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Livro "O Jovem e Seu Projeto de Vida"

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O livro "O Jovem e Seu Projeto de Vida" pretende contribuir para o aprimoramento da prática de educadores na formação pessoal, profissional e social de jovens. O trabalho tem como ponto de partida as experiências da Ação Comunitária com processos formativos destes dois públicos, ao longo de anos de atuação na área social. A ideia é disseminar uma metodologia focada no autoconhecimento e na análise de realidade, a fim de que o jovem construa uma visão de futuro baseada em escolhas mais conscientes. Para isso, o educador é peça chave! À medida que investe em sua prática de formador e atua como agente de transformação social, contribui para que jovens reflitam sobre sua história de vida, façam descobertas e escolham novos caminhos a serem seguidos. Estas ações contribuem para o desenho de um mundo com pessoas mais participativas e com potencial para promover mudanças.

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  • 1. VERSO CAPA

2. 4 3. 5 Oscar Linhares Ferro Diretor Presidente Celso Freitas Superintendente Deise Sartori Gerente de Desenvolvimento Social Milton Alves Santos Gerente de Programas Socioeducacionais Mauricio Guimares Gerente de Relacionamento e Mobilizao de Recursos Josmael Castanho Gerente Administrativo/Financeiro Equipe Tcnica do Programa Preparao para o Trabalho Cludia Barone Coordenadora Daniela Nunes Orientadora Pedaggica Rubeilde Novaes Jaqueline Melo Assistentes de Programa social ris Macias Auxiliar administrativo Consultoria: Alexandre Isaac, Daniela Provedel, Humberto Dantas, Tony Marlon Coordenao editorial: Cludia Barone Reviso de texto: Flavio Carrana Jornalista responsvel: Flavio Carrana - MTB n 12.724 Ilustrao: Rodrigo Bueno Projeto Grfico e Diagramao: Liga da Kriao 4. 6 O Jovem e seu Projeto de Vida: Metodologia da Ao Comunitria para o Desenvolvimento Integral do Jovem Este trabalho foi realizado no mbito do Projeto Gerao, com recursos do Fundo Municipal da Criana e do Adolescente (FUMCAD) da Cidade de So Paulo. per- mitida a reproduo do texto e dos dados nele contidos, desde que citada a fonte. Reprodues para fins comerciais so proibidas. O Jovem e seu Projeto de Vida: Metodologia da Ao Comunitria para o desenvolvimento integral do jovem / Ao Comunitria. So Paulo: Ao Comunitria, 2013. 86 p. : Il.; color. Bibliograa ISBN: 978-85-66991-01-7 1. Jovens - Projeto de Vida 2. Cartograa 3. Educomunicao 4. Imaginao Sociolgica I. Ao Comunitria 13-0453 CDD 305.23 ndices para catlogo sistemtico: 1. Jovens - integrao social Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP) (Anglica Ilacqua CRB-8/7057) Parceria e Apoio: 5. 7 ndice Sobre a Ao Comunitria........................................................................9 Prefcio..................................................................................................11 Apresentao.........................................................................................13 Parte I..................................................................................................................15 Introduo............................................................................................................. 15 Mtodos de Trabalho: Panorama Geral................................................................... 20 Primeiro Mtodo: Imaginao Sociolgica.............................................................. 26 Segundo Mtodo: Cartografia................................................................................ 32 Terceiro Mtodo: Educomunicao........................................................................ 36 Quarto Mtodo: Orientao Profissional................................................................ 40 Sobre a Atuao de Educadores no Trabalho com Jovens........................................ 43 Parte II.................................................................................................................45 Oficina: Uma Concepo Poltico-Pedaggica........................................................ 45 Oficinas Experimentais........................................................................................... 47 Parte III................................................................................................................63 Estrutura do Portflio Projeto de Vida................................................................... 63 Parte IV................................................................................................................73 Expectativas e Demandas do Mundo do Trabalho na Construo do Projeto de Vida.................................................................................................. 73 Parte V.................................................................................................................75 Galeria de Fotos: Atividades Realizadas com Jovens................................................ 75 Bibliografia..........................................................................................................83 6. 8 Siglas Utilizadas CHA = Conhecimentos, Habilidades e Atitudes CMDCA = Conselho Municipal dos Direitos da Criana e do Adolescente FUMCAD = Fundo Municipal dos Direitos da Criana e do Adolescente IBGE = Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica NCE/USP = Ncleo de Comunicao e Educao da Universidade de So Paulo PPT = Programa Preparao para o Trabalho PROCEL = Programa Nacional de Conservao de Energia Eltrica PV = Projeto de Vida UNESCO = Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura 7. 9 Sobre a Ao Comunitria A Ao Comunitria uma associao civil, sem fins lucrativos, fundada em 1967, que trabalha pela incluso e proteo social de crianas, adolescentes e jovens de 0 a 29 anos, por meio da educao, cultura, cidadania e empregabilidade. Localizada na regio do Campo Limpo (zona sul da cidade de So Paulo), ado- tando metodologias replicveis nos demais estados do pas, a Ao Comunitria conta com a parceria de mais de 30 organizaes de bairro na implantao de seus diversos programas socioeducativos. O objetivo destes Programas desenvolver uma atuao crtica e cidad junto s crianas, aos adolescentes e jovens, incentivando-os a agir positivamente em suas comu- nidades, a ir em busca de seus sonhos e a criar suas prprias oportunidades. Primeiras Letras Programa para crianas de at 5 anos focado no estmulo oportuno ao desenvolvimento de competncias e habilidades para a vida. Cr-Ser Programa de educao complementar que atende crianas e adolescentes de 6 a 15 anos no contraturno escolar e tem foco no protagonismo juvenil. Preparao Para o Trabalho Programa para adolescentes e jovens de 15 a 21anos. O foco a preparao para a vida pessoal, profissional e social, a fim de que o jovem reflita sobre seu Projeto de Vida e desenvolva as competncias necessrias empregabilidade e ao exerccio da cidadania. Cursos profissionalizantes Para jovens a partir dos 18 anos. Os cursos oferecidos for- mam garons, garonetes e tambm vendedores de lojas. Em 2012, foram mais de 10.300 pessoas beneficiadas por nossos programas, conside- rando educandos, educadores, famlias, lderes e gestores comunitrios. Acesse www.acomunitaria.org.br e saiba como voc tambm pode se envolver na transformao da realidade brasileira. 8. 10 9. 11 Prefcio Wagner A. Santos1 Nos ltimos anos, o Brasil tem implantado importantes polticas pblicas voltadas para o enfrentamento das desigualdades sociais ainda presentes na vida de milhes de bra- sileiros que vivem nas periferias dos grandes centros urbanos. Os movimentos migratrios do centro em direo s periferias tm agravado essa disparidade de forma significativa. Enquanto no centro, onde h um acentuado decrscimo populacional, se con- centram os equipamentos educacionais, servios sociais e culturais, as periferias que contam com elevadas taxas de crescimento populacional e altos ndices de mortali- dade por homicdio da populao jovem masculina, enfrentam maior prevalncia de desemprego e ausncia de infraestrutura bsica de todos os servios socioeducacionais necessrios plena formao de crianas e jovens. Todas essas condies resultam na excluso social de jovens moradores das periferias das grandes cidades. Torna-se, portanto, evidente que o enfrentamento do conjunto desses problemas socioeconmicos requer que o poder pblico e o setor privado implementem aes integradas, disponibilizando recursos tcnicos e humanos eficazes para promover a melhoria da qualidade de vida e o exerccio da cidadania. A Ao Comunitria vem cumprindo o importante papel de fomentar novas aes formativas e empreendedoras do ponto de vista da inovao, dialogando com as necessidades de um mercado de trabalho cada vez mais exigente em relao formao profissional. com base nessa experincia que coloca disposio esta publicao, que oferece modelos testados de prticas e metodologias de trabalho destinados a auxiliar o jovem a pensar seu projeto de vida. Trata-se de um texto que ressalta a necessidade do protagonismo do jovem na construo da sua prpria histria, ao mesmo tempo em que destaca a juventude como elemento primordial de sustentabilidade, reconhecendo-a enquanto sujeito de aes pautadas na cidadania. dentro desse esprito que prope aos jovens criarem e recriarem, a si mesmos e ao mundo. 1 Cientista Poltico e membro da equipe do Centro de Estudos e Pesquisas em Educao, Cultura e Ao Comunitria CENPEC. 10. 12 Este trabalho destaca tambm a necessidade de avaliar prticas e buscar opes didtico-pedaggicas de organizao interna dos espaos e do tempo, que ensinem valores, atitudes, conceitos e prticas sociais, favorecendo o desenvolvimento da auto- nomia, do aprendizado, da cooperao e da participao social, para que os jovens se percebam como cidados. Para o atendimento pleno dos objetivos desta proposta, so colocadas, como ele- mentos metodolgicos fundamentais, a orientao e a capacitao contnua dos pro- fissionais envolvidos na formao dos jovens. As dicas propostas para as aes dos educadores tm como objetivo a interveno na realidade presente com base em valores reais. Recomendo este texto principalmente por conta do seu carter democrtico e inovador, por estabelecer um processo de formao e informao de cidads e cidados e tambm oferecer prticas e metodologias que dialogam com os quatro pilares reco- mendados pela UNESCO para a educao do sculo XXI: Aprendendo a aprender, Aprendendo a ser, Aprendendo a fazer e Aprendendo a viver junto. Boa leitura! 11. 13 Apresentao Deise Sartori 2 Esta publicao resultado da execuo do Projeto Gerao, submetido ao Con- selho Municipal dos Direitos da Criana e do Adolescente (CMDCA) em 2011, apro- vado e executado no binio 2012/2013 com recursos do Fundo Municipal dos Direi- tos da Criana e do Adolescente da Prefeitura da Cidade de So Paulo (FUMCAD). Uma reflexo que nos inspira a realizar esse trabalho est na obra do Prof. Antonio Carlos Gomes da Costa: Para encontrar os outros, o educando precisa encontrar-se consigo mesmo; para en- contrar-se consigo mesmo o educando precisa ser compreendido e aceito; ele se sentindo com- preendido e aceito ele vai aumentar sua autoestima, seu autoconceito e sua autoconfiana, porque ele vai ter a sensao de que tem valor para algum; se ele tiver a sensao de que tem valor para algum e de que compreendido e aceito, ele vai olhar o futuro sem medo; se ele olhar o futuro sem medo, ele ser capaz de plasmar, de construir um projeto de vida; se ele constri um projeto de vida, sua vida passa a ter um sentido; se a vida passa a ter um sentido, ele comea a ver com outros olhos os estudos, a obedincia, a profissionalizao, o seguimento das regras, o tratamento com as pessoas, etc. Tudo isso se modifica na sua vida. Isso a Pedagogia da Presena. (Costa, 2001) No ano 2000 a Ao Comunitria colocou o pblico jovem no centro da sua misso e, desde essa poca, isso vem sendo aprimorado numa proposta que tem como foco desen- volver competncias pessoais, relacionais, produtivas e cognitivas que contribuam para a incluso social de jovens pertencentes a famlias em situao de vulnerabilidade social. Neste percurso, previmos a participao de todos os envolvidos e realizamos uma srie de consultas no sentido de encontrar as melhores prticas para o alcance de nossos objetivos. Destacamos uma atividade projetada e construda por nossa equipe tcnica, educadores, especialistas e gestores: o Projeto de Vida (PV). Quando introduzimos o PV em nosso programa para jovens - Programa Preparao para o Trabalho (PPT) - visitvamos as organizaes sociais parceiras onde ele era exe- cutado e percebamos sua importncia quando vamos as produes dos educandos, 2 Pedagoga e gerente do departamento de Desenvolvimento Social da Ao Comunitria. 12. 14 que revelavam o resultado de um trabalho focado na construo de uma perspectiva de futuro. Nos rostos dos jovens que terminavam o percurso formativo estavam refletidas a esperana, confiana e a coragem para empreender mudanas. Mas queramos mais: nossa inteno era aprofundar a busca e encontrar uma metodologia que oferecesse respostas s nossas inquietaes: Que tipo de jovem queremos formar? Para que tipo de sociedade? Qual o significado da incluso social do jovem pertencente s camadas populares? Essas reflexes amadureceram medida em que fomos encontrando alguns cami- nhos estratgicos, que ao longo de oito anos se configuraram como um fio condutor do Programa Preparao para o Trabalho, que aqui apresentamos, sem a pretenso de torn-lo uma receita a ser seguida, mas como exemplo de soluo que amplia as prti- cas da educao do jovem para a vida produtiva. 13. 15 Parte I Introduo A educao, dever da famlia e do Estado, inspirada nos princpios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exerccio da cidadania e sua qualificao para o trabalho (Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional Artigo 2) Com o intuito de buscar caminhos que contribuam para a incluso social de jo- vens, a Ao Comunitria investe de forma sistemtica na criao de metodologias que atendam tal propsito. Por meio da formao continuada de educadores e da parceria com lideranas comunitrias, coloca em prtica o conhecimento e a experincia acu- mulados, aprimorando cotidianamente sua operao e sua prtica educativa. Prope um jeito de fazer, ou seja, uma maneira singular e organizada de realizar intervenes no mundo por meio de aes que promovam um novo olhar para a sociedade, seguido de atitudes voltadas para o bem comum. Coerente com esta lgica, uma das principais linhas de trabalho da organizao se ex- pressanadescobertadeprticasquecontribuamparafazerevoluiracidadaniaemumcon- texto de desenvolvimento integral, tendo os jovens como um dos pblicos principais. Considerando que a cidadania compreendida ao longo da vida e construda a partir do convvio entre as pessoas nas aes em prol da manuteno e do desen- volvimento da sociedade, educar para seu exerccio preparar para uma convivncia democrtica e de qualidade. Assim sendo, pode-se dizer que um dos focos principais das metodologias de trabalho da Ao Comunitria o investimento na melhoria das competncias relacionais, ou seja, na capacidade de conviver com o outro, amparada por valores democrticos como, por exemplo, igualdade, liberdade, solidariedade, par- ticipao e diversidade. medida que os jovens desenvolvem diferentes competncias e habilidades, mu- dam suas formas de se relacionar com as pessoas e com o mundo e se posicionam de maneira mais democrtica frente s questes sociais. Apreender o sentido e o exerccio do convvio social, em qualquer mbito, a base para a construo de valores com- prometidos com o bem comum, necessrios ao exerccio da cidadania. Tal desenvolvi- mento contribui para a vida pessoal, social e profissional destas pessoas. 14. 16 No que diz respeito vida profissional, pode-se dizer que a preparao para o mundo do trabalho est diretamente relacionada com a formao para a cidadania. Reconhecer direitos e responsabilidades, desenvolver capacidades, fazer escolhas e to- mar decises so demandas colocadas constantemente pelo mundo do trabalho e de suas relaes. Desenvolver aes com os jovens para que compreendam a relao entre trabalho e cidadania fundamental para a construo de suas identidades, ainda mais considerando que se encontram em fase de desenvolvimento e muito prximos da experincia do primeiro emprego. Partir do investimento nas aprendizagens bsicas para a convivncia, compreend- las a partir da leitura que os jovens fazem (e aprendem a fazer) de si mesmos, de seus valores e da realidade que os cerca, contribui para a construo de suas identidades. Nessa perspectiva, desde 2004, a Ao Comunitria prope a metodologia do Projeto de Vida, para que os jovens reflitam sobre a realidade em que vivem, faam uma an- lise de contexto e planejem aes futuras pautadas em princpios ticos e de cidadania. Por meio da anlise de contexto, desenvolvem autoconhecimento para a construo do Projeto de Vida. A proposta desta metodologia explorar diferentes aspectos (familiar, educacional, profissional e social) da vida do jovem, para que ele possa fazer escolhas considerando o contexto social e sua histria. Por meio de perguntas e exerccios que provoquem a reflexo, esses aspectos so problematizados e correlacionados em trs tempos: Passado, Presente e Futuro. Seguem exemplos das possveis indagaes, especialmente sobre a vida social: Passado - Como eram as formas de me relacionar na vida social antes de participar de experincias em projetos formativos? Que tipo de posicionamento eu tinha diante de algumas questes sociais? Quais eram meus desejos de insero profissional? Presente - Como se do as minhas relaes sociais? Como tem sido vivenciar os mtodos durante a formao? Meus posicionamentos diante das ques- tes sociais tm mudado? Tenho olhado para o mundo do trabalho de uma forma diferente? Como exercito a cidadania por meio do trabalho? Futuro - Como eu gostaria que fosse minha vida em sociedade? O que espero para minha escola? E para minha comunidade?. Durante o processo formativo, os jovens montam um portflio com as atividades que foram desenvolvidas. O processo de reflexo assim materializado para que haja uma percepo concreta do trabalho desenvolvido. Em relao vida social, o jovem 15. 17 incentivado e provocado a pensar em situaes coletivas e experincias que faam parte do seu cotidiano e estejam diretamente relacionadas aos seus interesses indivi- duais. Num segundo momento, ele levado a observar contextos sociais mais amplos e a investigar a relao destes com sua vida e escolhas. Desta forma, os jovens podem atribuir sentido s experincias formativas, aumentando as chances de sentirem-se comprometidos com a coletividade, promovendo uma construo crtica e consistente de seus Projetos de Vida. Eixo norteador do processo formativo, o Projeto de Vida amparado por mtodos que facilitam o processo de reflexo, investigao e proposio do educando. Para esta publicao, a despeito de tantos outros existentes, quatro mtodos foram escolhidos: Imaginao Sociolgica, Cartografia, Educomunicao e Orientao Profissional. Cada um deles sustentado por um conjunto de ideias e concepes que se relacionam ao modo como a Ao Comunitria concebe a relao ensino-aprendizagem. Tais m- todos se correlacionam e se complementam, propondo intervenes no mundo por meio de aes que promovam um novo olhar para a sociedade, seguido de atitudes voltadas para o bem da coletividade. Durante a construo do Projeto de Vida, os educadores criam situaes, pro- vocam e encorajam o jovem a olhar para si e para o mundo, para que se depare com questes que o faam refletir. Desta forma, sua identidade vai sendo ressignificada por meio de reflexes existenciais como, por exemplo: Quem sou eu? Qual o sentido da vida? O que penso do meu corpo? Como vou me sustentar? No que vou trabalhar? A partir desta lgica, outros temas tambm so abordados, como por exemplo, drogas, sexualidade, consumo, famlia, entre outros. Como j foi dito, justamente nesse perodo que o jovem tenta construir, na relao com outros jovens e adultos, sua nova for- ma de ser e de se perceber no mundo. Ao longo da construo dessa nova identidade, por mais que no parea, os jovens esto muito atentos aos adultos que os cercam, selecionando aspectos de que no gostam e outros que lhes agradam, fazendo oposies, rejeitando ou ainda concordando. Ainda no processo de constituio e significao da identidade os ado- lescentes e jovens lanam mo de diversas e intensas experincias pensamentos, palavras e aes( Isaac, 2005: 15). A formao da identidade um processo dinmico, que resulta da assimilao e rejeio das identificaes sofridas ao longo da vida, assim como das interaes entre o desenvolvimento pessoal e as influncias sociais. Nesse contexto, ajudar o jovem a 16. 18 avaliar o vnculo com o outro muito importante. Sua identidade e escolhas sempre se relacionam com os outros, reais e imaginrios. Suas escolhas sobre trabalho, por exemplo, sempre se baseiam em relaes interpessoais passadas, presentes e futuras. A formulao de um Projeto de Vida, seja por uma via consciente ou inconsciente, faz parte e tambm resultado do processo da formao da personalidade e da identi- dade do jovem. Para um adolescente, planejar e definir seu futuro no implica somente definir o que fazer, mas, fundamentalmente, escolher quem ser e, ao mesmo tempo, quem no ser. Em seu trabalho a Ao Comunitria quer ajudar o jovem a pensar sobre essas definies, torn-las conscientes e desnaturaliz-las, ou seja, relacion-las a contextos culturalmente construdos. Em outras palavras, pretende ajud-los a perce- ber que os padres criados pela sociedade no so naturais e podem se modificar (e ser modificados) ao longo do tempo. Cabe ressaltar que a metodologia proposta desenvolvida com os jovens aten- didos pelos Programas Socioeducacionais da Ao Comunitria a cada semestre. Isso significa que a instituio realiza um trabalho condicionado s limitaes de tempo, o que singulariza seus resultados, mesmo que positivos. Logo, os mtodos apresentados podem ser adequados e explorados de acordo com o contexto de cada organizao que pretenda utiliz-los. Por outro lado, esse trabalho aponta caminhos possveis e prope reflexes, que podem contribuir para que educadores de diferentes projetos encontrem solues para seus desafios e enriqueam suas aes com os educandos. 17. Panorama Geral 18. 20 Mtodos de trabalho Panorama Geral O eixo central de todo esse trabalho o Projeto deVida e as diferentes metodologias que se inter-relacionam ao longo dos encontros formativos com os jovens. No se trata de ensinar ou to pouco citar a existncia dessas metodologias para os jovens, mas de se apro- priar delas para oferecer aos educandos reais possibilidades de desenvolvimento e aprendizagem. Vale lembrar que a utilizao desses mtodos no feita de maneira sequencial. No existe uma ordem, mas sim uma interao, que a forma de organizar- mos aes consistentes sob a orientao de correntes metodolgicas. O primeiromtodo utilizado chama-se Imaginao Sociolgica e foi construdo a partir do pensamento sociolgico, no qual parte expressiva das situaes e acontecimentos individuais est relacionada a um determinado contexto social e histrico. Ele prope que o indivduo compreenda sua vida a partir da anlise dos contextos sociais e histricos. Por meio desse mtodo, os jovens podem realizar leituras da realidade, atribuindo sentidos mais amplos a contextos, relaes e fenmenos sociais, compondo uma viso realista do mundo sua volta. Na medida em que se identificam nos contextos sociais, os jovens passam a com- preender seus papis como participantes responsveis e no como meros observadores ou vtimas da estrutura social. Mais ainda: comeam a perceber que seus valores no so absolutamente naturais e que foram construdos ao longo do tempo, influenciados por diferentes conjunturas. Tambm aprendem a perceber que valores podem mudar ou ser abandonados por causa de transformaes histricas e sociais. Assim, os modos de convvio adotados pelas pessoas, fundamentais para o exerccio da cidadania, se do em contextos histricos prprios. No momento em que os jovens compreendem que seus comportamentos no so apenas expresses individuais, mas fruto de mediaes associadas a contextos sociais mais amplos, aumenta a probabilidade de que se percebam como corresponsveis pelo bem comum. Logo, as aes voltadas para a promoo da cidadania e para a construo da vida social tambm so favorecidas. O segundo mtodo a ser envolvido nessa construo do Projeto de Vida a Carto- grafia. Ela prope uma investigao do territrio a partir dos recursos e talentos locais. Os jovens produtores das cartografias so considerados pesquisadores e, ao mesmo tempo, recursos ativos do territrio cartografado. 19. 21 A Cartografia permite se apropriar da cultura local, reconhecendo a diversidade com que os espaos so ocupados e geridos, possibilitando aos jovens pesquisadores que reflitam sobre suas prticas, alterando as prprias maneiras de ver, sentir, pensar e perceber seu entorno e o mundo. Aqui preciso associar a Cartografia Imaginao Sociolgica, pois a ideia fazer com que os jovens observem seu bairro, compreendendo-o a partir de sua histria e relacio- nando-o com um contexto social mais amplo. Durante a observao, o jovem estimu- lado a refletir sobre seus valores e atitudes, podendo ao longo do processo mudar suas formas de interao com as outras pessoas, com a vizinhana e, consequentemente, com a sociedade em geral. De maneira complementar, os dois mtodos tm potencial para elevar a capacidade do jovem olhar em volta e perceber criticamente o mundo. O terceiro mtodo ser desenvolvido a partir da concepo da Educomunicao, aqui compreendida como meio para garantir o direito informao e como instigao leitura crtica dos meios de comunicao. Esse mtodo est correlacionado s duas ferramentas anteriores, medida em que a anlise parte do contexto individual para o coletivo. Em outras palavras: num primeiro momento, os jovens devem se enxergar como consumidores crticos dos objetos culturais divulgados na mdia, para posterior- mente relacion-los com os contextos sociais e com as relaes de poder. Por meio do permanente exerccio da criticidade, preciso mostrar aos jovens os diversos caminhos de acesso informao e auxili-los na interpretao do que divulgado. Ao aprender a desvendar distintas realidades, o jovem comea a perceber o quanto sua vida e seus va- lores so influenciados e capturados para a produo e a reproduo das desigualdades. Desta forma, tem a possibilidade de rever valores, padres de consumo e comporta- mentos, o que pode propiciar o surgimento as formas de convvio fundamentais ao exerccio da cidadania. O quarto mtodo tem como fundamento a Orientao Profissional, que na perspec- tiva contempornea vai muito alm da escolha de uma carreira: um processo mais slido de organizao de um projeto de vida, construo da identidade pessoal e profissional e de busca por uma insero consciente na sociedade e no mundo do trabalho. Trata- se de possibilitar aos jovens experincias e reflexes que os tornem conscientes dos parmetros subjetivos, sociais e econmicos que influenciam suas escolhas, a fim de que possam alinhar seus caminhos profissionais a seus projetos de vida de modo mais crtico, mais consciente, amplo e socialmente responsvel. 20. 22 Mapa da proposta pedaggica: Promover a Desnaturalizao Somos seres temporais, sociais, econmicos, polticos, etc. Somos uma construo a partir desses elementos e no seres simplesmente naturais... Portanto, somos fruto de escolhas nossas e do meio. Projetos de Vida: + Alinhados identidade e no apenas a identificaes inconscientes. + Reais, genunos, livres, crticos. Que respeitem as diferenas e no as transformem em desigualdades. + Cidados. Para alm de si mesmo (O que me causa como sujeito e o que causo no mundo). + Conscientes + Autorais De passivo para co-autor, de posio de vitimizado para corresponsvel. Imaginao Sociolgica Educomunicao Orientao Profissional (Psicologia scio-histrica) Cartografia+ + + 21. 23 Este mapa ilustra os pontos de convergncia e o entrelaamento dos quatro m- todos. Apesar de suas particularidades e especificidades, os mtodos promovem um movimento em comum: a desnaturalizao. Ao desnaturalizar a situao do jovem e do mundo onde ele vive, cada mtodo aponta para a construo, temporalidade e sobre determinao presentes na elaborao de identidades e projetos de vida. Ao perceber-se como um sobredeterminado e como fruto de um processo dialtico entre seu prprio desejo e as condies de seu meio e de sua poca, o jovem dever sentir-se capaz de construir seu projeto de vida de modo mais autoral e criativo e no apenas responder passivamente s expectativas da mdia de massa ou enquadrar-se de modo fatalista e vitimizado nas suas limitaes pessoais ou sociais. Poder criar proje- tos em que respeite sua identidade e que no sejam simples repeties, identificaes inconscientes com personagens ou modelos de seu meio. Desse modo, suas escolhas e projetos tornam-se mais genunos, crticos e contex- tualizados, privilegiando a singularidade, mas tambm considerando aspectos coletivos, como resultado do desenvolvimento de um olhar cidado. 22. 24 23. A Imaginao Sociolgica 24. 26 PRIMEIRO MTODO A Imaginao Sociolgica Usar a imaginao sociolgica, conceito de Charles W. Mills, nos permite compreender que somos capazes de enxergar alm. Alm do mundo em que vivemos e que por vezes nos limita tanto. Alm das realidades que nos sufo- cam. Utilizar a imaginao sociolgica como mtodo nos possibilita formar cidados mais compromissados com o amplo. Amplido que deve ser pensada em termos conjun- turais, e em termos histricos. (Dantas & Martins Jr.) O que representa formar jovens? Prepar-los para o mercado de trabalho, ofertando aprimeiraoportunidadedesalrioevidadigna?Elevarassuaschancesderendimento? Afast-los da vulnerabilidade? Qualificar a mo de obra do pas? Se todas as respostas s perguntas acima forem positivas, estaremos diante de um desafio expressivo. Mas como justificar uma distncia significativa entre a simples qualificao profis- sional e a construo da cidadania? Como afastar a formao tcnica do compromisso social das empresas? Tais perguntas equivalem a dizer que, se por um lado, carecemos de profissionais prontos para o exerccio estritamente formal de uma atividade laboral, por outro, vemos conjuntos expressivos de organizaes privadas aprimorando seus compromissos com a sociedade, por meio de aes as mais diversas reunidas sob o jargo Reponsabilidade Social. Nesse sentido, formar para a Cidadania e para a Democracia, buscando o de- senvolvimento de princpios como igualdade, liberdade, solidariedade, diversidade, participao e tolerncia configura-se como uma resposta s demandas igualmente re- levantes para desenvolvimento de um pas justo, que supere as desigualdades oriundas da m distribuio de renda e acabe com as opresses decorrentes dos preconceitos. Da o objetivo de pensarmos em formas capazes de levar os jovens para o convvio respaldado por valores que devem ser construdos conjuntamente. Para responder aos desafios apresentados, devemos considerar a existncia de diferentes mtodos em distintas cincias. Na sociologia, o conjunto de conceitos e mtodos para compreenso do real expressivo. E no mtodo do norte-americano Charles W. Mills que encontramos um caminho frtil, sobretudo se considerarmos que o trabalho aqui proposto guarda relao com conceitos, mtodos e cincias que 25. 27 objetivam decifrar problemas prprios da juventude. Falamos especificamente de algo que Mills (1959) escreveu no final da dcada de 50 do sculo passado. Trata-se de seu conceito de Imaginao Sociolgica. Se o jovem, por exemplo, precisa descrever sua trajetria e, a partir desse esforo, desenhar o seu Projeto de Vida, parece necessrio que compreenda a complexidade do mundo em que vive. Se ele utiliza a cartografia para desenhar seu universo e a educomunicao para expressar criticamente sua realidade, tal exerccio, feito com conscincia, parece ser capaz de gerar resultados mais condizentes com a realizao das expectativas e investimentos mobilizados no processo. A Imaginao Sociolgica , assim, um instrumento capaz de lidar com o despertar da conscincia, e servir de base para o desenvolvimento de atividades construtivas. O mtodo indicado por Mills logo no primeiro captulo da obra A Imaginao Socio- lgica, intitulado A Promessa. O texto apresenta o processo pelo qual os indivduos adquirem uma nova viso de mundo por meio da capacidade de olhar alm da peque- na e restrita realidade que os cerca (Mills, 1982) Em plena dcada de 50, ele descreve algo que qualquer cidado ainda sente nos dias de hoje: no cotidiano, temos dificuldades para superar nossas preocupaes e nutrimos sentimentos de aflio sobre questes privadas, como o emprego, famlia, vizinhos, etc. Assim, nos amedrontamos ou nos sentimos pequenos, porque no temos capacidade e preparo para compreender a complexidade da organizao social e nem mesmo o que sentimos. Dessa forma, muito alm da percepo de que estamos encurralados em nossos cotidianos, devemos compreender que existem aspectos impessoais e fatores objetivos na estrutura das sociedades em que vivemos.Tais questes podem determinar o que sentimos. nesse sentido que precisamos compreender que somos influenciados por aspectos que transcendem nosso cotidiano e que o impactam acentuadamente. Assim, para decodificar os fatores objetivos que influenciam nossas vidas, a Imagi- nao Sociolgica confere importncia necessidade da constituio de uma percepo histrica do mundo em que vivemos. Segundo esse entendimento, nada acontece por acaso: nossa realidade o resultado de uma srie de desdobramentos histricos e est relacionada com escolhas que fazemos com maior ou menor grau de conscincia. (Mills, 1982) A Imaginao Sociolgica uma ferramenta que possibilita a percepo das con- junturas e capaz de oferecer maior grau de conscincia aos jovens, permitindo que 26. 28 constituam uma ampla viso da realidade. Tal compreenso pode aliviar a sensao de aprisionamento individual que por vezes notamos em nossas vidas. O uso da Imaginao Sociolgica seria assim capaz de ampliar tanto a possibili- dade de compreender a vida social quanto a busca por alternativas superadoras. As percepes se tornam mais aguadas. E em se tratando do Projeto de Vida, as escolhas profissionais podem ser mais apropriadas, ou seja, realizadas a partir da combinao entre desejos e autoconhecimento, com tomadas de deciso contextualizadas. A com- preenso dos contextos familiares e do entorno ficaria mais clara por meio da anlise do passado. O rapaz e a moa que sonham em ser docentes, por exemplo, poderiam notar a importncia das inovaes tecnolgicas para o campo da educao. A Imagina- o Sociolgica aponta para a necessidade de oferecer aos jovens a possibilidade de uma compreenso mais ampla acerca da sociedade. E aqui no existe segredo ou magia: estamos falando em desvelar tendncias e contextos para uma leitura mais acurada das probabilidades futuras. O que muitos poderiam chamar de criao de visionrios, para a sociologia aprimoramento tcnico de uma habilidade de leitura de mundo. Assim, para a construo de um Projeto de Vida mais consistente e consciente nos parece fundamental a capacitao desses jovens para melhor compreenderem a si mesmos, seus valores e a realidade que os cerca (Mills, 1982). E os mtodos propostos se mostram capazes de reduzir distores e afast-los dos pensamentos caractersticos do senso comum, que reduzem a possibilidade de compreenso da vida social e criam obstculos para significativas parcelas da juventude. Se em termos individuais aprimoramos a leitura de mundo, essencial que traba- lhemos tambm em termos coletivos, para que se fortaleam valores inerentes a uma sociedade, como por exemplo a consolidao da Democracia e da Cidadania. Theodor H. Marshall (1967) afirma que o conceito de Cidadania est diretamente relacionado construo coletiva de uma conscincia acerca do que representa viver em sociedade e agir sobre a realidade compartilhada. A Imaginao Sociolgica ou, se preferirmos, a capacidade de um olhar mais consistente e crtico sobre a realidade, poderia elevar a conscincia dos jovens para que compreendam melhor o momento histrico em que vivem no que diz respeito, por exemplo, Cidadania. Perguntemos ento para os jovens o que acham da poltica e teremos como pos- svel resposta: Trata-se de algo sujo e dela preciso manter distncia. Questionemos o que entendem por classe poltica, e teremos como possvel resposta: Trata-se de um bando de corruptos que prejudicam o cidado. 27. 29 Se parte da juventude tem essas representaes sobre a poltica, a Imaginao So- ciolgica pode ser capaz de lhes mostrar uma leitura da realidade, atribuindo sentido a contextos e fenmenos que aparentemente no tm nenhuma relao com sua vida (Mills, 1959) Auxili-los a compreender o quanto seus gestos, escolhas e alternativas de vida se relacionam aos contextos polticos que ilustram em seus desejos de afasta- mento e descrdito um exemplo da tomada de conscincia que desejamos. A respon- sabilidade sobre a construo de um Projeto de Vida passa pela compreenso acerca das probabilidades e da responsabilidade sobre a efetivao das vontades. Desejamos assim estimular a construo de Projetos de Vida inseridos em percepes de contextos mais amplos da sociedade. Sem partidarismos ou defesas apaixonadas de ideologias. O intuito maior celebrar a promessa de Mills, ou seja: pensar na formao de agentes capazes de se sentirem responsveis pelo meio em que vivem, utilizando para tanto uma capacidade extraordinria de compreenso conjuntural e histrica para a leitura daquilo que desejam. 28. 30 29. A Cartografia 30. 32 SEGUNDO MTODO A Cartografia A cartografia aqui proposta percebida como um mtodo para compreender e intervir no mundo por meio da criao de mapas objetivos e subjetivos (Alexandre Isaac) O termo cartografia remete s rotas de navegao, ao ato de se lanar rumo ao des- conhecido, seguindo um sonho, um interesse, um desafio. Remete-nos assim ao que fizeram os grandes navegadores do sculo XVI, que criaram novas rotas e mapas para prospectarem territrios inexplorados. Ao ser apropriada pela Geografia, Psicologia Social e pela Educao, a Cartografia nos conduz ideia de modos de conhecer e com- preender o mundo. A Cartografia no pode ser vista apenas como uma espcie de chave para o conhecimento e a compreenso da realidade, mas sim como um meio de transfor- mao social. Seu uso nos possibilita o acesso ao conhecimento e compreenso do mundo, bem como estabelece um modo de agir sobre ele para superar as violncias e as desigualdades sociais. Como mtodo, ela prope que o educando desenvolva um olhar investigativo (fazedor de perguntas), assumindo o papel de cartgrafo, ou seja, de pesquisador de sua comunidade e da sociedade em geral. Por meio da anlise da realidade que o cerca, o jovem poder refletir sobre situaes e fenmenos, consideran- do-os na construo do seu Projeto de Vida. Princpios de uma investigao cartogrfica: O cartgrafo pretende captar a vida onde ela est acontecendo, nas pessoas e nos grupos com os quais se trabalha. Ele um investigador das relaes no territrio. Busca conhecer e compreender o conjunto de elementos que interferem na formao e no desenvolvimento das pessoas e das comunidades. Precisa se mostrar interessado, curioso e aberto para perceber a vida, o movimento que pulsa nos mais diversos ter- ritrios, nos grupos e nas comunidades, apreendendo, junto com os jovens e demais atores sociais, as possibilidades de transformao. A investigao cartogrfica opera sobre o real mas tambm sobre as subjetividades, recorrendo s lembranas, desejos e memrias das pessoas e das comunidades. Acredita- se que esse tipo de investigao capaz de despertar uma nova vontade de agir, de cons- truir novas realidades e de oferecer sentidos s experincias subjetivas e comunitrias. 31. 33 O cartgrafo se detm sobre os movimentos dos territrios, buscando apreender e dar visibilidade aos potenciais das comunidades e no somente s suas fragilidades e vul- nerabilidades. O pesquisador tem como princpio que qualquer pessoa da comunidade possui habilidades, experincias e qualidades que podem contribuir para e com o bem comum. Nesse sentido, o cartgrafo procura reconhecer as capacidades das pessoas, dos grupos, das comunidades, dos lugares e das culturas, buscando minimizar suas dificuldades. Trata-se da tentativa de reverter situaes em que fraquezas criam efeitos de imobilidade, dando lugar a potencialidades capazes de produzir transformaes de interesse coletivo. Assim, alguns lugares considerados de risco, de alta vulnerabilidade e de profundas excluses sociais, no sero compreendidos exclusivamente como territrios marcados por fragilidades, carncias e pontos fracos. Nessas comunidades existem pessoas capazes de desenvolver processos altamente inteligentes, detentoras de grande criticidade e criatividade. Outro ponto importante: quando falamos de cartografia, especialmente nas reas educacionais e sociais, notamos que ela se apresenta por meio da adoo do trabalho por projetos (Fundao Sicredi, 2008:16). A Cartografia pode dar sentido aos trabalhos por projetos na medida em que prope dilogos e combinaes entre experincias, inte- resses, desejos e saberes dos educandos e as suas reais possibilidades de criar, inventar e intervir nos territrios e comunidades. O trabalho com projetos se baseia numa concepo de aprendizagem segundo a qual aprender no memorizar ou acumular informaes, e ensinar no repassar contedos prontos. A aprendizagem um processo dinmico que ocorre por meio das relaes que estabelecemos em nossas vidas com os diferentes sujeitos, espaos, objetos de interesse e conhecimentos. Trabalhar com projetos optar por uma estratgia que possibilite construir os conhecimentos por meio da ao, isto , aprender fazendo. Essa uma caracterstica intrnseca da Cartografia, que depende ento do envolvimento de educadores e educandos igualmente comprometidos com a busca de conhecimentos que tenham sentido e significado para todos. Nas organizaes socioeducativas, o trabalho com projetos contribui para romper a fragmentao dos conhecimentos e o isolamento entre as pessoas, promovendo pontes e dilogos que permitem constituir saberes significativos, estabelecendo relaes entre diferentes campos do conhecimento. 32. 34 Para que a aprendizagem mobilize os educandos, ela tem que fazer sentido em suas vidas e atender desejos de compreenso, de realizao pessoal e social. Por isso, qualquer aprendizagem deve estar articulada com a vida dos jovens e da comunidade em que vivem. nesse ponto que a Cartografia ganha importncia e relevncia. um esforo permanente de conferir sentido aos conhecimentos. Educadores e educandos escolhem, selecionam, promovem experincias de cons- truo de conhecimentos, selecionam estratgias, definem responsabilidades, estabe- lecem cronogramas de ao e constroem metas comuns. A ao prioriza o dilogo, a troca de saberes, a expresso de dvidas, a soluo de conflitos e a valorizao das diferenas, promovendo a apropriao e a ampliao de conceitos, atitudes, valores e competncias pessoais e sociais. Em conjunto, os atores sociais refletem, tomam deci- ses, pesquisam, coletam, sistematizam dados, discutem e tiram concluses, aprimo- rando capacidades como ouvir, propor, argumentar, contra-argumentar, estabelecer prioridades, planejar e avaliar aes coletivas. Aliados aos processos cartogrficos, os projetos possibilitam transformar os espaos socioeducativos em campos abertos para a construo dos saberes, valorizando a curio- sidade e a satisfao dos mais variados desejos de conhecer. O resultado do desenvol- vimento dos projetos a promoo das aprendizagens e da autonomia necessrias para sua realizao, isto , os projetos possibilitam construir formas pessoais e coletivas de aprendizagem, que podero ser aperfeioadas a cada nova experincia compartilhada. 33. A Educomunicao 34. 36 TERCEIRO MTODO A Educomunicao: Na educomunicao, entendemos o processo comunicativo como um direito humano (Ismar de Oliveira Soares) Durante certo tempo, a Educomunicao foi vista e analisada apenas como caminho para a construo de senso crtico frente aos meios de comunicao de massa. Sua prtica era pensada, desenhada e aplicada com a finalidade de gerar reflexes que ajudassem a sociedade a compreender como a realidade era lida e contada pela mdia. Com o passar do tempo, o prprio conceito de Educomunicao se ampliou e hoje cabem novas defi- nies que nos permitem lev-la para os ambientes educacionais. Muitas so as definies do que Educomunicao e outras tantas so as variaes e os entendimentos sobre o tema. Tal diversidade inclusive fruto de experimentaes feitas em todo o pas. Como espinha dorsal desse movimento de eterna descoberta do sobre o qu estamos falando, h a interseco entre a Comunicao Social e a Edu- cao como prtica de aprendizado. dessa interdependncia e dessa conexo que surgem os elementos nos quais se baseia nosso mtodo para compreender como a comunicao pode auxiliar na forma- o dos educandos. Por meio de tal abordagem, torna-se possvel no apenas contar nossa histria cotidiana, mas tambm reler e reavaliar historicamente a sociedade em que vivemos, o que fundamental para a construo do Projeto de Vida. Alm, claro, de permitir infinitas reinvenes das formas de aprender um determinado assunto. Segundo pesquisas do Ncleo de Comunicao e Educao da Universidade de So Paulo (NCE-USP), a Educomunicao um conjunto de aes com trs finalidades: integrar s prticas educativas o estudo sistemtico dos sistemas de comunicao, criar e fortalecer ecossistemas comunicativos em espaos educativos e melhorar o coeficiente expressivo e comunicativo das aes educativas. Basicamente, pode-se concluir que a Educomunicao tem como principais desafios planejar, implementar e avaliar processos, programas e produtos destinados a criar e fortalecer ecossistemas comunicativos em espaos educativos presenciais, como a sala de aula, ou virtuais, como as redes sociais. Nesse contexto, nota-se que a Educomunicao mais do que fomentar uma leitura crtica da mdia e uma tomada de posicionamento frente a ela. provocar os envolvi- 35. 37 dos para que se tornem, eles mesmos, os meios de comunicao que gostariam de ver em suas realidades, ou seja, os protagonistas produtores de uma comunicao marcada pelo senso crtico e pela proposio. E mais: praticar esse mtodo estimular perma- nentemente um ambiente criativo, democrtico e acolhedor para a ressignificao do mundo por aqueles que, de fato, so agentes desse ambiente. Uma pesquisa feita pelo Programa Nacional de Conservao de Energia Eltrica (Procel), da Eletrobrs, mostrou que 98% dos lares brasileiros tm aparelhos de te- leviso, percentual maior que a presena de eletrodomsticos como a geladeira, que s aparece em 96% das casas. Consequentemente, possvel afirmar que a televi- so a forma de manter parcela expressiva de cidados conectada ao mundo, o que evidencia a necessidade humana de se comunicar e, portanto, de manter uma vida em sociedade, mesmo que de forma superficial, como meros expectadores dos fa- tos. O que se pretende que a Educomunicao seja uma facilitadora no processo de desenvolvimento dos jovens educandos, para que estes abandonem a posio de expectadores, aprendam a ler criticamente o que comunicado e construam suas prprias opinies. Nesse sentido, a prtica educomunicativa transformadora. E, no caso, o que menos importa a qualidade tcnica da comunicao que est se produzindo, mas sim sua intencionalidade e seu contedo. Cabe ressaltar que, essencialmente, a informao poder. A histria da humani- dade mostra que em qualquer tempo ou espao geogrfico, uma das primeiras atitudes dos regimes ditatoriais, quando se instalam, buscar o controle dos meios de comuni- cao. Ou elimin-los. Sem poder se comunicar livremente, qualquer sociedade fica merc dos canais oficiais, ou seja, refm de uma verdade nica que, sem contestao, pode distorcer fatos e tornar-se absoluta. Mesmo nos regimes no autoritrios, a infor- mao valiosa, podendo ser divulgada e lida como verdade nica. Da a importncia de investir na formao de educandos que faam uma leitura ampliada do mundo, tornando-se agentes de transformao da prpria vida e da realidade que os cerca. Quanto mais conhecimento, maior o repertrio e melhor a viso crtica dos fatos. A Educomunicao ajuda a enfrentar tal desafio. Para inspirar uma reflexo sobre o tema, cabem aqui alguns pontos importantes. Talvez, em toda a histria, nunca se teve tanto acesso informao como agora. Somos atingidos pelo celular, pela internet, pelo computador, pela TV, pelo rdio, pelas placas e por outras dezenas de meios de comunicao. Porm, provavelmente nunca se tenha 36. 38 retido to pouco contedo. O problema, no entanto, no a quantidade de contedo produzido, mas sim a passividade das pessoas ao receberem as informaes. Principalmente no espao educativo, quanto mais pessoas fizerem uma leitura das intenes e relaes que esto nos bastidores dos contedos produzidos e aprenderem a gerar comunicao crtica para o mundo, maior ser a chance de a sociedade ser transformada. Quanto mais pessoas enxergarem suas comunidades, sua organizao, sua sala de aula e a si mesmas, como recursos comunicativos, maior clareza e liberdade haver para que as escolhas sejam feitas. Assim, deve-se pensar a Educomunicao no apenas como um processo pedaggico, mas tambm como um mtodo que viabiliza o projeto de uma sociedade onde todos tm o que falar e, principalmente, o poder para faz-lo. Esse o parmetro para as aes de formao dos jovens atendidos. 37. A Orientao Profissional 38. 40 QUARTO MTODO A Orientao Profissional O homem no seno o seu projeto, e s existe na medida em que se realiza. (Satre) Qual a dvida latente quando um jovem se pergunta sobre sua escolha profissio- nal? Ou quando se pergunta se existe lugar para ele no mercado de trabalho? H uma crena generalizada de que as pessoas so destinadas a certos caminhos profissionaisqueaslevariamrealizaopessoaleque,apenasaodescobriressecaminho, seria possvel fazer a escolha certa e ser feliz e bem-sucedido! A base desta crena a ideia de vocao inata, que determinaria para sempre as inclinaes do sujeito. como afirmar que a vocao, se minuciosamente pesquisada e associada carreira correta, poderia garantir o xito profissional e a satisfao, independente de levar em conta a conjuntura. Esta viso aliena o sujeito e o descola do meio em que est inserido. Quando estamos no campo do humano, das escolhas e do contexto ps-indus- trial no existe o para sempre, nem a escolha certa, muito menos garantias. Existem apostas, busca de lucidez e crtica, construo de sentidos e constantes remodelagens das escolhas a partir de seus cenrios complexos. Na realidade, as perguntas centrais que esto latentes nos questionamentos pro- fissionais dos jovens so de ordem existencial: Quem sou eu? Quem desejo ser? Como posso garantir minha realizao pessoal e ao mesmo tempo sobreviver nesse mundo de caos vocacional e incertezas que configuram a era ps-industrial? Numa poca de severa excluso social, o eixo central da orientao reside na recons- truo dos vnculos dos jovens com um mercado de trabalho permeado de incertezas e em plena transformao. Diante dos reais questionamentos subjacentes s dvidas vocacionais no contexto mundial contemporneo, a Orientao Profissional aponta para muito alm da escolha de uma carreira: foca a construo de projetos de vida, identidade pessoal e profissional e na preparao do sujeito para realizar escolhas con- textualizadas. Trata-se de um processo profundo de pesquisa do sujeito em seu contexto, para que possa consolidar sua identidade, buscando sentido para sua vida pela via do trabalho. 39. 41 apenas pelo conhecimento do cenrio onde est inserido que o jovem pode realizar escolhas autnomas e autnticas, escapando das estereotipias. O que se busca instrumentalizar os jovens para que se tornem conscientes dos determinantes pessoais, sociais e econmicos de suas escolhas e possam, de modo crtico e realista, alinhar seus sonhos e caminhos profissionais. Deste modo, a Orien- tao Profissional atua como importante facilitadora no processo de incluso social, medida que promove a desalienao do sujeito e a conscincia de que sua identidade e projeto de vida so produtos da interao com o meio onde vive e de seu contexto scio-histrico, estimulando assim a preparao para o exerccio crtico da profisso, o senso de autoria e a corresponsabilidade em seus projetos. Ao desnaturalizar os cenrios e valores vigentes, pode-se ajudar a diminuir a sensao de impotncia vivida pelos jovens em situaes sociais desfavorveis, na busca da pro- duo de um sentimento de pertencimento e potncia para a construo de planos de ao. Portanto, em nossa abordagem, a Orientao Profissional se configura como um trabalho de cunho educativo e poltico, que contribui para auxiliar o jovem a se posi- cionar de maneira ativa e consciente, de modo a encontrar alternativas para suportar as incertezas de sua escolha e do mercado, transcendendo a cultura da sobrevivncia. Desde a dcada de 80, os profissionais dessa rea tm atuado em um recorte cada vez mais social, atrelado ao contexto educacional e comunitrio. Portanto, ao invs da proposta psicomtrica de encaixe do sujeito numa carreira atravs de testes vocacionais e mensuraes, lanam mo de ferramentas de diversas reas do conhecimento para auxiliar os cidados a construrem projetos lcidos, autorais e responsveis. No caso do trabalho na Ao Comunitria, as intervenes abrangem de modo convergente todas as metodologias mencionadas (Cartografia, Imaginao Sociolgica, Educomunicao) alm de ferramentas baseadas na Psicologia e na Pedagogia. A abordagem scio-histrica e as referncias de Rodolfo Bohoslavsky (2007) tambm so muito importantes nessa leitura e constituem fundamentos terico-prticos de base, focando as escolhas no mundo do trabalho e na identidade profissional por meio do projeto de vida. Deste modo, o educador que utiliza a Orientao Profissional em sua prtica assume um papel de grande importncia no processo, pois sua postura e atuao no podem servir para reproduo de modelos cristalizados ou naturalizados. Ao contrrio, seu 40. 42 olhar deve compreender o jovem a partir de sua realidade, enxergar as potencialidades e diferenas entre os jovens, intervindo de modo que cada um deles possa se ver como sujeito ativo. A atuao do educador social nessa rea deve direcionar o jovem para a consci- ncia crtica e a tomada de decises a partir da anlise de contexto. Neste cenrio de contradies, ideologias paradoxais e transformao intensa da sociedade, a apreenso da realidade pelo jovem torna-se obscura e o educador deve ajud-lo a discriminar o que importante em seu processo de escolha, promovendo um olhar para alm da dimenso psicolgica e individual. As intervenes propostas pretendem estimular o jovem a construir uma trajet- ria profissional alinhada a valores humanos, a fim de engendrar uma sociedade na qual todos possam ter o direito diferena, sem que isso resulte em desigualdade. Visam permitir que escolhas sejam feitas e que contribuam para ampliar horizontes, os quais podem ir alm das condies scio-econmicas determinadas pela histria de vida. Seu objetivo maior facilitar escolhas para que o jovem construa caminhos que valo- rizem a criao, a reflexo e a liberdade e assim produza transformaes em si mesmo e em seu meio social. Mais do que oferecer respostas e garantias, o que se deseja ampliar a viso que o sujeito tem de si e do mundo, com a inteno de rearranjar, contextualizar e problema- tizar questes. Trata-se de deslocar a preocupao do jovem com uma carreira ideal e sugerir indagaes sobre sua existncia, sobre as ideologias e vises hegemnicas a respeito do mundo do trabalho. A Orientao Profissional tambm procura fomentar questionamentos sobre pos- sveis contribuies do jovem para a sociedade na perspectiva do bem comum, para alm da fantasia individualista de realizao pessoal. Seu maior desafio prover recur- sos para que os jovens possam circular de modo crtico e criativo entre as determina- es do contexto e a autoria de sua prpria histria. 41. 43 SOBRE A ATUAO DE EDUCADORES NO TRABALHO COM JOVENS jovem quando descortina a clara possibilidade de mudar de opinio, jovem quando salta o precipcio da razo e tem uma queda pra iluso, jovem quando entra no oceano de quarenta correntezas sem nenhuma embarca- o, Signo da sinceridade, da impulso, do sonho, da realizao, jovem quando carrega o mundo com as mos. (da cano Aos Filhos de Peixes de Oswaldo Montenegro) O educador uma pea chave no processo de desenvolvimento da metodologia e, portanto, o investimento em sua formao continuada fundamental para o sucesso do trabalho proposto. Questes de fundo precisam fazer parte desse processo formati- vo: Se voc tivesse que escrever sobre o tema Ser educador, o que diria? Qual o perfil adequado deste profissional? De quais competncias precisa dispor? Qual seu papel na aplicao das metodologias? Qual o espao que ele ocupa na vida de vrios jovens a cada atividade, curso ou projeto? Como tem sido sua relao com as instituies de ensino? Quais so seus direitos e responsabilidades? Como ele visto pela famlia, a sociedade e pelo prprio Estado? Como o jovem estabelece suas relaes com o edu- cador e como constitui suas prprias impresses e convices? H espao para as pro- posies do educador no processo de formao? Quais so os limites de sua atuao? Perguntas como estas tm permeado os projetos da Ao Comunitria ao longo dos anos e respond-las constantemente muito importante para que percebamos o lu- gar que o educador ocupa no processo de aplicao da metodologia. Em cada resposta so encontradas diretrizes, princpios e orientaes, para que este sujeito atue como um agente de transformao social, facilitando o processo de reflexo e organizao do Projeto de Vida dos jovens. Ele atuar como um facilitador no desenvolvimento dos educandos, mobilizando vontades e proposies em um processo permanente de infor- mao-reflexo-ao. Nesse contexto, o jovem deve ser sempre instigado a perceber sua responsabilidade nos resultados desejados e levado a descobertas que potencializem sua capacidade de olhar para si e para o mundo. Dessa forma, ter elementos para pautar suas aes e escolhas. A via a ser percorrida durante esse processo sempre de mo dupla, onde educador e educando aprendem juntos, em movimentos constantes de troca, consenso, dissenso e leitura de mundo: a todo instante os dois so sujeitos e objetos, ensinam e so ensinados, construindo e modificando seus Projetos de Vida. 42. 44 Nesse contexto, as metodologias desenvolvidas pela Ao Comunitria se constituem em grandes aliadas para que educador organize sua prtica, crie condies efetivas de aprendizagem para os educandos e tenha clareza de sua funo social, inspirando os jovens para que tomem conscincia de sua capacidade de produzir, criar e intervir no mundo. Educador, mos obra! 43. 45 Parte II Oficina: Uma concepo poltico-pedaggica Oficina um jeito de aprender e ensinar baseado no princpio do aprender fazendo, valorizando os saberes das crianas, adolescentes e jovens e o trabalho coletivo 3 Depois da apresentao dos quatro mtodos que so utilizados como suporte para a construo do Projeto de Vida, cabe oferecer um exemplo de Oficina para cada mtodo proposto. As oficinas foram pensadas a partir de fundamentos que valorizam o saber do jovem e viabilizam sua participao num contexto de troca e reflexo. Cabe mencionar que a oficina uma estratgia utilizada pela Ao Comunitria na consecuo de seus projetos, um jeito de fazer presente na sua concepo do que ser jovem: (...) um ser histrico, um ser afetivo, um ser inteligente e criador de cul- tura como o adulto, artfice de seu prprio desenvolvimento e saber. (Elias e Sanches, 2007:163). A Ao Comunitria no concebe a juventude como uma etapa de preparao e de espera para a fase adulta. Ao contrrio, reconhece as potencialidades produtivas, criativas e participativas dessa fase da vida. Tambm compreende que o jovem se en- contra em pleno desenvolvimento fsico, afetivo, cognitivo e social. Nessa perspectiva, as oficinas propostas pelos projetos da Ao Comunitria procuram oferecer situaes de aprendizagem significativas e indicadores de resultados, visando o desenvolvimento integral dos educandos. Quanto a indicadores de resultado, a instituio dispe do Sistema de Avaliao de Mudanas e Impactos Sociais (SAMIS). Ele foi criado para que os educadores pu- dessem contar com uma ferramenta que avaliasse o educando durante o processo de aprendizagem. Alm disso, sua lgica permite que os indicadores sejam desdobrados em pistas, ou seja, atitudes concretas, que contribuem para que sejam identificadas mudanas no educando, permitindo, assim, uma avaliao com maior clareza e menos parcialidade. 3 CENPEC. Oficinas + Participao = Educao Integral/oficinas . Disponvel em http://www.educacaoeparticipacao.org.br/index.php/ oficinas. Consulta realizada em 26/05/2013 s 10:35. 44. 46 Para que a Oficina se enquadre na concepo mencionada, preciso que alguns elementos sejam observados: Intencionalidade preciso vislumbrar o objetivo da oficina, ou seja, aonde se quer chegar. Esse objetivo deve estar em consonncia com o planejamento da proposta formativa. necessrio ter clareza em relao s aprendizagens que se deseja ver apro- priadas pelos jovens. Acolhimento a criao de um ambiente favorvel fruio de aprendizagens, onde o educador mobiliza as vontades e capacidades dos jovens e facilita o processo de discusso e reflexo. Podem ser utilizadas msicas, poesias, e dinmicas relacionadas ao tema do encontro. Convite ao preciso compartilhar com os educandos o objetivo da atividade, dando sentido proposta, para que haja envolvimento deles com a atividade. funda- mental partir dos saberes, ideias e hipteses dos jovens sobre os contedos da oficina, para depois promover a ampliao do repertrio cultural e de informao em relao ao tema. Passo a passo O educador precisa construir um roteiro de desenvolvimento para a ativi- dade,considerandotempo,espao,recursosnecessrios,nmerodepessoas.Spossvelim- provisarquandosetemumbomplanejamentodaatividade.Nessaetapa,elecompartilhaseus saberes com os educandos, buscando a ampliao dos conhecimentos e saberes dos jovens. Avaliao Compartilhada Esta etapa retoma o percurso total da oficina e permi- te que os jovens percebam suas aprendizagens, sejam crticos e reflexivos com relao aos conceitos, valores, certezas e dvidas expressas no decorrer do encontro. Tambm o momento do educador avaliar sua prtica e verificar o alcance do objetivo da oficina. Indicadores de Resultado A prtica do educador precisa estar pautada em crit- rios prvios. Para isso, a construo de indicadores de resultado alinhados a atitudes concretas dos educandos fundamental para a avaliao do trabalho desenvolvido. Tais ferramentas contribuem para que a subjetividade do ato de avaliar seja submetida a alguns parmetros que orientam o olhar do educador. Sistematizao Essa uma tarefa ps-oficina. Por meio da sistematizao, as aes formativas so objeto de sntese e reflexo. A produo deste conhecimento deve ser registrada e pode ser utilizada no planejamento de futuras oficinas. Os elementos apresentados so fundamentais no processo de desenvolvimento de uma Oficina. Portanto, o educador precisa consider-los em seu planejamento, garan- tindo o tempo e espao necessrios para que sejam colocados em prtica. Seguem as Oficinas para os quatro mtodos propostos: 45. 47 Oficinas experimentais Oficina 1: Imaginao Sociolgica Nome da Oficina: Nem pior, nem melhor: apenas diferentes Intencionalidade: O propsito da atividade permitir que os jovens percebam que existem entre eles semelhanas e diferenas que os tornam nicos. E dentro dessa diversidade que surgem desafios, como a necessidade de levar adiante princpios gerais de tolerncia. Compreender mltiplas realidades oferece uma viso mais ampla sobre o ambiente em que se vive. Entender tais diversidades em perspectiva histrica vai auxiliar na construo de um olhar mltiplo sobre nosso espao. Objetivo: Permitir que o jovem se perceba em meio diversidade, encarando-a como algo natural e capaz de faz-lo entender o mundo em que vive. Passo a Passo: Q Numa dinmica inicial, os jovens podem ser separados por um nmero de variveis que os levem ao isolamento pleno. No parece ser necessrio pensar em mais de seis ou sete itens, mas os educadores devem inserir a quantidade suficiente para separar plena- mente a turma. A sala, ou espao ao ar livre, deve ser amplo para que eles percebam o isolamento. QNuma turma de 40 jovens, por exemplo, pode-se dividi-los em: I Masculino e Feminino; I Dentro de cada gnero, sem que eles deixem de manter a primeira separao, pode-se dividi-los por estado civil dos pais: casados (vivem juntos) e separados (ou no vivem juntos). importante manter os critrios sempre com DUAS possibili- dades. Aps esse segundo critrio, sero quatro grupos: meninos de pais separados, meninos de pais casados e meninas nas duas condies; I A terceira varivel pode ser sobre a religio. Separe os catlicos e no catlicos lembrando que essa religio foi escolhida porque estatisticamente dois teros da populao brasileira so catlicos, mas isso no quer dizer que no se respeite ou no se valorize as outras religies; I Na quarta varivel, no caso de So Paulo, pode-se separar corintianos de no co- rintianos. No Rio de Janeiro, flamenguistas de no flamenguistas. E assim sucessi- vamente, de acordo com o time de maior torcida no estado onde a atividade estiver ocorrendo. Aqui um bom momento para descontrair um pouco; 46. 48 I Na quinta alternativa, a separao pode ser por etnia. Esta mais uma varivel delicada, e os educadores devem apresentar os conceitos de etnia e de miscigenao aos jovens, estimulando-os a respeitar as diversidades; I Na sexta tentativa, pode-se separar os educandos que tm dois ou mais irmos daqueles que tm um ou nenhum; I A partir da stima opo, se os jovens no estiverem totalmente sozinhos o educador pode introduzir nova diviso, sempre tomando muito cuidado com a forma como fala das variveis, para evitar comentrios que possam ser revertidos em sentimentos negativos. QSer possvel pensar que teremos dois homens, de pais separados, catlicos, no brancos, corintianos, com mais de dois irmos cada um? Pouco provvel, mas o exerc- cio permite que variveis sejam introduzidas at que se chegue a seres nicos. As carac- tersticas devem ser anotadas e escritas em letra de forma legvel e grande num papel apresentado pelos participantes (esse papel entregue antes do comeo da atividade e os alunos devem escrever a caracterstica escolhida a cada varivel apresentada). QAgora que se separaram, hora de pedir que circulem e encontrem algum idntico (a) na sala. Algum com todas as caractersticas iguais. Muito provavelmente, no encontraro. QO desafio seguinte consiste em pedir que cada jovem encontre algum melhor que ele: de olho nas caractersticas, d a mo para algum que voc tem a certeza que melhor que voc. Pouco provvel que tal unio ocorra, mas o educador pode separar eventuais junes com discursos estimulantes. QEm seguida, pode-se pedir que escolham uma caracterstica legal e se unam a pessoas diferentes. No importa a caracterstica escolhida, o intuito mostrar que eles tm liberdade para se aproximar de quem gostam ou desejam. QNo final, estaro todos entrelaados, e da a concluso: nem melhores nem piores, apenas diferentes. QA partir de ento, os jovens devem buscar estatsticas que dimensionem suas carac- tersticas. Qual o percentual de distribuio na sociedade, das religies, das preferncias futebolsticas, dos gneros, das etnias? Ser possvel notar que ningum est sozinho em suas escolhas e caractersticas. Esse o incio possvel para o uso de algo que deseja ofertar percepo de vida em sociedade, com diversidade e tolerncia. 47. 49 QA pesquisa pode ser estimulada com dados do IBGE. Uma boa soluo distribuir aos jovens tabelas com as variveis que foram trabalhadas. Formando duplas ou trios, podem olhar juntos as tabelas. Eles vo desvendar o mundo que os cerca. QSe nessas tabelas, existirem dados em perspectiva histrica, MELHOR, pois eles sero capazes de notar tendncias, como por exemplo: aumento no nmero de negros no Brasil, aumento no nmero de evanglicos, predominncia discreta das mulheres em relao aos homens, aumento do nmero de famlias chefiadas por mulheres, etc. Nem todas as variveis utilizadas precisam estar nas tabelas. A partir de uma reflexo sobre os dados, as duplas / trios podem ser estimuladas a fazer apresentaes rpidas sobre o que lhes chamou mais a ateno. QOuvidas as anlises, importante que criem, estabeleam e apresentem hipteses para entender por que OCORREU aquilo que lhes chamou a ateno, ou seja, quais foram as causas dos fatos analisados pelos jovens. No final, vale a pena dizer que a verificao dessas hipteses, respondidas com o uso de mtodos cientficos, o que chamamos de cincia nesse caso social, porque busca desvendar um fenmeno per- cebido em nossa sociedade! Avaliao Compartilhada (dicas): A GRANDE questo lembrar que toda a ati- vidade baseada em perguntas. A todo momento, os jovens devem ser estimulados a entender, primeiro, que so nicos e capazes de viver em harmonia, dentro dos limites da tolerncia. E na segunda etapa, de pesquisa e observao de dados, eles devem ser instigados a formular hipteses. importante estimular debates, perguntar o que acham da reflexo alheia. Isso essencial. Indicadores de Resultado: Indicador 1: H tolerncia no grupo lOs jovens fizeram a associao entre escolhas e caractersticas nicas de uma pessoa; lRespeitaram e valorizavam as caractersticas de seus colegas de turma; lPerceberam-se como sujeitos essenciais da sociedade (parte do todo). Indicador 2: Tem imagem positiva de si lDemonstram segurana ao manifestar suas ideias e opinies; lDescrevem-se de forma positiva, demonstrando autoestima fortalecida; lInvestem em seu autodesenvolvimento. 48. 50 Indicador 3: Fez uso da imaginao sociolgica, aps as anlises e pesquisas realizadas lContextualizam as prprias caractersticas e as dos colegas, demonstrando perspectiva; lDemonstram curiosidade, fazendo perguntas sobre os fatos pesquisados; lTiveram insights acerca das diversidades presentes na sociedade. Sugestes para aprofundamento do tema: Filmes: Manderlay - Lars Von Trier Quase dois irmos - Lucia Murat O Baile - Ettore Scola Narradores de Jav - Eliane Caff Sites: www.ibge.gov.br www.seade.gov.br www.ipea.gov.br www.pnud.org.br 49. 51 Oficina 2: Cartografia Nome da Oficina: Expedio Cartogrfica Intencionalidade: Depois de desenvolver e compartilhar com os jovens algumas aprendizagens referentes metodologia da Imaginao Sociolgica, fundamentais para que eles possam ser protagonistas de suas histrias e refletir sobre seus projetos individuais e cole- tivos, esta oficina visa adensar e ampliar o universo de atuao destes educandos. A proposta agora de um trabalho de natureza cartogrfica, que pretende proporcionar-lhes um conhe- cimento mais aprofundado da comunidade em que vivem, exercendo assim o protago- nismo juvenil e influenciando, por meio de suas aes, a vida de toda a coletividade. Objetivo: Dar subsdios para que os jovens reflitam e discutam sobre aspectos das seguintes questes: I A relao entre comunidade e escola; I O trabalho realizado pelas entidades e associaes da comunidade; I Os espaos possveis para uma convivncia prazerosa, saudvel e de aprendizagens; I O reconhecimento e o mapeamento da paisagem social e ambiental da comunidade. Passo a Passo: QAquecimento (entrevistas no grupo) - Cada jovem escreve em uma folha de papel sua msica preferida, a comida que mais gosta, o melhor filme que j viu, a atividade de lazer preferida. Depois disso, o papel fixado no peito e eles andam pela sala observando as preferncias dos outros jovens. O educador sugere a formao de duplas, considerando a proximidade das preferncias. Cada jovem entrevista o parceiro, anotando todas as informaes em um papel, de modo a conhecer outras preferncias, escolhas, posicionamentos, crenas e caractersticas do entrevistado. importante que colham o maior nmero possvel de informaes sobre o outro e que registrem o contedo das entrevistas. Depois disso, cada um apresenta seu entrevistado para o grupo e, em seguida, verifica se suas hipteses se confirmaram, ou seja, se aquilo que imaginou do outro foi de alguma maneira confirmado por ele; QExpedio Cartogrfica - A proposta para essa atividade a realizao de uma incurso de carter investigativo, na comunidade. Os jovens podem fotografar, filmar, entrevistar outros jovens e lideranas comunitrias, conversar com moradores antigos e profes- sores das escolas, visitar espaos culturais, conhecer grupos artsticos, alm de ouvir os trabalhadores das organizaes e instituies locais. Eles devem sair em duplas ou 50. 52 trios, o que ser previamente definido no coletivo, considerando tambm suas habi- lidades individuais (os mais falantes, os mais observadores, os mais criativos, os mais metdicos, os que tm facilidade para escrever), para garantir diferentes olhares e per- cepes no processo de investigao. Lembrando sempre que essas habilidades no so inatas, que podem e devem ser aprendidas e aperfeioadas na relao entre educador e educando. Esse processo fornecer ao educador e aos jovens um material precioso para o fomento de futuras investigaes e anlises. A ideia que, depois da expedio car- togrfica, eles possam se apropriar melhor do universo da comunidade, reconhecendo a diversidade com que os espaos locais so ocupados e geridos, alm de refletir sobre suas prticas, alterando as maneiras de veem, sentem, pensam e percebem o entorno. QProposta de roteiro para conversa com pessoas da comunidade - sempre bom promo- ver um encontro com os jovens para dirimir as dvidas que possam surgir a propsito dos conceitos, ideias e palavras existentes na sugesto de roteiro para conversa. As conversas com os diferentes atores da comunidade podem ser gravadas para facilitar uma discusso e a sistematizao posteriores. Um ensaio deixar os jovens mais segu- ros. Seguem algumas sugestes de perguntas para as entrevistas: Entrevistas com Outros jovens da comunidade - Quais as trs principais coisas que gostaria que existissem no bairro? / Quais as opes de estudo, lazer e cultura do bair- ro? / O que voc gosta de fazer nas horas de lazer? / Qual a sua opinio sobre a sua es- cola? E o que voc gostaria que a escola oferecesse? Por qu? / Voc conhece o trabalho de alguma instituio local? / Voc participa de algum grupo de jovens? Qual? / Como sua comunidade aparece no jornal, no rdio, na televiso? O que voc acha do que dito sobre ela? / Quais as trs piores coisas que acontecem no bairro? Entrevistas com Moradores Antigos - Voc sabe de onde vem o nome da regio onde mora? / Fale sobre as pessoas e famlias que, na sua opinio, ajudaram a construir essa comunidade/ Conte um pouco da histria da comunidade e de como foram chegando a luz eltrica, o transporte coletivo, as primeiras fbricas, o comrcio, as primeiras escolas, o posto de sade, a Igreja, etc. / Quais as primeiras festas que aconteceram na sua comunidade? Como elas surgiram? / Qual o acontecimento mais importante da sua comunidade? Voc participou dele? / Qual era o lugar mais bonito da comunidade quando voc era jovem? / Se voc pudesse mudar algum fato histrico da sua regio, o que mudaria? / H algum outro fato ou histria que voc gostaria de relatar? / Fale das coisas boas e dos problemas que essa histria deixou. 51. 53 Os jovens podem reunir dois ou trs moradores e realizar uma entrevista coletiva que pode ser gravada e posteriormente editada. Dessa maneira, a conversa pode ser mais produtiva, com um formato de bate papo. Entrevistas com Trabalhadores das organizaes e instituies locais - H quantos anos a instituio se instalou na comunidade? / Quais os objetivos da instituio e qual a faixa etria do pblico atendido? / Que critrios existem para o atendimento? E como feita a divulgao? / Como voc classificaria a populao local: participativa, solid- ria, desinteressada, desmobilizada? / Qual o principal problema da regio? / A insti- tuio participa de algum frum, associao, conselho, movimento reivindicatrio? / A instituio realiza trabalho em parceria? E o que determina a escolha de parceiros? Entrevistas com Professores das escolas -Qualsuaopiniosobreaescolaesobreosjovens queafrequentam?/Oquemaisdificultaotrabalhodaescola?/Doseupontodevista,oque h de bom e o que falta na escola? / Quem pode ajudar a resolver os problemas da escola e do bairro? / Existe Grmio ou outra forma de organizao dos alunos? Como fun- ciona? / Que outras atividades podem ser desenvolvidas na escola, alm das aulas pro- priamente ditas? / Voc participa de algum grupo da comunidade: associao de mora- dores, movimento reivindicatrio, conselhos/fruns, partido poltico, grupo religioso? QOrientaes para o desenvolvimento da entrevista: I Lembrar que a entrevista uma conversa aberta, mas orientada por um objetivo. Existe uma agenda oculta que direciona o rumo da conversa por meio das per- guntas em cada questo. As respostas sero assinaladas s pelo jovem pesquisador; I preciso evitar a contaminao das respostas: fixar a ateno no entrevistado principal, lembrando sempre que o ponto de vista do entrevistado que interessa. No caso de a conversa ser com um casal, focalizar em um dos dois e perguntar sempre para a mesma pessoa; I Tomar cuidado para no emitir juzos de valor durante a entrevista, evitando exercer qualquer influncia sobre as respostas dadas. Os valores e opinies do en- trevistado que interessam; I Criar um clima de cordialidade e simpatia. Conduzir a entrevista calmamente. Insistir sem forar as respostas; I O entrevistador precisa suportar os silncios. No deve induzir respostas. Diante de respostas vagas ou no sei, tentar ajudar o entrevistado. Pode ser que o entrevista- do nunca tenha pensado antes nessa questo e precise de uma ajuda para organizar o pensamento e dar uma opinio; 52. 54 I Estar atento s fantasias e temores do entrevistado: ele pode imaginar que o en- trevistador mantm vnculos com alguma instituio ou pessoa que poderia preju- dic-lo; ou que suas queixas vo resolver seus problemas (porque o entrevistador representante do governo); situaes deste tipo pedem que o entrevistador retome a finalidade do trabalho, dando os esclarecimentos necessrios; I Reforar sempre a importncia da opinio do entrevistado. Avaliao Compartilhada (dicas): O processo deve desafiar os jovens a elaborar e exe- cutar novas ideias, alm de propor - com a participao deles - aes de reflexo e de interveno sobre seus projetos de vida. Indicadores de Resultado: Indicador 1: Percebem questes de ordem coletiva lRelatam situaes que envolvem o bem comum; lRelacionam questes individuais com o contexto coletivo; lIdentificam ativos da comunidade. Indicador 2: Apresentam viso crtica em relao ao contexto da comunidade lDemonstram incmodo em relao s situaes que prejudicam o bem comum; lEstabelecem vnculos entre situaes da comunidade, produes da mdia e a histria; lReveem suas atitudes e posturas com relao comunidade. Indicador 3: Propem aes de interveno para a melhoria da comunidade lPercebem-se como sujeitos fundamentais para a mudana da comunidade; lPlanejam aes de interveno na comunidade; lExecutam aes de interveno na comunidade. Sugestes para aprofundamento do tema: Texto: Nossa Escola Pesquisa Sua Opinio, In: Instituto Paulo Montenegro, So Paulo: Editora Global, 2002. Vdeo: Atitude na Cena(2003, Direo Joinha Filmes). durao 17 Alm da Lousa, Culturas Juvenis, Presente (2000, Direo Grupo Educao Ritmo Rua, durao 14 Site: Observatrio Jovem do Rio de Janeiro -http://www.uff.br/observatoriojovem/ 53. 55 Oficina 3: Educomunicao Nome da Oficina: Jovens Comunicadores Intencionalidade: Como trazer para o mundo real dos adolescentes e jovens conceitos muitas vezes abstratos demais? Como aproximar, no ambiente educativo, intenes e prticas de uma forma que seja prazerosa para educadores e adolescentes? Esse o seu grande desafio, educador. Por meio de uma srie de exerccios prticos, possvel conceituar de modo ldico e eficaz a educomunicao como prtica da cidadania. Pode-se fazer isso respondendo a trs perguntas: O que educomunicao? Como nos reconhecemos educomunica- dores? Como a educomunicao reconhecida na prtica da cidadania? No se trata aqui de trazer dezenas de conceitos para tentar entender algo que existe justamente na prtica cotidiana. preciso convidar os jovens para uma jornada de experimentao diferente, na qual o jovem vai, em primeiro lugar fazer, experimen- tar, vivenciar, para s ento, coletiva e colaborativamente, conceituar, buscar refern- cias, at que finalmente o grupo entenda sobre o que estamos falando. Objetivo: Essa sugesto de atividade tem o objetivo de convidar os jovens a se expe- rimentarem no cotidiano como comunicadores, gerando um processo de reflexo coletiva sobre o papel de destaque que temos na construo de um entendimento de mundo. So tambm objetivos dessa atividade: I Ampliar o entendimento do que so recursos comunicativos locais; I Provocar uma autorreflexo sobre nosso papel na construo do conhecimento; I Estimular outras formas de aprendizagem, incluindo a si mesmo e sua prpria histria, como recursos pedaggicos; I Alinhar conceitualmente educomunicao entre os participantes; I Ampliar a viso sobre as Tecnologias de Informao e Comunicao TICs em nosso cotidiano. Passo a passo: A atividade est dividida em trs momentos interconectados. Sugere-se que seja feita em trs dias diferentes, para que oferea aos participantes uma chance de reflexo sobre cada um dos passos. 54. 56 QMeu eu Comunicador Nessa primeira etapa, os jovens so convidados a explorar tudo que carregam consigo como recurso comunicativo. Partindo do prprio corpo, dos sons que ele emite, at a mochila, os cadernos, o aparelho celular, tudo deve ser considerado como recurso que ajudar a contar uma histria. Em roda, o educador deve iniciar explican- do o quanto somos sonoros e dotados de recursos que nos ajudam a contar histrias e a estabelecer dilogos. Como exemplo, vale a pena citar que muitas pessoas s con- seguem contar o que viram, o que gostaram, emitindo sons que se relacionem com o fato ocorrido. Se elas esto contando que um carro bateu, fatalmente faro um som de impacto ao simular a coliso com as mos. Com esse exerccio, o que se pretende oferecer aos jovens a possibilidade de se olharem, se investigarem, explorarem seus corpos e os objetos que carregam, para que tenham elementos que ajudem a contar histrias. Assim, quanto mais sons eles forem estimulados a tirar do corpo e do que carregam, mais rico ser o produto final. Depois que j exploraram o que carregam, o educador pedir que se renam em trios ou quartetos e compartilhem o que descobriram de sons e outros elementos em suas experincias pessoais. Feito isso, vem o convite mais desafiador: criar um produto de comunicao de rdio com esses recursos sonoros que acabaram de descobrir. Ainda em grupo, eles de- vem pensar numa histria impactante que tenham visto nas ltimas duas semanas com algum muito prximo. Em seguida, precisam escrever a histria num papel (roteiro), respeitando o tempo e os fatos acontecidos. Logo aps, o grupo precisa definir, entre os participantes, papis personagens que ajudem a ilustrar a histria escolhida. Depois disso, voltam ao roteiro, escrevendo as falas em uma folha de papel, os sons que devem ser emitidos e em qual tempo, alm dos efeitos sonoros que iro executar. Importante: eles apenas podem usar os recursos encontrados no prprio corpo e nos materiais que carregam sempre consigo. No podem utilizar objetos de outros lugares. Sugere-se que montem uma radionovela, ou um spot, sempre de curta dura- o, mas que tenha: abertura, apresentao, sonoplastia e efeitos, ao menos duas vozes diferentes no enredo, com comeo, meio, fim e ficha tcnica no fim da produo. O tempo desse produto comunicativo dever ser fixado pelo prprio educador, a partir da observao do ritmo e da produtividade da turma. 55. 57 Ao terminar as produes, todos voltam roda original e, juntos, apresentam seus programas de rdio. Toda a gravao dever ser feita, nica e exclusivamente, com apa- relhos celulares dos prprios jovens, independentemente da qualidade que o som possua. Q Quais recursos comunicativos existem em minha organizao? No segundo dia, o exerccio segue exatamente da mesma forma, porm agora os jovens podem ampliar o seu olhar e observar a sua organizao como um espao comunicativo. Para isso, eles devem ser convidados a andar pela organizao de modo a observar todo e qualquer espao que acreditem possibilitar algum tipo de comuni- cao (exemplo: em frente ao vaso sanitrio masculino, sobre a descarga, pois todos os homens olham, inevitavelmente, para l). A ttulo de exemplo, qualquer espao que fique prximo do local do almoo, pois um dos poucos momentos em que h mais pessoas concentradas em um mesmo espao. Em seguida, os jovens sero convidados a voltar sala e colocar no papel, car- tolina ou flipchart, todos os espaos comunicativos que localizaram como potencial desperdiado. importante que educador faa uma reflexo sobre os pontos levan- tados, de modo a gerar uma discusso e uma reflexo sobre os possveis potenciais comunicativos dos locais escolhidos. Em seguida, os jovens se organizaro em trs grupos e escolhero trs espaos onde podero criar algum tipo de comunicao relacionada. Por exemplo, uma cam- panha de conscientizao sobre o uso da descarga no banheiro masculino. Importante dizer que esses produtos comunicativos precisam ser inovadores, divertidos e levar alguma mensagem especfica para a organizao. Uma sugesto: o educador pode registrar fotograficamente os trabalhos dos trs grupos e exibi-los ao realizar a avaliao do dia. A avaliao ser feita em cima de trs perguntas: Por que esse lugar tem um potencial comunicativo? Nossa mensagem foi efetiva, gerou algum impacto? Quais recursos utilizamos para fazer tudo acontecer? Aqui, vale analisar e refletir o quanto de comunicao deixamos de produzir por achar que precisaramos de recursos carssimos, equipamentos, etc. QComunicao em Movimento No terceiro dia de atividade, o educador pode comear recapitulando os prin- cipais aprendizados das duas primeiras etapas, por meio de uma apresentao ou das anotaes de um mapa mental que todos possam ver. 56. 58 Reunidos em roda, com folhas de flipchart, canetinhas, giz de cera, os jovens anotam todos os recursos que usaram nas primeiras etapas, sejam fsicos ou no. Com isso ser feito um painel gigantesco que eles devero observar. Em seguida, o educador deve convidar a turma a pensar, coletiva e colaborativamente, um produto de comu- nicao que gere algum tipo de movimento dentro da organizao. So os jovens que, aps pesquisar e dialogar entre eles, decidem o que deve ser. A ttulo de exemplo, se os jovens avaliarem que necessria uma ao comunica- tiva em favor de abraos grtis dentro da organizao, eles devem buscar na internet referncias sobre quem j a fez, como fez, e discutir quais so os desafios de reproduzir aquela ao numa escala menor. Feito isso, passam a se organizar para criar essa ComunicAO no mundo. o momento de enumerar os recursos necessrios, definir papis, etc. importante aqui ressaltar que o educador apenas um facilitador do processo, sendo essencial que ape- nas d suporte e no influencie na escolha da ao pelo grupo. Independente da ao escolhida, o grupo dever registrar em udio e vdeo o que ser feito. No momento da avaliao, esse registro deve ser projetado para que todos tenham conscincia do caminho rumo construo dessa ao conjunta. Avaliao Compartilhada: ser feita ao fim de cada dia de atividade, a fim de colher as impresses mais recentes. Em roda, a turma receber do educador um papel e uma canetinha e cada um dever registrar algo que o tenha impressionado durante aquele dia. Vale toda e qualquer coisa, desde que relacionada a um conhecimento que ele no tinha, a algo dentro do prprio processo de criao da atividade. Esses papis sero colados em uma parede, onde todos possam ver, e o educador far a leitura de cada um deles, de modo que o jovem que se sentir convidado possa detalhar o que escreveu, compartilhando com o grupo. Indicadores de Resultado: Indicador 1: Tem poder de observao do espao ao redor de si lO jovem conseguiu identificar elementos significativos do ponto de vista comuni- cativo e que esto no ambiente no qual ele se encontra; lRegistrou no papel o que observou, descrevendo detalhes; lFoi criativo ao identificar o recurso comunicativo e express-lo. 57. 59 Indicador 2: Tem entendimento do tema da atividade lAo final do dia, conseguiu transformar a sua observao em um produto palpvel para ser apresentado; lConsegue emitir a sua opinio durante as construes coletivas dos produtos comunicativos; lMostrou-se participativo e curioso durante as trs fases da atividade. Indicador 3: Consegue relacionar a conversa micro com o tema macro lApresenta cases que tenham relao com o que o educador est explicando; lEmbasa suas opinies com o que foi dito durante a atividade; lApresenta argumentos nos grupos de trabalho. Sugestes para aprofundamento do tema: Filmes: Uma Onda no Ar, direo de Helvcio Ratton, 2002, Brasil. Classificao 17 anos. Saneamento Bsico o Filme, direo Jorge Furtado, 2007, Brasil, Classificao 16 anos. Educomunicao O Nascimento, Direo: Marta Russo e Michele Marques Pereira, 2013. 58. 60 Oficina 4: Orientao Profissional Nome da Oficina: A rvore da Vida Intencionalidade: A figura da rvore uma representao arquetpica bastante fundamental e presente no inconsciente coletivo. Em muitas referncias, representa a ligao do mundo interno com o mundo externo e o crescimento. Permite explo- rar assuntos como identidade, autopercepo, autoconfiana, protagonismo, valores, competncias (Conhecimentos, Habilidades e Atitudes - CHA) e os resultados obti- dos e esperados pelo jovem em relao a seu projeto de vida. Temas como noo de causa-consequncia, responsabilizao, resilincia e perseverana para alcanar resul- tados tambm podem estar presentes. O objetivo principal desta atividade instigar o jovem a refletir sobre os temas citados como foco em seu processo de escolha e na sua relao com o meio, tendo sempre como eixo central o projeto de vida e a identidade. A rvore da vida demonstra a relao que o jovem tem com o meio e liga seu passado com o presente e o futuro. Ela um poderoso instrumento de autoconhecimento, planejamento e percepo das relaes consigo mesmo e com o meio. Objetivo: Desenhar a rvore da vida como representao do projeto de vida, da identidade, das realizaes, foras, e fraquezas. Passo a passo: I Apresentar o enunciado ao educando; I Voc deve desenhar a sua rvore da vida. Nas razes, desenhar e escrever seus valor