TÍTULO: ANÁLISES DOS PROCESSOS PSICOLÓGICOS GRUPAIS NA
ATIVIDADE DE TRABALHO NA SEÇÃO DE NUTRIÇÃO DO HU. - PROJETO:
TRABALHO E SUBJETIVAÇÃO EM UMA INSTITUIÇÃO HOSPITALAR
ORIENTADORA: Profa. Dra. Inara Barbosa Leão
AUTORA: Priscilla Soares Teruya
ENDEREÇO: Rua Espanha, 851 Vila Jacy. Campo Grande – MS / CEP.: 79006-580
TELEFONE: (67) 3386-9340 / (67) 9228-6509
ANÁLISES DOS PROCESSOS PSICOLÓGICOS GRUPAIS NA ATIVIDADE
DE TRABALHO NA SEÇÃO DE NUTRIÇÃO DO HU. - PROJETO:
TRABALHO E SUBJETIVAÇÃO EM UMA INSTITUIÇÃO HOSPITALAR
Resumo do Projeto A subjetividade do indivíduo é constituída no processo de relação com a objetividade,
através de instrumentos de mediação como o trabalho, a linguagem e as emoções. Essas
mediações permitem aos indivíduos a interiorização do mundo material, através das
suas atividades, portanto, ativamente. O trabalho do homem é uma atividade social que
assente a cooperação entre indivíduos, o que supõe uma divisão técnica das funções do
trabalho. Na produção os homens não agem apenas sobre a natureza. Eles produzem
colaborando de uma determinada maneira e distribuindo entre si suas atividades. Para
produzir entram em relações e ligações determinadas uns com os outros e não é senão
nos limites destas relações sociais que se estabelecem a sua ação sobre a natureza, a
produção. Partindo desses pressupostos teóricos, a presente pesquisa visa analisar a
dinâmica material e psico-grupal que sustenta a produção e as relações interindividuais
na Seção de Nutrição do Núcleo do Hospital Universitário e, conseqüentemente,
entender quais os processos psíquicos lhes são peculiares, necessários e aqueles que
redundam de dificuldades geradas pelo/no trabalho e suas conseqüências individuais.
Tais ações serão realizadas apoiadas nas Teorias Psicológicas Sócio-Histórica e aquelas
próprias dos processos grupais que nos permitirem a apreensão de suas determinações
sociais, utilizando como metodologia a pesquisa participativa. As atividades
desenvolvidas visam atender, também as exigências para o cumprimento dos Estágios
Supervisionados em Psicologia Organizacional I, II e III
Palavras-chave
SUBJETIVIDADE – PSICOLOGIA DO TRABALHO – INSTITUIÇÃO
HOSPITALAR
PARECER
Eu, professora doutora Inara Barbosa Leão, sou de parecer favorável à
apresentação para inscrição no Prêmio Silvia Lane, promovido pela
Associação Brasileira de Ensino de Psicologia – ABEP, do Relatório Final
do Estágio Supervisionado em Psicologia Organizacional II e III pela,
então, acadêmica: Priscilla Soares Teruya, resultante das atividades
desenvolvidas sob minha orientação durante a 5ª série no período letivo de
2005-2006 e já aprovado pela Comissão de Estágio supervisionado do
Curso de Psicologia/CCHS.
Minha opinião favorável se deve ás características do trabalho e da
instituição onde se desenvolveu e ao tratamento dado aos dados.
Campo Grande, 28 de fevereiro de 2007.
InaraBLeão Profa. Dra. Inara B. Leão.
Curso de Psicologia Campo Grande, 28 de março de 2007.
PARECER O Curso de Psicologia da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul/Campus de Campo Grande, tem a honra de inscrever trabalhos dos seus ex-alunos, para o Premio Silvia Lane, promovido pela Associação Brasileira para o Ensino de Psicologia – ABEP. Esta Universidade, mesmo diante de tantas adversidades, tem tentado incentivar o aluno a pesquisar, produzir textos e a apresentar esta produção em eventos regionais, nacionais e internacionais. Acreditamos que é necessário dar mais ênfase na criação e não sermos apenas reprodutores de conteúdos acadêmicos. A Universidade precisa resgatar o seu papel de produtora de conhecimento, incentivando na vida acadêmica a construção de novos pesquisadores. A Universidade que presa pelo ensino de qualidade está diretamente determinada pela pesquisa. E isto não deve ser apenas retórica. Sendo assim, o Curso de Psicologia indica para concorrer a este importante prêmio de incentivo à produção acadêmica os trabalhos abaixo listados, informando que estes foram selecionados dentro da instituição por apresentarem: coerência do texto em relação ao que foi proposto; boa articulação entre estudo teórico-prático e clareza na conexão das idéias. Desta forma apresento os trabalhos que foram selecionados: Para a categoria Relatório de Estágio:
1) Análises dos processos psicológicos grupais na atividade do trabalho na seção de nutrição do Hospital Universitário. Período: 2005-2006. – Projeto: Trabalho e subjetivação em uma instituição hospitalar. Relatório de estágio, sob a orientação da profª.drª. Inara Barbosa Leão.
Para a categoria Trabalho de Conclusão de Curso:
2) Esperança e expectativa dos desempregados: a supremacia do sentido sobre o significado. Trabalho de Conclusão de Curso, sob a orientação da profª.drª. Inara Barbosa Leão;
3) O sentido subjetivo do trabalho para a profissional do sexo. Trabalho de Conclusão de Curso, sob a orientação da profª.drª. Alexandra Ayach Anache.
O Curso de Psicologia parabeniza os trabalhos acima e deseja aos
participantes boa sorte!
Profª. Rosilene Caramalac. Coordenadora do Curso de Psicologia
UFMS/CCHS – Campo Grande
Adriano Kasiorowski Araujo
Claudiane Coimbra da Silva
Éder Juliano A. Blanco.
Elódia Herminia Maldonado
Fabíola Sampaio de Oliveira Córdova
Fernando Ulisses Rosalino
Guilherme Espindola
Heriel A. B. da Luz
Leonardo Bastos
Lívia Gomes dos Santos
Luciléa Rezende Arguelho
Luis Henrique Moura
Priscilla Bolfer Moura
Priscilla Soares Teruya
ANÁLISES DOS PROCESSOS PSICOLÓGICOS GRUPAIS NA ATIVIDADE
DE TRABALHO NA SEÇÃO DE NUTRIÇÃO DO HU.
- PROJETO: TRABALHO E SUBJETIVAÇÃO EM UMA INSTITUIÇÃO HOSPITALAR
Supervisão: Profa. Dra. Inara
Barbosa Leão
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATOGROSSO DO SUL
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS
CURSO DE PSICOLOGIA – FORMAÇÃO DE PSICÓLOGO
CAMPO GRANDE.
JUNHO DE 2006.
SUMÁRIO
1 - Introdução .................................................................................................................. 3
2 - Apresentação do local e condições nas quais a atividade de estágio aconteceu..... 5
3 - Descrição do trabalho ................................................................................................ 7 3.1. - FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA................................................................................ 7
3.1.1 A Teoria Psicológica Sócio-Histórica........................................................................................7 3.1.2 A Teoria da Atividade..............................................................................................................13 3.1.3 A Teoria de Campo de Kurt Lewin..........................................................................................17 3.1.4 Sistema, Grupo e Poder – Ignácio Martin-Baró.......................................................................32
3. 2 – FUNDAMENTAÇÃO METODOLÓGICA ............................................................. 38 4 - Apreciação sobre o desenrolar das atividades e dos desafios enfrentados ............ 41
4.1 ANÁLISE DO GRUPO DE NUTRICIONISTAS........................................................ 41 4.1.a Devolutiva da Análise do Grupo das Nutricionistas ................................................................54
4.2 ANÁLISE DO GRUPO DE COZINHEIROS .............................................................. 56 4.2.a Devolutiva da Análise do Grupo dos Cozinheiros ...................................................................60
4.3 ANÁLISE GRUPO DOS AUXILIARES DE COZINHA ........................................... 64 4.3.a Devolutiva da Análise do Auxiliares de Cozinha.....................................................................72
4.4 ANÁLISE GRUPO DE COPEIROS............................................................................ 74 4.4.a Devolutiva da Análise do Grupo de Copeiros..........................................................................78
4.5 ANÁLISE GRUPO DE ASSISTENTES ADMINISTRATIVOS ............................... 81 4.5.a Devolutiva da Análise do Grupo de Assistentes Administrativos............................................82
4.6 ANÁLISE DO GRUPO DE AUXILIARES OPERACIONAIS.................................. 84 4.6.a Devolutiva da Análise do Grupo de Auxiliares Operacionais.................................................88
5. REPRESENTAÇÕES GRÁFICAS DAS ANÁLISES DA SEÇÃO DE NUTRIÇÃO DO HU. .......................................................................................................................... 93
6- CONCLUSÃO.......................................................................................................... 107
7 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................. 110
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1 - Introdução
Ao longo deste relatório, apresentamos os procedimentos, fundamentos teórico-
metodológicos, considerações e resultados alcançados pelas intervenções realizadas.
Para tanto, iniciamos pela explicitação dos pressupostos epistemológicos que
fundamentam e justificam o tipo de abordagem e de prática adotada, explanando
também acerca dos objetivos que nortearam as atividades realizadas.
Seguimos com uma apresentação sintética da Fundamentação Teórica que nos
embasou, definindo os conceitos teóricos relacionados à problemática analisada, a partir
dos pressupostos da Psicologia Sócio-Histórica, a Teoria da Atividade de Leontiev, os
constructos da Teoria de Campo de Kurt Lewin e, também, os estudos de Martin-Baró
sobre grupos.
Através de uma interlocução e de uma relação dialógica e sintetizadora entre tais
autores é que foram desenvolvidas as intervenções e análises dos fatores envolvidos.
O trabalho segue, então, pela descrição das atividades realizadas e dos meios que
utilizamos para alcançarmos tais objetivos, ou seja, a Metodologia adotada, que no caso
apóia-se no Materialismo Histórico Dialético e na Pesquisa-ação. Em seguida, serão
apresentadas as análises, propostas e possíveis recomendações.
Antes, é importante frisarmos que, para compreendermos os processos
psicológicos de um grupo, devemos partir do reconhecimento de que existe uma série
de influências sociais, muito amplas e profundas, sobre todo e qualquer indivíduo ou
grupo. Estas influências sociais implicam na forma como as instituições se organizam e
em como o trabalho é realizado nestas. Dentre os modos de organização institucional,
determinado socialmente, está o que é chamado de Divisão Social do Trabalho, que
consiste em separar por etapas e por grupos as tarefas que devem ser executadas. Por
exemplo: o grupo de cozinheiros, de nutricionistas, de copeiros e demais grupos
possuem funções diferentes, bem específicas, e cada um é responsável por uma etapa de
todo o processo, e isso é um exemplo de Divisão do Trabalho. Mas, esta divisão não é
própria desta instituição, é uma construção histórica, ou seja, que foi elaborada ao longo
de muito tempo pelos homens e serve para todas as instituições, não só para o HU. O
mesmo pode ser dito sobre o modo de organização hierárquico das instituições.
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Tais modos de organizações sociais, como a estrutura hierárquica e a divisão
social do trabalho, impõem certas condições para cada grupo: cada um terá suas
possibilidades e seus limites estabelecidos pelo próprio trabalho que executa, pela
própria função que desempenha no processo geral.
Dessa forma, os problemas e conflitos que surgem nestes processos não são
conflitos pessoais e não devem ser abordados como “culpa de alguém”,
individualmente. São resultantes do próprio trabalho e da forma como ele é executado,
ou seja, das próprias condições, possibilidades e limites que o ordenamento hierárquico
e a divisão social do trabalho impõem a cada grupo. Tanto que se trocássemos todos os
indivíduos, as dificuldades não desapareceriam.
Assim, tínhamos claro que as influências sociais e todas estas condições dadas
pela hierarquia institucional e pela divisão do trabalho, no presente caso, partem das
relações que se estabelecem desde o Ministério da Educação e o da Saúde com o HU
como um todo, e continuam nas relações entre o HU e a Seção de Nutrição, e é dessa
forma que tais influências chegam até os grupos que compõem esta Seção, regulando as
relações entre estes grupos e participando da formação dos aspectos psicológicos aí
presentes.
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2 - Apresentação do local e condições nas quais a atividade de estágio aconteceu
O Hospital Universitário da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, “Rosa
Pedrossian”, localiza-se em Campo Grande, é um dos principais hospitais responsáveis
por receber toda população do Estado é considerado referência estadual para o
atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS).
Configura-se como um Hospital Escola, sendo mantido com recursos
provenientes do Ministério da Saúde e da Educação. Como Hospital Escola é campo de
estágio para vários cursos e universidades, entre elas a Universidade Federal de Mato
Grosso do Sul (UFMS), Universidade para o Desenvolvimento do Pantanal (UNIDERP)
e Universidade Católica Dom Bosco (UCDB).
A divisão do trabalho no H.U./UFMS é organizada em razão das funções e
objetivos de cada atividade, portanto, é dividido em Seções. Uma delas é a Seção de
Nutrição que é responsável por preparar as refeições dos pacientes internados,
acompanhantes, funcionários e residentes. Por sua vez a Seção de Nutrição também é
subdividida em função das atividades desenvolvidas.
O início das atividades se deu quando a Chefe do Setor Administrativo da
referida Seção solicitou os serviços à área de Psicologia do Trabalho do Curso de
Psicologia do CCHS/UFMS com vista a eliminar os conflitos identificados entre os
funcionários e que, na opinião da solicitante, impediam o bom andamento das
atividades do grupo. A partir desta demanda, foi constituído um grupo de Estagiários
que se interessaram pela temática e que foram supervisionados pela professora
responsável pelas intervenções psicológicas requeridas. Este grupo, por sua vez, foi
dividido em subgrupos, cada qual responsável por um Setor da Seção de Nutrição,
sendo eles: Nutricionistas, Cozinheiros, Auxiliares de Cozinha, Assistentes
Administrativos, Auxiliares Operacionais e Copeiros.
Com base nos dados levantados - através das reuniões em grupo e de observação
de campo - foram feitos os confrontos entre os diversos dados coletados buscando as
relações e a totalidade do fenômeno estudado, visando a partir disso e das pesquisas
bibliográficas, elaborarmos sínteses e propostas de modificação da realidade estudada.
Tendo em vista tal intuito, foram feitas as análises psicológicas das informações
colhidas, a partir das quais foram criadas as representações gráficas apoiadas nos
conceitos de Martín-Baró sobre Identidade, Conhecimento e Poder, a fim de facilitar a
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exposição para os funcionários na reunião de devolutiva.
Este trabalho constitui-se, portanto, na síntese das atividades e resultados obtidos
ao longo de aproximadamente um ano das atividades desenvolvidas nas Disciplinas
Estágio Supervisionado em Psicologia Organizacional II e III, junto à Seção de Nutrição
do Hospital Universitário (HU) da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
(UFMS). A atuação conjunta dos acadêmicos que cursavam os dois níveis de Estágio se
deve a estratégia do grupo para garantir que não haja quebra de continuidade das ações
em decorrência da formatura dos acadêmicos estagiários no nível III. Portanto, Neste
momento as ações junto aos trabalhadores e a organização hospitalar continuam em
desenvolvimento a partir do que foi desenvolvido até o momento da elaboração deste
Relatório.
No período letivo de 2005-2006, período contemplado por este Relatório, o
Trabalho no Estágio Supervisionado em Psicologia Organizacional III, foi cumprido
pelos acadêmicos que concluíram o curso em Junho de 2006. Portanto, a decisão de
apresentarmos este para a apreciação neste Concurso foi tomada em comum acordo com
os participantes e o termo de consentimento se encontra sob a guarda da Professora
Supervisora.
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3 - Descrição do trabalho
3.1. - FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
3.1.1 A Teoria Psicológica Sócio-Histórica
- Consciência e Trabalho
O contexto atual no qual o trabalho é realizado é o do capital, no qual há a
acumulação deste por uma classe social, mediante a utilização do trabalho de uma outra.
A classe que detém os meios de produção e condiciona o trabalho é chamada de classe
burguesa e a que vende sua força de trabalho é a classe trabalhadora. Porém, esta
relação de trabalho não foi sempre assim, pois esta forma de organização do trabalho se
instalou a partir das Revoluções Francesa e Industrial, as quais consagraram o
capitalismo como sistema sócio-econômico vigente.
Entretanto, a forma de produção de mercadorias e o trabalho humano não podem
ser confundidos. O trabalho é a atividade do homem por excelência, sendo através dele
que a espécie humana pôde modificar a natureza em seu benefício, além de constituir a
sua subjetividade e transformar o seu corpo.
O trabalho se caracteriza desde quando o homem ainda era um ser nômade, que
vivia da coleta de alimentos que era a forma de saciação de sua necessidade primeira:
alimentação. Conforme as alterações ambientais e a falta de alimentos suficientes para a
manutenção da espécie, o homem passou a criar instrumentos capazes de protegê-lo do
frio, dominar o fogo, confeccionar armas e utensílios com elementos da natureza. Essas
criações humanas, exigidas pelo enfrentamento com a natureza e propiciada pelo
trabalho, transformam a organização psíquica do homem, que cria não só instrumentos
práticos para lidar com a realidade, mas também instrumentos psicológicos, os quais o
fazem dar um salto qualitativo em sua relação com a realidade material.
A princípio, seu primeiro instrumento é seu próprio corpo: ao conquistar a
bipedia, o homem reorganiza sua concepção de ambiente, sua percepção e
psicomotricidade. A natureza segue exigindo maneiras mais sofisticadas de atuação para
a consecução dos objetivos humanos, isto é, o homem novamente faz novo salto
qualitativo ao modificar sua mão com o movimento de pinça, movimento este que
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possibilita manipular instrumentos mais sofisticados, de maneira a, mais uma vez,
reorganizar sua forma de lidar com o mundo externo. Engels (1999, s/p), em “Sobre o
papel do trabalho na transformação do macaco em homem” diz:
“Em face de cada novo progresso, o domínio sobre a natureza que tivera início com o desenvolvimento da mão, com o trabalho, ia ampliando os horizontes do homem, levando-o a descobrir constantemente nos objetos novas propriedades até então desconhecidas”.
O trabalho teve então o papel de transformar, historicamente, o macaco no
homem de hoje, e as modificações que promoveu no ambiente físico propiciaram a
transformação para a consciência do homem, fazendo dele o produtor de sua própria
existência.
O trabalho estabeleceu também a necessidade de uma linguagem, que nasce da
atividade simpráxica que o homem exerce na natureza. Algumas convenções
lingüísticas se fizeram necessárias e, a partir do trabalho conjunto, tivemos o advento da
linguagem enquanto representação da realidade, a princípio como referencial, ou seja,
ligada diretamente ao seu objeto e, posteriormente, a linguagem conceitual, a qual
trouxe a possibilidade das Funções Psicológicas Superiores do homem, tais como o
pensamento, a abstração, a emoção, a memória superior, etc.
Concomitantemente às alterações biopsíquicas e à utilização da linguagem, o
homem produz a cultura e a passa de geração a geração. Neste contexto, o homem deixa
de ser nômade e passa ao sedentarismo, em decorrência da exaustão das possibilidades
da coleta e a decorrente necessidade de cultivar seu próprio alimento.
Este homem trabalhador já mantém com a natureza uma relação de domínio e o
trabalho torna-se mais elaborado com a divisão natural do mesmo, ou seja, os homens
mantinham trabalhos diferentes dos das mulheres, crianças e velhos, devido às suas
compleições físicas e estrutura corpórea. Às mulheres cabia a criação dos filhos e os
trabalhos artesanais das tribos humanas.
Aqui, o homem já havia domesticado os animais, e produzia sua existência sem
acumulação, sendo que todo produto do trabalho do grupo era dividido entre os seus
membros. Mas esta situação foi constantemente modificada conforme a história, pois
houve o aumento na produção e surgiu a necessidade de troca entre os membros.
No século XII a.C., os gregos detinham propriedade privada e o trabalho era
feito pelos escravos, resultantes das derrotas das guerras, os quais não tinham
propriedade e prestavam-se a seus senhores. Com o desenvolvimento da ordem sócio-
política, cria-se a divisão pela propriedade da terra e estabelecem-se os reinos,
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principalmente entre os séculos IV e IX, onde já estava vigendo um novo sistema
social: o feudalismo.
No feudalismo, o senhor feudal era o dono das terras, onde eram produzidos os
meios de sobrevivência dos senhores e dos servos – trabalhadores que trocavam sua
força de trabalho pela proteção dos senhores feudais. Neste modo de produção, os
trabalhadores recebiam uma parte da produção ao trabalharem para seus senhores;
conforme os meios de produção que possuíam, o que permitiu não só a reprodução de
si, mas, em alguns casos, iniciarem a acumulação de bens e capital.
Contudo, foi com o feudalismo que houve a emergência de trabalhadores
manufatureiros, os quais fabricavam produtos artesanais e não tinham relação de
serventia com os senhores feudais. Estes criam os Burgos, agregados de trabalhadores
que exerciam o comércio e acumulavam riqueza.
O período histórico em que os burgos surgiram e deram condições para a
emergência de uma nova classe social, devido ao seu poder econômico, é chamado de
mercantilismo. Neste, as mercadorias adquirem valor de troca e as terras já não mais as
únicas fontes de poder.
E deste período histórico em diante, esta nova classe se torna revolucionária,
lutando contra os senhores feudais e o poder político exercido pela Igreja. Estas lutas,
associadas com o desenvolvimento técnico do trabalho produtivo, produzem as
condições necessárias para a nova configuração social, culminada com as Revoluções
Francesa e Industrial, que instauram o capitalismo sob as bases da ideologia liberal.
– O Trabalho no Capitalismo
Com o capitalismo, a classe burguesa surge como a detentora dos meios de
produção, bem como do poder político, instituindo as leis do novo sistema social. O
liberalismo, atrelado à idéia de liberdade da burguesia, torna-se hegemônico e é
representada pela frase: “liberdade, igualdade e fraternidade”. Agora os homens eram
livres, mas esta liberdade referia-se a não mais depender dos senhores feudais, o que
levaria os homens agora livres, porém desprotegidos, a venderem sua força de trabalho
aos detentores dos meios de produção capitalista.
O capitalismo sustenta-se na acumulação do capital e esta se dá da seguinte
forma: os homens, agora livres, têm a possibilidade de vender sua força de trabalho aos
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capitalistas, ou seja, alienam parte de seu tempo livre e sua força de trabalho para
trabalhar para aqueles que ficam com o produto do trabalho, trocado por um valor
monetário, o qual deve servir para que os indivíduos consigam manter a si mesmos e
suas famílias.
No entanto, os capitalistas ficam não apenas com o produto do trabalho, mas
também com o valor agregado a esse produto pelo trabalho que não foi pago. Este
trabalho não pago chama-se mais-valia, conceito desenvolvido por Marx (1999) e que
se refere ao valor que um produto tem ao ser produzido, ou seja, seu valor de uso; e o
valor que o produto passa a ter, acrescido da produção extra feita pelo trabalhador e não
paga pelo capitalista, isto é, seu valor de troca.
É sob estas condições que o trabalhador contemporâneo produz sua existência e
sua consciência: não detendo o produto de seu trabalho, não percebendo como suas
relações com a realidade se dão de forma parcial em decorrência deste modo de
produção, e mais, também não se reconhecendo como produtor de sua própria vida.
– A Consciência
A consciência, de acordo com a Teoria Psicológica Sócio-Histórica, é um
conjunto de conteúdos e processos subjetivos, tais como imagens de percepção e as
Funções Psicológicas Superiores. É através da consciência que o homem irá se
relacionar com o ambiente material e social sendo que é, por ela também, que pôde
construir a cultura e a sociedade.
A gênese da consciência se dá por meio da atividade do sujeito na realidade
objetiva. Ao entrar em atividade, o sujeito cria novas conexões intrapsíquicas, formando
assim as Funções Psicológicas, com as quais irá se orientar no mundo. A consciência é
pautada pela representação social, isto é, pelo significado – conjunto de representações
construídas socialmente e convencionadas por determinada cultura, e pelo sentido –
representação individual produzida pela atividade do sujeito em relação ao significado
social. Em outras palavras, o significado é social e o sentido é individual.
O significado que, inicialmente, está no contexto sócio-cultural onde o sujeito se insere, é ressignificado pela sua atividade, mediando-a, atribuindo-lhe sentido próprio com base nas suas experiências afetivas anteriores. Aquele nos permite analisar o objeto, distinguir nele propriedades essenciais e relacioná-lo a determinada categoria, mas é o sentido que exprime os componentes afetivos para a exploração da realidade.
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Para se entender consciência, faz-se necessário a explicação de como seus
conteúdos e processos são interiorizados. A princípio, o homem, dotado da capacidade
de ser afetado pela realidade objetiva, entra em relação com ela em busca da saciação de
suas necessidades, sejam elas biológicas ou sociais e, para isso, necessita entrar em
atividade em seu meio social.
Porém, essa atividade deve ser motivada, e é este motivo que indica os objetos
para a consecução de seus objetivos, isto é, o motivo é a contradição dialética entre
necessidade individual e condições de saciação dessa necessidade dadas pela realidade
material. O motivo da atividade é essencialmente emocional, tanto que nos sentidos do
sujeito encontramos seus motivos, ou seja, encontramos o princípio emocional que o
levou a entrar em atividade.
A consciência do indivíduo é tratada por Leontiev (1995) como um reflexo da
realidade, mas não um reflexo imediato, sendo, ao contrário, mediado por sua atividade.
A consciência do homem é a representação do mundo para este homem, e esta
representação está restrita às formas em que a cultura se organiza, às formas de
produção material da vida e ao contexto histórico em que se dão as relações humanas.
Segundo Leontiev (Idem), o homem reflete a realidade a partir de mediadores de
sua consciência, que são os chamados instrumentos mediadores. Vários são os
instrumentos mediadores da consciência: a linguagem, devido à sua capacidade
representativa e comunicativa; a emoção, por ser a representação social dos afetos
sentidos pelo homem e discriminados segundo a cultura e o momento histórico em que
se dão. Portanto, se retomarmos a discussão acerca dos sentidos e significados,
podemos dizer que para a consciência, a emoção é a contradição entre os afetos
individuas e a representação social dos mesmos, sendo que por isso dizemos que o
sentido é emocional, pois é o produto dessa contradição. Em outras palavras, os afetos
do homem, quando significados socialmente, são sentidos por esse homem como
particulares.
Outro elemento mediador da consciência é o grupo social do qual o indivíduo
faz parte. Este grupo representa a macro-sociedade, mas com algumas particularidades
condicionadas à sua própria dinâmica e organização. Segundo Vigotsky (1999), a
palavra é o microcosmo da consciência, o que nos indica que ela – elemento
representativo da linguagem, que é também um mediador da consciência – carrega a
significação e o sentido para o sujeito. Contudo, esta representação da linguagem é
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contingente ao processo grupal no qual se dão as representações.
Portanto, temos vários instrumentos mediadores da consciência do homem, e
todos estão em constante processo de mudança, segundo o processo histórico. Não se
pode tomá-los separadamente, devido ao fato de a atividade do homem ser tão diversa
quanto seus processos intersubjetivos. Esta característica de multideterminação da
consciência indica a complexidade dos processos individuais e seus matizes
significativos, uma vez que o homem, este ser em movimento, está cotidianamente
reestruturando sua consciência a partir de sua atividade em um mundo em constante
transformação. Muito embora não concebamos esta mudança facilmente, as nuances
cotidianas nos transformam aos poucos e, segundo o método dialético, este pouco se
transforma em muito por saltos qualitativos, o que caracteriza o reconhecimento da
mudança.
Finalmente, a consciência é a instância produzida pela atividade do homem e
que está constantemente produzindo o homem, em conjunto com o movimento histórico
da humanidade.
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3.1.2 A Teoria da Atividade
O ser humano está inserido em um contexto sociocultural, e é através das
relações que mantém nesse contexto que desenvolverá suas Funções Psicológicas
Superiores, que são meios estruturados que promovem o funcionamento psicológico
humano, surgindo a partir de diferenciações promovidas pelo desenvolvimento histórico
e social do homem, através das relações reais estabelecidas no meio social. Assim, de
acordo com Aguiar (2001, p. 96), "o homem está em relação com esse mundo; atua
interferindo no mundo (atividade) e ao mesmo tempo é afetado por essa realidade
constituindo seus registros [psicológicos]". Portanto, é com a atividade que o homem se
insere no mundo, e por meio dela que ele se constitui, o que nos leva a concluir que o
estabelecimento, desenvolvimento e caracterização da atividade é um dos processos que
compõe e promove o funcionamento psicológico do ser humano.
A atividade pode ser melhor compreendida como mediação, entre o homem e a
realidade. Ela não é a ação, embora sob alguns aspectos possamos dizer que a atividade
é a ação do homem sobre o mundo, inclusive sobre ele mesmo. Ela caracteriza-se por
ocorrer a partir de uma necessidade que é demonstrada por um objetivo a ser alcançado:
é assim que o motivo é objetivado e direciona a atividade; isto porque os motivos
impulsionadores da atividade não são conscientes. Enquanto se toma consciência dos
fins, a compreensão dos motivos permanece inconsciente, embora estejam presentes sob
a forma de tônus emocional das ações. O verdadeiro motivo só será conhecido quando
as ações explicitarem o motivo pessoal e, a partir dessa explicitação, levar ao motivo
social interiorizado e transformado em interesse pessoal. Portanto, a emoção constituí-se
quando o motivo é objetivado e, antes que ocorra a valorização social de sua atividade,
são os estados emocionais que direcionam o sujeito para determinado objeto, ou seja, é
a partir da emoção que a atividade é dotada de significação.
De acordo com Wertsch (1988, p. 210 apud Leão, 1999, p. 31), a Teoria da
Atividade de Leontiev diferencia três níveis de atividade, cada um caracterizado por um
tipo específico de unidade. No primeiro nível, estão as atividades reais, concretas,
desenvolvidas e determinadas pelo contexto sociocultural no qual o homem está
inserido.
O outro nível é o fato de "ser a unidade de uma ação orientada para um objetivo"
(Leão, 1999, p.31). A ação é um meio de realizar a atividade e, conseqüentemente, de
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satisfazer o motivo. O traço característico de uma ação é o fato de que é sempre
orientada para um objetivo, almejando satisfazer um objetivo particular. Isso significa
que ela pode fazer parte da realização de diversas atividades, de forma relativamente
independente, uma vez que um motivo pode ser constituinte de diferentes atividades. O
terceiro nível refere-se às operações, que se relacionam com as circunstâncias
específicas que estão envolvidas na execução da ação e constituem o meio pelo qual
uma ação é realizada. Enquanto uma atividade é orientada por um motivo, as ações são
orientadas para as metas, e as operações orientadas pelas condições. Uma atividade é
realizada através de ações cooperativas ou individuais, podendo se estabelecer cadeias
ou redes de ações que estão relacionadas umas com as outras por buscarem atingir a
mesma meta. Uma característica importante de uma ação é que ela é planejada antes de
sua execução
Dessa forma, a ação tem seu aspecto intencional e o operacional, que não se
define pelo objetivo em si, mas pelas circunstâncias objetivas na qual se desenvolve. Na
ausência de um motivo, realizam-se apenas ações ou operações, que são partes
constitutivas da atividade, mas não são a própria atividade.
A atividade tem papel determinante na formação da consciência, que é a mente
humana como um todo, e a atividade é a interação humana com sua realidade objetiva -
é através da atividade que a consciência vai diferenciar o mundo real das impressões
interiores individuais; tendo a capacidade de observar a si mesma, de forma a manter a
estabilidade objetiva das propriedades materiais, independente das subjetivas.
É a partir da atividade que ocorrerá uma apreensão da realidade objetiva, não de
forma passiva, mas de maneira ativa, criativa, sobre a base e no decorrer da
transformação prática da realidade. Para que isso ocorra, é necessário que aja uma
interiorização da atividade, que se dará por meio de signos sociais - a linguagem. Sua
origem é social, e a linguagem tem grande importância em sua constituição, uma vez
que a noção de "eu" se constrói na relação com o outro, desempenhando a função de
contato social. Ela caracteriza-se pela relação que o indivíduo faz entre sentido (pessoal)
e significado (social), através da atividade, quando o sujeito apreende a realidade como
sendo particular e a torna consciente.
A tomada de consciência, portanto, é a apreensão do sentido individual da
atividade, que é uma construção social. Assim, a partir da atividade, o homem modifica
o meio ao mesmo tempo em que é modificado, pois é pela atividade que o homem se
objetiva e transforma a realidade, ao mesmo tempo em que transforma a si mesmo e se
subjetiva. Por isso, deve ser objeto de estudo da psicologia, por situar o homem na
15
realidade objetiva e transformar tal realidade em subjetividade.
A atividade também é determinante na constituição da identidade, que é um
processo resultante da relação que o sujeito estabelece com o meio. Todas as funções
Psicológicas Superiores são, inicialmente, fenômenos sociais, e como tal, não têm
nenhuma característica de permanência. Porém, enquanto representação social de um
indivíduo, a sua identidade é apenas pressuposta, cabendo ao indivíduo, através da
atividade, acatar ou não a representação que lhe é atribuída pelos outros, sendo que,
portanto, a identidade se constrói através da atividade.
A atividade, ao mesmo tempo em que é construção do homem, é também
"determinada pela forma que a sociedade se organiza para o trabalho" (Aguiar, 2001,
p.99). Pois, como o trabalho é uma das manifestações da atividade humana que tem a
centralidade na sua vida, ao ser interiorizado, reconfigura e se expressa em todas as
demais atividades, por meio de signos sociais. Conseqüentemente, qualquer
consideração acerca da atividade, da consciência ou de aspectos psicológicos do ser
humano deve, necessariamente, considerar o contexto no qual ele está inserido, e é neste
que os significados das palavras são construídos.
A linguagem é um mediador para o processo de transmissão, reprodução de
conhecimento e constituição do pensamento. Ela "reproduz uma visão de mundo,
produto das relações que se desenvolveram a partir do trabalho produtivo para a
sobrevivência do grupo social" (Lane, 1994, p. 32-33). Entretanto, a partir da atividade,
essa linguagem social é interiorizada e transforma-se em Sentido pessoal das atividades
e de seus contextos.
A Atividade Subjetiva
O sentido da realidade e das atividades nela desenvolvidas é pessoal, relacionado
diretamente "com a realidade, com a própria vida e com os motivos de cada indivíduo".
(Lane, 1994, p.34).
Isto porque, para satisfazer suas necessidades, o homem precisa atuar sobre o
mundo, o que resulta também na construção do fenômeno psicológico, aqui entendido
como "atividade do homem de registrar a experiência e a relação que mantém com o
ambiente sociocultural" (Aguiar, 2001, p.98). Assim,
"o homem constrói seu mundo interno na medida em que atua e
16
transforma o mundo externo. Mundos externo e interno são, portanto, imbricados, pois são construídos num mesmo processo, e a existência de um depende da do outro. Atuar no mundo é uma propriedade do homem, isto é, a atividade é uma das suas determinações". (Bock, 1999, p. 143).
A subjetivação da realidade ocorre a partir da sua interiorização, concebida
como o processo pelo qual alguns aspectos da atividade que ocorreram externamente
passam a acontecer no plano interno, onde sofrem modificações, adaptações e,
principalmente, podem desenvolver-se de forma a extrapolar as possibilidades da
atividade externa.
Tal conceito, desenvolvido por Vigotsky, possibilitou o desenvolvimento das
idéias psicológicas concretas sobre a origem das operações internas de pensar (Leontiev,
1978).
A atividade interna é um processo histórico: foi a partir do desenvolvimento
ontológico que o homem tornou-se capaz de raciocinar e resolver tarefas apoiando-se na
linguagem, sem que ocorresse a externalização de sua ação. Ela começa como uma
atividade material e, devido às ações e operações requeridas pelo uso da linguagem, se
interioriza em forma de sistemas neuropsicológicos sobre a base do sistema fisiológico,
o que foi propiciado pelo desenvolvimento filogenético dos seres humanos.
Portanto, a atividade interna é constituída socialmente, mas é produto da
interação social sobre a atividade cerebral, uma vez que os processos psíquicos e
fisiológicos formam uma unidade indissociável.
De acordo com Leão (1999, p. 45),
"... o pensamento apresenta-se como uma atividade propriamente dita, com ações e operações, e as funções cerebrais que as possibilitam. Essas transformações têm por base o desenvolvimento da linguagem e da palavra, quando estas passam a permitir a realização de ações, pela transmissão verbal de certos conteúdos. Especificamente, estes conteúdos só podem organizar os aspectos de planificação, organização e direção de uma atividade, visto que não podem produzir alterações físicas na natureza."
Nestas condições, qualquer operação ou ação de trabalho é dialeticamente
promotora da conformação e de alterações na subjetividade dos homens, tornando-os,
ao mesmo tempo, tão iguais e completamente diferentes.
17
3.1.3 A Teoria de Campo de Kurt Lewin
A Teoria de Campo de Kurt Lewin é um conjunto de conceitos por meio dos
quais se pode representar a realidade psicológica. É um enfoque no qual o
comportamento é visto como algo que ocorre em um campo ou sistema organizado,
considerando os fatores externos e internos à pessoa, pois estes interagem para a
determinação deste comportamento.
Para Lewin, a Teoria de Campo não seria apenas um conjunto de conceitos com
os quais se pode representar a realidade psicológica. A sua contribuição foi tornar os
conceitos da Psicologia de Campo suficientemente abrangentes para serem aplicados à
todas as espécies de comportamento e, também, torná-los específico para permitir a
representação de uma pessoa definida em uma situação concreta.
Assim, a Teoria de Campo de Lewin cria uma linha de pesquisa que,
posteriormente, passa a ser conhecida, vulgarmente, como Dinâmica de Grupos. Ela
permite justamente demonstrar e explicitar de uma maneira coerente com a ciência
como essas relações que se dão entre as pessoas de determinados grupos podem ser
percebidas, demonstradas e trabalhadas lógica e formalmente. Portanto, diferentemente
daquilo que vinha sendo proposto, por exemplo, pela psicanálise e pela fenomenologia,
que fazem uma abordagem com a intenção de lidar com a subjetivação, com
mecanismos eminentemente psicológicos e inconscientes ou incompreensíveis à luz da
consciência; a idéia de Lewin é que é possível mostrar esses processos através de
conceitos e representações gráficas.
As principais características da Teoria de Campo são as proposições que:
- o comportamento é função do campo que existe no momento em que ele
ocorre;
- a análise começa com a situação como um todo, a partir da qual são
diferenciadas as partes componentes;
- a pessoa concreta, em uma situação concreta, pode ser representada
matematicamente.
O campo é definido como a “totalidade dos fatos coexistentes, concebidos em
termos de mútua interdependência” (Lewin apud Hall & Lindzey, 1966, p. 234). O
campo no qual o comportamento ocorre, é dividido em pessoa e meio, sendo este último
diferenciado em partes psicológicas e não-psicológicas. Pessoa e meio psicológico são
18
mutuamente interdependentes. As forças que atuam no campo precisam ser entendidas e
apreendidas e a cognição é o elemento fundamental que permitirá ao indivíduo conhecer
e agir na realidade, pois ela descreve os processos psicológicos implicados na obtenção,
no uso, no armazenamento e na modificação do conhecimento sobre o mundo e sobre as
pessoas. Neste processo de cognição, o indivíduo constrói estruturas explicativas da
realidade, sendo que tais estruturas orientarão a sua ação psíquica e, portanto, a sua
interação em um grupo. Ao falarmos em estruturas cognitivas, estamos nos referindo às
crenças, às opiniões, às expectativas, às hipóteses, às teorias e aos esquemas que o
indivíduo já possui, bem como às indagações sobre estes, às possibilidades de respostas
para estas indagações e aos recursos de organização para construção dessas respostas. A
cognição é o processo que vai construir o significado do comportamento que será
emitido pelo indivíduo.
Na teoria proposta por Lewin, a pessoa é representada como ser distinto, e como
parte de uma totalidade maior. O isolamento da pessoa do resto do universo é obtido
através do desenho de uma figura fechada.
NÃO – PESSOA NÃO - PESSOA
Tudo o que está dentro dos limites de P é pessoa; o que está fora é não-pessoa. O
aspecto significativo desta figura é que ela descreve uma área totalmente delimitada e
que se insere dentro de uma área maior.
Porém, como a pessoa não é uma unidade perfeita, a estrutura da pessoa é
heterogênea, subdividida em partes separadas, mas interdependentes e
intercomunicantes. A pessoa se diferencia em região percepto-motora e região
intrapessoal, sendo, esta última, dividida em células periféricas e células centrais. Dessa
maneira, a pessoa é definida como uma região diferenciada no espaço vital.
O espaço vital é o todo da realidade psicológica, o qual contém a totalidade dos
fatos possíveis e capazes de determinar o comportamento do indivíduo, ou seja, o
espaço vital representa o padrão total de fatores e influências que afetam o
comportamento, em dado momento. O espaço vital inclui tudo o que for necessário para
a compreensão do comportamento concreto de um ser humano individual em um dado
P
19
meio psicológico e em determinado tempo.
NÃO-PSICOLÓGICO NÃO-PSICOLÓGICO
P + M = V
(M): meio psicológico;
(P): pessoa;
(V): espaço vital.
A região entre os dois perímetros constitui o meio psicológico M e a área total
dentro da elipse, incluindo o círculo, é o espaço vital V.
O espaço fora da elipse é denominado, por conveniência, de mundo físico –
apesar de não ser restrito apenas aos fatos físicos - e esta região representa os aspectos
não-psicológicos do universo.
Lewin, ao explicar o comportamento humano como uma função da interação
entre a pessoa e o meio psicológico, propõe a seguinte equação:
C = f (P + M)
(C): comportamento;
(F): função;
(P): pessoa;
(M): meio psicológico
Diante disso, podemos afirmar que o comportamento é uma função do espaço
vital, pois se P + M = V, temos
O espaço vital é rodeado pelo meio físico, sendo que estas regiões distintas
fazem parte de uma totalidade maior. Lewin chamou a região exterior e contígua ao
limite do espaço vital de “invólucro externo do espaço vital”. O limite entre o espaço
vital e o mundo exterior possui a propriedade de permeabilidade e assim, fatos não-
C = f (V)
M M
P
20
psicológicos podem, e de fato o fazem, alterar fatos psicológicos. Também é verdadeiro
que fatos psicológicos podem produzir alterações no mundo físico.
- Invólucro Externo
Outra propriedade do espaço vital é a de que a pessoa não é parte do meio psicológico e
nem está incluída nele.
Entretanto, o limite entre a pessoa e o meio é também permeável e, assim, os
fatos do meio podem influenciar a pessoa e os fatos relativos à pessoa podem
influenciar o meio.
INVÓLUCRO EXTERNO
Quanto ao meio, também é necessário que este seja subdividido em regiões, pois
o meio homogêneo e não diferenciado, no qual todos os fatos são igualmente influentes
sobre a pessoa, não representa o verdadeiro status quo. Contudo, não é preciso
distinguir entre diversas regiões do meio, já que todas as regiões são iguais.
Com isso, o espaço vital é, neste momento, representado por uma pessoa
diferenciada, circundada por um meio diferenciado e, portanto, o espaço vital consiste
de um conjunto de sistemas interconectados. Para Lewin, duas regiões estão conectadas
quando um fato1, em uma região, está em comunicação com um fato em outra região e,
também, quando os fatos de uma região são acessíveis aos fatos de outra. Quando isto
acontece, temos uma ocorrência e o grau de interligação ou a extensão da influência
entre as regiões é determinado pela resistência das delimitações, – se a resistência for
forte, as regiões próximas possuirão pouca influência recíproca; já se a resistência for
fraca, as regiões poderão sofrer influência recíproca mesmo muito separadas - pelo
número de regiões intervenientes e pelas qualidades de superfície das regiões.
O número de regiões no espaço vital é determinado pelo número de fatos
psicológicos separados, existentes em determinado momento. Por exemplo, se existem 1 Para Lewin, fato é também algo não observável diretamente, mas que pode ser deduzido de algo observável. Existem fatos empíricos e fatos hipotéticos ou dinâmicos. O fato é representado por uma região.
ESPAÇO VITAL
21
apenas dois fatos, a pessoa e o meio, só há duas regiões no espaço vital. Na pessoa, o
número de regiões é determinado pelo número de fatos relacionados com a mesma.
Se, por exemplo, a sensação de fome é o único fato existente, a esfera
intrapessoal só terá uma região.
Em um meio diferenciado em regiões, os fatos de uma determinada região
influenciam mais a pessoa do que os fatos de outra região. A compreensão de uma
situação psicológica concreta exige o conhecimento da posição da pessoa no seu meio
psicológico. Fisicamente, a pessoa pode estar em uma audiência mas, psicologicamente,
pode estar pescando.
O modo pelo qual as regiões que formam o espaço vital se relacionam, é
entendido através do grau de influência ou acessibilidade entre as regiões. A influência
exercida pelas regiões do meio entre si é expressa através da facilidade com que uma
pessoa pode mover-se de uma região a outra. A isto, Lewin denominou locomoção. Ao
realizar uma locomoção, a pessoa move-se através do meio psicológico, porém, essa
locomoção não significa movimento físico através do espaço. A influência mútua entre
duas regiões intimamente conectadas é exercida quando as locomoções se tornam
possíveis entre essas regiões. O meio psicológico, para Lewin, é uma região em que a
locomoção se torna possível.
O processo pelo qual as regiões da pessoa expressam sua influência mútua, foi
denominado comunicação. As regiões da pessoa estão conectadas quando podem
comunicar-se entre si: a região perceptiva, por exemplo, se comunica com as células
periféricas da região intrapessoal e, por sua vez, estas se comunicam com as células
mais centrais.
De acordo com Lewin, locomoção e comunicação são ocorrências, pois resultam
da interação de fatos. É necessário seguir três princípios ao deduzir-se uma locomoção,
uma comunicação ou uma ocorrência do espaço vital.
1. Princípio da conexão: uma ocorrência resulta sempre da interação de
dois ou mais fatos.
2. Princípio da concreção: somente os fatos concretos, isto é, aqueles que
existem no espaço vital, podem ter efeitos.
3. Princípio da contemporaneidade: apenas os fatos presentes podem criar
comportamento atual.
Kurt Lewin chamou de reestruturação do espaço vital todas as mudanças ou
ocorrências estruturais resultantes da ação de uma região sobre outra. Dentre estas,
podemos citar: o número de regiões pode aumentar ou diminuir, de acordo com a adição
22
ou subtração de fatos novos ao espaço vital; duas regiões distantes podem se aproximar
e vice-versa; uma delimitação permeável pode tornar-se forte e uma forte tornar-se
fraca.
Há ainda duas outras dimensões do espaço vital. Uma é a de níveis de realidade,
coordenada com conceitos de realidade e irrealidade. A realidade consiste em uma
locomoção verdadeira, enquanto que a irrealidade consiste em uma locomoção
imaginária. As locomoções se tornam mais fáceis, geralmente, à medida que a pessoa
caminha em direção da irrealidade, pois as delimitações se tornam menos rígidas e a
qualidade das superfícies das regiões mais fluidas. Lewin acredita que o conceito de
níveis de realidade se aplica não somente às estruturas do meio, mas também à estrutura
da pessoa, apesar de não ter trabalhado nesta questão.
A outra dimensão é a do tempo. Apesar de passado e futuro não poderem afetar
o comportamento atual, as atitudes, pensamentos e sentimentos da pessoa a respeito do
passado e do futuro podem ser influentes sobre sua conduta. “O presente, portanto,
inclui o passado psicológico e o futuro psicológico” (Lewin apud Hall & Lindzey, 1966,
p. 250).
Acima, vimos os principais conceitos estruturais da teoria lewiniana. Agora,
veremos os principais conceitos dinâmicos constituintes da chamada psicologia vetorial.
Lewin postula que a pessoa é um sistema complexo de energia. A energia
psíquica é a que realiza o trabalho psicológico e é liberada quando a pessoa procura
voltar ao estado de equilíbrio após um estado de desequilíbrio. Este é provocado por um
aumento de tensão em uma parte do sistema, como resultado de um estímulo externo ou
uma mudança interna.
A tensão é um estado de uma região intrapessoal em relação a outras regiões
intrapessoais. Como visto anteriormente, a pessoa é diferenciada em regiões e, a região
intrapessoal, é dividida em células. Ao se referir às propriedades dinâmicas da região ou
célula intrapessoal, Lewin chama a região de sistema.
A tensão possui duas propriedades conceituais significativas. A primeira é que
um estado de alta tensão em um determinado sistema tenderá a passar para os demais
sistemas circunvizinhos, em estado de baixa tensão, até que o sistema todo atinja o
equilíbrio. O meio psicológico pelo qual a tensão se equilibra é chamado processo, e
este pode ser o ato de pensar, lembrar, sentir, perceber, agir.
O estado de equilíbrio não significa, obrigatoriamente, que o sistema esteja sem
tensão, embora a tensão sempre acabe por atingir a condição de equilíbrio. O equilíbrio
no sistema significa que a tensão no sistema como um todo está bem distribuída ou que,
23
em um sub-sistema cujo volume de tensão seja desigual, está cercado e isolado dos
outros sistemas interpessoais.
A segunda propriedade é a pressão que a tensão exerce sobre a delimitação do
sistema. Se essa delimitação for firme, a difusão da tensão de um sistema para os outros
estará bloqueada, mas se não, a tensão fluirá de um sistema para os demais. Uma
delimitação é uma região de resistência ou uma barreira. A força exercida na região de
delimitação contra a força que é gerada dentro desta região é, provavelmente,
determinada pelos estados de tensão nos sistemas circunvizinhos.
O aumento de tensão ou a liberação de energia na região intrapessoal é causada
pelo aparecimento de uma necessidade. Pode ser uma condição fisiológica como a
fome, a sede, o sexo e pode ser o desejo de algo ou a intenção de realizar alguma coisa,
portanto, um conceito motivacional, que equivale a termos como motivo, desejo,
impulso. A necessidade é determinante do comportamento, ou seja, é iniciadora do
comportamento.
Para Lewin, cada necessidade é um fato concreto, devendo ser descrita em todas
as suas especificidades a fim de que possamos compreender a verdadeira realidade
psicológica.
As necessidades de uma pessoa, segundo Lewin, são, em grande parte,
determinadas por fatores sociais.
Para conectar a motivação com o comportamento, Kurt Lewin utiliza os
conceitos de valência e força ou vetor.
A valência é a propriedade conceitual de uma região do meio psicológico, é o
valor dessa região para a pessoa. Há dois tipos de valência: positiva e negativa. A região
de valor positivo é a que contém um objetivo que reduz a tensão quando a pessoa nela
penetra e, a de valor negativo, é a que aumenta a tensão. As valências positivas atraem e
as negativas repelem.
A fonte primária da valência é a necessidade, que organiza o meio em um
trançado de regiões que atraem e repelem. A força de uma valência depende da força da
necessidade somada a fatores não psicológicos que influenciam a valência de uma
região. Contudo, uma valência não é uma força. Ela dirige a pessoa através do seu meio
psicológico, mas não provê a pessoa do poder motivador para locomover-se.
A locomoção ocorre sempre que uma força age sobre uma pessoa. Força e
tensão são conceitos diferentes, pois a força existe no meio psicológico e a tensão é uma
propriedade do sistema intrapessoal.
24
A direção, energia e ponto de aplicação são três propriedades conceituais de
força, e estão representadas matematicamente pelo vetor. Quando apenas um vetor age
sobre a pessoa haverá uma locomoção ou tendência para mover-se na direção do vetor,
mas quando dois ou mais vetores impulsionam a pessoa para diferentes direções,
dizemos que a locomoção será decorrente da resultante de todas as forças envolvidas.
A direção de um vetor é determinada pela localização de uma região, seja de
valência positiva ou negativa; a força de um vetor está relacionada com a força da
valência, com a distância psicológica entre a pessoa e a valência e com a potência
relativa de outras valências.
Percebemos que uma necessidade libera energia, aumenta a tensão, comunica
valor e cria força e, em geral, qualquer locomoção pode ser atribuída aos conceitos de
necessidade, tensão, força, valência, barreira, às propriedades do meio, à dimensão da
realidade-irrealidade e à perspectiva do tempo.
A reestruturação dinâmica do meio psicológico pode ser resultado de mudanças
nos sistemas de tensão da pessoa, da locomoção ou dos processos cognitivos. A
reestruturação também pode resultar da interferência de fatores do invólucro externo no
meio psicológico.
O retorno da pessoa à um estado de equilíbrio é o objetivo último de todos os
processos psicológicos e, para que esse objetivo seja alcançado, é preciso que ocorra
uma locomoção adequada no meio psicológico.
Notamos também que Lewin procura matematizar seus conceitos porque
acredita que as representações matemáticas requerem uma formulação precisa, além de
ser possível compor as equações racionais que conectam conceitos diferentes e formular
relações funcionais. Porém, a matemática utilizada por ele é um tipo de matemática para
descrever interconexões e intercomunicações das regiões espaciais, sem nenhuma
referência a grandeza ou forma.
P
25
Maiorias e Minorias Psicológicas
Lewin se utiliza, ainda, dos conceitos de maioria e minoria psicológica,
afirmando que toda minoria psicológica possui, antes de tudo, dimensões sociais, ou
seja, são sociais em sua origem, em suas estruturas e em sua evolução.
Desde o início de seus estudos, procurou distinguir as definições de
minoria/maioria da Demografia e da Psicologia.
Em Demografia, a maioria é composta de cinqüenta por cento mais um dos
indivíduos que compõe a população em que está inserido e, por sua vez, todo grupo
composto por menos de cinqüenta por cento da população é tido como a minoria. Em
Psicologia, a maioria psicológica é aquela que dispõe de estruturas, de um estatuto e de
direitos que lhe permitam autodeterminar-se, independentemente do número ou da
porcentagem de seus constituintes. É classificado como minoria psicológica o grupo
que não possui direitos totais ou um estatuto pleno que lhes permita optar quanto a seu
futuro, tendo seu destino subordinado à boa vontade de um outro grupo, se percebendo,
então, em estado de tutela, também independentemente do número ou porcentagem de
seus constituintes.
Em uma maioria psicológica, as forças existentes no grupo são forças positivas e
de atração, havendo força centrípeta – que atrai o indivíduo para o centro do grupo –
proporcionando, com isso, maior coesão e integração grupal. As forças são positivas
quando as condições presentes no grupo são condizentes com as necessidades de seus
membros e aí, não há o desejo de abandonar o grupo.
Já em uma minoria psicológica as forças são negativas e de repulsão, havendo
força centrífuga – que repele o indivíduo para a periferia ou para as margens do grupo –
comprometendo, com isso, a coesão e integração grupal. Os indivíduos que se mantêm
nesta margem constituem os denominados marginais, que são dotados do que Lewin
chama de Chauvinismo Negativo – o qual consiste em um ódio a si e ao seu grupo. Este
ódio surge justamente quando as condições do grupo não atendem as necessidades dos
seus membros, fazendo com que estes desejem abandonar o grupo. Porém, o grupo
majoritário não os aceitam como membros e, assim, estes marginais são impedidos de
se integrarem ao grupo majoritário, mas não desejam pertencer ao grupo minoritário,
permanecendo na margem deste.
A superação desta situação exige que o grupo se imponha e conserve um
Chauvinismo Positivo, uma lealdade ao grupo, e não espere concessões do grupo
26
majoritário.
Para tanto, pode tornar-se necessária a presença de alguns líderes e, sobre isso,
Lewin afirma que o bom líder é aquele que não guarda – ocultamente em si – nenhuma
forma de chauvinismo negativo e possui plena lealdade e aceitação de seu grupo, isto é,
não busca a liderança apenas para se destacar de seu grupo por não aceitá-lo e para se
aproximar do grupo majoritário.
Campos e Conhecimento
Entre os pressupostos de Lewin, cabe discorrermos ainda a respeito das idéias de
campo perceptual e campo de conhecimento, e a relação entre o conhecer e o que vai
fazer suporte a esse conhecimento, dado pela dinâmica de figura e fundo, tal qual ela é
apresentada na geometria e na física, e pela idéia do insight como a possibilidade de
apreensão de um conhecimento verdadeiro, a partir do momento em que a percepção
coincide com as estruturas, pois essa é a idéia das estruturas biológicas humanas como
similares às estruturas da natureza. A estrutura é a mesma e vai ter um momento em que
elas vão coincidir.
A compreensão de uma situação psicológica concreta requer o conhecimento da
posição da pessoa no meio psicológico. O espaço vital representa o padrão total de
fatores e influências que afetam o comportamento, em dado momento. As forças do
campo precisam ser entendidas e apreendidas no campo e a cognição é o elemento
fundamental para permitir que o indivíduo conheça, use, guarde e depois aja naquela
realidade. E nesse processo de cognição, o indivíduo constrói estruturas explicativas
desta realidade e estas estruturas explicativas vão orientar a sua ação psíquica e,
portanto, a sua interação no grupo. A Cognição descreve os processos psicológicos
implicados na obtenção, no uso, no armazenamento e na modificação do conhecimento
sobre o mundo e as pessoas. Então, conforme o indivíduo tenha possibilidade de obter,
usar, armazenar e modificar conhecimento, ele vai dar uma determinada configuração
ao seu campo psicológico, ao espaço aonde ele vive.
As estruturas cognitivas compreendem as crenças, opiniões, expectativas,
hipóteses, teorias e esquemas que o indivíduo já possui, as indagações que ele tem sobre
eles, as possibilidades de respostas que o indivíduo tem pra estas explicações e os
recursos de organização para construção dessas respostas.
Um indivíduo, ao construir hipóteses, ou elaborar algum tipo de teoria, está
27
utilizando o conhecimento que tem para construir novo conhecimento e, ao faltar
informações e/ou dados, o próprio esquema cognitivo vai fazer com que o indivíduo
busque estas informações que faltam. A cognição é o processo que vai construir o
significado do comportamento que o indivíduo vai emitir, ou seja, depende do
significado que tem o estímulo que o indivíduo vai receber. Assim, trabalhando com um
grupo, é possível entender porque o grupo reage a alguns estímulos vindos de membros
do grupo e não reagem a outros vindos de pessoas externas ao grupo, o que leva Lewin
a afirmar que para mudar o sujeito deve-se mudar o grupo. O que vai determinar esta
significação, é a experiência psíquica de cada indivíduo, aquilo que Lewin vai chamar
de campo, a existência no campo.
Dentro do campo existe algumas condições para que os fenômenos sejam dados,
e Lewin trata disso através de alguns conceitos que vão permitir descrever as
propriedades de um grupo, como o grau de coesão dentro deste. Entender o grau de
coesão significa poder determinar qual é o grau de atração mútua entre os membros do
grupo, entre os sujeitos que apresentam acontecimentos psíquicos no campo vital.
Quanto mais coesos são os fenômenos no campo vital, mais forte é o campo, portanto,
mais forte a estrutura. A estrutura de quase todos os grupos é hierárquica, as posições
são ordenadas quanto ao status e ao poder, das mais elevadas às mais baixas. Sujeitos
com alto grau de coesão intragrupal, em geral, são sujeitos de difícil transformação, são
chamados de sujeitos fortes.
Segundo Lewin, as condições nas quais vão se dar o processo, que dinâmica será
instituída e que tipos de forças estarão em relação, dependem da gênese do grupo.
O que vai garantir, estruturar e organizar a forma de funcionamento e as relações
dentro de um grupo, é como este surgiu e a dinâmica que se dá na relação entre os
participantes para a construção dos seus objetivos. A idéia de dinâmica de grupo de
Lewin está baseada na Gestalt e a idéia de estruturas é de estruturas baseadas na gênese.
Portanto, é necessário estar dentro do grupo para compreender como se deu seu
nascimento e, a partir de como surgiu, os objetivos que vai perseguir e que
comprometem e envolvem os seus participantes. Sem conhecer a gênese do processo,
não há como entender a dinâmica que se estabelece a partir disso. Portanto, a dinâmica é
indissociável da gênese porque são os momentos iniciais de formação do grupo que
determinam como ele vai seguir, qual o seu dever e quais são as suas etapas.
O campo não se restringe àquilo que podemos entender como espaço do grupo.
Para saber qual é o campo do grupo deve-se olhar intragrupo, ou seja, as relações entre
os sujeitos e qual é a construção de cada um dos sujeitos que compõe o grupo, a própria
28
dinâmica do grupo e, então, o grupo para a sociedade e a sociedade para o grupo.
Portanto, o campo está sendo constituído pela pessoa, pelo meio psicológico como ele
existe para o indivíduo e o macrogrupo, que é a sociedade como um todo.
Assim, para compreender a dinâmica de um grupo é necessário entender o
ambiente onde ele se dá. A relação intragrupo são relações sociais de forças no espaço
vital do indivíduo, porque o espaço vital está organizado a partir da cognição e a
cognição é individual. Quantos indivíduos tiverem no grupo, tantas cognições, então
tantos campos psicológicos terão. Esses campos se relacionam e é a partir deles que as
pessoas se comportam. Assim, relações intragrupos são compreendidas pelo
entendimento de como o campo psicológico está organizado pela cognição e a
totalidade disso é o espaço vital do indivíduo, a totalidade dos acontecimentos
psicológicos, incluindo pessoas e ambiente.
Se a cognição em si faz com que o indivíduo entenda e depois concorde, o
comportamento é movimento no espaço e, dependendo do espaço que este tem, a
possibilidade de desenvolvimento está praticamente condicionada.
Já que existem essas complicações entre as relações intragrupos, as estruturas de
cognição e o ambiente, é necessário considerar que o indivíduo e o grupo são um
sistema interdependente.
A idéia do Lewin é contra as abordagens atomísticas, e faz uso de uma
abordagem que permite o entendimento da totalidade fazendo o confronto entre o
perceptível e o ponto determinante e, portanto, é o determinado enquanto figura e o
determinante enquanto fundo. Sendo assim, os métodos atomísticos, para ele, são
improváveis de darem conta desse objeto porque o fenômeno de grupo se torna
inteligível quando se consegue praticar neste fenômeno cortes analíticos sociais
concretos. Quanto menor a área de corte, maior a possibilidade de se entender a
dinâmica porque há o acompanhamento do funcionamento sem destruir o objeto.
Segundo Lewin, para ser válida a exploração científica dos grupos relativa ao
campo da psicologia das relações intergrupais, deve se dar em constante referência à
sociedade global, na qual o fenômeno do grupo se manifesta. Assim, nunca deve-se
trabalhar um grupo como se ele existisse independente da sociedade. E, ao abordar e
interpretar cientificamente os fenômenos da magnitude destes que o grupo envolve e
desta complexidade, deve-se realizar uma aproximação complementar com todas as
ciências sociais.
O que faz a dinâmica do grupo são as relações intergrupais, e estas relações
estão calcadas na comunicação que se estabelece dentro deste. Porém, Lewin afirma que
29
estas comunicações são precárias. Quando a compreensão é comum no grupo, as
pessoas compreendem o que as outras estão falando e, então, a relação é sincera,
imediata, e isso cria a possibilidade do grupo liberar a sua capacidade de criar e agir,
porque ele já não tem mais estas quebras comunicacionais.
A comunicação é o aspecto mais relevante dentro das relações interpessoais em
um grupo. Ele afirma que a produtividade e a eficiência de um grupo estão
estreitamente relacionadas não apenas com a competência de seus membros, mas com a
solidariedade de suas relações interpessoais.
A partir das experiências de Lewin com grupos, Shultz – um psicólogo norte-
americano, professor da Universidade de Harvard – descreve as suas idéias sobre
comportamentos interpessoais. Ele afirma que um membro só aceita fazer parte de um
grupo a partir do momento em que tem “necessidades fundamentais” satisfeitas dentro
desse grupo, caso contrário, ou ele se recusa a participar, ou é eliminado do grupo
(Shultz apud Mailhiot, 1977, p.66).
Considerando grupo como um conjunto de indivíduos que se inter-relacionam
por sua interdependência, considera-se que o mesmo é o terreno onde o indivíduo se
sustenta e satisfaz as suas necessidades, sendo o alicerce sobre o qual ele se mantém e o
apoio que lhe concede ou nega status social, segurança e auxílio. O grupo ao qual o
indivíduo pertence não é somente uma fonte de segurança ou proteção, como também
determina o que o indivíduo considera certo ou errado, seus desejos e seus objetivos.
As necessidades do indivíduo no grupo são interpessoais, pois só são satisfeitas
em e pelo grupo. Podem ser resumidas em três: necessidade de inclusão, de controle e
de afeição. A forma como o indivíduo satisfaz essas necessidades depende do seu
comportamento dentro do grupo; os dependentes quanto à sua inclusão, demonstram ser
mais abdicadores quanto ao controle e hiperpessoais quanto à afeição; os
contradependentes, mais autocratas e hipopessoais; e finalmente os interdependentes,
que são mais democratas e interpessoais.
Segundo Bavelas (apud Mailhiot,1977), a comunicação só existe quando se
estabelece entre duas ou mais pessoas um contato psicológico, sendo que este último só
surge em uma relação autêntica, em que se tem bem definido o que sabe, sente e pensa
um grupo organizado para que se alcance determinado objetivo.
Em diversas pesquisas, compreende-se diversos tipos de comunicação humana,
que variam segundo os instrumentos de contato, pessoas e objetivos.
Segundo os instrumentos, têm-se as comunicações verbais e não-verbais, sendo
que uma não pode sobressair à outra, complementando-se reciprocamente. Quanto às
30
pessoais, ela pode ser a dois, de modo pessoal ou profissional, ou de grupo em relações
intragrupo ou intergrupo.
E finalmente, quanto aos seus objetivos, a comunicação pode ser consumatória,
quando é gratuita e espontânea, ou instrumental, quando a utiliza o sujeito da
comunicação com objetivo de assegurar ganhos e satisfazer interesses.
Uma comunicação autêntica não existirá ou será impedida quando houver
distâncias físicas ou psicológicas. Para que isso não ocorra, deve-se identificar as vias
de acesso à comunicação. São mencionados como vias de acesso, os meios de
comunicação e os canais de comunicação (divididos em formais, espontâneos ou
clandestinos), ambos constituindo uma rede de comunicação. Segundo Bavelas, “quanto
mais forem espontâneas as vias de acesso ao outro e menos formais os canais de
comunicação, mais a comunicação com ele tem possibilidade de tornar-se adequada e
autêntica” (apud Mailhiot,1977, p.75).
Em um grupo, também é importante que se observe a forma de relacionamento,
que pode ser igualitária ou horizontal (em círculo, quando o grupo é democrático, ou em
cadeia, quando o grupo se caracteriza pelo modo “laissez-faire”), ou pode ser
hierarquizada ou vertical (em “y”, quando o grupo é democrático, mas em vias de
tornar-se autocrático, ou em roda, quando o grupo é especificamente autocrático). Neste
aspecto, Bavelas conclui que “quanto mais a autoridade se exerce de modo democrático,
mais o clima de grupo torna-se e se mantém igualitário e, em conseqüência, as
comunicações tornam-se e permanecem mais abertas” (Idem, p.77).
A comunicação possui os seguintes componentes: o emissor; o receptor; a
mensagem, que pode ser ideacional, quando se trata de informação, afetiva, podendo ser
positiva ou negativa, ou vital quando possui conteúdos intelectuais e afetivos; o código,
que pode ser público ou secreto; e o destaque ou camuflagem quanto ao conteúdo
constante na mensagem e o código utilizado.
Em uma comunicação problemática, podem haver bloqueios provisórios (ruídos)
ou permanentes, que interrompem completamente a comunicação, ou também há
filtragens, em que se interrompe parcialmente a comunicação. Os bloqueios e filtragens
perturbam as percepções do sujeito quanto a si mesmo e aos outros, tornando falsas as
atitudes e os comportamentos interpessoais.
As perturbações e distorções provisórias ou temporárias na comunicação podem
provir de seis fontes diferentes: do emissor, como inibições interiores ou tabus
exteriores; do código, quando há diferenças culturais; e quando há percepção seletiva do
receptor, estados de alienação ou sensibilidade exclusiva para a comunicação verbal.
31
Quando se trata de grupos autocráticos, dois modos de perturbação ou distorção são
identificados: a hostilidade autista de quem detém o poder e a transmissão seletiva do
subordinado.
Segundo Mailhiot (1977), as relações interpessoais podem ser acentuadamente
prejudicadas pelos preconceitos, pelas distâncias sociais (em uma relação intergrupal) e
pelas barreiras psicológicas (na relação intragrupal, quando há uma percepção vertical
do outro, onde alguns dos membros de um grupo são vistos de baixo para cima).
Ainda de acordo com Mailhiot (idem), “para chegar ao altruísmo e tornar-se
capaz de abertura em suas comunicações humanas, o ser humano, qualquer que seja seu
grau de socialização, deve liberar-se dessa falsa obsessão de que só aqueles que nos
parecem semelhantes nos são próximos e que para serem fraternais conosco, os outros
devem ser idênticos a nós”. Dessa forma, está dado o primeiro passo no aprendizado da
autenticidade, que é a especificidade desenvolvida para que o grupo alcance o seu
objetivo.
32
3.1.4 Sistema, Grupo e Poder – Ignácio Martin-Baró
Em geral, os autores definem grupo como sendo uma unidade que se dá quando
os indivíduos interagem entre si e compartilham algumas normas e objetivos. Muitos
são os aspectos indicados como relevantes para diferenciar um grupo de outras situações
em que verificamos a presença de várias pessoas em uma mesma atividade.
Neste sentido, Martín-Baró fala em processo grupal e não em grupo ou dinâmica
de grupo. Não se trata apenas de diferença na denominação, mas uma diferença
profunda no fenômeno estudado. Ao falar em processo, os autores remetem ao fato do
próprio grupo ser uma experiência histórica, que se constrói num determinado espaço e
tempo, fruto das relações que vão ocorrendo no cotidiano, ao mesmo tempo, que traz
para a experiência presente vários aspectos gerais da sociedade, expressos nas
contradições que emergem no grupo. O autor define grupo como "uma estrutura de
vínculos e relações entre pessoas que canaliza, em cada circunstância, suas necessidades
individuais e/ou interesses coletivos" (1989, p.206).
Ressalta ainda que um grupo é uma estrutura social, “é uma realidade total, um
conjunto que não pode ser reduzido à soma de seus membros” e que "a totalidade do
grupo supõe alguns vínculos entre os indivíduos, uma relação de interdependência que é
a que estabelece o caráter de estrutura e faz das pessoas membros" (Idem, ibidem).
Assim, segundo o autor, um grupo constitui um canal de necessidades e
interesses em uma situação e circunstância específicas, afirmando, com isso, o caráter
concreto e histórico de cada grupo.
O autor considera seis fatores que são necessários para a caracterização de um
grupo:
1. A percepção dos membros – pois, somente quando os indivíduos se percebem
como relacionados uns com os outros, podem atuar em função dessas relações.
Para que isto ocorra, deve também existir a percepção da totalidade das ações
unitárias;
2. Uma motivação compatível - a condição essencial para existência de um grupo
se encontra na necessidade e motivação das pessoas, que as levam a buscar sua
satisfação através da relação com outras pessoas;
33
3. Possuir um objetivo comum – Diferentemente da motivação, o objetivo comum
será o que irá garantir a unidade grupal, fortalecendo o grupo.
4. Uma organização - a natureza do grupo não está nas partes, e sim no todo; o
elemento unitário não se dá pela característica comum a todos os indivíduos, e
sim, por um ordenamento peculiar e mais ou menos estável dos vínculos entre
eles;
5. Interdependência – a vinculação dos indivíduos entre si faz com que eles se
tornem dependentes um dos outros, e esse fato é o que garante a unidade;
6. Interação entre os membros – é essencial para a existência do grupo, tal qual a
norma, e implica em dizer que a ação de um deve estar necessariamente ligada à
ação do outro.
Apresenta ainda, três parâmetros principais para a análise do processo grupal: a
identidade do grupo, ou seja, a definição do que é e o que o caracteriza como tal frente a
outros grupos; o poder de que dispõe o grupo em suas relações com os demais grupos e
a atividade grupal e mais a significação social do que produz essa atividade grupal
(1989, p. 208), pontuando que não são aspectos grupais independentes.
Um dos fatores para análise do grupo é a identidade, que se define pelo grau e
pelo caráter da formação organizativa do grupo, pela relação com outros grupos e pela
consciência que seus membros têm acerca de seu próprio grupo. Entretanto, a
Identidade demanda a existência de uma totalidade, uma unidade de conjunto, que acaba
por gerar uma peculiaridade que a diferencia dos outros grupos. A identidade do grupo
acaba por transcender e condicionar a identidade individual dos membros.
A identidade se formará tendo em vista os seguintes critérios:
• Forma de organização – é o grau de estruturação interna, a
institucionalização ou normatização do grupo. Ela é a primeira organização a
surgir, pois determina as condições para que os indivíduos pertençam aos
grupos. Essas normas vão traduzir a identidade do grupo;
• Relação com outros grupos – são as relações com outros grupos que
configurarão a identidade, primeiro criando-a e depois a mantendo;
• A consciência de pertencer a um grupo – quando a pessoa pertence à um
grupo ela toma como referência para sua própria identidade a identidade do
grupo e isso requer que ela interiorize o pensamento do grupo.
O poder é a capacidade de obter diferenciais vantajosos em relação a outros
grupos que lhe permitem alcançar seus objetivos, inclusive impondo sua vontade à
34
outros grupos sociais, ainda que não seja de forma coercitiva.
O que garante o poder é a superioridade que os grupos possuem em suas
relações sociais. O grupo que possuir mais recursos (sejam de qualquer natureza), será o
grupo dominante. Um grupo pode ser poderoso por ter a capacidade técnica e cientifica
ou por conhecer a práxis, entretanto, os recursos serão definidos pela sociedade em que
eles vivem.
Para entender um grupo é necessário compreender sua dinâmica de
funcionamento e sua atividade, o que faz, que tarefa desenvolve, quais suas metas.
Já o Conhecimento, é aquilo que entendemos do mundo e de nós mesmos e que
utilizamos psicologicamente para realizarmos as ações necessárias para as nossas vidas,
sendo adquirido através das nossas próprias atividades. Cada grupo tem que ser capaz
de produzir um efeito real da vida social para afirmar sua identidade, e a ação grupal é
importante se obtém a realização daqueles objetivos que correspondem à aspiração
individual de seus membros.
Ainda segundo Martin-Baró (1989), é um erro estudar os grupos considerando
alguns aspectos, tais como: a parcialidade dos paradigmas dominantes, pois deve se
levar em conta não só a parcialidade dos microgrupos, mas todo o contexto em que ele
se insere; o individualismo, pois, não é possível se prender apenas nas relações
interpessoais; e o ahistoricismo, que não leva em conta a história de formação do grupo
e todos os fatores necessários para compreensão do espaço vital, inclusive aspectos
externos.
Desta forma, a atividade grupal tem duas dimensões:
1. Externa, relacionada com a sociedade e/ou outros grupos, quando o
grupo deve ser capaz de produzir um efeito real sobre eles para afirmar
sua identidade, e
2. Interna,vinculada aos membros do próprio grupo, em direção à realização
dos objetivos que levem em consideração as aspirações individuais ou
comuns.
Utilizando as dimensões de Identidade, Poder e Conhecimento é possível
distinguir grupos primários, funcionais e estruturais, que correspondem às relações
sociais do mesmo tipo que articulam o trabalho social das pessoas:
• Grupos Primários – são os primeiros grupos em que o indivíduo se insere,
amigos e família. Os vínculos entre os membros são de caráter
35
interpessoal; o poder caracteriza-se de modo pessoal, assim como a
atividade que busca a satisfação pessoal;
• Grupos funcionais – são aqueles que correspondem à divisão do trabalho
no interior de um determinado sistema social. O poder dos grupos
funcionais depende do valor da importância que seu trabalho tenha em
uma sociedade; a atividade vincula-se à satisfação de necessidades
sistêmicas;
• Grupos estruturais – Correspondem à divisão entre os membros da
sociedade de acordo com os interesses, objetivos derivados da produção.
Portanto, o poder é dado por aquele que controla os meios de produção; a
atividade que busca satisfazer interesses de classe.
Segundo Martin-Baró (1989, p. 310-311), os grupos funcionais surgem da
divisão social do trabalho em cada sociedade, o que implica em uma série de
conseqüências muito importantes:
“ a) Todo grupo funcional responde a las exigencias no de la sociedad en abstracto, sino de cada ordenamiento social concreto donde se produce la división del trabajo; b) Existe una relación orgánica entre los diversos grupos funcionales existentes en cada sociedad, lo cual no significa que no existan entre ellos oposiciones y aun contradicciones parciales, puesto que la existencia de un orden social no significa sin más una total armonía entre los sectores o grupos que componen la sociedad; c) El sentido de la relación entre los diversos grupos funcionales sólo se entiende adecuadamente a la luz del todo concreto que es cada ordenamiento social”.
Além disso, os grupos funcionais se superpõem aos grupos estruturais, o que
significa que um determinado grupo funcional pode estar composto por membros de
diferentes classes sociais. Estes grupos também não abrangem a totalidade dos aspectos
da vida de seus membros, mas, segundo o autor, só abarcam aspectos parciais de suas
vidas.
Quanto aos tipos de grupos funcionais, o autor afirma que a quantidade desses
grupos está ligada às funções criadas pela divisão do trabalho, sendo assim, existe uma
grande variedade de grupos funcionais na sociedade atual. Ressalta ainda dois tipos de
grupos funcionais: os grêmios e as organizações.
Nos grêmios, a atividade de seus membros é simples, no sentido de ser uma única
atividade. É essa atividade que irá definir a identidade do grêmio. Além disso, o poder
do grêmio está ligado à importância social da atividade que ele desenvolve.
Nas organizações, não importa somente o que o grupo faz, mas como faz. Suas
36
atividades são mais complexas e por isso é necessário o auxílio de outros profissionais
para alcançar seus objetivos. As organizações possuem ainda a capacidade de readequar
sua estrutura a fim de alcançar seus objetivos, e dessa forma, podem atender funções
sociais distintas. Assim, o poder de uma organização estará ligado à sua inserção no
contexto social.
Segundo Baró (1989, p. 316), há muitos grupos na vida real que podem ser
qualificados de funcionais, no entanto, para definir um grupo com tal, é importante
considerar três aspectos: sua estruturação interna, a referência intergrupal e a tarefa
própria do grupo.
Quanto à estruturação interna, no grupo funcional, ela deve estar determinada
pelas exigências próprias do sistema social: “(...) falar da estrutura de um grupo
funcional significa aludir à uma ordem, a unidade dos elementos que o compõem,
porém uma unidade surgida em função de uma necessidade social”. (Martin-Baró, 1989,
p. 317).
A estruturação do grupo funcional implica em que a totalidade é maior que as
partes, ou seja, o grupo procura um objetivo que se sobrepõe ao dos membros
separadamente. O papel que o grupo desempenha é melhor à medida que alcance o
objetivo da ordem social:
“El critério estructurador de un grupo funcional consiste, por tanto, en la necesidad planteada por el ordenamiento social donde se produce; los individuos se organizan y se relacionan entre sí con el fin primordial de dar respuesta a una exigencia de la sociedad establecida. La identidad del grupo viene, por tanto, de su intencionalidad objetiva, es decir, de aquel fin en función del cual existe”. (Idem, p. 318).
Cabe ressaltar que a estruturação do grupo funcional não implica em
relacionamentos pessoais estreitos entre seus membros, apesar de poder existir essas
relações. Nos grupos funcionais, as relações tendem a ser mais impessoais,
profissionais.
Em relação à referência intergrupal, no grupo funcional, a capacidade para
desenvolver uma determinada tarefa é mais importante que a identidade pessoal de seus
membros. A identidade do grupo é desenvolvida frente ao que os outros grupos lhe
exigem, lhe atribuem e esperam dele. Além disso:
37
“(...) para los grupos funcionales, los vínculos más importantes no son los que relacionan a los miembros del grupo entre sí, sino los que les relacionan como grupo (o en cuanto miembros de un grupo) con otros grupos (o con miembros de otros grupos en cuanto tales). La funcionalidad del grupo se define hacia los otros y, por consiguiente, su identidad se constituye fundamentalmente frente a los más grupos, aquellos que no cumplen esa función social, pero que la reconocen y aun la requieren y complementan”. (Martin-Baró, 1989, p. 319).
Isso não quer dizer que a personalidade dos membros do grupo funcional seja
sempre ignorada, ao contrário, existem funções que necessitam de características
peculiares.
Na dinâmica intergrupal, um dos processos mais conhecidos é sua unificação e
coesão interna no momento em que se vê ameaçado por outro grupo.
A tarefa do grupo funcional é outra característica importante. Ela se refere ao
que o grupo faz, ou seja, sua tarefa característica. Sendo assim, um grupo é funcional
porque cumpre uma função, satisfaz uma necessidade ou responde a uma exigência da
sociedade. O autor ressalta que, “neste sentido, a funcionalidade de um grupo depende
da importância que para um determinado ordenamento social tenha uma necessidade ou
uma exigência” (Idem, 1989, p. 327).
É a tarefa do grupo funcional frente à sociedade que configura sua importância.
E de acordo com o autor, a importância essencial da tarefa para a identidade do grupo
funcional se confirma pela sua manutenção e desenvolvimento. Isto porque a identidade
do grupo funcional se estabelece fundamentalmente pela tarefa do grupo, mas a
definição da tarefa se realiza de acordo com as exigências e expectativas dos outros
grupos sobre ele.
Ao falar de identidade dos grupos funcionais é necessário considerar o poder
desse grupo, pois, segundo o autor, “o poder de um grupo depende de sua identidade,
mas, por sua vez, sua identidade é em parte definida por seu poder”. (Ibidem, p. 338).
38
3. 2 – FUNDAMENTAÇÃO METODOLÓGICA
Com base nos pressupostos da Teoria Psicológica Sócio-Histórica e na
abordagem metodológica do materialismo Histórico Dialético, conduzimos as
atividades de conhecimento, análise e intervenção em Psicologia Organizacional e do
Trabalho junto ao Núcleo Hospital Universitário (NHU), considerando a constituição
material dos fenômenos subjetivos, a necessidade de se remontar à historicidade da
realidade para compreendê-la em sua essência e a existência das contradições que
permeiam as relações humanas.
Nos orientamos, ainda, pelos constructos de Vigotsky e Leontiev sobre a
atividade do homem, enquanto fator de mudança e constituição da consciência humana,
através da interiorização e representação que o homem faz de sua própria atividade
concreta.
Assim, a partir deste prisma teórico, realizamos as reuniões com os diversos
grupos da Seção de Nutrição do NHU.
Utilizamos também a pesquisa-ação que, segundo Thiollent (1986, p. 14), pode
ser definida como “um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo”.
O objetivo da pesquisa-ação consiste em resolver ou, pelo menos, em esclarecer
os problemas da situação observada. Dessa maneira o pesquisador desempenha um
papel ativo na realidade dos fatos observados: no equacionamento dos problemas
encontrados e no acompanhamento e na avaliação das ações desencadeadas em função
desses problemas.
Alguns dos principais pontos a serem considerados em relação à pesquisa-ação é
que:
- há uma ampla interação entre pesquisadores e pesquisados;
- desta interação elegem-se prioridades dos problemas a serem resolvidos e as
soluções a serem encaminhadas;
- o objeto da investigação é a situação social e os problemas encontrados nesta, e
não as pessoas que constituem a situação;
39
- durante todo o processo são acompanhadas as ações e decisões tomadas pelas
pessoas envolvidas;
- a pesquisa não se limita a uma forma de ação, mas pretende aumentar o
conhecimento dos pesquisadores e do(s) grupo(s) pesquisado(s).
A pesquisa-ação foi realizada na Seção de Nutrição do Núcleo do Hospital
Universitário, na qual existe hierarquia e grupos cujos relacionamentos foram o foco de
nossas intervenções. Coube aos acadêmicos buscarem a mediação entre os vários
grupos.
A metodologia da pesquisa-ação tem sua especificidade no relacionamento de
dois tipos de objetivos:
a) Objetivo prático: contribuir para o melhor equacionamento do problema
central, com levantamento de soluções e proposta de ações correspondentes às soluções
para auxiliar as pessoas envolvidas na situação pesquisada.
b) Objetivo de conhecimento: obter informações que seriam de difícil acesso por
outros procedimentos, aumentar nosso conhecimento de determinadas situações.
Os estagiários responsáveis trabalharam junto aos subgrupos e estiveram
submetidos a supervisão da professora responsável, em reuniões semanais.
Como o trabalho no Núcleo Hospital Universitário teve por base a Teoria
Psicológica Sócio-histórica e a Teoria da Atividade de A. N, Leontiev, seus
pressupostos orientaram o trabalho devido à sua metodologia, a Materialista Histórica
Dialética. Esta descreve uma visão de homem que participa de seu próprio agir no
mundo, modificando-o para garantir a sua produção e reprodução, conseqüentemente,
sendo mudado por sua atividade.
Nossa intervenção teve por objetivo a mudança nas atividades subjetivas dos
sujeitos, pois ela é a via de acesso à alteração na dinâmica objetiva que medeia as
consciências dos mesmos. Mas qualquer alteração na dinâmica implica em
reestruturação da mesma, o que refaz o processo de forma diferente.
Consideramos os problemas já detectados pela direção da Seção, mas buscando
identificar os problemas que levaram às dificuldades encontradas pela direção.
Posteriormente, interferimos na realidade grupal segundo os indicativos das
relações que ocasionaram as queixas, sempre tendo em vista que nossa presença se
constituía em um outro mediador na relação estabelecida, ou seja, a presença já causava
uma primeira alteração. Dessa maneira os acadêmicos desempenharam um papel ativo
na realidade dos fatos observados, no equacionamento dos problemas encontrados, no
acompanhamento e na avaliação das ações desencadeadas em função desses problemas.
40
Com base nos dados levantados - através das reuniões em grupo e de observação
de campo - foram feitos os confrontos entre os diversos dados coletados buscando as
relações e a totalidade do fenômeno estudado, a fim de, a partir disso e das pesquisas
bibliográficas, elaborarmos sínteses e propostas de modificação da realidade estudada.
Tendo em vista tal intuito, foram feitas as análises psicológicas das informações
colhidas, a partir das quais foram criadas as representações gráficas apoiadas nos
conceitos de Baró sobre Identidade, Conhecimento e Poder, a fim de facilitar a
exposição para os funcionários na reunião de devolutiva.
A devolutiva foi realizada no 03/06/2006, contou com a participação de todos os
acadêmicos envolvidos e cerca de vinte funcionários da Seção de Nutrição do NHU.
Foram apresentadas as análises psicológicas com suas respectivas representações
gráficas efetuadas por cada grupo de acadêmicos responsável por cada setor e , ao final,
houve um debate acerca dos resultados apresentados.
Cabe relembrar que as análises foram confeccionadas com base nos construtos
da Teoria de Campo de Kurt Lewin, na Teoria da Atividade de Leontiev, nos
pressupostos da Psicologia Sócio-Histórica e nos estudos de Martin-Baró sobre grupos,
buscando uma interlocução e uma relação dialógica e complementar entre tais autores.
41
4 - Apreciação sobre o desenrolar das atividades e dos desafios enfrentados
4.1 ANÁLISE DO GRUPO DE NUTRICIONISTAS2
As nutricionistas da Seção de Nutrição do NHU/UFMS exercem uma
função de controle do trabalho e do capital por estarem ligadas à administração do
seção. Há uma confrontação entre o grupo das nutricionistas e o grupo dos cozinheiros e
entre o grupo das nutricionistas e o grupo dos copeiros, em que tanto o poder de
controle quanto a obediência, são devidos às funções de ambos.
O controle exercido pelas nutricionistas da Unidade de Alimentação e Nutrição
(UAN) pode ser percebido através das funções de planejamento das escalas de serviço
da seção da produção de refeição e administrativo; planejamento das escalas de plantão;
controle da higiene e qualidade dos alimentos; elaboração de documentos referente à
manutenção e reparo de equipamentos; bem como estabelecer a necessidade de
aquisição de novos utensílios e equipamentos; estabelecimento de regras de
racionalização dos processos de produção das refeições; adaptação racional da área
físico-funcional; participação dos processos de seleção de novos funcionários;
estabelecimento de normas e rotinas específicas das seções de produção e refeição;
formulação de impressos da UAN; participação dos processos de humanização da UAN;
orientação dos copeiros sobre as prescrições dietéticas, formulação dos cardápios de
alimentação, orientação de dietas para os pacientes, convocação dos funcionários para
as reuniões; supervisão dos serviços de higienização das seções; solicitação dos serviços
de dedetização das seções da UAN.
Estas são, de forma geral, as atividades desempenhadas pelas nutricionistas da
Seção de Nutrição do NHU/UFMS.
Trata-se de um grupo institucionalizado, criado e mantido por uma instituição
pública, no qual o trabalho é hierarquizado de acordo com a organização da instituição
e, devido à forma de ordenamento da produção, devemos ter claro que as determinações
sociais e todas estas condições dadas pela hierarquia institucional e pela divisão do
trabalho, no presente caso, partem das relações entre o Ministério da Educação e o da
2 Elaborada por Elódia Herminia Maldonado, Fernando Ulisses Rosalino, Luis Henrique Moura e Priscilla
S. Teruya
42
Saúde com o HU como um todo, e continua nas relações entre o HU e o Seção de
Nutrição, sendo dessa forma que tais influências chegam até os grupos que compõem
esta Seção de Nutrição, regulando as relações entre estes grupos e participando da
formação dos aspectos psicológicos aí presentes. Nota-se uma dificuldade por parte do
grupo das nutricionistas em comandar tanto os funcionários, que não respeitam a
hierarquia funcional, quanto as próprias nutricionistas, que desautorizam-se umas às
outras.
Pode ser percebido, também, que as nutricionistas pensam a instituição como um
mecanismo e as divisões funcionais da seção de nutrição como engrenagens que
garantem o correto funcionamento do todo, refletindo uma perspectiva funcionalista,
que enfatiza a harmonia e o equilíbrio em todo o ordenamento social e, desta forma,
qualquer problema em alguma parte desta engrenagem é tida como disfuncional, como
um ajuste que deve ser superado e eliminado.
Por estarmos estudando grupos de trabalhadores, foi necessário nos
fundamentarmos teórico-metodologicamente, também, na Teoria de Campo de Kurt
Lewin, um teórico da dinâmica e da gênese de grupos. Considerando o grupo o conjunto
das nutricionistas da Seção de Nutrição do NHU/UFMS.
A Teoria de Campo de Kurt Lewin é um conjunto de conceitos por meio dos
quais se pode representar a realidade psicológica. Não é um novo sistema de psicologia,
mas um enfoque no qual o comportamento é visto como algo que ocorre em campo ou
em um sistema organizado. Não é possível compreender o comportamento sem se
considerar os fatores externos e internos à pessoa, pois estes interagem na determinação
deste comportamento.
Para que possamos analisar o grupo em questão, é necessário lembrarmos que se
trata de um grupo institucionalizado que obedece à uma hierarquia regida por uma
legislação que regulamenta e fiscaliza todo o funcionamento dos Hospitais
Universitários Federais. Segundo Lewin, os grupos só podem ser estudados na
perspectiva que é entendida a sociedade do qual são partes. Portanto, a instituição é
social e cumpre aquilo que a sociedade determina, configurando este grupo como uma
das alternativas apresentadas capazes de cumprir a tarefa social de garantir a nutrição
das pessoas internadas no hospital.
O grupo das nutricionistas é tido como a maioria psicológica. Na Seção de
Nutrição, representam o grupo dominante que possui estruturas e direitos instituídos que
lhe permitam autodeterminar-se, não estando subordinados a nenhum outro grupo. É
coeso na medida em que é a maioria psicológica e, entretanto, não é um grupo
43
totalmente integrado porque, de acordo com o que foi relatado pelas nutricionistas,
apresentam dificuldades, como brigas e desautorizações freqüentes.
Para as nutricionistas que compõem o grupo, forma-se um campo psicológico,
que é o espaço de vida considerado dinamicamente, no qual a totalidade dos fatos
coexistentes são mutuamente interdependentes. O campo no qual o comportamento
ocorre é dividido em pessoa e meio, sendo este último diferenciado em partes
psicológicas e não-psicológicas. As forças que atuam no campo precisam ser entendidas
e apreendidas, e a cognição é o elemento fundamental que permitirá ao indivíduo
conhecer e agir na realidade, pois a cognição descreve os processos psicológicos
implicados na obtenção, no uso, no armazenamento e na modificação de conhecimento
sobre o mundo e sobre as pessoas. Neste processo de cognição, o indivíduo constrói
estruturas explicativas da realidade, e tais estruturas orientarão a sua ação psíquica e,
portanto, a sua interação com o grupo. Ao falarmos em estruturas cognitivas estamos
nos referindo às crenças, às opiniões, às expectativas, às hipóteses, às teorias e aos
esquemas que o indivíduo já possui, bem como às indagações e aos recursos de
organização para construção destas respostas. A cognição é o processo que vai construir
o significado do comportamento que será emitido pelo indivíduo.
O campo psicológico deve ser entendido como uma realidade fenomênica que
atrai a percepção e confere-lhe significados, englobando também características de
personalidade das nutricionistas e os componentes emocionais ligados ao grupo e, deste
modo, consideraremos o campo psicológico do grupo das nutricionistas sendo a Seção
de Nutrição do Hospital Universitário.
As relações ocorridas dentro do grupo de nutricionistas devem ser consideradas
como um campo social de forças no espaço vital de cada uma delas. Para Lewin, campo
social é uma totalidade dinâmica, caracterizado pelas posições relativas ocupadas pelos
elementos que o constituem. A partir deste conceito, Lewin diz que o grupo constitui o
terreno sobre qual o indivíduo se mantém; que o indivíduo utiliza o grupo como um
instrumento para satisfazer suas necessidades psíquicas e sociais; que a dinâmica de
grupo possui um impacto social sobre seus membros constituintes; e que o grupo é um
dos elementos ou dos determinantes do espaço vital do indivíduo.
O espaço vital é o todo da realidade psicológica, o qual contém a totalidade dos
fatos possíveis capazes de determinar o comportamento do indivíduo, ou seja, o espaço
vital representa o padrão total de fatores e influências que afetam o comportamento, em
dado momento. O espaço vital é representado pela situação mais imediata, que
determina o comportamento. Assim, por espaço vital será aqui tratado o Hospital
44
Universitário, como um todo, devido à necessidade de delimitação metodológica do
objeto de estudo e por compreender o conjunto dos fatores mais imediatos que
determinam o comportamento dos membros do grupo.
Dentro do grupo, cada indivíduo possui seu próprio campo, que sofrerá
determinada organização, dependendo da forma como os outros elementos envolvidos
na dinâmica vão estar distribuídos neste campo.
O campo é composto pela pessoa e o meio psicológico tal como ele existe para o
indivíduo, não existindo campo psicológico que possa ser idêntico, mesmo que os
indivíduos estejam fisicamente inseridos no mesmo campo, pois dependerá da
experiência individual, ou seja, dependerá da forma como o indivíduo experimentará o
campo.
O que vai garantir, estruturar e organizar a forma de funcionamento e as relações
dentro do grupo é baseado na forma como eles surgiram e a dinâmica que se dá na
relação entre os participantes para construção dos objetivos deste grupo, cuja gênese
atrela-se justamente à origem da instituição hospitalar na qual se insere e às
determinações normativas.
O campo não se restringe aquilo que possamos entender como espaço do grupo.
O campo será constituído pela pessoa, pelo meio psicológico como ele existe para o
indivíduo e pela sociedade.
A relação intragrupo é a relação social de forças no espaço vital do indivíduo,
organizada a partir da cognição. Os campos é que se relacionam e é a partir deles que as
pessoas se comportam. Portanto, as relações intragrupos são entendidas através da
compreensão de como o campo psicológico está organizado pela cognição, e a
totalidade disso é o que se tornará o espaço vital do indivíduo, a totalidade dos
acontecimentos psicológicos incluindo pessoas e ambiente.
Cada membro integrante do grupo das nutricionistas se percebe como detentor
de certo poder - seja para determinadas decisões técnico-administrativas, seja para
reivindicações junto à direção geral do Hospital – e se reconhece enquanto possuidor de
um status quo dentro da hierarquia sistêmica e orgânica na qual se insere e, ainda, se
identifica com tal estrutura institucional e com suas atividades de comando, de controle,
de fiscalização e com o poder burocrático que sua função lhe confere.
Além disso, há valorização de sua posição – em detrimento das demais – e a
convicção de possuir o saber, o conhecimento científico, o acesso às informações
especializadas, o que também gera a percepção de uma situação privilegiada em relação
aos demais funcionários da seção. Isso pode ser facilmente constatado quando as
45
nutricionistas, em seus discursos, se referem à seus subalternos como “os funcionários”,
não se vendo elas próprias como funcionárias também, mas como dirigentes
diferenciados daqueles que executam.
Tais formas de percepção determinam o modo de interpretação da realidade e,
assim, os demais trabalhos desenvolvidos na seção passam a ser subjugados e, de certa
forma, desvalorizados, conforme constatamos nas diversas queixas do grupo dos
cozinheiros.
Com isso, tem-se aí, de modo flagrante, um problema de comunicação inter-
grupal, relatado pela maioria dos funcionários, das diferentes divisões, inclusive pelas
próprias nutricionistas. Este problema de comunicação – próprio das estruturas
rigidamente hierarquizadas e formais, como relata Lewin – caracteriza-se tanto por
filtragens, quanto por ruídos e bloqueios, o que irá determinar a série de problemas nas
relações inter-grupais presente naquele ambiente e relatado tautologicamente pela
maioria dos integrantes.
A filtragem pode ser evidenciada, por exemplo, quando na discussão entre uma
copeira e uma nutricionista, aquela justificou sua conduta – recriminada pela última –
dizendo que outra nutricionista a mandou fazer daquele jeito, sem explicitar porque o
mandou. Cabe frisar que a filtragem aí pode ter ocorrido a partir da copeira ou a partir
da nutricionista que deu a ordem.
O ruído pode ser constatado quando as nutricionistas relatam que “os
funcionários têm pensamento limitado”, ou seja, não entendem perfeitamente as ordens
e não as cumprem completamente.
Os bloqueios, talvez os mais recorrentes entre as falhas de comunicação ali
estabelecidas, são mais facilmente verificados. Podemos reconhecê-los nas falas dos
cozinheiros, quando estes dizem que não falam a mesma língua que as nutricionistas,
que estas não as ouvem e não acatam suas opiniões, quando dizem que gostariam de
reuniões coletivas, de poderem reivindicar mais e de uma maior aproximação inter-
grupal.
Quanto mais verticalizadas, formais e burocráticas as vias de acesso entre os
diferentes grupos, maiores são as probabilidades de falhas na comunicação. No entanto,
devemos lembrar que esta condição estrutural rígida e piramidal está dada na própria
gênese da instituição e em suas normatizações e objetivos, os quais sofreram alterações
nos últimos anos, aumentado sua demanda, seu orçamento e suas funções, ao
transformar-se de clínica-escola para Hospital Público do SUS (Sistema Único de
Saúde) e, assim, o campo psicológico aqui tratado não pode ser entendido sem relação
46
com a totalidade global e sem a dinâmica política que lhe permeia.
O problema de comunicação, conforme explica Lewin, pode levar ao fenômeno
do Preconceito. Assim, as nutricionistas podem sustentar idéias sobre os outros grupos
que são pré-concebidas, sem um maior contato com a realidade deles para um
discernimento e um julgamento mais fundamentado sobre os mesmos. Tais idéias,
crenças ou opiniões tendem, como já apontamos, a subjugar e desvalorizar os demais
grupos, não acatando suas reivindicações.
A forma como as nutricionistas se percebem e a sustentação genética
institucional de suas condições – que são os elementos para a própria psicogênese do
grupo em questão – garantem a coesão deste grupo, bem como uma força centrípeta ao
mesmo, ou seja, uma distribuição de forças de atração para o interior do grupo e,
consequentemente, a repulsão de quaisquer tentativas de invasão ou de superação das
fronteiras por forças externas. Daí manterem o distanciamento, a inacessibilidade, a
formalidade, a rigidez das relações inter-grupais, a centralização das decisões, etc.
Tudo isso reforça cada vez mais uma forma de liderança autocrata, porém,
segundo Lewin, as estruturas horizontais de grupo e a liderança democrata é o que
garantem a autonomia e a criatividade necessárias. Além disso, o conjunto de todos os
grupos da Sessão de Nutrição caracteriza um sócio-grupo, voltado a um objetivo básico
(a produção de alimentos) que está acima das individualidades. Todos estes fatores
levantam certas dificuldades para se chegar às formas mais funcionais de grupo
descritas por Lewin.
Embora tenhamos tratado das relações inter-grupais, a dinâmica inter-grupal na
divisão das nutricionistas também apresenta implicações relevantes. A própria valência
entre os membros do grupo, como é de se supor, não é uniforme e equânime. Muito
provavelmente, a nutricionista R. apresenta uma valência mais positiva, tanto em
relação aos demais membros de seu grupo quanto para os externos ao mesmo, pelo fato
de já possuir 15 anos de trabalho naquele ambiente e por já ter passado por várias
funções, angariando um conhecimento mais completo, privilegiado e respeitado. Foi
chefe de seção por cinco anos, trabalhou na pediatria por quatro anos, também na clínica
cirúrgica e, atualmente, trabalha no ambulatório com crianças desnutridas.
Já a nutricionista J., por exemplo, é de se supor que apresente, relativamente,
uma valência mais negativa, por ser nova (27 anos de idade) e por estar apenas há um
ano naquele trabalho. O grupo dos cozinheiros relatou que os funcionários eram mais
unidos antigamente e que, com a entrada de novas nutricionistas, isso mudou. Não é
possível determinar os fatores e causas específicas de tal mudança e a correlação com os
47
novos integrantes, nem a alteração precisa das forças do campo vital que se seguiram.
Por ora, apenas visamos apontar a valência negativa que é observada neste fato.
Também em relação à nutricionista M. pode-se apontar a predominância de uma
valência negativa, haja visto que fora destituída do cargo de chefe por meio de abaixo-
assinado.
A nutricionista S., ainda, nos fornece alguns indicadores de sua valência
negativa quando relata que, enquanto chefe, brigava muito com os funcionários e que
hoje nem estes e nem mesmo as nutricionistas confiam muito nela.
Retomando os problemas de comunicação, estes também são verificados nos
processos intra-grupais, em especial quando o grupo das nutricionistas relatam que elas
desautorizam-se umas às outras, frente aos demais funcionários.
Admitimos que a alienação - própria da divisão do trabalho – é reforçada ainda
mais pelos problemas de comunicação existentes, o que nos leva à necessidade de uma
construção conjunta de caminhos ou canais pelos quais a comunicação possa ter um
fluxo mais livre e, consequentemente, haver significativas mudanças na qualidade das
relações inter e intra-grupais.
Além dos processos descritos acima – que se dão pela interação dinâmica entre
várias características psicológicas individuais e grupais –, podemos mencionar algumas
características mais, que também entram nesta dinâmica e constituem os processos
psicológicos, juntamente com a percepção do status quo, o preconceito, o chauvinismo
positivo ou a coesão do grupo.
A forma de produção determina uma estrutura cognitiva específica, necessária
para cada trabalho específico e, conforme registramos pelas entrevistas e observações,
as nutricionistas basicamente devem conferir, registrar, fazer requisições, inspecionar,
preencher formulários, efetuar operações matemáticas para contabilizar, controlar e
prever estatisticamente a demanda de material, entre outras atividades.
Pode-se presumir, com isso, uma estrutura cognitiva pautada na lógica-
matemática e uma atividade de abstração muito grande que envolve o planejamento e a
previsão, calcada no método de dedução e indução (própria da estatística, que vai da
parte para o todo, da amostragem para o universo total) e um comportamento
necessariamente pragmático-funcional, uma forma iminentemente mecanicista de ver o
mundo (como exemplo, podemos mencionar uma nutricionista que se referiu várias
vezes à Instituição como sendo uma engrenagem), bem como idéias e hipóteses
ancoradas na abordagem sistêmica e, devido à própria formação/especialização das
nutricionistas, é de se supor uma visão biologizante e orgânica de toda a realidade.
48
As exigências de mensuração, controle e previsão determinam,
preponderantemente, atividades de abstração e comportamentos mais introspectivos e
reflexivos, em detrimento das atividades motoras.
Estas características e os processos que elas constituem são, em geral,
valorizados socialmente e, por conseguinte, reforçam a percepção das nutricionistas de
que são superiores, mais dotadas intelectualmente e potencialmente, e logo, que só elas
podem saber o que é melhor. Daí a liderança autocrática, a impossibilidade de acatar
sugestões, críticas e reivindicações, e a insatisfação dos demais funcionários.
Conforme assinalamos, as inter-relações estão caracterizadas pelas falhas de
comunicação, pela rígida estrutura hierárquica que separam os grupos e, logo, pelo
desnivelamento das relações intergrupais, pela divisão do trabalho e a conseqüente
especialização e alienação inerentes e, enfim, pela liderança autocrática.
No que tange mais especificamente às relações intra-grupais, como mencionadas
anteriormente, são caracterizadas por valências desiguais, embora permaneça a força de
coesão no grupo. Também aqui se observa falhas de comunicação gritantes.
Além destas variáveis – assim definidas não pelas suas mutabilidades internas,
mas por serem específicas e próprias deste grupo – podemos mencionar também uma
constante, que é observada tanto fora da instituição quanto internamente, qual seja: o
individualismo.
É evidente que as especificidades do contexto de trabalho não eliminam,
necessariamente, as determinações sociais mais amplas, pelo contrário, no caso, as
reforçam. Desse modo, o individualismo – próprio da sociedade capitalista e de sua
ideologia – permeia as relações intergrupais também na presente análise.
O modo de produção do objetivo final e as formas de relação descritas aqui, bem
como a história e a gênese do próprio grupo, determinam os processos psicológicos
descritos anteriormente.
Com base em tudo o que vimos até aqui, podemos dizer, sinteticamente, que a
estrutura hierárquica, a liderança autocrática e o grupo das nutricionistas constituindo a
maioria psicológica, os problemas de comunicação, o modo de gênese institucional
engendrado e demais aspectos – como a escassez de recursos financeiros -, irão implicar
aos trabalhadores, inevitavelmente, problemas de relações inter e intra-grupo para a
satisfação das suas necessidades.
A Instituição, com isso, consegue manter sua normatização e sua histórica
49
estrutura, porém, vê-se menos funcional e mais enrijecida.
Lewin postula que o respeito mútuo só pode ser alcançado através da
interdependência de destinos, entretanto, esta não é percebida enquanto recíproca e
simétrica pelos integrantes dos diferentes grupos da Seção de Nutrição.
Devido às limitações teóricas de Kurt Lewin nos reportamos à Teoria Sócio-
Histórica a fim de considerarmos outros aspectos como as implicações do trabalho na
subjetividade humana.
A atividade concreta e mediada do sujeito é interiorizada pelo mesmo, tornando-
se conteúdo e processo psíquico da consciência, determinando, dessa forma, sua
interpretação da realidade, seus conhecimentos, suas escolhas, seus processos de
percepção e de atenção seletiva.
Assim, os valores culturais, a ideologia, as crenças e expectativas do grupo em
que se insere o sujeito, todos estão mediando as atividades deste e é dessa forma que
aqueles participam de sua constituição psíquica.
As especificidades do trabalho desenvolvido na Seção de Nutrição tornam
necessários alguns processos psicológicos específicos e estes, por sua vez, irão permear
as relações intra e inter-psíquicas de cada membro daquele grupo de trabalho.
Os aspectos perceptivos mencionados anteriormente acerca da visão mecanicista
e sistêmica dos trabalhadores analisados, bem como seus embasamentos lógico-
matemáticos e, também, o prisma biologizante pelo qual as nutricionistas interpretam a
realidade, além da própria percepção do status quo que elas possuem do próprio grupo
em relação aos demais dentro da Instituição, todos são constituídos e transformados nas
inter-relações de trabalho.
Reportaremos-nos agora aos escritos de Martin-Baró para contemplarmos os
elementos básicos que norteiam as relações dos grupos não abordados pelas teorias
anteriores. Assim, para realizarmos a análise psicológica do grupo das nutricionistas da
Seção de Nutrição do N.H.U./UFMS, utilizaremos também os estudos realizados por
Martin Baró (1989) a respeito da dinâmica grupal.
Segundo Baró (1989), a Psicologia Social considera seis fatores que são
necessários para caracterização de um grupo:
• A percepção dos membros – pois, somente quando os indivíduos se percebem
como relacionados uns com os outros, podem atuar em função dessas relações.
Bem como a percepção da totalidade das ações unitárias;
50
• Uma motivação compatível - a condição essencial para existência de um grupo
se encontra na necessidade e motivação das pessoas, que as levam a buscar sua
satisfação através da relação com outras pessoas;
• Possuir um objetivo – não se trata do fato de que todos os indivíduos se unam
pela mesma motivação, mas sim que as motivações sejam satisfeitas pelo grupo,
mesmo que distintas;
• Uma organização - a natureza do grupo não está nas partes e sim no todo, com o
elemento unitário não se dando pela característica comum a todos os indivíduos,
e sim por um ordenamento peculiar e mais ou menos estável dos vínculos entre
eles;
• Interdependência – a vinculação dos indivíduos entre si faz com que eles se
tornem dependentes uns dos outros, e esse fato é o que garante a unidade;
• Interação – a ação de um indivíduo deve estar necessariamente ligada a ação do
outro.
Ainda que os funcionários da Seção de Nutrição do NHU se caracterizem como
um grupo, vimos que existem alguns fatores que dificultam o relacionamento dos
indivíduos, portanto, a presente análise tratará principalmente dessas dificuldades.
Partimos do fato que estamos lidando com um grupo institucionalizado, isto é,
criado e mantido por uma instituição pública, no qual todos os grupos existentes na
Seção de Nutrição do N.H.U./UFMS e suas respectivas atividades deverão ser
entendidas como resultantes dos acontecimentos que ocorreram ao longo da história do
N.H.U. e da sociedade em geral, ou seja, desde sua criação à sua inserção na sociedade,
influenciados pelas condições econômicas, das idéias principais e institucionais.
Deste modo, segundo Baró (1989), não é possível estudar os grupos sem
considerar alguns aspectos, tais como:
• a parcialidade dos paradigmas dominantes - não só a parcialidade dos
microgrupos, mas sim todo o contexto, ou seja, não analisaremos
exclusivamente o grupo das nutricionistas;
• o individualismo - não é possível se prender apenas às relações interpessoais,
deste modo não trataremos de indivíduos isoladamente;
• e o historicismo – é necessário considerar a história de formação do grupo e
todos os fatores necessários para compreensão do espaço vital, inclusive
aspectos externos.
51
O Hospital Universitário é uma organização estruturalmente formalizada para
atingir determinados objetivos. Dessa maneira, o grupo das nutricionistas, bem como
todos os grupos da Seção de Nutrição, pode ser caracterizado como um grupo funcional
especializado, mobilizado e coordenado que tem um objetivo comum: a produção de
alimento para o hospital. Isso porque, para Baró os grupos funcionais são aqueles que
correspondem às divisões do trabalho no interior de um determinado sistema social.
Sendo assim, podemos dizer que o grupo das nutricionistas recebe o poder de
administração devido às suas funções de controle do trabalho, que estão ligadas e
subordinadas à administração geral do N.H.U., impondo certos tipos de funções de
chefia.
Para compreendermos os processos psicológicos de um grupo, devemos partir do
reconhecimento de que existe uma série de determinações sociais, muito amplas e
profundas, sobre todo e qualquer indivíduo ou grupo. Estas determinações sociais
implicam na forma como as instituições devem se organizar e em como o trabalho deve
ser realizado nestas instituições. Dentro deste modo de organização institucional,
determinado socialmente, está o que é chamado de Divisão do Trabalho, que consiste
em separar por etapas e por grupos as tarefas que devem ser executadas.
Tais modos de organizações sociais, como a estrutura hierárquica e a divisão do
trabalho, impõem certas condições para cada grupo: cada grupo terá suas possibilidades
e seus limites estabelecidos pelo próprio trabalho que executa, pela própria função que
desempenha no processo geral.
Dessa forma, os problemas e conflitos que surgem neste processo não são
conflitos pessoais, individuais, mas surgem do próprio trabalho que é executado e da
forma como ele é executado, ou seja, das próprias condições, possibilidades e limites
que o ordenamento hierárquico e a divisão do trabalho impõem a cada grupo. Tanto que
se trocássemos todos os indivíduos, as dificuldades não desapareceriam.
Assim, devemos ter claro que as influências sociais e todas estas condições
dadas pela hierarquia institucional e pela divisão do trabalho, no presente caso, partem
das relações entre o Ministério da Educação e o da Saúde com o HU, como um todo, e
continua nas relações entre o HU e o Seção de Nutrição, sendo dessa forma que tais
influências chegam até os grupos que compõem esta Seção de Nutrição, regulando as
relações entre estes grupos e participando da formação dos aspectos psicológicos aí
presentes.
Para uma melhor compreensão sobre a dinâmica destes grupos considerados,
52
elegemos três aspectos psicológicos de grupos para a análise: Conhecimento, Identidade
e Poder. Tais aspectos são processos psicológicos entendidos como base das relações
humanas existentes em qualquer grupo e que nos ajudam a compreender melhor a forma
como se dão estas relações.
Estes processos não significam algo constante, imutável, pelo contrário, todos os
elementos considerados são dinâmicos e estão relacionados entre si, não podendo ser
considerados como elementos isolados, pois estão presentes, ainda que de modo
implícito, nas relações de trabalho de um grupo, determinando e constituindo a forma de
entendimento das pessoas e a forma destas perceberem a si e ao mundo.
Os conflitos constatados possuem implicações psicológicas muito relevantes,
pois determinam as formas de percepção de cada grupo, ou seja, o modo como estes
grupos vêem a si e aos outros. Assim, tais conflitos determinam, em cada grupo, um
modo de percepção que perpassa pela questão da desvalorização do trabalho dos demais
grupos e até do próprio trabalho, bem como pela questão do desrespeito às diferenças
inerentes a cada grupo e ao trabalho desenvolvido por cada um destes dentro da
instituição.
Há um conflito entre o trabalho intelectual desempenhado pelo grupo de
nutricionistas e o trabalho manual desempenhado pelo grupo dos cozinheiros e pelo
grupo dos copeiros, refletindo a organização estrutural da sociedade. Socialmente, é
mais valorizado o trabalho intelectual em detrimento do trabalho manual, o
conhecimento teórico ao conhecimento prático. Contudo, se questionássemos os
pacientes internados e seus acompanhantes a respeito da maior valorização do trabalho
de uma nutricionista ou de um cozinheiro, possivelmente, a resposta seria a de que o
trabalho do cozinheiro é mais valorizado, pois são eles que, efetivamente, elaboram o
produto final, o alimento, ou ainda, o dos copeiros que trazem as prescrições médicas
das dietas e levam a comida até os pacientes.
Queremos dizer com isso que o poder dos grupos funcionais depende do valor
que seu trabalho tenha em uma sociedade e a satisfação de suas necessidades sistêmicas.
A organização da vida na sociedade capitalista está pautada na divisão entre o
conhecimento intelectual e o conhecimento prático. O trabalho intelectual é mais
valorizado que o trabalho manual, em nossa sociedade, porque é ele que vai organizar e
elaborar os conhecimentos mais especificamente. Essa divisão que é feita pela nossa
sociedade, é uma divisão operacional. E é reproduzida na seção na forma de conflitos
entre o grupo das nutricionistas e o grupo dos cozinheiros e entre o grupo das
nutricionistas e o grupo dos copeiros, na forma de valorização social do trabalho. Há
53
uma maior valorização social atribuída pelo grupo das nutricionistas ao próprio trabalho
desenvolvido pelo grupo em relação ao trabalho do grupo dos cozinheiros e do grupo
dos copeiros.
O que foi relatado sobre o conhecimento vai aparecer na forma de identidade,
também como conflito.
A identidade é formada de uma maneira dupla: primeiro ela é dada pela
instituição, isto é, nos identificamos devido à função que desempenhamos, determinada
pela organização geral do H.U. A outra maneira é dada por aquilo que o outro atribui a
nós. A identidade é aquilo que orienta a nossa atividade, quer dizer, eu sei o que eu faço
e sei o que o outro faz. Mas não é só saber o que o outro faz, é, também, reconhecer a
importância e valorizar o trabalho do outro. O que nos apareceu como conflito é a
impossibilidade de o grupo das nutricionistas reconhecer no trabalho do grupo dos
cozinheiros e do grupo dos copeiros as determinações que os seus conhecimentos
acrescem ao produto ou a atividade dos cozinheiros e copeiros.
Para Baró (1989), a finalidade da existência do grupo, ou seja, sua capacidade
para desenvolver determinada tarefa garantirá a identidade do grupo frente aos demais
grupos. Essa identidade será definida pelo grau e pelo caráter da formação organizativa
do grupo, pela relação com outros grupos e pela consciência que seus membros terão
acerca de seu próprio grupo.
Entretanto, a identidade demanda a existência de uma totalidade, uma unidade
de conjunto, que acaba por gerar uma peculiaridade que a diferencia dos outros grupos,
transcende e condiciona a identidade individual dos membros.
O que foi descrito do conhecimento e da identidade, aparece também na forma
de conflito relacionado ao poder, lembrando que o poder é primeiramente atribuído pela
instituição e em um segundo momento estabelecido nas correlações entre os grupos. Por
ser dado institucionalmente, a hierarquia impede que um grupo se sobreponha a outro
grupo, porém, esta não garante a obediência à autoridade. O poder é reorganizado nas
correlações entre os grupos e, nestas, podemos constatar um conflito entre o grupo das
nutricionistas e o grupo dos cozinheiros, assim como entre o grupo das nutricionistas e o
grupo dos copeiros.
Percebemos, de acordo com as nutricionistas, que o grupo dos cozinheiros e o
grupo dos copeiros da Seção de Nutrição não reconhecem a identidade do grupo das
nutricionistas e vice-versa, justamente pelo entendimento de que o trabalho de um grupo
é mais importante do que o do outro.
54
4.1.a Devolutiva da Análise do Grupo das Nutricionistas
Os conflitos constatados, e que serão apresentados aqui, possuem implicações
psicológicas muito relevantes, pois determinam as formas de percepção de cada grupo,
ou seja, o modo como estes grupos vêem a si e aos outros. Assim, tais conflitos
determinam, em cada grupo, um modo de percepção que perpassa pela questão da
desvalorização do trabalho dos demais grupos e até do próprio trabalho, bem como pela
questão do desrespeito às diferenças inerentes a cada grupo e ao trabalho desenvolvido
por cada um destes dentro da instituição.
CONHECIMENTO
Conhecimento é aquilo que nós entendemos do mundo e de nós mesmos e que
utilizamos psicologicamente para realizarmos as ações necessárias para as nossas vidas,
sendo adquirido através das nossas próprias atividades.
É o conhecimento de nossas funções e das funções desempenhadas pelos outros.
Na forma como a nossa vida está organizada, faz-se uma divisão entre o
conhecimento intelectual e o conhecimento prático. O trabalho intelectual é mais
valorizado que o trabalho manual, em nossa sociedade, porque é ele que vai organizar e
elaborar os conhecimentos mais especificamente. Essa divisão é feita pela nossa
sociedade, é uma divisão operacional. Essa divisão é reproduzida aqui na seção, na
forma de conflitos entre o grupo das nutricionistas e o grupo dos cozinheiros e entre o
grupo das nutricionistas e o grupo dos copeiros, na forma de valorização social do
trabalho. Há uma maior valorização social atribuída pelo grupo das nutricionistas ao
próprio trabalho desenvolvido pelo grupo, em relação ao trabalho do grupo dos
cozinheiros e do grupo dos copeiros.
55
IDENTIDADE
Isso que foi falado sobre o conhecimento, vai aparecer aqui, na forma de
identidade, também como conflito.
A identidade é formada de uma maneira dupla: primeiro ela é dada pela
instituição, isto é, nos identificamos devido à função que desempenhamos. A outra
maneira é dada por aquilo que o outro atribui a nós. A identidade é aquilo que orienta a
nossa atividade, quer dizer, eu sei o que eu faço e sei o que o outro faz. Mas não é só
saber o que o outro faz, é, também, reconhecer a importância e valorizar o trabalho do
outro. O que nos apareceu como conflito, é a impossibilidade de o grupo das
nutricionistas reconhecerem no trabalho do grupo dos cozinheiros e do grupo dos
copeiros as determinações que os seus conhecimentos acrescem ao produto ou a
atividade dos cozinheiros e copeiros.
PODER
O que foi falado sobre o Conhecimento e a Identidade, aparece aqui na forma de
conflito relacionado ao poder, lembrando que o poder é primeiramente atribuído pela
instituição e, em um segundo momento, estabelecido nas correlações entre os grupos.
Por ser dado institucionalmente, a hierarquia impede que um grupo se sobreponha a
outro grupo, porém, esta não garante a obediência à autoridade. O poder é reorganizado
nas correlações entre os grupos e, nestas, podemos constatar um conflito entre o grupo
das nutricionistas e o grupo dos cozinheiros, assim como entre o grupo das
nutricionistas e o grupo dos copeiros. Este conflito situa-se entre a necessidade de
valorização do trabalho intelectual e a necessidade de valorização do trabalho prático,
impossibilitando ao grupo das nutricionistas reconhecer e valorizar o trabalho do grupo
dos cozinheiros e do grupo dos copeiros quanto aos conhecimentos destes e sua
importância para a concretização do produto final.
56
4.2 ANÁLISE DO GRUPO DE COZINHEIROS3
1- Os processos psicológicos individuais e grupais determinados pelo trabalho ali
realizado.
No interior do grupo dos cozinheiros, podemos ver uma opinião comum sobre
a falta de comunicação. Esta percepção se apresenta a todos que no local trabalham,
pois eles reclamam que não são ouvidos, que não têm poder de “voz”. Tudo isto nos
leva a crer que, mesmo havendo forças dirigidas mais ou menos para um ou outro
membro dali, eles reconhecem seu destino como ligado ao destino do grupo, isto é, um
grupo sem voz. O grupo de cozinheiros tem um papel fundamental na organização da
Seção de Nutrição, pois dele saem todos os dias, os alimentos para serem entregues aos
pacientes. Temos, então, um produto a ser elaborado (objetivo a ser executado),
segundo a organização do sistema externo, portanto, imposto ao grupo. Este objetivo os
mantém unidos durante horas naquela seção.
Outro objetivo existente ali, é o de conviver sem os problemas de
relacionamentos que, segundo eles, são promovidos por uma integrante do grupo. Isto
quer dizer que as forças que afastam ou impelem os sujeitos para o grupo estão ligadas à
atuação dessa integrante. Ao manter tal comportamento, ela faria com que o grupo se
volte contra ela, mas ela própria pode estar apresentando aquilo que chamamos de ódio
a si mesmo. Isto seria apreendido por ela buscar manter uma relação mais estreita com o
grupo superior hierarquicamente; seu grupo entende que ela buscaria, assim, se
beneficiar, o que a faz sentir ódio de si por não ser integrante do grupo majoritário e,
por conseguinte, odiará seu grupo, pois este a mantém nesta posição de inacessibilidade
do grupo tido como majoritário.
O ódio a si mesmo é um sentimento experimentado por aqueles indivíduos que
não têm suas necessidades atendidas no grupo do qual fazem parte e podem, inclusive,
tornarem-se líderes deste grupo que detestam, pois isso os aproximaria mais do grupo
psicologicamente majoritário, do qual tais indivíduos aspiram fazer parte. O indivíduo
que está na periferia do seu grupo, costuma apresentar este tipo de sentimento, ou seja,
isso explicaria o motivo desta funcionária, que precisa de seu grupo, criar intrigas e
maldizer seus afins, deste grupo. O ódio a si mesmo pode se apresentar em tudo que se
refere ao grupo, não excluindo, portanto, a si próprio. 3 Elaborada por Adriano Kasiorowski de Araújo e Heriel A. B. da Luz
57
Considerando a questão do ódio a si mesmo, e levando em conta o
comportamento de um dos integrantes do grupo dos cozinheiros, chegamos à conclusão
de que ela contribui, em grande parte, para o equilíbrio negativo do grupo.
Os indivíduos fiéis (Núcleo Chauvinista) ao grupo se sentem cada vez mais
propensos a excluírem este membro que os “atrapalha” nas atividades e na manutenção
do grupo. Isso pôde ser verificado quando disseram que a dita funcionária já estava
muito velha e deveria se aposentar logo. Ela carrega uma força de afastamento do
grupo.
Outro fator que a leva para fora do grupo é o fato de estar muito próxima do
grupo considerado a maioria psicológica, o das nutricionistas. Este grupo exerce a
função de direção e submete todos os outros às suas ordens. Mas entre as ordens
emanadas deste grupo e a execução delas, existe o campo psicológico dos indivíduos,
neste caso o dos cozinheiros, que atribuem às condições atuais, problemas de
comunicação intergrupais e interpessoais no interior dos grupos.
Os indivíduos do grupo dos cozinheiros reconhecem, e com bastante
eloqüência, que são essenciais dentro da seção, pois sem eles não há alimento aos
pacientes, os quais constituem o principal motivo de existir a seção dentro da instituição
hospitalar. Diante deste fato, seu grupo tem apenas a barreira hierárquica como
impedimento de conquistarem maior poder dentro da seção, e é por isso que atribuem às
nutricionistas grande responsabilidade sobre a falta de comunicação. Na verdade,
poderíamos dizer que o grupo das nutricionistas é o bode expiatório do grupo dos
cozinheiros, ou seja, para conseguirem maior destaque e vantagens dentro da Seção,
condenam o grupo das nutricionistas, que está com o mesmo objetivo, dizendo que elas
não sabem sobre o trabalho, muito embora tenham a formação exigida para isto. Do
outro lado, as nutricionistas dizem que os cozinheiros não compreendem os fatores que
as fazem tomar as decisões no que tange aos alimentos ali cozinhados.
Temos pessoas de diferentes meios psicológicos e tendo interpretações
diversas sobre a questão central, que é cozinhar o alimento. Óbvio é que a comunicação
estará prejudicada onde há processos psicológicos distintos em relação ao mesmo
objetivo.
2- As características psicológicas e comportamentais devidas à organização da forma de
produção.
A forma de produção da seção é extremamente hierarquizada, o que dificulta o
58
reconhecimento do produto do trabalho dos trabalhadores desta seção. Esta dificuldade
vai apresentar-se na maneira como os indivíduos irão agir, pensar e sentir, uma vez que
todos os processos psicológicos do indivíduo estão mediados por seu espaço vital, o
qual é constituído pela pessoa e pelo meio psicológico, tal qual se lhe apresenta.
Tem-se um ambiente no qual os cozinheiros cozinham alimentos para
pacientes, mas não estão diretamente ligados a estes pacientes. Tem-se, também, ordens
de se cozinhar determinada quantidade de alimento para determinada dieta, sem,
contudo, uma prévia elaboração sobre se irá faltar ou sobrar algo, o que oferece, no
mínimo, um pequeno conflito para se executar as ordens. Então, temos uma situação
onde se deve fazer algo com um fim que não se sabe se será alcançado e sem ser
previamente organizado com vistas às condições de execução das tarefas.
Temos no grupo dos cozinheiros, uma insegurança muito grande com relação a
isto, pois eles estão sob ordens de executar de determinada forma mas sem os meios de
fazê-lo. Isto se reflete na maneira de se comunicarem, pois reclamam de uma má
comunicação, porém tudo com o que trabalham, se constitui em um estado confusional,
seja pela falta de elementos necessários para consecução da tarefa, seja pela não
visualização do produto do trabalho.
3- As inter-relações entre os trabalhadores e a influência destas nos processos e
conteúdos da subjetividade dos mesmos.
Como dito acima, as relações estão sempre mediadas pela má comunicação.
Esta má comunicação pode ser descrita como um sistema simbólico que não é
compartilhado por todas as esferas da seção, ou melhor, cada grupo mantém um
conjunto significativo que irá mediar todos os aspectos de sua vida e irá orientá-lo nas
relações, seja com quem e onde for.
No caso dos cozinheiros, estes estão mediados por sua atividade de cozinhar,
necessitando, para tanto, de alguns processos específicos mais desenvolvidos que os
outros trabalhadores de outras seções, e esses processos estão, por sua vez,
determinados pela atividade desempenhada naquele grupo. Cada grupo irá desenvolver,
de forma distinta, sua representação, por estar esta condicionada à atividade que cada
um desenvolve e à forma como se dá as relações dos seus membros na realização dela.
A comunicação é caótica intergrupalmente, mas é quase perfeita
intragrupalmente, isto porque os grupos que não conseguem estabelecer uma
59
comunicação adequada estão coesos e com pouca possibilidade de dispersar-se e,
mesmo se houver problemas entre eles, suas dimensões estão claramente estabelecidas,
sendo que dentro delas relações se estabelecem e representações se constroem de forma
uniforme e em consonância com os indivíduos. Mas, quando estes indivíduos de grupos
distintos vão entrar em relação, a comunicação não funciona, e eles definitivamente
falam outra língua, pois se utilizam de diferentes linguagens, de diferentes
representações. Isto tudo irá torná-los cada vez mais distantes, também, em outros
aspectos, como em pensamento e em emoção.
4- As características e os processos grupais determinados pela organização do trabalho e
suas principais implicações para os trabalhadores e para a Instituição.
Esta Instituição organizada de forma sistêmica e vertical, tem o problema de
não poder ter uma peça com alguma alteração, pois este fato causa uma mudança em
toda a organização do trabalho, ali. Isto é visto claramente com o fato de a mudança da
diretora ter causado uma animosidade tal, que levou à realização de um abaixo-
assinado, retirando-a do cargo. Já a atual diretora, foi aceita, mas sofre críticas dos
funcionários.
Para a psicologia, não interessa muito a forma orgânico-administrativa de uma
instituição, pois as relações são arquitetadas e mantidas segundo a forma inter-subjetiva.
Isto quer dizer que o organograma hierárquico da instituição não nos dá a real dimensão
dos papéis exercidos pelos grupos no interior do seção nutricional e, tampouco, o
conhecimento dos líderes e possíveis detentores de poder da seção.
Há uma percepção de que as chefes da Seção não seriam as mandantes deles, e
que eles teriam poder e causariam muitas alterações funcionais por produzirem o que é
o mais importante na seção, ou seja, a alimentação dos pacientes.
Tem-se ali um processo grupal onde se busca o rompimento da verticalização,
uma quebra, o que causaria uma alteração no pensamento e comportamento dos
indivíduos de toda a seção. Se a administração não administra mais de forma linear, o
produto/objetivo do trabalho está sendo feito com algumas alterações que se refletem na
forma de produção e nas relações inter-pessoais dentro da instituição.
Com relação aos trabalhadores, as alterações se darão em sua atividade de
forma direta e em sua subjetividade de forma indireta (mediada). Essas alterações estão,
ainda, sendo entendidas e deverão nos levar ao entendimento da totalidade da situação,
60
situação necessária para uma intervenção eficaz.
4.2.a Devolutiva da Análise do Grupo dos Cozinheiros4
A seção está organizada de forma sistêmica e vertical, tendo o problema de
não poder ter uma peça com alguma alteração, pois este fato causa uma mudança em
toda a organização do trabalho, ali. Isto é visto claramente, com o fato de a mudança da
diretora ter causado uma animosidade tal, que se chegou a ser feito um abaixo-assinado,
retirando-a do cargo.
Para a psicologia, a forma orgânico-administrativa de uma instituição se
apresenta como um dos níveis que as relações são arquitetadas e mantidas; o outro nível
não é facilmente identificado, tratando-se da forma intersubjetiva. Isto quer dizer que o
organograma hierárquico da instituição não nos dá a real dimensão dos papéis exercidos
pelos grupos no interior da seção nutricional e tampouco o conhecimento dos líderes e
possíveis detentores de poder do seção.
Parece-nos provável que os cozinheiros apresentam certa autonomia no seção,
ou seja, estão subordinados hierarquicamente às nutricionistas, mas não estão
subordinados às mesmas, subjetivamente. Eles têm o poder e causam muitas alterações
hierárquicas por produzir o que é reconhecidamente o mais importante na seção, a
alimentação dos pacientes.
Tem-se ali um processo grupal onde há o rompimento da verticalização, uma
quebra, o que causa uma alteração no pensamento e comportamento dos indivíduos de
todo a seção. Se a administração não administra mais de forma linear, o
produto/objetivo do trabalho está sendo feito com algumas alterações, que se refletem
na forma de produção e nas relações inter-pessoais dentro da instituição.
No grupo da cozinha, que abarca não apenas os cozinheiros mas também os
auxiliares de cozinha, isto é, todos os que trabalham para a produção do alimento, os
indivíduos se percebem como membros do grupo, muito embora o regime de escalas
tenha alterado substancialmente, no estabelecimento das relações. Todos os indivíduos
do grupo estão reunidos em torno de um objetivo comum: produzir os alimentos.
O grupo dos cozinheiros se mostra organizado, tanto que sabem quem querem
dentro e quem preferem fora de seu grupo. Outro aspecto dessa organização, se refere
4 Elaborada por Adriano Kasiorowski de Araújo e Heriel A. B. da Luz
61
aos acordos não-verbais existentes; eles mantêm uma boa coesão interna, uma vez que
as pessoas se vêem interdependentes umas das outras e interagem entre si.
Com relação aos trabalhadores, a organização do grupo causa alterações que se
dão em sua atividade de forma direta e em sua subjetividade de forma indireta
(mediada). Como o grupo é dinâmico e se altera segundo as relações intergrupais e
intragrupais, bem como conforme a história do próprio grupo, é necessário entender
como o grupo se deu historicamente, não a história da criação do grupo na seção
(mesmo que seja parte da história do grupo), mas a história do estabelecimento de certos
acordos e normas do próprio grupo, assim como o estabelecimento das relações entre os
seus membros.
As relações estão sempre mediadas pela má comunicação. Esta má
comunicação pode ser descrita como um sistema simbólico que não é compartilhado por
todas as esferas da seção, ou melhor, cada grupo mantém um conjunto significativo que
irá mediar todos os aspectos de sua vida e irá orientá-lo nas relações, seja com quem e
onde for.
No caso dos cozinheiros, estes estão mediados por sua atividade de cozinhar,
necessitando, para tanto, de alguns processos específicos mais desenvolvidos que os
outros trabalhadores de outras seções, sendo que esses processos estão, por sua vez,
determinados pela atividade desempenhada naquele grupo. Cada grupo irá desenvolver
de forma distinta sua representação, por estar esta condicionada à atividade que cada um
desenvolve e à forma como se dá as relações dos seus membros na realização dela.
A comunicação é caótica intergrupalmente, mas é quase perfeita
intragrupalmente, isto porque os grupos que não conseguem estabelecer uma
comunicação adequada estão coesos e com pouca possibilidade de dispersar-se e,
mesmo se houver problemas entre eles, suas dimensões estão claramente estabelecidas e
dentro delas relações se estabelecem e representações se constroem de forma uniforme e
em consonância com os indivíduos. Mas, quando estes indivíduos de grupos distintos
vão entrar em relação, a comunicação não funciona, e eles definitivamente falam outra
língua, pois se utilizam de diferentes linguagens, de diferentes representações. Isto tudo
irá torná-los cada vez mais distantes também em outros aspectos, como em pensamento
e em emoção.
Se pensarmos na seção de nutrição como um grupo onde cada grupo funcional
seja considerado um subgrupo, estaríamos caindo em um problema, pois um grupo
necessita ter esquemas estabelecidos e membros que interajam entre si. Na seção, isto
não acontece, e estão sendo chamados de grupo da nutrição por estarem ocupando um
62
mesmo espaço e estarem ligados à uma hierarquia, ou seja, se constitui em uma
categoria social, não um grupo. No momento em que esta categoria social conseguir se
transformar em um grupo, as relações na seção facilitarão o trabalho realizado e não
mais haverá os problemas encontrados lá, atualmente.
Existem três aspectos que devem nos chamar a atenção para se compreender
um grupo, que são conhecimento, identidade e poder. Trataremos de cada um mais
adiante.
Como mostra a figura 1, os cozinheiros têm conhecimento acerca do trabalho
das nutricionistas, embora este esteja sendo um pouco conflitante, uma vez que os
cozinheiros possuem um conhecimento tácito sobre a realização da produção necessária
para alimentar os pacientes.
Eles também conhecem, por estarem em relação, os trabalhos dos auxiliares de
cozinha, dos assistentes administrativos, dos auxiliares operacionais e dos copeiros. O
conhecimento aqui abordado, é inerente à relação que se estabelece entre os subgrupos
na seção.
No caso da identidade, esta se refere à forma como o grupo se reconhece
perante os outros grupos e como os outros grupos lhe reconhecem, isto é, quando o
grupo dos cozinheiros se coloca de determinada maneira e os outros grupos lhe
atribuem ou admitem um papel determinado, ou algum outro. A figura 2, mostra que
todos os outros grupos reconhecem os cozinheiros como um grupo, porém existe uma
divergência entre o grupo das nutricionistas e dos cozinheiros, sendo que estes não são
reconhecidos por elas tal e qual se reconhecem.
Finalmente, a questão do poder é a que mais pode causar problemas de
interpretação, pois, como mostra a figura 3, é onde há maior incidência de conflitos na
seção. A questão do poder não é facilmente identificada, uma vez que está em
consonância com o conhecimento e com a identidade do grupo. Isto se deve ao fato de
um grupo de trabalho, como é o nosso caso, conhecer sobre os outros grupos funcionais,
sendo de grande valia no que toca ao poder do grupo conhecedor. E quando este grupo é
reconhecido como importante, seu poder aumenta. Poder aqui, pode ser descrito como a
capacidade de influenciar os outros grupos, capacidade de romper com o instituído, a
partir da dinâmica institucional e através das relações e correlações de forças. As forças
estão em jogo sempre que há grupos e, no caso dos cozinheiros, por sua função e sua
posição dentro da seção (em outras palavras, por produzir o objeto da existência da
seção: o alimento) eles conseguiram tal capacidade.
63
64
4.3 ANÁLISE GRUPO DOS AUXILIARES DE COZINHA5
A análise psicológica dos dados coletados junto aos auxiliares de cozinha, será
calcada em três teorias: a de Leontiev, que trata da atividade; e as de Lewin e Baró, que
tratam sobre grupos. O aspecto básico de análise é o trabalho e as suas implicações na
consciência dos indivíduos. Consideramos também que as relações estabelecidas na
sociedade, em geral, participam da formação dos aspectos psicológicos.
A função dos auxiliares de cozinha da Seção de Nutrição do HU consiste no pré-
preparo de alimentos, preparo de saladas e higienização. Desta forma, podemos
considerá-la uma atividade-meio, ou seja, apenas uma parte do conjunto de atividades
que devem ser realizadas para que o objetivo final (comum) seja alcançado – a
alimentação.
Para compreendermos os processos psicológicos de um grupo, devemos partir do
reconhecimento de que existe uma série de determinações sociais, muito amplas e
profundas, sobre todo e qualquer indivíduo ou grupo. Dessa forma, os problemas e
conflitos que surgem neste processo não são considerados individualmente. Esses
problemas surgem do próprio trabalho e da forma como é executado, ou seja, das
próprias condições, possibilidades e limites que a divisão do trabalho impõe a cada
grupo.
Há especificidades em relação às consciências individuais e processos grupais, já
que: a instituição (Hospital Universitário) segue normas estabelecidas para todos os
hospitais do país e, por ser uma instituição pública, deve obedecer à um regimento
específico para este tipo de instituição. Depois, há as normas internas do Hospital
Universitário Maria Aparecida Pedrossian, e estas são obedecidas pela administração do
hospital, bem como pela equipe responsável por cada seção.
Aqui se encontra a Seção de Nutrição que, além de todos estes regimentos, tem
sua própria divisão funcional, estabelecendo as tarefas de cada grupo, dentre os quais o
de auxiliares, que é subordinado à todas essas normas e está no final da hierarquia. Este
grupo possui, também, as suas regras de convivência e trabalho, tais como: revezar as
5 Elaborada por Priscilla Bolfer Moura e Leonardo Bastos
65
tarefas; não conversar; perguntar aos cozinheiros como eles querem que a comida seja
pré-preparada; preservar os instrumentos de trabalho e, se necessário, levar de casa e
economizar materiais de limpeza.
Mais especificamente, as atividades dos auxiliares de cozinha são: o pré-preparo
das verduras e legumes (limpar, desinfetar, descascar, lavar); preparo das saladas;
higienização da sua seção, das louças, fogão, panelas a vapor, pias e balcão térmico; e
servir a comida no refeitório. Para que essas tarefas sejam realizadas, são necessárias
algumas funções psicológicas superiores, que são construídas ao longo da história social
do homem e são mediadas por instrumentos e símbolos desenvolvidos culturalmente.
A atividade, ao mesmo tempo em que é construção do homem, é também
"determinada pela forma como a sociedade se organiza para o trabalho" (Aguiar, 2001,
p.99). O homem constitui-se a partir da interiorização da atividade, e qualquer
consideração acerca da atividade, da consciência ou de aspectos psicológicos do ser
humano, deve levar em conta o contexto no qual a atividade refere-se à ação do homem
sobre a realidade, sendo definida pelo lugar que o indivíduo ocupa (socialmente) dentro
da forma como a sociedade se organiza para o trabalho. É um processo que se inicia a
partir de uma necessidade individual, com origem na realidade material, desencadeando
ações do sujeito.
A atividade é um dos processos que compõem e promovem o funcionamento
psicológico humano, ou seja, as funções psicológicas são resultantes da atividade
humana sobre o meio social e natural. Para ele, a atividade é um sistema de
transformação do meio, com a ajuda de instrumentos.
O emprego de instrumentos também pode ser entendido como atividade
mediacional e, deste ponto de vista, representa, ao mesmo tempo, a unidade essencial de
construção da consciência, pois a condição de toda atividade é uma necessidade, mas
cada necessidade vai se determinar em um objeto. O objeto torna-se o motivo da
atividade enquanto elemento que a estimula.
O trabalho é um processo mediado pelos instrumentos e pela sociedade. O
trabalho social é uma característica da atividade humana e origina necessidades
independentes dos motivos biológicos, que são os motivos dos comportamentos. O
trabalho é um mediador fundamental na constituição da subjetividade do indivíduo, pois
permite que possamos orientar nossos objetivos socialmente, assim como a nossa
modificação contínua. Através do trabalho, o homem realiza uma atividade sobre a
natureza.
A atividade do indivíduo ocorre em um sistema de relações sociais e de vida
66
social, onde o trabalho ocupa lugar central e também se encontra em processo de
mudanças históricas. O trabalho é o elemento de constituição do sujeito e da sua
consciência, que aparece como forma de atendimento das necessidades individuais e se
modifica juntamente com as mudanças históricas.
O trabalho é uma atividade humana institucionalizada, que exige o
estabelecimento de papéis, objetivos e meios de produção adequados para cada tarefa.
Isto leva à uma divisão técnica e à fragmentação hierárquica. Essa divisão do trabalho é
organizada pelas instituições e reforçam a divisão social do trabalho.
As Funções Psicológicas Superiores têm origens sócio-culturais e dependem de
processos psicológicos elementares, de origem biológica, e elas se interrelacionam com
as funções psicológicas inferiores (ou secundárias), mas são genética, estrutural e
funcionalmente diferentes, cada uma delas tendo qualidades e propriedades específicas.
As Funções Psicológicas Inferiores são imediatas, de origem natural e biológica,
portanto, são controladas pelo meio social e físico, sendo assim, inconscientes e
involuntárias. Já a especificidade das funções psicológicas superiores são mediadas,
precisando de um signo mediador.
A mediação refere-se ao processo de representação mental e ao fato de que os
sistemas simbólicos, que se interpõem entre o sujeito e o objeto de conhecimento, têm
origem social.
Na dinâmica das Funções Psicológicas Superiores, todas as funções estão inter-
relacionadas, porém uma função pode emergir mais que a outra, em determinados
momentos, estabelecendo uma hierarquia entre elas. A ênfase em uma ou outra função é
determinada pela vontade, sendo que esta é inicialmente social, interpsicológica e
posteriormente intrapsicológica.
Qualquer função psicológica superior foi externa porque foi social, antes de ser
interna. Assim, é nas relações entre as pessoas, e por elas, que se constituem as funções
psicológicas superiores, sendo estas relações mediadas por instrumentos, em especial os
signos. É por intermédio dessas relações, que os processos passam de sociais para
individuais.
No grupo dos auxiliares de cozinha, por exemplo, os processos psicológicos
mais importantes são: a atenção, a percepção e a coordenação motora.
A atenção consiste em o homem selecionar a informação e as ações necessárias e
manter um controle permanente sobre essas, abstraindo as demais informações. Ela se
manifesta na percepção, nos processos motores e no pensamento, sendo que dois fatores
são determinantes da atenção: os estímulos externos e a própria atividade do sujeito.
67
Desta forma, podemos analisar as atividades dos auxiliares de cozinha como
uma função que requer muita atenção, por se tratar de lavar, descascar e cortar
alimentos. Se eles não tiverem atenção suficiente, podem estragar/desperdiçar alimentos
e até mesmo se machucar.
A percepção é o processo e o registro de informações, passadas pelos órgãos dos
sentidos. Nela, também estão incluídos os componentes motores, estando ligada à
experiência anterior. Através da percepção, é possível estabelecer os traços de um
determinado objeto, bem como categorizá-los e, assim, abstrair indícios como cor,
tamanho, forma, função, entre outros.
A percepção dos objetos é determinada pela tarefa que se coloca ao sujeito e
pela atividade prática que ele desenvolve com esse objeto. Sendo assim, os auxiliares de
cozinha percebem os traços específicos (forma, tamanho, densidade) de cada alimento
para poder cortar, descascar, lavar, tendo também uma percepção (tamanho) dos locais e
objetos que têm de limpar.
É preciso coordenação fina e grossa para que o corte seja feito da maneira que a
nutricionista mandou e o cozinheiro “gosta” e, também, para que não se machuquem ao
manusear as facas e descascadores.
Apesar da atividade dos auxiliares necessitar de atenção, por estarem há muito
tempo fazendo o mesmo trabalho e já terem prática, seus movimentos são automáticos,
possibilitando que eles pensem em outras coisas enquanto trabalham.
A organização do trabalho na Seção de Nutrição é alienante por ser
institucionalizada, dividida e hierarquizada de tal forma que seja impossível o domínio
de todo o processo de produção. E nesta organização, há a formação de grupos para que
se alcance o objetivo comum. A boa alimentação é reconhecida como um dos fatores
mais importantes para se ter saúde, porém, também representa prazer e relacionamento
social. É através da alimentação que a criança entra em contato com a mãe, tendo em
vista que a oralidade é considerada uma das primeiras formas de contato com o mundo.
Além de valor nutricional, a alimentação tem valor emocional, pois aquele que
alimenta é tido como próximo, como alguém que ajuda, sustenta, que acolhe e cuida.
O grupo dos auxiliares de cozinha pode ser considerado um sócio-grupo, por ser
um grupo de tarefa, estruturado e orientado em função da execução/cumprimento de
determinada tarefa. Segundo Lewin, o campo de um grupo consiste em elementos de
um grupo e em um meio tal, como existe para o grupo naquele momento. Sendo assim,
o campo dos auxiliares de cozinha é o Hospital Universitário e o espaço vital é a seção
de nutrição.
68
Cada grupo possui características próprias que “não são a soma de características
de cada elemento do grupo, mas formam uma gestalt”. E, além das normas da
instituição, outra característica que une esse grupo é sua interdependência.
No caso do grupo dos auxiliares de cozinha, funcionalmente e psicologicamente
eles são interdependes, pois, pelo que relataram, seus principais grupos de convivência
são o de trabalho e a família. Assim, os colegas de trabalho (daquela seção) passam a
ser um ponto de apoio para os problemas da vida familiar, bem como, para
relacionamentos em geral.
Podemos notar que os grupos dos auxiliares de cozinha, cozinheiros e copeiros
são mais próximos por lidarem diretamente com a comida, além de seus lugares de
trabalho serem próximos. Outro fator que faz com que haja maior proximidade é o fato
de que, às vezes, é necessário que um “cubra” o outro, ou seja, que um cumpra a função
do outro. Assim, há, além de uma questão operacional, o afeto que envolve esses
trabalhadores. Isso pode ser muito bem percebido no grupo dos auxiliares de cozinha,
sendo coesos e tendo um bom relacionamento com todos os outros grupos. Por
passarem muito tempo juntos, os membros estabelecem contatos psicológicos
profundos, possibilitando a comunicação autêntica, boa integração, produtividade e
criatividade.
A interação entre os auxiliares de cozinha é muito importante para que as tarefas
sejam divididas sem que ocorram maiores conflitos, para que o trabalho seja produtivo e
o objetivo comum seja alcançado.
Cada indivíduo é parte da totalidade (o grupo), e qualquer mudança na situação
do grupo afeta diretamente o indivíduo. Apesar de cada um ter seus objetivos pessoais e
não precisar ser idênticos com os objetivos do grupo, é preciso que as divergências
fiquem dentro de certos limites para que não haja rompimento. A maioria dos objetivos
dos auxiliares tem a ver com o futuro da família e o seu próprio e, sendo assim, o
trabalho é um meio de obter o necessário para que planos (principalmente materiais)
sejam alcançados.
Podemos observar, também, que os auxiliares de cozinha têm sua conduta
voltada em função das forças objetivas que decorrem de uma situação, como é o caso de
reclamação às nutricionistas, e até mesmo ameaça de paralisação e falta de instrumentos
de trabalho.
Podemos dizer, também, que é um grupo conformista, o que está muito mais
relacionado com a “rigidez” da instituição do que com o desejo, a aspiração de seus
componentes em mudar.
69
Existe uma autovalorização e valorização externa do trabalho realizado na Seção
de Nutrição, que é construída principalmente pelo aspecto afetivo que o “preparo” da
alimentação possui, por estar relacionado ao cuidado, sendo valorizado socialmente. Por
se tratar de um hospital, isso se intensifica e provoca um retorno dos pacientes para os
funcionários, sob a forma de gratidão, o que motiva o trabalho, mesmo com
dificuldades estruturais.
Dessa forma, o grupo dos auxiliares de cozinha trabalha de forma integrada, o
que possibilita a divisão e complementação de tarefas necessárias, sem que isso gere
maiores conflitos. Este compromisso com a elaboração da comida pode ser
exemplificado pela forma de como a falta de utensílios é solucionada: tais utensílios são
trazidos pelos próprios auxiliares de cozinha, de suas casas, para que o trabalho não seja
prejudicado e, conseqüentemente, os pacientes.
Tendo como base a Teoria de Baró, temos de considerar seis fatores para
caracterizar um grupo: a) Percepção dos membros – pois, somente quando os indivíduos
se percebem como relacionados uns com os outros, podem atuar em função dessas
relações. Para que isso ocorra, deve também existir a percepção da totalidade das ações
unitárias; b) Motivação compatível - a condição essencial para existência de um grupo
se encontra na necessidade e motivação das pessoas, que as levam a buscar sua
satisfação através da relação com outras pessoas; c) Objetivo comum – Diferentemente
da motivação, o objetivo comum será o que irá garantir a unidade grupal, fortalecendo o
grupo; d) Organização - a natureza do grupo não está nas partes e, sim, no todo, com o
elemento unitário não se dando pela característica comum a todos os indivíduos, mas
sim, por um ordenamento peculiar e mais ou menos estável dos vínculos entre eles; e)
Interdependência – a vinculação dos indivíduos entre si faz com que eles se tornem
dependentes um dos outros, e esse fato é o que garante a unidade; f) Interação entre os
membros – é essencial para existência do grupo, tal qual a norma, e implica em dizer
que a ação de um deve estar necessariamente ligada à ação do outro.
Sendo assim, podemos considerar os auxiliares de cozinha como um grupo, em
particular um Grupo Funcional, pois corresponde à divisão do trabalho no interior de
um determinado sistema social.
Ainda de acordo com este autor, podemos analisar os grupos a partir do
conhecimento, identidade e poder que, por serem processos psicológicos, são base das
relações humanas existentes em qualquer grupo, possibilitando a compreensão da forma
como se dão tais relações.
Conhecimento refere-se aquilo que entendemos do mundo e de nós mesmos,
70
pois é o que utilizamos para pensar e decidir sobre o que realizarmos e quais são as
ações necessárias para a nossa vida. Mas este conhecimento só é adquirido através das
nossas atividades.
Cada grupo desenvolve uma série de conhecimentos específicos, por realizar sua
função. O grupo dos auxiliares de cozinha, por exemplo, tem como funções: o pré-
preparo de alimentos, saladas, higienização da sua seção, louças, fogão e servir as
refeições do dia no refeitório. Como já dito anteriormente, essas atividades requerem
conhecimentos específicos como a diferenciação das verduras e legumes, dos tipos de
corte, dos produtos que devem ser utilizados na limpeza, na contagem de pessoas e
porcionamento das quantias no refeitório. Estes, entre outros, aspectos psicológicos,
compõem a estrutura da consciência.
A identidade é um processo contínuo que cria as características individuais e as
do grupo em que nos inserimos. Ela é formada a partir de como os outros nos tratam, do
que pensam ou sabem de nós ou do grupo. Sendo assim, a identidade do grupo dos
auxiliares se constitui fundamentalmente frente aos demais grupos. As pessoas nos
tratam a partir do que sabem de nós e, se concordamos que somos como elas pensam, há
uma identificação imediata. Se não concordamos e negamos o que pensam ou fazem em
relação a nós, lhes apresentamos uma outra característica da nossa identidade a elas e
alteramos os nossos comportamentos, sentimentos e pensamentos.
Sendo assim, é fundamental conhecer e reconhecer o trabalho do outro, para que,
a partir desse reconhecimento, forme-se a identidade. Com esse reconhecimento dos
outros grupos, o grupo dos auxiliares formou a sua própria identidade, diferenciando-se
pela função, dos demais grupos, e agindo conforme tal.
Porém, pode-se notar um conflito na identidade desse grupo com a direção do
Hospital Universitário, uma vez que eles não possuem as condições de trabalho
necessárias para realizar suas funções, como, por exemplo, a falta de utensílios de
cozinha e limpeza. Este fato, bem como outras dificuldades e facilidades, participam da
identificação, influenciando as relações entre os diversos grupos.
O poder refere-se à capacidade de obter diferenciais vantajosos em relação a
outros grupos que lhe permitem alcançar seus objetivos, inclusive impondo sua vontade
a outros grupos sociais, ainda que não seja de forma coercitiva. O que garante o poder é
a superioridade que os grupos possuem em suas relações sociais. O grupo que possuir
mais recursos (sejam de qualquer natureza), será o grupo dominante. Um grupo pode ser
poderoso por ter a capacidade técnica e científica ou por conhecer a práxis, entretanto,
os recursos serão definidos pela sociedade em que eles vivem. Porém, este poder é
71
dinâmico, podendo diferenciar-se de acordo com as relações (entre os grupos)
específicas de cada situação e os objetivos e interesses envolvidos.
O grupo dos auxiliares de cozinha tem poder reduzido por serem poucos e por
realizarem um trabalho repetitivo e habitual. Mas são apoios para que outros grupos
consigam exercem seu poder, como é o caso dos cozinheiros e nutricionistas.
Pelo fato de suas atribuições estarem relacionadas especificamente à preparação
da comida, os auxiliares integram o grupo que trabalha dentro da cozinha, em relação
direta com os cozinheiros. E, por estarem mais perto destes, tanto no espaço físico
quanto pela função, há um maior contato entre eles e, assim, as suas reivindicações
estão mais relacionadas, o que gera sentimento de proteção e afeto entre estes dois
grupos. Os cozinheiros pedem para que os auxiliares de cozinha façam algumas coisas
da maneira como eles precisam e querem (como o corte de verduras) e, assim, nota-se
que os auxiliares estão subordinados, em algumas tarefas, aos cozinheiros.
Com relação às nutricionistas, há um maior distanciamento, sendo que o contato
só é feito através do mural ou quando é preciso pedir alguma coisa. Porém, reconhecem
a autoridade destas, inclusive as limitações das mesmas frente à instituição, como é o
caso da liberação de dinheiro para a compra de materiais necessários. E, ao fazerem
isto, dão sustento ao poder das nutricionistas para que elas possam fazer os pedidos
necessários para os seus superiores.
Segundo a organização funcional da Seção de Nutrição, esses funcionários só
estão abaixo das nutricionistas na hierarquia, porém o que notamos é diferente, os
auxiliares também estão subordinados aos cozinheiros. Esta subordinação informal pode
ser explicada pela maior comunicação e contato, por serem estes os responsáveis pelo
término do preparo dos alimentos. Já com as nutricionistas, a relação fica restrita à
divulgação dos cardápios, que é feita por meio do mural.
Podemos compreender essa subordinação informal como uma subordinação que
é sustentada pelo vínculo da dependência e proteção, que se estabelece entre os
auxiliares e os cozinheiros. Por serem os cozinheiros muito respeitados dentro da seção,
já que são os principais responsáveis pelo produto final (a comida), os auxiliares
dependem destes para fazer a sua tarefa da maneira mais eficiente e melhor possível.
Esses dois grupos de trabalho estão sempre muito perto, trabalhando no mesmo
ambiente e tendo funções que se complementam, porém, com os cozinheiros tendo
maior “voz” dentro da seção. Sendo assim, os auxiliares assumem a posição de
subordinação e dependência, esperando também que, se necessário, sejam protegidos
por estes.
72
4.3.a Devolutiva da Análise do Auxiliares de Cozinha6
Referimo-nos a conhecimento como aquilo que entendemos do mundo e de nós
mesmos, pois é o que utilizamos para pensar e decidir sobre o que realizarmos e quais
são as ações necessárias para a nossa vida. Mas, este conhecimento só é adquirido
através das nossas atividades.
Cada grupo desenvolve uma série de conhecimentos específicos. Por realizar sua
função, os Auxiliares de Cozinha têm como funções: o pré-preparo de alimentos,
saladas, higienização da sua seção, das louças, do fogão e servir o refeitório. Essas
requerem conhecimentos como a diferenciação das verduras e legumes, dos tipos de
corte, dos produtos que devem ser utilizados na limpeza, na contagem de pessoas e
porcionamento das quantias no refeitório. Estes são alguns aspectos psicológicos que
desenvolvem e os quais utilizam também para fazer outras coisas durante a vida.
As setas são todas contínuas, representando a função dos Auxiliares, que requer
conhecimentos específicos e é institucionalizada pelo HU, e as outras, o conhecimento
dos outros grupos da seção.
Identidade
É um processo contínuo na nossa vida, que cria as nossas características
individuais e as do nosso grupo. Depende de como os outros nos tratam, a partir do que
pensam ou sabem de nós ou do grupo. As pessoas nos tratam a partir do que sabem de
nós e, se concordamos que somos como elas pensam, há uma identificação imediata. Se
não concordamos e negamos o que pensam ou fazem em relação a nós, lhes
apresentamos uma outra característica da nossa identidade, e elas e nós, alteramos os
nossos comportamentos, sentimentos e pensamentos. Trata-se de conhecer e reconhecer
o trabalho do outro, sendo que a partir desse reconhecimento, eu formo a minha
identidade. Com esse reconhecimento dos outros grupos, o grupo dos auxiliares formou
a sua própria identidade, diferenciando-se, pela função, dos demais grupos, e agindo
6 Elaborada por Priscilla Bolfer Moura e Leonardo Bastos
73
conforme tal. Sabe-se, assim, quais são as minhas funções e quais são as dos outros, que
está representada pelas setas contínuas.
A seta tracejada representa um conflito nessa identidade com a administração do
HU, pois a falta de condições de trabalho e outras dificuldades e facilidades para
realizar o trabalho é parte dos elementos que participam da identificação e que
influenciarão nas relações entre os diversos grupos.
Poder
O grupo dos auxiliares de cozinha tem poder reduzido por serem poucos e por
realizarem um trabalho repetitivo e habitual. Mas é o apoio para que outros grupos
consigam exercem seu poder, como é o caso dos cozinheiros e nutricionistas.
Pelo fato de suas atribuições estarem relacionadas especificamente à preparação
da comida, os auxiliares integram o grupo que trabalha dentro da cozinha, em relação
direta com os cozinheiros. E, por estarem mais perto destes, tanto no espaço físico
quanto pela função, há um maior contato entre eles e, assim, as suas reivindicações
estão mais relacionadas, o que gera sentimento de proteção e afeto entre estes dois
grupos. Os cozinheiros pedem para que os auxiliares de cozinha façam algumas coisas
da maneira como eles precisam e querem (como o corte de verduras) e, assim, nota-se
que os auxiliares estão subordinados, em algumas tarefas, aos cozinheiros.
Com as nutricionistas, há um maior distanciamento, sendo que o contato só é
feito através do mural ou quando é preciso pedir alguma coisa. Porém, reconhecem a
autoridade destas, inclusive as limitações das mesmas frente à instituição, como é o caso
da liberação de dinheiro para a compra de materiais necessários. E, ao fazerem isto, dão
sustento ao poder das nutricionistas para que elas possam fazer os pedidos necessários
para os seus superiores.
74
4.4 ANÁLISE GRUPO DE COPEIROS7
Para Lewin, o grupo constitui o terreno sobre o qual o indivíduo se mantém. O
indivíduo utiliza o grupo como um instrumento para satisfazer suas necessidades
psíquicas e sociais, sendo este grupo um dos elementos ou dos determinantes do espaço
vital. Este se caracteriza por formar o todo da realidade psicológica, contendo fatos
capazes de determinar o comportamento dos indivíduos e representando o padrão total
de fatores e influências que afetam o comportamento.
No estudo dos grupos funcionais, Baró colocou que estes são os principais
reguladores da vida social de uma pessoa, respondendo às exigências de cada ordem
social.
Na seção de nutrição, encontramos um grupo funcional, pois é um grupo que surgiu
da divisão social do trabalho, ou seja, há a necessidade deste grupo dentro do hospital
para atender a demanda da população, sendo composto por indivíduos de classe social
variada, cada um se diferenciando pelo papel que exerce dentro do grupo, abarcando
somente aspectos parciais da vida de seus membros, visto que, segundo o que se pode
observar com as reuniões da copa, as relações entre os membros do grupo só ocorre
durante o período em que estão desenvolvendo juntos sua atividade.
O relacionamento entre os membros do grupo, para se ter uma característica
funcional, deve ser impessoal, estritamente profissional, não havendo envolvimento
primário. Entre os membros do grupo da copa é este o tipo de relacionamento
característico.
Dentro de um grupo, cada indivíduo possui seu próprio campo psicológico, o qual
terá sua organização, dependendo da forma como os outros elementos envolvidos na
dinâmica estarão distribuídos neste campo. Não existe campo psicológico que possa ser
idêntico, mesmo que os indivíduos estejam fisicamente inseridos no mesmo campo, pois
dependerá da experiência individual, ou seja, dependerá da forma como o indivíduo
experimentará o campo, neste caso, a Seção de Nutrição.
Nosso trabalho se desenvolveu dentro de uma instituição pública, a qual já está
organizada por uma determinada hierarquia. O Hospital Universitário Maria Aparecida
7 Elaborada por Claudiane Coimbra da Silva e Fabíola Sampaio de Oliveira Córdova
75
Pedrossian segue normas, regido por uma legislação que regulamenta e fiscaliza o
funcionamento dos Hospitais Universitários Federais. Dentro da Seção de Nutrição, a chefia é exercida pelas nutricionistas, as quais
supervisionam os outros grupos de funcionários. Como para a Psicologia as relações são
mantidas intersubjetivamente, a hierarquia da Seção pode não estar mostrando
realmente quem são os líderes e reais detentores do poder.
Na hierarquia da Seção, os copeiros, como todos os outros funcionários, são
subordinados às nutricionistas. O contato deles com a chefia acontece todas as vezes
que os carrinhos estão arrumados e elas fazem a conferencia das baixelas, para verificar
se o porcionamento e a quantidade das mesmas está adequado à quantidade e
necessidade dos pacientes, ocorrendo também um segundo contato na volta das clínicas,
quando os copeiros entregam as prescrições alimentares que os médicos passaram aos
pacientes.
Para os copeiros desenvolverem o serviço, há a necessidade do uso de Funções
Psicológicas Superiores, as quais são construídas ao longo da história social do homem
e são mediadas por instrumentos e símbolos desenvolvidos culturalmente. As Funções
Superiores dependem de processos psicológicos elementares, de origem biológica, não
se podendo esquecer que estas estão inter-relacionadas com as Funções Psicológicas
Inferiores, ou secundárias, as quais são genética, estrutural e funcionalmente diferentes
das Funções Superiores.
As Funções Psicológicas Inferiores são imediatas, de origem natural e biológica,
submetidas a determinações fisiológicas, controladas pelo meio social e físico, além de
inconscientes e involuntárias. Já as Funções Psicológicas Superiores são mediadas,
mediação esta que se refere ao processo de representação mental e ao fato de que os
sistemas simbólicos que se interpõem entre o sujeito e o objeto de conhecimento têm
origem social. É por intermédio das relações que os processos passam de sociais para
individuais.
Dentre os processos psicológicos utilizados pelos copeiros, os mais importantes
são a atenção, percepção e concentração.
Na atenção, inclui-se o processo de selecionar as informações e ações
necessárias para se desenvolver uma determinada atividade, sempre mantendo um
controle para abstrair as demais informações necessárias. Manifesta-se na percepção,
nos processos motores e nos pensamentos. O que irá determinar a atenção serão os
estímulos externos e a própria atividade do sujeito.
76
As atividades diárias realizadas pelo grupo de copeiros exigem dos mesmos um
grau de atenção e concentração elevado, devido ao fato de estarem preparando parte dos
alimentos (sobremesa e lanche), os quais serão levados aos pacientes, também sendo
eles que porcionam as dietas normais.
Na percepção, ocorre o processo e registro de informações passadas pelos órgãos
dos sentidos. Incluem-se comportamentos motores e está ligada à experiência anterior.
É através da percepção que o sujeito consegue estabelecer os traços de um determinado
objeto, categorizá-lo, obter indícios como cor, tamanho, forma, função, etc. É
determinada pela tarefa que se coloca ao sujeito e pela atividade prática que ele
desenvolve.
Ao preparar as frutas para a sobremesa e o lanche, os copeiros devem sempre se
atentar para a qualidade das frutas, separar as que servem ou não para o consumo, para
isto, utilizando-se da percepção, atenção e concentração.
No preparo das baixelas, quando porcionam os alimentos a serem levados aos
pacientes, devem ter uma boa noção de quantidade, pois a comida não será pesada,
havendo a necessidade de sempre se atentarem para a conservação de volume.
Dentro das atividades realizadas pelos copeiros, há movimentos que já se
encontram automatizados, o que lhes possibilita pensar em outras coisas enquanto
trabalham. Lavar e vaporizar os materiais é um processo que já se configura como um
processo de linha, automatizado.
No trabalho que cabe aos copeiros, dentro da Seção de Nutrição, estes ajudam no
preparo dos alimentos, na linha de produção, mantendo também como função a entrega
do produto final ao seu destino, sendo o único grupo da Seção a manter contato direto
com os pacientes (alvo principal da linha de produção), ou seja, são eles os únicos que
visualizam o produto final do trabalho: o paciente se alimentando.
Este é um fator que diferencia o grupo dos copeiros dos demais grupos da Seção.
Para Baró, é necessário que o indivíduo capte o sentido funcional global, sabendo qual é
o produto final, e qual a função social que está sendo cumprida. É a organização que
distribui as tarefas para cada indivíduo, produzindo essa separação entre o que ele
realiza e o produto final. Dessa maneira, o indivíduo acaba atuando apenas como
sujeito, pois o objetivo da sua ação serve apenas como um passo intermediário dentro da
organização, o que faz com que sua tarefa perca sentido enquanto elemento de uma
totalidade.
77
Um dos problemas psicossociais mais graves ocorre quando a pessoa não sabe
muito bem o que está fazendo ou para que serve a sua atividade. A fragmentação da
atividade faz com que o indivíduo não tome consciência do que realmente faz.
Para o autor, nada há de mais destruidor para o psiquismo do que o sentimento de
não servir para nada. Toda tarefa perde sentido e a pessoa obrigada se sente ofendida em
sua dignidade, como sujeito humano.
Sendo assim, a organização da Seção se configura como alienante, dividida e
hierarquizada, onde, neste processo de produção, é impossível se adquirir o domínio de
todas as fases por quais passam a preparação dos alimentos.
Quando se fala em grupo funcional, o vínculo mais importante não é o que ocorre
entre os membros do grupo, e sim o que ocorre entre o grupo e outros grupos
funcionais, pois a identidade do grupo irá se constituir frente aos outros grupos, os quais
irão reconhecer, requerer e complementar a função social.
Baró coloca que se há uma estrutura de grupo, há uma totalidade, que é maior do
que as partes. Surge daí, então, normas que irão regular a relação entre os membros do
grupo.
Há dentro do grupo de copeiros, regras fixadas por eles mesmos, onde cada
indivíduo fica responsável por uma clínica e, cada clínica, corresponde a um
determinado serviço na linha de produção. Por exemplo: o responsável pela pediatria,
pode ficar responsável também por higienizar as baixelas. Isto é uma regra, à qual todos
obedecem e cada qual fazendo sua parte, deixando o grupo com uma maior coesão, sem
possibilidade de se dispersarem e, com isto, sem conflitos advindos de problemas
decorrentes de divergências do serviço.
Se, por ventura, há algum conflito, as dimensões de cada um dentro do grupo estão
claramente estabelecidas, cada qual sabe seu limite, sendo dentro desta relação que as
representações se constroem de forma uniforme e em consonância. As divergências
devem ficar sempre dentro de um certo limite para que não haja um rompimento, pois
dentro de um grupo, o indivíduo é parte da totalidade, e qualquer mudança que ocorra
neste grupo, irá afeta-lo diretamente.
Entre os copeiros há uma boa comunicação, a qual se mantém na medida em que
cada funcionário cumpre suas tarefas e, principalmente, seus horários.
Esta boa comunicação, segundo relato, não pode ser vista nas relações intergrupos
da Seção. Como cada grupo fica responsável por uma determinada parte da produção e
78
os copeiros não ajudam no preparo das maiores refeições (almoço e jantar). Segundo o
grupo, não há comunicação intergrupos, cada um fazendo a sua parte, sendo que o
horário de descanso também é diferente, então quase não mantendo relação.
Apesar da pouca relação intergrupos, quando da necessidade da substituição de
um membro do grupo da copa, por um membro de outro grupo, a mudança ocorre
pacificamente, já que respaldados por regras rígidas, este não terá como causar nenhuma
mudança na organização do trabalho grupal.
O que caracteriza a importância do trabalho da copa, para os copeiros, é a
questão de que são eles que levam coisas boas para os pacientes: “É através da
alimentação que os pacientes conseguem aumentar suas defesas, sem alimentação não
há recuperação”, remetendo-se muito à questão da ajuda.
Gostam de exercer esta função, porque desta maneira, podem ajudar os
pacientes. Nenhum dos copeiros perguntados gostaria de exercer outra função neste
momento.
O fator mais importante para se manter uma boa saúde, é ter uma qualidade na
alimentação. A questão de se alimentar ou alimentar o outro representa prazer e
relacionamento social.
Além do valor nutricional, não se pode esquecer do valor emocional que envolve
o ato de alimentar. Aquele que alimenta é tido como próximo, aquele que ajuda,
sustenta, acolhe e cuida.
4.4.a Devolutiva da Análise do Grupo de Copeiros8
Conforme o que já foi dito pelos grupos anteriores, nos baseamos no
trabalho como determinante da organização da vida dos indivíduos. É através da
atividade principal, em nosso caso o trabalho na copa, que as pessoas fazem sua
interação com a sociedade, formando seus pensamentos, emoções e seus
comportamentos.
Os copeiros estão inseridos na Seção de Nutrição, conforme o primeiro slide
(slide 1) que vocês viram, assim, também, sofrendo as influências do Núcleo do
Hospital Universitário, da Universidade Federal (de Mato Grosso do Sul) e,
consequentemente, do Ministério da Saúde e da Educação.
Apresentaremos uma representação gráfica da análise psicológica que fizemos, a
partir dos encontros realizados com os copeiros, do que eles nos disseram acerca do
8 Elaborada por Claudiane Coimbra da Silva e Fabíola Sampaio de Oliveira Córdova
79
trabalho realizado por eles junto a esta Seção e das interações que se dão com os outros
grupos. Não falaremos sobre relações inter-pessoais, mas sobre as relações que se dão
entre os grupos, independente de quem participe deles.
Partiremos dos conceitos de conhecimento, identidade e poder, porque são os
aspectos psicológicos que sempre aparecem nas relações de grupos analisados a partir
Psicologia. Nos slides, as setas são as representações dos processos psicológicos
envolvidos nas relações citadas, não significando que estas relações acontecem isoladas
e independentes das outras que já foram e serão apresentadas pelos outros grupos, pois
tais relações acontecem simultaneamente.
Em nosso primeiro slide, falaremos sobre o aspecto psicológico do
conhecimento, que é adquirido pela própria atividade desenvolvida pelo indivíduo,
sendo utilizado para realizar suas atividades cotidianas, fazendo com que ele entenda o
mundo e as outras pessoas.
Percebemos que no grupo dos copeiros não há conflitos em suas relações com os
grupos dos cozinheiros, auxiliares de cozinha, nutricionistas e com o Hospital
Universitário, no que se trata do conhecimento. Contudo, em suas falas, não notamos
que saibam sobre os grupos de assistentes administrativos e auxiliares operacionais.
Estabelecem, também, relação de conhecimento com as clínicas pelo contato que é
exigido pela sua função dentro da Seção de Nutrição.
No próximo slide, temos a análise psicológica acerca do aspecto identidade. A
identidade é o reconhecimento de atributos ao outro, que são acatados por este. Quando
as identidades são aceitas, não há conflitos entre os grupos. Com o grupo de copeiros,
vimos que com as nutricionistas, os cozinheiros e as clínicas não há conflitos. Todavia,
não ocorre o mesmo com o Hospital Universitário (HU), porque os copeiros relatam
dificuldades estruturais para realizarem seu trabalho, de responsabilidade do HU, como,
por exemplo, falta de materiais, materiais inadequados e estrutura física da cozinha.
Pelos copeiros terem um maior contato externo com a instituição, eles a enxergam de
maneira diferente em relação aos outros grupos da Seção e, talvez, por isso, apresentem
este conflito com o HU. Os copeiros apresentam um fortalecimento de identidade, pelas
ligações externas que estabelecem fora da Seção.
Neste slide, o aspecto psicológico tratado é o poder. Psicologicamente, poder
não designa hierarquia e coerção, e sim o confronto estabelecido entre os grupos em
função de suas relações. A perda de poder implica em colocar o outro em má situação,
sabendo que ela é má. O grupo de copeiros não busca estabelecer maiores relações de
80
poder dentro da Seção, além da que se estabelece, necessariamente, com a chefia
imediata. Provavelmente, tal configuração se deve ao fato de manterem relações
externas à própria seção, o que pode torná-lo marginal aos processos da própria Seção.
Notamos que pela vinculação com grupos externos mais fortes dentro da Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul, o grupo de copeiros consegue alguns privilégios, como
a contratação de mais funcionários.
81
4.5 ANÁLISE GRUPO DE ASSISTENTES ADMINISTRATIVOS9
Apresentaremos, agora, o resultado da análise dos dados recolhidos entre os
assistentes administrativos, lembrando que esses dados foram analisados de acordo com
uma teoria da Psicologia, e que se tivéssemos escolhido outra, poderíamos ter
encontrado algumas diferenças nesses resultados.
De acordo com essa teoria, o trabalho tem um papel determinante na vida das
pessoas. É através do trabalho que nos formamos, e a forma como nós pensamos,
sentimos e agimos está diretamente ligada ao trabalho que nós realizamos. Além disso,
a sociedade em que vivemos participa na formação de nossos aspectos psicológicos.
Devemos, portanto, considerar que a forma como a atividade é realizada na nutrição do
NHU e, conseqüentemente, os aspectos psicológicos que aparecem como resultado
dessa atividade são, também, afetadas pelos Ministérios da Saúde e da Educação e,
também, pela administração da UFMS – esses órgãos determinam algumas das relações
que são estabelecidas no NHU, e assim também na seção de nutrição. Por isso, estamos
considerando que o funcionamento psicológico é baseado tanto nas relações que os
homens mantêm entre si, como nas relações que são estabelecidas no meio externo.
Uma das primeiras considerações que devemos fazer quando analisamos a seção
de Nutrição, é que ela está dentro de uma instituição hospitalar – e, portanto, possui
algumas formas pré-estabelecidas de funcionamento, como, por exemplo, a
organização, a hierarquia e as tarefas que cada seção deve realizar. Além disso, o
trabalho segue uma forma de funcionamento determinada socialmente e que não
acontece só aqui no NHU: é a divisão do trabalho em partes, em que cada grupo realiza
uma etapa – e, portanto, cada grupo tem seus limites e possibilidades, determinados
pelas funções pré-estabelecidas, que no final dará origem à um único produto: no caso
de seção de Nutrição, o alimento para o hospital. Isso se chama Divisão Social do
trabalho, e foi uma forma encontrada pelos homens, há muito tempo, de realiza-lo. Essa
divisão do trabalho também teve efeitos sobre a forma como a gente vê o mundo e,
também, como são estabelecidas as nossas relações. Além de dividir o trabalho entre
diversos grupos, essa forma de divisão do trabalho dividiu também o trabalho
intelectual do trabalho prático, sedo o trabalho intelectual (que aqui nessa seção é
9 Elaborada por Lívia dos Santos e Guilherme Espindola.
82
realizado pelos nutricionistas e pelos assistentes administrativos) mais valorizado
socialmente, não significando que seja melhor ou mais importante que o prático.
Cada grupo dentro da seção, portanto, tem uma função diferente – foi criado e é
mantido pela instituição pública. Assim, todas as atividades que cada grupo realiza
devem ser entendidas também como resultado do que aconteceu ao longo da história do
NHU e da sociedade em geral.
Dessa forma, os conflitos que encontramos ao analisar os dados recolhidos aqui
não são culpa de ninguém, e nem são pessoais, mas causados pela forma que o trabalho
é executado, pelas próprias condições de trabalho – as características, os limites e as
possibilidades originados pela divisão de trabalho. Tanto que, caso os indivíduos de
cada grupo fossem trocados, os conflitos permaneceriam os mesmos.
4.5.a Devolutiva da Análise do Grupo de Assistentes Administrativos10
Para compreender as dificuldades que encontramos ao analisar os dados
recolhidos na Seção de Nutrição do NHU, escolhemos três categorias: conhecimento,
identidade e poder. Escolhemos essas categorias porque são processos psicológicos que
são a base para as relações humanas que existem em qualquer grupo, e nos ajudam a
entender como se dão essas relações. Elas serão apresentadas através de representações
gráficas que demonstram os processos psicológicos.
Antes, porém, de iniciar a apresentação dessas representações dos processos
psicológicos, gostaríamos de lembrar que elas foram separadas por grupo apenas para
facilitar a sua apresentação. Elas acontecem todas ao mesmo tempo e, além disso, essas
representações não são constantes, mas estão sempre em mudança. Elas foram
separadas por grupo, e como grupo, entendemos um conjunto de pessoas que mantém
relações entre si e fazem isso de acordo com normas que já foram estabelecidas.
A primeira representação gráfica dos processos psicológicos é a referente ao
conhecimento, lembrando que, aqui, entendemos conhecimento como aquilo que eu sei
a respeito dos outros grupos (como funciona, quais as funções, etc.) e que participa da
minha constituição psicológica.
10 Elaborada por Lívia dos Santos e Guilherme Madureira Espindola
83
As setas pontilhadas representam os processos psicológicos que apresentam
dificuldades: com o grupo das nutricionistas, no que diz respeito às muitas requisições,
que devem ser feitas o tempo todo. Além disso, o relacionamento entre as nutricionistas
e os assistentes administrativos é, por vezes, desgastante e causam problemas e
irritações para os assistentes administrativos.
Em relação aos auxiliares de cozinha, o conflito acontece porque eles tentam
burlar o esquema das requisições e pedem a liberação de alimentos/produtos sem ter
requisição. E o conflito com os auxiliares operacionais é, exatamente, por serem
liberados, às vezes, sem requisição: eles só percebem isso quando o material do
almoxarifado não bate com a relação do sistema SIGMA, sendo, então,
responsabilizados os assistentes administrativos.
Quanto à próxima representação gráfica dos processos psicológicos, refere-se à
identidade grupal, que é o que o grupo é, as suas particularidades que o diferenciam
dos outros grupos, como eles são e como os outros o reconhecem. Esse aspecto não
apresenta nenhum conflito com os grupos que os assistentes administrativos se
relacionam: o núcleo hospital universitário, as clínicas, as nutricionistas, os auxiliares
operacionais, cozinheiros, auxiliares de cozinha e copeiros.
Quanto à próxima representação, refere-se ao poder. Entendemos um grupo
como poderoso, sempre quando ele conseguir dispor de meios, tiver formas de ter
vantagens para a consecução de seus objetivos nas relações com outros grupos, de
forma que ele possa alcançar os objetivos e, inclusive, impor sua vontade sobre os
outros grupos.
Existe uma relação de poder com as nutricionistas, já que são os assistentes
administrativos que entram em contato com os fornecedores e realizam o controle
financeiro da Seção. Existe também uma relação conflituosa de poder com os auxiliares
operacionais. Essa relação é estabelecida hierarquicamente, mas em alguns momentos,
quando é liberado material sem que haja requisição, é desrespeitada a hierarquia, que
determina que só serão liberados materiais com a requisição.
84
4.6 ANÁLISE DO GRUPO DE AUXILIARES OPERACIONAIS11
A Seção de nutrição do N.H.U pode ser caracterizada como um grupo, pois os
funcionários estão organizados num processo de relação mútua e organizada com a
finalidade de atingir um objetivo em comum: a produção das refeições para os demais
funcionários e pacientes, contribuindo assim para a possível manutenção e recuperação da
saúde destes.
A seção de nutrição é organizada em diversas atividades para que se atinja o
objetivo de transformar os alimentos e direcioná-los para seu fim: alimentar e tratar os
“pacientes e funcionários”. E cada uma destas atividades é realizada por uma determinada
quantidade de funcionários com objetivos definidos, como por exemplo: cozinheiros,
copeiros, assistentes administrativos, auxiliares operacionais, etc.
Os copeiros trazem as informações das dietas dos pacientes para as nutricionais, que
por sua vez, montam o cardápio e passam para os Assistentes Administrativos que fazem o
pedido e montam a requisição. Esses funcionários levam a requisição para as Nutricionais
assinarem e logo trazem para os Auxiliares Operacionais, os quais são encarregados de
fazer a entrega dos produtos necessários mediante o controle da requisição.
Os auxiliares operacionais são os responsáveis pelo almoxarifado, são eles que
cuidam do abastecimento dos materiais, produtos alimentícios perecíveis e não perecíveis;
de higienização e outros necessários. As atividades desenvolvidas pelos auxiliares
operacionais são importantes, para garantir o controle dos produtos. Essas atividades são
divididas e organizadas através de normas e regras, como a entrega de materiais unicamente
sob a apresentação de requisição; horário de entrega de alguns materiais sempre em
horários previamente estabelecidos para que se possa dar continuidade aos procedimentos
de preparo dos alimentos; liberação de mais produtos para o preparo dos alimentos somente
com autorização da chefia; horários de entrada e saída na seção, etc. Estas e demais regras e
normas no decorrer do trabalho destes são organizadas, estabelecidas e modificadas
11 Elaborada por Éder Blanco e Luciléa Arguelho
85
unicamente pelas nutricionistas, que assumem desta forma a posição mais elevada dentro
da escala hierárquica.
Os três funcionários do almoxarifado são contratados pela FAPEC, por regime CLT,
fato que não proporciona nenhuma estabilidade ao emprego, podendo ser rompido o
contrato a qualquer momento, com os devidos acertos de direitos previstos no regime de
contrato. Esse fato pode ser um reforçador para a união do grupo, que se mostrou bem
disposto a ajudar um ao outro e colaborar com o trabalho geral do almoxarifado.
Este subgrupo, segundo Kurt Lewin é entendido como um grupo minoritário, pois o
destino do grupo depende diretamente da vontade da maioria psicológica, que dentro deste
contexto é entendida como o grupo das nutricionistas. Pois, segundo Lewin é o grupo
majoritário que cria e organiza os valores, regras e normas para manutenção dos grupos
minoritários.
O fato dos auxiliares operacionais terem seus contratos através de um regime
diferenciado dos demais funcionários (CLT), faz com que subjuguem-se à autoridade das
nutricionistas, já que estas possuem o domínio burocrático, podendo decidir a respeito de
uma nova contratação ou não, sendo que são as responsáveis diretas pelo gerenciamento do
trabalho desempenhado por estes. Isto faz com que passe a existir uma identificação no
grupo, já que se sentem iguais frente ao mesmo perigo, passando a existir um espírito de
ajuda e proteção mútua entre os integrantes do grupo, fato observado através das entrevistas
feitas, quando dizem que se ajudam para não sobrecarregar o funcionário do outro turno, e
que sempre se retribui com outros favores.
Ao mesmo tempo, os auxiliares operacionais sentem-se acuados no momento em
que são pressionados pelo grupo de cozinheiros, que é visto como um grupo forte dentro da
Seção. Quando falta algum produto para que possa terminar a refeição, os cozinheiros
pedem o produto diretamente ao almoxarifado, e os funcionários somente têm autorização
de liberar o produto sob autorização prévia por parte das nutricionistas, através de
preenchimento e assinatura de requisição. E muitas vezes os cozinheiros não querem
esperar este processo burocrático, e ao mesmo tempo hierárquico, o que gera um conflito
entre ambos os grupos. Os cozinheiros querem que os auxiliares operacionais liberem
alguns produtos além dos que foram requisitados, no entanto, esses funcionários não podem
86
fazer essa liberação, fato que leva os cozinheiros a ficarem brabos com os auxiliares
operacionais.
Através da prática das atividades que desenvolvem no seção, os funcionários
passaram a melhorar os processos psicológicos necessários à realização destas atividades
particulares, como a atenção, memória, cálculo e abstração reflexiva. Estes processos são
bastante utilizados por estes para a realização de tarefas como:
Lembrar quais produtos estão próximos a vencer;
Quais os hortifruti que estão em maior quantidade e precisam ser liberados
mais rapidamente e em maiores quantidades;
Quanto tempo durará o estoque de carne de acordo com o consumo, para que
seja possível a previsão de um novo pedido de compra;
Qual o procedimento a ser tomado frente a um produto novo e desconhecido,
de acordo com os conhecimentos adquiridos.
Estes processos psicológicos são necessários para o desempenho de tais atividades,
tornando o fluxo sempre contínuo para obtenção do objetivo final.
As atividades desenvolvidas nesta seção passam a ser uma forma de unir o grupo,
pois a não realização destas atividades se torna um perigo ao grupo que se sente
pressionado pelo grupo majoritário, e ao mesmo tempo passa a existir uma pressão interna,
dos integrantes do próprio subgrupo, o que Kurt Lewin considera o ódio a si mesmo, por
sentirem que a não realização e conclusão do objetivo podem deixá-los ridicularizados e
mal vistos frente aos demais grupos, ou até mesmo responsabilizados por uma possível
falha na produção dos alimentos, podendo custar o próprio emprego.
Desta forma o grupo dos auxiliares operacionais, constrói vínculos afetivos que os
unem, e fazem entender que os problemas enfrentados por eles são problemas do grupo e
não individuais, o que os torna um grupo unido e coeso.
De acordo com Baró, esse grupo passa a ser definido como um grupo funcional. O grupo
funcional surge em função de uma necessidade social, então possui uma estrutura. Segundo
87
Baró, “se não tiver um mínimo de estruturação não se pode falar em grupo funcional”,
dessa maneira, devem existir normas que regulem as relações entre seus membros. A Seção
de Nutrição é um grupo funcional, tem um objetivo para alcançar (produção das refeições),
sendo que para isso ser possível existem regras e normas que devem ser cumpridas, como
por exemplo, a forma de trabalhar e os horários de trabalho a ser cumpridos. É necessário
ressaltar que o grupo em si torna-se mais “importante” que seus membros isoladamente.
Além disso, a estruturação do grupo funcional não requer que haja
relacionamentos estreitos entre seus membros, ao contrário, as relações existentes nesse
grupo são geralmente de caráter impessoal, profissional. Assim os vínculos mais
importantes são os que relacionam os membros ao grupo e não os que relacionam os
membros entre si. Dessa forma, os s relacionamentos mais “fortes” na Seção é mais de
caráter profissional.
No grupo funcional é enfatizado o que ele faz (função) e não quem faz, no
entanto, isso não significa que as características individuais são ignoradas, já que
algumas funções necessitam de características peculiares. No caso dos auxiliares
operacionais, existem características essenciais ao desenvolvimento de seu trabalho,
como por exemplo, ser atencioso à qualidade do produto e aos prazos de validade.
No grupo funcional o importante não é a identidade pessoal de seus membros
(como nos grupos primários), mas sua capacidade de desenvolver determinada tarefa, -
no caso deles: cuidar do almoxarifado, liberar os produtos corretamente para que o
objetivo final (comida) seja concluído, mas que o estoque não seja desfalcado. Eles se
identificam no seu trabalho. Ainda segundo Baró, cada grupo desenvolve sua identidade
frente ao que os outros esperam dele.
Baró enfatiza ainda o processo de coesão interna do grupo quando se vê ameaçado
por outro. Talvez o fato de eles serem pressionados pelos cozinheiros a liberarem alguns
produtos que não estão autorizados pela requisição, os torna mais coeso. No momento
em que isso acontece os auxiliares se protegem entre si.
Em relação ao poder do grupo, Baró diz que o poder de um grupo depende de sua
identidade, mas por sua vez, sua identidade é em parte definida por seu poder. Além
disso, o poder surge e existe como tal somente nas relações entre as pessoas e os grupos.
88
O poder dos grupos funcionais surge mediante demanda social. A partir daí os
grupos buscam estender seu poder a outros campos, pois o poder social não busca
somente a realização de sua tarefa, mas também defender seu status, entretanto pode ser
que esse poder apareça claramente somente nos momentos de conflitos. No momento
quem que os cozinheiros pressionam os auxiliares operacionais a liberarem produtos que
não constam na requisição, eles reforça o poder dos assistentes administrativos e das
nutricionistas, já que entendem que não podem realizar essa liberação.
Podemos então pensar na questão da disputa de poder no seção de nutrição; a
definição de quem tem mais poder tem sido uma questão crucial, pois os cozinheiros não
têm obedecido às escalas de serviço e a outras ordens das Nutricionais. O que gerado
uma situação difícil de solucionar.
A organização do grupo funcional, a importância do seu papel social e o lugar que
ocupa em sua relação com outros grupos, pode depender de uma maneira essencial de
sua direção ou liderança. Então necessário existir um líder que direcione o grupo, porém
na Seção de Nutrição o líder não está conseguindo exercer seu poder institucionalizado,
tendo grandes dificuldades em dirigir o seção.
4.6.a Devolutiva da Análise do Grupo de Auxiliares Operacionais12
O que estamos apresentando aqui é resultado da análise psicológica dos dados que
coletamos no decorrer de nosso estágio, durante os encontros que tivemos com os
trabalhadores responsáveis pelo almoxarifado.
Nós escolhemos uma das teorias Psicológicas para podermos nos basear e fazer
essa análise. Desta forma, se nós tivéssemos utilizado outra linha teórica da psicologia,
esses resultados seriam outros, pois cada teoria psicológica possui formas diferentes de
entender o homem e o mundo.
Dentro desta teoria que trabalhamos, entende-se que o trabalho organiza a vida do
homem, já que ele constitui pensamento, formas de sentir as coisas, formas de agir e de
constituir sua consciência.
A teoria que nós usamos considera que também as relações que estabelecemos na
12 Elaborada por Éder Blanco e Luciléa Arguelho
89
sociedade, em geral, participam da formação dos nossos aspectos psicológicos.
A análise feita aqui, dentro desta linha teórica, trata das relações intergrupais, e não
de modo individual.
As atividades desenvolvidas pelos funcionários do almoxarifado sofrem influência
direta de diferentes níveis hierárquicos, tanto internos ao hospital como fora dele, como,
por exemplo: todo controle dos materiais e produtos do almoxarifado são controlados
diretamente pelas nutricionistas que, por sua vez, prestarão contas à direção do NHU, que
depende por sua vez de verbas do governo federal, que são repassadas através dos
Ministérios da Saúde e da Educação.
Esses diferentes níveis de relações, entre o NHU e os ministérios, influenciam as
atividades desenvolvidas e os aspectos psicológicos dos funcionários dos diversos grupos
da Seção de Nutrição, como, por exemplo: a liberação dos materiais e produtos, dentro da
Seção é feita pelos funcionários do almoxarifado; os produtos são comprados por uma
determinada quantidade, para um determinado período, porém, nem sempre isto é
proporcional à real necessidade da instituição, pois não se tem como prever a quantidade de
pessoas que irão adoecer em nossa cidade. Desta forma, pode acontecer de acabar algum
produto antes do tempo previsto. Quando isso acontece, é necessário que se faça novo
pedido de compras e, para que este seja autorizado, é necessário que se tenha verba para tal
necessidade e, se por acaso não possuir, o NHU ficará sem este produto, o que acarretará
diversos problemas, tanto aos pacientes, como aos funcionários. Nesse tempo, houve falta
de carne, acontecendo que tiveram de substituir esta por ovo ou soja.
Assim, percebemos que muito dos problemas acarretados à Seção, na verdade, são
de ordem acima da questão individual, estando além de suas condições.
Esta Seção é formada por subgrupos que se relacionam, condicionados pelas
interações anteriormente citadas, além das suas próprias condições, como está mostrado
aqui nessa representação gráfica.
Então, estamos analisando aqui, entendendo que o funcionamento psicológico do
ser humano está baseado nas relações sociais que as pessoas mantêm entre elas e entre o
meio externo social.
A Seção de Nutrição é dividida em diferentes subgrupos, e cada um é responsável
por funções diferentes, por uma etapa da produção, como, por exemplo, os auxiliares
90
operacionais pela liberação e controle dos produtos e alimentos e, assim, os demais grupos
por suas atribuições.
A forma como é organizada cada instituição e como o trabalho deve ser realizado é
determinado de acordo com as necessidades sociais, assim, se dá o que é chamado de
Divisão do Trabalho, que consiste em separar por etapas e por grupos as tarefas que devem
ser executadas.
Entendendo que alguns dos problemas e dificuldades enfrentados na seção não
dependem diretamente dos funcionários do almoxarifado, assim como sua própria
organização, como horas de trabalho, entrada e saída do trabalho, compras de produtos,
etc., qualquer que seja a pessoa que esteja na seção, enfrentará a mesma dificuldade
encontrada pelos atuais funcionários da seção, ou seja, não são problemas Individuais, mas,
sim relacionados à maneira como esta organiza o trabalho e como este é executado,
resultante dos limites e possibilidades dada pela divisão do trabalho, impondo, assim, a
cada grupo, o que foi determinado e constituído historicamente.
Para que sejam mais bem compreendidas estas dificuldades, trabalharemos três
aspectos psicológicos de grupos, nesta análise:
• CONHECIMENTO;
• IDENTIDADE;
• PODER.
Estas categorias foram escolhidas por serem processos psicológicos que são base
das relações humanas existentes em qualquer grupo e que nos ajudam a compreender
melhor a forma como se dão estas relações.
Conhecimento é aquilo que nós entendemos do mundo e de nós mesmos e que
utilizamos psicologicamente para realizarmos as ações necessárias para as nossas vidas e
que é adquirido através das nossas próprias atividades. É o conhecimento de nossas funções
e das funções desempenhadas pelos outros. O conhecimento é determinado em relação às
funções desempenhadas, referindo-se àquilo que entendemos do mundo e de nós mesmos e
que utilizamos psicologicamente para realizarmos as ações necessárias para as nossas vidas,
sendo adquirido através das nossas próprias atividades.
A identidade é aquilo que orienta a nossa atividade, quer dizer, eu sei o que eu faço
e sei o que o outro faz. Mas não é só saber o que o outro faz, é, também, reconhecer a
91
importância e valorizar o trabalho do outro. A identidade se dá em reconhecer suas
atividades e as dos demais grupos.
O Poder é entendido como a capacidade que um grupo tem de alcançar seus
objetivos, ressalvando que este poder não significa coerção ou punição de um sobre outro,
mas são as possibilidades e os limites que são dados a cada grupo, por meio do trabalho que
cada um destes grupos desempenha. Em outras palavras, o poder não está relacionado à
ambição ou à tentativa de tomar o lugar do outro ou pela vontade de comandar e submeter,
mas está relacionado à própria condição de trabalho de cada grupo e às possibilidades e/ou
limites que esta condição estabelece. O poder é, primeiramente, atribuído pela instituição e,
em um segundo momento, estabelecido nas correlações entre os grupos. Por ser dado
institucionalmente, a hierarquia impede que um grupo se sobreponha a outro grupo, porém,
esta não garante a obediência à autoridade. O poder pode ser reorganizado nas correlações
entre os grupos, tendo em vista que é dinâmico e depende das relações entre os diversos
grupos envolvidos nos objetivos e interesses.
Analisando o gráfico que representa estas categorias, vemos que a seta reta
apresenta determinados tipos de relações: poder, identidade ou conhecimento, e as
pontilhadas configuram algum tipo de conflito nas relações.
Lembrando que o que estamos apresentando aqui é o resultado de análise dos dados
que obtemos os grupos.
Em relação ao gráfico que representa conhecimento, não há nenhum conflito, já
que eles reconhecem o próprio trabalho e conhecem o trabalho dos demais; conhecem as
normas e regras estabelecidas pela instituição.
Em relação ao gráfico da identidade, os auxiliares operacionais apresentam
conflitos relacionados aos grupos dos Cozinheiros, Auxiliares de Cozinha e Copeiros. Esse
conflito acontece por não respeitarem as regras estabelecidas pela seção, de pedirem
produtos ao almoxarifado sem a apresentação de requisição. A partir do momento que não
são cumpridas tais regras, ocorre um processo de negação ou não reconhecimento das
atribuições destes funcionários (Auxiliares Operacionais), não sendo reconhecidos ou tendo
sua identidade negada por estes grupos, eles próprios passando a não se reconhecerem
como tal. A seta do HU para os auxiliares operacionais encontra-se pontilhada por
problema estrutural em relação ao tamanho do almoxarifado (muito pequeno) e à falta de
92
materiais necessários para sua função.
No gráfico de poder, existe conflito com todos os grupos do gráfico, menos com a
Clínica Médica, com a qual não possuem nenhum tipo de relação. O conflito acontece com
os cozinheiros, auxiliares de cozinha e copeiros, pois estes muitas vezes pedem materiais
sem a requisição preenchida e autorizada pelas nutricionistas. Isso acarreta uma série de
conseqüências ao grupo dos Auxiliares Operacionais, já que, ao liberarem os materiais sem
autorização, isto irá desfalcar os produtos do estoque, que não serão contabilizados no
programa de controle.
Assim, estes funcionários serão cobrados pelos assistentes administrativos e
nutricionistas, por este desfalque, o que gerará uma série de sanções administrativas a estes,
podendo até mesmo acarretar em perda do emprego na instituição, principalmente por
serem contratados por regime CLT.
93
5. REPRESENTAÇÕES GRÁFICAS DAS ANÁLISES DA SEÇÃO DE NUTRIÇÃO DO HU.
Clínicas
Nutricionistas
CopeiroAss.
Administrativo
Aux. Operacional
Cozinheiro
Aux. Cozinha
Hospital Universitário
Ministério da Saúde UFMS Minist. da Educação
ORGANOGRAMA
94
Clínicas
Nutricionistas
CopeiroAss.
Administrativo
Aux. Operacional
Cozinheiro
Aux. Cozinha
Hospital Universitário
Ministério da Saúde UFMS Minist. da Educação
NUTRICIONISTAS
CONHECIMENTO
Clínicas
Nutricionistas
CopeiroAss.
Administrativo
Aux. Operacional
Cozinheiro
Aux. Cozinha
Hospital Universitário
Ministério da Saúde UFMS Minist. da Educação
NUTRICIONISTAS
IDENTIDADE
95
Clínicas
Nutricionistas
CopeiroAss.
Administrativo
Aux. Operacional
Cozinheiro
Aux. Cozinha
Hospital Universitário
Ministério da Saúde UFMS Minist. da Educação
NUTRICIONISTAS
PODER
96
Clínica
Nutricionistas
CopeiroAss.
Administrativo
Aux. Operacional
Cozinheiro
Aux. Cozinha
Hospital Universitário
Ministério da Saúde UFMS Minist. da Educação
Conhecimento
97
Clínica
Nutricionistas
CopeiroAss.
Administrativo
Aux. Operacional
Cozinheiro
Aux. Cozinha
Hospital Universitário
Ministério da Saúde UFMS Minist. da Educação
Identidade
98
Clínica
Nutricionistas
CopeiroAss.
Administrativo
Aux. Operacional
Cozinheiro
Aux. Cozinha
Hospital Universitário
Ministério da Saúde UFMS Minist. da Educação
Poder
Clínicas
Nutricionistas
CopeiroAss.
Administrativo
Aux. Operacional
Cozinheiro
Aux. Cozinha
Hospital Universitário
Ministério da Saúde UFMS Minist. da Educação
AUXILIARES DE COZINHA
CONHECIMENTO
HU
99
Clínicas
Nutricionistas
CopeiroAss.
Administrativo
Aux. Operacional
Cozinheiro
Aux. Cozinha
Hospital Universitário
Ministério da Saúde UFMS Minist. da Educação
AUXILIARES DE COZINHA
IDENTIDADE
HU
100
Clínicas
Nutricionistas
CopeiroAss.
Administrativo
Aux. Operacional
Cozinheiro
Aux. Cozinha
Hospital Universitário
Ministério da Saúde UFMS Minist. da Educação
AUXILIARES DE COZINHA
PODER
Clínicas
Nutricionistas
CopeiroAss.
Administrativo
Aux. Operacional
Cozinheiro
Aux. Cozinha
Hospital Universitário
Ministério da Saúde UFMS Minist. da Educação
COPEIROS
CONHECIMENTO
HU
101
Clínicas
Nutricionistas
CopeiroAss.
Administrativo
Aux. Operacional
Cozinheiro
Aux. Cozinha
Hospital Universitário
Ministério da Saúde UFMS Minist. da Educação
COPEIROS
IDENTIDADE
HU
102
Clínicas
Nutricionistas
CopeiroAss.
Administrativo
Aux. Operacional
Cozinheiro
Aux. Cozinha
Hospital Universitário
Ministério da Saúde UFMS Minist. da Educação
COPEIROS
PODER
Assistentes administrativosAssistentes administrativos
Clínicas
Nutricionistas
CopeiroAss.
Administrativo
Aux. Operacional
Cozinheiro
Aux. Cozinha
Hospital Universitário
Ministério da Saúde UFMS Minist. da Educação
CONHECIMENTO
HU
103
Assistentes administrativosAssistentes administrativos
Clínicas
Nutricionistas
CopeiroAss.
Administrativo
Aux. Operacional
Cozinheiro
Aux. Cozinha
Hospital Universitário
Ministério da Saúde UFMS Minist. da Educação
IDENTIDADE
HU
104
Assistentes administrativosAssistentes administrativos
Clínicas
Nutricionistas
CopeiroAss.
Administrativo
Aux. Operacional
Cozinheiro
Aux. Cozinha
Hospital Universitário
Ministério da Saúde UFMS Minist. da Educação
PODER
105
Clínicas
Nutricionistas
CopeiroAss.
Administrativo
Aux. Operacional
Cozinheiro
Aux. Cozinha
Hospital Universitário
Ministério da Saúde UFMS Minist. da Educação
AUXILIARES OPERACIONAIS
CONHECIMENTO
HU
Clínicas
Nutricionistas
CopeiroAss.
Administrativo
Aux. Operacional
Cozinheiro
Aux. Cozinha
Hospital Universitário
Ministério da Saúde UFMS Minist. da Educação
AUXILIARES OPERACIONAIS
IDENTIDADE
HU
106
Clínicas
Nutricionistas
CopeiroAss.
Administrativo
Aux. Operacional
Cozinheiro
Aux. Cozinha
Hospital Universitário
Ministério da Saúde UFMS Minist. da Educação
AUXILIARES OPERACIONAIS
PODER
107
6- CONCLUSÃO
Conforme comentamos anteriormente, constatam-se alguns problemas de
comunicação, como bloqueios, filtragens e ruídos. Porém, estes não são causas, mas
conseqüências de algo anterior e mais amplo que os grupos trazem em sua história e que
possui relação com as noções do contexto social como um todo.
Assim, o individualismo, a disputa e a competitividade são algumas destas
determinações, próprias da cultura desenvolvida pelo sistema capitalista, e que dão origem,
no presente caso, a estes problemas de comunicação nas relações inter-pessoais e grupais.
É preciso, salientar também, que ainda que tenhamos apresentado as análises
separadamente, o fizemos apenas para fins didáticos. Para uma melhor compreensão sobre
os processos psicológicos existentes nestes grupos e seus subgrupos.
Optamos por eleger três aspectos psicológicos dos grupos para a análise, quais
sejam: Conhecimento, Identidade e Poder, os quais foram apresentados aqui também, sob a
forma de representações gráficas que demonstram os processos psicológicos e que
sintetizam os resultados e conclusões a que chegamos.
Elegemos esses aspectos por serem processos psicológicos que são base das
relações humanas existentes em qualquer grupo e que nos ajudam a compreender melhor a
forma como se dão estas relações.
Contudo, cabem alguns esclarecimentos:
1) Estas representações não significam algo constante, que nunca muda, pelo
contrário, todos os elementos considerados estão sempre em alteração, pois são
processos dinâmicos;
2) Vimos que estes conceitos (identidade, conhecimento e poder) estão
relacionados entre si e não podemos considerá-los como elementos isolados e
soltos, pois todos eles estão presentes, ainda que de modo implícito, nas relações
de trabalho de um grupo. Assim, determinam e constituem a forma de
entendimento das pessoas e a forma destas verem a si e ao mundo;
3) O que chamamos de Grupo aqui se refere aos aspectos que se constituem pela
interação entre os membros, pela interdependência entre eles, pela motivação e
108
existência de um objetivo comum a todos e pela existência de uma identidade ou
reconhecimento dos membros entre si, enquanto partes de um mesmo todo.
4) Por Conhecimento, nos referimos àquilo que entendemos do mundo e de nós
mesmos e que utilizamos psicologicamente para realizarmos as ações
necessárias para as nossas vidas e que são adquiridos através das nossas próprias
atividades;
5) Por Identidade, entenda-se aquilo que a instituição e os outros esperam do
grupo, a expectativa que há sobre ele grupo e que o mesmo, de certa forma,
acata e procura corresponder, se reconhecendo ou se identificando com esta
expectativa, através de um conjunto de idéias que cada tem sobre si e sobre os
demais grupos. Este conjunto de idéias que compreendem a identidade,
influência e constitui a própria forma de ver o mundo, a si, ao seu grupo e seu
próprio trabalho.
6) Por Poder, aqui, não nos referimos à ambição, ao desejo de subordinar, mandar
ou tomar o lugar do outro, nem à coerção ou punição, mas às possibilidades e
limites que são dados institucionalmente e pelas próprias condições de trabalho
de cada grupo. Assim, poder é a possibilidade ou capacidade de um grupo em
atender suas necessidades no seu trabalho. Este poder não é algo fixo, mas
dinâmico e dependente das relações entre os diversos grupos envolvidos nos
objetivos e interesses. O poder, enquanto aspecto psicológico, também
influencia, em cada grupo, a forma de ver o mundo, a si e ao próprio trabalho.
Os conflitos constatados e que foram apresentados aqui, possuem implicações
psicológicas relevantes, pois determinam as formas de percepção de cada grupo, ou seja, o
modo como estes grupos vêem a si e aos outros. Assim, tais conflitos determinam, em cada
grupo, um modo de percepção que perpassa pela questão da desvalorização do trabalho dos
demais grupos e até do próprio trabalho, bem como pela questão do desrespeito às
diferenças inerentes a cada grupo e ao trabalho desenvolvido por cada um destes dentro da
instituição.
Para alcançarmos a qualidade nas relações, apresentamos a seguinte proposta: que
se efetue regularmente reuniões sistemáticas e programadas com todo o grupo
109
(considerando as possibilidades e dificuldades das escalas de trabalho), tendo como eixo
central de discussão a forma como as atividades estão sendo desenvolvidas. Estas reuniões
visam a uma reflexão conjunta, à possibilidade de compartilhar as dificuldades e de se
colocar no lugar do outro, de conhecer melhor o outro para compreendê-lo e respeitá-lo em
suas diferenças, atenuando o distanciamento nas relações, de modo a alterar a forma de ver
o outro e também a forma de interagir com o mesmo, propiciando trocas de conhecimentos,
que possam amenizar a alienação inerente à divisão do trabalho, para que obtenhamos, a
médio e longo prazo, mudanças significativas e substanciais na qualidade das relações e,
conseqüentemente, eliminarmos os problemas de comunicação e transformarmos os
processos psicológicos conscientes que se tem de si e dos demais grupos. A utilização de
técnicas, métodos e jogos que visam a explicitação dos processos subjetivos grupais poderá
ser de grande valia para o êxito dessas propostas.
Entre os eixos temáticos a serem abordados nestas reuniões, teríamos algumas
questões relacionadas ao poder, suas implicações e as formas de lidar com este aspecto;
também questões relacionadas à identidade do grupo e sua complexidade para um grupo
heterogêneo, bem como suas determinações; também questões relacionadas ao conflito
entre conhecimento prático e conhecimento teórico; tudo visando a uma melhoria na
qualidade das relações inter-pessoais, numa estrutura hierarquizada; entre outras questões
pertinentes. Estes eixos temáticos, porém, não devem ser tomados como uma espécie de
“camisa de força” capaz de engessar a dinâmica do grupo analisado, mas estando aberto a
novas necessidades que podem ir surgindo nas reuniões e reflexões.
Por estarmos nos baseando na Pesquisa-Participativa é que propomos uma forma de
intervenção calcada nos procedimentos deste método.
Os debates, trocas e reflexões temáticas, mediados pelos acadêmicos estagiários e
pela professora supervisora responsável, garantirão às reuniões que os participantes tragam
idéias para auxiliar na construção de novos conhecimentos a partir dos conhecimentos já
adquiridos através da aliança entre teoria e prática, isto é, da práxis profissional.
110
7 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AGUIAR, Wanda M. Junqueira. Consciência e atividade: categorias fundamentais da psicologia sócio-histórica. In BOCK, Ana Mercês Bahia; FURTADO, Odair e GONÇALVES, M. Graça M. (orgs.). Psicologia sócio-histórica (uma perspectiva crítica em psicologia). São Paulo: Cortez, 2001. ASBAHR, Flávia. Psicologia Social e Marximo. Revista Princípios, nº 65. Disponível na World Wide Web no endereço: http://www.vermelho.org.br/principios/anteriores.asp?edicao=65&cod_not=250 BLANCK, J. Guillermo. Teoria y método para una ciência psicológica unificada. In SIGUÁN, Miguel (coord.). Actualidad de Lev S. Vigotski. Espanha: Editorial Anthropos, 1987. BOCK, Ana Mercês Bahia; FURTADO, Odair e TEIXEIRA, Maria de Lourdes Trassi. Psicologias - Uma introdução à psicologia. São Paulo: Saraiva, 1999. CODO, Wanderley. O fazer e a consciência. In CODO, Wanderley e LANE, Silvia T. M. (orgs.). Psicologia Social - O homem em movimento. São Paulo: Brasiliense, 1994. ENGELS, Friedich. Sobre o Papel do Trabalho na Tranformação do Macaco em Homem. Ed.: Ridendo Castigat Mores, Edição Eletrônica. Fonte digital: <www.jahr.org>, 1999 HALL, C. S. & LINDZEY, G. Teorias da Personalidade. São Paulo: Herder, 1966. LANE, Silvia T. M. Linguagem, pensamento e representações sociais. In CODO, Wanderley e LANE, Silvia T. M. (orgs.). Psicologia Social - O homem em movimento. São Paulo: Brasiliense, 1994. LEÃO, Inara Barbosa. Tese de Doutorado: Os professores universitários: a emoção e o pensamento em um trabalho intelectual institucionalizado. Orientadora: Sílvia T. M. Lane. São Paulo: PUC, 1999. LEÃO, Inara Barbosa. (Org.) Educação e psicologia: reflexões a partir da teoria sócio-histórica. Campo Grande, MS: Editora UFMS, 2003. 242p. LEONTIEV, A. N. Actividad, consciencia y personalidad. Buenos Aires: Ediciones ciencias del hombre, 1978. _______________ O Desenvolvimento do Psiquismo. Ed. Moraes: São Paulo – SP, 1995. LEWIN, Kurt. Problemas de Dinâmica de Grupo. São Paulo: Cultrix, 1978.
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