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R E S U M O Arelocalizaçãonoverãode2001deumdosmais importantesnaviosantigos jamais

descobertosemPortugal,desaparecidoapósasuasemidestruiçãopordragagensem1970,

tornou-se, desde logo, uma das primeiras prioridades do CNANS, a qual tem vindo a ser

anualmenteenquadradanoprogramadeactividadesdoCNANSenoâmbitodoprotocolo

decolaboraçãoassinadocomaCâmaraMunicipaldePortimão.Aregiãodeproadonavio,

querepousavanahorizontalnofundodorio,estendendo-seporumaáreade7mdecompri-

mento,foialvodeduasmissõesdeescavaçãoeregisto(2001e2002),tendosidodesmontada,

peçaapeça,numaterceirafase(2003).Ascampanhasde2004e2005,porsuavez,incidiram

sobreaescavação,registoedesmontagemdosegundoconjuntoarquitecturaldocascodo

navioArade1,detectadonofinaldamissãode2002.Nacontinuidadedaestruturadesmon-

tadaem2003,masdelaseparadaporrupturaeenterrando-seprofundamentenolodo,este

conjuntocorrespondeàregiãocentraldonavio.

A B S T R A C T The localisation of one of the most important ancient ships discovered in

Portugalduringthesummerof2001,vanishedafteritspartialdestructionbythedredging

Worksof1970,hasbecomeoneoftheprioritiesoftheCNANS,whichhasbeenannually

framed in the activity program of this centre and in the collaboration protocol signed

betweenIPAandCâmaraMunicipaldePortimão.Theupperportionofthehull,whichrested

on thebottomof the riverAradeoveran7m longarea,was fullyobservedandrecorded

duringtwofieldseasons(2001and2002)anddismantled,piecebypiece,inathirdphase

(2003).The2004and2005seasonshadasgoaltheexcavation,fullrecordinganddisman-

tlingofthelowerhull,brieflyobservedattheendofthe2002survey.Disassembledfromthe

architecturalcomplexdismantledin2003butinitscontinuity,thissecondportionofthe

hullisburiedinthesedimentandcorrespondstoamidships.

O navio seiscentista Arade 1: resultados preliminares das intervenções arqueológicas de 2004 e 2005 VANESSALOUREIRO*

JOãOGAChETALVES**

REVISTA PORTUGUESA DE Arqueologia. volume 10. número 1. 2007, p. 367-379

Vanessa Loureiro | João Gachet Alves O navio seiscentista Arade 1: resultados preliminares das intervenções arqueológicas de 2004 e 2005

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Nodecursodasdragagensde1970,quevisavamodesassoreamentodocanalprincipaledabaciaderotaçãodafozdorioArade,foraminterceptadas,enterradasnolodo,diversasestruturasnáuticasemmadeira(Alves,1999,p.31;Castro,2005,p.55-58).

Umdestesdestroços,denominadoporArade1, foivisitado,poucodepoisdoachado,porumaequipademergulhadoresamadoresdoCentroPortuguêsdeActividadesSubaquáticas(CPAS)eoutradaFederaçãoPortuguesadeActividadesSubaquáticas(FPAS).Deve-seaorelatórioelabo-rado,naocasião,porJoséFarrajotaeMariaMargaridaFarrajotaoconhecimentodealgumasdascaracterísticasessenciaisdestaembarcaçãoesuasprincipaisdimensões(Farrajota,1970).Ospri-meiros esboços, assim como uma descrição mais cuidada, resultaram de uma segunda missãoderegisto,tambémpromovidapeloCPAS,naqualparticiparamalémdeJoséFarrajotaeMariaMargarida Farrajota, Rui de Moura, Fernando Pina e Jorge de Albuquerque (Farrajota, 1970).Noentanto,algunsanosdepoisdasuadescoberta,jámuitodesconjuntado,onavioArade1voltouadesaparecernolodo,semtersidoalvodequalquerintervençãoarqueológica.

ConscientedoenormepotencialarqueológicodorioArade,em2001,oCentroNacionaldeArqueologiaNáuticaeSubaquática(CNANS)empreendeuumamissãodeprospecçãoeinvestiga-çãonoleitodesterio,aqualtinhacomoumdosseusobjectivosestratégicosarelocalizaçãodosnaviosdescobertosnasequênciadasdragagensde1970(Alves,MachadoeCastro,2002,p.3-4).A1deAgostode2001,foramlocalizadososdestroçosdeumnaviodecascoliso,oqualseassociou

Fig. 1 LocalizaçãodosítioArade1.

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de imediatoaonavioArade1dadécadade70. Com efeito, as duas embarcações pare-ciamostentarcaracterísticasidênticas.

DeacordocomaMemória descritiva das observações subaquáticas feitas em Portimão e cronologia dos acontecimentos que levaram às mesmas,onaviovisitadoem1970pelaequipado CPAS apresentava tabuado liso e cons-trução robusta, encontrando-se quebradoem duas partes: uma encastrada no taludeem bom estado de conservação, como setivesse sido seccionada; a outra, completa-mente desconjuntada, jazia na horizontal,empartes,àfrentedaprimeira,aindaligadaaestaporalgumastábuas.Ascavernas,porseu turno, na parte visível dos topos supe-riores,possuíamumasecçãorectangulardemaisoumenos13cmpor16cm,enquantoas tábuas de forro exterior, com aproxima-damente5cmdeespessura,seencontravamfixas a estas por cavilhas cilíndricas demadeiracom3cmdediâmetro.Asimagensrecolhidasnaépocamostravamaindaaexis-tência de forro interior, relativamente bempreservado.

Noentanto,nemem2001nemnascampanhasarqueológicasqueseseguiram,foramdetec-tadosquaisquervestígiosdesobrequilha,cujapresençahaviasidoatestadaem1970porJorgedeAlbuquerque, nem de escoas e respectivos tabiques, cuidadosamente fotografados pelo mesmoautor.Domesmomodo,dasupostacargadobarco,camadasdegravetosdevideiracobertasporesteiradevime,nãofoiencontradoorasto.AcampanhadeJunho/Julhode2004viriaacontribuirdeformadecisivaparaaidentificaçãodonaviodescobertoem2001comoonavioregistadoem1970.

Fig. 2 EsboçoelaboradoporJ.Albuquerqueem1970.

Fig. 3 Aescoadebombordo.Foto:J.Albuquerque. Fig. 4 Pormenordeumadascavernas.Foto:J.Albuquerque.

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1. As intervenções arqueológicas de 2001 a 2003

Osdestroços,detectadosem2001,encontravam-seseccionadosemdoisconjuntosarquitec-turais.Aextremidadedeproadonavio,queseencontravapraticamenteadescoberto,repousavaa-6mdeprofundidadeeocupava umaáreadeaproximadamente21m2.Umasegundaparteestru-tural,aparentementebastantedesconjuntada,enterrava-seprofundamentenolodoemdirecçãoaW,comoconfirmadoporsondagensrealizadascomlançadejactodeágua(Alves,MachadoeCas-tro,2001,p.5).

Aescavaçãoeregistodestenavio(iniciadoaindaem2001,pelaequipadoCNANS)continuounoverãode2002,sobadirecçãodoProfessorDoutorLuísFilipeCastro,docentenaTexasA&MUniversityeinvestigadordoInstituteofNauticalArchaeology.Duranteestaintervenção,queinci-diuessencialmentesobreaparteexpostadonavio,foiefectuadooregistodocascoedocavername,resultandonumaplantadepormenordaembarcação(Castro,2002a).

Nesteano,constatou-sequeaestruturademadeirahaviasofridoumadegradaçãoacentuadaepreocupante,provocadaporacçãodetaredo navalis,doanode2001paraoanode2002.Assim,visandoaprotecçãopatrimonialdestevestígio,amissãode2003foi totalmenteconsagradaaodesmantelamento da estrutura registada em 2002 (Rieth, Rodrigues e Alves, 2004, p. 4), sob adirecçãodoProfessorDoutorEricRieth,investigadordoCNRSedoMuséedelaMarine,docentenaUniversitédeParis1econsultorcientíficodoCNANS.

DesmontadapeçaapeçaaextremidadedeproadonavioArade1foitransferidaparaasins-talaçõesdoCNANS,encontrando-seactualmenteaocuidadodolaboratóriodeconservaçãoeres-tauro.Compreendendoaimportânciadestevestígioparaoestudodaarquitecturanavalseiscen-tista,aescavaçãoeregistodosegundoconjuntoarquitecturaltornou-senumadasprioridadesdoCNANS.

1. As intervenções arqueológicas de 2001 a 2003

Osdestroços,detectadosem2001,encontravam-seseccionadosemdoisconjuntosarquitec-turais.Aextremidadedeproadonavio,queseencontravapraticamenteadescoberto,repousavaa-6mdeprofundidadeeocupava umaáreadeaproximadamente21m2.Umasegundaparteestru-tural,aparentementebastantedesconjuntada,enterrava-seprofundamentenolodoemdirecçãoaW,comoconfirmadoporsondagensrealizadascomlançadejactodeágua(Alves,MachadoeCas-tro,2001,p.5).

Aescavaçãoeregistodestenavio(iniciadoaindaem2001,pelaequipadoCNANS)continuounoverãode2002,sobadirecçãodoProfessorDoutorLuísFilipeCastro,docentenaTexasA&MUniversityeinvestigadordoInstituteofNauticalArchaeology.Duranteestaintervenção,queinci-diuessencialmentesobreaparteexpostadonavio,foiefectuadooregistodocascoedocavername,resultandonumaplantadepormenordaembarcação(Castro,2002a).

Nesteano,constatou-sequeaestruturademadeirahaviasofridoumadegradaçãoacentuadaepreocupante,provocadaporacçãodetaredo navalis,doanode2001paraoanode2002.Assim,visandoaprotecçãopatrimonialdestevestígio,amissãode2003foi totalmenteconsagradaaodesmantelamento da estrutura registada em 2002 (Rieth, Rodrigues e Alves, 2004, p. 4), sob adirecçãodoProfessorDoutorEricRieth,investigadordoCNRSedoMuséedelaMarine,docentenaUniversitédeParis1econsultorcientíficodoCNANS.

DesmontadapeçaapeçaaextremidadedeproadonavioArade1foitransferidaparaasins-talaçõesdoCNANS,encontrando-seactualmenteaocuidadodolaboratóriodeconservaçãoeres-tauro.Compreendendoaimportânciadestevestígioparaoestudodaarquitecturanavalseiscen-tista,aescavaçãoeregistodosegundoconjuntoarquitecturaltornou-senumadasprioridadesdoCNANS.

Fig. 5 PlantadonavioArade1elaboradaduranteaintervençãode2002(Castro,2002a).

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2. As intervenções de 2004 e 2005

Coordenadas pelos signatários deste artigo, as intervenções arqueológicas de 2004 e 2005incidiramsobrearegiãocentralepartedaextremidadedepopadonavioArade1,tendosidodetec-tadoumnúcleocoesoextremamentebemconservado,profundamenteenterradonolodo,comaproximadamente4mdecomprimentopor3,80mdelargura.Pelaáreaenvolventedestenúcleo,sobretudoaestibordoeaSW,espalhavam-sepeçasdemadeiradeslocadasdoseucontextoorigi-nal,masemexcelenteestadodeconservação.

Ocascoapresentava-seseccionadoquernaextremidadedeproa(NE)quernaextremidadedepopa(SW).Épossívelquetalsejaconsequênciadeduaspassagensconsecutivasdadragaem1970,como,aliás,opareceatestarasprópriastábuasdecasco,cujamadeiraapresentafibrasrasgadas.Adeterioraçãodasextremidadesdebombordoeestibordo,porsuavez,pareceserapenasresultadodopassardosanosedascondiçõesdejazida.

Osvestígiosjaziamentreos-6meos-12mdeprofundidade,sobreotaludeformadopelasdragagensdadécadade70.Apresentavam,assim,umaorientaçãoNE/SWnosentidoproa/popa,com inclinação de aproximadamente 40º, e SE/NW no sentido estibordo/bombordo. Toda aregião a estibordo da quilha assentava sobre o talude NE/SW, enquanto a bombordo o cascoencontrava apoio no talude SE/NW. É exactamente no posicionamento dos destroços que seencontrajustificaçãoparaoexcelenteestadodeconservaçãodosmesmosabombordodaquilha.Comefeito,grandepartedotabuadodeestibordonãoestariaassentenotalude,tendoacabadoporsesoltardocontexto,oqueexplicaadispersãodetábuasnaáreaaestibordo.

NazonaSW,oamontoadodepeçasdemadeiraapresentaumcarizalgodiferente.Comefeito,paraalémdediversastábuas,cujatipologiaé,porora,difícildereconhecer,surgemescoas,caver-nas,tabiques,braços…Enfim,todootipodepeçassusceptíveisdeintegraremacomposiçãodeum

Fig. 6 PlantadonavioArade1elaboradaduranteaintervençãode2005.

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navio.É,contudo,derealçaraformadascavernasdetectadasnestaárea:trata-sedecavernasfecha-das, ainda não picas, que se localizariam entre a caverna mestra e a popa da embarcação. Estaregiãodoarqueossítiofoisumariamenteregistadaem2005,masnãoescavada,estandoprevistaaconclusãodostrabalhosnoVerãode2007.

OconjuntodosvestígiosarquitecturaisdonavioArade1écompletadopelapresençadeumaenormeâncora,cujatipologiasedesconhece.Comefeito,emboraahasteapresentejá2mdecom-primento, esta peça encontra-se ainda solidamente enterrada. Trata-se, sem dúvida, da âncoraidentificadaem1970porJorgeAlbuquerque(LoureiroeAlves,2005,p.16).Bastanteconcrecio-nada,possuiarganéu,comcercade50cmdediâmetro,umpequenofragmentodocepodemadeiraehastecom20cmdesecçãoeencontra-seinseridanolodosegundoaorientaçãodotaludeedosprópriosdestroçosdaembarcação.

2.1. Conjuntos estruturais funcionais do navio: descrição

2.1.1. Cavername longitudinal

Relativamenteàquilhaeàsobrequilha,poucosepodeparajáadiantar.Aquilha,emexce-lenteestadodeconservação,comaproximadamente4mdecomprimento,éumapeçaúnica,emcujaextremidadedeproaseobservamvestígiosdeumaescarvalisavertical1.Possuisecçãorectan-gular,comcercade17cmdealturae15cmdelargura.EstasdimensõesnãoapresentamvariaçõessignificativasentreascavernasC8eA1-183,emboraapartirdeC8asecçãotendaaaumentargra-dualmenteatéàzonadeligaçãoàrodadeproa2.Apresençadealefrizpareceserconstanteaolongodetodaapeça.

Fig. 7 Identificaçãodaquilhaesobrequilhanaplantageraldonavio.

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A sobrequilha, por sua vez, encontrava-se deslocada da posição original, tombada lateral-mente.Com4,40mdecomprimento,apresenta,nazonadacarlinga,secçãoquadradacom35cmdelargurapor33cmdealtura.Odenteadoencontra-sepreservadopraticamenteaolongodetodaaextensãodapeça,desaparecendonosúltimos80cm,àmedidaqueasdimensõesdaprópriasec-çãosereduzem.Épossívelqueestareduçãosejaresultadodadegradaçãodasobrequilhaenãoconsequênciadoprocessoconstrutivo.Nafacesuperiordasobrequilha,sãovisíveisaindaduasgrandesconcreçõesdeferro,certamentecavilhasférreasqueefectuavamaligaçãoàquilha.Ofrag-mentodequilharecuperadoem2003apresentavatambémnafaceinferiortrêsgrandesconcre-ções,tendosido,aliás,norelatóriodaintervençãode2002,lançadaahipótesedecavilhamentodasobrequilhaàquilha(Castro,2003).

2.2.2. Cavername transversal

OconjuntoarquitecturaldonavioArade1aindacoesopreservavadezcavernas,novebraçosdo ladodeestibordo,dezbraçosdo ladodebombordoeseissegundos-braçostambémabom-bordo.Ocavernametransversalapresentavaumritmo“en plein, en vide”,umamalhaserradaquenãopermiteaexistênciadeespaçamentoentreosparescaverna/braço,numaclaracontinuaçãodasobservaçõesregistadasparaaextremidadedeproa(Loureiro,2004,p.60).

Noqueserefereàscavernas,estasapresentamtalheeafeiçoamentocuidado,secçãorectan-gulareexcepcionalrobustez.Todaspossuemembornaldesecçãorectangulareligaçãoàquilhacompostaporumaouduascavilhas,inseridasverticalmenteapartirdafacesuperiordacaverna.Apresentam dimensões idênticas, sendo excepção apenas as peças A1-143, ligeiramente maisestreita,eA1-179,bastantemaisgrossa,praticamenteodobro,queasrestantes.Estahomogenei-

A sobrequilha, por sua vez, encontrava-se deslocada da posição original, tombada lateral-mente.Com4,40mdecomprimento,apresenta,nazonadacarlinga,secçãoquadradacom35cmdelargurapor33cmdealtura.Odenteadoencontra-sepreservadopraticamenteaolongodetodaaextensãodapeça,desaparecendonosúltimos80cm,àmedidaqueasdimensõesdaprópriasec-çãosereduzem.Épossívelqueestareduçãosejaresultadodadegradaçãodasobrequilhaenãoconsequênciadoprocessoconstrutivo.Nafacesuperiordasobrequilha,sãovisíveisaindaduasgrandesconcreçõesdeferro,certamentecavilhasférreasqueefectuavamaligaçãoàquilha.Ofrag-mentodequilharecuperadoem2003apresentavatambémnafaceinferiortrêsgrandesconcre-ções,tendosido,aliás,norelatóriodaintervençãode2002,lançadaahipótesedecavilhamentodasobrequilhaàquilha(Castro,2003).

2.2.2. Cavername transversal

OconjuntoarquitecturaldonavioArade1aindacoesopreservavadezcavernas,novebraçosdo ladodeestibordo,dezbraçosdo ladodebombordoeseissegundos-braçostambémabom-bordo.Ocavernametransversalapresentavaumritmo“en plein, en vide”,umamalhaserradaquenãopermiteaexistênciadeespaçamentoentreosparescaverna/braço,numaclaracontinuaçãodasobservaçõesregistadasparaaextremidadedeproa(Loureiro,2004,p.60).

Noqueserefereàscavernas,estasapresentamtalheeafeiçoamentocuidado,secçãorectan-gulareexcepcionalrobustez.Todaspossuemembornaldesecçãorectangulareligaçãoàquilhacompostaporumaouduascavilhas,inseridasverticalmenteapartirdafacesuperiordacaverna.Apresentam dimensões idênticas, sendo excepção apenas as peças A1-143, ligeiramente maisestreita,eA1-179,bastantemaisgrossa,praticamenteodobro,queasrestantes.Estahomogenei-

Fig. 8 Identificaçãodascavernas,braçosesegundos-braçosnaplantageraldonavioArade1.

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dadedimensionalregistava-sejánascavernasC6aC17,que,àsemelhançadaspeçasagorareferi-das,seencontramtambémcavilhadasàquilha3.

Algumascavernasapresentamaindanaextremidadedebombordo(A1-145)ouemambasasextremidades(A1-161,A1-149eA1-140)tabuinhasdeenchimentoquepermitiamonivelamentodocavername,possivelmenteparamelhorassentamentodasescoas.

ÉtambémdereferirqueascavernasapresentamumaformaemprocessodeaberturaatéA1-59eemprocessodefechoapartirdeA1-149.Ascavernasentreestasduaspeçasapresentamumplãoplano,sendoexplicitamentevisívelopontoapartirdoqualashastescomeçamaarre-dondarparaacompanharacurvaturadosbraços.Factointeressanteéestascavernasapresenta-remumaformaidênticaàilustradanoLiuro da Fabrica das Naosparaacavernamestra(Oliveira,1580,p.107-108).

Opoçodabombaencontra-seescavadoentreascavernasA1-59eA1-143,atingindoaextre-midadedobraçoA1-60eapresentandoumaformacircularperfeitamenteafeiçoada.

Osbraços,porsuavez,apresentamsecçãoidênticaàdascavernas,atingindo,doladodebom-bordo,comprimentossuperioresa2m.Comefeito,apenasobraçoA1-180temumaspectomaisdelicadoelargurainferioràmédia,rompendo,aliás,comamalhadocavername,ouseja,apenasnestepontoexisteespaçamentoentreosdoispares.Àsemelhançadascavernas,osbraçosmostramtalhecuidadoepossuempraticamentetodos,naextremidadevoltadaparaaquilha,tabuinhasdeenchimento.

Noqueserefereàsligaçõescaverna/braço,estasefectuar-se-iamatravésdecavilhasdemadeiranumamédiade4/5cavilhasporpar.EsteritmoéinterrompidonascavernasA1-143eA1-161,cujocavilhamentoémaisabundante.UmaparticularidadedonavioArade1resideexactamentenosis-tema de pregadura do cavername. Com efeito, para além das ligações entre o par caverna/braço,observa-sealigaçãoentreosprópriospares,comexcepção,comoreferido,dosparesA1-179/A1-180eA1-181/A1-182.Aorientaçãoperfeitamentehorizontaldascavilhasétambémbastanteelucidativa,umavezquenosremeteparaaligaçãodocavernametransversalantesdacolocaçãodocasco.

Porsuavez,ossegundos-braços,emboraderobustezidênticaàdasrestantespeçasdecaver-name,apresentamumtalhemenoscuidado.Domesmomodo,nãoparecetersidopreocupaçãodoscarpinteirosamanutençãodeumamalhaplenanestaregiãodonavio.Ossegundos-braçosencontram-seexclusivamentecavilhadosaotabuadoexterior.

2.2.3. Forro

Tabuado exteriorAstábuasdecascodonavioArade1encontram-sedispostas“à franc bord”semqualquerliga-

çãoentreelas.Ouseja,trata-sedeumnavioqueapresentaumcascoliso,vulgarizadoemtodaafachadaatlânticaemediterrânicadesdeaAntiguidadeClássica.Astábuasencontram-sedirectaeunicamentefixasaocavernametransversaldonavio,numalógicadeduascavilhasporcaverna,braçoousegundo-braço,processoconstrutivoqueremonta,paraomesmoespaçoterritorial,àAltaIdadeMédia.

Contam-sedezfiadasdetábuasabombordodaquilha,numtotaldedezanovepeças,eseisaestibordo,numtotaldesetepeças.Aoníveldarelaçãoentreasduasmetadesdocascoédedestacaraaparentehomogeneidadedimensionaldastábuas,ouseja,emboraaspeçasapresentemtodasdimensõesdistintas,atábuaSt1BbapresentaumalarguraidênticaaSt1Eb,St2BbaSt2Ebeassimsucessivamente.

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Porsuavez,aligaçãoentreastábuasdeumamesmafiadaefectua-seatravésdeumaescarvalisahorizontalquepermiteumencaixedaspeçastopoatopo.Emboraastábuasdecascoseencon-tremfixasaocavernametransversalexclusivamenteporcavilhasdemadeira(numalógicadeduascavilhasporpeçadecavername4),nazonadaescarvapodemosobservar,semexcepção,apresençadedoispregosdeferro,numclaroreforçodaligaçãoentreastábuas,talcomosucedenaextremi-dadedeproadonavioArade1(Loureiro,2004,p.77).

Astábuasapresentamcomprimentosdiversos,podendoatingiros3,20m(St4Eb).Aslargu-rasoscilamentre25cmeos31,5cm,emboraadimensãomais comumse situeemtornodos28cm/29cm.Asespessurasoscilamentreos4,5cmeos5,5cm.

Étambémdereferiraexistênciadedoisconjuntosdetábuasmaisfinos,peçasdeligaçãoentreastábuasSt8BbeSt9Bb(St8/9Bb)eentreastábuasSt5BbeSt6Bb(St5/6Bb),situaçãojádetectadanoconjuntoestruturaldeproa,masparaoladodeestibordo(Loureiro,2004,p.77).Naregiãoesti-bordoexterioraosdestroços,foramaindaencontradasduaspossíveisprecintas—estastábuasapre-sentamumaespessuraquecorrespondeaodobrodadasvulgarestábuasdecasco.

Astábuasderesbordoapresentamcaracterísticasidênticasàsdasrestantestábuas,emboraaespessurasejaligeiramenteinferior.Domesmomodo,nãoexistequalquerescarvadeligaçãoentreastábuas,encontrando-seaspeçasapenasencostadastopoatopo.Estasnãoapresentamsistemadeligaçãoàquilha—aextremidadedecontactocomaquilhaemchanfroencaixadirectamentenoalefriz.Estaconstataçãovaiaoencontrodahipótesedequeospregosdeferrofixandoastábuasderesbordoàquilhaapenasexistemnaextremidadedeproadonavio(Loureiro,2004,p.79).

Tabuado interiorNesta região do navio Arade 1, os vestígios de tabuado interior são muito escassos, resu-

mindo-seàpresençadaescoadebombordoedatábuaimediatamenteaseguir,aindain situ.Quanto

Fig. 9 IdentificaçãodotabuadoexteriornaplantageraldonavioArade1.

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àspeçasamontoadasnaáreaSW,muitascorresponderãocertamenteatábuasdeforrointerior,masaindanãoseprocedeuàsuacompletaidentificação.

Aescoaapresenta3,50mdecomprimentoeespessuraidênticaàdatábuaseguinte(6cm),fechando,atravésdainserçãodetabiquesnaextremidadebombordodascavernas,oespaçoentreosbraços,demodoaevitarainfiltraçãodedetritos.Estapeçaencontrava-seligadaapenasaalgunsbraçosatravésdeumacavilhainseridanodentedaescoa.Muitosdosdentesforamfracturadosduranteoprocessodedesmontagemdonavio,porserimpossívelacolocaçãodeumaserraentreaescoaeobraço.In situencontravam-seaindanovetabiques.Estesnãoestavampregadosanenhumapeça,mostrando,pelaorientaçãooblíquaepeloentalamentoperfeitoentreosbraços,teremsidoinseridosamartelo.

Quantoà tábuade forro interiorpropriamentedita,nadaháa registar, exceptoopadrãoperfeitamente aleatório do cavilhamento às cavernas e braços, numa contradição ao verificadoduranteadesmontagem,em2002,dotabuadodaextremidadedeproadonavio(Castro,2003).

3. Análise e problemáticas

ArobustaconstruçãodonavioArade1évisíveltantoaoníveldocavernametransversalcomodocavernamelongitudinal.Todasaspeçasessenciaisdaembarcaçãoapresentamdimensõesesec-çõespoderosas,existindoumcuidadoespecialnoseutalheeafeiçoamento.Estaideiaderobustezétambémtransmitidapelamalhaplenadocavernameepeloprópriosistemadepregadura,base-ado,essencialmasnãoexclusivamente,emcavilhasdemadeira.Otabuadoliso,porsuavez,ondesão visíveis vestígios de uma argamassa branca certamente destinada à calafetagem das juntas,envolvetodoesteconjuntoestrutural,nãoparecendo,contudo,deterumpapelessencialnopro-cessoconstrutivo.

Fig. 10IdentificaçãodotabuadointeriornaplantageraldonavioArade1.

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Parajá,todososindíciosparecemapontaronavioArade1comoumaembarcaçãoconstruídacombasenoprincípio“esqueleto-primeiro”econcebidaatendendoàpredeterminaçãoformaldocavername—queristodizerqueaformadocascoparecetersidodefinida,recorrendoaprocessoseinstrumentosespecíficos,apartirdodesenhoindividualdaspeçasdocavername.Porém,antesdeseefectuaremquaisquerconclusõesdefinitivas,énecessárioatendereanalisarcuidadosamentealgunspontos:

⋅ embora o cavilhamento caverna/braço apresente orientação perfeitamente horizontal, énecessáriocompreendercomoseefectuaaligaçãoentreosdiversosparese,sobretudo,enten-derasuasignificaçãonopróprioâmbitodaarquitecturadonavio;

⋅ apesardeotabuadodecascoseencontrarexclusivamentefixoaocavername,éimportanteobservaremquesentidoseefectuaocavilhamento (exterior/interiorou interior/exterior),qualarelaçãoentreoposicionamentodascavilhasdemadeiraedospregosdeferroedequemodo,ouqualasequênciaemqueforaminseridosossegundos-braços;

⋅ ascavernasmaiscentraisapresentamumamorfologiamuitopróximadaretratadapeloPadreFernandoOliveiraparaacavernamestra,comofundoplanoehastesaencurvarcombasenomodelodacircunferência5.Será,contudo,interessanteanalisarseoarcoformadoporcadacavernadonavioArade1erespectivosbraçossebaseianumacircunferênciademesmocentroeseessecentroécomumatodasascavernas;

⋅ verificar se existe alguma relação geométrica entre a morfologia das peças do cavernametransversaleumaqualquerrelaçãodimensionalentreesteconjuntofuncionaleocavernamelongitudinal;

UmaoutraproblemáticaqueselevantaemtornodonavioArade1respeitaàrelaçãoentreascaracterísticasprimáriasdonavio,comosseusparticularismos,comumapossívelorigemregional.Porora,aexistênciadeumatradiçãodeconstruçãocomumaosestaleirosnavaisfluviaisemarítimosdaregiãodoArade,entendidanavertentedebaciafluvial,estuárioelitoralenvolvente,éapenasumalinhadeinvestigação,namedidaemqueasfonteshistóricassãoescassaseausentesdeinformaçãoeosvestígiosarqueológicosseresumemadoissítioscoerentes—umdosquais,GEO5,dedataçãoposterioraoséculoXVII(Fonseca,2005,p.15).Contudo,estalinhadeorientaçãonãodeveráserdeimediatocolocadadelado,sobretudoapósaidentificaçãodeumconjuntodeduasdezenasdeamos-trasdemadeirasprovenientesdaestruturadonavioArade1.Todososfragmentosforamidentifica-doscomopertencentesaogéneroQuercus, reconhecendo-seanívelespecíficomadeiradecarvalhocerquinho(Q. fagineaLam.)—73%dasamostras—edesobreiro(Q. suberL.)—11%asamostras(Quei-roz et al., 2005, p. 2). O carvalho cerquinho é, como se sabe, uma espécie de distribuição ibérica,enquantoosobreiroseencontrapresenteemtodaaregiãomediterrânica,peloqueumaprovávelori-gemregional,pelomenos,paraaproveniênciadasmadeirasnãoéumahipótesesemfundamento.

4. Considerações finais

Atéaomomento,alvodecincointervençõesarqueológicas(numtotalde245diasdetrabalhodecampo,perfazendo1237imersões,correspondendoa1700horasdemergulho),onavioArade1éumadasprioridadesdoCNANSnoâmbitodeumadassuaslinhasdeinvestigação,a“ArqueologiadeNavios”.DatadodeentreasegundametadedoséculoXVeaprimeirametadedoséculoXVII,estearqueossítioapresentaduplaimportância.

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Quadro 1. Datações de radiocarbono relacionadas com o navio Arade 1

Ano de datação Ref. do laboratório Natureza da amostra Tipo de amostra Idade (BP) Data calibrada (cal AD)

1σ 2σ

1972 GrN-7978 Desconhecida Madeira 325±25*

1992 ICEN-520 Desconhecida Madeira 420±50** 1433-1481 1410-1520

1563-1630

2003 Beta-179040 Cavilha Madeira 420±50*** 1430-1490 1420-1530

1560-1630

2003 Beta-179041 Braço Madeira 320±40*** 1500-1640 1460-1660

2003 Beta-179042 Caverna Madeira 350±40*** 1470-1530 1450-1650

1550-1630

* Nãoseconhecemascurvasdecalibração(Alves,1993,p.151-163).**StuiverePearson,1986,p.805-838.***Stuiveretal.,1998,p.1041-1083.

Porumlado,dopontodevistaarquitectural,destaca-sepeloseuexcelenteestadodeconser-vação.Entreosvestígiosnáuticosescavadosnacostacontinentalportuguesa,éoúnicoqueapre-sentapreservado,praticamentena íntegra, todoocavernamedesdearodadeproaatéàregiãomestra do navio, chegando a ultrapassá-la numa extensão, por ora, desconhecida. Do mesmomodo,aspeçasdemadeiraencontradasnasimediaçõesdaestruturacoesa,foradecontextomasperfeitamenteintactas,permitem-nosencararestenaviocomoumverdadeiropuzzlequeserápos-sível reconstruir a uma escala inusitada. Com efeito, a descoberta, a SW da estrutura, de umacavernadepopajábastantefechadapermitir-nos-álevantarhipótesesquantoàmorfologiadestaextremidadedoArade1,earecuperação,naregiãoenvolventedeestibordo,deduasprecintasé,porsuavez,significativanoquerespeitaàstécnicasdeconcepçãoeconstruçãodonavio.

Quanto à integração deste arqueossítio numa qualquer tradição de construção naval, osdadossãoaindabastanteescassoseapenasapósaconclusãodetodosostrabalhosdearqueografiaeanálisedasobservaçõesefectuadassepoderãocomeçaratecerhipóteses.Contudo,parececertoqueonavioArade1viráaindaasuscitardiversasquestões…

Noqueserefereàassociaçãodestenavioaredesdenavegaçãooucomércio,tambémnãosepodeparajáadiantarmuito.Aliás,esteétalvezumpontoquesemanteráparasempreinconclu-sivo,umavezqueosartefactoseosvestígiosvegetaisrecuperados,bastanteescassos,nadaadian-tam.Comefeito,oespóliorecuperadoentreascavernasenasimediaçõesdonavioArade1resume--seadoispratoseumatacinhadeestanho,aumaanforeta,aumcaldeirãoeafragmentosdiversosdecerâmicacomum,entreosquaisfoipossívelidentificarumpratoesmaltado,algumastaçasetacinhas(Castro,2003a;LoureiroeAlves,2005,p.46-68).Trata-se,nasuamaioria,depeçascarac-terísticasdosséculosXVIeXVII,porém,nãosepodeafirmarseeramcargaouobjectosdousoquotidianodatripulação.Domesmomodo,osgravetosdevideira6eosvestígiosdevime(LoureiroeAlves,2005,p.16) eanoz (Castro,2003a) encontradosentreocavernamenãosãoexplícitosquantoàsuafunção.

AúltimacampanhaarqueológicanosítioArade1,previstapara2007,incidiránaescavaçãodaáreaaSWdaestruturacoesa,queseencontrarepletadepeçasisoladas.Asobservaçõesefectua-dasnãopermitemprever,parajá,quesevenhaaencontrarumterceiroconjuntoarquitecturalemconexão.

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NOTAS

* Arqueóloga,BolseiraFundaçãoparaaCiênciaeTecnologia,

ColaboradoraCNANS/IPA.** Arqueólogo,CNANS/IPA.1 Ofragmentodequilharecuperadoem2003éconstituídopor

doistroçosunidosporumaescarvalisavertical,quesedesenvolvia

entreascavernasC8eC10.Afixaçãodaescarvaeraasseguradapor

duascavilhasemmadeiraqueatravessavamtransversalmentea

quilhaereforçadapordoispregosemferroinseridosnas

extremidadesdebombordoeestibordodaescarva.Estemétodode

fixaçãomistorevelaumsistemadecoesãolongitudinalrobusto

(Loureiro,2004,p.44-45).2 AoníveldacavernaC4,asecçãoapresenta22cmdealturapor

14cmdelargura(Loureiro,2004,p.45).Arodadeproavaimanter

umasecçãoidêntica(com25cmdealturapor17cmdelargura),

apresentandotambémalefrizaolongodetodaasuaextensão,

numaclaracontinuaçãodaquilha(Loureiro,2004,p.48).3 AscavernasC2aC5apresentamdimensõesquenãoobedecema

qualquerpadrão,assimcomoumaestruturamaisamplaerobusta

etalhemenoscuidado.Estascavernasdistinguem-seaindadas

restantespornãoapresentaremqualquersistemadefixaçãoà

quilha(Loureiro,2004,p.68-70).4 Naspeçasdelargurareduzida,observa-seapresençadeumaúnica

cavilha.5 ComorecomendanoLiuro da Fabrica das Naos,«Chamão couado

onde a cauerna começa a fazer a uolta para cima. A qual uolta ha de fazer

em redondo (…). Do couado para cima chamão braço. Este tambem ha

de uoltar em redondo, pellas mesmas rezões; & o seu couado ha de começar

a fazer sua uolta, de maneyra a que a uolta de ambos seja hữa mesma,

feyta com hum rol, & sobre hum mesmo centro»(Oliveira,1580,p.106).6 EstesforamidentificadospeloCentrodeInvestigaçãoem

PaleoecologiahumanaeArqueociênciascomoVitis viniferaL.

(Queirozetal.,2005,p.4-5)edatadospor14C,peloInstituto

TecnológicoeNuclear,de210±40BP,oquecorresponde,para

doissigma,aosintervalosprováveisde1530-1537calADe1635-

-1696calAD(SoaresePrudêncio,2005).

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