente com a Constituição Francesa
4 GRUPPI, Luciano. Tudo Começou com Maquiavel. Ed. L&PM, Porto Alegre – RS, 16ª edição: 2001. p. 31, apud PENNA, Maria Cristina V. Martines. Constitucionalismo: Origem e Evolução Histórica – RDBC nº 21 – jan. a jun. 2013. p. 156.
24
elaborada em 1791, logo após a Revolução Francesa vão influenciar
diretamente as constituições brasileiras.
2.2 – Ética e a Carta Magna de 1988.
Pensar ética e valores morais na sociedade brasileira hodierna é
refletir como propor uma nova concepção moral que aplaque a chaga da
corrupção, que a cada dia ganha mais visibilidade, até então desconhecida da
maioria da população. Corrupção esta desprovida de qualquer sensatez, que
se revela nos mais diversos níveis estatais e privados a despeito de discursos
inflamados em prol da ética e da moral, de condutas politicamente corretas e
da defesa dos direitos individuais do homem.
2.2.1 – A Constituição da República e seu significado ético.
A Carta da República de 1988 surge num contexto do retorno do país
aos ideais da democracia garantindo a todos o exercício da cidadania e inicia
uma nova fase onde as preocupações éticas se fazem mais presentes, com a
ordem jurídica constitucional almejando alcançar o máximo do convívio social
pleno de estabilidade e paz, em se tratando de ética ser a ciência da conduta.
Assim, as normas são construídas de forma que surtam efeito prático
no comportamento e na conduta das pessoas, das sociedades, das
organizações, das corporações, das cooperativas, instituições e sindicatos bem
como dos órgãos governamentais.
De forma que, causem efetivas repercussões sobre a consciência e a
moral social, além de que a ética populacional.
Ao consagrar o nascimento do Estado Democrático de Direito, a
Constituição Brasileira de 1988 elege a igualdade e a justiça como valores
éticos a serem perseguidos.
A Constituição Brasileira, como qualquer constituição de um Estado
inicia-se pelo preâmbulo, o qual conforme Kelsen, não seria uma norma no
sentido estrito da palavra; mas como integrante da Constituição, sinaliza um
25
efetivo comando de observância obrigatória para todos os cidadãos da
República, o que passa a constituir uma questão ética.
Mitre afirma que “o preâmbulo é o pórtico da Constituição” e, sem as
portas a entrada não existe: através do preâmbulo a Constituição é
promulgada e passa a ter existência.
A partir do preâmbulo da Carta Magna há elementos que remetem à
valores éticos:
“Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos
em Assembléia Nacional Constituinte para instituir
um Estado Democrático, destinado a assegurar o
exercício dos direitos sociais e individuais, a
liberdade, a segurança, o bem-estar, o
desenvolvimento, a igualdade e a justiça como
valores supremos de uma sociedade fraterna,
pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia
social e comprometida, na ordem interna e
internacional, com a solução pacífica das
controvérsias, promulgamos, sob a proteção de
Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA
FEDERATIVA DO BRASIL.” 5 (grifo nosso)
Como se observa, na introdução da Constituição de 1988,
estabeleceram-se valores mais elevados que uma sociedade que se declara
fraterna, pluralista e sem preconceitos possa ter. Valores esses que
necessitam se firmar em todos os segmentos sociais do país e também,
internacionalmente, perante outros Estados Democráticos de Direito.
Pode-se citar a garantia que o Estado deseja conceder aos seus
cidadãos dos direitos fundamentais sociais e individuais como um dos valores
éticos elencados neste preâmbulo. Há também a necessidade de igualdade e
5 REUTERS, Thomson. Vade Mecum 2013 Universitário RT. Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo – SP, 5ª edição: 2013. p. 15.
26
justiça numa sociedade fraterna e a busca de soluções pacíficas com vistas à
harmonização social de seus habitantes.
Todos os pressupostos éticos presentes no preâmbulo constitucional
vão nortear o sentido desta Constituição chamada de ‘Constituição Cidadã’,
pois que olha para os anseios sociais e se coloca à disposição da cidadania, a
fim de alcançar os fins sociais para qual se dispõe.
2.3.1 – Constituição e alguns de seus preceitos éticos.
O legislador, ao participar da elaboração da Carta Magna, diante das
preocupações – o país saía de um período de ditadura – instituiu em seu bojo
artigos que estão impregnados de uma profunda textura ética.
Analisando alguns desses textos, é possível detectar essas
preocupações éticas impregnadas de valores.
No Título II, dos Direitos e Garantias Fundamentais, há várias
referências com parâmetros valorativos tais como: a vedação à tortura, ao
tratamento desumano e degradante; a indenização por dano moral, inclusive
em violação da intimidade, da vida privada, da honra, da imagem; a proibição
da associação para fins ilícitos; o direito de petição aos Poderes Públicos em
defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder. Trata-se de uma
ética da dignidade do ser humano.
José Afonso da Silva explica que: “direitos fundamentais do homem-
indivíduo são aqueles que reconhecem autonomia aos particulares, garantindo
a iniciativa e independência aos indivíduos diante dos demais membros da
sociedade política e do próprio Estado.” 6 7
A Constituição de 1988 expõe em seu corpo uma orientação ético-
política fundamentada na solidariedade social do qual verifica-se alguns
desses preceitos: a ética da universalidade – de acordo com art. 5º, caput -
6 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. Malheiros Editores Ltda, São Paulo – SP, 23ª edição: 2004. p. 190. 7 A explicação sobre a ética nos arts. 5º, caput até o 232 e incisos da CFRB nas p.p. 26-30 desta monografia são baseadas nos comentários disponíveis em: http://www.esdc.com.br/RBDC/RBDC-08/RBDC-08-125-Eduardo_Bittar.pdf. Acessado em 02/12/2015.
27
que elimina qualquer tentativa de xenofobia em território nacional, tendo em
vista a pluralidade racial e sua origem histórica em que se vive no país e
entende ser necessária a convivência salutar e harmônica entre as mais
diversas etnias nacionais e alienígenas em solo brasileiro.
O art. 5º, inciso I confere a ética da igualdade sem distinção. Aqui
observa-se a ética presente também na mediação a partir desta base
constitucional, onde todos são iguais perante a lei, ou seja, o mediador deve
ser escolhido consensualmente pelas partes, independentemente do sexo dos
indivíduos.
O inciso II do art. 5º da Carta Magna traz a ética da liberdade,
voluntariedade e disponibilidade onde as pessoas não são obrigadas a fazer
algo se assim não quiserem. Privilegia a liberdade de consciência e ação onde
ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude
de lei.
A liberdade aqui não como uma exceção, mas sim como uma regra
que deve ser respeitada e acatada por todos. As exceções serão tratadas em
lei própria.
Há incisos do art. 5º que primam por uma ética do não-abuso de poder,
da não-violência, da preservação de direitos humanos não somente aos
cidadãos livres mais também aos presos e criminosos, tais como: III, XXXIX,
XLII, XLV, XLVI, XLVII e outros.
Quando os incisos IV, VIII, IX, XXVII tratam do livre exercício de
qualquer trabalho, ofício ou profissão atendidas as qualificações específicas
estabelecidas por lei, com vistas à formação de uma consciência livre de
quaisquer barreiras, vínculos ou impedimentos, levando em conta a
necessidade do pluralismo na formação do pensamento e diálogos sociais,
valorizando a proteção dos autores e criadores por meio de leis próprias, há de
se falar em uma ética da liberdade intelectual, promovendo o desenvolvimento
científico, literário, artístico e cultural do país.
Há também a privacidade como a reunião de determinadas
informações que a pessoa humana decide manter em seu sigilo, segurança ou
28
dar a elas publicidade a quem quiser, onde, quando ou em que condições
considerar mais favorável sem que haja lei obrigando-a a fazer isto.
Daí extrai-se a ética da proteção à privacidade da personalidade
humana que se encontra nos incisos V, X e XII, que se expressa pelo direito à
intimidade, à vida privada, à honra e à imagem das pessoas, ou seja, contra o
dano à moralidade, a repressão ao abuso invasivo dos caracteres, da
intimidade da pessoa humana.
A ética da liberdade do pensamento está presente nos incisos IV, VIII,
IX e XXVII, permitindo a formação de mentes ideológicas, científicas, literárias
e artísticas livres de barreiras ou impedimentos, com vistas ao pluralismo de
pensamento e diálogo social, com a proteção – inclusive – do autor e do
criador de suas obras através de leis próprias.
A construção de valores igualitários de forma que um cidadão não
oprima o outro e muito menos o Estado assim o faça, com a oficialização de
um credo religioso em detrimentos dos demais, vedando as suas
manifestações, culto e crença fazem parte da ética da tolerância, seja religiosa,
seja racial contida nos incisos VI e XLI.
Uma ética do trabalho baseada na valorização do trabalhador,
permitindo a todos a livre escolha da profissão, resguardadas as condições
mínimas legais e com foco, principalmente, nas necessidades das famílias
como alimentos e saúde e todos os demais institutos de direitos e deveres
sociais associados ao trabalho é o que almejam os arts. 6º e 7º da Carta da
República.
Em tempos de crise e grassa corrupção no Brasil, o art. 37 caput e
seus incisos revigora a necessidade da ética administrativa, que remete a uma
moral administrativa com atuação dos gestores públicos de forma digna e justa
nas atividades estatais onde a cultura do respeito e observância no cuidado
com o dinheiro público e às necessidades sociais devem ser metas a serem
perseguidas por todos, a fim de que fomente a consciência de um Estado
exemplar que cuida corretamente dos seus cidadãos.
Aliada à necessidade de solidez do Estado no que tange à moralidade,
está presente nos arts. 170, caput até o 181 e 192 a ética da ordem econômica
29
regulando a atividade econômica no país e incentivando o desenvolvimento
dos mais diversos setores produtivos de forma equilibrada e equânime.
Na área científica, a Constituição em seu art. 218 prima por uma ética
que busca a formação de uma mentalidade voltada para a busca do
conhecimento e sua aplicabilidade através da implantação de programas que
auxiliem as pesquisas nos mais diversos setores do conhecimento, visando
alcançar as necessidades das variadas regiões e culturas do espaço brasileiro.
Na área da comunicação, nos arts. 220 e 221 se apresenta a ética da
comunicação social que estimula a criação de órgãos estatais que possam
coibir a formação de monopólios e oligopólios de comunicação, difundir a
cultura, informação e veiculação de notícias e dados, possuindo os meios de
comunicação, liberdade ampla de atuação, vedados os dispositivos legais
éticos e jurídicos.
Há de se falar também na ética ambiental e da preservação do meio
nos incisos e parágrafos do art. 225, que prioriza a utilização dos recursos
naturais do país respeitando os princípios da sustentabilidade, a despeito do
potencial energético e da biodiversidade do país.
Este princípio da sustentabilidade prioriza a proteção dos recursos
hídricos, minerais, biológicos, vegetais etc de maneira racional evitando a
degradação e uso dos mesmos de modo excessivo e desgastante a fim de
preservá-los para as gerações seguintes, tendo em vista serem estes, finitos.
No contexto social, a Lei Magna observa a ética familiar no art. 226,
incisos e parágrafos com o objetivo de preservar e fortalecer a célula mater da
sociedade, a família como elemento nuclear de formação social e por onde se
inicia a construção de uma sociedade de valores sólidos e justos.
E os arts. 227, 228 e 229 integram uma ética voltada para a criança, o
adolescente e o jovem através da proteção legal de suas necessidades, do
cuidado de suas privações, imbuindo a família à responsabilidade de
proporcionar um ambiente adequado dentro do lar e fora dele, de maneira que
a criança, adolescente ou jovem possam se desenvolver de forma saudável e
digna, proibida a discriminação entre filhos nascidos dentro do casamento ou
30
fora dele e a presença ativa do Estado na proteção infantil contra o abuso, a
violência familiar e o trabalho precoce.
Preocupado ainda com os anseios sociais, o Diploma Legal Brasileiro
em seu art. 230 se nos apresenta com uma ética de amparo e suporte ao
idoso na direção de valorização e dignificação da vida humana, promovendo
sua longevidade; tarefa essa, onde a família e o Estado tem papel
preponderante, permitindo que independentemente de ter uma vida produtiva
ou não do ponto de vista laboral, o idoso tenha qualidade de vida.
Nos art. 231 e 232 trata da ética não discriminatória de outras raças,
culturas e etnias, com vistas à desconstrução da idéia de uma única civilização
hegemônica em território brasileiro instituída pela história e tradição; garantindo
aos povos indígenas tratamento adequado e proteção exclusiva e adaptada às
suas necessidades, com enfoque contra a exploração de seu habitat, a
deterioração dos costumes, invasão de suas terras e degradação de seu meio
ambiente, fator de sobrevivência para esses povos.
Desde os primórdios da civilização, as sociedades perceberam a
necessidade de valores éticos a fim de possibilitar a convivência mais
harmoniosa possível em comunidade. Daí, surgiram as primeiras leis, os
primeiros códigos escritos que culminaram com a primeira Magna Carta
assinada pelo rei João Sem Terra em 1215, na Inglaterra medieval.
A partir daí, outras constituições foram surgindo e, no Brasil, a
Constituição de 1988 foi um marco na tarefa de redemocratização do país.
Trouxe com ela, a tarefa de inserir valores éticos que vão influenciar todo o
convívio moral e valorativo da sociedade brasileira, no que tange inclusive, ao
acesso à resolução de conflitos através dos mais diversos canais de
negociação, como a mediação. Ética esta que está presente tanto nas relações
interpessoais como intergrupos, ou seja, a própria mediação, a partir do
embasamento constitucional, constitui um meio não adversarial onde os
valores éticos deverão ser não somente aportados e reconhecidos, mas
colocados em prática.
A Lei Máxima Brasileira teve esta preocupação. Mas para que haja
efetividade na aplicação, às vezes difícil, da legislação pátria; há de se falar
31
numa ética do envolvimento de todos e cada um, solidariamente, não somente
de nossos gestores públicos.
Karl-Otto Apel propõe uma ética da responsabilidade dos seres
humanos onde a partir de uma comunidade real, se estabelece uma
comunidade ideal de comunicação, dado que “por primeira vez na história da
humanidade, a conservação da existência vem a ser um problema que
interessa à espécie humana como um todo e deve ser solucionado por ela
como um todo”.8
8 APEL, Karl-Otto. Estudos de Moral Moderna. Ed. Vozes - 1994. p. 163 e segs., apud GARCIA, Maria. A Constituição como Substrato Político e Ético da Comunidade – RDBC nº 09 – jan. / jun. 2007. p. 64.
32
CAPÍTULO III
ÉTICA E MEDIAÇÃO
"A não-violência leva-nos aos mais altos conceitos de ética, o objetivo de toda
evolução. Até pararmos de prejudicar todos os outros seres do planeta, nós
continuaremos selvagens.” (Thomas Edison, cientista)
3.1 – Ponderações sobre a Ética e a Mediação.
O cenário da pós-modernidade vivencia conflitos diversos entre os
indivíduos como resultado, dentre outros fatores, da crescente complexidade
da vida social.
Não que antes deste atual estado de coisas, já não houvessem
conflitos. O conflito é intrínseco ao ser humano desde seus primórdios.
A diferença agora é que esses se acentuam e a moral valorativa
tradicional de conteúdo hierárquico se esmaece e, em seu lugar surgem
sistemas sociais que se operacionalizam conforme seus próprios códigos e
critérios, influenciados pelo ambiente em que se formam.
Porém, valores admitidos ao longo dos séculos se tornam recorrentes e
necessários – como a solidariedade e a lealdade – e, agora mais do que isto,
adquirem certa universalidade, ainda que seu conteúdo se enriqueça e alargue
o entendimento da sociedade, deixando de pertencer a um tipo de moral em
particular.
Segundo Eduardo Bittar:
“Uma solução ética pressupõe que a
decisão se origine das próprias partes
envolvidas, o que se alcança com consenso e
sensatez, dispensando-se a autoridade, o
custo, o prejuízo e a demora, extraindo-se de
33
forma pacífica entre as partes, pela real
disposição de, por meios informais alcançar a
plenitude do meio termo necessário para a
solução de controvérsia.” 9
Neste contexto, a ética na mediação perpassa pelos códigos, pelas
normas, legislação vigente e vai mais adiante. Olha para os parâmetros
comportamentais de mediadores, das partes, advogados e instituições
envolvidas. Tem a Lei Magna como bússola, mas busca ir um pouco mais além
das palavras, da pura letra, fria e sem sentimentos ou afeto.
3.2 – Mediação.
3.2.1 – Conceitos.
A palavra “mediação” vem do latim mediare, que significa intervir,
mediar, dividir ao meio. A mediação é um meio de solução de conflitos onde
duas ou mais pessoas, com a participação de um terceiro neutro, o mediador,
negociam a fim de chegar a um entendimento comum que seja o melhor para
ambos os mediandos.
O Manual de Mediação Judicial do Ministério da Justiça define
mediação como sendo:
“...um processo autocompositivo
segundo o qual as partes em disputa são
auxiliadas por uma terceira parte, neutra ao
conflito, ou um painel de pessoas sem
interesse na causa, para auxiliá-las a chegar a
uma composição. Trata-se de uma negociação
assistida ou facilitada por um ou mais terceiros
na qual se desenvolve processo composto por
vários atos procedimentais pelos quais o(s)
terceiro(s) imparcial(is) facilita(m) a negociação
9 BITTAR, Eduardo C. Bianca. Curso de Ética Jurídica. São Paulo: Saraiva. 2002, p. 38.
34
entre pessoas em conflito, habilitando-as a
melhor compreender suas posições e a
encontrar soluções que se compatibilizam aos
seus interesses e necessidades.” 10
Christopher Moore define a mediação com a seguinte citação:
“A mediação é um prolongamento ou
aperfeiçoamento do processo de negociação
que envolve a interferência de uma aceitável
terceira parte, que tem um poder de tomada de
decisão limitado ou não-autoritário. Essa
pessoa ajuda as partes principais a chegarem
de forma voluntária a um acordo mutuamente
aceitável das questões em disputa. Da mesma
forma que ocorre com a negociação, a
mediação deixa que as pessoas envolvidas no
conflito tomem as decisões. A mediação é um
processo voluntário em que os participantes
devem estar dispostos a aceitar ajuda do
interventor se sua função for ajudá-los a lidar
com suas diferenças – ou resolvê-las. A
mediação é, em geral, iniciada quando as
partes não mais acreditam que elas possam
lidar com o conflito por si próprias e quando o
único meio de resolução parece envolver a
ajuda imparcial de uma terceira pessoa.” 11
Já para João Roberto da Silva, a mediação pode ser considerada
como: “a técnica de resolução de conflitos não adversarial, que, sem
imposições de sentenças ou laudos, e com um profissional devidamente
10 AZEVEDO, André Gomma (org.). 2013. Manual de Mediação Judicial (Brasília/DF: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD) – 4ª edição, 2103 – p. 85. 11 MOORE, Christopher. O processo de mediação. 2ª ed. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1998, p. 34.
35
preparado, auxilia as partes a acharem seus verdadeiros interesses e a
preservá-los num acordo criativo onde as duas partes ganhem.” 12
A mediação é um meio geralmente não hierarquizado de solução de
disputas em que duas ou mais pessoas, com a colaboração de um terceiro – o
mediador – que deve ser apto, imparcial, independente e livremente escolhido
ou aceito, expõem o problema, são escutadas e questionadas, dialogam de
forma construtiva e procuram identificar os interesses comuns, opções e,
eventualmente, firmar um acordo.
A mediação, como uma RAD – Resolução Alternativa de Disputa, é
método em virtude de se basear num complexo interdisciplinar de
conhecimentos científicos extraídos especialmente da comunicação, da
psicologia, da sociologia, da antropologia, do direito e da teoria dos sistemas.
Além de ser também uma arte, visto que um mediador capacitado deve possuir
habilidades e sensibilidades inerentes ao seu trabalho.
3.2.2 – Fundamentos Jurídicos da Mediação.
A mediação de conflitos não ocorre à margem dos princípios jurídicos.
Os valores jurídicos que se consubstanciam a mediação são os que tratam dos
Direitos Humanos, que considerados fundamentais, constitucionais e
internacionais, é requisito à formação dos mediadores.
3.2.2.1 – Na Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU
– 1948).
Como conseqüência das duas grandes guerras mundiais, foi criada em
1948 a Organização das Nações Unidas (ONU) com a incumbência de evitar a
guerra e promover a paz entre as nações. Para tal, foi considerado que a
12 SILVA, João Roberto. A mediação e o processo de mediação. São Paulo: Paulistanajur, 2004, p. 13.
36
promoção dos direitos humanos seria condição sine qua non para a
manutenção da paz nas sociedades.
Diante disso, a Assembléia Geral das Nações Unidas teve como um dos
primeiros atos, a proclamação de uma Declaração Universal dos Direitos
Humanos em 1948, cujo primeiro artigo dispõe o seguinte:
“Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”.
Observa-se que as três palavras de ordem da Revolução Francesa
estão a postos neste artigo, reafirmando os direitos de liberdade ou civis e
políticos. Sem querer trazer uma idéia ingênua da necessidade de respeito aos
direitos humanos, que em verdade, na maioria das vezes em muitos países
não são observados, o que a Declaração agora exige é que não haja mais
pessoas escravizadas, mulheres violentadas, xenofobias e infanticídio, por
exemplo, dentre tantas outras mazelas.
A partir da declaração, através de conferências, pactos, acordos,
protocolos internacionais, outros direitos foram se universalizando, se juntando
aos direitos de primeira geração (liberdade, civis e políticos). Os direitos de
igualdade, sociais e econômicos (de segunda geração); os direitos ecológicos,
que dizem respeito aos povos, às culturas e à própria natureza (de terceira
geração). E mais recentemente, abrem-se perspectivas para os direitos das
gerações futuras (de quarta geração).
NORBERTO BOBBIO se referia aos direitos de segunda e terceira
geração, não como exatamente “direitos”, mas como “exigências morais”, pois
que não há coação para fazê-los respeitar.
Desses direitos, os direitos sociais de igualdade, ainda que ocorram
depois dos direitos individuais de liberdade, são prioritários porque sem estes,
aqueles não alcançam sua concretude. Na verdade tem-se uma relação de
complementaridade entre eles, visto que, a igualdade supõe poder regulatório
e liberdade implica força emancipatória.
Nessa igualdade, pode-se exemplificar a desigualdade de renda, como
um dos fortes fatores conexos à insegurança, segundo Ad Melkert, que foi
37
administrador-adjunto do Programa das Nações Unidas Para o
Desenvolvimento (PNUD):
“Se observarmos as sociedades em que há uma distribuição mais
equitativa dos recursos e da renda, elas são mais pacíficas e mais bem
organizadas.” 13
Em ocorrendo essa distribuição mais igualitária, haverá mais segurança,
renda, a sociedade ficará mais organizada e a corrupção descerá a níveis
nunca antes experimentados em toda história humana. Para tal há de se criar
condições, o Estado deve adotar políticas adequadas com maior investimento
no desenvolvimento humano (educação, saneamento, saúde e serviços), criar
condições para que esses investimentos se originem não somente dos cofres
públicos, mas também a participação da iniciativa privada.
Essas são metas já estabelecidas pelo compromisso que países
assumiram com os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), que
compõe uma série de metas a serem atingidas.
Assim, percebe-se a importância fundamental para a mediação,
formação dos mediadores e facilitadores da mediação conhecer esses direitos
humanos, dos quais vão influenciar diretamente no comportamento da
sociedade diante da mediação como alternativa à resolução de disputas e nos
relacionamentos sociais entre si.
3.2.2.2 – Na Constituição da República Federativa do Brasil de
1988.
Já se viu que não pode conceber o bem-estar da cidadania e a das
relações entre os homens se não existir o estado de paz. E paz não há onde
houver conflitos judiciais. Observa-se, então que, a finalidade do Estado
Democrático de Direito está intimamente correlacionada à instituição do estado
de paz.
13 Disponível em: http://www.pnud.org.br/Noticia.aspx?id=1340 – Acessado em 09/02/2016.
38
A Constituição representa nada a mais, nada a menos, que a vontade
social.
A mensagem contida na Carta Magna, denominada “guia de orientação
máxima”,14 que é o preâmbulo, prevê a solução de conflitos de forma pacífica,
ou seja, não se concede ao Judiciário única forma de resolução de litígios.15
Esse é um dos caminhos.
Esses fundamentos essenciais e institucionais da CRFB/88 que adota,
dentre outros compromissos, o do Estado de solucionar pacificamente os
litígios seja de qualquer origem, corroboram para a natureza constitucional
válida, eficaz e eficiente à existência da mediação, como umas das formas
alternativas de solução de conflitos.
A mediação encontra-se cabalmente respaldada no Texto Magno pelo
princípio do acesso à justiça (art. 5º, XXXV da CRFB/88). Há um juízo
compatível positivo de constitucionalidade no instituto da mediação inserido na
Constituição da República Federativa do Brasil.
Esta RAD vem atender sob diversos aspectos o já citado preceito de
acesso à justiça à medida que preconiza por um método que lhe é privativo,
com vistas a solucionar conflitos, com adaptabilidade notória ao caso concreto,
que possui várias especificidades.
Por outro lado, a mediação também se coaduna com o princípio
democrático, tema basilar da Constituição em ordenamento pátrio e outros
Estados Soberanos, a partir do momento em que facilita aos cidadãos uma
maior e efetiva participação na árdua tarefa de resolução de contendas dentro
de um contexto das liberdades, com autonomia de suas vontades, na busca
por diferentes formas de distribuição de justiça, respeitando os princípios e
garantias fundamentais.
Diante disso, a afirmação do Poder Constituinte contida no preâmbulo
constitucional, compromete toda sociedade brasileira no Brasil e em âmbito
internacional com a solução pacífica de litígios e tendo a mediação como uma
dessas formas de solução pacífica de contendas.
14 DELGADO, José et al. – Mediação: um projeto inovador. Brasília: CEJ – CJF, 2003. p. 17. 15 Para tanto, vide capítulo II, 2.2.1, pp. 25-26 desta monografia.
39
Assim, pode-se dizer, que o instituto da mediação está expressamente
amparado pelo nosso ordenamento jurídico, na figura da Constituição Federal
da República do Brasil.
3.3 – Ética na Mediação.
A mediação e a ética estão intimamente atreladas. A ética é a
expressão unânime do certo, em certo sentido, do bom ou ruim. Estuda o
comportamento humano e tenta buscar uma padronização dessas condutas
com fins de minimizar os conflitos sociais.
A mediação, por sua vez, possui princípios éticos, que de acordo com
Carlos Eduardo de Vasconcelos:
“são normas objetivas e fundamentais,
relacionadas às virtudes subjetivas. São,
portanto, normas fundamentais de conteúdo
axiológico, cujo sentido é dado pelos valores
éticos. Referem-se, em última analise, à
dignidade da pessoa humana, reconhecida
como postulado supremo da vida social, com
seus atributos de honestidade (veracidade) e
altruísmo (amor). 16
Preceitos pelos quais os homens são desafiados a assumir
coletivamente a ética da responsabilidade social e devem se unir para o bem
comum, além de serem responsáveis pelas previsíveis conseqüências de seus
atos.
Desta feita, a ética profissional, o conjunto de normas, a participação
profícua do mediador ético, inclusive no exercício regular da profissão e com
preparo adequado para desempenhá-la, a colaboração dos mediandos e seus
advogados também de forma ética conjuntamente com a da instituição onde
16 VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. Mediação de Conflitos e Práticas Restaurativas – Ed. Método: São Paulo, 2008 – p. 105. O autor expõe como princípios éticos fundamentais, os princípios da igualdade de oportunidades, da existência digna (ou solidariedade), da igual liberdade e da estabilidade consensual (democrática).
40
funciona o processo não-adversarial são fatores imprescindíveis para que haja
uma mediação norteada pela ética, de forma que haja um resultado benéfico a
todos.
3.3.1 – Mediador e Ética.
Sabe-se que qualquer pessoa pode exercer a função de mediador.
Porém, a mediação assim como os demais métodos de resolução de conflitos,
necessita para o melhor desempenho que, o mediador seja capacitado para o
exercício da função com conhecimentos da técnica, dos métodos e dos
princípios éticos que norteiam a mediação. Isso agrega credibilidade e respeito
pelo processo, seus profissionais, os mediadores e, as instituições que
acolhem e incentivam a mediação de conflitos em seus espaços.
E, devido à seriedade e rigor científico que possui a mediação, o
parâmetro comportamental dos profissionais que atuam na mediação, como os
mediadores, deve refletir o propósito de estimular as partes a participar de
forma harmônica e pacífica do procedimento na busca da resolução de seus
conflitos.
Os princípios éticos específicos aplicados à mediação de conflitos
considerados fundamentais à atuação dos profissionais na resolução de
disputas e das instituições envolvidas são embasados no Código de Ética para
mediadores do Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem
– CONIMA, na Lei de Mediação nº 13.140/2015 e no Código de Ética para
Instituições de Mediação e Arbitragem também do CONIMA.
Em relação aos mediadores o Código de Ética17 preconiza os seguintes
princípios a serem adotados pelos mediadores:
a) Autonomia da vontade das partes: o mediador deve respeitar a vontade
das partes em participar do processo de resolução de conflitos ou, se
preferirem não aderirem. Aqui há o princípio ético constitucional previsto
no art. 5º, caput que reza: “...Todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
17 Disponível em: http://www.conima.org.br/codigo_etica_med. Acessado em 07/11/2015.
41
liberdade...”,18 ou seja, não há de se permitir que haja uma mediação
feita mediante coação. Presente está o livre-arbítrio. É a vontade
exclusiva do indivíduo em negociar ou não negociar.
b) Independência: o mediador não deve ser parente, dependente,
empregador, prestador, tomador de serviços ou amigo intimo de algum
dos mediandos. Ou seja, não há de que se tenha algum tipo de
afinidade entre o facilitador e os mediandos.
c) Imparcialidade: o profissional da mediação deve procurar compreender
a realidade dos mediandos, sem que nenhum preconceito ou valores
pessoais possam interferir no seu trabalho. Deve tratar seus assistidos
com isenção e nenhum conflito de interesses ou relacionamento pode
afetar sua imparcialidade. Este item tem aporte nos preceitos éticos da
Lei Maior que prevê no art. 5º, LIV: “ninguém será privado da liberdade
ou de seus bens sem o devido processo legal.” O mediador não pode
apreciar provas nem fazer juízo de valor sobre o caso, a fim de não
prejudicar sua necessária isenção.
d) Credibilidade: o mediador deve ser um profissional de total confiança,
idôneo, franco e coerente. Honestidade e altruísmo também fazem parte
deste item, o que facilitará o rapport19 entre ele e seus mediados.
e) Aptidão: o facilitador deve ter a capacitação, a competência necessária
para atuar no conflito. As improvisações não podem ocorrer, a fim de
satisfazer as expectativas dos mediados.
f) Confidencialidade: todos os envolvidos na mediação se obrigam a
guardar sigilo a respeito do conteúdo. O Texto Máximo da República
18 REUTERS, Thomson. Op. Cit. p. 16. 19Rapport: Relacionamento harmonioso ou estado de compreensão recíproca no qual por simpatia, empatia ou outros fatores se gera confiança e comprometimento recíproco, in AZEVEDO, André Gomma. Op. Cit. p. 128.
42
preconiza em seu inciso X do art. 5º que “são invioláveis a intimidade, a
vida privada...”, ou seja, pode-se considerar a intimidade como sinônimo
de privacidade, o que obriga a este segredo profisssional, desde que
não contrarie a ordem pública20; fato pelo qual a confidencialidade é
imediatamente rompida e a mediação encerrada.
g) Diligência: o mediador deve ter o cuidado e dedicação na realização de
suas tarefas. Deve nortear o processo com zelo, regularidade e
paciência. Deixar que a mediação transcorra com plena oportunidade
para os mediados vislumbrarem um entendimento. Imagine um
mediador que constantemente chega atrasado para iniciar uma sessão
de mediação. Isso pode comprometer todo um trabalho para se chegar
a um acordo pleno por parte dos mediandos, pois pode afetar o rapport
entre o mediador e os mediandos.
Além desses princípios éticos, outros da mesma natureza devem ser
observados. O profissional da mediação deve ter um perfil cooperativo,
avaliando a aplicabilidade da mediação ou não ao caso concreto. Esclarecer,
sempre que necessário, quanto aos seus honorários e forma de pagamento.
Abster-se de promessas e garantias a respeito do resultado, sempre tendo em
mente que ele é um facilitador. Quem deve chegar a uma solução
compartilhada são os mediados.
O mediador, ao perceber que é preciso realizar um caucus (sessão
privada), deve dialogar separadamente somente quando for dado o
conhecimento e igual oportunidade à outra, esclarecendo ao final quais os
pontos que podem ser do conhecimento do outro mediado e os que devem
ficar sob sigilo.
Permitir que ambos mediados tenham informações suficientes para
avaliar e tomar suas decisões sobre o caso e, eximir-se de forçar um acordo
entre os mediados ou tomar decisões por eles próprios.
20 Vide Lei 13.140/2016 art. 30, caput, §§ e seus incisos e art. 31 da referida Lei.
43
No inicio do processo de mediação, o mediador deve descrever como
ocorrerá o processo, definindo com os mediandos todos os procedimentos
pertinentes para alcance de uma solução.
Deve esclarecer quanto ao sigilo e utilizar as técnicas que se aplicam ao
caso de forma que assegure qualidade e transparência, levando a bom termo
os objetivos da mediação.
Se o caso pedir, sugerir a busca de especialistas na medida em que
suas presenças esclareçam pontos específicos e preservem a equanimidade
entre os mediados.
Em relação à instituição onde ocorre o processo de mediação, o
mediador deve colaborar para que o serviço prestado nesses espaços tenham
qualidade com aprimoramento e especialização pessoal assim exigidos pela
entidade. Aqui também salienta-se a importância de respeitar as normas
institucionais e éticas da profissão, submetendo-se ao Código de Ética da
instituição onde atua.
3.3.2 – Advogado e Ética.
O advogado representa um importante papel em uma mesa de
mediação. Ele pode ser um grande aliado do mediador na busca de soluções
que atendam seu cliente esclarecendo quais são os direitos seus direitos e
auxiliar tanto seu representado quanto o mediador na busca por soluções
criativas que atendam aos interesses de todos.
Para tal, é imprescindível que o operador do direito haja com ética no
exercício de sua profissão. Os padrões de conduta ética do advogado são
pautados no Estatuto da Advocacia e Ordem dos Advogados – Lei 8.906/94 c/c
a Resolução 02/2015 (Código de Ética da OAB) do Conselho Federal da
Ordem dos Advogados do Brasil. 21
O advogado possui o dever ético, pois nesta qualidade, ele é um
funcionário do sistema jurídico que tem responsabilidade especial pela
21 Disponível em: http://www.oab.org.br/Content/pdf/LegislacaoOab/Lei-8906-94-site.pdf. E em : http://www.oab.org.br/visualizador/19/codigo-de-etica-e-disciplina. Acessado em 05/12/2015.
44
qualidade da justiça e deve zelar para atender as expectativas da sociedade e
dos tribunais onde quer que exerça sua atividade.
Ele tem o dever ético na mediação de informar ao cliente sobre as
questões acerca do processo de mediação em andamento. Aconselhá-lo na
negociação com veracidade, confidencialidade e boa-fé explicando ao cliente
de maneira que permita ao mesmo a tomada de decisões que possam auxiliá-
lo a chegar a um bom acordo.
Reza o art. 20 do Código de Ética da OAB:
“O advogado deve abster-se de patrocinar
causa contrária à ética, à moral ou à validade de
ato jurídico em que tenha colaborado, orientado ou
conhecido em consulta; da mesma forma, deve
declinar seu impedimento ético quando tenha sido
convidado pela outra parte, se esta lhe houver
revelado segredos ou obtido seu parecer”.
A boa-fé do advogado implica que o advogado exerça sua profissão com
independência em nome de seu cliente e defenda os interesses e as posições
do mediado, até o limite em que essas posições possam ser sustentadas de
forma que ele tenha convicção de estar agindo de acordo com a lei.
O operador do direito deve ter sigilo profissional, que é inerente à sua
profissão – assim como ocorre com os mediadores. O advogado deve guardar
as confidências de seu assistido, que somente poderão ser reveladas pelo
advogado diante de grave ameaça ao direito à vida, à honra, ou quando o
advogado for afrontado pelo próprio cliente; desde que nos limites da
necessidade de sua defesa. 22
Óbvio dizer que, o advogado deve honrar as solicitações de seu cliente
de não revelar informações específicas ao mediador, as quais ele não deseja
que sejam ditas.
22 Ver arts. 25-27 do Código de Ética da OAB c/c arts. 7º, II e XIX, 34, VII e 72, § 2º do Estatuto da Advocacia e da OAB.
45
No preparo de um possível acordo, o advogado não pode redigir um
acordo que lhe permita locupletar-se com bens ou a alguém do parentesco do
mediado, salvo anuência do mediado e dentro dos parâmetros legais.
Nem é permitido à este profissional do direito fazer ou negociar um
acordo que lhe conceda direitos autorais ou publicidade na imprensa sobre
informações ligadas ao mediado.
É também defeso ao advogado participar da elaboração de um acordo
que restrinja seus direitos na prática da advocacia após o término da relação
profissional com seu cliente, o mediado.
3.3.3 – Instituições e Ética.
As instituições são criadas para organizar e gerenciar as atividades
humanas num espaço com maior grau de complexidade, em torno de um
interesse socialmente reconhecido.
A mediação ocorre nesses espaços que como tal, necessitam de
normas éticas que possam contribuir para o bom desenvolvimento negocial em
torno da resolução de conflitos.
O CONIMA 23 possui Código de Ética para Instituições de Mediação e
Arbitragem 24 que passou a vigorar a partir de 02/01/2011.
Em seu texto há uma série de normas que deverão ser observadas
pelas instituições com vistas a seu desenvolvimento e atendimento às
demandas sociais, como no caso da mediação.
A instituição deve reconhecer a importância da autonomia da vontade
dos mediados na prática da negociação de conflitos. Os mediandos tem a
liberadade em escolher a forma como irão transacionar seu patrimônio, se
através da mediação ou outro tipo de resolução de conflitos, inclusive com a
escolha da instituição que irá acompanhar o procedimento.
23 Vide página 40 desta monografia. 24 Disponível em: http://www.conima.org.br/docs/cod_etica_inst_med_arb_conima.pdf. Acessado em 07/11/2015.
46
Esse princípio – da autonomia das partes – não deve ser relegado em
momento algum pela instituição no desempenho de suas funções.
Assim como os mediadores, a instituição deverá proceder com
imparcialidade, independência, competência, diligencia e confidencialidade
bem como zelar pelos princípios fundamentais do processo de mediação.
Escolher a instituição para os mediandos perpassa pela confiança nela
depositada por eles, desde o início, com a indicação de determinada instituição
onde ocorrerá a mediação, até o seu término.
Segundo o Código de Ética Para Instituições de Mediação do CONIMA:
“Essa confiança é imanente à sua
conduta quanto ao desenrolar de todo o
procedimento, motivo pelo qual a instituição
deverá sempre ser imparcial, no sentido de
evitar qualquer privilégio a uma das partes
em detrimento da outra; independente,
entendendo-se não estar vinculada a
qualquer das partes envolvidas na
controvérsia; competente, no sentido de
conhecer profundamente os parâmetros
ditados pelas partes e pelo seu próprio
regulamento para a organização e a
administração do procedimento; e diligente,
pressupondo-se que não poupará esforços
para proceder da melhor maneira possível
quanto à execução das suas funções.” 25
A Instituição de Mediação e Arbitragem estará sempre disponível a
prestar esclarecimentos a quem quer que seja acerca dos métodos e formas
de mediação ou arbitragem, assumidos por ela através de convenção, cláusula
ou compromisso de mediação. Deve cumprir seu papel de tal maneira, que não
paire dúvidas a respeito de sua indicação. Para tal, deverá executar seu
25 Vide nota nº 24 à p. 45.
47
objetivo com qualificação e disponibilidade de tempo para atender às
exigências dos mediandos.
Em relação aos interessados na mediação, a instituição terá que revelar-
lhes, sempre que necessário, interesse ou relacionamento de qualquer
natureza (negocial, profissional ou social) que possa ter ou que tenha tido com
qualquer um dos mediados, de forma institucional ou através de seus
funcionários e colaboradores que possa afetar a sua imparcialidade e sua
independência ou comprometer sua imagem decorrente disto.
Não se admite que a instituição, que aceitou o encargo e a indicação
para sediar a mediação, renunciar a ele, pois subentende-se que ela já avaliou
a dimensão dos serviços a serem prestados. Sua renúncia poderá trazer
prejuízos aos mediados, pois implicará em interrupção de uma mediação em
andamento e início de novo procedimento em uma outra instituição indicada. O
que traz desgaste e desconforto a todos os envolvidos, a despeito das
emoções e comportamentos peculiares da mediação que estão envolvidos
neste processo.
Diante dos mediados, seus representantes e advogados, a instituição
credenciada para realização das mediações em seu espaço terá que ter
prudência e veracidade a respeito dos resultados das mediações, abstendo-se
de promessas e garantias. Evitar evocar a idéia de que os resultados são
sempre com acordo pleno e os mediandos sempre saem satisfeitos, com vistas
à proveitos e propaganda pessoal. Isso implica em não se comportar de forma
que permeie dúvidas acerca de sua conduta ou aparência parecerem
duvidosas.
Seu relacionamento com os envolvidos na mediação não deve gerar
nenhum vestígio de dúvida com relação à sua imparcialidade e independência.
No que tange ao procedimento da mediação, deve zelar para que os
princípios não somente éticos, mas de uma forma geral, sejam preservados ao
longo de todo processo perante os mediandos, seus representantes e
advogados. Isso envolve seu comportamento perante os profissionais e os
mediandos, que será probo e urbano, dentro e fora do processo.
48
Em seu trabalho, a instituição deverá garantir que todos os envolvidos
na mediação acesso às informações necessárias para o acompanhamento e
compreensão do processo de mediação, garantindo tratamento igualitário e
respeitoso aos profissionais e mediados envolvidos na mediação.
Frente aos mediadores, a instituição precisa zelar para que não violem o
Código de Ética dos Mediadores, inclusive com relação ao atendimento pleno
do processo e observação do regulamento. Para tal, se houver prerrogativa da
instituição na escolha de mediadores, buscar o melhor perfil de acordo com o
caso concreto, é a melhor opção.
Exigir dos mediadores que garantam sua independência, imparcialidade
e disponibilidade na condução do processo bem como que executem seu
trabalho com competência, discrição e diligência, de tal maneira que alcance
as expectativas dos mediandos.
Em relação ao processo, a instituição tem o dever de manter a
integridade do mesmo, administrando e organizando o procedimento com
esmero. Guardar sigilo sobre os fatos expostos durante a sessão de mediação
durante e depois de finalizado o caso. Isso fará com que os mediandos se
sintam amparados e tenham a expectativa de que o processo de mediação
ocorrerá dentro dos padrões normais esperados.
Essa postura institucional é importante, pois se traduz numa conduta
inatacável, no sentido de que esta organização não será alvo de críticas ou
controvérsias futuras por parte dos mediados, advogados, representantes,
mediadores ou outras pessoas eventualmente interessadas num determinado
caso concreto. Daí a importância de manter a integridade da administração do
procedimento, com extrema retidão em todas as suas ações e atitudes.
A instituição deve ter consciência de que a sua contribuição é realizar
atos administrativos que possam refletir no bom andamento das sessões de
mediação, respeitada a missão de cada profissional atuante neste meio.
Outro aspecto ético das instituições onde há mediações é na relação
entre ela e outras instituições administradoras de procedimentos de mediação.
A instituição nunca deve se manifestar de forma depreciativa em relação
a outra instituição, com intuito de angariar vantagens próprias com esta atitude.
49
Pelo contrário, deve promover o clima de cooperação entre as diversas
instituições que trabalham com a matéria, objetivando troca de conhecimentos
e intercâmbios, no almejo do bom andamento dos processos de mediação e
sucesso de todos.
Se identificado comportamentos antiéticos, deverá a instituição
comunicá-los ao órgão fiscalizador dessas instituições – no Brasil, entre tantos,
há o CONIMA, para que seja instaurado o respectivo procedimento disciplinar,
com intuito de se apurar os fatos alegados e se tomar as providências cabíveis,
coibindo desta feita, posturas incompatíveis com as instituições que tratam
sobre a mediação. Assim, haverá oportunidades para os profissionais éticos e
a mediação será cada vez mais fortalecida e corretamente divulgada no
espaço brasileiro.
Há também de se falar na instituição ética frente à sociedade onde atua.
Ela deve promover a divulgação de seus serviços de mediação e outros afins
que assim houver, evitando depreciar ou confrontar com outros métodos de
resolução de conflitos, como os meios utilizados pelo Poder Judiciário,
abstendo-se de utilizar em sua denominação e identificação de seus serviços e
profissionais, expressões e símbolos que façam qualquer associação com este
Poder ou outros órgãos estatais dedicados à resolução de controvérsias.
Tal comprometimento é importante, pois evita a indução dos usuários de
seus serviços a erro em relação à natureza privada ou não de sua atividade,
quando forem mediações efetuadas fora do âmbito dos tribunais brasileiros.
50
CONCLUSÃO
Com os sofistas, a ética se debruça sobre o relativismo ou subjetivismo
que Protágoras expressa com a máxima: “O homem é a medida de todas as
coisas”; da qual Sócrates critica afirmando que há um saber válido e universal
intrínseco da própria humanidade que possibilita a fundamentação de uma
moral também universal.
Platão e Aristóteles desenvolveram o racionalismo ético de Sócrates.
Em ambos a ética está associada a polis, inclusive Aristóteles se refere à ética
como sendo ramo da política. Já, Platão desenvolve a questão ética do corpo e
da alma onde o corpo, por suas paixões e desejos, não permite ao homem a
sua purificação e a encontrar o caminho do Bem. Esta idéia do Bem concede a
Platão ser chamado o pai da ética, apesar de haverem autores que
questionam tal título. E Sócrates pode ser considerado o pai da moral, por
trazer a noção da razão onde se fundamentam as normas e costumes morais.
Os estóicos e epicuristas buscaram uma ética pautada na paz interna do
indivíduo e no autocontrole pessoal da pessoa humana. A felicidade está
contida na condição íntima de cada um.
Os filósofos cristãos herdaram alguns dos conceitos dos antigos
filósofos em seus escritos, adaptando-os à uma nova roupagem, que
atendesse aos anseios da nova religião tais como: a purificação da alma
iniciada por Platão e retomada por Agostinho de Hipona na idéia de elevação
para compreender a vontade de Deus e a imortalidade, como um aspecto do
reino de Deus onde reina a eternidade.
Tomás de Aquino retoma a noção de felicidade da ética aristotélica, do
qual Deus é esta fonte. A idéia da razão foi substituída pela noção de amor e
boa vontade para com todos, inclusive a si mesmo.
Com o Iluminismo, surge Kant com sua ética formal onde os seres
humanos devem ser vistos como fins e não meios para o alcance de
determinados interesses. Já Marx critica a ética burguesa e a afirma em outros
patamares qualitativos, ao invés de negá-la totalmente. Freud também
51
colaborou com o tema, ao relacioná-lo a tabus sociais como o desejo, o
inconsciente e a sexualidade e o complexo de Édipo.
A ética tão decantada pelos filósofos da antiguidade hoje é vista como
algo sujeito a mutações tão imprevisíveis. Seu conceito varia historicamente.
Em eras remotas, a lei ainda não era escrita; havia a oralidade na
passagem dos valores incutidos naquela comunidade, de geração para
geração. Com o surgimento, ainda que restrito aos mais ricos e influentes
cidadãos da polis – da democracia, as leis vão se tornando normas mais
complexas a medida que a sociedade se organiza. O que culmina com a
primeira Magna Carta na idade média em solo inglês. Essa lei resumia valores
éticos muitos dos quais ainda hoje vigoram em muitas constituições pátrias,
como o princípio dos direitos humanos, coibir abusos do poder público e a
cobrança de impostos sem prévia autorização.
Vale ressaltar que como concepção do Direito natural, essas normas
não se reduziam a meros instrumentos normativos, mas era forma de trazer à
luz os valores mais necessários, sejam eles éticos, morais ou apenas
normativos, apreendidos por aquela sociedade naquele período e naquele
espaço de tempo, para serem formalizados.
Em seu ordenamento jurídico, o Brasil dispõe das fontes tradicionais do
Direito, a lei, a jurisprudência, o costume e a doutrina, com destaque para a lei,
dentre elas a Carta Magna de 1988, permeada de considerações éticas em
seu texto.
A leitura ética da Lei Máxima de 1988, desde o seu preâmbulo, vincula-
se a idéia de democracia como um regime político que se alicerça nos valores
morais da sociedade brasileira apoiados na liberdade, igualdade e
fraternidade. Valores esses fundantes de um genuíno Estado Democrático de
Direito. Não uma ética do faz-de-conta, mas aquela que influencie de forma
efetiva o comportamento não somente dos profissionais da mediação
envolvidos, mas toda a sociedade.
No mundo atual tratar deste tema – Ética – em consonância à mediação
e ao profissional mediador se torna tarefa árdua, não somente por ser uma
questão relativamente nova, a mediação; mas também pelos turbulentos
52
tempos em que se vive. Tempos difíceis onde o certo delineia o falso e os
conceitos de moral, ética e virtude se misturam ao imediatismo capitalista, à
empobrecedora corrupção nacional, à inversão de diversos valores e à
violência.
Vive-se infelizmente, o cumprimento profético do romance Laranja
Mecânica26 com a violência aterrorizando o meio social.
A mediação – prevista na Constituição Federal de 1988 em seu
preâmbulo e outros dispositivos – favorece a resolução de conflitos num tempo
razoável, trazendo uma nova maneira que vai além do Poder Judiciário, visto
suas principais características, a celeridade e a economicidade.
O mediador – frente ao seu trabalho de atenuar conflitos – deve estar
imbuído de cultivar os princípios éticos, tais como a autonomia da vontade das
partes, a independência, a imparcialidade, credibilidade, aptidão,
confidencialidade e diligencia. Princípios esses presentes na Lei Maior da
nação.
O advogado e as instituições que norteiam a prática da mediação
também deverão seguir seus códigos de ética contribuindo para que esta
modalidade de resolução de contendas não caia na descrença da sociedade,
mas seja respeitada como tal, visto seu conteúdo fortemente ético.
Diante disso, a ética se mostra um tema tão atual mesmo após
inúmeros avanços científicos e tecnológicos. Continua a intrigar a todos e a
chamar a atenção de uma forma ou de outra; conforto, esperança e alegria
para alguns e motivo para “torção de nariz” de outros.
Mas neste filtro ético é interessante que se manifestem os bons
profissionais e órgãos, quer sejam advogados, mediadores ou instituições que
praticam a mediação. Como bem disse o apóstolo Paulo em sua carta aos
Romanos:
“E até importa que haja entre vós
heresias, para que os que são sinceros se
manifestem entre vós.” Livro de I Coríntios
26 Laranja Mecânica: romance de Anthony Burgess publicado em 1962 que demonstra, num futuro próximo, a extrema violência juvenil na sociedade inglesa.
53
11:19 (Bíblia de Almeida Corrigida e
Revisada On Line -
https://www.bibliaonline.com.br/acf/1co/11).
Acessado em 15/02/2016.
Para que se separem os que são compromissados com a qualidade da
mediação efetuada e os resultados práticos do contato com os mediandos, a
instituição e demais envolvidos a médio e longo prazo.
Ainda não se alcançou tais valores em sua plenitude em solo pátrio,
mas a busca por uma ética que permeie a figura do mediador frente ao seu
tempo, deve ser perseguida.
54
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4 - http://www.esdc.com.br/RBDC/RBDC-09/RBDC-09-045-Maria_Garcia.pdf.
Acessado em 15/12/2015.
5 - http://proxy.furb.br/ojs/index.php/juridica/article/view/4059/2533. Acessado
em 15/12/2015.
6 - http://www.oab.org.br/Content/pdf/LegislacaoOab/Lei-8906-94-site.pdf. Acessado em 05/12/2015. 7 - http://www.oab.org.br/visualizador/19/codigo-de-etica-e-disciplina. Acessado em 05/12/2015.
8 - http://www.pnud.org.br/Noticia.aspx?id=1340 – Acessado em 09/02/2016.
9 - http://www.esdc.com.br/RBDC/RBDC-08/RBDC-08-125-Eduardo_Bittar.pdf. Acessado em 02/12/2015.
58
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
ÉTICA ATRAVÉS DOS TEMPOS 09
1.1 – Considerações iniciais sobre a ética 09
1.2 – Ética e história 10
1.2.1 – Ética no mundo Greco-romano 10
1.2.2 – Ética Medieval e sua Verticalização 13
1.2.3 – Ética Moderna e o Antropocentrismo 15
1.2.4 – Ética Contemporânea e sua Objetivação 17
CAPÍTULO II
ÉTICA E CONSTITUIÇÃO 21
2.1 – Constituição e Origem 21
2.2 – Ética e a Carta Magna de 1988 24
2.2.1 – A Constituição da República significado ético 24
2.3.1 – Constituição e alguns de seus preceitos éticos 26
CAPÍTULO III
ÉTICA E MEDIAÇÃO 32
3.1 – Ponderações sobre a Ética e a Mediação 32
3.2 – Mediação 33
3.2.1 – Conceitos 33
3.2.2 – Fundamentos Jurídicos da Mediação 35
59
3.2.2.1 – Na Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU – 1948) 36
3.2.2.2 – Na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 38
3.3 – Ética na Mediação 39
3.3.1 – Mediador e Ética 39
3.3.2 – Advogado e Ética 44
3.3.3 – Instituições e Ética 45
CONCLUSÃO 51
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 55
WEBGRAFIA 58
ÍNDICE 59