Anlise da reteno de gua em argamassas colantes de mercado
Silvano Ferrari (1); Eduardo Pereira (2); Marienne do Rocio M. M. da Costa (3);
Isac Jos da Siva (4); Paulo Roberto Niebel (5)
(1) Universidade Federal do Paran. [email protected]
(2) Universidade Federal do Paran. [email protected]
(3) Universidade Federal do Paran. [email protected]
(4) Votorantim Cimentos. [email protected]
(5) Votorantim Cimentos. [email protected]
RESUMO
Devido intensa utilizao de revestimentos cermicos, as argamassas
colantes industrializadas so cada vez mais requisitadas, pois oferecem resultados
mais confiveis. Como cada fabricante possui formulao prpria, diferentes
argamassas apresentaro propriedades distintas, sendo uma das principais a
reteno de gua. Este trabalho objetiva verificar a diferena de reteno de gua
em diferentes argamassas colantes de mercado. Selecionaram-se 5 argamassas,
ensaiadas conforme a NBR 13277:2005, ensaio destinado a argamassas
convencionais. Para o estudo das argamassas optou-se tambm pela realizao do
ensaio com um prato adaptado de 5 mm de espessura, simulando uma situao
mais real de aplicao. Atravs destes experimentos verificou-se que o ensaio
normalizado no capaz de detectar pequenas variaes em argamassas colantes,
enquanto que o ensaio adaptado mostrou maior sensibilidade a mudanas. Para
validar o mtodo proposto, executou-se tambm o ensaio de tempo em aberto,
normalizado para as argamassas colantes, encontrando-se uma boa correlao
entre as duas metodologias.
Palavras-chave: Reteno de gua, Argamassa colante, tempo em aberto.
Analysis of water retention in dry-set mortars on t he market
ABSTRACT
Due to the intense use of ceramic tiles, dry-set mortars are increasingly in
demand because they offer more reliable results. Since each manufacturer has its
own formulation, different mortars present different properties, one of the main ones
being water retention. Therefore, this study aims to analyze the difference in water
retention among different dry-set mortars on the market. 5 mortars were selected,
tested according to NBR 13277:2005, a test for conventional mortars. To study the
mortars we also chose to use an adapted 5 mm plate, which simulates a more
realistic application. Through these experiments it was found that the standardized
test is not capable of detecting small variations in dry-set mortars, whereas the
adapted test was more sensitive to change. To validate the proposed method, the
open time test was also carried out, standardized for dry-set mortars, which showed
a good correlation between the two methodologies.
keywords: water retention, dry-set mortars, open time.
1. INTRODUO
Nos ltimos anos, a indstria de materiais cermicos, que durante muito tempo
sobreviveu de forma artesanal, adotou a produo em massa de seus produtos. Em
funo disto, o Brasil hoje o segundo maior produtor e consumidor mundial de
revestimentos cermicos (1). O considervel crescimento da indstria cermica levou
a um crescimento proporcional da industrializao do setor de argamassas colantes,
pois na medida em que cresce a utilizao da cermica, exige-se tambm dos
fabricantes de argamassa o desenvolvimento de formulaes que atendam a esta
demanda.
Apesar do desenvolvimento da indstria de cermica e do aperfeioamento dos
procedimentos de colagem das peas, os problemas relacionados com o
desplacamento de revestimento so ainda hoje uma patologia grave e freqente,
registrada tanto nos primeiros anos de utilizao, quer aps longos perodos. Dentre
as principais propriedades que interferem no desempenho das argamassas colantes
tm-se no estado fresco a adeso inicial, o deslizamento, o tempo em aberto e a
reteno de gua e no estado endurecido, a capacidade de absorver deformaes e
a aderncia ().
As argamassas colantes diferem das argamassas tradicionais principalmente
devido presena de aditivos em sua composio a fim de modificar e melhorar
suas propriedades, sendo aditivos de destaque os ltices polimricos de EVA e
steres de celulose HEC. O EVA responsvel pelo aumento da adesividade ao
revestimento cermico e aumento tambm da capacidade de deformao da
argamassa no estado endurecido e os steres de celulose HEC so responsveis
pelo aumento da trabalhabilidade e da reteno de gua (3) (4) (5).
Segundo Cincotto et al (6), a reteno de gua a capacidade de que a
argamassa tem, no estado fresco, de manter sua consistncia, mesmo em situaes
propcias perda de gua. Desta maneira a gua tem grande importncia no
comportamento reolgico das argamassas, pois tem influncia direta na sua
trabalhabilidade e viscosidade, tendo papel fundamental nas reaes qumicas de
hidratao do aglomerante e na aderncia entre a argamassa e o substrato. A gua
responsvel ainda pelo transporte de produtos da hidratao do cimento para os
poros e cavidades do substrato, favorecendo a ancoragem mecnica entre os
mesmos, tendo assim influncia direta no estado endurecido da argamassa (7) (8) (9).
Nas argamassas colantes a reteno importante na medida em que a adeso
ao revestimento cermico prejudicada pela perda de gua por suco pelo
substrato ou ainda pela formao de pelcula no cordo da argamassa, pelcula
esta que resultado da perda de gua por evaporao na superfcie do cordo (10).
Com a adeso ocorrendo de maneira inadequada, a aderncia entre a argamassa e
o revestimento ser prejudicada, podendo tornar-se responsvel pelo aparecimento
de defeitos como o descolamento do revestimento.
No Brasil, as especificaes para argamassas colantes so recentes, sendo
necessria uma expanso da normalizao na rea a fim de contemplar outras
propriedades importantes quando tratamos deste tipo de produto. Sendo assim, este
trabalho buscou avaliar a reteno de gua em argamassas colantes a fim de
comparar o desempenho de algumas ACIII disponveis no mercado e tambm
avaliar uma adaptao no mtodo proposto pela ABNT para contemplar a anlise
desta propriedade em argamassas colantes.
2. MATERIAIS E MTODOS
2.1 Descrio das variveis de estudo
Com o objetivo de analisar a reteno de gua em argamassas colantes
industrializadas, selecionou-se 4 marcas comerciais de argamassas do tipo ACIII
para proceder-se os ensaios. As marcas foram escolhidas em funo de sua
disponibilidade na regio de Curitiba. Foi utilizada ainda uma argamassa
industrializada do tipo ACI para comparao de resultados entre as diferentes
classes de argamassa e assim, tambm, verificar a possibilidade de utilizao da
metodologia empregada nos ensaios, para diferenciar classes de argamassa. Sendo
assim, foram ensaiadas no total 5 marcas de argamassas colantes industrializadas.
Foram realizados os ensaios de reteno de gua para o prato convencional de
20 mm de espessura, conforme proposto pela NBR 13277 (11) . Tendo em vista que a
espessura de 20 mm adotada por esta norma na tentativa de simular a espessura
de revestimentos em argamassa para paredes e tetos, o mesmo no se aplica a
argamassas colantes, pois no reflete o comportamento deste tipo de mistura. Em
funo disto, neste trabalho o ensaio de reteno foi executado tambm com uma
adaptao na espessura do prato para 5 mm, buscando-se assim algo mais prximo
da condio real de aplicao em obra dos cordes de argamassa colante. A figura
1 descreve as variveis de anlise propostas para este trabalho.
Figura 1: Variveis de anlise
As misturas das argamassas foram executas conforme o recomendado pela
NBR 14081 (12). A quantidade de gua na mistura, bem como o tempo de maturao
das argamassas, foram respeitados conforme especificao dos fabricantes (tabela
1) obtida na embalagem dos produtos.
Tabela 1: Especificao conforme dados das embalagens das argamassas.
Argamassa Relao
gua/argamassa (%)
Tempo de maturao (min)
UFPR 1 29 15 UFPR 2 21,5 10 UFPR 3 21 0 UFPR 4 23 15
ACI 22,5 15
2.2 Ensaios de reteno de gua
A reteno de gua em argamassas convencionais avaliada pelo mtodo
proposto pela NBR 13277 (11), e consiste em determinar a quantidade de gua
retirada de uma poro de argamassa contida em um funil de filtragem (funil de
Bchner modificado), aps uma suco realizada por meio de uma bomba de vcuo
a baixa presso. A figura 2 demonstra o equipamento utilizado para este ensaio.
Neste trabalho utilizou-se este procedimento para avaliar as argamassas colantes.
Figura 2: Funil de Bchner modificado
Com a finalidade de obter uma situao mais prximas da real condio a que
as argamassas colantes esto submetidas em obra, e seguindo procedimentos
sugeridos por Bittencourt Jr. e Maia (13), executou-se mais uma vez o ensaio com o
funil de Bchner, porm adotando-se uma modificao na espessura do prato onde
a argamassa posicionada durante a suco. A figura 3 demonstra a diferena
entre os pratos utilizados pelos dois mtodos. No mtodo convencional o prato de
20 mm de espessura e na adaptao proposta o prato de 5 mm de espessura,
representando assim de forma mais fiel a espessura dos cordes de argamassa
aplicados em obra.
Figura 3: (a) Detalhes das espessuras das camadas de argamassa; (b) Pratos com
argamassa para ensaio de reteno de gua
O procedimento de norma sugere que a leitura da quantidade de perda de
gua aps a suco seja realizada aos 15 minutos. Com a inteno de verificar o
comportamento das argamassas durante um intervalo de tempo, neste trabalho
optou-se por fazer-se a leitura de perda de gua em pontos entre 5 e 21 minutos,
incluindo aos 15 min recomendado pelo ABNT, a fim de obter-se uma curva de
reteno de gua para as argamassas estudadas.
3. RESULTADOS
O programa experimental consistiu em avaliar alm do comportamento das
argamassas quanto reteno de gua, tambm avaliar a eficincia do mtodo de
ensaio pelo funil de Bchner como ferramenta para anlise desta propriedade, uma
vez que esta no contemplada pela normatizao brasileira. Os resultados obtidos
sero discutidos na seqncia.
3.1 Quanto ao mtodo de ensaio
Procedeu-se o ensaio de reteno de gua com o funil de Bchner tanto com o
prato de 20 mm quanto com o prato adaptado de 5 mm. Os valores de perda de
massa foram medidos aos 5, 8, 10, 12, 15, 17, 19 e 21 minutos. Optou-se por estes
tempos e no somente aos 15 min. conforme recomendado pela NBR, a fim de
verificar-se o comportamento das argamassas, atravs de curvas de reteno de
gua, durante um determinado perodo. A tabela 2 demonstra a diferena entre os
valores de reteno obtidos com as diferentes espessuras do prato aos 15 min. e a
figura 4 e 5 apresenta as curvas de reteno para as argamassas estudadas.
Tabela 2: Reteno de gua em argamassas colantes aos 15 minutos (%)
Argamassa Prato normal (20 mm) Prato modificado
(5 mm) Variao
(%)
UFPR 1 95,05 85,36 9,69 UFPR 2 99,09 92,5 6,59 UFPR 3 98,79 84,71 14,08 UFPR 4 97,93 89,77 8,17
ACI 98,88 90,89 7,99
Figura 4: Curvas de reteno de gua das argamassas colantes estudadas: (a) UFPR1; (b) UFPR 2; (c) UFPR 3 e (d) UFPR 4
Figura 5: Curvas de reteno de gua da argamassa colante ACI
De posse dos valores de reteno de gua aos 15 min. e observando os
grficos fica evidente como a adaptao do prato mostra-se muito mais sensvel a
perda de gua com o tempo, o que demonstra que a adaptao uma ferramenta
de controle de qualidade adequada. Em alguns casos, como o da UFPR 3 a
variao alterando-se o mtodo chegou a aproximadamente 14%. Em uma situao
real de obra, os cordes tero aproximadamente 5 mm, sendo assim, o prato
modificado demonstra com mais confiabilidade a configurao das argamassas
assentadas.
Para embasar as anlises de reteno de gua, executou-se tambm o ensaio
de tempo em aberto para as argamassas estudadas, conforme recomendado pela
NBR 14083 (14). Os valores de tempo em aberto podem ser associados capacidade
da argamassa de reter gua, uma vez que o ensaio mede o tempo necessrio para
a formao da pelcula sobre a argamassa e esta funo da perda de gua da
argamassa. A Figura 6 demonstra a correlao entre os ensaios de reteno de
gua e os valores do ensaio de tempo em aberto.
Figura 6: Detalhes dos pratos com argamassa para ensaio de reteno de gua
A reteno de gua uma propriedade fundamental para desempenho
adequado de argamassas colantes no estado endurecido, uma vez que ter
influncia direta na hidratao do cimento e no fenmeno de aderncia entre os
componentes da argamassa com o substrato. Atravs da figura, podemos observar
uma forte correlao entre os ensaios de tempo em aberto e de reteno de gua
com o prato modificado (R = 0,9492) demonstrando a viabilidade de utilizao do
ensaio do funil de Bchner para anlise de argamassas colantes.
3.2 Quanto s argamassas
Aps anlise da metodologia de caracterizao da reteno de gua em
argamassas colantes utilizando o prato de 5 mm, e confirmando-se sua viabilidade,
esta ser utilizada para anlise das argamassas selecionadas para este trabalho.
A tabela 3 apresenta um comparativo entre os dados obtidos para cada mistura
e tambm dados especificados pelos fabricantes. Em destaque esto algumas
informaes relevantes para as discusses do comportamento das argamassas.
Tabela 3: Reteno de gua em argamassas colantes ACIII aos 15 minutos (%)
Argamassa Tempo de maturao (min.)
Relao gua/argamassa
(%)
Reteno de gua (%)
Tempo em Aberto (MPa)
UFPR 1 15 29 85,36 1,2 UFPR 2 10 21,5 92,50 0,9 UFPR 3 0 21 84,71 1,3 UFPR 4 15 23 89,77 1,1
A figura 7 descreve o comportamento das curvas de reteno das argamassas
ACIII estudadas. Incluiu-se tambm na figura a curva referente a uma argamassa
ACI para compararmos o comportamento entre diferentes classes de argamassas.
Figura 7: Curvas de reteno de gua de argamassas com prato modificado.
A argamassa UFPR 1 apresentou baixa capacidade de reter gua, quando
comparada as demais. Isso pode ser associado elevada quantidade de gua
especificada pelo fabricante, que tambm foi a maior entre as argamassas
estudadas. A baixa reteno apresentada no parece ter afetado consideravelmente
o estado endurecido da mistura, uma vez que o tempo em aberto parece no ter
prejudicado esta propriedade. A gua em excesso utilizada para melhorar a
trabalhabilidade da mistura e aps a aplicao facilmente perdida. A quantidade de
gua utilizada nesta mistura pode ter melhorado as caractersticas reolgicas desta
argamassa, facilitando-se assim sua aplicao e penetrao dos compostos nos
poros do substrato, melhorando sua aderncia aos 28 dias.
A UFPR 2 apresentou a curva sempre em pontos superiores as demais,
demonstrando que sua reteno de gua sempre foi maior. Este efeito nem sempre
interessante, uma vez que a perda de gua pela argamassa pode colaborar
negativamente com a aderncia da argamassa aos substratos. Os problemas
decorrentes de uma reteno elevada podem ser verificados pelos valores de tempo
em aberto obtidos para esta argamassa, que foram os menores entre as misturas.
Provavelmente, a UFPR 2 tenha em sua composio aditivo retentor em excesso,
que melhora a reteno de gua porm afeta prejudicialmente suas caractersticas
no estado endurecido.
O tempo de maturao igual a zero especificado pelo fabricante para a UFPR 3
claramente afetou a reteno de gua da mistura. Este efeito pode ter sido
provocado pelo fato de que o aditivo no teve tempo suficiente para se dissolver, e
assim, no conseguiu nesse intervalo agir modificando a viscosidade da fase aquosa
de mistura a base de cimento. Este efeito parece no ter prejudicado o tempo em
aberto da mistura.
A UFPR 4 apresentou um comportamento intermedirio em comparao com
as outras argamassas estudadas.
A ACI estudada apresentou comportamento similar ao das ACIII desta
pesquisa. Isso pode ser justificado provavelmente pela presena dos aditivos
retentores de gua em ambas as argamassas, ou ainda pelo fato de que as
argamassas ACI geralmente utilizam teres de maiores viscosidades e menos
modificados. Baseado neste resultado, justifica-se um estudo mais aprofundado na
aplicao do mtodo do funil de Bchner com prato de 5 mm, principalmente
ampliando-se a quantidade de marcas de argamassas a serem estudadas das
diferentes classes (ACI, ACII e ACIII).
4. CONCLUSES
A anlise da reteno de gua utilizando-se o prato modificado de 5 mm
mostrou-se eficiente, demonstrando que o mtodo uma ferramenta adequada para
controle de qualidade de argamassas colantes. A anlise desta propriedade atravs
de curvas de comportamento mostrou-se tambm como uma alternativa
interessante, descrevendo com mais detalhes o comportamento da mistura ao longo
do tempo. O ensaio de reteno apresenta uma forte correlao com o ensaio de
tempo em aberto, demonstrando a viabilidade do uso desta metodologia para
caracterizao de argamassas colantes.
Quanto s argamassas ACIII de mercado, estas apresentam curvas de
reteno de gua bem distintas entre si, comportamento observado tambm para
seus valores de tempo em aberto. Isto demonstra que mesmo estas tendo a mesma
classificao segundo a norma, suas caractersticas so distintas e devem ser
sempre analisadas individualmente.
5. AGRADECIMENTOS
Agradecemos a Votorantim Cimentos pela parceria no desenvolvimento deste
trabalho.
6. REFERNCIAS
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