15
XV ENCONTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS DO NORTE E NORDESTE E PRÉ-ALAS BRASIL. 04 a 07 de setembro de 2012, UFPI, Teresina-PI. Grupo de Trabalho (27) – Políticas Públicas. Sessão 1 - Políticas de Educação ACESSO À UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ: EFEITOS DA DESIGUALDADE SOCIAL NO PROCESSO SELETIVO DE 2005 Marcelo Batista Gomes Universidade Federal do Piauí - UFPI ([email protected] ) Guiomar de Oliveira Passos Universidade Federal do Piauí - UFPI ([email protected] )

Acesso à universidade federal do piauí efeitos da desigualdade social no processo seletivo de 2005

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Aborda-se o acesso dos estudantes do ensino médio público à UFPI, baseando-se nos exames seletivos de 2005, últimos só com a ampla concorrência. Verificam-se os efeitos da igualdade vigente na seleção frente ao tipo de escola do ensino médio, compreendendo que o acesso ao ensino superior resulta “de uma seleção direta ou indireta que, ao longo da escolaridade, pesa com rigor desigual sobre os sujeitos das diferentes classes sociais” (BOURDIEU, 2002, p. 41). Os dados são do questionário preenchido na inscrição, submetidos à análise estatística. Os egressos do ensino médio público são 34,5% dos inscritos e 19% dos aprovados e a taxa de aprovação 7,2%. O êxito, só não verificado em Odontologia e Direito (noturno), foi maior nas licenciaturas, todavia, menor do que os da escola privada. Estes, já beneficiados econômica e culturalmente, também se beneficiam da igualdade do processo seletivo.

Citation preview

Page 1: Acesso à universidade federal do piauí efeitos da desigualdade social no processo seletivo de 2005

1

XV ENCONTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS DO NORTE E NORDESTE E PRÉ-ALAS BRASIL.

04 a 07 de setembro de 2012, UFPI, Teresina-PI.

Grupo de Trabalho (27) – Políticas Públicas.

Sessão 1 - Políticas de Educação

ACESSO À UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ: EFEITOS DA DESIGUALDADE SOCIAL NO PROCESSO SELETIVO DE 2005

Marcelo Batista Gomes Universidade Federal do Piauí - UFPI

([email protected])

Guiomar de Oliveira Passos Universidade Federal do Piauí - UFPI

([email protected])

Page 2: Acesso à universidade federal do piauí efeitos da desigualdade social no processo seletivo de 2005

2

ACESSO À UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ: EFEITOS DA DESIGUALDADE SOCIAL NO PROCESSO SELETIVO DE 2005

Marcelo Batista Gomes1

Guiomar de Oliveira Passos2

RESUMO

Aborda-se o acesso dos estudantes do ensino médio público à UFPI, baseando-se nos exames seletivos de 2005, últimos só com a ampla concorrência. Verificam-se os efeitos da igualdade vigente na seleção frente ao tipo de escola do ensino médio, compreendendo que o acesso ao ensino superior resulta “de uma seleção direta ou indireta que, ao longo da escolaridade, pesa com rigor desigual sobre os sujeitos das diferentes classes sociais” (BOURDIEU, 2002, p. 41). Os dados são do questionário preenchido na inscrição, submetidos à análise estatística. Os egressos do ensino médio público são 34,5% dos inscritos e 19% dos aprovados e a taxa de aprovação 7,2%. O êxito, só não verificado em Odontologia e Direito (noturno), foi maior nas licenciaturas, todavia, menor do que os da escola privada. Estes, já beneficiados econômica e culturalmente, também se beneficiam da igualdade do processo seletivo.

Palavras chave: Ensino superior. Democratização. Desigualdades.

1 Bacharel e Licenciado em Ciências Sociais – Mestrando em Políticas Públicas – PPGPP/UFPI

(Bolsista CAPES). E-mail: [email protected] 2 Doutora em Sociologia – Docente da Universidade Federal do Piauí – Departamento de Serviço social. E-mail: [email protected]

Page 3: Acesso à universidade federal do piauí efeitos da desigualdade social no processo seletivo de 2005

3

1 INTRODUÇÃO

O texto parte dos resultados da pesquisa: “Acesso ao ensino superior púbico:

democratização e desigualdades sociais na Universidade Federal do Piauí”,

(PASSOS, 2008), que analisou a condição e posição de classe de inscritos e

aprovados no exame seletivo de ingresso na UFPI em 2005, financiada pelo CNPq e

integrante do Programa de Bolsa de Iniciação Científica PIBIC/CNPq e UFPI. A

intenção é analisar o acesso de estudantes do ensino médio de escolas públicas à

universidade Federal do Piauí, baseando-se nos processos seletivos de 2005,

últimos em que vigorou apenas a ampla concorrência. Verificam-se os efeitos da

igualdade vigente nos processos seletivos de ingresso frente à escola frequentada

no ensino médio.

Parte-se da compreensão de que o acesso ao ensino superior resulta “de

uma seleção direta ou indireta que, ao longo da escolaridade, pesa com rigor

desigual sobre os sujeitos das diferentes classes sociais” (BOURDIEU, 2002, p. 41).

Isso, diz Bourdieu (2002, p. 41), explica porque um jovem da camada social superior

tem oitenta vezes mais chances de ingressar no ensino superior que um filho de um

assalariado agrícola e quarenta vezes mais que o filho de um operário.

O objetivo é expor as chances de ingresso numa instituição federal de ensino

dos que estudaram em escolas médias privadas e públicas quando vigora o princípio

da igualdade nos processos seletivos. Com isso, examinam-se, na realidade

nacional, os efeitos das diferenças de condições socioeconômicas no acesso ao

ensino superior estatal, pois, como é de domínio público, as escolas sob essa

jurisdição no Brasil atendem, majoritariamente, as classes com menores renda e

escolaridade.

Idêntica investigação realizada por Zago (2003; 2006) sobre aqueles que

tiveram acesso à Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) entre 2001 e

2003, constatou que a grande maioria dos aprovados “pertence aos estratos mais

favorecidos da população [...]” (2003, p.3-4), em particular, constata a autora em

outro estudo (ZAGO, 2006, p. 232), naquelas “carreiras mais prestigiosas”. Em outra

direção, Vasconcelos e Lima (2005) examinaram o ingresso de alunos de escolas

públicas de educação básica em universidades também públicas e constatou que

este é “limitado”, pois os problemas que enfrentam reduzem a “competitividade” de

seus alunos em relação aos egressos da rede privada. Em ambos, o que constatam,

Page 4: Acesso à universidade federal do piauí efeitos da desigualdade social no processo seletivo de 2005

4

ao examinarem seja os que logram aprovação nos exames seletivos, sejam os

destinos escolares dos egressos do ensino básico público, é que “os mais pobres

estão, extraordinariamente sub-representados no nível superior” (CASTRO, 2001,

apud VASCONCELOS, LIMA, 2005, p. 455).

Borges e Carnielle (2007), em estudo sobre o processo de estratificação

social no acesso à universidade pública, com base no Processo de Avaliação

Seriada da Universidade de Brasilía (1996-2000), constataram que a estratificação

social no Brasil se reflete no acesso ao curso superior. Para os autores, “o acesso

ao ensino superior é influenciado pela origem social do estudante” (BORGES;

CARNIELLE, 2007, p. 119), assim, afirmam que a educação pode não só constituir

um “fator de mudança e mobilidade social” como também contribuir para a

“manutenção das desigualdades”.

Neste estudo, focaliza-se o princípio da igualdade, que norteava os processos

seletivos, diante das desigualdades de condição. Pergunta-se: Será que a ação

estatal contribui para a redução das desigualdades sociais, promovendo a

democratização do ensino e da sociedade brasileira? Será que a igualdade, que tem

norteado esse sistema de ensino, tem favorecido a diminuição das desigualdades

sociais?

Para a análise das diferenças de acesso ao ensino superior entre estudantes

egressos de escolas do ensino médio público e privado na UFPI em 2005, utilizou-se

os dados colhidos pela Comissão Permanente de Seleção (COPESE) através de

questionário socioeconômico preenchido quando da inscrição no exame seletivo de

ingresso à Universidade Federal do Piauí realizado em 2005. Esses dados foram

submetidos à análise estatística com o auxílio dos Programas Startitical Package for

the Social Siences (SPSS version 13.0) e Microsoft Office Excel 2003.

A exposição está dividida em dois momentos. No primeiro, são feitas as

comparações em relação ao acesso à UFPI em 2005, dos candidatos de escolas do

ensino básico público e privado, explorando diferenças quanto às probabilidades de

êxito e taxa de sucesso dos dois grupos no processo seletivo. No segundo, expõem-

se as diferenças de acesso entre os cursos ofertados em 2005, destacando-se a

distribuição dos egressos de escolas púbicas e privadas entre os 38 cursos

ofertados em 2005 na UFPI. Na conclusão, expõem-se os efeitos da igualdade sobre

o processo seletivo de acesso ao ensino superior público, identificando-se quem são

Page 5: Acesso à universidade federal do piauí efeitos da desigualdade social no processo seletivo de 2005

5

os favorecidos pela ‘igualdade formal’, quando competem por uma vaga no ensino

superior os egressos de escolas públicas e privadas.

2 ACESSO À UFPI EM 2005 DE EGRESSOS DE ESCOLAS PÚBLICAS E

PRIVADAS

As 2.345 vagas ofertadas pela Universidade Federal do Piauí em 2005 para

38 cursos de graduação foram disputadas por 17.948 candidatos, dos quais 8.708

(48,5%) eram egressos de escolas privadas e 6.190 (34,5%) de escolas públicas,

outros 1.937 (10,8%) apenas concluíram o ensino médio em escola privada e 1.113

(6,2%) concluíram em escola pública.

Gráfico 1: Inscritos na UFPI/2005 segundo o tipo de escola em que cursou o ensino médio.

Os egressos da escola pública são em menor número já na inscrição, apesar

de serem naquele ano 81% dos concludentes do ensino médio, conforme dados do

INEP (2006). Na ocasião, concluíram o ensino médio no Piauí 36.105 alunos, dos

quais 29.406 eram egressos da escola pública e 6.699 de escolas privadas.

Enquanto é quase igual o número de inscritos e de concludentes egressos da escola

privada, entre os da escola pública, a diferença é de 75% entre os que concluíram e

os que se inscreveram. Há, por conseguinte, uma autoexclusão, isto é, uma espécie

de ‘seleção natural social’ ou de que opera a “lei geral de eliminação” de que fala

Bourdieu (1992).

Page 6: Acesso à universidade federal do piauí efeitos da desigualdade social no processo seletivo de 2005

6

A relação candidato vaga diferia nos quatro grupos: eram 3,7 candidatos/vaga

entre os da escola privada, 2,6 de escolas públicas, 0,8 que apenas concluíram na

escola privada e 0,5 que concluíram em escola pública. Assim, há menos candidato

por vaga entre os egressos do ensino público do que do privado, portanto,

comparando com os egressos da escola privada, suas chances são menores.

A probabilidade era que os da escola pública ocupassem 809 vagas, os da

escola privada 1.138, os que concluíram na pública 145 e os que concluíram em

escola privada 253 vagas. Os resultados mostram que a ocupação das vagas foi a

seguinte: 1.615 (69%) por egressos da escola privada, 445 (19%) por ex-alunos da

escola pública, 220 (9,4%) pelos que apenas concluíram em escolas privadas e 62

(2,6%) pelos que apenas concluíram em escolas públicas. Verifica-se que,

comparativamente ao esperado, os primeiros conseguiram 141,9% das vagas que,

estatisticamente, lhes eram previstas, enquanto os demais obtiveram menos do que

poderiam: os da escola pública 55%, os que apenas concluíram nesse

estabelecimento 42,6% e os que apenas concluíram na rede privada 86,9%.

Gráfico 2: Aprovados na UFPI/2005 segundo o tipo de escola em que cursou o ensino médio.

Por conseguinte, os primeiros não apenas preencheram as vagas que

probabilisticamente lhes eram destinadas como utilizaram também aquelas não

ocupadas pelos que estudaram em escolas públicas ou apenas ai concluiu ou nelas

fizeram a maior parte dos estudos, isto é, apenas concluíram em escolas privadas.

O melhor resultado, então, foi dos egressos do ensino básico privado e o pior

dos alunos que apenas concluíram o ensino médio em escolas públicas. Isso se

expressa na taxa de êxito, isto é, no percentual de aprovados entre os inscritos de

Page 7: Acesso à universidade federal do piauí efeitos da desigualdade social no processo seletivo de 2005

7

cada tipo de escola. Dentre os que vieram dos estabelecimentos de ensino médio

privado o êxito foi de 18,5% e aqueles que apenas concluíram em escolas privadas,

11,4%. Já entre todos aqueles que cursaram o ensino médio em estabelecimentos

públicos ou apenas ai concluiu, o êxito foi de 12,8%, quase o mesmo percentual

daqueles que apenas realizaram a última série na escola privada e 41% menos dos

que aí estudaram todo o ensino médio.

Gráfico 3: Percentual de aprovação dos inscritos por tipo de escola com taxa de aprovação por

grupo.

Tem-se, então, que o tipo de escola influencia no ingresso ao ensino superior

público no Piauí, pois os que frequentaram escolas privadas, apenas no último ano,

foram mais exitosos do que os estudantes das escolas públicas. A igualdade formal,

portanto, acaba por excluir os estudantes egressos do ensino básico público.

A seguir analisam-se quais foram os cursos em que os egressos de escolas

básicas púbicas e privadas mais lograram êxito no processo seletivo de 2005 na

UFPI.

Page 8: Acesso à universidade federal do piauí efeitos da desigualdade social no processo seletivo de 2005

8

3 AS DIFERENÇAS DE ACESSO DOS GRESSOS DE ESCOLAS PÚBLICAS E

PRIVADAS ENTRE OS CURSOS OFERTADOS NA UFPI EM 2005

Nos 38 cursos de graduação oferecidos pela Universidade Federal do Piauí

no exame seletivo de 2005, os candidatos egressos do ensino médio público

obtiveram aprovação em todos os cursos, exceto Direito (Noturno) e Odontologia em

que 100% estudaram em estabelecimento privado. É verdade que estes eram

minoria na disputa de uma vaga em 28 dos 38 cursos, sendo em maior número em,

aproximadamente, 26% dos ofertados à época; todos de licenciatura. Em 5 deles

são mais da metade — Pedagogia – CSHNB3 (60%), Letras – CSHNB (57,9%),

Matemática (Noturno) (57%), Matemática (55,6%) e Pedagogia – CMPP4 (52,7%) —

em 9 são mais numerosos — Lic. em Física (Not.), Lic. em Educação Artística, Lic.

em Pedagogia – CMRV5, Língua Portuguesa e Língua Francesa, Lic. em Letras

(Not.), Lic. em Química, Lic. em Letras (Diurno), Lic. em Pedagogia (Not.), Lic. em

Física.

Nos 74% dos cursos restante, estão em menor percentual. Além das duas

exceções acima, são menos de um quarto dos concorrentes, em: Medicina (15,1%)

Direito (18,3%), Direito (Noturno) (18,2%), Odontologia (20,3%) Arquitetura e

Urbanismo (23,3%), Direito (Diurno) e Farmácia (23,6%).

0

10

20

30

40

50

60

70

80

Med

icin

a

Od

onto

logi

a

Dir

eit

o (N

ot.

)

Arq

uit

etu

ra e

Urb

anis

mo

Dir

eito

Farm

ácia

Med

icin

a V

eter

inár

ia

Bac

h. e

m C

iênc

ias

Bio

lógi

cas

Ciê

nci

as E

con

ômic

as

Co

mun

icaç

ão S

oci

al

Lic.

em

Qu

ímic

a (N

otu

rno)

Enge

nhar

ia C

ivil

Ciê

ncia

s So

cia

is

Ciên

cia

s C

ontá

bei

s

Eng

enha

ria

de

Ag

rim

ensu

ra

Nu

triç

ão

Bac

h. e

m C

iênc

ias

da

Co

mpu

taçã

o

Bac

h. e

m Q

uím

ica

Ciê

ncia

s Co

ntá

beis

CM

RV

Bac

h. e

m M

ate

mát

ica

Lín

gua

Ingl

esa

Edu

caçã

o F

ísic

a

Bac

h. e

m F

ísic

a

Serv

iço

Soc

ial

Ad

min

istr

açã

o

Enfe

rmag

em

Ad

min

istr

ação

CM

RV

Ciên

cia

s Ec

onôm

ica

s C

MR

V

Lic.

em

Ciê

ncia

s B

ioló

gic

as

Lic.

em

Filo

sofi

a

Agr

on

omia

Lic.

em

His

tóri

a

Lic.

em

Geo

gra

fia

Lic.

em

Ciê

nci

as

Bio

lóg

icas

(No

turn

o)

Lic.

em

Ped

agog

ia (D

iurn

o)

Lic.

em

Fís

ica

(No

t.)

Lic.

em

Edu

caçã

o A

rtís

tica

Lic.

em

Pe

dago

gia

CM

RV

Líng

ua P

ort

ugu

esa

e L

íngu

a F

ranc

esa

Lic.

em

Let

ras

(No

t.)

Lic.

em

Quí

mic

a

Lic.

em

Let

ras

(Diu

rno)

Lic.

em

Ped

ago

gia

(No

t.)

Lic.

em

Fís

ica

Lic.

em

Ped

ago

gia

(Ves

p.)

Lic.

em

Mat

emát

ica

Lic.

em

Mat

emát

ica

(No

t.)

Lic.

em

Let

ras

CSH

NB

Lic.

em

Ped

ago

gia

CSH

NB

Todas em escola pública

Todas em escola particular

Concluiu em escola pública

Concluiu em escola particular

Maioria da escola privada maioria da escola pública

Empercentuais iguais

Gráfico 4: Tipo de escola cursada no ensino médio pelos inscritos na UFPI/2005.

3 Campus “Senador Helvídio Nunes de Barros” – Picos/PI.

4 Campus “Ministro Petrônio Portella” – Teresina/PI. 5 Campus “Ministro Reis Velloso” – Parnaíba/PI.

Page 9: Acesso à universidade federal do piauí efeitos da desigualdade social no processo seletivo de 2005

9

Nesse gráfico verifica-se que as preferências dos candidatos pelos cursos

variam também conforme a escola frequentada. Os egressos de escolas privadas

preferem os bacharelados, notadamente os mais prestigiados como Medicina,

Direito, Odontologia e os da escola pública os cursos de licenciatura, que, por sinal,

muitos deles figuravam entre os de menor concorrência nesse certame.

Na aprovação, os egressos do ensino básico privado prevalecem nos 38

cursos de graduação oferecidos pela UFPI em 2005, sendo maioria em 94,7%,

principalmente, entre os bacharelados e/ou aqueles cursos de maior prestígio social,

com destaque para: Odontologia (100%), Direito (98%), Medicina (95%),

Enfermagem (91,7%) e Direito (Noturno) (88%). Já os da escola básica pública,

prevalecem em apenas dois cursos (5,3%), ambos de licenciatura – Língua

Portuguesa e Língua Francesa (45%) e Licenciatura em Educação Artística (38,3%).

Cumpre observar, que mesmo nesses cursos não representam a metade dos

candidatos e a superioridade em relação aos da escola privada é de 5%.

Ainda se destacaram nos cursos de Licenciatura em Química, Licenciatura

em Pedagogia (Vespertino), Licenciatura em Matemática (Noturno), alcançando 40%

das vagas, todavia, menos dos que os da escola privada.

Nos 94,7% dos cursos restantes, em que estão em menor percentual entre os

aprovados, além de Direito (Noturno) e Odontologia, em que não conseguiram lograr

êxito, os egressos de escolas públicas são menos de um quarto dos aprovados em:

Direito (2%), Medicina (5%), Enfermagem (6,7%), Bacharelado em Ciências

Biológicas (6,7%), Educação Física (7,1%), Ciências Contábeis – CMRV (9,1%),

Comunicação Social (10%), Medicina Veterinária (10%), Administração – CMRV

(10,9%), Farmácia (11,4%), Nutrição (11,7%), Arquitetura e Urbanismo (12%),

dentre outros.

Page 10: Acesso à universidade federal do piauí efeitos da desigualdade social no processo seletivo de 2005

10

0

20

40

60

80

100

Lic. em Ed

ucação

Artística

Língu

a Po

rtugu

esa e Língu

a …Lic. em

Letras (N

otu

rno

)Lic. em

Ped

agogia C

SHN

BLic. em

Pe

dago

gia (Vesp

ertino

)Lic. em

Qu

ímica (N

otu

rno

)Lic. em

Qu

ímica

Lic. em P

edago

gia (Diu

rno

)C

iências Eco

micas C

MR

VA

gron

om

iaLic. em

Mate

mática (N

otu

rno

)Lic. em

Letras (D

iurn

o)

Lic. em Física (N

otu

rno

)Lic. em

Filoso

fiaLic. em

FísicaB

ach. e

m M

atemática

Lic. em M

atem

áticaLic. em

Pe

dago

gia CM

RV

Lic. em H

istória

Bach

. em

FísicaLic. em

Letras C

SHN

BLín

gua In

glesaLic. e

m P

edago

gia (No

turn

o)

Ciên

cias Sociais

Lic. em C

iências B

ioló

gicas …Lic. em

Ge

ografia

Bach

. em

Qu

ímica

En

genh

aria de A

grimen

sura

Ad

min

istração

CM

RV

Lic. em C

iências B

ioló

gicas

Serviço

Social

Ad

min

istraçãoB

ach. e

m C

iên

cias da C

om

pu

taçãoC

iências Eco

micas

Ciên

cias Co

ntáb

eis

Ciên

cias Co

ntáb

eis C

MR

VE

du

cação Física

Arq

uite

tura e

Urb

anism

oEn

genh

aria Civil

Nu

triçãoFarm

áciaM

edicin

a Ve

terinária

Co

mu

nicação

Social

Bach

. em

Ciên

cias Bio

lógicas

Direito

(No

turn

o)

En

fermagem

Med

icina

Dire

itoO

do

nto

logia

Todas em escola pública

Todas em escola

particular

Concluiu em escola pública

Concluiu em escola particular

Maioria da escola privada

maioria da escola pública

Gráfico 5: Tipo de escola cursada no ensino médio pelos aprovados na UFPI/2005.

Verifica-se que mesmo nos cursos onde os egressos de escolas públicas

mais se candidataram não ocuparam o maior número de vagas, sendo, em

praticamente todos os cursos, o êxito maior daqueles que estudaram em escolas

privadas, a exceção foi Licenciatura em Língua Portuguesa e Língua Francesa e

Licenciatura em Educação Artística.

As diferenças em relação ao acesso à UFPI em 2005 dos egressos de

escolas públicas e privadas explicitam-se, também, quando observamos o

percentual de aprovados entre os inscritos, ou seja, a taxa de êxito de cada tipo de

escola segundo os cursos escolhidos pelos candidatos que disputavam vagas nesse

processo seletivo.

Em Pedagogia do CSHNB, em que 60% dos inscritos eram oriundos de

escolas públicas o êxito foi obtido por 9,4%, os egressos de escolas privadas

obtiveram 30,4%. No curso de Letras (CSHNB) os egressos de escolas públicas

eram 57,9% dos candidatos e o êxito foi alcançado por apenas 6,8%, os alunos

oriundos de escolas privadas obtiveram 41,9% de êxito nesse curso. Em Matemática

(Noturno) dos 57% inscritos, o êxito foi de 18,5% para os egressos da escola pública

e 40,5% para os da escola privada e dos 52,7% dos inscritos egressos do ensino

público em Pedagogia – CMPP, o êxito foi de 12,4% enquanto os egressos de

escolas privadas obtiveram 16,2%.

Já entre aqueles 9 cursos em que os candidatos de escolas públicas estavam

em maior número entre os inscritos, o êxito foi o seguinte: Lic. em Física (Not.) 3,5%

para os egressos da escola pública e 20,6% para os da escola privada, Lic. em

Page 11: Acesso à universidade federal do piauí efeitos da desigualdade social no processo seletivo de 2005

11

Educação Artística – 11,4% dos primeiros e 26,6% dos segundos, Lic. em

Pedagogia (CMRV) – 8% contra 18,5%, Língua Portuguesa e Língua Francesa –

38,3% contra 48,5% da escola privada, o maior percentual de êxito, Lic. em Letras

(Not.) – 17,5% contra 26,6%, Lic. em Química – 14,5% contra 21,9%, Lic. em Letras

(Diurno) – 11,9% contra 21,2%, Lic. em Pedagogia (Not.) – 12,5% contra 34,2% e

em Lic. em Física o êxito dos egressos de escolas públicas foi de 18,4% contra

55,2% dos ex-alunos de escolas privadas.

Nos cursos em que os egressos de escolas públicas foram mais da metade

dos inscritos, observa-se, todavia que o êxito maior foi dos alunos que estudaram

em escolas da rede privada. Também, observa-se que naqueles cursos em que os

candidatos do ensino básico público são maioria entre os inscritos, ocorre a mesma

situação, o que evidencia a superioridade da escola básica privada nos processos

seletivos de ingresso ao ensino superior público.

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

50

Dire

ito (N

otu

rno

)

Od

on

tolo

gia

Dire

ito

En

ferm

ag

em

Me

dic

ina

Se

rviç

o S

oc

ial

Ba

ch

. em

Ciê

nc

ias

Bio

lóg

ica

s

Lic

. em

Ge

og

rafia

Nu

triçã

o

Co

mu

nic

ão

So

cia

l

Lic

. em

Fís

ica

(No

turn

o)

Ad

min

istra

çã

o C

MR

V

En

ge

nh

aria

Civ

il

Lic

. em

His

tória

Ciê

nc

ias

Co

ntá

be

is C

MR

V

Lic

. em

Ciê

nc

ias

Bio

lóg

ica

s (N

ot.)

Me

dic

ina

Ve

terin

ária

Ad

min

istra

çã

o

Lic

. em

Ciê

nc

ias

Bio

lóg

ica

s

Ciê

nc

ias

Co

ntá

be

is

Lic

. em

Ma

tem

átic

a

Ba

ch

. em

Ciê

nc

ias

da

Co

mp

uta

çã

o

Lic

. em

Le

tras

CS

HN

B

Lic

. em

Filo

so

fia

Lic

. em

Pe

da

go

gia

- CM

RV

Ba

ch

are

lad

o e

m Q

uím

ica

Ciê

nc

ias

So

cia

is

Lic

. em

Pe

da

go

gia

CS

HN

B

Fa

rmá

cia

Ed

uc

ão

Fís

ica

Arq

uite

tura

e U

rba

nis

mo

Ag

ron

om

ia

Lic

. em

Ed

uc

ão

Artís

tica

Lic

. em

Le

tras

(Diu

rno

)

Lic

. em

Pe

da

go

gia

(Diu

rno

)

Lic

. em

Pe

da

go

gia

(No

turn

o)

Lín

gu

a In

gle

sa

Lic

. em

Pe

da

go

gia

(Ve

sp

ertin

o)

Ciê

nc

ias

Ec

on

ôm

ica

s

Lic

. em

Qu

ímic

a

Ba

ch

are

lad

o e

m F

ísic

a

Lic

. em

Qu

ímic

a (N

otu

rno

)

Lic

. em

Le

tras

(No

turn

o)

Lic

. em

Fís

ica

Lic

. em

Ma

tem

átic

a (N

otu

rno

)

Ba

ch

are

lad

o e

m M

ate

tica

En

ge

nh

aria

de

Ag

rime

ns

ura

Ciê

nc

ias

Ec

on

ôm

ica

s C

MR

V

Lín

gu

a P

ortu

gu

es

a e

Lín

gu

a F

ran

ce

sa

Todo em es colapúblic a

Todo em es colapartic ular

C onc luiu em es c olapúblic a

C onc luiu em es c olapartic ular

Gráfico 6: Percentual de aprovação dos inscritos em cada curso por tipo de escola frequentada no

ensino médio.

O êxito predominante entre os que estudaram em escola privada, total ou

parcialmente, variou entre os cursos. Observa-se que entre os candidatos que

estudaram o ensino básico totalmente na escola pública, obtiveram mais êxito em:

Licenciatura em Língua Portuguesa e Francesa (38,3%), Ciências Econômicas –

CMRV (27,9%), Engenharia de Agrimensura (21,1%), Bacharelado em Matemática

(18,9%), Licenciatura em Matemática (Noturno) (18,5%) e Licenciatura em Física

(18,4%).

Page 12: Acesso à universidade federal do piauí efeitos da desigualdade social no processo seletivo de 2005

12

O êxito dos provenientes de escolas da rede privada foi maior nos seguintes

cursos: Engenharia de Agrimensura (71,6% dos que se inscreveram para este

curso), Licenciatura em Física (55,2%), Arquitetura e Urbanismo (54,1%), Lic. em

Língua Portuguesa e Francesa (48,5%), Licenciatura em Filosofia (43,9%) e

Licenciatura em Letras – CSHNB com (41,9%) de êxito dos egressos do ensino

básico privado.

Já os que apenas iniciaram em escolas da rede privada e concluíram na

escola pública destacaram-se em: Bacharelado em Matemática (100% dos inscritos

neste curso provenientes deste tipo de escola), Licenciatura em Química (noturno)

(25%), Licenciatura em Matemática (noturno) (22,2%), Ciências Econômicas (20%) e

Licenciatura em Pedagogia (Vespertino), Licenciatura em Letras (Noturno) com

(18,2%) respectivamente. Os que fizeram o caminho inverso, iniciando em escola

pública e concluindo na escola particular o êxito foi maior em: Bacharelado em

Física (57,1%), Licenciatura em Física (Noturno) (42,9%), Licenciatura em Letras

(Noturno) (38,9%), Ciências Econômicas CMRV (37,5%), Licenciatura em

Matemática (Noturno) (33,3%) e Licenciatura em Química (Noturno) (31,8%).

A taxa de êxito dos candidatos de escolas públicas e privadas entre os cursos

ofertados na Universidade Federal do Piauí em 2005 demonstra que os egressos de

escolas do ensino básico privado conseguiram mais êxito nesse certame do que os

seus concorrentes da escola pública, evidenciando o peso do tipo de escola básica

nos processos seletivos de ingresso ao ensino superior público.

Os egressos do ensino público estão representados nesse espaço social,

contudo, ainda são minorias, confirmando, assim, Bourdieu (1992), quando afirma

que o livre jogo das leis de transmissão cultural, no qual se baseia o princípio de

equidade, norteador dos processos seletivos, no período, faz com que o capital

cultural retorne às mãos daqueles que já o possuem.

A igualdade no acesso ao ensino superior público revela-se na verdade como

um fator de desigualdade. Aqueles que podem arcar com os custos do ensino básico

privado e podem se preparar melhor para enfrentar os exames seletivos de acesso

ao ensino superior, quase sempre ocupam as posições dominantes, isto é, os cursos

mais prestigiosos. Aos egressos de escolas públicas restam apenas àqueles cursos

que no mercado dos bens sociais são caracterizados como dominados.

Page 13: Acesso à universidade federal do piauí efeitos da desigualdade social no processo seletivo de 2005

13

4 CONCLUSÃO

No exame seletivo da Universidade Federal do Piauí em 2005, constatou-se

que os egressos de escolas públicas lograram êxito em praticamente todos os

cursos, exceto em Odontologia e Direito (Noturno), destacando-se principalmente

nas licenciaturas. Contudo, a supremacia foi dos alunos provenientes de escolas do

ensino básico privado que ocuparam a maioria das vagas ofertadas pela UFPI em

2005 e tiveram as melhores taxas de aprovação. Isso deu-lhes resultados superiores

mesmo naqueles cursos em que os da escola pública ocuparam maior número como

em Licenciatura em Língua Portuguesa e Francesa e Licenciatura em Educação

Artística – 7,2% contra 18,5%.

Constatou-se que os egressos de escolas privadas ocuparam 141,9% das

vagas que, estatisticamente, lhes eram previstas, enquanto os da escola pública

obtiveram menos do que poderiam; apenas 55% das que tinham probabilidade de

ocuparem e nos cursos de Licenciaturas menos concorridos.

A escola pública, portanto, não favorece a aprovação nos processos seletivos

em que vigora a igualdade. Isso, consequentemente, contribui para a conservação

da estrutura social, em que aqueles já beneficiados ficam com as melhores vagas e

oportunidades de acesso ao ensino superior público.

A ação estatal, quando tem por base a igualdade, portanto, favorece a

desigualdade. Assim, ao invés de promover a democratização do sistema de ensino

e da sociedade, colabora com a manutenção dos privilégios daqueles que, por

possuírem uma condição socioeconômica mais elevada, já são privilegiados.

Desse modo, a igualdade nos processos seletivos de acesso ao ensino

superior, não favorece a diminuição das desigualdades sociais, pelo contrário, age

acentuando ainda mais essas desigualdades. A seletividade social, que já opera

quando da escolha do estabelecimento de ensino básico e durante todo o cursus,

tem no exame seletivo de ingresso apenas a legitimação da exclusão, na expressão

de Bourdieu (1992, p. 234), sanciona a lei geral de eliminação, isto é, o que a

seleção natural social já realizou: a escolha dos mais aptos e adaptados ao meio.

Portanto, o sistema de ensino superior público é seletivo porque os favorecidos são

os alunos de escolas privadas por estarem mais adaptados ao meio, com isso, está

se perpetuando a desigualdade entre as classes.

Page 14: Acesso à universidade federal do piauí efeitos da desigualdade social no processo seletivo de 2005

14

Desse modo, ainda que seja alvissareira a presença dos segmentos sociais

historicamente excluídos, evidenciando recente fenômeno do prolongamento da

escolaridade no Brasil, não altera a estrutura da relação entre as classes, porque

mesmo assim ainda são minorias neste sistema de ensino e nos cursos menos

privilegiados.

Portanto, o livre jogo das leis de transmissão cultural, em que se baseia o

princípio da igualdade que norteava os processos seletivos de ingresso na

Universidade Federal do Piauí até 2005, faz a distribuição do capital cultural entre as

classes sociais de modo que este retorne às mãos daqueles que já o possuem.

Assim, os estudantes oriundos do ensino básico privado, que já são beneficiados

econômica e culturalmente, também se beneficiam da igualdade do processo

seletivo.

REFERÊNCIAS

BORGES, José Leopoldo das Graças. CARNIELLI, Beatrice Laura. Educação e estratificação social no acesso à universidade pública. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, v. 35, n. 124, p. 113-139, jan./abr, 2005. BOURDIEU, Pierre. Reprodução cultural e reprodução social. In: ______. A economia das trocas simbólicas. Trad. Sérgio Micele. 3. ed. São Paulo: Perspectiva, 1992, p.296-336. ______. Pierre. A Escola Conservadora: as desigualdades frente á escola e à cultura. In: NOGUEIRA, Maria Alice; CATANI, Afrânio (Orgs). Escritos de Educação. Trad. Aparecida Joly Gouveia. 4. ed. Petrópolis (RJ): Vozes 2002, p.39-64. INEP. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Educação Superior Brasileira: 1991-2004. Brasília: INEP/MEC, 2006. PASSOS, Guiomar de Oliveira. Acesso ao ensino superior público: democratização e desigualdades sociais na Universidade Federal do Piauí. Teresina, 2008. Projeto de Pesquisa apresentado ao Programa de Bolsa de Iniciação Científica – PIBIC-UFPI/CNPq. VASCONCELOS, Simão Dias, SILVA, Ednaldo Gomes da. Acesso à universidade pública através de cotas: uma reflexão através da percepção dos alunos de um pré-vestibular inclusivo. Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.13, n.49, p. 453-468, out./dez., 2005.

Page 15: Acesso à universidade federal do piauí efeitos da desigualdade social no processo seletivo de 2005

15

ZAGO, Nadir. Do acesso à permanência no ensino superior: percursos de estudantes universitários de camadas populares. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, v. 11 n. 32, p. 226-370, maio./ago., 2006. ______. Diferenças de acesso e de permanência no ensino superior: um estudo com estudantes universitários. II Seminário Internacional de Educação Intercultural, Gênero e Movimentos Sociais. Ceará: Nordeste Digital Line S/A, 2003, v. 01. p. 01-11.