Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas
Ano 7 • nº1358
Agosto/2013
“Meu lugar, minha história”
Maria da Conceição Alves Mesquita é o nome desta mulher guerreira, mais todos a conhecem por “Conceição”, que é mais conhecida que reza de padre nosso. Com seu sorriso largo, olhos brilhantes e de fala marcante ela abre as portas, as janelas, o quintal e o seu coração, em uma tarde calorosa e regada a café fresco. Conceição conta suas lutas e alegrias no Semiárido cearense. Sua história começa mais ou menos assim...
“Eu nasci numa comunidade chamada Cascudo, antes era
município de Uruburetama, mas hoje faz parte do município
de Trairi. Eu gostava de ajudar o meu pai na agricultura,
gostava de cuidar dos animais, colher, plantar, a minha
melhor brincadeira era mexer com agricultura,” afirma
Conceição.
Uma menina que nasceu sabendo gostar da natureza e viver para o mundo. “Meu negócio era estar
fora de casa, eu gostava muito de jogar bola, eu sempre fui “mulher-macho” desde a infância. Eu não
gostava de brincar de boneca, até mocinha eu vivia brincando de bola com os meninos e brincava até
escondida da minha mãe. Minha brincadeira era no roçado e com a bola no pé”. Lidar com a dureza de uma
infância e a leveza de sua meninice fez-se criar uma mulher batalhadora, fez-se criar uma líder.
Existiu um tempo em que Maria da Conceição foi morar na cidade de Fortaleza, lá ela casou, teve
quatro filhos. Mas seu pensamento era no interior, era na tranquilidade do campo. Quando seu esposo
faleceu, ela não pensou nenhuma e nem duas vezes,
decidiu logo voltar para comunidade: “Na cidade eu não
tinha emprego, eu achei que com a vida no interior eu teria
minha sobrevivência, teria como produzir, porque eu não
estudei e a única coisa que eu sabia era trabalhar na
agricultura. Eu voltei para as minhas raízes. Eu sabia que
aqui, eu ia poder trabalhar, produzir, eu ia ter uma vida
melhor, eu ia ser feliz”. Conceição, hoje aos seus 54 anos, é moradora da comunidade Urubu, no Trairi. Além de cuidar do quintal produtivo agroecológico, ela também exerce um importante papel na organização de sua comunidade atuando como presidente da Associação Comunitária dos Moradores de Urubu e como coordenadora da Casa de Sementes “O Jucazeiro”.
Trairi
Casa de Sementes O Jucazeiro
A agricultura é feita no arredor de casa
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Como se não bastasse, também exerce o papel de animadora da comunidade nas festas religiosas e
dançantes.
Conceição é uma daquelas mulheres que arregaçam as mangas para o trabalho e só sossegam
quando a luta é conquistada. Na sua comunidade, os moradores sempre tiveram dificuldade de ter
acesso à água tanto para beber, quanto para produção. Foi assim que juntamente com outros
agricultores e agricultoras decidiram se organizar. Essa guerreira conta: “O povo perguntava e queria
uma associação, assim sentimos a necessidade de nos organizar. Foi em 2005 que criamos a
associação, até que, 'mandada por Deus', veio a visita da Cáritas, foi a partir daí que a nossa comunidade
começou a mudar. Nós não sabíamos quase nada, mas vieram os incentivos, os intercâmbios, os cursos
e acesso a programas”. Com o fundo rotativo vieram as primeiras cisternas de placa, construídas em
sistema de mutirão. Com a organização, vieram a casa de sementes e a cisterna-calçadão.
Chama nossa atenção a irmandade presente entre as famílias Mesquita e Braga. As duas famílias
possuem um quintal produtivo agroecológico, no qual foi implementada uma cisterna para produção.
Assim Conceição nos conta: “A gente viu uma cisterna-calçadão num intercâmbio que fizemos e
começamos a trabalhar pra trazer a cisterna pra cá”. Ela acrescenta que “a ideia era incluir mais famílias
neste benefício, assim achamos melhor dividirmos o quintal para as duas famílias, as duas cuidam, as
duas plantam, as duas colhem, o quintal dá para todo mundo”.
Conceição fala como orgulho do quintal, sendo possível enxergar à distância a sua diversidade:
cebolinha, coentro, noni, maxixe, milho, feijão, abacaxi, limão, acerola, ata. Além das fruteiras, canteiros
e hortaliças, encontramos amor, amizade, sinceridade e sonhos tecidos coletivamente, tudo cultivado
com afeto pelas mãos das duas famílias, pelas mãos dessas duas “amigas-irmãs” Conceição Mesquita e
Elisângela Braga. Os caminhos traçados e alinhavados por essas duas mulheres estão para além das cercas que separam os seus quintais. Essa história de amizade demonstra que os sonhos pessoais e a satisfação das necessidades coletivas caminham de mãos dadas. Desse modo, Conceição diz que seu sonho é “conseguir água para produção na comunidade através de projetos, criar meios para a permanência da juventude no campo”. E acrescenta: “Queremos ter água”.
Realização Patrocínio
Articulação Semiárido Brasileiro – CearáBoletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas
Quintal produtivo agroecológico coletivo das famílias Mesquita e Braga