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Barbara Cartland Seu reino por um amor

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Barbara Cartland

Seu reino por um amor

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Título original: “A King in Love”

Resumo da Capa:

Zita percebeu, de repente, que não estava sozinha. Ouviu passos e avistou um vulto

no meio das árvores. Ficou aborrecida com aquela intromissão. Será que não tinha sequer o

direito de sofrer em paz? Por que um estranho vinha perturbar a beleza daquele lugar que

ela só gostaria de compartilhar com uma única pessoa no mundo? Enquanto hesitava entre

ir embora ou fingir que não o via, o homem se aproximou. E Zita pensou que estava

sonhando. Mas era o rei! Impulsivamente, sem pensar no que fazia, obedeceu ao coração.

Correu para ele, esquecida de que Maximiliano só a desejava como amante. Esquecida de

que ele era o homem destinado à sua irmã!

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Capítulo 1

1865

Sua Majestade, o rei Maximiliano, levantou-se do divã onde estava deitado e largou o

copo.

- Preciso ir embora.

- Mais non, mon brave!

O protesto veio dos lábios vermelhos da mulher que se olhava no espelho.

Ela estava admirando, não seu rosto bonito, e sim, o colar de enormes rubis e

brilhantes que usava.

- Não pode ir embora tão depressa - insistiu. O sotaque encantador transformava sua

voz um tanto vulgar em algo muito atraente.

Achando que seus protestos não eram suficientes, dirigiu-se para o rei, deixando que

o néglige de gaze e de rendas se abrisse na frente.

- Acha que seu presente fica bem em mim, mon cher? - perguntou, referindo-se ao

colar e postando-se diante de Maximiliano.

Os olhos do rei não pousaram no colar, e sim, no corpo da mulher que tinha

empolgado Paris.

“La Belle”, pois era este o nome pelo qual era conhecida no teatro, sorriu

maliciosamente e, com um leve movimento de ombros, fez com que o néglige caísse a seus

pés.

A pele da actriz era muito branca; a cintura, fina. Os seios e os quadris tinham as

curvas decretadas pela moda, mas só encontradas, com tal perfeição, em muito poucas

mulheres.

Ficou parada, dramaticamente, vendo os olhos do rei percorrerem seu corpo.

Depois, com uma exclamação abafada, aproximou-se, passou os braços em volta do

pescoço dele e beijou-o...

Bem mais tarde, o rei se aproximou do espelho para atar o nó da gravata.

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Agora era La Belle quem estava deitada no sofá, numa atitude de exaustão satisfeita,

o colar de rubis ainda brilhando no pescoço.

- Você me atrasou - disse o rei. - Mas o primeiro-ministro certamente vai aceitar

minha explicação, isto é, que estive tratando de negócios importantes.

- O que pode ser mais importante do que eu? - perguntou La Belle.

- O primeiro-ministro teria muitas respostas para essa pergunta - disse ele, sorrindo.

Feito o nó da gravata, olhou para seu reflexo no espelho, com ar zombeteiro, quase

como se apreciasse as rugas cínicas que lhe marcavam o rosto.

Observando-o, La Belle achou que, mesmo que não fosse um rei, era o amante mais

ardente e mais satisfatório que jamais tivera. E a actriz era muito experiente nisso!

Seduzida aos doze anos, tinha atingido o estrelato graças à sua sucessão de amantes,

até aparecer no Théâtre Imperial de Châtelet, onde Maximiliano a conhecera.

Seus amantes haviam sido duques, marqueses e até um obscuro príncipe italiano; mas

um rei tinha um encanto que ela achava irresistível.

O facto de Maximiliano ser muito rico e estar disposto a lhe dar uma vida

confortável bastou para convencê-la a deixar Paris e ir para Valdastien, o país onde ele

reinava.

No palácio havia um teatro particular, onde ela podia dançar para um público

distinto, sempre que o desejasse. Mas achava mais excitante dançar só para o rei, na mansão

onde ele a instalou e que tinha sido construída um século antes, no jardim do palácio.

Foi o avô do rei quem primeiro instalou ali uma amante, depois que ficou velho

demais para viajar para a capital e lá gozar os prazeres que somente uma mulher bonita

podia dar.

Para facilitar ainda mais as coisas, a mansão comunicava com o palácio por meio de

uma passagem subterrânea. Essa passagem tinha uma porta secreta dando para o escritório

do rei e somente ele possuía a chave.

- Quando vai voltar? - perguntou La Belle.

Esperou ansiosamente pela resposta, sem ter certeza do que ele diria.

Enquanto esperava, sabia que seria tolice tentar forçar o rei a marcar uma hora, ou

mesmo o dia em que poderia vê-la novamente.

Omnipotente, só fazendo o que bem entendia, Maximiliano prezava sua liberdade

acima de tudo. A actriz sabia que, se fosse sensata, nada teria perguntado, apenas esperando

até ele se dignar a voltar.

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Em todos os casos amorosos anteriores, tinha dominado os homens que a

desejavam, deixando-os de joelhos, podendo levá-los ao êxtase ou desprezá-los a ponto de

fazer com que ficassem desesperados.

Mas o rei era diferente.

Embora soubesse que o excitava, sendo muito bem recompensada pelo prazer que

lhe dava, a actriz nunca sabia com certeza se no dia seguinte não se veria num trem,

viajando de volta para Paris, sem nenhuma explicação da parte do rei por ter sido

“despedida”.

Quando Maximiliano se virou, ela se levantou do divã, fechando de novo o néglige.

Com a sabedoria de sua profissão, sabia que só as mulheres tolas se viam abandonadas

quando um homem se cansava delas.

Ficou observando-o, enquanto ele vestia o paletó justo, que revelava os ombros

largos e seu porte atlético.

Disse, suavemente:

- Você é muito bonito. Vou ficar contando as horas, até eu poder lhe dizer

novamente como anseio por sua presença.

Falou em tom dramático, mas o rei sorriu com ironia, reconhecendo as frases da peça

que ela representava, pouco falando e obtendo sucesso apenas como dançarina.

Foram justamente suas qualidades de dançarina, assim como seu corpo escultural,

que atraíram o rei, em primeiro lugar. Quando ele se achava com La Belle, pensava que,

assim como acontecia com a maioria das mulheres, quando menos ela falava, mais

interessante parecia.

Olhou-a mais uma vez e dirigiu-se para a porta, dizendo:

- Talvez eu organize um espectáculo no teatro, no próximo sábado. Vou pensar nisto

e, se for possível, mandarei avisá-la, para que possa preparar uma dança que eu ainda não

conheça.

Antes que ela respondesse, saiu e fechou a porta. Desceu calmamente a escada,

dirigindo-se para a porta da passagem secreta, que ficava na parte traseira do hall.

Quando se viu só, La Belle atirou-se no sofá e ficou tamborilando com os dedos na

parte curva da madeira.

Sabia perfeitamente por que motivo o rei sugerira uma nova dança, que ainda não

tivesse visto. Era porque ela teria que ensaiar e planear um traje novo, ficando ocupada

enquanto Maximiliano não precisasse dela.

Sentia-se furiosa por ver que ele dispunha de seu tempo, ao passo que ela mesma não

tinha o poder de prendê-lo.

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Sabia, pois não faltou quem lhe dissesse isso, que não era a primeira mulher que

tentava amarrá-lo e fracassava.

Havia uma longa lista de amantes bonitas que tinham vindo para Valdastien e ido

embora, se não em lágrimas, pelo menos humilhadas, percebendo que não eram tão

irresistíveis como pensavam.

Antes de La Belle sair de Paris, uma de suas amigas avisou:

- Vai ver que o rei é generoso, gentil e deliciosamente apaixonado. Mas é também

esquivo, indiferente ao sofrimento feminino e, invariavelmente, inacessível.

La Belle não acreditou. Tinha certeza de que, mesmo que todas as mulheres do

mundo não conseguissem conquistar o coração de Maximiliano, ela conseguiria.

Agora sabia que, embora a cumulasse de jóias, embora despertasse o desejo dela,

como a actriz despertava o dele, o rei continuava sendo dono absoluto de si mesmo.

Tinha a desagradável sensação de que, se morresse no dia seguinte. o rei mandaria

flores para o enterro e não pensaria mais nela.

Foi até à janela, blasfemando baixinho na gíria da sarjeta. Olhou para fora, mas não

viu as montanhas altas com os picos cobertos de pinheiros, nem o vale verde onde um rio

prateado serpeava por entre campos floridos.Em vez disso, imaginou os bulevares cheios

de gente, os lampiões de gás nos cafés, o público entrando no teatro, pronto para aplaudi-la

ruidosamente, quando terminasse sua dança.

“Sou uma tola! Não sei por que não o abandono e volto para lá.”

Com receio da resposta, afastou-se da janela com ar petulante e postou-se diante do

espelho, para admirar o colar de rubis.

Temia, como tantas outras antes dela, se apaixonar por um homem para o qual só

significava um belo corpo e uma dançarina sensacional.

O rei andou pela passagem secreta, que tinha um tapete grosso e era decorada com

lambris feitos com nogueira das florestas de Valdastien. Com uma chave de ouro, abriu a

porta que dava para o seu escritório.

Ao fechá-la, não pensava na actriz, como La Belle teria gostado, e sim, no primeiro-

ministro, que devia estar esperando por ele com impaciência.

Maximiliano estava mais de uma hora atrasado para a entrevista. Mas não pretendia

se desculpar, pela simples razão de acreditar que reinava pela graça de Deus e que,

portanto, seus súbditos, inclusive o primeiro-ministro, deviam aceitá-lo como era.

Passou para o enorme hall barroco, um dos mais belos do país e famoso em toda a

Europa.

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O palácio tinha sido reformado e aumentado no correr dos séculos, pouco restando

da construção original, que datava do século XVI.

Cada monarca tinha feito o possível para torná-lo mais impressionante. Governantes

de Outros países, quando vinham a Valdastien pela primeira vez, ficavam cheios de inveja

da beleza do palácio e da riqueza das peças que ali havia.

Maximiliano subiu uma escada magnífica, decorada com ouro e marfim, indo até a

antecâmara onde o primeiro-ministro devia estar à sua espera.

Era ali que, por tradição, o rei recebia seus ministros.

Como que para fazer com que compreendessem que eles eram apenas uma pequena

parte da história, as paredes estavam cobertas por tapeçarias representando as vitórias dos

antigos governantes e o teto pintado era obra de um artesão local que se inspirara nos

mestres italianos.

Quando o rei entrou na antecâmara, esperando ali encontrar, não apenas o primeiro-

ministro, mas pelo menos meia dúzia de membros do gabinete, ficou admirado por ver

apenas dois homens, perto da janela. Teve a impressão, embora não pudesse ouvir o que

diziam, de que conversavam seriamente e até pareciam um pouco apreensivos.

Estavam tão entretidos, que, por um momento, não perceberam a presença do rei.

Maximiliano tinha uma aguda percepção das pessoas e soube que o pedido urgente

do primeiro-ministro para vê-lo não era uma visita de cortesia, e sim, para tratar de algum

assunto muito grave.

Dirigiu-se para os dois homens, que imediatamente ficaram atentos.

- Boa tarde - disse ao primeiro-ministro.

- Boa tarde, Majestade. É muita gentileza sua nos receber, a mim e ao chanceler, com

tão curto aviso.

O rei inclinou a cabeça para o chanceler, o conde Holé, de quem não gostava muito.

O primeiro-ministro Continuou:

- Temos um assunto a discutir com Vossa Majestade e esperamos que tenha a

bondade de nos ouvir, sem ficar contrariado.

Maximiliano ergueu as sobrancelhas.

- Acho que esta sala é muito grande para uma conversa íntima. Sugiro que passemos

para a sala vizinha, onde certamente ficaremos mais bem acomodados.

Muito à vontade, sentou-se numa cadeira de espaldar alto, onde se via o brasão real

bordado em seda e ouro. Com um gesto, indicou que os dois homens deviam sentar-se.

Eles escolheram duas cadeiras perto do rei, obviamente para não precisarem falar

alto.

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Maximiliano olhou de um para o outro.

- Então, senhores? Estou curioso para saber qual o importante problema que me

trouxeram e que, por um motivo com o qual ainda não atinei, não exige a presença de todo

o gabinete.

O primeiro-ministro respirou fundo.

- O chanceler e eu estamos ansiosos, Majestade, para lhe falar sobre esse problema,

antes que seja apresentado ao gabinete e, mais tarde, ao parlamento. - Fez uma pausa,

olhou para o chanceler como pedindo confirmação, e continuou: - Devo ser franco, Majes-

tade, e dizer imediatamente qual o motivo que nos trouxe aqui?

- Certamente, prefiro que me digam logo qual o motivo. Como bem sabem, não

gosto de dissertações longas, que geralmente são desnecessárias.

- Muito bem, Majestade. A opinião de muitos de meus colegas, partilhada por toda a

nação, é que a linha sucessória precisa ser garantida. Seria um erro encorajar certas nações

vizinhas a pensarem que, caso alguma coisa acontecesse a Vossa Majestade, elas poderiam

ter alguma interferência nos negócios de Valdastien.

Quando o ministro começou a falar, o rei se contraiu. Agora, com voz inexpressiva,

mas com olhar duro, disse:

- O que está insinuando, primeiro-ministro, é que devo casar.

Como Vossa Majestade me pediu para ser franco, a resposta é... sim.

- Sou relativamente moço.

- Claro, Majestade. Ao mesmo tempo, não tem irmãos e, se não tiver um filho, a

linha sucessória terminará.

O rei ficou em silêncio, sabendo que era verdade. Como se temesse ter despertado

sua cólera, o ministro continuou: e...

- O povo do sul do país ficou muito abalado com a tentativa de morte contra o rei

Gustavo, há três semanas. Como Vossa Majestade não ignora, Sua Majestade escapou por

um triz. E nada nos diz que não haja outra tentativa de assassinato.

- O que os senhores estão dizendo é que há anarquistas por toda a parte. Na última

vez que estive em Paris, comentava-se que houve um atentado contra a rainha Vitória, na

Inglaterra.

- É verdade, Majestade. E, aqui em Valdastien. o povo tem medo, não apenas de que

um anarquista o ataque, como também porque sabem que Vossa Majestade está sempre

correndo perigo.

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O rei percebeu que o primeiro-ministro se referia a seus passatempos predilectos.

Gostava de alpinismo e orgulhava-se de, aos trinta e cinco anos, poder escalar montanhas

com a força e a agilidade de quinze anos antes.

Gostava também de domar cavalos selvagens, dos quais havia muitos em Valdastien.

Eram capturados em distritos isolados e montanhosos. Quando os melhores eram trazidos

para as cocheiras do palácio, o rei fazia questão de montar aqueles que seus cavalariços

mais temiam.

Essas duas actividades aborreciam o primeiro-ministro.

Mas, com um sorriso sarcástico, Maximiliano pensou que havia outro assunto que o

preocupava; não o abordava, embora estivesse presente em seu pensamento.

Em sua última viagem a Paris, o rei foi desafiado para um duelo por um francês

encolerizado que jurava que ele lhe havia seduzido a esposa.

O facto de não ter sido necessário nenhum esforço por parte de Maximiliano e de o

caso estar longe de ser sedução, não o impediu de aceitar o desafio.

Embora o aristocrata francês fosse um famoso duelista, que já tinha matado dois

adversários, foi ferido por uma bala do rei, mas não antes de acertá-lo de raspão no braço.

Todo o país ficou assombrado com o que aconteceu com seu rei e houve inúmeras

especulações a respeito.

Maximiliano sabia que, para o primeiro-ministro e o resto do gabinete, era esse

também um motivo urgente para tentar convencê-lo a ter um herdeiro.

O chanceler disse:

- Creio ser desnecessário explicar a Vossa Majestade o quanto o povo se sente feliz

sob seu reinado, esperando que haja muitos anos de alegria e de prosperidade. - Ao mesmo

tempo.

Seu olhar encontrou o do rei e ele se calou. Parecia ter medo de dizer mais alguma

coisa e de receber uma resposta áspera.

Maximiliano apertou os lábios. Ia dizer ao primeiro-ministro, ao chanceler e a todos

que podiam ir para o inferno, antes de vê-lo casado, quando ele se lembrou de que havia

uma ameaça muito maior para Valdastien.

No ano anterior, em Paris, o imperador lhe havia dito francamente que temia as

ambições da Prússia e que tinha certeza de que Bismarck estava decidido a unir todos os

Estados germânicos menores em uma Alemanha imperial que os engoliria a todos. um por

um.

Maximiliano, que não tinha em grande conta a inteligência de Napoleão MI, não lhe

dera ouvidos.

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Agora, os avisos - uns dados por franceses, outros vindos em cartas de monarcas que

reinavam em países pequenos como o dele - pareciam aumentar cada vez mais.

Podia visualizar a Alemanha invadindo o mapa da Europa, engolindo um a um os

principados até formar uma federação capaz de enfrentar a Inglaterra e a França em pé de

igualdade.

Com surpresa, o primeiro-ministro ouviu o rei dizer, em tom muito diferente do

esperado:

- Vou levar sua proposta em consideração. Compreendo que o que sugere é sensato.

Embora não deseje casar, acho justo o desejo de meu povo de eu lhe dar um herdeiro.

O primeiro-ministro respirou, aliviado.

- Só posso agradecer a Vossa Majestade por se mostrar tão compreensivo.

- Vou pensar nisso. Acho que o melhor seria eu visitar primeiro os países vizinhos,

com os quais pudéssemos fazer uma aliança firme.

O primeiro-ministro, que era um homem astuto, compreendeu exactamente o que o

rei queria dizer. Também ele tinha medo da Alemanha e da ambição de Bismarck, que,

como toda a Europa sabia, manipulava o fraco rei Guilherme, que estava mais interessado

em sua saúde do que na grandeza da pátria.

O rei levantou-se.

- Obrigado, senhores, por sua visita. Eu lhes participarei meus planos, assim que tiver

tempo de fazê-los.

Satisfeitos com o resultado da entrevista, o primeiro-ministro e o chanceler se

retiraram.

Depois que ficou sozinho, o rei sentou-se numa poltrona e ficou olhando, sem vê-lo,

o belo quadro de Fragonard na parede oposta. Não viu a figura graciosa no jardim

romântico, nem os cupidos acima dela, no céu.

Pensou apenas na incrível caceteação de ter que tolerar a companhia de uma rainha

cuja única qualidade, no que lhe dizia respeito, seria seu sangue real.

Pensou nas cortes pretensiosas e aborrecidas que tinha visitado em suas viagens pela

Europa; nos monarcas que conhecera. Eram todos iguais, muito cônscios de sua

importância, tendo pavor de serem depostos, não falando de outra coisa a não ser de

assuntos familiares e de mexericos a respeito de outras cortes.

Lembrou-se da comida sem graça, invariavelmente servida nesses lugares que

detestava, das camas pouco confortáveis, das intermináveis cerimónias oficiais e

compreendeu que uma rainha traria para o palácio de Valdastien todas essas coisas que o

irritavam e que sempre procurava evitar.

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Sendo solteiro, tinha conseguido reduzir essas cerimónias ao mínimo, podendo

divertir-se livremente, quase como se fosse um cavalheiro inglês, em sua propriedade rural.

Ia caçar quando bem entendia, só recebia as pessoas de quem gostava, deixando

todas as cerimónias solenes, a não ser uma ou duas por ano, a cargo do primeiro-ministro e

de outros membros do governo.

Pensando bem, achou que o povo de Valdastien via seu monarca menos do que o de

qualquer país. Por isso, disse a si mesmo, com ironia, esse povo estava muito mais satisfeito

do que qualquer outro.

Uma rainha mudaria tudo! Ia querer comparecer a inúmeras solenidades públicas,

visitar hospitais, receber buques de flores e, sempre que possível, andar de carruagem para

receber os aplausos da multidão.

Ia também querer interferir na direcção dos serviços domésticos do palácio, que o rei

considerava perfeitos, porque tinha o dom da organização.

Em vez de jantar com seus amigos íntimos, ou de gozar uma noite solitária, lendo ou

indo visitar La Belle, ou a mulher que estivesse instalada na mansão na ocasião, teria que

ficar conversando com alguma Frau feiosa e maçante.

As damas de honra seriam, sem dúvida, ainda mais feias e mais aborrecidas do que a

rainha.

Que vida terrível!

Mas sabia que não havia alternativa.

O primeiro-ministro não falaria com ele daquele modo, a não ser que tivesse sido

pressionado pelos outros membros do governo e também pelos cidadãos importantes, que

queriam evitar a ameaça germânica.

Pior ainda era a perspectiva de terem que encontrar um governante estrangeiro para

vir ocupar o lugar do rei, caso ele morresse sem deixar um herdeiro.

Maximiliano sabia que os gregos tinham procurado desesperadamente por um

monarca, tendo recentemente eleito para o trono o segundo filho do rei da Dinamarca, que

se tornou George I.

Mas sabia também que, se alguma coisa lhe acontecesse, Valdastien era um país

pequeno demais para sobreviver. Um tanto desgostoso, pensou que era justo que fizesse

um sacrifício por seu povo.

Há oito anos que reinava e apreciara cada momento. Tinha sido pouco convencional,

mas ninguém se queixou; era também totalmente egoísta, quando se tratava de seus

interesses particulares, e o povo o admirava por isso.

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Agora, precisava pagar o preço da liberdade que gozava, mas considerava-o muito

alto.

- Só Deus sabe onde poderei encontrar uma esposa que eu ache pelo menos

suportável! - murmurou.

Como se o diabo zombasse dele, viu passar diante de seus olhos uma procissão de

princesas, altas, baixas, gordas, magras, loiras, morenas, ruivas. Todas lhe pareciam muito

pouco atraentes, e a idéia de tocá-las fez com que estremecesse.

Mas uma seria a mãe de seus filhos e usaria a coroa de Valdastien.

- Não suportarei isso!

Depois, como se o diabo mudasse o cenário e erguesse o pano para um outro acto, o

rei viu as mulheres que tinha escolhido por seus encantos e que o prenderam durante

algum tempo.

Todas tinham suas qualidades.

Assim como os quadros que comprara para o palácio, assim como as jóias que dera a

tais mulheres, cada uma delas tinha sido perfeita.

Mais do que qualquer outra coisa, ele detestava a feiúra. Sabia que tinha herdado do

pai o amor à beleza, como também da mãe, que, com seu sangue húngaro, tinha sido uma

das mulheres mais bonitas que jamais conhecera.

Era uma magnífica amazona; tinha morrido muito moça, porque, assim como ele,

gostava dos cavalos selvagens, em vez dos que poderia montar sem perigo.

Se foi bonita em vida, também continuou sendo bonita depois de morta, O rei sabia

que sua beleza o inspirava, e era o que procurava em todas as mulheres, sem jamais a

encontrar.

Consternado com o futuro que o esperava, teve a impressão de que, de repente, um

abismo se abria à sua frente.

Não estava mais seguro, devia seguir um caminho estranho e traiçoeiro, com a

convicção de que sua paz e sua felicidade seriam destruídas, para sempre.

Começou a andar de um lado para outro, inquieto.

Como se não pudesse mais suportar os próprios pensamentos, desceu a escada e foi

para o escritório.

Procurou a chave que tinha guardado no bolso do colete. Sabia, embora isso fosse

apenas um paliativo como o vinho, que só La Belle poderia fazer com que se esquecesse de

tudo, por um momento.

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A porta da sala de estudos se abriu, mas a princesa Zita, que lia junto da janela, não

virou a cabeça.

Estava, na realidade, no mundo da fantasia, onde ficava, sempre que lia um livro, e

onde se refugiava, à noite, ou mesmo durante o dia, quando não se interessava pelo que se

passava à sua volta.

Só quando percebeu que havia alguém a seu lado, foi que olhou para a recém-

chegada, sua irmã mais velha, Sophie.

- Imagine o que aconteceu! - exclamou Sophie.

A contragosto, porque estava muito mais interessada na leitura, Zita perguntou:

- O que foi?

Não esperava nada de excitante, mas sabia que devia ser alguma coisa inesperada; do

contrário, Sophie não teria vindo interrompê-la.

A irmã sentou-se no banco da janela, diante dela.

- Mal posso acreditar, mas mamãe diz que deve ser por isso que ele vem aqui.

- De quem está falando? Quem é que vem aqui?

- O rei Maximiliano de Valdastien avisou o papai que está fazendo uma tournée pelos

países vizinhos e que deseja passar uns dias aqui.

Sophie falou no tom preciso, inexpressivo que lhe era peculiar, mas seus olhos

estavam animados, e encarou a irmã, com apreensão.

Zita ficou sem fala, por um momento.

- O rei Maximiliano? Tem certeza?

- Absoluta. E mamãe acha que ele vem pedir minha mão em casamento.

- Não pode ser verdade! Sempre ouvimos dizer que o rei é um solteirão inveterado,

que não pretende casar, embora haja muitas mulheres dispostas a partilhar o trono com ele.

Zita parecia estar falando para si mesma. Como a irmã não respondesse, continuou:

- Creio que sei por que motivo ele mudou de idéia. Uma noite destas, papai estava

falando com o barão Meyer sobre a determinação de Bismarck de expandir as fronteiras da

Alemanha. - Fez uma pausa e acrescentou, em tom positivo: - Sim! é por isso que o rei quer

não apenas ter certeza de que nosso país será seu aliado contra a Alemanha, como também

ter um herdeiro.

Zita não esperava que a irmã respondesse, pois sabia que Sophie não se interessava

por política, nunca procurando ouvir a conversa quando o pai recebia algum membro do

governo, nem, tampouco, lendo os jornais.

Zita gostava tanto de jornais quanto de livros. Muitas vezes achava que seu cérebro

estava dividido em dois compartimentos: um se interessava por política e pelos problemas

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de todos os países da Europa; o outro estava repleto de fantasias que tornavam o mundo

belo como um conto de fadas.

Nesse último, não havia problemas, a não ser os que aconteciam com ninfas e sátiros,

com gnomos e duendes, assim como com as sereias que atraíam marinheiros e navios com

seu canto, levando-os à destruição.

Era esse o assunto da história que estava lendo. Por um momento, teve dificuldade

em abandonar as sereias, com seus cabelos longos flutuando nas ondas, para concentrar-se

em Maximiliano e na sua procura de uma esposa.

Então achou que a diferença não era muito grande, afinal de contas.

A mãe de Zita, a grã-duquesa, ficaria horrorizada, se soubesse que a filha tinha

conhecimento da reputação do rei, isto é, a de dar sua protecção às mais lindas mulheres do

teatro.

O professor de música, que ensinava piano a Zita, tinha sido concertista, em Paris.

Assim sendo, conhecia o mundo do teatro, que fascinava a princesa, já que ela vivia na

quietude de Aldross, o país de seu pai.

- Conte-me mais alguma coisa, monsieur, conte tudo! - pedia Zita, quando a lição

terminava. E o professor tinha prazer em falar para ouvidos tão atentos.

Contava sobre as grandes personalidades do teatro. Como ia sempre a Paris, onde

tinha dois filhos casados, Zita sabia quais eram as últimas peças em cartaz.

Ele descrevia as prima- donas que atraíam multidões à ópera, as estrelas dos cafés-

concertos, as mulheres que enfeitiçavam os homens, que gastavam fortunas com elas em

vestidos, jóias, carruagens, cavalos e tudo o que desejassem.

Sabendo o quanto a moça se interessava, ele lhe trazia jornais franceses, que não

apenas descreviam o que acontecia no palco, como os escândalos sobre as pessoas da alta

sociedade.

O nome de Maximiliano aparecia frequentemente nesses jornais. Zita se interessava

por ele, porque o rei era muito bonito, a julgar pelos retractos e desenhos, e exactamente o

que Zita esperava que um monarca fosse. Com um ar dominador e autoritário, parecia

muito diferente dos homens comuns, assim como dos parentes de sangue real da princesa.

Encorajado pelo interesse da aluna e levado por sua própria verbosidade, o professor

às vezes era indiscreto. A mocinha ficou sabendo dos casos do rei. Assim que La Belle foi

instalada em Valdastien, ela teve conhecimento do fato.

- Diga-me como é essa actriz - pediu ao professor.

- Linda, com o corpo de uma deusa! Quando anda pelo palco, usando um traje

diáfano que revela a perfeição de suas formas, o público fica em silêncio. Não há maior

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homenagem para uma actriz do que o silêncio de um público fascinado por sua beleza e

pelo papel que interpreta.

Zita também ficava fascinada, mas não podia compreender que uma artista como La

Belle pudesse trocar os aplausos mesmo por um rei!

- Será que ela não sente solidão, levando uma vida tão calma naquele país, que ouvi

dizer que é parecido com o nosso?

O professor sorriu.

- Ela tem o rei para aplaudi-la.

- Quer dizer que dança para ele?

A pergunta fez com que o professor percebesse que tinha falado demais com uma

criatura jovem demais, que não deveria saber que mulheres como La Belle existiam.

- A aula acabou, princesa. Amanhã vamos tratar das composições de Liszt, em vez de

perdermos tempo com conversa fiada.

Num tom muito sedutor, Zita disse:

- Mas, professor, deve compreender que, quando conversamos, o senhor abre para

mim novos horizontes. E a música, quando vem do coração tanto quanto da mente, não

pode ser abafada.

Sabia que esse era o tipo de comentário que ele apreciava e compreendia.

- Vossa Alteza Real é muito inteligente. Por outro lado, eu não devia falar nessas

mulheres.

- Se essas mulheres dançam tão bem, como o senhor disse, então elas dão beleza ao

mundo, e é isso que todos nós buscamos.

- É verdade, bem verdade. Mas devo falar-lhe, Alteza, de Raquel, que foi uma actriz

brilhante e uma das maiores prima- donas de óperas, e que ainda não estudamos

completamente.

- Sim, é claro. Se o senhor puder arranjar um retracto dela, numa das suas revistas, eu

ficaria muito satisfeita.

Sabia perfeitamente que não estava interessada nas qualidades artísticas de La Belle, e

sim, em seu relacionamento com o rei Maximiliano.

“Por que será que ele a acha tão atraente?”, pensou.

Resolveu continuar insistindo com o professor para que lhe arranjasse um retracto de

La Belle. Queria satisfazer sua curiosidade quanto aos encantos da actriz que tinham feito

com que o rei a tirasse de Paris e a conservasse em Valdastien.

Agora, inesperadamente, ficava sabendo que o rei vinha a Aldross para casar com

Sophie.

Page 16: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Ao compreender o significado disso, Zita soltou uma exclamação de alegria.

- Sophie, você é a criatura mais feliz do mundo! Já pensou como é excitante? Papai

disse que não há no mundo nenhum monarca que se compare a ele em beleza e em

qualidades atléticas. Ele galgou o Matterhorn, em certa ocasião. E você vai ter, em

Valdastien, os cavalos mais soberbos e mais fogosos.

Ao dizer isso, lembrou-se de que a irmã não gostava de cavalos que não fossem

muito mansos.

Zita é que tinha herdado as qualidades de amazona da avó, que havia sido aclamada

por sua habilidade, assim como por sua beleza, em seu país, a Hungria.

- Não me interessam os cavalos, e sim, o povo de Valdastien - respondeu Sophie. -

Vou querer que todos me respeitem e me admirem. Sei que darei uma boa rainha, Zita.

- Tenho certeza disto, querida. Mas, muito mais importante do que ser rainha, é ser a

esposa do rei Maximiliano.

Sophie ficou em silêncio por um momento, antes de dizer:

- Não creio que mamãe aprove realmente o rei, mas é claro que deseja que eu tenha

uma posição importante. Não fosse por isso, penso que ela estaria considerando meu

casamento com o margrave de Baden-Baden.

Zita fez uma careta.

- Oh, não! Ele é tão maçante! Nunca diz uma coisa da qual a gente se lembre depois.

- Acho - O um bom homem.

Zita olhou para a irmã, pensativa.

Pelo que tinha ouvido falar, seria impossível descrever o rei como “um bom

homem”.

Não era apenas o professor de música que falava dele, como também madame

Goutier, que vinha ao palácio dar aula de francês para as duas princesas.

Era parisiense, mas casara com um cidadão de Aldross. Depois em viúva, continuou

vivendo ali, mas nunca perdeu contato com seu país de origem. Ia regularmente a Paris,

onde tinha numerosos parentes que a punham a par das últimas novidades e mexericos.

Sophie achava difícil aprender francês. Por isso, não ficava para conversar, depois da

aula, escapando assim que terminava. Zita ficava sozinha com a francesa.

- Conte as últimas novidades de Paris, madame.

Levando uma vida solitária, madame Goutier tinha muito prazer em responder.

Falava sobre o imperador e a imperatriz, sobre os vestidos que Frederick Worth

fazia, não apenas para as aristocratas, como para as mulheres do demi-monde, que tinham

jóias e trajes mais bonitos do que os das senhoras recebidas no Palácio das Tulherias.

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Por intermédio da professora, Zita ficou conhecendo um mundo que, supostamente,

ela não devia conhecer e que certamente não era comentado por princesas reais.

Ficou sabendo das loucas extravagâncias de mulheres que atraíam os homens com

sua beleza, levando-os a perder fortunas só pelo prazer de estar com elas. A moça era

inteligente e não tinha dificuldade em preencher os vazios que a professora deixava em suas

narrativas.

Como o imperador não fazia segredos de seus casos amorosos, a filha de madame

Goutier escrevia à mãe sobre as aventuras dele. Também o príncipe Napoleão exibia suas

amantes. Zita soube que o barão Haussmann, que havia reconstruído Paris, tinha sido visto

passeando, sem a menor cerimónia, com a actriz Francine Cellier.

Soube também que o rei holandês estava apaixonado por madame Mustard, tendo

gastado com ela uma quantia astronómica.

Conversando sem pensar, assim como o professor de música, madame Goutier não

fazia a mínima idéia de quanto a aluna guardava de cor, sobre tudo que lhe contava.

“Ah, se eu pudesse conhecer Paris!

Zita achava que teria que se contentar em sonhar com isso. Agora, de repente, como

um meteoro que caísse do céu, o homem mais bonito, mais audaz e certamente o mais

falado em Paris, o rei Maximiliano, seria hóspede do castelo de Aldross!

- Não posso acreditar que seja verdade! - disse novamente. - Se casar com ele,

Sophie, vai ser excitante, não apenas para você, como para mim. Prometa que me

convidará para ir passar uns tempos em Valdastien, se não quiser que eu fique desolada.

Zita falou em tom de súplica, tão grande a intensidade de seus sentimentos. Mas

Sophie respondeu devagar, com o tom inexpressivo de sempre:

- Não, Zita! Não vou convidá-la para ficar uns tempos comigo em Valdastien, nem

quero que fique muito perto de mim. Você é bonita demais!

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Capítulo 2

- Como pode ser tão injusta, mamãe? - perguntou Zita, indignada.

A grã-duquesa ficou em silêncio, como que pesando as palavras.

- Esta é a oportunidade de Sophie fazer um bom casamento e não quero que você

interfira ou estrague tudo para ela.

- Como eu poderia fazer isso?

A grã-duquesa não respondeu à pergunta. Disse, apenas:

- Não vou discutir o assunto. Você ficará no andar de cima e não tomará parte em

nenhum dos festejos preparados para o rei Maximiliano. Se me desobedecer, será mandada

para a casa de um de nossos parentes.

Zita ficou quieta. Se achava o palácio um lugar sombrio, isso nada era em

comparação com a monotonia e a depressão da casa de tios que viviam em lugares ainda

mais isolados do país.

Levantou-se e saiu da sala, fechando a porta com ruído.

A mãe suspirou. Sempre achara Zita difícil, porque se parecia com o pai, ao passo

que Sophie era quieta e obediente, exactamente como a grã-duquesa.

Zita caminhou ligeira pelo corredor, indo à procura do pai. lrrompeu no escritório,

encontrando-o sozinho. Aproximou-se e disse, zangada:

- Papai, não posso acreditar que seja com seu consentimento que me proibiram de

jantar com o rei Maximiliano ou de comparecer ao baile. Para dizer a verdade, parece que

nem mesmo lhe serei apresentada!

O grão-duque ergueu o olhar do jornal e notou o brilho encolerizado dos olhos

verdes da filha.

Com voz afectuosa e olhar bondoso, disse:

- Sinto muito, querida. Achei mesmo que você ia ficar aborrecida.

- Então o senhor sabia! - disse Zita, em tom acusador. - Oh, papai, como pôde ser

tão cruel?

O grão-duque estendeu a mão. Zita pegou-a e ajoelhou-se ao lado dele, com ar

súplice.

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- Sabe como a vida aqui tem sido monótona, ultimamente, papai. Seria bom dançar

com alguém, principalmente com o rei Maximiliano, que sempre desejei conhecer.

O pai apertou-lhe a mão.

- Infelizmente, querida, creio que a decisão de sua mãe, de não permitir que

compareça aos festejos em honra do rei, é por você ser tão bonita!

Zita fitou-o, como se não acreditasse em tais palavras. Depois disse, serenamente:

- Oh, sei que Sophie finge que tem ciúme de mim e que mamãe não aprova meu

comportamento com o senhor. Mas, francamente, o que elas sentem não deve ser

suficientemente sério para eu ficar isolada na sala de aula, como se tivesse uma moléstia

infecciosa!

O grão-duque sorriu, mas foi em voz triste que respondeu:

- Quando eu soube o que havia sido decidido, compreendi que você ficaria

aborrecida. Mas não há nada que eu possa fazer.

- Por que não?

O pai explicou, pacientemente:

- Porque é muito importante, como você deve compreender, que países pequenos

como o nosso se unam contra a cobiça da Alemanha. Se o rei Maximiliano casar com

Sophie, nossos dois países ficarão muito mais fortes do que são actualmente.

Sabia que Zita compreenderia exactamente o que ele dizia, porque muitas vezes os

dois tinham discutido os problemas políticos da Europa.

- Pensei que a Alemanha estivesse de olho na Áustria - disse ela, dali a um momento.

- Primeiro, a Áustria; depois, a Bavária e talvez nós. Em seguida... por que não?... a

França.

Zita respirou fundo.

Sabia que ele não estava falando levianamente. Era o que ela também achava, caso

Bismarck transformasse suas palavras em acções.

Encostou a face na mão do pai e disse:

- Mesmo assim, gostaria de ir ao baile oficial. Se me deixar ir, prometo não dançar

com o rei.

- Mas ele pode querer dançar com você, meu bem. E é exactamente disso que sua

mãe e Sophie têm receio.

Zita não se moveu. Ainda com a face encostada na mão do pai, pensou que era a

primeira vez que alguém na família dizia que ela era bonita.

Mas seria muito estúpida, se não tivesse percebido que se parecia muito com a

famosa avó húngara.

Page 20: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

A antiga grã-duquesa fez sucesso em toda a Europa e, pelo que Zita sempre ouviu

dizer, poderia ter feito um casamento muito mais brilhante, em vez de aceitar o pedido do

grão-duque de Aldross.

- Sua avó se apaixonou assim que viu seu avô, - disse o pai a Zita, quando ela era

pequena e admirava o retracto da avó, pendurado - na sala do trono.

- Se vovô era como o senhor, papai, então isso não me surpreende. Deve ter sido

muito bonito.

- Obrigado, querida - respondeu o grão-duque, na ocasião. - Mas estou satisfeito por

poder dizer que, embora me pareça com meu pai, herdei muitas das características de

minha linda mãe, principalmente seu amor por cavalos e sua habilidade em montar os

animais mais fogosos. E fui bastante inteligente para criar uma réplica dela em você.

Talvez pelo facto de ter amado e admirado a mãe, o grão-duque adorava Zita.

Quando ela nasceu, já tinha um filho, Henrich, e uma filha, Sophie. Embora nada dissesse,

esperava que a terceira criança fosse um menino.

Mas, assim que viu Zita, soube, de maneira inexplicável, que ela significava mais para

ele do que os outros dois filhos.

À medida que a menina crescia e se tornava cada vez mais bonita, com seus cabelos

ruivos e olhos verdes, o pai passava mais tempo na saleta das crianças.

Quando ela estava com oito anos, o pai a levou numa de suas viagens, apesar dos

protestos da grã-duquesa. Ele ia sempre para as montanhas, o que enfurecia a esposa.

- Quero conhecer meu povo. A melhor maneira de fazer isso é viver um pouco no

meio dele - disse o grão-duque, com firmeza.

Usando calça curta de couro, jaqueta verde e chapéu tirolês, o que era quase um

uniforme entre o povo de Aldross, tanto quanto entre os bávaros, o grão-duque costumava

fazer essas viagens sozinho.

Hospedava-se em estalagens pequenas, tomava o vinho da localidade, cantava com

seus súbditos as canções regionais que, de certo modo, expressavam melhor do que

palavras o que sentiam.

O povo de Aldross o adorava, achando que ele compreendia seus problemas.

O facto de o grão-duque ter outro motivo para fazer essas excursões ocasionais às

montanhas fazia com que seus súbditos lhe sorrissem e dissessem, uns para os outros: “Ele

é um homem de verdade”.

Page 21: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Para Zita, viajar sozinha com o pai era a coisa mais excitante do mundo, O grão-

duque tomava conta dela, sem repreendê-la, sem lhe dar ordens o tempo todo, como

acontecia com as babás, com as governantas e, naturalmente, com sua mãe.

Ela e o pai iam a cavalo até a metade do caminho, na subida para uma montanha.

Apeavam e depois seguiam a pé, atravessando os pinheirais e indo até os rochedos nus,

enquanto as pernas da menina aguentassem.

Embora procurasse não se queixar, às vezes Zita tinha que confessar que estava

cansada. Aí, então, procuravam um lago. e o grão-Duque sugeria que ela nadasse, até sentir-

se revigorada com a água fria.

Depois da primeira viagem com o pai, Zita aprendeu a nadar e acabou sabendo nadar

como um peixe.

Mas era uma aptidão que ela jamais mencionava no palácio, pois a mãe não aprovaria

que nadasse nua, mesmo não havendo ninguém por perto, a não ser o pai.

Todos os anos, Zita e o grão-duque iam juntos a algum lugar. Nada do que a grã-

duquesa pudesse dizer ou fazer os impedia de escapulir por uma semana ou dez dias.

Voltavam queimados de sol, cheios de saúde e de bom humor, mas pouco diziam

sobre o lugar para onde tinham ido ou sobre o que haviam feito.

Quando Zita estava com quinze anos, a grã-duquesa a proibiu de fazer essas

excursões. Por mais que suplicasse ao pai, não conseguiu convencê-lo a levá-la.

Não compreendia o motivo dessa proibição repentina, a respeito de uma coisa que a

tornava tão feliz e que também dava prazer ao pai.

Só quando começou a ouvir falar dos homens que gastavam tanto dinheiro, em Paris,

com as mulheres bonitas do derni-monde, foi que Zita teve a vaga idéia do que o grão-duque

fazia, quando dava essas fugidinhas sozinho.

Então, palavras semi-esquecidas lhe voltavam à memória, palavras que no passado

não tinham sentido para ela.

- Não quero saber de ver uma filha minha se associando com essas mulheres! - disse,

certa vez, calando-se subitamente, ao perceber que a menina entrava no quarto.

Em outra ocasião, ouviu a grã-duquesa perguntar, furiosa:

- Que espécie de reputação você acha que tem, andando com essas mulheres que

encontra em...

Também dessa vez, a frase não foi terminada. Gradualmente, voltaram outras

recordações que fizeram com que Zita compreendesse por que motivo agora era deixada

em casa.

Page 22: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Certa vez, estava dormindo numa estalagem, num quarto pequeno e de tecto baixo,

com uma vista linda das montanhas ao longe. O luar, entrando pela janela, bateu em seu

rosto e Zita despertou de um sono profundo.

Ela e o pai tinham caminhado o dia inteiro, nadado num lago frio e depois ido para a

estalagem encantadora no alto da montanha. Quando lá chegaram, uma moça loira, de pele

rosada e olhos azuis como miosótis, correu para eles, com uma exclamação de alegria.

- Você voltou! - disse, ao grão-duque. - Pensei que nunca mais o veria.

Ele sorriu, passou a mão no rosto da moça e respondeu:

- Sempre cumpro minhas promessas. Névia. Desta vez, trouxe minha filha para

conhecer a mulher mais bonita de Aldross!

O jantar foi delicioso, e Zita teve licença de tomar um pouquinho do vinho do

distrito.

Depois, não podendo mais ficar em pé, foi para a cama e pegou no sono assim que

se deitou.

Ao acordar por causa do luar em seu rosto, achou que era muito feliz. Estava quase

adormecendo novamente, quando ouviu uma risadinha suave e depois a voz do pai, grave e

profunda, como nunca tinha ouvido antes.

Pareceu-lhe estranho, mas Zita estava com muito sono para se preocupar com isso e

no dia seguinte já se esquecera.

Mais tarde, quando se lembrava deste episódio, achava que combinava com a cólera

que a mãe sentia quando o marido partia numa de suas viagens. Embora Zita não tivesse

mais permissão para acompanhá-lo, ele continuava a fazer essas excursões sozinho,

despertando a ira da esposa.

Lentamente, a garota começou a ver os pais sob um novo ângulo. Compreendeu que

o casamento deles tinha sido arranjado e que, para Aldross, fora uma vantagem o grão-

duque casar com uma moça da família real britânica, pois o país poderia contar com um

certo apoio da Inglaterra, caso isso se tornasse necessário.

A grã-duquesa, de aparência muito inglesa, era severa e tímida. E, à medida que

envelhecia, tornava-se mais fria e pouco emotiva, muito diferente do povo alegre e

extrovertido de Aldross.

Ali, todos riam, porque eram felizes, e cantavam enquanto trabalhavam. Ao

anoitecer, as vozes dos trabalhadores, voltando para casa, ecoavam pelos campos como

sinos, parecendo subir até os morros de cumes brancos de neve, como que levadas por

asas.

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Só naquele ano, quando tinha quase dezoito anos, Zita percebeu que a mãe amava o

grão-duque, não porque era sua esposa, e sim, como mulher.

Levou um choque, ao compreender, quase como se o pai lhe tivesse dito isso, que,

embora ele tratasse a mulher com respeito e consideração, não estava apaixonado por ela.

“Pobre mamãe!”

Decidiu que, quando chegasse a ocasião, se recusaria a casar com um homem a quem

não amasse e que não a amasse, por mais importante que ele fosse.

O grão-duque, tão bonito e tão atraente para as mulheres, devia sentir-se realmente

frustrado, O país sobre o qual reinava era pequeno; o casamento o impedia de perambular

pelo mundo, como gostaria de fazer.

Muitas vezes tinha falado a Zita de suas viagens quando moço, tendo ido ao Egipto,

à Rússia e, embora se mostrasse reservado a esse respeito, a Paris.

Quando Zita o interrogava sobre o que havia feito em Paris, o pai falava de Roma;

quando ela, astutamente, tentava fazê-lo falar dos quadros do Palácio das Tulherias, o grão-

duque falava dos que tinha visto em Florença e em Madrid.

Pouco a pouco, à medida que o professor de música e madame Goutier faziam com

que Paris criasse vida para ela, como uma cidade cheia de encantos e de mulheres bonitas,

Zita começou a compreender por que o pai ia para lá, em solteiro.

Depois de casado, a única maneira de escapar e ser livre por alguns dias era ir para as

montanhas.

Amava seu país e amava seu povo, mas, quando os olhares das mulheres se

iluminavam, ao vê-lo, e elas lhe estendiam os braços, não era homem de lhes dar as costas.

Zita também tinha pena do pai. E de si mesma, porque não lhe permitiam mais

acompanhá-lo. Agora, era obrigada a ficar no palácio, com a mãe.

Nessas ocasiões, a grã-duquesa se mostrava mais exigente do que de costume e toda

a corte parecia envolta numa névoa sombria, até o grão-duque voltar.

Como se seguisse os pensamentos de Zita e soubesse que sua caçula estava tão

frustrada como ele, o pai disse:

- Escute aqui, meu bem. Vou concordar com sua mãe, que não quer que você

apareça nos festejos em honra do rei, mas com uma condição: depois que ele for embora,

você e eu faremos uma excursão pelas montanhas.

Zita ergueu para ele os olhos, onde agora havia um brilho de entusiasmo.

- É verdade, papai? Seria maravilhoso. Não sabe como senti falta de nossos passeios.

- Também Senti falta, querida. Mas sua mãe diz que você não é mais criança para me

acompanhar, e reconheço que tem razão.

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- Mas, desta vez, ela vai ter que concordar. Prometa que cumprirá sua promessa, que

não deixará que mamãe o faça mudar de idéia!

- Prometo. Quero escalar a montanha num ponto aonde não vou há, no mínimo, dez

anos. Será muito emocionante mostrá-lo a você.

- Vou adorar, papai. E ficaremos bastante tempo, não é? Porque será maravilhoso ter

o senhor só para mim.

O grão-duque inclinou-se e beijou-a.

- Eu a amo, Zita, e quero que tenha tudo na vida para ser feliz. Mas nem sempre as

coisas são fáceis para mim. Você sabe disso.

- Sim, eu sei, papai. E esperemos que o rei case com Sophie, para que o senhor não

se preocupe mais com ela nem tenha receio de que Aldross seja engolido por aquele

monstro, Bismarck.

O grão-duque riu.

- Amém! E agora, querida, não faça mais barulho sobre o que acontecer até o rei ir

embora. A vida fica muito mais fácil para mim quando sua mãe está de bom humor.

- Vou procurar não aborrecer mamãe. Parece que eu sempre a perturbo, embora não

atine com o motivo disso!

O grão-duque poderia ter respondido com uma única palavra: ciúme. Mas sabia que

seria deslealdade dizer isso e calou-se.

Depois que Zita o beijou e saiu, ele ficou durante muito tempo pensando nela.

Devido à vida calma que levava no palácio, e sendo sempre repreendida pela mãe,

Zita não tinha idéia do quanto era bonita nem de que os homens iriam achá-la fascinante.

Lembrava-se dos olhares que, quando ele era menino, os homens lançavam à sua

mãe; homens de todas as idades, de todas as classes. E, agora, tinha a impressão de ver esse

mesmo tipo de olhar nos cortesãos, quando Zita aparecia.

Tinha certeza de que, se o rei Maximiliano estava mesmo querendo uma esposa, iria

preferir Zita a Sophie.

Mas era mais do que justo que a mais velha casasse antes. Como Sophie estava com

vinte anos, já era tempo de arranjar um marido.

O problema era que, com exceção do margrave de Baden-Baden, muito poucos

rapazes de sangue real vinham a Aldross ou eram convidados para visitar seus países.

A grã-duquesa já havia dito, desesperada, que Sophie ia ficar solteirona, se ela não

tomasse uma providência urgente.

- Que posso eu fazer? - perguntou o grão-duque. - Não posso fazer com que reis ou

príncipes disponíveis surjam como coelhos tirados da cartola de um mágico. E você sabe

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tão bem quanto eu que, com excepção de Valdastien, os países vizinhos são governados

por monarcas casados, com filhos ainda pequenos.

- Não adianta pensarmos no rei Maximiliano - comentou a duquesa, secamente. - Ele

perde seu tempo com o tipo de mulher que você acha atraente e de quem não se fala na

sala de visitas de uma dama!

- Ouvi dizer que a mulher que está agora com ele tem um corpo escultural! -

observou o grão-duque.

Imediatamente, percebeu que cometera um erro, pois a esposa ergueu o queixo e saiu

da sala, sem nem mais uma palavra.

Isso significava, como ele bem sabia, que ela ia ficar emburrada durante as próximas

vinte e quatro horas e que a atmosfera, às refeições, se tornaria insuportável.

Pegou o jornal que tinha largado quando Zita entrara e disse a si mesmo:

“Pobre Maximiliano! Depois de casado, vai ver que as mulheres que o divertiram no

passado, assim como La Belle, estarão em Paris e ele estará preso em Valdastien, para o

bem ou para o mal, até que a morte os separe”.

Embora Zita procurasse não aborrecer a mãe, como havia prometido ao pai, achou

intolerável ver a excitação dos preparativos no palácio e saber que não tomaria parte dos

festejos em homenagem ao rei.

Sophie precisava de vestidos novos, e as costureiras iam e vinham. As capas foram

tiradas da mobília do salão de baile, e o chão, encerado. As paredes brancas e douradas

foram limpas, ficando brilhantes como se tivessem sido pintadas na véspera.

Trouxeram flores das estufas, que foram arranjadas em vasos. Eram em tão grande

profusão, que o salão e toda a casa pareceram um jardim.

- Não compreendo, papai, por que nossa casa não pode ficar sempre assim bonita -

observou Zita, ao almoço. - seria melhor do que fazer isso apenas para um visitante de

passagem, que provavelmente não vai apreciar essa decoração tanto quanto nós.

- Você não deixa de ter razão, querida.

O grão-duque gostava de discutir com a filha caçula; achava estimulante tanto para

ele quanto para ela. às vezes, tomavam posições opostas, só por graça, e isso era uma coisa

que a grã-duquesa não compreendia.

- Por outro lado, se o incomum se tornasse comum e corriqueiro, você não o

apreciaria tanto - continuou o pai.

Os olhos de Zita brilharam. Ia responder, quando a mãe interferiu:

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- Basta de suas idéias ridículas, Zita. E procure não aborrecer seu pai com perguntas

tolas. Temos muito que fazer, antes que Sua Majestade chegue, amanhã.

- A que horas ele deve chegar, mamãe? - perguntou Sophie. Como a pergunta foi

feita pela filha predilecta, a grã-duquesa respondeu, de boa vontade:

- Você vai encontrar o programa dos festejos em minha escrivaninha. O rei já deve

ter saído, para a primeira parte da viagem. Passará a noite em casa de um amigo, não muito

longe de nossa fronteira.

- E quando vou vê-lo? - perguntou Sophie, ansiosa.

- Seu pai vai encontrá-lo na estalagem Golden Cross, amanhã, às onze da manhã, e o

trará para cá, com uma escolta de cavalaria.

- E onde estaremos nós?

- Estaremos aqui, esperando. Você deve usar aquele bonito vestido cor-de-rosa.

Tenho certeza de que o rei a achará parecida com uma rosa.

Como Sophie tinha cabelos castanhos opacos e uma expressão emburrada, era difícil

compará-la a uma flor.

Zita conteve o desejo de rir da comparação da mãe, poética e pouco costumeira.

Nisso, seu olhar encontrou o do pai.

Achando que ajudaria a irmã, aconselhou:

- Diga à cabeleireira para lhe fazer um penteado mais leve. Se ela fizer uns cachos em

volta do rosto, em vez de puxar os cabelos para trás, você vai ficar mais bonita e, como diz

mamãe, parecendo uma flor.

- Não estou pedindo sua opinião, Zita - interrompeu a grã-duquesa, secamente.

Levantou-se e estendeu a mão para a filha mais velha. - Venha, Sophie. Temos uma porção

de coisas para fazer e não quero que você ouça a opinião de ninguém, a não ser a minha.

As duas saíram. Zita suspirou e olhou para o pai. Nada disseram. Cada qual sabia o

que o outro pensava. O grão-duque colocou a mão sobre a da filha.

- Pense como vamos nos divertir nas montanhas - disse, meigamente.

Em seu quarto, o único lugar onde não sentia irritação com os preparativos, Zita foi

para a janela, imaginando se poderia ver o pai, de relance, enquanto ele estivesse no palácio.

Mas a mãe lhe havia dito inúmeras vezes que ela devia ficar no andar de cima, na sala

de estudos, que antes tinha sido o quarto das crianças e, mais tarde, a saleta das duas

princesas.

O quarto havia sido redecorado, mas, para Zita, parecia que ali ainda estava a casa de

boneca que tinha pertencido a ela e a Sophie, assim como o cavalo de balanço de Henrich,

a fortaleza de brinquedo dele, na qual as irmãs não tinham licença de tocar, e também as

Page 27: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

numerosas bonecas que o irmão costumava esconder, para aborrecê-las. Quando ele estava

de mau humor, podia até quebrar uma delas!

“Creio que, quando sairmos daqui e formos viver em nosso próprio palácio, nós

sentiremos adultas”, disse Zita a si mesma.

Ficou imaginando se Sophie seria feliz em Valdastien, com o fantasma de La Belle e

de tantas outras mulheres. Depois, achou que não era Sophie que ia ver esses fantasmas

(porque provavelmente nem saberia de sua existência), e sim, o rei.

Será que ele se sentiria frustrado, como seu pai, e teria que recorrer ao consolo de

galgar suas montanhas e desaparecer em suas florestas, em vez de ir divertir-se em Paris,

como provavelmente fazia agora?

Era difícil imaginar seus pensamentos e sentimentos, pois só o conhecia pelas

histórias contadas pelo professor de música e por madame Goutier, assim como pelos

retractos de revistas e de jornais. E estava certa de que esses não lhe faziam justiça.

Foi então que resolveu ver o rei.

“Mesmo que eu tenha que ficar na beira da estrada, quando ele passar, vou vê-lo!”

De repente, lhe ocorreu uma idéia que ela sabia ser uma afronta às convenções, mas

que não deixava de ser muito excitante.

Ninguém deu muita atenção a Zita, na noite anterior à chegada do rei. Se tivessem

dado, veriam que ela estava silenciosa e imersa em pensamentos.

Ao mesmo tempo, havia em seu olhar um brilho que o grão-duque poderia ter

reconhecido como o mesmo que aparecia nos olhos de sua mãe, quando ela planeava

alguma travessura.

A princesa Ilena, como era chamada antes do casamento, tinha escandalizado as

senhoras idosas da corte do pai, mas o povo a admirava por sua coragem tanto quanto por

sua beleza.

O que Zita pretendia fazer agora era uma coisa que a avó teria tido coragem de fazer,

pois era valente e indomável.

Para grande alívio da grã-duquesa, a moça foi se deitar cedo, dizendo que estava com

uma ligeira dor de cabeça.

Lá em cima, quando ninguém podia vê-la, tirou do armário seu traje de montaria.

Arrumou também uma trouxa de roupas que levaria do mesmo jeito que fazia quando saía

só com o pai, isto é, presa na sela do cavalo.

Excitada demais para dormir, Zita apenas cochilou. Quando acordava, olhava para o

céu, através da janela aberta.

Page 28: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Assim que as estrelas começaram a se apagar e surgiram os primeiros sinais da

madrugada, ela se levantou e se vestiu apressadamente. Levando a trouxa, desceu por uma

escada de serviço, que dava para o caminho das cocheiras.

Andava silenciosamente e não foi vista pelas duas sentinelas sonolentas que

guardavam as portas mais importantes da casa. Sabia que, a essa hora da madrugada, não

haveria ninguém ali. Foi até o depósito dos arreios e pegou sua sela. Em seguida, dirigiu-se

para a baia de seu cavalo favorito.

Assobiou de mansinho. Pegasus se aproximou dela, satisfeito. Zita colocou-lhe o

arreio e passou a rédea pelo pescoço do animal.

Se havia uma coisa que aprendera em suas viagens com o pai, era confiar em seu

cavalo e ser auto- suficiente.

- Como é que você pode dar conta de seu cavalo, sem um cavalariço? - Sophie lhe

perguntara, um dia, com desprezo.

Mas Zita achava muito mais excitante estar a sós com o pai, nessas viagens, do que

serem acompanhados por criados, que, não só atrapalhariam seus momentos de intimidade,

como criticariam o desconforto a que todos se veriam expostos.

Apertou a barrigueira do cavalo, que ficou quieto. Depois, como não havia ninguém

para ajudá-la a montar, Zita pareceu voar para a sela.

Seguindo cautelosamente por entre as árvores, até saírem do jardim do palácio, Zita

pôs o cavalo a galope no campo, evitando casas e estradas.

Andaram sobre uma grama alta e luxuriante, cheia de flores de vários tons de rosa,

lilás e vermelho, que se tornavam mais vivos à medida que o dia clareava e os primeiros

raios de sol douravam os picos das montanhas, cobertos de neve.

A estalagem Golden Cross, para onde Zita se dirigia, não ficava longe. Quando a

moça chegou, ainda era muito cedo. No pátio havia apenas um cavalariço sonolento. Como

a jovem parecia conhecer o caminho, ele não lhe deu atenção. Zita levou Pegasus para uma

baia e pegou sua trouxa.

Entrou na estalagem por uma porta lateral, que felizmente estava aberta, e subiu uma

escada estreita que levava aos fundos da hospedaria, onde ficavam os aposentos do

proprietário.

Seguiu por um corredor não atapetado. Bateu de leve na última porta e, não ouvindo

resposta, virou o trinco.

Viu dentro do quarto uma jovem sentada na cama, de camisola, esfregando os olhos,

de sono.

Zita entrou.

Page 29: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

- Bom dia, Gretel!

A moça fitou-a, atónita.

- Princesa! O que está fazendo aqui?

Zita fechou a porta e pôs o dedo nos lábios.

- Silêncio! Nesse momento, não sou princesa, e sim, sua amiga da cidade que veio

visitá-la.

Gretel era uma moça bonita, gorduchinha, um pouco mais velha do que Zita, com

olhos azuis e faces rosadas.

- Pensei que nunca mais a veria! Achei que seu pai viria aqui, mas não esperava vê-la.

- Não me dão mais licença para vir. - Zita sentou-se na beira da cama e continuou: -

Escute. Gretel, preciso da sua ajuda.

- Farei o que me pedir. Como cresceu! às vezes a vejo de longe quando passa pelas

ruas, mas de perto é ainda mais bonita.

- Obrigada, Gretel. Mas, justamente porque sou bonita, não tenho licença para

conhecer o rei, quando ele for ao palácio, hoje.

- Não tem licença? Por quê?

- Meus pais estão com a esperança de que ele case com minha irmã.

Gretel riu.

- Não precisa dizer mais nada. Você é muito mais bonita do que sua irmã, como bem

sabe.

Quando Zita saía com o pai, estava subentendido que viajavam “incógnitos”, e todos

se dirigiam a eles como se fossem iguais, tratando-os sem cerimónia. às vezes, o grão-duque

até fingia para si mesmo que os súbditos não o reconheciam.

Claro que sabiam quem ele era, porque era bonito, amado e admirado demais para

que não o reconhecessem.

Mas, como gostava desse mistério, era apenas mein Herr, e a filha, apenas Zita, uma

menina bonita em que os homens davam afectuosos tapinhas na cabeça e para quem

faziam brinquedos de madeira entalhada.

- O que deseja que eu faça? - perguntou Gretel.

- Li o programa preparado para o rei e sei que ele vem passar uma hora aqui.

- É verdade. Temos um quarto pronto para ele.

- Calculei que deve vir para cá a cavalo, com roupas comuns - continuou Zita. - Mas,

como depois vai seguir com papai numa carruagem aberta, terá que vestir o uniforme.

- Não estou sabendo dos detalhes. Só nos disseram que preparássemos o melhor

quarto para ele.

Page 30: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

- É aquele onde papai sempre fica?

Gretel fez que sim.

- Depois que o rei subir sozinho, quero que você lhe ofereça um café, ou um copo de

vinho - disse Zita. - Mas eu é que vou levar a bandeja para ele.

Gretel olhou-a, atónita.

- Por que quer fazer isso?

- Porque é a única oportunidade que terei de vê-lo direito. Oh, Gretel, precisa me

ajudar! Desejo tanto vê-lo! Seria muito triste se o rei fosse embora sem que eu visse outra

coisa a não ser o alto de sua cabeça, da janela de meu quarto.

- Se ele estiver usando um capacete com plumas, você não vai ver nem mesmo isso -

observou a outra, sorrindo.

- Creio que não, mesmo. Entende por que preciso que me ajude? Trouxe comigo um

vestido como aquele que eu usava quando ia excursionar com papai. Na realidade, não é o

mesmo, porque não entro mais nele, mas consegui convencer uma das criadas a comprar

um novo para mim, na cidade, sem que mamãe soubesse. E escute aqui, Gretel, acho que

logo viremos visitá-la, porque papai prometeu me levar para as montanhas, assim que o rei

partir.

- Que bom! Vocês precisam mesmo vir. Sabem como gostamos, quando aparecem!

- Era tão divertido! Você deve estar lembrada de que eu dançava para seus

convidados. Depois, eles não só me aplaudiam, como me atiravam flores!

- Achavam que você era maravilhosa! - disse Gretel. - E eu também.

- Eu devia ter nove anos, naquela época.

A garota riu.

- Lembro-me de que, certa noite, um homem que não sabia quem você era tentou

beijá-la, e você despejou cerveja na cabeça dele! Todo o mundo riu e zombou do infeliz,

que foi embora feito uma bala!

- Felizmente, papai não estava, no momento, e não viu o que aconteceu. Do

contrário, não teria permitido que eu falasse com tanta liberdade com desconhecidos, como

eu fazia.

- O mal é que você sempre foi muito bonita.

- Sim, é esse o mal. E o mesmo está acontecendo agora. Nunca o rei, a não ser que

você me ajude.

- E se ele souber quem é você?

- Por que haveria de saber? Garanto-lhe que, lá em casa, não vão mencionar que

existo, com receio de que ele peça para me conhecer. Sophie quer o rei para ela, e vai tê-lo,

Page 31: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

mas eu só quero dar uma espiadinha nele, antes que esteja com papai, com todo mundo

aplaudindo-o, menos eu. - Zita reflectiu por um minuto. - Não vejo mal nisso. E ninguém,

na estalagem, saberá que vim aqui, a não ser você.

- Quem a viu entrar?

- Apenas um cavalariço. Não o conheço nem de vista. E ele não me deu a mínima

atenção.

- Deve ser Carl. Levanta-se muito cedo e é um tanto estúpido.

- Se alguém perguntar de quem é o cavalo que está na cocheira, diga que uma sua

amiga veio visitá-la, Gretel. Mas não creio que façam perguntas.

- Não, claro que não. Vamos ver seu vestido. E é melhor que eu também me vista,

ou vai haver encrenca.

Zita abriu a trouxa, enquanto Gretel se vestia depressa, usando um traje semelhante

ao que a princesa tinha trazido. Era o traje nacional de Aldross, quase idêntico aos dos

outros países daquela parte da Europa.

Tinha uma saia rodada vermelha, sobre várias saias muito engomadas, uma blusa

branca com bonitos bordados, um corpete de veludo preto, amarrado na frente, e uma

faixa de seda.

Só o que faltava ao traje de Zita era o avental branco que Gretel usava, quando

trabalhava.

- Não pude pedir à criada que comprasse um avental. Ela poderia estranhar.

- Garanto que sim - respondeu Gretel. - Não iria esperar que uma princesa real

andasse de um lado para outro servindo café ou vinho!

Dito isso, foi até uma cómoda e tirou da gaveta um avental igual ao seu, só que com

renda na beirada.

- É meu melhor avental. Pretendia usá-lo para servir o rei, mas sua necessidade, Zita,

é maior do que a minha.

- Obrigada, Gretel. E qualquer gorjeta que ele me der será sua.

A outra riu.

- Não espero grandes gorjetas. Descobri que os personagens importantes que vêm

aqui acham que sua presença já é bastante para aqueles que os servem.

- Pois bem, quando conhecermos o rei, vamos descobrir se ele é generoso, avarento,

amável ou seco. Aproximar-se dele como criada é muito diferente do que se eu o

encontrasse em igualdade de condições.

- Vai se ver em apuros, se for descoberta - comentou Gretel. - E eu também.

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- Você pode pôr toda a culpa em mim. Mas, se formos inteligentes, não há razão para

que descubram coisa alguma. E eu terei visto Sua Majestade, o rei Maximiliano. o que creio,

será muito revelador!

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Capítulo 3

Depois de vestida, Gretel desceu e foi buscar para Zita um café e croissants quentes,

recém-saídos do forno.

- Está tudo certo, princesa. Ninguém vai aborrecê-la. Estão todos muito excitados

com os preparativos para receber o rei.

Levou Zita para um quarto, no outro lado do corredor, de onde ela poderia ver a

comitiva real chegar.

A estalagem Golden Cross estava situada, pelo que dizia o proprietário, exactamente

na fronteira.

- Estou montado em duas nações - ele costumava comentar. Um dos motivos de a

estalagem ser procurada por cidadãos tanto e Aldross como de Valdastien era estar situada

ao pé de uma das montanhas mais altas e mais conhecidas de Aldross.

Por isso também, o grão-duque parava ali frequentemente, quando ia fazer suas

escaladas.

Era um lugar alegre, onde todos pareciam rir e cantar. E a comida, sem dúvida,

melhor do que a da maioria das estalagens do mesmo tipo.

Depois de tomar o café, Zita tirou o traje de montaria e vestiu o traje nacional, que

lhe ficava muito bem.

Felizmente, a criada do palácio que o comprara tinha trazido exactamente o que a

moça queria e estava pronta a guardar segredo.

- Quando acabarem as festividades, Maria, vou fazer uma excursão com papai nas

montanhas - explicara então Zita. - Você sabe que ele não gosta de que sejamos

reconhecidos, de modo que preciso ir vestida de camponesa.

Maria riu.

- É a última coisa que poderia parecer. Alteza. E todos reconhecem o grão-duque,

embora finjam que não.

- Sei disso. Mas só o que me interessa, no momento, é ficar com ele, longe daqui,

onde sou repreendida sempre que abro a boca.

- É uma pena que Vossa Alteza não tenha licença para ir ao baile. Todos, aqui no

palácio, dizem que seria a moça mais linda da festa. é um absurdo ter que perder tudo!

Page 34: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Zita concordou, com um suspiro.

- Pelo menos, se a princesa Sophie casar com o rei, teremos um casamento real, e

será muito excitante!

Ao dizer isso, notou a expressão de Maria e pensou que a empregada achava pouco

provável que tal acontecesse.

Sabendo que não devia discutir as esperanças da irmã com uma criada, Zita mudou

logo de assunto.

Agora, já pronta, olhou-se no espelho do quarto de Gretel e penteou os cabelos no

estilo das camponesas, com fitas caindo-lhe até os ombros.

Tinha tido o cuidado de encomendar fitas verdes, amarelas e azuis, para combinarem

com a cor de seus cabelos. Depois que o arranjo ficou pronto, Zita achou que estava muito

bonito.

Agora, lá embaixo, havia barulho e movimento, o que indicava que todo mundo

cuidava dos últimos preparativos para a recepção ao rei.

Zita tinha lido, no programa que estava na escrivaninha da mãe, que os dois

governantes deveriam se encontrar a sós dentro da estalagem.

Depois de trocarem os cumprimentos e tomarem um copo de vinho, a comitiva do

rei Maximiliano voltaria para casa e os dois governantes seguiriam numa carruagem aberta

para a capital, por um caminho todo decorado.

O rei seria recebido pelo primeiro-ministro e pelos membros do gabinete, e depois,

pelo prefeito e pelos vereadores, iria então para o palácio, onde a grã-duquesa e Sophie

estariam à espera.

Reflectindo sobre o protocolo, Zita pensou que o rei, sem dúvida, ia achar tudo

muito maçante.

“Garanto que já fez isso milhares de vezes. E, com certeza, preferiria estar passeando

no Bois de Boulogne, com uma bela mulher a seu lado na carruagem, sabendo que á noite

iria encontrá-la em tête-à-tête. Ou, talvez, a levaria a um dos restaurantes elegantes de Paris,

ou a um café-concerto.”

Eram esses os divertimentos que o professor de música e madame Goutier lhe

haviam descrito.

Como estava ficando tarde, Zita saiu do quarto de Gretel e foi para o aposento

desocupado, cuja janela dava para o lado de Valdastien.

O país do rei não era muito diferente de Aldross: tinha também montanhas altas,

com os picos cobertos de neve, e um vale onde os cavalos podiam galopar livremente na

grama verde e florida.

Page 35: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

A grande diferença era que Valdastien era cortado por um rio largo, que não apenas

tornava a terra fértil, como permitia que por ele navegassem barcaças, levando mercadorias

directamente para um porto marítimo.

Isso fazia o país muito mais próspero do que seus vizinhos, o que causava uma certa

inveja.

Não havia dúvida de que seria vantajoso, para Aldross. se houvesse uma união entre

os dois países. E Zita sabia que, se Sophie casasse com o rei, Aldross ficaria muito mais

forte, em relação à Alemanha.

Levou uma cadeira dura para perto da janela, sentou-se e apoiou os cotovelos no

peitoril. Ficou olhando para a estrada estreita e poeirenta que descia para o vale, por onde o

rei viria.

Considerou que, a essa altura, a criada que a chamava de manhã, no palácio, devia ter

dado por sua falta. Talvez tivesse sido mais prudente ter contado a verdade a Maria. Mas,

assim que também desse pela falta de seu traje de montaria e de suas botas, certamente

deduziria que a patroa tinha saído a cavalo.

A dama de honra das duas irmãs, a baronesa Nekszath, estaria muito ocupada,

enfeitando-se para a chegada do rei, e não se preocuparia com a ausência de Zita.

“Quando eu voltar para casa, vou dizer apenas que saí para galopar. Ninguém me

pode culpar por fazer uma coisa de que gosto, quando me excluíram de todos os festejos.”

Pensou de novo, com certo ressentimento, na maneira como estava sendo tratada.

Nesse momento, viu uma nuvem de pó ao longe, e seu coração pulou de alegria e de

excitação.

Durante algum tempo, foi difícil ver com clareza.

Depois compreendeu que não havia apenas uma carruagem, mas várias. Quando a

comitiva chegou mais perto, Zita viu, como esperava, que o rei cavalgava na frente.

Atrás vinham as carruagens com os dignitários de Valdastien, que se despediriam na

fronteira. Mais atrás, a bagagem, os criados e os lacaios de Sua Majestade.

Vendo tantas malas, Zita pensou que era muito mais agradável viajar como o pai e ela

iam fazer depois que tudo terminasse. O que os dois levavam cabia em duas trouxas,

amarradas em suas selas, além de mais alguns pequenos objectos nos alforjes.

“Estaremos livres! Livres de todo aquele protocolo e de Sim, Majestade e Não,

alteza.”

A comitiva estava próxima, e agora Zita via bem o rei.

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Era uma figura imponente e dominadora, embora usasse um traje de montaria

simples, que não o diferenciava dos companheiros. A moça achou que, mesmo que

estivesse no meio de uma multidão, ela saberia que ele era um homem importante.

O cavalo vinha a passo vivo. Só quando avistou a estalagem e o grupo preparado

para recebê-lo, foi que o rei se virou para um dos companheiros e diminuiu a marcha.

Zita não podia ver a porta principal da estalagem, pois esta havia sido construída bem

na fronteira, de modo que uma parte ficava num e a Outra parte no outro.

Assim, o rei desapareceu de vista. antes que ela pudesse examiná-lo bem. .

Zita ficou observando a nuvem de poeira por um ou dois minutos. Depois, excitada,

seguiu as instruções de Gretel e se dirigiu para a frente da casa, ao longo do corredor.

Sabia para que quarto o rei seria levado. Ao lado havia um aposento menor,

geralmente ocupado por um criado ou por um viajante que não pudesse gastar muito.

Agora, estava vazio.

Zita foi para lá, deixando a porta aberta, para poder ouvir as vozes lá embaixo. à

medida que o barulho aumentava, ficou sabendo que o rei estava sendo levado pelo

estalajadeiro para dentro da casa.

Devia estar tomando uma bebida com seus acompanhantes, antes que estes o

deixassem, porque ouviu o tilintar de copos e o ruído de rolhas que saltavam. Brindes, com

certeza, desejando-lhe felicidade na viagem.

Zita já tinha feito uma lista dos outros países aonde ele poderia ir, em busca de

esposa, caso Sophie não correspondesse à sua expectativa. Não havia dúvida de que seria

vantajoso, para Maximiliano, casar com uma moça de um reino vizinho, de modo que

poderia visitar a Bósnia, a Sérvia, a Bulgária e talvez até a Roménia. embora este país fosse

muito mais distante de Valdastien.

A Hungria era outra possibilidade. Zita tinha certeza de que lá ele poderia encontrar

uma princesa que, no mínimo, apreciaria os cavalos de Valdastien.

Quando perguntou ao pai se havia moças casadouras nesses países, o grão-duque se

mostrou um tanto vago.

- Francamente, não sei, querida. Só sei que há poucos países com rapazes solteiros

adequados para você e sua irmã.

- Isso torna ainda mais importante Sophie conquistar o rei - observou Zita. - Pelo

menos, é um bom partido e, pelo que ouvi dizer, um homem muito atraente.

O grão-duque ficou em silêncio durante alguns momentos.

- Os homens atraentes nem sempre dão bons maridos.

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Zita ia fazer-lhe um elogio, mas depois achou que, se fosse sincera, devia reconhecer

que o pai, embora se mostrasse um marido atencioso, tinha fracassado aos olhos da esposa,

porque nunca lhe dera seu coração.

“Mas isso é uma coisa que ninguém pode dar, sem amor. E o coração não obedece a

ordens de ninguém, nem mesmo quando se trata do coração de um rei ou de uma rainha.”

Zita riu de sua imaginação.

Como se compreendesse que estavam em terreno perigoso, o pai tinha mudado de

assunto.

Agora, ali na estalagem, Zita percebeu que alguém subia a escada de madeira sem

passadeira. Fechou a porta, deixando apenas uma fresta para poder espiar.

Viu aparecer um criado, seguido por um carregador que trazia uma maleta.

- Vou tirar o uniforme de Sua Majestade da maleta - disse o criado, entrando no

quarto reservado para o rei. - Depois que eu tiver guardado as roupas que ele está usando

agora, você as pode levar de volta para a carruagem que seguirá Sua Majestade à capital.

Ouviu-se o ruído da mala sendo colocada no chão, e dos trincos que se abriam. Zita

ficou imaginando o uniforme do rei sendo tirado da mala e colocado na cama.

O carregador desceu; agora, no quarto, só estava o criado.

Foi então que, pela primeira vez, ocorreu a Zita que não ia ver o rei a sós. Tinha se

esquecido de que ele não se vestiria sozinho. Teve receio de que o criado pegasse a bandeja

de café, quando ela a trouxesse, não permitindo que entrasse no quarto.

Estava imaginando o que faria, se tal acontecesse, quando ouviu na escada o som de

passos muito mais leves, mas firmes, e teve certeza de que era o rei.

Viu de relance seus ombros largos, ao entrar no quarto. Quando a porta se fechava,

Gretel apareceu no alto da escada.

- Majestade!

Maximiliano parou e olhou para ela.

- Quero lhe perguntar uma coisa - disse Grelei, quase sem fôlego. - Deseja um café,

ou um copo de vinho?

- Um café seria bem-vindo.

- Vou buscá-lo imediatamente, Majestade!

Gretel fez uma reverência e desceu a escada correndo. O rei fechou a porta.

Zita teve a impressão de que a amiga levou muito tempo para aparecer com a

bandeja, mas na realidade isso aconteceu poucos minutos depois.

- Esqueci que o criado estaria com ele - sussurrou.

Gretel levantou os olhos.

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- Nunca pensei que quisesse falar com o rei a sós!

- Talvez eu não tenha oportunidade de falar com ele de jeito nenhum, se o criado me

tomar a bandeja!

A outra deu um sorrizinho maroto e bateu à porta do quarto do rei.

O criado abriu-a.

- Desculpe-me, mas um cavalheiro, numa das carruagens, deseja falar com você.

- Comigo? - perguntou o homem, atónito.

- Sim. Encontrou uma coisa que talvez tenha sido esquecida e que Sua Majestade

pode querer levar.

- Perdoe-me, Majestade, mas preciso descer.

Passou por Gretel, sem nada dizer. A moça piscou para Zita, antes de ir atrás dele.

A princesa respirou fundo. Carregando a bandeja com cuidado, foi até à porta aberta

e bateu.

- O café de Vossa Majestade - disse, em tom suave.

- Pode entrar.

Ela obedeceu e viu o rei de pé, diante do espelho da cómoda, escovando os cabelos

com duas escovas de marfim. Usava uma calça comprida preta, com uma listra vermelha na

costura, que fazia parte de seu uniforme, e uma camisa branca de linho.

Zita tinha visto várias vezes o pai escovar os cabelos desse modo, antes de acabar de

se vestir, e sempre achara que isso o tornava muito atraente.

Colocou a bandeja numa mesinha redonda, perto da janela.

O rei continuava de costas. Decidida a falar com ele, Zita perguntou:

- Quer que eu sirva o café, Majestade?

Sem pensar, falou na língua dele.

Sempre tivera facilidade para línguas e falava perfeitamente, não apenas inglês,

francês, alemão e italiano, como os idiomas dos países vizinhos. O pai lhe ensinara estes

últimos, dizendo que faziam parte do sangue deles. Eram todos baseados numa mistura de

alemão e de húngaro, mas cada qual tinha uma variação e uma entonação características.

O rei largou as escovas.

- Você é, sem dúvida, um de meus súbditos, não é? - disse, sorrindo.

Virou-se para ela e ficou imóvel.

O sol que entrava pela janela iluminava os cabelos de Zita. dando-lhe um brilho

chamejante. E a pele da moça era de uma brancura perfeita.

Como estava excitada, seus olhos cintilavam como esmeraldas.

Para Zita, também, o rei foi uma surpresa, muito diferente do que imaginava.

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Em primeiro lugar, era mais bonito e muito mais moço do que parecia nos retratos.

Mas não foi apenas sua aparência física que a surpreendeu. Muito intuitiva a respeito das

pessoas, sentiu que ele era especial, mas não pelo facto de ser rei. Havia nele um estranho

magnetismo.

Sem querer, ficou encarando-o, e percebeu que a olhava exactamente do mesmo

modo.

Maximiliano foi o primeiro a falar:

- Você não respondeu à minha pergunta.

No primeiro momento, Zita não se lembrou do que era.

- Não, não sou de seu país, Majestade, sou de Aldross.

- Mas fala a minha língua.

- Não é muito diferente da nossa.

- Sei que há uma semelhança, mas você a fala como se tivesse vivido em Valdastien a

vida inteira. Se bem que não possa ser muito tempo - acrescentou, com um sorriso.

- Nunca visitei seu país, Majestade, mas gostaria de conhecê-lo.

- Quando for lá, espero que não fique decepcionada.

Zita achou que estavam conversando de um modo muito estranho. Era como se as

palavras lhes viessem aos lábios, quando os pensamentos estavam longe.

Não conseguia parar de olhar para o rosto do rei.

Temendo que ele a despedisse, quando queria continuar, disse, rapidamente:

- Vossa Majestade deve tomar o café enquanto está quente. Espero que goste dos

croissants. São deliciosos.

- Garanto que sim. E o gosto por boa comida e boa bebida é uma coisa que nossos

dois países têm em comum.

- Então, plagiando o que Vossa Majestade me disse, espero que não fique

decepcionado.

Pegou o bule pesado e serviu o café na xícara grande. Percebeu que o rei a observava

e ficou um tanto intimidada. Ao mesmo tempo, estava excitada porque conversava com

ele. Mesmo que nunca mais o visse, sempre teria essa recordação.

- Como se chama? - perguntou Maximiliano.

Apanhada de surpresa, ela disse a verdade:

- Zita.

Depois, pensou, apavorada, que talvez tivesse sido indiscreta. Lembrou-se, então, de

que oficialmente sempre se referiam a ela como “princesa Tereza”, que era seu primeiro

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nome. “Zita” era usado apenas em família e pelas pessoas que viviam perto do palácio,

sendo um tratamento afectuoso.

- Um nome bonito, para uma criatura bonita - disse o rei.

Ela o olhou surpresa.

Mal podia acreditar que Maximiliano de Valdastien flertasse com a garçonete de uma

estalagem.

Mas por que não? Era o tipo de observação que seu pai faria, com seu modo jovial e

amistoso, para qualquer mulher bonita que encontrasse em suas excursões, quando pensava

estar viajando incógnito.

O rei aproximou-se da mesa.

- Sempre julguei que cabelos ruivos fossem privilégios das húngaras.

Zita sorriu.

- Minha avó era húngara, Majestade.

- Isso explica tudo - disse ele, satisfeito por ter acertado. - E suponho que também

tinha olhos verdes.

Zita tornou a sorrir, mas não respondeu. Dali a um momento, o rei perguntou:

- Gosta de trabalhar aqui?

- Não estou aqui há muito tempo.

- Pensei que, com sua beleza.

Interrompeu-se, como achando que estava exagerando a intimidade, e pegou a xícara

de café. Tomou um gole, sempre olhando para a moça.

Zita ficou à espera, achando que o comportamento correcto seria ela se retirar, mas

querendo, desesperadamente, continuar ali.

- Que idade você tem?

- Quase dezoito, Majestade.

- E é a primeira vez que sai de casa para trabalhar? É muita bondade sua demonstrar

interesse.

O rei largou a xícara.

- Estou interessado, porque aprecio a beleza e me parece que está desperdiçando a

sua num lugar como este, quando poderia...

Interrompeu-se novamente.

- Poderia o quê, Majestade?

- Poderia fazer muitas outras coisas. Mas talvez isso a estragasse, seria uma pena.

- Que outras coisas Vossa Majestade acha que eu poderia fazer?

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Zita achou que era uma conversa fascinante para ter com um rei que não fazia a

mínima idéia de quem era ela.Era quase como se estivesse conversando com o pai, quando

os dois procuravam frases que pudessem confundir o outro, num interessante duelo de

palavras.

- Você sabe dançar?

- Mas, claro! Sei dançar como uma cigana ou, se Vossa Majestade preferir, executar as

danças típicas de Aldross. as quais, creio eu, devem ser muito parecidas com as danças

regionais de Valdastien.

Falou em tom brincalhão, quase como falava com o pai.

- Você me deixa perplexo. Parece educada. Tanto sua gramática quanto a construção

das frases indicam que tem um domínio de minha língua que eu não esperaria encontrar

numa...

Interrompeu-se, procurando a palavra certa, mas Zita terminou a frase por ele:

- ...numa camponesa!

O rei deu uma risada.

- Você não parece uma camponesa. Agora, fale comigo em sua língua.

- O que Vossa Majestade gostaria que eu dissesse? - perguntou Zita, na língua de

Aldross.

- Não importa. Vá falando, até eu pensar em alguma coisa.

Zita deu uma risadinha. Depois, achando que ele ficaria ainda mais perplexo, disse,

num francês perfeito, com sotaque parisiense:

- Como parece que estamos participando de uma competição de idiomas, eu gostaria

de descobrir qual a fluência de Vossa Majestade na língua da capital mais alegre do mundo.

O rei fitou-a com mal disfarçado espanto. Perguntou. asperamente:

- Que brincadeira é essa? Quem é você? Uma actriz? Quem a mandou falar comigo?

Zita não esperava tal reacção.

- Não é nada disso, Majestade. Acontece que tenho aptidão para línguas e me dei ao

trabalho de aprendê-las.

- É verdade?

- Garanto que... é.

Olhou-o quase com ar súplice, não querendo aborrecê-lo, não querendo estragar os

momentos deliciosos que tivera, antes de Maximiliano desconfiar dela.

De repente, como se lembrando de que o tempo estava passando, o rei disse:

- Quero tornar a vê-la, Zita, e continuar esta conversa. Antes de partir de Aldross,

vou lhe mandar um recado, dizendo onde deve ir me encontrar. - Fez uma pausa e

Page 42: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

acrescentou: - Virei para cá ou providenciarei para que você vá ao meu encontro. Está

disposta a fazer isso?

Ela ficou sem saber o que dizer. Depois, hesitando porque não podia raciocinar

direito, respondeu:

- Talvez seja... impossível.

- Nada é impossível. Embora tenhamos que ser discretos, estou decidido, firmemente

decidido, não apenas a me encontrar com você, como a fazer com que me explique três

mistérios.

- Quais são... eles?

- A cor de seus cabelos, a expressão de seus olhos e sua aptidão para línguas.

Havia uma nota zombeteira na voz dele, mas Zita sabia que estava falando sério.

Antes que ela pudesse responder, ouviu-se um ruído de passos no corredor e o

criado de quarto do rei entrou apressadamente.

- Não sei quem me mandou aquele recado, Majestade - disse ele. - As carruagens já

partiram e, se esqueceram alguma coisa, nada posso fazer.

O rei não respondeu. Tinha pegado sua túnica, e o criado se apressou a ajudá-lo a

vesti-la.

- Pediram-me que avisasse Vossa Majestade de que a carruagem do grão-duque já

está à vista.

- Então, preciso me apressar.

Como se essas palavras despertassem Zita de um sonho, no qual era difícil pensar

com clareza ou compreender o que estava acontecendo, ela pegou a xícara de café,

colocou-a na bandeja e se dirigiu para a porta.

Já ia sair, quando o rei falou, secamente, como quem dá uma ordem:

- Não se esqueça do que lhe disse, Zita.

- Não me esquecerei, Majestade.

Fez uma pequena reverência e saiu do quarto sem olhar para Maximiliano, mas

sentindo que ele a observava.

Só depois que fechou a porta, percebeu que seu coração batia descompassado e que

estava meio tonta. Embora tivesse sido emocionante, excitante e perigoso, sentia-se exausta

com a dramaticidade do incidente.

Enquanto cavalgava para casa, Zita se lembrou de todos os detalhes do encontro,

mal podendo acreditar que aquilo não fosse imaginação sua.

Tinha visto o rei, falara com ele, e, incrivelmente, ele dissera que queria tornar a vê-la.

Page 43: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Era uma coisa que Zita não esperava, mas agora sabia que precisava se esquecer de

tudo, nem que fosse por causa de Sophie. Não devia interferir nos sentimentos dele pela

irmã nem no namoro dos dois, se é que Maximiliano pretendia cortejar a filha mais velha

do grão-duque.

Aos olhos dele, a posição de Zita seria a mesma de La Belle e de outras mulheres do

demi-monde com as quais se divertia, em Paris ou na mansão contígua ao palácio de

Valdastien.

Sua mãe ficaria horrorizada, se soubesse não apenas do que Zita havia feito, mas da

maneira como o rei a olhara e falara com ela.

“Creio que todos os homens são iguais. Basta verem um palminho de rosto bonito,

que já começam a falar com intimidade. E é uma coisa que uma princesa não deveria

permitir”

Ao mesmo tempo, pensou que era mais fácil conversar com o rei como uma

garçonete bonita do que num jantar de cerimónia. Lá haveria cortesãos à esquerda e à

direita, e a grã-duquesa observando tudo com olhos de águia.

Depois, achou que seria fácil conversar com o rei, fossem quais fossem as

circunstâncias, O importante não era tanto o que diziam, e sim, o que deixavam de dizer,

assim como as vibrações que iam de um ao outro.

- Foi o que senti por ele - murmurou, enquanto cavalgava em direcção ao palácio. -

Gostaria de saber se sentiu a mesma coisa por mim. Ele é fascinante!

Pegasus levantou as orelhas, ao ouvir a voz dela. Zita se inclinou e deu umas

pancadinhas no pescoço do cavalo.

- Sim, ele é magnífico e, ao mesmo tempo, imprevisível. Naturalmente, sente-se

atraído por qualquer rostinho bonito.

Lembrou-se de todas as histórias que tinha ouvido a respeito de Maximiliano.

Não era apenas La Belle. Havia as famosas beldades da sociedade parisiense, assim

como as mulheres do demi-monde que lhe tinham sido descritas por madame Goutier. E

também as actrizes, das quais o professor de música falava num tom que indicava que não

estava velho demais para apreciá-las!

“O rei está pouco ligando para que uma mulher seja uma actriz do Théâtre de

Variétés ou uma garçonete da Estalagem Golden Cross.”

Ficou imaginando o que ele pensaria quando, depois de lhe mandar um bilhete,

recebesse a resposta de Gretel de que a moça não estava mais lá.

Achou que seria bem- feito, se ele esperasse em vão por ela na estalagem, ou fosse

qual fosse o lugar que marcasse para o encontro.

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Tinha contado a Gretel os detalhes do encontro e pedido que abrisse a qualquer

bilhete que fosse entregue para ela.

A amiga ouviu, de olhos arregalados.

- Você conquistou o rei! Mas tenha cuidado, princesa, ou se verá em apuros.

- Disso não há dúvida, se papai ou mamãe descobrirem o que andei fazendo.

- Como poderiam descobrir? O rei tem fama de dom-juan, mas nunca se ouviu dizer

que teve um caso com uma garçonete bonita. - Reflectiu sobre isso e continuou: - Você

não parece uma garçonete, e não adianta fingir que é.

- Então, o que pareço ser?

- Uma princesa! - respondeu Gretel, e ambas riram.

Chegando ao palácio, quando subia a escada para a sala de estudo, Zita pensou que,

se antes tinha sido frustrante saber que não ia poder ver o rei, agora era mil vezes pior.

Só pensava nele, lá embaixo, sentado à mesa, suportando um almoço longo e

maçante, com discursos cujo teor já devia ter ouvido muitas vezes antes. Se ela estivesse

presente, poderia ao menos observá-lo. Talvez os olhos deles se encontrassem, e um

saberia o que o outro estava pensando.

Zita estremeceu.

“Devo estar louca, imaginando que ele pensaria em mim, ou que, se me conhecesse

como realmente sou, me daria alguma atenção. A única coisa que despertou seu interesse

por mim foi o facto de eu não parecer empregada de uma estalagem. Ficou perplexo por eu

falar três línguas.”

Lembrou-se depois do que o rei dissera a respeito de seus cabelos. Ocorreu-lhe que,

se ele visse o retrato de sua avó, na sala do trono, poderia suspeitar.

Mas não havia razão para isso, porque ir à sala do trono não fazia parte do programa

dele. E era apenas lá que havia um bom retracto da avó de Zita.

“Isso está parecendo uma história de detective, onde o vilão deixa pistas por toda a

parte e, cedo ou tarde, acaba sendo apanhado!”

Estremeceu, ao pensar que sua mãe poderia um dia descobrir o que tinha feito. E

estava certa de que o castigo seria de acordo com o crime.

Durante o resto da tarde, ficou deitada na cama, tentando ler um livro. Mas o tempo

todo pensava no rei, imaginando se naquela noite, ou talvez no dia seguinte, ele mandaria

um bilhete à estalagem, pedindo que Zita fosse a seu encontro.

Por um momento, brincou com a idéia de atender ao pedido. Depois, achou que não

só seria perigoso e complicado, como agora precisava ser leal à irmã e deixar que

Maximiliano concentrasse suas atenções em Sophie.

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Depois que os dois ficassem noivos, Zita faria com que ele jurasse jamais contar em

que circunstâncias tinham se conhecido.

“Tenho certeza de que ele é bastante desportivo para não me denunciar.”

À noite, ia haver um baile no palácio. Era pouco provável que o rei tentasse se

encontrar com ela, pois seria obrigado a dançar no salão repleto de flores, onde

provavelmente ficaria até à uma da madrugada.

Era a essa hora que a grã-duquesa gostava que suas festas acabassem. Depois que

tocavam o hino nacional, os convidados não tinham outra coisa a fazer, a não ser ir para

casa.

Trouxeram para Zita, no quarto, um jantar pouco apetitoso.

A baronesa Makszath, que fazia tudo o que a grã-duquesa queria, tinha vindo ao

quarto de Zita duas vezes, para saber se estava bem.

Depois que a moça garantiu que sim, a baronesa correu para os festejos lá de baixo.

Sua última visita foi pouco antes do jantar. Entrou no quarto de Zita usando o

melhor vestido de baile, com uma tiara pequena na cabeça grisalha. Tinha uma expressão

excitada, incomum nela.

- Que está acontecendo? - perguntou Zita.

- Oh, é emocionante! Sua Majestade é o homem mais bonito que já vi!

- O que Sophie acha dele?

A baronesa hesitou, antes de responder:

- Tenho a impressão de que está um pouco intimidada. Sentou-se ao lado dele, ao

almoço, mas não pareciam ter muito o que conversar. E achei o rei um tanto preocupado.

- De que maneira?

A baronesa teve dificuldade em responder!

- Para dizer a verdade, o rei não pareceu estar fazendo muito esforço. Minha mãe

sempre dizia que...

A baronesa começou uma das intermináveis histórias de sua mocidade, mas Zita não

a ouviu.

Pensava que, se tivesse comparecido ao almoço, teria muito assunto para conversar

com o rei. O mais importante seria a atitude dele em relação à Alemanha. A seguir, falariam

sobre cavalos.

Obviamente, a baronesa não queria ficar no andar de cima, quando havia tanta coisa

interessante lá embaixo. Logo saiu do quarto, recomendando a Zita que dormisse cedo.

- Não tenho muita escolha! - respondeu a moça, secamente. Recusou o último prato

que o lacaio trouxe.

Page 46: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

O que aconteceria, se descesse e fosse espiar o baile pela janela, do lado de fora?

Sabia que, se fizesse isso e fosse descoberta, sua mãe ficaria furiosa.

Depois, brincou com a idéia de colocar seu melhor vestido de baile, que era verde, da

cor de seus olhos, e entrar no salão, dizendo que, afinal de contas, tinha resolvido

comparecer à festa.

Podia imaginar a consternação que causaria, assim como a cólera da mãe e o ódio de

Sophie.

“Até mesmo papai me olharia com repulsa. E com razão; seria pouco desportivo eu

agir assim.”

Caso o rei não pedisse Sophie em casamento, Zita seria considerada culpada e ouviria

falar no assunto a vida inteira.

Finalmente, atirou longe o romance, que era muito aborrecido, e apagou as velas.

Teve a impressão de que ouvia o som de música. Não podendo tapar os ouvidos,

imaginou que estava dançando com o rei.

Enquanto ele a tinha em seus braços, Zita sentia que uma corrente os unia, de modo

que a música parecia vir, não dos violinos, mas do coração dos dois.

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Capítulo 4

Depois de algum tempo sem conseguir dormir, Zita levantou-se, foi até à janela e

ficou olhando para as estrelas, imaginando o que o futuro lhe reservaria.

Sabia que, devido ao seu nascimento e à sua posição, cedo ou tarde teria que aceitar

um casamento que fosse vantajoso para seu país, ou de interesse político.

Mesmo que lutasse contra isso, era inevitável. Desde criança, ouvira mil vezes que

pertencer a uma família real acarretava grandes responsabilidades.

Sabia agora que o que realmente sua mãe dizia era que, como princesa, o único

serviço que poderia prestar a Aldross seria fazer um casamento vantajoso.

Assim, quando pensava em amor, Zita se via, não como uma princesa, mas como

uma moça comum, como não podia ser de facto.

O homem de seus sonhos não tinha rosto e não era de sangue real.

Zita contava a si mesma histórias em que o homem que amava é húngaro e um

magnífico cavaleiro: podia dançar com ele ao som música cigana ou galopar pelas estepes,

lado a lado, até o horizonte infinito.

Como alternativa, ela se imaginava ficando apaixonada por um inglês que possuísse

cavalos. Os dois veriam os animais ganharem Derby ou a Taça de Ouro. Caminhando ao

lado dele, Zita levaria o vencedor pela rédea até a baia.

Tanto seu pai quanto sua mãe lhe contaram o que acontecia nas corridas, na

Inglaterra, e que a organização lá era superior à de qualquer outro hipódromo do mundo.

Também imaginava uma grande mansão, em estilo georgiano, de propriedade do

marido, onde viveriam sossegados, treinando seus cavalos e participando muito pouco das

actividades do condado.

Era essa a vida que a grã-duquesa levava, como um membro obscuro da família da

rainha Vitória, até ficar decidido que casaria com o grão-duque de Aldross.

- Fale mais de sua infância, mamãe - pedia Zita.

Quando era moça, ela conversava com as filhas com um jeito humano e revelador.

Só depois que Zita se tornou tão bonita, foi que a mãe a pôs de lado, guardando suas

confidências para a filha mais velha e sua predilecta, Sophie.

Havia uma nacionalidade que nunca entrava nas cogitações de Zita: a francesa.

Page 48: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Embora ficasse fascinada com as descrições da beleza de Paris, de sua alegria e de seu

encanto, sabia que na França quase todos os casamentos eram arranjados. Levavam em

consideração as vantagens sociais. E o dote da noiva era de grande importância. Mas quase

todos os homens casados tinham amantes, consideradas tão importantes para a felicidade

de um homem como sua família.

“Eu detestaria isso!”

Ocorreu-lhe que Sophie acharia humilhante, se chegasse, um dia, a saber que o rei,

assim como muitos franceses, tinha uma esposa em público e uma amante em particular.

Talvez Sophie, sendo muito tola, nunca chegasse a saber, pensou Zita, à guisa de

consolo.

Achava repulsiva a idéia de o rei, ou outro homem qualquer, levar uma vida dupla.

Ao mesmo tempo, sabia que era exactamente isso que seu pai fazia e não podia culpá-lo.

“Mamãe é muito fria... E papai gosta de mulheres quentes, risonhas, extrovertidas.”

Tentou imaginar o pai beijando a esposa com paixão e achou impossível. Para dizer a

verdade, não podia imaginar a mãe tendo um sentimento apaixonado, a não ser a cólera.

Mesmo por ser inglesa, a grã-duquesa conseguia se controlar. Quando ficava

realmente zangada com alguém, ou com uma das filhas, apenas se empertigava toda, como

se fosse feita de pedra, e a voz parecia de gelo.

Era muito diferente das pessoas de Aldross. Estas gritavam, discutiam e atiravam

objectos umas nas outras. Mas, no momento seguinte, já se abraçavam, com lágrimas de

arrependimento, beijavam-se e faziam tudo para que reinasse de novo a paz.

- Garanto que a vida seria muito melhor assim - murmurou Zita.

Lembrou-se de que muitas vezes, em criança, tinha sido castigada por perder o

controle, ou dizer o que pensava.

- As pessoas de sangue real não demonstram emoção - disse a grã-duquesa, inúmeras

vezes. - A realeza não chora em público; esconde seus sentimentos por detrás de uma

máscara.

- Por quê? Por quê? - perguntava Zita, levando uma palmada para não discutir com a

mãe ou com as governantas, que faziam as mesmas recomendações.

Certa vez, bateu o pé e gritou:

- Detesto ser uma princesa real! Vou fugir e viver com os ciganos, e vocês nunca

mais me verão!

Saiu correndo do quarto e chegou a sair do palácio, com a intenção de nunca mais

voltar. Mas tinha sido trazida de volta, levando umas palmadas e sendo obrigada a ficar no

quarto, de castigo, o dia inteiro. Seu jantar seria apenas pão e água.

Page 49: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Zita não se arrependeu, mas aprendeu que era mais prudente não expressar seus

sentimentos de modo tão claro, devendo guardá-los para si mesma.

Esses pensamentos a levaram de volta ao rei. Embora fosse muito excitante

conversar com ele, e mais excitante ainda flertar com ele, tinha pena de Sophie.

“Se ela se apaixonar pelo rei, como mamãe se apaixonou por papai, vai ficar sentada

no palácio, com o coração partido, enquanto ele estiver com La Belle, divertindo-se, ou

com outra mulher igual a ela. Ou, então, talvez esteja em Paris, tratando de um negócio

importante.”

Então, ocorreu-lhe a idéia de que, fosse qual fosse o sofrimento futuro, valia a pena

receber as carícias do rei, em vez de suportar as demonstrações amorosas do maçante

margrave de Baden-Baden.

Ficou tanto tempo à janela, que viu o brilho das estrelas se apagar no céu. A

madrugada chegava cedo, nessa época do ano, e logo o primeiro brilho do alvorecer

surgiria atrás das montanhas.

Zita resolveu sair a cavalo, como na véspera. Mas nesse dia não havia pressa, porque

todo mundo, no palácio, estaria exausto, após o baile.

Vestiu-se lentamente, escolhendo a saia rodada de um traje de montaria verde, leve e

própria para o verão; uma blusa branca de musselina com aplicações de renda e uma

jaqueta que combinava com a saia.

O traje fazia com que parecesse muito jovem. Não pretendendo usar chapéu, já que

ninguém a veria, escovou bem os cabelos ruivos, até que eles pareceram flutuar à volta do

rosto. Prendeu-os depois na nuca, com uma fita verde.

Quando ficou pronta, havia no céu uma claridade que dava um brilho dourado aos

picos cobertos de neve.

Zita saiu do palácio pelo mesmo caminho da véspera: a porta lateral, a mais próxima

das cocheiras.

Com a chegada do rei, o número de sentinelas era maior. Depois de selar seu cavalo,

compreendeu que seria impossível sair do jardim por um dos portões principais.

Assim sendo, guiou o cavalo por entre as árvores, até chegar ao portão que era usado

pelos jardineiros. Ali não havia nenhuma sentinela. Embora o portão tivesse um cadeado,

isso não constituía obstáculo para Pegasus. Ele pulou o portão com uma folga de uns

quinze centímetros.

Logo se viram trotando por lugares desabitados, em direcção aos campos que Zita

achava que deviam ser semelhantes às estepes que tanto desejava conhecer.

Page 50: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Quando chegaram ao vale, o nevoeiro que o cobria de manhã começava a se dissipar.

Teve a impressão de estar entrando num país encantado, que nada tinha a ver com o

palácio e com o mundo que deixara para trás.

Dispondo de bastante tempo, fez o cavalo seguir devagar, até que o nevoeiro se

dissolveu e ela distinguiu o brilho das flores.

A princípio, o sol iluminou apenas os picos dos morros, mas depois chegou ao vale,

com um brilho dourado.

Era um espectáculo tão bonito que ela desejou poder mostrá-lo ao rei e desafiá-lo a

mostrar-lhe algumas coisas igualmente em Valdastien.

Ao pensar nele, o instinto fez com que virasse a cabeça. Viu, ao longe, um cavalheiro

que vinha naquela direcção.

Zita parou. Com súbita apreensão, achou que talvez a tivessem visto sair da cocheira,

mandando alguém para buscá-la.

Quando o cavalheiro se aproximou, teve uma idéia absurda. Mas, quanto mais perto

ele chegava, mais Zita se convencia de que era o rei.

Sem saber porquê, ficou à espera, e um brilho malicioso surgiu em seus olhos verdes

Percebeu que o rei a havia reconhecido e que esporeava o cavalo para alcançá-la. Zita

esperou mais alguns segundos; então, esporeou Pegasus, fazendo-o galopar. Ele ia tão

depressa, que seus cascos mal pareciam tocar o chão.

Sem olhar para trás, tinha certeza de que o rei galopava, tudo fazendo para alcançá-la.

Estava decidida a não permitir que o conseguisse, mas ouvia cada vez mais perto o

ruído dos cascos do garanhão negro que ele montava. Finalmente, galopavam lado a lado, a

grande velocidade.

Continuaram assim durante algum tempo. Relanceando o olhar para Maximiliano,

achou que nenhum homem que conhecia e que montava era excepcional.

Assim continuaram, até ficarem ofegantes.

Como se houvesse entre eles uma comunicação muda, ambos acharam que bastava

de galope e diminuíram a marcha.

Zita virou-se para o rei, sorrindo.

- Um empate, creio eu, Majestade. Ou, como mulher, devo conceder-lhe o gosto da

vitória?

- Creio que fomos ambos vencedores. Mas eu gostaria de saber como é possível que

uma simples mulher monte tão bem.

Zita riu e o som pareceu cristalino, na quietude da manhã.

O rei fez seu animal parar e disse:

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- Seu cavalo é estupendo. A quem pertence?

- É meu. E, como Vossa Majestade bem pode imaginar, eu o amo.

- Como provavelmente ama a pessoa que o deu a você.

A moça notou certa aspereza na voz dele. Fitou-o, como que esperando por uma

explicação.

- Como o cavalheiro em questão é, obviamente, rico, acho extraordinário que

permita que você trabalhe numa hospedaria.

Zita sorriu, imaginando o que deveria responder. O rei perguntou, com secura:

- O que esse homem significa para você? Gosta dele como do cavalo que lhe deu?

Ela ficou tão atónita com a pergunta que, por um momento, apenas olhou para o rei.

Depois, compreendeu o que ele estava insinuando: achava que era uma mulher como La

Belle e outras de seu tipo.

Zita ergueu o queixo, desafiadora.

- Como considero o que me diz uma ofensa, vou deixá-lo, Majestade.

Ia virar Pegasus, mas, com um movimento rápido, o rei pegou a rédea do animal.

Surpreso, Pegasus empinou, mas Maximiliano não largou a rédea.

- Não pode ir embora. Quero falar com você.

- Não sei se quero falar com Vossa Majestade.

Então, os olhos de ambos se encontraram e Zita compreendeu que não poderia ir

embora.

Continuaram de olhos presos. Como se ela o obrigasse a isso, o rei disse, em voz

baixa:

- Perdoe-me, mas você deve ter percebido que tudo o que diz ou faz me deixa

perplexo. Para dizer a verdade, a não ser que me dê uma explicação e responda às minhas

perguntas, creio que vou ficar louco!

Percebendo que ele falava a sério, Zita ficou encabulada e desviou o olhar.

- Não posso imaginar por que Vossa Majestade se... preocupa comigo.

O rei largou a rédea de Pegasus.

- Essa foi a única observação tola que ouvi de você, desde que nos conhecemos.

Vamos continuar.

Zita virou seu cavalo e cavalgou ao lado do rei, na manhã ensolarada.

A névoa tinha desaparecido totalmente, na parte baixa do vale, mas ainda pairava

sobre as árvores que o sol não havia alcançado, encobrindo o palácio distante, de modo

que parecia que eles estavam sós, num mundo encantado.

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Continuaram a cavalgar. O único ruído que se ouvia era o dos cascos dos cavalos e o

tilintar dos arreios. Percebendo que o rei olhava para ela de um modo penetrante, Zita

ficou satisfeita por saber que estava perplexo e que as coisas não eram tão simples como

sempre deviam ter sido para ele. Finalmente, Maximiliano disse:

- Estou esperando.

- Esperando o quê?

- Quero saber o que você tem a contar.

- Por que hei-de lhe contar alguma coisa? Não é muito mais divertido saber que nos

encontramos, talvez por determinação do destino? Assim como um sonho, não há

necessidade de explicação, nem de um motivo para tudo.

Zita falou como se estivesse conversando com o pai. Como o rei nada dissesse, ela

continuou:

- Os sonhos são lindos apenas quando, ao acordar, não tentamos fazer com que se

tornem realidade.

- Está mesmo sugerindo que, quando nos despedirmos, hoje, eu não saiba mais nada

a seu respeito do que sei agora?

- Por que não? Não tinha intenção de encontrá-lo aqui.

- O destino nos reuniu novamente. Isso e o facto de eu não ter podido dormir,

pensando em você.

Zita olhou para ele, espantada. Parecia estranho que Maximiliano dissesse isso, pois

ela também não tinha podido dormir, por causa dele.

- Agora Vossa Majestade está exagerando. Se não dormiu, deve ser por causa do que

comeu, à ceia, ou porque bebeu champanhe demais.

- É plausível, mas você sabe tão bem como eu que não é verdade. E não falo por

falar. Desde que a conheci, ontem, na estalagem, eu a quero, Zita.

- Que estranho! - murmurou a moça, quase acrescentando que também ela o queria.

O rei ia dizer qualquer coisa, mas uma borboleta roçou o focinho de seu cavalo, que

se espantou.

Maximiliano controlou-o imediatamente e depois disse:

- Preciso conversar com você! Temos que encontrar um lugar onde possamos

conversar sentados, e não a cavalo!

- A mais ou menos um quilómetro e meio daqui, há uma estalagem pequena, usada

por aqueles que pretendem escalar a montanha acima dela - disse Zita. - Tenho certeza de

que nos servirão café, caso Vossa Majestade ainda não tenha tomado o desjejum.

O rei sorriu.

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- Para dizer a verdade, escapuli, sem que me vissem. Achei que ia escandalizar todo

mundo, se pedisse meu cavalo tão cedo. E, certamente, achariam estranho eu querer sair

sozinho.

Zita riu. Sabendo que ele tinha razão e que os criados do palácio teriam ficado

perturbados, assim como os cavalariços.

Mas sabia também que não devia deixar que o rei percebesse que ela estava a par

dessas coisas. Fez com que Pegasus avivasse o passo. Ela e seu companheiro trotaram em

silêncio.

Zita tinha estado naquela estalagem, numa de suas excursões com o pai, quando ele

fora escalar a montanha.

Achou pouco provável que as mesmas pessoas estivessem cuidando da hospedaria,

mas, mesmo que agora os donos fossem desconhecidos, talvez soubessem quem ela era, já

que em Aldross todo mundo conhecia a família de seu governante.

A estalagem era um chalé pequeno, no meio de árvores, construído na encosta, mas

não num ponto alto demais que dificultasse a subida dos cavalos.

Como Zita esperava, havia mesas e cadeiras do lado de fora, assim como alguns

caramanchões para quem quisesse conversar com mais intimidade, isolado dos outros

hóspedes.

Era tão cedo que ainda não havia ninguém tomando o vinho leve da região, ou a

cerveja que vinha da capital e que, portanto, era mais cara.

- Quer que leve os cavalos para a cocheira? - perguntou o rei, depois que apearam.

- Não precisa levar Pegasus. Não irá longe e virá quando eu o chamar.

- Então, o nome dele é Pegasus. Não me admiraria se criasse asas e saísse voando,

carregando você.

- Prometo não fazer isso, até tomar meu café.

Zita deu um nó na rédea, no pescoço do animal, e deixou-o livre. Após um momento

de hesitação, como não quisesse admitir que a moça podia controlar melhor Pegasus do

que ele o seu garanhão, Maximiliano fez a mesma coisa.

- Creio que, como é muito cedo, Vossa Majestade terá que entrar, para encomendar o

café. Provavelmente não esperam ninguém, até o Sol estar alto.

Ao dizer isso, imaginou que, já que o rei achava que era uma garçonete, cumpria a ela

essa tarefa. Mas, no momento, estava em igualdade de condições.

Sem esperar pela resposta, Zita dirigiu-se para o caramanchãozinho mais próximo.

coberto por parreiras, onde os cachos de uva já começavam a amadurecer. Sentou-se,

esperando que a pessoa que trouxesse o café não olhasse muito para ela.

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O rei demorou um pouco, o que a surpreendeu. Quando apareceu, veio em

companhia de uma mulher idosa, grande e gorda, que trazia uma bandeja e uma toalha. Ela

colocou tudo na mesa, dizendo:

- Vocês mesmos têm que arrumar a mesa, do contrário meus croisants vão se queimar.

Não posso deixá-los no forno por mais tempo.

- Nós nos arranjaremos - respondeu o rei.

A mulher afastou-se apressadamente, sem nem mesmo olhar para Zita.

O rei segurou a bandeja. enquanto a moça estendia a toalha axadrezada na mesa de

ferro. Colocou-a depois diante de Zita.

Havia ali um bule grande de café, duas xícaras, um pote de creme grosso e uma cesta

de frutas de vários tipos.

- Levou muito tempo para voltar - comentou Zita. - Eu estava imaginando o que

teria acontecido.

- Os croissants eram mais importantes do que eu.

Ela deu uma risada.

- Sei por que está rindo - disse Maximiliano.

- Mas, claro! Estava pensando que deve ser humilhante, para Sua Majestade, o rei

Maximiliano de Valdastien, ver que está em segundo lugar, em relação a um croissant!

- Confesso que isso jamais aconteceu.

Zita entregou-lhe a xícara de café. Ele acrescentou:

- E é também a primeira vez que me vejo na companhia de uma criatura tão bela!

- Diz isso com muita facilidade. Percebo que tem muita prática, Majestade. O

director de uma peça de teatro faria com que repetisse isso inúmeras vezes, até parecer

sincero.

- E você é uma actriz! Eu disse a mim mesmo, ontem, que sua representação era boa

demais para ser verdadeira.

Zita riu.

- Se é nisso que deseja acreditar, acredite!

- Quero que me diga a verdade.

- Seria muito decepcionante se, depois de tudo o que Vossa Majestade imaginou,

descobrisse que sou filha de um sapateiro!

- Duvido que a filha de um sapateiro tivesse sua aparência, Zita, e montasse um

cavalo chamado Pegasus, como se viesse do Olimpo.

- Isso é muito poético - brincou a moça.

- Você está começando a me aborrecer. Vamos deixar de fingir e falar a sério.

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- Sinto decepcioná-lo, mas é assim que falo, sempre que tenho oportunidade.

- Você não me decepciona. Fala de um modo condizente com sua aparência, como

se saísse de um sonho. Estou morrendo de medo de acordar.

- É uma coisa que não deve fazer. Portanto, pare de ficar imaginando coisas e de se

beliscar para ver se está dormindo! Se estiver de repente abrirá os olhos e verá que está em

sua cama... sozinho!

Zita disse as últimas palavras sem pensar. Só quando viu a expressão do rei,

compreendeu que ele as havia interpretado de um modo muito diferente.

- Que quer dizer com isso? O que sabe a meu respeito, além de eu ser um rei que

veio visitar a capital de seu país?

Estava zangado, e Zita não pôde deixar de rir.

- Pensa que é só isso que sabem a respeito de Vossa Majestade? Como é nosso

vizinho, ouço falar dos casos amorosos do rei Maximiliano desde que me entendo por

gente!

- E o que foi que ouviu?

Zita ficou pensando se devia dizer a verdade.

Podia ouvir de novo madame Goutier lendo as cartas da filha sobre as aventuras de

Maximiliano, em Paris; ou o professor de piano descrevendo os encantos das actrizes do

Théâtre de Variétés e das cantoras que tinham conquistado a cidade, cantando em cafés-

concertos.

Seus pensamentos a levaram até La Belle, que era hóspede do rei, na mansão pegada

ao palácio de Valdastien.

Enquanto reflectia sobre o que responder, o rei a observava. De repente. ele disse:

- Quem lhe contou tais coisas e por que motivo você acreditou nelas com tanta

facilidade?

Zita virou o rosto para outro lado.

- Vossa Majestade não deve... ler meus pensamentos.

- Por que não? E saiba que o facto de poder lê-los é a coisa mais estranha que jamais

me aconteceu.

Zita não pôde deixar de fitá-lo. Quando os olhares de ambos se encontraram, ela

soube que o que ele dizia era verdade. De um modo estranho, incompreensível, o rei podia

saber o que ela estava pensando, como também ela sabia o que ele pensava. Compreendeu

que, não apenas estava interessado por ela, como intrigado e quase fascinado.

Maximiliano tinha de facto ficado acordado, pensando na moça. Achou, depois, que

a única maneira de escapar de pensamentos tão estranhos, tão insistentes, era sair a cavalo.

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Entreolharam-se durante muito tempo, e o rei disse:

- Por que isso nos aconteceu, Zita?

Um tanto amedrontada, ela respondeu:

- Não acho que tenha acontecido.

- Não com palavras. Mas, assim como sei o que está pensando, sinto que você recebe

as minhas vibrações. E também recebo as suas.

Zita prendeu a respiração.

- Não deve dizer... isso! Não é... verdade!

O rei sorriu.

- Por que mentir a respeito de uma coisa tão agradável? Ontem à noite, tive medo de

nunca mais tornar a vê-la. Agora sei que não precisava ter medo. Somos atraídos um para o

outro, assim como a Lua atrai as marés.

Ela respirou fundo.

- É uma boa comparação. A Lua está longe, no céu, e, embora possa afectar o mar,

não há hipótese de ambos se aproximarem. O mesmo acontece connosco.

O rei deu um soco na mesa, que fez com que Zita pulasse, e as xícaras e os pires

estremeceram.

- Tolice! Temos que nos ver de novo!

- É... impossível.

- Por quê?

- Porque, como eu já disse, Vossa Majestade está tão longe como o homem da Lua,

que não desce para se misturar com os comuns mortais, como eu.

- Você é um ser humano. E, se fosse necessário, tenho certeza de que Pegasus

poderia levá-la à Lua.

Zita riu, porque não esperava por tal resposta.

- Gostaria que Pegasus pudesse saber como Vossa Majestade está sendo lisonjeiro

com ele.

- Voltamos a Pegasus! E ainda estou esperando que me diga quem o deu a você.

Zita não respondeu. Maximiliano insistiu:

- Ficou zangada, quando eu fiz a sugestão óbvia, mas não pode ser tão cruel a ponto

de deixar que eu fique torturado por uma emoção que nunca senti. - Zita olhou para ele,

espantada. - Pois bem, estou com ciúme, como nunca estive, no passado. Quem é ele?

- Não creio que Vossa Majestade tenha o direito de me fazer esse tipo de pergunta.

- Então, me dê esse direito.

- Não sei o que quer dizer com isso.

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- Creio que sabe. Mas tenho medo de dizer o que é.

Zita compreendeu então que ele lhe oferecia o lugar ocupado por La Belle.

Embora achasse que devia ficar escandalizada e zangada com a sugestão, imaginou,

desesperadamente, o que poderia responder, sem tornar impossível a conversa entre eles.

Conversar com o rei era o que mais desejava, a coisa mais excitante e mais

extraordinária que tinha acontecido em sua vida. Por isso, não podia terminar tudo, como

se fizesse descer o pano no teatro, no final da peça.

Maximiliano a observava, e Zita sabia que procurava ler seus pensamentos.

Inesperadamente, ele disse:

- Não posso acreditar que você não seja pura. Algum homem já a possuiu?

Por um momento, a moça o encarou, incrédula, porque nunca imaginara que um

homem lhe fizesse tal pergunta tão íntima e tão impertinente.

Corou violentamente e respondeu, sem pensar:

- Claro que não! Como pode perguntar uma coisa dessas?

O rei soltou uma exclamação de triunfo. Colocando a mão sobre a dela, disse:

- Eu sabia! Perdoe-me, mas, depois que você me disse que Pegasus lhe foi dado de

presente tive a impressão de que todos os demónios zombavam de mim.

- Não quero falar sobre mim... nem Vossa Majestade deve falar comigo desse modo.

Estava ofegante. O contacto da mão dele provocava uma intensa vibração que lhe

causava um intenso prazer.

- Você é tão linda! Tão absurda, tão ridiculamente linda! Eu sempre soube que devia

haver no mundo alguém como minha mãe, mas esperava que, se tal criatura existisse, eu a

encontraria na Hungria.

- Então, por que não a foi procurar lá?

O rei suspirou.

- Por várias razões. Antes de tudo, porque não quero casar; e também porque nunca

achei que o temperamento húngaro, impetuoso, impulsivo, emotivo, fosse desejável para a

esposa do rei de Valdastien.

Zita compreendia bem o que ele queria dizer.

Embora sua avó e seu avô tivessem sido muito felizes como marido e mulher, Zita

sabia que, como grã-duquesa de Aldross, sua avó muitas vezes escandalizara os cidadãos

mais conservadores de sua nova pátria.

Quando ela e o marido brigavam, todo o palácio vibrava com a violência das

discussões. Depois que faziam as pazes, tudo parecia “ensolarado”, como dizia um velho

cortesão.

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- Há no meu país um provérbio que diz: “É melhor viver do que existir”. E um

outro: “É preferível sentir calor demais perto do fogo do que ficar gelado na neve.”

O rei inclinou a cabeça para trás e riu.

- Como é possível que você seja, não apenas bonita, mas também inteligente e

espirituosa? A cada momento que passo a seu lado, Zita, fico mais convencido de que

estou de facto sonhando.

- Então, não tente acordar.

Tentou libertar a mão, mas Maximiliano a prendeu.

- Não vou perdê-la, Zita, até me prometer que poderemos continuar sonhando, no

futuro. - Observou o rosto da moça e continuou: - Nós dois sabemos que o que nos

aconteceu, desde que nos conhecemos, não é apenas uma coisa excepcional, como também

única. Nós nos encontramos no tempo e no espaço. Se nos perdermos de novo, será um

crime do qual nunca nos perdoaremos.

- É o que temos de fazer. Vossa Majestade tem sua vida, e eu, a minha.

- Qual é sua vida? É o que estou tentando convencê-la a me dizer.

Zita não respondeu, e ele continuou:

- Seja o que for que você estiver fazendo agora, por que seu futuro não pode ser a

meu lado? Zita, eu a quero como mulher, mas desejo também que me ajude, que me inspire

a fazer coisas em que jamais pensei, até agora. - Desviou o olhar e acrescentou: - sei,

intuitivamente, que essas coisas são como portas que se abrem para novos projectos e

novos interesses que irão ajudar, não apenas a mim, mas ao meu povo. - De repente, soltou

a mão dela e colocou-a na testa. - Não sei por que lhe digo isso, mas parece que as palavras

me vêm aos lábios sem que minha mente e minha vontade as controlem. Mas,

inexplicavelmente, sei que a verdade é essa.

- Está me assustando. Como é que pode dizer essas coisas, quando mal nos

conhecemos?

- Agora você está saindo de nosso sonho. Encontramo-nos duas vezes, mas estive

procurando por você, tentando encontrá-la novamente, através de centenas de vidas

diferentes.

- Acredita realmente nisso? - Zita pôs os cotovelos na mesa e apoiou o rosto nas

mãos. - Já tentei solucionar o problema da reencarnação, mas nunca encontrei alguém com

quem pudesse falar sobre o assunto.

O rei sorriu.

- É um assunto muito vasto. Apesar disso, para quem já esteve no Oriente, parece

muito compreensível e totalmente lógico. - Fez uma pausa e continuou: - Mas, no

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momento, não estou interessado na reencarnação, como crença ou como argumento. Estou

interessado em você, Zita, e é esse o problema que temos que resolver.., e logo.

- Como podemos resolver qualquer coisa com essa pressa?

- Devo partir de Aldross amanhã. E o grão-duque marcou uma reunião para hoje à

noite, com o primeiro-ministro e os membros do gabinete, para discutirmos nossa posição

em relação à Alemanha.

Zita compreendeu que, se o pai tinha feito isso, era com a esperança de poder

anunciar que o casamento do rei com Sophie iria unir os dois países e, assim, aumentar sua

resistência a uma federação alemã. Como se as palavras lhe viessem aos lábios sem querer,

perguntou:

- Pretende casar com... a princesa Sophie?

Page 60: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Capítulo 5

Ouve um momento de silêncio. O rei perguntou. então:

- É isso que o povo de Aldross espera?

- Claro que é.

- Porquê?

- Vossa Majestade conhece a resposta. Não posso acreditar que não saiba, mais do

que qualquer outra pessoa, das ambições de Bismarck e da ganância da Prússia.

Maximiliano ergueu as sobrancelhas.

Zita percebeu que estava profundamente admirado por ela conhecer o aspecto da

visita dele.

O rei hesitou, como se preferisse dar uma resposta evasiva.

- Na realidade, resolvi que, hoje à noite, quando me encontrar com o gabinete

reunido, vou fazer uma proposta para uma aliança comercial mais forte entre nossos dois

países, o que envolveria também o problema da defesa.

Zita soltou uma exclamação de alegria, O rei continuou:

- Não vejo motivo para que essa aliança não se estenda aos outros principados e às

outras monarquias desta parte da Europa.

A moça mostrou-se ainda mais alegre.

- Quer dizer que também nós teríamos uma federação? Como Vossa Majestade é

inteligente! Como é que ninguém se lembrou disso?

Ao dizer tais palavras, achou que o pai e o primeiro-ministro tinham sido muito

obtusos por não pensarem antes numa federação.

- Parece razoável, já que temos tanta coisa em comum - respondeu o rei,

serenamente.

Os olhos de Zita brilhavam.

- É muito inteligente de sua parte! Tenho certeza de que as pessoas que estavam

preocupadas com a desmedida ambição da Prússia vão ficar muito satisfeitas.

O rei reclinou-se na cadeira, como se quisesse observá-la melhor sob outro aspecto.

- Como é que sabe tanto e se interessa por tais coisas?

Zita riu.

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- Agora, está sendo indelicado! O que está realmente querendo dizer é que a mulher

deve cuidar apenas de seu lar, de seu marido e de seus filhos.

- Como você não tem essas duas últimas coisas, creio que deveria estar ocupada com

a dança e, naturalmente, com sua beleza.

- Ainda tenho miolo na cabeça!

- Sei disso, e fico satisfeito por você aprovar meu plano.

- Não apenas o aprovo, como sei que o grão-duque e seus ministros vão ficar

encantados.

Ao dizer isso, pensou que, se era essa a maneira de o rei evitar seu casamento com

Sophie, sua mãe ficaria muito decepcionada.

Tais pensamentos deviam ter transparecido em seu rosto, porque Maximiliano

perguntou:

- Creio que você encontrou um probleminha. Qual é? Estou pensando que, em nossa

federação... e Vossa Majestade visa encontrar outro nome, porque não suporto a idéia de

copiar prussianos... não deve incluir a Bulgária, nem se aproximar muito dela.

O rei encarou-a como se achasse incrível tal observação.

- Como sabe disso?

Zita poderia ter respondido que um de seus parentes lhe havia dito que uma

organização subterrânea da Roménia estava em contato com os revolucionários búlgaros.

Mas, como tal fato não era do conhecimento público, respondeu, em tom despreocupado:-

Ouvi comentar, em algum lugar.

O rei inclinou-se para a frente, com os cotovelos na mesa.

- Está tornando as coisas ainda mais difíceis para mim, Zita.

- De que modo?

- Precisa me contar como sabe coisas que nenhuma moça do povo poderia saber. E

também como consegue sentar-se aqui, conversando comigo em pé de igualdade.

Zita deu uma risadinha.

- Se isso for verdade, Majestade, sinto-me... lisonjeada.

- Agora, não está sendo natural, e sim representando - disse o rei, asperamente. - E

estou decidido a saber a verdade.

- Já lhe pedi que deixe as coisas como estão. isto é um sonho e estamos sonhando

juntos. Se sair deste sonho, vai ficar decepcionado ou desiludido, e seria um erro.

- Você me surpreende, como me surpreendeu desde que a vi pela primeira vez, com

o sol brilhando em seus cabelos. Meu instinto me diz que nunca ficarei decepcionado.

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- Vossa Majestade vai partir amanhã, e isso não lhe dá muito tempo para perder as

ilusões.

O rei olhou para outro lado e Zita percebeu que estava reflectindo sobre o que dizer.

Achando que seria um erro apressá-lo, ela tirou um pêssego da cesta de frutas e

comeu-o, pensando que já estava na hora de voltarem para o palácio.

Seria um erro, se viessem a descobrir que ela e o rei tinham sumido ao mesmo

tempo.

Era pouco provável que alguém, sabendo que ambos tinham saído a cavalo, pensasse

que estavam juntos, mas sabia que no palácio haviam olhos e ouvidos onde menos se

esperava.

E haviam bocas também, prontas a contar à grã-duquesa qualquer coisa fora do

comum.

O rei pareceu tomar de repente uma decisão

- Como lhe disse, Zita, vou partir amanhã. Pretendia ir, em seguida, visitar a Bósnia,

mas mudei de idéia.

- Seria, naturalmente, o próximo país, em seu plano de defesa contra a Prússia.

- Sei disso, mas a Bósnia vai ter que esperar. Pretendo primeiro ir para um castelo

que possuo nas montanhas, a mais ou menos trinta quilómetros daqui.

- Sei a que se refere! Ao castelo de Kovac!

- Já ouviu falar nele?

- Ouvi dizer que é muito imponente e que foi usado pelos reis de Valdastien como

um forte inexpugnável de defesa contra os agressivos guerreiros de Aldross.

O rei deu uma risada.

- Tinha me esquecido disso. Hoje não há mais guerreiros lá, mas a vista é maravilhosa

e quero que você a aprecie.

Fitou-a bem nos olhos. Quando compreendeu o que ele sugeria, Zita teve a

impressão de que seu coração parava de bater. Encarou-o, mal acreditando que o rei a

convidava para ir para lá em sua companhia.

Maximiliano colocou a mão sobre a dela.

- Poderíamos ser muito felizes lá, no meu castelo no meio das nuvens, Zita. Acabo

de perceber que, sempre que fui para lá, fui sozinho. E isso aconteceu porque era você que

estava faltando.

Zita sentiu as vibrações do rei e achou que talvez ele sentisse as dela.

Em voz baixa e trémula, respondeu:

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- Será que Vossa Majestade está sugerindo uma coisa que sei que não é apenas errada,

como muito... insultuosa?

A mão do rei apertou a dela.

- Sabe que não é isso que pretendo que seja. Mas quero-a a meu lado, quero

conversar com você, ouvi-la falar e, acima de tudo, quero fazer amor com você, Zita.

A moça enrijeceu. Quis retirar a mão, mas o rei a prendeu mais ainda.

Dali a um momento, disse:

- Creio que compreende que fez uma sugestão com a qual não posso concordar e que

também é muito errada, do ponto de vista de Vossa Majestade, no momento actual.

O rei pareceu surpreso, e Zita continuou:

- Veio aqui numa missão de boa vontade, que interessa tanto a Valdastien como a

Aldross. O mínimo que pode fazer, se achar que sua missão está terminada, é informar seus

ministros sobre o que ficou resolvido. - Fez uma pausa e continuou, em tom firme: - Deve

também falar-lhes de sua nova idéia de estender a unificação dos países desta área até a

Bósnia e a Sérvia, assim como a certos principados pequenos que, como sabe, estão tão

envolvidos como nós.

Ao terminar, Zita percebeu que o rei a fitava como se mal pudesse acreditar no que

ouvia. Antes que ela dissesse as últimas palavras, ele observou, secamente:

- Devo acreditar que você me acusa de negligência?

- Não. De indiferença - respondeu Zita, irreflectidamente. - Se quiser ser franco, deve

reconhecer que está pondo seus interesses particulares na frente dos de seu país e do meu.

Notou a expressão atónita de Maximiliano. Depois, como se nada mais houvesse

para dizer, Zita levantou-se.

Se Vossa Majestade pagar o café, vou buscar os cavalos.

Não esperou pela resposta. Saiu do caramanchão e foi para diante da estalagem, onde

os animais pastavam tranquilamente sob as árvores.

Zita assobiou. Pegasus ergueu a cabeça e veio para perto dela. Após uma pequena

hesitação, o garanhão de Maximiliano o seguiu.

Antes que o rei saísse do chalé, depois de ter pago a conta, Zita já estava montada,

segurando a rédea.

Tinha montado sozinha de propósito. porque não queria que o rei a tocasse. Sabia

que ele estava perplexo com seu jeito de falar e que também devia estar zangado.

Tinha a desagradável sensação de que, se Maximiliano a tocasse, acharia difícil não

lhe pedir desculpas pelo que tinha dito. E, caso desculpasse, talvez isso o encorajasse a falar

de novo na ida dos dois ao castelo das montanhas.

Page 64: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

“Como ele ousou propor tal coisa?”

Mas sua indignação não era sincera.

Sabia que era a única culpada por Maximiliano tratá-la da mesma forma que tratara

dezenas de outras mulheres, criaturas que ele cortejava em Paris ou trazia para Valdastien,

como tinha trazido La Belle.

Compreendeu, desesperada, que o rei estragara a aventura mais excitante que ela

jamais tinha imaginado que pudesse lhe acontecer.

Mas era bastante honesta para compreender que havia provocado o incidente

desagradável; primeiro, fingindo ser garçonete na estalagem Golden Gross e, depois,

comportando-se de um modo íntimo e provocante.

Sua mãe a censuraria, mesmo que os dois estivessem conversando numa das salas do

palácio.

“Ele supôs que eu estivesse sob a protecção do homem que me deu Pegasus.

Embora eu tenha negado isso, creio que tal idéia ainda o preocupa, no íntimo. E acha difícil

compreender que eu não esteja disposta a aceitar o que me oferece.”

A porta da estalagem se abriu e Maximiliano apareceu. Quando desceu os degraus da

frente, Zita achou que não poderia haver um homem de aparência mais majestosa.

“É um rei, até a raiz dos cabelos!”

Mas era triste saber de uma coisa: que ela não parecia uma princesa e que ele nem

mesmo a julgava uma aristocrata.

“Não há razão para ele pensar que eu o seja.”

Ao mesmo tempo, achou lamentável que uma pessoa precisasse ter um rótulo para

que se soubesse quem era. E o rei devia ter sabido, instintivamente, que Zita não somente

era pura, como também respeitável demais para aceitar sua proposta.

Maximiliano aproximou-se, pegou a rédea de seu cavalo e montou.

Sem esperar por ele, Zita foi na frente, pelo caminho tortuoso que levava ao vale.

O rei seguiu-a, mas foi impossível conversar até chegarem ao campo.

Quando seu cavalo emparelhou com o dela, Zita deu uma chicotada em Pegasus, que

se pôs a galopar, satisfeito com o exercício e também por saber que se dirigiam para casa.

Maximiliano nada podia fazer, a não ser galopar também. Zita só puxou a rédea

quando achou que Pegasus devia estar cansado. Além do mais, as torres da capital já

podiam ser vistas, ao longe, assim como o palácio, fora da cidade.

Era imponente e bonito, ao sol.

Mas, para Zita, era como uma prisão à sua espera. E, depois que voltasse à sua cela,

nunca mais poderia escapar.

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Pegasus parou. Zita disse então:

- É melhor nos separarmos aqui, Majestade. Não devemos ser vistos juntos.

- Está pensando em sua reputação ou na minha? - perguntou ele, em tom

zombeteiro.

- Em ambas!

- Reconheço que isso é sensato, mas, ao mesmo tempo, não tenho intenção de

permitir que me deixe sem antes me dizer onde poderemos nos encontrar novamente.

- Não adianta fazermos isso.

- É o que você pensa. - como Zita não respondesse, ele perguntou: - Ficou

escandalizada com o que sugeri?

- Sabe muito bem que sim!

- Perdoe-me. Desejo desesperadamente estar com você, conversar com você. Mesmo

que não permita que lhe dê demonstrações de amor, quero estar em sua companhia.

- É uma coisa que não pode acontecer. Depois de nos despedirmos, nunca mais nos

veremos.

- Por que você me afasta sem uma explicação, sem me dizer por que motivo não

posso encontrá-la, Zita, apenas como cidadã deste país encantador?

- É uma pergunta à qual não posso responder. E não adianta insistir. - Fez uma pausa

e acrescentou: - Foi muito excitante, muito interessante, conhecê-lo. Mas não há futuro nos

sonhos, e por isso não nos encontraremos mais, depois que Vossa Majestade partir,

amanhã.

Ao dizer isso, Zita teve certeza de que o rei não pretendia casar com Sophie. Tinha

planejado uma aliança entre Valdastien e outros países, como um meio de evitar seu

casamento com uma princesa de Aldross.

Maximiliano olhou para ela e, dali a um momento, disse, com uma nota de desespero

que a surpreendeu:

- O que posso dizer? Como fazer com que compreenda o quanto desejo vê-la? Agora

que nos encontramos, não posso perdê-la.

- É uma coisa inevitável.

- Mas por quê? Por quê?

A moça olhou para o Sol, acima dos picos gelados, e disse:

- Creio que poderíamos ficar aqui, discutindo, o dia inteiro. De certo modo, seria

excitante. Mas há pessoas à sua espera e outras à minha espera, de modo que seria um

grande erro despertarmos a curiosidade delas sobre onde estivemos.

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- Está certo. Vou deixá-la. Mas com a condição de prometer que se encontrará aqui,

amanhã, à mesma hora. Não devo partir antes, de modo que estarei aqui às cinco.

- Se eu vier, sobre o que vamos falar?

O rei deu uma risada.

- O que está tentando dizer, indirectamente, é que vou tentar convencê-la a ir

comigo, depois que me despedir do grão-duque, na Estalagem Golden Cross. Se eu

prometer falar de tudo, menos disso, virá ao meu encontro?

Zita reflectiu que seria muito difícil evitar aquele assunto especial, estaria no

pensamento de ambos, dissessem eles o que dissessem. Achando difícil afastá-lo

definitivamente, respondeu:

- Prometo que virei, se for possível. Não sei... Hoje de manhã, consegui escapulir

enquanto todos dormiam.

- Assim como eu - observou o rei, sorrindo. - Dê-me sua mão.

Zita estendeu-lhe a mão. Os cavalos estavam muito juntos, parados devido ao

cansaço. Maximiliano tirou a luva de Zita e beijou-lhe a mão.

Ela sentiu a pressão dos lábios do rei e, instintivamente, apertou a mão dele.

- Não existem palavras, nem seriam necessárias, para expressar o quanto desejo vê-la

novamente, Zita. Digo mais: se você não vier, entrarei em contato com você, seja como

for, e nos encontraremos, por maiores que sejam as dificuldades.

Qualquer coisa no tom dele fez com que Zita tivesse medo.

- Sei que posso entrar em contato com você, por intermédio de alguém da Estalagem

Golden Cross - continuou o rei. - Mas prefiro que me diga onde poderemos nos encontrar,

ou para onde poderei escrever, sem despertar suspeitas.

- Não há outro jeito, a não ser através da Estalagem Golden Cross.

- Isso não é verdade, mas creio que sou obrigado a me contentar em saber que, pelo

menos, a encontrarei lá.

Zita não respondeu. O rei ainda segurava sua mão e beijou-a de novo.

- Sabe tão bem como eu, Zita, embora tenha me lembrado de meus deveres de rei,

que sou também um homem, e sujeito às mesmas emoções de um homem qualquer.

Beijou de novo a mão de Zita, virando-a depois e beijando a palma.

A moça teve uma sensação que nunca tinha experimentado antes. Foi como se um

choque subisse por seu braço, passando pelos seios e indo até o coração.

Era emocionante, mas tinha também algo de espiritual, que não sabia explicar.

Encabulada e ao mesmo tempo alarmada, Zita retirou a mão. Nisso, Pegasus se

moveu, de modo que o rei não pôde prender a moça.

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Os olhos dela pareciam muito verdes e brilhantes.

- Adeus - disse, suavemente.

- Au revoir, Zita.

“Ele diz até à vista porque não vai desistir”, pensou. Entreolharam-se por um

momento e com isto disseram muito mais do que poderiam com palavras.

Percebendo que o tempo passava, ela fez o cavalo andar. Sabia que poderia

aproximar-se do palácio de vários modos e que não havia perigo de tornar a encontrar o

rei, que entraria pelo portão da frente.

Fez o cavalo andar depressa, decidida a levá-lo para a cocheira antes que Maximiliano

chegasse á porta da frente, onde os lacaios estariam à sua espera.

Só quando já estava no quarto, viu que não eram oito horas e que, portanto, a criada

ainda não tinha vindo chamá-la.

Tanta coisa acontecera, desde seu primeiro encontro com o rei, que poderia acreditar

que tinham se passado dias, anos, um século.

Tirou o traje de montaria e deitou-se, pensando em Maximiliano e em sua sugestão

de levá-la para o castelo no morro.

“Se eu não fosse quem sou, seria muito emocionante.” Mas não devia nem pensar

em tal coisa. Se o acompanhasse, seria igual a La Belle e às outras mulheres de quem

madame Goutier lhe falara e que tinham conseguido os favores do rei por algum tempo,

sendo depois descartadas e substituídas.

Ficou imaginando se elas se sentiriam humilhadas e infelizes.

Depois, teve certeza de que qualquer mulher que tivesse tido intimidade com o rei

ficaria desolada, se o perdesse, como se a luz desaparecesse de sua vida, deixando-a

mergulhada em sombras.

“É horrível eu pensar assim!”

Mas a verdade era que, por mais que tentasse ficar zangada com ele, sabia que quem

brinca com fogo pode se queimar.

“Nunca mais vou encontrar um homem tão atraente, tão fascinante. .

Só o facto de estar com ele tornava sua mente mais viva. E seu corpo conhecia uma

excitação estranha, misteriosa.

Imaginou se seria assim que as outras mulheres do rei se sentiam, sabendo que seu

tempo ao lado dele era curto e que só conseguiriam prendê-lo enquanto as achasse bonitas

e desejáveis.

Sabia que ele fazia amor com elas, embora não soubesse bem o que isso significava.

O que teria sentido, se o rei lhe beijasse os lábios, em vez da mão?

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Aquele beijo havia despertado nela uma sensação nova e violenta, meio prazer, meio

dor. Talvez fosse a isso que as pessoas se referiam, quando falavam do êxtase do amor.

De repente, ficou imóvel.

A palavra “amor” pareceu impressa em sua mente com letras de fogo.

O que sentia podia ser amor? E, neste caso, que tipo de amor seria?

Embora o rei tivesse dito que queria que fosse com ele ao castelo e que desejava dar-

lhe demonstrações de amor, não havia dito que a amava.

Nem ela pensara, naquele momento, que era a isso que ele se referia.

Amor!

A palavra estava sempre em seus sonhos. Mas, quando se viu na companhia do rei,

Zita não pensou nela.

Queria vê-lo, olhar para ele. E conversar com ele era estimulante. Mas, como se

tratava de um rei, não pensou nele como homem, um homem que poderia amar e que, por

sua vez, poderia amá-la.

Durante todo o tempo em que estiveram juntos, Zita gostou do subterfúgio de fazer

com que ele acreditasse que era um garçonete da Estalagem Golden Cross. Tinha atiçado a

curiosidade de Maximiliano e evitado suas perguntas com a perícia de um duelista que

encontrou um adversário à altura.

Agora, aquilo que havia sido uma fantasia, um jogo, de repente se tornava sério.

O rei a convidara para ir para seu país, para o castelo do qual Zita ouvira falar muito,

porque tinha um papel na história tanto de Aldross quanto de Valdastien.

Achava que seu pai nunca o visitara. Um castelo no meio das nuvens!”

Devia ser muito excitante conhecê-lo em companhia do rei, ficando a sós com ele,

como tinham ficado no caramanchão, conversando como nunca poderiam ter conversado

no palácio.

“Mas está tudo acabado, e seria um erro nos encontrarmos de novo, amanhã”

Lembrou-se então de que prometera ir e sentiu novamente o beijo do rei na palma da

mão.

Olhou para a mão, como se esperasse ver ali a impressão dos lábios dele.

“Estou apaixonada? Isso é amor? O que é o amor?”

As perguntas se sucediam. Não conseguindo ficar deitada, tal sua inquietação,

levantou-se e foi para a janela, onde ficou olhando as montanhas, ao longe.

Imaginou o que seria ver-se sozinha com o rei, no castelo, com os morros de picos

gelados acima deles e a vista maravilhosa de Valdastien, lá embaixo.

Pôde ouvir de novo a voz de Maximiliano:

Page 69: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

“Quero fazer amor com você!”

O dia pareceu lento, quase interminável, desde o momento em que a criada veio

chamar Zita até a hora em que ela sabia que o rei iria encontrar o primeiro-ministro e os

outros membros do gabinete, para discutirem negócios de Estado.

A essa altura, Zita tinha certeza de que seus pais sabiam que Maximiliano não

pretendia pedir a mão de Sophie. E a própria Sophie devia saber também.

Como se esse pensamento tivesse atraído a irmã, Zita viu Sophie entrar no quarto.

Usava um dos vestidos novos feitos para a visita do rei. Seus cabelos estavam

penteados conforme a sugestão de Zita, que foi criticada pela mãe, quando deu tal

conselho.

Mas a expressão da moça não condizia nem com o vestido nem com o penteado;

parecia emburrada, decepcionada e mal-humorada.

- O que aconteceu? - perguntou Zita quando a irmã atravessou o quarto e sentou-se

diante dela.

- Papai vai acompanhar o rei a um jantar e mamãe e eu ficaremos em casa.

- Não parece muito interessante. Você não gosta de política, Sophie, e é sobre isso

que eles vão falar.

Percebeu que a irmã não a ouvia. Dali a um momento, Sophie disse, apressadamente:

- O rei não falou em casamento com papai nem comigo!

- Sinto muito. Está decepcionada?

- Não muito. Mamãe está bastante zangada. Diz que o rei não tinha o direito de vir

aqui, dando-nos esperança, mas eu o achei intimidador e muito maçante. Quando falava

comigo, parecia estar pensando em outra coisa. - Olhou para Zita e continuou: - Vou pedir

a mamãe que convide o margrave de Baden-Baden para vir se hospedar aqui. Tenho

certeza de que ele me fará a corte, que é realmente o que desejo.

- Então, espero que vocês casem e sejam muito, muito felizes,

- Não creio que uma mulher possa ser feliz com o rei. Mamãe diz que ele não apenas

é egoísta, como tem má reputação. E eu não gostaria de casar com esse tipo de homem.

- Também creio que ele faria uma mulher infeliz - disse Zita, em voz baixa.

- Vou jantar com mamãe - . avisou Sophie, levantando-se. - Você deve ficar aqui.

Caso o rei apareça inesperadamente, não pode vê-la.

- É pouco provável que apareça, mas estou satisfeita aqui, com meu livro.

Zita falou em tom despreocupado, achando que Sophie ia sorrir dessa idéia, mas a

irmã saiu do quarto sem nada dizer, fechando a porta.

Page 70: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

- Então, o rei escapou - murmurou Zita.

Pela primeira vez, ocorreu-lhe a idéia de que, já que não ia casar com Sophie, talvez

quisesse casar com ela, Zita. Depois, lembrou-se do que havia dito sobre uma esposa

húngara. Achou que, embora quisesse levá-la para o castelo da montanha, estava

convencido de que o temperamento húngaro, “impetuoso, impulsivo e emotivo”, não era

adequado a uma rainha.

- Creio que sou tudo isso - murmurou, com tristeza.

Sempre achara difícil ser calma, prosaica e controlada, como a mãe.

“A verdade é que não tenho ambição de ser rainha. Se o homem que eu amasse fosse

rei, eu participaria de sua vida como se fôssemos gente comum, e não como governantes

de um país, sempre à disposição dos súbditos.”

Lembrou-se de como o pai gostava de viajar sozinho, sem todos os encargos de um

monarca.

Era isso que Maximiliano fazia, de um modo um pouco diferente, quando ia para

Paris.

Depois que Sophie casasse com o margrave, talvez ela, Zita, encontrasse um grão-

duque sem importância ou um príncipe que também não gostasse de pompa.

Teve a desagradável sensação de que nenhum homem por quem se interessasse, ou

que se interessasse por ela, poderia atraí-la tanto quanto o rei.

Era magnífico, montava muito bem, e havia aquelas vibrações entre eles e a magia de

lerem os pensamentos um do outro.

“Não estou apaixonada! Não estou!”, queria gritar.

Mas tinha a impressão de que isso era bravata e de que, ao se despedir do rei, naquela

manhã, deixara com ele seu coração.

Zita jantou sozinha. sendo servida por um lacaio que mal continha bocejos, devido à

hora tardia em que o baile terminara, na véspera. Quando colocou diante dela a bandeja de

prata com o café, o homem disse:

- Há um bilhete de Sua Alteza, que esqueci de trazer antes.

Zita ficou surpresa, mas reconheceu a letra do pai. Abriu o bilhete e leu:

“Desejei ir vê-la, meu bem, antes de sairmos para o jantar, mas não foi possível,

porque me atrasei.

“Resolvi que você e eu vamos iniciar nossa excursão amanhã cedo, assim que o rei

partir.

Page 71: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

“Se nos atrasarmos, é bem possível que haja um impedimento para nossa partida, no

último momento, o que seria decepcionante.

“Sugiro, portanto, que você me encontre na Estalagem Golden Cross, para onde

deve ir acompanhada por um cavalariço, é claro.

“O rei vai seguir directamente para Valdastien. Depois que eu tiver trocado de roupa,

iniciaremos nossa aventura.

“Vou deixar um bilhete para sua mãe e sugiro que você faça o mesmo.

“Deus a abençoe, querida filha.

Seu afectuoso

Pai.”

Zita ficou olhando para o papel e leu muita coisa nas entrelinhas.

Evidentemente, a grã-duquesa ficaria furiosa, se percebesse que o marido ia levá-la

numa de suas excursões. Mas nada poderia fazer, se só tomasse conhecimento disso depois

que eles tivessem partido.

Achou que tal estratégia era muito inteligente por parte do seu pai e que ela teria

planejado as coisas da mesma forma.

O grão-duque acompanharia o rei até a Estalagem Golden Cross. Lá, seu criado de

quarto já teria à sua espera o traje nacional que ele costumava usar nas excursões. Logo que

trocasse de roupa, partiria com Zita, sem que ninguém soubesse para onde iam.

“Papai é tão bom conspirador quanto eu.

Gostaria de poder contar-lhe como tinha enganado o rei, primeiro aparecendo como

garçonete e, depois, surgindo sozinha, montando Pegasus. E contar que ele, sem ter a

menor idéia de que estava falando com uma princesa, a convidara para lhe fazer companhia

no castelo das montanhas, no meio das nuvens!

Era uma história fascinante, mas sabia que o pai ia ficar zangado com o que

certamente consideraria uma impertinência por parte de Maximiliano.

Provavelmente, se sentiria insultado por sua filha ter sido confundida com o tipo de

mulher que aceitava semelhante convite.

“Infelizmente, não posso contar a papai. Mas sei que ele gostaria de saber como fui

inteligente.”

Agora, tinha muito que fazer, antes de ir para a cama. Saiu da sala de estudo para ir

preparar tudo para a excursão.

Page 72: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Ao voltar para o palácio, na véspera, guardara seu vestido de camponesa numa gaveta

fechada à chave, em seu quarto. Tirou-o da gaveta e percebeu que, na pressa de trocar de

roupa na estalagem, tinha trazido na trouxa o avental de Gretel.

Precisava devolvê-lo. Seria fácil, pois iria à estalagem ao encontro do pai, tendo que

deixar ali seu traje de montaria, para quando voltasse da excursão.

Quando estava na montanha com o pai, Zita sempre usava o traje de camponesa,

mesmo quando andava a cavalo.

Era muito mais prático do que estar constantemente trocando de roupa. Assim

sendo, tudo o que precisava levar podia ser guardado dentro do alforje. Além de uma

camisola, costumava levar mais duas blusas, roupa de baixo, escovas e pentes.

Agora, ao fazer sua trouxa, não se esqueceu das fitas para os cabelos, além de vários

pares de meias brancas. As meias iam até os joelhos. Eram mais confortáveis, assim como

os sapatos de salto baixo e fivela prateada, do que as botas que usava com a montaria.

Sentindo-se livre em seus trajes de camponesa, achava que simbolizavam a liberdade

que tinha nas excursões com o pai.

Imaginando que viajavam “incógnitos”, saíam ao encontro de pessoas muito mais

divertidas e certamente mais felizes do que as que encontravam no palácio.

Zita reflectiu que não havia hipótese de poder sair a cavalo de madrugada, para ir ao

encontro do rei.

Pegasus ia ter um longo dia, indo até à estalagem e depois andando muitas horas

mais.

Seria, na realidade, uma viagem muito mais longa, pois seu pai pretendia ir até à

montanha mais distante.

Talvez tivessem que dormir no caminho.

Achou que o grão-duque escolhera aquela montanha porque nunca tinha estado lá, e

não haveria ninguém que ele conhecesse ou que o conhecesse.

Compreendia que seria embaraçoso para ele encontrar seus “amigos especiais”,

quando acompanhado pela filha.

Depois, reflectiu que, se o pai tinha segredos, também ela os tinha. Precisava ser

cautelosa.

Caso ele quisesse namorar alguma bonita estalajadeira, como acontecia no passado,

procuraria ser discreta e desaparecer, para não interferir.

“É o único divertimento que o pobre papai tem...

Page 73: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Embora achando censurável, por ele ser um homem casado, compreendia sua

necessidade de fugir, de vez em quando, da monotonia do palácio e de uma esposa que

sempre o criticava.

Pensou que gostaria de poder casar com um plebeu, um homem que passasse a vida

rindo e cantando.

Compreendeu depois que era inteligente demais para se contentar com um homem

comum e que, quando tinha oportunidade de ouvir o primeiro-ministro e outros membros

do gabinete, achava a conversa muito interessante e esclarecedora.

Enquanto preparava a roupa que ia usar no dia seguinte, pensou que achava qualquer

conversa com o rei Maximiliano uma experiência emocionante, de certo modo ligada à

excitação que sentira quando ele lhe beijara a mão.

O contacto dos lábios dele a fizera vibrar. Estar na companhia do rei era muito

diferente do que estar junto de qualquer outro homem.

Talvez fosse uma coisa que nunca mais encontraria. Seria amor? Não podia

responder, mas não havia dúvida de que a pergunta se impunha.

Sentindo medo, teve vontade de fugir e nunca mais pensar nisso.

Page 74: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Capítulo 6

Cavalgando pelo sopé da montanha, ao lado do pai, Zita devia estar mais feliz do que

nunca, mas qualquer coisa impedia que essa aventura fosse tão maravilhosa como esperava.

Todas as manhãs, ao acordar, tinha a impressão de que havia uma pedra no lugar do

coração.

Embora os dois rissem e pilheriassem, embora galgar uma nova montanha fosse

emocionante, faltava algo.

À noite, sozinha no quartinho da hospedaria, seus pensamentos se voltavam para o

rei.

Imaginava se teria sido desnecessariamente cruel, não indo ao encontro dele, como

havia prometido.

Teria esperado muito, na esperança de que ela aparecesse?

Depois, um tanto céptica, dizia a si mesma que, naturalmente, ele não a havia

esperado muito, nem se importado por ela não aparecer.

Por que se importaria com uma mulher, quando tinha dúzias de todos os tipos,

ansiosas por caírem em seus braços?

Achou que o rei se interessara por ela apenas por achá-la imprevisível. E o facto de

não encontrar uma explicação para a aparência ou a inteligência de Zita certamente o

irritara.

Julgando-se muito intuitivo e perspicaz, Maximiliano esperava poder avaliar

imediatamente qualquer mulher, assim que a conhecia. E, provavelmente, raras vezes se

enganava.

“Talvez tenha ficado decepcionado comigo, e isso lhe fará bem.” Ao mesmo tempo,

sabia que, nessa competição desigual, ela é que saíra ferida. Mas dizia a si mesma que isso

acontecia por falta de experiência. Como conhecia poucos homens atraentes, com certeza o

rei lhe parecia mais fascinante do que realmente era.

“Se eu já tivesse estado em Paris, ou mesmo na Inglaterra, provavelmente teria

conhecido pelo menos uma dúzia de homens tão atraentes como ele. Pelo menos, não o

acharia tão especial, a ponto de não conseguir esquecê-lo.”

Page 75: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Embora durante o dia se esforçasse para dar atenção ao pai. sabia que em tudo o que

dizia ou fazia estava a lembrança do rei.

Ao mesmo tempo, era uma delícia cavalgar livremente, sabendo que, à noite, não

teria que ver a mãe, que sempre tinha alguma censura a lhe fazer.

As coisas não tinham corrido totalmente de acordo com o planeado. Para começar,

Maximiliano se atrasara ao sair do palácio. Enquanto esperava que as carruagens chegassem

à Estalagem Golden Cross, Zita não pôde deixar de pensar se estariam atrasados por causa

da demora do rei, que talvez tivesse ficado esperando por ela.

Reflectiu, em seguida, que estava querendo ser mais importante do que realmente era.

Mas... certamente ele devia ter ficado irritado por ela não obedecer às suas ordens. E

mais aborrecido ainda por perceber que jamais descobriria o segredo da imprevisível

garçonete.

Como havia a chance de o rei lhe escrever, ou perguntar sobre ela na estalagem, foi

forçada a confiar em Gretel.

- Você tornou a ver o rei? - perguntou a moça. - Que emocionante! O que ele disse?

- Foi por acaso que nos encontramos. Tínhamos ambos saído a cavalo.

- Ele pediu a princesa Sophie em casamento?

Zita fez que não.

- Garanto que a culpada foi você! - exclamou Gretel.

Zita riu.

- Creio que a verdade é que o rei não quer casar com ninguém. Afinal, já é um

solteirão.

- É verdade. E os viajantes que se hospedam aqui falam muita coisa sobre as actrizes

e mulheres desse tipo que ele recebe no palácio. Mas eu não devia dizer isso a você.

- Por que não? Também ouvi falar dessas coisas.

Gretel pareceu surpresa.

- Para nós, foi emocionante ver o rei, pessoalmente. Mas, se não vai casar com a

princesa Sophie, creio que nunca mais virá a Aldross.

- Por que diz isso? - perguntou Zita, admirada.

- Porque ele fica muito ocupado em outro lugar, quando sai de Valdastien.

- Em Paris!

- E quem pode censurá-lo? - perguntou Gretel. - Na França, compreendem o que um

homem quer, em matéria de divertimento. Que temos nós a lhe oferecer, a não ser umas

danças típicas e montanhas cobertas de neve?

Page 76: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Zita riu, mas achou que era verdade, os países pequenos como Valdastien e Aldross

deviam ser muito monótonos para um homem que gostava de aventuras.

Dali a uma hora, o rei chegou com o grão-duque. Trocou de carruagem e partiu para

seu país, sem entrar na estalagem.

Observando-o de uma janela do andar de cima, Zita pensou que ele não tivera nem

mesmo a curiosidade de perguntar se ela ainda estava ali. A amizade dos dois, se é que se

podia chamar assim, terminara.

O grão-duque entrou apressadamente no quarto que antes havia sido ocupado por

Maximiliano.

- Desculpe o atraso, querida. O rei se atrasou, ao café da manhã, e o primeiro-

ministro também insistiu em falar com ele mais uma vez. - Atirou na cama o chapéu e

continuou: - Só Deus sabe por que os estadistas sempre têm mais uma palavrinha para

dizer, assim como, antes, pessoas, que invariavelmente acrescentam um pós-escrito às

cartas.

Zita riu.

- A questão, papai, é que não são tão inteligentes como nós. Assim sendo, as coisas

importantes que deviam ter dito em primeiro lugar só lhes ocorrem quando estão na cama,

ou no banho.

O pai deu uma gargalhada.

Depois, enquanto ele trocava de roupa, a moça foi procurar Gretel, no quarto

pegado.

O grão-duque e a filha deixaram suas roupas na estalagem, tomaram um copo de

vinho oferecido pelo proprietário e partiram, excitados com a perspectiva do que os

esperava.

- Não vamos chegar a tempo ao lugar onde eu pretendia ficar hoje à noite - disse o

pai. - Mas podemos parar no meio do caminho para olhar o lago onde você aprendeu a

nadar.

- Seria óptimo! A estalagem de lá é muito agradável.

Na verdade, era mais confortável do que Zita se lembrava e servia uma comida

deliciosa. Ficaram lá três noites.

Subiam a montanha e depois Zita tomava banho no lago, que continuava o mesmo,

não tendo sido estragado pela presença de turistas.

Às vezes, no inverno, as torrentes modificavam o cenário nas encostas dos morros,

mas o lago continuava parecendo um espelho azul reflectindo o céu. Os rochedos cobertos

de pinheiros desciam até à água.

Page 77: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Era tudo tão belo, que ela achou que parecia um conto de fadas. Enquanto nadava,

pensava o que sentiria, se o homem amado estivesse a seu lado. Depois do banho, ficariam

ao sol, à beira do lago, falando de seus sonhos e, naturalmente, de seu amor.

Então, procurava se convencer de que tinha tudo o que queria, estando na

companhia do pai.

Além do mais, era pouco provável que encontrasse um homem de sua classe social

que não ficasse horrorizado com a idéia de sua mulher nadar num lugar público, embora

ninguém a visse, a não ser ele.

“Tenho muita sorte de papai não ser convencional. Como posso ser ingrata a ponto

de querer a companhia de outra pessoa, além da dele?”

Mostrou-se muito afectuosa com o pai, sabendo que o fazia feliz e que ele se divertia

na excursão.

- São as primeiras férias que tenho, há muito tempo - disse o grão-duque.

- Sim, parece mesmo que estamos em férias. Mas sei que, no ano passado, o senhor

desapareceu durante quase uma semana e mamãe se mostrou tão desagradável que todos os

criados do palácio falaram em ir embora!

- Agora me lembro. Mesmo assim, parece que faz muito tempo que não me sinto tão

livre.

- Vamos aproveitar ao máximo!

No dia seguinte, saíram de manhã bem cedo e almoçaram num chalé onde os

alpinistas costumavam dormir, quando escalavam a montanha. A comida era muito

simples, mas suportável.

Havia lá dois homens que iam tentar chegar ao pico. O grão-duque conversou com

eles, que aceitaram respeitosamente seus conselhos sobre a melhor maneira de tentar a

escalada, embora Zita tivesse quase certeza de que não haviam reconhecido o soberano.

Quando o sol esquentou, pai e filha se puseram de novo a caminho. O grão-duque

indicou uma montanha que parecia mais alta do que as outras, onde as neves de inverno

não apenas cobriam os picos, como podiam ser vistas nas rochas mais abaixo.

- Parece alta demais, papai!

- E é. Maximiliano me disse que é mais alta do que qualquer montanha de Valdastien.

- O rei já a escalou?

- Talvez, já que me disse que a estalagem onde vamos ficar é bastante confortável.

Imediatamente, Zita ficou imaginando se o rei teria ido lá incógnito; talvez, em

companhia de alguma mulher bonita.

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Como tinha uma quedinha por actrizes, era pouco provável que estas apreciassem o

desconforto da vida no campo e de suas estalagens.

Imaginou-as perfumadas e cheias de jóias, apreciando o luxo de tapetes grossos, de

quartos luxuosos, e gostando de ser servidas por vários criados.

Se, antes de ficarem famosas, tinham tido uma vida sem conforto, certamente não

iam querer que isso agora se repetisse.

Com Zita, acontecia o contrário. Gostava do soalho de madeira nu, a não ser talvez

por um ou outro tapete de pele de urso ou de carneiro; gostava das camas com grades, as

preferidas dos camponeses, porque eles podiam puxar para bem perto o cortinado, nas

noites de inverno; gostava dos colchões de penas de ganso. E lavar-se com água fria

certamente não era sacrifício, no verão.

- Por que está tão séria, querida? - perguntou o grão-duque.

- Sinto falta de suas risadas.

- Para dizer a verdade, estava pensando como tenho sorte de estar aqui com o senhor

e de gozar uma vida simples, nós mesmos nos servindo, sem ter ninguém para nos amolar

ou nos recriminar por nossa aparência.

O grão-duque deu uma risada.

- Garanto que sua mãe acharia muito censurável eu preferir um lenço de seda ao

pescoço, em vez de uma gravata, e andar a cavalo em mangas de camisa, quando faz calor.

- Neste momento, não estou preocupada com minha aparência, e sim com meu

estômago. Estou com fome. Só espero que nos sirvam um jantar substancial, quando

chegarmos à hospedaria.

O almoço dos dois constara quase que só de leite de cabra!

- A julgar pelo que disse Maximiliano, a comida é excelente, de que espero não me

decepcionar.

De novo o nome do rei causou uma estranha sensação em Zita. sempre tinha sentido

isso, desde o momento em que o conhecera na Estalagem Golden Cross.

Sentiu, agora, que um capítulo de sua vida tinha sido encerrado e não haveria menção

do rei nos capítulos seguintes.

Dali a uma hora, o Sol desceu no horizonte e o calor diminuiu. Deixaram o vale e

começaram a subir a encosta da montanha.

Havia um caminho sinuoso no meio dos pinheiros. Continuaram até Zita achar que

tinham perdido o caminho.

Iam devagar. Finalmente, avistaram mais acima um chalé atraente, com janelas de

rótula, que parecia saído de um livro de gravuras.

Page 79: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

- Encontramos, papai! E é lindo!

Havia mesas e cadeiras do lado de fora da hospedaria, e viajantes estavam sentados,

tomando vinho.

Isso era muito comum nas estalagens das montanhas, nessa altura do ano. Mas, como

aquela era muito isolada, Zita viu que ela e o pai seriam os únicos hóspedes.

Levaram os cavalos para os fundos; as cocheiras eram primitivas, mas adequadas.

Como não havia nenhum cavalariço, Zita levou Pegasus para uma baia onde havia

bastante água, o que indicava que as cocheiras estavam em uso.

Tirou-lhe o arreio e a rédea, afagou-lhe o pescoço e fechou a porta, vendo em

seguida que o pai já tinha cuidado de seu cavalo.

Dirigiram-se para o chalé, que ficava a pequena distância. Em vez de ir para a porta

da frente, o grão-duque entrou pela cozinha.

Bateu num tabique de madeira, dizendo, em voz alta:

- Há alguém para dar as boas- vindas a um viajante cansado?

Ouviu-se uma voz feminina, chamando alguém. Depois uma mulher apareceu no

corredor que dava para a frente da casa.

No momento em que ela surgiu, Zita achou que já a conhecia de algum lugar. A

mulher sorria e, ao ver o grão-duque, soltou uma exclamação:

- Não! Não pode ser verdade!

- Névia! - disse ele, estendendo-lhe as mãos.

Zita se lembrou, então, de que Névia era a mulher bonita que tinha ficado tão

contente por ver o grão-duque, anos antes, quando ele e a filha viajavam por outra parte do

país.

Lembrava-se também de que o pai havia dito:

- Sempre cumpro minhas promessas, Névia, e desta vez trouxe minha filha para

conhecer a mulher mais bonita de Aldross!

Névia os havia instalado confortavelmente, naquela ocasião. embora mais velha,

continuava muito bonita. Seus olhos brilharam, quando os ergueu para o grão-duque.

- Mal posso acreditar! Pensei em você, muitas vezes, mas tinha certeza de que nunca

viria aqui!

- Voltei uma vez ao lugar onde você morava, mas não estava mais lá.

- Foi por causa de Rudolph - contou Névia, em voz baixa. - Ficou tão enciumado

que fez questão de mudarmos para um lugar onde achou que você jamais me encontraria.

- Bem que tentei - disse o grão-duque, com simplicidade. Acrescentou, em tom

diferente: - Talvez seja embaraçoso para você, se minha filha e eu nos hospedarmos aqui.

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- Rudolph morreu num acidente, há um ano, ao escalar uma montanha. Agora, sou a

dona de tudo. Dirijo isto aqui com a ajuda de várias moças boazinhas e de um sobrinho,

que aprendeu o ofício.

- Deu um largo sorriso. - Graças a Deus, não temos nenhum hóspede, no momento,

de modo que meus melhores quartos estão vagos. Assim, posso cuidar bem de você e da

Fraulein.

Como se, de repente, se lembrasse da presença de Zita, virou-se para ela e disse:

- Como cresceu! Não é mais a garotinha que conheci.

- Todos nós envelhecemos - observou o grão-duque. - Infelizmente, é uma coisa que

não podemos evitar.

Falou em tom de brincadeira, mas Zita notou em sua voz uma nota de excitação.

Ao olhar para o pai, achou que não só estava bonito como sempre, mas parecia mais

moço.

O grão-duque foi instalado num quarto grande e confortável, que dava para a frente

do chalé. Zita foi levada para um outro, que Névia não parecia considerar bastante bom

para a moça, mas que tinha uma bela vista para o vale.

- Espero que fique bem acomodada, aqui. E, por favor, peça o que quiser. Não sei

dizer como me sinto feliz por vê-la e a seu digno pai.

Zita tinha certeza de que a mulher conhecia a identidade do grão-duque, mas que

fingia desconhecer sua posição, só para que ele ficasse satisfeito.

Depois de se lavar, a moça colocou fitas nos cabelos, pois não as usava quando

andava a cavalo. Desceu e viu que tinham arrumado uma mesa de jantar para ela e o pai, no

jardim. Ficava parcialmente oculta por arbustos e fez com que Zita se lembrasse do

caramanchão onde se sentara com o rei, surpreendendo-se e confundindo-o com as coisas

que dissera.

Ocorreu-lhe que tinha sido muito tola, não indo encontrá-lo mais uma vez.

Mas teria sido quase impossível, para ela, pegar outro cavalo na cocheira, em vez de

Pegasus, pois talvez tivesse dificuldade em arreá-lo.

Pensou no rei, que agora devia estar viajando para a Bósnia.

Talvez encontrasse lá a noiva que procurava. Então, só o que Zita viria a saber dele

seriam os mexericos.

Se não encontrasse uma noiva na Bósnia, ele iria para a Sérvia. Conforme Zita lhe

disse, ainda faltavam vários principados para serem visitados.

Em todos esses lugares, certamente haveria mulheres atraentes, dispostas a casar com

ele ou a permitir que lhes desse demonstrações amorosas.

Page 81: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

“Para quem me estou reservando?”

Percebeu que o pai observava Névia, que trazia a comida, com uma expressão

bastante reveladora.

“Ela o atrai, assim como meu pai a atrai. E não há nada mais natural do que eles

procurarem ser felizes juntos. Por que haveria de ser errado?”

A comida estava deliciosa e o vinho da região também era excelente. Zita notou que

o pai falava com um tom de voz mais profundo e diferente do que jamais ouvira nele.

Percebeu também que ficava animado, sempre que Névia aparecia. A mulher sentou-se ao

lado do grão-duque e disse:

- Conte, agora, tudo o que fez depois que nos vimos pela última vez. Senti muito sua

falta. Não sei dizer o quanto senti sua falta!

- Você está ainda mais bonita.

Zita tomou seu café em silêncio. Depois, sem uma palavra. saiu, para que os dois

pudessem conversar mais à vontade.

Sabia que seria falta de tacto ficar. Queria que o pai se divertisse. Disse a si mesma

que, naquela noite, se acordasse, não devia estranhar os risos abafados que, em outras

ocasiões, ouvia, vindos do quarto do pai.

Afastou-se do chalé, seguindo um dos caminhozinhos por entre os pinheiros, que

durante anos eram usados pelas pessoas que subiam e desciam a montanha.

O Sol, no ocaso, tinha um maravilhoso brilho rubro, e o ar cheirava a pinheiros.

Sentiu que ela fazia parte da mata, da natureza, e que a vida que nela pulsava era da

natureza também, pois tudo vinha da mesma fonte.

Continuou a caminhar pelo atalho tortuoso atrás do chalé, chegando a um ponto

onde a rocha estava nua, sem nenhuma vegetação.

A queda de algumas rochas tinha, arrastado as árvores, de modo que dali se via

perfeitamente o vale. Uma névoa vinha subindo, começando a envolver tudo e fazendo

com que a paisagem parecesse parte de um sonho.

Achou que tão grande beleza jamais poderia ser reproduzida numa tela, nem mesmo

pelos maiores artistas.

Era tudo tão perfeito, que Zita desejou poder fazer parte daquilo. Apenas uma

pessoa no mundo poderia sentir o que sentia, mas não soube explicar a si mesma por que

tal pensamento lhe ocorreu.

“Nós dois não tivemos tempo de discutir a beleza.”

Tinha sido estúpida, ao provocar Maximiliano, em vez de procurar partilhar com ele

os sentimentos que, tinha certeza, ambos possuíam.

Page 82: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Achando aquela beleza intolerável, resolveu voltar para o chalé.

Então, percebeu que alguém se aproximava.

Ouviu passos e depois notou que um homem vinha naquela direcção, caminhando

no meio das árvores.

Ficou aborrecida com aquela intrusão.

Seria muito maçante ter que parar e falar com o desconhecido, como era hábito na

região.

Tinha consciência apenas da beleza do vale e da dor em seu coração por não poder

partilhar tudo aquilo com o rei.

Enquanto hesitava, sem saber se, caso virasse as costas, o desconhecido continuaria

seu caminho sem lhe dirigir a palavra, ele apareceu por entre as árvores.

Zita achou que só podia estar imaginando coisas.

Mas, quando o homem chegou mais perto, ela viu que, por incrível que parecesse, era

de fato o rei que ali estava!

Por um momento, ficou paralisada. Depois, ele sorriu, e Zita se esqueceu de tudo, a

não ser de que tinha encontrado o homem que amava!

Nunca soube se Maximiliano disse alguma coisa ou se apenas lhe estendeu os braços.

Soube apenas que, impulsivamente, ansiosa e sem reflectir, reagiu aos sentimentos

que a dominavam e fez o que o coração mandava.

O rei abraçou-a com força e depois a beijou.

Zita sentiu uma grande felicidade, quase um êxtase.

Os beijos dele se tornaram mais possessivos, mais apaixonados. Zita sentiu que

Maximiliano se apossava não apenas de seu coração como também de sua alma.

Só quando achou que seria impossível continuar tendo tal e não morrer, foi que o rei

finalmente ergueu a cabeça.

- Minha querida! - disse com voz trémula, diferente. - Pensei que nunca mais fosse

ver você!

Antes que ela pudesse responder, voltou a beijá-la, de um exigente, possessivo, como

se temesse perdêr-la novamente.

Para Zita, o tempo pareceu parar. Finalmente, com uma exclamação de felicidade,

escondeu o rosto no ombro dele.

Seu coração batia acelerado, todos os seus nervos vibravam. Jamais tinha acreditado

que um dia chegasse a sentir tamanha felicidade...

- Minha adorada! Como pôde fugir daquele jeito? Fiquei desesperado, pensando que

nunca mais a encontraria.

Page 83: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

- Não pude fazer.. outra coisa - Zita conseguiu murmurar.

- Quando fiquei sabendo, na Estalagem Golden Cross, que ninguém sabia para onde

você tinha ido, pensei que ficaria louco.

- Procurou por... mim?

- Mandei alguém fazer isso. Assim como também mandei vários empregados de

minha confiança indagarem na cidade sobre seu paradeiro, querida, e onde poderia

encontrá-la.

Zita se contraiu. Ele continuou:

- Está tudo certo, meu amor. Eles foram muito discretos. Mas como poderia eu

imaginar que você estava aqui?

- Então.. como é que você... veio?

- Estava à sua procura.

Ao ver a expressão de surpresa dela, continuou:

- Explico tudo daqui a pouco, mas agora só o que quero é beijá-la, meu amor.

Não esperou pela resposta, recomeçando a beijá-la, até Zita se sentir inflamada, com

uma sensação de êxtase. Era incapaz de pensar, podendo apenas sentir!

Então, ouviram uma voz atrás deles.

- Zita! Que diabo pensa que está fazendo? - perguntou o grão-duque.

Era difícil voltar à realidade, compreender que ainda estava nos braços do rei e que

seu pai a fitava, atónito, mal podendo acreditar no que via.

Enquanto a moça procurava se dominar, o rei se virou. O grão-duque soltou uma

exclamação:

- Majestade! - Como se ainda não acreditasse nos próprios olhos, disse: - Não sabia

que Vossa Majestade conhecia Zita!

O rei se contraiu. Virou-se completamente para o recém-chegado, agora apenas com

um dos braços em volta de Zita.

Por um momento, os dois homens se entreolharam. Depois, o rei perguntou,

asperamente:

- Zita é sua, senhor? É uma coisa que nunca me passou pela cabeça.

- Minha? Claro que é minha! Mas nunca imaginei que Vossa Majestade a conhecesse.

Acho isso espantoso!

Aproximou-se dos dois. Olhando para Maximiliano, Zita compreendeu o que ele

estava pensando.

Por um momento, não achou possível.

Page 84: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Temendo que ele dissesse alguma coisa que revelasse ao grão-duque a estranha

história do encontro dos dois e a ignorância de Maximiliano sobre a identidade dela,

apressou-se a falar:

- Perdoe-me, papai, por não lhe ter contado, mas conheci Sua Majestade quando

estávamos ambos andando a cavalo.

O rei soltou-a. Agora olhava, não para o grão-duque, e sim para ela. A surpresa de

seu rosto teria parecido ridícula, se Zita não estivesse nervosa, com medo do que ele

pudesse revelar.

- Devo compreender, senhor, que Zita e... sua filha?

- Claro que é minha filha! - respondeu o grão-duque, como se o rei o estivesse

desafiando.

- Não a vi, quando me hospedei no palácio.

O grão-duque pareceu um tanto constrangido.

- Minha mulher achou que era preferível que Vossa Majestade só fosse apresentado a

Sophie, de modo que Zita não apareceu. - Depois, considerando que não havia motivo para

ficar na defensiva e que esse papel devia ser do rei, continuou: - Mas eu gostaria, Majestade,

que me desse uma explicação. Como é que, após um conhecimento tão casual com minha

filha, pois não pode ter sido mais do que isso, Vossa Majestade se julga com o direito de se

comportar dessa forma?

- Ficarei muito grato, senhor, se der seu consentimento para Zita e eu casarmos o

mais depressa possível.

Sua voz estava firme, não havendo nela a desconfiança de antes.

Agora, foi o grão-duque que ficou surpreso. Olhou para Maximiliano, mal podendo

acreditar.

- Certamente, é uma coisa que eu não esperava, Majestade, e que devemos discutir

isso tomando um copo de vinho.

Foi só então que Zita voltou à realidade.

Pareceu acordar de um sonho no qual tinha vivido desde que o rei começara a beijá-

la, causando-lhe um êxtase indescritível. Percebeu que os dois homens estavam decidindo

seu futuro.

Era como se tivesse sido posta de lado, vendo os anos se estenderem à sua frente,

sem que pudesse dar opinião sobre seu próprio destino.

Embora seu corpo vibrasse por causa das emoções despertadas pelo rei, sua mente

lhe dizia que eles não tinham o direito de tomar decisões sem consultá-la.

Page 85: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

O rei e o grão-duque sorriam um para o outro, com uma compreensão que não

parecia necessitar de palavras.

Mas Zita de repente sentiu frio, como se o gélido vento da montanha a tocasse,

apagando o fogo do amor que a consumia.

Olhou para o pai e percebeu como estava satisfeito com o pedido do rei.

Depois, olhou para Maximiliano. Embora seu corpo desejasse chegar mais perto dele,

sua mente gritou: “Não!”

Viu, quase como se estivessem presentes, as mulheres que o rei havia amado, que

fizeram parte de sua vida; as mulheres de que ouvira falar e as que apenas imaginara.

Mulheres que, como La Belle, provavelmente o esperavam naquele momento.

Viu-as entrando na vida do rei, saindo, sendo substituídas por outras e mais outras, e

soube que jamais poderia suportar tal coisa.

Tudo isso passou por sua mente num segundo. O pai ia para o chalé, quando a ouviu

dizer, em voz calma, clara:

- Antes de continuarmos o assunto, tenho alguma coisa a dizer. naturalmente, sinto-

me bastante honrada com o pedido de casamento de Sua Majestade, mas minha resposta é

não! Jamais serei sua esposa!

Não esperou para ver a expressão atónita dos dois homens e seguiu. Passou por eles,

enveredando pelo caminho no meio das árvores, cada vez mais depressa, até chegar á

estalagem.

Subiu a escada, foi para seu quarto, atirou-se na cama e escondeu a cabeça no

travesseiro.

Sabia que estava fechando as portas do Paraíso.

Ao mesmo tempo, o instinto de auto-preservação, mais forte do que o êxtase do

amor, lhe disse que era a única maneira de sobreviver.

Muito tempo depois, Zita ouviu o pai subir e entrar no quarto.

Não veio dizer boa-noite, e ela achou que devia estar zangado com seu

comportamento e envergonhado porque a filha tinha insultado o rei.

Recusar-se a casar com um homem não devia ser considerado um insulto, pensou.

Mas tinha certeza de que Maximiliano não apenas se consideraria insultado, como

humilhado, por ser rejeitado na primeira vez que pedia a uma mulher para ser sua esposa.

Depois, achou que ela é que devia se considerar insultada. Afinal, o rei lhe havia

oferecido uma posição muito diferente, antes. Se tinha sido tão pouco perspicaz, a ponto

Page 86: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

de julgar que Zita aceitaria semelhante proposta, então era culpado de ela agora não querer

casar.

Mas os pensamentos, por mais lógicos que fossem, não impediam que ficasse

consternada nem que tivesse a desagradável convicção de que o pai ia pressioná-la para que

mudasse de idéia.

“O comportamento do rei vai estragar nossas férias”, pensou, com ressentimento.

Mas já estavam estragadas. porque nunca mais se sentiria feliz ou livre.

Maximiliano a beijara e a sensação de êxtase ainda permanecia dentro dela. Só de

pensar nele, ficava emocionada, com a impressão de sentir novamente a pressão de seus

lábios dominadores.

- Eu o amo... Eu o amo...

Mas sabia que, no que dizia respeito ao rei, esse amor não era suficiente.

Talvez fossem felizes juntos durante algum tempo, até Maximiliano se cansar dela,

como se cansara de tantas outras.

Então iria para Paris, ou, como acontecia com o grão-duque, procuraria consolo em

seu próprio pa'ís, para aliviar a monotonia de um casamento que sempre seria igual, dia

após dia.

“Como é que eu poderia suportar isso?”

Sabia que, quando acontecesse, por mais que quisesse controlar seu temperamento e

suas emoções, teria vontade de matar a mulher que lhe roubasse o amor do marido. E seria

até capaz de matar, mesmo!

Imaginou-se sozinha no palácio, ou em seu quarto majestoso, enquanto o rei saísse

pela passagem secreta para visitar a amante. Depois que os membros da corte se retirassem,

ele iria gozar o prazer da companhia de uma outra mulher, que tinha uma atracção que a es-

posa não lhe oferecia mais.

“Então, eu morreria. Ou cometeria um crime terrível, do qual jamais me perdoariam.

Apesar de tudo, os beijos de Maximiliano haviam despertado nela sensações que Zita

não sabia que existiam. E, se o perdesse agora, jamais encontraria a mesma felicidade nos

braços de outro homem.

Ouviu passos leves no corredor, uma porta se abrindo e se fechando, e soube quem

tinha ido para o quarto do grão-duque.

Compreendeu que não era apenas o comportamento do rei que a impedia de casar

com ele, mas também a infidelidade de seu pai.

“Todos os homens são iguais!”

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Zita aceitava isso. Mas não aceitaria a agonia, a humilhação, a frustração de ser a

esposa indesejada de um marido que ela adorasse. mas que não a quisesse mais.

“Sou diferente de mamãe, porque eu não poderia perdoar nem esquecer. E não

ficaria sentada, calmamente, à espera de meu marido.”

Nesse caso, talvez fosse levada a causar um escândalo e arranjar um amante, só para

desafiar o rei.

Mas tinha a estranha sensação de que, se amasse Maximiliano como amava agora,

jamais permitiria que outro a tocasse ou dela se aproximasse.

A agonia do que sofreria mais tarde era tão vívida em sua mente, que soube que

qualquer sofrimento presente seria insignificante, comparado com a dor do futuro.

“Não vou casar com ele! Não vou!”

Apesar disso, seu corpo ansiava por aquele homem. Teve a desagradável sensação de

que, se o rei aparecesse agora, ela se atiraria em seus braços, como quando o vira aparecer,

sob as árvores.

“Eu o amo! Eu o amo!”

Mas não havia solução nem final feliz. Só o que podia fazer era tentar que o pai

compreendesse que estava resolvida e que nada a faria mudar de idéia.

Pela janela, podia ver as estrelas. Achando que isso a fazia sofrer mais ainda,

levantou-se e foi fechar as cortinas.

Só com a luz das velas no quarto, seria mais fácil reflectir com calma.

Sua cama não tinha grade, como as outras das estalagens onde dormira nas noites

anteriores. Tinha uma cabeceira de madeira entalhada, com desenhos de flores e de frutas.

Na base viam-se vários pássaros. Os entalhes tinham sido pintados, de acordo com o estilo

local, e o colchão era de penas de ganso, muito macio e confortável. Mas Zita sentia-se

como se estivesse deitada sobre pedras, que a espetavam e martirizavam.

- E é o que sou: mártir do amor - murmurou, amargurada.

Ajeitou-se o melhor possível na cama, mas não apagou as velas.

Sabia que, se ficasse no escuro, ansiaria pela companhia do rei, sonhando com ele

acordada.

Mas, mesmo com a luz acesa, não podia deixar de pensar no bem-amado e imaginar

aonde teria ido.

Não estava hospedado no chalé, porque Névia dissera que não via outros hóspedes.

“Por que hei-de me preocupar? Quanto mais cedo ele aceitar a decisão, melhor.”

Tinha certeza de que La Belle, ou outra igual a ela, estaria a consolá-lo. Pensar na bela

dançarina à espera do rei foi como uma punhalada no coração...

Page 88: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Zita estava decidida a não fraquejar.

“Não casarei com ele.., nem que me peça de joelhos!”, disse, orgulhosa.

Nesse momento, a porta se abriu.

Zita deixou escapar uma exclamação de espanto.

Era o rei!

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Capítulo 7

Maximiliano entrou, fechou a porta e dirigiu-se lentamente para a cama.

Vestia um roupão escuro, longo, e tinha um lenço de seda no pescoço.

Parecia estranho; o roupão fazia com que desse a impressão de ser mais alto.

Zita fitou-o de olhos arregalados.

- O que está fazendo... aqui? Não tem o direito de... entrar em meu quarto.

- Preciso falar com você. E, como poderia fugir, como já fugiu antes, não há outro

meio de obrigá-la a me ouvir.

- Não quero ouvi-lo. Nada temos a dizer um ao outro.

- Pelo contrário, tenho muito a dizer. E você não terá alternativa, a não ser me ouvir.

- Não adianta. Já tomei minha decisão e... nada me fará mudar de idéia.

Ao dizer isso, percebeu que o rei, de pé ao lado da cama, olhava para ela. Com a

surpresa que tivera ao vê-lo entrar, ela havia se sentado na cama, recostando-se nos

travesseiros.

À luz das velas, a camisola transparente, enfeitada de rendas, era muito reveladora.

Num gesto de defesa, .Zita puxou o lençol para cima. Teve a impressão de que os

lábios do rei se torceram num sorriso, antes que ele se sentasse de frente para ela.

Só o facto de senti-lo tão próximo fez com que seu coração acelerasse. Sentia as

vibrações dele de um modo tão intenso, que não podia pensar em mais nada. Mas disse,

agressiva:

- Não tem o direito de vir aqui. Sabe que isso é muito pouco convencional. Papai

ficaria furioso, se soubesse.

Mas seu pai não poderia censurar o rei, já que também ele agia de maneira

extremamente censurável.

Muito agitada, não conseguiu olhar para Maximiliano. Ficou esperando sua resposta,

achando que, dissesse ela o que dissesse, não o impressionaria.

Dali a um momento, o rei falou:

- Desde que nos conhecemos, Zita, você se mostrou pouco convencional. Agora,

chegou minha vez.

- Foi... diferente.

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- De que maneira?

- Quando fingi ser uma garçonete, na Estalagem Golden Cross, queria apenas... olhar

para você, porque mamãe disse que eu não devia aparecer enquanto você estivesse no

palácio.

- Seu comportamento na estalagem não foi o que se esperaria da filha do grão-duque.

- Só o que eu queria era vê-lo de perto e verificar se o que diziam a seu respeito era...

verdade.

- Então, sentia curiosidade a meu respeito?

- Assim como todo mundo, em Aldross.

- Só espero que eu não a tenha decepcionado - comentou, com ironia. - Mas, quando

a vi, Zita, uma coisa me aconteceu que nunca tinha acontecido antes.

Não podendo conter-se, ela olhou de relance para Maximiliano e censurou-se por

achar que ele estava ainda mais bonito.

Havia também no olhar do rei uma expressão que fez com que Zita se lembrasse do

modo como a beijara, levando-a ao êxtase.

Foi mais maravilhoso do que qualquer outra coisa que ela tinha imaginado ou com a

qual jamais havia sonhado.

Sabendo que o rei esperava, conseguiu perguntar, baixinho:

- E que foi que.., aconteceu?

- Eu me apaixonei!

- Não é verdade!

- É verdade. E agora, vou contar uma história. Creio que, como temos muita

afinidade e podemos ler os pensamentos um do outro, você vai compreender.

Zita disse a si mesma que não ouviria, que ordenaria que ele saísse do quarto. Mas,

antes que pudesse dizer qualquer coisa, o rei tornou a falar:

- Minha mãe era húngara!

Fosse o que fosse que Zita esperava ouvir, não era isso. Arregalou os olhos e

perguntou:

- Húngara? Eu não tinha a mínima idéia!

- Muito poucas pessoas sabem, simplesmente porque o nome de minha mãe

raramente é mencionado, até mesmo em Valdastien. A razão é que o casamento dela com

meu pai foi morganático.

Zita ficou tão surpresa, que largou o lençol que tinha puxado sobre os seios. Fitou o

rei, atónita.

- Morganático?

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- Meu pai se apaixonou por minha mãe. Embora ela fosse de origem nobre, não tinha

sangue real. Então, casaram secretamente, na Hungria. Quando voltaram para Valdastien,

meu avô nada pôde fazer, a não ser reconhecer que o casamento era válido.

- Deve ter sido muito... romântico.

- E de facto foi. Mas minha mãe não era apenas bonita; era muito húngara! - Sorriu e

acrescentou: - Impetuosa, impulsiva e emotiva! Todas as coisas que meu pai achou

irresistíveis e que também eu acho irresistíveis em você.

- Mas você disse. .

- Sei o que disse e é uma coisa que também quero explicar - declarou o rei,

interrompendo-a.

Olhou para outro lado, como se mergulhasse no passado.

- Quando minha mãe morreu, eu tinha apenas seis anos. Meu pai ficou tão

desesperado, que não se importou com um futuro sem a mulher amada. Deixou que o

forçassem a um novo casamento que, politicamente, seria vantajoso para Valdastien. -

Olhou de novo para Zita e acrescentou: - Creio que você, mais do que qualquer outra

pessoa, calcula o que um casamento arranjado significa para um homem que sabe o que é o

amor e que compreende que, sem amor, seu casamento é vazio e sem sentido.

Zita sabia que o rei se referia ao grão-duque, mas nada disse. Ele continuou:

- Assim que veio para o palácio, minha madrasta resolveu apagar a lembrança de

minha mãe da memória de todos, como se ela nunca tivesse existido. Foi ajudada nisso

pelos estadistas que se envergonhavam, de certo modo, por minha mãe não ser rainha,

sendo-lhe permitido apenas o título de Sua Alteza Sereníssima. Todos os retratos dela

foram destruídos, ou guardados onde ninguém os pudesse ver. Seu nome jamais era

mencionado e eu não tinha o direito de falar nela.

Zita soltou uma exclamação de horror. Maximiliano continuou:

- Eu adorava minha mãe. Era a criatura mais bela, mais afectuosa, mais humana de

minha vida de criança. Assim como meu pai, achei que o mundo veio abaixo, com sua

morte. Sentia-me solitário a um ponto que não posso descrever.

Zita teve a visão de um garotinho num palácio imenso, com as pessoas à sua volta

mostrando-se, de repente, hostis a tudo o que para ele tinha significado na vida.

Fez um gesto impulsivo de tocar a mão do rei, mas conteve-se, achando que, se o

tocasse, não poderia mais sustentar sua decisão de não casar.

- Não somente me proibiram de falar em minha mãe, como mandaram embora as

governantas que ela havia escolhido para mim. Todo mundo procurava me convencer de

que eu devia suprimir tudo o que houvesse de húngaro em mim e no meu caráter.

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Zita imaginou o quanto ele devia ter sofrido, como aquilo devia ter sido terrível.

- Se eu dizia uma palavra em húngaro, era castigado - continuou Maximiliano. - Se

chorava, era castigado por ser descontrolado e dramático. Meus preceptores receberam

ordem da rainha para me ensinar que a coisa mais importante na vida era o autodomínio.

Com isso, ela queria dizer que nunca deveria demonstrar minhas emoções.

- Como alguém pode ser tão cruel com uma criança?

- A resposta é muito simples, Zita: a rainha estava com ciúme. Depois de casada,

apaixonou-se por meu pai, mas sabia que ele jamais a amaria e que sempre se lembraria da

primeira mulher.

- Creio que isso era... duro, para ela - murmurou Zita, pensando em sua mãe.

- Muito duro, mas é o que muitas vezes acontece com casamentos arranjados. Foi

por isso que resolvi nunca me ver em tal situação.

- Apesar disso, pensei que você tivesse vindo para Aldross com a intenção de casar

com Sophie.

- Meu primeiro-ministro me disse que eu precisava casar, para garantir a sucessão ao

trono. Se eu morresse sem um herdeiro, era muito provável que a Alemanha, tendo

estabelecido sua federação, se intrometesse nos negócios de Valdastien.

- Era disso que tínhamos medo também. Papai pensou, então, que talvez você

pedisse a mão de Sophie, porque seria vantajoso para os dois países.

- Talvez isso acontecesse. Mas, certamente, eu iria visitar outros países, antes de me

decidir. Então, conheci você, Zita.

- Está dizendo que isso fez com que... mudasse de idéia?

- Quando me virei para você, naquele quarto da estalagem, o sol iluminava seus

cabelos, e, por um momento, pensei que minha mãe tivesse ressuscitado!

- Sou parecida com ela?

- Está aí outra coisa sobre a qual lhe quero falar. Muitas vezes ouvi dizer que sua avó

era muito bonita e que tinha um temperamento muito húngaro. - Os olhos dele tiveram um

brilho malicioso. - Então, antes de vir para Aldross, examinei a árvore genealógica de sua

avó e descobri um ramo obscuro da família Esterhazy onde havia um casamento com

alguém da família Frazcozski, à qual minha mãe pertencia. - Fez uma pausa e acrescentou,

com um sorriso que fez o coração de Zita bater mais depressa: - Então, minha querida,

pode ver que somos parentes!

- Mas você disse que não queria casar com... uma húngara!

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- Tinham incutido tanto em mim a idéia de que tudo o que era húngaro era errado,

do ponto de vista de um monarca, que cheguei quase a acreditar. Então, naquele momento,

eu estava lutando contra meu amor por você.

Zita pareceu surpresa, mas nada disse.

- Fiquei na defensiva, achando que, embora a desejasse, o único lugar que podia lhe

dar em minha vida era um lugar passageiro, porque o fogo que me consumia acabaria por

se apagar, como sempre aconteceu no passado.

- Foi o que ouvi dizer. E é por isso que... não quero casar com você.

- Desconfiei de que o motivo era esse.

De novo, Zita pareceu admirada. Ele continuou:

- Esqueceu-se de que posso ler seus pensamentos, como você pode ler os meus?

Hoje, querida, quando fugiu, dizendo que não casaria comigo, compreendi que tinha medo

do futuro e de vir a sofrer.

- Como soube disso?

- Como posso explicar o que sinto por você? Posso apenas dizer que a amo como

jamais amei outra mulher na vida!

- E como é que pode ter... certeza?

- Tenho certeza, porque você é tudo o que sempre desejei, sem jamais acreditar que a

encontraria. - Ele continuou, como que desafiando-a: - Claro que houve mulheres em

minha vida. Depois que me libertei do jugo de minha madrasta, aproveitei a liberdade

como a maioria dos homens faria.

- Foi para Paris.

- Sim, Paris. E lá encontrei muitas das alegrias de que tinha sido privado no palácio

sombrio, deprimente, de Valdastien.

- Posso imaginar... quais foram.

- Claro que pode. Havia em Paris mulheres que me diziam que eu era atraente,

mulheres que me faziam rir, com quem eu podia dançar. E que estavam prontas a fazer o

que eu queria, contanto que lhes desse jóias, vestidos e festas mais extravagantes do que

qualquer outra dada até então!

- Deve ter sido divertido.

- Não há dúvida quanto a isso. Mas, depois de algum tempo, percebi que estava

ficando saciado, como quem come pâté de foje gras em excesso. - Sorriu e continuou: -

Quando meu pai morreu e herdei a coroa, fiquei satisfeito por voltar para Valdastien, para

meus cavalos, minhas escaladas nas montanhas, assim como para outros desportos que

sempre apreciava quando minha madrasta não me impedia de tomar parte neles.

Page 94: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

- . Que aconteceu com ela?

- Era alemã, e mandei-a de volta à sua terra.

- Alemã?

- Era do ducado de Mildensburg. O povo de lá é em parte prussiano. Como você

pode compreender, isso explica o que sofri quando estava sob a influência dela.

- E sua madrasta concordou... em ir embora?

- Não tinha escolha!

Zita compreendeu que ele havia obrigado a rainha a partir. Suspirou e ouviu-o

continuar:

- Agora eu era dono de mim mesmo e podia fazer o que queria.

- E isso significava levar... mulheres para a mansão pegada ao palácio.

- Como sabe disso?

- Creio que, em Aldross, todo mundo sabe.

O rei fitou-a por um longo momento. Depois, disse:

- Então, essa é uma das razões de não querer casar comigo!

Zita corou e não conseguiu encará-lo.

- Quero dizer-lhe, Zita, que a casa está vazia, agora, e que assim vai continuar -

afirmou ele em voz baixa.

- Até... precisar de novo?

- Se eu precisar de novo da casa, será porque você morreu ou deixou de me amar,

Zita.

- Como pode ter certeza?

- Por instinto. Creio que ambos sabemos que nosso instinto é uma qualidade muito

húngara. Não poderia ser explicado a outras pessoas, mas faz parte de nós, a ponto de não

devermos desprezá-lo.

- Creio que seria um erro eu casar com você. Compreendo o que quer dizer, claro

que compreendo, mas não desejo ser rainha.

Hesitou, procurando as palavras certas. O rei disse:

- Você está procurando criar um caso, e não pretendo ouvi-la. Vou casar com você,

com ou sem o seu consentimento. E não tenho intenção de permitir que diga não!

Como ele disse isso em voz baixa e calma, Zita demorou um tanto para se

compenetrar de que falava a sério.

Percebeu que Maximiliano tinha uma vontade de ferro e que estava disposto a lutar

para vencê-la. Tinha também a sensação de que seria o vencedor.

Page 95: Barbara cartland -_seu_reino_por_um_amor_(pdf)(rev)[1]

Mas ainda estava incerta, ainda temia seu amor por ele, um amor tão intenso que

mais causava dor do que prazer, e que a amedrontava.

- Se você sair, não apenas deste quarto, mas de minha vida, nos esqueceremos um do

outro. Achará uma rainha que não se importará, se você tiver... outros interesses. E, se for

sensato, verá que, como ambos somos húngaros, nosso casamento seria tempestuoso e

acabaríamos nos destruindo.

Ao dizer isso, pensou em como teria ciúme dele, caso chegasse a ser sua esposa.

Ocorreu-lhe depois que, se o rei se comportasse como temia, ela não apenas teria

vontade de matar a mulher, como de matar o próprio marido!

Maximiliano olhou-a fixamente e, de repente, deu uma risada.

- Oh, minha querida! Acha realmente que não sei o que está pensando? Como

julguei, por um momento, que o grão-duque fosse seu amante, e não seu pai, também senti

a mesma coisa. Ciúme! Tive vontade de matá-lo, só para tirar você dele, Zita. É minha, e

matarei qualquer um que tocar em você.

Falou com tanta violência que Zita se assustou.

- Talvez briguemos, mas, por mais que gritemos um com o outro, será uma

tempestade passageira - prosseguiu o rei. - Depois que fizermos as pazes, haverá sol, e o

amor nos levará de novo ao auge da felicidade.

Havia em sua voz uma nota apaixonada, que fez Zita vibrar.

A felicidade a que ele se referia pareceu tomar conta dela, como quando tinha sido

beijada, lá fora, ao pôr-do-sol.

- Eu a amo, Zita. E, como não quero que coisa alguma no mundo nos separe e me

faça sofrer como sofri nos últimos dias, vou lhe propor para decidir entre duas alternativas.

E tem que ser agora!

- Quais são?

- A primeira é que me dê sua palavra de honra de que casará comigo. Como é

importante que eu consiga estabelecer uma federação com os outros países que pretendo

visitar, vou levá-la comigo e casaremos exactamente dentro de duas semanas.

- Isso é impossível!

Ele continuou, sem dar atenção ao protesto:

- A alternativa é eu ficar aqui hoje à noite e possuí-la. Assim, você me pertencerá e,

de manhã, quando eu contar a seu pai o que aconteceu, ele concordará em que a única

solução é o casamento.

- Está fazendo chantagem comigo! Como se atreve?

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- Faço isso porque sei que posso torná-la muito feliz. E sei que me fará feliz também.

Nós dois temos muitas coisas para fazer no mundo, coisas de inestimável valor para outras

pessoas, a começar pelo meu país e pelo seu.

- Isso é muito bonito, mas sabe muito bem que não me dá chance de recusar.

- Claro que não lhe dou chance. E isso, querida, porque não é necessário dizer que

me ama. Fiquei sabendo que me amava no momento em que você vibrou, quando beijei a

palma de sua mão. E tive muita, muita certeza, quando a beijei hoje à tarde e ambos

pensamos que tínhamos chegado ao Paraíso.

Zita não soube o que responder, mas achou que não devia capitular assim tão

facilmente.

- Você só me pediu em casamento depois que soube quem eu era: a filha do grão-

duque!

O rei sorriu.

- Estive imaginando quando você iria me acusar dizendo isso. Tenho uma pergunta

para lhe fazer. Por que pensa que levei duas horas descendo o morro de meu castelo, para

vir até esta hospedaria, sabendo que ia encontrar seu pai aqui?

- Não tenho a mínima idéia.

- Nos últimos três dias, depois que você não compareceu ao nosso encontro, meus

homens de confiança varejaram a capital à sua procura, mas sempre voltaram dizendo que

tinham fracassado.

- Porque estavam procurando no lugar errado.

- Seus amigos da Estalagem Golden Cross guardaram bem o segredo. Portanto, só

havia uma coisa para eu fazer.

- O quê?

- Pedir a ajuda do grão-duque.

- Por que acha que ele o ajudaria?

- Porque, sabendo que você me pertencia, eu estava resolvido a casar. E, como é

súbdita de Aldross, a única pessoa que poderia tornar nosso casamento aceitável em

Valdastien seria o governante de seu país.

- Você pretendia casar comigo? Um casamento morganático?

- Era a única maneira de eu ser feliz para o resto da vida - respondeu o rei, com

simplicidade.

- Mal posso acreditar!

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- Farei com que acredite. Não nego que as coisas ficaram muito mais fáceis, querida,

pelo facto de você poder reinar, como minha rainha. Certamente, não haverá oposição por

parte do primeiro-ministro. E meus súditos vão adorá-la.

- Não estava pensando neles, quando disse que não casaria com você.

O rei leu os pensamentos de Zita e soube que pensava em La Belle e nas outras

mulheres que poderiam interferir na vida deles.

- Sei exactamente a quem se refere, mas precisa esquecer as outras mulheres, querida.

Foram apenas flores à beira de meu caminho, que feneceram rapidamente e não tiveram

importância, porque, o tempo todo, no fundo do coração, eu sabia o que estava

procurando: sonhava com você, ansiava por você. - Suspirou. - Como fui tão estúpido, a

ponto de não perceber que meu sangue húngaro só poderia ficar satisfeito com uma

húngara? Agora que a encontrei, serei uma pessoa completa, e você também, minha

querida.

Inclinou-se e colocou os braços em volta de Zita.

Ela achou que devia resistir, mas não conseguiu.

Os lábios do rei prenderam os dela, e Zita sentiu que todo o seu ser se entregava ao

homem amado. Sua cabeça caiu sobre o travesseiro, e Maximiliano beijou-a com mais ardor

ainda.

Uma corrente de vibrações os uniu, e Zita achou que tinha perdido a identidade e

agora fazia parte dele.

O rei beijou-a inúmeras vezes, até Zita perceber que seu corpo se inflamava e que

também ele parecia prisioneiro de um amor intenso.

Finalmente, os dois se separaram. A moça murmurou, incoerente, numa voz que

parecia de outra pessoa:

- Eu amo... você! Amo você!

- Diga isso novamente! Diga, até fazer com que eu acredite!

- Eu amo você!

- Quando é que vai casar comigo?

Zita deixou escapar um som que mais parecia um soluço e respondeu:

- Amanhã... Hoje à noite... Mesmo que você me ame apenas por algum tempo...

valerá a pena.

- Hei-de amá-la para sempre! Sabe, minha querida, não existem palavras para

expressar a grandeza, a profundidade e a maravilha de nosso amor.

Sabendo que era verdade, Zita passou os braços em volta dos ombros de

Maximiliano.

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- Também eu o amo loucamente. Mas tenho receio de aborrecê-lo e de você me

deixar. Se fizer isso... creio que prefiro morrer!

- Jamais a deixarei, minha adorada, e você jamais me deixará. Sei que vamos precisar

de pelo menos mil anos para nos convencermos de nosso amor, um amor que conhecemos

em outras vidas. Tivemos muita, muita sorte, em nos encontrarmos novamente nesta.

Zita chegou mais perto dele.

- Se for verdade, então, nunca perderemos um ao outro. E você tem razão: ficaremos

juntos por toda a eternidade, porque não somos duas pessoas, e sim, uma só.

O rei nada disse. Continuou beijando a mulher amada, até que as estrelas pareceram

cair do céu e envolvê-los numa chuva de luz.

Os gritos da multidão se tornaram ensurdecedores, quando a carruagem real, levando

os noivos, saiu do palácio e entrou na rua principal.

Havia uma profusão de flores; bandeiras tremulavam nas janelas de todas as casas,

enquanto o povo agitava chapéus e lenços.

Segurando o braço do rei, Zita acenava. Pétalas de flores caíam na carruagem aberta,

que seguia lentamente atrás do regimento de cavalaria que os escoltava até a fronteira.

Só quando saíram da cidade e se viram em campo aberto, onde havia menos gente,

foi que o rei perguntou:

- Está cansada, meu amor?

- Como poderia estar cansada, quando só penso na felicidade de tê-lo encontrado,

meu querido? Sabendo que não vou precisar casar com um sujeito maçante como aquele

margrave de Baden-Baden?

O rei deu uma risada.

- Acho que ele combina muito bem com sua irmã.

- É o que ela também pensa.

- E eu combino muito bem com você. Mas creio que sua mãe não me aprova.

- Na realidade, mamãe acha que combinamos, porque ela também nunca me

aprovou!

Ambos riram.

Uma chuva de pétalas de rosas os impediu de falar, ao passarem por um grupo de

crianças de escola.

O rei disse então:

- Você ficou muito bonita, de vestido de noiva. E está muito bonita agora, com esse

chapéu de plumas verdes.

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- Mamãe diz que o verde não dá sorte, mas dá sorte para mim! Assim como as

esmeraldas que você me deu.

Ao dizer isso, olhou para a enorme esmeralda que trazia no dedo, ao lado da aliança.

- É a cor de seus olhos. Como seus olhos brilham, quando a excito, minha querida, é

esse brilho que vou ver hoje à noite.

Zita corou.

- Não me contou aonde vamos passar a lua-de-mel. Mas acho que posso adivinhar.

- Então, leu meus pensamentos. Para onde poderíamos ir, a não ser para meu castelo

no meio das nuvens?

- É para lá que eu tinha certeza de que você me levaria. Mas pensei que ficasse...

envergonhado de fazer isso.

- Não estou nada envergonhado. Quero levá-la para lá, Zita, porque... e é a pura

verdade... jamais levei uma mulher ao castelo. Era o preferido de minha mãe e ela o

decorou em estilo tipicamente húngaro.

- Então, vou gostar dele tanto quanto você gosta.

O rei pegou-lhe a mão e levou-a aos lábios. Isso despertou aplausos mais ruidosos na

multidão, que o considerou um gesto muito comovente, do qual todos se lembrariam.

Na Estalagem Golden Cross, eles deviam trocar de carruagem, deixando a que

pertencia ao grão-duque e tomando a do rei.

Zita ficou surpresa, quando, em vez de uma vitória aberta, viu que o veículo que os

esperava era um faetonte muito elegante, puxado por quatro cavalos. Era bem leve e com

rodas muito grandes, o que fazia com que fosse bastante veloz.

Não teve tempo de manifestar sua surpresa, a não ser depois que se despediram dos

cortesãos que os tinham acompanhado desde o palácio.

Antes de partir, Zita tinha uma palavrinha para dizer a Gretel.

- É graças a você, Gretel, que me sinto tão feliz. Trouxe-lhe um presente. Espero que

o use e sempre se lembre de nós.

- Nunca a esquecerei, Majestade.

Quando se afastava, Zita teve certeza de que Gretel ficaria muito contente com o

broche que lhe dera. A jóia tinha as iniciais de Zita e do rei, em brilhante sobre esmalte.

Agora, o próprio rei guiava o faetonte, escoltado por quatro cavaleiros que se

mantinham a uma distância discreta.

- Como você pôde pensar numa coisa tão excitante? - perguntou Zita, referindo-se

ao faetonte.

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- Estou com pressa. A carruagem oficial e o regimento de cavalaria fariam com que

levássemos o dobro do tempo, na viagem até o castelo.

- Nunca vi um faetonte deste tipo.

- Veio de Paris - respondeu ele, com um brilho malicioso no olhar.

- Contanto que seja a única coisa que você importe de Paris, não me queixarei!

- Garanto que você quer ir até lá para comprar uns vestidos novos. Mas não há

pressa. Por enquanto, acho-a muito bonita, Zita, e muito desejável, com os vestidos feitos

em seu país.

- Acho que está fazendo pouco das lojas de Aldross!

Garanto-lhe que todos os vestidos de meu enxoval, e não houve tempo para muitos,

têm etiqueta francesa. - Deu uma risadinha e acrescentou: - Para dizer a verdade, como

mamãe desaprovou quase todos eles, são muito chiques!

- Darei minha opinião mais tarde. Mas aposto que nada será mais tentador do que a

camisola que você usava, quando a pedi em casamento no quarto do chalé!

- Pediu em casamento! - exclamou Zita, indignada. - Apenas me informou de que eu

tinha que casar com você! Para ser franca, sou apenas uma prisioneira, acorrentada ao carro

do vencedor!

- Creio que, se devemos dizer a verdade, o prisioneiro sou eu. Perdi a liberdade, que

me era muito preciosa, no momento em que a conheci.

- Já está arrependido?

- Vou responder a essa pergunta um pouco mais tarde - declarou o rei, chicoteando

os cavalos, para que andassem mais depressa.

O castelo era mais bonito e mais impressionante do que Zita havia imaginado.

Construído no alto de uma montanha de pico coberto de neve, era um palácio de

sonhos. Quando Maximiliano pegou Zita nos braços e transpôs a soleira da porta

carregando-a, ela soube que ele era também o rei de seus sonhos.

No salão, uma orquestra cigana tocava. Havia vinho para os músicos e também para

os empregados principais, para que bebessem à saúde dos noivos.

Depois, os dois subiram a escada, de mãos dadas.

Primeiro, o rei mostrou o salão oficial, que tinha a vista mais bela que Zita jamais

contemplara.

Levou-a depois pelo largo corredor, decorado com quadros e com mobília de grande

valor, indo até a suíte real.

Quando entraram no primeiro aposento, o quarto da rainha, Zita achou que era o

mais bonito do mundo.

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Pensou que só uma húngara poderia ter criado coisa tão bela.

Ficou emocionada, de uma maneira difícil de explicar, e percebeu que também o

marido estava comovido.

- É o quarto de minha mãe - disse ele, suavemente.

- Sinto que ela sabe que estamos aqui, juntos. E está muito contente por ver que você

é... feliz.

Para sua surpresa, Maximiliano não a beijou, como esperava, indo fechar a porta à

chave.

Voltou para perto de Zita, desmanchou o laço das fitas do chapéu e atirou-o no sofá.

- Todos os criados, aqui, são de origem húngara. Dei ordem para que não nos

perturbem, a não ser que toquemos a campainha.

A maneira de Maximiliano falar fez com que ela o encarasse com ar indagador. O rei

desabotoou o casaco leve que Zita usava e atirou-o também no sofá.

Abraçou-a, dizendo:

- Há três horas que somos marido e mulher e ainda não tive ocasião de beijá-la,

querida.

Zita ergueu os lábios, mas, antes de beijá-la, ele comentou:

- Acho que, depois da cerimónia, do desjejum e de uma longa viagem, você deve

estar cansada.

Zita corou, fazendo com que o marido risse.

- É uma frase convencional, mas que significa uma coisa muito diferente.

Devagar, como se deliberadamente não quisesse demonstrar pressa, Maximiliano

passou o dedo na face de Zita, até o queixo.

Ela sentiu uma estranha emoção, como se todo seu corpo se inflamasse.

- Você é linda! Mal posso acreditar que é finalmente minha, que não vai desaparecer

e que não vou acordar pensando que tudo foi um sonho.

- Estamos num mundo de sonhos, meu marido querido. E nunca vamos sair dele.

- Creio que isso seria impossível. Para termos certeza de que continuaremos

sonhando, quero lhe dizer o quanto a amo e o quanto você significa para mim.

Seus lábios buscaram os dela, mas foi um beijo terno e rápido.

Depois, delicadamente, desabotoou-lhe o vestido, que escorregou dos ombros e caiu

no chão.

Dali a um momento, ele a pegou no colo, colocando-a na cama. Zita sentiu a maciez

do colchão, viu o sol da tarde que envolvia o vale, notou o céu límpido acima dos picos

gelados e sentiu uma intensa felicidade.

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Maximiliano estava ali com ela, e só isso importava. Ele a puxou para mais perto,

cada vez mais, beijou seus cabelos, os olhos e, finalmente, a boca.

- Eu o amo. Oh, meu querido, meu maravilhoso Maximiliano! Amo você!

Não soube se pronunciou tais palavras ou se elas cantavam em seu coração.

E, então, o fogo que tinha sido reprimido durante o dia inteiro os levou para o

êxtase, para o auge da felicidade.

Zita sentiu que o rei não tinha tomado apenas seu coração e sua alma, mas também

seu corpo.

Eram uma pessoa só, não apenas nessa vida, mas em outras que viriam...

Fim

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