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AmordePerdiçãodeCamiloCasteloBranco
Capadaprimeiraediçãodaobra
• Nascea16demarçode1825,emLisboa,esuicidou-sea1dejunhode1890emS.MigueldeSeide,Famalicão;
• Órfãodemãeaosdoisanosedepaiaosnove,passou,aparIrdestaidade,aviveremVilaRealcomumaIapaterna.
• Aos16anos,casou-secomJoaquinaPereira.• Abandonouaesposaeafilhaem1842.Morrerampoucodepois.
• Em1844,instalou-senoPorto.• Em1845,estreou-senapoesiaenoanoseguintenoteatroetambémnojornalismo-
aIvidade,aliás,quenuncaabandonaria.• Em1846,estevepresoporterraptadoPatríciaEmília,umdosseustumultuosos
amores,dequemteriaumafilha,masqueacabariaporabandonar.• Em1851,estreia-senoromancecomAnátema;
• Conheceuaalta-rodaportuensebemcomoosmeiosboémiosefoiprotagonistadeaventurasromanescas.
• Em1853,oseunomecomeçavaasoarnosmeiosjornalísIcoseliteráriosdoPortoedeLisboa:jáalimentaraváriaspolémicasepublicaraalgunsromances.
• Em1856,aIngeamaturidadeliterária(nodomíniodosprocessosdeescrita)comoromance(poralgunsautoresconsideradonovela)OndeEstáaFelicidade?.
VidaeobradeCamiloCasteloBranco
• Em1856, iniciouo relacionamentoamorosocomAnaPlácido, casadadesde1850comManuelPinheiroAlves.
• Em1858,nasceManuelPlácido,filhodeCamiloedeAnaPlácido.• Em1860,ManuelPinheiroAlvesdesencadeouoprocessodeadultério:emjunhofoi
presaamulherea1deoutubroCamiloentregou-senacadeiadaRelaçãodoPorto.• Entre 1862 e 1863, o escritor publicou onze novelas e romances aIngindo uma
notoriedadedificilmenteigualável.• Em1864,fixou-senaquintadeS.MigueldeSeide(propriedadedeManuelPinheiroAlves
que,entretanto,faleceraem1863)enasceu-lheoterceirofilho,Nuno.• Em1876,tomouconsciênciadaloucuradosegundofilho,Jorge.Noanoseguintemorreu
ManuelPlácido.• A parIr de 1881, agravaram-se os padecimentos, incluindo a doença dos olhos que o
afetava.Em1889,porocasiãodoseuaniversário,foiobjetodecalorosahomenagemde
escritores,arIstaseestudantes,promovidaporJoãodeDeus.• Em1890,jácego,impossibilitadodeescrever,suicidou-secomumIroderevólver.• Camilofoioprimeiroescritorprofissionalentrenós.
Síntesedaobra
Introdução
• ExplicaçãodosmoIvosquelevamàproduçãodaobra:
• existêncianumlivrode“anIgosassentamentos,
nocartóriodascadeiasdaRelaçãodoPorto”,de
umautoqueditaaprisãodeSimãoBotelho,
familiar(Io)deCamiloCasteloBranco.
“Simão António Botelho, queassim disse chamar-se, sersolteiro, e estudante naUniversidade de Coimbra,natural da cidade de Lisboa, eassistente na ocasião de suaprisão na cidade de Viseu,idadededezoitoanos,filhodeDomingos JoséCorreiaBotelhoedeD.RitaPreciosaCaldeirãoCastelo Branco; estaturaordinária, cara redonda, olhoscastanhos, cabelo e barbapreta, vesJdo com jaqueta debaetão azul, colete de fustãopintadoecalçadepanopedrês.E fiz este assento, que assinei—FilipeMoreiraDias.A margem esquerda desteassentoestáescrito:Foi para a Índia em 17 demarçode1807.”
• SinteIzaahistórianumaúnicafrase:
• “Amou,perdeu-se,emorreuamando.”
• Narradorqueinteragecomoleitor:
• dáasuaopinião,esperandoacompaixãodoleitor
faceaorelatado;
• mostraasuaincredulidaderelaIvamenteaesta
situaçãotão“triste”.
Síntesedaobra
CapítuloI
• CaracterizaçãodopaiedamãedeSimão;
• NascimentodeSimão;
• AlIvezdeD.Rita;
• Simãonaadolescência.
CapítuloII
• SimãoemCoimbra;
• Perdeoano;
• Voltaparacasa;
• MudançadeaItudedeSimão–“SimãoBotelhoamava”;
• Definiçãodoamor;
• Inimizadeentreasfamílias;
• PlanosdeSimãoedeTeresa;
• Amordescoberto;
• OpaideTeresadecidequeelatemdeirparaumconvento;
• Simãotorna-seumestudanteexemplar.
SíntesedaobraCapítuloIII
• AirmãmaisnovadeSimãotorna-seamigadeTeresa:
• “conversam”àjanela;
• OpaideSimãodescobreaamizadedasuafilhaeoamordeseufilho,dirige-seaTeresa,proibindo-
adeamarSimão;
• OpaideTeresapropõequeasuafilhacasecomoprimoBaltasarCouInho;
• TeresaeBaltasarconversam;
• Teresarecusacasarcomoprimo;
• OpaideTeresareferequeasoluçãoéelaingressarnumconvento.
CapítuloIV
• CaracterizaçãodeTeresa;
• TeresaeSimãotrocamcartas;
• TeresaconInuaarecusarocasamentocomoprimo;
• SimãoconheceasintençõesdopaideTeresa:
• 1ªreação-pretendematarBaltasar;
• 2ªreação– iraViseueencontrar-seàsescondidascomTeresa.
SíntesedaobraCapítuloV
• FestanacasadeTeresa:
• Intençãodopai– conseguirconvencerafilhaacasarcomoprimo;
• BaltasarespiaTeresaepercebequeelaqueriràrua;
• TeresapercebequeoprimosuspeitadealgoemandaSimãoembora;
• SimãoeBaltasartrocampalavrasduras;
• SimãoestáhospedadonacasadeJoãodaCruzedafilhadeste,Mariana:
• JoãodaCruzéfielaSimão(opaideSimãoajudou-onopassado);
• Marianaapaixona-seporSimão.
CapítuloVI
• BaltasarpreparaumaemboscadaparamatarSimão;
• JoãodaCruzsuspeitaquealgocorrerámal,porissoacompanhaSimão,semestesaber;
• Uniramesforços;
• SimãotemumbreveencontrocomTeresa,mastemqueseirembora,poisosassassinosestãono
seuencalço;
• Simãoficaferidoeosassassinossãomortos.
SíntesedaobraCapítuloVII
• OferimentodeSimãoémaisgravedoquesejulgava;
• TeresamandaumacartaaSimão;
• BaltasarélevadoàjusIça,jáqueoscriadosassassinadoseramdele,contudonadasedescobre;
• OpaideTeresatemconhecimentodetudoedecidemandarafilhaparaummosteiro;
• Ambientedomosteiro:
• LocalhosIl;
• Existemintrigasedifamação;
• CríIcaaoambientereligioso.
CapítuloVIII
• ÉMarianaquemcuidadeSimão:
• ComprovaçãodequeMarianaestáapaixonadaporSimão;
• SonhodeMariana– indíciotrágicodequealgoaconteceráaSimão;
• TrocadecartasentreSimãoeTeresa– SimãoficaasaberqueTeresaestánumconvento;
• Marianaapercebe-sedequeSimãoestásemdinheiroeelaboraumplano– dardinheiroaSimão,
dizendo-lhequeInhasidosuamãeamandar-lho;
• SimãopercebequeMarianaoama.
SíntesedaobraCapítuloIX
• OpaideTeresasabeondeestáSimãoepretendelevarTeresaparaoutroconvento;
• Amendigaquefaziaatrocadecartasédescobertaeespancada;
• Marianaoferece-separafazeressepapel;
• FicaofendidaquandoSimãolhequerpagarporisso.
CapítuloX
• MarianavaiaoconventoondeestáTeresaparalheentregarumacarta:
• Adevassidãodoclero:
• OpadrecapelãodomosteiroondeestáTeresainteressa-seporMariana;
• EncontroentreMarianaeTeresa:
• TeresaquerpagaraMarianaporelaassumiropapeldemensageira:
• Marianasente-sediminuídaquerpelabeleza,querpelariquezadeTeresa;
• SimãopretenderaptarTeresaquandoamudaremdeconvento:
• TeresadissuadeSimão(recadoquemandaporMariana)
• NovopressenImentodeMariana;
• Simãodecideiraoconvento:
• EncontraBaltasar– mortedeBaltasar;
• Simãoassumeaculpaeentrega-se.
SíntesedaobraCapítuloXI
• Simãoépreso;
• OpaideSimãonãointerferenocaso;
• EstupefaçãodojuizpornãohaverqualquertentaIvadeilibarSimão;
• AmãeescreveaSimãoeesteficaasaberqueodinheiroquerecebeunãofoidasuaparte.
• Marianavisita-o.
CapítuloXII
• OpaideSimãomuda-separaVilaRealparaestarlongedeViseu(ondeSimãoestápreso);
• MarianacuidadeSimãonacadeia;
• OpaideSimãoestáirredunveleamãeescreveaopaiapedirclemênciapelofilho;
• Simãoécondenadoàforca;
• Todaafamíliaapelaaopaiparaqueesteintercedaafavordofilho;
• ÉoIo-avôdeSimãoqueconsegueconvenceropai;
• Simãoouviuimperturbávelasuasentençaenãoquisapelar;
• Opovogostadeenforcamentoseéhábitolevaremascriançaspara“quesirvadeexemplo”;
• Simãopreocupa-secomMarianaepercebequeelaoama:
• PedeaJoãodaCruzquecuidedarapariga.
SíntesedaobraCapítuloXIII
• VidadeTeresadesdeamortedeBaltasar:
• TeresatemconhecimentodequeBaltasarmorreuequeSimãoomatou;
• SabequeSimãoseentregouàjusIça;
• Encontra-sedébil,sentequemorreráembreve;
• Apósalgunsimpedimentos,consegueescreveraSimão;
• ArespostadeSimãodá-lhevida.
CapítuloXIV
• OpaideTeresavaivisitá-laeencontra-adoente;
• ComoSimãoestánacadeiadoPorto,opaideTeresapretendelevá-laparaViseu;
• Apesardeestardébil,Teresamanifesta-secontraavontadedopai,dizendoqueporsuavontade
morreriaigualmentenumaforcaaoladodeSimão;
• OpaideTeresafazdetudoparaquenãoexistaqualquercomunicaçãoentreSimãoeasuafilhaaté
queoCorregedordoPortolhedizqueSimãoéumhomemdehonraequenãoseráenforcado.
SíntesedaobraCapítuloXV
• 13.março.1805
• JoãodaCruzvaivisitarSimão:
• Marianaestámelhordesaúde;
• AmãedeSimãopediuaJoãodaCruzparacuidardoseufilho;
• SimãopedeaJoãodaCruzparairentregarumacartaaTeresaeesteconseguefazê-lo,trazendo
umarespostadevolta;
• MarianavoltaráaajudarSimãonacadeia(emboratantoSimãocomoJoãodaCruzsaibamque
MarianaamaSimão).
CapítuloXVI
• OirmãodeSimão,Manuel,queregressouacasacomumaamante,vaivisitá-loàcadeia–este
recebe-ocomfrieza;
• ManuelfalacomodesembargadorquelhegarantequeSimãonãoiráparaaforca,masparao
degredo;
• Teresasente-semelhordesdequesoubequeSimãonãoiriaparaaforca;
• OpaideSimãonãoaceitaManuelemsuacasa,umavezqueamulherqueeletrazécasada;
• OpaideSimãotratadeajudarestasenhoraavoltaràsuaterranatal,paraquedeixeasuafamília.
SíntesedaobraCapítuloXVII
• JoãodaCruztemumpressenImentodequealgoiráacontecer;
• Chegaumcavaleiroàportadesuacasaemata-o,dizendoquevemsaldarumadívidadeseupai;
• SimãorecebeumacartanacadeiaadaranonciaeMarianaestápresente;
• SofrimentodeMariana;
• Apelo/EgoísmodeSimão.
CapítuloXVIII
• MarianavendeuasterrasdopaiepediuaSimãoparaguardarodinheiro;
• MarianapretendeirparaodegredocomSimão;
• SimãoeMarianatêmaprimeiraconversasincera,emqueSimãolhedizquenãolhepodedaroseu
amor;
• MarianaestádispostaamorrerporSimão;
• Aofimdesetemeses,otribunaldecretouapenadeSimão–10anosdedegredoparaaÍndia;
• OpaideSimãoconseguequeapenasejacumpridanaprisãodeVilaReal;
• Simãonãoaceita–querirparaodegredo.
SíntesedaobraCapítuloXIX
• Simãoestáhádezanovemesesnaprisão;
• Discursodonarrrador;
• CartasdeTeresaeSimão:
• SimãopedeaTeresa“SetemderenascerparaIumaauroradepaz,viveparaafelicidade
dessedia.”;
• 10.março.1807:
• InImaçãoparaseguirnaprimeiraembarcaçãoparaaÍndia;
CapítuloXX
• 17.março.1807–embarcounoCaisdaRibeira;
• Simãodistribuiodinheiroqueasuamãelhemandou-dignidade;
• SimãovêaolongeoconventoeTeresaestánomiranteatrásdogradeamento;
• Despedem-secomumaceno;
• Simãovêalgumaagitação–éTeresaquemorre;
• Simãopareceestaraplanearasuamorteeconversacomocomandanteepreparaofuturo
deMariana.
Síntesedaobra
Conclusão
• ÚlImacartadeTeresa;
• Simãovaiaoconvéscomocomandante:
• EstesuspeitaqueSimãosequeirasuicidar;
“É já omeu espírito que te fala, Simão. Atua amiga morreu. A tua pobre Teresa, àhora em que leres esta carta, se me Deusnãoengana,estáemdescanso.” “Adeus!Àluzdaeternidadeparece-mequejátevejo,Simão!”
• Simãoadoece;
• Aoanoitecer,deitadonoseucatre,Simãodelira;
• MortedeSimão;
• ÉaIradoaomar.
Conclusão
• ÚlImacartadeTeresa;
• Simãovaiaoconvéscomocomandante:
• EstesuspeitaqueSimãosequeirasuicidar;
“Tu virás ter connosco; ser-te-emos irmãosnoCéu…Omaispuroanjoserás tu...Seésdeste mundo, irmã; se és deste mundo,Mariana...”
• Antesquealguémvisse,MarianaaIra-se
aomare,abraçando-seaSimão,morre.
• Ascartassãosalvas. “DafamíliadeSimãoBotelhoviveainda,emVila Real de Trás-os-Montes, a senhora D.Rita Emília da Veiga Castelo Branco, a irmãpredileta dele. A úlIma pessoa falecida, hávinteeseisanos,foiManuelBotelho,paidoautordestelivro.”
Sugestão biográfica da obra
Realidade Ficção
Amor de Perdição – Memórias duma Família
Título Subtítulo
Narrativa dos amores contrariados de Simão e Teresa.
Inspiração na história real de u m f a m i l i a r ( t i o ) e n u m documento fidedigno (registo da Cadeia da Relação do Porto).
IntroduçãoFolheandoos livrosdeanIgosassentamentosnocartóriodascadeiasdaRelaçãodoPorto, li,nodasentradasdospresosde1803a1805,pág.232,oseguinte:Simão António Botelho, que assim disse chamar-se, solteiro e estudante na Universidade de Coimbra, natural dacidadedeLisboa,eresidentenaocasiãodasuaprisãonacidadedeViseu,idadededezoitoanos,filhodeDomingosJosé Correia Botelho e de D. Rita Preciosa Caldeirão Castelo Branco; estatura ordinária, cara redonda, olhoscastanhos,cabeloebarbapreta,vesJdocomjaquetaazul,coletedefustãopintadoecalçadepanopedrês.Àmargemesquerdadesteassentoestáescrito:FoiparaaÍndiaa17deMarçode1807.Nãofiariademasiadonasensibilidadedoleitorporacharqueodegredodeumrapazdedezoitoanoslhehádefazerdó.Dezoitoanos!Oamanhecerdouradoeescarlatedamanhãdavida!AsgenIlezasdocoraçãoqueaindanãosonhaemfrutosmasjáseperdeemdevaneiosnoperfumedasflores!Dezoitoanos!Oamordaquelaidade!Apassagemdoseiodafamília,dosbraçosdamãe,dosbeijosdasirmãs,paraascaríciasmaisdocesdavirgem,queselheabredeigualmodocomoflordamesmaestaçãoedosmesmosaromas,eàmesmahoradavida!Dezoitoanos!..Edegredadodapátria,doamoredafamília!NuncamaisverocéudePortugal,nemamãe,nemareabilitação,nemadignidade,nemumamigo!..Étriste!Oleitordecertoseentristecia;ealeitora,selhedissessememmenosdeumalinhaahistóriadaquelesdezoitoanos,choraria!Amou,perdeu-seemorreuamando.É a história. E umahistória assim conseguirá por ventura ouvi-la de olhos enxutos amulher, a criaturamais bemformada das branduras da piedade que por vezes traz consigo do Céu um reflexo da divinamisericórdia? Essa, aminhaleitora,acarinhosaamigadetodososinfelizes,nãochorariaseeulhedissessemqueopobrerapazperdeuahonra, a reabilitação, a pátria, a liberdade, as irmãs, a mãe, a vida, tudo... por amor da primeira mulher que odespertoudoseusonhodeinocentesdesejos?Chorava,chorava!Tomaraeusaberdizerquantodolorososobressaltoquemecausaramaquelaslinhas,procuradasdepropósito,elidascomaamarguraeorespeitoe,aomesmotempo,ódio.Ódio,sim...Aseutempoverãoseéperdoáveloódio,ouseantesnãomeforamelhorabrirmãodesde jádeumahistóriaquepodeprovocaranáuseaaosfriosjulgadoresdocoraçãopelassentençasqueeuaquidissercontraafalsavirtudedoshomens,feitosbárbaros,emnomedasuahonra.
IntroduçãoFolheando os livros de anIgos assentamentos nocartório das cadeias da Relação do Porto, li, no dasentradas dos presos de 1803 a 1805, pág. 232, oseguinte:Simão António Botelho, que assim disse chamar-se,solteiroeestudantenaUniversidadedeCoimbra,naturaldacidadedeLisboa,eresidentenaocasiãodasuaprisãona cidade de Viseu, idade de dezoito anos, filho deDomingos José Correia Botelho e de D. Rita PreciosaCaldeirão Castelo Branco; estatura ordinária, cararedonda,olhoscastanhos,cabeloebarbapreta,vesJdocom jaqueta azul, colete de fustão pintado e calça depanopedrês.Àmargemesquerdadesteassentoestáescrito:FoiparaaÍndiaa17deMarçode1807.Nãofiariademasiadonasensibilidadedoleitorporacharque o degredo de um rapaz de dezoito anos lhe há defazerdó.Dezoito anos! O amanhecer dourado e escarlate damanhãdavida!AsgenIlezasdocoraçãoqueaindanãosonha em frutos mas já se perde em devaneios noperfume das flores! Dezoito anos! O amor daquelaidade! A passagem do seio da família, dos braços damãe,dosbeijosdasirmãs,paraascaríciasmaisdocesdavirgem, que se lhe abre de igual modo como flor damesmaestaçãoedosmesmosaromas,eàmesmahoradavida!Dezoitoanos!..Edegredadodapátria,doamore da família!Nuncamais ver o céu de Portugal, nemamãe, nem a reabilitação, nem a dignidade, nem umamigo!..Étriste!
OrigemdamatérianarraIva
Factosreais:• Registosdocartóriodascadeiasda
RelaçãodoPorto;• Verosimilhança.
Personagens
DomingosBotelho:• PaideSimãoBotelho
D.RitaPreciosaCasteloBranco:• MãedeSimãoBotelho
SimãoBotelho:• Estudantede18anos;• “estaturaordinária,cararedonda,olhos
castanhos,cabeloebarbapreta”;• Apaixonado;• Degredado.
Acontecimentosnucleares
PaixãodeSimão:• Afastamentodafamília;• CondenaçãoaodegredonaÍndia.
Oleitordecertoseentristecia;ealeitora,selhedissessememmenosdeumalinhaahistóriadaquelesdezoitoanos,choraria!Amou,perdeu-seemorreuamando. É a história. E uma história assimconseguirá por ventura ouvi-la de olhosenxutos a mulher, a criatura mais bemformadadasbrandurasdapiedadequeporvezes traz consigo do Céu um reflexo dadivinamisericórdia?Essa,aminhaleitora,acarinhosa amiga de todos os infelizes, nãochoraria se eu lhe dissessem que o pobrerapaz perdeu a honra, a reabilitação, apátria,a liberdade,as irmãs,amãe,avida,tudo...poramordaprimeiramulherqueodespertou do seu sonho de inocentesdesejos? Chorava,chorava!Tomaraeusaberdizerquanto doloroso sobressalto que mecausaram aquelas linhas, de propósitoprocuradas, e lidas com a amargura e orespeitoe,aomesmotempo,ódio. Ódio, sim... A seu tempo verão se éperdoáveloódio,ou seantesnãome foramelhorabrirmãodesde jádeumahistóriaque pode provocar a náusea aos friosjulgadores do coração pelas sentenças queeu aqui disser contra a falsa virtude doshomens, feitos bárbaros, em nome da suahonra.
Frase-síntesedaobra“Amou,perdeu-seemorreuamando.”
SenImentosprovocadospelahistóriaqueirárelatar• “dolorososobressalto”expressoatravés
de“amargura”,“respeito”e“ódio”
RazõesquemoIvamointeressedonarrador
• “dolorososobressalto”esenImentoscontraditórios
(“amargura”,“respeito”,“ódio”)provocadospelo
conhecimentodahistória–aprecocidadedamorte
deSimão;
• SimãoBotelhoéparentedoautor,éseuIopaterno;
• (EmboranãoestejapresentenaIntrodução,Camilo
CasteloBrancotambémfoipresoporquestões
amorosas,oque,naturalmente,concorreparaoseu
interesseporestahistória.)
Intençãoespecíficadecontarestahistória
“aquelaslinhas,depropósitoprocuradas”
Oleitordecertoseentristecia;ealeitora,selhedissessememmenosdeumalinhaahistóriadaquelesdezoitoanos,choraria!Amou,perdeu-seemorreuamando. É a história. E uma história assimconseguirá por ventura ouvi-la de olhosenxutos a mulher, a criatura mais bemformadadasbrandurasdapiedadequeporvezes traz consigo do Céu um reflexo dadivinamisericórdia?Essa,aminhaleitora,acarinhosa amiga de todos os infelizes, nãochoraria se eu lhe dissessem que o pobrerapaz perdeu a honra, a reabilitação, apátria,a liberdade,as irmãs,amãe,avida,tudo...poramordaprimeiramulherqueodespertou do seu sonho de inocentesdesejos? Chorava,chorava!Tomaraeusaberdizerquanto doloroso sobressalto que mecausaram aquelas linhas, procuradas depropósito, e lidas com a amargura e orespeitoe,aomesmotempo,ódio. Ódio, sim... A seu tempo verão se éperdoáveloódio,ou seantesnãome foramelhorabrirmãodesde jádeumahistóriaque pode provocar a náusea aos friosjulgadores do coração pelas sentenças queeu aqui disser contra a falsa virtude doshomens, feitos bárbaros, em nome da suahonra.
Público-alvodaobra
“leitora”:• OenredosenImentalcorrespondeaogostoromânIco
dopúblicofeminino;• Onarradorprocurasensibilizaronarratárioparaa
situaçãoquevaiserrelatada.
LinguagemuIlizadaesuaexpressividade
• AlinguagemuIlizadarefleteoenvolvimentoemoIvo
donarrador:
• Pontuaçãoexpressiva:
• Exclamações;
• Interrogaçõesretóricas;
• ReIcências(hesitaçõesmarcadas).
Autorenarrador
• Asimetriarealidade-ficçãofazcomquenaintroduçãoestasduasenIdadessefundam.
• CamiloCasteloBrancoescreveestaobranaprisão.Oautorfoicondenadopelocrimedeadultério–AnaPlácidoeracasadaeabandonouomaridoparaficarcomCamilo.
O herói romântico
Marcado por:
. Excecionalidade
. Força de sentimentos
. Individualismo
. Egocentrismo
. Esperança
. Idealismo
. Confronto com a sociedade
. Desilusão / Frustração Caspar Friedrich, O viajante sobre o mar de névoa, 1818
CapítuloIDomingosJoséCorreiaBotelhodeMesquitaeMeneses,fidalgodelinhagemeumdosmaisanIgossolarengosdeVila-RealdeTrás-os-Montes,eraem1779, juiz de fora de Cascais, e nessemesmo ano casara comumadamado paço,D. Rita TeresaMargarida Preciosa daVeiga Caldeirão CasteloBranco,filhadumcapitãodecavalos,netadeoutro(...).Formara-seDomingosBotelhoem1767,eforaaLisboalernoDesembargodoPaço,iniciaçãobanaldosqueaspiravamàcarreiradamagistratura.DomingosBotelhocasoucomD.RitaPreciosa.Ritaeraumaformosura,queaindaaoscinquentaanossepodiaprezardeoser.Adamadopaçonãofoiditosacomomarido.Molestavam-nasaudadesdacorte,daspompasdascâmarasreais.edosamoresdesuafeiçãoemolde,queimolouaocaprichodarainha.Estedesgostosoviver,porém,nãoempreceuquesereproduzissememdoisfilhosetrêsmeninas.OmaisvelhoeraManuel,osegundoSimão;dasmeninasumaeraMaria,asegundaAnaeaúlImaInhaonomedesuamãe,ealgunstraçosdebelezadela(...).Em1801,achamosDomingosJoséCorreiaBotelhodeMesquitacorregedoremViseu.Manuel,omaisvelhodeseusfilhos, temvinteedoisanos,e frequentaosegundoano jurídico.Simão,que temquinze,estudahumanidadesemCoimbra.Asmeninassãooprazereavidatodadocoraçãodesuamãe.Ofilhomaisvelhoescreveuaseupaiqueixando-sedenãopodervivercomseuirmão,temerosodogéniosanguináriodele.Contaqueacadapassosevêameaçadonavida,porqueSimãoempregaempistolasodinheirodoslivros,convivecomosmaisfamososperturbadoresdaacademia,ecorredenoiteasruasinsultandooshabitanteseprovocando-osàlutacomassuadas.Manuel,cadavezmaisaterradodasarremeIdasdeSimão,saideCoimbraantesdefériasevaiaViseuqueixar-seepedirquelhedêseupaioutrodesIno,D.Ritaquerqueseufilhosejacadetedecavalaria.DeViseuparteparaBragançaManuelBotelho,ejusIfica-senobredosquatrocostadosparasercadete.Noentanto,SimãorecolheaViseucomosseusexamesfeitoseaprovados.Opaimaravilhava-sedotalentodofilho,edesculpa-odaextravagânciaporamordotalento.Pede-lheexplicaçõesdoseumauvivercomManuel,eelerespondequeseuirmãooquerforçaravivermonasIcamente.OsquinzeanosdeSimãotêmaparênciasdevinte.Éfortedecompleição;belohomemcomasfeiçõesdesuamãe,eacorpulênciadela;masdetodoavessoemgénio.NaplebedeViseuéqueeleescolheamigosecompanheiros. (...)As irmãs temiam-no,IranteRita,amaisnova,comquemelebrincavapuerilmente,eaquemobedecia,seelalhepedia,commeiguicesdecriança,quenãoandassecompessoasmecânicas.Finalizavam as férias, quando o corregedor teve um grave dissabor. Umdos seus criados Inha ido levar a beber osmachos, e, por descuido oupropósito, deixou quebrar algumas vasilhas que estavam à vez no parapeito do chafariz. Os donos das vasilhas conjuraram contra o criado;espancaram-no. Simão passava nesse ensejo; e, armado de um fueiro que descravou de um carro, parIu muitas cabeças, e rematou o trágicoespetáculopelafarsadequebrartodososcântaros.Opovoléuintactofugiraespavorido,queninguémseatreviaaofilhodocorregedor;osferidos,porém,incorporaram-seeforamclamarjusIçaàportadomagistrado.DomingosBotelhobramiacontraofilho,eordenavaaomeirinhogeralqueoprendesseàsuaordem.D.Rita,nãomenosirritada,masirritadacomomãe,mandou,porportastravessas,dinheiroaofilhoparaque,semdetença,fugisseparaCoimbra,eesperasseláoperdãodopai.O corregedor quando soubeo expediente de suamulher, fingiu-se zangado, e prometeu fazê-lo capturar emCoimbra. Como, porém,D. Rita lhechamasse brutal nas suas vinganças e estúpido juiz de uma rapaziada, o magistrado desenrugou a severidade posIça da testa, e confessoutacitamentequeerabrutaleestúpidojuiz.
CapítuloIDomingos José Correia Botelho de Mesquita eMeneses, fidalgo de linhagem e um dos maisanIgos solarengosdeVila-RealdeTrás-os-Montes,eraem1779,juizdeforadeCascais,enessemesmoanocasaracomumadamadopaço,D.RitaTeresaMargarida Preciosa da Veiga Caldeirão CasteloBranco,filhadumcapitãodecavalos,netadeoutro(...).Formara-se Domingos Botelho em 1767, e fora aLisboa lernoDesembargodoPaço, iniciaçãobanaldosqueaspiravamàcarreiradamagistratura.DomingosBotelhocasoucomD.RitaPreciosa.Ritaerauma formosura, que ainda aos cinquenta anossepodiaprezardeoser.A dama do paço não foi ditosa com o marido.Molestavam-nasaudadesdacorte,daspompasdascâmarasreais.edosamoresdesuafeiçãoemolde,que imolouaocaprichodarainha.Estedesgostosoviver,porém,nãoempreceuquese reproduzissemem dois filhos e três meninas. O mais velho eraManuel, o segundo Simão; das meninas uma eraMaria, a segundaAna e a úlImaInha o nomedesuamãe,ealgunstraçosdebelezadela(...).Em1801, achamosDomingos JoséCorreiaBotelhodeMesquitacorregedoremViseu.Manuel, o mais velho de seus filhos, tem vinte edois anos, e frequenta o segundo ano jurídico.Simão, que tem quinze, estuda humanidades emCoimbra.Asmeninassãooprazereavidatodadocoraçãodesuamãe.
Caracterizaçãodoambientefamiliar
DomingosBotelhoD.RitaCasteloBranco
Manuel Simão Maria Ana Rita
DomingosBotelho–Corregedor-AnIgomagistradocomfunçõesanálogasàsdoactualjuizdeDireito
D.Rita–damadopaço,habituadaaoscostumesdacorte,nãolheagradavaavivênciaemViseu.
Manuel–22anos,frequentao2ºanojurídicoemCoimbra.
Simão–15anos,estudahumanidadesemCoimbra.
Raparigas–“sãooprazereavidatodadocoraçãodesuamãe”.
(ConInuaçãoCap.I)O filhomais velho escreveu a seupai queixando-sede não poder viver com seu irmão, temeroso dogéniosanguináriodele.Contaqueacadapassosevêameaçado na vida, porque Simão emprega empistolas o dinheiro dos livros, convive com osmaisfamosos perturbadores da academia, e corre denoiteasruasinsultandooshabitanteseprovocando-osàlutacomassuadas.Manuel,cadavezmaisaterradodasarremeIdasdeSimão, sai deCoimbra antesde férias e vai aViseuqueixar-seepedirquelhedêseupaioutrodesIno,D. Rita quer que seu filho seja cadete de cavalaria.De Viseu parte para Bragança Manuel Botelho, ejusIfica-se nobre dos quatro costados para sercadete.No entanto, Simão recolhe a Viseu com os seusexamesfeitoseaprovados.Opaimaravilhava-sedotalento do filho, e desculpa-o da extravagância poramor do talento. Pede-lhe explicações do seumauviver comManuel, e ele respondeque seu irmãooquerforçaravivermonasIcamente.OsquinzeanosdeSimãotêmaparênciasdevinte.Éfortedecompleição;belohomemcomasfeiçõesdesuamãe, e a corpulência dela;mas de todo avessoem génio. Na plebe de Viseu é que ele escolheamigos e companheiros. (...) As irmãs temiam-no,Irante Rita, a mais nova, com quem ele brincavapuerilmente, e a quem obedecia, se ela lhe pedia,com meiguices de criança, que não andasse compessoasmecânicas.
Simão
• Rebelde;• Inteligente;• “fortecompleição”–éumhomemfortee
bonito;• “avessoemgénio”–dá-secomosmais
pobres,nãofazendodisInçãosocial;• Temidopelasirmãs;• Meigoparaairmãmaisnova–
sensibilidade.
IníciodoretratodoheróiromânIco
(ConInuaçãoCap.I)Finalizavam as férias, quando o corregedor teve umgravedissabor.UmdosseuscriadosInhaidolevarabeber os machos, e, por descuido ou propósito,deixou quebrar algumas vasilhas que estavam à vezno parapeito do chafariz. Os donos das vasilhasconjuraram contra o criado; espancaram-no. Simãopassava nesse ensejo; e, armado de um fueiro quedescravou de um carro, parIu muitas cabeças, erematou o trágico espetáculo pela farsa de quebrartodos os cântaros. O povoléu intacto fugiraespavorido, que ninguém se atrevia ao filho docorregedor; os feridos, porém, incorporaram-se eforamclamarjusIçaàportadomagistrado.DomingosBotelhobramia contraofilho,eordenavaaomeirinho geral que o prendesse à sua ordem. D.Rita, não menos irritada, mas irritada como mãe,mandou,porportas travessas,dinheiroaofilhoparaque,semdetença, fugisseparaCoimbra,eesperasseláoperdãodopai.O corregedor quando soube o expediente de suamulher, fingiu-se zangado, e prometeu fazê-locapturar em Coimbra. Como, porém, D. Rita lhechamassebrutalnassuasvingançaseestúpidojuizdeuma rapaziada, o magistrado desenrugou aseveridadeposIçadatesta,econfessoutacitamentequeerabrutaleestúpidojuiz.
Simãorespondeaideaisemqueacredita,revolta-secontraainjusIçaeentraemconflito.
OpaideSimãonãotemcontemplaçõescomofilhoepretendequeoprendam.
AmãedeSimãodádinheiroaofilhoparaqueestefujaparaCoimbra.
AItudesdisIntasfaceaocomportamentodofilhoerelaIvamenteàjusIça.
O amor-paixão
Intensidade do sentimento
Entrega espiritual
Impossibilidade de concretização física
Oposição à razão
Motivador de conflito com a sociedade
Catalisador da tragédia (associação à morte)
O amor-paixão
CapítuloIVOcoraçãodeTeresaestavamenIndo.Vãopedirsinceridadeaocoração!Parafinosentendedores,odiálogodoanteriorcapítulodefiniuafilhadeTadeudeAlbuquerque.Emulhervaronil, temforçadecaráter, orgulho fortalecido pelo amor, desapego das vulgaresapreensões,sesãoapreensõesarenúnciaqueumafilhafezdoseualvedrioàsimprevidentesecaprichosasvontadesdeseupai.Dizboagentequenão,eeuabundosemprenovotodagenteboa. Não será aleive atribuir-lhe uma pouca de astúcia ouhipocrisia, se quiserem; perspicácia seria mais correto dizer.Teresaadivinhaquealealdadetropeçaacadapassonaestradarealdavida,equeosmelhoresfinsseaIngemporatalhosondenãocabemafranquezaeasinceridade.Estesardissãorarosnaidade inexperta de Teresa; mas a mulher do romance quasenuncaétrivial,eestadequerezamosmeusapontamentoseradisInnssima. A mim me basta crer em sua disTnção, acelebridadequeelaveioaganharàcontadadesgraça.DacartaqueelaescreveuaSimãoBotelho, contandoas cenasdescritas,acríIcadeduzqueameninadeViseucontemporizavacomopai,pondoamiranofuturo,sempassarpelodissabordoconvento, nem romper com o velho em manifestadesobediência.NanarraIvaquefezaoacadémicoomiIuelaasameaças do primo Baltasar, cláusula que, a ser transmiIda,arrebataria de Coimbra o moço, em quem sobejavam brios ebravuraparamantê-los.MasnãoéestaaindaacartaquesurpreendeuSimãoBotelho.Parecia bonançoso o céu de Teresa. Seu pai não falava emclaustro nem em casamento. Baltasar CouInho voltara ao seusolar de Castro-d'Aire. A tranquilamenina dava semanalmenteestasboasnovasaSimão,que,aliandoàsventurasdocoraçãoas riquezasdoespírito,estudava incessantemente,edesvelavaasnoitesarquitetandooseuedizciodefuturaglória.
Teresa• Revela“perspicácia”,nãoafrontando
diretamenteoseupaieservindo-sedealguma“astúcia”aoaparentarrenunciaraosseusdesejosecederàs“caprichosasvontades”doseuprojenitor;
• Forte,astuciosa,perspicaz,ponderada.
• ConheceogéniodeSimão,porissonãolhecontatudo:
• Inteligenteeponderada
Simão• EstáemCoimbraemantémum
comportamentomaiscalmo;• Estuda“incessantemente”,graçasaeste
amorquehabitaoseu“coração”.
Antecipaçãodoquehádevir.TeresairáescreveroutracartaquefaráSimãoagircomooutrorafazia.
ComentáriosdonarradorrevelamasuaperspecIvapessoal,valorizaçãodosenImentoamoroso(absolviçãodoautor).
(ConInuaçãoCap.IV)Aoromperd’alvadumdomingodejunhode1803,foiTeresachamadaparaircom seu pai à primeira missa da igreja paroquial. VesTu-se a menina,assustada, e encontrou o velho na antecâmara a recebê-la com muitoagrado,perguntando-lheseelaseerguiadebonshumoresparadaraoautordeseusdiasumrestodevelhicefeliz.OsilênciodeTeresaerainterrogador.-VaishojedaramãodeesposaateuprimoBaltasar,minhafilha.Éprecisoque te deixes cegamente levar pela mão de teu pai. Logo que deres estepasso dizcil, conhecerás que a tua felicidade é daquelas que precisam serimpostas pela violência. Mas repara, minha querida filha, que a violênciadum pai é sempre amor. Amor tem sido a minha condescendência ebrandura para conTgo. Outro teria subjugado a tua desobediência commaustratos,comosrigoresdoconvento,etalvezcomodesfalquedoteugrande património. Eu, não. Esperei que o tempo te aclarasse o juízo, efelicito-medetejulgardesassombradadodiabólicopresngiodomalditoqueacordou o teu inocente coração. Não te consultei outra vez sobre estecasamento,portemerqueareflexãofizessemalaozelodeboafilhacomquetuvaisabraçarteupai,eagradecer-lheaprudênciacomqueelerespeitouoteugénio,velandosempreahonradeteencontrardignadoseuamor.Teresa não desfitou os olhos do pai; mas tão abstraída estava, queescassamentelheouviuasprimeiraspalavras,enadadasúlImas.- Nãomerespondes,Teresa?!-tornouTadeu,tomando-lhecariciosamente
asmãos.- Queheideeuresponder-lhe,meupai?-balbuciouela.-Dá-meoque tepeço?Enchesde contentamentoospoucosdiasquemerestam?-Eseráopaifelizcomomeusacrizcio?-Nãodigassacrizcio,Teresa...Amanhãaestashorasverásquetransfiguraçãose fezna tuaalma. Teuprimoéumcompostode todasas virtudes;nemaqualidadedeserumgenIlmoçolhefalta,comoseariqueza,aciênciaeasvirtudesnãobastassemaformarummaridoexcelente.- E ele quer-me, depois de eu me ter negado? - disse ela com amargurairónica.-Seeleestáapaixonado,filha!...etembastanteconfiançaemsiparacrerquetuhásdeamá-lomuito!...-Enãoserámaiscertoodiá-loeusempre?!Euagoramesmooabominocomonuncapenseiquesepudesseabominar!Meupai...-conInuouela,chorando,comasmãoserguidas-mate-me;masnãomeforceacasarcommeuprimo!Éescusadaaviolência,porqueeunãocaso!
Costumes/Normassociais:• OpaideTeresadecidecomquemafilhairá
casar:• PrimoBaltasar:
• Igualestatutosocial;• Opatrimónioficanafamília.
AgeraçãodeTadeudeAlbuquerqueedeDomingosBotelhorege-sepelasseguintesnormas:• Ofilhoprimogénitodeveseguiraspisadasdo
pai(Manuelestudaparajuiz);• Osegundofilhodevesermilitarouingressar
navidareligiosa;• Asfilhassãoeducadasparaumbom
casamento,decididopelospais,ou• Podemingressarnumconvento.
PreponderânciadopretéritoperfeitodoindicaIvo–successãodeaçõespontuaiselocalizadasnumtempodeterminado(opretéritoimperfeitoeopresenteremetemparaumpassadoduraIvo)
Referênciasaotempodaação–ritmomaisrápido(contrastacomoritmomaislentodosparágrafosanteriores).
TadeudeAlbuquerque
(ConInuaçãoCap.IV)Tadeumudoudeaspecto,edisseirado:-Hás de casar! - Quero que cases! Quero!... Quandonão,amaldiçoadaserásparasempre,Teresa!Morrerásnumconvento!Esta casa irá para teuprimo!NenhuminfamehádeaquipôrpénasalcaIfasdemeusavós.Seésumaalmavil,nãomepertences,nãoésminhafilha,não podes herdar apelidos honrosos, que foram pelaprimeiravezinsultadospelopaidessemiserávelquetuamas!Malditasejas!Entranessequarto,eesperaquedaítearranquemparaoutro,ondenãoverásumraiodeSol.Teresa ergueu-se sem lágrimas, e entrou serenamentenoseuquarto.TadeudeAlbuquerquefoiencontrarseusobrinho,edisse-lhe:- Não te posso dar minha filha, porque já não tenhofilha. A miserável, a quem dei este nome, perdeu-separanóseparaela.Baltasar, que, a juízo de seu Io, era um composto deexcelência, Inha apenas uma quebra; a absolutacarência de brios.Malograda a tentaIva do seu amordeemboscada, tornouparaa terraoprimodeTeresa,dizendoaovelhoqueeleo livrariadoassédioemqueSimãoBotelholheInhaocoraçãodafilha.Nãoaprovouareclusãonoconvento,discorrendosobreashipótesesinfamantes que a opinião pública inventaria.Aconselhouqueadeixasseestar emcasa, e esperassequeofilhodocorregedorviessedeCoimbra.
Casamento ou Convento
MoIvodoódioentreasfamílias:• Emdeterminadaocasião,DomingosBotelho
decidiujudicialmentecontraTadeudeAlbuquerque–desdeaíasfamíliasnãosedão.
ConselhosdeBaltasar:• NãomandarTeresaparaumconvento-A
opiniãopública;• PromessadequelivrariaTeresadoassédiode
Simão.
TadeudeAlbuquerque
Teresa–forçaefirmezadecaráter,nãocedeàimposiçãodopaiesuporta“semlágrimas”oconfronto:• heroínaromânIca;• confrontocomasociedade;• crónicadamudançasocial.
Citaçõesqueservemdebaseàresposta:
1ºMomento:• “o velho na antecâmara a recebê-la commuito agrado, perguntando-lhe se ela se erguia de bons
humoresparadaraoautordeseusdiasumrestodevelhicefeliz.”• “Éprecisoquetedeixescegamentelevarpelamãodeteupai.”• “conhecerásquea tua felicidadeédaquelasqueprecisam ser impostaspela violência.Mas repara,
minhaqueridafilha,queaviolênciadumpaiésempreamor.”• “condescendência e brandura para conIgo. Outro teria subjugado a tua desobediência commaus
tratos, com os rigores do convento, e talvez com o desfalque do teu grande património. Eu, não.Espereiqueotempoteaclarasseojuízo”
• -Nãomerespondes,Teresa?!-tornouTadeu,tomando-lhecariciosamenteasmãos.2ºMomento• “Tadeumudoudeaspecto,edisseirado:• - Hás de casar! - Quero que cases! Quero!... Quando não, amaldiçoada serás para sempre, Teresa!
Morrerásnumconvento!Estacasairáparateuprimo!NenhuminfamehádeaquipôrpénasalcaIfasdemeus avós. Se és uma alma vil, não me pertences, não és minha filha, não podes herdar apelidoshonrosos,queforampelaprimeiravezinsultadospelopaidessemiserávelquetuamas!Malditasejas!Entranessequarto,eesperaquedaítearranquemparaoutro,ondenãoverásumraiodeSol.”
• “-Amiserável,aquemdeiestenome,perdeu-separanóseparaela.”
Caracterização de Tadeu de Albuquerque tendo em conta os dois momentos distintos na conversa com a filha
Resposta:
Duranteocapítuloquarto,nomeadamentenoexcertoapresentado,TadeudeAlbuquerquesofreumatransformaçãopsicológica,adotandodoisIposdecomportamentodisIntos.Numprimeiromomento,eleprocurasercompreensivocomasuafilha, tentandocriarumambientedeamizadeecumplicidade, recebendo-a “na antecâmara [...] com muito agrado, perguntando-lhe se ela se erguia de bonshumoresparadaraoautordeseusdiasumrestodevelhice feliz”.Desta forma,tentaqueasuafilhaconfieoseudesInonassuasmãos,dizendo-lheque“[é]precisoque[sedeixe]cegamentelevarpelamãode[s]eupai”esóassimconseguiráconhecerafelicidadeque,noseucaso,“[precisa]ser[imposta]pelaviolência”,porémesclarece-adizendoque“aviolênciadumpaiésempreamor”.ÉprecisamentenestemomentoqueopaideTeresaconfessaquetemsidosemprecondescendenteebrandocomela, jáque“[o]utroteriasubjugadoa[s]uadesobediênciacommaustratos,comosrigoresdoconvento,etalvezcomodesfalquedo[...]património”.Pelocontrário,oseuprogenitoresperoupacientementequeafilhatomasseumadecisão,aqualeleaguardanesteinstante“tomando-lhecariciosamenteasmãos”.TodoesteenlevoterminadeformaabruptaquandoTeresarespondeaseupaiquenãocasarácomoprimo.A parIr dessemomento, “Tadeumudou de aspecto” e ficou “irado”, dirigindo-se à filha de uma forma violenta.Assim,amaldiçoa-a,diz-lhequemorrerá“numconvento”equeserádespojadadoseupatrimónio,queserádadoaBaltasar.Oseudescontroloétalqueafirma“[s]eésumaalmavil,nãomepertences,nãoésminhafilha,nãopodesherdarapelidoshonrosos. [...]Malditasejas!”, rematandocomadecisãoacercadodesInodeTeresa“Entranessequarto,eesperaquedaítearranquemparaoutro,ondenãoverásumraiodeSol”.Emsuma,aalteraçãodoestadodeespíritodeTadeudeAlbuquerquefazcomqueTeresapassedeuma“boafilha”para uma “miserável”, sendo, destemodo, estes “cognomes” representaIvos da compreensão e da fúria senIdaspelopaidaprotagonista.
Caracterização de Tadeu de Albuquerque tendo em conta os dois momentos distintos na conversa com a filha
(ConInuaçãoCap.IV)Ponderaramnoânimodovelhoas razõesdeBaltasar. Teresamaravilhou-sedaquietação inesperadadeseupaiedesconfiouda incoerência.EscreveuaSimão. Nada lhe escondeu do sucedido; nem as ameaças de Baltasar pordelicadeza suprimiu.Rematavacomunicando-lheas suas suspeitasdealgumplanodeviolência.O académico, chegando ao período das ameaças, já não Inha clara luz nosolhosparadecifraro restantedacarta.Tremia sezões,easartérias frontaisarfavam-lheentumecidas.Nãoerasobressaltodocoraçãoapaixonado:eraaíndole arrogante que lhe escaldava o sangue. Ir dali a Castro-d'Aire eapunhalaroprimodeTeresanasuaprópriacasa,foioprimeiroconselhoquelhesegredouafúriadoódio.Nestepropósitosaiu,alugoucavalo,erecolheuavesIr-sedejornada.Jápreparado,acadaminutodeesperaassomava-seemfrenesis. O cavalo demorou-semeia hora, e o seu bom anjo, neste espaço,vesIdo com as galas com que ele vesIa na imaginação Teresa, deu-lherebatesde saudadedaqueles temposeaindadashorasdaquelemesmodiaemquecismavanafelicidadequeoamorlhepromeIa,seeleaprocurassenocaminhodotrabalho,edahonra.Contemplouosseuslivroscomtantoafeto,como se em cada um esIvesse uma página da história do seu coração.NenhumadaquelaspáginasInhaele lido, semquea imagemdeTeresa lheaparecesseafortalecê-loparavencerostédiosdaconInuadaaplicação,eosímpetos dum natural inquieto e ansioso de comoções desusadas. "E há detudoacabarassim?-pensavaele,comafaceentreasmãos,encostadoàsuabanca de estudo. - Ainda há pouco eu era tão feliz!... - Feliz! - repeIu ele,erguendo-se de golpe. - Quem pode ser feliz com a desonra duma ameaçaimpune?!... Mas eu perco-a! Nunca mais hei de vê-la!... Fugirei como umassassino, e meu pai será o meu primeiro inimigo, e ela mesmo há dehorrorizar-sedaminhavingança...Aameaça sóelaaouviu;e, seeuIvessesidoaviltadonoconceitodeTeresapelosinsultosdomiserável,talvezqueelaosnãorepeIsse.Simão Botelho releu a carta duas vezes, e à terceira leitura achou menosafrontosas as bravatas do fidalgo cioso. As linhas finais desmenIamformalmente a suspeita do aviltamento, com que o seu orgulho oatormentava: eram expressões ternas, súplicas ao seu amor comorecompensadospassadosefuturosdesgostos,visõesencantadorasdofuturo,novosjuramentosdeconstância,esenIdasfrasesdesaudade.
RevoltadeTeresaedeSimãoperanteasituação
ÂnsiadeliberdadeedejusIça,lutapelosideais
MudançanasociedadeprovenientedaRevoluçãoFrancesa(1789)
SimãoeTeresadispostosatudoparadarvozaosseusideaiseàsuahonra.
DiscursoemoIvodeSimão–grandeexpressividadedapontuação
(ConInuaçãodoCap.IV)Quandooarreeirobateuàporta,SimãoBotelho jánãopensavaemmatarohomemdeCastro-d'Aire;masresolverairaViseu,entrardenoite,esconder-seeverTeresa.Faltava-lhe,porém, casadeconfiançaonde seocultasse.Nasestalagens, seria logodescoberto.Perguntou ao arreeiro se conhecia alguma casa em Viseu onde ele pudesse estarescondidoumanoiteouduas,semreceiodeserdenunciado.OarreeirorespondeuqueInha,aumquartodeléguadeViseu,umprimoferrador;enãoconheciaemViseusenãoos estalajadeiros. Simão achou aproveitável o parentesco do homem, e logo daí opresenteoucomumajaquetadepeleseumafaixadesedaescarlate,àcontademaioresvalorespromeIdos,seeleobemservissenumaempresa,amorosa.No dia seguinte, chegou o académico a casa do ferrador. O arreeiro deu conta ao seuparentedoquevinhatratadocomoestudante.FoiSimãoBotelhocautelosamentehospedado,eoarreeiroabalounomesmopontoparaViseu,comumacartadesInadaaumamendiga,quemoravanomaisimpraIcávelbecodaterra. A mendiga informou-se miudamente da pessoa que enviava a carta, e saiu,mandandoesperaro caminheiro.Poucodepois. voltouela coma resposta, eoarreeiroparIuagalope.Eraarespostaumgritodealegria.TeresanãorefleIu,respondendoaSimãoquenaquelanoitesefestejavamosseusanos,esereuniamemcasaosparentes.Disse-lhequeàsonzehorasempontoelairiaaoquintalelheabririaaporta.Nãoesperavatantooacadémico.Oqueelepediaerafalar-lhedaruaparaajaneladoseuquarto,ereceava impossívelesteprazer,queeleavaliavaomáximo.Apertar-lheamão,senIr-lheohálito,abraçá-latalvez,cometeraousadiadeumbeijo,estasesperanças,tãoalém de suas modestas e honestas ambições, igualmente o enlevavam e assustavam.Enlevo e susto em corações que se estreiam na comédia humana são senImentoscongeniais.AhoradaparIda,Simãotremia,easimesmopediacontasdaImidez,semsaberqueosencantosda vida, osmais angélicosmomentosda alma, são esses lancesdemisteriosoalvoroçoqueaosmaisserôdiosdecoraçãosucedememtodasasrazõesdavida,eatodososhomens,umavezaomenos.Às onze horas em ponto estava Simão encostado à porta do quintal, e a distânciaconvencionadaoarreeirocomocavaloàrédea.Atoadadamúsica,quevinhadassalasremotas,alvoroçava-o,porqueafestaemcasadeTadeudeAlbuquerqueosurpreendera.Nolongotermodetrêsanosnuncaeleouviramúsicanaquelacasa.Seelesoubesseodianatalício de Teresa, espantara-se menos da estranha alegria daquelas salas, semprefechadascomoemdiasdemortório.Simão imaginoudesvairadamenteasquimerasquevoejam, ora negras, ora translúcidas, em redor da fantasia apaixonada.Não há balizaracionalparaasbelas,nemparaashorrorosasilusões,quandooamorasinventa.SimãoBotelho,comoouvidocoladoàfechadura,ouviaapenasosomdasflautas,easpancadasdocoraçãosobressaltado.
SimãoeTeresatêmaItudesdedesmedidoamor,sempensarverdadeiramentenasconsequênciasdosseusatos:• SimãodecideirverTeresa,
primeiramentecomoobjeIvodematarBaltasar(depoisacabaporficarmaiscalmo);
• TeresarevelaaSimãoquenaquelanoiteháfestaemsuacasaemarcaumencontroconsigo.
Amor-paixão
Referênciasaotempodaação–ritmomaisrápido(contrastacomoritmomaislentodosparágrafosanteriores).
Narrador heterodiegéIco com posiçãosubjeIva – os comentários revelam aperspeIva pessoal sobre a situaçãoemocional das personagens – valorizaçãodosenImentoamoroso.
CríTcaàsociedadedoséculoXIX
SenTmentoderevoltaedesencantofaceaopaís
Antagonismoentreahonradosprotagonistaseamoralsocialdecadenteeanacrónica
FacetaanT-heroicadosprotagonistas
A obra como crónica da mudança social
A obra como crónica da mudança social
A obra como crónica da mudança social
CapítuloXApeouMarianadefrontedomosteiro,efoiàportariachamarasuaamigaBrito.-Queboamoça! -disseopadrecapelão,queestavano rarolateraldaporta,praIcandocomaprioresa,acercadasalvaçãodas almas, e de umas coretas de vinho do Pinhão que elerecebera naquele dia, e do qual já Inha engarrafado umalmudeparatonizaroestômagodaprelada.-Queboamoça! - tornou ele, comumolhonela e outro noraro,ondeaciumosaprioresaseestavaremordendo.-Deixeláamoça,edigaquandohádeiraserventebuscarovinho.-Quandoquiser,senhoraprioresa.Masreparebemnosolhos,nofeiIo,naqueletododarapariga!...-Pois repareosenhorpadre João - replicoua freira -queeutenhomaisquefazer.E reIrou-se como coraçãoomal-ferido, e o queixo superiorescorrendolágrimas...desimonte.cheiroatabaco-hábitodoséc.XIX-Dondeévossemecê?-dissebrandamenteopadrecapelão.-Soudaaldeia-respondeuMariana.-Issovejoeu...Masdequealdeiaé?-Nãomeconfessoagora.-Masnãofariamalseseconfessasseamim,menina,quesoupadre...-Bemvejo.-Quemalgéniotem!...-Éistoquevê.-Quemprocuracánoconvento?-Jádisseláparadentroquemprocuro.-Mariana,éstu?!Andacá!
CríIcasocial
Estesdiálogosdocapelãoservemparamostrarqueosmembrosdoclerotêminteressesmundanais–adevassidãodoclero.
Diálogos
- Reproduçãofieldaoralidade;- TensãodramáIca;- Frasescurtas=ritmorápido;- Revelamapersonalidadedos
intervenientes:- Capelão–malicioso;- Mariana–decidida,
dedicada,temperamentoforte.
Mudançasocial
-Teresaestánoconventopornãoaceitaraimposiçãodopaierompercomoshábitosestabelecidos.
(ConInuaçãoCap.X)Amoçafezumacortesiadecabeçaaopadrecapelão,efoiaolocutóriodondevinhaaquelavoz.-EuqueriafalarconIgoemparIcular,Joaquina-disseMariana.-Euvouversearranjoumagrade:esperaaí..OpadreInhasaídodopáIo,eMariana,enquantoesperava,examinou,umaauma,asjanelasdomosteiro.Numadasjanelas,atravésdasreixasdeferro,viuelaumasenhorasemhábito.-Seráaquela?-perguntouMarianaaoseucoração,quepalpitava-Seeufosseamadacomoela!...-Sobeaquelasescadinhas,Mariana,eentranaprimeiraportadocorredor,queeulávou-disseJoaquina.Marianadeualgunspassos,olhounovamenteparaajanelaondeviraasenhorasemhábito,erepeIuainda:-Seeufosseamadacomoela!...Malentrounagrade,disseàsuaamiga:-Olhalá,Joaquina,queméumameninamuitobranca,alvacomoleite,queestavaaliagoranumajanela?-Seriaalgumanoviça,queháduascámuitolindas.-MaselanãoInhavesImentanenhumadefreira.-Ah!jásei;éaD.TeresinhadeAlbuquerque.-Entãonãomeenganei-disseMariana,pensaIva.-Poistuconhece-la?-Não;masporamordelaéqueeucávimfalarconIgo.-Entãoqueé?!Quetenstucomafidalga?-Eucá,pormimnada;mascomumapessoaquelhequermuito.-Ofilhodocorregedor?-Essemesmo.-MasesseestáemCoimbra,-Nãoseiseestá,nemsenão.Faz-metuumfavor?-Seeupuder...-Podes...Euqueriafalarcomela.-Ódianho!Issonãoseisepoderáser,porqueatrazemasfreirasdebaixodeolho,eelavai-seemboraamanhã.-Paraondevai?-Vaiparaoutroconvento,nãoseisedeLisboa,sedoPorto.Osbaúsjáestãopreparados,eelaestámortaporsair.Etuquelhequeres?-Nãotopossodizer,porquenãosei...Queriadar-lheumpapel...Fazecomqueelavenhacá,queeudou-techitaparaumvesIdo.-Comotuestásrica,Mariana!...-atalhou,rindo,Joaquina.-Eunãoqueroatuachita,rapariga.Seeupuderdizer-lhequevenha,semquealguémmeouça,digo-lho.Eagoraéboamaré,porquetocouaocoro...Deixa-meirlá...Joaquinasaiu-sebemdadizcilcomissão.Teresaestavasozinha,absorvidaacismar,comosolhosfitosnopontoondeviraMariana.-Ameninafazfavordevircomigodepressinha?-disse-lheacriada.Seguiu-aTeresa,eentrounagrade,queJoaquinafechou,dizendo:-Omaisbrevequepossabatapordentroparaeulheabriraporta.Seperguntaremporvossaexcelência,digo-lhequeameninaestánomirante.
IntervençãodeMariana-TrazumrecadodeSimãoparaTeresa;-Abnegaçãototal–fazomelhorparaSimão,passandoporcimadosseusprópriossenImentos.
ConInuaçãodocap.XAvozdeMarianatremia,quandoD.Teresalheperguntouquemera.-Souumaportadoradestacartaparavossaexcelência.-ÉdeSimão!-exclamouTeresa.-Sim,minhasenhora.Areclusaleuconvulsivaacartaduasvezes,edisse:-Eunãopossoescrever-lhe,quemeroubaramomeuInteiro,eninguémmeemprestaum.Diga-lhequevoudemadrugadaparaoconventodeMonchique,doPorto.Quesenãoaflija,porqueeusousempreamesma.Quenãovenhacá,porqueissoseriainúIl,emuitoperigoso.Queváver-meaoPorto,queheidearranjarmododelhefalar.Diga-lheisto,sim?-Sim,minhasenhora.-Nãoseesqueça,não?Vircá,pormodonenhum.Éimpossívelfugir,evoumuitoacompanhada.VaioprimoBaltasareasminhasprimas,emeupaienãoseiquantoscriadosdebagagemedasliteiras.Tirar-menocaminhoéumaloucuracomresultadosfunestos.Diga-lhetudo,sim?Joaquinadisseforadaporta:-Menina,olhequeaprioresaandalápordentroaprocurá-la.-Adeus,adeus-disseTeresa,sobressaltada.-TomeláestalembrançacomoprovademinhagraIdão.EIroudodedoumaneldeouro,queofereceuaMariana.-Nãoaceitominhasenhora.-Porquenãoaceita?-Porquenãofizalgumfavoravossaexcelência.Areceberalgumapagahádeserdequemcámemandou.FiquecomDeus,minhasenhora,eoxaláquesejafeliz.SaiuTeresa,eJoaquinaentrounagrade.-Játevaisembora,Mariana?-Vou,queépressa;umdiavireiconversarconIgomuito.Adeus,Joaquina.-Poisnãomecontasoqueistoé?Oamordafidalgaestápertodaqui?Conta,queeunãodigonada,rapariga!...-Outravez,outravez;obrigada,Joaquina?Mariana,duranteavelozcaminhada,foirepeIndoorecadodafidalga;e,sealgumavezsedistraiadesteexercíciodememória,eraparapensarnasfeiçõesdaamadadoseuhóspede,edizer,comoemsegredo,aoseucoração:"Nãolhebastavaserfidalgaerica:é,alémdetudo,lindacomonuncavioutra!"Eocoraçãodapobremoça,avergandoaoqueaconsciêncialheiadizendo,chorava.
PedidoexplícitodeTeresaparaqueSimãonãotenteirvê-laquandoelamudardeconvento.
TeresatentapagarofavorqueMarianalheestáafazer.• Mariananãoreagebema
isso.ElaassumeestepapelporamoraSimão,nãoquerserpagaporisso.
SofrimentodeMariana
Relações entre personagens
ConInuaçãoCap.XSimão, de uma fresta do posIgo do seu quarto, espreitava ao longo do caminho, ou escutava a estropeada dacavalgadura.AodescobrirMariana,desceuaoquinteiro,desprezandocautelaseesquecidojádoferimento,cujacrisedeperigopioraranaqueledia,queeraooitavodepoisdoIro.Afilhadoferradordeuorecado,esemalteraçãodepalavra.Simãoescutara-aplacidamenteatéaopontoemquelheeladissequeoprimoBaltasaraacompanhavaaoPorto.-OprimoBaltasar!...-murmurouelecomumsorrisosinistro-SempreesteprimoBaltasarcavandoasuasepulturaeaminha!...-Asua,fidalgo!-exclamouJoãodaCruz.-Morraele,queolevemtrintamilhõesdediabos!MasvossasenhoriahádeviverenquantoeuforJoão.Deixe-a irparaoPorto,quenãotemperigonoconvento.DehoraahoraDeusmelhora.Osenhor doutor vai para Coimbra, está por lá algum tempo, e às duas por três, quando o velho mal se precatar, afidalguinhaengrampa-o,eésuatãocertocomoestaluzquenosalumia.-Euheidevê-laantesdeparIrparaCoimbra-disseSimão.-Olhequeelarecomendou-memuitoquenãofosselá-acudiuMariana.-Porcausadoprimo?-tornouoacadémicoironicamente.-Achoquesim,eportalveznãoservirdenadaláirvossasenhoria-respondeuTmidamenteamoça.-Lá,sequer,-brandoumestreJoão-amulher,vai-se-lheTraraocaminho.Nãotemmaisquedizer.-Meupai,nãometaestesenhoremmaiorestrabalhos?-disseMariana.-Nãotemdúvidamenina-atalhouSimão-euéquenãoquerometerninguémemtrabalhos.Comaminhadesgraça,pormaiorqueelaseja,heideeulutarsozinho.JoãodaCruz,assumiuumagravidadedequeasuafigurararasvezesseenobrecia,disse:-SenhorSimão,vossasenhorianãosabenadadomundo.Nãometasozinhoacabeçaaostrabalhos,queeles,comoooutroquediz,quandopegamdeensarrilharumhomem,não lhedeixamtomarfôlego.EusouumrúsTco;mas,abemdizer,estounaqueladaquelequediziaqueomaldosseusburrinhosofizeraalveitar.Paixões...queasleveodiabo,emaisquem comelas engorda. Por causa de umamulher, ainda que ela seja filha do rei, não se ha de umhomembotar aperder.Mulhereshátantascomoapraga,esãocomoasrãsdocharco,quemergulhauma,eaparecemquatroàtonadaágua.Umhomemricoefidalgocomovossasenhoria,ondequertopaumacomumpalmodecaracomosequereumdotedeencheroolho.Deixe-aircomDeusoucomabreca,queela,seIverdesersua,nãolhehádevirdar,tantoandarparatráscomoparadiante:éditadodosanIgos.Olhequeistonãoémedo,fidalgo.TomesenIdo,queJoãodaCruzsabeoqueépôrdoishomensdumafeitaaolharosete-estrelo,masnãosabeoqueémedo.SeosenhorquersairàestradaeIraratalpessoaaopai,aoprimo,eaumregimento,sefornecessário,euvoumontarnaégua,edaquiatrêshorasestoudevoltacomquatrohomens,quesãoquatrodragões.Simãofitaraosolhoschamejantesnodoferrador,eMarianaexclamara,ajuntandoasmãossobreoseio:-Meupai,nãolhedêessesconselhos!...-Cala-teaí,rapariga!-dissemestreJoão.-VaiIraroalbardãoàégua,amanta-a,ebota-lheseco.Nãoésaquichamada.-Nãováaflita,senhora-disseSimãoàmoça,quesereIrava,amargurada.-Eunãoaproveitoalgunsdosconselhosdeseupai. Ouço-o com boa vontade, porque sei que quer o meu bem; mas hei de fazer o que a honra e o coração meaconselharem.
Campolexicaldemorte:
esseéodesInopressagiadodestecasal.
CaracterizaçãodeMariana:- correta;- cumpridora;- prudente;- preocupada
comSimão.
CaracterizaçãodeJoãodaCruz:- rúsIco;- Visão
tradicionalistadospapéisdohomemedamulher;
- bondoso;- dispostoa
ajudarSimão.- corajoso.
ConInuaçãodoCap.XAo anoitecer, Simão, como esIvesse sozinho, escreveu umalongacarta,daqualextratamososseguintesperíodos:"Considero-teperdida,Teresa.OSoldeamanhãpodeserqueeuo não veja. Tudo, em volta de mim, tem uma cor de morte.Parecequeofriodaminhasepulturameestápassandoosangueeosossos.Nãopossoseroquetuqueriasqueeufosse.Aminhapaixãonãoseconformacomadesgraça.Erasaminhavida:InhaacertezadequeascontrariedadesmenãoprivavamdeI.Sóoreceiodeperder-tememata.OquemerestadopassadoéacoragemdeirbuscarumamortedignademimedeI.Setensforçaparaumaagonialenta,eunãopossocomela.Poderiavivercomapaixãoinfeliz;masesterancorsemvingançaé um inferno. Não hei de dar barata a vida, não. Ficarás semmim,Teresa;masnãohaveráaíuminfamequetepersigadepoisdaminhamorte. Tenho ciúmes de todas as tuas horas.Hás depensarcommuitasaudadenoteuesposodocéu,enuncaIrarásdemimosolhosdatuaalmaparaveresaopédeIomiserávelquenosmatouarealidadedetantasesperançasformosas.Tu verás esta carta quando eu já esIver num outro mundo,esperandoasoraçõesdastuaslágrimas.Asorações!Admiro-medestafaíscadeféquemealumianasminhastrevas.!...Tuderas-me como amor a religião, Teresa.Ainda creio; não se apaga aluz,queétua;masaprovidênciadivinadesamparou-me.Lembra-te demim. Vive, para explicares aomundo, com a tualealdade a uma sombra, a razão por que me atraíste a umabismo.Escutaráscomglóriaavozdomundo,dizendoqueerasdignademim.Ahoraemqueleresestacarta...”
• EstacartadenunciaoestadodeespíritodeSimãoantesderumaraViseu;
ImportânciadestacartanaeconomiadanarraIva:
• AntecipaodesInofataldarelação,insisIndonocampolexicalde“morte”;
• CulpabilizaBaltasardetodaestadesgraça.
Esteamornãoterá
“esperançasformosas”.
ConInuaçãodoCap.XNãoodeixaramconInuaraslágrimas,nemdepoisapresençadeMariana.Vinhaelapôramesaparaaceia,e,quandodesdobravaatoalha,disseemvozabafada,comoseasimesmasomenteodissesse:-ÉaúlImavezqueponhoamesaaosenhorSimãoemminhacasa!-Porquedizisso,Mariana?-Porquemodizocoração.Destavez,oacadémicoponderousupersIciosamenteosditamesdocoraçãodamoça,ecomosilênciomeditaIvodeu-lheaelaaevidênciaantecipadadovaIcínio.Quandovoltoucomatravessadagalinha,vinhachorandoafilhadeJoãodaCruz.-Choracompenademim,Mariana?-disseSimão,enternecido.- Choro, porqueme parece que o não tornarei a ver; ou, se o vir, será demodo que oxalá que eumorresseantesdeover.-Nãoserá,talvez,assim,minhaamiga...-Vossasenhorianãomefazumacoisaqueeulhepeço?-Veremosoquepede,menina.-Nãosaiaestanoite,nemamanhã,-Pedeo impossível,Mariana.Heide sair,porquememataria senão saísse. - Entãoperdoeaminhaousadia.Deusotenhadasuamão.Araparigafoicontaraopaiasintençõesdoacadémico.AcudiulogomestreJoãocombatendoaideiadasaída, com encarecer os perigos do ferimento. Depois, como não conseguisse dissuadi-lo, resolveuacompanhá-lo. Simão agradeceu a companhia,mas rejeitou-a comdecisão.O ferrador não cedia dopropósito, eestava jápreparandoa clavina, e arraçoando commedidadobradaaégua -paraoquedesseeviesse-diziaele,quandooestudantelhedisseque,melhoravisado,resolveranãoiraViseu,eseguirTeresaaoPorto,passadososdiasdeconvalescença.FacilmenteoacreditouJoãodaCruz;masMariana,submissasempreaoqueoseucoração lhebacorejava,duvidoudamudança,edisseaopaiquevigiasseofidalgo.Asonzehorasdanoite,ergueu-seoacadémico,eescutouomovimentointeriordacasa:nãoouviuomais ligeiro ruído, a não ser o rangido da égua na manjedoura. Escorvou de pólvora nova as duaspistolas.EscreveuumbilhetesobrescritadoaJoãodaCruz,eajuntou-oàcartaqueescreveraaTeresa.Abriuasportasdajaneladoseuquarto,epassoudaliparaavarandadepau,daqualosaltoàestradaerasemrisco.Saltou,eInhadadoalgunspassos,quandoafresta,lateralàportadavaranda,seabriu,eavozdeMarianalhedisse:-Entãoadeus,senhorSimão.EuficopedindoaNossaSenhoraquevánasuacompanhia.Oacadémicoparou,eouviuavozinImaquelhedizia:-"Oteuanjodaguardafalapelabocadaquelamulher,quenãotemmaisinteligênciaqueadocoraçãoalumiadopeloseuamor."-Dêumabraçoemseupai.Mariana-disse-lheSimão-eadeus...atélogo,ou...-Atéaojuízofinal...-atalhouela.-OdesInohádecumprir-se...Sejaoqueocéuquiser.Tinha Simão desaparecido nas trevas, quandoMariana acendeu a lâmpada do santuário, e ajoelhouorandocomofervordaslágrimas.
PressenImentosdeMariana• SabequeSimãovai
“perder”asuavidanaquelanoite.
Marianacomo“anjodaguarda”deSimão,aquelaquezelapelasuatranquilidadeefelicidade,abdicandodasuaquepassariaporverretribuídooseuamor.
ConInuaçãodoCap.XEraumahora,eestavaSimãodefrontedoconvento, contemplandoumaaumaas janelas. Emnenhuma vira da clarão de luz; só a do lampadário do Sacramento se coava baça e pálida navidraçadumafrestadotemplo.Sentou-senasescaleirasda igreja,eouviuali, imóvelasquatrohoras.Dasmilvisõesquelherelancearamnoatribuladoespírito,aquemaisamiúdoserepeIaera a de Mariana suplicante, com as mãos postas; mas, ao mesmo tempo, cria ele ouvir osgemidos de Teresa, torturada pela saudade, pedindo ao céu que a salvasse dasmãos de seusalgozes.OvultodeTadeudeAlbuquerque,arrastandoafilhaaumconvento,nãolheafogueavaasededavingança;mascadavezque lheacudiaàmentea imagemodiosadeBaltasarCouInhoinsInIvamenteasmãosdoacadémicoseasseguravamdapossedaspistolas.Asquatrohoraseumquarto,acordouanaturezatodaemhinoseaclamaçõesaoraiardaalva.Ospassarinhos trinavamnacercadomosteiromelodias interrompidaspelo toquesolenedasAve-Marias na torre. O horizonte passara de escarlate a alvacento. A púrpura da aurora, comolabaredaenorme,desfizera-seemparnculasdeluz,queondeavamnodeclivedasmontanhas,ese distendiam nas planícies e nas várzeas, como se o anjo do Senhor, à voz de Deus, viessedesenrolandoaosolhosdacriaturaasmaravilhasdorepontardumdiafesIvo.Enenhumadestasgalasdocéuedaterraenlevaraosolhosdomoçopoeta.!As quatrohoras emeia, ouviu SimãooInidode liteiras, dirigindo-se àquele ponto.Mudoudelocal,tomandoporumaruaestreita,fronteiraaoconvento.Pararamasliteirasvaziasnaportaria,elogodepoischegaramtrêssenhorasvesIdasdejornada,quedeviamseras irmãsdeBaltasar,acompanhadasdedoismochilascomasmulasà rédia.Asdamas foram sentar-se nos bancos de pedra, laterais à portaria. Em seguida abriu-se a grossaporta,rangendonosgonzos,eastrêssenhorasentraram.Momentos depois, viu Simão chegar à portaria Tadeu deAlbuquerque, encostado ao braço deBaltasarCouInho.Ovelhodenotavaquebrantoedesfalecimentoaespaços.OdeCastro-d’Aire,bemcompostodefiguraecaprichosamentevesIdoàcastelhana,gesIculavacomoaprumodequemdáassuasirrefutáveisrazões,econsolatomandoarisoadoralheia.-Nadadelamúrias,meuIo!-diziaele.-Desgraçaseriavê-lacasada!Euprometo-lheantesdeumano resItuir-lhe curada.Umanode convento é umóImo vomitório do coração.Nãohá nadacomoissoparalimparosarrodovícioemcoraçõesdemeninascriadasàdiscrição.SemeuIoaobrigasse,desdemenina,aumaobediênciacega, tê-la- iaagorasubmissa,eelanãose julgariaautorizadaaescolhermarido.-Eraumafilhaúnica,Baltasar!-diziaovelhosoluçando.-Poisporissomesmo-replicouosobrinho.-SeIvesseoutra,ser-lhe-iamenossensívelaperda,emenos funesta a desobediência. Faria a sua casa na filha mais querida, embora Ivesse deimpetrarumalicençarégiaparadeserdaraprimogénita.Assim,agora,nãolhevejooutroremédiosenãoempregarocautérioàchaga;comemplastroséquesenãofaznada.
VisõesdeSimão
• Mariana–apelandopelasuavida;
• Teresa–“torturadapelasaudade”apelandoparaqueeleasalvasse;
• TadeudeAlbuquerque–obrigandoafilhaaingressarnumconvento;
• Baltasar–trazia-lheasededevingança.
Baltasar–homemautoritárioearrogante,defendeumaeducaçãodesubmissão≠damudançasocialqueseoperavanaépoca(frutodaRevoluçãoFrancesa)
ConInuaçãodoCap.XAbriu-senovamenteaportaria.esaíramastrêssenhoras,eapóselasTeresa.Tadeuenxugouaslágrimas,edeualgunspassosasaudarafilha,quenãoergueudochãoosolhos.-Teresa...-disseovelho.- Aqui estou, senhor - respondeu a filha, sem o encarar. - Ainda é tempo - tornouAlbuquerque.-Tempodequê?-Tempodeseresboafilha.-Nãomeacusaaconsciênciadeonãoser.-Aindamais?!...Queres ir para tua casa, e esqueceromalditoquenos faz a todosdesgraçados?-Não,meupai.OmeudesInoéoconvento.Esquecê-lonempormorte.Sereifilhadesobediente,masmenIrosaéquenunca.Teresa,circunvagandoosolhos,viuBaltasar,eestremeceu,exclamando:-Nemaqui!-Falacomigo,primaTeresa?-disseBaltasar,risonho.-Consigofalo!Nemaquimedeixaasuaodiosapresença?-Souumdoscriadosqueminhaprimalevaemsuacompanhia.DoisInhaeuhádias,dignosdeacompanharemaminhaprima,masesseshouveaíumassassinoquemosmatou.Afaltadeles,soueuquemeofereço.-Dispenso-odadelicadeza-atalhouTeresa,comveemência.-Euéquemenãodispensodea servir, à faltadosmeusdoisfiéis criados,queumceleradomematou.-Assimdeviaser-tornouelatambémirónica-porqueoscobardesescondem-senascostasdoscriados,quesedeixammatar.-Aindasenãofizeramascontasfinais...,minhaqueridaprima-redarguiuomorgado.Este diálogo correu rapidamente, enquanto Tadeu de Albuquerque cortejava aprioresaeoutrasreligiosas.Asquatrosenhoras,seguidasdeBaltasar,Inhamsaídodoátriodoconvento,ederamderostoemSimãoBotelho,encostadoàesquinadaruafronteira.Teresaviu-o...adivinhou-o,primeiradetodas,eexclamou:-Simão!Ofilhodocorregedornãosemoveu.Baltasar,espavoridodoencontro,fitandoosolhosnele,duvidavaainda.
Teresa–forteedecidida:• desafiaaautoridade
paterna(reflexodamudançasocial)
Baltasar–hipócrita,cínico:• Insinuaqueoscriados
forammortos(porSimão)
• Cobarde,naopiniãodeTeresa.
ConInuaçãodoCap.X- É incrível que este infame aqui viesse! - exclamou o de Castro-d'Aire. Simão deu alguns passos, e disseplacidamente:-Infame...eu!eporque?-Infame,einfameassassino!-replicouBaltasar.-Jáforadaminhapresença!-Éparvoestehomem!-disseoacadémico.-Eunãodiscutocomsuasenhoria...Minhasenhora-disseeleaTeresa,comavozcomovidaeosemblantealteradounicamentepelosafetosdocoração.-Sofracomresignação,daqualeulheestoudandoumexemplo.Leveasuacruz,semamaldiçoaraviolência,ebempodeserqueameiocaminhodoseucalvárioamisericórdiadivinalheredobreasforças.-QuedizestepaIfe?!-exclamouTadeu.-Vemaquiinsultá-lo,meuIo!-respondeuBaltasar,-Temapetulânciadeseapresentarasuafilhaaconfortá-lanasuamalvadez!Istoédemais!Olhequeeuesmago-oaqui,seuvilão.-Vilãoéodesgraçadoquemeameaça,semousaravançarparamimumpasso-redarguiuofilhodocorregedor.-Eunãootenhofeito-exclamouenfurecidamenteBaltasar-porentenderquemeavilto,casIgando-onapresençadecriadosdemeuIo,quetupodessupormeusdefensores,canalha!- Se assim é - tornou Simão, sorrindo - espero nunca me encontrar de rosto com sua senhoria. Reputo-o tãocobarde,tãosemdignidade,queoheidemandarazorragarpeloprimeiromarioladasesquinas.BaltasarCouInholançou-sedeímpetoaSimão.Chegouaapertar-lheagargantanasmãos;masdepressaperdeuovigordosdedos.Quandoasdamaschegaramainterpor-seentreosdois,BaltasarInhaoaltodocrânioabertoporumabala,quelheentraranafronte.Vacilouumsegundo,ecaiudesamparadoaospésdeTeresa.TadeudeAlbuquerquegritavaaaltosbrados.Os liteireirosecriadosrodearamSimão,queconservavaodedonogaIlhodaoutrapistola.Animadosunspelosoutrosepelosbradosdovelho,iamlançar-seaohomicida,comriscodevida,quandoumhomem,comumlençopelacara,correudaruafronteira,esecolocou,debacamarteaperrado,àbeiradeSimão.Estacaramoshomens.-Fuja,queaéguaestáaocabodarua-disseoferradoraoseuhóspede.-Nãofujo...Salve-se,edepressa-respondeuSimão.-Fuja,queseajuntaopovoenãotardamaísoldados.-Jálhedissequenãofujo-replicouoamantedeTeresa,comosolhospostosnela,quecaíradesfalecidasobreasescadasdaigreja.-Estáperdido!-tornouJoãodaCruz.-Jáoestava.Vá-seembora,meuamigo,porsuafilhalhorogo.Olhequepodeser-meúIl;fuja...Abriram-setodasasportasejanelas,quandooferradorselançounafuga,atécavalgaraégua.Umdosvizinhosdomosteiro,que,emrazãodoseuozcio,primeirosaiuàrua,eraomeirinhogeral.-Prendam-no,prendam-no,queéummatador!-exclamavaTadeudeAlbuquerque.-Qual?-perguntouomeirinhogeral.-Soueu-respondeuofilhodocorregedor.-Vossasenhoria!-disseomeirinho,espantado;e,aproximando-se,acrescentouameiavoz:-Venha,queeudeixo-ofugir.-Eunãofujo-tornouSimão.-Estoupreso.Aquitemaminhasarmas.Eentregouaspistolas.TadeudeAlbuquerque,quandoserecobroudoespasmo,feztransportarafilhaaumadasliteiras,eordenouquedoiscriadosaacompanhassemaoPorto.AsirmãsdeBaltasarseguiramocadáverdeseuirmãoparacasadoIo.
TadeueBaltasarunidoscontraSimão
MortedeBaltasar
DignidadeehonradeSimão–assumeoseuato
JoãodaCruzveioemauxíliodeSimão
Relações entre personagens
CapítuloXIXAverdadeéalgumasvezesoescolhodeumromance.Navida real, recebemo-la comoela saidosencontrados casos,ouda lógica implacáveldascoisas;mas,nanovela,custa-nosasofrerqueoautor,se inventa,nãoinventemelhor;e,secopia,nãomintaporamordaarte.Umromancequeestribanaverdadeoseumerecimentoéfrio,éimperInente, é uma coisa que não sacode os nervos, nem agente,sequerumatemporada,enquantoelenos lembra,destejogo de nora, cujos alcatruzes somos, uns a subir, outros adescer,movidospelamaniveladoegoísmo.A verdade! Se ela é feia, para que oferecê-la em painéis aopúblico!?A verdade do coração humano! Se o coração humano temfilamentos de ferro que o prendem ao barro doente saiu, oupesamneleeo submergemnocharcoda culpaprimiIva,paraqueéemergi-lo,retratá-loepô-loàvenda!?Osreparossãodequemtemojuízonoseulugar;mas,poisqueeuperdi omeu a estudar a verdade, já agora a desforra quetenhoépintá-lacomoelaéfeiaerepugnante.Adesgraçaafervoraouquebrantaoamor?Istoéqueeusubmetoàdecisãodoleitorinteligente.Factosenãoteseséoqueeutragoparaaqui.Opintorretrataunsolhos,enãoexplicaasfunçõesópIcasdoaparelhovisual.
Narrador• PosiçãosubjeIva
• DáasuaperspeIvadosacontecimentosedaverdade
• Interagecomonarratário/leitor
(CapítuloXIX–conInuação)Aocabodedezanovemesesdecárcere,SimãoBotelhoalmejavaumraiodeSol,umalufadadoarnãocoadapelosferros,opavimentodocéu,queodaabóbadadoseucubículopesava-lheopeito.Ânsiadevivereraasua;nãoerajáânsiadeamar.Seis meses de sobressaltos diante da forca deviam distender-lhe as fibras docoração;eo coração,paraoamor,quer-se fortee tenso,deumacerta rijeza,que se ganha com o bom sangue, com os anseios das esperanças, e com asalegrias.queoenchemereforçamparaosreveses.CaiuaforcapavorosaaosolhosdeSimão;masospulsosficaramemferros,opulmão ao armortal das cadeias, o espírito entanguido no glacial estupidezdumasparedessalitrosas,edumpavimentoqueressoaosderradeirospassosdoúlTmopadecente,edumtetoquefiltraamorteagotasdeágua.O que é o coração, o coração dos dezoito anos, o coração sem remorsos, oespíritoanelantedeglórias,aocabodedezoitomesesdeestagnaçãodavida?O coração é a víscera, ferida de paralisia, a primeira que falece sufocada pelarebeliões da almaque se idenIfica à natureza, e a quer, e se devorana ânsiadela,eseestorcenasagoniasdaamputação,paraosquaisasaudadedaventuraexIntaéumcautérioembrasa;eoamor,quelevaaoabismopelocaminhodasonhadafelicidade,nãoésequerumrefrigério.Ao deslaçar da garganta a corda da jusIça, Simão Botelho teve uma hora dedesafogo, como que senIa o panbulo lascar entre os seus braços, e entãoconvidouocoraçãodamulherqueoperderaaassisIràssegundasnúpciasdasuavidacomaesperança.Depois,apassoigual,aesperançafugia-lheparaasareiasdaÁsia,eocoraçãointumescia-sede fel,oamorafogava-senele.morte inevitável,quandonãoháaberturaporondeaesperançaentrealuzirnaescuridãoínIma.EsperançaparaSimãoBotelho,qual?
Dezoitomesesdecárcere–umamortelenta;-umamorteinterior.
Quandoumrasgodeesperançaaparecelogodesaparece.
(CapítuloXIX–conInuação)AÍndia,ahumilhação,amiséria,aindigência.E os anelos daquela alma Inham mirado as ambições de um nome. Para afelicidadedoamorenvidavaasforçasdotalento;mas,alémdoamor,estavaaglória,orenomeeavãimortalidade,quesónãoédemêncianasgrandesalmasenosgéniosquesesentemprevivernasgeraçõesvindouras.Mas grinaldas de amor a escorrerem sangue dos espinhos, essas infiltramvenenocorrosivonopensamento,apagamnoseioafaíscadasnobresafoitezas,apoucam a ideia que abrangera mundos, e paralisam de mortal espasmo osestosdocoração.AssimtesenTastu,infeliz,quandodezoitomesesdecárcere,comopaibuloouodegredonalinhadoteuporvir,tehaviammatadoomelhordaalma.ATmesmoperguntavaspeloteupassado,eocoração,seousavaresponder,retraía-se,recriminadopelosditamesdarazão.Dealém,daqueleconventoondeoutraexistênciaagonizava,gementesqueixaste vinham espremer fel na chaga; e tu, que não sabias nem podias consolar,pediaspalavrasaoanjodacompaixãoparaela,easdodemóniododesesperoparaI.Os dez anos de ferros em que lhe quiseramminorar a pena, eram-lhe maishorrorososqueopanbulo. Eaceitá-los-ia,porventura, seamasseo céu,ondeTeresabebiaoar,quenospulmõesselheformavaempeçonha?Creio:-antesamasmorra, ondepodeouvir-se o somabafadode uma voz amiga; antes osparoxismos de dez anos sobre as lajes húmidas de uma enxovia, se, na horaextrema, a úlIma faísca da paixão, ao bruxulear para morrer, nos alumia ocaminhodocéuporondeoanjodoamordesditososelevantouadarcontadesiaDeus,eapediraalmadoqueficou.
DesInodeSimão
Narradordirige-seàpersonagem,lamentandooseufim.
Teresatuberculosa.
(CapítuloXIX–conInuação)Teresa pedira a Simão Botelho que aceitasse dez anos de cadeia, e esperasse ai a suaredençãoporela."Dezanos!-dizia-lheaenclausuradadeMonchique.Emdezanosterámorridomeupaieeusereituaesposa,eireipediraoreiqueteperdoe,senãoIverescumpridoasentença.Sevaisaodegredo,parasempreteperdi,Simão,porquemorrerás,ounãoacharásmemóriademim,quandovoltares".Comoapobrese iludianashorasemqueasdébeisforçasdevidase lheconcentravamnocoração!Asânsias,a lividez,odeperecimentoInhamvoltado.Osangue,quecriaranovo, já lhesaíaemgolfadascomatosse.Sepor amoroupiedadeo condenadoaceitasseos ferrolhos trêsmil seiscentase cinquentavezes corridos sobre as suas longas noites solitárias, nem assim Teresa susteria a pedrasepulcralqueavergavadehoraahora."Nãoesperesnada,márIr-escrevia-lheele.-AlutacomadesgraçaéinúIl,eeunãopossojálutar.Foiumatrozenganoonossoencontro.Nãotemosnadanestemundo,Caminhemosaoencontrodamorte...Háumsegredoquesónosepulcrosesabe.Ver-nos-emos?Vou.Abominoapátria,abominoaminhafamília;todoestesoloestáaosmeusolhoscobertodeforcas,equantoshomensfalamaminhalíngua,creioqueosouçovociferarasimprecaçõesdo carrasco. Em Portugal, nem a liberdade com a opulência; nem já agora a realização dasesperançasquemedavaoteuamor,Teresa!Esquece-tedemim,eadormecenoseiodonada.Euqueromorrer,masnãoaqui.Apague-sealuzdosmeusolhos;masaluzdocéu,quero-a!QueroverocéunomeuúlImoolhar!Nãomepeçasqueaceitedezanosdeprisão.TunãosabesoqueéaliberdadecaIvadezanos!Não compreendes a tortura dos meus vinte meses. A voz única que tenho ouvido é a damulherpiedosaquemeesmolaopãodecadadia,eadoaguazilqueveiodar-measarcásIcaboa-novadeumagraçareal,quemecomutaomorrerinstantâneodaforcapelasagoniasdedezanosdecárcere.Salva-te,sepodes,Teresa.Renunciaaopresngiodumgrandedesgraçado.Seteupaitechama,vai.SetemderenascerparaTumaauroradepaz,viveparaafelicidadedessedia.E,senão,morre,Teresa,quea felicidadeéamorte,éodesfazerem-seempóasfibras laceradaspelador,éoesquecimentoquesalvadasinjúriasamemóriadospadecentes".
PedidoeplanosdeTeresa
Vozdonarrador
Teresaestácadavezmaisdoente(àbeiradamorte)
ApelodeSimãoparaqueTeresaviva–provadoseuamor.
(CapítuloXIX–conInuação)As palavras únicas de Teresa, em resposta àquelacarta, significaIva da turbação do infeliz, foramestas: "Morrerei, Simão, morrerei. Perdoa tu aomeu desTno... Perdi-te... Bem sabes que sorte euqueria dar-te... e morro, porque não posso, nempoderei jamais resgatar-te. Se podes, vive; não tepeçoquemorras,Simão;queroquevivasparamechorares. Consolar-te-á o meu espírito... Estoutranquila.Vejoaauroradapaz...Adeus,atéaocéu,Simão".Seguiram-se a esta carta muitos dias de terríveltaciturnidade. Simão Botelho não respondia àsperguntas de Mariana. Di-lo-íeis arroubado nasvoluptuosasangúsIasdoseupróprioaniquilamento.AcriaturapostaporDeusao ladodaquelesdezoitoanos tão atribulados chorava; mas as lágrimas, seSimão as via, Iravam-no damudez sossegada paraímpetosdeaflição,queafinaloextenuavam..
ApelodeTeresaparaqueSimãovivaeconsciênciadequeoseudesIno,faceàdecisãodoseuamado,éamorte.
Simãotemdezoitoanos.
Concentraçãotemporaldaação.
(CapítuloXIX–conInuação)Decorreramseismesesainda.E Teresa vivia, dizendo às suas consternadas companheiras quesabiaaocertoodiadoseutrespasse.DuasprimaverasviaSimãoBotelhopelasgradesdoseucárcere.Aterceirajaenfloravaashortas,eesverdeavaasflorestasdoCandal.Eraemmarçode1807.Nodia10dessemês,recebeuocondenadoinImaçãoparasairnaprimeira embarcação que levava âncora do Douro para a Índia.Nesse tempo vinham aqui os navios buscar os degredados, erecebiamemLisboaosqueInhamigualdesIno.Nenhum estorvo impedia o embarque de Mariana, que seapresentou ao corregedor do crime como criada do degredado,compassagempagaporseuamo.-Eapassagemvale-abem!-disseogalhofeiromagistrado.Simão assisIu ao encaixotar da sua bagagem, numa quietaçãoterrível,comoseignorasseoseudesIno.QuismuitasvezesescreveraderradeiracartaàmoribundaTeresa,enemsinaisdelágrimaspodiajáenviar-lhenopapel.-Quetrevas,meuDeus!-exclamavaele,earrancavaamãoscheiasoscabelos.–Dai-melágrimas,Senhor!Deixai-mechorar,oumatai-me,queestesofrimentoéinsuportável!Marianacontemplavaestarrecidaesteseoutroslancesdeloucura,ouosnãomenosmedonhosdaletargia.-ETeresa!-bradavaele,surgindosubitamentedoseuespasmo.-Eaquelainfelizmeninaqueeumatei!Nãoheidevê-lamais,nuncamais!Ninguémme levará aodegredo a noicia de suamorte! E,quandoaeuchamarparaquemevejamorrerdignodela,quemtediráqueeumorri,ómárTr?!
Concentraçãotemporaldaação–ritmoacelerado.
GritoalucinadodeSimão.Culpabiliza-sedafuturamortedasuaamada.
MarianatemtudotratadoparaembarcarcomSimãoparaodegredo.
ConclusãoÀsonzehorasdanoiteocomandanterecolhera-senumbelichedepassageiro,eMariana,sentadanopavimento,comorostosobreos joelhos,parecia sucumbiraopassardas trabalhosaseafliIvashorasdaqueledia.Simão Botelho velava prostrado no camarote, com os braçoscruzados sobre o peito, e os olhos fitos na luz que balançava,pendentedeumarame.Oouvidotê-lo-ia,talvez,atentoparaumassobio da ventania: devia de soar-lhe como um ai plangenteaquelesilvoagudo,vozúnicanosilênciodaterraecéu.Àmeia-noiteestendeuSimãoobraçotrémuloaomaçodascartasqueTeresa lheenviara,econtemplouumpoucoaqueestavaaode cima, que era dela. Rompeu a fita, e dispôs-se no camaroteparaalcançarobaçoclarãodalâmpada.
AconcentraçãotemporaldaaçãoIníciodaação:
• 1801AfastamentodeSimãoeTeresa:• 1803DegredodeSimão• 1807Conclusão:• “Àsonzehorasdanoite”;• “Àmeianoite”;• “Àstrêshorasdamanhã”;• “Demanhã”;• “Àsonzehoras”;• “Aosegundodiadeviagem”;• “Aoquartodia”;• “Aosextodiadenavegaçãoincerta”;• Eraodia27demarço,ononoda
enfermidadedeSimão”;• “Aoanoitecerdessedia”;• “Aoromperdamanhã”;• “Algumashorasvolvidas”
Depoisdorelatode6anosentreoscapítulosIeXX,a“Conclusão”apresentaosacontecimentosdepoucosdias,aquelesemqueSimãoagonizoueacaboupormorrer.
TentaIvadepormenorizaretornarmaisintensoodramadaspersonagensenvolvidasnotriânguloamoroso.
Concentração Temporal – o autor da novela abrevia o tempo da história, resumindo e saltandomeseseanos,quandoissoéconveniente,oqueprovocaumaassimetrianorelatodasações.
ConInuaçãodaConclusãoDiziaassimacarta:«Éjáomeuespíritoquetefala,Simão.Atuaamadamorreu.AtuapobreTeresa,àhoraemqueleresestacarta,semeDeusnãoengana,estáemdescanso.Eudeviapoupar-teaestaúlImatortura;nãodeviaescrever-te;masperdoaàtuaesposadoCéuaculpa,pelaconsolaçãoquesintoemconversarconIgoaestahora,horafinaldanoitedaminhavida.Quem tediriaqueeumorri, senão fosseeumesma, Simão?Daqui apouco,perderásda vistaestemosteiro; correrásmilharesde léguas, enãoacharás,empartealgumadomundo,vozhumanaquetediga:—Ainfelizespera-tenoutromundo,epedeaoSenhorqueteresgate.Setepudessesiludir,meuamor,quereriasantespensarqueeuficavacomvidaecomesperançadever-tenoregressodoteudegredo?Assimpodeser,mas,aindaagora,nestesolenemomento,domina-meavontadedefazer-tesenIrqueeunãopodiaviver.Parecequeamesmainfelicidadetemàsvezesvaidadedemostrarqueoé,aténãopodê-losermais!Queroquedigas:—Estámorta,emorreuquandoeulheIreiaúlImaesperança.Istonãoéqueixar-me,Simão;nãoé.TalvezeupudesseresisIralgunsdiasàmorte,setuficasses;mas,deummodoououtro,erainevitávelfecharosolhosquandoserompesseoúlImofio,esteúlImoqueseestáaparIr,eeumesmaooiçoparIr.Nãovãoestaspalavrasacrescentaratuapena.Deusmelivredeajuntarumremorsoinjustoàtuasaudade.Seeupudesseaindaver-tefeliznestemundo;seDeuspermiIsseàminhaalmaestavisão!Feliz,tu,meupobrecondenado!Semoquerer,meuamoragoratefaziainjúria,julgando-tecapazdefelicidade!Tumorrerásdesaudade,seoclimadodesterronãotemataraindaantesdesucumbiresàdordoespírito.Avidaerabela,era,Simão,seaIvéssemoscomotumapintavasnastuascartas,quelihápouco!Estouaveracasaquetuadescrevias,pertodeCoimbra,cercadadeárvores,floreseaves.AtuaimaginaçãopasseavacomigonasmargensdoMondego,àhorapensaIvadoescurecer.Estrelava-seocéu,ealuaabrilhantavaaágua.Eurespondiacomamudezdocoraçãoaoteusilêncio,e,animadapeloteusorriso,inclinavaafaceaoteupeito,comosefosseaodaminhamãe.Tudoistolinastuascartas;eparecequecessaodespedaçardaagoniaenquantoaalmaseestáarecordar.Noutracarta,falavas-meemtriunfoseglóriasenaimortalidadedoteunome.Tambémeuiaatrásdatuaaspiração,ouàfrentedela,porqueomaiorquinhãodos teusprazeresdeespíritoqueria euque fosseomeu. Era criançahá três anos, Simão, e já entendiaos teus anelosde glória, e imaginava-osrealizadoscomoobraminha,semetudizias,comodissestemuitasvezes,quenãoseriasnadasemoesnmulodomeuamor.Oh!Simão,dequecéutãolindocaímos!Àhoraqueteescrevo,estástuparaentrarnanaudosdegredados,eeunasepultura.Que importamorrer, senãopodemos jamais ternesta vidaanossaesperançadehá três anos?Poderias tu comadesesperançae coma vida,Simão?Eunãopodia.Os instantesdodormir eramos escassosbenezciosqueDeusme concedia;amorteémaisqueumanecessidade, éumamisericórdiadivina,umabem-aventurançaparamim.Equefarástudavidasematuacompanheirademarnrio?Onde irás tuaviventarocoraçãoqueadesgraçateesmagou,semoesquecimentodaimagemdestadócilmulher,queseguiucegamenteaestreladatuamalfadadasorte?Tununcahásdeamar,poisnão,meuesposo?TeriasvergonhadeImesmo,sealgumavezvissespassarrapidamenteaminhasombraàfrentedosteusolhosenxutos?Sofre,sofreaocoraçãodatuaamadaestasderradeirasperguntas,aqueturesponderás,noaltomar,quandoestacartaleres.Rompeamanhã.VouveraminhaúlImaaurora.AúlImadosmeusdezoitoanos!Abençoadosejas,Simão!Deusteproteja,ete livredeumaagonia longa.TodasasminhasangúsIasLheofereçoemdescontodastuasculpas.SealgumasimpaciênciasajusIçadivinamecondena,oferecetuaDeus,meuamigo,osteuspadecimentos,paraqueeusejaperdoada.Adeus!Àluzdaeternidadeparece-mequejátevejo,Simão!»
ÚlImacartadeTeresaparaSimão(cartapóstuma)
ConInuaçãodaConclusãoErgueu-seodegredado,olhouemredordesieolhoucomespasmoMariana,quelevantavaacabeçaaomenormovimentodele.—Quetem,senhorSimão?—disseela,erguendo-se.—Estavasaqui,Mariana?Nãotevaisdeitar?—Nãovou;ocomandantedeu-melicençaparaficaraqui.—Mashádeassimpassaranoite?Rogo-tequevás,porquenãoénecessáriooteusacrizcio.—Seonãoincomodo,deixe-meaquiestar,senhorSimão.—Ficaentão,minhaamiga,fica.Podereisubiraoconvés?—Queriraoconvés,senhorBotelho?—disseocomandante,lançando-sedobeliche.—Queria,senhorcomandante.—Iremosjuntos.SimãojuntouacartadeTeresaaomaçodassuas,esaiuacambalear.Noconvéssentou-senummontedecordas,econtemplouomiradourodeMonchique,queparecianegronosopédaserrapenhascosaemqueatualmenteficaaRuadaRestauração.Ocapitãopasseavadaproaàré,mascomoouvidoatentoaosmovimentosdodegredado.Recearaeleopropósito do suicídio, porqueMariana lhe incuIra semelhante suspeita. Queria omaríImo dizer-lhepalavrasconsoladoras,maspensavaparasimesmo:—«Oquesehádedizer-seaumhomemquesofreassim?»—Eparavajuntodelealgumasvezes,comoparadesviar-lheoespíritodaquelemiradouro.— Eu nãome suicido!— exclamou abruptamente Simão Botelho.— Se a sua generosidade, senhorcapitão,seinteressaemqueeuviva,podedormirdescansadoasuanoite,queeunãomesuicido.—Masmereço-lheeuacondescendênciadedescercomigoàcâmara?—Irei;maseulásofromais,senhor.Nãorespondeuocomandante,econInuouapassearnoconvés,apesardasrajadasdevento.Marianaestavaagachadaentreospacotesdacarga,apoucadistânciadeSimão.Ocomandanteviu-a,falou-lhe,ereIrou-se.Àstrêshorasdamanhã,SimãoBotelhosegurouatestaentreasmãos,queselheabriaabrasadapelafebre.Nãoseconseguiusentar,edeixou-secairameiocorpo.Acabeça,aodeclinar,pousounoseiodeMariana.—OAnjodacompaixãosemprecomigo!—murmurouele.—Teresafoimuitomaisdesgraçada.—Querdesceraocamarote?—disseela.—Nãoconsigo.Ampara-me,minhairmã.Deu alguns passos para a escadinha, e olhou ainda sobre o miradouro. Desceu a íngreme escada,apegando-seàscordas.Lançou-sesobreocolchão,epediuágua,quebebeuinsaciavelmente.Seguiu-seafebre,oestorcimento,easânsias,comintervalosdedelírio.Demanhãveioabordoummédico,por convitedocapitão.Examinandoo condenado,dissequeerafebremalignaadoença,ebempodiaserqueeleachasseasepulturanocaminhodaÍndia.MarianaouviuoprognósIco,enãochorou.
OCapitãoeMarianareceiamqueSimãodesuicide,masestegarantequenãoofará.
Marcastemporais
Àsonzehorassaiuanaudamarinha.Àsânsiasdadoençaacresceramasdoenjoo.Apedidodocomandante,Simãobebiaremédios,quevomitavalogo,revoltospelascontrações.Aosegundodiadeviagem,MarianadisseaSimão:—Seomeuirmãomorrer,queheideeufazeràquelascartasquevãonacaixa?Pasmosaserenidadeadestapergunta!—Seeumorrernomar—disseele—,Mariana,aIraaomartodososmeuspapéis,todos;eestascartasqueestãodebaixodomeutravesseirotambém.Passadaumaânsia,quelheembargavaavoz,SimãoconInuou:—Seeumorrer,quetencionasfazer,Mariana?—Morrerei,senhorSimão.—Morrerás?Tantagentedesgraçadaqueeufiz.Afebreaumentava.Ossintomasdamorteeramvisíveisaosolhosdocapitão,queInhasobejaexperiênciadevermorreremcentenasdecondenados,feridosdafebredomar,edesprovidosdemedicamentos.Aoquartodia,quandoanausemoviaronceiradefrontedeCascais,sobreveioumasúbitatempestade.Onaviofez-seaolargomuitasmilhas,e,perdidoorumodeLisboa,navegoudesnorteado.Aosextodiadenavegaçãoincerta, por entre espessas brumas, parIu-se o leme em frente de Gibraltar. E, em seguida ao desastre,aplacaramasrefegas,desencapelaram-seasondas,enasceu,comaauroradodiaseguinte,umformosodiadePrimavera.Eraodia27deMarço,ononodaenfermidadedeSimãoBotelho.MarianaInhaenvelhecido.Ocomandante,aoolharparaela,exclamou:—ParecequevoltadaÍndiacomosdezanosdetrabalhosjápassados!—Jáacabados.Decerto.—disseela.Aoanoitecerdessedia,ocondenadodeliroupelaúlImavez,ediziaassimnoseudelírio:«Acasa,pertodeCoimbra,cercadadeárvores,floreseaves.AtuaimaginaçãopasseavacomigonasmargensdoMondego,àhorapensaIvadoescurecer.Estrelava-seocéu,ealuaabrilhantavaaágua.Eurespondiacomamudezdocoraçãoaoteusilêncio,e,animadapeloteusorriso,inclinavaafaceaoteupeito,comosefosseaodaminhamãe.Dequecéutãolindocaímos.Atuaamigamorreu.AtuapobreTeresa.Equefarástudavidasematuacompanheirademarnrio?Ondeirástuaviventarocoraçãoqueadesgraçateesmagou.Rompeamanhã.VouveraminhaúlImaaurora.AúlImadosmeusdezoitoanos.OfereceaDeusosteuspadecimentos,paraqueeusejaperdoada.Mariana.»Marianacolouosouvidosaoslábiosroxosdomoribundo,quandopensououviroseunome.«Tuvirásterconnosco;ser-te-emosirmãosnoCéu.Omaispuroanjoserástu.Seésmesmodestemundo,irmã;seésmesmodestemundo,Mariana.»Atransiçãododelírioparaaletargiacompletaeraoanúncioinfalíveldotrespasse.Aoromperdamanhãapagou-sealâmpada.Marianasaíraapedirluz,eouviuumgemidoestertoroso.Voltandoàs escuras, com os braços estendidos para tatear a face do agonizante, encontrou amão convulsa, que lheapertouumadassuas,erelaxoudesúbitoapressãodosdedos.
Marcastemporais
ConInuaçãodaConclusão
Entrouocomandantecomumalâmpada,eaproximou-lhadarespiração,quenãoembaciouovidro.—Estámorto!—disseele.Marianacurvou-sesobreocadáver,ebeijou-lheaface.Eraoseuprimeirobeijo.Ajoelhoudepoisaopédobelichecomasmãoserguidasenãooravanemchorava.Algumashoraspassadas,ocomandantedisseaMariana:—Agoraé tempodedarsepulturaaonossoventurosoamigo.Éventuramorrerquandosevemaestemundocomtalestrela.PasseasenhoraMarianaaliparaacâmara,poisodefuntotemdeserlevadodaqui.Mariana Irou o maço das cartas debaixo do travesseiro, e foi para uma caixabuscarospapéisdeSimão.Atouoroloaoavental,queeleInhadaquelaslágrimasdela,choradasnodiadasuademência,eprendeuoembrulhoàcintura.Foiocadáverenvoltonumlençol,etransportadoparaoconvés.Marianaseguiu-o.Doporãodanaufoitrazidaumapedra,queummarujolheatouàspernascomumpedaçodecabo.Ocomandantecontemplavaacenatristecomosolhoshúmidos,eos soldadosqueguarneciamanau, tão funeral respeitoos impressionara,queinsensivelmentesedescobriram.Marianaestava,noentanto,encostadaaoflancodanau,epareciaestupidamenteencararaquelesempuxõesqueomarujodavaaocadáver,parasegurarapedranacintura.Dois homens ergueram omorto ao alto sobre a amurada. Deram-lhe o balançoparaoarremessaremparalonge.E,antesqueobaquedocadáversefizesseouvirnaágua,todosviram,eninguémjápôdesegurarMariana,queseaIraraaomar.Àvozdocomandantedesamarraramrapidamenteobote,esaltaramhomensparasalvarMariana.Salvá-la!Viram-na,ummomento,bracejar,nãopararesisIràmorte,masparaabraçar-seaocadáverdeSimão,queumaonda lheaIrouaosbraços.OcomandanteolhouparaosíIodeondeMarianaseaIrara,eviu,enleadonacorda,oavental,eàflorda água, um rolo de papéis, que osmarujos recolheramna lancha. Eram, comosabem,acorrespondênciadeTeresaeSimão.DafamíliadeSimãoBotelhoviveainda,emVilaRealdeTrás-os-Montes,asenhoraD. Rita Emília da Veiga Castelo Branco, a irmã predileta dele. A úlIma pessoafalecida,hávinteeseisanos,foiManuelBotelho,paidoautordestelivro.
MortedeSimão
ReaçãodeMariana
Marcastemporais
Procedimentoquandohaviamortosabordo.
DecisãodeMariana:• AcompanhaSimãoatéao
fim;• Amorsupremo.
SimãoBotelhoéIodeCamiloCasteloBranco
ConInuaçãodaConclusão