Transcript
Page 1: O que as feministas realmente pensam da jane austen

O Que As Feministas Realmente Pensam sobre Jane Austen1

Por Elizabeth KantorTradução de Márcia Bock Belloube

As feministas descobriram “The Jane Austen Guide to Happily Ever After” (algo como O Guia Jane Austen para Felizes para Sempre). Ou, no mínimo, decidiram que não podem continuar ignorando-o - e eles definitivamente não são vendidos na premissa.

Amanda Marcotte, escrevendo para a Slate, afirma que a nossa “obsessão em encontrar um cara para casar” tem muito pouco a ver com o porquê ler Jane Austen e, como ela sugere, “as mulheres apenas desfrutam de uma boa história”. (Não é uma estranha coincidência, porém, de desfrutarmos histórias construídas em torno deste único tema – a possibilidade de viver feliz para sempre com um cara – que são os mesmos temas dos livros de autoajuda e conselhos nas revistas femininas que consumimos tão vorazmente?).

Sara Seltzer reclama sobre a minha “absurda equação direta dos costumes sexuais da Inglaterra Regencial com os costumes de hoje”, mas é claro que ela não quer dizer que eu ache os padrões sexuais nos romances de Austen são os mesmos que os padrões sexuais de hoje. Ela quer dizer que eu acato os princípios de Austen vivenciados durante a sua vida real igualmente a sério, em vez de destituí-los arrogantemente na suposição de que se Austen fosse avançada para o século XXI, então é claro que ela estaria a bordo de pensamentos atuais iluminados e que ela seria, como Seltzer afirma, “tão legal como Cinquenta Tons de Cinza”.

A afirmação de Seltzer de que Austen aprovaria o S&M com temática erótica recebe um passe de Esther Zuckerman no Atlântico e que (por outro lado) reclama que estou afirmando que Austen pela sua ideologia conservadora porque eu acho que a autora de Razão e Sensibilidade – cujo erro trágico da heroína e deixar que um homem saiba que ela o ama antes de dele dizer que a ama – não aconselha mulheres a fazerem propostas de casamentos.

Zuckerman resume os argumentos de Seltzer: “Tentar adivinhar o que (os nossos autores favoritos) pensam sobre os conceitos que eles provavelmente não poderiam nem mesmo imaginar e redundante”. Sim, esse é o cerne da questão. Mas é realmente verdade que Austen “não poderia sequer imaginar” os problemas nos relacionamentos modernos?

Por uma questão de fato, há personagens nas novelas de Austen, cujas vidas amorosas são um pouco como a nossa realidade neste século XXI. Há a Lydia Bennet, que tem relações sexuais com um homem que está descaradamente usando-a e ela não tem ideia. Há Maria Bertram, se humilhando para um homem que já deixou bem claro que ele nunca vai amá-la. Temos a Sra. Clay, vivendo com um homem que não está pronto para se comprometer com ela e esperando que ele possa, eventualmente, ser “persuadido e carinhoso” para propor.

Obviamente, Austen estava ciente que você poderia ter o tipo de vida amorosa que define a tendência hoje. (E ela não ignorava o fato de que existiam argumentos

1 Texto originalmente em inglês, disponível em: http://www.huffingtonpost.ca/elizabeth-kantor/jane-austen-elizabeth-kantor_b_1814526.html

Page 2: O que as feministas realmente pensam da jane austen

principistas para eles – defensores do amor livre: Mary Wollstonecraft, William Godwin, William Blake e Percy Shelley eram todos seus contemporâneos). Mas ela não pinta este estilo de relacionamento como particularmente sábio, particularmente admirável ou particularmente atraente.

Que abordagem realmente reduz o trabalho de Jane Austen? Tomando seus princípios a sério e perguntando como suas ideias poder ser aplicadas hoje? Ou dispensar suas ideias sobre amor e sexo – sempre que elas não sobreponham como opinião moderna esclarecida – como preconceitos cegos que certamente cresceriam para fora se nós pudéssemos levá-lo para o século XXI? A proposta de Seltzer reescrita das novelas está na linha com opção #2:

“Estou convencida de que, se esses livros fossem escritos hoje, Austen iria responder a nossas vidas: Lizzy dormiria com Wickman, Marianne com Willoughby, Anne com Wentworth na primeira vez. Fanny Price até poderia ter uma segunda chance com Henry Crawford. Mas em seguida, eles seriam como: ‘oops, ele é um merda! Posso namorar meu primo agora? ’”.

Algo parece ter-se perdido na tradução. Será que os romances ao longo destas linhas ainda têm o poder dos romances reis da Jane Austen?

É uma pena terrível descartar os princípios dos livros da Jane Austen como os preconceitos que ela teria abandonado em uma idade mais avançada. Afinal, suas ideias não acabam com as observações (não particularmente surpreendente) que viver com um cara não é a maneira ideal para leva-lo ao altar e que a intimidade bem vem com um risco de “ligação” que é maior para as mulheres do que para os homens.

Os princípios de viver das suas heroínas do período regencial não são realmente “tradicionalistas” em tudo. Elas só olham desta maneira em um mundo onde alguns fatos mais evidentes, sobre os homens e mulheres, têm sido obscurecidos por uma ideologia que já estava sendo proposta durante a vida de Jane Austen, que ela não comprou, mas que, eventualmente, triunfou tão completamente que, agora, é quase impossível para nós imaginar que qualquer pessoa inteligente nunca pensou diferente. Mas Austen fez. Ela não apenas aderiu cegamente às crenças dos dias anteriores. Ela realmente pensava sobre amor, sexo, relacionamentos e em como os homens e mulheres poderiam ser felizes juntos. E sendo um gênio, ela veio com muitas informações valiosas das quais nós podemos nos beneficiar – se levarmos a sério.