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2. Processo
Penal
ooperao internacional
na execuo da pena
a transferncia de presos
Ela Wiecko V. de Castilho
Subprocuradora-geral da Repblica.
Professora de Direito Penal e Criminologia da UNB.
Doutora em Direito pela UFSC. Lidera o Grupo de Pesquisa Sociedade,
Sistema de Justia e Controle Penal registrado na Plataforma do CNPq.
RESUMO: O artigo, depois de mostrar o crescente nmero de pessoas conde
nadas em pases nos quais so estrangeiros e que devem cumprir pena privativa
de liberdade, descreve o regime jurdico brasileiro de transferncia dessas
pessoas para seus pases de nacionalidade. Trata da transferncia de presos,
como uma das espcies da execuo de sentena penal estrangeira, forma de
cooperao penal entre os Estados. So examinados o fundamento, finalidade,
conceito, objeto, limitaes, efeitos e procedimento dos dez atos internacionais
em vigor no Brasil.
PAlAVRAS-CHAVE: Cooperao penal internacional- Execuo de sentena pe
nal estrangeira - Transferncia de pessoas condenadas - Transferncia de presos.
ABSTRACT: The article, aftershowingthe growing numberofpeople sentenced
in foreign countries having to complywith prison sentences, describes the transfer
of these people under the Brazilian legal system to their country of citizenship.
It discusses prisoners transfer, as one of the modalities of execution of foreign
criminal sentences, away of cooperation in criminal matters between the States.
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Ela Wiecko V.de Castilho
The basis, purpose, concept, object, limitations, effect and procedure of the ten
international acts in effect in Brazil.
KEYWORDS:nternational cooperation in criminal matters - Execution of
foreign criminal sentence - Transfer of sentenced people - Transfer of prisoners.
SUMRlO:ntroduo - 1.Transferncia de execuo de sentena penal
- 2. Presos as estrangeiros as no Brasil- 3. Presos brasileiros no exte
rior - 4. Os tratados em vigor no Brasil- 5. O regime jurdico brasileiro
da transferncia de pessoas condenadas: 5.1 Fundamento formal; 5.2
Fundamento material; 5.3 Finalidade; 5.4 Conceito; 5.5 Objeto; 5.6
Condies; 5.7 Limitaes; 5.8 Efeito; 5.9 Procedimento- 6. Concluso
-7. Referncias bibliogrficas.
READODIREITO:Penal; Internacional; Processo penal
ntro uo
Durante quase 500 anos, da poca de Grotius at o sculo XX, a cooperao
entre os Estados em matria penal consistiu fundamentalmente na extradio.
Mas, nos ltimos 50 anos o cenrio se transformou para acolher um nmero
crescente de novos instrumentos e formas ou modalidades de cooperao.
BASSIOUNI 2004, p. 411 refere oito formas de cooperao penal entre
Estados, a saber: extradio, assistncia jurdica, execuo de sentena penal estran
geira, homologao de sentena penal estrangeira, transferncia de procedimento
criminal, bloqueio e seqestro de produtos derivados de crime, troca de informao
de inteligncia e do direito aplicvel, espaos judiciais regionais e sub-regionais.
Por sua vez, SOUZA 2001, p.138 enumera cinco formas, com base na legislao
portuguesa: extradio, transmisso de processo penal, execuo de sentena penal
estrangeira, vigilncia de pessoa condenada ou libertada condicionalmente, aUXI1io
geral, compreendendo a notificao de documento, a notificao para compare
cimento, a entrega temporria de preso, o envio de objeto, valor, documento ou
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Cooperao internacional na execuo da pena
processo diligncia para averiguar produtos do crime informao sobre o
direito aplicvel informao relativa a antecedentes penais informao sobre
sentenas penais.
Uma das formas menos utilizadas a transferncia de pessoas condenadas
em um pas para cumprir pena em outro uma espcie da execuo de sentena
penal estrangeira. Foi utilizada no mundo pela primeira vez em 1951.
No Brasil a transferncia de pessoas condenadas que estavam cumprindo
pena privativa de liberdade ocorreu pela primeira vez em 2002.
portanto um tema novo pouco conhecido que tende a suscitar questes
de natureza poltica e jurdica. A facilidade de trnsito das pessoas no mundo
globalizado aumentou a possibilidade de cometimento de crimes em um pas por
nacionais de outro pas.
O nmero de presos e presas estrangeiros no Brasil e de brasileiros e
brasileiras presos no exterior est aumentando. A par da criminalizao ocorre
igualmente o aumento da vitimizao de nacionais brasileiros em outros pases
principalmente no contexto do trfico para fins de explorao sexual e do contra
bando de migrantes.
Casos enquadrados nessas trs situaes tm sido levados aoconhecimento
da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidado rgo do Ministrio Pblico
Federal. Exigem esforos de cooperao entre Estados para permitir o cumpri
mento da pena em pases diferentes daquele onde sedeu a condenao ou o retorno
ao pas de origem sob proteo. No que diz respeito aos primeiros trata-se do
instituto conhecido como transferncia de presos sendo a melhor denominao
a de transferncia de pessoas condenadas. No que se refere s vtimas de crime a
resposta de cooperao no encontra ainda um instituto jurdico configurado.
Esta exposio objetiva apresentar os tratados em vigor sobre transfe
rncia de pessoas condenadas para disseminar o conhecimento sobre os prin
cpios que regem essa modalidade de cooperao bem como os requisitos para
1. A expresso abrange tratados em sentido estrito e acordos.
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sua concesso, a fim de incentivar a sua utilizao. Vale ressaltar que todos os
tratados firmados pelo Brasil contm a clusula segundo a qual as autoridades
competentes das Partes informaro a todo preso nacional da outra Parte sobre a
possibilidade da aplicao do tratado e sobre as conseqncias jurdicas derivadas
de sua transferncia.
Transferncia de execuo de sentena penal
A execuo de sentena penal estrangeira uma modalidade recente de
cooperao internacional. No espao europeu abrange situaes fticas diversas,
como a transmisso da execuo penal a outro pas onde o condenado se encontra
ou a transferncia da execuo penal a outro pas para onde o condenado entre
gue. A presente anlise est restrita execuo que exige a transferncia de pessoa
condenada em um pas para cumprir pena em outro.
Conforme levantamento realizado por GUEIROS 2007, p.266 o
primeiro tratado especfico sobre transferncia de presos civis foi celebrado
entre Lbano e Sria, em 1951. Em 1963, foi firmado o Acordo de Cooperao
entre Finlndia, Islndia, Noruega, Sucia e Dinamarca. Em 1977, os Estados
Unidos celebraram tratados de transferncia de presos com o Mxico e com
o Canad.
No mbito das Naes Unidas o tema entrou na pautado 5. Congresso
das Naes Unidas sobre Preveno do Delito e Tratamento do Delinqente
em Genebra 1975 , ocasio em que foi apresentado estudo realizado pela
Associao Internacional de Ajuda ao Preso. O Congresso seguinte, em Ca
racas 1980 aprovou Resoluo determinando fosse elaborado um modelo
de acordo para a transferncia de presos, a ser submetido Assemblia-Geral
das Naes Unidas.
Segundo BASSIOUNI 2004, p. 433 e GUEIROS 2007, p. 267 , a
difuso internacional do instituto ocorreu a partir da Conveno Europia sobre
a Transferncia de Pessoas Condenadas Estrasburgo, 21.03.1983 . Alm dos
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Estados integrantes do Conselho da Europa, aderiram outros pases, entre eles
Estados Unidos, Canad,Bahamas, Chile, Costa Rica,Panam,Trinidad-Tobago,
Turquia, Israel e Tonga.
Um contexto especfico facilitou essa difuso. Em primeiro lugar, a forte
migrao de trabalhadores estrangeiros em busca de trabalho nos pases do ento
Mercado Comum Europeu criou um fato antes inexistente: a presena de estran
geiros em nmero significativo na populao prisional.
Em segundo lugar, na mesma poca, jovens americanos viajavam pelo
mundo em busca de drogas. Em conseqncia, um grupo significativo de
americanos acabou sendo preso em pases como Mxico, Canad, Turquia e
Pases- Baixos. O governo americano, aps intensa presso de familiares de
presos no estrangeiro, em especial no Mxico, da imprensa e do congresso norte
americano, firmou acordos bilaterais com aqueles pases e aderiu
Conveno
de Estrasburgo.
2. Presos as estrangeiros as no Brasil
De acordo com dados do Departamento Penitencirio Nacional BRASIL,
2007, p. 46-47 e 44 , em 04.12.2006, havia um total de 2.070 presos estran
geiros no pas, sendo 1.717 homens e 353 mulheres. O total geral de presos
no sistema penitencirio estabelecimentos de regime fechado, semi -aberto,
aberto, de medida de segurana e nas delegacias de polcia era de 401.236.
Percentualmente, os presos estrangeiros correspondem a 0,51
do total de
presos.
Os estados com maior nmero de presos estrangeiros so, em 1.0 lugar,
So Paulo, com 1.077 883 homens e 194 mulheres ; em 2., Mato Grosso do Sul,
com 335 249 homens e 86 mulheres ; em 3., Paran, com 105 98 homens e 7
mulheres ; em 4.0,Rio deJaneiro, com 99 83 homens e 16 mulheres , seguidos do
Rio Grande do Sul,Acre,Amazonas,Mato Grosso e Santa Catarina. Nos demais
estados o nmero insignificante.
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No ms de junho de 2007, no estado de So Paulo, j eram 1.487, sendo
1.125 homens e 362 mulheres. E o total geral de presos no pas passara a 419.551.
RASIL, 2007)
Embora apercentagem dos presos estrangeiros seja pequena, impressiona
a evoluo crescente do nmero geral de presos cerca de 19 mil em seis meses).
Observa-se que, em So Paulo, o nmero total de presos estrangeiros diminuiu,
mas aumentou o segmento feminino.
Presos brasileiros no exterior
Relatrio consular do ano de 2006, disponibilizado autora pelo Depar
tamento das Comunidades Brasileiras no Exterior do Ministrio das Relaes
Exteriores, totaliza 3.950 presos, num universo de 2.971.872 brasileiros no exterior
que abrange aqueles em situao migratria irregular e regular. Equivale a um
percentual de 0,13 . Os pases com maior nmero de brasileiros presos so os Es
tados Unidos 1531), Espanha 470),Japo 412), Portugal 239), Paraguai 197),
Guiana Francesa 140), Itlia 103), Argentina 96) e Venezuela 90). Segundo
pesquisa de GUEIROS 2007, p. 260), em 2000 eram 1.372 presos, num total de
1.887.893 brasileiros no exterior. Equivalia a um percentual de 0,07 .
4 Os tratados em vigor no Brasil
No Brasil, o interesse acerca do tema da transferncia de presos estrangeiros
para os seus pases comeou com o rumoroso caso da extorso mediante seqestro
de Ablio dos Santos Diniz, ocorrido em dezembro de 1989. O crime foi praticado
por um grupo de pessoas que, exceo de um brasileiro, eram todas estrangeiras
dois argentinos, cinco chilenos, dois canadenses). No curso da execuo penal
foram celebrados tratados com o Canad 1992),Argentina 1998) eChile 1998),
vindo a permitir a transferncia dos estrangeiros para os seus pases de origem a
fim de l continuarem o cumprimento da pena privativa de liberdade.
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Atualmente, esto em vigor para o Brasil Tratados de Transferncia de
Pessoas Condenadas celebrados com dez pases :2 Canad 1993 , Chile 1998 ,
Espanha 1998 ,Argentina 1998 , Bolvia 1999 , Reino Unido da Gr- Bretanha
e Irlanda do Norte 2000 , Paraguai 2002 , Peru 2003 , Portugal 2006 . Faz
parte tambm de um acordo multilateral: a Conveno Interamericana sobre o
Cumprimento de Sentenas Penais no Exterior 2001 ,que inclui Canad, Chile,
Costa Rica, Equador, Estados Unidos, Mxico, Nicargua, Panam, Paraguai e
Venezuela. Esta conveno no restringe os tratados bilaterais firmados com o
Canad, Chile e Paraguai, consoante o disposto no seu art. XII.
Esto pendentes de aprovao legislativa tratados com Angola 2005 ,
Suriname 2005 Moambique 2007 e Panam 2007 .3
Negociaes esto em trmite com o Equador, Benin, Ucrnia e Itlia.
Em 2005 foram transferidos para cumprir pena no Brasil oito brasileiros:
dois condenados na Argentina e seis na Espanha. Do Brasil foram transferidos
cinco canadenses, cinco chilenos e um ingls. GUEIROS, 2007, p. 261
De acordo com informaes prestadas autora pela Diviso de Medidas
Compulsrias do Ministrio da Justia, em 2006 obtiveram transferncia para
cumprir pena no Brasil trs brasileiros: dois condenados na Espanha e um na In
glaterra. Do Brasil foram transferidos para seus respectivos pases: um espanhol,
um ingls, um paraguaio e um argentino.
At junho de 2007 houve a transferncia de trs espanhis, do Brasil para
a Espanha.
Segundo informaes obtidas por GUEIROS 2007, p. 260 , no
Ministrio da Justia tramitavam, em 2005, aproximadamente 120 pedidos
de transferncia, sendo cerca de 70 deles de pedidos para o exterior e 50 no
sentido inverso.
As condenaes, majoritariamente, se referem a trfico de drogas.
2. A referncia
do ano em que o tratado entrou em vigor para o Brasil.
3. Ano de assinatura.
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Ela Wiecko V. de Castilho
5.
regime jurdico br sileiro d tr nsfernci
de pesso s conden d s
5 Fundamentoformal
No h lei no Brasil que regule a cooperao internacional na transfern
cia de pessoas condenadas. O Cdigo Penal no art.
9.0
prev a homologao de
sentena estrangeira para obrigar o condenado reparao do dano, a restituies
e outros efeitos civis, e a sujeit-Io a medida de segurana. Portanto, no con
templa a hiptese de homologao de sentena estrangeira para o cumprimento
de pena no Brasil.
A transferncia de execuo de sentena penal estrangeira pressupe obri
gatoriamente que um Estado possa executar a sentena penal de outro Estado.
Sendo a sentena penal manifestao muito forte da soberania estatal, todos os
pases relutam em admitir a eficcia da sentena penal estrangeira em seus ter
ritrios. Por isso a frmula do art.
9.0
usual a todos os pases. Para contornar o
impedimento BASSIOUNI e outros autores 2004, p. 433 desenvolveram a teoria
de que a execuo de uma sentena penal estrangeira tem natureza administrativa,
ou seja, no implica no reconhecimento do juzo penal. O raciocnio parte de uma
fico legal que separa a execuo da sentena do reconhecimento do julgamento
penal que deu causa sentena.
Para o pas que transfere o preso denominado de Estado remetente,
sentenciador ou da condenao mais fcil admitir a natureza administrativa.
O mesmo no ocorre para o pas que o recebe denominado de Estado recebedor
ou receptor .
Os pases europeus aceitaram a proposio. Mesmo porque j existe a
Conveno Europia sobre oValor Internacional das Sentenas Penais, celebrada
em Haia, em 28.05.1970. Os Estados Unidos tambm aceitaram, sob condio
de que a pessoa, para ser transferida, declare explicitamente que os seus direitos
constitucionais foram respeitados no julgamento. Essa condio, de certa maneira,
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igualmente uma fico legal, pois a pessoa transferida est, na maioria das vezes,
sob condies to ruins e to desejosa de retomar ao pas natal que no lhe interessa
argir violaes de direitos.
No Brasil, a questo foi examinada por ARAJO JR. 1995,p.1l1 ,que
defendeu a necessidade da prvia homologao da sentena penal estrangeira,
cujo trmite, poca, se realizava perante o Supremo Tribunal Federal. No
entendia como uma sentena condenatria prolatada no estrangeiro pudesse
dar causa a instaurao de um juzo executrio penal, sem passar por um juzo
de delibao para os ajustes necessrios legislao nacional, ainda que sem
qualquer indagao de mrito.
O governo brasileiro, porm, considera dispensvel a homologao, vez que,
ao contrrio da extradio, a transferncia s se consuma se houver concordncia
da pessoa a ser transferida. Avalia a transferncia como uma questo administra
tiva da execuo. Reporta -se a parecer do Ministrio Pblico Federal, que teria se
manifestado pela constitucionalidade dos tratados de transferncia. Este parecer
no foi apresentado pelo Ministrio da Justia, nem localizado no sistema de in
formaes do Ministrio Pblico Federal. Ao contrrio, foi localizado parecer, da
lavra do Subprocurador-Geral da Repblica Edson Oliveira de Almeida BRASIL,
2001 , no sentido da indispensabilidade da prvia homologao.
GUEIROS 2007, p. 290 , que j perfilhou o entendimento de Arajo Jr.,
defende hoje a desnecessidade de homologao, argumentando que os tratados
tm fora de lei, alterando, pois, o Cdigo Penal, e que essa espcie de tratados
versa sobre direitos humanos, podendo alcanar o s us de emenda constitucional
se aprovados com o
quorum
especial. Refere ainda o entendimento de Maria The
reza Rocha de Assis Moura, segundo a qual, ao se exigir a homologao judicial,
estar-se-ia diante do instituto da execuo de sentena condenatria estrangeira
e no daquele da transferncia de pessoa condenada.
A meu ver,porm, a transferncia internacional de pessoa condenada implica
na transferncia da execuo penal. Execuo penal vlida supe o reconhecimento
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deuma sentena penal.Ademais, no uma fasemeramente administrativa. Trata-se,
pois, de uma questo muito pouco debatida que, mais cedo ou mais tarde, vir a ser
submetida ao Superior Tribunal de Justia e ao Supremo Tribunal Federal.
Entretanto, no que diz respeito falta de previso no Cdigo Penal isso
no representa qualquer empecilho. O fundamento formal para a transferncia de
presos estrangeiros do Brasil para outros pases e de presos brasileiros no exterior
para o Brasil so os tratados internacionais, enquanto no houver alterao legis
lativa do art. 9.0 ou a edio de uma lei geral de cooperao jurdica internacional,
a exemplo das leis da Sua e de Portugal. Vale ressaltar que essas leis no excluem
regras especficas de tratados bem como incorporam regras j consolidadas pelo
direito internacional dos tratados.
ARAUJO JR. 1995, p.112) aponta os dois sistemas de homologao de
sentenas penais estrangeiras. O primeiro, da nacionalizao da deciso, importa
em que a sentena, uma vez homologada, passa a ser considerada como se fora
prolatada por um juiz nacional de primeira instncia, segundo a lei do Pas. Per
mite amodificao do mrito do julgado, no Estado recebedor, atravs de recursos
ou da reviso criminal. O segundo sistema, chamado de aplicao indireta da lei
processual penal estrangeira, considera a sentena estrangeira um fato jurdico
histrico. Em conseqncia, o Pas que executa a sentena no pode alterar o
contedo, entretanto o processo de execuo se desenvolver segundo o que
estabelecer a lei nacional.
Os tratados celebrados pelo Brasil, como se ver adiante, adotam o
sistema de aplicao indireta, com muitas limitaes aplicao de institutos
da execuo penal.
5 Fundamento material
GUElROS 2007, p. 256-258) arrola quatro fundamentos para o instituto:
i) custo financeiro da gesto da populao prisional estrangeira; ii) irracionalida
de da execuo penal dirigida ao preso estrangeiro, cuja finalidade a reinsero
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social do condenado, se, ao final, ele expulso para o seu pas de origem; iii) o
Estado deve assumir a tarefa de execuo da pena de seu nacional, pois faz parte
da responsabilidade pela violao da ordem jurdico-penal de outro Estado; iv)
princpio da humanidade, que exige minorar o sofrimento de quem se encontra
encarcerado e distante de seu crculo familiar e cultural.
5 Finalidade
A transferncia visa fomentar a cooperao mtua em matria penal Bol
via,Portugal, Conveno Interamericana), aboa administrao dajustia Portugal
e Conveno Interamericana), mas, sobretudo, promover ou facilitar a reabilitao
social da pessoa condenada. Alguns tratados utilizam o termo reinsero social
Argentina, Bolvia e Portugal).
5 4 Conceito
Ato bilateral internacional discricionrio, condicionado aoconsentimento
da pessoa transferida. No h obrigao de transferncia, mas apenas o dever de
analisar pedidos de transferncia. Todos os tratados ou acordos firmados pelo
Brasil contm clusula esclarecendo que a transferncia ato discricionrio dos
Estados remetente e recebedor. Entretanto, reconhecido o direito de o preso
estrangeiro pleitear a transferncia. Os Estados podero considerar, entre outros
fatores, a possibilidade de a transferncia contribuir para a sua reabilitao social,
a gravidade do crime, os antecedentes penais, o estado de sade, os vnculos fami
liares, sociais ou de outra natureza com o Estado remetente e recebedor. Todos os
tratados determinam que, se um dos Estados no aprovar a transferncia, dever
informar imediatamente ou sem demora a deciso. Alguns explicitam que
podero apresentar ou no o motivo.
A literatura produzida no largo perodo de tempo em que predominou a
extradio como nico instrumento de cooperao penal internacional condiciona
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os demais instrumentos. Portanto, a racionalidade que preside aquele instituto se
aplica a este. Centra-se na idia do aut dedere autjudicare
Os atos internacionais em exame no seguem um modelo padro, mas seu
contedo muito semelhante. A seguir sero destacados alguns pontos.
Objeto
Em todos os tratados o objeto da transferncia o cumprimento da pena
privativa de liberdade. Da a terminologia ainda prevalente de transferncia de
presos . Entretanto, compreendem tambm vigilncia, liberdade condicional,
antecipada ou vigiada, condenao condicional Bolvia); suspenso condicional
da pena e liberdade condicional, antecipada ou vigiada Argentina); suspenso
condicional da pena, liberdade condicional ou regime em meio aberto Paraguai);
execuo condicional, liberdade vigiada e outras formas de superviso sem deten
o Conveno Interamericana); medida de segurana para inimputveis Peru,
Portugal e Conveno Interamericana); vigilncia ou outras medidas aplicadas
a menores infratores Canad, Chile, Espanha, Bolvia, Argentina, Conveno
Interamericana), medida privativa aplicada a menores infratores Paraguai).
A Conveno Interamericana e os tratados com a Argentina, Bolvia e
Peru vedam expressamente a transferncia para cumprimento da pena de morte.
Todavia, quanto aos outros, a interpretao das regras de cada tratado leva
concluso de que s se referem a cumprimento de pena privativa de liberdade.
Qyanto a priso perptua os tratados com o Canad, Reino Unido, Portugal e
com a Espanha consignam a regra de que a pena deve ter durao exeqvel no
Estado recebedor ou deve poder ser convertida, pelas autoridades competentes
do Estado recebedor, a uma durao exeqvel nesse Estado. Os tratados com
a Bolvia e com a Argentina exigem que a pena tenha durao determinada. A
ausncia de regra expressa nos outros Estados resolvida pelo requisito da no
contrariedade ordem jurdica do Estado recebedor, que poder negar a transfe
rncia ou condicion-Ia comutao.
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5.6 Condies
De modo geral os tratados celebrados pelo Brasil contemplam, implcita ou
explicitamente, sete condies: i
Nacionalidade dapessoa condenada correspondente
aoEstado recebedor.
A nacionalidade aferida de acordo com o conceito estabelecido
na Constituio e nas leis de cada pas. Os tratados com Portugal e Reino Unido
apresentam a peculiaridade de admitir a transferncia de qualquer pessoa, desde
que tenha residncia habitual ou vnculo pessoal no territrio da outra Parte capaz
de justificar a transferncia. ii Trnsito emjulgado da sentena. iii Suficiente lapso
depena pendente de cumprimento,
aferido no momento da solicitao. O mnimo
aceito comumente seismeses, o que pode inviabilizar a transferncia face ademora
do procedimento. Os tratados com o Canad e com a Espanha se referem a uma
durao exeqvel, o do Paraguai exige 12 meses, salvo razes excepcionais, os da
Argentina e Bolvia, um ano. iv
Consentimento voluntrio da pessoa condenada,
que deve ser previamente informada das conseqncias jurdicas da transferncia
e concordar expressamente por escrito. No caso de menores ou de inimputveis,
o documento deve ser subscrito pelo representante legal. Antes de ser efetuada a
transferncia o Estado recebedor pode verificar, por meio de funcionrio desig-
nado, se o consentimento se fez de modo regular. A revogao do consentimento
s est prevista no tratado com o Chile, at antes da aceitao da transferncia
pelos dois Estados.
v Dupla incriminao dofato como crime.
No se levam em
conta as diferenas de denominao e as que no afetam a natureza do crime. vi
Conjrmidade com a ordem jurdica do Estado receptor. vii Concordncia dos Estados
Partes com a traniferncia.
O tratado com a Argentina exige a condio adicional de que o preso
tenha reparado os danos causados vtima, se lhe era possvel. O tratado com a
Bolvia faz depender do pagamento de multas, custas judiciais, reparao cvel ou
condenao pecuniria de qualquer natureza, ou que garanta seu pagamento de
forma satisfatria. O tratado com o Paraguai segue igual regra acrescentando a
Processo Penal 245
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Ela Wiecko V. de Castilho
comprovao de inexistncia de trmite de demanda por indenizao na jurisdio
civil bem como excetuando o preso que comprove a sua absoluta insolvncia.
5. 7
imit es
Clusula comum a todos os tratados a de que a pessoa transferida no
poder ser detida processada ou condenada novamente no Estado recebedor pelo
mesmo crime que motivou a sentena. Entende se que poder s Io por outro.
Os tratados com o Canad Chile e Espanha explicitam que o preso trans-
ferido no ser privado de nenhum direito em virtude da legislao do Estado
recebedor salvo quando suscitado pela prpria imposio da pena.
A pena ser cumprida de acordo com as leis e procedimentos do Estado
recebedor.
indiscutvel que o Estado recebedor no pode agravar a pena ou
prolongar a sua durao. Mas os Estados remetentes se preocupam com as modi-
ficaes que alteram a durao da pena ou seu regime para que a transferncia no
se transforme numa vlvula de escape punio. Por isso o Brasil ops reserva a
possibilidade de reduo de perodos de priso ou do cumprimento alternativo da
pena conforme facultado pelo art.
VII 2
da Conveno lnteramericana. Todavia
pelos tratados com a Bolvia e Argentina o Estado Recebedor pode outorgar e
revogar a liberdade condicional antecipada ou vigiada. O tratado com o Paraguai
admite tambm a mudana de regime da pena privativa de liberdade.
Todos os tratados estabelecem que apenas o Estado sentenciador pode
proceder reviso da sentena condenatria. O tratado com o Peru acrescenta a
modificao cancelamento indulto anistia ou graa; o tratado com o Reino Unido
a modificao ou reforma reduo comutao extino; os tratados com o Chile
Espanha Bolvia e Argentina indulto anistia ou comutao; os tratados com a
Bolvia e Argentina ainda anulao modificao perdo ou tornar sem efeito; o
tratado com o Paraguai anulao modificao ou tornar sem efeito; o tratado com
o Canad perdo e anistia.
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Cooperao internacional na execuo da pena
8 Efeito
Suspende a execuo da pena no Estado sentenciador. Mas o Estado
recebedor no poder continuar executando a pena no caso em que o Estado
remetente consider-Ia cumprida. A dinmica da execuo exige que os dois
Estados mantenham intercmbio constante de informaes.
9 Procedimento
Qyanto ao procedimento h dois tipos: transferncia passiva a do estran
geiro condenado no Brasil que quer ser transferido para seu pas e transferncia ati
va a do brasileiro condenado no exterior que quer ser transferido para o Brasil .
O procedimento se desenvolve na Secretaria Nacional deJustialDiviso
de Medidas Compulsrias do Ministrio da Justia, indicado nos tratados como
a autoridade central brasileira. Na maioria dos pases com que o Brasil celebrou
tratados igualmente o Ministrio da Justia a autoridade central. De qualquer
modo, sempre intervm a autoridade diplomtica. A transferncia passiva tem incio
com a solicitao, em regra por Nota Verbal, formulada por embaixada, de ofcio ou
decorrente de pedido do estrangeiro preso ou de seu familiar. A seguir, comunica-se
ao juzo da execuo penal, solicitando os documentos necessrios. Depois de tra
duzidos so encaminhados Embaixada do pas recebedor. Sehouver concordncia
so ultimados atos administrativos no mbito do Ministrio da Justia e contatada
novamente a embaixada para apresentar compromisso de respeito aos termos da
transferncia. A Polcia Federal encarrega-se da entrega do preso aos agentes do
Governo estrangeiro. As despesas correm conta do Brasil at a entrega.
A transferncia ativa deflagrada a partir de correspondncia do preso
brasileiro dirigida s autoridades brasileiras, aqui ou no exterior, diretamente ou
por intermdio de amigos ou familiares. Tomando conhecimento, o Ministrio
das Relaes Exteriores contata a embaixada do local da priso a fim de solicitar os
documentos, que devero ser traduzidos. Aps, verifica -se com ojuzo de execuo
Processo Penal 247
8/10/2019 Ela Wiecko - Cooperacao Internacional Na Execucao Da Pena - Fichado Por Felipe Remonato
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Cooperao internacional na execuo da pena
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