ODONE GINO ZAGO NETO
O CONTEÚDO FORMAL NA REPRESENTAÇÃO
IMAGÉTICA DOS MODELOS ATÔMICOS
Santa Maria, RS
2018
ODONE GINO ZAGO NETO
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O CONTEÚDO FORMAL NA REPRESENTAÇÃO
IMAGÉTICA DOS MODELOS ATÔMICOS
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ensino de Ciências e Matemática da Universidade Franciscana, como requisito parcial para obtenção do título de mestre em Ensino de Ciências e Matemática com ênfase em Ensino de Química.
Orientador: Dr. GILBERTO ORENGO
Santa Maria, RS
2018
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Elaborada pela Bibliotecária Eunice de Olivera CRB/10 - 1491
Z18c Zago Neto, Odone Gino
O conteúdo formal na representação imagética dos
modelos atômicos / Odone Gino Zago Neto,
orientação Gilberto Orengo – Santa Maria, 2018.
114 f. : il.
Dissertação ( Mestre em Ensino de Ciências e
Matemática ) – Programa de Pós-graduação em Ensino
de Ciências e Matemática – Universidade Franciscana
1. Modelo 2. Átomo 3. Molécula 4. Eletrosfera e
núcleo I. Orengo, Gilberto II. Título.
CDU 53
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RESUMO
A proposta desta pesquisa é relacionar a construção da representação imagética do átomo com o
conteúdo formal da Química estudado no ensino médio. O público-alvo foram alunos de uma escola
particular de Santa Maria, RS, e por intermédio da elaboração de desenhos de átomos e moléculas
foi analisada a presença de conteúdos da Química formal como: modelos atômicos, característica
elétrica da matéria e ligações entre átomos. O estudo utilizou como referencias as teorias de
aprendizagem de Lev Vigotsky e as teorias objeto-modelo de Mario Bungue. Nela foi investigado o
nível de aprofundamento e entendimento da estrutura atômica e sua aplicação nos estudos da
Química. Justifica-se a relevância dessa pesquisa devido ao constante transito dos estudos formais
de Química aos distintos universos visíveis e invisíveis. Nessa perspectiva, o invisível aos olhos,
criado e imaginado na mente do homem, explica os fatos concretos estudados nos experimentos
laboratoriais. Logo, para compreender como o estudante faz essa transição é necessário verificar
como ele imagina o mundo invisível aos olhos e como ele aplica esses conhecimentos na
compreensão do mundo visível. Os procedimentos metodológicos caracterizam uma pesquisa
qualitativa e quantitativa do tipo de estudo de caso baseada na elaboração, por estudantes, de
desenhos de átomos e moléculas e posterior aplicação de um questionário. A análise de dados da
pesquisa demostrou que a representação pictográfica utilizada para desenhar os átomos foi de um
modelo atômico mais complexo, por outro lado, a representação imagética das moléculas seguiu o do
modelo mais simples. Foi verificado ainda que há excelência na representação da eletrosfera, porém,
não do núcleo. Observa-se que muitos participantes da pesquisa não tem esclarecida a ideia de
modelo, porém, uma grande maioria os utiliza constantemente para melhor compreender a Química.
Palavras-chave: modelo, átomo, molécula, eletrosfera e núcleo.
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Abstract The proposal of this research is to relate the imagery representation building of the atom with the
formal content of the studied Chemistry in high school. The audience was private school students of
Santa Maria, RS, and through the elaboration of drawings of atoms and molecules has been
examined for the presence of Chemical content as: Atomic models, electrical characteristic of matter
and links among atoms. The study used as references the learning theories of Lev Vigotsky and
object-model theories of Mario Bungue. It was investigated the level of development and
understanding of atomic structure and itsr application in the studies of chemistry. As a way to justifiy
the relevance of this research due to the constant traffic of chemistry studies formal to the different
visible and invisible universes. In this perspective, the invisible to the eye, created and imagined in the
mind of man, explains the facts studied in laboratory. To understand how the student does this
transition is necessary to verify how he imagines the world invisible to the eye and how he applies this
knowledge in understanding of the visible world. The methodological procedures characterizing a
qualitative and quantitative research of study type case based on the elaboration, by students, of
drawings of atoms and molecules and subsequent application of a questionnaire. The analysis of the
survey`s data showed that the pictographic representation used to draw the atoms was a more
complex Atomic model, on the other hand, the imagery representation of molecules stick to the
simplest model. It was verified that there is still excellence in eletrosfera the representation, but not the
core. It is observed that many participants of research have clarified the idea of model, however, a
vast majority use them constantly to better understand the chemistry.
Keywords: model, atom, molecule, eletrosfera and core.
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Lista de Ilustrações
Figura 1 – Modelo Atômico de Dalton: Esfera maciça, neutra e indestrutível.......................................17
Figura 2 – Foto de um copo de água – Uma visão macroscópica da água...........................................19
Figura 3 – Representação dos átomos de oxigênio (azul) e hidrogênio (vermelho) segundo o modelo
de Dalton para molécula de água..........................................................................................................19
Figura 4 – Esquema básico de funcionamento de um tubo de Crookes...............................................20
Figura 5 – Modelo Atômico de Thomson...............................................................................................22
Figura 6 – Anna Bertha Roentgen e chapa de raios x de sua mão.......................................................25
Figura 7 – Experimento de Becquerel...................................................................................................26
Figura 8 – Desenho representando o experimento que levou a descoberta das partículas alfa e beta e
das radiações gama..............................................................................................................................29
Figura 9 – Experimento de difração das partículas alfa (α)...................................................................31
Figura 10 – O modelo atômico proposto a partir das ideias de Rutherford, Geiger e Marsden (1911).32
Figura 11 – As trajetórias em espiral possíveis para os elétrons próximos ao núcleo..........................33
Figura 12 – As trajetórias em espiral possíveis para os elétrons mais afastados do núcleo................34
Figura 13 – Espectro contínuo obtido da radiação solar.......................................................................35
Figura 14 – Esquema de um espectroscópio para obtenção do espectro atômico de emissão...........36
Figura 15 – Espectros de emissão do hidrogênio, do sódio e do hélio.................................................36
Figura 16 – Modelo atômico de Bohr com todas as sete órbitas circulares no mesmo plano..............43
Figura 17 – Elétrons só podem ficar em órbitas cujas energias são permitidas...................................44
Figura 18 – Elétrons de mesma energia ficam em uma mesma órbita.................................................45
Figura 18-A – Elétron absorvendo energia suficiente para dar um salto quântico................................45
Figura 18-B – Elétron excitado em um estágio estacionário de maior energia.....................................46
Figura 19-A – Elétron excitado em um estágio estacionário de maior energia retornando ao estagio
estacionário de menor energia..............................................................................................................46
Figura 19-B – Elétron no estado fundamental de energia....................................................................47
Figura 20 – Origem das raias espectrais com base no modelo atômico de Bohr..............................48
Figura 21 – Átomos de Carbono e Nitrogênio com as três partículas subatômicas segundo o modelo
atômico de Bohr.....................................................................................................................................50
Figura 22 – Estímulo, Signo e Resposta...............................................................................................61
Figura 23 – Elementos Organógenos....................................................................................................78
Figura 24 – Fórmula de Lewis do Propano (um dos componentes do gás de cozinha).......................79
Figura 25 – Fórmula Estrutural Plana do Etanol....................................................................................79
Figura 26 – Representação dos átomos de carbono, nitrogênio, oxigênio e hidrogênio, seguindo o
modelo de Rutherford-Bohr, elaborados pelo participante A04.............................................................82
Figura 27 – Representação dos átomos de carbono, nitrogênio, oxigênio e hidrogênio seguindo o
modelo de Rutherford-Bohr com órbitas parciais elaborados pelo participante A11............................83
Figura 28 – Representação dos átomos de carbono, nitrogênio, oxigênio e hidrogênio seguindo um
modelo próprio como uma esfera com camada de valência elaborados pelo participante A21...........83
7
Figura 29 – Estímulo, Signo e Resposta...............................................................................................85
Figura 30 – Representação da molécula do etanol utilizando para os átomos da molécula o modelo de
Dalton (átomo esférico maciço e neutro) elaborado pelo participante A09...........................................90
Figura 31 – Representação da molécula do etanol utilizando para os átomos da molécula o modelo de
Rutherford-Bohr (átomo nucleado com elétrons em órbitas circulares de energia quantizada)
elaborado pelo participante A12............................................................................................................91
Figura 31 – Representação da molécula do etanol utilizando para um modelo de átomos pontuais em
estruturas tetraédricas elaborado pelo participante A06.......................................................................92
Figura 33 – Representação da molécula do etanol utilizando átomos como letras em estruturas
tetraédricas elaborado pelos participantes A10, A26 e A29 respectivamente......................................92
8
Lista de Tabelas
Tabela 1 – Modelos Atômicos Apresentados Nos Desenhos de Átomos.............................................84
Tabela 2 – Questão Cinco: A Escolha do Modelo.................................................................................86
Tabela 3 – Estruturas do átomo apresentada no desenho...................................................................88
Tabela 4 – Questão sete: Características Importantes em um Desenho do Àtomo..............................89
Tabela 5 – Modelos Atômicos Apresentados Nos Desenhos das Moléculas........................................93
Tabela 6 – Modelos Atômicos Utilizados Nos Desenhos de Moléculas................................................95
Tabela 7 – Aspecto Relevante nos desenhos dos Átomos nas Moléculas...........................................97
Tabela 8 – Uso dos Modelos Atômicos na Compreensão da Química.................................................97
Tabela 9 – Uso dos Conhecimentos de Química Aplicado aos Desenhos de Átomos e Moléculas.....99
Tabela 10 – O Conceito de Modelo Atômico.......................................................................................101
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .........................................................................................................9
1.1 JUSTIFICATIVA...................................................................................................12
1.2 OBJETIVOS.........................................................................................................14
2 REVISÃO DE LITERATURA .................................................................................16
2.1 A EVOLUÇÃO DOS MODELOS ATÔMICOS.....................................................16
2.1.1 Lavoisier, Dalton e os Elementos ...................................................................................16
2.1.2 Radiações e o Modelo Atômico de Thomson .................................................................19
2.1.3 Raios X, Radioatividade e o Modelo de Rutherford ........................................................23
2.1.4 A Luz, os Espectros e o Modelo Atômico de Bohr ..........................................................34
2.2 TEORIA SOCIOINTERACIONISTA de LEV VIGOTSKY ...................................51
2.2.1 Lev Seminivich Vigotsky..................................................................................................51
2.2.2 Filogênese, ontogênese, sociogênese e microgênese....................................................52
2.2.4 Bases da Teoria Sociocultural de Lev Vigotsky...............................................................54
2.2.5 Vigotsky e a educação.....................................................................................................62
2.2.6 A Química, os signos, os objetos e a linguagem ............................................................66
2.3 EPISTEMOLOGIA DE MARIO BUNGUE ...........................................................68
2.3.1 Mario Bungue...................................................................................................................68
2.3.2 A Matemática e as Pesquisas..........................................................................................68
2.3.3 Os Objetos-modelo e o Modelo Teórico..........................................................................69
2.3.4 A Caixa Preta e o Modelo................................................................................................70
2.3.5 Objeto-modelo e os Modelos Teóricos............................................................................72
2.3.6 Modelos nas Ciências Naturais.......................................................................................74
3 METODOLOGIA.....................................................................................................77
3.1 Caracterização da Pesquisa..............................................................................77
3.2 O Contexto da Pesquisa....................................................................................77
3.3 Instrumentos de Coleta de Dados....................................................................80
4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS............................................82
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................102
REFERÊNCIAS........................................................................................................106
APÊNDICES.............................................................................................................111
APÊNDICE A...........................................................................................................111
APÊNDICE B...........................................................................................................112
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1 INTRODUÇÃO
A Química constitui uma ciência estruturada a partir do uso de uma
linguagem específica cujos conceitos e imagens transitam entre dois mundos, o
macroscópico e o nanoscópico. Quando avaliamos a evolução do pensamento
científico relacionado à Química Moderna verifica-se que ele foi estruturado a partir
da lei da conservação da massa (Lei de Lavoisier) e das novas concepções dos
elementos químicos, que estabeleceram, praticamente, desde seu princípio, íntima
relação entre os estudos do comportamento da matéria concreta e observável e o
mundo invisível dos átomos. O experimentalismo químico desenvolvido desde a
alquimia e fundamentado na relação concreta entre individuo e objeto transformado
necessitava, para uma evolução científica, de compreensão mais profunda da
natureza da matéria. Foi assim que o atomismo grego redimensionado por Dalton,
dentro dos princípios científicos de sua época, forneceram subsídios teóricos para
essa evolução. Nessa perspectiva, o invisível aos olhos, criado e imaginado na
mente do homem, explica os fatos estudados nos experimentos laboratoriais.
O primeiro modelo atômico científico criado pelo inglês John Dalton originou
uma imagem que relacionava os conhecimentos da realidade científica de sua
época: o início da revolução industrial e da Química moderna. Assim que os
conhecimentos químicos se ampliaram e a matéria se revelava mais complexa, seu
modelo começa a ficar obsoleto e a necessidade humana de visualizar esse novo
mundo invisível dos fundamentos da matéria vai criando adaptações que agregam
as novas representações imagéticas aos conhecimentos novos adquiridos. A
evolução da imagem que temos da representação imagética dos átomos segue o
critério normal da evolução do pensamento científico, mas, para a educação,
representa algo significativo que remonta a um processo de evolução científica da
humanidade e, ao mesmo tempo, apresenta aos estudantes a grande revolução que
nos levou ao mundo atual mostrando a Química como uma ciência voltada para
explicar a natureza e as tecnologias geradas pela ação do homem. Os referenciais
teóricos que geraram os modelos atômicos estão calcados nos métodos científicos
e, por isso, é importante situar determinada representação imagética do átomo ao
seu momento histórico. Para Westhal e Pinheiro (2011, p. 592):
[...]mesmo a popularidade de uma teoria, não prova a sua veracidade. Em ciências, as teorias são postas em provas fazendo-se predições
11
com ajuda de leis e dados. Se estas predições falham, a teoria é considerada falsa, ou pelo menos, pouco verdadeira...
Desta forma, apesar de, num dado momento, não podermos garantir estarmos diante de uma verdade completa e absoluta, as provas observacionais e experimentais, com frequência, nos fornecem indicações de verdades parciais, que, com o passar do tempo, como mostra a História da Ciência, revelam-se interessantes e suficientemente verdadeiras, a ponto de estimular novas investigações que, por sua vez, podem alcançar melhores aproximações com a realidade.
A compreensão de que uma imagem posta em desenho, figura, fotografia ou
filmagem representam apenas o simbolismo de parte de uma realidade, trata-se de
fator relevante na análise da compreensão de uma representação imagética. Para
os modelos atômicos isso pode tornar-se mais complexo devido ao fato de sofrerem
evolução na sua imagem devido ao crescimento dos conhecimentos científicos. Mas,
essa realidade parcial carrega em si a aproximação da imagem da realidade, para
Bunge (1985, p. 13):
Podemos decir de um relato o de uma pintura, de uma teoria o de um diseño técnico, que son realistas em maior o menor grado. Em essos casos ´realista` significa ´conforme com (fiel a la) realidade`. Por ejemplo. La pintura flamenca o la mecánica cuántica son realistas, entanto la literatura fantástica e las teorias econòmicas de la compete perfecta son irrealistas.
1
Quando estruturamos certo modelo, estamos supondo ser esse
representante de determinada realidade. No caso dos modelos atômicos, há o
objetivo de expor a representação imagética da realidade imediata de fatos
observados no cotidiano e nos experimentos científicos. As deformações do modelo
ou da compreensão dessa realidade ocorrem por desconhecimento de determinadas
características dos sistemas ou pela inexistência de experimentos ou fatos novos
que justifiquem de imediato sua refutação parcial ou total.
As ciências podem ser divididas em formais ou fáticas. Na ciência formal, há
a busca da explicação utilizando linguagem adequada e simbólica que se relaciona
diretamente ao estudo científico realizado. Já na ciência fática, há relação com a
1 Tradução livre da citação feita pelo autor: Podemos dizer de um realato ou de uma pintura, de uma
teoria ou de um desenho técnico, que são realistas em maios ou menor grau. Nesses casos ‘realista’ significa ‘conforme a (firl a) realidade’. Por exemplo: A pintura flamenca ou a mecânica quântica são realistas, enquanto a literatura fantástica e as teorias econômicas da competição perfeita são irrealista.
12
aplicação da ciência formal ás necessidades humanas como, por exemplo, dentro
dos processos de formação e produção de novas substâncias (Bunge, 2014).
Segundo Bunge (2014, p. 7):
De esta manera, las ciencias formales jamás entran en conflicto con la realidad. Esto explica la paradoja de que, siendo formales, se "aplican" a la realidad: en rigor no se aplican, sino que se emplean en la vida cotidiana y en las ciencias fácticas a condición de que se les superpongan reglas de correspondencia adecuada.¨ Tenemos así una primera gran división de las ciencias, en formales (o ideales) y fácticas (o materiales). Esta ramificación preliminar tiene en cuenta el objeto o tema de las respectivas disciplinas; también da cuenta de la diferencia de especie entre los enunciados que se proponen establecer las ciencias formales y las fácticas: mientras los enunciados formales consisten en relaciones entre signos, los enunciados de las ciencias fácticas se refieren, em su mayoría, a entes extracientíficos: a sucesos y procesos.
2
Na educação química, utilizam-se as duas maneiras que a ciência pode se
apresentar. No caso do estudo dos modelos atômicos, assunto dessa pesquisa,
utilizam-se as imagens para representar conjuntos de informações preciosos para a
explicação de vários fatos científicos estabelecendo uma inter-relação entre o
pictórico relacionado ao conhecimento formal da ciência com a aplicação
relacionada ao cotidiano e a tecnologia gerada por esse conhecimento.
No ensino médio, são estudados de maneira formal quatro modelos
atômicos que são, em ordem cronológica, os modelos atômicos de Dalton,
Thomson, Rutherford e Bohr. No referencial teórico dessa pesquisa é feito um
levantamento da evolução histórica de cada um desses modelos para a melhor
compreensão e acompanhamento de como o desenvolvimento do pensamento
científico, em cada momento que novas descobertas foram surgindo, interferiu na
representação imagética do átomo. Com base na representação imagética desses
quatro modelos serão estabelecidos os fundamentos necessários à compreensão
dos fenômenos químicos da matéria. A formação simbólica das imagens desses
quatro modelos facilita a evolução do pensamento da concretude para a formalidade
e pode ser utilizada para explicar fatos reais e experimentais com imagens
2 Tradução livre feita pelo autor: Dessa maneira, as ciências formais jamais entram em conflito com a
realidade. Isso explica o paradoxo de que, sendo formais, se ¨aplicam¨ a realidade: na verdade não se aplicam, senão pelo fato de serem empregadas na vida cotidiana e nas ciências fáticas com a condição de que se suponham regras de correspondência adequadas. Temos assim uma primeira grande divisão das ciências, em formais (ou ideais) e fáticas (ou materiais). Esta ramificação preliminar tem em conta o objeto ou tema das respectivas disciplinas; também da conta da diferença de espécie entre os enunciados que se propõem estabelecer as ciências formais e as fáticas: portanto os enunciados formais constituem em relações entre signos, os enunciados das ciências fáticas se referem, em sua maioria, a situações extracientificas: a sucessos e processod.
13
relacionadas aos conteúdos formais. Compreender como os alunos imaginam o
átomo e interpretar a representação imagética que eles são capazes de produzir ou
reproduzir nos faz entender o nível de aprofundamento e de formalização de suas
ideias com relação à estrutura fundamental de seu universo concreto.
É importante observar que devemos ter consciência que cabe aos
professores mostrar que a adequação da imagem dos átomos deve-se a aquisição
de novos conhecimentos científicos e estabelecer o uso dessas imagens na
representação das teorias abordadas na Química.
1.1 JUSTIFICATIVA
A Química, no ensino médio, tanto em propostas curriculares mais
tradicionais quanto nas modernas3 pode ser dividida em quatro grupos fundamentais
de conteúdos que são: Química Geral, Cálculos Químicos e Soluções, Química
Orgânica e Físico-Química. Seus conteúdos e linguagens específicas são estudados
e distribuídos em três anos com cargas horárias que variam de uma escola para
outra. No ensino médio a Química Geral mostra os fundamentos da Química, nela
são introduzidos os conceitos básicos dessa ciência, bem como seu vocabulário
específico e as bases teóricas que sustentam a compreensão da Química nos
conteúdos envolvendo os Cálculos Químicos, Química Orgânica e Físico-Química.
Na Química Geral, abordada no primeiro ano do ensino médio, são estruturadas as
fundamentais relações científicas entre o mundo macroscópico, relacionado
diretamente com os sentidos, e o universo nanoscópico que se envolve com um
mundo imaginário, mas que busca explicar e justificar o comportamento
macroscópico da matéria. É inserida nessa relação que se estrutura um dos
momentos mais importantes dos estudos da Química: o aprendizado dos modelos
atômicos. Esses são, na verdade, representações imagéticas fundamentadas em
estudos, teorias e experimentos envolvendo a matéria sensível. A explanação do
conteúdo cria um modelo mental das estruturas básicas da matéria cuja abordagem
3As propostas mais modernas apresentam um posicionamento diferente de conteúdos e conceitos
que criam um novo caminho para a aquisição do conhecimento químico. Exemplos são as propostas curriculares de Química do ENEM e do Estado de São Paulo.
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pode atingir a percepção e a dimensão cognitiva gerando a formação da imagem
que ganha, então, um significado científico. Para Silva (2006, p. 72):
Imagens são recursos largamente utilizados há séculos por nós, professores de ciências, e vários trabalhos, entre eles os de Perales e Jimenez (2002), Amador e Carneiro (1999), Martins et al. (2003), vêm trazendo contribuições importantes para compreensão de sua utilização. Parece ser unânime a ideia de que imagens não são imediatamente transparentes e, portanto, precisam ser explicitamente trabalhadas.
Na primeira fase dos estudos de Química, é estruturada a formação
fundamental sobre um universo invisível aos olhos em que entram conceitos com
relações imagéticas os átomos, moléculas, ligações interatômicas, ligações
intermoleculares entre outas que serão a base para a compreensão plena de todo o
conteúdo de química que será visto posteriormente.
Na educação química, em todos seus níveis de estudo, há, entre os
professores, imensas preocupações que estão diretamente relacionadas com o
como educar em química. Dai surgem vários questionamentos e, entre eles: se, no
estudo da Química, há a necessidade de trânsito entre o universo sensível e o
imaginário, será que os alunos conseguem fazer a transição entre os dois
universos?
O conteúdo quando compreendido, assimilado e formalizado pode ser
traduzido em inter-relações de imagens desses universos. Devido ao amplo contato
com o mundo concreto a formação da representação imagética é mais simples, pois,
estamos desde o nascimento nos relacionando com o mundo dos sentidos. Por
outro lado, mesmo nos estudos formais isso é instigado desde os primeiros contatos
com a ciência. Com relação a representação imagética dos átomos e moléculas, que
observamos ser relevantes para o ensino de Química, pois, são utilizadas como
fundamentos em muitas abordagens, imagina-se que os modelos atômicos
fornecidos dentro do conteúdo base deveria apresentar as respostas não somente
teóricas mas, também simbólicas que seriam evidenciadas em representações
imagéticas adequadas à compreensão dos assuntos relacionados à Química das
ligações, das moléculas e das substâncias geradas por elas podendo criar, a partir
delas, uma chuva de questionamentos que daria mais sentido ao significado da
palavra modelo e instigaria muitos alunos a propor respostas as falhas dos modelos.
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1.2 OBJETIVOS
Na fundamentação teórica dessa pesquisa, baseada na história da ciência, é
apresentada a evolução do pensamento científico que levou a estruturação dos
quatro modelos atômicos fundamentais utilizados nos estudos da Química no ensino
médio e, auxiliares na compreensão de seus fenômenos fundamentais. Cada
modelo apresenta características que demonstram, cronologicamente, uma evolução
no conteúdo formal. A representação imagética deles pode nos fornecer dados
relativos a características estruturais dos átomos de acordo com o imaginário do
desenhista e fornece, de forma muito direta, uma inter-relação entre a profundidade
de imersão do aluno no conteúdo formal com relação aos estudos da estrutura
atômica. Esse desenho fornece subsídios para compreender como ele aplica e
relaciona esses fundamentos imagéticos aos conteúdos de Química.
Tendo a imagem real a máxima iconicidade, então, nenhum desenho
representa a realidade, quanto mais próximo dessa realidade mais icônica é a
imagem. Para Souza (2014, p. 128) o grau de realidade com que uma imagem se
relaciona com a realidade que representa passa por diferentes níveis, desde a
igualdade total (iconicidade máxima) até a abstração total.
As figuras criadas para representar a realidade dos átomos apresentam,
devido a sua evolução, conteúdos formais cumulativos que aparecem na
representação pictográfica, permitindo sua analise. Logo, podemos dizer que o
modelo de Dalton é menos icônico que o de Thomson, pois, nesse é acrescentada a
natureza elétrica da matéria, porém, o modelo de Thomson é menos icônico que o
de Rutherford cuja presença do núcleo e da eletrosfera demostram maior
proximidade com a realidade e podemos dizer que, nos estudos da Química do nível
médio, o modelo mais icônico é o de Bohr por ser o que apresenta mais detalhes.
Assim, Bohr fornece o modelo que melhor explica a realidade e que se relaciona de
forma mais profunda aos conteúdos vindouros.
Segundo Silva (2006, p. 78):
Podemos dizer que o referente das imagens nunca é propriamente o objeto em si representado, pois essa representação nunca é perfeita, sendo sempre um produto de uma construção. Objetos mais icônicos também não representam a realidade tal como ela é. Toda imagem da realidade é sempre produto de uma construção. O ato fotográfico, por exemplo, não é senão fruto de cortes, de um enquadramento que recorta o real sob um certo ponto de vista...
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Dessa maneira, essa pesquisa se estruturou com base na dúvida que existe
na relação entre a imagem representada pelo aluno e o conteúdo formal por ele
estudado no ensino médio. Como cada modelo atômico representa um conjunto de
conteúdos formais, surge dai a questão: quais as concepções teóricas que
embasam a representação imagética dos átomos, em nível nanométrico, na
elaboração de modelos atômicos por alunos do ensino médio de uma escola privada
de Santa Maria?
O objetivo principal dessa pesquisa que é: Identificar, analisar e compreender
qual o modelo utilizado na representação imagética do átomo, utilizada por alunos
de uma turma de terceiro ano de uma escola privada de Santa Maria.
Como a exigência do estudo das moléculas, dentro da Química, é muito mais
importante que os estudos dos retículos surgiu à necessidade de verificar qual tipo
de representação imagética os alunos utilizam para desenhar os átomos na
formação das moléculas. Como na elaboração da figura de cada tipo de modelo
atômico existe o envolvimento de determinados conteúdos formais surgiram alguns
objetivos específicos são:
1. Identificar se a representação imagética envolve a apresentação de
conteúdos formais, aprendidos na abordagem dos modelos atômicos, referentes as
características elétricas do átomo e a valência;
2. Analisar como o aluno entende a ideia de modelo;
3. Identificar qual o modelo atômico formal será utilizado pelos alunos para
representar os átomos nas moléculas;
4. Identificar como o aluno representa as ligações químicas nas moléculas.
Assim, um conhecimento formal utilizado em toda a Química, estruturado nos
estudos do início do primeiro ano do ensino médio será tanto mais claro quanto
melhor for o modelo imagético representado.
Essa pesquisa buscará justamente identificar como os alunos representam
os átomos em nível nanométrico fazendo uma análise de alguns conteúdos formais
que estão relacionados a cada uma das representações imagéticas geradas por
eles.
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2 REVISÃO DE LITERATURA
2.1 A EVOLUÇÃO DOS MODELOS ATÔMICOS
2.1.1 Lavoisier, Dalton e os Elementos
A ideia da existência do átomo foi algo que surgiu na Grécia antiga como
uma visão meramente filosófica, porém, os modelos atômicos científicos só foram
elaborados muito mais tarde com base em questionamentos que foram publicados
no mesmo ano da revolução francesa. Em 1789, Antoine Laurent Lavoisier (1743-
1794) publica o livro Tratado de Química Elementar (Traìtè Elémentaire de Chimie)
que introduz a ideia da matéria sensível ser formada por trinta e três elementos e
não quatro como se imaginava. Acompanhando as ideias dessa nova perspectiva
sobre os elementos, Lavoisier, nesse livro, divulga a Lei da conservação da massa,
primeira lei experimental da Química, e, possivelmente aquela que proporcionou a
ela o ¨status¨ de Ciência. Segundo essa lei, nas transformações da matéria a massa
sempre se conserva, ou seja, se tivermos um quilo de substâncias que reagem,
considerando um rendimento de 100% para a reação, teremos um quilograma de
produtos, nem um grama a mais e nem um grama a menos. Apesar dessa grande
descoberta, Lavoisier não consegue explicar o motivo dessa conservação. O que a
massa teria de tão excepcional que a tornaria invariável nas transformações? Essa
dúvida corroeu seus pensamentos até sua morte em 1894. No livro Ciência –
História e Realidade de A. Sutcliffe e A.P.D. Sutcliffe (1976, p. 53), os autores
descrevem essa passagem da seguinte maneira:
Lavoisier, como a maioria dos fazendeiros-gerais, foi condenado à morte e, segundo a praxe daqueles dias, a sentença foi executada dentro de poucas horas após lavrada. Durante o julgamento se tentou lembrar os grandes serviços que Lavoisier prestara à França, mas o esforço foi inútil. Também houve pedido, ao que se diz, seja do próprio Lavoisier seja de alguém por ele, no sentido de adiar a sentença por uma quinzena para permitir que ele terminasse algumas importantes experiências. Foi nessa altura do julgamento, afirma-se, que Coffinhall teria feito sua notória observação de que ¨A república não precisa de cientistas, e a justiça deve seguir seu curso (baseado no livro de T. E. Thorpe, Essays on Historical Chemistry, (1888), p. 107.).
Dessa maneira o grande cientista Lavoisier morre guilhotinado como um
fazendeiro-geral, uma espécie de cobrador de impostos da época. Mas, seu legado
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científico ganhava força na mente de outros grandes pensadores e, em pouco
tempo, o mistério da conservação da massa começa a ser desvendado. Na
Inglaterra, na cidade de Manchester, o químico Joseph John Dalton (1766-1844)
publica, em 1808, em seu livro New System of Chemical Philosophy, uma nova
concepção sobre a estrutura fundamental da matéria e reestrutura de maneira formal
o atomismo grego de Leucipo e Demócrito, proposto a, aproximadamente, 400 anos
antes de cristo. Segundo Filgueiras (2004, p. 42),
A primeira comunicação oral da teoria de Dalton a respeito de sua teoria atômica foi lida por ele na Sociedade Literária e Filosófica de Manchester em 21 de outubro de 1803...Dalton em sua obra principal, saída à luz a partir de 1808, o New System of Chemical Philosophy...ousou onde Lavoisier não tinha sequer especulado.
Dalton, usando os fundamentos da Química moderna, sedimentados agora
nas poderosas leis ponderais, que regem os estudos das reações químicas até os
dias de hoje agregado a seus estudos de matemática e física procura explicar o
comportamento da matéria sensível e nos leva, com isso, a uma viagem para um
mundo desconhecido. Há agora um universo de estruturas minúsculas criadas pelas
ideias de Dalton cujas imagens mentais desse mundo nanométrico justifica o
comportamento da matéria sensível. Para Dalton a matéria seria em sua base
constituída por partículas extremamente pequenas que não conseguimos enxergar,
mas que deveriam ser, segundo sua concepção, esféricas, neutras, mas,
principalmente indestrutíveis e donas da massa da matéria gerando uma imagem
representada na figura 1 apresentada a seguir:
Figura 1 – Modelo Atômico de Dalton: Esfera maciça, neutra e indestrutível.
Fonte: Zago, 2000.
19
Nessa concepção toda a massa da matéria pertence ao que os cientistas da
época chamavam de “partículas últimas” de um elemento e que Dalton, retornando
aos gregos, chamou de átomos, cujo significado seria sem partes ou indivisível. Ao
considerar o átomo indestrutível Dalton criou a condição necessária para a
manutenção da massa, pois, se o átomo não pode ser destruído ou transformado
em outro tipo de átomo, a massa dele deve, obrigatoriamente, se conservar. Dessa
forma, John Dalton, quatorze anos após a morte de Lavoisier, começa a desvendar
os segredos da conservação da massa e para isso proporciona ao mundo uma
imagem de uma estrutura invisível, mas com imagem concreta cujas propriedades
ajudam a explicar os fenômenos da natureza.
O atomismo de Dalton mudou a maneira de pensar e imaginar a matéria. A
partir dele a matéria ganha uma nova concepção que vai além do mundo dos cinco
sentidos, agora a matéria pode ser representada por duas distintas imagens uma do
mundo concreto e sensível, obtida de forma imediata e outra de um mundo invisível
aos sentidos, elaborada e fundamentada em teorias e modelos que justificam as
propriedades dos materiais e aprimoram e formalizam as concepções científicas
vinculadas a Química Moderna.
Segundo Filgueiras (2004, p. 44):
[...] A teoria atômica de Dalton é um dos marcos fundamentais da Química do século XIX. Ao contrário das cogitações abstratas de tantas outras teorias sobre a constituição da matéria, a sua se originou de uma combinação de intuição teórica e observações de laboratório, sendo respaldada diretamente por seus estudos sobre gases...a teoria passou a ter aceitação universal e tornou-se um dos alicerces da Química.
A partir das ideias geradas pelo atomismo Daltoniano e seus precursores,
hoje, a água de um copo pode ser tanto visualizada e percebida pelos sentidos
como a que é apresentada na foto da figura 2, como, também, imaginada e
desenhada, em forma e estrutura no mundo das moléculas, dos átomos e das
atrações elétricas que esses átomos são capazes de exercer uns sobre os outros,
representada na figura 3. Tudo isso graças a imagens modelizadas a partir de
fundamentações científicas criadas a partir do primeiro modelo de átomo imaginado
por Dalton no início do século XIX.
20
Fonte: Arquivo pessoal do autor.
Figura 2 - Foto de um copo de água – Uma visão macroscópica da água
Fonte: Arquivo pessoal do autor.
Figura 3 – Representação dos átomos de oxigênio (esfera maiorl) e hidrogênio (esfera menor) segundo o modelo de Dalton para molécula de água.
Fonte: Russel, 1981.
21
2.1.2 Radiações e o Modelo Atômico de Thomson
A evolução do pensamento científico, das análises experimentais e da
necessidade da evolução tecnológica causada pela revolução industrial geraram
grandes mudanças na concepção e na imagem dos átomos. A necessidade de
explicar a natureza da matéria com base no mundo nanoscópico do átomo gerou um
grande avanço na maneira de compreender as transformações químicas e físicas da
matéria. Por volta de 1870, o físico e químico inglês Willian Crookes (1832-1919)
descobre em seus experimentos que, ao evacuar um tubo de vidro e aplicar uma
grande diferença de potencial, surgem raios que foram chamados por ele de raios
catódicos. A figura 4 apresenta um dos experimentos de Crookes que o levou a
descobrir os raios catódicos.
Figura 4 – Esquema básico de funcionamento de um tubo de Crookes
Fonte: Desenho elaborado pelo autor baseado na descrição do experimento de Crookes feitas por
Russel, 1981, p. 116.
Em um de seus experimentos Crookes observou que os raios catódicos eram
capazes de movimentar pás de uma hélice colocada dentro do tubo evacuado, esse
fato seria explicado pela colisão dos raios catódicos com as pás da hélice, assim,
Cátodo (–)
Ânodo (+)
Fonte de alta
voltagem
Raios Catódicos
Tubo de vidro evacuado
22
nesse experimento, Crookes acaba descobrindo que os raios catódicos deveriam ser
formados por minúsculas partículas dotadas de massa e energia.
Em 1895, o físico francês Jean-Baptiste Perrin (1870-1942) demostrou que
as partículas formadoras dos raios catódicos seriam carregadas negativamente.
Aragão (2008, p. 134) descreve esse experimento da seguinte maneira:
Ele usou um tubo de Crookes, introduziu um disco com uma ranhura retangular. Colocou ainda dentro do tubo um tela fluorescente, para se visualizar a trajetória desenhada pelos raios catódicos. Colocando ainda um imã em forma de U em volta do tubo, de modo que as linhas de força do campo magnético sejam perpendiculares à direção do movimento dos raios catódicos, o feixe desloca-se para a direção que corresponde à presença de cargas elétricas negativas.
O físico e matemático inglês, Joseph John Thomson (1856-1940), gerou
uma grande revolução cientifica ao pesquisar e estudar a natureza elétrica da
matéria e a radioatividade. Thomson confirmou em suas pesquisas que os raios
catódicos seriam formados por partículas de massa muito pequena e dotadas de
carga negativa. Essas estruturas migravam do polo negativo para o polo positivo dos
eletrodos inseridos dentro da ampola de vidro evacuada. Thomson concluiu que
eram as mesmas partículas que se desprendiam quando superfícies metálicas eram
irradiadas por luz ultravioleta e com o físico americano Robert Andrew Millikan
(1868-1953), mediu a relação carga/massa dessa partícula. Outro experimento
realizado por Thomson foi a analise a massa eletrodepositada pelo hidrogênio num
processo eletrolítico envolvendo as mesmas partículas dos raios catódicos. Esse
experimento levou a conclusão que a massa da partícula seria em torno de 2000
vezes menor que a do átomo de hidrogênio.
Uma observação importante é de que os raios catódicos, criados em
laboratório, apresentam as mesmas propriedades das descargas elétricas que
ocorrem nos dias de tempestades e, portanto, deveriam ser formadas pelas mesmas
partículas. Thomson identificou essas partículas como pequeniníssimas, negativas e
muito menores que o átomo e concluiu que o raio seria o efeito da migração dessas
partículas negativas de um ponto a outro de um sistema. De onde viriam essas
partículas negativas? Por volta de 1896 o átomo, pelas ideias de Thomson, agregou
essas partículas negativas e teve sua imagem alterada. Segundo ele o átomo
provavelmente seria uma estrutura material muito pequena. Sua representação
imagética poderia ser representada por uma esfera maciça de carga elétrica positiva
com pequenas estruturas de cargas elétricas negativas incrustradas em sua
23
superfície. Essas pequenas cargas negativas ao escaparem da atração elétrica da
esfera positiva e migrarem na direção do polo positivo iriam originar os raios
catódicos. Thomson chamou de elétrons essas pequenas partículas geradoras da
corrente elétrica.
Para Chassot (2010, p. 212) a descoberta do elétron deve-se a um grande
número de pesquisas elaboradas nesse período:
O elétron, que em 1833 já fora prognosticado em um estudo de Faraday, ofereceu muitos desafios aos cientistas. J. Plücker (1801-1868), trabalhando com descargas elétricas, verificou que eram desviadas por campos magnéticos, produzindo fosforescência. J. Hittorf (1824-1914), aluno de Plücker, em 1869 construiu os primeiros tubos de raios catódicos, que foram aperfeiçoados por E. Goldstein e W. Crookes. Hoje sabemos que os raios catódicos são elétrons, mas então o assunto era objeto de grandes discussões. Hertz afirmava ter provas experimentais de que os raios catódicos não podiam ser partículas, no que tinha a adesão de físicos e alemães. Foi o francês J. B. Perrin (1870-1942) que, em 1895, demonstrou que os raios catódicos eram partículas carregadas negativamente. Em 1899, J.J. Thomson, professor Cavendish (título acadêmico) da Universidade de Cambridge, fez a determinação da carga e da massa do elétron, e R. A. Millikan, em 1910, aperfeiçoou a determinação da massa.
Observe uma imagem do modelo de Thomson representada na figura 5.
Figura 5 – Modelo Atômico de Thomson
Fonte: Zago, 2000.
Esfera positiva
Elétrons(e–) incrustados.
24
Devido a essa imagem dos elétrons incrustados numa massa positiva essa
representação imagética ficou conhecida no Brasil como modelo “pudim de passas”.
Esse modelo atômico acrescentou ao modelo de Dalton cargas elétricas
antagônicas, unidas por forças de atração elétrica que permitiu justificar o
comportamento elétrico da matéria. Thomson ao colocar os elétrons na superfície da
esfera positiva forneceu, ao mesmo tempo, explicações para a retenção do elétron
no átomo, para a característica neutra do átomo e, ainda, para a capacidade do
átomo de gerar a corrente elétrica e os íons positivos. Devido à atração elétrica com
a esfera positiva os elétrons se mantinham presos à estrutura atômica. Como, para
Thomson, o tamanho da esfera positiva varia para átomos de diferentes elementos,
seriam necessárias diferentes quantidades de elétrons para neutralizar cada tipo de
átomo, assim, se o número de elétrons for suficiente os átomos poderiam ser
neutros. Por outro lado, se os elétrons escaparem da atração elétrica da esfera
positiva do átomo neutro, então, eles gerariam a corrente elétrica que foi estudada
nos raios catódicos. Ao emitir os elétrons os átomos deixariam de ser neutros, pois,
faltariam elétrons para neutralizar a carga da esfera positiva, logo, eles assumiriam
carga positiva formando o que hoje chamaríamos de íons positivos ou cátions.
Surgiram vários questionamentos sobre a aplicação desse modelo atômico
na explicação dos fenômenos químicos naturais, acredita-se que o próprio Thomson
duvidava de sua representação imagética e de seu comportamento.
Para Aragão (2008 p. 136):
Thomson utilizou este modelo atômico para explicar muitas propriedades físicas e químicas da matéria. Essa descrição do átomo não se mostrou, contudo, muito satisfatória, por não ter grande utilidade, principalmente na previsão ou na explicação das propriedades químicas.
Thomson, em seu modelo atômico, fornece a imagem de um átomo divisível.
Lembre que há ai um contra-senso pois a palavra átomo significa indivisível. Sua
divisibilidade é concebida ao se imaginar que ele é capaz de liberar os elétrons para
gerar os raios catódicos e a eletricidade.
2.1.3 Raios X, Radioatividade e o Modelo de Rutherford
Em 1905, vários cientistas já haviam pesquisado a natureza da luz, porém,
ela foi estudada de forma mais profunda por Max Planck. Pesquisas sobre as
25
emissões de radiação nos tubos de descarga e sobre as emissões radioativas
também foram realizadas por vários cientistas incluindo Henry Becquerel, Madame
Curie e Ernest Rutherford. A partir desses estudos surgiram alguns questionamentos
relacionados à origem de determinadas propriedades da natureza como: de onde
viria à luz? De onde viriam as partículas e a energia proveniente das emissões
radioativas? Como se imagina a luz, as partículas e a energia emitida nas emissões
radioativas deveriam vir da matéria, o átomo, formador fundamental da matéria,
deveria dar essas explicações. O modelo atômico de Thomson já não respondia
esses questionamentos.
Em 1895 o físico alemão Wilhelm Konrad Röntgen (1845-1923) ficou
intrigado ao observar o resultado de um de seus experimentos com tubos de
descarga elétrica. Ao preparar o experimento Röntgen não percebeu que próximo ao
tubo estava, por acaso, uma lâmina com um dos lados revestido com platinocianeto
de bário {Ba2[Pt(CN)6]}, uma substância fluorescente, ou seja, que emite luz quando
submetida a radiação externa mas cuja emissão cessa no momento que a fonte de
energia é retirada. Trabalhando no escuro Röntgen ligou o sistema do tubo de
descarga, que estava completamente recoberto por um papelão preto e, para seu
espanto, observou a lâmina com platinocianeto de bário emitiu luz. Röntgen
observou que mesmo virando a lâmina para o lado sem o revestimento de
platinocianeto de bário ela continuava a emitir luz, resolveu colocar anteparos (pano,
madeira,...) entre a lâmina e o tubo e verificou que, mesmo assim, a tela continuava
a emitir luz. Isso o fez concluir que a radiação que saia do tubo atravessava os
anteparos com facilidade, pois se tratava de uma energia de alta frequência e baixo
comprimento de onda que Röntgen chamou de raios X.
Ao colocar a mão esquerda de sua esposa, Ana Berta Röntgen, entre o tubo
de descarga e uma lâmina de sulfeto de zinco (ZnS), material utilizado como
contrastante nas chapas fotográficas, ficou mais espantado ainda ao observar que a
imagem formada na lâmina de sulfeto de zinco representava os ossos da mão dela
como apresentado na figura 6.
26
Figura 6 – Anna Bertha Roentgen e chapa de raios x de sua mão.
Fontes: Fotos retiradas dos seguintes endereços eletrônicos: https://www.awesomestories.com/asset/view/Anna-Bertha-Roentgen (foto de Anna Bertha Roentgen) e http://www.scielo.cl/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0717-73482006000100006 (foto da chapa de raios x da mão de Anna Bertha Roentgen). Acesso: 17 de fevereiro de 2017.
A descoberta dos raios X foi extremamente produtiva e criou importantes
questionamentos sobre a natureza da matéria tornando-se fundamental para
evolução do modelo imagético do átomo.
Na França um cientista que estudava a fluorescência em sais de urânio (U)
ficou muito apreensivo com as descobertas de Röntgen. Antoine Henri Becquerel
(1852 – 1908), em janeiro de 1886, foi um dos muitos a visitar, no museu do Louvre,
em Paris, uma exposição das primeiras fotografias de raios X feitas por Röntgen.
Becquerel imaginou que poderia obter os raios X de outra maneira,
utilizando-se dos fenômenos da fluorescência. Ele decidiu fazer uma experiência
com dissulfato de potássio e uranila [K2UO2(SO4)2], sal preparado por ele mesmo
anos antes a partir do mineral, extraído da Polônia, chamado pechblenda. Ele
27
envolveu duas chapas fotográficas de sulfeto de zinco (ZnS) em papel preto que
impedisse a luz de penetrar, mas, devido as experiências de Rötgen, ele sabia que
se ocorresse emissão de raios x, as emissões energéticas atravessariam o papel e
marcariam as chapas fotográficas. Fixou cristais de dissulfato de potássio e uranila
próximos a duas placas próximas de uma janela (fonte de luz). Entre uma das placas
e os cristais do sal ele colocou uma moeda. Arrumou o sistema de tal forma que a
luz solar incidisse nos cristais e os tornasse fluorescentes, de acordo com a figura 7.
Figura 7 – Experimento de Becquerel
Fonte: Desenho elaborado pelo autor a partir da descrição do experimento apresentada por: Segrè, p.
29-30.1980
Becquerel esperava que os cristais irradiados emitissem raios x e
imprimissem as chapas. Ele imaginava que uma das placas ficaria completamente
impressa e outra, devido à interferência da moeda, imprimiria seu formato. Ao
revelar as chapas Becquerel verificou que estava correto, as duas chapas estavam
reveladas, parecendo-lhe então que os cristais do sal irradiado emitiam raios x.
Porém, as coincidências são bárbaras e inexplicáveis. Em 26 de fevereiro de 1896
Becquerel foi repetir o experimento montando o sistema na mesma janela, porém, o
Luz
Luz
Luz
Luz
Cristal de K2UO2(SO4)2
Cristal de K2UO2(SO4)2
Chapas fotográficas
cobertas
Moeda
28
dia estava nublado. Esperou durante três dias e o sol não voltou a surgir. Por fim,
decidiu desmontar o equipamento e para sua surpresa as chapas fotográficas
estavam impressas do mesmo modo que as do experimento anterior. Isso levantou
um questionamento: Como estão impressas se não houve luz solar suficiente para
causar a fluorescência? Então Becquerel imaginou que os cristais daquele sal
tinham condições de, naturalmente, emitir radiações, não necessitando de fonte
energética externa. Repetiu o experimento sem expor os cristais a luz e obteve o
mesmo resultado anterior. No primeiro momento ele concluiu que os sais de
dissulfato de potássio e uranila emitiam naturalmente raios x, porém, ao pesquisar
melhor as características da emissão chegou à conclusão que não eram raios x,
seria uma radiação produzida por um novo tipo de atividade da matéria que envolve
um caráter natural de certos elementos que algumas substâncias continham. Ele
chamou esse fenômeno de radioatividade (do francês radio-activité).
Para Segrè (1980, p. 30)
Eis uma situação em que o acaso, a sagacidade e a vivacidade constituíram elementos fundamentais. Henri Becquerel afirmava que também seu pai e avô mereceriam crédito por essa descoberta... Mas, à época, a descoberta de Becquerel aparentemente não se comparava com a de Röntgen e não provocou a excitação que a de Röntgen havia provocado.
Sutcliffe e Sutcliffe (1976 p. 204) reforçam essa ideia ao relatarem o que o
farmacologista britânico Hallett Henry Dale (1875-1968) escreveu no jornal ¨The
Brithisch Medical Journal¨ em 4 de setembro de 1948 na página 453.
Numa reunião do Clube de Ciência Natural dos estudantes superiores em Cambridge, em 1897, meu contemporâneo R.H. Strutt (mais tarde Lorde Rayleight, o eminente físico, co-descobridor dos gases raros), descreveu-nos as descobertas de Becquerel. Bem me lembro do protesto cético de um de nós, que mais tarde se tornaria mundialmente famoso em Física e Astronomia. ¨Ora, Strutt¨, disse ele, ¨se essa história de Becquerel fosse verdadeira, violaria a lei da conservação da energia. ¨Recordo-me de o ardoso Strutt retrucar: ¨Muito bem, o mais que posso dizer é tanto pior para a lei, porque sei que Becquerel é observador fidedigno. ¨Sem dúvida nenhum de nós naquele momento tinha a menor ideia da enorme expansão do conhecimento que aquelas descobertas originariam, nem do enorme arsenal de recursos físicos que seria por esse meio posto a serviço da medicina.”
Apesar de inicialmente a radioatividade não causar tanto alvoroço no meio
acadêmico, logo após sua descoberta se torna uma das principais fontes de
pesquisa para vários químicos e físicos.
29
O jovem neozelandês Ernest Rutherford (1871-1937) era um prodígio e
desde a infância nutria grande paixão pela ciência, aos 10 anos já lia livros de
Física, aos 11 anos entrou para o Nelson College como bolsista e aos 19 anos
ingressou no Canterbury College que tinha apenas seletos 150 alunos. Defendeu
uma tese sobre o magnetismo superficial do ferro e aos 24 anos foi, como bolsista,
aprimorar seus estudos na Inglaterra aos cuidados de ninguém menos que Joseph
John Thomson, o pai do modelo “pudim de passas”. Revelou-se um excelente
pesquisador e curiosamente manteve durante toda sua vida correspondência regular
com sua mãe e incentivadora.
A princípio continuou suas pesquisas sobre o magnetismo até que surgem
os estudos de Röntgen sobre os raios x. Thomson e Rutherford começam a medir o
grau de ionização causado pela incidência dos raios x na matéria. Surge a
radioatividade de Becquerel. Rutherford resolve medir o poder da ionização causada
pelo urânio e, em 1899, acaba descobrindo a emissão de duas pequenas partículas,
uma com carga positiva e outra com carga negativa. Nesse experimento Rutherford
fez passar emissões radioativas por entre duas placas de cargas opostas como
mostra a figura 8. Elas eram colocadas de forma que ficassem paralelas e não se
tocassem, deixando um espaço entre elas por onde Rutherford fazia passar
emissões radioativas provenientes do urânio (U). Na frente do equipamento era
colocada uma chapa fotográfica cuja função seria a de verificar a deflexão das
emissões radioativas devido a ação do campo elétrico gerado pelas placas. Ele
verificou que a radiação advinda do urânio acabava originando dois tipos de
manchas na chapa fotográfica. Uma delas desviava-se em direção a placa
carregada negativamente, assim, essa emissão deveria ter carga positiva, ela
gerava partículas com massa maior e, mais tarde, o próprio Rutherford identificou
como átomos ionizados do elemento Hélio (He2+). Ele chamou essas partículas de
alfa (α). A outra emissão identificada por Rutherford, era de uma partícula de massa
muito menor que era desviada na direção da placa de carga positiva o que indicava
sua natureza negativa. Ele chamou essas emissões de partículas beta (β). No
mesmo ano Henry Becquerel acabou deixando todos os cientistas estarrecidos
quando revelou a íntima relação das partículas beta (β) com a dos elétrons de
Thomson: a carga e a massa seriam iguais. Assim, de alguma maneira os átomos
estariam emitindo partículas de carga negativa e positiva. Becquerel ainda
surpreendeu mais quando verificou que a energia das partículas beta era muito
30
maior que a dos elétrons emitidos nos tubos de raios catódicos. Em 1900 o físico
francês Paul Ulrich Villard (1860-1934) comprovou experimentalmente que havia,
nas emissões radioativas, a liberação de uma radiação desprovida de massa e de
cargas elétricas que também seria emitida pelo material radioativo, tinham altíssimo
poder de penetração em relação às partículas alfa e beta e pareciam muito com os
raios x. Villard chamou essa emissão de radiações gama (γ). A figura 8 apresenta,
de forma esquemática, esse experimento realizado por Rutherford e, posteriormente,
por Villard.
Figura 8 – Desenho representando o experimento que levou a descoberta das
partículas alfa e beta e das radiações gama.
Fonte: Desenho elaborado pelo autor adaptado de: http://brasilescola.uol.com.br/quimica/radioatividade-estrutura-atomo.html. Data de acesso 25 de abril de 2017.
As descobertas das partículas alfa, beta e da radiação gama forneceram
terreno muito fértil para a pesquisa e compreensão dos sutis mistérios do mundo
material. Se estas emissões de partículas e radiação vêm de sistemas materiais e,
se a matéria seria formada por átomos, imagina-se então, que são os átomos que as
produzem. Assim, imaginar o átomo como uma esfera positiva com elétrons
incrustrados não parecia fornecer uma representação suficiente para a compreensão
de seu comportamento.
– – – – – – – – – – – –
+ + + + + + + + + + +
Urânio
Invólucro de chumbo
Placa carregada Negativamente.
Placa carregada Positivamente.
Chapa Fotográfica.
Radiação gama (γ).
31
Após suas descobertas, Ernest Rutherford casou-se e assumiu a cátedra de
física na Universidade MgGill, em Montreal, no Canadá. Em 1907 retorna a
Inglaterra contratado pala Universidade de Manchester e em 1908 recebe o prêmio
nobel de Química pela descoberta das partículas alfa e beta.
Nesta época muitos cientistas, como o físico japonês Hantaro Nagaoka
(1865 – 1950), questionavam o modelo atômico proposto por Thomson. Para
Nagaoka o átomo deveria apresentar uma estrutura semelhante a do sol com os
planetas, ou seja, o átomo deveria ter uma região central, possivelmente positiva,
que atrairia os elétrons, negativos, que girariam a seu redor. Mas como provar isso?
Ernest Rutherford acabará provando realizando um experimento que utilizaria o
bombardeio de partículas alfa, emitidas por um material radioativo, sobre a matéria.
Como as partículas alfa têm carga positiva e o suposto centro atômico também, as
partículas alfa que se aproximarem dele seriam repelidas e sofreriam um desvio
(espalhamento).
Sob a orientação de Rutherford os cientistas Hans Geiger (1882-1945) e
Ernest Marsden (1889-1970) realizaram o experimento do espalhamento das
partículas alfa. Neste, um emissor de partículas alfa emitiria um feixe destas
partículas que insidiria em uma fina lâmina de um material muito denso como ouro
de densidade 19,32 g/mL e que é 70% mais denso que o chumbo de densidade
11,34 g/mL, assim, eles poderiam observar os desvios que estas partículas
sofreriam caso atravessassem a lâmina. Para Marques e Caluzi (2009 p. 3)
Sobre a estrutura atômica Rutherford passou um longo processo de investigação até chegar ao desenvolvimento do modelo...[...]Foi por meio da experiência relatada nos livros didáticos que Rutherford desenvolveu seu modelo. Para isso teve como subsídio um artigo publicado em 1909 cujo título era Sobre a Reflexão Difusa das Partículas Alfa. Esse artigo foi publicado por Geiger e Marsden. Eles relatam nesse artigo que bombardearam com partículas alfas uma delgada folha de ouro com a espessura de 6 microns....[...]Foi, portanto baseado nesses resultados que Rutherford escreveu um artigo em 1911 com o título O Espalhamento das Partículas Alfa e Beta na Matéria e a Estrutura do Átomo. Nesse artigo ele relata as dispersões das partículas alfa e beta obtidos pelo trabalho de Geiger e Marsden...
Para sustentar sua nova imagem da estrutura atômica, Rutherford cita o artigo do Físico japonês H. Nagaoka de 1904. Nesse artigo Nagaoka considera como ¨Sistema saturniano¨um modelo do átomo formado por uma partícula central rodeada por anéis de elétrons girando com uma velocidade angular comum...
A figura 9 apresenta o equipamento usado por Geiger e Marsden para
realizar esse experimento:
32
Figura 9 – Experimento de difração das partículas alfa (α).
Desenho elaborado pelo autor adaptado de Segrè, 1980, p. 110.
Como resultado foi verificado que a maioria das partículas alfa atravessara a
lâmina de ouro sem sofrer deflexão algumas mudaram sua trajetória e outras
chegaram a retornar.
Esse experimento que procurava justificar um estudo matemático sobre o
comportamento da matéria feito por Rutherford levou-o a algumas observações
como:
1. Devido ao grande número de partículas alfa que atravessou a lâmina de
ouro pode-se concluir que o átomo deve apresentar muitos espaços vazios.
2. Devido ao desvio e retorno de algumas partículas alfa positivas o átomo
deve possuir uma região muito densa e positiva que causa a repulsão elétrica com
as partículas alfa causando suas deflexões e retorno.
3. Os elétrons descobertos por Thomson devem estar em uma região
externa ao núcleo e permanecem no átomo devido à atração elétrica entre elétrons
negativos e o núcleo positivo.
Microscópio
Tela Fluorescente
Lâmina de 0,0001 cm de espessura de ouro
(denso – d = 19,3 g/mL)
Feixe de partículas alfa (α)
Partículas alfa que difrataram (mudaram de direção em relação ao feixe inicial)
Urânio (U) emissor de partículas alfa (α). partículas alfa (α)
Direção e sentido do movimento das partículas alfa.
33
4. Devido a grande densidade do núcleo imagina-se que a massa contida no
núcleo é muito maior que a dos elétrons.
5. Para a manutenção da estrutura os elétrons deveriam estar em
movimento. A princípio se pensava que a força centrífuga, que joga o elétron na
direção oposta ao núcleo, seria compensada pela atração elétrica entre o núcleo e
os elétrons.
Com as observações obtidas no experimento Rutherford conseguiu
comprovar que o átomo não seria maciço e levou o imaginário de todos a uma nova
forma de pensar a estrutura atômica. A partir dai surge a imagem do átomo como um
sistema planetário em que o núcleo ficaria no centro e orbitando no entorno dele
estariam os elétrons. A figura 10 demostra uma representação imagética de como se
pensava ser a estrutura atômica após as conclusões de Gaiger, Marsden e
Rutherford.
Figura 10 – O modelo atômico proposto a partir das ideias de Rutherford,
Geiger e Marsden (1911).
Fonte: Desenho elaborado pelo autor.
Órbitas Imaginária por onde transitam os
elétrons.
Os elétrons (negativos) de Thomson orbitando no
entorno do núcleo positivo
Centro positivo do átomo (núcleo) que mantém os elétrons orbitando por atração elétrica.
34
Apesar do modelo atômico de Rutherford justificar de forma coerente os
resultados do experimento ele apresenta uma série de limitações, pois, se o elétron
é negativo e o núcleo positivo eles se atraem e o próprio Rutherford chegou a
conclusão que somente a força centrifuga não seria suficiente para manter os
elétrons na mesma órbita. Imaginava-se, fundamentando-se na física newtoniana,
que dependendo da distância do elétron ao núcleo duas situações poderiam ser
observadas, se os elétrons estivessem mais próximos do núcleo eles fariam um
movimento em espiral até cair nele, por outro lado, se ele estivesse a uma distância
grande ele poderia fazer um espiral para fora e fugir da atração nuclear. As figuras
11 e 12 procuram mostrar como se imaginava o que ocorreria com as trajetórias dos
elétrons nos átomos.
Figura 11 – As trajetórias em espiral possíveis para os elétrons próximos ao
núcleo.
Fonte: Desenhos elaborados pelo autor.
Trajetória espiral do elétron para o centro do átomo devido à força de atração elétrica ser mais
intensa que a força centrífuga.
Elétron
Núcleo Positivo
35
Figura 12 – As trajetórias em espiral possíveis para os elétrons mais afastados
do núcleo.
Fonte: Desenho elaborado pelo autor.
2.1.4 A Luz, os Espectros e o Modelo Atômico de Bohr
Para entender o comportamento dos elétrons no átomo com o objetivo de
explicar as características energéticas da matéria foi necessário entender a
formação dos espectros atômicos.
O físico inglês Isaac Newton (1642-1727) realizou pela primeira vez a
decomposição da luz visível. Ele observou que ao passar luz natural através de um
prisma ela é decomposta em várias cores e que chamamos, hoje, de espectro da luz
visível como o exposto na figura 13.
Trajetória espiral do elétron para fora do átomo devido à força centrifuga mais intensa que a força de atração elétrica.
Núcleo Positivo
36
Figura 13 – Espectro contínuo obtido da radiação solar.
Fonte: https://static.todamateria.com.br/upload/es/pe/espectro_visivel.jpg
Acesso em 12/07/2018.
Foi o físico alemão Joseph von Fraunhöver (1787-1826) que inventou um
aparelho, chamado espectroscópio, que permitiu verificar os espectros atômicos.
Em suas experiências com espectros Fraunhöver observou que o espectro
da luz solar medido durante um eclipse e os espectros da lua e dos planetas
apresentavam várias linhas escuras, ou seja, os espectros dos corpos celestes não
eram contínuos e tanto o sol como a lua e os planetas apresentavam o mesmo
espectro. Fraunhöver também observou em seus experimentos que quando sais de
sódio eram levados ao fogo era emitida uma luz característica originando um
espectro que apresentava apenas uma linha que correspondia a da cor amarela.
Assim, quando não utilizamos a luz natural e sim a que provêm de um único
elemento, será obtido, também, um espectro descontínuo. Fraunhöver acabou
descobrindo o espectro atômico do sódio. Ao realizar uma experiência envolvendo
uma lâmpada com um único elemento no estado gasoso, não será obtido o espectro
completo e sim algumas linhas com determinadas frequências da luz visível. Os
espectros obtidos dessa forma são chamados de espectros atômicos. A figura 14
37
apresenta um esquema de como funciona o espectroscópio para determinação dos
espectros atômicos.
Figura 14 – Esquema de um espectroscópio para obtenção do espectro
atômico de emissão.
Fonte: Desenho elaborado pelo autor fundamentado no desenho e nas observações apresentadas
em: Fonseca (2014) e Russel (1980).
O interessante é o espectro atômico funciona como uma “digital” dos
elementos. Cada tipo de átomo terá o seu espectro característico, assim, são uma
maneira de identificar a presença de determinado elemento na composição de uma
substância. A figura 15 apresenta os espectros atômicos básicos de emissão do
hidrogênio, do sódio e do hélio.
Figura 15 – Espectros de emissão do hidrogênio, do sódio e do hélio.
Espectro de emissão do Hidrogênio
400 500 600 700 λ em nm (10– 9
m)
Lâmpada contendo
determinado gás do
elemento. Lente.
Prisma. Espectro atômico de emissão.
Luz.
Fenda
38
Espectro de emissão do Sódio
400 500 600 700 λ em nm (10– 9
m)
Espectro de emissão do Hélio
400 500 600 700 λ em nm (10– 9
m)
Fonte: Desenho elaborado pelo autor fundamentados em Fonseca (2014) e Russel (1980).
O resultado de Fraunhöver para os espectros solares, da lua e dos planetas
paralelamente com os estudos dos espectros atômicos permitiram afirmar que as
linhas escuras dos espectros dos corpos celestes seriam devido a não existência de
determinados elementos químicos na composição solar. Como a lua e os planetas
só refletem a luz solar os espectros obtidos por Fraunhöver para os corpos celestes
eram iguais.
Como a luz é uma onda eletromagnética, ou seja, apresenta frequência (f) e
comprimento de onda (λ), para ter uma avaliação mais completa dos espectros
atômicos havia a necessidade de saber quais eram as frequências e os
comprimentos de onda das emissões luminosas dos elementos. Em 1885, um físico
suíço, Johann Jakob Balmer (1825-1898), que além de se interessar por
numerologia nutria grande interesse pelos espectros atômicos, conseguiu chegar a
uma equação que permitia calcular as frequências e os comprimentos de onda das
linhas espectrais do espectro da luz no visível (comprimentos de onda de 400 a 700
nm) para o gás hidrogênio.
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A equação de Balmer pode ser representada da seguinte maneira:
𝑓 = 𝑅 (1
22+
1
𝑛22
)
Onde f é a frequência da onda medida em Hertz, R é a constante de
Rydenberg que vale 1,1x10–2 nm–1 e n2 é um número inteiro maior ou igual a 2.
No início do século XIX Max Planck e Albert Einstein demostram que as
ondas eletromagnéticas comportam-se como pequenos pacotes de energia
chamados fótons.
Segundo Planck:
𝐸𝑓ó𝑡𝑜𝑛 = ℎ
𝜆
Onde Efóton é a energia do fóton medida em joules, h é a constante de Plank
que vale 6,63x10–34 J.s e λ é o comprimento de onda em nanômetros.
Segundo Einstein:
𝑐 = 𝑓 . 𝜆
Onde c é a velocidade da luz no vácuo que é constante e cujo valor é de
297600 Km/s, f é a frequência da onda medida em hertz e λ o comprimento de onda
em nanômetros.
Assim, unindo as duas ideias, chegaremos a seguinte equação:
𝐸𝑓ó𝑡𝑜𝑛 = ℎ. 𝑓
𝑐
Como c e h são constantes a energia do fóton depende exclusivamente da
frequência, logo, cada fóton deve ter uma energia proporcional à frequência da luz.
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Os fótons seriam radiações eletromagnéticas que são originadas na matéria,
ou seja, devem ser originadas por alguma condição da estrutura dos átomos, assim,
criaram-se vários questionamentos como: Por que cada elemento só produz fótons
com certas frequências? Como a estrutura atômica é capaz de produzir fótons?
Como é a estrutura atômica?
Niels Henrik David Bohr (1885-1962) nasceu em 7 de outubro de 1885 em
Copenhague, na Dinamarca. Rico, teve uma educação invejável. Em 1911 foi para
Inglaterra estudar física com J.J. Thomson onde acabou conhecendo e sendo,
também aluno, de Rutherford. Bohr se interessou muito pelos seus trabalhos e pelos
sérios problemas que enfrentava na explicação da instabilidade mecânica e elétrica
de seu modelo atômico.
Bohr imaginou que o dilema da instabilidade estrutural do modelo atômico de
Rutherford ocorreria devido ao fato de existirem princípios físicos ainda
desconhecidos que descrevessem de maneira adequada o comportamento do
elétron no átomo. Em 1912 Bohr estrutura suas ideias matemáticas sobre o
comportamento do elétron no átomo, porém, ao apresenta-las para Rutherford esse
acaba refutando algumas delas o que cria uma situação de descredito de seu
trabalho físico matemático. Mas no início de 1913 ocorre uma situação muito
interessante. Um amigo de Bohr, o espectroscopista Hans Marius Hansen (1886-
1956), após ouvir sobre suas ideias e suas frustrações com relação a opinião de
Rutherford sobre elas lhe pergunta se já havia tentado aplicar suas ideias aos
trabalhos de espectroscopia da luz visível olhado os trabalhos experimentais de
Balmer sobre os espectros atômicos do hidrogênio. Bohr, então, foi olhar esses
trabalhos e ficou espantado com as inter-relações entre as emissões de luz e as
características energéticas de sua teoria sobre os elétrons.
Segundo Sègre (1980, p. 125), que teve um convívio de grande proximidade
com Bohr:
Bohr ponderou sobre esses problemas e ideias e mencionou-os em uma carta ao irmão, datada de 19 de junho de 1912. Em junho ou julho, preparou um memorando sobre o assunto, para discutí-lo com Rutherford. Era óbvio que estava muito entusiasmado com o modelo, mas ainda não tinha analisado o espectro do hidrogênio. Os espectros se tornaram a chave para grande parte do que veio depois, mas eram considerados muito complicados e um campo aparentemente indecifrável na época. No início de 1913 é que um estudante seu amigo, Hans Marius Hansen, indagou de Bohr o que é que seu modelo tinha a dizer a respeito de espectros. Quando Bohr afirmou que não sabia dizer nada sobre o assunto, Hansen aconselhou-o a dar uma olhada na fórmula de Balmer. ¨Logo que vi a
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fórmula de Balmer tudo se tornou claro para mim¨- declarou Bohr muitos anos mais tarde.
Por incrível que pareça, no início de 1913, Bohr não havia relacionado as
características estruturais e energéticas do átomo ao espectro atômico. A partir
dessa relação suas ideias no campo da matemática poderão ser estudadas,
também, na área experimental. Primeiramente ele partiu do princípio de que seriam
os elétrons que absorvem energia e posteriormente a reemitem na forma de luz, ou
seja, os fótons emitidos pelos átomos são devido a absorção e liberação de energia
pelos elétrons. Ele imaginou que a menor energia que um elétron pode ter seria – A
e que outras energias possíveis seriam – A/n2, onde n é um número inteiro que varia
de 2 até o infinito. Assim ele torna a energia do elétron descontínua, ou seja, os
elétrons não poderão assumir qualquer energia e sim somente aquelas que lhe são
permitidas, desta maneira os elétrons estariam, dentro do átomo, presos a estas
energias. Segundo Bohr cada uma dessas energias geraria uma órbita do elétron no
entorno do núcleo.
Segundo Bohr um elétron com energia – A ao receber energia em
quantidade adequada iria ficar com uma energia maior e migraria para uma órbita
mais externa gerando um salto quântico do elétron. Logo, para Bohr, não apenas
cada órbita tem uma energia, mas, à medida que a órbita se afasta do núcleo, a
energia cresce. Segundo ele a emissão de luz viria do retorno dos elétrons ás
órbitas mais internas logo, a energia liberada pelo elétron (Eliberada), também
chamada de fóton corresponderia á energia das diferenças energéticas da órbita
mais externa (Eexterna) e da mais interna (Einterna), assim:
Eliberada = Efóton = Eexterna – Einterna.
Logo, a energia liberada pelo retorno do elétron seria a diferença da energia
das duas órbitas. Vamos imaginar que um elétron pule de uma energia inicial – A
para uma órbita de energia – A/n2, ao retornar a órbita mais interna liberará uma
energia que será:
𝐸𝑙𝑖𝑏𝑒𝑟𝑎𝑑𝑎 = 𝐸𝑓ó𝑡𝑜𝑛 = 𝐸ó𝑟𝑏𝑖𝑡𝑎 2 − 𝐸ó𝑟𝑏𝑖𝑡𝑎 1 = − 𝐴
𝑛2− 𝐴
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Quando Bohr analisou o sistema utilizando-se das ideias de Planck e
Einstein sobre a energia e generalizou esta expressão para qualquer energia
permitida para o elétron, fez a dedução apresentada a seguir:
𝐸𝑙𝑖𝑏𝑒𝑟𝑎𝑑𝑎 = 𝐸𝑓ó𝑡𝑜𝑛 = 𝐸ó𝑟𝑏𝑖𝑡𝑎 2 − 𝐸ó𝑟𝑏𝑖𝑡𝑎 1 = ℎ. 𝑓
𝑐= −𝐴 (
1
𝑛22
+ 1
𝑛12
)
Logo,
ℎ. 𝑓
𝑐= −𝐴 (
1
𝑛22
+ 1
𝑛12
)
Assim, ao isolar a frequência poderemos obter a seguinte equação:
𝑓 = −𝐴. 𝑐
ℎ (
1
𝑛22
+ 1
𝑛12
)
Onde:
𝑅 = −𝐴. 𝑐
ℎ
Em que R é a constante de Rydenberg que vale 1,1x10–2 nm–1.
Assim, por exemplo, quando n2 for igual a 2 (n2 = 2) a equação ficará:
𝑓 = 𝑅 (1
22+
1
𝑛12
)
Não é a toa que Bohr afirmou que tudo ficou mais claro quando estudou os
trabalhos de Balmer. Veja a genialidade de Bohr que acabou por encontrar apenas
com deduções matemáticas uma equação muito semelhante à de Balmer cuja
equação foi obtida de maneira experimental e estruturada a partir do espectro do
hidrogênio. Bohr encontrou um grande aliado para, finalmente, expor suas ideias e
buscar sua aceitação e, pela primeira vez, em julho de 1913, as publica no volume
26 da revista Philosophical Magazine.
43
Bohr, com suas ideias, acaba gerando um novo modelo atômico estruturado
a partir do modelo de Rutherford. Ainda é muito comum na Química observar
citações com relação a um modelo atômico de Rutherford-Bohr, mas, apesar da
representação imagética parecida e um servir como base para a estruturação do
outro, existe uma distância, em termos de aprofundamento teórico, enorme entre
eles, por isso, o mais adequado é trata-los separadamente. A imagem criada pelo
átomo de Bohr inclui os elétrons em permanente movimento em órbitas circulares,
girando em torno de um núcleo denso e positivo. Esses elétrons teriam energia
quantizada, ou seja, para o elétron só seriam permitidas certas quantidades de
energia, isso criaria órbitas estacionárias e, cada uma delas, representaria uma
energia possível para o elétron, ou seja, onde ele poderia ficar (estacionar). Cada
nível energético permitido para o elétron criaria uma órbita. A sugestão da
descontinuidade da energia aparece na representação de seu modelo imagético
como essas órbitas. Elas seriam as regiões permitidas para o elétron. Entre duas
órbitas existiriam infinitas outras orbitas que não seriam estacionárias, ou seja, cujos
elétrons não poderiam ter aquela quantidade de energia para permanecer. Bohr
também conclui que elétrons, dispostos assim, não cairiam no núcleo, pois a menor
energia permitida para o elétron ainda o manteria em uma órbita. Bohr sugeriu
algumas características dos elétrons em certos postulados como:
1. O átomo apresenta núcleo denso e positivo;
2. Os elétrons movimentam-se em órbitas circulares no entorno do núcleo;
3. Os elétrons só podem ter certas quantidades de energia (energia
quantizada) e cada energia gera uma órbita;
4. Quanto mais afastado do núcleo mais energia o elétron terá;
5. Apesar da atração nuclear, a mínima energia que o elétron pode ter não
permite que este se desloque até o núcleo;
6. O átomo apresenta um grande número de órbitas não estacionárias, ou
seja, que o elétron não pode ficar (energias proibidas para o elétron).
7. Para o maior átomo conhecido o número de órbitas é sete, ou seja, seus
elétrons se distribuem em sete órbitas.
Assim, à imagem fundamentada no experimento de Geiger e Marsden da
difração das partículas alfa (α) e nas ideias propostas pelo modelo atômico de
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Rutherford, á acrescentada a quantização da energia dos elétrons e cria-se,
portanto, a inter-relação entre a energia dos elétrons e as órbitas da eletrosfera.
Esse novo modelo apresenta uma nova e intrigante relação entre o núcleo positivo e
os elétrons, assim, a partir dessas ideias cada camada eletrônica corresponde a um
nível energético cuja energia cresce à medida que o elétron se afasta do núcleo. A
figura 16 apresenta a representação imagética sugerida para esse modelo atômico.
Figura 16 – Modelo atômico de Bohr com todas as sete órbitas circulares no
mesmo plano.
Fonte: Desenho elaborado pelo autor fundamentado na descrição de Russel (1980) e Fonseca
(2014).
Com seu modelo Bohr possibilita justificar e explicar como são originadas as
ondas eletromagnéticas e a corrente elétrica. A seguir estão cinco situações
previstas dentro dos postulados elaborados pelo próprio Bohr e que nos ajudam a
Cresce a energia do elétron
E1
E2 E3
E4
E5 E6
E7
K L M N O P Q
Núcleo positivo
Elétron
E1, E2, E3, E4, E5, E6 e E7 são energias possíveis para os elétrons.
45
esclarecer questões relacionadas o comportamento do elétron que justificam a
formação das ondas eletromagnéticas e da corrente elétrica.
1. O elétron não pode ficar entre duas órbitas (dois níveis energéticos). Para
o elétron só é permitido ficar em uma órbita estacionária, ou seja, aquela que ele
pode permanecer devido a sua energia. A figura 17 apresenta as possibilidades e
impossibilidades energéticas para o elétron (descontinuidade de energia);
Figura 17 – Elétrons só podem ficar em órbitas cujas energias são permitidas
Fonte: Desenho elaborado pelo autor a partir dos dados apresentados em Fonseca, 2014.
2. Ao permanecer em uma órbita a energia do elétron será constante, ou
seja, esse elétron está num estágio estacionário e, apesar de permanecer em
movimento constante, sua energia será sempre a mesma. Admite-se, nesse caso
que ele não absorve nem libera energia.
Se cada órbita apresenta apenas uma quantidade de energia fixa, podemos
afirmar que todos elétrons que estão em uma mesma órbita devem apresentar a
mesma quantidade de energia. A figura 17 apresenta elétrons em uma mesma
órbita, ou seja, com a mesma energia;
E1
E2
Energias possíveis para o elétron
Elétron não pode permanecer nesse estado energético
X
Núcleo positivo
Elétron em uma órbita estacionária.
46
Figura 18 – Elétrons de mesma energia ficam em uma mesma órbita.
Fonte: Desenho elaborado pelo autor a partir dos dados apresentados em Fonseca, 2014.
3. Quando um elétron absorve uma quantidade definida de energia vinda do
meio externo ele entra num estado de excitação e migra para uma órbita mais
externa, assim, os elétrons ao absorverem energia não conseguem ficar na mesma
órbita e dão saltos quânticos para órbitas mais externas que sejam compatíveis com
seu estado de excitação ou, em casos extremos, absorvem tanta energia que fogem
da atração nuclear e podem gerar a corrente elétrica. As figuras 18–A e 18–B
apresentam dois momentos relacionados a um salto quântico ocorrido com absorção
de energia pelo elétron.
Figura 18-A – Elétron absorvendo energia suficiente para dar um salto
quântico.
Fonte: Desenho elaborado pelo autor a partir dos dados apresentados em Fonseca, 2014.
Núcleo positivo
Elétrons com mesma energia. positivo
E1
E1
E1 E2
Salto quântico do elétron.
Energia E absorvida pelo elétron: E = E2 – E1
Núcleo positivo
Elétron com energia E1. Lembrando que: E2 > E1
47
Figura 18-B – Elétron excitado em um estágio estacionário de maior energia.
Fonte: Desenho elaborado pelo autor a partir dos dados apresentados em Fonseca, 2014.
4. As ondas magnéticas como a luz visível, radiação ultravioleta e os raios X
se formariam quando elétrons excitados retornam á órbitas mais internas, cuja
energia é menor, e liberam o excesso de energia (Eexcesso) de acordo com a seguinte
equação:
𝐸𝑒𝑥𝑐𝑒𝑠𝑠𝑜 = 𝐸ó𝑟𝑏𝑖𝑡𝑎 𝑚𝑎𝑖𝑠 𝑒𝑥𝑡𝑒𝑟𝑛𝑎 − 𝐸ó𝑟𝑏𝑖𝑡𝑎 𝑚𝑎𝑖𝑠 𝑖𝑛𝑡𝑒𝑟𝑛𝑎
Segundo esse modelo a energia de excesso (Eexcesso) corresponde a energia
de uma determinada onda eletromagnética. A quantidade de energia envolvida na
formação dessa onda depende do tipo de elemento envolvido (sódio, potássio,
chumbo, enxofre,...) bem como do número de órbitas que ele está retornando. As
figuras 19-A e 19-B apresentam dois momentos relacionados a liberação de energia
ao ocorrerem saltos quânticos do elétron para órbitas mais internas.
E1 E2
Elétron com energia E2. Estado excitado.
Núcleo positivo
Lembrando que: E2 > E1
48
Figura 19-A – Elétron excitado em um estágio estacionário de maior energia
retornando ao estagio estacionário de menor energia.
Fonte: Desenho elaborado pelo autor a partir dos dados apresentados em Fonseca, 2014.
Figura 19-B – Elétron no estado fundamental de energia.
1 Estado fundamental de energia do elétron é o estado de menor energia que o elétron pode estar.
Fonte: Desenho elaborado pelo autor a partir dos dados apresentados em Fonseca, 2014.
E1
E2
Elétron com energia E2. Estado excitado.
Núcleo positivo
Lembrando que: E2 > E1
Energia E liberada na forma de ondas eletromagnéticas.
As ondas eletromagnéticas podem ser Luz visível, radiação ultravioleta ou raios X.
E1 E2
Elétron com energia E1. Estado fundamental1.
Núcleo positivo
Lembrando que: E2 > E1
49
Apesar de Albert Einstein, grande amigo de Bohr, nunca ter concordado com
a quantização da energia, Einstein fez o seguinte comentário citado em Segrè (1980
p. 127 e 128):
[...]um homem dotado do instinto e da capacidade de percepção singulares como os de Bohr, a descoberta das grandes leis das linhas espectrais e das camadas dos elétrons do átomo, bem como seu significado para a Química, pareceu-se um milagre e ainda hoje me parece um milagre. Esta é a mais elevada forma de musicalidade na esfera do pensamento.
O modelo de Bohr, princípio da mecânica quântica, também nos ajuda a
entender as raias espectrais características para cada um dos elementos. As linhas
viriam de absorções e, em seguida, liberações de energia vindas dos elétrons ao
transitarem entre as camadas do átomo. A figura 20 apresenta como se formaria o
espectro do hidrogênio.
Figura 20 – Origem das raias espectrais com base no modelo atômico de Bohr.
Fonte: Desenho elaborado pelo autor a partir dos dados apresentados em Fonseca, 2014.
Os elétrons, partículas mais expostas do átomo, foram, inicialmente alvo de
grande preocupação dos cientistas que se envolveram de forma profunda na
compreensão de seu comportamento. Identificados por Faraday em 1823, mas
definidos como partículas atômicas por Thomson em 1887, os elétrons foram usados
E1
E2
E3
Elétron Excitado
Nível Nanoscópico
Nível Macroscópico
Salto Quântico
Onda Eletromagnética
Espectro atômico
Raia espectral originada no salto quântico do elétron
50
como base de explicação de várias e importantes características da matéria que
resultaram no domínio da produção de eletricidade, na compreensão mais profunda
das ligações químicas gerando a possibilidade da produção de novos materiais
como medicamentos, fertilizantes, elastômeros, plásticos, vidros especiais,
detergentes,... e na estruturação de melhores técnicas para a produção em maior
escala de produtos químicos ¨necessários¨ ao conforto da humanidade, porém, o
estudo da radioatividade, visto anteriormente, levou as pesquisas relacionadas ao
núcleo atômico positivo e em 1908. Antes mesmo de elaborarmos o modelo atômico
de Bohr, Thomson, Rutherford e Goldstein acabaram descobrindo a existência de
uma partícula positiva cuja massa era em torno de 1840 vezes a massa do elétron,
foi chamado de próton. Essa partícula possui, de forma incrível, a mesma carga em
módulo do elétron. O núcleo, imaginado a partir de 1900, e tornado mais real em
1911 a partir do modelo de Rutherford não apresentava lógica quando se analisava
a relação de carga e massa. Sua massa sempre era maior que sua capacidade de
carga. Muito mais tarde, em 1932, James Chadwick resolve esse problema
descobrindo o nêutron, uma partícula cuja massa é aproximadamente igual a do
próton, mas que não apresenta cargas elétricas. Os átomos apresentam, quase
sempre, um número de nêutrons igual ou maior que o número de prótons.
Para a Química o interesse pelo estudo do núcleo atômico, apesar de
importante, não tem a mesma representatividade que a do estudo da eletrosfera,
pois, a maior parte dos fenômenos químicos relaciona-se a transformações na
eletrosfera. A figura 21 apresenta, respectivamente, a representação imagética
seguindo o modelo atômico de Bohr para o átomo do carbono e do nitrogênio em
uma escala relacionada ao de raio atômico (distância que vai do centro do núcleo
até o elétron mais externo que é medida por difração de raios x em processos que
envolvem a formação das ligações químicas).
51
Figura 21 – Átomos de Carbono e Nitrogênio com as três partículas
subatômicas segundo o modelo atômico de Bohr.
Isótopo–12 do Carbono
Fonte: Desenhos elaborados pelo autor utilizando dados retirados de Gonçalves, 2001.
Isótopo–14 do Nitrogênio
Fonte: Desenhos elaborados pelo autor utilizando dados retirados de Gonçalves, 2001.
Hoje, podemos afirmar que Bohr conseguiu com certo sucesso explicar o
comportamento dos elétrons no átomo de hidrogênio, porém, para átomos mais
complexos as explicações necessitavam de muitos ajustes com relação às
pesquisas e ao modelo atômico. As observações feitas por Bohr criaram muitas
questões entre as quais: Como o elétron transforma energias quaisquer em ondas
eletromagnéticas? Por que se supõe que as órbitas são circulares? As órbitas
realmente existem? Essas questões criaram muitas dúvidas sobre a representação
E1
E2
prótons (positivos)
nêutrons (neutros)
elétrons (negativos)
Isótopo-12 do Carbono Tem 6 elétrons
6 prótons e 6 nêutrons.
E1
E2
prótons (positivos)
nêutrons (neutros)
elétrons (negativos)
Isótopo-14 do Nitrogênio Tem 7 elétrons,
7 prótons e 7 nêutrons.
Raio de 7,7x10-9
cm = 7,7 nm
Raio de 7,4x10-9
cm = 7,4 nm
52
imagética do átomo, assim, para compreender melhor o comportamento do elétron e
da formação das ondas eletromagnéticas foram necessários muitos estudos
posteriores realizados por grandes cientistas como Arnold Sommerfield (1868 –
1951), Prince Louis de Broglie (1892 – 1986), Werner Karl Heisenberg (1901 –
1976), Erwin Schröndinguer (1887 – 1961), Linus Carl Pauling (1901 – 1994) entre
outros.
A compreensão mais profunda da intimidade da matéria e do estudo do
comportamento de suas partículas formadoras é necessária para obtenção das
novas tecnologias impostas pelo mercado consumidor. Assim, esse estudo, está
relacionado diretamente com necessidades criadas pela sociedade moderna que
visam não apenas o conforto, mas, a manutenção da hegemonia de alguns países
sobre outros. Não é a toa que tantos cientistas continuam a pesquisar e estudar os
as partículas formadoras da matéria.
Para as necessidades da formação em nível médio os modelos atômicos de
Dalton, Thomson, Rutherford e Bohr são capazes de fornecer as explicações em
nível nanométrico que auxiliam a melhor compreensão da química da natureza e das
novas tecnologias geradas pelos seus conhecimentos.
2.2 TEORIA SOCIOCULTURAL DE LEV VIGOTSKY
2.2.1 Lev Semenovich Vigotsky
Lev Semenovich Vigotsky nasceu em 1896, na cidade de Orsha, Bielo-
Rússia. Estudou na Universidade de Moscou e, em 1917, concluiu seus estudos em
Direito e Filosofia. No mesmo ano começa a lecionar Literatura e Psicologia na
cidade de Gomel e cria a revista literária Verask.
Em 1924, Vigotsky, com o auxílio de vários colaboradores, inicia seus
trabalhos de investigação na área de psicologia do desenvolvimento, educação e
psicopatologia. De 1925 até 1934 lecionou disciplinas de Psicologia e Pedagogia
em Moscou e Leningrado. Morreu em 1934, aos trinta e oito anos, vítima de
tuberculose.
53
2.2.2 Filogênese, Ontogênese, Sociogênese e Microgênese
O bielo-russo, Lev Semianowitch Vigotsky, é considerado hoje um dos
grandes pesquisadores relacionados a estruturação e formação dos processos
cognitivos com aplicação na educação. Vigotsky estudou com profundidade o ciclo
vital humano e nos forneceu luz sobre os processos de desenvolvimento e
transformação dos indivíduos a partir de relações biológicas, fisiológicas e sociais.
Para ele há, pelo menos, quatro planos genéticos básicos a partir do qual
ocorre o desenvolvimento e transformação de um indivíduo que seriam a filogênese,
a ontogênese, a sociogênese e a microgênese.
A filogênese relaciona-se a estudos feitos sobre a evolução de determinada
espécie, essa evolução, provocada por adaptações progressivas acaba gerando
predisposições biológicas para cada espécie. Por exemplo, a flexibilidade do gato
relaciona-se a filogênese de sua espécie, assim, todos os felinos tem flexibilidade. O
estudo da filogênese é realizado deste os primórdios da evolução de uma espécie,
ou seja, no caso dos felinos inicia quando os peixes passaram para repteis, dos
repteis para os mamíferos quadrupedes e assim por diante até chegar aos dias de
hoje. No caso dos humanos, o início da filogênese é igual a dos felinos, porém,
evoluímos a partir de mamíferos quadrupedes de maneira diferente, passamos a
bípedes e, com mãos livres, foi proporcionado o fabrico de objetos cuja manipulação
estruturou um cérebro mais plástico que gerou uma grande melhoria na
comunicação, na criação da linguagem, na melhor e mais aprimorada estrutura
social e através de processos mentais a criação de uma relação temporal com a
existência.
Para Moura (2016, p. 108),
A filogênese estuda a evolução das espécies, porém, para compreender este fenômeno, é primordialmente importante descrevê-lo. A espécie é vista como uma continuidade biológica e genética, isto é, o segmento de uma linha, de uma sequência ancestral, e sua evolução consiste em um processo lento de transformação em longos períodos de tempo. Darwin e Wallace foram os expositores da teoria da seleção natural, segundo um princípio evolutivo, no qual todos os seres vivos evoluíram a partir de formas preexistentes mais simples. Por meio desta visão, a evolução das espécies tornou-se termo de complexidade crescente, organização e adaptação biológica (RHODES, 1974). Essa visão evolucionista dá suporte à teoria histórico-cultural em Vigotski, que ao mesmo tempo que tem o evolucionismo como pano de fundo, o supera em vários aspectos dando a ele uma dimensão humana e cognitiva.
54
Os estudos de Vigostsky relacionaram a evolução humana com relação a
evolução dos macacos antropoides que é a espécie que apresenta o crescimento
filogenético mais próximo da dos humanos. Esse estudo foi fundamentado nas
pesquisas de sua época e o levou a concluir que o uso e a criação de instrumentos
foram fundamentais para o desenvolvimento dos processos mentais superiores
característicos dos humanos visto que os macacos antropoides são incapazes de
produzir instrumentos para uso impossibilitando uma maior sofisticação de seus
processos mentais.
A ontogênese é um plano genético que se relaciona à evolução dos
indivíduos de uma determinada espécie desde o princípio da vida até sua morte. A
ontogênese estuda as transformações de cada espécie que ocorrem durante o
período de vida. No caso dos humanos, há, por exemplo, vários períodos da vida
como a infância, a puberdade e a idade adulta. A ontogênese tem uma relação
direta com a evolução dos organismos biológicos, do aumento das capacidades
motoras e de pensamento que acompanham seu crescimento bem como da perda
de algumas capacidades que ocorrem com o passar dos anos da vida adulta até a
morte de indivíduo. No caso dos humanos a evolução biológica leva o individuo ao
domínio de seu corpo e de sua imaginação trazendo crescimento da complexidade
de sua cognição, de sua afetividade e de sua estrutura emocional. Segundo
Vigotsky, 2007, apud Moura (2016 p.109)
A maturação é vista como uma pré-condição do aprendizado e nunca como resultado dele. Então, o aprendizado forma uma superestrutura sobre o desenvolvimento, deixando-o essencialmente inalterado. Estes dois processos diferentes, embora inerentes, influenciam um ao outro. A maturação depende diretamente do desenvolvimento do sistema nervoso e o aprendizado, por si só, também é um processo de desenvolvimento.
Para Vigotsky (1994), a criação das funções mentais superiores ocorre dentro
da ontogênese humana em dois momentos inter-relacionados e consecutivos, pois,
em primeiro lugar o surgimento das funções mentais relaciona-se diretamente com
as interações sociais do indivíduo e, somente após, essas funções são
internalizadas. Assim, observa-se que, para Vigostsky, ocorre um movimento de fora
para dentro, onde as relações sociais acabam se internalizando no indivíduo. A partir
dessa análise surge a sociogênese, que é a parte do plano genético que busca
compreender a criação e evolução das funções mentais superiores dos humanos
relacionadas a interações sociais. Para Vigotsky (1994), as funções mentais só se
55
estruturam a partir das interações sociais, logo, elas só passam a existir no indivíduo
quando ele realiza a mediação entre si e o mundo externo internalizando os signos e
os valores relacionados à cultura social em que está inserido. Para Bedim e Oliveira,
2012, apud Moura (2016 p. 110):
Vigotski apresenta um conceito de sujeito que não se organiza internamente e nem é apenas um simples fenômeno dos estímulos do ambiente. Esta concepção é fundamental para pensarmos que o sujeito não é apenas condicionado pelo meio ou interage com ele de forma neutra, mas, também, o produz e o afeta. Nesse aspecto, o conceito de mediação é fundamental na aprendizagem, pois é através dela e da internalização dos símbolos que os processos psicológicos complexos, característicos do homem, são formados (BEDIM; OLIVEIRA, 2012).
Como para cada indivíduo as experiências em sua relação social são sempre
diferentes, a maneira como o indivíduo assimila essas relações sociais relaciona-se
a sua microgênese. Essa parte do estudo do plano genético é caracterizada pelo
surgimento da psicologia interior de cada indivíduo que cria uma intima relação entre
o psiquismo individual no cruzamento dos fatores biológico, numa relação histórica e
cultural, sendo estas últimas cruciais na formação da afetividade e na criação da
personalidade. Portanto, é de suma importância adensar estudos sobre esta
perspectiva do desenvolvimento. Os planos genéticos, vistos em conjunto, vão
caracterizar a gênese dos processos psicológicos no ser humano.
2.2.3 Bases da Teoria Sociocultural de Lev Vigotsky
As ideias de Lev Vigotsky (2001) sobre a formação da estrutura cognitiva nos
fornece um rico subsídio para entender como os símbolos e signos, representados
por letras, números ou imagens, ganham significado. Lev Vigotsky é um estudioso
que busca caracterizar aspectos do comportamento humano e do aprendizado e
analisa e elabora hipóteses sobre como essas características se formam ao longo
da história humana e de como se desenvolvem durante a vida de um indivíduo.
Vigotsky (1994) busca analisar quatro questões do comportamento humano,
primeiramente, qual é a relação que se processa entre os seres humanos e o seu
ambiente físico e social? Quais as formas novas de atividade que fizeram com que o
trabalho fosse o meio fundamental de relacionamento entre o homem e a natureza?
56
Quais são as consequências psicológicas dessas formas de atividade? E, qual a
natureza das relações entre o uso de instrumentos e o desenvolvimento da
linguagem?
Ele dá especial atenção na compreensão da atividade das crianças no início
da fala, mas, diferentemente de outros pesquisadores que compararam o
desenvolvimento humano ao das plantas (botânicos) ou as dos animais (zoólogos)
ele buscará trabalhar o desenvolvimento da inteligência de forma específica nos
humanos. Nesse período, segundo Vigotsky (1994, p. 31):
[...]os psicólogos estudavam o desenvolvimento do uso de signos como um exemplo de intelecto puro, e não como o produto da história do desenvolvimento da criança. Frequentemente atribuíram o uso de signos à descoberta espontânea, pela criança, da relação entre signos e seus significados.
Para ele os estudiosos da inteligência prática e os estudiosos do
desenvolvimento da fala não relacionam de forma adequada essas duas funções.
Assim, para Vigostsky (1994 p. 32):
[...]o comportamento adaptativo das crianças e a atividade de uso de signos são tratados como fenômenos paralelos - uma visão que leva ao conceito de fala "egocêntrica" de Piaget". Ele não atribui papel importante à fala na organização da atividade infantil, como também não enfatiza suas funções de comunicação, embora seja obrigado a admitir sua importância prática.
Vigotsky atribui à atividade simbólica uma função organizadora que relaciona-
se diretamente ao desenvolvimento da inteligência e do comportamento. Para ele é
no momento da convergência da fala com as atividades práticas de interação que
teremos um maior desenvolvimento intelectual.
Segundo Vigotsky (1994 p. 33):
[...]assim que a fala e o uso de signos são incorporados a qualquer ação, esta se transforma e se organiza ao longo de linhas inteiramente novas. Realiza-se, assim, o uso de instrumentos especificamente humano, indo além do uso possível de instrumentos, mais limitado, pelos animais superiores.
Usando palavras para traçar um plano de ação que a criança utiliza de forma
melhor os instrumentos dando a eles maior significado que aqueles dados pelos
outros animais, os instrumentos não são apenas aqueles objetos de manuseio, mas,
a criança elabora os estímulos fornecidos pelo objeto para estruturar soluções a
problemas futuros.
Com o auxílio da fala a criança consegue controlar melhor o ambiente e isso
produz novas relações e modifica seu comportamento, mais tarde, essas relações
57
produzem o intelecto e a base de seu trabalho produtivo. A fala e a ação, nesse
primeiro momento, estão dentro de um mesmo conjunto de funções psicológicas, por
isso, as crianças, até certa idade, quando submetidas a resolução de um problema,
por exemplo, pegar um doce sobre o armário com o uso de um banco, narram a
ação. A fala facilita a manipulação dos objetos. Nesse período, a fala segue a ação e
é dominada por ela, uma ação como desenhar, por exemplo, é seguida pela fala, ou
seja, somente após desenhar, ela observa e nomeia seu desenho. Nesse primeiro
momento não há, previamente, uma intenção de desenhar tal ou qual objeto, é
durante a ação de desenhar que ela vai estruturando seu significado.
Quanto mais complexa a ação, mais importante fica o uso da fala
egocêntrica4, a criança terá uma maior necessidade da fala para realizar sua ação,
ela organizará a ação e é com o uso da visão, das mãos e da fala que a criança
internalizará o campo visual da ação permitindo a ela a elaboração de estratégias
para realiza-la.
A fala egocêntrica é a base da fala interior e representa uma transição entre
a fala exterior e a fala interior, sendo a fala exterior aquela usada para a
comunicação. Ao tornar mais complexa a ação a criança aumenta o uso emocional
da linguagem aumentando seus esforços para solucionar os problemas e
demostram, quando tiver outra pessoa presente, uma intima relação entre a fala
egocêntrica e a socializada mesclando-as, narra sua organização de ação e busca
confirmação de suas estratégias, atenta para dicas melhores ou para elaborar uma
nova estratégia. Nesse caso, ao elaborar um desenho, a criança narra o que está
desenhando e as imagens vão sendo desenhadas ao mesmo tempo e de acordo
com a narrativa.
Quando, mais tarde, desenvolvem a fala internalizada5 elas recorrem a si
mesmas para solucionar os problemas demostrando que a linguagem falada vai
além da comunicação interpessoal e passa a adquirir uma função de comunicação
com si mesmo, ou seja, intrapessoal. Assim, como na fala egocêntrica as palavras
imaginadas na fala internalizada moldam uma maneira de agir e evitam a ação
meramente impulsiva, distinguindo-a dos outros animais. As experiências que
ocorrem rotineiramente na vida da criança fazem com que ela crie seus métodos de
resolução de problemas que serão internalizados e utilizados para a solução de
4 Na fala egocêntrica a criança, para resolver o problema, fala com ela mesma.
5 Fala que ocorre de maneira interna sem a pronúncia de palavras. Um pensamento verbal.
58
problemas mais complexos. Quando elas organizam esses métodos como uma
forma social de comportamento, elas conseguem desenvolver uma atitude social.
Assim, quando há a internalização da fala social, há, também, a socialização da
criança ao seu ambiente. Nesse momento a criança já desenvolve a capacidade de
pensar no que desenhar antes de fazer o desenho, assim, o desenho é imaginado
antes de ir para o papel. Imaginar o que desenhar sugere que, nesse momento, a
fala internalizada precede a ação, surge ai a função planejadora da fala. É essa
função que permite a criança resolver problemas mais complexos de um intervalo de
ações que estão além das suas experiências mas aquém de sua capacidade de
solução. É utilizando a função planejadora que a criança cria noção de
temporalidade, as experiências já vivenciadas e utilizadas para o planejamento
remontam seu passado e suas relações sociais e o futuro relaciona-se a resolução
de problemas que deverão ser resolvidos a posteriori como, por exemplo, se
amanhã a criança tem uma festa de aniversário para ir ela pode questionar: O que
vou vestir? Que presente vou dar? Do que vou brincar?
O uso das funções cognitivas e comunicativas da linguagem desenvolverão
as funções psicológicas superiores na criança. É importante compreender que o
desenvolvimento de uma criança se passa em um ambiente social e sua ações
estão intimamente relacionadas com ele, sendo direcionadas a objetivos definidos
por seu meio social, assim, a complexidade da estrutura humana está enraizada e
fundamentada na união entre sua história individual e a história da sociedade a que
pertence.
A relação da fala com o uso de instrumentos é fundamental para evolução de
funções psicológicas como o uso dos sentidos para a percepção6 de seu mundo, na
evolução das operações sensório-motoras e da melhoria na atenção. Observa-se
que essa evolução também se relaciona diretamente com a formação das imagens e
de suas representações.
Inicialmente observa-se que quando pedimos para uma criança olhar e
descrever um desenho contendo vários objetos ela utiliza a rotulação, que introduz
a capacidade de, ao mesmo tempo, escolher no desenho e isolar um objeto entre
um conjunto de objetos da figura descrevendo-o isoladamente. Vamos supor que
seja mostrado um desenho contendo três objetos: uma cama, uma mesa e uma
6 Segundo o dicionário Michaelis da editora Melhoramentos – Perceber v. t. d. Adquirir conhecimento por meio
dos sentidos; abranger com a inteligência, entender, enxergar, divisar, ouvir, escutar.
59
cadeira. A criança, nessa fase, isola os objetos e descreve cada um deles
separadamente, nessa fase ela não apresenta a capacidade de relacioná-los como
um conjunto - móveis da casa. A rotulação é uma função primária no
desenvolvimento das crianças que, muitas vezes, para explicar o que veem
substituem sua dificuldade de comunicar-se pela linguagem utilizando gestos e
expressões faciais. Mais tarde ela não só rotula, mas, com a melhoria da fala,
sintetiza e consegue ter uma visão do todo da figura. Nesse caso, se mostrarmos o
mesmo desenho anterior, a criança consegue analisar que o conjunto de objetos
relaciona-se a móveis da casa e posteriormente, se perguntada, os rotula
isoladamente.
Elementos de uma figura são todos vistos ao mesmo tempo, já, a fala é
caracterizada por ser sequencial descreve-se um elemento e depois outro, depois
outro, depois outro,... Na fala, analítica, rotulamos elemento por elemento e os
conectamos em uma estrutura de sentença. Linguagem e percepção estão
interligadas mesmo em processos de resolução de problemas que não envolvam a
fala, mas, envolvem uma linguagem psicológica. Assim, imagina-se que quando um
aluno desenha um átomo ele descreva seus vários elementos que serão analisados
isoladamente como núcleo, elétrons, eletrosfera, camadas eletrônicas,... mas, que
irão gerar uma figura no qual estão inter-relacionados e serão vistos todos ao
mesmo tempo.
Diferente dos outros animais nós percebemos os objetos reais desde idade
muito precoce, não percebemos o mundo apenas como cor e forma, mas, também,
com sentido e significado.
Segundo Vigotsky (1994 p. 44):
Não vemos simplesmente algo redondo e preto com dois ponteiros; vemos um relógio e podemos distinguir um ponteiro do outro. Alguns pacientes com lesão cerebral dizem, quando veem um relógio, que estão vendo alguma coisa redonda e branca com duas pequenas tiras de aço, mas são incapazes de reconhecê-Io como um relógio; tais pessoas perderam seu relacionamento real com os objetos.
Assim, um aluno, ao desenhar um átomo seguindo determinado modelo
atômico está comunicando não uma informação isolada, mas, a representação de
um conjunto de informações inter-relacionadas e que pode ser reconhecido, dentro
desse conjunto de informações, por outras pessoas que detenham entre seus
conhecimentos os da estrutura atômica.
60
Segundo Vigotsky (1994 p. 42):
Crianças mais velhas descrevem ações e indicam as relações complexas entre os diferentes objetos de uma figura. A partir dessas observações, Stern inferiu que o estágio em que as crianças percebem objetos isolados precede o estágio em que elas percebem ações e relações, além dos próprios objetos, ou seja, quando elas são capazes de perceber a figura como um todo.
Nós percebemos o conjunto com todas as categorias de estruturas
conectadas, não temos percepções isoladas. Em experimentos com crianças
pequenas demonstram que os movimentos estão amplamente relacionados ao
pensamento e sua decisão para ação ocorre em uma conjugação simultânea entre
movimentos físicos e gestos com a fala; em crianças maiores, cinco ou seis anos, a
resolução de problemas não envolve mais os movimentos para tomada de decisões
demonstrando a evolução nas atividades psicológicas superiores dos humanos.
A atenção é uma das grandes funções da estrutura psicológica que é de
extrema importância na resolução de problemas. Com o auxílio da linguagem
podemos focar melhor e criar novos centros estruturais dentro do que foi percebido.
A atenção relaciona, de forma dinâmica, experiências do passado para agir no
presente com uma perspectiva do futuro. Com o auxílio da fala a criança controla
sua atenção reorganizando seu campo de percepção. Utilizando a atenção a
criança engloba os diversos campos perceptivos que formam estruturas dinâmicas e
sucessivas ao longo do tempo criando a ideia de temporariedade.
Para Vigotsky (1994 p. 47):
Dentre as grandes funções da estrutura psicológica que embasa o uso de instrumentos, o primeiro lugar deve ser dado atenção. Vários estudiosos, a começar por Kohler, notaram que a capacidade ou incapacidade de focalizar a própria atenção é um determinante essencial do sucesso ou não de qualquer operação prática.
Quando a atenção cria a possibilidade de existência da combinação dos
elementos relacionados aos campos visuais referentes ao presente e ao passado
em um único campo de atenção, onde para solucionar um determinado problema o
instrumento e o objeto da ação ficam no mesmo campo dinâmico da atenção, isso
leva a utilização e reconstrução de outra função fundamental, a memória. Ela torna
disponíveis fragmentos do passado que são utilizados para modificar o presente e
criar uma situação do futuro. Assim, o campo temporal, criado pela fala pode ser
estendido tanto para o passado quanto para o futuro. O sistema de signos cria
condições para o desenvolvimento em um sistema único dentro do campo temporal.
61
Existem dois tipos fundamentais de memória, uma delas é a memória natural,
relaciona-se a percepção criada pela relação direta de estímulos externos como
exemplo uma criança que se machucou com certo brinquedo e, lembrando isso,
toma muito mais cuidado ao brincar ou até não deseja mais brincar com ele. Essa
memória relaciona-se diretamente as funções psicológicas elementares que
relacionam-se aos aspectos biológicos elementares para a vida como comer, beber,
etc. Outra memória, essa praticamente exclusiva dos seres humanos, é criada pela
relação da pessoa com as experiências vividas em seu meio social. Amarrar nós nos
calçados, elaborar desenhos ou entalhar a madeira, mesmo sendo processos
simples criam signos que estendem as operações da memória para além da aptidão
biológica do sistema nervoso humano criando uma maneira totalmente diferente de
comportamento. Os signos são estímulos gerados pela ação do próprio homem,
não são naturais e são relacionados diretamente ao meio social e não ao ambiente
natural. Essa estimulação artificial e autogerada é que cria o tipo de memória que
origina as funções superiores nos seres humanos. Letras, palavras, números e
desenhos, por exemplo, são signos criados pelo homem para sua comunicação,
são signos como esses que desencadeiam a formação dessa memória que leva as
funções psicológicas superiores dos humanos.
Segundo Vigotsky (1994 p. 52):
Mesmo essas operações relativamente simples, como atar nós e marcar um pedaço de madeira com a finalidade de auxiliares mnemônicos, modificam a estrutura psicológica do processo de memória. Elas estendem a operação de memória para além das dimensões biológicas do sistema nervoso humano, permitindo incorporar a ele estímulos artificiais, ou autogerados, que chamamos signos.
Há na representação imagética do átomo a necessidade da utilização das
funções psicológicas superiores que caracterizam os humanos. Desenhar um átomo,
uma estrutura concreta que não se relaciona diretamente ao mundo natural e
sensível, a partir da memória, necessita que, anteriormente, tenha existido uma
estimulação artificial que exigiu atenção e que gerou um signo imagético que
comunica aos iniciados nos estudos da Química um conjunto de informações que,
além da relação temporal, possivelmente, extrapola as informações apresentadas de
maneira estática no desenho.
Para os alunos do nível médio, lembrar a representação imagética dos
modelos atômicos corresponde a um processo lógico cuja elaboração do desenho
62
representa não só o uso da memória relacionada apenas ao desenho, mas de uma
rede de processamentos de informações inter-relacionadas e obtidas durante o
aprendizado de vários conteúdos de Química que envolvem o uso da atomística, ou
seja, o indivíduo não lembra apenas do elemento isolado mas das complexas
relações desse elemento durante os processos de aprendizado. A diferença do
comportamento da criança e do adolescente com relação ao pensar é abordada por
Vigostsky (1994, p. 67) da seguinte maneira:
[...]Para as crianças, pensar significa lembrar; no entanto, para o adolescente, lembrar significa pensar. Sua memória está tão "carregada de lógica" que o processo de lembrança está reduzido a estabelecer e encontrar relações lógicas; o reconhecer passa a consistir em descobrir aquele elemento que a tarefa exige que seja encontrado.
As funções psicológicas superiores alteram a relação estímulo-resposta, os
signos, realizam uma complexa mediação entre o estímulo e a resposta. Observe a
figura 22 que apresenta a relação entre estímulo, signo e resposta.
Figura 22 – Estímulo, Signo e Resposta
Estímulo Resposta
Signo
Fonte: Adaptado de Vigotsky.
Segundo Vigotsky (1994 p. 54), estudos cuidadosos demonstram que esse é
um tipo básico de organização para todos os processos psicológicos superiores,
ainda que de forma muito mais elaborada do que a mostrada acima.
Quando o estímulo fornecido e o impulso de reagir de forma direta é inibido
pela pré-existência de signos e da memória criada por eles, ocorre o uso de
experiências anteriores ajudam a incorporar um estímulo auxiliar que facilita a
resolução do problema. Esse estímulo auxiliar, que é um signo, fornece não só uma
nova maneira de ver o problema, mas, ao inibir a resposta imediata, também, cria
63
uma forma de controle psicológico do comportamento. Assim, a ação não é
comandada apenas pelo estímulo, mas, também pelas experiências do indivíduo
criadas através dos signos desenvolvidos ao longo de seu contato social. Logo, ao
fornecer um desenho de um modelo atômico como o de Dalton, que é apenas uma
esfera, para um indivíduo iniciado nos estudos da atomística, este ganha, através do
controle psicológico do comportamento, um significado que vai muito além da esfera,
assim, observa-se que ao saber que se trata de um desenho relacionado à Química,
a representação imagética, ganha uma nova relação entre o estímulo e a resposta
em que a figura do modelo pode ser considerada o estímulo auxiliar (signo) cujas
ideias que levaram ao desenho foram elaboradas a partir dos estudos formais da
atomística e que auxilia a compreender propriedades que levam o átomo, invisível
aos olhos, ser considerado a estrutura organizada fundamental para formar a
matéria sensível.
2.2.4 Vigotsky Aplicado a Educação
Há na evolução do aprendizado escolar três grandes correntes relatadas por
Vigotsky (1994). A primeira segue a visão de que, apesar de intimamente
relacionados, os processos de desenvolvimento são independentes do aprendizado.
A evolução biológica e cognitiva do indivíduo é independente do aprendizado
escolar, porém, são um pré-requisito para ele. O aprendizado é considerado um
processo puramente externo. Segundo Vigotsky (1994, p. 104):
[...] o desenvolvimento do ato de pensar em crianças em idade escolar, tem-se admitido que processos como dedução, compreensão, evolução das noções de mundo, interpretação da casualidade física, o domínio das formas lógicas de pensamento e o domínio da lógica abstrata ocorrem todos por si mesmos, sem qualquer influência do aprendizado escolar.
Para essa corrente os ciclos de desenvolvimento precedem os ciclos de
aprendizagem.
Uma segunda corrente relaciona-se a visão de que o aprendizado é
desenvolvimento, nesse caso, o processo de aprendizagem está misturado ao de
desenvolvimento. Nela o processo de aprendizagem se reduziu a formação de
hábitos e o desenvolvimento a acumulação de respostas possíveis para determinado
64
estímulo. Para essa corrente os ciclos de desenvolvimento e de aprendizado
evoluem juntos. Segundo a análise de Vigotsky (1994, p. 105) para essa corrente
[...] aprendizado e desenvolvimento coincidem em todos os pontos, da mesma
maneira que duas figuras geométricas idênticas coincidem quando superpostas.
A terceira corrente busca uma composição entre as duas primeiras nela o
desenvolvimento é biológico, cognitivo e de aprendizado, desta maneira, aprender é
também considerado um tipo de desenvolvimento, logo, pode-se imaginar que a
evolução no processo de aprendizado pode impulsionar o desenvolvimento
cognitivo. Para essa corrente o aprender tem papel fundamental no desenvolvimento
da criança, porém, essa ênfase leva essa teoria para um problema pedagógico
relacionado à transferência de conteúdos. A educação formal inclui aspectos que
não estão relacionados à vida cotidiana do aluno, assim, aprender línguas,
matemática, filosofia, ciências naturais, etc... seria considerado importante para o
crescimento mental, porém, várias pesquisas mostraram que o conhecimento de
uma área específica tem pouca influência no desenvolvimento como um todo.
Assim, ao obter grandes conhecimentos nos aspectos fundamentais dos modelos
atômicos, dentro da Química, não implica que o aluno tenha bom desempenho em
assuntos de Física relacionados à eletricidade ou que tenha um espetacular
aprendizado em Literatura ou Filosofia.
Analisando os trabalhos experimentais feitos pelos psicólogos da educação
Woodworth e Thorndike, Vigotsky (1994, p. 107) observa que:
[...] adultos foram treinados, com sucesso, para estimar o tamanho de uma determinada figura bidimensional; porém esse treinamento não os tornou capazes de estimar o tamanho de outras figuras bidimensionais de tamanhos e formas variadas.
Pesquisas tem mostrado que a mente não é um conjunto de capacidades
gerais, mas sim um grupo de capacidades específicas que podem se desenvolver de
maneira independente. Desta maneira o aprendizado seria considerado a aquisição
de várias capacidades específicas de pensar sobre muitas coisas e um determinado
aprendizado só auxilia no desenvolvimento de outro se tiver um mesmo conjunto de
operações ou uma efetiva relação. Assim, dentro da Química, dominar modelos
atômicos pode ser extremamente relevante para capacitar e auxiliar um aluno
aprender as ligações químicas interatômicas. Segundo Vigotsky (1994):
A melhora de uma função da consciência ou de um aspecto da sua atividade só pode afetar o desenvolvimento de outra na
65
medida em que haja elementos comuns a ambas as funções ou atividades.
Um aspecto levantado pela terceira corrente é de que ao aprender algo se
desenvolvem estruturas e operações que podem ser utilizadas em outros
aprendizados que estão por vir, assim, ao criar essas operações o indivíduo, muitas
vezes, adianta-se em sua evolução possibilitando facilitar desenvolvimentos
posteriores. Isso mostra que o aprendizado e o desenvolvimento não são paralelos,
um pode preceder o outro.
Vigotsky rejeita as três posições analisadas por ele e tenta atingir a
explicação ideal para as relações gerais e específicas sobre desenvolvimento e
aprendizagem escolar. Primeiramente deve-se imaginar que a aprendizagem não
escolar inicia-se antes da escolar, assim, por exemplo, chega-se na escola com
noções de uso cotidiano de dividir, somar, subtrais e multiplicar. Para Vigotsky
(1994, p. 110) [...] aprendizado e desenvolvimento estão inter-relacionados desde o
primeiro dia de vida da criança.
Quando queremos saber a relação real entre a capacidade de aprendizagem
e o processo de aprendizagem, não devemos nos limitar apenas aos níveis de
desenvolvimento pré-determinados. É importante compreender que em termos de
aprendizado o que importa é o que o aluno está aprendendo e não o que já
aprendeu. Podemos, a partir daí, estabelecer dois níveis de desenvolvimento que se
interrelacionam, o desenvolvimento real, que corresponde aquilo que se pode fazer
por si mesmo sem auxílio externo, e o desenvolvimento proximal que ocorre quando
há auxílio externo. Nesse último, quando o problema é resolvido criam-se novas
operações a partir desse auxílio há a chamada zona de desenvolvimento proximal
(ZDP) que segundo Vigotsky (1994 p. 112):
[...]nós chamamos a zona de desenvolvimento proximal. Ela é a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar a partir da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas orientados por um adulto ou em,colaboração com companheiros mais.capazes.
Assim, dentro do estudo dos processos que envolvem a interação, a
mediação e a internalização, há ainda um aspecto importante a ser avaliado que é o
limite de capacidade de determinado aprendizado, para Vigotsky esse limite é a ZDP
(zona de desenvolvimento proximal). Ela é uma importante etapa do processo de
66
aprendizagem que corresponde a uma lacuna que se estende desde aquilo que já é
sabido até aquilo que temos a potencialidade para saber, é a lacuna que existe entre
o presente e o futuro, ou seja, entre o que se é e aquilo que se pode ser. Essas
potencialidades biológicas e cognitivas do indivíduo podem ser preenchidas a partir
da adequação de suas interações sociais, assim, por esse ponto de vista a evolução
das capacidades de aprendizagem de um indivíduo depende intimamente da relação
do indivíduo com sua comunidade.
A zona de desenvolvimento proximal relaciona-se a ideia de intimidade,
aproximação e interação. Proximal tem relação com próximo, desta maneira,
entende-se que esse desenvolvimento só ocorre com um individuo em sua inter-
relação com as pessoas próximas e que apresentam maior conhecimento sobre o
assunto. Isso ocorre no relacionamento com os pais, tios, avós, amigos e,
principalmente, em termos de conhecimentos formais com o professor. Assim, é o
meio social que fornece os estímulos que levarão o que se é para aquilo que se
pode ser. Dessa maneira, a pessoa pode se apropriar dos conhecimentos advindos
de sua interação com o meio social e se desenvolverá de acordo com sua
potencialidade natural e orgânica.
Segundo Vigotsky (1994 p. 115) [...] o aprendizado humano pressupõe uma
natureza social especifica e um processo através do qual as crianças penetram na
vida intelectual daqueles que as cercam.
Quando imaginamos a abordagem Química do átomo que não relaciona-se a
um conhecimento cotidiano ou nato, imagina-se o quanto é utilizada a zona de
desenvolvimento proximal entre professor e alunos. A própria ideia de modelo e a
evolução do pensamento científico envolvido nos conteúdos dos modelos atômicos
desde os gregos até o modelo quântico oferece um excelente exemplo de elementos
interligados em ordem crescente cuja conexão é estimulada por um auxilio externo,
nesse caso, do professor. Assim sendo, a representação imagética seria um signo
criado para auxiliar a compreensão dos significados de modelo bem como de como
eles evoluíram a partir de novas descobertas científicas.
67
2.2.5 Signos, Objetos e a Linguagem Química
Na Química do ensino médio há o objetivo de introduzir e formalizar
conceitos relacionados à matéria e suas transformações. Esses conceitos em sua
grande maioria vinculam-se a imagens relacionadas ao átomo. Por exemplo, quando
estruturamos as ideias relacionadas à substância oxigênio, podemos abordá-las a
partir de informações relacionadas ao cotidiano como: na natureza o oxigênio é um
gás na temperatura ambiente, ele é utilizado no processo respiratório como
comburente da glicose para obtenção de energia, constitui, em torno de 22% da
atmosfera terrestre e é o principal elemento químico da superfície terrestre estando
presente na água e em vários minerais. Observe que essas informações sobre o
oxigênio são interessantes e vinculadas ao cotidiano e relacionadas com a Química.
Elas nos conduzem a imagens da água, do ar, da terra, de uma pessoa
respirando,... Porém, por outro lado, essas observações, apesar de científicas não,
necessariamente se utilizam da linguagem química. O uso da Química exige o uso
de sua linguagem, assim, sobre o oxigênio, utilizando as concepções químicas
poderíamos dizer que seu símbolo é “O”, seus átomos apresentam oito prótons no
núcleo e oito elétrons na eletrosfera, sendo seis na camada de valência, realiza
duas ligações químicas por compartilhamento de elétrons e apresentam três
isótopos estáveis, ele gera moléculas apolares diatômicas sendo essas formadas
por átomos unidos por orbitais moleculares sigma e pi originados em orbitais
atômicos “p”, sua substância pura simples apresenta fórmula química O2(g) e é
utilizada como oxidante no processo respiratório. Nesses casos, as imagens das
situações descritas são, em sua maioria, formadas a partir de concepções das
estruturas atômicas. Observe a grande diferença das duas narrativas, na primeira é
citada a terra, a atmosfera, a respiração e a água cujas presenças são constantes
em nossas vidas e desenvolvemos uma relação nata e intrínseca com essa matéria.
A segunda narrativa relaciona-se a conceitos específicos sobre o oxigênio que
envolvem importantes conceitos químicos como: símbolo químico, fórmula química,
ligações químicas, molécula, átomo, próton e número de oxidação. No primeiro
momento as imagens relacionam-se ao mundo sensível, concreto e nato. Feche os
olhos e imagine terra. Fácil, não. Cada um pode imaginar a terra de um jeito, com
cores, texturas e vários aspectos diferentes, logo formar a imagem na mente
68
(imaginar) é simples. No segundo momento as imagens relacionam-se a um mundo
impalpável e invisível aos sentidos. Agora feche os olhos e imagine um átomo de
oxigênio. Se você teve um estudo formal desse assunto no ensino médio ou na
universidade, ainda assim, essa imagem será confusa e fundamentada em um
modelo teórico que apresentará detalhes técnicos que poderão não ser lembrados.
É mais complexo.
O estudo dos modelos atômicos, das imagens e conceitos relacionadas ao
átomo muitas vezes começam a ser estudados já primeiros momentos do estudo da
Química ainda na pré-adolescência, por volta dos quatorze anos, no oitavo ano do
ensino fundamental. Assim, nossos alunos, são conduzidos a imagem estática de
uma estrutura atômica pensada, muitas vezes, como uma estrutura real e cuja
imagem definida em aula representa a realidade concreta do átomo. Estabelecer a
ideia de que os desenhos apresentados representam apenas modelos teóricos não
é a tarefa mais fácil, pois, no momento que se estabelece um desenho para a
representação e, através dele, justificar características da matéria concreta, nos
parece lógico, que o modelo na verdade é a representação da realidade. Como o
desenvolvimento da Química necessita de uma representação simbólica específica,
é necessário criar a imagem do que se está estudando para aprofundar os conceitos
químicos para compreender melhor os aspectos experimentais e teóricos dessa
ciência. Não há como imaginar sem ter a imagem. Assim, para a apropriação do
conhecimento Químico, tão importante quanto a linguagem simbólica escrita
desenvolvida pelos símbolos e fórmulas químicas é a linguagem simbólica por
imagens estabelecidas pelos modelos atômicos.
A evolução dos modelos atômicos, a partir das ideias de Dalton, agregaram a
imagem os avanços na área do conhecimento físico e químico de cada época e
representam uma maneira de pensar e tornar concreta a estrutura nanoscópica da
matéria. Os modelos atômicos procuram justificar os dados obtidos nos
experimentos e sua evolução remonta a revolução histórica do desenvolvimento das
ciências. A compreensão do comportamento da matéria com relação aos modelos
atômicos representava para a Biologia, a Química e a Física um funil teórico cuja
evolução das relações experimentais com as dos modelos atômicos representavam
a mais próxima inter-relação entre as propriedades do mundo observado pelos
sentidos humanos e sua constituição fundamental que caracterizava o mundo
imaginário que explicasse essas propriedades.
69
2.3 EPISTEMOLOGIA DE MARIO BUNGUE
2.3.1 Mario Bungue
Mario Bunge, doutor em ciências físico-matemáticas, nasceu em Buenos
Aires, em 21 de setembro de 1919. Professor de física teórica e filosofia, aprofundou
suas pesquisas na Universidade Nacional de la Plata e posteriormente na
Universidade McGill, em Montreal, onde trabalha desde 1966. Mario Bunge tem
vinte e quatro doutorados Honoris Causa e é membro da American Association for
the Advancement of Science (desde 1984) e da Royal Society of Canadá (desde
1992). Autor de vários livros Bunge desenvolveu várias teorias sobre método
científico, metodologia da pesquisa e modelos. Para Bunge (2008, p. 12) o objetivo
de uma pesquisa não é a acumulação de fatos mas a sua compreensão.
2.3.2 A Matemática e as Pesquisas
Após a segunda guerra mundial há a criação de sistemas hipotético-dedutivos
e a criação de muitos modelos teóricos que melhoraram nossa visão do mundo e
incluem pesquisas que atingem várias áreas do conhecimento. A utilização da
matemática, não restrita apenas aos dados estatísticos, modifica a maneira de ver
os experimentos e dá a clareza necessária a compreensão dos fatos.
Segundo Bungue (2008, p. 13):
Esta revolução científica, a mais grandiosa após o nascimento da teoria atômica contemporânea, foi possível pela aproximação da física e a colaboração profissional de milhares de biólogos e engenheiros, psicólogos e matemáticos, sociólogos e físicos, em alguns serviços de guerra dos EUA e em escala menor na Grã-Bretanha, no último conflito mundial. Tão logo a guerra terminou, desabou uma avalanche de novas abordagens, novas teorias e novas disciplinas oriundas destes contatos.
A partir de 1950 há um grande número de novas teorias que surgem
fundamentadas na matemática dos fatos. Surge a cibernética, a teoria dos jogos, a
sociologia matemática, são consolidados os estudos nas áreas da biologia e da
70
psicologia matemática além de muitas outras teorias oriundas de uma nova maneira
de pensar.
O uso da matemática em ciências não físicas faz com que os modelos
construídos por suas pesquisas ganhem clareza, lógica e critérios do método
científico. Para Bungue (2008, p. 13) a revolução iniciada por volta de 1950 versa
sobre a maneira de abordar o estudo dos objetos não-físicos.
2.3.3 Os Objetos-modelo e o Modelo Teórico
A análise de propriedades semelhantes entre estruturas que aparentemente
são diferentes cria uma inter-relação teórica que leva a melhor compreensão de
ações ou fatos. Dessa maneira, o modelo teórico criado deve se relacionar aos fatos
estudados naquela temporalidade, nos modelos atômicos, observa-se esse
crescimento natural. Dalton, por exemplo, em 1802 se preocupou com as reações
químicas e seu modelo atômico, até os dias de hoje, pode ser utilizado para
justificar e explicar as propriedades mais importantes das reações químicas. Ele
estruturou um átomo maciço para que a massa tenha uma localização precisa e
considerou-o indestrutível para que a massa se conserve. Esse é um exemplo típico
de um objeto-modelo e de uma teoria correspondente que é geral e válida para
todos os processos químicos envolvendo a matéria. O objeto estudado por Dalton,
as reações químicas, geraram um modelo teórico explicativo muito relacionado a
temporalidade dos fatos de sua época, e apesar de um modelo muito simples,
calcado na filosofia grega dos elementos e do próprio átomo, Dalton cria uma
explicação plausível para os fatos. Ele propõe um modelo teórico que relaciona
objetos físicos reais, por meio de objetos-modelos, e suas propriedades químicas
reacionais, por outro lado, quando pensamos em explicar a origem da eletricidade
ou da luz, o modelo atômico de Dalton resulta em um grande fracasso.
Segundo Bunge (2008, p.15):
...todo fracasso de uma ideia pode ser instrutivo em ciência, porque pode sugerir as modificações que será preciso introduzir a fim de obter modelos mais realistas. Em resumo, para aprender o real começa-se por afastar-se da informação. Depois se lhe adicionam elementos imaginários (ou antes hipotéticos) mas com uma intenção realista. Constitui-se assim um objeto-modelo mais ou menos esquemático e que, para frutificar deverá ser enxertado sobre uma teoria suscetível de ser confrontada com os fatos.
71
Modelos teóricos são sistemas hipotéticos dedutivos que concernem a
objetos-modelos que representam algo real. Um modelo não necessariamente
atende a todos os detalhes que cercam a realidade mas sim a alguns de seus
aspectos que relacionam-se ao interesse do pesquisador. É esse fato que permite
que um modelo evolua, cresça e envolva mais detalhes sobre a realidade do objeto,
isso cria um maior número de referenciais teóricos sobre o real. Pensando dessa
maneira entende-se que os modelos são provisórios e devem, para evolução
humana, sofrer modificações não importando se são eles das ciências físicas ou
não. Para Bunge (2008, p. 18):
Em suma, uma vez concebido um modelo da coisa, a gente descreve em termos teóricos, servindo-se para tanto de conceitos matemáticos (tais como o conjunto e probabilidade) e procurando enquadrar o todo em um esquema teórico compreensivo.
2.3.4 A Caixa Preta e o Modelo
As pesquisas que levam as teorias e consequentemente a estruturação de um
modelo começam por aquilo que Bunge chama de caixa preta. Essa estrutura
apresenta aspectos internos desconhecidos, porém, seu comportamento externo
apresenta mecanismos mais ou menos expostos mas que servem para explicar o
aspecto exterior da caixa. Assim pode se analisar os aspectos externos para
posteriormente compreender seu interior. Pesquisas nas mais variadas áreas
iniciam-se pela observação dos aspectos externos no sistema de caixa preta. Assim
é na psicologia, na macroeconomia, na biologia, na química,... Segundo Bunge
(2008, pg. 19):
Seja um sistema qualquer, máquina ou organismo, molécula ou instituição, e suponhamos que alguém queira descrever e predizer seu comportamento sem se ocupar, no momento, de sua composição interna nem dos processos que podem ocorrer em seu interior. Contruir-se-á um modelo do tipo caixa preta, que constituirá uma representação do funcionamento global do sistema, exatamente como a ideia que uma criança faz de um carro, do rádio ou da televisão.
A caixa preta terá uma entrada e uma saída cuja análise de pesquisa tem que
relacionar a entrada e a saída. No modelo de Dalton, por exemplo, sabe-se que a
72
massa da matéria é constante nas transformações, isso é o aspecto externo
relacionado aos efeitos da matéria sensível nas pesquisas de Lavoisier.
Estudar e estabelecer um objeto-modelo que explicasse a natureza fez Dalton
ressuscitar da filosofia grega os elementos e os átomos e elaborar um modelo em
que cada elemento é formado por átomos que são donos da massa da matéria e são
indestrutíveis. Isso explicou o fenômeno da conservação da massa em
transformações da matéria. A entrada da caixa-preta seria as transformações da
matéria e a saída a conservação da massa. Dalton cria um modelo para explicar os
fenômenos de entrada e saída. Revelou-se a partir desse modelo um aspecto
crucial da estrutura da caixa preta mas não todos, nesse caso foi avaliado apenas
um aspecto do comportamento da matéria. Observe que a explicação do fenômeno
não revelou o real interior da caixa-preta. Dalton conseguiu estabelecer uma lei do
sistema que prevê o comportamento da matéria em reações químicas a partir de
variáveis como composição química, proporção de massa, manutenção da massa e
outras que respeitavam as leis ponderais das reações e isso é válido até os dias
atuais. Por outro lado, Dalton não consegue, com seu modelo, justificar
características elétricas da matéria. Logo, a caixa-preta continua sem ser
desvendada.
O surgimento de novas pesquisas e novos modelos teóricos utilizando
entradas e saídas diferentes para a mesma caixa-preta fazem chegarmos mais
próximo da realidade. No caso dos modelos atômicos a sofisticação ocorreu e
modelos mais explicativos e abrangentes surgiram e é bom lembrar que com grande
auxílio da matemática. Para Bunge (2008, pg. 21):
Uma hipótese acerca dos mecanismos escondidos só poderá ser considerada como confirmada se satisfazer as seguintes condições: explicar o funcionamento observado, prever fatos novos além dos previsíveis por modelos de caixa preta e concordar com a massa das leis conhecidas. Tais exigências reduzem o conjunto dos modelos de mecanismos e permitem submetê-los a testes empíricos.
O modelo de Dalton, apesar de não ser aceito de imediato pela comunidade
científica, acabou sendo amplamente divulgado e discutido, pois fornecia
explicações satisfatórias para explicar o comportamento da matéria nas
transformações. Observe que ele se utilizou de todas as premissas descritas por
Bungue na citação acima.
73
Conforme o tipo e a área da pesquisa é necessário compreender que há uma
variedade de modelos de caixas pretas. Para Bunge (2008, p. 21)
É possível, pois, propor, uma grande variedade de modelos de um sistema dado: caixas pretas sem estados internos, caixas pretas (ou melhor , cinzentas) com estados internos, e caixas com mecanismos (mecânico ou outro qualquer); caixas deterministas e caixas estocásticas; caixas com um só nível (por exemplo, físico) ou com muitos (por exemplo, físico e biológico), e assim por diante. A escolha entre estes diversos objetos-modelo e os modelos teóricos correspondentes dependerá do objetivo do investigador.
2.3.5 Construção do Objeto-modelo
A construção da representação de um objeto-modelo, que é uma
representação esquemática de um objeto concreto ou de um fato, fundamentada em
um modelo teórico é uma atividade criadora.
Um objeto-modelo por si só não serve muito se não consegue se adequar e
se enquadrar a um conjunto de ideias que permitam explicitá-lo. Elas devem
fornecer uma relação dedutiva que ajude a tecer observações que tornam o modelo
explicativo do comportamento do objeto dentro dos fatores analisados e, acima de
tudo, permitam a criação de uma teoria geral sobre esse comportamento analisado.
A estruturação do modelo atômico de Dalton, por exemplo, levou a um
desenho que inseria qualidades ao objeto-modelo levando-o a uma visão concreta e
conveniente para a interpretação de sua teoria. Ele levou em conta, em sua análise,
apenas alguns fatores mas adequou ao conjunto de ideias, as leis ponderais,
criando assim uma teoria geral que o levou a uma imagem especulativa, um modelo,
de como e quais características teria o objeto, no caso, o átomo. Segundo Bunge
(2008, p. 25)
Uma coisa pode ser representada de modo mais ou menos esquemático por um desenho ou desenho animado que será então um modelo concreto da coisa. Tal representação será literal ou simbólica, figurativa ou inteiramente convencional. Em todo caso será parcial, pois ela há de supor que certas propriedades das coisas não merecem ser representadas, quer porque são tidas como secundárias, quer porque as uvas estão ainda muito verdes.
Nas teorias envolvendo as ciências há a estruturação do objeto-modelo
relacionado a evolução do conhecimento científico. No caso do modelo atômico
observa-se que com a evolução os desenhos representativos vão se tornando mais
74
complexos, mais explicativos e justificando mais propriedades do objeto. Essa
complexidade devido ao grande número de informações, a quantidade de variáveis
matemáticas e as características estruturais do novo modelo resulta em uma
situação que só conseguimos imaginar como é seu comportamento com relação as
variáveis avaliadas.
Modelos complexos são, por vezes, melhor representados por diagramas
como, por exemplo, os de densidade de probabilidade no caso do modelo quântico
do orbital. Para Bunge (2008, p. 26):
...os desenhos, por mais úteis que sejam em ciência experimental e por razões psicológicas, não são, em geral, constituintes da teoria. Basta lembrar dos desenhos do fim do século sobre o papel dos diagramas e dos análogos mecânicos: Mach censurava Dalton por desenhar átomos que se considerava puras ficções, ao passo que Duhem desprezava o que ele escola inglesa de física por seu apego a representações visuais e aos mecanismos mecânicos. Recentemente, esse debate foi reaberto: está de novo em moda fazer elogios dos modelos visuais e mesmo de análogos e metáforas. Alguns consideram as representações visuais como muletas psicológicas, mas também como desempenhando função lógica.
A expressão modelo terá, pelo menos, dois sentidos, pode ser uma
representação esquemática gráfica ou por desenho de um determinado objeto ou
um modelo teórico que leva a uma idealização. Nesse último caso, cria-se um
modelo hipotético-dedutivo que pode ser impossível de ser representado por
desenhos, esquemas ou gráficos.
Para os estudantes da química do nível médio, é importante ressaltar a
importância da função lógica e psicológica, citada por Bunge (2008, p. 27) dos
desenhos dos modelos atômicos. Os desenhos reforçam as teorias e vice-versa. Os
quatro principais modelos atômicos como visto no item 2.1 da revisão de literatura,
carregam em seus desenhos aspectos científicos suficientes para a formação de um
cidadão ativo na sociedade, por isso, é desnecessário o estudo de modelos
atômicos mais avançados cujos desenhos serão muito complexos ou impossíveis de
serem concretizados, assim, nesse nível de estudos da Química, faz-se
desnecessários os estudos de distribuição eletrônica em subníveis energéticos, o
famoso diagrama das diagonais de Pauling, e de números quânticos magnético e
spin, relacionados aos movimentos de translação e de rotação do elétron. A carga
teórica desses modelos atômicos mais modernos é profunda e de pouco auxílio na
compreensão da natureza imediata sendo de muita importância no nível superior
75
mas de extremo mau gosto nos estudos realizados no ensino médio cujo objetivo
fundamental é outro.
Um modelo teórico atendendo, muitas vezes, a necessidade das explicações
para fatos fixa-se em determinado foco. A expansão do objeto-modelo necessita
pesquisas e estudos que levem em conta outros fatores em focos ainda não
trabalhados ou com o mesmo foco mas buscando outras características do fato.
Assim, um modelo teórico, dependendo da situação, pode ser abandonado para a
criação de um novo modelo que satisfaça melhor a explicação da realidade. Um
exemplo é a evolução do modelo atômico. Para Bunge (2008, p. 30):
Todo modelo teórico é parcial e aproximativo: não apreende senão uma parcela das particularidades do objeto representado. Eis por que malogrará cedo ou tarde. Mas na ciência, mesmo a morte é fecunda: o malogro de um modelo teórico o levará a construção, quer de novos objeto-modelo, quer de novas teorias gerais.
O modelo nas ciências da natureza representa uma maneira de pensar sobre
os fatos investigados. Na educação Química, cujas teorias estudadas são
estruturadas fundamentalmente nos modelos atômicos, observa-se que se bem
compreendida a ideia fundamental de modelo atômico e de sua permanente
evolução bem como sua importância na explicação dos fenômenos naturais, a
aprendizagem de assuntos correlatos será muito facilitada. Segundo Bunge (2008,
p. 29):
O termo “modelo” designa uma variedade de conceitos que é preciso distinguir. Nas ciências teóricas da natureza e do homem parece haver dois sentidos principais: o modelo enquanto representação esquemática de um objeto concreto e o modelo enquanto teoria relativa a esta idealização.
2.3.6 Modelos nas Ciências Naturais
Os modelos teóricos são esboços hipotéticos de coisas e fatos supostamente
reais. Há uma ambiguidade no termo “modelo” que faz com que apresente muitos
sentidos e os esboços fornecidos por ele, relacionados a pesquisas e estudos,
supostamente representam o real.
O objeto-modelo é uma importante estrutura que auxilia a entender melhor as
teorias gerais e levam a uma teoria específica que chamamos de modelo teórico.
Esse, por sua vez, fornece concretude em sua representação simbólica e podem ser
76
empiricamente testados e inscritos na teoria geral ajudando a compreender melhor
aspectos da realidade.
Se considerarmos o objeto-modelo como qualquer representação
esquemática de um objeto: desenho, esboço, equação matemática, diagrama,
animação, foto,... Se o objeto for concreto o modelo gerado por ele é uma
idealização. A representação nunca é completa e inclui elementos imaginários que
são misturados com elementos concretos que, como muitos pormenores da
realidade são ignorados e descartados, levam a uma aproximação do real, assim, o
modelo teórico gerado pela pesquisa realizada com um determinado objeto não
apresenta a mesma complexidade da realidade.
O objeto-modelo é um constructo que sempre possui um fato como referência
podendo ser conceitual ou não. Como o objeto-modelo faz parte da teoria ele herda
suas peculiaridades e leis. Para Bunge (2008, p. 34):
Nem todos os objetos-modelo são conceituais e nenhum modelo conceitual de um objeto concreto é um modelo teórico, embora possa contribuir de base para este. Um colar de contas multicoloridas pode representar uma cadeia polímera, e um cociograma representa algumas das relações entre os indivíduos em um grupo, mas o primeiro é um modelo físico ou análogo e o outro é apenas uma apresentação de dados. A fim de conseguir um modelo teórico, o objeto-modelo tem de ser absorvido por uma teoria, o objeto-modelo herda as peculiaridades desta e, em partículas, suas leis.
Nas ciências naturais há uma ordem para se chegar ao modelo teórico. A
coisa ou fato gera o objeto-modelo cuja pesquisa origina o modelo teórico, um
exemplo seria o do estudo do comportamento dos gases com relação a
movimentação das partículas, esse é o fato que gera o objeto-modelo que é
considera-los gases ideais, ou seja, descarta-se o volume das partículas e as
atrações entre as moléculas. Isso gera o modelo teórico da teoria cinética dos
gases. Segundo Bunge (2008, p 35):
Em alguns campos, o modelo teórico é construído em torno do objeto-modelo. Nos campos mais avançados, o objeto-modelo pode amiúde ser vinculado a uma teoria geral existente. Assim, na teoria da aprendizagem dificilmente há uma teoria genérica: cada modelo de aprendizagem é uma esquematização de um certo tipo de experimento, e os modelos adequados parecem não adaptar-se a uma única teoria compreensiva.
As teorias gerais, geradas pelos modelos teóricos, são genéricas e atendem a
um grupo de situações semelhantes, porém, devem permitir a criação de teorias
específicas que a permitam fornecer explicações para situações particulares. Assim,
77
as teorias gerais devem permitir o enriquecimento com dados e informações
referentes a condições particulares para internaliza-las em seus princípios.
Nem todo modelo teórico conceitual leva a produção de um mecanismo assim
como os objetos-modelo podem não ser determinados a sim probabilísticos como é
o caso, por exemplo, do elétron visto pela mecânica quântica moderna.
Um objeto-modelo inserido em teorias gerais diferentes fornece modelos
teóricos diferentes, por exemplo, modelos de moléculas gasosas avaliadas pela
mecânica clássica e pela mecânica quântica gerarão ideias e imagens diferentes.
Desenhos das moléculas pelo modelo de Dalton e pelo modelo quântico de Bohr
apresentam significativas diferenças. Um objeto-modelo mesmo visto pelos ângulos
de teorias diferentes não poderá substituir o próprio objeto, eles só retratam o objeto
com maior ou menor aproximação da realidade e ajudam a compreender melhor seu
comportamento. Um exemplo, dentro dos estudos de modelos atômicos é observar
que o elétron de Thomson não é o mesmo de Bohr apesar de ambos terem carga
elétrica negativa e terem mobilidade de translação quando fora do átomo. Bohr
concede aos elétrons energias quantizadas e insere movimento de translação para o
elétron dentro do átomo. Inseridos em modelos de temporalidades e abrangências
conceituais diferentes os elétrons de nenhum dos dois modelos pode substituir a
ideia do elétron real pois não levam em conta vários fatores relacionados ao elétron
real e que apresenta, ainda hoje, muitas caixas pretas a serem estudadas.
A ideia que cerca a formação dos modelos é complexa e segundo Bungue
(2008, p. 38) na semântica e, particularmente na teoria do modelo, “modelo” significa
uma interpretação de um teoria abstrata sob a qual (interpretação) todas as
afirmações da teoria são satisfeitas (verdade). Qual é a relação entre este conceito
semântico de modelo e o conceito metacientífico de modelo teórico? Evidentemente,
toda teoria científica, seja genérica ou específica, é uma teoria interpretada no
sentido de que, se devidamente formulada, contém regras e suposições que dotam
o formalismo de um significado factual.
78
3 A METODOLOGIA
3.1 Caracterização da Pesquisa
Essa pesquisa é qualitativa, com levantamento e análise dos dados e quanto
a natureza foi do tipo aplicada, pois busca gerar conhecimentos que visa a aplicação
prática do produto e, com relação aos procedimentos utilizados é enquadrada dentro
de um estudo de caso.
3.2 O Contexto da Pesquisa
Na Química do ensino médio os modelos imagéticos do átomo são
formalmente trabalhados durante a abordagem histórica da evolução dos modelos
atômicos no primeiro ano, geralmente, dentro de um período de tempo que varia de
dois a seis períodos de aula, dependendo do nível de abordagem que o professor
imagina necessário e da carga horária da Química na escola. Muitas escolas
apresentam esses modelos já no oitavo ou nono ano do ensino fundamental. Na
escola que foi feita a pesquisa, a carga horária da Química para o primeiro ano do
ensino médio é de quatro períodos e são abordados assuntos de Química Geral e
de Cálculos Químicos.
Após apresentados os modelos atômicos ainda no primeiro ano, há, na
Química formal um mergulho no estudo do átomo e são elaborados muitos conceitos
com base nesses modelos como: número atômico, número de massa, capacidade
de ligação, valência, estabilidade, potencial de ionização, cátions, afinidade
eletrônica, ânions, eletronegatividade e tantos outros. Isso pode ser abordado
apenas em nível conceitual ou utilizando também desenhos que representam o
átomo e suas características. A Química de primeiro ano pode ser trabalhada com
imagens atômicas e moleculares até seu conteúdo final que são as reações
inorgânicas e os cálculos químicos.
Na escola em que foi feito o estudo, no segundo ano, são feitos estudos das
soluções e da físico-química, que utilizam em suas abordagens de maneira muito
rica as relações atômicas como foi visto na justificativa (p. 12). Como exemplos
dessa utilização teríamos o estudo da teoria das colisões e da entalpia de ligações
que, por exemplo, pertencem, respectivamente, aos estudos da cinética química e
79
da termoquímica e que utilizam de forma direta a representação atômica e
molecular. No terceiro ano as imagens de átomos e moléculas, utilizando os
modelos atômicos vistos no primeiro ano, envolvem apenas alguns átomos cujos
principais são: carbono, hidrogênio, oxigênio, nitrogênio, fósforo, enxofre e os
halogênios. Normalmente, esses átomos são apresentados pelo modelo de Bohr
que determina o número de elétrons da camada de valência e, consequentemente, a
capacidade de ligação de cada átomo envolvido na formação dos compostos
orgânicos. Observe os desenhos dos átomos apresentados na figura 22 dos
elementos organógenos (carbono, hidrogênio, oxigênio e nitrogênio) apresentados
nas primeiras aulas de química orgânica.
Figura 23 – Elementos Organógenos
Fonte: Arquivo pessoal do autor.
Átomo do Carbono
Átomo do Nitrogênio
Átomo do Hidrogênio
Átomo do Oxigênio
80
Tradicionalmente, no estudo dos compostos orgânicos, os átomos são
representados pelos seus símbolos químicos. As moléculas pelas estruturas de
Lewis como na representação do propano apresentado na figura 23 ou as fórmulas
estruturais planas como a da molécula do etanol apresentado na figura 24.
Figura 24 – Fórmula de Lewis do Propano (um dos componentes do gás de
cozinha)
Fonte: Arquivo pessoal do autor.
Figura 25 – Fórmula Estrutural Plana do Etanol
Fonte: Arquivo pessoal do autor.
Observe que nesses casos usam-se os símbolos químicos, pontos, balões e
traços para representar elétrons, ligações e orbitais moleculares e atômicos.
No desenvolvimento dos assuntos de Química Orgânica foi utilizada uma
abordagem tradicional voltada para preparação dos alunos para os concursos de
que irão participar. Estrutura-se o estudo das cadeias carbônicas e das funções
orgânicas, sempre trabalhando com a união dos átomos, mas, usando os símbolos
químicos C, N, H, O, S e P para representar os átomos e traços (──) para
representar as ligações químicas covalentes.
C C C • • • • • • • • • •
• •
• •
• •
• •
• •
H H H
H H H
H H
C C O
H H
H H
H H
81
Nesse primeiro momento é muito importante entender a relação entre o
conteúdo pesquisado e o público alvo da pesquisa. Como o ponto de partida dessa
pesquisa qualitativa aplicada relaciona-se diretamente com a ampla utilização de
modelos atômicos na evolução de vários conteúdos de química e visto ser
constantemente utilizada a representação imagética dos átomos nas abordagens
dos conteúdos, para o desenvolvimento desta pesquisa seria necessário trabalhar
com alunos que já tivessem várias experiências com os conteúdos de Química e,
imagina-se, que tivessem passado por vários conceitos e ideias que se
relacionavam direta ou indiretamente com as representações imagéticas dos átomos
e de sua estrutura. Assim, o público-alvo escolhido foi o dos alunos do último ano do
ensino médio. A escola escolhida é privada e pertence ao município de Santa Maria.
Essa escola apresenta alunos de alta performance em concursos, tendo obtido, no
ano da pesquisa, segundo dados divulgados pelo Ministério da Educação, primeiro
lugar do ENEM das escolas particulares da cidade de Santa Maria e quinto lugar
geral no estado do Rio Grande do Sul. Assim, a escolha do terceiro ano do ensino
médio parece natural devido aos vinte e nove alunos participantes já terem estudado
muitos conteúdos de Química relacionados ao átomo e, teoricamente, fornecerão
uma melhor representação para ele.
Esta pesquisa apresenta termo de consentimento anexado no apêndice A.
3.3 Instrumentos de Coleta de Dados
Como um dos objetivos dessa pesquisa foi investigar desenhos produzidos
por alunos do último ano do ensino médio, foi solicitada a elaboração de imagens de
átomos específicos e importantes nos estudos de Química. Os átomos cujos
desenhos foram pedidos são os organógenos (carbono, hidrogênio, nitrogênio e
oxigênio). Assim, a partir da análise desses desenhos pode-se estabelecer a relação
entre a representação imagética dos átomos e alguns dos aspectos importantes do
conteúdo formal que se relacionam a esse tipo de representação. Porém, como o
objetivo do estudo dos átomos é a formação das estruturas reticulares e
moleculares, sendo as moleculares vastamente estudadas em toda a Química, foi
necessário verificar qual tipo de representação imagética os alunos utilizam para
desenhar os átomos na formação das moléculas. Para isso ocorrer foi necessário,
em um segundo momento, obter os desenhos dos átomos na formação de
82
moléculas, no caso, foi solicitado para que desenhassem a molécula do etanol. Por
último foi aplicado um questionário para complementar as informações relacionadas
à pesquisa.
Cronologicamente as três etapas da pesquisa seguiram o seguinte caminho:
após três meses de aula, dentro do estudo do petróleo, foi pedido para os alunos
desenharem, como eles imaginavam serem os átomos de carbono, hidrogênio,
oxigênio e nitrogênio. O desenho envolveu liberdade de expressão. Foi explicado, na
introdução da atividade, que cada um deveria representar os átomos como eles o
imaginavam. Na semana seguinte foi pedida a elaboração da representação
imagética de uma molécula de etanol, formada pela união de nove átomos. Foi
novamente reforçada a ideia de que eles “deveriam” seguir sua imaginação.
Quinze dias, após elaborada a etapa dos desenhos, foi aplicado um
questionário com oito questões que abordavam vários aspectos com relação aos
modelos atômicos estudados no ensino médio. O questionário está apresentado no
apêndice B.
Existem vários aspectos formais que podem ser analisados em uma
representação imagética. Porém, nessa pesquisa foi feita a verificação de alguns
dos aspectos formais relacionados aos desenhos, que são:
a) observar se na representação imagética dos átomos há a imagem da eletrosfera e
dos seus elétrons;
b) verificar se na representação imagética dos átomos há a representação do núcleo
atômico;
c) analisar, dos quatro modelos atômicos vistos, qual dos modelos atômicos foi mais
utilizado para representar os átomos isolados e qual foi mais utilizado para
representar os átomos nas moléculas;
d) verificar se, no desenho da molécula, é respeitada a característica de valência
dos átomos.
4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS
A pesquisa foi elaborada no ano de 2016 em uma turma com trinta e cinco
alunos do terceiro ano do nível médio de um colégio da cidade de Santa Maria
localizada no estado do Rio Grande do Sul. Dos trinta e cinco alunos da turma, vinte
83
e nove participaram da pesquisa. Um dos alunos, por motivo de um intercâmbio
acabou não participando e quatro alunos, por motivos pessoais, faltaram a algum
dos três encontros da pesquisa e decidiram não participar.
No terceiro mês de aula, sem aviso prévio, foi pedido para que os alunos
desenhassem os átomos dos elementos carbono, hidrogênio, oxigênio e nitrogênio.
Foi esclarecido que fazia parte de uma pesquisa e que não valeria nota. Não foi
sugerido nem citado nenhum modelo atômico estudado anteriormente. Lembrando
que, no sistema clássico de ensino, o estudo dos modelos atômicos é realizado no
início do primeiro ano do ensino médio, ou seja, praticamente dois anos antes do
desenvolvimento desta pesquisa.
O modelo de Rutherford-Bohr foi o escolhido por 28 participantes, ou seja, por
96,55 %, como o do exemplo apresentado na figura 26 abaixo.
Figura 26 – Representação dos átomos de carbono, nitrogênio, oxigênio e
hidrogênio, seguindo o modelo de Rutherford-Bohr, elaborados pelo
participante A04.
Fonte: Representação imagética feita pelo estudante A04.
Dos vinte e oito alunos que escolheram o modelo de Rutherford-Bohr dois, ou
seja, 6,88 % desenharam a eletrosfera do átomo com órbitas parciais. Essa maneira
simplificada de representar é muito utilizada quando se quer o desenho do átomo e
o tempo é escasso como, por exemplo, nas resoluções de testes. Um exemplo está
representado na figura 27 exposta a seguir.
84
Figura 27 – Representação dos átomos de carbono, nitrogênio, oxigênio e
hidrogênio seguindo o modelo de Rutherford-Bohr com órbitas parciais
elaborados pelo participante A11.
Fonte: Representação imagética feita pelo estudante A11.
Como resultado de escolha do tipo de modelo um aluno, correspondendo a
3,44 % dos participantes, utilizou o modelo próprio em que o átomo foi representado
por uma esfera com a distribuição eletrônica da camada de valência. Esse modelo
está representado na figura 28 apresentada a seguir:
Figura 28 – Representação dos átomos de carbono, nitrogênio, oxigênio e
hidrogênio seguindo um modelo próprio como uma esfera com camada de
valência elaborados pelo participante A21.
Fonte: Representação imagética feita pelo estudante A21.
85
A Tabela 1, a seguir, dispõe os dados apresentados anteriormente em que,
na primeira coluna são colocados os modelos formais estudados no ensino médio
no período de três anos. Os modelos estão colocados em ordem crescente de
cronologia e complexidade. Na segunda coluna são colocados os valores
percentuais dos alunos que seguiram cada um dos modelos para fazer seus
desenhos e na última coluna o número de alunos que utilizou cada um dos modelos.
Tabela 1 – Modelos Atômicos Apresentados Nos Desenhos de Átomos
Modelo Atômico Formal Estudado no
Ensino Médio
% de Alunos que
Utilizaram o Modelo
Número de
Alunos
Dalton
(esfera maciça)
0 0
Thomson
(esfera positiva com elétrons incrustrados)
0 0
Rutherford-Bohr/Órbita Circular
inteira ou parcial
(núcleo positivo com elétrons em órbitas
circulares com energia quantizada)
96,55 28
Orbital
(núcleo positivo com elétrons em orbitais)
0 0
Outro Modelo
(Modelo não formal criado pelo
participante)
3,44 1
Fonte: Análise imagética.
A partir dos dados da tabela 1 conclui-se que a grande maioria dos
participantes da pesquisa optou por um modelo mais complexo de átomo indicando
que suas concepções atômicas são mais detalhadas e incluem núcleo, eletrosfera,
elétrons, cargas elétricas e órbitas circulares. Um participante optou por representar
um modelo próprio, representado na figura 3. Apesar de ser um modelo autoral,
observa-se nitidamente a utilização de conhecimentos formais visto que a
representação apresenta uma concepção de eletrosfera registrada em seu desenho
como a camada de valência e seus elétrons, ou seja, ele utilizou um dos
conhecimentos mais importantes da estrutura atômica que é sem dúvida a
86
informação mais importante para o estudo das ligações químicas. Nenhum aluno
escolheu os modelos de Dalton ou Thomson demostrando que seus conhecimentos
sobre a estrutura atômica é mais complexo e que esses modelos não
comtemplariam as características desejadas em suas representações. A decisão da
maioria em seguir o modelo mais complexo indica que houve o aprendizado indicado
pela complexa mediação feita pelo conjunto de signos utilizados nos desenhos.
Observe a figura 4 que apresenta a relação entre estímulo, signo e resposta
utilizando o assunto da pesquisa.
Figura 29 – Estímulo, Signo e Resposta
Estímulo Resposta
Átomo Desenho
Modelo de Rutherford-Bohr
Signos
Fonte: Adaptado de Vigotsky.
A decisão de utilizar o modelo mais complexo precede a elaboração do
desenho, portanto exige conhecimento prévio e uma utilização mais ativa das
funções psicológicas superiores. Para Vigotsky (1994 p. 45) os adultos tomam uma
decisão preliminar internamente e, em seguida, levam adiante a escolha na forma de
um único movimento que coloca o plano em execução.
Passados quinze dias da elaboração dos desenhos, foi entregue, sem aviso
prévio, aos participantes da pesquisa um questionário com oito questões (apêndice
B). Foi esclarecido para os alunos que se tratava da continuidade da pesquisa e que
não valeria nota. Nesse questionário constavam questões pertinentes a estrutura
atômica, uma das questões era a seguinte:
87
Questão 05. Quando você pensa em um átomo e resolve desenhá-lo qual modelo
você escolhe
□ Dalton (esfera – bola de bilhar).
□ Thomson (esfera positiva com elétrons incrustrados – pudim de passas)
□ Rutherford-Bohr (elétrons em órbitas com energias definidas para cada órbita –
planetário).
□ Outro modelo.
A partir da análise da pergunta cinco do questionário foi possível analisar a
coerência entre o desenho feito e a resposta ao questionário. Na questão de múltipla
escolha 8,82%, ou seja, três estudantes desenhariam o modelo de Dalton, 11,76%,
quatro estudantes, desenhariam o modelo de Thomson e 79,42%, correspondendo a
27 estudantes, desenhariam o modelo de Rutherford-Bohr. A Tabela 2 apresenta, na
segunda coluna a porcentagem de alunos com relação a escolha dos modelos
apresentados na questão cinco do questionário.
Tabela 2 – Questão Cinco: A Escolha do Modelo
Modelos Atômicos Apresentado na
Questão 5
% de Alunos que
Utilizaram o Modelo
Número de
Alunos
Dalton
(esfera maciça)
13,79 4
Thomson
(esfera positiva com elétrons incrustrados)
3,45 1
Rutherford-Bohr
(núcleo positivo com elétrons em órbitas
circulares com energia quantizada)
75,86 22
Outro modelo 6,9 2
Fonte: Questionário aplicado aos participantes.
Observando os dados da tabela 2 é possível concluir que há uma incoerência
na resposta fornecida com relação ao desenho apresentado de 20,58 % dos
participantes, ou seja, oito alunos desenharam um modelo, mas posteriormente
escolheram outro. O participante A21, único a desenhar um modelo de átomo
diferente do de Rutherford-Bohr, afirma na resposta de seu questionário que
88
desenharia o modelo de Rutherford-Bohr, outros sete participantes desenharam o
modelo de Rutherford-Bohr, mas afirmaram que desenhariam modelos como de
Dalton, Thomson ou outros.
Outra análise prevista para essa pesquisa seria se o átomo desenhado
apresenta núcleo definido e eletrosfera. Como, vinte e oito participantes,
correspondendo à taxa de 96,55% dos alunos, o modelo escolhido foi o de
Rutherford-Bohr, então, esse modelo apresenta em sua estrutura núcleo e
eletrosfera, e ao analisar os desenhos, foi verificado que dos 29 desenhos
retratando os modelos atômicos 75,86 % apresentava núcleo, porém, 100%
apresentavam eletrosfera. É bom ressaltar que o desenho do participante A21, cujo
modelo foi estruturado por ele, apresenta camada de valência que é uma parte da
eletrosfera, assim, esse participante foi incluído dentre aqueles que apresentaram
eletrosfera. A Tabela 3, apresentada a seguir, apresenta esses dados.
Tabela 3 – Estruturas do átomo apresentada no desenho
Estrutura do
Átomo
% de Alunos que Desenharam a
Estrutura
Número de
Alunos
Núcleo
75,86 22
Eletrosfera
100 29
Fonte: Análise imagética.
Analisando esses dados é importante verificar que 24,14% dos pesquisados
curiosamente não desenharam o núcleo atômico no seu átomo, mas todos se
preocuparam em desenhar de forma total ou parcialmente a eletrosfera. Um fato que
pode justificar essa atitude é de que a eletrosfera é amplamente utilizada nas
explicações químicas do comportamento do átomo com relação as ligações,
interações intermoleculares e formação das moléculas, portanto, é o assunto mais
tratado com relação ao átomo no decorrer dos estudos do ensino médio. Assim,
poderíamos avaliar que há uma falha no constructo, ou seja, por um lado apesar do
sujeito saber que o átomo tem núcleo ele não o representa por acha-lo irrelevante
ou, por outro lado, não sabe que o núcleo existe, nesses casos há uma
89
representação parcial do modelo atômico de Rutherford-Bohr, porém com vários
aspectos relevantes apresentados.
Em se tratando de desenhos é bom lembrar que ele se origina a partir de um
objeto-modelo e que sua complexidade, muitas vezes, não é retratada com
fidelidade. Para Bunge afirma que (2008, p. 26):
O desenho, mesmo quando é possível (não é o caso do elétron7 e
das ideias) não substitui o objeto-modelo. E quando é possível e útil fornecer uma representação visual do objeto-modelo, amiúde este ultimo precede o desenho e este é sempre menos rico que a ideia representada.
Outra questão pertinente a estrutura atômica apresentada no questionário do
apêndice B foi a questão 7 apresentada a seguir:
07. Qual aspecto você acha mais relevante para mostrar em um desenho de átomo?
□ Características de massa e volume.
□ Sua capacidade de ligação (valências).
□ A existência da eletrosfera e sua distribuição eletrônica.
□ A existência do núcleo.
Na análise das respostas dessa questão observou-se que nenhum
participante acha que o aspecto mais relevante seria o do átomo apresentar massa
e volume, porém, a maioria deles, correspondendo a 48,27% acha os aspectos
relacionados com a capacidade de ligação do átomo sua característica mais
relevante. Treze participantes, correspondendo a 44,82% acham que a existência da
eletrosfera e sua distribuição eletrônica são o aspecto mais importante para ser
apresentado no desenho do átomo. Para 6,9% dos pesquisados, ou seja, dois
participantes, o núcleo atômico o aspecto mais importante. A tabela 4, a seguir,
apresenta esses dados.
7 Bunge refere-se ao elétron seguindo as ideias mais modernas como da concepção onda-partícula
de Louis De Broglie e do princípio da incerteza de Werner Heisenberg.
90
Tabela 4 – Questão Sete: Características Importantes em um Desenho do
Àtomo.
Característica mais Importante do
desenho do átomos
% do grau de relevância
dos participantes
Número de
Participantes
Características de massa e volume.
0 0
Sua capacidade de ligação
(valências).
48,27 14
A existência da eletrosfera e sua
distribuição eletrônica.
44,82 13
A existência do núcleo.
6,9 2
Fonte: Questionário aplicado aos participantes.
A análise dos dados da tabela leva-nos considerar que a capacidade de
ligação de um átomo que se relaciona a distribuição dos elétrons na eletrosfera é o
aspecto mais importante do desenho do átomo, assim, que os 48,27% dos
participantes acham, de forma indireta e mais abrangente, que a eletrosfera é
importante. Há coerência nisto já que todos desenharam corretamente a camada
eletrônica de valência dos átomos, justamente a camada eletrônica que fornece a
capacidade de ligação dos átomos. Se levarmos em conta que 48,27% acharam a
capacidade de ligação, que se relaciona diretamente a camada de valência, mais
importante e 44,82% consideraram a eletrosfera e a distribuição eletrônica que inclui
a camada de valência como o aspecto mais importante podemos afirmar que
93,09% dos participantes acham de forma direta ou indireta que o aspecto mais
importante do desenho é a eletrosfera. Esse fato demostra muita coerência com
relação aos dados retirados dos desenhos dos modelos em que 100%
apresentavam o desenho da eletrosfera ou aspectos relacionados a camada de
valência da eletrosfera, como do desenho do participante A21.
Reforçando o dado que para 93% dos participantes é a eletrosfera o aspecto
mais importante para ser expresso no desenho e que 7% acham o núcleo mais
importante, há corroboração, deles com o fato do núcleo ter sido deixado de lado no
desenho dos átomos por, aproximadamente, um quarto dos entrevistados aventando
91
novamente a hipótese de que nos estudos de química sua representação não é
relevante.
Sete dias após os participantes fazerem o desenho do átomo foi pedido para
desenharem uma molécula do etanol apresentando os átomos e suas ligações. No
desenho da molécula vinte e quatro participantes da pesquisa, ou seja, 70,59 %
escolheram o modelo de Dalton para desenhar a molécula, como a do exemplo
apresentado na figura 30 apresentada a seguir.
Figura 30 – Representação da molécula do etanol utilizando para os átomos da
molécula o modelo de Dalton (átomo esférico maciço e neutro) elaborado pelo
participante A09.
Fonte: Representação imagética feita pelo estudante A09.
O modelo de Rutherford-Bohr foi utilizado por seis alunos, alcançando 17,65%
dos estudantes. A figura 31 a seguir que exemplifica esse tipo de desenho.
92
Figura 31 – Representação da molécula do etanol utilizando para os átomos da
molécula o modelo de Rutherford-Bohr (átomo nucleado com elétrons em
órbitas circulares de energia quantizada) elaborado pelo participante A12.
Fonte: Representação imagética feita pelo estudante A12.
O mais interessante foi que 11,76 % dos alunos, ou seja, quatro alunos
utilizaram outros modelos imaginários criados a partir de suas ideias de molécula.
Observe os casos nas figuras 32 e 33.
Figura 32 – Representação da molécula do etanol utilizando um modelo de
átomos pontuais em estruturas tetraédricas elaborado pelo participante A06.
Fonte: Representação imagética feita pelo estudante A06.
93
Figura 33 – Representação da molécula do etanol utilizando átomos como
letras em estruturas tetraédricas elaborado pelos participantes A10, A26 e A29
respectivamente.
A10
A26
A29
Fonte: Representação imagética feita pelo estudante A10, A26 e A29.
94
Na Tabela 5, a seguir, dispõe os dados acima em que, na primeira coluna, os
modelos formais estudados no ensino médio pelos alunos no período de três anos
apresentando a possibilidade de criação de um modelo próprio. Na segunda coluna
são colocados os valores percentuais dos alunos que seguiram cada um dos
modelos para fazer seus desenhos e na última coluna o número de alunos que
utilizou cada um dos modelos.
Tabela 5 – Modelos Atômicos Apresentados Nos Desenhos das Moléculas
Modelo Atômico Formal
Estudado no Ensino Médio
% de Alunos que Utilizaram o
Modelo para representar a
molécula do etanol
Número
de
Alunos
Dalton
(esfera maciça)
65,55 19
Thomson
(esfera positiva com elétrons
incrustrados)
0 0
Rutherford-Bohr
(núcleo positivo com elétrons em
órbitas circulares com energia
quantizada)
20,7 6
Outros
(modelos próprios criados pelo
aluno)
13,8 4
Fonte: Análise imagética.
A análise dos dados permite afirmar que a representação das moléculas feitas
pelo modelo atômico mais simples foi o mais utilizado. Esse modelo atômico é
representado por um átomo neutro e não fornece justificativa para a presença das
ligações estudadas no ensino médio, porém, é importante observar que é muito
utilizado pelos professores para representar as moléculas e em imagens
encontradas na internet. Pela análise dos desenhos foi observado que 100% dos
participantes representaram as ligações químicas dos átomos seguindo
corretamente a capacidade de ligações destes, um fato muito relevante e coerente
visto que a grande maioria, 93,09%, segundo o resultado da questão sete do
questionário, considera a distribuição eletrônica e a capacidade de valência o
95
aspecto mais importante que deve conter o desenho de um átomo. Por outro lado
observam-se três tipos de desenhos fundamentais para representar a mesma
molécula. Para Bunge (2008, p. 38) os vários retratos de um objeto-modelo não
necessitam ser isomorfos entre si e consequentemente não podem substituir o
objeto que retratam, embora possam ajudar a entende-lo.
Há um aspecto muito interessante nos modelos retratados nas figuras 32 e
33: Nesses modelos os estudantes pesquisados partem de um pressuposto básico
espacial com a premissa de que o aspecto mais importante no desenho de sua
molécula é a geometria do carbono ser tetraédrica, não há conexão com os modelos
atômicos estudados, não há eletrosfera, núcleo ou compartilhamento de elétrons.
Observa-se que eles não deixaram de representar os átomos como letras ou pontos,
porém, a preocupação maior foi com a distribuição tridimensional dos átomos no
espaço. Dessa forma, esses modelos de moléculas atenderam a uma determinada
teoria estudada no ensino médio: geometria espacial dos átomos do carbono.
Porém, outras teorias gerais são deixadas de lado e isso demonstra o grau de
complexidade de uma molécula, assim observa-se que ao retratar a geometria do
carbono há a impossibilidade, pelo nível de ensino dos pesquisados, de retratar as
características atômicas. Para Bunge (2008 p. 36) qualquer objeto-modelo dado
pode, dentro de limites, ser vinculado a certo número de teorias gerais a fim de
produzir modelos teóricos diferentes (teorias específicas) do objeto real em causa.
No questionário, exposto no apêndice B, aplicado sete dias após a elaboração
do desenho da molécula do etanol constava a seguinte questão de múltipla escolha:
Questão 06. Quando você pensa em uma molécula com vários átomos unidos por
ligações químicas e resolve desenhá-lo qual modelo você escolhe?
□ Dalton (bola de bilhar - esfera).
□ Thomson (pudim de passas – esfera positiva com elétrons incrustrados)
□ Rutherford-Bohr (planetário – elétrons em órbitas com energias definidas para
cada órbita).
□ Outro modelo.
Nessa questão de múltipla escolha 27,6 % dos participantes, ou seja, nove
pessoas, afirmaram que desenhariam o modelo de Dalton para representar o átomo
na molécula. Quatro participantes da pesquisa, ou seja, 13,8 %, afirmam que
desenhariam o modelo de Thomson para representar a molécula. A maioria, ou seja,
96
37,95%, correspondendo a 11 participantes, disseram que utilizariam o modelo de
Rutherford-Bohr para desenhar a molécula. Há um grupo de seis participantes,
correspondendo a 20,7% dos entrevistados, que afirmam que utilizariam outro tipo
de modelo. A Tabela 6 a seguir apresenta a porcentagem e o número de
participantes e a respectiva escolha dos modelos apresentados na questão seis do
questionário.
Tabela 6 – Modelos Atômicos Utilizados Nos Desenhos de Moléculas
Modelo Atômico Formal
Estudado no Ensino Médio
% de Alunos que Utilizaram o
Modelo para representar a
molécula do etanol
Número
de
Alunos
Dalton
(esfera maciça)
31,0 9
Thomson
(esfera positiva com elétrons
incrustrados)
10,34 3
Rutherford-Bohr
(núcleo positivo com elétrons em
órbitas circulares com energia
quantizada)
37,95 11
Outros
(modelos próprios criados pelo
aluno)
20,7 6
Fonte: Análise imagética.
A partir da análise da pergunta seis do questionário e dos desenhos
elaborados pelos participantes foi possível analisar se há coerência entre o desenho
feito e a resposta ao questionário. Observou-se entre os participantes da pesquisa
uma incoerência entre o modelo desenhado e o modelo escolhido no questionário. É
bom lembrar que o questionário foi aplicado após o desenho ter sido elaborado.
Apesar de 37,95% dos participantes afirmarem que utilizariam o modelo de
Rutherford-Bohr em seus desenhos observa-se que apenas 20,7% utilizaram esse
modelo nos desenhos. Dos 10,34% que afirmaram que utilizariam o modelo de
Thomson em seus desenhos observou-se que nenhum realmente o utilizou. O
modelo de Dalton, o mais utilizado nos desenhos, com taxa de 65,55%, nas
97
respostas ao questionário aparece em segundo lugar entre os desenhos que seriam
utilizados para representar as moléculas com uma taxa de 31,0 %. No questionário
20,7% dos entrevistados afirmam que utilizariam outros modelos para representar as
moléculas e observa-se que nos desenhos 13,8% utilizaram outros modelos.
Outra questão do questionário (apêndice B) que trata da estrutura molecular é
a questão oito apresentada a seguir:
Questão 08. Qual aspecto você acha mais relevante para mostrar em um desenho
de uma molécula?
□ Características de massa e volume.
□ A distribuição dos átomos no espaço.
□ As ligações entre os átomos (valências).
Para os participantes da pesquisa massa e volume não são aspectos
relevante dos átomos para elaboração de seu desenho em uma molécula, porém,
37,95% acreditam ser a distribuição dos átomos no espaço o fator mais relevante
para o desenho de uma molécula, porém, para a maioria dos entrevistados, 62,05%,
as ligações entre os átomos e suas valências são o aspecto mais importante a ser
registrado no desenho de uma molécula.
Tabela 7 – Aspecto Relevante nos desenhos dos Átomos nas Moléculas
Aspecto Relevante para ser Apresentado no
Desenho do Átomo na Molécula
% de Escolha dos
Participantes
Número de
Alunos
Características de massa e volume
0 0
A distribuição dos átomos no espaço.
37,95 11
As ligações entre os átomos (valências).
62,05 18
Fonte: Análise imagética.
Observa-se pela análise das respostas que os participantes entendem que
distribuir bem os átomos no espaço e apresentar sua capacidade de ligação são os
aspectos mais importantes e devem ser registrados no desenho de uma molécula,
porém, é de pouca relevância se o átomo tem mais ou menos massa ou se ele é
mais volumoso ou não. Pela análise dos desenhos da molécula do etanol (C2H6O)
98
observa-se que 75,9 % deles apresentam os átomos bem dispostos no espaço tanto
em representações planas ou espaciais, nesses desenhos é também respeitada a
capacidade de ligação entre eles. Apesar de ser difícil representar a massa nos
desenhos, 65,55% dos desenhos utilizaram a relação de volume entre os átomos.
Neles o hidrogênio é corretamente representado como um átomo menor.
No questionário, exposto no apêndice B, há questões que demostram o
quando os alunos acham relevante o estudo e a utilização dos modelos atômicos na
compreensão dos fenômenos químicos estudados no ensino médio. A questão um
apresentada a seguir é uma delas:
Questão 01. Você acha que o estudo dos modelos atômicos melhora sua
compreensão da Química?
□ Melhora muito.
□ Melhora pouco.
□ Não melhora.
Segundo 82,8% dos participantes da pesquisa o uso dos modelos atômicos
melhora muito sua compreensão da Química, 13,8% acha que melhora pouco e
apenas um participante da pesquisa acredita que não melhora. A tabela 8 a seguir
apresenta a relação percentual de cada uma das respostas.
Tabela 8 – Uso dos Modelos Atômicos na Compreensão da Química
Você acha que o estudo dos modelos atômicos
melhora sua compreensão da Química?
% de Escolha
dos Participantes
Número
de Alunos
Melhora muito. 82,8 24
Melhora pouco. 13,8 4
Não melhora 3,45 1
Fonte: Questionário aplicado aos participantes.
Ao analisar essa questão observa-se que a grande maioria acha que estudar
os modelos atômicos é importante para a compreensão da Química, opinião muito
relevante quando pensamos que todos os estudos da Química apresentam relações
com esse mundo nanoscópico e que para compreendê-lo há a necessidade de
estruturarmos imagens concretas sobre ele.
99
Os modelos atômicos apresentados e estudados no ensino médio, como os
vistos no referencial teórico, apresentam explicações para os fenômenos da
natureza como a conservação da massa em transformações da matéria, a
eletricidade e até os fenômenos luminosos, assim, não podemos negar que há
grande importância nesses estudos e é gratificante observar que os participantes da
pesquisa, estudantes do ensino médio, perceberam isso.
Outra questão elaborada com o mesmo intuito da questão um é a questão
dois, nela queremos saber se os participantes da pesquisa percebem o quanto
utilizam dos conhecimentos químicos quando elaboram seus desenhos de átomos e
moléculas. A questão apresentadas a eles foi a seguinte:
Questão 02. Ao desenhar um átomo ou uma molécula você utiliza os conhecimentos
de Química adquiridos no ensino médio?
□ Utilizo muito.
□ Utilizo pouco.
□ Não utilizo.
Para a grande maioria dos pesquisados (79,35%) há uma utilização dos
conhecimentos de Química quando desenham átomos ou moléculas, já, cinco
participantes, ou seja, 17,25% acreditam que utilizam muito pouco dos
conhecimentos de Química na elaboração desses desenhos. Apenas um
participante acredita que não utiliza conhecimentos de Química na elaboração de
desenhos de átomos e moléculas.
A tabela 9 apresentada a seguir fornece a porcentagem de escolha de cada
uma das respostas possíveis.
Tabela 9 – Uso dos Conhecimentos de Química Aplicado aos Desenhos de
Átomos e Moléculas
Ao desenhar um átomo ou uma molécula você
utiliza os conhecimentos de Química adquiridos
no ensino médio?
% de Escolha dos
Participantes
Número
de
Alunos
Utilizo muito 79,35 23
Utilizo pouco 17,25 5
Não utilizo 3,45 1
Fonte: Questionário aplicado aos participantes.
100
A analise dos dados das respostas da questão dois é concordante com o fato
da maioria dos estudantes participantes da pesquisa desenharem seus átomos
seguindo o modelo de Rutherford-Bohr. Esse modelo agrega mais informações e
explica com maior clareza fatos pertinentes e importantes do estudo da Química. O
fato de 79,35% deles perceber e admitir que utilizam muito os conhecimentos de
Química reforça a ideia de que esse assunto é importante e relevante nos
programas de Química do ensino médio.
Para saber se os participantes da pesquisa utilizam o estudo formal dos
modelos atômicos em seus estudos foi elaborada a questão quatro que está
apresentada a seguir:
Questão 04. Durante seus estudos de Química do ensino médio, para compreender
melhor o conteúdo, você desenhou o átomo
□ muitas vezes.
□ poucas vezes.
□ praticamente nunca.
Analisando o questionário observou-se que a maioria dos participantes, treze,
perfazendo uma taxa de 44,85%, utilizam os desenhos de átomos muitas vezes para
melhor compreender a Química. Dos entrevistados 41,4% utilizam poucas vezes e
quatro, ou seja, 13,8% praticamente nunca utilizam desenhos do átomo para melhor
compreender os conteúdos de Química.
A tabela 10, colocada a seguir, apresenta a porcentagem de escolha dos
participantes com relação a questão quatro.
Tabela 10 – Uso dos Desenhos de Átomos e Moléculas na Compreensão da
Química
Durante seus estudos de Química do ensino médio,
para compreender melhor o conteúdo, você
desenhou o átomo
% de Escolha
dos
Participantes
Número
de
Alunos
muitas vezes. 44,85 13
poucas vezes 41,4 12
praticamente nunca. 13,8 4
Fonte: Questionário aplicado aos participantes.
101
A análise dos dados revela que apesar de menos da metade usar muito os
desenhos para compreender melhor os conteúdos de Química, 86,2 % os utilizam
em seus estudos, sendo então relevante o uso dos modelos atômicos pelos
participantes na compreensão da Química. Apenas 13,8% dos pesquisados não
utilizam praticamente nunca os desenhos de átomos com o objetivo de compreender
melhor os conteúdos de Química estudados.
Uma questão apresentada no questionário (apêndice B) que objetiva saber
como os participantes da pesquisa compreendem a ideia de modelo é a questão três
apresentada a seguir:
Questão 03. Em sua opinião o desenho de um modelo atômico é a representação
gráfica de
□ uma estrutura imaginária fundamentada apenas na observação das propriedades
sensíveis da matéria.
□ uma estrutura concreta e real das partículas que formam a matéria sensível
fundamentada em conhecimentos científicos.
□ uma estrutura imaginária das partículas que formam a matéria sensível
fundamentada em conhecimentos científicos.
A análise quantitativa dos dados coletados com base nas respostas da
questão três demostram que a maioria dos participantes, ou seja, 55,2% apresenta a
concepção de que o desenho do modelo atômico é a representação gráfica de uma
estrutura imaginária das partículas que formam a matéria sensível fundamentadas
em conhecimentos científicos, porém, para 30,45% dos pesquisados o desenho do
modelo atômico é a representação concreta e real das partículas que formam a
matéria sensível fundamentada em conhecimentos científicos. Apenas 10,35% dos
participantes acreditam que o desenho de um modelo atômico é a representação
gráfica fundamentada apenas na observação das propriedades sensíveis da
matéria.
A tabela 10, apresentada a seguir, coloca a porcentagem e o número de
participantes com relação ao conceito de modelo atômicos.
102
Tabela 10 – O Conceito de Modelo Atômico
Em sua opinião o desenho de um modelo
atômico é a representação gráfica de
% de Escolha dos
Participantes
Número de
Alunos
uma estrutura imaginária fundamentada apenas na observação das propriedades sensíveis da matéria.
10,35 3
uma estrutura concreta e real das partículas que formam a matéria sensível fundamentada em conhecimentos científicos.
30,45 10
uma estrutura imaginária das partículas que formam a matéria sensível fundamentada em conhecimentos científicos.
55,2 16
Fonte: Questionário aplicado aos participantes.
A análise dos dados permite afirmar que a maioria dos alunos, 55,2 %,
apresentam uma melhor noção do significado de modelo atômico, eles têm uma
noção de que o desenho não representa uma imagem real cuja concepção concreta
é sim fruto de um conjunto de ideias que são fundamentadas em pesquisas
científicas com o objetivo de compreender melhor a natureza. Com uma taxa de
10,35%, três participantes acreditam que o modelo atômico é imaginário sim, porém,
fundamentado apenas em observações das propriedades sensíveis da matéria, ou
seja, que podemos sentir. Isso tira da ideia de modelo atômico sua fundamentação
nas pesquisas científicas demostrando uma concepção parcial do significado de
modelo atômico. Observa-se que 30,45% dos participantes acreditam ser o desenho
do modelo atômico uma imagem de algo real e concreto, demostrando que há uma
compreensão de que os átomos desenhados existem daquela maneira e que suas
estruturas são realmente daquele jeito. Essa porcentagem é elevada entre os
participantes. Acreditar ser o átomo realmente da maneira com que desenham e
indica que não compreenderam bem a ideia de modelo.
Observa-se que durante as atividades surgiram muitas maneiras de
representar átomos e moléculas, porém, todos trabalharam conceitos formais da
atomística e seguiram as regras gerais para obtê-los, alguns de uma maneira mais
simples, outros, de forma mais complexa. Lembrando que estamos tratando de um
objeto invisível aos olhos e que isolado é imperceptível aos sentidos. Sua criação e
estudos foi fundamentada em hipóteses e pesquisas que levaram a melhor
compreensão da natureza. Segundo Bunge (2008, p. 96)
103
O que acontece com os conceitos, acontece com as hipóteses: quanto mais profundo um corpo de conhecimento, mais ideias não-convencionais ele conterá. Um ser onisciente não teria, provavelmente, o que fazer com conceitos não-observáveis e hipóteses; mas para o homem, a maior parte da realidade está oculta e deve, por isso, ser conjecturada.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Cada um dos quatro itens fundamentais analisados nessa pesquisa
apresentou um grau de relevância na estruturação dos conceitos químicos. Estas
representações como a dos elétrons, eletrosfera, núcleo e valência são utilizadas
desde a Química básica até nas relações mais profundas das pesquisas envolvendo
produção de novas substâncias, assim, sua representação imagética nos forneceu
subsídios para entender como os estudantes estão imaginando seu átomo, o que
permitirá a apresentação de conceitos mais aprofundados relacionados a essas
características. Haverá também, a partir disso a maior facilidade na elaboração de
analogias entre o comportamento da matéria em nível nanométrico e macrométrico.
Segundo Bunge (2008, p. 196) sem analogia não poderia haver conhecimento de
qualquer espécie: a percepção de analogias é o primeiro passo para a classificação
e a generalização.
A verificação da presença da eletrosfera demonstra que o aluno tem a noção
que o átomo é dividido em duas regiões e que nessa divisão a eletrosfera comporta
os elétrons que são suas partículas mais externas, secundariamente foi analisado se
a eletrosfera está em camadas ou não, esse fato fornece indícios que o estudante
sabe que os elétrons de um átomo não são “idênticos” e que existe uma diferença
de posicionamento com relação ao núcleo. Quando a representação imagética do
átomo era de uma esfera seguindo o modelo de Dalton da “bola de bilhar” observa-
se que a ausência de característica elétrica no átomo o incapacita de ter interações
elétricas e magnéticas, que são os fundamentos dos estudos da química das
ligações e das reações, observou-se que muitos estudantes utilizaram esse modelo
na representação da molécula do etanol demostrando que os modelos de moléculas
devem ser melhor trabalhados e representados pelos professores em suas aulas. O
aprendizado e a estruturação das ideias relacionadas ao desenvolvimento dos
104
modelos atômicos estabelecem respostas para o comportamento da matéria e
conforme o estudante estrutura seu desenho é possível verificar seu nível de
desenvolvimento. Ao estudar o desenvolvimento do modelo atômico o estudante
está sempre submetido à situação de questionamentos relacionados não só aos
limites estabelecidos pelos modelos como também por seus próprios limites. Isso
coloca o sujeito de forma permanente na zona de desenvolvimento proximal (zona
de desenvolvimento proximal), etapa da aprendizagem e que corresponde a lacuna
que compreende aquilo que já se sabe e aquilo que temos a potencialidade de
saber, ou seja, para seguir em frente nos estudos do modelo atômico e estabelecer
as potencialidades da compreensão do assunto, desenvolvido em pesquisas muito
profundas sobre a natureza da matéria há a necessidade do contato com o sujeito
mais experiente. Estas operações de desenvolvimento simbólico se refletem nos
desenhos escolhidos para ilustrar determinado signo, para Vigotsky (1994, p. 75):
Uma operação que inicialmente representa uma atividade externa é reconstruí da e começa a ocorrer internamente. É de particular importância para o desenvolvimento dos processos mentais superiores a transformação da atividade que utiliza signos, cuja história e características são ilustradas pelo desenvolvimento da inteligência prática, da atenção voluntária e da memória.
Observou-se também que ao procurar aplicar seus conhecimentos o
estudante ou percebeu os limites de seu conhecimento na aplicação do modelo ou
utilizou um modelo mais simples para a representação. Muitas vezes, durante a
análise do experimento observou-se que o estudante, como mostram os dados, no
questionário demostraram sua intenção de utilizar o modelo mais sofisticado, porém
no momento de comunicar via desenho utiliza um modelo mais simples. Assim,
apesar de estar interiorizada uma forma mais complexa de desenho o sujeito utiliza
em sua comunicação uma maneira mais sintética e simples de representa-la. No
livro pensamento e linguagem Vigotsky abordou esse assunto relacionando a
comunicação oral ao pensamento que pode ser estendida a qualquer tipo de
comunicação, segundo ele (2001, pg 320):
...à medida que o discurso interior se desenvolve, evidencia uma tendência a uma forma de abreviação totalmente específica: nomeadamente a omissão do sujeito de uma frase ou de todas as palavras a ele relacionadas, embora preservando o predicado. Essa tendência para a predicação surge em todas as nossas experiências com tal regularidade que somos forçados a admitir que se trata de uma forma sintática do discurso anterior.
105
Os estudantes participantes da pesquisa que representaram a eletrosfera
demostram conhecimentos da divisão atômica e, assim, representaram o átomo com
eletrosfera e núcleo atômico. Bem, se há a presença do núcleo não só infere que há
uma divisão de regiões no átomo como também há uma divisão entre as
características elétricas do átomo. A presença da carga positiva no núcleo já
justificaria ser relevante, para aquele estudante que o representou, a característica
elétrica dos átomos. Curiosamente, uma taxa de 24,15% dos pesquisados
desenharam a eletrosfera e não desenharam o núcleo, porém, verificando a
abordagem dos dois assuntos núcleo e eletrosfera, é possível compreender essa
discrepância devido a eletrosfera ser muito mais estudada e utilizada nos estudos da
Química que o núcleo. Esse fato revelou-se mais ainda quando observa-se que
100% dos alunos desenharam a eletrosfera e a consideram o aspecto mais
relevante de aparecer nos desenhos dos modelos. Nesse caso foi interessante
verificar se o núcleo apresenta o registro ou não que apresenta carga positiva
Imagina-se que os estudantes que representaram os átomos com a
concepção de Dalton, por um lado, demonstraram que a representação imagética do
átomo envolve menor quantidade de conteúdo formal. Não há elétrons, eletrosfera
ou núcleo. Por outro lado, estavam representando apenas uma simplificação
imagética que apresenta menos detalhes. É como se fosse um desenho de pessoas
feitas por pauzinhos. Nessa pesquisa poucos foram os que desenharam o átomo
com a concepção de Dalton, demonstrando que os participantes da pesquisa
conheciam mais detalhes do átomo. Porém, ao representar a molécula com o
modelo de Dalton, utilizado pela maioria dos pesquisados, nos forneceu a noção de
que essas relações que ocorrem entre os átomos requer maior aperfeiçoamento. Na
Química é muito comum o uso dessas imagens de modelos atômicos de átomos
esféricos com ligações, os chamados modelos de bastão e bola. Observa-se a
necessidade de maior uso e de pesquisas que visem melhorar a utilização de
modelos com concepção elétrica como o de Rutherford-Bohr para a montagem de
moléculas. Entra aí a importância dos elétrons da última camada que a pesquisa
demonstrou que os participantes acham relevante no desenho do átomo pois é
através dela que se sabe a capacidade de ligação dos átomos. A falta de presença
deles no desenho, quando utilizamos o modelo de Dalton, nos trará os seguintes
questionamentos: Qual força de atração une os átomos? Qual estrutura do átomo se
envolve na formação das ligações? E Qual o motivo dos átomos se unirem?
106
Assim, foi relevante observar os desenhos dos átomos na formação das
moléculas e a verificação do respeito ao número de ligações pertinente a cada
átomo da molécula nos permitiu verificar, mesmo que o desenho seja de um modelo
atômico simples como o de Dalton, se há noção das características relacionadas a
cada tipo de átomo, diferenciando-os quimicamente. Deve-se levar em consideração
que os modelos apresentam diferenças, porém, todos eles estão inseridos dentro de
uma mesma teoria: a matéria é formada por átomos. Assim, um modelo de molécula
desenhado de acordo com o modelo de Rutherford-Bohr ou de Dalton apesar de
muito diferentes apresentam vínculos entre si apesar de, em nível específico de
informações, um agregar e justificar mais as propriedades da matéria que o outro.
Segundo Bunge (2008, p. 35) qualquer objeto-modelo dado pode, dentro de limites,
ser vinculado a certo número de teorias gerais a fim de produzir modelos teóricos
diferentes (teorias específicas) do objeto real.
O questionário enriqueceu a pesquisa nos levando a concluir que os
estudantes pesquisados acham muito importante os estudos dos modelos atômicos,
pois, auxiliam a compreender melhor a Química. A grande maioria admitiu que
desenha os modelos em seus estudos de Química o que reforça o fato que os
desenhos do átomo alimentam e tornam mais simples vários assuntos de Química.
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APÊNDICE A: Termo de consentimento livre e esclarecido
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE) O pesquisador Odone Gino Zago Neto, aluno regular do curso de Mestrado Profissionalizante em Ensino de Ciências e Matemática – Pós-Graduação strito
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sensu promovido pelo Centro Universitário Franciscano - Unifra, sob orientação do Professor Dr. Gilberto Orengo, realizará a pesquisa: “O conteúdo Formal na Representação Imagética dos Modelos Atômicos”, junto aos estudantes do 3° Ano do Ensino Médio do Colégio Riachuelo, do município de Santa Maria. Os dados desta pesquisa estarão sempre sob sigilo ético. Não será mencionado o nome da instituição ou dos alunos participantes em nenhuma apresentação oral ou trabalho acadêmico que venha a ser publicado. É de responsabilidade do pesquisador a confidencialidade dos dados. A participação não oferece risco ou prejuízo aos participantes. Se, a qualquer momento, o(a) participante resolver encerrar sua participação na pesquisa, terá toda a liberdade de fazê-lo, sem que isso lhe acarrete qualquer prejuízo ou constrangimento. O pesquisador compromete-se a esclarecer qualquer dúvida ou questionamento, que eventualmente a instituição participante venha a ter, no momento da pesquisa ou posteriormente através do e-mail – [email protected]. Após ter sido devidamente informado(a) de todos os aspectos desta pesquisa e ter esclarecido todas as minhas dúvidas: Eu, ......................................................., diretora da instituição Colégio Riachuelo de R.G. ............................... concordo com o uso dos dados da pesquisa para a melhoria da qualidade do ensino.
Santa Maria, ..... de Abril de 2017.
____________________________________ Assinatura da Direção
____________________________________ Assinatura do Pesquisador
Apêndice B: Questionário aplicado aos alunos
Mestrado Profissional em Ciências e Matemática Prof. Odone Zago Questionário Sobre Desenhos de Modelos Atômicos Público: Alunos do terceiro ano do Colégio Riachuelo Turmas 31, 32 e 33
Nome:..................................................................................N.0......... Turma:..............
Assinale uma única resposta
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01. Você acha que o estudo dos modelos atômicos melhora sua compreensão da
Química?
□ Melhora muito.
□ Melhora pouco.
□ Não melhora.
02. Ao desenhar um átomo ou uma molécula você utiliza os conhecimentos de
Química adquiridos no ensino médio?
□ Utilizo muito.
□ Utilizo pouco.
□ Não utilizo.
03. Em sua opinião o desenho de um modelo atômico é a representação gráfica de
□ uma estrutura imaginária fundamentada apenas na observação das propriedades
sensíveis da matéria.
□ uma estrutura concreta e real das partículas que formam a matéria sensível
fundamentada em conhecimentos científicos.
□ uma estrutura imaginária das partículas que formam a matéria sensível
fundamentada em conhecimentos científicos.
04. Durante seus estudos de Química do ensino médio, para compreender melhor o
conteúdo, você desenhou o átomo
□ muitas vezes.
□ poucas vezes.
□ praticamente nunca.
05. Quando você pensa em um átomo e resolve desenhá-lo qual modelo você
escolhe
□ Dalton (esfera – bola de bilhar).
□ Thomson (esfera positiva com elétrons incrustrados – pudim de passas)
□ Rutherford-Bohr (elétrons em órbitas com enegias definidas para cada órbita –
planetário).
□ Outro modelo.
114
06. Quando você pensa em uma molécula com vários átomos unidos por ligações
químicas e resolve desenhá-lo qual modelo você escolhe?
□ Dalton (bola de bilhar - esfera).
□ Thomson (pudim de passas – esfera positiva com elétrons incrustrados)
□ Rutherford-Bohr (planetário – elétrons em órbitas com energias definidas para
cada órbita).
□ Outro modelo.
07. Qual aspecto você acha mais relevante para mostrar em um desenho de átomo?
□ Características de massa e volume.
□ Sua capacidade de ligação (valências).
□ A existência da eletrosfera e sua distribuição eletrônica.
□ A existência do núcleo.
08. Qual aspecto você acha mais relevante para mostrar em um desenho de uma
molécula?
□ Características de massa e volume.
□ A distribuição dos átomos no espaço.
□ As ligações entre os átomos (valências).
Muito obrigado pela colaboração. Abraço, Odone.