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Numa caravana vamos…
Numa caravana vamos, aos solavancos,
Numa caravana vamos, percorrendo lugares distantes…
Há um ano partimos de Xi’ian, era o tempo quente de verão.
Puxávamos os camelos e atámos a carga que roçava o chão.
Passámos a porta da cidade e o sino da torre ouvimos.
Dissemos adeus e na rota da seda para oeste seguimos.
Numa caravana vamos, aos solavancos,
Numa caravana vamos, percorrendo lugares distantes…
Há nove meses chegámos a Lanzhou, já as folhas caíam.
O rio Amarelo atravessámos e as muralhas da cidade se descobriam.
Trocámos seda por algodão, que tinha um cheiro de louvar.
Comprámos fruta fresca e legumes para comer e levar.
Numa caravana vamos, aos solavancos,
Numa caravana vamos, percorrendo lugares distantes…
Há seis meses chegámos a Dunhuang, já o vento forte o ar arrefecia,
Em redor do oásis luxuriante, dunas por todo o lado havia.
Vendemos seda e pedras preciosas, trocámos arroz por pão,
De água enchemos os jarros para a travessia do deserto vilão.
Numa caravana vamos, aos solavancos,
Numa caravana vamos, percorrendo lugares distantes…
Há cinco meses chegámos a Hami, exaustos, doentes, abatidos.
O inverno no deserto é cruel, tal nos havia sido dito.
Aquecemo-nos com uma sopa de cabeça de anho e chá fumegante,
Descansámos uns dias antes de deixar Hami e seguir adiante.
Numa caravana vamos, aos solavancos,
Numa caravana vamos, percorrendo lugares distantes…
Há três meses chegámos a Turpan e a carícia da primavera sentimos.
Passámos vinhais e campos verdes a brotar entre vastos mimos.
Ficámos em cabanas de tijolo onde uvas penduradas secavam,
Mais tarde transformadas em passas que as caravanas amiúde compravam.
Numa caravana vamos, aos solavancos,
Numa caravana vamos, percorrendo lugares distantes…
Há uma semana chegámos a Kashgar, o fim da nossa viagem.
Era novamente verão, pois há um ano percorríamos a paisagem.
Os corpos esgotados e as patas dos camelos feridas,
A viagem da Rota da Seda ultrapassava as duas mil milhas.
Numa caravana vamos, aos solavancos,
Numa caravana vamos, percorrendo lugares distantes…
Hurra! Hoje é dia de mercado, razão da nossa jornada.
Pois o mercado de domingo em Kashgar é de fama...
Neste grande bazar, os povos, cada qual de uma terra diferente,
Falam estranhas línguas que ninguém bem compreende…
Mas todos se reuniram para vender e comprar,
Carregando as caravanas com artigos de encantar.
Venderemos toda a seda que trouxemos,
E levaremos para Xi’an as compras exóticas que fizemos.
Da Índia veio o marfim, os chás e as especiarias,
Do Médio Oriente vieram carpetes e lindas tapeçarias.
Mil cavalos da Arábia conduzidos, ovelhas e fortes carneiros,
Iaques peludos dos montes nevados cimeiros.
Mas em breve o sol se põe e o mercado fica cerrado.
As caravanas abarrotadas abandonam então o povoado.
Pelas montanhas rumo ao Ocidente algumas viajarão,
Outras a rota do Sul muito em breve perseguirão.
Numa caravana vamos, aos solavancos,
Numa caravana vamos, percorrendo lugares distantes…
Iremos, uma vez mais, sempre rumo ao Oriente.
Percorreremos de novo, até Xi’an, a Rota da Seda ardente.
♦♦♦♦
A história da seda
Tudo começou com uma jovem imperatriz chinesa, uma lagarta e um grande
segredo… Conta a história que há muito tempo estava a noiva do imperador chinês,
Hsi Ling-shi, sentada no seu jardim debaixo de uma amoreira, quando um casulo
caiu dentro da sua chávena de chá quente. Ao retirá-lo do chá, o casulo desfez-se
num longo e delicado fio de seda. E assim os chineses descobriram como fazer
seda a partir dos casulos do bicho-da-seda.
Centenas de pequenas lagartas nasciam dos ovos do bicho-da-seda. Durante
seis semanas alimentavam-se dia e noite das folhas da amoreira, até estarem
suficientemente grandes para tecer os casulos. Recolhiam-se estes depois, e usava-
se vapor ou ar quente para os tornar macios. Desfiando vários casulos de uma só
vez, entrelaçavam-se os fios finos como cabelos até se formar o fio de seda. O fio
era então tecido no tear e tingido em ricos coloridos, numa lindíssima paleta de
cores.
O tecido final era forte, gracioso e admirável. Com ele fazia-se bandeiras e
estandartes para o exército chinês. A seda fascinava as pessoas de terras
longínquas, que ansiavam por produzi-la. Os chineses, todavia, eram demasiado
astutos para partilhar o segredo. A preparação da seda foi assim cuidadosamente
preservada e durante muito tempo ninguém sabia como era feita.
Atualmente, muitos países, além da China, produzem seda, e muito do
trabalho deixou de ser manual. Mas a história começou há muito tempo com uma
jovem imperatriz, uma lagarta e um grande segredo…
A história da rota da seda
A rota das caravanas, conhecida como a “Rota da Seda”, tem milhares de
anos. Alguns historiadores pensam que este longo percurso constituiu a primeira
rota comercial estabelecida entre os povos da Europa e do Oriente.
Os europeus adoravam a seda chinesa e queriam muito comprá-la. Por isso,
caravanas carregadas de tecido viajavam para Ocidente através de reinos
montanhosos e aldeias desertas…. Mas as caravanas não transportavam apenas
seda. Os chineses também transportavam peles, especiarias, metais, jade,
cerâmica e artigos envernizados. No seu percurso paravam nos oásis e postos
comerciais para vender as mercadorias, negociar artigos novos e comprar água e
provisões. Ao mesmo tempo, as caravanas que viajavam para Oriente, vindas da
Europa, traziam pedras preciosas, ouro, prata, marfim, tapeçarias e perfumes.
Poucas caravanas faziam o trajeto completo pela Rota da Seda, pois esta era
demasiado longa. As caravanas costumavam parar para descansar, e em seguida, a
viagem era retomada por novos condutores e outros animais bem menos cansados.
E assim, muitas vezes, ou as pessoas regressavam a suas casas ou ficavam na
nova aldeia e constituíam família. Desta forma, diferentes grupos de pessoas
fixaram-se ao longo da Rota da Seda. Trouxeram com eles novas religiões e artes,
novas línguas e invenções e novas ideias.
A Rota da Seda chinesa é apenas uma das antigas rotas das caravanas.
Uma rota seguia, através das montanhas, para oeste, de Kashgar até
Samarkand e Ásia Central. Outra seguia para sul, até à India através de passagens
montanhosas. A Rota da Seda chegou inclusive à Europa. Atualmente, muitos dos
oásis chineses mencionados nesta história são cidades movimentadas e buliçosas
tal como devem ter sido há séculos.
Um dos mais célebres exploradores que percorreram a Rota da Seda foi Marco
Polo. Há quase oitocentos anos viajou entre a Itália e a China num périplo que
demorou vários anos. Conhecemos felizmente as suas histórias sobre as pessoas
que encontrou e as coisas que viu quando percorreu a antiga Rota da Seda.
♦♦♦♦
AO LONGO DA ROTA DA SEDA…
Xi’ an
A antiga cidade de Xi’an era o ponto de partida das caravanas em direção ao Ocidente
através da Rota da Seda. Localizada nos vales férteis dos rios Amarelo e Wei, a cidade de
Xi’an ainda preserva, dispersos entre os seus edifícios modernos, as velhas muralhas e
portões, pagodes e “torres do inferno”. Os célebres guerreiros em terracota, que se
supõe terem guardado o túmulo de um dos primeiros imperadores (221-210 a.C.), foram
descobertos em 1974, transformando esta cidade num valioso reduto de interesse
turístico e arqueológico.
Lanzhou
Lanzhou, a capital da província de Ganzu, era uma importante paragem na rota das
caravanas. A mais de 550 km a oeste de Xi’an, abrigada num vale estreito entre colinas
áridas, o clima ameno e a sua localização ao longo do rio Amarelo tornaram-na num
ponto essencial de passagem entre o Tibete, a Mongólia e outras partes da China. As
mercadorias eram embarcadas ao longo do rio em jangadas de peles de animais
insufladas e, com os carregamentos, vieram outros povos que se estabeleceram entre o
povo nativo Han.
Dunhuang
A 1100 km de Lanzou, na extremidade da Grande Muralha da China, encontra-se
Dunhuang, outro importante entreposto comercial. Condutores de caravanas do Oriente e
do Ocidente nele interrompiam a viagem, para aprovisionamento, e davam graças pela
travessia segura num país cheio de perigos. As grutas de Mogao, que abrigam um
tesouro de manuscritos budistas, muitos murais e esculturas, refletem a gratidão dos
viajantes assim como a esperança na continuação de uma boa viagem.
Hami
Hami, que se encontra abaixo do nível do mar e a 370km de Dunhuang, era a principal
paragem da Rota da Seda. A sua população mista inclui alguns grupos minoritários, tais
como os Hui, os Kazakhs, os Mongóis e os Uigurs, além dos nativos Han. Hami é famosa
pelos seus melões doces, de longe o produto mais comercializado pelas caravanas. O
oásis faz fronteira com o deserto Taklamakan, cujo nome significa “entrar e nunca sair”,
pois constituía um grande obstáculo no caminho das caravanas.
Turpan
370 km depois de Hami ficava o oásis de Turpan, outra importante paragem das
caravanas. Tal como Hami, Turpan encontra-se abaixo do nível do mar, é afetado pelas
mudanças bruscas de temperatura e sofre a influência do deserto Taklamakan. Todavia,
um sistema de irrigação subterrâneo, alimentado pelos rios das montanhas Flaming, rega
vinhais e campos luxuriantes. Durante séculos, as passas brancas, a mais famosa
produção da região, secaram em edifícios sem telhado, feitos de tijolos de lama, e foram
vendidas em muitos mercados.
Kashgar
A cidade lendária de Kashgar era o último oásis da Rota da Seda da China, a cerca de
1400 km de Turpan e próximo da fronteira ocidental do país. Aqui, no sopé das
montanhas Pamir, na confluência das rotas das caravanas do Norte e do Sul, os viajantes
extenuados encontravam repouso e provisões frescas. O mercado de domingo de
Kashgar, que ainda se realiza, continua a ser propício a um cruzamento e combinação de
culturas e línguas, religiões e tradições, refletindo as diversas facetas da China de
sempre.
Laurie KrebsWe’re riding on a caravan
Bath, Barefoot Books, 2005(Tradução e adaptação)