Upload
emerson-mathias
View
1.235
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
21
Análise da Disciplina: América II – Filme A História Oficial
O filme “A História Oficial” trata-se de um documento histórico
importantíssimo quando analisamos os conteúdos históricos relativos a História da
América II. Sabemos que o filme é uma interpretação do real e não uma verdade
absoluta, entretanto poderíamos utilizá-lo como documento histórico para elaborarmos
aulas para uma turma de Ensino Médio.
A HISTÓRIA OFICIAL. Direção: Luiz Puenzo. Produção: Marcelo Piñero e Oscar
Kramer. Roteiro: Guião Aída Bortnik e Luiz Puenzo. Argentina, 1985 (112 min).
Elenco: Norma Aleandro, Héctor Alterio, Chunchuna Villafañe.
Sinopse: Alicia é uma professora de História que ensina através dos livros didáticos, ou
seja, a história oficial dos vencedores, dos heróis, da elite dominante. Pertencente à
classe média argentina, desconhece as tragédias geradas em seu país pela ditadura
militar (1976-1983). Ela é uma mãe atenciosa para a filha Gaby, uma criança registrada
como filha legítima e trazida para casa pelo seu marido Roberto. Após o retorno do
exílio da amiga Ana, uma ex presa política, Alicia começa a descobrir os horrores
praticados contra os opositores do regime. Ela começa então a crer na possibilidade de
que seu marido teria mantido relações escusas com a máquina repressora do regime e
adotado Gaby depois que seus pais, possíveis presos políticos, foram assassinados.
Um pouco sobre o diretor:
Luis Alberto Puenzo, nascido em 19 de fevereiro de 1946 na cidade de Buenos
Aires, Argentina.
Luis Puenzo gravou o filme todo na cidade de Buenos Aires, temia por sua
segurança e queria gravar o filme em segredo utilizando câmeras de 16 mm, mas
o regime ditador caiu em 1983 antes de terminar de escrever o roteiro.
22
Luis Puenzo dirigiu centenas de comerciais e dois longas-metragens antes de ser
reconhecido internacionalmente por dirigir o filme A História Oficial. Em 1968,
ele fundou sua primeira empresa, Luis Puenzo Cinema, realizando inúmeros
filmes comerciais. Seu primeiro longa-metragem dirigido às crianças: Luzes My
Shoes (1973). A História Oficial (1985) marcou um importante passo em sua
carreira como cineasta, para investigar o problema da falta de base em um livro
de Aida Bortnik e ganhar o Oscar de melhor filme estrangeiro. Pouco prolífico,
fez menos de meia dúzia de filmes, incluindo desde o fracassado Velho Gringo
com Gregory Peck em um romance de Carlos Fuentes, E a Peste, adaptando o
romance de Albert Camus.
O filme é ambientado na década de 80 em plena ditadura Argentina. Alice é uma
professor de história no início dos anos 80. Em seu trabalho, em casa, sempre
aceitou a versão oficial do Estado sobre a ditadura. Até que um dia a fachada do
regime e sua vida começa a desmoronar. Ela conhece uma das Avós da Praça de
Maio (que possivelmente é avó de sua filha adotiva) e começa a descobrir a
verdadeira face da ditadura, inclusive o envolvimento de seu marido com casos
de torturas e desaparecimento de pessoas. Além da omissão da Igreja e da elite
Argentina (empresários).
Em 1968, ele fundou sua primeira empresa, Luis Puenzo Cinema, realizando
inúmeros filmes comerciais. Seu primeiro longa-metragem dirigida às crianças:
Luzes My Shoes (1973). A história oficial (1985) marcou um importante passo
em sua carreira como cineasta, para investigar o problema da falta de base em
um livro de Aida Bortnik e ganhar o Oscar dos Oscar de melhor filme
estrangeiro. Pouco prolífico, iria rolar a menos de meia dúzia de filmes,
incluindo desde o fracassado Velho Gringo com Gregory Peck em um romance
de Carlos Fuentes e a Praga, adaptando o romance de Albert Camus.
CONTEXTUALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO:
No contexto histórico da produção do filme (década de 80) a Argentina vivia um
dos piores regimes ditadores da América do Sul, muito mais radical do que viveram
23
Brasil e Chile. Muitas pessoas contrárias ao regime desapareceram e o clima de
violência e ilegalidade pairava sobre a Argentina.
A junta argentina criada pelo golpe rompeu com a legalidade de
forma muito mais radical que os regimes militares brasileiro e
chileno. No primeiro dia do golpe, A Suprema Corte, a
Procuradoria-Geral e os tribunais superiores das províncias
foram expurgados. Ao mesmo tempo, “todos os demais
membros do poder Judiciário foram afastados do cargo (...) As
lideranças do regime falavam de maneira explícita sobre a
necessidade de contornar as restrições legais. Em 1980, o
general Tomaz Sanchez de Bustamante declarou: “Há normas e
padrões judiciais que não se aplicam neste caso...tudo tem que
estar coberto numa nuvem de silêncio”. (PEREIRA, 2010:193)
O próprio Luis Puenzo nascido em 19 de fevereiro de 1946, portanto tinha 20
anos, quando do golpe militar (hoje civil-militar), ocorrido em junho de 1966
derrubando Arturo Illia. Traz sua própria experiência de quem viveu um dos mais cruéis
regimes militares da América Latina. Pois, como escritor e produtor corria os riscos
impostos por seus escritos e filmes se despertassem descontentamento do regime
ditador. Puenzo, abre sua empresa cinematográfica em 1968 e por isso passa a ser um
alvo para represálias dos militares. Vemos na historiografia dentro deste contexto que a
ditadura de 1966 até sua queda em 1983, foram mortos e torturados, artistas, escritores,
advogados entre outros. O período das trevas intitulado pelos historiadores vai do ano
de 1976 até o fim da ditadura no ano de 1983, portanto, o filme está dentro deste
contexto e muito mais ainda da própria vida de seu autor. Perseguições a escritores,
artistas, músicos, proibições de leituras e músicas e a queima de livros.
A incineração de livros um mês após o golpe militar de 24 de
março de 1976, que derrubou o governo de Maria Estela
Martinez de Perón, era um alerta sobre o período de trevas em
que o país estava afundando. Entre as obra destruídas estavam
novelas de Gabriel García Márquez, poemas de Pablo Neruda e
dezenas de títulos de filosofia e literatura espanhola, francesa e
inglesa. (...) A destruição de livros, que lembrava o nazifacismo
na Europa, antecipava o regime de terror que, entre 1976 e
1983, torturou e matou milhares de pessoas e sumiu com os
corpos. O número oficial de mortos e desaparecidos registra 12
mil vítimas. Organizações de defesa dos direitos humanos
contam mais de 30 mil. (...) A relção de filmes banidos ia além
24
dos limites do absurdo: O pequeno princípe, de Antoine de
Saint-Exupéry; Tia Júlia e o escrevinhador, de Mário Vargas
Llosa; Um elefante ocupa muito espaço, de Elsa Bornemann; e
O nascimento, as crianças e o amor, de Agnes Rosenstichl. Os
dois últimos por trata-se de “material destinado as público
infantil com uma finalidade de doutrinamento e intuito
subversivo”. (...) O brasileiro Paulo Freire também figurava no
índex de proibições. (RIBEIRO, 2012:154)
Temos conexões e paralelos entre o golpe e o regime militar argentino e os
regimes militares do Chile e do Brasil. Foram regimes repressivos, autoritários e
antilegalistas, apoiados, financiados e legalizados pelos Estados Unidos, que sempre
influenciou por motivos políticos e econômicos os países da América Latina desde suas
independências.
Em uma cena do filme A História Oficial, onde empresários argentinos recebem
empresários “provavelmente americanos” em uma reunião, o autor “revela” com essa
representação a influência de grandes empresas americanas interessadas em manter o
regime ditador argentino, portanto, favorável política e economicamente para os Estados
Unidos. Assim como em praticamente todos os países da América Latina neste período.
Dentro deste contexto no ano de 1982 devemos ressaltar a Guerra das Malvinas, uma
tentativa frustrada do governo argentino de desviar o foco da péssima situação política e
econômica, encobrir sua corrupção, torturas, desaparecimentos, mortes, desmandos e
ilegalidades.
(...) Com o país mergulhado no caos social e econômico e
diante da explosão de revelações sobre torturas, assassinatos e
desaparecimentos, Galtieri achou que era preciso arranjar um
inimigo externo para desviar a atenção. Em 2 de abril de 1982,
lançou o país numa desastrada aventura ao ordenar o
desembarque de tropas nas Ilhas Malvinas, Falkland para os
ingleses. A guerra durou menos de três meses. A Inglaterra,
então governada pela primeira-dama Margaret Thatcher,
mobilizou um imenso poder de fogo contra os argentinos, que
foram esmagados rapidamente. O conflito deixou mais de mil
mortos, a maioria argentinos. Em 15 de junho, a Argentina se
rendeu. A imagem de soldados argentinos humilhados,
abandonando as ilhas, abateu profundamente o país. Dois dias
após a rendição, Galtieri renunciou. (RIBEIRO, 2012:155-6)
“Os militares impediram o desenvolvimento científico e tecnológico e sucatearam o
parque industrial nacional. Na década de 1980, vários segmentos de classe se uniram na
25
retomada do controle político do país.” (IOKOI, 1989:52). Ainda segundo a autora,
setores industriais, intelectuais, a ala progressista da Igreja, através de movimentos
sociais conseguiram abalar os alicerces do regime militar. A Guerra das Malvinas em
1982, foi um esforço do regime ditador para manter-se no poder, mas sua derrota
humilhante serviu para os movimentos operários ganharem força política, sem a
submissão do poder dominante que culminou com o fim da ditadura em 1983.
HISTÓRIA DE CONFLITOS:
Para DORATIOTO (1994), desde sua independência a Argentina (Vice-Reino
do Prata), não manteve a unidade territorial. Foi na capital Buenos Aires que
comerciantes instalaram uma junta como reposta a usurpação do trono espanhol por
José Bonaparte. A burguesia tentou manter o monopólio sobre o comércio exterior do
Prata. Defendiam a centralização do poder (unitários), contrários aos oligarcas do
interior que propunham a descentralização do poder (federalistas), portanto a Argentina
desde sua formação apresentava intensos conflitos entre suas elites.
Mais do que outros países do continente, a Argentina enfrentou
uma prolongada luta pela independência. Mal tinham
conseguido se livrar do domínio espanhol, na primeira metade
do século XIX, os argentinos tiveram de enfrentar as forças da
Inglaterra e da França, que tentavam se instalar no país com o
objetivo de controlar o mercado do couro e impor a venda de
manufaturados ingleses e franceses. O general José de San
Martín liderou a guerra de libertação, que terminou com a
derrota dos espanhóis e de seus aliados locais. A independência
foi conquistada em 1816. Em 1829, o general Juan Manuel
Rosas tomou o poder e teve papel decisivo na expulsão das
forças inglesas e francesas, que chegaram a bloquear o Porto de
Buenos Aires. De Rosas transformou-se num ditador e ficou
vinte anos no poder, até ser deposto por outro general, José de
Urquiza, em 1852. (RIBEIRO, 2012:164)
Essa origem da nação argentina apresentada pela historiografia, bem com o
contexto político e social em que o filme A História Oficial foi produzido, ou seja, na
década de 1980, nos favorece na utilização desta obra como um importante material de
apoio em aulas para o Ensino Médio. Tanto podemos utilizar as influências do
imperialismo inglês e francês na independência argentina no início do século XIX
26
(fatores relevantes e fundamentais que levaram a ditadura de 1966 a 1983), como
posteriormente a influência americana a partir do século XX.
CONTEXTUALIZAÇÃO DO TEMA CENTRAL:
O tema central do filme são as Avós da Praça de Maio e o desaparecimento de
crianças, filhos e filhas de opositores do regime ditador na Argentina. Na obra A
História Oficial, isto é representado por Gaby filha de Alicia (protagonista da história),
filha de uma prisioneira que deu a „luz‟ no cárcere e que foi “adotada” por sua família,
especificamente trazida pelo seu marido que „aparentemente‟ era conivente com o
regime ditador. Este fato provavelmente era corriqueiro na ditadura, muitos filhos que
tiveram os pais mortos, ou mulheres que tiveram seus filhos quando estavam presas,
passaram a ser criados por seus algozes ou por famílias que tinham algum envolvimento
com a ditadura como é representado no filme. Ao final da ditadura surgem as Mães da
Praça de Maio e atualmente as Avós da Praça de Maio que reivindicam punições para os
culpados das mortes e desaparecimentos de seus filhos e netos. Além de procurarem
saber sobre o que aconteceu com seus filhos, buscam encontrar seus netos que
possivelmente estejam sendo criados por famílias que eram simpáticas ao regime,
ativamente ou passivamente cúmplices.
(...) Calcula-se que por ali passaram cerca de 5 mil pessoas,
incluindo políticos das mais diversas filiações, sindicalistas,
professores, estudantes, artistas e religiosos, suspeitos de
atividades contra o regime. Poucos sobreviveram. A maioria
morreu durante as sessões de tortura e espancamento. Os que
sobreviviam, em geral com ossos quebrados, órgãos internos
lesados, dentes arrebentados e olhos ou ouvidos perfurados,
eram colocados em aviões da Marinha argentina e lançados em
alto-mar. Também passaram pela Esma e por dependências do
Exército mulheres de presos políticos ou elas próprias
militantes de algum grupo ou partido que estavam grávidas no
momento da prisão. Dezenas ou centenas de bebês nasceram
nas prisões e foram distribuídos entre os próprios militares, que
se encarregavam de falsificar papéis de adoção. Esse número
nunca foi apurado. (RIBEIRO, 2012:156)
27
Segundo Pereira, a junta argentina criada pelo golpe de 1976, rompeu com a legalidade
de forma muito mais radical do que os regimes do Brasil e do Chile. Todos os poderes,
Legislativo, Executivo e Judiciário foram expurgados. Os líderes do golpe falavam
explicitamente sobre a necessidade de contornar as restrições legais. “Em 1980, o
general Tomaz Sanchez de Bustamante declarou: Há normas e padrões judiciais que não
se aplicam neste caso...tudo tem que estar coberto numa nuvem de silêncio.”
(PEREIRA, 2010:193). A política de desaparecimentos rotineiros se intensifica a partir
deste período, chamado de Guerra Suja.
A linguagem usada pelos militares argentinos para legitimar sua
guerra suja, é, em particular, notória, tendo sido mais violenta e
inflexível que a do regime militar chileno, e por certo muito
mais que a do regime brasileiro. Ao mesmo tempo, da mesma
forma que a seus predecessores brasileiro e chileno, faltava ao
regime argentino uma ideologia que o legitimasse de forma
plena – fato esse notado por Juan Linz – e ele, muitas vezes,
usou um futuro retorno à democracia liberal como argumento
de autolegitimação. (PEREIRA, 2010:198).
Dentro deste tema podemos explorar os diversos conceitos representados nesta obra, os
aspectos como as mães da Praça de Maio e avós da Praça de Maio. Podemos estudar,
pesquisar e analisar o envolvimento da Igreja neste período, o envolvimento de setores
da sociedade civil (empresários, elite burguesa), entre outros.
ASPECTO RELEVANTE:
As Mães e Avós da Praça de Maio. “(...) Um segundo tipo de grupo coordenava as
ações dos familiares dos mortos e desaparecidos, dentre os quais os mais importantes
eram as Mães da Praça de Maio, as Avós da Praça de Maio e os Familiares dos Detidos
e Desaparecidos por Razões Políticas.” (PEREIRA, 2010:204).
Percebemos no filme uma cena que faz uma representação do contexto violento da
ditadura argentina, quando Gaby, filha da professora Alicia deixa a festa e vai brincar
com os presentes que ganhou em seu quarto. Ela brinca de ser mãe da boneca que
ganhou dos pais, cuidando e dando carinho, ela diz para a boneca: “mamãe está aqui,
pode dormir tranquila”, de repente os primos de Gaby invadem o quarto segurando
28
armas de brinquedo e destroem parte de suas coisas, a menina grita desesperada. A cena
mostra a menina como uma mãe que coloca seu filho para dormir e tem seu lar invadido
no meio da noite e sua casa destruída, situação vivida por muitas pessoas durante a
ditadura militar na Argentina.
A repressão argentina foi estruturada no trio seqüestro-
desaparecimento-tortura de pessoas. As pessoas eram
sequestradas, em suas próprias casas tendo parentes e vizinhos
como testemunhas. A maior parte das ações ocorria já tarde da
noite ou de madrugada pegando a todos de surpresa. Para
facilitar a ação e disseminar o terror na vizinhança os grupos
encarregados do sequestro cortavam a energia elétrica deixando
todos no escuro, usavam megafones, helicópteros e até mesmo
granadas e bombas. Em seguida, a casa era invadida por um
grupo de pessoas, que às vezes era composto por até 50
militares ou policiais, fortemente armados. A vítima então era
levada em um dos vários carros usados na ação. Não sem antes
que toda sua família, inclusive crianças, fosse aterrorizada e
ameaçada.1
“Segundo o CONADEP, Comissão Nacional sobre o Desaparecimento de Pessoas, os
desaparecimentos por sexo eram de 70% de homens jovens, 30% mulheres e dessas 3%
estavam grávidas no momento em foram abordadas. No caso do filme, Gaby foi uma
dessas crianças que nasceram depois que suas mães ainda grávidas foram sequestradas.”
(PEREIRA, 2010:203).
“(...) Marc Ferro (1977) mostrou como cinema acrescentou à história uma nova fonte
fundamental: o filme torna claro, aliás, que o cinema é “agente e fonte da história”.2
No filme temos uma cena onde Alicia vê as Mães/Avós da Praça de Maio de dentro do
prédio onde seu marido trabalha (há uma legenda na imagem com os dizeres: Avós da
Praça de Maio). Podemos aqui fazer uma relação de como se trabalhar o livro didático
junto com o texto segundo Capelato, Morettin, Napolitano e Saliba, em “História e
Cinema: dimensões históricas do audiovisual”:
1QUADRAT, Samantha Viz. Memória direitos humanos e política na Argentina
contemporânea. X Encontro Regional da ANPUH-RJ História e Biografias – Universidade do
Estado do Rio de Janeiro -2002. 2 FERRO, Marc. In: LÊ GOFF, Jacques. História e Memória. Editora da Universidade Estadual
de Campinas (UNICAMP), 1994, p. 49.
(Unicamp), 1994, p.49.
29
A articulação das imagens não canônicas com os textos é
fundamental. Sobretudo porque as legendas que acompanham
as imagens, principalmente a dos livros didáticos, são,
descontadas raríssimas exceções, também estereotipadas e
canônicas. Aliás, não é por coincidência que a palavra legenda,
venha de legendum, originalmente, lenda, invenção. Noutros
termos, acredito que as imagens não canônicas são estratégias
para o conhecimento da história mas não substituem o suporte
escrito. Ao contrário do que se costuma dizer, a “imagem não
fala...por si só”. Penso aqui, nas imagens cruas, sem nenhum
comentário ou legenda. Tais imagens podem interessar,
impressionar, seduzir, comover e apaixonar, mas não podem
informar. O que nos informa são as palavras. Os historiadores
sabem disso quando lidam com arquivos audiovisuais e
encontram uma imagem sem data, sem menção de local ou de
autor – é uma imagem absolutamente inútil...3
As Avós da praça de Maio possuem uma trajetória de luta na busca por seus entes
queridos. Se tornaram “parte” da história argentina e principalmente em um ícone de
resistência, garra e determinação na busca de aproximadamente quatrocentos jovens(
segunda dados que cresceram com famílias que as adotaram ilegalmente durante a
ditadura e não sabem sua identidade até os dias de hoje.
“Nada detuvo a las Abuelas en la búsqueda de sus nietos:
hicieron trabajo de detectives; recorrieron juzgados y orfanatos;
recibieron y siguen recibiendo las denuncias que la sociedad lês
hace llegar; viajaron por los cinco continentes; se entrevistaron
con personalidades de todo el mundo, y nunca perdieron de
vista su objetivo. Para asegurar la validez de los análisis de
sangre implementaron un banco de datos genéticos, creado por
ley, donde están los mapas genéticos de las familias que tienen
niños desaparecidos. Hoy las Abuelas ya no están solas en su
búsqueda. Las acompaña buena parte del pueblo argentino que
entendió la profunda carga ética de su mensaje. Y también las
acompañan sus nietos, sus bisnietos y os jóvenes que tienen
dudas sobre su identidad y se acercan a ellas. Más de 400
jóvenes continúan viviendo con su identidad cambiada. Por
ellos y por los niños de las futuras generaciones trabajan las
Abuelas: para preservar su identidad, sus raíces y su historia”.4
3 CAPELATO, MORETTIN, NAPOLITANO, SALIBA (orgs.). História e Cinema: dimensões
históricas do audiovisual. São Paulo: Alameda, 2007. 4 Revista Abuelas de Plaza de Mayo. Abuelas 30 años (1977-2007)
http://www.abuelas.org.ar/material/documentos/revista_abuelas30.pdf. (Acesso em 31/05/2013)
30
Na Argentina, o levantamento desses dados é realizado de forma expressiva pela
associação das Avós da Praça de Maio. São centenas de crianças roubadas que
atualmente vivem sem saber a verdade, mas o trabalho dessas mães e avós da Praça de
Maio, tem feito com que muitos cheguem a conhecer seus parentes de sangue.
“Os registros mantidos por esses grupos tornaram-se vitalmente
importantes após a queda do regime militar, tendo fornecido os
dados básicos para o relatório da Conadep5. Os protestos das
Mães da Praça de Maio forma, também, de importância vital,
simbolizando a resistência às atrocidades do regime e a
esperança de uma sociedade melhor no futuro.” (PEREIRA,
2010:204).
O filme acaba com Gaby cantando a seguinte canção:
“No país do não me lembro...
dou três passos e me perco...
Um passinho para trás
E não tenho nenhum mais
Um passinho para cá
Ai que medo que me dá
Percebemos na letra desta música, uma clara alusão desta obra ao tema central que é o
desaparecimento de pessoas durante a ditadura argentina e ao aspecto que analisamos
das Mães e Avós de Maio. Enfim, um país que esconde a “verdadeira” História Oficial
até hoje. Onde a elite dominante, militares e civis envolvidos no regime “fingem não se
lembrar das barbaridades e crimes cometidos.”
ANÁLISE DO CAPÍTULO DO LIVRO DIDÁTICO – DITADURA ARGENTINA
História – O Mundo por um fio: do século XX ao XXI. Vol. 3 – Ensino Médio. PNLD –
2012 / 2013 / 2014. Editora Saraiva. Ronaldo Vainfas, Sheila de Castro Faria, Jorge
Ferreira, Georgina dos Santos (orgs).
5 Comissão Nacional sobre o Desaparecimento de Pessoas.
31
O Livro é dividido em três seções, a primeira seção é intitulada, Revoluções e Guerras
com oito capítulos. No capítulo 1, o tema é Brasil: a Primeira República. No capítulo 2,
é Brasil: República no ritmo de mudança. No capítulo 3, A Primeira Guerra Mundial e o
declínio da Europa. No capítulo 4, o tema é Da Revolução Russa ao Stalinismo. No
capítulo 5, Crises do entre guerras. No capítulo 6, Democracia em xeque: o fascismo e o
nazismo. No capítulo 7, A Segunda Guerra Mundial e no capítulo 8, Brasil: a República
nacional-estadista.
A segunda seção é intitulada Guerra Fria, Guerras Quentes e possui seis capítulos, do
capítulo nove ao quatorze. No capítulo 9 o tema é, Construindo rivalidades: o mundo
pós-guerra (1). No capítulo 10, Construindo rivalidades o mundo pós-guerra (2). No
capítulo 11, O Terceiro Mundo: África e Ásia. No capítulo 12, O Terceiro Mundo:
América Latina. No capítulo 13, O Brasil e a República democrática. No capítulo 14,
Brasil: a República dos generais.
A terceira seção intitulada Rumo ao Novo, possui quatro capítulos, vai do capítulo
quinze ao dezoito. No capítulo 15, o tema é Tempos de crise. No capítulo 16, O Brasil
da democracia. No capítulo 17, O colapso do comunismo e no capítulo 18, O novo
século.
Ps.: Cada capítulo possui tópicos com subtítulos abordando os assuntos mais
importantes de cada dentro do contexto do título de cada capítulo.
Nosso tema de análise está localizado na seção 2, capítulo O Terceiro Mundo: América
Latina, tópico 5 – Argentina dividida. O capítulo possui 4 páginas de texto (296-299)
e 2 intituladas – Roteiro de estudos (300-1)
O capítulo traz um resumo sobre o contexto histórico desde a posse de Juan
Domingos Peron na década de 1940 e vai até os anos 80 com a Guerra das
Malvinas e a posso de Raul Afonsin, início da redemocratização argentina.
Os autores utilizaram imagens para contextualizar os momentos políticos
abordados no capítulo. Imagens do discurso no retorno Peron, da posse do
General Videla em 1974 e das Mães da Praça de Maio em 1982.
Os autores apresentam uma seção na última página do capítulo (p.299),
intitulada, Conversa de Historiador – com o título, Terrorismo de Estado. Está
32
seção é elaborada com citações do livro História contemporânea da Argentina de
Luis Alberto Romero. Essas citações se referem aos sequestros, torturas, prisões
e execuções do regime ditador. As citações contextualizam as informações
passadas no texto e deixam mais claras as práticas ilegais realizadas durante a
ditadura.
Nas páginas 300 e 301, temos o Roteiro de Estudos. Nesta seção um ponto
muito importante e pertinente é um quadro com o título Reflexões que explica o
conceito de ditadura e de democracia, explica suas diferenças (p.300). Os
autores propõem que os alunos façam um texto explicando as contraposições
entre ditadura e democracia.
Na página 301, os autores colocam 3 questões de vestibulares de universidades
renomadas, intituladas, Vamos testar?
CONCLUSÃO:
Analisando o livro didático, percebemos que os conteúdos apresentados sobre a
América Latina são muito resumidos. O texto foca apenas na figura de Peron para
trabalhar a ditadura argentina. Não faz uma contextualização econômica, política e
cultural do período da ditadura. O filme História Oficial poderia ser utilizado como uma
pesquisa ou um exercício a ser visto pelos alunos na seção Roteiro de Estudos. Esta
obra como uma representação da realidade pode e deve ser utilizada pelos professores
como um documento histórico junto com textos que reforcem e aprofundem os
processos políticos, econômicos e culturais ocorridos na ditadura argentina.
33
BIBLIOGRAFIA
CAPELATO, MORETTIN, NAPOLITANO, SALIBA (orgs.). História e Cinema:
dimensões históricas do audiovisual. São Paulo: Alameda, 2007.
DORATIOTO, F. Espaços nacionais na América Latina. São Paulo: Brasiliense, 1994,
p. 29-71.
FERRO, Marc. In: LÊ GOFF, Jacques. História e Memória. Editora da Universidade
Estadual de Campinas (UNICAMP), 1994, p. 49.
IOKOI, Zilda Márcia Grícoli. Lutas sociais na América Latina. Porto Alegre: Mercado
Aberto, 1989. p. 7-52.
PEREIRA, Anthony W. Ditadura e Repressão: o Autoritarismo e o Estado de direito no
Brasil, no Chile e na Argentina. São Paulo: Paz e Terra, 2010.
QUADRAT, Samantha Viz. Memória direitos humanos e política na Argentina
contemporânea. X Encontro Regional da ANPUH-RJ História e Biografias –
Universidade do Estado do Rio de Janeiro -2002.
RIBEIRO. Taquari Carlos. Tiranos e Tiranetes: A Ascensão e Queda dos Ditadores
Latino Americanos e Sua Vocação Para o Ridículo e o Absurdo. Civilização Brasileira.
São Paulo. 2012.
SITES
Revista Abuelas de Plaza de Mayo. Abuelas 30 años (1977-2007)
http://www.abuelas.org.ar/material/documentos/revista_abuelas30.pdf. (Acesso em
31/05/2013)