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UNISINOS UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS UNIDADE ACADÊMICA DE GRADUAÇÃO CURSO DE COMUNICAÇÃO DIGITAL NATHALIA SCHOEN MUNHOZ CONSUMO COLABORATIVO EM BAZARES DE TROCAS DO FACEBOOK UM ESTUDO DE CASO DO BAZAR DE TROCAS DA ESTILO SÃO LEOPOLDO 2012

Consumo colaborativo em bazares de trocas do Facebook: Um estudo de caso do Bazar de Trocas da ESTILO

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Trabalho de conclusão do curso de Comunicação Digital da aluna Nathalia Schoen Munhoz em 2012/01

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Page 1: Consumo colaborativo em bazares de trocas do Facebook: Um estudo de caso do Bazar de Trocas da ESTILO

UNISINOS – UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS

UNIDADE ACADÊMICA DE GRADUAÇÃO

CURSO DE COMUNICAÇÃO DIGITAL

NATHALIA SCHOEN MUNHOZ

CONSUMO COLABORATIVO EM BAZARES DE TROCAS DO FACEBOOK

UM ESTUDO DE CASO DO BAZAR DE TROCAS DA ESTILO

SÃO LEOPOLDO

2012

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Nathalia Schoen Munhoz

CONSUMO COLABORATIVO EM BAZARES DE TROCAS DO FACEBOOK

Um estudo de caso do Bazar de Trocas da ESTILO

Monografia apresentada como exigência

parcial para obtenção do grau de Bacharel em

Comunicação Social – Habilitação em

Comunicação Digital, na Universidade do

Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS.

Orientadora: Prof. Ms. Rosana Vieira de Souza

São Leopoldo

2012

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AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, Edailson e Eliana, que cobraram que eu fosse uma boa aluna desde

pequena, que sempre me amaram e confiaram em mim, que relevaram meu eventual mau

humor nesse último semestre e perdoaram todas as louças que não lavei, eu agradeço

infinitamente. Espero poder deixá-los orgulhosos.

Mãe, obrigada por ter me apresentado o mundo maravilhoso dos brechós, por dividir

teu guarda-roupa comigo e por nunca ter desistido de tentar me fazer gostar de moda. Tenha

certeza que este trabalho tem um pedacinho seu.

Pai, obrigada pelo carinho, por zelar pelo meu conforto, por atender aos meus desejos

sem que eu pedisse, e por todos os mimos. Tu és um amor!

Aos meus avós, por tudo que me ensinaram, por todo o carinho e por sempre me

receberem de braços abertos: muito obrigada. Em especial à minha avó Elma, por ser sempre

tão chique e elegante, por fazer as melhores comidas do mundo e pela ajudinha mensal pra

pagar a faculdade. Vó, sem palavras pra agradecer!

Ao meu par, Daniel Limas, parceiro de todas as horas, por estar comigo nos tendéis e

nas rajadas, por me fazer companhia nessas noites e finais de semana de estudo, por estar

sempre pronto pra dar uma mão, por aguentar o mimimi e sempre me dizer que ia dar tudo

certo, muito obrigada. Babe, te amo!

À minha querida orientadora Rosana Souza, pela amizade, pelos cafés, pelas risadas,

por dividir comigo o gosto pelo retrô, por conter meu desespero a cada orientação, por sempre

me indicar um norte e, principalmente, por acreditar neste trabalho. Valeu, Rô!

Ao meu pequeno grande amigo Eric, por ser um querido, por dividir comigo as

angústias e as conquistas, e por estar ao meu lado nessa jornada acadêmica, gracias!

Ao pessoal da SiriusPrime pelo apoio e compreensão, e por acreditar que juntos

podemos transformar o mundo. Vocês todos são muito especiais, obrigada.

E, por fim, às meninas dos bazares de trocas, pela amizade, pelas conversas, pelas

risadas, pelas troquinhas maravilhosas, e por colaborarem com a execução desse trabalho.

Sem vocês, este trabalho não existiria. Muito obrigada, meninas!

Thally

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Tudo quanto existe, tudo que representa Espírito para Espírito, é propriamente uma Roupa,

um Traje ou Vestimenta, vestida para uma estação, e a ser posta de lado. Assim, nesse

importante assunto das ROUPAS, devidamente compreendido, inclui-se tudo que o homem

pensou, sonhou, fez e foi: todo o Universo exterior e o que ele contém nada é senão

Vestimenta; e a essência de toda ciência reside na FILOSOFIA DAS ROUPAS.

Thomas Carlyle (1795 – 1881)

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RESUMO

Esta pesquisa tem por objetivo compreender a lógica do modelo de trocas de roupas em redes

sociais a partir do estudo de caso do Bazar de Trocas da Estilo, um grupo de criado no

Facebook pela revista Estilo para esta finalidade. Para isto, estudou-se o histórico do comércio

desde o escambo de mercadorias até o modelo atual; a lógica do consumo, com ênfase no

consumo feminino; e o consumo colaborativo. Também foram estudadas as dinâmicas de

redes sociais e das ferramentas do Facebook. Foram realizadas pesquisas qualitativas e

quantitativas baseadas em netnografia. Foi possível, a partir desta pesquisa, compreender este

tipo manifestação de consumo colaborativo em redes sociais. Conclui-se então que os meios

digitais possuem ferramentas que potencializam a colaboração, e que a partir disto é possível

a existência de modelos de consumo colaborativo como o de trocas de roupas pela Internet.

Palavras-chave: Consumo colaborativo. Bazares. Trocas de roupas. Redes Sociais.

Facebook.

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ABSTRACT

This research aims to understand the logic of the model of clothing exchange in social

networks from the case study of Bazar de Trocas da Estilo, a group created on Facebook by

the magazine Estilo for this purpose. For this, was studied the history of commerce from the

barter of goods to the current model of commerce, the logic of consumption, with emphasis

on women's consumption, and collaborative consumption. Also been studied the dynamics of

social networks and Facebook's tools. Was performed qualitative and quantitative research

based on netnography. It was possible from this research to understand such demonstration of

collaborative consumption on social networks. It was concluded that digital media have tools

that empower collaboration, and from this is possible to have models of collaborative

consumption as the clothing exchange by the Internet.

Keywords: Collaborative consumption. Bazaars. Clothing exchange. Social networks.

Facebook.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Pirâmide da hierarquia das necessidades de Maslow ............................................... 19 Figura 2: Tela inicial do Facebook ........................................................................................... 38

Figura 3: Quadro resumo da metodologia ................................................................................ 50 Figura 4: Cabeçalho do Bazar de Trocas da Estilo, com o mural ............................................ 54 Figura 5: Divulgação de álbum de trocas ................................................................................. 57 Figura 6: Divulgação de peça para troca .................................................................................. 57 Figura 7: Divulgação de álbuns e peças para troca (apenas link) ............................................. 58

Figura 8: Divulgação de álbum de desejos (wishlist) ............................................................... 58 Figura 9: Textos de procura por peças de desejo...................................................................... 58

Figura 10: Divulgação de peça para venda, e indicação de grupos de venda ........................... 59 Figura 11: Divulgação de álbum de vendas, e indicação da proibição de vendas .................... 59 Figura 12: Publicação de álbum de vendas .............................................................................. 60 Figura 13: Mensagem de usuária indo para encontro presencial regional de usuárias............. 60 Figura 14: Postagem de foto de encontro presencial, com conversação. ................................. 61

Figura 15: Reclamação sobre fraudes ....................................................................................... 61 Figura 16: Reclamação sobre o Facebook ................................................................................ 62 Figura 17: Reclamação sobre falta de honestidade .................................................................. 62 Figura 18: Mensagem de agradecimento de troca recebida ..................................................... 63

Figura 19: mensagem de recomendação de usuárias ................................................................ 63 Figura 20: Divulgação de código de rastreamento ................................................................... 63

Figura 21: Comprovante de envio ............................................................................................ 64 Figura 22: Postagem de bom dia .............................................................................................. 64

Figura 23: Postagem sobre o grupo .......................................................................................... 65 Figura 24: Desabafo sobre troca ............................................................................................... 65

Figura 25: Pedido de ajuda para fazer parte do grupo .............................................................. 65 Figura 26: Comentários sobre vício de compras (sapatos) ....................................................... 66 Figura 27: Postagem sem conteúdo .......................................................................................... 66

Figura 28: Postagem com informações sobre problemas de saúde .......................................... 67 Figura 29: Postagem com divulgação de link de promoção ..................................................... 67 Figura 30: Pedido de ajuda com inglês ..................................................................................... 68

Figura 31: Postagem de frase pronta, pensamento ................................................................... 68 Figura 32: Gráfico de resultados do questionário no item Gênero........................................... 69

Figura 33: Gráfico de resultados do questionário no item Faixa etária ................................... 69 Figura 34: Gráfico de resultados do questionário no item Status de Relacionamento ............. 70

Figura 35: Gráfico de resultados do questionário no item Faixa de renda aproximada .......... 70 Figura 36: Gráfico de resultados do questionário no item Localização ................................... 71 Figura 37: Gráfico de resultados do questionário no item........................................................ 72

Figura 38: Gráfico de resultados do questionário no item Tipo de itens negociadas ............... 72

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 10 1.1 DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA ................................................................................... 11 1.2 OBJETIVOS E ESBOÇO METODOLÓGICO ................................................................. 13

1.3 JUSTIFICATIVA DO TEMA ............................................................................................ 14

2 COMÉRCIO, CONSUMO E CONSUMO COLABORATIVO ..................................... 16 2.1 BREVE HISTÓRICO DO COMÉRCIO ............................................................................ 16 2.2 NOÇÕES SOBRE A LÓGICA DO CONSUMO .............................................................. 18 2.2.1 AS MULHERES E O CONSUMO ................................................................................. 21

2.3 CONSUMO COLABORATIVO ........................................................................................ 23

2.3.1 Motivações para a colaboração .................................................................................... 23

2.3.2 Negócios baseados em compartilhamento ................................................................... 24 2.3.3 Práticas de consumo colaborativo na atualidade........................................................ 26 3 REDES SOCIAIS ................................................................................................................ 29 3.1 ATORES, NÓS E A CONSTRUÇÃO DO EU VIRTUAL ............................................... 29 3.2 CONEXÕES, LAÇOS E CAPITAL SOCIAL ................................................................... 31

3.3 DINÂMICAS DAS REDES SOCIAIS NA INTERNET ................................................... 34 3.4 O FACEBOOK ................................................................................................................... 35

3.4.1 Histórico do Facebook ................................................................................................... 36 3.4.2 Recursos do Facebook ................................................................................................... 37

4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .................................................................... 41 4.1 ETNOGRAFIA E NETNOGRAFIA .................................................................................. 41

4.2 SONDAGEM ..................................................................................................................... 44 4.3 DEFINIÇÃO DA AMOSTRA ........................................................................................... 45 4.4 ETAPAS DE PESQUISA ................................................................................................... 46

4.4.1 Observação participante ............................................................................................... 46 4.4.2 Mapeamento de uso da ferramenta Grupos ............................................................... 46

4.4.3 Identificação de categorias de postagens ..................................................................... 46 4.4.4 Aplicação de questionário ............................................................................................. 47

4.4.5 Entrevista em profundidade ......................................................................................... 48 4.5 QUADRO RESUMO ......................................................................................................... 49

5 RESULTADOS OBTIDOS ................................................................................................. 51 5.1 LÓGICA DE FUNCIONAMENTO DO BAZAR ............................................................. 51 5.2 APROPRIAÇÕES DA FERRAMENTA GRUPOS........................................................... 53

5.2.1 Mural .............................................................................................................................. 53 5.2.2 Publicações do mural .................................................................................................... 54

5.2.3 Membros ......................................................................................................................... 55 5.2.4 Fotos ................................................................................................................................ 55 5.2.5 Documentos .................................................................................................................... 55 5.3 CATEGORIAS DE POSTAGENS .................................................................................... 56

5.3.1 Divulgação de Trocas .................................................................................................... 57

5.3.2 Divulgação de Vendas ................................................................................................... 58 5.3.3 Mensagens pessoais ....................................................................................................... 60 5.3.4 Outras postagens ........................................................................................................... 66 5.4 RESULTADOS DO QUESTIONÁRIO ............................................................................. 68

5.4.1 Gênero ............................................................................................................................ 69 5.4.2 Faixa etária ..................................................................................................................... 69

5.4.3 Status de relacionamento .............................................................................................. 70

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5.4.4 Faixa de renda aproximada .......................................................................................... 70

5.4.5 Localização geográfica .................................................................................................. 71 5.4.6 Atividades realizadas nos bazares ................................................................................ 72 5.4.7 Tipo de itens negociados ............................................................................................... 72 5.4.8 Perguntas abertas .......................................................................................................... 73 5.5 RESULTADOS DAS ENTREVISTAS ............................................................................. 76

5.5.1 Motivações de uso dos bazares ..................................................................................... 76 5.5.2 Impacto na vida e na rotina .......................................................................................... 78 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................ 80 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................................... 82 Apêndice 1 – Instrumento de coleta do questionário ............................................................... 84

Apêndice 2 - Entrevista 01 ....................................................................................................... 88 Apêndice 3 - Entrevista 02 ....................................................................................................... 90 Apêndice 4 - Entrevista 03 ....................................................................................................... 94

Apêndice 5 - Entrevista 04 ....................................................................................................... 96 Apêndice 6 - Entrevista 05 ....................................................................................................... 98

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1 INTRODUÇÃO

Na sociedade capitalista, tudo aquilo que os indivíduos precisam para viver tem de ser

comercializado de alguma forma, de itens de primeira necessidade a supérfluos, o que faz

com que seja quase impossível viver sem consumir. E a cada dia surgem novas formas de

consumo que evoluem e se modificam juntamente com os avanços tecnológicos. Toda nova

invenção tecnológica, além de potencial mídia, pode se tornar um canal de vendas. Foi assim

com o rádio, a televisão, e com a Internet não foi diferente. A rede mundial de computadores

trouxe outro modelo de comércio: o comércio eletrônico, ou e-commerce. Para além das lojas

virtuais1, sites de compras coletivas e clubes de compras

2, também há o comércio informal

praticado por pessoas comuns a partir das ferramentas que a rede proporciona, como sites de

redes sociais, blogs, fóruns, entre outros.

Navegando por sites, redes sociais e blogs na Internet, é possível observar que as

ferramentas disponíveis nestes canais são utilizadas pelos usuários para fins diferentes

daqueles para os quais haviam sido construídas. O comércio informal na Internet é realizado a

partir das apropriações destas ferramentas. Blogs viram vitrines, álbuns do Flickr se

transformam em catálogos, comunidades do Orkut e grupos do Facebook viram grandes feiras

e shoppings virtuais. São desde pessoas vendendo seus trabalhos artesanais, até pessoas

comercializando produtos usados que não querem mais.

Na sociedade onde o modelo capitalista incentiva o consumo, cada vez mais surgem

movimentos que visam consumir conscientemente. A sustentabilidade é um tema que está

sendo amplamente abordado hoje, e a consciência do consumidor em relação a esse tema vem

aumentando cada vez mais. Pensar mais antes de comprar, ponderar prós e contras e constatar

se determinado produto é realmente necessário é uma das formas de consumir

conscientemente. Outra forma é reutilizar e reciclar produtos que não utilizamos mais. E isto

1 Lojas virtuais são sites inteiramente destinados ao comércio eletrônico, ou e-commerce, onde o comprador

passa por todas as etapas do processo de compra/venda online, sem necessitar do intermédio de um vendedor, e

independente do horário comercial. Fonte: eCommerceOrg. Disponível em: <http://www.e-

commerce.org.br/lojas_virtuais.php>. Acesso em: 21 abril 2012. 2 Os sites de compras coletivas disponibilizam diariamente ofertas de curta duração de produtos e serviços com

grandes descontos, com o objetivo de fazer com que as pessoas conheçam marcas e estabelecimentos. Para que

uma oferta seja válida, é necessário atingir um número mínimo de compradores. Já os clubes de compras são

sites que oferecem diversas campanhas de marcas, disponibilizando por alguns dias uma loja virtual com

diversos produtos, sempre com bons descontos. Os produtos à venda em geral são peças de ponta de estoque, de

coleções passadas ou ainda com pequenos defeitos de fabricação. Fonte: Oficina Da Net. Disponível em:

<http://www.oficinadanet.com.br/artigo/e-commerce/solucoes_em_e-

commerce_entenda_o_que_e_compra_coletiva_e_clube_de_compra>. Acesso em: 21 abril 2012.

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não diz respeito apenas à reciclagem de lixo, mas também a dar outro destino a produtos que

estejam em condições de uso.

Há muitos produtos que são comprados por impulso e acabam não sendo utilizados;

outros que são utilizados por um tempo, e depois deixam de ser utilizados; outros que

agradam na hora da compra, mas deixam de agradar à segunda vista e nunca são utilizados.

Isso acontece com frequência dentre o público feminino, que compra itens de vestuário

regularmente, e com frequência adquire estes produtos por impulso, vindo a não utilizar ou

utilizar pouco posteriormente. Pensando assim, muitas mulheres doam as roupas que não

usam mais, ou as vendem em brechós. Passar adiante estes produtos é uma forma de consumir

conscientemente, afinal, o que para uma pessoa não tem utilidade, pode ser interessante para

outra pessoa.

1.1 DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA

Os brechós sempre trouxeram implícito o conceito de reutilização de roupas, mas o

que outrora era sinônimo de roupas velhas, usadas, baratas e fora de moda, hoje vem

ganhando outra conotação. Os brechós ganharam visibilidade com os movimentos de

sustentabilidade, e passaram a ser considerados Cult. Muitos artistas e personalidades

conhecidas também ajudaram a dar visibilidade aos brechós nos últimos tempos, ao declarar

que gostavam de frequentar lojas do gênero. São lugares onde é possível encontrar os

chamados “achados”: peças de boa qualidade, de marcas e modelos diferentes dos que

costuma-se encontrar em lojas tradicionais, e a preços muito mais baixos.

As peças antes consideradas velhas e fora de moda, agora são vintage e podem ajudar

a construir um look atual. E com o ciclo da moda, que vai e volta, peças que saem de moda

agora e vão parar num brechó, em pouco tempo podem estar de volta às ruas novamente como

peças da moda. E também está acontecendo uma quebra de paradigma em relação aos

brechós, que passam a ter roupas de marca, de boa qualidade, semi-novas e às vezes até

mesmo peças novas, que foram compradas na estação, mas não foram utilizadas.

Há vários motivos que fazem com que consumidores procurem os brechós. Segundo

Silva e Godinho (2009), as pessoas buscam os brechós por cansarem de acompanhar as

tendências da moda, por vê-los como uma forma de economizar, por buscar identidade

pessoal a partir de peças vintage diferenciadas e exclusivas, ou mesmo para encontrar artigos

de boas marcas por preços mais acessíveis. Todos estes motivos também colaboraram para

que este fenômeno chegasse ao meio virtual.

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Na Internet é possível encontrar inúmeros blogs destinados à comercialização informal

de peças usadas, em especial de vestuário feminino. São pessoas que encontraram na Internet

uma forma de passar adiante as peças de roupa que não usam mais, ganhando espaço no

armário, economizando dinheiro e consumindo de maneira sustentável. Este é o caso do blog

Enjoei (e to vendendo)3, por exemplo. As donas e visitantes destes blogs acabaram criando

uma espécie de rede social informal de brechós, com processos e convenções implícitas que

foram sendo construídas pelas próprias usuárias. Aos poucos este movimento foi ganhando

maiores dimensões, e chegou às redes sociais, como o Flickr4, o Orkut

5 e o Facebook

6. As

usuárias utilizam seus perfis pessoais para divulgar suas peças, ou criam perfis específicos

para realizar esta atividade.

Ainda nas redes sociais surgiu outro movimento a partir dos brechós: os bazares de

trocas. São grupos que funcionam dentro dessas redes, destinados à troca dessas peças de

roupas que antes eram vendidas nos brechós. A diferença é que, ao invés de vender o que ou

comprar as peças usadas, ambas as partes negociam uma troca de peça por peça. De certa

forma, é um retorno ao sistema de escambo, que existia no início da história do comércio.

Mas este sistema de escambo virtual não acontece apenas com roupas. Há diversos grupos,

comunidades e blogs que são utilizados para outros tipos de troca, como o site Troca

Figurinhas7, que possibilita que os colecionadores troquem suas figurinhas, e também o

aplicativo Dois Camelos8 do Facebook e o português Clube de Trocas

9, também no Facebook,

que possibilitam todo tipo de troca de objetos e até mesmo serviços.

A partir deste contexto, observado durante a fase de sondagem do tema a ser

pesquisado, foi possível elaborar alguns questionamentos que nortearam a pesquisa:

Como funciona a lógica do modelo de trocas pela Internet?

Como é feita a apropriação das ferramentas disponíveis nas redes sociais para a

realização dos bazares de trocas?

Como se dão as interações sociais e “comerciais” entre as pessoas que compõe estes

bazares?

Quais os fatores que motivam o usuário a participar destes grupos?

3 Disponível em: <http://www.enjoei.com.br>. Acesso em: 01 maio 2012.

4 Disponível em: <http://www.flickr.com>. Acesso em: 01 maio 2012.

5 Disponível em: <http://www.orkut.com.br>. Acesso em: 01 maio 2012.

6 Disponível em: <http://www.facebook.com>. Acesso em: 01 maio 2012.

7 Disponível em: <http://www.trocafigurinhas.com/>. Acesso em: 30 set. 2011.

8 Disponível em: <http://apps.facebook.com/doiscamelos/>. Acesso em: 30 set. 2011.

9 Disponível em: <http://www.facebook.com/group.php?gid=292470249203>. Acesso em: 30 set. 2011.

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Como é possível relacionar os bazares de trocas com os modelos de consumo

colaborativo?

Com base nestes questionamentos foi possível estabelecer os objetivos a serem

alcançados com esta pesquisa.

1.2 OBJETIVOS E ESBOÇO METODOLÓGICO

O presente trabalho tem por objetivo compreender a lógica do modelo de trocas online

a partir de uma pesquisa exploratória realizada em grupos existentes para este fim nas redes

sociais; em especial o Bazar de Trocas da Estilo10

, grupo do Facebook destinado a trocas de

peças de vestuário, relacionando este estudo de caso com as práticas de consumo

colaborativo.

Para tanto se fez necessário investigar quais são os usos e de que maneira se dão as

apropriações das ferramentas do Facebook pelos usuários de bazares de trocas, e também

identificar as motivações do uso e o impacto na vida dos usuários destes bazares.

Foi realizada inicialmente uma sondagem acerca do tema, onde foram observados

brechós virtuais localizados em blogs, sites e redes sociais, para que fosse possível conhecer o

universo pesquisado e delimitar o tema de pesquisa. Durante esta sondagem, foram

descobertos os bazares de trocas no Facebook, grupos nos quais foi realizada a observação

participante.

A participação ativa nos bazares – interagindo com as usuárias e realizando trocas – se

fez necessária para compreensão do modelo de trocas online, e esta interação com as usuárias

foi fundamental para entender o como ocorre o processo de negociação e a construção de

reputação e confiança em forma de capital social.

Também se fez necessária a realização de questionários e entrevistas com os

utilizadores dos bazares, para que fosse possível conhecer o perfil destes usuários e

compreender as suas motivações e as mudanças ocasionadas em suas vidas a partir deste uso.

Além disso, foi realizada a identificação dos elementos que compõe a ferramenta

grupos do Facebook, a identificação das suas apropriações, e a categorização das postagens

durante uma semana de observação diária do grupo, de modo a compreender os bazares de

trocas como um todo. Os procedimentos metodológicos serão explicados detalhadamente no

capítulo 4 desta monografia.

10

Disponível em <https://www.facebook.com/groups/128866630515607/>. Acesso em: 30 set. 2011

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1.3 JUSTIFICATIVA DO TEMA

A sustentabilidade é um tema que está em alta e vem sendo amplamente discutido e

desenvolvido. Com o surgimento de novas formas de comercialização e de negócios na

Internet a cada dia, como os sites de compras coletivas e os clubes de compras com descontos,

que incentivam cada vez mais o consumo, os brechós e bazares de trocas se mostram uma

forma interessante de desenvolver um modelo de comércio baseado no consumo consciente e

na sustentabilidade.

Além disso, é um modelo ecologicamente correto, já que o indivíduo deixa de

consumir recursos naturais novos para reutilizar e reciclar produtos que ainda estão em boas

condições de uso. E os benefícios não são apenas para a natureza e para o bem estar do

planeta: O uso de bazares de trocas satisfaz o desejo de consumo, mas de uma maneira muito

mais social e consciente, além de representar uma economia muito grande para o bolso de

quem utiliza.

Para além da crescente importância acadêmica e mercadológica que os bazares de

trocas na Internet vêm alcançando, a escolha desta temática parte, também, de uma motivação

pessoal da autora desta monografia, a qual, desde a infância, fazia uso de peças de segunda

mão. Tanto roupas e calçados herdados de primos maiores, como também uma variedade de

outros objetos, como livros e até mesmo móveis. Este fato, motivado pela situação financeira

familiar, ajudou a construir noções do que acerca do que significa era economizar e reutilizar.

Dessa forma, a visita a brechós e bazares de caridade e o gosto por coisas objetos tidos

como “vintage” ou retrô foram frequentes por parte da autora deste trabalho. A Internet

passou, então, mais recentemente, a caracterizar uma nova plataforma onde o hábito

adquirido, anteriormente, pode se manter e se desenvolver, a partir das funcionalidades que o

ambiente digital pode oferecer. A Internet pode ser um bom meio para procurar objetos de

desejo, os quais podem ser encontrados em clubes de compras coletivas, lojas virtuais, mas

também em blogs e redes sociais, como é o caso dos bazares de trocas.

Neste contexto, o grupo de trocas de peças de vestuário dentro da plataforma

Facebook, criado pela revista de moda Estilo, constitui um local onde muitas pessoas, em

geral mulheres, trocam suas peças de roupas todos os dias, estabelecendo relações de amizade

com as outras usuárias. Além das trocas há, aparentemente, uma motivação anticonsumista e

uma preocupação com a sustentabilidade que provém das próprias usuárias.

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A relação do tema escolhido com o curso de Comunicação Digital provém do fato de

que a Internet tem se mostrado cada vez mais como um agente facilitador para promover o

surgimento de novas formas de comunicação e de consumo. As redes sociais na Internet

facilitaram a conexão entre pessoas desconhecidas, porém com interesses em comum, o que

faz com que surjam grupos de interesse como os bazares de trocas. Este tipo de integração

social não seria possível sem a existência da Internet e das ferramentas que ela disponibiliza.

Compreender as formas com que as pessoas se apropriam das ferramentas para criar novas

maneiras de interagir e consumir é um dos motivos que torna esta pesquisa relevante para a

área da Comunicação Digital.

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2 COMÉRCIO, CONSUMO E CONSUMO COLABORATIVO

Neste capítulo é realizada uma breve síntese da história do comércio, mostrando como

o consumo evoluiu desde o escambo até chegar aos movimentos de consumo colaborativo que

emergem na atualidade. Também são explorados os desdobramentos do consumo colaborativo

na sociedade atual.

2.1 BREVE HISTÓRICO DO COMÉRCIO

O comércio data do início da história da humanidade, quando o ser humano vivia em

pequenos grupos, produzia suas próprias ferramentas e utensílios, obtinha por meio de caça e

colheita sua própria comida, e seu vestuário era composto por peles dos animais que ele

mesmo caçava. Com o tempo, os indivíduos começaram a perceber que outros grupos

possuíam objetos, ferramentas, utensílios e até mesmo alimentos diferentes dos seus, e

segundo Ratto (2008), perceberam que a forma mais pacífica de obter os itens desejados dos

outros grupos era propor a troca.

A origem do comércio foi estimulada, então, pela constatação da existência

de mercadorias diferentes produzidas por grupos rivais. A troca foi o meio

encontrado para obter de modo pacífico as mercadorias desejadas. Com a

troca, o homem passou a atender melhor as suas necessidades e, assim,

evoluir em sua condição de sobrevivência. (RATTO, 2008, p. 20.)

Assim surgia a primeira forma de comércio, chamado de escambo, ou permuta. Esta

prática foi utilizada durante muito tempo, inclusive na troca de mercadorias por trabalho,

como ocorria no Brasil colonial, por exemplo, onde os índios ofereciam o seu trabalho aos

colonizadores para receber em troca objetos como escovas de cabelo, espelhos e utensílios

domésticos. Hoje, o escambo na sua forma original, como principal forma de

comercialização, é pouco comum na sociedade, sendo mais frequente em locais menos

desenvolvidos (RATTO, 2008).

O escambo não visava o lucro. A troca de produtos ou serviços consistia em satisfazer

ambas as partes envolvidas, sem lucros ou prejuízos de nenhuma das partes, diferentemente

do comércio contemporâneo, que é baseado na moeda (dinheiro), onde quase invariavelmente

há lucro de uma das partes. Nos países mais desenvolvidos, onde o capitalismo já está

arraigado, o uso da moeda (dinheiro) é o mais comum. Ratto (2008) afirma que o surgimento

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17

da moeda foi o que deu origem ao processo de compra e venda como o conhecemos

atualmente.

A busca pelo lucro nas transações comerciais tornou o comércio uma prática social

muito mais complexa, dando origem à sociedade de consumo da qual participamos

atualmente. A partir dessa busca pelo lucro nas transações comerciais, foi criado o marketing

como forma de divulgação e o design como forma de valoração e diferenciação dos produtos,

entre outros elementos que ajudaram a construir o modelo de consumo atual

(BAUDRILLARD, 1995).

Com a evolução da humanidade, o comércio foi modificando-se, e estendendo-se às

novas tecnologias que foram surgindo. E a cada dia surgem novas formas de consumo, que

evoluem e se modificam juntamente com os avanços tecnológicos. É possível constatar, por

exemplo, que o homem inventou a telefonia, e posteriormente inventou o telemarketing e as

vendas por telefone. Inventou o correio, e subsequentemente inventou o comércio por mala

direta. Inventou a televisão, e também inventou as propagandas comerciais e os canais de

vendas de produtos, e assim por diante. Toda nova invenção tecnológica pode e

provavelmente deverá se tornar um potencial canal de vendas (RATTO, 2008).

Com o advento e a popularização da Internet, surgiu o chamado comércio eletrônico,

ou e-commerce. O comércio eletrônico consiste no mesmo processo de compra e venda do

comércio tradicional, geralmente baseado em pagamento monetário, porém, com o intermédio

de algum equipamento eletrônico como um computador ou um smartphone, conectado à

Internet. O comércio eletrônico ganhou espaço aos poucos, e hoje movimenta o comércio

mundial paralelamente ao mercado tradicional, estando em constante expansão. Este modelo

trouxe um grande diferencial para o mercado, que foi a possibilidade de comercializar

produtos e serviços a qualquer dia ou horário, sem depender necessariamente de um vendedor

à postos para atender o cliente e concretizar a compra. O consumidor pode visualizar os

produtos ou serviços desejados quantas vezes ele quiser, à hora que desejar, no conforto de

sua casa, e em caso de decidir pela compra, passa por todo o processo de compra e pagamento

sozinho, sem precisar do intermédio de ninguém, e sem enfrentar filas (ALBERTIN, 2004).

Aos poucos o comércio eletrônico começou a ganhar visibilidade e credibilidade com

os consumidores, e este modelo de negócio foi se expandindo e ganhando força. Pipocaram os

mais variados tipos de loja virtual, desde lojas pequenas, até grandes portais e lojas de

departamento que vendem os mais variados tipos de produtos. Também surgiram plataformas

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18

comunitárias de compra e venda de produtos, como o E-bay11

e o Mercado Livre12

, que

permitem que qualquer pessoa venda ou compre o que quiser. Mais recentemente, surgiram os

sites de compras coletivas (como o Peixe Urbano13

e o Groupon14

) e os clubes de compras

(Como Brandsclub15

e Privalia16

), que se valem de descontos para atrair consumidores a

conhecer novos estabelecimentos e marcas, ou mesmo liquidar produtos de ponta de estoque.

A evolução das práticas comerciais influenciou diretamente a maneira como o ser

humano consome, e para compreender a lógica do consumo colaborativo, presente nos

bazares de trocas, algumas noções sobre a lógica do consumo se fazem necessárias.

2.2 NOÇÕES SOBRE A LÓGICA DO CONSUMO

O consumo é uma área muito abrangente e complexa de se estudar. Definir o que é

consumo, ou quais são suas motivações, é uma tarefa muito difícil, principalmente para dar a

essa definição um caráter multidisciplinar. Slater (2002) diz que o consumo é sempre um

processo cultural, e que a cultura do consumo define um sistema em que as pessoas utilizam

de seu livre-arbítrio para escolher o que querem consumir, enquanto por outro lado utilizam

argumentos para persuadir o outro a querer consumir determinado produto. Para Canclini

(1995) não há uma teoria sociocultural do consumo, que é muito complexo e permeado de

nuances de acordo com o ângulo que se observa. Mas ainda assim ele propõe uma definição

para nortear o pensamento sobre o consumo:

[...] o consumo é o conjunto de processos socioculturais em que se realizam

a apropriação e os usos dos produtos. Esta caracterização ajuda a enxergar os

atos pelos quais consumimos como algo mais do que simples exercícios de

gostos, caprichos e compras irrefletidas, segundo os julgamentos moralistas,

ou atitudes individuais, tal como costumam ser explorados pelas pesquisas

de mercado. (CANCLINI, 1995, p. 53)

É possível viver sem produzir, mas é praticamente impossível viver sem consumir. E o

conceito de consumir é muito mais abrangente que o simples ato comercial de comprar ou

vender. O homem consome cultura, recursos naturais, e tudo aquilo que lhe é externo

11

Disponível em: <http://www.ebay.com/>. Acesso em 12 jun. 2011. 12

Disponível em: <http://www.mercadolivre.com.br/>. Acesso em 12 jun. 2011. 13

Disponível em: <http://www.peixeurbano.com.br/>. Acesso em 12 jun. 2011. 14

Disponível em: <http://www.groupon.com.br/>. Acesso em 12 jun. 2011. 15

Disponível em: <http://www.brandsclub.com.br/>. Acesso em 12 jun. 2011. 16

Disponível em: <http://br.privalia.com/>. Acesso em 12 jun. 2011.

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19

fisicamente, e que ele adquire para si (CANCLINI, 1995). Estudando apenas a fatia do

consumo que está relacionada a bens materiais, ainda é possível subdividir o consumo naquilo

que é necessidade básica, e de outro lado o que é supérfluo – e ainda assim, esta divisão seria

muito subjetiva e pessoal. Segundo Barbosa e Campbell (2008), as necessidades básicas são

as que não suscitam culpa ao indivíduo, e que, portanto, podem ser consideradas legítimas,

enquanto as supérfluas estão associadas ao desejo e ao excesso, e requerem justificativas para

diminuir a culpa do indivíduo.

Mesmo na sociedade contemporânea, moderna e individualista, na qual as

noções de liberdade e de escolha são valores fundamentais, sente-se a

necessidade de justificar a compra de alguma forma. E este último aspecto é

muito significativo, pois esta necessidade contraria o pressuposto da

racionalidade econômica na aquisição de bens. (BARBOSA; CAMPBELL,

2008, p. 20)

Segundo Maslow (1962) necessidade é, em resumo, a privação de certas satisfações.

Como o indivíduo em geral não pode satisfazer todas as suas necessidades de consumo, se faz

necessário que ele estabeleça prioridades. Neste caso, de acordo com a Teoria das

Necessidades de Maslow (1943), as necessidades sempre serão satisfeitas de acordo com uma

ordem hierárquica, que possui cinco níveis, de acordo com a pirâmide da figura 1:

Necessidades fisiológicas, necessidades de segurança, necessidades sociais, necessidades de

estima, e por último, necessidades de autorrealização.

Figura 1: Pirâmide da hierarquia das necessidades de Maslow

Adaptada de: Maslow (1943).

De acordo com Maslow (1943), as necessidades de nível mais baixo devem ser

satisfeitas primeiro, para que seja possível satisfazer as necessidades de nível mais alto. O

primeiro degrau compreende as necessidades fisiológicas, como fome, sede e sono; No

segundo degrau estão as necessidades de segurança, que vão desde sentir-se fisicamente

seguro, até inclusive possuir segurança financeira; No terceiro degrau estão as necessidades

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20

sociais, que compreendem o amor, o afeto, a amizade e a pertença a um grupo; No quarto

degrau estão as necessidades de estima, que compreendem o sentimento de autoestima,

confiança e conquista do respeito dos outros indivíduos; Por fim, o último degrau diz respeito

à realização pessoal, em que o indivíduo busca aquilo que o faz ser quem é essencialmente.

Esta hierarquia tende a ser respeitada no contexto do consumo e da aquisição de bens,

onde primeiramente o indivíduo deverá consumir itens de alimentação e higiene, por

exemplo, e somente deverá consumir supérfluos como acessórios de moda quando tiver

satisfeito estas e outras necessidades básicas, estabelecendo-se assim prioridades. Porém,

mesmo para satisfazer as necessidades básicas, o indivíduo pode fazer escolhas de consumo

baseadas no seu desejo pessoal.

Considerando um indivíduo que esteja com fome: a necessidade a ser suprida é a

alimentação, mas a escolha de qual item será consumido para satisfazer esta necessidade vai

depender de fatores sociais, econômicos e de escolhas pessoais. O mesmo acontece com o

consumo de moda, cuja necessidade básica é vestir-se, mas outras necessidades associadas,

como a autorrealização, autoafirmação e a diferenciação vão influenciar na decisão do

produto que será consumido. Estes fatores secundários são cada vez mais importantes para os

consumidores, e recentemente acabaram ocasionando mudanças no processo de decisão de

compra.

Consumidores de todos os mercados começaram a adotar um novo modelo

de compras: ao mesmo tempo em que preferem lojas com descontos para

abastecer a despensa, e procuram economizar, investem significativamente

em categorias que oferecem gratificação emocional. (VERA, MASSON e

VICÁRIA, 2008, p. 44)

Outra característica do indivíduo consumidor é a insaciedade. Segundo Baudrillard

(1995) o homem nunca se sente realizado, e está sempre a procura de algo novo que o sacie.

O próprio convívio em sociedade o motiva a querer consumir coisas que o façam saciar certas

necessidades e buscar realização, mas estas coisas nunca serão suficientes ou definitivas, pois

as necessidades também mudam com o indivíduo. Este sentimento de insaciedade é o motor

do consumo.

Assim, na sociedade contemporânea, consumo é ao mesmo tempo um

processo social que diz respeito a múltiplas formas de provisão de bens e

serviços e a diferentes formas de acesso a esses mesmos bens e serviços; um

mecanismo social percebido pelas ciências sociais como produtor de

sentidos e de identidades, independentemente da aquisição de um bem;

(BARBOSA; CAMPBELL, 2006, p. 26)

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2.2.1 As mulheres e o consumo

A maneira feminina de consumir é bem diferente da masculina, principalmente no que

diz respeito ao consumo de moda. Conhecer estas diferenças se faz necessário para que seja

possível compreender o público utilizador dos bazares de trocas, que é essencialmente

feminino. Para tanto, neste subcapítulo serão exploradas as particularidades da relação entre

as mulheres e o consumo, com ênfase no consumo de moda. “A moda afeta a atitude da

maioria das pessoas em relação a si mesmas e aos outros. Muitas delas negariam isso, mas

essa negativa é normalmente desmentida por seus próprios hábitos de consumo”

(SVENDSEN, 2010, p. 10).

Em nenhum momento da história a mulher ganhou tanto quanto hoje (BARLETTA,

2003), e vem aumentando seu poder aquisitivo nos últimos anos, garantindo a sua

independência e aumentando exponencialmente sua participação no mercado. Segundo Bento

(2010), apesar da mulher ainda possuir remuneração inferior à masculina, essa realidade está

mudando, e elas vêm se tornando cada vez mais financeiramente independentes e,

principalmente, adquirindo poder de decisão de compra; Estima-se que cerca de 80% dos

gastos familiares estão sob decisão da mulher (BARLETTA, 2003). Isto contribuiu para que o

público feminino fosse cada vez mais visado no mercado, sendo alvo certo para a publicidade

das marcas.

A mulher consumidora é muito ocupada, tem uma lista extensa e complexa

de tarefas que são próprias da sua nova condição de trabalhadora, acumulada

com a sua antiga e presente posição de mulher, mãe e dona de casa. Por tudo

isto, tem menos disponibilidade, não tem tempo a perder, e está sempre a

pensar em várias coisas, sendo difícil atrair a sua atenção. (BENTO, 2010, p

15)

De acordo com Barletta (2003), o jeito feminino de comprar é muito diferente do

masculino. Enquanto homens utilizam muito a racionalidade, analisam os prós e contras e

usam o senso prático e de oportunidade, as mulheres utilizam muito mais a percepção

extrassensorial, valorizam muito a questão emocional e são muito atentas a detalhes. Além de

terem seus sentidos afetados com mais facilidade, as mulheres os levam em conta no

momento da compra.

Outro fator importante é o pensamento contextual: mulheres associam cada elemento a

um “todo” maior e mais amplo, permeado de significações. A questão social também é levada

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22

em conta, desde a opinião de um amigo até a expressão do vendedor são fatores que vão

contribuir para a decisão de compra (BARLETTA, 2003). Então, uma peça de roupa deve não

somente ser bonita aos olhos, mas também deve ser agradável ao tato e ter um cheiro

aprazível, além de trazer algum tipo de significação para que conquiste uma consumidora.

Segundo Barletta (2003), a maioria do público online é feminino, e os principais

componentes da Internet (que de acordo com a autora são: comunicação, conteúdo, comércio,

comunidade e conveniência) têm mais apelo entre as mulheres do que entre os homens, o que

explica a grande oferta de produtos para este público na Internet. Acompanhando durante

alguns dias as ofertas dos sites de compras coletivas e as campanhas de clubes de compras,

por exemplo, é possível observar que uma fatia consideravelmente maior delas consiste em

produtos e serviços voltados para o público feminino. E a grande maioria destas ofertas são

peças de vestuário ou itens relacionados à beleza, todos eles objetos de desejo feminino.

E este fenômeno não é inédito, relembrando as liquidações de lojas de roupas em final

de estação, por exemplo. As lojas ficam lotadas de consumidores que desejam aproveitar as

ofertas de produtos com descontos. A maior parte do público consumidor da temporada de

liquidações são as mulheres, especialmente no que diz respeito a itens de vestuário. De acordo

com Miller (2002), é um fato que as mulheres consumem muito mais itens de vestuário do

que os homens, e apesar de possuírem os guarda-roupas muito mais cheios que a maioria dos

homens, elas nunca estão satisfeitas com seu arsenal. E elas não compram apenas produtos

para si, mas lembram de comprar roupas para o cônjuge, para os filhos, para a mãe, e até

mesmo para os amigos mais próximos.

As mulheres compram na esperança de que aqueles para quem elas compram

se tornem os recipientes adequados daquilo que foi comprado e de suas

devoções. As mercadorias, de bens alienáveis, passam a ocupar o lugar que

seria de bens inalienáveis em outras sociedades ao se transformarem em

objetos de devoção. (MILLER, 2002, p. 16)

Boa parte dos produtos de moda adquiridos é proveniente de compras por impulso, e

muitas vezes nem serão usados. Seja porque na próxima estação a peça não estará mais na

moda, ou não nos servirá mais, ou ainda porque a um segundo olhar, o produto não agradou

ao consumidor da mesma forma que à primeira vista. É assim que muitos produtos acabam

esquecidos nos armários, ocupando espaço e gerando cada vez mais desperdício.

Apesar deste fato, as mulheres continuam consumindo, querendo adquirir produtos

que satisfaçam seus desejos, e assim gastando uma fatia considerável de sua renda todos os

meses em itens de beleza e vestuário. E é por isto que os bazares de trocas podem ser uma

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23

alternativa prática, econômica e sustentável de suprir os desejos de consumo feminino, além

de uma forma de educar aos poucos as pessoas para promover o consumo colaborativo

(assunto que será abordado a seguir).

2.3 CONSUMO COLABORATIVO

Neste subcapítulo iremos explorar o conceito de consumo colaborativo, relacionando

sua aplicação aos bazares de trocas, a partir das noções estabelecidas sobre escambo,

comércio e consumo nos capítulos anteriores, e com base nas ideias dos autores Tapscott e

Williams (2006), Botsman e Rogers (2011) e Gansky (2010), entre outros que abordam a

onda do consumo colaborativo e suas possibilidades.

2.3.1 Motivações para a colaboração

O comércio então pode ser entendido como uma prática cultural baseada na oferta de

produtos e serviços para a satisfação de desejos ou necessidades, visando o lucro de uma das

partes. Porém, nem toda transação comercial precisa ser baseada no lucro e na exploração.

Johann Schneider, em entrevista ao autor Elias Fajardo (2010) disse que comércio é

essencialmente troca, e que as trocas podem ser boas para ambos os lados, sem que ninguém

seja explorado.

Comércio nada mais é do que troca. Quem o transforma em algo bom ou

ruim, explorador ou não, é o ser humano que o pratica. Infelizmente se criou

uma imagem de que o comércio tem necessariamente de ter aspectos de

exploração. Isto está mudando, pois pode haver trocas boas, sem exploração,

entre alguém que produz algo e alguém que vai consumi-lo. Estamos falando

de comércio como parceria. (FAJARDO, 2010, p. 59)

É possível oferecer um produto ou serviço sem almejar lucro, tendo em vista que

também se pode usufruir de outro produto ou serviço quando necessário, como uma troca de

favores, uma parceria. Isto é basicamente a essência do consumo colaborativo. Todos

possuem algo que pode ser compartilhado, e assim contribuir para a comunidade. De acordo

com Botsman e Rogers (2001) as pessoas em geral fazem isto sem perceber, quando

emprestam um livro, quando passam uma receita, quando fornecem informação especializada

(no caso de um advogado dar orientação jurídica para um amigo, por exemplo), entre tantos

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outros exemplos que poderiam ser citados. A colaboração está implícita nas relações

interpessoais.

Além das motivações sociais, de colaboração e pertencimento a uma comunidade, a

necessidade econômica em períodos de crise financeira também fez com que as pessoas

ficassem mais abertas a novas formas de acesso ao que elas precisam, e de como consegui-las.

O modelo econômico tradicional visava o consumismo, em que as pessoas compravam

produtos, utilizavam, jogavam fora e voltavam a comprar. Embora funcionasse

economicamente a curto prazo, de acordo com Tapscott e Williams (2006), não era um

modelo saudável nem sustentável. Para estes autores, uma nova democracia econômica está

surgindo, na qual todos são protagonistas. O consumo colaborativo é mais do que apenas boa

vizinhança e sustentabilidade, mas também é uma forma saudável de manter a economia

fazendo as pessoas consumirem mais gastando menos, numa economia do que Botsman e

Rogers (2011) intitularam de “o que é meu é seu”.

Para Botsman e Rogers (2011) os consumidores estão cada vez mais conscientes de

que o crescimento indeterminado e o consumo de recursos finitos são inviáveis em termos

econômicos, ambientais e existenciais, exigindo uma postura mais social por parte das

organizações. Mais que adquirir mercadorias, os consumidores contemporâneos são

consumidores de ideias, filosofias e experiências, que uma vez estabelecidos através das

marcas, despertam nos públicos o desejo de pertencimento a essas "comunidades

ideológicas".

2.3.2 Negócios baseados em compartilhamento

Muitas empresas também já perceberam que a colaboração em alta traz uma vasta

gama de oportunidades, e estão trabalhando de forma a aproveitar esta onda. Segundo Lisa

Gansky (2010), o modelo de negócios do futuro é baseado no compartilhamento de produtos e

serviços e está baseado nas redes de relacionamentos. Para Tapscott e Williams, esta era da

colaboração também traz grandes desafios para as empresas. Os novos modelos de negócio

começam a ameaçar os modelos tradicionais. e quem não souber aproveitar este momento

ficará para trás. Porém, o compartilhamento não deve substituir o consumismo: de acordo

com os autores, ambos os modelos tendem a coexistir em harmonia futuramente. “Em vez de

reconhecerem a derrota para a força econômica mais poderosa do nosso tempo, as empresas já

estabelecidas podem utilizar a nova colaboração para obter um sucesso sem precedentes”

(TAPSCOTT; WILLIAMS, 2006).

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Lisa Gansky (2010) cunhou o termo “Mesh” para definir os negócios baseados em

compartilhamento de informações e recursos. Para ela, pessoas e empresas que iniciam

projetos com esta mesma mentalidade acabam gerando um ecossistema de negócios, em que

todos se ajudam para crescer e prosperar, otimizando processos e minimizando a utilização de

recursos com base no compartilhamento. E quando fala de negócios, Gansky se refere a

empresas, mas também a projetos, movimentos e até mesmo ONGs que acreditam que

estamos na era do compartilhamento e que todos têm a ganhar com o Mesh.

Por que chamar de “Mesh” essa nova onda de negócios? Mesh descreve um

tipo de rede que permite que qualquer nó se ligue em qualquer direção com

quaisquer outros nós no sistema. Cada parte está conectada a cada outra

parte e elas se movem em conjunto, uma atrás da outra. Para mim, “Mesh” é

uma metáfora apta e rica para descrever uma nova fase completa de serviços

baseados em informações. (GANSKY, 2010, p.16)

De acordo com a teoria da cauda longa de Anderson (2010), o chamado “mercado de

hits”, composto por poucos produtos que são destinados a grandes massas, vem sendo

substituído pelo mercado de nichos, que por sua vez é representado por uma infinidade de

produtos destinados a milhares de pequenos nichos, que em sua totalidade podem competir

com o mercado de hits. Para Gansky (2010), os negócios Mesh são capazes de encontrar e

preencher nichos facilmente, por sua estrutura estar mais bem capacitada para a identificação

de desejos e necessidades dos clientes.

O computador com acesso à Internet foi o principal fator que colaborou para o

fenômeno da cauda longa, por causa de: (1) ter democratizado as ferramentas de produção, (2)

ter reduzido os custos de consumo, através da democratização da distribuição e (3) por ter

proporcionado a ligação entre a oferta e a demanda. Estes fatores representam as três forças

da cauda longa (ANDERSON, 2006, p 50-55) e também explicam como o consumo

colaborativo vem ganhando força nos últimos anos a partir da Internet. Gansky (2010)

concorda com a importância da Internet neste contexto, e afirma que a Mesh só se torna

possível a partir do momento em que todos estão ligados uns aos outros a partir desta

conectividade permanente e relativamente barata, e que ao mesmo tempo abre um leque muito

maior de possibilidades.

A Internet oferece muitas vantagens para a comercialização online, de acordo com

Anderson (2006) por atingir diretamente o consumidor, com baixo custo de divulgação e

manutenção da estrutura comercial tradicional, por não possuir restrição ao horário comercial,

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por muitas vezes não depender de uma interação direta entre vendedor e comprador, por

facilitar as buscas de produtos, entre outros motivos. Todos podem ser compradores e

vendedores, e todos podem também ser formadores de opinião.

Consumidores que antes não tinham meios eficazes de compartilhar sua opinião sobre

determinados produtos, agora podem localizar e contribuir com conteúdo sobre estes

produtos, a partir das redes sociais e de fóruns de discussão. As ferramentas disponíveis na

Internet também possibilitaram outros tipos de comercialização informal, o que potencializou

o consumo colaborativo a partir de redes sociais e sites específicos para este fim.

2.3.3 Práticas de consumo colaborativo na atualidade

Por meio do consumo colaborativo, tem-se acesso a uma maior gama de produtos sem

que haja necessidade de aumentar a produção dos mesmos; eles são compartilhados,

reutilizados, pertencem a uma coletividade e não apenas a um indivíduo. Porém, a era da

colaboração muda os valores sociais. De acordo com Botsman e Rogers (2011), o valor de um

indivíduo para a sociedade, que antes era determinado por crédito, propaganda e pelas coisas

que consumia, cada vez mais será definido pela reputação, pela comunidade e pelo que é

doado e compartilhado.

São muitos os casos de consumo colaborativo, e a seguir serão expostos alguns

exemplos citados pelos autores referenciados neste capítulo, para exemplificar a manifestação

desta cultura na Internet e nas redes sociais.

Gansky (2010) cita o exemplo da Zipcar17

, um serviço de compartilhamento de carros

que está presente nos Estados Unidos, no Canadá e em alguns países da Europa. O serviço foi

criado por duas amigas que souberam identificar uma maneira melhor de suprir uma

necessidade. Diferentemente dos serviços tradicionais de aluguel de carros, a Zipcar

disponibiliza carros convenientemente localizados por toda a cidade, e que podem ser locados

via Internet de maneira fácil e rápida. Além de facilitar a vida de seus usuários com o

consumo colaborativo de automóveis, serviços como o da Zipcar também ajudam a reduzir a

poluição e o consumo de recursos. “A base do sucesso da Zipcar foi uma fórmula simples:

criar uma maneira simples e eficiente para que as pessoas compartilhassem os carros ao invés

de comprá-los. O serviço é rápido, útil e acessível” (GANSKY, 2010, p. 11).

17

Disponível em: <http://www.zipcar.com/>. Acesso em: 15 maio 2012.

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Outro serviço citado por Gansky (2010) é o Roomorama18

, uma plataforma de

hospedagem alternativa, que permite que pessoas tornem suas casas em uma estada de curta

duração com tempo compartilhado, beneficiando hóspedes e anfitriões. Para o hóspede, o

Roomorama representa um baixo custo de hospedagem; para o anfitrião, uma maneira de

ganhar um dinheiro extra. “É isso que a Roomorama faz. Ao oferecer um serviço, ela cria

oportunidades para todos” (GANSKY, 2010, p. 25). Assim como o Zipcar e o Roomorama,

existem vários outros serviços semelhantes para compartilhamento de carros, residências e

outros tipos de produtos e serviços.

Entrando na parte de trocas de roupas, Gansky (2010) traz o exemplo do ThredUP19

,

uma plataforma para trocas de roupas que surgiu da ideia de um homem que queria encontrar

alguém do seu tamanho para trocar suas camisas. A ideia foi um sucesso, e logo milhares de

homens e mulheres associados estavam trocando suas peças de roupas por outras “novas”. Os

sócios listavam as peças que possuíam e os itens que gostariam de receber em troca, depois

enviavam seu pacote para o ThredUP, que se encarregava de enviar pacotes com peças de

igual valor. “Os sócios gostam de receber um pacote no correio com roupas “novas”. Ele

chega, e parece como um presente: você sabe que é pra você, mas não sabe exatamente o que

o espera” (GANSKY, 2010). Posteriormente, o foco do ThredUP foi mudado para as roupas

infantis, que em geral são utilizadas por curtos períodos e depois deixam de servir. A

mudança de foco foi uma sugestão dos próprios sócios.

Dentro do nicho da moda, há diversos outros exemplos além do ThredUP. O site

americano 99Dresses20

é uma plataforma de compra e venda de roupas de segunda mão

através de uma moeda virtual chamada de “botões”. Inicialmente, a ideia era disponibilizar

uma plataforma onde as mulheres pudessem trocar vestidos de festa. Hoje o site se apresenta

como “um guarda-roupa infinito de moda gratuita” que permite que você “nunca vista a

mesma roupa duas vezes”. Nesse estilo, existe também o britânico Big Wardrobe21

, cujo site

informa que hoje está presente em cerca de 140 países, o americano I-Ella22

e o francês

VideDressing23

, que recentemente lançou uma versão brasileira.

Neste capítulo foi explorado o consumo colaborativo, com base no histórico do

comércio e na lógica do consumo. Em geral, além de representarem economia para os bolsos

de seus usuários, os sistemas de consumo colaborativo trazem a seus usuários um valor

18

Disponível em: <http://www.roomorama.com>. Acesso em: 15 maio 2012. 19

Disponível em <http://www.thredup.com>. Acesso em 16 maio 2012. 20

Disponível em <http://www.99dresses.com>. Acesso em 16 maio 2012. 21

Disponível em <http://www.bigwardrobe.com>. Acesso em 16 maio 2012. 22

Disponível em <http://www.i-ella.com>. Acesso em 16 maio 2012. 23

Disponível em <http://www.videdressing.com>. Acesso em 16 maio 2012.

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agregado, ao mostrarem o valor da comunidade e do compartilhamento. Para que seja possível

compreender o contexto em que os bazares de trocas estão inseridos, bem como os novos

valores sociais trazidos pela era da colaboração, se faz necessário explorar os conceitos de

redes sociais, que serão abordados no próximo capítulo.

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29

3 REDES SOCIAIS

Neste capítulo serão abordados os conceitos de redes sociais, baseados nas ideias do

livro “Redes sociais e Internet”, de Raquel Recuero (2009), dentre outros autores que tratam

do tema. Também será abordado o Facebook, site de rede social onde estão situados os

bazares de trocas que são objeto de nesta monografia.

3.1 ATORES, NÓS E A CONSTRUÇÃO DO EU VIRTUAL

A Internet tornou possível que as pessoas se expressassem e sociabilizassem com

maior facilidade através das ferramentas de comunicação que surgiram a partir dela. O uso

destas ferramentas faz com que os usuários deixem rastros, a partir dos quais é possível

estudar as interações, compreender o seu comportamento e fazer o reconhecimento de padrões

nas redes sociais.

Marteleto (2001, p.72) define rede como um "sistema de nodos e elos; uma estrutura

sem fronteiras; uma comunidade não geográfica; um sistema de apoio ou um sistema físico

que se pareça com uma árvore ou uma rede". Uma rede social, de acordo com Recuero (2009)

é composta de atores e conexões, onde atores são os nós da rede (pessoas, grupos,

instituições) e as conexões são as interações e laços sociais entre eles. As redes sociais, para

Marteleto (2001, p.72), representam “[...] um conjunto de participantes autônomos, unindo

idéias e recursos em torno de valores e interesses compartilhados”.

Uma rede, assim, é uma metáfora para observar os padrões de conexão de

um grupo social, a partir das conexões estabelecidas entre os diversos atores.

A abordagem de rede tem, assim, seu foco na estrutura social, onde não é

possível isolar os atores sociais e nem suas conexões.

(RECUERO, 2009, p.24)

Os atores são representados por nós (ou nodos), e são as pessoas que estão presente na

rede. Eles são responsáveis por moldar esta rede a partir das interações e da construção de

laços sociais. Na Internet, segundo Recuero (2009), os atores da rede não são identificados

imediatamente, e se faz necessário o uso de representações. Um exemplo disso é que uma

comunidade do Orkut é um nó, mas ela é formada por diversos membros, e cada qual também

é um nó na rede. Ambos, a comunidade e os perfis pessoais no Orkut não são atores sociais,

Page 30: Consumo colaborativo em bazares de trocas do Facebook: Um estudo de caso do Bazar de Trocas da ESTILO

30

mas são representações desses atores, construídos por eles para representar elementos de sua

individualidade.

Este tipo de construção identitária é um processo que se mantém em permanente

evolução, e se repete em outros elementos do ciberespaço (RECUERO, 2009). Como por

exemplo, os sites pessoais, que não necessariamente são redes sociais. A construção do “eu”

está presente nas diversas apropriações que os usuários fazem de espaços virtuais, desde a

escolha de nicknames, a migração de um site de rede social para outro, a escolha de um tipo

de avatar ou a descrição de si mesmo. Um perfil em uma rede social é uma presença do “eu”

no ciberespaço, um espaço privado e público ao mesmo tempo, pois é preciso ser visto para

existir no ciberespaço. E quando as pessoas falam a partir desses espaços estão tornando

possível a expressão das redes sociais na Internet.

As pessoas têm uma necessidade premente de

pertencimento/reconhecimento em relação à comunidade ou grupo social no

qual estão inseridas. Nesse sentido, a sua organização em torno de projetos

comuns, sobretudo culturais, onde os indivíduos compartilham não só o

mesmo território, mas seus interesses, suas necessidades, enfim desejos

comuns é que se constitui neste processo de formação de identidade

individual e coletiva. (SILVA, 2005, p.3)

De acordo com Silva (2005), a construção da identidade pessoal tem raiz na identidade

coletiva. A percepção do outro é essencial para a interação humana, e no ciberespaço as

pessoas são percebidas a partir das suas palavras. Mas é preciso colocar rostos e informações

que identifiquem os atores responsáveis por cada informação, geralmente anônima, na

Internet. Conforme Recuero (2009), a partir dessa identificação dos atores que se torna

possível a interação social que cria vínculos e conexões na rede. Num perfil do Orkut ou do

Facebook, por exemplo, existem informações pessoais como nome, cidade e estado; há

também uma foto escolhida como avatar; e ainda existem relacionados a estes perfis

informações que identifiquem os gostos pessoais. Todas estas escolhas ajudam a construir o

“eu” nesses perfis, de forma que o perfil é percebido pelas outras pessoas como a

representação do próprio indivíduo dentro daquela rede.

Assim, podemos entender que os atores são as pessoas que agem através destas

ferramentas (blogs, websites, perfis em redes sociais) para se expressar de alguma forma. No

entanto, estas representações apenas são plausíveis a partir da possibilidade de interação com

outros atores e a criação das conexões. A soma das representações de cada indivíduo nas

diferentes plataformas e ferramentas na web dão pistas para que possamos entender quem é

Page 31: Consumo colaborativo em bazares de trocas do Facebook: Um estudo de caso do Bazar de Trocas da ESTILO

31

aquele indivíduo. “São construções plurais de um sujeito, representando múltiplas facetas de

sua identidade” (RECUERO, 2009, p. 30).

3.2 CONEXÕES, LAÇOS E CAPITAL SOCIAL

O outro elemento que compõe as redes sociais são as conexões, as ligações entre os

nós. Em geral, a rede é composta pelos laços sociais que são formados a partir da interação

dos seus atores. Esta interação só pode ser percebida graças aos rastros deixados nas redes.

Como por exemplo, uma publicação no mural de um perfil do Facebook fica gravada e

disponível até que alguém a delete, ou que o sistema saia do ar. Costuma-se dizer que o que é

publicado na web é como se fosse escrito em pedra, porque após publicado, não se tem mais

controle sobre este conteúdo; Ainda que tenha sido deletado, o conteúdo em questão teve livre

acesso por um determinado tempo, e gerou replicações na memória do computador de quem

acessou, foi indexado em sistemas de busca, e também pode ter sido copiado e republicado

por outras pessoas que tiveram acesso a ele.

A interação depende da atividade do outro, pois toda ação cria a expectativa de uma

reação, num processo comunicacional de caráter social. E no ciberespaço, as interações

possuem algumas peculiaridades. Recuero (2009) diz que na web, geralmente não há pistas da

linguagem não-verbal, mas poderiam ser citadas como exemplo as transmissões em streaming

via Twitcam (http://www.twitcam.com), onde existe a percepção destes sinais gestuais e de

fala, ainda que numa via de mão única, pois quem é assistido apenas recebe comentários

escritos em resposta, como forma de interação.

A ação de um depende da reação do outro, e há orientação com relação às

expectativas. Essas ações podem ser coordenadas através, por exemplo, da

conversação, onde a ação de um ator social depende da percepção daquilo

que o outro está dizendo. (...) A interação é, portanto, aquela ação que tem

um reflexo comunicativo entre o indivíduo e seus pares, como reflexo social.

(RECUERO, 2009, p. 30)

De acordo com Recuero, a interação entre os atores pode ser síncrona ou assíncrona.

Na primeira, os atores estão ambos presentes, interagindo simultaneamente (como nos chats e

sistemas de mensagens instantâneas), e na segunda os atores dividem um mesmo espaço e

mantém uma conversação, mas em tempos diferentes (como em fóruns e postagens no

Facebook, por exemplo). Mas as conexões nem sempre são fáceis de distinguir no

Page 32: Consumo colaborativo em bazares de trocas do Facebook: Um estudo de caso do Bazar de Trocas da ESTILO

32

ciberespaço. Uma conversação pode começar em um comentário no Facebook, evoluir em

uma conversa no Messenger, voltar para o Facebook, e ainda ter desdobramentos por outros

meios, como Twitter, e-mail, telefone, ou até mesmo presencialmente. E para quem não

participou ativamente desta interação, pode ser difícil compreender a evolução destas

conversações.

A interação mediada pelo computador cria e mantém relações complexas que ajudam a

construir as redes sociais na Internet. As relações geradas nessas redes, por sua vez, vão gerar

laços sociais. Determinadas ações e interações podem vir a criar, fortalecer, enfraquecer, ou

mesmo extinguir os laços sociais entre os atores, já que nem sempre a interação acontece de

forma positiva. O laço social é uma relação de interação estabelecida entre dois ou mais

atores, e independe de empatia ou afeto entre as partes, ou do tempo de duração. O laço social

pode variar de intensidade (fortes, fracos) e de duração (curtos, longos), de acordo com as

circunstâncias, e estas duas características em geral estão diretamente relacionadas entre si e

com o grau de intimidade entre o par de atores.

As redes sociais na Internet suportam tanto os laços fracos quanto os fortes, embora

sejam mais propícias para os laços fracos, já que propiciam a interação esparsa. Quanto maior

o número de laços, maior o número de interações, e maior será a complexidade de

determinada rede social. Os laços sociais podem vir de relações pessoais reais, e podem surgir

dentro do ciberespaço. Há até mesmo laços sociais que podem ser estreitados quando trazidos

para o ciberespaço, e também relações que só se mantém à distância, utilizando as redes

sociais na Internet como meio de interação, o que cria uma desterritorialização dos laços.

Os laços sociais, de acordo com Recuero (2009), também podem ser divididos em

laços relacionais e laços associativos. Os laços relacionais são aqueles em que há interação

mútua, que pode ser originada através da comunicação instantânea, onde o fluxo de

mensagens é mais constante. Os laços relacionais podem se fortalecer mais a cada nova

interação. Os laços associativos, por sua vez, se caracterizam pelo sentimento de

pertencimento, quando alguém quer demonstrar que faz parte de um determinado grupo, que

compartilha gostos em comum com outras pessoas ou mesmo busca identificação com outros

usuários. De acordo com Marteleto (2001) as redes informais são iniciadas a partir do

momento em que uma comunidade está consciente sobre interesses e/ou necessidades que são

comuns entre seus membros, e isso ocorre a partir dos laços relacionais.

Laços relacionais, deste modo, são aqueles constituídos através de relações

sociais, apenas podem acontecer através da interação entre os vários atores

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33

de uma rede social. Laços de associação, por outro lado, independem dessa

ação, sendo necessário, unicamente, um pertencimento a um determinado

local, instituição ou grupo. (RECUERO, 2009, p. 39)

Outro elemento relativo às conexões de uma rede social na Internet é o capital social.

Para Araújo (2010), “Capital Social é a argamassa que mantém as instituições em contato

entre si e as vincula ao cidadão visando a produção de bem comum” (ARAÚJO, 2010, p.10) .

Já Recuero (2009) trabalha a construção do conceito de capital social a partir de conceitos de

alguns autores, como Putnam, Bourdieu e Coleman. Inicialmente, de acordo com a reflexão

da autora, entendemos que é um indicativo da conexão entre os pares de indivíduos em uma

rede social. O capital social refere-se a estabelecer confiança e reciprocidade nas relações, a

partir de aspectos individuais e coletivos.

A confiança, preceito básico do capital social, segundo Putnam (2002), pode derivar

de duas fontes que são (1) regras de reciprocidade e (2) sistemas de participação cívica. As

regras de reciprocidade, conforme o autor, estão relacionadas com a retribuição de favores,

mas também com a aplicação de regras de constrangimento social, definidas publicamente de

maneira clara, para quem não coopera ou transgride as regras estabelecidas. Já os sistemas de

participação cívica remetem a vários tipos de associações, onde o indivíduo tem consciência

de que tem seu papel e que precisa desempenhá-lo para que adquira a sensação de

pertencimento àquele grupo social (PUTNAM, 2002).

O capital social é o agregado dos recursos atuais e potenciais, os quais estão

conectados com a posse de uma rede durável, de relações de conhecimento e

reconhecimento mais ou menos institucionalizadas, ou em outras palavras, à

associação a um grupo – o qual provê cada um dos membros com o suporte

do capital coletivo (...) (BOURDIEU, 1983, p.248-249 apud RECUERO,

2009, p. 46)

O capital social, de acordo com Araújo (2010) está associado à coletividade; para

Recuero (2009) está relacionado ao pertencimento a grupos, às ações dos atores destes grupos,

e ao conhecimento e reconhecimento mútuo dos participantes destes grupos. Dessa forma,

também podemos dizer que para compreender o capital social é necessário observar não

apenas os atores e suas interações, mas o conteúdo das mensagens trocadas entre eles, e

principalmente o sentido destas mensagens para o coletivo. Ao que diz respeito à Internet, é

importante compreender o conceito de capital social para poder estudar as relações

estabelecidas nas redes sociais, que são ainda mais complexas no ciberespaço.

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34

Uma sociedade cuja cultura pratica e valoriza a confiança interpessoal é mais

propícia a produzir o bem comum, a prosperar. A cooperação voluntária,

assentada na confiança, por sua vez, só é possível em sociedades que

convivem com regras de reciprocidade e com sistemas de participação

cívica. Em sociedades que tenham capital social, que, a exemplo de outras

formas de capital, é produtivo e possibilita a realização de certos objetivos

que sem ele seriam inatingíveis (ARAUJO, 2010, p.17).

.

3.3 DINÂMICAS DAS REDES SOCIAIS NA INTERNET

São muitos os elementos que compõe as dinâmicas das redes sociais na Internet. O

primeiro aspecto a ser levado em conta, de acordo com Watts (2003) citado por Recuero

(2009) é que as redes sociais se modificam com o tempo, pois por serem dinâmicas estão em

constante transformação. Estas transformações, em uma rede social, são muito influenciadas

pelas interações. “Os processos dinâmicos das redes são consequência direta dos processos de

interação entre os atores. Redes são sistemas dinâmicos e, como tais, sujeitos a processos de

ordem, caos, agregação, desagregação e ruptura” (NICOLIS; PRIGOGINE, 1989 apud

RECUERO, 2009, p. 80).

Outro aspecto a ser considerado sobre as redes sociais é seu caráter emergente.

Segundo afirma Recuero (2009) esta é uma característica dos sistemas complexos, que

envolve o aparecimento de padrões de comportamento que se repetem em larga escala de

modo coletivo e descentralizado. Neste contexto, a partir da interação surgem alguns

elementos importantes, como a cooperação, a competição e o conflito, como processos sociais

que influenciam a rede.

Quando os homens trabalham juntos, tendo em vista um objetivo comum,

seu comportamento é chamado cooperação. Quando lutam um contra o

outro, a conduta é rotulada oposição. Cooperação e oposição constituem os

dois processos básicos da vida em grupo (OGBURN; NIMKOFF, 1975,

p.236 apud RECUERO, 2009, p. 81)

Conforme afirma Recuero (2009), para que seja possível viver em sociedade, é

necessária a cooperação, que é o processo formador das estruturas sociais. A cooperação é o

que faz com que pessoas ajam de maneira organizada, de modo que um grupo possa ser

formado. A cooperação pode ser motivada pelos interesses individuais, pelo capital social

envolvido e pelas finalidades do grupo. "Sugere-se um ambiente de total cooperação, em que

se desenvolve o sentimento de pertença, promovendo a preocupação com o bem-estar do

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35

grupo, que em troca proporcionará a todos uma desinteressada receptividade e um confortante

sentimento de segurança" (PRIMO, 2005)

A competição é uma forma de luta social, que compreende a luta mas não a

hostilidade, que por sua vez é característica presente no conflito (RECUERO, 2009).

Enquanto a competição pode gerar cooperação entre os membros de um determinado grupo

ou subgrupo – que se organizam para vencer outro grupo em algum aspecto – a competição

pode levar a uma ruptura na organização social, podendo inclusive originar novos grupos a

partir dessa ruptura. Para Primo (2005), cooperação e conflito não são opostos. “Se um

competidor livrar-se de seu adversário, ele não poderá mais competir” (PRIMO, 2005). Para

Recuero (2009), estes processos podem estar relacionados de maneira mais complexa:

A cooperação, a competição e o conflito não são, necessariamente, processos

distintos e não relacionados. São, sim, fenômenos naturais emergentes das

redes sociais. O conflito, por exemplo, pode envolver cooperação, pois há a

necessidade de reconhecimento dos antagonistas como adversários. Esse

reconhecimento implica cooperação. Do mesmo modo, o conflito entre

grupos pode gerar cooperação dentro dos mesmos (RECUERO, 2009, p. 82).

Outros aspectos importantes a serem considerados sobre a dinâmica das redes sociais

são a ruptura e a agregação. “Uma das dinâmicas esperadas em grupos sociais é sua

capacidade de agregar mais pessoas e de que pessoas rompam com o grupo” (Recuero, 2009).

Deste modo, é possível compreender que os atores ligados a determinado grupo têm o poder

de agregar novos membros relacionados a um determinado tema ou contexto. E quanto maior

é a comunidade, maior a chance de ocorrerem competições e conflitos, que podem gerar

rupturas. Em geral, as rupturas são causadas por grupos pequenos em relação à comunidade,

mas que possuem grande expressão por estar reunidos em torno de clusters, que são atores

que possuem um número de conexões maior do que a média e acumulam um capital social

rico. Deste modo, as opiniões dos clusters costumam ter maior relevância e levam a agregar

outras pessoas mais facilmente, como uma forma de liderança.

3.4 O FACEBOOK

Nos capítulos 3.1 a 3.3, foram abordados os conceitos presentes nas redes sociais

aplicados à Internet, de acordo com as ideias de Recuero (2009). Neste capítulo será abordado

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36

de forma breve o site de rede social Facebook, para contextualizar o ambiente no qual se

situam os bazares de trocas estudados na presente monografia.

3.4.1 Histórico do Facebook

O Facebook é um site de rede social, ou seja, “um site que foca a publicização na rede

social dos atores” (Recuero, 2009, p. 178). Hoje é um dos sites de rede social mais acessados

no mundo. Chamado originalmente de “thefacebook”, o Facebook foi lançado em 2004, por

Mark Zuckerberg, em parceria com seus colegas Dustin Moskovitz e Chris Hughes, enquanto

eram alunos de Harvard.

Inicialmente, o site era focado naqueles alunos que estavam deixando o ensino

secundário e entrando na universidade. O foco inicial era criar uma rede de contatos entre os

universitários. Foi primeiramente aplicado a alunos de Harvard (em 2004), e depois

expandido a outras universidades e escolas (em 2005), e neste primeiro momento para entrar

no thefacebook era necessário pertencer a alguma das instituições reconhecidas. Em 2005, o

site possuía 5 milhões de membros ativos, e foi o ano em que passou a ser conhecido somente

como “Facebook”24

.

Posteriormente, o Facebook foi sendo liberado para escolas e empresas, até estar

disponível para o mundo inteiro. Em dezembro de 2011, o site ultrapassou o Orkut em

número de usuários e acessos, se tornando a maior rede social no Brasil. De acordo com a

comScore25

, as mulheres passam mais tempo no Facebook do que os homens no Brasil

(enquanto eles passam cerca de 4,1 horas no site, elas costumam ficar cerca de 5,3 horas).

Além disso, pessoas com idades de 25 a 34 anos representam a maioria dos visitantes do site e

30,6% da audiência total26

.

Hoje, de acordo com a página oficial do Facebook no site homônimo, “a missão do

Facebook é dar às pessoas o poder de compartilhar e tornar o mundo mais aberto e

conectado27

”. Nesta página, o site também fornece uma pequena descrição sobre a rede social:

“Milhões de pessoas usam o Facebook todos os dias para relacionar-se com os amigos,

24

Fonte: <http://www.infoescola.com/Internet/historia-do-facebook/. Acesso em: 16 jun. 2012. 25

A comScore é uma das maiores empresas do mundo que se dedicam a pesquisas sobre a Internet e o mundo

móvel. 26

Fonte: <http://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2012/01/facebook-passa-orkut-e-vira-maior-rede-social-do-

brasil-diz-pesquisa.html>. Acesso em: 16 jun. 2012. 27

Traduzido de “Facebook's mission is to give people the power to share and make the world more open and

connected”. Fonte: <https://www.facebook.com/facebook/info>. Acesso em: 16 jun. 2012.

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37

carregar um número ilimitado de fotos, compartilhar links e vídeos, e saber mais sobre as

pessoas que encontram28

”.

3.4.2 Recursos do Facebook

Para entrar no Facebook, o usuário deve preencher um cadastro simples (ver figura 2),

com poucas informações, como nome, sobrenome, e-mail e senha, gênero e aniversário. O site

possui uma validação de nome para evitar que sejam feitos cadastros fakes29

. O e-mail e a

senha são necessários para entrar no site e acessar sua conta posteriormente, e o aniversário é

requerido pela limitação de idade do Facebook só para maiores de 13 anos. O perfil30

do

Facebook é feito para pessoas físicas. Empresas, instituições, organizações e marcas devem

criar fanpages31

.

Após o cadastro, é solicitado ao novo usuário fazer uma busca pelos seus amigos e

conhecidos que já estão presentes na rede social para adiciona-los a sua rede de amigos. O

usuário também é incentivado a complementar as informações do seu perfil, adicionando o

local onde mora, onde nasceu, onde trabalha atualmente e locais onde já trabalhou, onde

estuda atualmente e locais onde já estudou; O usuário também pode relacionar amigos a seu

perfil como familiares e informar se está em um relacionamento, entre outras informações.

28

Traduzido de “Millions of people use Facebook everyday to keep up with friends, upload an unlimited number

of photos, share links and videos, and learn more about the people they meet.” Fonte:

<https://www.facebook.com/facebook/info>. Acesso em: 16 jun. 2012. 29

Termo utilizado para representar os perfis falsos. 30

Seu perfil (linha do tempo) é uma imagem completa de si mesmo no Facebook. Fonte:

<https://www.facebook.com/help/glossary>. Acesso em: 16 jun. 2012. 31

Páginas permitem que empresas, marcações e celebridades se conectem com pessoas no Facebook. Os

administradores podem publicar informações e atualizações do Feed de notícias para pessoas que "curtem" suas

páginas. Fonte: <https://www.facebook.com/help/glossary>. Acesso em: 16 jun. 2012.

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38

Figura 2: Tela inicial do Facebook32

O usuário também é incentivado a postar fotos, vídeos e atualizações em seu mural33

,

além de interagir com as publicações dos amigos (que aparecem no feed de notícias), através

dos botões curtir34

, compartilhar e fazendo comentários. O usuário também pode curtir

fanpages, que ficam relacionadas a seu perfil como interesses, e também pode fazer parte de

grupos35

.

Todas as informações pessoais e de interesse do usuário ficam disponíveis para acesso

em seu perfil. Recentemente, o Facebook lançou a timeline36

, ou linha do tempo, recurso em

que a história do usuário é contada ano a ano desde seu nascimento, de acordo com as

informações pessoais e atualizações diárias no site.

São muitas as ferramentas e recursos que compõe o Facebook, mas abaixo é feita uma

relação apenas daquelas que são necessárias para compreender os bazares de trocas, tema de

pesquisa da presente monografia.

32

Imagem da tela de login do Facebook (http://www.facebook.com) em 17 de junho de 2012. 33

“Seu Mural é o espaço no seu perfil no qual você e seus amigos podem publicar e compartilhar”. Fonte:

<https://www.facebook.com/help/glossary>. Acesso em: 16 junho 2012. 34

“Clicar em "Curtir" é uma forma de fazer comentários positivos e conectar-se com coisas importantes para

você”. Fonte: <https://www.facebook.com/help/glossary>. Acesso em: 16 junho 2012. 35

“Grupos são círculos fechados de pessoas que compartilham e mantém contato no Facebook”. Fonte:

<https://www.facebook.com/help/glossary>. Acesso em: 16 junho 2012. 36

“Sua linha do tempo é a sua coleção de fotos, histórias e experiências que contam sua história”. Fonte:

<https://www.facebook.com/help/glossary>. Acesso em: 16 junho 2012.

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39

Mural: O Mural é um espaço presente na página de perfil do usuário que permite que

ele poste atualizações de status, fotos, vídeos e links. Caso o usuário permita, seus amigos

também podem postar conteúdo de texto, links ou fotos no seu mural. Todas as postagens do

mural estão sujeitas às configurações gerais de privacidade do usuário, em que ele decide

quem pode visualizar suas publicações, mas estas configurações padrão podem ser alteradas

para cada postagem individual.

Botão Curtir: O botão de curtir (like, na versão original) é um recurso onde os

usuários podem manifestar que gostam de determinado conteúdo, sejam atualizações de

status, comentários, fotos, links compartilhados, fanpages, entre outros.

Botão Compartilhar: O botão de compartilhar (share, na versão original) é um

recurso onde os usuários podem replicar determinado conteúdo conteúdo para sua rede, sejam

atualizações de status, comentários, fotos, links compartilhados, fanpages, entre outros. Em

geral, o botão compartilhar está localizado ao lado do botão curtir.

Comentários: Em geral, quase todo tipo de publicação de um usuário no Facebook

permite que outros usuários postem comentários. Estes comentários podem ser isolados e

independentes, mas também podem gerar conversação.

Fotos: Todos os usuários possuem em seu perfil uma seção de fotos, onde podem

postar fotos divididas em álbuns. Também é possível postar vídeos, mas este é um recurso

pouco utilizado. Por padrão, o usuário possui um álbum de “Fotos do Mural”, um de “Fotos

do Perfil” e um de “Fotos de Capa”, mas o usuário pode criar outros álbuns. Cada álbum pode

conter uma descrição e várias fotos. Em cada foto, o usuário pode colocar uma descrição,

informar o local onde foi tirada e com quem estava naquela foto. Também é possível marcar

os amigos nas fotos. Abaixo dos álbuns, há uma seção com todas as fotos e vídeos em que o

usuário foi marcado.

Bate-papo: O Facebook disponibiliza uma ferramenta de bate-papo ou chat, em que

os usuários podem enviar mensagens instantâneas para conversar com seus amigos que

estiverem online. É possível adicionar amigos à conversa, e também iniciar chamadas de

vídeo. Quando um usuário tenta falar com outro usuário que esteja offline, o conteúdo é

enviado como mensagem para que ele veja quando estiver online. Todas as conversas do bate-

papo ficam com histórico disponível em mensagens, agrupadas por usuário ou por usuários.

Mensagens: Além de armazenar o histórico das conversas do bate-papo, o recurso de

mensagens permite aos usuários trocar mensagens privadas com usuários, sejam eles amigos

ou não, de acordo com as opções de privacidade do usuário. As mensagens podem ser lidas,

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respondidas e arquivadas como num sistema de e-mail. Também é possível enviar links e

anexar fotos e arquivos de maneira privada pelas mensagens.

Grupos: Os grupos são um espaço fechado onde grupos de pessoas podem se

comunicar sobre interesses em comum. Os grupos podem ser públicos, privados ou secretos.

Em grupos secretos ou fechados, as publicações ficam visíveis somente para os membros dos

grupos, e membros dos grupos devem ser aprovados ou adicionados por outros membros.

Grupos públicos ficam disponíveis na busca do Facebook, e qualquer um pode passar a fazer

parte. Os membros recebem notificações por padrão quando algum membro publica algo no

grupo. Os membros dos grupos podem participar de bate-papos, carregar fotos para álbuns

compartilhados, colaborar em documentos dos grupos e convidar os membros que são amigos

para eventos dos grupos. A ferramenta grupos e suas apropriações nos bazares de trocas serão

abordadas com mais detalhes no capítulo 5.2 da presente monografia.

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41

4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Neste capítulo são abordados os processos metodológicos utilizados para a realização

da pesquisa, bem como o detalhamento de cada uma das etapas que foram realizadas e seus

respectivos objetivos.

Após a sondagem inicial, foram feitos recortes no escopo, e subsequentemente a

seleção do corpus da pesquisa. Definiu-se que a pesquisa seria realizada em duas etapas: (1)

quantitativa e (2) qualitativa.

Na etapa quantitativa, foi realizada observação participante no Bazar de Trocas da

Estilo, de modo a compreender a lógica de funcionamento do mesmo. Depois foi feita a

documentação da ferramenta grupos, para identificação das apropriações de uso para a

realização dos bazares. Em seguida, foi feita a observação documentada da atividade do bazar

durante uma semana, a qual possibilitou a identificação de categorias. Por fim, foi aplicado

um questionário com as usuárias, para obter um perfil demográfico e compreender as

motivações de uso dos bazares de trocas.

Na etapa qualitativa, foram aproveitados os conhecimentos adquiridos a partir dos

meses de conversação com as usuárias37

, bem como as respostas às perguntas abertas do

questionário da fase quantitativa. Para complementar a análise, foram realizadas entrevistas

em profundidade com cinco usuárias. O objetivo da fase qualitativa era conhecer o ponto de

vista das usuárias sobre os bazares de trocas, identificar suas motivações de uso e o impacto

deste uso em suas vidas.

Para realizar a pesquisa, de maneira a aprofundar o conhecimento acerca da lógica de

funcionamento dos bazares de trocas, e das motivações das usuárias, foi escolhido o método

de observação participante, embora em alguns momentos tenha sido utilizada a observação

silenciosa. Os procedimentos metodológicos utilizados tiveram base na netnografia.

4.1 ETNOGRAFIA E NETNOGRAFIA

A metodologia utilizada para a realização desta pesquisa foi a Etnografia aplicada à

Internet, também conhecida como Netnografia. Ambas serão explicadas a seguir neste

subcapítulo.

37

São considerados todos os meses desde a sondagem inicial (março de 2011) até a finalização do presente

trabalho (junho de 2012).

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42

Etnografia é um processo utilizado para descrever um grupo de pessoas, onde o

pesquisador vai à campo para coletar informações sobre este grupo. Não consiste

necessariamente uma metodologia, mas pode ser um método utilizado como narrativa para

uma pesquisa (ANGROSINO, 2009). Desta forma, foram utilizadas abordagens etnográficas

para o desenvolvimento da pesquisa e análise.“A etnografia é a arte e a ciência de descrever

um grupo humano – suas instituições, seus comportamentos interpessoais, suas produções

materiais e suas crenças” (ANGROSINO, 2009, p. 30).

Inicialmente surgida na área da antropologia, a etnografia sofreu muitas apropriações

e adaptações, e hoje é utilizada nas mais diversas áreas, ainda que muitas vezes de forma

incorreta. Após a Internet se consolidar como meio de comunicação, alguns pesquisadores

perceberam que poderiam aplicar abordagens etnográficas para estudar culturas de

comunidades virtuais, ainda que esta perspectiva causasse estranhamento em cientistas e

antropólogos, que sentiam falta do poder “ir a campo” num contexto atemporal e

independente de localização física, como é o caso da Internet. Outro ponto criticado é a frieza

das relações humanas intermediada por máquinas.

Porém, há autores que defendem a validade desta transposição. Hine (2000; 2005),

que popularizou o termo, afirma que a construção do campo, diferentemente do presencial

onde podemos analisar a realidade social, no virtual acontece a partir de reflexões subjetivas.

O virtual nunca está totalmente separado do real, acontecendo através da imersão do sujeito

através da máquina. Por causa da atemporalidade do meio virtual, em geral a narrativa é

construída depois dos fatos, e raramente respeita a ordem cronológica dos acontecimentos.

O termo netnografia é um neologismo surgido na metade da década de 90, formado

por net + etnografia. Este termo foi popularizado por Robert Kozinets em suas pesquisas

relacionadas a fandoms38

. Posteriormente, outros autores passaram a defender o termo, e

defendendo que a utilização dele ajuda a demarcar as diferenças da etnografia quando

aplicada para ambientes virtuais, desde as formas de coleta de dados até a análise (Kozinets,

2010). Além de “netnografia”, outros termos foram cunhados por outros autores para

denominar a pesquisa etnográfica no meio virtual, porém, discussões acerca da implicação de

significado desses termos acabaram por definir que a própria “etnografia” continua aplicável

para pesquisas no campo virtual.

A etnografia pode ser escolhida “para estudar questões ou comportamentos sociais

que ainda não são claramente compreendidos e ajudar o pesquisador a ‘tomar pé da situação’

38

Palavra de origem inglesa (derivada de Fan Kingdom), que se refere ao conjunto de fãs de um determinado

programa da televisão, pessoa ou fenômeno em particular.

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43

antes de centrar-se em questões específicas” (Angrosino, 2009, p. 36). Também podemos

escolher esse método para “conhecer a perspectiva das próprias pessoas sobre as questões”.

Ele pode ser utilizado para definir o problema de pesquisa, identificar os participantes de um

cenário social, registrar um processo e contextualizar o levantamento de dados quantitativos.

Para realizar uma pesquisa etnográfica, é necessário realizar um planejamento inicial,

que pode ser alterado durante o curso da pesquisa – já que os processos não são

necessariamente lineares, e o comportamento das pessoas nem sempre corresponde às nossas

expectativas. O planejamento deve contemplar alguns limites, para que o pesquisador não

desvie do foco da pesquisa, como o que estudar e o que deixar de fora. O pesquisador deve

revisar a literatura existente acerca da temática do objeto, enquanto busca se aclimatizar e

conhecer bem o objeto. Em alguns casos, a literatura existente não contempla o problema de

pesquisa, mas ainda assim a etnografia ajuda a construir este problema.

Após a literatura e o domínio inicial do tema de pesquisa, o pesquisador deve ir a

campo para estudar o objeto, tanto como observador quanto como participante. No caso da

netnografia, o pesquisador deve se inserir no campo de pesquisa, “selecionar, observar,

documentar (salvando arquivos e mensagens, fazendo printscreens, efetuando downloads de

materiais etc.), questionar e analisar” (AMARAL et al, 2011). É importante ter o material

salvo, pois apesar de tudo aparentemente estar sempre disponível na web, em algum momento

pode não estar mais: sites mudam o layout ou são descontinuados; postagens são excluídas,

usuários deixam o sistema, funcionalidades são adicionadas ou removidas, entre outros

problemas.

O campo virtual deve ser considerado como um elemento da vida cotidiana, e não

como algo independente. Os elementos de interação social (mensagens, tweets, recados, links,

etc) devem ser reparados no dia a dia da pesquisa. Devem ser consideradas três fronteiras

(espacial, temporal e relacional) e três esferas de influência (analítica, ética e pessoal) para a

construção do campo a ser pesquisado (KENDALL, 2009, p. 22). Ambas as fronteiras e as

esferas de influência vão ajudar a delimitar o recorte do objeto. As fronteiras espaciais

ajudarão num campo mais descritivo de um projeto.

Quando o pesquisador for a campo, deve entrar em contato com o grupo para

ambientação, e a partir daí manter um diário de campo com as anotações que serão utilizadas

para construir uma descrição e análise de seu objeto. No diário de campo devem ser feitos os

comentários de função emotiva (anotações subjetivas do pesquisador), empírica (para coleta

de dados), reflexiva e analítica (identificação de padrões e categorias). A netnografia não é

feita apenas da observação, mas também das trocas culturais e dos questionamentos aos

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44

informantes. A etnografia, segundo as autoras, pode ser adaptada e combinada com diversos

outros métodos de pesquisa, como análises quantitativas e estatísticas, pesquisas de opinião,

análise de redes sociais, estudos de caso, análise de conversação, e até mesmo do uso de

games.

O grau de familiarização do pesquisador com as ferramentas digitais, suas facilidades

de dificuldades dentro do campo, são fatores que contribuem para a discussão e análise, e

ajudam a garantir a confiabilidade dos dados (AMARAL et al., 2011). Outra coisa importante

é a decisão do pesquisador de ser apenas observador anônimo ou agir como participante; e

isto varia da percepção do pesquisador em relação ao que é mais adequado a cada objeto que

vá pesquisar. Ambos têm seus aspectos positivos e negativos. Em ambos os casos, por estar

lidando com informações e conteúdos pessoais, é necessário respeitar os valores éticos e a

privacidade dos pesquisados em ocasião da divulgação dos resultados da pesquisa. “A

tecnologia disponível para o etnógrafo moderno aumenta sua capacidade de fazer trabalho de

campo, mas também corre o risco de congelar o instante com tanta clareza e (aparente)

conclusividade que o fluxo da ‘vida real’ não é mais capturado” (ANGROSINO, 2009, p.

123).

4.2 SONDAGEM

Neste capítulo será detalhada a etapa de sondagem. Antes que fosse determinado o

escopo de pesquisa da presente monografia, foi realizada uma etapa de sondagem acerca do

tema escolhido, que num primeiro momento eram os brechós online.

Nesta etapa de sondagem foram pesquisados alguns brechós online situados em sites,

blogs e perfis de redes sociais. Durante esta pesquisa, foi descoberto um grupo de trocas de

roupas no Facebook. Inicialmente, foi feita apenas a observação do funcionamento deste

grupo, mas após alguns dias de observação silenciosa, foi iniciado o processo de observação

participante do grupo, com a realização efetiva de trocas, estabelecendo relações sociais e de

amizade com as usuárias. Neste período, foram feitas anotações iniciais e o planejamento do

projeto de pesquisa.

Foi realizada ainda na fase exploratória uma pesquisa simples, em forma de

questionário. O objetivo dessa pesquisa inicial era conhecer o perfil geral dos usuários do

bazar de trocas, verificar se o tema possuía relevância para ser pesquisado, e sondar usuários

que pudessem compor a amostra da pesquisa posteriormente. Durante a realização desta

pesquisa inicial, também foram descobertos outros bazares de trocas, e alguns até mesmo de

Page 45: Consumo colaborativo em bazares de trocas do Facebook: Um estudo de caso do Bazar de Trocas da ESTILO

45

vendas de peças usadas, principalmente dentro do Facebook. Em geral, as usuárias destes

outros bazares também faziam parte do bazar da revista Estilo, ou tinham o mesmo perfil, mas

começavam a segmentar em outros grupos. Por exemplo, criando grupos de trocas por região,

ou por numeração de calçados, como é o caso do “Bazar de Trocas Rio”, e do “Bazar de

Trocas e Vendas de Calçados do 37 ao 40”, respectivamente.

Diante da amplitude de campo e da relevância atual do tema a ser pesquisado, foi

possível concluir que o tema era digno de ser pesquisado. A partir desta primeira sondagem,

foi possível definir o escopo de pesquisa e a amostra.

4.3 DEFINIÇÃO DA AMOSTRA

Visto que o universo dos brechós e bazares online é muito amplo, e que o tempo hábil

para a realização da pesquisa era limitado, tornou-se necessário fazer algumas escolhas quanto

à amostra que seria pesquisada. O primeiro recorte feito foi focar a pesquisa nos bazares de

trocas de roupas em redes sociais, por possuírem muitas especificidades interessantes, por

terem relação direta com o consumo colaborativo, e por se restringirem principalmente ao

público feminino. A partir deste recorte, foi definido que a pesquisa seria focada apenas nos

bazares do Facebook, por este disponibilizar ferramentas mais sociais (como as opções curtir

e compartilhar, e a própria ferramenta grupos, onde se situam os bazares) que enriquecem a

experiência dos usuários.

Dentro do universo dos bazares de trocas do Facebook, foi selecionado um grupo para

observação e realização do estudo de caso: o “Bazar de Trocas da ESTILO”, criado pela

revista de moda Estilo. Este grupo foi escolhido pela sua relevância, por possuir um número

significativo de usuários, por registrar atividade diária e constante, e consequentemente por

ter sido notado na mídia nacional, aparecendo em matérias de canais televisivos, jornais,

revistas e em sites de notícias.

Como comentado anteriormente, a pesquisa se dividiu em duas etapas (qualitativa e

quantitativa), e para cada etapa foram utilizadas algumas usuárias para compor a amostra. A

amostra do questionário (fase quantitativa) foi composta pelas usuárias que voluntariamente

se disponibilizaram para respondê-lo. No que diz respeito às usuárias entrevistadas na etapa

qualitativa, foram escolhidas usuárias que se mostraram ativas durante o período de coleta de

dados, e que concordaram em participar. A diversidade de perfis também fez parte do critério

de escolha: Mulheres de diferentes idades, estados civis, classes sociais e localidades;

Algumas das usuárias pesquisadas foram mulheres que faziam trocas nos grupos, mas

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46

também vendiam e compravam peças de brechós online; Também haviam mulheres que

possuíam sites e blogs para comercialização de peças de brechó, mulheres que utilizavam

apenas as redes sociais, e também as que se faziam presentes em ambos os ambientes.

4.4 ETAPAS DE PESQUISA

Neste capítulo serão detalhados os procedimentos realizados nas etapas qualitativa e

quantitativa da pesquisa.

4.4.1 Observação participante

Foi realizada a observação participante da autora da presente monografia como usuária

dos bazares de trocas. Nesta etapa, a pesquisadora procurou, através da observação e da

participação ativo no Bazar de Trocas da Estilo, compreender como era o funcionamento do

grupo. Para isto também foi necessária a realização negociações e envio de trocas de roupas,

tanto pelos correios quanto presencialmente. A conversação e a interação com as usuárias foi

essencial para compreender a lógica de funcionamento do grupo, e como se dá a construção

de confiança entre as usuárias. Os resultados desta etapa estão descritos no capítulo 5.1 desta

monografia.

4.4.2 Mapeamento de uso da ferramenta Grupos

Para que fosse possível compreender as apropriações de uso que as usuárias faziam da

ferramenta grupos do Facebook para a realização dos bazares de trocas, foi feito o

mapeamento dos recursos e funcionalidades disponíveis nesta ferramenta. A partir daí, foi

observada a maneira como eram utilizados estes recursos, e os resultados encontrados foram

documentados. Os resultados desta etapa estão descritos no capítulo 5.2 desta monografia.

4.4.3 Identificação de categorias de postagens

Após a identificação dos elementos presentes em grupos do Facebook, e suas devidas

apropriações pelos usuários dos bazares de trocas, foi realizada a documentação das postagens

do Bazar de Trocas da Estilo, com intuito de categorizar essas postagens, a partir da

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47

observação silenciosa das postagens contabilizadas durante uma semana39

. Os resultados

desta etapa estão descritos no capítulo 5.2 desta monografia.

4.4.4 Aplicação de questionário

Foi elaborado um questionário dividido em duas partes. A primeira delas, de caráter

objetivo, era referente a dados básicos de faixa etária, localização, entre outros. A segunda

parte possuía perguntas abertas sobre o uso dos bazares de troca. O questionário40

foi feito a

partir da ferramenta de formulários do Google Docs (ver instrumento de coleta no Apêndice 1

deste trabalho), e disponibilizado em um endereço público durante duas semanas, e obteve 68

respostas espontâneas. Neste período, a divulgação do formulário foi feita diariamente no

mural do Bazar de Trocas da Estilo. “As mulheres adoram enquetes e testes – e é por isto que

todas as revistas femininas os publicam com frequência e até os utilizam como parte de sua

pesquisa de audiência” (BARLETTA, 2003).

Na primeira etapa, eram pedidos os seguintes dados: Nome ou pseudônimo41

, gênero,

faixa etária, status de relacionamento42

, estado, cidade e faixa de renda.

Na segunda etapa, as perguntas abertas eram as seguintes:

Quando e como você começou a utilizar bazares de trocas na Internet?

Qual a frequência com que você utiliza os bazares de trocas na Internet?

Que tipo de bazares você faz parte? Pode citar alguns dos que você é mais ativo?

Além dos bazares de trocas no Facebook, você utiliza blogs, sites ou outras

ferramentas para realizar trocas? Se sim, quais?

Você já sofreu algum tipo de problema (calote, prejuízo, depepção) com uma troca?

Se sim, como procedeu na situação?

Que tipo de mudanças os bazares trouxeram para a sua vida?

Na segunda etapa ainda haviam duas perguntas objetivas de múltipla escolha, que

eram as seguintes:

39

Período de coleta: de terça 8/11/2011 às 12h 00min até terça 15/11/2011 às 12h 00min 40

Questionário disponibilizado entre 15 e 29 de novembro de 2011, no seguinte link:

<https://docs.google.com/spreadsheet/viewform?hl=pt_BR&formkey=dEdPRDlZMmZXS3VQejdtSUNDNFEt

OXc6MQ#gid=0>. 41

Neste campo, foi pedido um nome para identificação. Foi sugerido um apelido ou pseudônimo que fosse

utilizado nos bazares de trocas, ou o nome e as iniciais do sobrenome, ou ainda informar um nome ou apelido

qualquer à escolha do usuário. O nome escolhido neste campo seria utilizado para eventuais citações das

respostas no trabalho acadêmico. 42

Neste campo, foi pedido aos informantes que escolhessem a opção que fosse mais compatível com seu status

real de relacionamento atual (não necessariamente o que está informado no Facebook). Como a pesquisa está

baseada em redes sociais, definiu-se que o status de relacionamento seria mais relevante que o estado civil.

Page 48: Consumo colaborativo em bazares de trocas do Facebook: Um estudo de caso do Bazar de Trocas da ESTILO

48

Sobre a sua atividade nos bazares, você costuma... (múltipla escolha)

o Trocar peças

o Comprar peças

o Vender peças

o Emprestar peças

o Alugar peças

o Apenas observar

Que tipo de itens você costuma negociar nos bazares? (múltipla escolha)

o Peças de vestuário

o Calçados

o Acessórios de moda

o Maquiagens, perfumaria e cosméticos

o Lingerie (roupas de baixo e roupas de dormir)

o Eletrônicos (iPod, mp3 player, câmera digital, etc)

o Celulares / Smartphones

o Computadores / notebooks / laptops / tablets

o Eletroportáteis (chapinha, baby liss, escova modeladora, depilador, etc)

o Itens de decoração (casa)

o Livros, CDs e DVDs

o Outro: (campo para digitação)

Por fim, foi disponibilizado um campo para que o informante fizesse comentários, e

outro para que deixasse um e-mail de contato, para que posteriormente fosse possível contatar

os informantes, até mesmo para dar um feedback sobre a pesquisa. Ambos os campos eram

facultativos.

Os resultados desta etapa estão descritos no capítulo 5.4 desta monografia.

4.4.5 Entrevista em profundidade

Após a realização das etapas anteriores, verificou-se a falta de informações mais

pertinentes a respeito de como as usuárias se sentiam em relação ao uso dos bazares, e sobre

as mudanças que este uso tinha trazido pra vida delas. Para que fosse possível obter estas

informações, foi feita a pesquisa qualitativa, a partir da realização de entrevistas em

profundidade com algumas usuárias.

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49

Novas técnicas de pesquisa reconhecem que, quando as mulheres

“conversam entre si”, a dinâmica é muito diferente da de uma conversa entre

homens. As mulheres se tornam mais comunicativas quando interagem

livremente, e quando têm permissão de falar em termos variados, num estilo

feminino e amigável. (BARLETTA, 2003, p. 173)

Esta etapa foi fundamental para compreender a importância dos bazares na vida das

usuárias e o impacto que este uso ocasionou na vida e no comportamento dessas mulheres. A

entrevista foi feita com cinco usuárias, algumas de modo presencial, com uso de gravador, e

outras a partir da ferramenta de chat do Facebook. As usuárias escolhidas possuíam diferentes

perfis, tanto em relação a faixa etária, faixa de renda, estado civil e localidade.

A entrevista foi dividida em dois blocos de perguntas por tema. Dentro de cada bloco

havia uma lista de perguntas que seriam utilizadas como baliza para a entrevista. Outras

perguntas foram acrescentadas de acordo com o andamento de cada entrevista.

Bloco 01: Motivações da utilização dos bazares

O primeiro bloco de perguntas foi relacionado às motivações das usuárias para utilizar

os bazares de trocas. Para guiar este bloco, foram utilizadas as seguintes questões:

(A) Como e por que você começou a utilizar os bazares de trocas?

(B) Que motivos fizeram com que você continuasse participando?

(C) O que os bazares de trocas significam para você hoje?

Bloco 02: Impacto do uso na vida e na rotina

O segundo bloco de perguntas foi relacionado ao impacto que o uso dos bazares

causou na vida e na rotina das usuárias. Para guiar este bloco, foram utilizadas as seguintes

questões:

(A) O que mudou na sua vida e na sua rotina depois que começou a utilizar os bazares?

(B) Que pontos positivos e negativos você poderia apontar sobre o seu uso dos bazares?

(C) Seu modo de consumir itens de vestuário mudou após a utilização dos bazares?

4.5 QUADRO RESUMO

O infográfico abaixo apresenta o quadro resumo da metodologia utilizada nesta

pesquisa, de modo a facilitar o entendimento deste capítulo.

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50

Figura 3: Quadro resumo da metodologia

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51

5 RESULTADOS OBTIDOS

Este capítulo apresenta os resultados obtidos a partir dos procedimentos

metodológicos descritos no capítulo anterior, bem como a análise destes resultados com base

na fundamentação teórica acerca de comércio, consumo, consumo colaborativo (capítulo 2) e

redes sociais (capítulo 3).

5.1 LÓGICA DE FUNCIONAMENTO DO BAZAR

Conforme visto anteriormente, uma rede social é uma metáfora que pode ser usada

para o estudo dos padrões de conexão de um grupo social, a partir das conexões de seus atores

(RECUERO, 2009). Uma rede social é composta de atores e conexões, onde atores são os nós

da rede (pessoas, grupos, instituições) e as conexões são as interações e laços sociais entre

eles. Sites de redes sociais são ferramentas que servem de apoio para as interações de uma

rede de pessoas. Os atores são responsáveis por moldar esta rede a partir das interações e da

construção de laços sociais. Um perfil no Facebook, por exemplo, não é um ator social, mas

uma representação desse ator. Uma rede social só existe quando há conexões entre os nós,

gerando interação. Nas ferramentas de redes sociais na Internet, esta interação só pode ser

percebida graças aos rastros deixados nas redes.

Como em toda rede social, podemos observar no Bazar de Trocas da Estilo os aspectos

básicos que se pressupõe de uma rede, além dos atores e das conexões. Também podemos

identificar a cooperação, os conflitos, a competição, ruptura, agregação e adaptação

(RECUERO, 2009). As usuárias cooperam para criar e manter as regras do bazar, para

informar as moderadoras, para atualizar a “Lista Branca” das pessoas confiáveis e a “Lista

Negra” de não confiáveis, para resolver conflitos nas trocas e até mesmo para avisar a outras

usuárias que encontraram certas peças que elas estavam procurando. Também há

manifestações solidárias quando alguma das usuárias se encontra com dificuldades, dúvidas

ou problemas pessoais, por exemplo.

Como é uma rede baseada em confiança, as usuárias dependem da confiabilidade

umas das outras. Mas muitas vezes ocorrem conflitos quando uma troca não é enviada por

uma das partes, ou quando são enviadas peças sem condições de uso, por exemplo. Também

há geração de conflitos em relação às vendas no bazar, já que algumas usuárias querem

comprar e vender peças, enquanto outras repudiam esta prática, alegando que o “bazar de

trocas” é feito só para trocas. Também foram observados casos de usuárias que se

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52

incomodavam com manifestações de amizade e postagens que não fossem diretamente

relacionadas a peças para trocas no bazar, o que gerava conflito com as pessoas que nutriam

estas práticas.

Foi possível observar também que há certas peças que causam “disputas” dentro da

comunidade quando alguma usuária posta. Produtos de marcas boas ou marcas “queridinhas”

como Melissa, Farm e Victoria’s Secret, ou produtos visados em determinada época, como

vestidos de renda no verão, ou botas no inverno, por exemplo, motivam a competição para ver

quem vai levar a peça.

Por causa de conflitos existentes entre usuárias do Bazar de Trocas da ESTILO entre

as usuárias, onde umas se incomodavam com manifestações de amizade e postagens que não

fossem diretamente relacionadas a peças para trocas no bazar, enquanto outras apoiavam e

consideravam saudável este comportamento no grupo. O conflito acabou por gerar uma

ruptura, em que um pequeno grupo de usuárias criou um bazar onde pudessem se expressar

livremente, e também se defender das usuárias “mal intencionadas”, o Trocas Entre Amigas.

Também houve uma ruptura no grupo no que diz respeito às vendas de produtos. As usuárias

que queriam comprar e vender seus produtos acabaram criando vários outros grupos no

Facebook destinado a vendas, já que o comércio era “proibido” nos grupos de trocas. Como

exemplo é possível citar o grupo “e-LOka Trocas e Vendas43

”.

Como comentado anteriormente, no Bazar de Trocas da ESTILO havia um grupo de

usuárias que tiveram o poder de agregar um número significativo de pessoas e romperam com

o grupo, para dar origem a outro grupo semelhante, porém, com novas regras de operação.

Como clusters deste grupo, é possível citar Desiree Guedes e Thainá Freitas, por exemplo.

O grupo Trocas Entre Amigas44

foi fundado em março de 2011 por um grupo de

meninas que pertenciam ao “Bazar de Trocas da ESTILO” que estavam descontentes o grupo,

por causa de “barracos”, que segundo as fundadoras do novo grupo, aconteciam no grupo da

Estilo. De acordo com elas, estes desentendimentos ocorriam por causa de calotes nas trocas

(pessoas que não enviavam as trocas combinadas, ou enviavam peças sem condições de uso),

pelo uso da rede de trocas para divulgação de venda de produtos e por causa da “opressão”

(por parte das moderadoras do grupo, e de algumas usuárias) às relações sociais e

manifestações de amizade a partir da criação de tópicos que não fossem relacionados

diretamente à divulgação de peças para troca.

43

Disponível em: <http://www.facebook.com/groups/203793372988309/>. Acesso em: 5 out. 2011. 44

Disponível em: <http://www.facebook.com/groups/trocasentreamigas/>. Acesso em: 5 out. 2011.

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53

Quando foi solicitada a colaboração das usuárias com dados sobre a criação do grupo,

uma delas respondeu o seguinte:

“A fundadora foi a Thainá Souza e as motivações foram os barracos, desentendimentos e

afins da Estilo... queríamos um ambiente saudável de lazer e onde pudéssemos ficar mais

atentas aos golpes, e onde poderíamos ajudar mais...” - Desiree Guedes.

Também houve segmentações do grupo que não ocorreram por causa de conflitos, mas

pelo que podemos considerar como adaptação, a partir da criação de outros grupos

semelhantes de trocas (em alguns casos, de vendas também) por grupos de interesse. Podemos

citar grupos segmentados por localidades, como o “Bazar de Trocas Porto Alegre45

”; grupos

relacionados a marcas, como o “Desapegos Melissa46

”; e até mesmo grupos por tipo e

tamanho de produto, como é o caso do “Bazar de Trocas e Vendas Calçados do 37 ao 40!47

”.

5.2 APROPRIAÇÕES DA FERRAMENTA GRUPOS

As usuárias do Bazar de Trocas da Estilo, bem como de outros bazares semelhantes, se

apropriaram da ferramenta de grupos do Facebook e se auto-organizaram para dar forma aos

bazares de trocas. Abaixo, é feita uma relação das ferramentas disponíveis nos grupos do

Facebook, e como elas são utilizadas48

:

5.2.1 Mural

O mural é a página que exibe os tópicos postados pelos usuários do grupo, em ordem

cronológica decrescente. As postagens atualmente podem ser de três tipos:

45

Disponível em: <http://www.facebook.com/groups/104208902994300/>. Acesso em: 6 out. 2011. 46

Disponível em: <http://www.facebook.com/groups/132502760163890/>. Acesso em: 6 out. 2011. 47

Disponível em: <http://www.facebook.com/groups/202944283070067/>. Acesso em: 6 out. 2011. 48

A ferramenta Grupos do Facebook (bem como todas as outras ferramentas desta rede social) vem sofrendo

alterações freqüentes recentemente, então a identificação de recursos está sujeita ao período de observação

(outubro de 2011).

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54

Figura 4: Cabeçalho do Bazar de Trocas da Estilo, com o mural

1. Escrever mensagem: É a opção padrão, em geral apenas para publicação de

mensagens em formato texto. Quando há um link adicionado à postagem, ele é convertido

para um formato padrão de imagem, título, teaser (um pequeno pedaço do conteúdo) e fonte

(site/url). É a opção mais utilizada nos bazares de trocas, para conversação e até mesmo para

divulgação de peças e álbuns, que são postados em geral por link.

2. Adicionar foto/vídeo: Este modelo permite três opções: Enviar foto/vídeo (arquivo do

seu computador), usar webcam (tirar foto ou gravar vídeo na hora), criar um álbum de fotos

(criar um álbum dentro do grupo, e adicionar várias fotos). As fotos, os vídeos e os álbuns

adicionados ficam dentro do grupo, todos na seção “fotos”. Praticamente não são adicionados

vídeos nos bazares de trocas, e as fotos são de certa maneira poucas, já que em geral as

usuárias utilizam os álbuns de fotos de seus perfis pessoais para postar as fotos das peças, e

não o mural do grupo. Todavia, é possível encontrar fotos de peças para troca postadas a

partir desta ferramenta.

3. Perguntar: Permite a criação de enquetes ou perguntas com respostas que podem ser

pré-determinadas ou não. É possível adicionar opções de resposta, e há a opção de liberar (ou

não) que qualquer usuário do grupo possa adicionar uma resposta. Esta opção é raramente

utilizada pelas usuárias do bazar.

Para todas as três modalidades de postagem, há a opção de adicionar pessoas que

estejam com você no momento da postagem, e adicionar o local onde você está manualmente

ou via geolocalização. Ambos os recursos não são utilizados usualmente nos bazares de

trocas.

5.2.2 Publicações do mural

Todas as publicações do mural são tópicos que podem ser “curtidos”, comentados e

seguidos por outros usuários. Ao comentar ou curtir uma publicação, o usuário

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55

automaticamente está seguindo esta publicação, mas pode deixar de seguir a qualquer

momento. Também é possível seguir uma publicação sem ter curtido ou feito um comentário

nela. Quando o usuário segue uma publicação, ele passa a receber notificações de atualização

cada vez que outro usuário comentar ou curtir a postagem. As postagens e suas devidas

categorizações serão descritas mais profundamente no capítulo 5.3.

5.2.3 Membros

Na seção de membros49

há uma listagem dos membros do grupo, com nome, foto e

alguma informação adicional (que pode ser cidade de origem ou profissão, por exemplo).

Além disso, se o membro listado for um amigo do usuário, há o botão “amigos”, com opção

de categorizá-lo nas listas de amigos ou desfazer amizade; Se o membro não for um amigo, há

a opção de adicionar como amigo; Caso este membro já tenha feito uma solicitação de

amizade para o usuário, há um botão para responder à solicitação de amizade (confirmar ou

excluir solicitação); E caso o usuário já tenha solicitado amizade de algum membro mas não

tenha sido aprovado, há a informação “aguardando aprovação”.

5.2.4 Fotos

Na seção de fotos50

estão disponíveis todas as fotos e os vídeos que foram adicionados

ao grupo através do mural. Também há a opção de criar álbuns públicos de fotos, onde

qualquer membro pode adicionar fotos ou vídeos, “curtir” e comentar os álbuns ou as

fotos/vídeos individualmente.

5.2.5 Documentos

A seção de documentos51

possui uma listagem dos documentos do grupo, que são

visíveis para todos os usuários. Os documentos também podem ser editados por qualquer

membro do grupo, desde que o membro criador do documento permita esta opção nas

configurações de criação do documento.

49

Disponível em: <http://www.facebook.com/groups/128866630515607/members/>. 50

Disponível em: <http://www.facebook.com/groups/128866630515607/photos/>. 51

Disponível em: <http://www.facebook.com/groups/128866630515607/docs/>.

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56

Os principais documentos são o documento de regras de uso da comunidade, a “Lista

Branca” (de usuárias confiáveis) e a “Lista Negra” (de usuárias que não se mostraram

confiáveis), que são constantemente editados, onde os usuários adicionam, respectivamente,

nomes de pessoas com quem realizaram trocas boas e ruins, além de comentários eventuais

sobre o motivo da adição de um membro à respectiva lista. Há documentos criados com o

propósito de esclarecer casos de conflitos na comunidade, e também há documentos criados

para divulgação de bazares presenciais e outros eventos.

5.3 CATEGORIAS DE POSTAGENS

Durante o período de coleta foram contabilizadas 1905 postagens únicas, sem

considerar o número de comentários, que variava de 0 a 200 por postagem. Destas postagens,

foi possível identificar quatro tipos:

1. Postagens de divulgação de peças para troca

2. Postagens de divulgação de peças para vendas

3. Postagens com mensagens de caráter pessoal

4. Outros tipos de postagens

Na tabela abaixo são exibidos os resultados encontrados durante o período de coleta:

Tabela 1 – Categorias de postagens.

Tipo Categoria N°

Divulgação

de trocas

Álbum ou peça (link do álbum, com foto, formato Facebook) 1146

Link para álbum (apenas link, sem formato Facebook) 129

Texto descritivo sobre peças/álbum 43

Álbum ou peça de desejo (link, foto, etc) 10

Pergunta sobre peças de desejo (texto) 178

Divulgação

de vendas

Álbum ou peça (link do álbum, com foto, formato Facebook) 29

Texto descritivo sobre peças 3

Mensagens

pessoais

Sobre encontros presenciais 26

Reclamações sobre trocas ou vendas 28

Agradecimentos e recomendações 43

Fotos (relacionado a moda) 5

Divulgação de código de rastreamento 10

Mensagens para as outras usuárias 110

Outras

postagens

Postagem sem conteúdo 89

Divulgação de mensagens de correntes e utilidade pública 8

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57

Compartilhamento de links ou informações 12

Pedido de ajuda em assuntos específicos 5

Piadas, bobagens, etc. 7

Frases, pensamentos, etc. 7

Divulgação de sites e eventos 17

TOTAL 1905

5.3.1 Divulgação de Trocas

A grande maioria das postagens, 1146 das 1905 postagens, era referente a divulgação

de álbuns ou peças para troca, em formato de link do Facebook, como pode ser observado nas

figuras 5 e 6. com foto, título e descrição. Alguns álbuns eram de “Trocas e Vendas”, mas

estes também foram contabilizados como álbuns de troca.

Figura 5: Divulgação de álbum de trocas

Figura 6: Divulgação de peça para troca

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58

Foram registradas 129 postagens de divulgação de peças ou álbuns para troca, que por

algum motivo não apareciam no formado de Facebook, mantendo apenas o link, como visto

na figura 7. Este fato pode ser devido a permissões de acesso ao álbum ou foto do usuário, ou

a erros da ferramenta durante a postagem.

Figura 7: Divulgação de álbuns e peças para troca (apenas link)

Também foram encontradas 43 postagens com divulgação apenas textual de peças

para troca, sem links ou imagens, como exemplificado na figura 8. Com relação a listas de

desejos, foram feitas 10 publicações de álbuns desse tipo, e 178 postagens de divulgação

textual de peças de desejo, conforme a figura 9.

Figura 8: Divulgação de álbum de desejos (wishlist)

Figura 9: Textos de procura por peças de desejo

5.3.2 Divulgação de Vendas

Apesar de se tratar de um bazar de trocas, foi possível identificar postagens de vendas

(como pode ser visto nas figuras 10, 11 e 12) que em geral eram repreendidas pelas outras

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usuárias, que perguntavam se a pessoa também fazia trocas das peças divulgadas, e caso

contrario informavam que a prática de vendas não era bem aceita no grupo. Em alguns casos

de insistência ou conflito acabavam por pedir para que as moderadoras retirarem a usuária que

estivesse vendendo dentro do grupo.

Figura 10: Divulgação de peça para venda, e indicação de grupos de venda

Figura 11: Divulgação de álbum de vendas, e indicação da proibição de vendas

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60

Figura 12: Publicação de álbum de vendas

5.3.3 Mensagens pessoais

Também foram encontradas muitas mensagens pessoais, que eram conversações entre

as usuárias, sobre assuntos independentes da divulgação de álbuns ou peças para trocas.

Foram encontradas 26 postagens falando sobre encontros presenciais de usuárias, como no

exemplo da figura 13. Algumas dessas postagens continham fotos destes encontros, como

pode ser visto na figura 14. Os encontros presenciais eram tanto encontros casuais entre duas

usuárias para trocas de peças, como também encontros regionais organizados com várias

usuárias.

Figura 13: Mensagem de usuária indo para encontro presencial regional de usuárias

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61

Figura 14: Postagem de foto de encontro presencial, com conversação.

Outro tipo de mensagem encontrada foram as de reclamações sobre trocas, como nas

figuras 15, 16 e 17; ao todo foram 28 postagens. As usuárias reclamavam de trocas que não

haviam sido enviadas ou que haviam chegado sem condições de uso, fraudes, desonestidade,

problemas com o Facebook, entre outros.

Figura 15: Reclamação sobre fraudes

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62

Figura 16: Reclamação sobre o Facebook

Figura 17: Reclamação sobre falta de honestidade

Porém, além das reclamações, foram feitas 43 postagens com agradecimentos de

trocas e recomendações de usuárias, conforme as figuras 18 e 19. Nesta contagem estão as

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63

postagens de atualização da Lista Branca, que apareciam no mural juntamente com as demais

postagens.

Figura 18: Mensagem de agradecimento de troca recebida

Figura 19: mensagem de recomendação de usuárias

Foram feitas 5 postagens com imagens relacionadas a moda (imagens retiradas de

revistas por exemplo) e 10 com divulgação de código de rastreamento (figura 20) e

comprovantes de envio (figura 21).

Figura 20: Divulgação de código de rastreamento

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Figura 21: Comprovante de envio

Foram encontradas 110 postagens com mensagens pessoais para outras usuárias, como

postagens de bom dia / boa tarde / boa noite, comentários sobre coisas do dia-a-dia, pedidos

de ajuda para iniciar no bazar, desabafos, convite para organização de bazar presencial,

perguntas sobre customização de roupas, comentários sobre o tempo, postagens perguntando

quem está online, perguntando código de rastreio, pedindo desculpas por atraso de postagem,

entre outras. Elas foram agrupadas por não haver assunto em comum suficientemente

relevante, conforme exemplos das figuras 22 a 26.

Figura 22: Postagem de bom dia

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65

Figura 23: Postagem sobre o grupo

Figura 24: Desabafo sobre troca

Figura 25: Pedido de ajuda para fazer parte do grupo

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66

Figura 26: Comentários sobre vício de compras (sapatos)

5.3.4 Outras postagens

Por fim, também foram encontrados outros tipos de postagens, como as 89 postagens

sem conteúdo, como no exemplo da figura 27 (que podem ser devido a erros do Facebook, ou

devido às configurações de privacidade da usuária que postou).

Figura 27: Postagem sem conteúdo

Outro tipo encontrado foram as 8 postagens de correntes e de itens utilidade pública, e

as 12 postagens com compartilhamento de links e informações diversas, como notícias, por

exemplo. Na figura 28, vemos uma postagem de uma usuária com informações sobre um

determinado problema de saúde, o qual foi comentado por usuárias que conheciam o

problema. Já na figura 29, vemos o compartilhamento de um link promocional.

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Figura 28: Postagem com informações sobre problemas de saúde

Figura 29: Postagem com divulgação de link de promoção

Também foram registradas 5 mensagens com pedido de ajuda para as usuárias do

bazar que tivessem algum tipo de conhecimento específico, como inglês (ver figura 30), arte,

direito, enfermagem, etc.

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Figura 30: Pedido de ajuda com inglês

O mural do grupo foi usado em 17 postagens para divulgação de eventos. Também

foram encontradas 7 postagens com citações de frases reflexivas e pensamentos (conforme

figura 31), e 7 com piadas, brincadeiras e conteúdo humorístico.

Figura 31: Postagem de frase pronta, pensamento

5.4 RESULTADOS DO QUESTIONÁRIO

Após o encerramento do período para respostas, foram contabilizadas 68 respostas, a

partir das quais foi possível traçar um perfil demográfico dos usuários do bazar, com as

seguintes constatações:

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5.4.1 Gênero

Figura 32: Gráfico de resultados do questionário no item Gênero

De acordo com a figura 32, assim como pôde ser observado no grupo, o gênero dos

informantes foi exclusivamente feminino, somando 100%.

5.4.2 Faixa etária

Figura 33: Gráfico de resultados do questionário no item Faixa etária

De acordo com o gráfico da figura 33, a faixa etária encontrada foi de 15 a 60 anos,

com maior concentração entre 20 e 30 anos (41%), e entre 30 e 40 anos (35%); Em seguida,

pessoas entre 40 e 60 anos (15%), e em menor número, pessoas entre 15 e 20 anos (6%) e

entre 50 e 60 anos (3%).

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70

5.4.3 Status de relacionamento

Figura 34: Gráfico de resultados do questionário no item Status de Relacionamento

Em status de relacionamento (as mesmas opções disponibilizadas nas configurações

de usuário do Facebook), como pode ser visto no gráfico da figura 34, a maioria dos

informantes se declarou “Casado(a)” (49%), seguido por “Em um relacionamento sério”

(21%), ”Solteiro(a)” (15%) e “Noivo(a)” (7%). “Amizade Colorida” não foi marcada por

nenhum dos informantes. As outras opções somam 8%.

5.4.4 Faixa de renda aproximada

Figura 35: Gráfico de resultados do questionário no item Faixa de renda aproximada

A faixa de renda (per capita) da maioria dos informantes, de acordo com o gráfico da

figura 35, ficou entre R$1.000 a R$3.000 (47%), seguida pela faixa entre R$3.000 a R$5.000

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(21%), e entre R$500 a R$1.000 (19%). Em menor número estão as faixas acima de R$5.000

(10%) e até R$500 (3%).

5.4.5 Localização geográfica

Figura 36: Gráfico de resultados do questionário no item Localização

No item Estado (UF), de acordo com o gráfico da figura 36, foi possível perceber que

a grande concentração de usuários está entre São Paulo (41%) e Rio de Janeiro (18%), como

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72

foi possível perceber facilmente durante a observação. Depois, aparece o Rio Grande do Sul

(9%), seguido do Paraná (6%) e Minas Gerais (6%). Acre, Bahia, Distrito Federal, Goiás,

Maranhão, Mato Grosso do Sul e Santa Catarina variam entre 1% e 4%, somando 18%.

5.4.6 Atividades realizadas nos bazares

Figura 37: Gráfico de resultados do questionário no item

Quanto à atividade dos usuários nos bazares, de acordo com o gráfico da figura 37 foi

possível identificar que a grande maioria costuma trocar peças (94%), e também há muitas

pessoas que costumam comprar (60%) e vender peças (46%). Também há um número

considerável que declarou apenas observar os bazares (16%) e um pequeno número que

declarou emprestar peças pelos bazares (3%).

5.4.7 Tipo de itens negociados

Figura 38: Gráfico de resultados do questionário no item Tipo de itens negociadas

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73

Conforme o gráfico da figura 38, com relação aos itens que costumam negociar nos

bazares, a grande maioria declarou negociar peças de vestuário (97%) e calçados (96%). Há

também um grande número de pessoas que declararam negociar acessórios de moda (79%),

maquiagens, perfumaria e cosméticos (56%). Em menor número foram considerados livros,

CDs e DVDs (32%), eletrônicos (24%), celulares / smartphones (22%), lingerie (19%), itens

de decoração (19%), eletroportáteis (18%), computadores / notebooks / laptops / tablets (9%)

e outros (4%).

5.4.8 Perguntas abertas

Com as questões abertas, de caráter qualitativo, as respostas das informantes ajudaram

a construir um melhor entendimento sobre a lógica de funcionamento, e sobre o perfil das

usuárias dos bazares em relação a vários aspectos.

Observação: Os nomes exibidos nas citações abaixo são pseudônimos utilizados nas

respostas do formulário de pesquisa, cujo uso foi autorizado pelas informantes.

A maioria das usuárias afirma ter conhecido os bazares de trocas a partir de links

patrocinados do Facebook e indicação de amigas que já utilizavam. A maioria começou a

participar dos bazares a partir do Bazar de Trocas da ESTILO, ainda no início deste ano, mas

muitas declararam participar de outros tipos de bazares (como mercado livre e comunidades

no Orkut) e utilizar brechós online já desde 2010.

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74

“Iniciei no Facebook, ao ver uma amiga fazendo trocas, comecei a adicionar os bazares,

fiz o meu também e as trocas começaram” (15/11/2011, por Juli)

“Por volta de abril de 2011 conheci o bazar de trocas da Estilo no site da revista e desde

então faço trocas frequentes. Já tenho meu bazar/brechó há mais de 2 anos e faço trocas

tb desde que abri” (16/11/2011, por Garimpo)

“A partir de fevereiro de 2011, depois de ver um anúncio do bazar da Estilo. Hoje

participo e administro uns 6 bazares virtuais, além de participar de encontro de brechós

pessoalmente” (18/11/2011, por Ana's Bazzar)

Quanto a frequência de uso, grande parte das informantes afirmou utilizar os bazares

de trocas diariamente, várias vezes por dia. Muitas afirmaram passar em média 2 horas

conectadas, e algumas chegaram a afirmar que passam mais de 3 a 4 horas, fazendo trocas e

observando os bazares. Outras afirmaram fazer um uso mais moderado, algumas vezes na

semana, ou ainda de modo esporádico.

“Desde que entrei tenho ficado conectada quase o dia todo... às vezes propondo e

fazendo trocas, outras vezes somente para passar o tempo” (16/11/11, por Karen Kiss)

“Todos os dias...hahahaha é viciante, atualizo a página toda hora, mesmo se estiver

trabalhando” (22/11/2011, por Cici troquinhas)

“No inicio eu dediquei muito tempo para o bazar, mas agora faço trocas eventualmente”

(16/11/2011, por Cáthia Lavor)

Quanto à realização de vendas nos bazares (que é um tema polêmico entre as

usuárias), muitas se mostraram favoráveis, e muitas afirmaram apoiar quando a venda é

realizada em bazares de vendas (e não nos bazares de trocas). Porém, a maioria declararou

não gostar da prática dentro dos bazares de trocas, por causar decepções na hora de negociar

um produto propondo troca, e descobrir que a outra parte aceita apenas venda. Outra

reclamação é com relação aos preços das peças nestes bazares de vendas, que muitas vezes

são superestimados.

“Acho que os bazares de vendas são válidos. Podemos comprar produtos que não

encontramos na nossa cidade e, às vezes, com preços mais justos do que no mercado

tradicional” (15/11/2011, por Lauren)

“Não participo de nenhum, pois não me inspiram confiança” (16/11/2011, por Sirlei)

“Discordo, pois você se cadastra num bazar de trocas é para trocar e não para vender. A

pessoa vai até o perfil de outra e só encontra coisas para venda aí é injusto”

(16/11/2011, por Bruna e Paulo Deretti)

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75

“Acho que bazar de trocas, e é exclusivamente para trocas, por isso que existem os

bazares de vendas, acho que não é legal misturar as estações, pq acaba que muita gente

se camufla dizendo que troca, e no final só quer vender!” (16/11/2011, por Kelly Sousa)

“Acho os bazares de vendas interessantes quando vc acha produtos com preços

razoáveis e as vezes acho coisas que me servem que não acho nas lojas e em ótimo

estado!” (27/11/2011, por Fátima Bispo Bernardes)

A maioria das informantes disse não utilizar brechós online em blogs e outras

ferramentas além do Facebook, mas algumas afirmaram utilizar o Flickr, Orkut e blogs para

comprar, trocar e vender peças.

Quanto aos problemas com os bazares, as respostas foram divididas. Parte das

informantes disse nunca ter tido problemas, mas outra parte alegou já ter sofrido algum tipo

de calote, prejuízo ou decepção. Muitas delas até mesmo narraram os casos na resposta.

Porém, mesmo para as que tiveram problemas, estes foram casos isolados na utilização dos

bazares.

“Graças a Deus não, já tive casos de não servir, mas não foi um problema, pois a peça

estava em perfeita ordem e foi tranqüilo para trocá-la com outra pessoa” (16/11/2011,

por Kelly Sousa)

“Já sofri alguns problemas desses, algumas trocas vieram em mau estado, outras não

eram como descritas nas fotos, mas acho que esse é um risco que assumimos num bazar

como esse onde as negociações são feitas via Internet e não se pode olhar o produto

pessoalmente. Na maioria das vezes, não tomei atitude nenhuma, pois acho muito

desgastante ficar me aborrecendo por coisas que nem uso e que se não fosse pelo bazar

acabariam doadas. Encaro como uma doação mesmo. Apenas uma vez pedi para

destrocar e a menina concordou prontamente, sendo assim ficou só entre nós, nem

comentei nos bazares” (17/11/2011, por Ana Cristina)

Por fim, quanto às mudanças que os bazares de trocas representaram na vida destas

pessoas, as respostas foram muito variadas. Muitas disseram ter o bazar como um hobby

prazeroso e divertido, a maioria afirmou ter feito novas amizades e passarem a ser mais

vaidosas, mas também muitas reclamaram de passar muito tempo em frente ao computador, e

também de ficarem mais consumistas. Algumas reclamaram de gastar muito com frete, mas

muitas afirmaram ter encontrado uma forma de economizar e renovar o guarda-roupa de

maneira barata.

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76

“Fiquei mais consumista...kkkkkkk – negativo. Renovei o guarda-roupa, fiquei mais

vaidosa – positivo. Fiz mais amizades – positivo. Passei a ficar muito tempo na net –

negativo” (16/11/2011, por Isabella)

“Conheci muitas pessoas legais no bazar da Estilo, já encontrei algumas pessoalmente e

fiz ótimas amizades. Fiz ótimas trocas tb. O lado negativo é o vício de ficar horas online”

(16/11/2011, por Garimpo)

“Despertei um novo olhar sobre as minhas roupas que já estavam "aposentadas" dentro

do armário. Comecei a fazer um uso mais efetivo de acessórios (descobri que o cinto é

uma arma poderosíssima para compor um visual). Gostei dos relacionamentos de

"amizade" que criei no bazar” (16/11/2011, por Karen de Andrade Gaúcha)

5.5 RESULTADOS DAS ENTREVISTAS

Apesar das questões abertas do questionário terem ajudado a compor um

conhecimento acerca das usuárias dos bazares de trocas, se fez necessário o uso de entrevistas

em profundidade para que fosse possível obter informações com mais qualidade sobre o uso

dos bazares.

Para obter estas informações, foram realizadas entrevistas em profundidade com cinco

usuárias. As entrevistas foram feitas com dois blocos temáticos: (1) as motivações do uso dos

bazares de trocas e (2) o impacto deste uso na vida das usuárias. A metodologia utilizada para

as entrevistas encontra-se no capítulo 4.4.2. desta monografia, e as entrevistas podem ser lidas

na íntegra do Apêndice 2 ao Apêndice 6.

Abaixo, um quadro com o perfil das usuárias entrevistadas:

Tabela 2 – Perfil das usuárias entrevistadas. N º Usuária Idade Estado Civil Profissão Escolaridade Cidade/Estado

01 Trocar e

Renovar

27 Casada Bancária Superior

(cursando)

São Paulo/SP

02 Baú da

Deinha

31 Solteira “Bazarzeira” Técnica em

contabilidade

Vila Velha/ES

03 Liége

Desapegos

28 União

estável

Captadora de

recursos

Pós graduada

/ Socióloga

São Leopoldo/RS

04 Jo Sts 32 Solteira Advogada Superior Osasco/SP

05 KlicBazar

Marilia

27 Solteira Consultora Superior

(cursando)

São Leopoldo/RS

5.5.1 Motivações de uso dos bazares

Page 77: Consumo colaborativo em bazares de trocas do Facebook: Um estudo de caso do Bazar de Trocas da ESTILO

77

Com o primeiro bloco de perguntas, foi possível identificar as motivações que fizeram

com que as usuárias entrevistadas começassem a utilizar os bazares de trocas e se

continuassem a utilizá-lo.

As entrevistadas ficaram sabendo dos bazares de trocas a partir de meios diferentes.

Uma descobriu por acaso, outra a partir de uma matéria em um telejornal, mas o principal

meio de divulgação e de propagação dos bazares de trocas parece ser a indicação de amigos

que já utilizam ou que conhecem alguém que já utiliza. Porém, o principal fator que

impulsionou as usuárias a entrarem nos bazares foi a curiosidade que estes grupos

despertaram.

Utilizar as roupas boas que estão paradas no guarda-roupas como moeda para adquirir

outros produtos foi a novidade que fez despertar esta curiosidade, e as pessoas parecem estar

cada vez mais abertas para este tipo de prática de consumo colaborativo, que vai contra o

modelo tradicional de consumo.

Após a curiosidade inicial, os motivos que mantiveram as usuárias nos bazares de

trocas foram principalmente as boas trocas realizadas e o relacionamento de amizade criado

com as outras usuárias, fator que é muito valorizado.

“As trocas bem sucedidas e as amizades que se criam. Dá para se divertir. Renovei meu

guarda roupa; estava começando um trabalho novo e busquei roupas mais sociais, e

consegui! Sabe que eu era muito apegada nas coisas; quando nos mudamos aqui para o

apartamento, que é bem pequeninho, tivemos que nos desfazer de muitas coisas, e foi um

exercício ótimo. Parece que agora tô continuando o exercício. Faz bem.“ (Liege

Desapegos)

“Eu achei muito interessante a ideia de poder trocar coisas que para mim não são tão

uteis por coisas que eu poderia utilizar e fazer o mesmo por outras pessoas; eu acho que

é uma maneira de todo mundo sair ganhando, de, de repente, gastar menos, e também

fazer novas amizades, conversar com pessoas diferentes.” (KlicBazar Marilia)

Elas consideram o bazar uma diversão e um hobby, que até certo ponto satisfaz os

desejos de consumo com um baixo custo, além de liberar espaço no armário para coisas

novas. De acordo com as entrevistadas, renovar o guarda-roupas é bom, mas exercitar o

desapego também é um fator importante. Porém, uma das entrevistadas considerou que os

bazares fizeram com que ela ficasse mais apegada às coisas, no sentido de que ela deixou de

doar roupas para trocá-las nos bazares.

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78

“Tenho mais roupas do que realmente preciso. E INFELIZMENTE ao invés de praticar o

desapego (doar), acabei me apegando! Sempre doei as roupas sempre que eu comprava

uma nova... Com o bazar, acumulo e não doo mais.” (Jo Sts)

Para a maioria das usuárias, a troca vai além da peça de roupa. Para algumas usuárias,

enviar e receber as trocas é como uma troca de presentes. Muitas delas também enviam

“mimos” umas para as outras além das peças combinadas nas trocas. As usuárias querem não

somente fazer as trocas, mas querem também agradar as parceiras de trocas, deixa-las felizes

ao receber os pacotes.

“A roupa é legal, receber é legal porque a gente se sente como se estivesse recebendo um

presente. Essa é a sensação que eu tenho quando recebo um pacote: não parece uma

troca, parece um presente; e quando eu mando um pacote para alguém, também, parece

que eu estou mandando um presente.” (KlicBazar Marilia)

Em geral, de acordo com as entrevistadas, os bazares de trocas significam na vida das

usuárias um passatempo, um hobby e uma forma de fazer novas amizades e conhecer outras

culturas.

5.5.2 Impacto na vida e na rotina

Apesar do interesse das usuárias, o uso dos bazares de trocas traz uma série de

implicações para a vida e para a rotina delas.

O principal ponto observado pelas entrevistadas foi o tempo. Ser usuária dos bazares

de trocas demanda tempo e dedicação. Elas precisam de tempo para organizar o armário,

separar as peças, lavar, fotografar, fazer upload, colocar descrição, divulgar nos grupos de

trocas, responder as mensagens das interessadas, além de garimpar os perfis das outras

usuárias em busca de peças interessantes para troca, o que também faz com que elas passem

muito mais tempo online no Facebook do que passavam antes de começarem a utilizar os

bazares.

Outro fator importante é a postagem. As trocas precisam ser devidamente embaladas,

endereçadas e enviadas pelo correio. Além do tempo para fazer o pacote, há também a

questão logística de ir até os correios, que nem sempre faz parte do itinerário rotineiro das

usuárias, e também há a questão financeira. Por mais que as trocas tragam economia, de certa

forma, as usuárias reclamam muito dos gastos com os correios.

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79

As entrevistadas também indicaram pontos positivos e negativos da utilização dos

bazares. Dentre os pontos positivos mais citados estão as amizades e as peças recebidas. Já

dentre os pontos negativos mais citados estão o tempo que precisa ser investido e as pessoas

mal intencionadas, que não cumprem com o combinado. No entanto, todas afirmam que os

pontos positivos pesam mais que os negativos, e que em geral as trocas boas são bem mais

frequentes do que as ruins.

“O positivo é a renovação do guarda roupa e as amizades. Negativo são pessoas que

trocam produtos de má qualidade, com defeito, etc. Ou que não mandam as trocas como

combinam.” (Liége Desapegos)

Por fim, todas elas afirmaram que seu jeito de consumir itens de vestuário mudou após

começarem a utilizar os bazares. Elas afirmam que deixaram de comprar muitas coisas em

lojas para adquiri-las através de trocas, então o consumo de itens novos diminuiu, e ao mesmo

tempo fez aumentar a circulação de produtos que antes seriam esquecidos nos armários, o que

ajuda a reduzir o desperdício. Outro fator apontado pelas usuárias foi que elas acabaram

mudando seu estilo, experimentando usar coisas que elas antes jamais comprariam, por

exemplo.

Neste capítulo foram abordados os resultados obtidos a partir de cada uma das etapas

descritas na metodologia.

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80

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a pesquisa nos bazares de trocas nesta monografia, usando como exemplo o

estudo de caso do Bazar de Trocas da Estilo, desde a simples observação diária, considerando

a inserção da pesquisadora como usuária, passando pela interação com as usuárias, o

monitoramento das postagens, a identificação de processos e categorias, as anotações de

campo, os questionários disponibilizados, e até mesmo as entrevistas em profundidade, foi

possível obter um material rico para análise deste nicho.

A fundamentação teórica a partir do estudo do histórico do comércio, com detalhe para

as antigas práticas de escambo de mercadorias; as noções sobre a lógica do consumo, em

especial o consumo feminino; o estudo sobre o consumo colaborativo; bem como o estudo das

dinâmicas das redes sociais ajudaram a construir uma base para entender a lógica do modelo

de trocas dos bazares e traçar o perfil das usuárias. Deste modo, a partir dos resultados

obtidos, foi possível atingir os objetivos a que a presente monografia se propunha.

Os bazares de trocas são relativamente recentes, e embora já existissem manifestações

semelhantes no Orkut e em blogs, por exemplo, eles se popularizaram entre o público

feminino no Facebook a partir do início do ano de 2011, ganhando milhares de adeptas pelo

país, principalmente após a divulgação do grupo da revista Estilo, o que ajudou a dar mais

visibilidade a este segmento.

Os álbuns de fotos dos perfis viraram catálogos de produtos para troca; o mural dos

grupos se transformou em um verdadeiro bazar, servindo tanto como vitrine para divulgação

dos produtos quanto como local de conversação, gerando conversações, negociações e

relações de amizade.

Foi possível também reconhecer os atores e as conexões entre eles, e também

estabelecer uma ligação com as dinâmicas de redes sociais, como cooperação, competição,

conflito e adaptação (RECUERO, 2009; PRIMO, 2005).

Nos bazares de trocas, as relações são baseadas na confiança mútua e em um sistema

de reputação, no qual as próprias usuárias colaboram editando documentos de “Lista Branca”

para fazer recomendações e “Lista Negra” para reclamações. Este sistema ajuda na construção

do capital social envolvido neste processo. “Se não houver confiança ou instrumentos

definidos para obrigar cada um a cumprir sua parte no contrato, pessoas racionais não

produzem espontaneamente bens coletivos” (ARAUJO, 2010, p. 17)

Apesar de muitas usuárias reclamarem de passar muito tempo na Internet, de gastar

com os correios e de sofrer em alguns casos com trocas não enviadas, calotes e decepções, a

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maioria das usuárias ainda considera os bazares de trocas uma coisa positiva, e descobriram

uma forma barata, colaborativa e sustentável de renovar o guarda-roupa, além de muito

divertida.

Embora algumas usuárias utilizem os bazares apenas para negociar as peças, a maioria

das usuárias acaba fazendo novas amizades, muitas vezes estendendo essa experiência para a

“vida real”, conhecendo outras usuárias pessoalmente, e realizando bazares ao vivo.

Avaliando os prós e os contras, os bazares de trocas se mostraram uma forma positiva de

consumir conscientemente e fazer amigos.

O estudo realizado nesta monografia se mostrou importante para a área da

Comunicação Digital por explorar um dos desdobramentos das novas formas de consumo

colaborativo que a Internet propicia, e que sem ela não seriam possíveis da forma que se

apresentam. Os bazares de trocas de roupas em redes sociais são um claro exemplo de como o

modelo de consumo está mudando, cada vez mais ancorado nas pessoas e na colaboração.

Conclui-se, por fim, que ainda há muito que se estudar neste campo, visto que o consumo

colaborativo é um tema cada vez mais forte e atual.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Apêndice 1 – Instrumento de coleta do questionário

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Apêndice 2 - Entrevista 01

Entrevistador: Nathalia Schoen Munhoz

Usuária entrevistada (nome de perfil): Trocar e Renovar

Modalidade: Bate-papo do Facebook

Entrevistador: Os objetivos dessa entrevista são entender as motivações da utilização dos

bazares de trocas, e entender o impacto desse uso na vida e na rotina das usuárias.

Trocar e Renovar: ok

Entrevistador: Primeiro, precisaria de alguns dados seus para poder situar a pesquisa:

idade, estado civil, profissão/ocupação, escolaridade e cidade.

Trocar e Renovar: 27 anos, Casada, Bancária, superior (cursando), São Paulo.

Entrevistador: Obrigada... Sobre as motivações de uso: Como e por que você começou a

utilizar os bazares de trocas?

Trocar e Renovar: Comecei depois que vi essa movimentação em um programa de TV.

Entrevistador: Era um programa de TV falando sobre os bazares de trocas?

Trocar e Renovar: Sim, na verdade uma entrevista se eu não me engano no jornal hoje a

mais de um ano atrás, aí me interessei.

Entrevistador: hmmm bacana, me lembro dessa entrevista. E você gostou? Que motivos

fizeram que você continuasse participando?

Trocar e Renovar: No inicio sim amei, mas fiquei parada por uns meses levei uns calotes...

rsrs... Hoje voltei mais no intuito de vender, pois na troca hoje depois de tanta divulgação

muitas pessoas entram para estelionato.

Entrevistador: Eu nunca levei calotes. Mas já vi muitos. O que mais acontece são atrasos e

tal... Mas também ocorreram trocas boas, não?

Trocar e Renovar: Sim, claro tive muitas trocas excelentes que me fizeram criar laços de

amizade e troco com essas pessoas ate hoje!

Entrevistador: E o que o bazar significa pra você hoje?

Trocar e Renovar: Relacionamento!

Entrevistador: Agora vamos para a parte 2: Impacto do uso na vida e na rotina. O que

mudou na sua vida e na sua rotina depois que começou a utilizar os bazares?

Trocar e Renovar: Na rotina muita coisa pelo fato de ir ao correio quase sempre... Na minha

vida? Hum, ate meu marido esta trocando... rs

Entrevistador: Legal... Então você mostrou os bazares pra outras pessoas? Incentivou o uso?

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Trocar e Renovar: Sim claroooooo! Para amigas, colegas de trabalho...

Entrevistador: Bacana... E que pontos positivos e negativos você poderia apontar sobre o seu

uso dos bazares?

Trocar e Renovar: Positivos como disse as amizades e a aquisição de algumas coisas que

não encontro nem em loja mais. Negativos: Infelizmente algumas pessoas de má índole...

Entrevistador: E o que pesa mais? Os pontos positivos ou os negativos?

Trocar e Renovar: Positivos, se não eu já teria saído daqui.

Entrevistador: Uma última questão: Seu modo de consumir itens de vestuário mudou após a

utilização dos bazares?

Trocar e Renovar: Sim, não compro mais sapatos, por exemplo... rsrs. Só troco!

Entrevistador: Legal... Você hoje com os bazares gasta menos?

Trocar e Renovar: Sim, mesmo com o frete caríssimo do correios... rs

Entrevistador: haha sim... Às vezes vale a pena né?

Trocar e Renovar: Sim sempre vale!

Entrevistador: é isso então! Muito obrigada pela atenção! Você tem alguma sugestão,

alguma questão que não foi abordada?

Trocar e Renovar: No momento não, flor. Boa sorte!!!

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Apêndice 3 - Entrevista 02

Entrevistador: Nathalia Schoen Munhoz

Usuária entrevistada (nome de perfil): Baú da Deinha

Modalidade: Bate-papo do Facebook

Entrevistador: Os objetivos dessa entrevista são entender as motivações da utilização dos

bazares de trocas, e o impacto desse uso na vida e na rotina das usuárias.

Baú da Deinha: Eu ja trabalho com bazar com minha mãe ja tem mais de uns 15 anos, a

vontade de mexer com isso foi necessidade mesmo, e tambem juntou uma coisa que a gente

gosta muito de lidar, reutilização das coisas... e tambem era uma coisa que parecia de facil

começo. Eu faço muitas vendas e troquinhas sempre, quase que diariamente.

Entrevistador: Eu vou te fazer algumas perguntinhas do roteiro tudo bem?

Baú da Deinha: Ok.

Entrevistador: Primeiro, precisaria de alguns dados seus para poder situar a pesquisa:

idade, estado civil, cidade, profissão/ocupação e escolaridade.

Baú da Deinha: 31, solteira, no momento, “bazarzeira” mesmo, haha… tenho conseguido

viver disso; sou técnica em contabilidade, Vila Velha - ES.

Entrevistador: Jura, que bacana.

Baú da Deinha: haha... a gente tem uma lojinha em casa tb, um brechó, só que tá

reformando.

Entrevistador: Que máximo, adoro brechós.

Baú da Deinha: É uma coisa ainda muito interessante, pq não se cobra impostos; pra se abrir

uma loja de novos, mesmo quem pode, geralmente fecha antes do primeiro ano. E bazar, se a

pessoa souber lidar, ganha um dinheiro legal sim. Ali na Glória tem uma senhora, em frente

ao Extrabom, ela lida com bazar ha muitos anos ali. Ela tem funcionaria, paga aluguel de uns

mil reais, haha... ela fatura um dimdim bom ali.

Entrevistador: Que massa. Eu sempre estou em brechó. Acho cada coisa bacana...

Baú da Deinha: haha... eu tb. Amo shopping, mas não largo bazar não.

Entrevistador: hahaha idem! Então, vou te fazer as perguntinhas do bloco 1, ok?!

Baú da Deinha: Ok.

Entrevistador: Sobre as motivações de uso: como e por que você começou a utilizar os

bazares de trocas?

Baú da Deinha: Especificamente só de trocas?

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Entrevistador: Sim, estou focando o TCC nos bazares de trocas. Mas, pode falar sobre sua

experiência com as compras e vendas também, fique à vontade.

Baú da Deinha: Eu sempre prefiro as vendinhas, claro, haha... mas troquinhas são muito bem

vindas também. O que as meninas fazem muito é um álbum de desejos, pra já ficar

especificado o que tão procurando pra trocar. É difícil achar coisas pra mim pq sou grandona,

meço 1,80m e calço 40, haha...

Entrevistador: O álbum de desejos é pra não trocar só por trocar, isso?

Baú da Deinha: Isso. Geralmente as trocas são por coisas que preciso mesmo, mas já troquei

uma bota por um ferrinho de criança antigo; antigamente os brinquedos eram feitos como que

pra gente grande, haha... Amo coisas retrô, vintage. As trocas me dão isso tb: achar coisas que

podem tá perdidas aí na casa de alguém, haha... e o Facebook facilita mais ainda isso.

Entrevistador: E você fez amizades também com meninas do bazar?

Baú da Deinha: Sim, várias. Muitas também de longe, através do correio, pelo Facebook...

tem uma menina que eu amoooo, a Viviane; troquei um vestido meu da Farm com uma

coleção de miniaturas de perfume. Outra coisa que eu amo: miniaturas, haha...

Entrevistador: hmmmm... E como vc começou a usar os bazares?

Baú da Deinha: Por necessidade e curiosidade, tudo misturado, haha...

Entrevistador: Descobriu eles onde ou quando?

Baú da Deinha: Eu já conhecia os do Orkut, e os de lá migraram pra cá, haha... e antes do

Orkut eu sempre andei por ai com mamãe vendo uns daqui de perto.

Entrevistador: hmmm legal... eu conheci só aqui no Facebook. E que motivos fizeram com

que você continuasse participando? (ex: amizade, rentabilidade, hobby, economia, etc...)

Baú da Deinha: Ah, pq como eu tenho muitos contatos, com amigas que viajam e me trazem

coisas diferentes, dai a gente troca, compro delas pra expor na minha página. E eu gosto de

mexer com coisas diferentes: antiguidades, fantasias.

Entrevistador: O que os bazares de trocas significam para você hoje?

Baú da Deinha: Uma oportunidade de me livrar do que eu já enjoei e/ou acho que vai ser

interessante pra alguém e conseguir em troca um dimdim ou algo que me sirva.

Entrevistador: Agora vou fazer as perguntas sobre o impacto na vida e na rotina, ok? O que

mudou na sua vida e na sua rotina depois que começou a utilizar os bazares?

Baú da Deinha: Eu sempre tenho que ter um tempo disponível pra dar atenção ao pessoal, eu

geralmente tiro pra me comunicar com eles na hora do almoço e depois das 8h da noite; e

quase todo dia tb tiro um tempo pra entregar as coisas.

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Entrevistador: Você negocia só com pessoas da sua região ou também negocia com gente de

longe?

Baú da Deinha: Os dois. No orkut era mais pelo correio, agora ta sendo mais pessoalmente.

Entrevistador: Troca pessoalmente e pelo correio tb? hmmm legal...

Baú da Deinha: Porque tem os grupos dos locais.

Entrevistador: Sim, também estou em alguns grupos locais.

Baú da Deinha: No Orkut esses grupos locais eram mais parados.

Entrevistador: É bacana conhecer as meninas pra trocar, né?

Baú da Deinha: Muito!

Entrevistador: O Facebook facilitou a socialização, creio eu.

Baú da Deinha: Muito! Mas muita gente ainda tá pelo Orkut. Eu chamo, mas se recusam a

vir para o Facebook. Dizem que é difícil de mexer.

Entrevistador: Continuando... Que pontos positivos e negativos você poderia apontar sobre o

seu uso dos bazares?

Baú da Deinha: Positivos: é que sempre da pra eu tirar um troquinho bom, principalmente

com propaganda no Facebook. E ao mesmo tempo isso complica. Já tive umas brigas feias

pela net. Várias vezes pq vendi a peça e ainda não tinha apagado. Daí como não é

pessoalmente, a pessoa ainda acha que ta lá. Isso já me aconteceu umas 2 ou 3 vezes. E

brigaram feio comigo, pq aqui tem um tal de “quem fala primeiro na peça, é dela”. Quem

comenta né? Daí, nossa! Acharam que ainda tava a venda, e brigaram comigo pq não tinha

mais a peça e ainda tava anunciando. Tem que ficar muito atenta!

Entrevistador: Nossa!

Baú da Deinha: Pq da gente pra tudo mesmo... ah, uma coisa muito chata também: muita

gente leva na brincadeira, marca e não vai. Já perdi muito tempo indo entregar, e a pessoa

simplesmente some, exclui e bloqueia; Isso acontece MUITOOOO!

Entrevistador: Nossa, sério? Já tinha visto calotes, mas isso não tinha visto ainda.

Baú da Deinha: É, tem vários grupos de caloteiras. Já levei um no Orkut. Mandei um vestido

xadrez e um bichinho de pelúcia lindo, e em troca veio um aparelho que não funcionou. Eu

sempre prefiro deixar pra lá, mas tem gente que encrenca feio querendo de volta. Aparelhos a

distância, não troco mais.

Entrevistador: Pra terminar: Seu modo de consumir itens de vestuário mudou após a

utilização dos bazares?

Baú da Deinha: Sim,a maioria das roupas e coisas que tenho hoje em dia são de bazar ou

comprei com dinheiro que ganhei de bazar. E eu gosto mesmo de reutilizar as coisas. Eu

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nunca segui muito moda, primeiro que a moda não gosta de mim, pq sou tamanho maior, e tb

tudo da moda é caro, só uso se achar mais barato em bazar; E eu geralmente consigo achar!

Dou muita sorte de achar o que quero em bazares.

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Apêndice 4 - Entrevista 03

Entrevistador: Nathalia Schoen Munhoz

Usuária entrevistada (nome de perfil): Liége Desapegos

Modalidade: Bate-papo do Facebook

Entrevistador: Os objetivos dessa entrevista são entender as motivações da utilização dos

bazares de trocas, e o impacto desse uso na vida e na rotina das usuárias.

Liége Desapegos: Ok!

Entrevistador: Primeiro, precisaria de alguns dados seus para poder situar a pesquisa:

idade, estado civil, profissão/ocupação, escolaridade e cidade.

Liége Desapegos: Idade: 28 anos. Estado civil: União Estável. Profissão: Socióloga

Captadora de Recursos e Projetos. Escolaridade: Pós graduada. Cidade: São Leopoldo.

Entrevistador: Sobre as motivações de uso: como e por que você começou a utilizar os

bazares de trocas?

Liége Desapegos: O meu marido me falou que vocês (tu e a Marília) faziam as trocas na

Internet. Ele ia me explicando como funcionava; depois de um tempo, resolvi entrar para ver

como era. Falei com a Marília, ela me explicou que criou um perfil diferente do pessoal, só

para trocas. Fiz o mesmo e comecei a trocar. Primeiro eu pensei nas trocas para roupas para o

meu filho; depois inseri outras trocas, porque roupa de criança não é muito comum. Ah, e

falei contigo também sobre as trocas.

Entrevistador: Mas tu chegou a encontrar peças infantis?

Liége Desapegos: Sim! Fiz três trocas com roupas para ele, e tênis também. Uma nos

primeiros dias de bazar.

Entrevistador: O ruim é que é difícil de trocar peças de criança... pq se deixou de servir no

filho de alguém, provavelmente a pessoa vai querer roupinhas maiores, e não menores, né?

Liége Desapegos: Sim. Mas a troca pelas roupas de criança é por roupas femininas, para a

mãe da criança em geral.

Entrevistador: hmmmm bacana! Que legal, essa parte, como não sou mãe, e não troquei

roupas infantis, eu não sabia.

Liége Desapegos: Algumas pessoas só vendem, mas eu não compro. E já troquei roupas do

meu filho por outras peças.

Entrevistador: E depois que tu começou a usar os bazares, tu gostou? Que motivos fizeram

com que você continuasse participando?

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Liége Desapegos: As trocas bem sucedidas e as amizades que se criam. Dá para se divertir.

Renovei meu guarda roupa; estava começando um trabalho novo e busquei roupas mais

sociais, e consegui! Sabe que eu era muito apegada nas coisas; quando nos mudamos aqui

para o apartamento, que é bem pequeninho, tivemos que nos desfazer de muitas coisas, e foi

um exercício ótimo. Parece que agora tô continuando o exercício. Faz bem.

Entrevistador: O que os bazares de trocas significam para você hoje?

Liége Desapegos: Novas amizades, hobby e um passatempo. Não acho que haja economia,

porque o gasto com correio é alto, mas assim, liberamos espaço no armário para receber

outras coisas. Apesar de ter feito trocas presenciais já.

Entrevistador: Bom, vamos pra segunda parte, que é sobre o impacto do uso dos bazares na

sua vida: o que mudou na sua vida e na sua rotina depois que começou a utilizar os bazares?

Liége Desapegos: Uso o computador à noite todos os dias neste horário para olhar o bazar;

isso mudou na minha rotina. O pessoal do correio da Unisinos já me conhece pelo nome.

Entrevistador: Legal... Que pontos positivos e negativos você poderia apontar sobre o seu

uso dos bazares?

Liége Desapegos: O positivo é a renovação do guarda roupa e as amizades. Negativo são

pessoas que trocam produtos de má qualidade, com defeito, etc. Ou que não mandam as trocas

como combinam.

Entrevistador: Por ultimo: seu modo de consumir itens de vestuário mudou após a utilização

dos bazares?

Liége Desapegos: Sim. Algumas peças de "desejos" eu não compro direto; procuro primeiro

no bazar e na ausência eu compro. Acho legal que também tem um viés sustentável, pois se

troca, alguém usa, e não compra diretamente.

Entrevistador: Diminui o desperdício, né?!

Liége Desapegos: Sim. Tecido polui desde o processo de fabricação e descarte até o descarte.

Entrevistador: Mais alguma coisa que tu gostaria de comentar e que não tenha sido

abordada na entrevista?

Liége Desapegos: Acho os bazares uma forma de interação social muito bacana, mas há

necessidade de melhorar o processo de troca. Às vezes é difícil achar alguém que use o

mesmo numero, ou tenha roupas infantis, enfim, perfis próximos. Então exige tempo. Desde

que comecei a trabalhar fiz poucas trocas porque não tive tempo de fomentar as trocas. É

legal, mas exige dedicação.

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Apêndice 5 - Entrevista 04

Entrevistador: Nathalia Schoen Munhoz

Usuária entrevistada (nome de perfil): Jo Sts

Modalidade: Bate-papo do Facebook

Entrevistador: Os objetivos dessa entrevista são entender as motivações da utilização dos

bazares de trocas, e o impacto desse uso na vida e na rotina das usuárias.

Jo Sts: Tranquilo…

Entrevistador: Primeiro, precisaria de alguns dados seus para poder situar a pesquisa:

idade, estado civil, profissão/ocupação, escolaridade e cidade/estado.

Jo Sts: 32 anos, solteira, advogada, superior completo Osasco/SP

Entrevistador: Obrigada. Teremos dois blocos de perguntas. O primeiro é: motivação da

utilização dos bazares.

Jo Sts: Certo...

Entrevistador: Como e por que você começou a utilizar os bazares de trocas?

Jo Sts: Descobri o grupo por um acaso... No início só olhei... Pra entender como funcionava.

Depois comecei a ver coisas que me interessavam... E tinha muita coisa guardada em casa...

Então pensei em trocar o que eu não usava, por peças que eu queria... Tudo isso com um custo

pequeno.

Entrevistador: E você gostou? E que motivos fizeram com que você continuasse

participando?

Jo Sts: Em partes. Gostei muito das peças que eu troquei... O que eu não gostei é que tem

pessoas que desvalorizam muito as peças dos outros para sair ganhando. Minha motivação é

que consegui trocar muita coisa legal! E ainda tenho coisas em casa que quero me desfazer.

Entrevistador: O que os bazares de trocas significam para você hoje?

Jo Sts: Uma diversão e um passatempo.

Entrevistador: Bloco 2: Impacto do uso na vida e na rotina. O que mudou na sua vida e na

sua rotina depois que começou a utilizar os bazares?

Jo Sts: Na minha vida: mudou que agora meu armário está mais abarrotado que nunca. Tenho

mais roupas do que realmente preciso. E INFELIZMENTE ao invés de praticar o desapego

(doar), acabei me apegando! Sempre doei as roupas sempre que eu comprava uma nova...

Com o bazar, acumulo e não doo mais. Rotina: acabo olhando o Facebook mais vezes por

dia... E comecei a olhar para as peças das lojas com outros olhos. Ao invés de pagar R$100

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numa calça... Logo penso que no bazar consigo trocar por uma peça que me custou R$40,00,

por exemplo. Deixei de comprar roupas nas lojas e priorizei as trocas.

Entrevistador: Que pontos positivos e negativos você poderia apontar sobre o seu uso dos

bazares?

Jo Sts: Positivos: ter peças que eu sempre quis com um custo mínimo. Estar sempre com um

visual novo. Conhecer pessoas de todo o Brasil! Negativos: passei a acumular muitas peças.

Tenho mais roupas do que realmente preciso. E parei de doar as peças, sempre pensando em

trocar.

Entrevistador: A última pergunta eu acho que vc já me respondeu, mas, se quiser

complementar: seu modo de consumir itens de vestuário mudou após a utilização dos

bazares?

Jo Sts: Sim!!!! Deixei de comprar em lojas para trocar no Bazar. Gasto menos... Mas tenho

mais coisas, o que acho desnecessário!

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Apêndice 6 - Entrevista 05

Entrevistador: Nathalia Schoen Munhoz

Usuária entrevistada (nome de perfil): KlicBazar Marília

Modalidade: Pessoalmente

Entrevistador: Acerca dos bazares de troca, eu gostaria de fazer dois blocos de perguntas

rápidas; o primeiro diz respeito às motivações para a utilização dos bazares. Eu queria saber

como e porque tu começou a utilizar os bazares?

KlicBazar Marília: eu comecei a utilizar porque uma amiga minha comentou que haviam

grupos no Facebook para trocas, e aí eu fui ver como é que era, fiquei curiosa, acessei, achei

bem interessante e comecei a usar.

Entrevistador: E que motivos fizeram com que tu continuasse participando? Qual foi tua

primeira impressão, o que te fez gostar e continuar participando?

KlicBazar Marília: eu achei muito interessante a ideia de poder trocar coisas que para mim

não são tão uteis por coisas que eu poderia utilizar e fazer o mesmo por outras pessoas; eu

acho que é uma maneira de todo mundo sair ganhando, de, de repente, gastar menos, e

também fazer novas amizades, conversar com pessoas diferentes. É gostoso isso, você

conhece uma pessoa e pensa “tal peça é a cara daquela pessoa”, e então tu acabe te sentindo

amiga, mais íntima; é bem interessante, bem bacana. Por isso que eu continuei, eu senti esse

aconchego.

Entrevistador: Tu consideraria o uso dos bazares um hobby, um passatempo?

KlicBazar Marília: É, pra mim isso é um passatempo; é uma atividade que eu faço quando

eu tenho um pouco de tempo vago, quando as coisas estão mais corridas realmente eu não

consigo entrar tanto, mas é como um hobby mesmo; é umas coisa que me dá prazer, é uma

coisa que tira um pouco a cabeça da correria, dos problemas; é bacana.

Entrevistador: Tu diria, então, que é mais do que só as roupas, mais do que só a peça que tu

recebe?

KlicBazar Marília: Com certeza. A roupa é legal, porque realmente tu acha coisas bem

interessantes, coisas que talvez tu nem compraria, mas é algo diferente, alguém tem, tá

acessível, então tu acaba experimentando coisas diferentes do que tu provaria normalmente. A

roupa é legal, receber é legal porque a gente se sente como se estivesse recebendo um

presente. Essa é a sensação que eu tenho quando recebo um pacote: não parece uma troca,

parece um presente; e quando eu mando um pacote para alguém, também, parece que eu estou

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mandando um presente. Então é muito bacana isso, né?! E por tudo isso que proporciona, por

ser esse passatempo, por ter essas amizades, tudo isso... vai além da peça.

Entrevistador: Tem também a questão econômica, porque, se tu pensar, tu, fazendo essas

trocas, deixa de gastar um dinheiro comprando alguma coisa, não é?!

KlicBazar Marília: Com certeza! Eu economizei bastante fazendo trocas, praticamente

renovei meu guarda roupas; quando comecei a fazer, fiz bastante. Tem o custo de correio que

é uma coisa que fica muito pequeno perto do valor que tu iria gastar se tu fosse adquirir as

peças. Então vale bem a pena.

Entrevistador: O segundo bloco de perguntas seria sobre o impacto do uso dos bazares na

tua vida e na tua rotina. Queria saber o que mudou na tua vida, no teu jeito de pensar, na tua

rotina, no dia a dia, depois que começaste a utilizá-los?

KlicBazar Marília: Na rotina, muda o fato de começar a tirar tempo para fazer isso; porque,

por mais que seja um hobby, tu tens vontade de, pelo menos uma vez por dia, dar uma

espiadinha para ver o que tem de novidade. Isso é o que mudou na minha rotina: aquela

vontade de ir lá, procurar, ver o que tem, o que me serve... aquela cosa bacana.

Entrevistador: Garimpar, não é?!

KlicBazar Marília: É, garimpar; sempre dá aquela vontadezinha. Isso foi uma coisa que

mudou na minha rotina.

Entrevistador: E sobre o teu jeito de pensar sobre o consumo?

KlicBazar Marília: Antes não passava muito pela minha cabeça fazer trocas; até tinha várias

coisas na minha casa que não serviam mais, que eu não usava, e coisas que eu realmente não

tinha como reaproveitar... eu dava pra outras pessoas, ou doava para entidades, ou alguém da

minha família, enfim... mas, às vezes eram coisas que eu havia pagado um valor razoável,

estavam novas, e eu acabava dando para alguém porque não tinha o que fazer. Algumas outras

eu deixava guardadas, na esperança de que um dia eu iria querer usar, ou por pena, por serem

peças boas. Isso mudou: hoje eu vejo uma forma de ganhar algo com isso.

Entrevistador: É o exercício do desapego, não é?!

KlicBazar Marília: É, só que quando tu sabe que vai ter algo pra ti, tu vai gostar também, é

muito mais fácil desapegar, né?!

Entrevistador: Sobre o uso dos bazares, que pontos positivos e negativos tu pode me dar?

KlicBazar Marília: O que há de positivo é a variedade de coisas que tu pode encontrar; além

de roupas, calçados, acessórios, tu encontra utilidades em geral, eletrônicos, etc; tem de tudo,

então torna-se algo bem bacana. Também a questão de ter contatos com outras pessoas, às

vezes tu pode trocar ideia sobre outras coisas, tu acaba conhecendo gente do Brasil inteiro...

Page 100: Consumo colaborativo em bazares de trocas do Facebook: Um estudo de caso do Bazar de Trocas da ESTILO

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Entrevistador: Há um pouco de intercâmbio cultural?

KlicBazar Marília: É, um intercambio de cultura. Às vezes o que está se usando aqui no sul,

não se usa lá no Rio de Janeiro, por exemplo.

Entrevistador: Eventualmente uma coisa que por aqui se usa bastante vai pra lá como

novidade.

KlicBazar Marília: Exatamente. Essa coisa é muito bacana. Normalmente a gente não tem

tantas amigas em outros lugares, pra poder realizar esse tipo de troca.

Entrevistador: Inclusive encontrar gente que tenha o mesmo tamanho que tu, né?! Às vezes tu

tens bastante amigas querendo trocar coisas contigo, só que vocês usam tamanhos diferentes.

Nos bazares tu encontra.

KlicBazar Marília: Essa é uma dificuldade nos bazares: é bem difícil encontrar uma pessoa

que tenham um perfil parecido com a gente. Da maneira que os bazares estão hoje, tu

realmente tem que garimpar. Mas às vezes a pessoa tem vários tamanhos. Varia muito,

depende da menina; algumas tem de tudo. Mas, para mim uma das dificuldades é essa:

encontrar quem calce o meu número, quem usa o mesmo número de roupa... ou até quem

gosta de coisas parecidas com o que eu gosto. Às vezes a menina tem o meu tamanho, mas

tem um estilo completamente diferente. Acredito que essa seja uma das dificuldades. É difícil

encontrar as pessoas certas, porque se perde muito tempo procurando, e aí uma coisa que

deveria ser prazerosa torna-se uma coisa cansativa. Tu fica procurando e procurando pessoas

e peças e tal... se eu tivesse como procurar mais fácil, e ter as minhas favoritas, seria bem

legal. (vamos supor que...) Hoje eu estou afim de ver novidades. Eu já vou de cara nas minhas

favoritas; não preciso ficar todo dia procurando.

Entrevistador: Finalizando: teu jeito de consumir itens de vestuário mudou?

KlicBazar Marília: Mudou porque abriu um pouco a minha mente pra outras coisas que eu

não consumiria antes. Essa questão de pegar uma peça que não seria tanto teu estilo, mas que

tu acha interessante e tu pega, porque está mais acessível do que tu comprar aquela peça. Tu

não tem que ter um desembolso tão alto; se tu não gostar, tu troca de novo. Tem essa

facilidade. O que acontece é que muitas peças são diferentes e eu não compraria,

provavelmente... mas, estando ali (no bazar)... E aí acaba que tu vai mudando um pouco teu

estilo; tu vai te descobrindo, vai provando coisas diferentes, e vai começando a consumir

coisas diferentes.