Editorial
A revista “Gesto” traz os trabalhos realizados pelos artistas Soraia Goto,
Silvana Abdal, Tarsila Kauffmann, Vitor Colombo e Isadora Reis dentro da
linguagem performática no ano de 2013.
Nesses trabalhos as relações de afeto moldam-se apontado presenças
relacionadas a ausência que pode ser suscitadas pelo corpo. Os materiais utilizados
pelos artistas se apresentam como veículo para a realização das ações onde gesto
se coloca imprescindível como recurso.
As performances aqui apresentadas tem a potência de criar uma ação de
valor íntimo através de construções que se relacionam com o espaço, permeando
poéticas fluidas por meio de movimentos que descobrem-se no decorrer de cada
processo. Aqui o que conecta esses trabalhos é materialização expandida da
experiência íntima através de um caminho que se dá de dentro para fora.
Agradecimentos:
Daniela Troya Marques
Elfi Nitze
Raquel Santis Silva
Luciano Favaro
Thainá Schuzel
Cristiano Araújo
Renato Reis Trippe
Sumário
3 - Editorial
6 - Sem Título, 2013 - por Soraia Goto
12 - Ode ao Afeto, 2013 - por Silvana Abdal
17 - Parto, 2013 - por Vitor Colombo
22- Li nas Linhas - por Tarsila Kauffmann
27 - Laço, 2013 - por Isadora Reis
Sem Título, 2013 | por Soraia Goto
Depoimento do artista
O trabalho Sem título, 2013, realizado
através da linguagem da performance
representa os dois “polos”da vida –
“nascimento e morte.” Ao idealizar a
performance desenvolvi um trabalho
intenso realizando uma “introspecção” onde
vivenciei cada detalhe, refleti sobre as
escolhas realizadas e, o trajeto a ser
percorrido. Ao vivenciar o nascimento, o
“despertar” para o mundo coloco todos os
sentimentos, angústias, frutos da caminhada
e quando inicio a pintura neste momento,
transmito o “pulsar” da vida que só se
extingue com a morte, discuto também de
forma sutil o reconhecimento artístico
quando ao deitar-me para finalização do
trabalho, deixo ao lado a tinta
representando “a passagem” advinda com a
morte.
A lona com a pintura ali realizada
representa todo o caminho artístico e, a tinta
ao lado representa o reconhecimento que
muitos artistas só encontram após a morte.
Esta obra e todos os preparos feitos para sua
realização foram de suma importância
levando a um amadurecimento com vários
questionamentos, sobre toda uma “trajetória
de vida”, o despertar com o nascimento, a
caminhada realizada e a superação de “tudo”
quando nos entregamos para a morte
deixando uma obra para a imortalidade.
Soraia Goto | 2014
Texto crítico
Inicialmente em pé e delicadamente,
Soraia Goto inicia sua performance
deitando-se no centro de uma lona de
algodão cru em posição fetal, permanecendo
nesta posição durante quinze minutos
quando, após o estouro provocado por um
balão, muda de posição.
Gestos lentos, pausados. Os pés se
curvam um pouco; realiza pequenas ações
leves e lentamente, e em um movimento um
pouco demorado, porém não robotizado, ela
se senta. A artista senta-se, observa o espaço
em que se encontra, levanta e se desloca em
linha reta. Em seguida pega um jarro com
tinta vermelha posicionado próximo a ela e
movimenta-se dentro do diâmetro do tecido
derramando a tinta em movimentos
circulares, de maneira a formar o desenho de
uma espira sobre esse tecido.
Soraia segue a derramar a tinta até retornar
ao centro, local inicial da ação, onde uma
pequena área permanece intacta. Quando atinge
esse local a artista produz com a tinta um
contorno que remete ao lugar onde está inserido
seu corpo. Em seguida Soraia deita-se nesse
espaço finalizando a ação. Examinar a
performance de Soraia em relação aos seus
trabalhos anteriores, de certa maneira, não se
mostra uma tarefa muito árdua pelo fato dela
seguir um linha de pesquisa na qual se identifica
muito com a pintura (utilizando com mais
freqüência a tinta a óleo, aquarela e acrílica).
Mesmo em linguagem que não estão diretamente
ligadas a esse contexto pictórico, Soraia traz
consigo, inclusive pela sua personalidade, toda a
gama de possibilidades que a pintura possui.
Referindo-me mais especificamente quanto à
questão da coerência poética na obra apresentada
por Soraia, tudo o que observei fez sentido
dando continuidade poética ao que Soraia
sempre desenvolveu como obra. Para mim toda a
ação e cada um de seus detalhes fizeram ainda
mais sentido por terem sido concebidos por essa
artista. A ideia inicial era uma espécie de
continuação de um de seus trabalhos anteriores
onde foram desenvolvidas fotos performáticas
com o tema de solidão.
Contudo a artista, sentindo que esse
projeto não estava mais atendendo a suas
expectativas e a partir de conversas, inclusive
após discussão em sala, sentiu que era preciso ir
além e buscar mais. Foi a partir disso que um
novo projeto começou a ser pensado. Começou a
repensar em tudo o que havia pensado desde
então, em algo que trouxesse mais para perto a
linguagem que vem abordando, a pintura- que
possui mais tempo de contato e familiaridade.
Raquel Santis Silva | 2013
Ode ao Afeto - por Silvana Abdal
Depoimento do artista
O trabalho “Ode ao afeto” de 2013
consiste na ação de unir pela costura peças de
roupas resultando na construção de um objeto
têxtil, de aproximadamente quatro metros. Esse
projeto surgiu da necessidade de acionar o corpo
como matéria de reflexão e investigação dentro
de minha pesquisa em performance. Nesta
reflexão percebi que o que meu corpo trazia eram
afetos impressos, memória e história, sempre
através das relações afetivas e do amor. Para
mim, roupas parecem acionar um tipo de
memória que mantém o corpo presente. Quão
vasto pode ser o corpo dessas relações
construídas no cuidado e fragilidade de agulha e
linha? Que caminhos internos podem ser
trilhados nesse universo?
De cada peça, o motivo dela estar ali, a
presença da pessoa ausente, o tempo passado, o
tempo vivido, os tempos sobrepostos.
Os elementos: tecido, linha, agulha, sã matéria inerte
estabelecendo uma relaçãocom a matéria orgânica,
viva e ativada do gesto da costura, a manualidade, o
envolvimento físico. O corpo da obra vai sendo
construído com ou sem a presença do olhar do
espectador, prescinde dele. Mas esse corpo é
presente, está vivo.
Por fim, há aqui um potencial de acionamento
da memória pessoal do espectador, de seus afetos,
redes, conexões.
Silvana Miranda Lima Abdal | 2014
Texto crítico
A performance “Ode ao
afeto”, produzida pela artista
Silvana Abdal, trata-se de uma
ação que consiste na confecção
de um objeto têxtil, através da
costura manual de roupas que
pertencem à pessoas próximas
e de seu dia-a-dia (familiares,
amigos e colegas). A artista se
sentanuma cadeira e usando
uma mesa grande como base de
apoio, começa a desenrolar a
linha,coloca delicadamente
numa agulha, seleciona duas
peças e começa a ação.
Dentre essas roupas, é
possível identificar uma canga,
peças masculinas (camisetas),
blusas femininas e peças
infantis. Este objeto não tem
um formato específico e parece
não haver preocupação da parte
da artista em relação a construir
um. Conforme a artista costura
as roupaslado a lado, em
sobreposição e justaposição, o
objeto começa a tomar corpo e
cor. Aparentemente a artista
não se preocupa em selecionar
uma ordem para a colocação
das peças, parecendo aleatória
suas escolhas. Por outro lado,
parece se preocupar com a
composição das cores.
Fotografia: Daniela Troya Marques
A performance teve duração de
aproximadamente uma hora e o objeto criado
alcançou cerca de três a quatro metros de
comprimento.
Silvana Abdal leva como referência, autores
da literatura universal como, por exemplo, Franz
Kafka (universo sem saída, processos
infindáveis, ambiente interno e labiríntico);
Marcel Proust (universo em observação, questão
do tempo armazenado na memória e que pode
ser acessado instantaneamente por um objeto
afetivo) e Albert Camus (susto diante da
existência). Há também influência de artistas
visuais como: AnselmKieffer (um ser afetado
pelo ambiente em que vive, materialidade nas
obras, sobreposição de materiais e uso de pouca
cor); Farnese de Andrade (assemblage,
ressignificado, construção da obra a partir de
objetos com significação familiar, social,
pessoal, além de fotos, armários e santos);
Edvard Munch (expressionismo alemão e
questões existenciais) e Caspar David Friedrich.
Em seus processos, materiais como o tecido
trazem o aspecto do corpo que envolve dentro e
fora. A costura tem o caráter de efetivação de
sua ação no processo, com o tempo que
necessário, começo, meio e fim.
Para a artista, o tecido também carrega a
memória afetiva de imaginário infantil, no qual
pode se transformar em várias coisas, além do
aspecto de “em construção”, envolve muitas
possibilidades, transparência, revelação, verdade
e também carrega questões relevantes como, por
exemplo, relações táteis, presença física,
fragilidades, inconsistências e fracassos.
ThainaSchulze | 2013
Li nas Linhas - por Tarsila Kauffmann
Depoimento do artista
A ação criada se instala no espaço em que
habito - e se baseia no próprio - que se
transforma com fitas, cordas, rendas, tecidos e
objetos, materializando caminhos percorridos e
espaços afetivos. Os trajetos traçados se
conectam entre ambientes, e são feitas teias nos
lugares de maior ação cotidiana, criação
artística, etc. Por sua ligação, um lugar é sempre
ativado por outro, quando há interação em um
dos espaços.
A pesquisa para mim iniciavam-se pela
forma de registro, capturando imagens que
serviriam de base para serem pensadas e
sobrepostas à outras linguagens e olhares. O
vídeo, a fotografia e atividades manuais e
performáticas constantemente foram forma de
suporte para expressar estas imagens.
A ação performática, neste momento, parte
da construção registrada por midia, a interação
com esta nova configuração do lugar e sua
continua construção e a junção destes registros
de forma à tornar visível as particularidades de
cada momento.
Frame do vídeo Li nas Linhas, 2013, de Tarsila Kauffmann
Frame do vídeo Li nas Linhas, 2013, de Tarsila Kauffmann
Portanto, o registro feito através das
diferentes máquinas digitais, mostra a maneira
de adaptação processual em relação com o
espaço. O processo de transformação se dá a
partir do com-viver ere-fazer-se dentro dele. A
videoperformance em looping, é projetada
ocupando o máximo de suas paredes, lado a
lado.
Mostram quatro ambientes –
quarto/banheiro/ateliê/jardim. As grandes
escalas projetadas de forma contínua criam outro
espaço ao redor deste. As cenas e sons
mesclados entre si tendem a imergir no convívio
destes três ambientes com o corpo maestro.
Tarsila Kauffmann | 2014
Texto crítico
Fitas que se cruzam, entrelaçam, se
encontram e expandem. A artista tecendo
caminhos de cor e formas, demarcando
ambientes de sua intimidade e, ao mesmo tempo,
criando, através da demarcação, um universo
onírico ao qual não há indícios do início ou do
término, mas sim da possibilidade de uma
contínua expansão.
Desde seus primeiros trabalhos, Tarsila
Kauffmann procura entrelaçar o universo
particular e coletivo.
Porta que já não é mais porta, espelho que
se ressignifica a uma esfera não mais íntima,
mas plural, ao receber, pelas mãos da artista,
grande camada plástica.
Fissuras no chão de sua rua e locais por
onde passam carregadas de memórias que se
transmutam a um convite para suas lembranças,
através do livre acesso pela internet, a poemas
escritos por suas mãos, abrindo assim seu
universo íntimo ao mundo.
Li nas Linhas, performance apresentada por
Tarsila, segue por este caminho de equilíbrio e
amalgamento entre o micro e o macro, no
entrelaçamento de campos habitualmente
distintos, no momento em que a artista decide
usar sua própria casa como matéria-prima do
trabalho.
A performance é apresentada em vídeo, com
aproximadamente 40 minutos de duração, onde o
que se vê um processo aparentemente
descompromissado, porém contínuo, construção
fluida de uma rede de fitas coloridas sendo
tecidas pela artista, ora
fumando durante o processo, ora dançando por
entre teias coloridas. O corpo, agora, também
revela-se parte fundamental, ao entrelaçar-se ao
ambiente e à obra. Assim, seu quarto, seu ateliê e
seu banheiro, lugares de maior convívio e
trânsito, tornam-se espaços vivos, mutáveis e em
expansão, como o corpo e a vida. E como a arte
que ali se revela.
Paredes, fitas, cama, chuveiro, janelas, sons e
cores. O vídeo, ao registrar o processo de
construção, desvenda ao espectador também o
universo particular da artista, como se pudesse
passear com ela por sua intimidade.
Luciano Favaro | 2013
Parto, 2013 - por Vitor Colombo
Depoimento do artista
Tentando explicar uma experiência artística
desde o projeto ao trabalho final, começo por falar
sobre minha poética e análise de minhas próprias
obras que não por novidade conversam com esta,
mesmo sendo todas realizadas por outras linguagens,
afinal a obra Parto foi a primeira performance que
fiz. Ao analisar trabalhos anteriores e compará-los
com este, posso afirmar minha centralidade mental
ao assunto de oposição, de contraste, de opostos, de
misturas. Sempre de forma inconsciente atribuía esse
valor em todos meus trabalhos, e nesse não foi
diferente. Através do contraste da bolha de sabão e
da fumaça, atribuí conceitos entre opostos, e através
destes outros conceitos.
Talvez por culpa da linguagem nova e sem
possibilidade absoluta de grafismo, pude entreter o
publico de outro jeito assim como criei outras
possibilidades de me expressar.
A idéia de criação por um vício, por dor, por
oposição, pela almae suaessência e por até certo
“DNA”, precede a frustração da fuga das relações
entre criação e criador.
Tendo em mente de que nada é pra sempre,
e colhemos o que plantamos, a fumaça inalada,
mesmo “bonita” por fora, ainda é algo de caráter
destrutivo que eu mesmo criei, e que de certa
forma, é menos mortal do que a bolha de sabão.
Porém, explicar uma obra que em minha
opinião, é tão aberta, significa matar inúmeras
relações que estabeleceríamos com os mesmos
assuntos.
Mesmo tendo questões pessoais de
paternidade e maternidade, isso não é algo tão
nítido para ser visto por uma pessoa
desconhecida. A apresentação foi uma
experiência que acrescentou valores
importantes para a criação de novos trabalhos,
além de, por ser um novo ângulo de análise pra
mim, esclarecer meus pensamentos artísticos e
o que me instiga a fazer arte.
Texto crítico
A performance Parto do artista
Vitor Manoel Colombo foi realizada no
Centro Universitário Belas Artes de São
Paulo, sala 212 da Unidade I no dia 22
de novembro de 2013.
A ação inicia-se quando o artista
adentra ao ambiente vestindo traje
neutro. O ambiente se constitui por uma
mesa com extensão de 1 x 1 m, coberta
por tecido escuro e sobre ele há um
narguilé que se encontra dentro de uma
caixa de papelão branca, permitindo
somente que a mangueira do aparato
seja visualizada. Há ainda um recipiente
transparente cheio de um líquido à base
de água e glicerina, além de uma um
frasco de detergente amarelo e uma
toalha de rosto. Além disso, há um
tapete do mesmo tecido posicionado no
chão, à frente da mesa.
A instalação possui caráter simples,
composta somente por objetos necessários para
a realização da obra. Porém, a transparência do
recipiente que comporta o líquido possibilita
uma percepção peculiar sobre a ação.
Iniciando a performance, Colombo começa
a inalar através da mangueira a fumaça
produzida pelo narguilé, que possui cheiro de
café e em seguida coloca o detergente nas mãos
mergulhando-as lentamente no recipiente. Em
seguida retira as mãos embebidas em detergente
e, com o sopro contaminado pela fumaça, busca
dar forma a uma bolha, enquanto seu gesto
remete ao formato de uma vagina.
O artista consegue produzir varias bolhas
durante um período de 20 minutos e tenta
protegê-las do vento ou qualquer obstáculos
que possam ocasionar o estouro das mesmas,
ainda que isso se mostre inevitável. Quando o
estouro ocorre o artista procura inspirar a
fumaça que se encontrava no interior da bolha
de sabão e que agora toma o espaço. Esse
processo se repete de acordo com o
comportamento das bolhas no ambiente e
quando julga necessário Colombo finaliza a
ação, seca as mãos na toalha e sai de
cena.Segundo o artista, o processo de criação
da performance conclui-se com a escolha dos
materiais, no caso glicerina, detergente e
fumaça de narguilé com sabor/cheiro de café.
Enquanto a ação acontece, por conta da
tarefa de criar bolhas possuir certo nível de
dificuldade, o performer precisa inalar grande
quantidade de fumaça, levando-o ao cansaço e
enjoo.
.
Durante o processo, uma frustração do performer
é eminente, já que além de ser difícil a criação da
bolha, ela estoura com facilidade, transpassando a
mesma frustração ao publico que o observa. É
bastante óbvio que o objetivo não poderia ser
alcançado pelo fato de ser impossível. Salvador Dalí
declarou: “Não tenha medo da perfeição, você nunca
irá atingi-la.”
Conceitualmente Colombo busca colocar-se na
posição de criador, experimentando dar forma à vida.
A performance deixa claro que a vida criada não pode
ser absorvida da mesma forma, e cabe a ela perder-se
e espalhar-se pelo mundo.
Elfi Nitze | 2013
Laço, 2013 - por Isadora Reis
Depoimento do artista
A performance Laço, de 2013, acontece
num ambiente que simula o quarto de dormir e a
ação é composta por dois participantes, eu e meu
companheiro, que permanece deitado durante
todo o procedimento. Inicio a ação sentada,
manuseando uma caixinha de costura que
contém alfinetes, tesoura e pequenos carretéis de
linha, e aos poucos preparo os materiais para
iniciar uma costura. Logo em seguida começo a
costurar a roupa que veste a pessoa deitada
diretamente no lençol que forra o colchão. A
costura se dá em torno de todo seu corpo, ou seja
braços, antebraços, ombros, em torno de todo o
tronco, coxas, joelhos e tornozelos, originado um
contorno. O processo leva aproximadamente 2
horas e 30 minutos, até que a ação se finaliza
quando me deito.
Através dessa ação busco fazer uma alusão
ao processo de construção da relação amorosa
trazendo a costura como um elemento que possa
remeter ao ato de tecer um relacionamento. Nos
encontramos em um momento no qual as emo-
ções e o amor são entendidos como piegas
enquanto as relações se encontram em crise e no
lugar dos questionamentos, mostrando-se cada
vez mais instáveis ou flexíveis.
A partir disso, tenho como objetivo abordar
a fragilidade dos laços humanos e a complexidade
do que é um relacionamento amoroso, além de
questões como o controle, o afeto, as
responsabilidades e os possíveis significados da
relação a dois.
Isadora Reis | 2013
Fotografia: Daniela Troya
Fotografia: Daniela Troya
Texto crítico
Permeando entre noções de realidade e
ilusão, os processos de trabalhos de Isadora
Mendes Reis que antecedem a atual performance
são de aspecto conceitual no que diz respeito à
construção estética.
Em Experimente não Servir, trabalho
composto por um espelho e uma coroa de metal,
está presentea ideia de manuseio do objeto pelo
espectador, induzindo-o a coroar a si próprio,
porém a coroa é largamente maior que uma
cabeça comum, estabelecendo assim um jogo
entre intenção e frustração.
A performance Laço, de 120 minutos, se
estende como uma instalação. A artista inicia com
grande concentração a ação de costurar seu
parceiro em uma cama de casal, através do pijama
que ele está vestindo. As cores predominantes na
cena, tanto nos trajes quanto nas roupas de cama,
são neutras e se contrapõem com a linha
vermelha que é utilizada na costura.
Iniciando pelo braço, com calma, ela
percorre a silhueta do corpo que repousa de
barriga para cima, não linearmente, alternando
para o outro braço, seguindo pela perna, e assim
por diante. Os pontos refletem seu estado de
espírito, de forma que em algumas partes ficam
mais espaçados, outros mais concentrados. No
meio deste processo,seu companheiro cai num
sono profundo.
Isadora segue na ação, no que diz respeito à
calorosamente amarra-lo na cama, que é
considerada um lugar de acasalamento e amor.
Na realidade, usa de uma metáfora para um amor
seguro, mas um amor que vai além da segurança,
chegando quase na possessão. Isso se demonstra
no modo em que seu corpo costura o outro com
certa frieza e sem muito carinho aparente. A
ação se resume na própria ação, o costurar.
Surge aí uma questão paradoxal, onde
um cenário é construído com o intuito de
criar um ambiente aconchegante tanto para a
performer quanto para o espectador,
acolhendo-os. No entanto, há um confronto
entre esse espaço e o o estado de espírito que
ela transpassa. Sua frieza não coincide com a
ação romantizada da posse de uma pessoa.
Da mesma forma, no trabalho Sobre
nossas mesas, 2013, gravura onde um prato
antigo se encontra vazio, existe um
distanciamento entre uma proposta onde o
acolhimento se coloca presente através de
um elemento do cotidiano relacionado ao
ritual da alimentação e a frieza de um
elemento/ação vazia que nunca chegará a
acontecer. Ao chegar nestas conclusões
críticas, o trabalho de Isadora revela como
potência poética uma tensão entre o acolher
e o esvaziar, uma relação que fica entre o
pessoal e o impessoal, gerando reflexões
acerca de nossas ações e relações com a vida.
Talvez esta tensão procure materializar, como
metáfora, as relações humanas da
contemporaneidade, onde nada se fixa, como
propõe o filósofo Bauman, em seu livro Amor
Líquido. Relações que se baseiam na
superficialidade, ainda que na aparência
tenham profundidade, mas que escondem um
vazio imenso.
Tarsila Kauffmann | 2013
Para assistir a vídeos ou acessar outras informações dos artistas acesse os links abaixo:
Tarsila Kauffmann: tarsilak.weebly.com
Isadora Reis: https://www.youtube.com/watch?v=Zk7WMybE0Jw&feature=youtu.be
Créditos
Cristiano Araújo
Daniela Troya Marques
Elfi Nitze
Isadora Mendes Reis
Luciano Favaro
Raquel Santis Silva
Silvana Abdal
Soraia Goto
Thainá Schulze