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FACULDADE ESTÁCIO DE SÁ SANTA CATARINA RICARDO DE MATTOS JAHN O BOBO DAS TREVAS E O CAVALEIRO DA CORTE: ANALISANDO O CAVALEIRO DAS TREVAS SÃO JOSÉ, 2009.

O BOBO DAS TREVAS E O CAVALEIRO DA CORTE: ANALISANDO O CAVALEIRO DAS TREVAS - TCC de Ricardo Jahn

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O BOBO DAS TREVAS E O CAVALEIRO DA CORTE: ANALISANDO O CAVALEIRO DAS TREVAS - TCC do aluno Ricardo Jahn para o curso de Publicidade do Centro Universitário Estácio SC

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FACULDADE ESTÁCIO DE SÁ SANTA CATARINA

RICARDO DE MATTOS JAHN

O BOBO DAS TREVAS E O CAVALEIRO DA CORTE: ANALISANDO O CAVALEIRO DAS TREVAS

SÃO JOSÉ, 2009.

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RICARDO DE MATTOS JAHN

O BOBO DAS TREVAS E O CAVALEIRO DA CORTE ANALISANDO O CAVALEIRO DAS TREVAS

Monografia apresentada a disciplina Projeto Experimental II, como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Comunicação social com Habilitação em Publicidade e Propaganda da Faculdade Estácio de Sá de Santa Catarina. Professores Orientadores: Conteúdo: Diego Moreau, Mestre. Metodologia: Grasiela Schmitt, Especialista.

SÃO JOSÉ, 2009.

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

J25b JAHN, Ricardo de Mattos.

O bobo das trevas e o cavaleiro da corte : analisando o cavaleiro das trevas. / Ricardo de Mattos Jahn. – São José, 2009.

80 f. ; il. ; 31 cm. Trabalho Monográfico (Graduação em Comunicação Social com Habilidade em Publicidade e Propaganda) – Faculdade

Estácio de Sá de Santa Catarina, 2009. Bibliografia: f. 79

1. História em quadrinhos. 2. Imagem e linguagem. 3. Heróis na literatura. I.Título.

CDD

741.5

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Dedico este trabalho aos meus pais, meus eternos professores.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço aos meus pais, Fernando e Maria Luiza, por me darem uma vida repleta de

carinho, amor e possibilidades.

Aos meus irmãos Gustavo e Filipe por todos os momentos de amizade e aprendizado.

A toda minha família, especialmente meu primo Antônio, por compartilhar seu

imenso conhecimento sobre quadrinhos, música e cinema.

Às família Susin e Athanázio, pelo amor, compreensão e companheirismo durante os

momentos mais importantes da minha vida até hoje.

Aos meus amigos e suas famílias, que ajudaram na construção da pessoa que sou

hoje.

Ao meu professor Fábio Messa, por todo seu carinho, dedicação e determinação em

instigar a sede de conhecimento em seus alunos.

E especialmente ao meu amigo, professor e orientador Diego Moreau, que dirigiu

cena a cena a minha passagem na Faculdade como uma aventura de aprendizado sem fim e foi

a estrela principal no começo de uma bela amizade.

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"Quando eu amo, eu devoro todo meu coração. Eu odeio, eu adoro, numa mesma oração". Chico Buarque de Hollanda

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Ilustração 1: Estereótipos dos quadrinhos ................................................................................ 17

Ilustração 2: Estereótipos dos quadrinhos ................................................................................ 18

Ilustração 3: Linhas e Iluminação ............................................................................................. 18

Ilustração 4: Yellow Kid de Richard F. Outcult ....................................................................... 19

Ilustração 5: Selo comemorativo, lançado em 1995 nos EUA, com Dick Tracy de Chester

Gould ........................................................................................................................................ 21

Ilustração 6: Capitão América dando um soco em Hitler ......................................................... 22

Ilustração 7: Surge o Cavaleiro das Trevas: Batman de Bob Kane .......................................... 24

Ilustração 8: O Homem-Aranha ............................................................................................... 27

Ilustração 9: O presidente eleito dos Estados Unidos, Barack Obama na capa da revista The

Amazing Spiderman #583. ....................................................................................................... 29

Ilustração 10: Batman e Robin entregando uma arma nova para um soldado durante a II

Guerra Mundial e Batman atirando no caminhão com zumbis e falando “Por mais que eu

odeie tirar a vida de um ser humano. Eu receio que desta vez seja necessário!” ..................... 43

Ilustração 11: A família Batman, desenhada por Bob Kane .................................................... 44

Ilustração 12: Batman dando um pontapé na cara do cordeiro obediente dos políticos norte-

americanos, Superman .............................................................................................................. 45

Ilustração 13: Gwynplaine, com o sorriso permanente, interpretado pelo ator Conrad Veidt no

filme The Man Who Laughs, de 1928. A primeira imagem do Coringa nos quadrinhos ........ 47

Ilustração 14: Robin é brutalmente assassinado por Coringa na história Batman – Morte em

Família, de 1989 ....................................................................................................................... 48

Ilustração 15: Batman e Robin trocando socos com os bandidos no filme de 1966 ................ 50

Ilustração 16: Coringa e os mafiosos ........................................................................................ 60

Ilustração 17: Coringa e Batman na prisão ............................................................................... 61

Ilustração 18: Bruce, Rachel e Harvey ..................................................................................... 63

Ilustração 19: Coringa visita Duas Caras no hospital ............................................................... 66

Ilustração 20: Coringa virando Gotham do avesso ................................................................... 67

Ilustração 21: Batman misturado com Coringa, o super-homem das Trevas ........................... 69

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SÚMARIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 10

1.1 TEMA E PROBLEMA DE PESQUISA ............................................................................ 11

1.2 OBJETIVOS ....................................................................................................................... 11

1.2.1 Objetivo geral ................................................................................................................. 11

1.2.2 Objetivos específicos ...................................................................................................... 12

1.3 JUSTIFICATIVA ............................................................................................................... 12

1.4 ESTRUTURA DO TRABALHO ....................................................................................... 13

2 REVISÃO DE LITERATURA ............................................................................................. 14

2.1 HISTÓRIAS EM QUADRINHOS ..................................................................................... 14

2.1.1 A Linguagem .................................................................................................................. 15

2.1.2 Era de Platina ................................................................................................................ 18

2.1.3 Era de Ouro .................................................................................................................... 21

2.1.4 Era de Prata ................................................................................................................... 24

2.1.5 A Era de Bronze e Era Moderna .................................................................................. 28

2.2 SUPER-HERÓIS NO CINEMA ........................................................................................ 30

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .......................................................................... 37

4 ANÁLISE DE DADOS ........................................................................................................ 42

4.1 BATMAN NOS QUADRINHOS ...................................................................................... 42

4.2 CORINGA NOS QUADRINHOS ..................................................................................... 47

4.3 CINEMA E TV ................................................................................................................... 50

4.4 O BOBO DAS TREVAS E O CAVALEIRO DA CORTE ............................................... 57

5 CONCLUSÃO ...................................................................................................................... 70

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 74

ANEXO A – Declaração de responsabilidade ...................................................................... 79

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RESUMO

Neste trabalho é realizado um estudo, por meio de pesquisas do tipo exploratória, bibliográfica, descritiva e documental, das características dos super-heróis e vilões dos quadrinhos ao longo do tempo, identificando as semelhanças mais expressivas, a influência do mundo real nas histórias e as conseqüências desta influência. A pesquisa descritiva com o método de observação das cenas do filme o Cavaleiro das Trevas auxiliam na questão principal do projeto que é traçar a distinção entre o Bem e o Mal, personificados como Batman e Coringa no filme. Esta distinção é elaborada através da utilização do método indutivo, que possibilita desenvolver uma reflexão e posicionar-se teoricamente sobre as diferenças e similaridades entre os dois personagens. Usando o filósofo Nietzsche como guia para as questões morais, este trabalho busca evidenciar a forma como estes opostos, Batman e Coringa, se atraem de uma maneira que, em essência, buscam o mesmo fim, impor a sua moral perante o outro. Palavras-chave: Quadrinhos. Super-heróis. Vilões.

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1 INTRODUÇÃO

Toda pessoa já teve ou tem alguém em quem se espelha, alguém que transmite força,

esperança ou alegria. Um herói. Um pai, uma mãe, um irmão ou o Batman. Sim, o Batman.

Através dos quadrinhos, a batalha entre super-heróis e vilões ajudou a formar conceitos e

valores na cultura do Homem. Os fracos e oprimidos, os mocinhos e mocinhas, diversos

personagens que refletem a personalidade do ser humano, sendo ela de uma pessoa calma e

alegre como o Superman ou de uma triste e sombria como o Batman.

Como afirma Vergueiro (2005), em maio de 1939, a revista “Detective Comics #27”

traz Batman na capa e começa escrever a história de um dos personagens mais ambíguos e

carismáticos dos quadrinhos. Sem super poderes e com sede de justiça o homem-morcego

reinventa o termo herói nos gibis. Em 1940, no gibi Batman #1, surge aquele que viria a ser

seu maior inimigo, o Coringa. Um palhaço, um bobo da corte que comete crimes enquanto se

diverte duelando com Batman.

A indústria dos quadrinhos foi crescendo ao longo do tempo e seus personagens

foram saindo das páginas para as televisões em seriados, desenhos, videogames e finalmente

para o cinema, sempre retratando de forma bem distinta herói e vilão, o bem e o mal. Em

diversas versões, Batman acabou recebendo um tom mais humorístico, tanto em seriados

como em desenhos e também no cinema. Os diretores Tim Burton e Joel Schumacher deram

suas versões hollywoodianas, sempre levando o filme na perspectiva do certo e errado,

representada pelas personagens. Em 2005, recomeçando a franquia no cinema, é lançado o

filme Batman Begins, com uma seriedade e um tom sombrio peculiar dos gibis antigos de

Batman, como “Asilo Arkham” (1989) e “A Piada Mortal” (1988). Sem um grande vilão, o

filme é mais concentrado na formação do alter-ego de Bruce Wayne. Três anos depois, chega

às telonas a continuação, Batman – O Cavaleiro das Trevas. Se no primeiro filme percebe-se

claramente um herói lutando contra vilões pelo bem da cidade de Gotham, neste filme é

apresentada outra perspectiva. Batman também é um vilão, e Coringa é a sua maior ameaça.

Seria o palhaço então, o herói?

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1.1 TEMA E PROBLEMA DE PESQUISA

Super-Homem e Lex Luthor, Homem-Aranha e Duende Verde, Homem de Ferro e

Madarim, os quadrinhos sempre tiveram personagens que traçavam muito bem a linha entre o

que é certo e o que é errado, quem é o mocinho e quem é o bandido.

Através da descrição de tais valores na história nos gibis, pretende-se evidenciar

como a questão da moral, retratada no filme, é ambígua em relação a toda história dos

quadrinhos, levantando a possibilidade de um de seus maiores heróis na verdade ser um vilão.

No filme “O Cavaleiro das Trevas”, as conversas e ações de Batman e Coringa se

misturam de tal forma que a linha até então bem traçada, é borrada. Tem-se, então, a

problemática deste trabalho, quem é o herói e quem é o vilão?

1.2 OBJETIVOS

Neste tópico apresentam-se os objetivos (geral e específico) que auxiliaram na

delimitação do estudo.

1.2.1 Objetivo geral

Analisar a relação do perfil ideológico dos personagens Batman e Coringa no filme

“O Cavaleiro das Trevas”, sob uma perspectiva de valores morais da personificação de bem e

mal, do ponto de vista do filósofo Friedrich Nietzsche, demonstrando a ambigüidade entre os

personagens.

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1.2.2 Objetivos específicos

a) Elaborar um levantamento histórico das histórias em quadrinhos;

b) Resgatar as principais adaptações das histórias em quadrinhos para o cinema;

c) Identificar a trajetória de Batman e Coringa nos quadrinhos e no cinema;

d) Teorizar sobre a diferença entre Batman e Coringa de acordo com os valores de

bem e mal dos quadrinhos;

e) Analisar semiologicamente o filme em relação aos conceitos de moral de

Friedrich Nietzsche.

1.3 JUSTIFICATIVA

O filme “O Cavaleiro das Trevas” é a 4ª maior bilheteria na história do cinema com

mais de 1 bilhão de dólares arrecadados, e a 2ª maior bilheteria nos Estados Unidos com mais

de U$ 500 milhões de dólares. Ganhou 65 prêmios, incluindo duas estatuetas no Oscar 2009,

melhor ator coadjuvante para Heath Ledger (Coringa) e melhor edição de som. Concorreu

ainda a mais seis estatuetas e outros cinqüenta e dois prêmios, como informa o site IMDb1

Para o mercado, o estudo colabora para evidenciar a importância da indústria dos

quadrinhos para o cinema, que está lançando cada vez mais filmes de super-heróis. Sucesso

.

Aclamado por críticos e fãs, o filme agradou a todos de uma forma espantosa. Seria pelos

efeitos especiais? Talvez pela saudade em ver na tela o então falecido ator Heath Ledger?

Seria pela forte campanha de marketing, esta mesma já um case referência? Ou seria uma

combinação de tudo isso e o mais simples: um grande filme? Baseado nos quadrinhos mais

sombrios de Batman, o diretor Christopher Nolan foi além de fazer um filme de ação de herói,

ele trouxe para o público um conto em que se discute a essência do ser humano, a sua moral.

O que leva cada pessoa ao seu limite, e por qual razão ela tem determinado limite.

Usando elementos da psicanálise, filosofia, mitos e mais referências dos quadrinhos,

o filme apresenta através de um Homem-Mocego e um Palhaço bandido, uma discussão sobre

como é definida a questão do certo e o errado para o Homem.

1 O site IMDb (The Internet Movie Data Base – www.imdb.com), é referência para pesquisas de informações sobre cinema, sendo um banco de dados respeitado no meio do entretenimento.

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no cinema, DVD, brinquedos, jogos, e diversos outros produtos acabam sendo derivados de

um processo que cresce potencialmente.

Para a academia, é relevante para enriquecer a bibliografia sobre o tema, já que ainda

foi pouco explorado e gera subsídios para outros estudos ligados a quadrinhos, cinema e

mitos.

Para o acadêmico, o assunto tem grande valor, pois usa ícones importantes da cultura

de quadrinhos e cinema, ou seja, da ficção, para discutir sobre o valor de moral constituído

pela os homens, na vida real, gerando um aprofundamento mesclado dos conceitos de herói e

vilão, e bem e mal, nos quadrinhos.

1.4 ESTRUTURA DO TRABALHO

Este trabalho é divido em cinco capítulos, mais referências. No primeiro capítulo

tem-se a introdução, abordando a temática principal, os objetivos, divididos em objetivo geral

e específico, a justificativa e a estrutura do trabalho.

No segundo capítulo, é feita a revisão de literatura, com pontuações e relatos de

diferentes autores sobre a linguagem e os principais momentos ao longo do tempo nas

histórias em quadrinhos, as adaptações cinematográficas dos super-heróis dos quadrinhos e os

valores de bem e mal e herói e vilão na filosofia e nas próprias páginas de gibis.

No terceiro capítulo são evidenciados os procedimentos metodológicos usados para a

realização deste trabalho.

No quarto capítulo se tem a análise do problema, através dos métodos de pesquisa,

relacionando os dois personagens principais do filme, com as histórias em quadrinhos,

adaptações para o cinema e filosofia.

No quinto capítulo é apresentada a conclusão do estudo, onde se pontuam as

respostas para o problema estabelecido e os objetivos alcançados, e as referências usadas para

que este trabalho tenha sido concluído.

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2 REVISÃO DE LITERATURA

As histórias em quadrinhos influenciam gerações desde o seu começo. Criando

esperança, medo e outros sentimentos que fazem parte da cultura de crianças e adultos no

mundo todo. Para fazer a análise do filme O Cavaleiro das Trevas, é necessário resgatar a

trajetória das histórias em quadrinhos, evidenciando suas características de criação, produção

e linguagem para depois discutir suas adaptações para o cinema e enfim chegar ao tema

principal que é a distinção de Batman e Coringa no filme.

2.1 HISTÓRIAS EM QUADRINHOS

Não existem limites para as histórias em quadrinhos. Idades, classes sócio-

econômicas, sexo, o que seja, ela atinge a todos. Através de heróis, vilões, ajudantes,

namoradas e mordomos, elas ajudaram a criar estereótipos, discutem até hoje diversos

arquétipos e influenciam o homem na publicidade, arte, televisão e cinema. A polêmica é

estabelecida quando vem a famosa frase “é coisa de criança”. “As histórias em quadrinhos

(HQs)2

2 Será usada a sigla HQs para se referir ao termo História em Quadrinhos.

são vistas como um produto menor, uma “irmã pobre” das outras manifestações

artístico-culturais produzidas pelo ser humano”. (MOREAU, 2007, p. 8). O que é inegável é a

presença da cultura destas histórias na própria história do Homem. “Tal a dimensão desse

sincretismo que não se sabe onde termina a influência externa absorvida pelas HQs e onde

começa a sua inserção nos outros meios”. (DANTAS, 2006 apud SOUZA, 2007, p. 18). Para

entender o mundo das histórias em quadrinhos, é importante entender primeiro como é feita a

comunicação entre cada detalhe impresso nas páginas e o leitor. Como é usada a linguagem.

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2.1.1 A Linguagem

Textos, planos de cena, traços, desenhos e cores, todos são elementos da linguagem.

Ela é algo inerente ao ser humano e em sua forma oral e iconográfica, aparece por volta dos

dois anos de idade, como uma das manifestações de “função simbólica”, ou seja, a capacidade

da criança de viver situações ausentes, utilizando-se de símbolos ou signos, através da

imagem mental ou da palavra (SEBER, 1991).

Para Eco (1991, p. 18)

o signo é um gesto emitido com a intenção de comunicar, ou seja, para transferir uma representação própria ou um estado interno para um outro ser. Naturalmente, presume se que, para que a transferência tenha êxito, uma determinada regra (um código) habilite tanto o emissor quanto o receptor para entender a manifestação do mesmo modo.

De acordo com O’Neil e Adams (2005), os quadrinhos são mais que palavras e

imagens numa mesma página. São elementos separados e diferentes, mas que conseguem e

devem trabalhar juntos, a fim de transmitir informações. Para Cagnin (1975, p. 29-30), a

relação dos sistemas de linguagem oral e visual com os signos nas HQ é diferente, “o código

escrito é um sistema de signos discretos ou digitais, isto é, composto unidades autônomas e

contáveis (nos dedos), que se manifestam separadamente nos diversos níveis de significação”.

Enquanto com as imagens, o composto narrativo tem uma linha contínua, que tem semelhança

com o objeto representado, passando a impressão do real.

a leitura em busca do significado não é unidirecional, em linha, como na escrita, ou em momentos sucessivos, como na fala, é contínua; a sua significação vem do todo, é próxima do modo de ver e entender as coisas reais, e forma, portanto, um inventário aberto, como o dos signos lingüísticos, com exceção dos abstratos [...]. (CAGNIN, 1975, p. 30).

Assim, é evidenciado por Cagnin (1975), a maneira em que leitura da escrita e a

leitura da imagem se complementam. O poder da escrita consiste em demonstrar e explicitar

conceitos universais, enquanto o elemento icônico nos remete a representação artificial da

realidade de determinado objeto físico, com indicações de movimento, enquanto a imagem

mantém a semelhança na aparência do real com cada particularidade e especificidade.

Eisner (2005) afirma que todas as histórias possuem uma estrutura, não importando o

meio: texto, filme ou quadrinhos, pois os elementos de uma narrativa são iguais,

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independentemente de como ele é contada. O que transforma esta estrutura de narração em

história em quadrinhos é o relacionamento do roteirista e desenhista, buscando uma

linguagem simples e unificada com um vocabulário similar, como exemplifica McCloud

(2005, p. 48): o desenhista e o roteirista começam de mãos dadas, com um objetivo em comum: Fazer quadrinhos de “qualidade”. O desenhista sabe que, para isso, vai ter que fazer mais do que cartuns grosseiros. Ele parte em busca de uma arte de qualidade. A roteirista sabe que não pode ficar só no Uff! Tum! Blam! Ela parte em busca de algo mais profundo. Em museus e em bibliotecas o desenhista encontra o que busca. Ele estuda os grandes mestres da arte ocidental, praticando noite e dia. Ela também encontra o que procura nos grandes mestres da literatura ocidental. Ela lê e escreve muito, buscando uma voz unicamente sua. Finalmente, os dois estão prontos. As pinceladas dele são perfeitas, suas figuras...Puro Michelangelo as descrições dela são impressionantes. Suas palavras fluem como um soneto Shakespeareano. Ambos estão prontos para dar as mãos de novo e criar uma obra-prima.

De uma forma geral, as imagens são representadas de forma simplista, para facilitar a

linguagem, e serem reconhecidas pelo leitor, remetendo a situações comuns e a realidade.

“Como a experiência precede a análise, o processo digestivo intelectual é acelerado pela

imagem fornecida pelos quadrinhos”. (EISNER, 2005, p. 19).

Eco (1970) relata que uma imagem que nos remete a um estereótipo3

3 “Imagem preconcebida de alguém ou algo, baseada num modelo ou numa generalização”. HOUAISS, Antonio; VILLAR, Mauro de Salles; FRANCO, Francisco Manoel de Mello. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. 2º Ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004.

, independente

do ambiente, utiliza elementos gráficos que respeitam o próprio gênero, sua origem. Há os

que utilizem figuras de linguagem, como as metáforas e as relações de semelhança, para

evidenciar a idéia, compondo assim uma trama de convenções, formando um repertório

simbólico complexo. Além disto, os estereótipos auxiliam com o dinamismo e a fluência na

comunicação entre personagens-leitores nas HQ, uma vez que diferentemente dos filmes,

nesta comunicação há falta de tempo e/ou espaço para apresentar e desenvolver os

personagens.

Ainda sobre o estereotipo de personagens, Eisner (2005, p. 22) explicita: “a imagem

ou caricatura tem de defini-lo instantaneamente”. Assim, levando em consideração suas

experiências pessoais, o leitor consegue interpretar de maneira rápida informações e

características que não estão evidentes no texto, tais como personalidade, humor, idade, entre

outras, como ele exemplifica na ilustração 1.

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a arte dos quadrinhos lida com reproduções facilmente reconhecíveis da conduta humana. Seus desenhos são o reflexo no espelho, e dependem de experiências armazenadas na memória do leitor para que ele consiga visualizar ou processar rapidamente uma idéia. Isso torna necessária a simplificação de imagens transformando-as em símbolos que se repetem. Logo, estereótipos. Nos quadrinhos, os estereótipos são desenhados a partir de características físicas comumente aceitas e associadas a uma ocupação. Eles se tornam ícones e são usados como parte da linguagem na narrativa gráfica. (EISNER, 2005, p. 21).

Ilustração 1: Estereótipos dos quadrinhos Fonte: Eisner (2005, p. 22).

Eisner (2005, p. 20) conclui sobre a capacidade de dinamismo e influência que uma

imagem pode ter nas páginas das histórias em quadrinhos: “imagens estáticas têm limitações.

Elas não exprimem abstrações ou pensamentos complexos facilmente. Mas as imagens

definem em termos absolutos. Elas são específicas”.

Parafraseando, Janson (2005) descreve as linhas dando forma e volume à face,

iluminação para reforçar os ângulos e planos da face para criar profundidade, volume e peso,

são algumas das dicas visuais que o autor cria para dar alguma idéia da personalidade de seu

personagem. Tais fatores serão observados nas ilustrações 2 e 3.

em faroestes dos anos 40 e 50, uma pista visual consistente era a cor dos chapéus que os personagens usavam: o chapéu preto era do malvado, o chapéu branco do mocinho. O cara mau tinha a barba por fazer; o herói tinha um visual limpo e puro. O público era capaz de determinar de imediato quem estava de que lado pela maneira como os personagens se vestiam e como pareciam”. (JANSON, 2005, p. 24).

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Ilustração 2: Estereótipos dos quadrinhos Fonte: Janson (2005, p. 24).

Ilustração 3: Linhas e iluminação: estereótipos dos quadrinhos Fonte: Janson (2005, p. 22).

Estereótipos e linguagem à parte, toda história tem um começo, e nos quadrinhos, é

um menino com uma camisola amarela que dá início a primeira de muitas eras.

2.1.2 Era de Platina

A história dos quadrinhos teve quatro grandes fases relacionadas a mudanças,

vendas, e história dos super-heróis. A era de Platina, de Ouro, de Prata e de Bronze.

A história das revistas em quadrinhos nos Estados Unidos da América começou em 14 de setembro de 1842, com a publicação do suplemento The Adventures of Mr. Obadiah Oldbuck, escrito e desenhado por Rodolphe Töpffer. Tratava-se de uma republicação de tiras feitas para jornais, contendo um total de 40 páginas por história. Töpffer é considerado por muitos historiadores americanos como o pai dos quadrinhos atuais, já que suas quadrinizações possuíam seqüências narrativas e textos nas bordas dos painéis. O próprio autor costumava se referir aos seus quadrinhos como picture story - que poderia ser traduzido como ‘’histórias em retratos’’. (GUEDES 2004, p. 10).

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A Era de Platina é o começo das histórias em quadrinhos e ainda não se tem super-

heróis, apenas heróis. Segundo Patati e Braga (2006), o primeiro personagem foi Yellow Kid,

de Richard Fenton Outcault. Um menino de roupão amarelo junto com seus amigos

participava de aventuras em um Estados Unidos que ainda estava sendo formado por

diferentes culturas e raças. Os personagens moravam no mesmo bairro, uma espécie de favela

americana, onde com um tom cômico, gostavam de aprontar.

A ilustração a seguir, apresenta um exemplo dos quadrinhos do personagem Yellow

Kid:

Ilustração 4: Yellow Kid de Richard F. Outcault Fonte: New York Journal (apud MOREAU, 2007, p 13).

A comédia foi o caminho encontrado para o sucesso de jornais da época como The

New York World e New York Journal, que buscavam o aumento das vendas, criando mais

personagens como Little Nemo in Slumberland, Le Pieds Nickelés e The Katzenjammer Kids,

e produtos relacionados:

na esteira do sucesso do Yellow Kid, que foi publicado em diversos outros jornais, virou pôsteres e brinquedos, começaram a surgir vários personagens. Em comum, um olhar crítico e bem-humorado do cotidiano da vida americana. Herdeiros diretos das charges políticas, esses primeiros personagens captavam a atenção dos leitores através da identificação direta. (MOREAU, 2007, p. 15).

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Moreau (2007) evidencia que com o tempo o gênero comédia saiu da exclusividade e

os fatores externos começam a influenciar os quadrinhos. O desemprego, a depressão e a

queda das Bolsas de Nova Iorque, desanimavam os leitores. As piadas que então eram

engraçadas começaram a se tornar repetitivas e cansativas, levando as pessoas a procurarem

por algo diferente, e não tiras que criticavam o cotidiano de um trabalhador que já não tinha

dinheiro para pagar as contas no final do mês. Buscava-se mais. Nesse contexto chegam às

aventuras e os heróis para os quadrinhos.

Moreau (2007) ressalta ainda, que os temas: espaço sideral, viagem no tempo e

perseguições, começaram a dominar a atenção dos leitores, que viam nestas novas aventuras,

uma saída para aquele cotidiano sofrido, sem perspectiva de mudanças. Príncipe Valente,

Buck Rogers e Tubinho foram alguns dos heróis mais famosos da época, que teve ainda um

detetive conhecido até hoje, Dick Tracy. A história do policial trazia exatamente o que o

público queria, justiça. Bandidos, policiais corruptos, qualquer um que desafiasse a lei era

preso. O interessante é como o tom infantil e adulto é mesclado nas histórias de Tracy,

nada de pistas, charadas ou brilhantes deduções sherlockianas. Contra vilões sem moral ou limite, apenas socos e balas resolviam. Tudo o que o público ansiava era um policial correto, incorruptível e que não descansava até prender os criminosos. Vale destacar o traço do autor, algo quase infantil, contrastando com o tema pesado e brutal das tramas. Brutal mesmo, afinal mais de uma vez vilões foram mortos em tiroteios violentos. (MOREAU, 2007, p. 22).

A ilustração 5 mostra o personagem Dick Tracy, do criador Chester Gould, usando

um de seus equipamentos eletrônicos, que faziam sucesso na época, como cita Moreau (2007,

p. 22): “Gould também brindou seus leitores com inovações tecnológicas que fizeram história,

como o rádio-relógio de Tracy, o avô dos celulares”.

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Ilustração 5: Selo comemorativo, lançado em 1995 nos EUA, com Dick Tracy de Chester Gould Fonte: Moreau (2007, p. 23).

Conforme exposto, as aventuras e seus heróis mudando o estilo dos quadrinhos, as

tiras foram evoluindo e migrando dos jornais para suas próprias edições, sendo bem recebidas

pelos leitores. Com isto, a Era de Platina vai dando espaço para uma nova e super fase, a Era

de Ouro.

2.1.3 Era de Ouro

A era do surgimento dos super-heróis vai aproximadamente de 1938 até 1955, tendo

como marco inicial, a aparição de Superman na capa da revista Action Comics # 1, levantando

um carro sobre a cabeça. Um ser com superpoderes, um uniforme com cores em homenagem

a bandeira dos Estados Unidos e que lutava pela verdade, justiça e o american way4

Superman, em suas primeiras edições, deu uma dura em um senhorio que explorava seus inquilinos, balançando o pobre homem sobre os telhados da cidade. Esse tipo de situação - ficar devendo dinheiro - era, sem dúvida, algo comum na vida dos

. Tudo o

que as pessoas precisavam. O azulão virou o símbolo do correto, do que seria o bem, e fazia

exatamente o que seus leitores desejavam como afirma Moreau (2007, p. 31),

4 A tradução literal de american way é jeito americano, que é uma referência ao estilo de vida patriótico e familiar norte-americano.

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leitores, vendo seus pais diariamente enfrentando a recessão econômica que atingia os EUA.

Com o sucesso de Superman, as editoras começaram a criar mais super-heróis, é

então que nascem: Tocha Humana, Sandman, Capitão Marvel, Spirit, Capitão América e

mais.

Na Era de Ouro, personagens mais patrióticos como Capitão América e o próprio

Superman, lutaram inclusive contra o os inimigos dos Estados Unidos fora dos quadrinhos.

Durante a Segunda Guerra Mundial, o então presidente dos Estados Unidos, Franklin

Roosevelt, reuniu-se com os criadores de quadrinhos para que eles mostrassem os super-

heróis, lutando contra os nazistas. O resultado foi que Superman e Capitão América lutaram,

com direito a uma capa de revista com Hitler levando um soco do Capitão América, como

evidencia a ilustração 6. As revistas do Capitão América serviram de motivação e apoio,

sendo distribuídas para os soldados americanos (GUEDES 2004). Os quadrinhos começam a

quebrar a barreira da ficção, trazendo a guerra ao mundo dos super-heróis e levando as

pessoas a guerra. Nas páginas, nazistas e seus aliados travavam combates épicos com os

personagens, motivando os fãs, que aos milhares, compravam as revistas e “[...] pouco depois

se alistariam e combateriam na guerra mundial. Um público a quem o Capitão faria

companhia nas trincheiras”. (PATATI, BRAGA, 2006, p. 81).

Ilustração 6: Capitão América dando um soco em Hitler Fonte: Moreau (2007, p. 47)

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Neste contexto, apesar da existência de vários personagens, um que ganhou destaque

tanto quanto Superman, e foi tão importante quanto para a formação de ícone do termo super-

herói, foi Batman. Ele não voava, não tinha super força ou era mais rápido que uma bala. Ele

era humano, um super-herói humano. A pedido do desenhista Bob Kane, o escritor Bill Finger

cria um personagem com uma das histórias mais densas dos quadrinhos.

Para explorar o sucesso excepcional de Superman, Whitney Ellsworth, supervisor das publicações da DC, recorre a Bob Kane, um de seus desenhistas mais engenhosos, e lhe pede que crie um novo personagem. Por sua vez, Kane vai buscar orientação com seu amigo Bill Finger, autor de talento, com quem já criara Rusty and His Pals e Clip Carson para a Adventure Comics. A idéia básica de Bob Kane é vaga: um herói vestido de vermelho, com duas abas rígidas nas costas e um pequeno capuz como máscara. Dessa idéia inicial, Bill Finger manterá somente o nome inventado por Kane: Batman. (D.H. Martin, 1987 apud MOREAU, 2007, p. 35).

Quando criança, Bruce Wayne vê seus pais serem assassinados por um criminoso.

Com sede de justiça e guiado pela determinação, Bruce torna-se um ser quase que sobre-

humano, mas que no fim das contas é “apenas” um homem muito inteligente e um super

lutador, como explica Guedes (2004). E através de Finger, começa a história de um

personagem, que junto com Superman, acaba servindo como modelo para os outros, como

afirmam Patati e Braga (2006, p. 68), “entre esses dois extremos típicos, dotados de forte

valor icônico, nasceu a fisionomia de toda a geração inicial de super-heróis”.

Moreau (2007, p.38) lembra que apesar de características semelhantes com

habilidades especiais, origem traumática e identidades secretas, os dois personagens tinham

personalidades e particularidades diferentes. “Em essência Batman era um super-herói como

Super-Homem, mas diferia em motivação e modus operandi. Se Super-Homem representava a

luz, Batman era as trevas”. (GUEDES, 2004, p. 20).

Onde tem herói tem vilão. Em 1940 na revista Batman #1, é apresentado um dos

personagens mais conhecidos das histórias em quadrinhos, o Coringa. Rodrigo Monteiro do

site Omelete, especializado em quadrinhos, conta como ao longo do tempo Batman e Coringa

travam uma batalha incessante.

Denominando-se O Príncipe Palhaço do Crime, ele começou a cometer uma série de crimes cruéis, em que qualquer lógica deixava de existir. Ao longo dos anos, Batman sempre conseguiu frustrar seus planos, iniciando um ciclo vicioso que é típico da maioria dos vilões dos quadrinhos: o Coringa cometia um crime, Batman o prendia no Asilo Arkham, ele fugia para aprontar mais uma e ser preso novamente. Isso desenvolveu um grande laço de ódio entre o herói e o criminoso. (MONTEIRO, 2005).

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A ilustração 7 apresenta umas das primeiras aparições de Batman nos quadrinhos,

com sua capa com forma de asa de morcego, o desenho traz traços pontiagudos e cores

chamativas.

Ilustração7: Surge o Cavaleiro das Trevas: Batman de Bob Kane Fonte: Edição Fac Símile Editora Abril (apud MOREAU, 2007 p. 36).

Com o fim da Segunda Guerra Mundial em 1945, os super-heróis vão perdendo

espaço. Como explica Moreau (2007), com a manobra do Presidente Roosevelt e dos

criadores das histórias em quadrinhos, os personagens acabaram ficando muito ligados a briga

com espiões e nazistas. Levando as vendas do personagem mais famoso na época, Capitão

Marvel, caírem pela metade. Assim a Era de Ouro é encerrada dando lugar a uma época onde

a ficção científica, humor e principalmente o terror eram os temas dominantes das histórias.

2.1.4 Era de Prata

Para tentar atrair os leitores que andavam desanimados com os super-heróis, as

editoras tentavam achar um novo caminho. Enredos mais infantis, histórias de policias e

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faroeste, bichos falantes e até quadrinhos para o público feminino, conforme Guedes (2004).

Mas a grande sucesso desta era, viria de uma tragédia.

Um dos responsáveis pelo sucesso dos super-heróis da editora National e dono da

editora Educational Comics - EC, Max Gaines, morre afogado ao tentar socorrer uma criança

em 1947. Então Willian Gaines, de 25 anos, herda a empresa do pai, mas como cita Guedes

(2004, p. 42) ele “[...] não tinha muito tato para lidar com aqueles tipos de publicações”, ele

contrata o desenhista e editor Al Feldstein para juntos criarem um dos marcos da Era de Prata,

as revistas de terror.

Gibis como Tales From the Crypt, The Haunt of Fear, foram ganhando os leitores.

Com o sucesso, diversas editoras começaram a apostar no gênero até o momento que o terror

ficou proibido. Patati e Braga (2006) contam que concorrentes da EC, apoiados por um grupo

conservador, começam uma cruzada, procurando censurar as histórias e afirmando que elas

eram ofensivas e degradantes. O autor ironiza e questiona a razão da perseguição “Terá sido

porque não só Gaines não tinha medo de mostrar sangue e sugerir sexo? Ou também porque

seus monstros incluíam a Klu Klux Klan e a Máfia? Seus quadrinhos policiais rotineiramente

denunciavam a corrupção da polícia”. (PATATI; BRAGA, 2006, p. 97). As editoras

começaram a demitir desenhistas, infantilizar suas tramas e sofreram repressão de uma

sociedade que tinha figuras como psiquiatra Frederic Wertham, que chegou a propor situações

de homossexualismo nos quadrinhos, como discute Moya (1970) sobre uma passagem do

livro Seduction of the Innocent de Wertham:

o psiquiatra, ignorando as cifras oficiais a respeito do homossexualismo no Exército americano, corajosamente preocupa-se com as relações entre Batman e Robin. ‘Constantemente eles se salvam um ao outro de ataques violentos de um número sem fim de inimigos. Transmite-se a sensação de que nós, homens, devemos nos manter juntos porque há muitas criaturas malvadas que têm que ser exterminadas[...] Às vezes, Batman acaba numa cama, ferido, e mostra-se o jovem Robin sentado ao seu lado. Em casa, levam uma vida idílica. São Bruce Wayne e Dick Grayson. Bruce é descrito como um grã-fino e o relacionamento oficial é que Dick é pupilo de Bruce. Vivem em aposentos suntuosos com lindas flores em grandes vasos[...] Batman é, às vezes, mostrado num robe de chambre[...] é como um sonho de dois homossexuais vivendo juntos.’ Neste parágrafo não se sabe quem é mais doentio a respeito do robe de chambre, Bob Kane ou o Dr. Frederic Wertham. Portanto, o maior perigo já enfrentado por Batman e Robin está representado num robe de chambre e num vaso de flores. Esses e outros símbolos sexuais ficaram no subconsciente dos jovens que se pederastizaram nas fileiras das forças armadas norte-americanas. (MOYA, 1970, p. 72-73).

Guedes (2004) explica que mesmo com a censura, Superman e Batman ainda faziam

sucesso, principalmente depois que os editores juntam os dois personagens na mesma

aventura em julho de 1952, na revista Superman 76#, onde um descobre a identidade do

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outro. O Homem-Morcego e Robin ajudando o último filho de Krypton, novos personagens

como Jimmy Olsen e com histórias mais leves, os heróis começam a traçar seu caminho para

uma nova era.

Moreau (2007) discorre que se na Era de Ouro as histórias dos heróis eram baseadas

no místico e mitológico, no final da década de 50 com a influência da Guerra Fria, era a

ciência que respondia diversas questões nos quadrinhos. O Flash corria tão rápido que

atravessava sólidos, vibrando entre a matéria e inclusive caindo em uma realidade paralela,

onde existia outro Flash, o famoso Multiverso. Depois criaram mais realidades onde até os

heróis eram vilões, algo que animava os fãs que se empolgavam com toda esta realidade

paralela. O fato mais marcante da Era de Prata é o surgimento de uma das editoras mais

importantes da história dos quadrinhos, a Marvel.

Patati e Braga (2006) relatam que a editora Marvel buscava um caminho diferente na

época e guiada por Stan Lee e Jack Kirby ela foge de personagens ligados a acidentes

nucleares, resolve fazer algo no estilo da Liga da Justiça, a liga de heróis da editora

concorrente National. Stan Lee então cria novos personagens que não formam uma liga e sim

uma família, nasce o Quarteto Fantástico. Relatando a história dos personagens, Moreau

(2007) explica que o cientista Reed Richards embarca numa missão espacial com sua noiva,

Sue Storm, o irmão caçula dela, Johnny Storm e o melhor amigo de Reed, o piloto Ben

Grimm. No espaço sua nave é atingida por uma tempestade de raios cósmicos e quando

voltam a terra, descobrem que os raios deram a eles super poderes. Uma mudança

significativa nas características dos heróis começa no Quarteto Fantástico através do

personagem de Ben Grimm, que depois dos raios vira o herói O Coisa. Ele era o único que

não gostava de ter poderes, ele não se via como um herói e sim como um monstro.

Guedes (2004) esclarece que depois de criar a primeira “família” da Marvel, Stan Lee

apresenta mais um herói que vem para se tornar um dos mais adorados e que irá servir de

padrão para uma série de outros heróis, o Homem-Aranha. O aracnídeo é um herói inovador

no mundo dos quadrinhos, um garoto órfão que mora com os tios, com estilo nerd e

desajeitado que acaba sendo picado por uma aranha radioativa e adquire super poderes da

noite pro dia. Indo na contramão de todos, esse era exatamente o personagem que Stan Lee

queria como afirma o autor:

de acordo com Goodman o personagem tinha tudo para dar errado: não era rico, era cheio de complexos e falhas de caráter e nem ao menos era bonito, fisicamente. Bem, tais tópicos eram o que servia de argumento para Stan Lee. A escolha do desenhista Steve Ditko foi também de uma inspiração quase divina por parte de Lee,

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já que, com seu traço simples, porém marcante, Ditko conseguiu transmitir a carga necessária de mistério e esquisitice ao herói. (GUEDES, 2004, p. 64).

Nada de um personagem destemido, o Homem-Aranha era conhecido como o

“amigo da vizinhança”, e assim foi ganhando a atenção da garotada que via no alter-ego, Peter

Parker, uma forte semelhança com o real. Mas como afirma Moreau (2007), nem sempre o

herói, era visto como um herói.

só que a vida de Parker realmente não é fácil. Enquanto os outros super-heróis são admirados e festejados, o Homem-Aranha é visto como uma ameaça. O editor do maior jornal de Nova York - Clarim Diário, J.J. Jameson, odeia o escalador de paredes. E faz de tudo para voltar a opinião pública contra o herói. (MOREAU, 2007, p. 69).

Na ilustração 8, a capa da revista ratifica como a trama do aracnídeo era diferente,

sendo que ele não era adorado pelas pessoas. Ele é chamado de aberração e ameaça pública

pelas pessoas, algo um tanto quanto incomum para um super-herói.

Ilustração 8: O Homem-Aranha Fonte: Moreau (2007, p. 68).

Segundo Moreau (2007), o sucesso dos super-heróis traz novos personagens como

Homem de Ferro, Thor O Deus do Trovão, Nick Fury, X-Men, Hulk, Homem Formiga, e o

grupo que era a verdadeira resposta a Liga da Justiça da National, Os Vingadores. O grupo era

formado por Hulk, Homem de Ferro, Thor, Homem-Formiga e sua esposa Vespa.

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Guedes (2004) afirma que na década de 60 a Marvel não para de fazer sucesso, suas

revistas vendem bem, os heróis ganham desenhos na televisão e novas revistas são lançadas,

como a do personagem preferido de Stan Lee, O Surfista Prateado. A época era farta de

edições com cada herói tendo a sua própria revista e com histórias de heróis se encontrando e

lutando juntos, até que no final dos anos 60, os quadrinhos vão ganhando aventuras com teor

mais adulto, perdendo a censura e decretando o fim da Era de Prata.

2.1.5 A Era de Bronze e Era Moderna

Duas épocas dos quadrinhos de características muito similares, em que as histórias

dos super-heróis, traziam temas mais fortes como morte, drogas e violência. Moreau (2007)

cita que a era de bronze é marcada pela morte da namorada do Homem-Aranha, Gwen Stacy,

que é assassinada pelo Duende Verde, desencadeando uma revolução nos quadrinhos e no

período de transição da Era de Bronze para Moderna, década de 80, o conservadorismo

começa a sair de cena para que pessoas como Alan Moore e Frank Miller criem algumas das

obras mais importantes de todas as eras.

O escritor britânico Alan Moore junto com o desenhista Dave Gibbons lança em

1986, Watchmen. Uma história repleta de polêmica, envolvendo filosofia, política e

questionando a moral dos super-heróis, que na HQ, são pessoas comuns que vivem

normalmente entre a sociedade fundamenta Irwin (2005). Assis (2006) lembra que Watchmen

é considerada uma das melhores histórias em quadrinhos já lançadas, sendo a única do gênero

que consta na lista dos 100 melhores romances dos últimos 80 anos, elaborada por críticos da

conceituada revista americana Time.

Frank Miller, que já era conhecido pelo seu trabalho com O Demolidor, não traz

novos personagens, mas usa os dois maiores ícones dos quadrinhos para criar O Cavaleiro

das Trevas. Um Batman de quase 60 anos e aposentado resolve voltar à ativa. Com medo do

que o Homem-Morcego possa fazer, o presidente americano resolve chamar alguém para

colocar limites no Morcegão, o seu velho amigo, Superman. Com um posicionamento

inovador, Miller coloca frente a frente os dois heróis, cada um representando a sua essência, o

vigilante com sede de justiça e o protetor do american way (IRWIN, 2005).

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Isso deixa clara a diferença crucial que existe entre os dois personagens: Superman um “escoteiro”, Batman um “vigilante”. O clímax da trama acontece com uma luta de vida e morte entre os heróis, com Batman dando uma surra no homem de aço. O tom sombrio, a discussão política e a realidade que impregnam a história mudaram os HQ. (MOREAU, 2007, p. 88).

A partir daí a porteira ficou aberta e o mundo dos quadrinhos foi sendo renovado por

outro direcionamento e público. Selos como Vertigo, Dark Horse e Image, focavam nos fãs de

quadrinhos que queriam histórias mais adultas, e assim davam mais liberdade aos seus

escritores e desenhistas para criarem (SOUZA, 2007). O Monstro do Pântano, V de Vingança,

From Hell e muitas outras obras abriram um novo caminho que dura até os dias de hoje. A

história em quadrinhos nunca apaga o que já foi percorrido, mas recria e inova a partir da

realidade apresentada no mundo atual, seja recessão, guerra mundial, guerra fria, ditadura ou

até de uma esperança de democracia (MOREAU, 2007). A ilustração 9, com então presidente

eleito dos Estados Unidos Barack Obama , na capa da revista do Homem-Aranha, representa a

interação dos quadrinhos com a realidade.

Ilustração 9: O presidente eleito dos Estados Unidos, Barack Obama na capa da revista The Amazing Spiderman #583 Fonte: Forlani (2009).

Os super-heróis eram o principal produto dos quadrinhos, fazendo sucesso nas

páginas, nas lojas de fantasias e brinquedos, qual seria próximo passo?

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2.2 SUPER-HERÓIS NO CINEMA

O sonho de qualquer fã de quadrinhos era ver seu super-herói preferido em carne e

osso, o mais perto que chegaram até hoje foram assistindo às adaptações para telona. Atores e

atrizes representando os ideais, vestindo o uniforme e usando falas tradicionais dos gibis.

Aguiar (2002a) descreve os anos 40 como uma década em que as pessoas lotavam as

sessões matinês de cinema para ver aventuras baseadas nas histórias em quadrinhos. O autor

ratifica a importância das adaptações na época:

nos anos 40, as matinês de cinema viviam seu auge. Numa época em que ainda não havia a televisão, toneladas de séries de aventura invadiam as telas oferecendo ao público o escapismo necessário numa sala de projeção perto de sua casa. Legiões de fãs iam religiosamente assistir toda semana às peripécias de seus heróis e descobrir como eles se safariam da enrascada em que se meteram no final do episódio anterior. Os quadrinhos serviram de fonte de inspiração para muitos desses seriados. Tarzan, Flash Gordon, Super-Homem, Fantasma, Buck Rogers, Capitão América, Mandrake, Capitão Marvel, entre tantos outros cativaram o público; cada um à sua maneira, com suas virtudes e defeitos em particular. (AGUIAR, 2002a).

Segundo Morelli (2009), Superman teve suas primeiras adaptações para o cinema em

1948 com uma série de curtas-metragens exibidos antes do filme principal. Apenas alguns

anos depois, em 1951, é lançado o seu primeiro filme de sucesso, com o ator George Reeves

no papel principal: “Superman e Os Homens Toupeiras foi o primeiro longa-metragem do

famoso herói”. (MORELLI, 2009, p. 105). O autor salienta ainda que George Reeves repetiu

o papel na TV, para um seriado.

Morelli (2009) relata ainda que as décadas de 50, 60 e 70, foram recheadas de

adaptações de super-heróis para a telona. Príncipe Valente de 1954 era inspirado numa das

famosas HQ’s, mas como ressalta o autor, não fez tanto sucesso. Barbarella (1968), Diabolik

(1968), Besouro Verde (1974), Doc Savage (1975), Capitão América (1974) e muitos outros

completam a lista.

O problema é que nem toda adaptação respeitou as características primordiais dos

personagens, exagerando em certos pontos ou até fugindo totalmente da história original dos

quadrinhos. A questão é sempre o jogo de interesses entre estúdio, diretor, atores, o criador do

personagem e editora. A opinião dos editores, criadores e desenhistas não tinha importância

diante do investimento dos estúdios, assim os personagens eram modelados a gosto do que era

visto como lucrativo na época.

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Aguiar (2003) lembra que na década de 60, o seriado Batman, que era um sucesso

nos Estados Unidos, largou o tom sombrio do personagem nos quadrinhos e usou a comédia

como fator chave para alavancar a audiência do programa. Morelli (2009) comenta o filme

Batman, O Homem-Morcego, baseado na série de TV: todos os elementos que fizeram a fama

do seriado estão presentes em Homem-Morcego:

as lutas com onomatopéias, os vilões impagáveis e o humor nonsense – numa cena, Batman sai correndo com uma bomba de pavio aceso, no melhor estilo desenho animado. A produção também caprichou nos bat-acessórios como a bat-lancha, o bat-cóptero e a bat-moto, que depois foram usados no seriado. (MORELLI, 2009, p. 14).

Em 1978, é lançado Superman – O Filme, com Christopher Reeve no papel do super-

herói. Com direção de Richard Donner, a obra contava ainda com Marlon Brando no papel do

pai de Kal-El e Gene Hackman como o vilão Lex Luthor. O filme foi um marco nas

adaptações dos quadrinhos para o cinema, sendo elogiado por fãs e críticos em conseqüência

da fidelidade às HQs comenta Medeiros (2006) no site Omelete5

5 O site Omelete será usado como referência neste trabalho por ter um grande acervo de informações sobre o tema, que tem pouca bibliografia a respeito. Lembrando ainda que os profissionais do site, são respeitados e usados como referência no meio, principalmente sobre quadrinhos e cinema.

:

A trama do filme seguiu a origem conhecida das histórias em quadrinhos, com desdobramentos inteligentes. Contribuiu para a isso o fato de Elliot S. Maggin, o roteirista do herói de maior importância desde o início dos anos 1970, ter atuado como consultor criativo, dando verdadeiras aulas sobre o significado mítico do Super-Homem. (MEDEIROS, 2006)

Dois anos depois chega a continuação, Superman II, e como afirma Medeiros (2006),

o filme foi finalizado por Richard Lester, isto porque Richard Donner começou a filmar, mas

depois de opiniões divergentes com o estúdio abandona o projeto. Lester usaria ainda alguma

coisa das filmagens de Donner e construiria o filme dali em diante. Os vilões do filme são

alienígenas do mesmo planeta que Superman, mas parecem fisicamente e pelo sotaque que

vieram da União Soviética. Os personagens General Zod, Ursa e Non sofrem influência do

mundo real, em plena luta do capitalismo contra o comunismo, e acabam sendo usados no

filme como bandeira contra a União Soviética. A franquia ainda teria um terceiro filme,

praticamente uma comédia pastelão com o famoso comediante Richard Pryor com vilão e o

quarto filme, usando da Guerra Fria mais uma vez como pretexto para encaixar um vilão

“soviético”, no caso o Nuclear Man (SUPERMAN II..., 1980).

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Os anos 80 também tiveram seus momentos de heróis nas salas de cinema como

argumenta Morelli (2009). Flash Gordon (1980), Conan O Bárbaro (1982), He-Man e Os

Mestres do Universo (1987) e A Volta do Monstro do Pântano (1989) são exemplos. Sendo

que o último citado, tenta reproduzir o sucesso dos quadrinhos, mas falha na produção:

“Algumas idéias criadas por Alan Moore para os quadrinhos do personagem foram utilizadas

de maneira amadora na trama”. (MORELLI, 2009, p. 83).

A década de 90 continuou triste para os super-heróis no cinema, com adaptações

fracas, exageradas e que de nada lembravam as histórias em quadrinhos. Capitão América, O

Fantasma e a franquia de Batman. Em Batman & Robin de 1997, as características dos

personagens foram deixadas completamente de lado, colocando Val Kilmer, o ator que

interpretava Batman, numa bat-enrascada como lembra Aguiar (2002b):

o galãzinho Val Kilmer até que tentou, mas era inexpressivo demais para impor respeito como um Batman decente; ainda mais usando uma armadura com mamilos salientes e protagonizando uma das mais deprimentes cenas da história das adaptações das HQs paras as telas:O close das NÁDEGAS de Batman enquanto veste as calças do uniforme! Não bastasse a cena degradante, vemos que o dito tem um zíper dividindo seus bat-glúteos! Para piorar a situação, trouxeram Robin (Chris O´Donnel) de volta do limbo, provido claro, de mamilos igualmente assanhados como os de seu parceiro. Agora, porém, ele não é mais um menino órfão e indefeso, e sim um mauricinho com quase trinta anos nas costas, que Bruce Wayne acolhe em sua casa

Após uma longa década, o diretor e fã de quadrinhos, Bryan Singer, chega para

mudar a história das adaptações de quadrinhos para o cinema. Em 2000, lança o filme X-Men,

sendo um sucesso de crítica e bilheteria. Fidelidade aos quadrinhos, sem exageros e com um

Wolverine furioso, Singer abre a porta para outras adaptações que se enriquecem cada vez

mais os estúdios. Hulk, três filmes do Homem-Aranha, onde só o primeiro arrecadou mais

800 milhões de dólares em bilheteria, Superman, Homem de Ferro e Batman (MORELLI,

2009).

Após virar piada nos anos 90, Batman ressurge com força em 2005, pelas mãos do

jovem diretor Christopher Nolan. Com o foco na construção do alter-ego de Bruce Wayne, o

filme é fiel a história original do super-herói nos quadrinhos, uma criança que tem seus pais

assassinados na sua frente, e a partir daí procura por justiça. Com um tom adulto e sério,

característico do personagem, a obra agrada de uma forma geral e prepara o terreno para uma

continuação avassaladora. Em 2008 é lançado O Cavaleiro das Trevas, o filme ganha muito

destaque na mídia pela morte acidental do ator Heath Ledger, que interpreta o Coringa na

trama. Jornalistas comentam que é a melhor atuação da carreira do ator, diversos jornais e

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revista elogiam o filme, e assim é criada uma grande expectativa em relação a obra. E ela não

decepciona, faz mais 1 bilhão de dólares em bilheterias, se tornando a 4ª maior bilheteria da

história do cinema, ganha diversos prêmios, inclusive o Oscar póstumo de melhor ator

coadjuvante para Heath Ledger, e assim colocando de vez as adaptações dos super-heróis no

patamar de clássicos do cinema (BORGO; FORLANI; HESSEL, 2009).

Ao ver o filme, é possível ir além do entretenimento, identificando conflitos morais

entre os personagens, que discutem o conceito do certo e do errado, do bem e do mal, quem é

o herói e quem é o vilão.

2.3 BEM E O MAL, HERÓI E VILÃO

O que faz de uma pessoa o herói? Ou um vilão? O bem e o mal travam uma

discussão nos quadrinhos na perspectiva do mocinho e do bandido, e na maior parte das vezes

é visível a diferença de características dos dois. Já por outra perspectiva é possível ver certa

similaridade entre os dois, tornando difícil a distinção sobre quem é quem. Filósofos ao longo

da história discutiram sobre a moral e o que leva o homem a ter determinada ação, como

sentimento de amor ao próximo e de coletividade como afirma Nietzsche (1992, p. 113):

não pode haver moral do "amor ao próximo" eu quanto o olhar permaneça fixo na observação da humanidade, enquanto se considere imoral apenas o que parece ameaçar a sobrevivência da coletividade: enquanto o utilitarismo das avaliações morais permanecer subordinado unicamente à utilidade do rebanho. Na época romana mais florescente um ato caritativo não se qualificava nem como bom nem mau, nem como moral ou imoral. Ainda que se o louvasse, seu elogio era concedido com uma espécie de desprezo involuntário quando se comparava esta ação com outra que servisse ao interesse da comunidade, da res pública. Ainda que tenha existido em outras épocas uma prática limitada e constante da compaixão, da igualdade, da ajuda recíproca, estavam entretanto à margem da moral. Em resumo, o "amor ao próximo" é quase sempre coisa secundária, convencional por um lado, e arbitrária por outro, se comparado com o medo ao próximo. Uma vez que a estrutura da sociedade parece ter boas bases ao abrigo de perigos exteriores, esse medo ao próximo abre aos juízos morais perspectivas novas, instintos fortes e perigosos. Nasce a espírito da aventura, da louca temeridade, o rancor, a astúcia, a capacidade, o desejo de dominar que eram até então não apenas respeitados, sob nomes distintos, é claro, daqueles que indicamos, e obrigatoriamente cultivados e selecionados, já que constantemente se tinha necessidade deles contra os inimigos da coletividade.

No livro O Evangelho Segundo Jesus Cristo do escritor José Saramago, se tem uma

luta do bem e do mal com Deus e o Diabo, como dois pólos que equilibram um a existência

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do outro. Lúcifer discute com Deus sobre a razão dos dois existirem e resume como um se

relaciona como outro.

porque este Bem que eu sou não existiria sem esse Mal que tu és, um Bem que tivesse de existir sem ti seria inconcebível, a tal ponto que nem eu posso imaginá-lo, enfim, se tu acabas, eu acabo, para que eu seja o Bem, é necessário que tu continues a ser o Mal, se o Diabo não vive como Diabo, Deus não vive como Deus, a morte de um seria a morte do outro. (SARAMAGO, 1991 p. 392-393).

O herói não está tão distante do vilão como parece, ao mesmo tempo em que se veem

como opostos, a essência os torna iguais. Determinados por diferentes morais procuram

mesmo fim, impor a sua moral. O homem necessita desta diferenciação, como prova de que

um possa triunfar sobre o outro, passando a se transformar no ser dominante e que dita as

regras da sociedade.

Toda nova elevação do tipo "homem" foi até aqui obra de uma sociedade aristocrática — e sempre será assim, isto é, será sempre inegavelmente devida a uma sociedade que tem fé na necessidade de uma grande escala hierárquica e de uma profunda diferenciação de valor de homem a homem e que para chegar à sua finalidade não saberia fazer menos que escravizar sob uma forma ou outra. Sem o "pathos" da distância que nasce de decisiva diferença de classe, do constante olhar ao redor de si e sob si das classes dominantes sobre pessoas e instrumentos, e de seu constante exercício no obedecer e no comandar, em manter os outros opressos e distantes, não seria nem mesmo possível o outro misterioso "pathos", o desejo de sempre novas expansões das distâncias entre a própria alma, o desenvolvimento de estados sempre mais elevados, mais variados, distantes. maiores. tendentes a alturas ignotas, logo à elevação do tipo "homem", o incessante triunfo do homem sobre si mesmo para adotar em sentido supermoral uma fórmula moral. (NIETZSCHE, 1992, p. 193).

Superman e Lex Luthor, Homem-Aranha e Duende Verde, têm suas características

opostas mais visíveis, sendo que com a exceção de Luthor, os outros 3 tem algo de sobre-

humano. Já entre Batman e Coringa não. Sem teias de aranha, super força, visão raio-x, nada

disto, apenas a determinação e os conflitos que os guiam para impor cada um a sua moral. O

que a primeira impressão os torna forças opostas, sob um olhar mais específico, se observa as

ligações da mesma essência (IRWIN 2005).

Qualquer que seja o valor que concedamos ao verdadeiro, à veracidade, ao desinteresse, poderia acontecer que nos víssemos obrigados a atribuir à aparência, à vontade da ilusão, ao egoísmo e à cobiça, um valor superior e mais essencial à vida; poder-se-ia chegar a supor inclusive que as coisas boas têm um valor pela forma insidiosa em que estão emaranhadas e talvez até cheguem a ser idênticas em essência às coisas más que parecem suas contrárias. (NIETZSCHE, 1992, p. 12).

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Chaui (2000) aborda a filosofia moral como algo instituído por cada cultura e

sociedade. Segundo a autora, o sujeito ético moral sabes o que está fazendo, tendo

conhecimento das causas e fins de seus atos e intenções. Ela salienta que para a concepção

racionalista, “a filosofia moral é o conhecimento das motivações e intenções (que movem

interiormente o sujeito moral) e dos meios e fins da ação moral capazes de concretizar aquelas

motivações e intenções”. (CHAUI, 2000, p. 352). Já Nietzsche, é contrário a esta concepção,

afirmando que a liberdade é essencial junto com a manifestação completa de quem deseja

como conclui a escritora Chaui (2000, p. 353):

a moral racionalista foi inventada pelos fracos para controlar e cominar os fortes, cujos desejos, paixões e vontade afirmam a vida, mesmo na crueldade e na agressividade. Por medo da força vital dos fortes, os fracos condenaram paixões e desejos, submeteram a vontade à razão, inventaram o dever e impuseram castigos para os transgressores [...] transgredir normas e regras estabelecidas é a verdadeira expressão de liberdade e somente os fortes são capazes dessa ousadia. Para disciplinar e dobrar a vontade dos fortes, a moral racionalista, inventada pelos fracos, transformou a transgressão em falta, culpa e castigo [...]

No filme O Cavaleiro das Trevas, Coringa e Batman atuam de acordo com seus

desejos e senso de moral, sendo que Batman, que já é conhecido dentre outras coisas, por usar

da violência contra seus inimigos para conseguir a justiça, quebra a perna de mafioso para

conseguir informações sobre o paradeiro do Palhaço do Crime. Gikovate (2005) distingue o

bem e o mal como egoísmo e generosidade respectivamente. O autor conclui que o conceito

de justiça carrega certa dualidade e que não se deve entender o justo como algo bom e a justiça

como idealização do bem: “O bem e o mal são formas de injustiça”. (GIKOVATE, 2005, p.

138). Nietzsche (2005, p. 65-66) vai além:

cada um satisfaz o outro, ao receber aquilo que estima mais que o outro.Um dá ao outro o que ele quer, para tê-lo como seu a partir de então, e por sua vez recebe o desejado. A justiça é, portanto, retribuição e intercâmbio sob o pressuposto de um poderio mais ou menos igual: originalmente a vingança pertence ao domínio da justiça, ela é um intercâmbio. Do ponto de vista de uma perspicaz autoconservação, isto é, ao egoísmo da reflexão que diz: “por que deveria eu prejudicar-me inutilmente e talvez não alcançar a minha meta?”. – Isso quanto à origem da justiça. Dado que os homens, conforme o seu hábito intelectual, esqueceram a finalidade original das ações denominadas justas e equitativas, e especialmente porque durante milênios as crianças foram ensinadas a admirar e imitar essas ações, aos poucos formou-se a aparência de que uma ação justa é uma ação altruísta; mas nesta aparência se baseia a alta valorização que ela tem, a qual, como todas as valorizações, está sempre em desenvolvimento: pois algo altamente valorizado é buscado, imitado, multiplicado com sacrifício, e se desenvolve porque o valor do esforço e do zelo de cada indivíduo é também acrescido ao valor da coisa estimada.

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No livro “Super-Heróis e A Filosofia – Verdade, Justiça e o Caminho Socrático” o

autor Willian Irwin debate filosofia através das histórias em quadrinhos. Usa exemplos

clássicos para discutir a moral. No caso de Superman, por exemplo, que é visto como um

símbolo do altruísmo, Irwin (2005) explica que o super-herói só se sente realizado quando usa

seus poderes plenamente. Então cada vez que ele ajuda um “fraco e oprimido”, na verdade ele

está agindo para o seu bem. De certa forma pode-se dizer que ele é um ser egoísta dotado de

uma grande generosidade. O autor também comenta sobre a série de gibis O Retorno do

Cavaleiro das Trevas6

, onde Batman é apresentado de uma forma mais fria e traumatizada que

o normal, fortalecendo o status de vigilante que não se importa com a justiça, ele faz a sua

justiça.

As leis podem ser injustas, os políticos podem ser corruptos e o sistema legal pode proteger os maus, mas nada disso desanima Batman de sua missão. O super-herói vigilante, combatente do crime não deixa nada se interpor entre ele e a busca do que ele vê como a verdadeira justiça. Por que as estruturas sociais bem-intencionadas deveriam ficar no caminho do que é objetivamente certo? (IRWIN, 2005, p. 44)

Segundo Irwin (2005), justiça, moral, ética, bem e mal, trevas e luz, são conceitos e

temas abordados deste os primórdios da humanidade até os dias de hoje. Desde pinturas nas

cavernas, até as salas de cinema. Na trama de O Cavaleiro das Trevas, Batman busca

distanciar-se das características de Coringa o filme inteiro, inclusive afirmando que os dois

não são iguais. Nietzsche (1992, p. 89), resume o problema em um aforismo: “quem deve

enfrentar monstros deve permanecer atento para não se tornar um monstro. Se olhares

demasiado tempo dentro de um abismo, o abismo acabará por olhar dentro de ti”.

As questões levantadas até o presente momento, como a moral, o bem e o mal serão

aprofundadas no quarto capítulo, procurando evidenciar estas distinções no filme e em relação

aos conceitos estabelecidos nas histórias em quadrinhos e suas adaptações para o cinema.

6 Apesar do nome semelhante, o filme usou esta série apenas como inspiração em relação as características de personalidade do personagem e não a história em si.

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3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Neste capítulo serão apresentados os procedimentos metodológicos utilizados nesta

pesquisa. Com o objetivo de evidenciar o caminho traçado para alcançar as metas deste

projeto, será descrito o método científico e os tipos de pesquisa adotados na análise dos dados

apresentados.

Cervo e Bervian (2005, p. 25) afirmam “o método científico quer descobrir a

realidade dos fatos e esses, ao serem descobertos, devem, por sua vez, guiar o método”.

Longaray e Beuren (2004, p. 30) dizem “em seu sentido mais geral, o método é o

ordenamento que se deve auferir aos diferentes processos necessários para alcançar

determinado fim estabelecido ou um objetivo esperado”.

Como Cervo e Bervian (2005, p. 25) relatam:

toda investigação nasce de algum problema observado ou sentido, de tal modo que não pode prosseguir, a menos que se faça uma seleção da matéria a ser tratada. Essa seleção requer alguma hipótese ou pressuposição que irá guiar e, ao mesmo tempo, delimitar o assunto investigado. Daí o conjunto de processos ou etapas de que se serve o método científico, tais como a observação e a coleta de todos os dados possíveis [...].

Para Galliano (1986, p. 32), metodologia é um “instrumento utilizado pela ciência na

sondagem da realidade, mas um instrumento formado por um conjunto de procedimentos,

mediante os quais os problemas científicos são formulados”. Demo (1985, p. 19), afirma:

“metodologia é uma preocupação instrumental. Trata das formas de se fazer ciência. Cuida

dos procedimentos, das ferramentas, dos caminhos”, ou seja, ajuda no direcionamento do

trabalho, assistindo o pesquisador do início ao fim. Gil (2002, p. 162) conclui sobre

metodologia: “descrevem-se os procedimentos a serem seguidos na realização da pesquisa.

Sua organização varia de acordo com as peculiaridades de cada pesquisa. Requer-se, no

entanto, a apresentação de informações acerca de alguns assuntos”.

Assim para este trabalho destacam-se o uso do método indutivo e das pesquisas do

tipo exploratória, descritiva, bibliográfica e documental.

O método indutivo, explica Máttar Neto (2002, p. 50), trabalha com probabilidades, e

não com certezas como no processo dedutivo. Porém, o autor afirma que é na indução onde se

consegue o avanço científico: “é com a indução que a ciência arrisca e salta. A indução afina-

se, nesse sentido, com o espírito experimental da ciência”. Cervo e Bervian (2005, p. 32)

defendem que costumeiramente, as pessoas pensam, mas não raciocinam sobre os problemas,

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“confundindo a divagação irresponsável com a reflexão sistemática [...] O ato de pensar

caracteriza-se por ser dispersivo, natural e espontâneo. A reflexão, porém, requer esforço e

concentração voluntária. É dirigida e planificada”. Oliveira (1999, p. 60) acrescenta ainda que

o método indutivo “é considerado como o elemento distintivo da ciência. O seu emprego é

considerado como forma ou critério de demarcação entre aquilo que é científico e aquilo que

não é científico”.

Através da utilização deste método, foi possível elaborar uma reflexão e um

posicionamento teórico sobre a dualidade dos valores de Batman e Coringa na produção O

Cavaleiro das Trevas. Para a realização desta indução científica, foram efetuadas pesquisas,

visando adquirir grande quantidade e diversidade de informações para o enriquecimento do

trabalho.

Pesquisa segundo Gil (2002, p. 17), é “[...] o procedimento racional e sistemático que

tem como objetivo proporcionar respostas aos problemas que são propostos”. Cervo e Bervian

(2005) comentam que a pesquisa parte de uma dúvida ou problema, e que a solução ou

resposta será encontrada com a utilização do método científico. Com o problema definido, as

pesquisas, exploratória e descritiva, servem como forma de análise dos objetivos deste

projeto.

A pesquisa exploratória tem por base tornar o problema conhecido para assim torná-

lo mais explícito ou para a criação de hipóteses (GIL, 2002). Cervo e Bervian (2005, p. 69)

afirmam que:

o estudo exploratório, designado por alguns autores como pesquisa quase científica ou não científica é, normalmente, o passo inicial no processo de pesquisa pela experiência e um auxílio que traz a formulação de hipóteses significativas para posteriores pesquisas.

Raupp e Beuren (2006) ressaltam que explorar determinado assunto, é agregar mais

informações com aspectos inéditos, objetivando dar início a elaboração a outros tipos de

pesquisa que tenham o mesmo tema, como por exemplo, a descritiva.

Definido o tema deste trabalho, a pesquisa exploratória foi iniciada, com

levantamento de materiais sobre quadrinhos, os personagens Batman e Coringa, adaptações de

quadrinhos para o cinema e posicionamentos filosóficos sobre os conceitos de Bem e Mal.

Estes materiais foram importantes, pois ajudaram na argumentação e principalmente na

pesquisa descritiva, onde foram explicitados por diferentes autores.

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A pesquisa descritiva, segundo Cervo e Bervian (2005, p. 66), “[...] observa, registra,

analisa e correlaciona fatos ou fenômenos (variáveis) sem manipulá-los”. Gil (2002) elucida

que ela também tem como objetivo, averiguar se há ligações entre as variáveis. Raupp e

Beuren (2006, p. 81) fundamentam que a pesquisa descritiva é “como um estudo

intermediário entre a pesquisa exploratória e explicativa, ou seja, não é tão preliminar como a

primeira nem tão aprofundada como a segunda. Nesse contexto, descrever significa

identificar, relatar, comparar, entre outros aspectos”. Este tipo de pesquisa foi importante para

o capítulo 4, onde foram descritas cenas do filme O Cavaleiro das Trevas, para então analisá-

las, relacionando as semelhanças e diferenças entre Batman e Coringa, a partir de ideais de

Friedrich Nietzsche, também descritos no capítulo supracitado.

Para obter dados necessários para a pesquisa foram utilizadas as pesquisas,

bibliográfica e documental.

Cervo e Bervian (2005, p. 65) afirmam “a pesquisa bibliográfica procura explicar um

problema a partir de referências teóricas publicadas em documentos”. Gil (2002, p. 44)

comenta:

a pesquisa bibliográfica é desenvolvida com base em material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos. Embora quase todos os estudos seja exigido algum tipo de trabalho dessa natureza, há pesquisas desenvolvidas exclusivamente a partir de fontes bibliográficas.

Marconi e Lakatos (2001, p 43-44) acrescentam que este tipo de pesquisa apresenta

um “levantamento de toda a bibliografia já publicada, em forma de livros, revistas,

publicações e imprensa escrita. Sua finalidade é colocar o pesquisador em contato direto com

tudo aquilo que foi escrito sobre determinado assunto [...]”. Toda a bibliografia pesquisada

contribuiu para a elaboração do capítulo 2 deste trabalho, a revisão de literatura. Diferentes

autores, pontuando e discutindo os mesmos temas. Como Eisner e Cagnin na parte de

linguagem nos quadrinhos, Moreau, Patati e Braga sobre as Eras das HQ’s, Morelli e os

redatores do site Omelete sobre as adaptações para o cinema, e Nietzsche e Saramago nos

conceitos filosóficos. Grande parte do acervo bibliográfico usado serviu também como

documentos, que validaram ainda mais, a qualidade e o bom desenvolvimento deste trabalho.

Gil (1996, p. 51) sustenta que enquanto a pesquisa bibliográfica usa uma gama de

colaborações de diferentes autores sobre um tema, “a pesquisa documental vale-se de

materiais que não receberam ainda um tratamento analítico, ou que ainda podem ser

reelaborados de acordo com os objetos de pesquisa”. Máttar Neto (2002) defende que existem

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possibilidades de pesquisas documentais além da biblioteca, como confirmam Marconi e

Lakatos (2001, p. 43), definindo a pesquisa documental como aquela de fontes primárias,

os documentos de fonte primária são aqueles de primeira mão, provenientes dos próprios órgãos que realizaram as observações. Englobam todos os materiais, ainda não elaborados, escritos ou não, que podem servir como fonte de informação para a pesquisa científica. Podem ser encontrados em arquivos públicos ou particulares, assim como em fontes não escritas: fotografias, gravações, imprensa falada (televisão e rádio), desenhos, pinturas, canções, indumentárias, objetos de arte, folclore, etc.

Para Raupp e Beuren (2006, p. 89), a investigação documental pode juntar-se a

outras pesquisas ou ter como característica um traçado distinto sobre determinado tema. Os

autores salientam: “sua notabilidade é justificada no momento em que se podem organizar

informações que se encontram dispersas, conferindo-lhe uma nova importância como fonte de

consulta”.

DVDs de filmes para cinema e televisão, foram os documentos pesquisados,

observados e analisados. A observação de obras como do escritor Friedrich Nietzsche ou do

diretor de cinema Christopher Nolan, somadas com os outros documentos usados,

contribuíram em forma de conhecimento, embasamento e defesa teórica para a construção,

análise e conclusão deste trabalho.

Os autores Marconi e Lakatos (2001, p. 90) fundamentam sobre a observação: “é

uma técnica de coleta de dados para conseguir informações e utiliza os sentidos na obtenção

de determinados aspectos da realidade. Não consiste apenas em ver e ouvir, mas também em

examinar fatos ou fenômenos que se deseja estudar”. Para Colauto e Beuren (2006), na

observação simples, o pesquisador apenas examina os acontecimentos, mantendo o controle

dos resultados. É uma técnica “assistemática – não estruturada” afirma Andrade (1999, p.

118). Rudio (1979 apud MARCONI; LAKATOS, 2001, p. 91) conceitua “é o fato de o

conhecimento ser obtido através de uma experiência casual, sem que se tenha determinado de

antemão quais os aspectos relevantes a serem observados e que meios utilizar para observá-

los”.

O filme Cavaleiro das Trevas foi observado diversas vezes, em DVD, sendo pausado

em determinadas cenas, que apresentavam características importantes para análise do

problema deste trabalho. Registrando os conceitos visualizados e entendidos, foi possível

acrescentar as demais pesquisas e dados coletados, para enfim analisar todo material de uma

forma mais profunda, através de uma abordagem qualitativa.

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De acordo com Richardson (1999 apud RAUPP; BEUREN, 2006, p. 91), os

trabalhos “que empregam uma metodologia qualitativa podem descrever a complexidade de

determinado problema, analisar a interação de certas variáveis, compreender e classificar

processos dinâmicos vividos por grupos sociais”. Oliveira (2007, p. 60) lembra: “os dados

podem ser obtidos através de uma pesquisa bibliográfica, entrevistas, questionários, planilhas

e todo instrumento (técnica) que se faz necessário para obtenção de informações”. Oliveira

(1999, p. 116) entende que é justificável o uso da metodologia qualitativa para um problema,

“pode até ser uma opção do pesquisador, apresentar-se de uma forma adequada para entender

a relação de causa e efeito do fenômeno e consequentemente chegar à sua verdade e razão”. O

autor salienta que neste tipo de abordagem, é necessário coletar uma série de dados sobre o

assunto, de autores e especialistas distintos, para então relacionar estes dados e o pesquisador

dar seu expor suas conclusões. Raupp e Beuren (2006, p. 92) esclarecem: “na pesquisa

qualitativa concebem-se análises mais profundas em relação ao fenômeno que está sendo

estudado” diferente do estudo quantitativo, que segundo os autores, é superficial.

O capítulo 4, ou seja, a análise de todas as pesquisas, fatos observados e registrados e

dos dados coletados, foram abordados de forma qualitativa, procurando mostrar uma

observação e descrição detalhada do fenômeno. Em razão da complexidade do problema, não

é possível usar instrumentos estatísticos para quantificar as informações reunidas. Sendo

assim, a reflexão e o aprofundamento teórico nos conceitos de valores morais de Friedrich

Nietzsche, as pesquisas sobre história em quadrinhos e seus personagens junto à observação

da obra cinematográfica O Cavaleiro das Trevas, contribuíram para o uso desta abordagem.

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4 ANÁLISE DE DADOS

Neste capítulo será feita a análise dos personagens Batman e Coringa, do filme O

Cavaleiro das Trevas, sob uma perspectiva dos valores de bem e mal, segundo conceitos de

Friedrich Nietzsche e a base de heróis e vilões dos quadrinhos. Para chegar neste

aprofundamento, será contextualizada a história de Batman e Coringa nos quadrinhos, TV e

cinema, os heróis e vilões nas histórias em quadrinhos, a questão da interpretação de uma

obra, pela visão do leitor-modelo de Umberto Eco e finalmente analisar o filme, para chegar a

resposta do problema proposto.

4.1 BATMAN NOS QUADRINHOS

Criado para continuar o sucesso de Superman, Batman estreia nos quadrinhos em

1939, na revista de histórias policiais, Detective Comics. Inspirados no filme The Bat, nos

personagens Zorro e Sherlock Holmes e nos desenhos de uma máquina voadora de Leonardo

da Vinci, Bob Kane e Bill Finger concebem um personagem que iria servir de modelo para

tantos outros no mundo dos gibis. No início, suas histórias continham um teor sombrio e

violento, mostrando inclusive o morcegão atirando e matando vilões. Atordoado por

presenciar ainda quando criança, o assassinato de seus pais, Bruce Wayne decide estudar e

treinar para se tornar um homem de habilidades únicas e assim vingar-se. Recebendo

reclamações do excesso de violência, o desenhista Jerry Robinson cria Robin, um parceiro

adolescente para Batman, que traz certa dose de humor às histórias e ameniza as críticas.

Contudo, diante da Segunda Guerra Mundial, as revistas ainda traziam tramas violentas, com

direito a Batman entregando armas para soldados e matando humanos que foram

transformados em zumbis, acreditando que é um mal necessário, como é visto nas ilustrações

10 e 11 (VERGUEIRO, 2005).

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Ilustrações 10: Batman e Robin entregando uma arma nova para um soldado durante a II Guerra Mundial e Batman atirando no caminhão com zumbis e falando “Por mais que eu odeie tirar a vida de um ser humano. Eu receio que desta vez seja necessário!” Fonte: Curley (2005).

Na década de 50 as críticas à violência continuaram e o livro “The Seduction of The

Innocent” do médico Frederic Wertham catalisa um movimento para censurar as histórias em

quadrinhos. É criado então o código de ética dos quadrinhos, que usava o infeliz discurso de

querer preservar os valores da família e do bem, ignorando a liberdade de expressão e escolha,

e impondo do esdrúxulo ao absurdo nos quadrinhos. Como hoje a TV e jogos de Videogame

são apontados como os culpados por qualquer desvio de conduta, o sensual, menções a

defeitos físicos, personagens de terror, eram as causas da época. Para Wertham e companhia,

o mal nunca deveria prevalecer e o bem sempre iria triunfar, ou seja, era proibido retratar a

realidade, só era permitido o mundo do faz de conta, onde tudo acaba bem. As revistas que

seguiam as normas recebiam um selo na capa, afirmando que aquela edição havia sido

aprovada pelo código de ética, já as que contrariavam, eram boicotadas e duramente criticadas

(ABBADE, 2006). Com toda esta adversidade, as histórias começam ganhar um tom infantil e

personagens que serviam apenas para provar que Batman e Robin não eram um casal

homossexual, como afirmava Wertham. Mulher-morcego, Batmoça, Batcão e até um

Batduende que levava Bruce Wayne para outra dimensão para lutar com monstros e

alienígenas (BEATTY, et al. 2008, tradução nossa). A ilustração 12 traz estes personagens

reunidos, junto com o mordomo da família, Alfred, e Comissário da polícia de Gotham, Jim

Gordon.

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Ilustração 11: A família Batman, desenhada por Bob Kane Fonte: Tipton (2003).

Com este direcionamento Batman foi desagradando aos fãs e estava prestes a ser

cancelado, até que o editor Julius Schwartz chama o artista Carmine Infantino, e juntos

remodelam Batman, aumentando as vendas e o tornando um sucesso nas décadas de 60 e 70.

Apesar de nos quadrinhos a mudança ter sido clara, o seriado de TV, Batman, com Adam

West, no papel principal, levava ares cômicos e infantis, mas mesmo assim, foi um sucesso

estrondoso na época. Começa então a chamada Batmania, com os espectadores curiosos para

ver qual astro de Hollywood ia fazer uma ponta no episódio a semana ou qual bugiganga o

homem-morcego iria tirar do seu cinto de utilidades.

Em meados dos anos 70, nos quadrinhos, Dennis O’Neil e Neal Adams vão

acrescentando cada vez mais o status de detetive ao personagem, devolvendo o tom sóbrio às

histórias do herói. O’Neil e Adams resgataram a essência de Coringa, retratando sua

insanidade sem limites e também criaram um dos inimigos mais famosos do homem-

morcego, o vilão imortal Ra’s Al Ghul, também conhecido como Cabeça do Demônio.

(VERGUEIRO, 2005). Ra’s está vivo há centenas de anos graças ao Poço de Lázaro, algo

como uma fonte da juventude. Comandando a Liga dos Assassinos, o vilão tem como objetivo

proteger o planeta dos estragos do homem. Para deter estas ações nocivas do homem, O

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Cabeça de Demônio decide que boa parte da humanidade seja exterminada até que um

equilíbrio natural seja atingido. Estas histórias vão conquistando os fãs até a chegada de um

escritor que mudaria o mundo de Batman mais uma vez (MOREAU, 2007).

Bruce Wayne com 60 anos tentando reabilitar criminosos? Gotham dominada por

gangues e políticos corruptos? Superman o vilão? Em 1985 é lançada uma das obras mais

aclamadas do personagem, O Cavaleiro das Trevas. Frank Miller apresenta uma história onde

o herói está aposentado e isolado em sua mansão. Cansado de ser passivo, resolve voltar à

ativa e acabar com o crime, custe o que custar. Caçando os inimigos um a um, Batman é visto

pelos políticos conservadores, como um justiceiro incontrolável que não respeita as leis e que

precisa de um basta. E este basta tem uma capa vermelha, um uniforme azul com um

emblema de um S no peito. Na tentativa de capturar Batman, Superman toma uma surra

histórica, com direito a pontapé na cara, como pode ser visto na ilustração 13. No final o

Cavaleiro das Trevas forja a própria morte e se esconde num esconderijo subterrâneo, onde

começa planejar e treinar “[...] um exército...para trazer sentido ao mundo infectado por algo

pior que ladrões e assassinos”. (BRUCE WAYNE, apud MILLER, 1987, p. 49).

Ilustração 12: Batman dando um pontapé na cara do cordeiro obediente dos políticos norte-americanos, Superman Fonte: Miller (1987, p. 45).

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A década de 80 encerraria ainda, com duas “chaves de ouro”, A Piada Mortal de

Alan Moore e Asilo Arkham de Grant Morrison (BEATTY et al. 2008, tradução nossa). Estas

obras são marcas na construção do homem-morcego, sendo celebradas e tendo características

usadas como influência até hoje, inclusive para os filmes Batman Begins e Batman O

Cavaleiro das Trevas do diretor Christopher Nolan e o roteirista David S. Goyer (LOEB;

SALE, 2008).

Dos anos 90 até os dias de hoje, o tom sombrio, solitário e violento, é o que

permanece nos quadrinhos do herói (GUEDES, 2004). Entre as diversas histórias durante

esses anos, a mais conhecida e elogiada pela crítica e fãs, é a mini-série Batman – O Longo

dia das Bruxas, de Jeph Loeb, lançada entre 1996 e 1997, em 13 edições (LOEB; SALE,

2008). Com desenhos de Tim Sale, a trama é recheada de suspense, com Batman, Jim Gordon

e o promotor de justiça Harvey Dent, em busca de um assassino que sempre comete um crime

em um feriado. Intrigas entre famílias mafiosas de Gotham, vilões fugindo do Asilo Arkham,

completam o verdadeiro pano de fundo da história, que é a luta pela justiça e o que isso

implica em três personagens. Batman cada vez mais incentivado pelo sentimento de vingança

encontra dificuldades de encontrar o ponto certo entre justiça e vingança. Jim Gordon se

distancia da família enquanto se aproxima de solucionar casos e Harvey Dent, determinado a

restaurar a paz na cidade, vai perdendo a fé na justiça, e quando vira vítima pela falta dela,

resolve criar as suas próprias regras, as suas leis, tornando-se o Duas-Caras. O diretor

Christopher Nolan e o roteirista David S. Goyer, afirmam que de todas as histórias de

Batman, esta foi a que mais influenciou na construção dos dois filmes da Batfranquia,

principalmente no Cavaleiro das Trevas. A luta de Dent, os problemas pessoais de Gordon, o

clima noir dos desenhos, entre outras características, serviram como referência, inclusive uma

frase usada por Batman no conto, é usada no filme, para promover a campanha de Harvey a

promotor de justiça: “Eu acredito em Harvey Dent” (LOEB; SALE, 2008, p. 376).

Dentre todos os vilões, de todas as décadas, sempre só teve um que realmente

conseguia tirar o morcegão do sério. Um personagem, que apesar de poder parecer o

contrário, de bobo não tem nada. Se a cidade de Gotham é um circo de loucos criminosos, não

há dúvida quem é o palhaço.

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4.2 CORINGA NOS QUADRINHOS

Criado por Jerry Robinson, Bill Finger e Bob Kane, Coringa fez sua primeira

aparição na revista Batman #1, em 1940. A aparência do personagem foi inspirada no

personagem Gwynplaine, do filme The Man Who Laughs, de 1928. Na história, Gwynplaine

é filho de um homem que insultou um Rei. Revoltado, o rei ordena que matem o homem e

torturem seu filho. Então um médico desfigura o rosto de Gwynplaine, deixando-o com um

sorriso aterrorizador e permanente, como pode ser visto na comparação entre o personagem

(ilustração 14) e primeira imagem de coringa nos quadrinhos (ilustração 15) (TIPTON, 2004).

Ilustrações 13: Gwynplaine, com o sorriso permanente, interpretado pelo ator Conrad Veidt no filme The Man Who Laughs, de 1928. A primeira imagem do Coringa nos quadrinhos Fonte: Tipton (2004).

Inicialmente, Coringa tinha caráter extremamente violento e não era tão cômico,

inclusive assassinando e torturando suas vítimas, que mesmo depois de mortas ficavam com

um sorriso, o que veio se tornar a marca registrada do personagem. O sucesso foi instantâneo,

e os embates com Batman eram praticamente mensais. Mas como todos os personagens das

HQ’s, na década de 50, ele sofreu com o Código de Ética dos Quadrinhos, tendo a

participação quase que extinguida, devido a sua aparência e atitudes, consideradas ofensivas

pelas normas. Na década de 60 foi retornando às paginas, com ares de comédia pastelão, em

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conseqüência ao sucesso do seriado de TV, e finalmente nos anos 70, o escritor Dennis

O’Neil e o artista Neal Adams, resgatam o verdadeiro espírito do Palhaço do Crime. Um

assassino cruel, insano, que segue apenas as suas próprias regras. Nesta época o vilão chegou

a ter sua própria revista, tamanha sua aprovação dos fãs (BASÍLIO, 2008).

A década de 80 é com certeza, a mais especial e importante na história do

personagem. Em Asilo Arkham, quase leva Batman a loucura, usando pressão psicológica para

mostrar que os dois não são tão diferentes. Na polêmica Morte em Família, a editora DC

surpreende ao deixar o público escolher o destino de Robin através de uma votação por

telefone. Eram duas opções, ele continuava vivo, ou morria. O resultado comprovou o quanto

o garoto-prodígio não era adorado pelos fãs. O Robin Jason Todd é espancado por Coringa

com um pé de cabra e amarrado junto a uma bomba, que explode um pouco antes do Homem-

morcego chegar. A imagem de Batman carregando Robin morto impressiona com os traços

que caracterizam a violência que o jovem foi submetido, como é visto na ilustração 15.

Ilustração 14: Robin é brutalmente assassinado por Coringa na história Batman – Morte em Família, de 1989 Fonte: Assis (2009).

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Apesar de serem duas grandes histórias, nem elas e nenhuma outra atingiu o sucesso

e o primor de A Piada Mortal, de Alan Moore e Dave Gibbons. Lançada em 1988, ela

apresenta uma origem para Coringa, que até hoje, é a mais aceita pra fãs e críticos. Um

assistente de laboratório abandona o emprego para tentar a carreira de comediante. Sem

sucesso, com uma esposa grávida e dívidas, ele começa a se desesperar por uma oportunidade

de mudança. Dois criminosos o convidam para ajudar a assaltar uma fábrica de baralhos que

fica ao lado da fábrica química onde ele trabalhava. Como sabia o caminho para chegar de

uma fábrica a outra, aceita. No dia do assalto, recebe a notícia que sua esposa sofrera um

acidente testando um aquecedor de mamadeiras e acabara falecendo. Incrédulo e pressionado

pelos bandidos, continua com o plano. Para despistar a polícia, na noite do crime, usa uma

máscara igual a de um bandido procurado pela polícia, o Capuz Vermelho. Enquanto estão

atravessando a fábrica química, um guarda os avista e começa atirar, já chamando reforço. Os

dois criminosos acabam sendo mortos enquanto o ex- assistente de laboratório tentando fugir,

sem enxergar direito por causa da máscara, acaba ficando cara a cara com Batman, que deduz

que ele é o famoso bandido Capuz Vermelho.

Tentando fugir do super-herói, acaba pulando em um tonel de produtos químicos que

deixam seus cabelos verdes, a pele brutalmente branca, seus lábios vermelhos e ele totalmente

enlouquecido. O então comediante sem graça torna-se o verdadeiro Bobo da Corte de

Gotham, O Coringa. No presente, o já formado e cada vez mais insano Coringa, foge do Asilo

Arkham, invade a casa do Comissário Gordon e atira em sua filha, deixando-a paraplégica.

Não satisfeito, tira fotos dela nua e ensangüentada para depois torturar Gordon. Respondendo

a garota despida e baleada no chão, ele afirma que está cometendo essas atrocidades, para

“provar algo”. Ele quer provar que qualquer ser humano pode perder todo seu conceito de

moral se for exposto a uma experiência traumática, seja perder a esposa grávida, ou ter os pais

assassinados.

É neste ponto que o escritor Alan Moore consegue dobrar a idéia de herói e vilão nos

quadrinhos, apontando que Batman e Coringa, não são tão diferentes assim. No final da

história, quando captura o criminoso, o homem-morcego afirma que entende a razão do seu

sofrimento e oferece uma trégua, perguntando se ele não quer ajuda. A resposta? Não poderia

ser diferente: uma piada. E pela primeira vez, Batman não ri, mas gargalha, junto com

Coringa.

Dos anos 90 até os dias de hoje, diversas outras histórias foram contadas nas páginas

dos quadrinhos, mantendo a violência e ironia como características do Coringa. Mas o que

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realmente trouxe o personagem com força total para os fãs, não estava nos gibis. Estava na

telona.

4.3 CINEMA E TV

O vigilante de Gotham começou sua trajetória no cinema, na década de 40, com

curtas-metragens que animavam o público toda semana, em sessões vespertinas. A partir de

1943, Lewis Wilson encarna o personagem principal, em uma série de 15 filmes, batizada “O

Morcego”. Com uniformes colantes e fantasias desajeitadas, Batman e Robin desvendavam

mistérios de uma forma mais cômica do que policial. Em 1949, o ator Robert Lowery assume

o uniforme do homem-morcego, mantendo as principais características do seu antecessor: um

herói atrapalhado, desconfortável em seu traje, que provocava mais gargalhadas do que

suspiros ou pavor (AGUIAR, 2002a).

Na década de 60, estréia o seriado para TV “Batman”, estrelada pelo rechonchudo

Adam West e o menino prodígio Burt Ward. Assumidamente uma comédia, o programa foi

sucesso instantâneo, gerando inúmeras aparições de celebridades da época como Bruce Lee,

Sammy Davis Jr e Jerry Lewis. No ano de 1966, chega ao cinema, o filme derivado do

seriado. Praticamente um episódio longo do seriado, o longa-metragem apresenta as mesmas

características do programa de TV. Bat-acessórios, vilões engraçados, legendas para cada

soco (como é visto na ilustração 16) e uma dupla de heróis se safando no final, não

importando o tamanho da enrascada (MORELLI, 2009).

Ilustração 15: Batman e Robin trocando socos com os bandidos no filme de 1966 Fonte: Morelli (2009, p. 14).

Mais de 20 anos depois, em 1989, o diretor Tim Burton assume a franquia e

reformula completamente o tom do personagem. Sombrio e aventureiro, Batman – O Filme

foi sucesso de críticas e acabou abrindo caminho para adaptações mais fiéis às histórias em

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quadrinhos. O ator Michael Keaton interpreta um Batman durão, de poucas palavras e muitos

sopapos, lembrando os tempos de quando o personagem era escrito por Frank Miller. Jack

Nicholson como Coringa rouba todas as cenas em que aparece: engraçado, assustador e

enlouquecido, acaba deixando Keaton como um mero coadjuvante.

Apesar da boa retomada, o filme se perde três pontos principais. Michael Keaton não

tinha a mínima semelhança com o personagem, tanto fisicamente como na interpretação da

personalidade complexa. O Coringa é o assassino dos pais de Batman: uma manobra triste

que desrespeita a história das HQ’s, e que faz com que a palavra clichê pareça um elogio.

Coringa morre no final: Gotham sem seu Bobo da Corte? Difícil. O palhaço do crime não é só

principal inimigo do morcegão como é um dos mais conhecidos vilões de toda a história.

Burton e Keaton voltam em 1992 com Batman – O Retorno, agora com Pinguim e

Mulher-Gato nos papéis de vilões. Melhor que o primeiro, a continuação ainda sim, segue

com algumas patinadas do diretor. Novamente o herói fica no segundo plano e deixa Danny

DeVito (Pinguim) e Michelle Pfeiffer (Mulher-Gato) carregarem o filme nas costas. O

problema, além de o ator principal ter a mesma expressão facial para todo tipo de sentimento,

é mais uma vez a origem dos personagens. Pingüins do esgoto resgatam um bebê deformado

abandonado em um rio. Uma mulher que cai de um prédio tem o corpo mordido e lambido

por gatos e acaba ganhando super força, agilidade e algumas vidas a mais. Mesmo gostando

do direcionamento que foge a comédia, os fãs acabam insatisfeitos com a produção e ficam

felizes quando o diretor anuncia que está largando a franquia. Mal sabiam os fãs, que a pior

fase ainda estava por vir.

O estadunidense Joel Schumacher é sem dúvida alguma a pessoa mais odiada por

qualquer pessoa que goste um pouco de Batman e quadrinhos. Abraçado a uma estética

debochada e a ignorância total em relação ao personagem, ele dirige os dois maiores fracassos

do herói no cinema. Batman Eternamente estréia em 1995, com Val Kilmer no papel

principal. Mais uma vez a inexpressão toma conta da estrela do filme. Chris O’Donnel dá vida

a Robin, enquanto Jim Carrey (Charada) e Tommy Lee Jones (Duas-Caras) encarnam os

vilões. Excesso de cores, de personagens, falhas no roteiro, não se comparam aos mamilos

pontiagudos na armadura de Batman e uma das cenas mais desnecessárias na história do

cinema, um close nas nádegas de Batman, enquanto ele veste o uniforme. O filme tem ainda a

participação dispensável de Nicole Kidman, como uma psicóloga que tem interesse em Bruce

Wayne. No final, o Duas-Caras morre, Charada acaba sendo vítima da sua própria arma, uma

espécie de liquidificador que lê a mente das pessoas, e enlouquece. Antes dos créditos finais,

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Batman e Robin, aparecem correndo em busca de novas aventuras. Infelizmente Joel

Schumacher trouxe estas novas aventuras dois anos depois.

Batman & Robin, estreou nas telonas em 1997. Schumacher apresenta um carnaval

de plumas e néon, transformando Gotham em um baile de máscaras onde ganha quem tiver a

mais colorida. Sai Val Kilmer e entra George Clooney para a impossível tarefa de fazer o

personagem render. Chris O’Donnel volta como Robin, enquanto o cartel de inimigos fica por

conta de Uma Thurman no papel de Hera Venenosa e Arnold Schwarzenegger como Sr. Frio.

O filme traz ainda a Batgirl (Alicia Silverstone) patricinha e o monstrengo Bane, ambos

totalmente fora do conceito das HQs. Não é a toa que qualquer continuação do série é

proibida, e toda a franquia é colocada na gaveta por oito anos, até que um diretor inglês,

conhecido pelos seus filmes com enredos de conflitos psicológicos, chega para salvar o dia.

Christopher Nolan estava ganhando reconhecimento pelos filmes Amnésia, de 2000,

e Insônia, de 2002, quando foi escolhido para reiniciar a franquia de Batman e Cia. Ao lado

do roteirista e fã de quadrinhos David S. Goyer, Nolan traz Gotham ao mundo real. Inspirados

em HQs antigas, como Batman: ano um, de Frank Miller, Nolan e Goyer apresentam um

mundo crível, com problemas atuais, personagens densos e um belo começo de história. O

elenco é recheado de boas atuações, com a exceção da dispensável Katie Holmes no papel de

da amiga de infância de Bruce Wayne, Rachel Dawes. Christian Bale acerta em todas facetas

do personagem, representando tanto um Batman violento e sombrio como um Bruce Wayne

dividido entre o mundo da ostentação com do medo, provocado por traumas familiares. O

antagonista da história é um velho personagem dos quadrinhos, R’as al Ghul, interpretado por

Ken Watanabe. O pupilo de Ra’s, Henri Ducard (Liam Neeson), resgata Bruce de uma prisão

e o oferece um treinamento com Liga das Sombras, uma sociedade secreta que afirma

combater o mal. Após rebelar-se contra a Liga, Bruce retorna a Gotham e encontra o crime

dominando a cidade. Atuando ao lado do comissário Gordon (Gary Oldman), com os

conselhos do Mordomo Alfred (Michael Caine) e a ajuda do cientista Lucius Fox (Morgan

Freeman), Bruce torna-se Batman e começa uma luta contra a corrupção e a criminalidade.

Ao longo do filme a Liga das Sombras e Henri Ducard voltam à cena em busca de

vingança, enquanto o Espantalho espalha o terror pela cidade com um gás tóxico que desperta

os piores pesadelos nas pessoas. Ou seja, se Batman queria lutar, nessa história não falta

oportunidade. Cenas de brigas, efeitos especiais, e parafernálias a parte, o ponto crucial do

filme, é a construção do personagem Batman. De onde ele veio, como ele é e o que ele quer.

Vingança é a melhor das respostas. Ele busca vingança contra qualquer figura que lembre o

bandido que assassinou seus pais. Esta complexidade do personagem é algo incomum aos

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então ditos mocinhos. A razão não é simples e o personagem se vê diversas vezes confuso,

sem ter certeza do que realmente está fazendo e por que está fazendo. Assim, o diretor

Christopher Nolan começa a desmistificar o herói, para no filme seguinte, trazer à tona a sua

real natureza, O Cavaleiro das Trevas.

Depois de estabelecer a origem do personagem em Batman Begins, o diretor

Christopher Nolan apresenta no filme O Cavaleiro das Trevas a discussão do que motiva

Batman a fazer o que faz. Para tratar desta questão, ele usa o Coringa, um criminoso

descontrolado, e o promotor de justiça Harvey Dent, um advogado que busca extinguir a

corrupção da cidade de Gotham.

O filme começa com bandidos usando máscaras de palhaços assaltando um banco.

Detalhe: o banco é conhecido por guardar nos cofres, o dinheiro dos mafiosos de Gotham. Ao

longo do roubo, os assaltantes vão matando uns aos outros, esperando ganhar mais dinheiro já

que assim, menos pessoas vão dividir o montante. No final, apenas um deles continua vivo e

foge com todo o dinheiro: o Coringa. Enquanto isso Batman está lidando com o Espantalho e

alguns mafiosos além de proteger dois homens fantasiados como o próprio Batman, que

tentavam prender os bandidos. Depois de amarrar todos juntos, segue para o banco onde

houve o roubo. Lá, conversando com o seu amigo tenente Gordon, acha melhor não dar tanta

atenção ao Coringa e prefere continuar atrás dos grandes mafiosos da cidade.

Apesar de ficar correndo atrás dos bandidos, Batman afirma não querer continuar

com isto por muito tempo e vê no promotor de justiça Harvey Dent sua chance de aposentar o

uniforme. No intuito de saber se pode confiar em Dent, Bruce conversa com o promotor sobre

Batman. Dent é enfático ao dizer que o morcegão está fazendo um bom trabalho e que

provavelmente quem quer que seja Batman, não quer continuar caçando bandidos pelo resto

da vida: “Ou você morre como um herói ou você vive o bastante para se tornar o vilão”.

Enquanto isso, Mr. Maroni, um dos maiores gângster da cidade, reúne toda máfia de Gotham

para resolver o problema de todos terem seu dinheiro rastreado pela polícia. Durante o

encontro, Coringa entra pela porta soltando uma risada sarcástica e resolve mostrar que seu

humor é sem limites. Finca um lápis na mesa e diz que vai fazer fazê-lo desaparecer com um

truque de mágica. Irritado, um dos mafiosos manda seu capanga acabar com a brincadeira.

Quando o capanga chega perto, Coringa o pega pela cabeça e a empurra contra o

lápis, cravando o objeto na testa do infeliz coadjuvante do truque. Atônitos, os mafiosos

resolvem ouvir o que ele tem para falar. O palhaço propõe matar Batman, em troca ele quer

metade de todo o dinheiro deles. Crendo que ele é apenas um maluco, não aceitam. Nesta

cena, é quando o espectador conhece o verdadeiro Coringa criado pelo diretor e roteiristas do

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filme e o ator Heath Ledger. Nos quadrinhos, TV e em outras adaptações para o cinema, o

personagem era maléfico, mas seus atos cruéis não eram mostrados de forma tão explícita.

Quem esperava um Coringa como o de Jack Nicholson, recheado de humor, ou um

brincalhão como o da série de TV dos anos 60, ou até um mais sério como os de Alan Moore

e Frank Miller, é surpreendido por um truque de mágica macabro dotado de uma violência

insinuante que lembra a ultraviolência do personagem Alex DeLarge no filme Laranja

Mecânica, de Stanley Kubrick, baseado no livro homônimo de Anthony Burgess.7

Coringa, antecipando tudo, começa a matar pessoas e afirma que só vai parar quando

o verdadeiro Batman se apresentar, tirar a máscara e mostrar quem ele realmente é. O palhaço

do crime vai matando civis, policiais, uma juíza, sempre deixando uma pista da sua próxima

vítima. Gordon descobre que o prefeito é o próximo alvo e intensifica a segurança em um

evento público o qual o político irá discursar. Mesmo assim Coringa consegue furar o

esquema e atira em direção ao prefeito, mas Gordon se joga na frente, sendo atingido. Harvey

Dent captura um comparsa de Coringa e o ameaça com uma arma na cabeça para conseguir

informações. Sem obter respostas, resolve tirar na moeda, a sorte do comparsa: “Cara, você

mantém a sua cabeça. Coroa, não deu sorte”. Antes de sair o veredicto, Batman aparece e

detém Dent, afirmando que ele é a única esperança de Gotham contra os criminosos e que ele

não pode desistir agora. O homem-morcego decide então se entregar a polícia e mostrar que

na verdade é o playboy milionário Bruce Wayne. Assim Coringa ia parar com os assassinatos,

Dent tomaria a frente da luta pela justiça e Bruce, enfim poderia ficar com sua amada, Rachel

Toda esta

cena do lápis, é praticamente uma mensagem do diretor para o público: eles precisam ter

medo do Coringa. Sobre esta relação entre autor e público, Eco (2002) afirma que a noção de

interpretação sempre envolve uma comunicação entre a estratégia do autor e a resposta do

observador.

Mr. Maroni e companhia ficam sabendo durante esta reunião, que todo o seu

dinheiro está com Mr. Lau, um chinês que descobriu que Gordon ia apreender todo dinheiro

rastreado, e levou os dólares para China, onde nenhum policial poderia prendê-lo. Batman

consegue capturar e trazer Lau de volta a Gotham, e com isso Harvey Dent e sua namorada, a

advogada Rachel Dawes, conseguem provas contra toda a máfia, levando-as a prisão e

repensar na oferta daquele maluco de terno roxo e rosto maquiado.

7 No filme Laranja Mecânica (1971), o personagem Alex DeLarge e seus amigos são viciados em atos de violência explícita. Roubam, brigam e matam. Em uma das cenas, espancam um homem paraplégico e o obrigam a assisti-los estuprar a sua esposa.

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Dawes. A atual namorada de Dent é amiga de infância de Bruce e uma das poucas pessoas

que sabem que ele é Batman.

Com a população aterrorizada pelas mortes e pedindo que Batman se entregue,

Harvey Dent resolve assumir a identidade do vigilante e em uma coletiva afirma que é o

herói. A polícia o leva em custódia sem saber seu verdadeiro plano: Dent sabia que Coringa

queria pega-lo. Enquanto estivesse sendo levado para prisão, o palhaço iria atrás dele e esse

seria o momento perfeito para que Batman o capturasse. O plano é certeiro. O tenente Jim

Gordon, que tinha forjado a própria morte, para despistar atenção, prende Coringa enquanto

ele tentava atacar Batman. O plano só tinha uma falha. Ser preso era exatamente o que

Coringa queria. Ao mesmo tempo em que ele é preso, Harvey Dent e Rachel Dawes são

sequestrados. Na delegacia Batman age antes de falar. Antes das perguntas, distribui socos e

bofetadas para intimidar o criminoso. Coringa sente prazer em ver Batman totalmente acuado

sem ter nenhuma alternativa para conseguir a resposta de onde está o promotor e Dawes. Ao

ver Batman descontrolado e tomado de raiva, Coringa diz que ele terá que fazer uma escolha

entre Dent e Dawes: cada um está em um lugar diferente e Batman só vai conseguir salvar um

deles. O palhaço diz os endereços e Batman corre para salvar Dawes e manda Gordon salvar

Dent. Mas Coringa não parava com as piadas: ele disse os endereços invertidos para Batman,

que ao chegar ao local vê Dent amarrado, caído no chão, com o rosto coberto de gasolina. Os

dois lugares explodem ao mesmo tempo. Em um, Dent está na rua agonizando com seu rosto

em chamas por causa da explosão. No outro, Gordon não chega a tempo e Rachel Dawes

morre. Coringa acaba tirando Mr. Lau da cadeia e fugindo. Em um esconderijo, mata Mr. Lau

e queima a sua parte do dinheiro que recebeu dos mafiosos na frente de um deles, que

questiona a razão daquilo. Coringa diz não se preocupar com o dinheiro e que agora ele é o

dono da cidade.

O “dono da cidade” vai ao hospital onde Harvey Dent, com metade do rosto

dilacerado, está se recuperando. Com Dent amarrado, Coringa começa a explicar que não teve

participação na morte de Rachel, e que os verdadeiros culpados foram os mafiosos. Com o

discurso que ele não planejou nada daquilo, Coringa convence Dent que a culpa de Rachel ter

morrido, foi dos mafiosos e da polícia, que eram os verdadeiros corruptos da cidade. Após

sair do hospital, Coringa anuncia para população que o jogo dele começou e quem não quiser

jogar, que saia da cidade. Mas alerta que as estradas e as pontes não boas opções. As pessoas

correm para barcas para tentar fugir de qualquer atentado.

O problema é que são apenas duas barcas. E além dos civis, a polícia não queria

correr o risco de o Coringa libertar os presos da cidade. Então fica dividido: em uma barca os

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civis, e na outra os presidiários. Quando as barcas já estão a caminho pra fora da cidade, uma

voz horripilante entra na transmissão do alto falante. Coringa mais uma vez tinha antecipado

os movimentos das pessoas. As duas barcas estavam lotadas de explosivos sendo que o

detonador de cada barca estava na outra, ou seja, os presidiários com o detonador dos civis e

os civis com a chance de se tornarem presidiários. O palhaço avisa que uma das barcas deverá

explodir a outra até a meia-noite ou ele explodirá as duas. As pessoas nas duas barcas

começam a ficar agitadas querendo tomar alguma atitude, sem ter certeza ainda do que

realmente querem. Enquanto Coringa falava para as barcas, Batman consegue rastrear seu

esconderijo e invade o local. Depois de lutar contra alguns capangas chega até Coringa, que

espera uma explosão para poder provar que todo ser humano pode ser corrompido, tudo que

ele precisa é uma chance. Nas barcas, os civis decidem explodir a outra, mas ninguém tem

coragem para apertar o botão, enquanto um dos presidiários pede o detonador e joga na água.

O relógio marca meia-noite e sem explosão, Batman ironiza Coringa dizendo que ele

falhou e que as pessoas não são como ele. Coringa tenta então detonar as duas barcas, mas

Batman o impede, amarrando-o de cabeça para baixo. Coringa diz: “acho que estamos

destinados a fazer isso para sempre”. Batman responde dizendo que as pessoas acabaram de

mostrar que ele está errado e que elas podem ser boas. Coringa então tira o Ás da manga. Ele

corrompeu o símbolo de honestidade e do bem da cidade. Harvey Dent agora é o criminoso, é

o Duas-Caras.

Depois de caçar a matar os policiais corruptos que ajudaram no seqüestro de Rachel,

Duas-Caras rapta a mulher e os dois filhos de Jim Gordon e anseia por vingança. Quando

Gordon os encontra, suplica para Harvey não machucá-los. Duas-Caras puxa o filho do

policial e encosta a arma na cabeça dele. Batman chega e pede para Harvey largar a arma. O

ex-advogado e agora assassino diz que vai agir por justiça e que ela será decidida pelo acaso,

na moeda. Primeiro Batman: Coroa. Um tiro certeiro no abdômen. Segundo, ele próprio,

Harvey Dent: Cara. Nada acontece. Terceiro e último, o filho de Gordon: antes de a moeda

cair, Batman derruba Duas-Caras, que despenca de um local de considerável altura. Batman

fica se segurando em uma mão e o menino na outra. O levanta até o alcance do pai, para

largar sua mão de apoio e cair ao lado de Dent. Gordon vai até os dois, ao ver Batman

levantando e Duas-Caras morto, afirma que eles perderam e o Coringa ganhou, porque ele

conseguiu corromper o cavaleiro branco de Gotham, conseguiu transformar Harvey Dent no

Duas-Caras. Batman então ordena que seja espalhada a notícia que foi ele mesmo quem

matou as pessoas assassinados por Dent, para que assim ninguém saiba que a última

esperança do bem da cidade no final tornou-se um criminoso. Gordon diz que não pode fazer

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isso porque Batman não matou ninguém, ele não é um assassino. “Ou você morre como um

herói ou você vive o bastante para se tornar o vilão” responde o homem-morcego. Enquanto

Batman foge, Gordon explica ao filho que Batman não é um herói, ele é o que Gotham

merece, um Cavaleiro das Trevas. Esta frase de Gordon, que encerra o filme, inevitavelmente

levanta uma questão: se ele não é um herói, seria então um vilão?

4.4 O BOBO DAS TREVAS E O CAVALEIRO DA CORTE

Antes de iniciar a análise do filme, é importante destacar o papel do espectador em

relação ao filme. O longa-metragem O Cavaleiro das Trevas pode ser atribuído a inúmeras

interpretações. Um bom suspense, um filme de ação demorado, uma obra prima fiel aos

quadrinhos ou até, uma discussão da moral, do bem e do mal. O que vai identificar e

caracterizar as referências da obra vai ser o conhecimento do observador, ou como descreve

Eco (2002), o Leitor-modelo.

Em primeira instância, para compreender minimamente o filme, deve-se ter uma

competência gramatical, para ouvir e entender os diálogos ou apenas ler as legendas. Além do

que está sendo explicitamente mostrado na tela, há questões mais complexas que estão

camufladas em signos, gestos e palavras, mas não são ditas. É neste momento que é exigido

conhecimento do leitor-modelo. O diretor Christopher Nolan junto com seus roteiristas David

S. Goyer e Jonathan Nolan construíram uma obra que requer um leitor-modelo rico em

determinadas informações e que as use para interpretar o filme, tornando a experiência de

assisti-lo mais completa.

Definitivamente uma pessoa que nunca tenha lido um gibi de super-herói ou não

tenha a mínima idéia de quem é Batman, pode ter grande apreço pelo filme e identificar

referências de suas experiências pessoais. Mas um espectador, que está familiarizado com a

história do personagem, que já leu os gibis como O Cavaleiro das Trevas, Watchmen, O

Longo dia das Bruxas, A Piada Mortal e Asilo Arkham, vai ter uma experiência mais

completa, podendo inclusive adicionar conteúdo à obra, o que Eco (2002, p. 42) denomina

“livre aventura interpretativa”.

Pode-se interpretar a relação psicanalítica entre Bruce Wayne usar o Batman como

uma forma de sublimar sua dor e vontade de vingança pela morte dos seus pais, ou também

pelos conceitos filosóficos de Nietzsche sobre o divino, sendo a cidade de Gotham Deus,

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Coringa o Diabo e Batman como um anjo que atravessa um conflito psicológico sem saber se

continua adorando seu Deus, mesmo sendo ignorado por Ele, ou se junta ao Diabo, ficando

livre das regras divinas e agindo com o único intuito de agradar a si mesmo. Neste trabalho,

como poderá ser visto agora, seguiu-se um caminho diferente.

A análise será focada na discussão de como a moral, o bem e o mal, estão

representados no filme O Cavaleiro das Trevas, através do seu enredo e personagens

principais. Como Chaui (2000, p. 436) lembra “toda cultura e cada sociedade institui uma

moral, isto é, valores concernentes ao bem e ao mal, ao permitido e ao proibido, e à conduta

correta, válidos para todos os seus membros”. Além disto, diversos filósofos como Kant,

Rousseau, Hegel e Descartes já conceituaram de diferentes formas estes valores. É importante

frisar que estes mesmos valores serão abordados nesta análise, unicamente pelo ponto de vista

do filósofo alemão Friedrich Nietzsche, que conceituou a moral, o bem e o mal, nas suas

obras, de forma complexa e tal que é possível relacionar com as questões discutidas no filme,

como poderá ser visto a partir deste momento.

A obra cinematográfica O Cavaleiro das Trevas apresenta um cenário incomum em

relação às histórias de super-heróis de antigamente. O filme é influenciado principalmente

pelos gibis: Watchmen (1986), Dark Knight (1985) e The Long Halloween (1996). Em vez de

um mocinho que quer defender os fracos e oprimidos contra um criminoso, temos um herói

perturbado psicologicamente e um vilão sem limites. Mas até que ponto os dois são tão

diferentes?

No início do filme, já se pode perceber que Batman não é muito querido pelo povo

de Gotham. A polícia o persegue, afirmando que ele não pode agir acima de lei, e deve

responder a ela como qualquer cidadão. Além disto, alguns civis começam a se fantasiar de

homens-morcego, para também combater o crime. Trabalho redobrado: Batman prende os

bandidos e ainda salva seus admiradores. Irritado por estar amarrado junto aos criminosos, um

dos fantasiados de Batman questiona o vigilante a razão de ele poder fazer isso e os outros

não: “qual a diferença entre nós?”. De maneira irônica, responde que pelo menos ele não está

usando almofada de Hóquei (protetor abdominal usados por desportistas praticantes de

Hóquei). Apesar de realmente possuírem uniformes diferentes, por que qualquer pessoa não

poderia também tornar-se um vigilante? Para Batman, isto seria uma concorrência, uma

disputa de espaço. Por mais que seja árdua a tarefa de lutar contra os outros diariamente, isto

motiva e realiza emocionalmente o herói. Assim, ele tem o controle da situação e o senso de

justiça estabelecido é o seu. É o que Nietzsche (2007a) chama de autoconservação. Ele não

está querendo proteger aquele homem fantasiado. Ele quer proteger a si mesmo de qualquer

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ameaça que possa limitar suas ações. Harvey Dent, promotor de justiça da cidade, não deixa

por menos, leva os criminosos à prisão, mas sempre buscando prender os chefes, os grandes

mafiosos da cidade. Dent cai nas graças do gosto popular e do próprio Batman, que enxerga

no promotor um aliado e no futuro, um substituto. Mas o que eles não contavam é que os

mafiosos eram o menor dos seus problemas. Um homem maquiado, de terno roxo, munido de

algumas balas, gasolina e caos, tinha chegado.

Durante todo filme Coringa é chamado de louco, aberração, um doido sem

escrúpulos. No início Batman acha que ele é apenas um criminoso normal, mas o seu

mordomo Alfred o alerta que ninguém realmente conhece Coringa. Batman diz que só precisa

descobrir o que ele quer. Alfred responde com uma história, sobre um homem que roubava

pedras preciosas e simplesmente as jogava fora. Ele não queria fortuna, sucesso, ele fazia isso

porque “alguns homens só querem ver o circo pegar fogo”. Coringa queima todo dinheiro que

ganha dos mafiosos, sempre usa a mesma roupa e não compra jóias. Ele quer ver Gotham

pegar fogo, e ele é a gasolina, o agente do caos. Então seria correto pensar que ele é o mal?

Talvez não. Nietzsche (2005, p.73-74) diz que “a maldade não tem por objetivo o sofrimento

do outro em si, mas nosso próprio prazer em forma de sentimento de vingança ou de uma

mais forte excitação nervosa, por exemplo”.

Na verdade, Coringa tem prazer em fazer o que faz porque o torna quem ele

realmente é. Um homem amoral, que não se direciona por valores e sim pelo simples

sentimento de prazer em realizar o que tem vontade. Nietzsche (2005) afirma que este prazer

não é bom nem mau, é um sentimento que está desprendido das conseqüências, o tornando

algo natural do homem que não foi condicionado por qualquer cultura que seja. Ele está sendo

a essência mais pura do homem, um super-homem. No livro Assim falava Zaratustra, o

filósofo alemão define super-homem como um homem sem Deus, um homem criador e não

criatura, e que ignora o próximo, dando valor apenas para O Eu, para o prazer. Coringa não

tem um Deus, não tem moral, ele não age para o mal nem para o bem, ele age para o Eu,

como rigorosamente afirma Nietzsche (2007a, p. 30) “Por trás dos teus pensamentos e

sentimentos, meu irmão, há um senhor mais poderoso, um sábio desconhecido que se chama

“Eu Sou”. É no teu corpo que ele mora. Ele é teu corpo”.

O palhaço afirma que Gotham merece uma classe de criminosos melhor que os

mafiosos que disputam dinheiro e poder. Eles não são diferentes das pessoas ditas honestas.

Todos eles foram condicionados a buscar algo como sucesso, poder, fama, alicerçados nos

valores de bem e mal. Mas para Coringa não basta ser o super-homem de Gotham, ele precisa

de outro, para poder divertir-se, para sentir prazer. Batman é o escolhido, mas obviamente não

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vai aceitar o discurso facilmente. Então em vez de falar, Coringa decide mostrar que todos os

homens são super-homens em potencial e tudo que eles precisam, é um empurrão. Nada

melhor para provar isto, do que pegar o símbolo da honestidade, da justiça e do bem, Harvey

Dent, e virá-lo totalmente do avesso.

Na ilustração 16, Coringa conversa com os mafiosos de Gotham, que procuram uma

solução para deter Batman.

Ilustração 16: Coringa e os mafiosos Fonte: Batman (2008).

Coringa começa a assassinar policiais, civis, juízes, e diz que só vai parar quando

Batman aparecer e mostrar sua verdadeira identidade. Enquanto Dent, afirma entender o

vigilante, a população se sente acuada e pede que ele se entregue para cessar a violência. Cada

vez mais a figura de herói vai se desmanchando. Aquele que lutava para manter a cidade livre

da corrupção e protegia as pessoas da violência, agora é visto como uma ameaça. Batman

decide fazer o que lhe é exigido, mas antes de agir, Harvey Dent afirma publicamente que é o

Batman, em mais uma manobra para tentar estabelecer a ordem na cidade, deixando o

verdadeiro homem-morcego livre para capturar Coringa. O plano dá certo. Justamente como o

palhaço do crime queria. Na cadeia fica frente a frente com Batman. Mal contra o bem? Não.

Super-homem versus super-homem.

Durante todo o enredo Batman permanece tentando salvar as pessoas, seja dos

mafiosos, do Coringa ou delas mesmas. O problema é que ele acredita estar fazendo isto pelo

bem, para ajudar as pessoas, quando na verdade ele é tão amoral quanto o próprio Coringa, a

única diferença é que Batman não enxerga isso. Nietzsche (2005, p. 47) conceitua: “a besta

que existe em nós quer ser enganada; a moral é mentira necessária, para não sermos por ela

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dilacerados”. Bruce Wayne é uma máscara enquanto Batman é o ser real, a besta que se apoia

em sensos morais para tentar controlar-se e não acabar virando o Übermensch, o super-

homem de Nietzsche. O Cavaleiro das Trevas não liga para dinheiro, fama ou de ser desejado

por mulheres. Ele faz o que faz por vingança, pela morte dos seus pais e essencialmente por

prazer, que para ele, é ser uma força criadora e controladora da ordem e justiça que ele

determinar, quando ele determinar. Zaratustra, o messias de Nietzsche (2007a) sustenta que o

prazer provém de tudo o que preserve o Eu, como a dominação, sensualidade e o egoísmo.

Apesar de acreditar estar agindo pelo bem dos outros, Batman se encaixa perfeitamente na

questão de como alguém é o que realmente é, de Nietzsche (2007b, p. 63): “Expressando

moralmente: amor ao próximo, viver para os outros e outras coisas pode ser a medida de

defesa para a manutenção do mais duro dos egocentrismos”. Ao longo do filme, Batman já

começa a duvidar do seu real papel em Gotham, mas é durante a conversa com Coringa

(ilustração 17) que as coisas começam a ficar mais claras para o vigilante noturno.

Ilustração 17: Coringa e Batman na prisão Fonte: Batman (2008).

No maior estilo Batman, o morcegão aparece por trás de Coringa, empurrando sua

cabeça contra a mesa e dando socos no palhaço que se diverte com a situação. Batman então

pergunta por que Coringa quer matá-lo. Depois de dar uma gargalhada horripilante ele

responde: “eu não quero matar você. O que eu iria fazer sem você? Voltar a roubar mafiosos?

Não, não. Você me completa”. E ele continua, dizendo que para as pessoas, Batman é como

ele, um louco que vai ser usado até quando elas precisarem. Coringa conclui sobre a moral da

sociedade: “as pessoas são tão boas quanto o mundo permite”. Assim ele tenta mostrar a

realidade para Batman, porque ele está tornando-se um super-homem, mas ainda não

compreendeu isto. Nietzsche (2007b, p. 150) elucida o que é a realidade para um super-

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homem: “ela não lhe é estranha, ele não fugiu a ela, ela é ela mesma, ela ainda carrega em si

tudo o que é terrível e questionável nela, e só com isso o homem pode ter grandeza...”. A

realidade de Batman é que ele faz tudo pela autoconservação. Ele não segue um Deus, código,

ou uma moral. Ele persegue o objetivo de realizar sua vontade de estabelecer a ordem a sua

maneira. Mesmo quando está pensando que está agindo por compaixão, está enganado:

[...] a compaixão não tem por objetivo o prazer do outro. Pois ela abriga no mínimo dois (talvez muito mais) elementos de prazer pessoal, e é, desta forma, fruição de si mesma: primeiro como prazer da emoção, a espécie de compaixão que há na tragédia, e depois, quando impele à ação, como prazer da satisfação no exercício do poder. Alem disso, se uma pessoa que sofre nos é bastante próxima, livramos a nós mesmos de um sofrimento, ao realizar atos compassivos. – À parte alguns filósofos, os homens sempre situaram a compaixão num nível baixo, na hierarquia dos sentimentos morais; e com razão. (NIETZSCHE, 2005, p. 73-73).

Mas Batman não quer ser como Coringa, e na tentativa de afastar qualquer chance

disto acontecer, agride Coringa. Ele não quer ouvir porque tem medo de compreender a

verdade, porém, a sua força física é como cócegas para Coringa, apenas o faz rir. Nada pode

ameaçá-lo, nada pode amedrontá-lo. Coringa não tem posses para serem tiradas, não ama

ninguém, nem a ele mesmo, porque não acredita em nada além da realidade imposta por ele.

O palhaço funciona como o que Nietzsche (1992, p. 49) definiria de “vontade de potência”.

Uma forma de energia que é a própria essência da vida. No caso do Coringa, uma potência do

caos em relação à ordem vigente. Se alguns homens estabeleceram normas para controlar a

sociedade, Coringa tirou todas as normas para libertar a sociedade. Cada um vivendo da

forma que realmente quer, sem pudor sem conseqüências. E ele sabe que o homem-morcego é

como ele, só precisa de empurrãozinho para admitir.

Para tentar convencer Batman da sua real natureza, Coringa faz mais um dos seus

joguinhos. Harvey Dent e Rachel Dawes foram sequestrados, e Batman só vai conseguir

salvar um deles. Ao escolher um, ele estará sentenciando o outro à morte. Alguns socos e

pontapés depois, Coringa informa os locais de cada um. Agora ele tem que escolher quem

salvar: o símbolo de esperança que pode deter os criminosos de Gotham, aquele que

representa a o bem, ou a mulher que ele diz amar. Batman não pensa duas vezes e vai atrás de

Rachel Dawes. Neste momento Coringa prova que o justiceiro age pelo prazer, mesmo que

preso a emoção ainda, e deixa de lado a razão a qual jura defender: a chance de uma Gotham

melhor.

Ao chegar ao local informado, Batman percebe o truque de Coringa, ao ver Harvey

Dent amarrado perto de latas de gasolinas e explosivos. Sem tempo de chegar a Rachel, tira

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Dent de dentro do prédio, que explode e respinga chamas no rosto de Dent. Ao mesmo tempo,

explode o local onde Rachel está, mas ninguém chega a tempo de salvá-la.

Dawe foi uma das poucas que conseguiu decifrar o conflito interno de Batman. Antes

de ser sequestrada, escreveu uma carta para Batman que apenas Alfred lê e para não magoar

ainda mais seu patrão, a destrói. Apesar de este ser um dos incontáveis gestos de afeto do

mordomo, a relação patrão-empregado nunca é alterada. Por mais que ele tenha ajudado a

criar Bruce e tenha sido muito próximo de seu pai, Alfred nunca deixa de ser um lacaio da

família Wayne e em nenhum momento deixa de usar o termo patrão, ao dirigir a palavra a seu

mestre. Nem nos momentos de descontração, ou em momentos de tristeza. E Bruce nunca

deixa de se comportar como mestre, como senhor. Na carta, Rachel diz que amava Dent e iria

casar com ele. E que quando ela tinha falado que ficaria junto com Batman quando Gotham

não precisasse mais dele, estava sendo sincera. Mas tinha chegado à conclusão que esse dia

nunca chegaria porque era ele que sempre precisaria de Batman. O único erro da Sra. Dawes

foi confundir quem este homem realmente era. Bruce nunca vai poder abandonar Batman

porque simplesmente não existe Bruce Wayne. O playboy milionário, dono da maior empresa

da cidade, o rosto mais conhecido de Gotham, o homem que aparenta apenas se importar em

como gastar dinheiro, esse é seu álibi perfeito. Quando seus pais foram assassinados, ele

morreu junto, e a partir daquele momento começava a nascer um novo ser, alguém que dali

em diante viveria por vingança, para saciar seus desejos de justiça ao seu modo. Tudo isto

para aliviar a própria dor, por prazer.

A ilustração 18 mostra Rachel Dawes (centro) com seus dois amados. Bruce Wayne

(à esq.) e Harvey Dent (à dir.).

Ilustração 18: Bruce, Rachel e Harvey Fonte: Batman (2008).

Uma das cenas do filme que retrata bem a dualidade de bem e mal no filme é a da

barca. A população de Gotham tenta fugir da cidade para escapar do Coringa. Após ele

ameaçar explodir as estradas e pontes, todos correm para o porto. O problema que é além dos

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civis, a polícia está retirando todos os presos da cidade, com medo que Coringa os solte. A

divisão é simbólica: os puros em uma barca, os malvados na outra.

Como sempre, uma piada do palhaço para causar aflição a todos. As duas barcas

carregam gasolina e explosivos, sendo que cada barca está com o detonador da outra. Os

passageiros têm até a meia-noite para explodir a outra barca para sobreviver. Se até a meia-

noite ninguém tiver tomado uma decisão, Coringa irá explodir as duas. Mais uma vez, o

roteiro bem amarrado de Christopher Nolan e David S. Goyer levanta a questão da moral.

Quem irá matar para sobreviver? Na barca dos civis, as pessoas decidem fazer uma votação

para decidir se mandam os presos pelos ares ou não. Homens e mulheres começam a

argumentar que são pessoas boas, e que os condenados já tiveram sua chance mas não

souberam aproveitar. Então para não morrer vale tornar-se justamente o que você condena?

Justamente como Coringa previa, colocando um pouco de caos, as pessoas começam a

mostrar quem elas realmente são.

Na barca dos criminosos, um certo alvoroço no começo, até que um dos presos, um

homem alto e fisicamente poderoso, pede o detonador para o policial: “dê-me isso que eu vou

fazer o que você deveria ter feito há 10 minutos”. Quando recebe o detonador, joga pela

janela, deixando a decisão com a outra barca ou Coringa. A questão da moral mais uma vez é

exposta, invertendo os papéis. Os criminosos, os pecadores, o mal da sociedade é quem toma

uma decisão de preservar a vida alheia. São eles quem têm compaixão. Então na verdade

quem é o bem? Quem é o mal? Eles são totalmente distintos a todo o momento? Esta cena

implica em todas estas questões, levantando a discussão do que torna uma pessoa do bem ou

do mal, e que dependendo do momento isto pode mudar. Um ladrão e assassino, pode praticar

o bem, quebrando a ideia de que estes valores estão bem separados, como no caso do filme,

onde o preso (mal) salva a vida de centenas de civis (bem), e os civis, depois de uma votação,

aceitam matar os presos para poderem sobreviver.

Outro ponto interessante é a escolha de quem vai ser o encarregado de detonar a

outra barca. Na hora de apertar o detonador, nenhum civil tem coragem, inclusive um homem

que chega a segurar a chave para detonar, mas não consegue. Os ditos corretos, e pessoas do

bem, são quem decidem pelo pecado, matar o próximo. O problema é que nenhum deles tem a

coragem de concretizar a ação. Quando o homem comum se sente acuado, sem coragem de

falar, fazer ou tomar partido de algo, apela para a democracia. Afinal, não importa a decisão

final, não foi ele quem decidiu, foram todos. É como se a democracia desse o aval para eles

cometerem algo que considerem imoral. Nenhum deles vai sentir culpa, porque para eles foi

algo justo a se fazer, foi o que a maioria queria, foi para o bem maior. Porém, no momento de

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ser o carrasco e concluir a decisão, alguns falham, porque por mais que tenha sido votado por

todos, a decisão final está em suas mãos, apenas nas suas. Esta cena do filme é praticamente

um deboche deste conceito de democracia, pois exemplifica como ela é deturpada pelo

homem, que afirma usá-la para o bem de todos, quando inevitavelmente ela vai ser usada para

o benefício de uns e prejuízo de outros.

Para Nietzsche (1992, p. 115-116) a democracia é a herdeira do cristianismo, o

homem tenta usá-la como substituição da vontade divina, priorizando o coletivo e não o Eu:

“o movimento democrático representa não apenas uma forma de decadência da organização

política, mas também uma forma de decadência, isto é, uma diminuição do homem, uma

mediocrização, um abaixamento de seu valor”. Definitivamente não existe um super-homem

em uma das barcas. Segundo Nietzsche (2007a) os homens foram castrados a vida inteira

pelas mais diversas formas de condicionamento: igreja, escola, pais entre outros. Castrados no

sentido de não terem um comportamento ativo e sim passivo, de vítima, como manda a bíblia:

se baterem em um lado da sua face, você deve oferecer o outro, e não resistir. O homem deve

venerar um ser superior e adorar o próximo, exatamente o contrário de um Übermensch, que

não aceita valores supremos como bem e mal, e entende a autoconservação como o essencial:

“essa única moral que foi ensinada até hoje, a moral da renúncia-a-si-mesmo trai uma vontade

de fim, nega a vida em seus fundamentos”. (NIETZSCHE, 2007b, p. 152).

As pessoas daquelas barcas não estavam prontas para aceitar a realidade, preferem

acreditar que estão fazendo tal coisa porque é o certo a se fazer. Negando totalmente um

mundo além deste, qual seria o problema de querer conservar a própria vida? Admitindo não

existir algo além da vida terrena e assim excluindo-se os sensos morais que as religiões

impõem o elemento mais importante para o ser humano seria a sua própria existência. O bem

maior seria o seu, a autopreservação. Cometendo qualquer ação que o prejudicasse, o homem

estaria negando o ser onipresente e potente a quem responde: ele próprio. Se uma das barcas

explodisse a outra, de que adiantou para os mortos preservarem o próximo? Não sobraria nada

além dos que sobreviveram para contar a história e continuar com suas vidas, preservando-as

sempre que precisarem.

Batman acredita que aquelas pessoas provaram algo a Coringa, que ele está sozinho e

ninguém é igual a ele. Mas o justiceiro não sabia que Coringa tinha ido ao hospital prestar

uma visita. Vestido de enfermeira, ele invade o quarto de Harvey Dent (ilustração 19), e

começa um diálogo como promotor, para convencer que não teve culpa na morte de Rachel

nem do acidente com o rosto de Harvey. Coringa quer usar ele para reafirmar a ordem do

caos.

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Ilustração 19: Coringa visita Duas-Caras no hospital Fonte: Batman (2008).

O palhaço afirma que estava preso quando o casal foi sequestrado e por isso não

poderia ter participado da ação. O criminoso explica que a polícia, Gordon e os mafiosos que

têm culpa, porque eles que ficam planejando a todo o momento o que vão fazer para controlar

as pessoas. E define-se como um cachorro que persegue carros: “eu simplesmente faço as

coisas”. Coringa fala que foi impressionante o que ele fez com uns barris de gasolina e

algumas balas. Na verdade é como se ele colocasse os barris pela cidade e acendesse o

fósforo, mas quem jogaria o fósforo seriam as próprias pessoas, atordoadas, sem saber o que

fazer. Como ele próprio diz, quando o que foi planejado não ocorre, as pessoas perdem a

cabeça: “se você introduz um pouco de anarquia e perturba a ordem vigente, tudo se torna um

caos. Eu sou um agente do caos. E sabe qual a chave para o caos? É o medo”. Nietzsche

(2007a) considera que as pessoas precisam ter o caos dentro delas para atingir a realidade.

Desprender-se da moral, valores supremos, ao sobrenatural. Assim, não importa como o ser

humano vai agir, seja por ira, amor ao próximo ou maldade. Porque ao libertar-se destes

conceitos, não importa o meio, o fim é sempre o mesmo: a autofruição. Exatamente a essência

de um cachorro que persegue carros ou de um homem que simplesmente faz as coisas.

Neste momento do filme Coringa acaba com qualquer resquício de Harvey Dent

naquele homem. Com metade do rosto dilacerado, deixando a sorte de uma moeda definir o

destino das pessoas, nasce Duas-Caras. Um ser amoral, que só quer vingança contra o mundo

e que sai do hospital matando civis e policiais. Uma criatura. O criador é um super-homem

não tão sério que adora piadas.

Numa das cenas mais importantes do filme, Coringa explica para Batman como o

fato de as pessoas das barcas não terem se explodido não tem tanta importância. O que ele

mais queria ele conseguiu. O cavaleiro branco de Gotham, o homem que estava prendendo

todos os mafiosos, que não burlava as leis, a esperança, o símbolo da ordem de Gotham foi

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corrompido. Usando uma jogada de câmera, a cena mostra Coringa preso por um fio

amarrado no pé, de cabeça para baixo conversando com Batman. Enquanto ele conta como

conseguiu transformar Harvey no Duas-Caras, a câmera vai girando até o ponto que quando

ele conclui seu discurso, a sensação é que ele está em pé, ou seja, conseguiu virar Gotham do

avesso (ilustração 20).

Ilustração 20: Coringa virando Gotham do avesso Fonte: Batman (2008).

Coringa ainda profetiza: “Você não me mata por um senso de falso moralismo

inapropriado e eu não vou matar você, porque você é muito divertido. Acho que você e eu,

estamos destinados a fazer isso para sempre”. Este diálogo com o efeito visual sintetiza toda a

questão do filme. Coringa tentando convencer Batman o tempo todo de que ele também é

amoral e que qualquer um pode ser tudo o que a pessoa precisa é algo que exclua sua

necessidade de seguir uma ordem, um código. O homem-morcego acreditando que luta só

pelos outros, pelo bem da cidade de Gotham. A mesma cidade que antes o chamava de

salvador e agora queria sua cabeça, porque ele era um louco que não respeitava as leis. Como

Coringa, a aberração que corrompeu o garoto de ouro da cidade, criando mais um louco, que

também seria caçado.

Nietzsche (1992, p. 89) conclui “quem deve enfrentar monstros deve permanecer

atento para não se tornar também um monstro. Se olhares demasiado tempo dentro de um

abismo, o abismo acabará por olhar dentro de ti”. No caso de Batman, ele é o próprio abismo.

Por isso reage com violência quando Coringa começa a pontuar as semelhanças entre os dois.

O então herói segue a trama inteira num conflito psicológico, buscando um substituto para

ele, quando na verdade, não importa o que acontecer, ele nunca vai aposentar o uniforme,

nunca vai renunciar-a-si-mesmo. No momento em que fizer isso, perderá toda fonte de prazer

que tem. A eterna luta pela vingança dos pais, a capacidade de estabelecer a sua ordem, fazer

a sua justiça. Nietzsche (2007a, p. 13) pontua “o homem é uma corda estendida entre o animal

e o super-homem”. No filme Cavaleiro das Trevas, o Coringa é o super-homem, uma espécie

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de verdade absoluta, uma energia que segue em frente apenas alimentando-se daquilo que

necessita para viver, o prazer. Todos os homens que seguem os códigos, as leis impostas por

determinada sociedade, são o meio da corda. Tem o instinto animal, desejos vigorados pela

necessidade, mas castrados pelas normas da sociedade, o que impede de chegarem ao final da

corda. Batman está praticamente no final da corda, servindo o que seu corpo exige, mas fica

no conflito de não ter certeza se cede a toda vontade de autoconservação ou se aceita aos

códigos que a sociedade ordena sedando a verdadeira besta que possui dentro de si. Para

arrastar Batman para o final da corda, Coringa traz primeiro um homem que seria o exemplo

maior do meio da corda. Mostra como foi fácil atrair Harvey Dent para o lado do super-

homem.

O filme termina com Batman matando Harvey Dent e falando para Gordon que não

conte a ninguém o que Dent fez, pois assim o Coringa ganharia. Então os dois combinam que

o ex-tenente, agora comissário Gordon, irá afirmar que Batman matou os civis e policiais,

levando todos a crer que Dent nunca foi corrompido. Antes de subir na moto para fugir,

Batman cita o próprio Dent: “Ou você morre um herói, ou vive o bastante para ver você

mesmo se tornar o vilão”. Um conceito, mais simples que a visão de Nietzsche sobre a moral,

representa a dualidade que é retratada ao longo do filme e concluída no último instante do

longa-metragem. O herói virando o vilão. Para continuar sua luta contra o crime organizado e

agentes do caos, ele precisa virar o antagonista.

É interessante como de fato ele vira o vilão, tanto no sentido mais simples de herói

versus vilão como vira aquilo que ele acredita ser o mal, na luta moral. Em termos simples

porque ele matou representante do bem e admite mentir para sociedade para o que ele julga

ser para um bem maior. No caminho da moral, e aí é que está o ponto principal do filme,

Batman nega a verdade para Gotham porque eles precisam ter sua “fé recompensada” e a

verdade, “às vezes não é o bastante”. Ele deturpa todo seu senso de moral, justificando seus

atos e uma mentira, através da valorização na crença em algo não mundano. Além disso, ele

acaba assumindo o posto de super-homem porque ao iludir as pessoas sobre Dent e assumir a

culpa, ele continua lutando, provando sua superioridade, estabelecendo sua ordem, definindo

o que é justiça e principalmente, ele consegue a autoconservação. Vai continuar fazendo o que

lhe dá prazer, sem que todo mundo saiba que ele falhou diante do Coringa. Que na verdade

ele não está certo nem errado, ele não é o herói que Gotham precisa, ele é quem ele quer que

Gotham precise, ele é o Super-homem das Trevas (ilustração 21).

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Ilustração 21: Batman misturado com Coringa, o super-homem das Trevas Fonte: Batman (2008).

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5 CONCLUSÃO

Com este trabalho procurou-se discutir os valores de moral, bem e mal, estabelecidos

no filme O Cavaleiro das Trevas. A base deste estudo foi os conceitos em relação a estes

valores, do filósofo Friedrich Nietzsche. Para se chegar à análise de fato, foi necessário um

levantamento histórico sobre as histórias em quadrinhos, suas principais fases, seus principais

personagens, as adaptações para o cinema e TV, e conceitos filosóficos sobre valores morais.

As histórias em quadrinhos definitivamente não são algo só para crianças. Foi

possível identificar que elas já nascem como uma forma de expressar o sentimento da época,

fazendo críticas em relação ao desemprego e a difícil situação econômica na qual as pessoas

encontravam-se, através do personagem Yellow Kid, de Richard Fenton Outcault. A realidade

invadia os quadrinhos. Políticos usavam a indústria dos gibis para difundir seus ideais e

inclusive convocar jovens para a Segunda Guerra Mundial. Histórias de terror tomaram conta

dos quadrinhos enquanto a censura era imposta às editoras. Insinuações de apologia ao

homossexualismo e à violência eram um dos discursos atribuídos às revistas de Batman por

exemplo. Após livrar-se da censura, as histórias ganham teor mais adulto. Alan Moore e

Frank Miller surpreendem as pessoas com seus enredos complexos e realistas. Percebe-se,

portanto, o poder das HQs na sociedade, sendo usadas com diversos fins: diversão,

instrumento de discurso político e símbolo de referência do comportamento da sociedade.

Além de serem influenciadas pelo que acontecia no mundo, elas influenciavam e ajudaram a

formar culturas na sociedade.

As adaptações para cinema e TV foram um grande passo na popularização de

personagens, como foi evidenciado. Séries televisivas, sessões matinês e mais tarde

superproduções hollywoodianas dominaram cada uma em sua época, a atenção do espectador.

A transformação do personagem desenhado para uma pessoa real interpretando o personagem

foi um sucesso para a indústria dos quadrinhos e cinematográfica. Médias de audiência e

bilheterias bem sucedidas, derivados como bonecos, fantasias e jogos de videogame,

ajudaram a globalizar a cultura pop destes personagens. O que confirma a evolução e a

enorme dimensão das adaptações cinematográficas, que se antes serviam apenas para divertir

famílias que não possuíam um aparelho de TV, hoje chegam a movimentar bilhões de dólares

entre custos de produção, bilheterias e lançamento em DVD.

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Ao longo deste estudo foi possível perceber as diversas mudanças nos personagens

Batman e Coringa, tanto nos quadrinhos como nas adaptações. Em certos momentos com

teores mais cômicos como na série de TV dos anos 60, com um Batman dono de uma barriga

nada atlética, investigando crimes ao lado de Robin ou nas adaptações para o cinema do

diretor Joel Schumacher, onde se tem um clima debochado. Em outros momentos, mais sérios

como nas histórias de Alan Moore e Frank Miller, com um Batman e Coringa violentos, ou

nos filmes do diretor Christopher Nolan, que apresentam um Batman traumatizado

psicologicamente pela morte dos pais e um Coringa caótico sem limites para conseguir o que

quer. Fica claro que não importa se foi nos quadrinhos, cinema ou TV, as histórias de Batman

em todas as épocas sempre abordaram temas atuais, com questões além de uma simples

história de detetive e influenciaram diversas gerações ao longo do tempo.

O comportamento humano foi um dos temas mais discutidos nas obras do homem-

morcego. A reação de uma criança presenciar o assassinato dos pais, a construção de uma

persona para vingar-se, o sentimento de necessidade de ser justo, foram alguns dos aspectos

que ajudaram na formação de um dos super-heróis mais complexos já criado. Sua relação com

o mordomo Alfred, com os criminosos, com o comissário Gordon e com os vilões, são

assuntos para diversas outras pesquisas e trabalhos acadêmicos. Para a execução deste

trabalho foram explorados os conceitos de moral, bem e mal no filme O Cavaleiro das Trevas.

Feito um estudo sobre conceituações diferentes sobre estes valores, foi verificada a

semelhança do ponto de vista do filósofo Friedrich Nietzsche com as questões discutidas no

filme.

Na análise do filme foi revelado como os pensamentos de Nietzsche se encaixam na

trama da obra de 2008. O personagem Coringa foi retratado como um homem que não

respeitava as leis da sociedade e que para provar o quanto esta sociedade é falha, instaurou o

caos e esperou para que as pessoas fossem mostrando quem realmente são. Com o único

objetivo de agradar a si mesmo, queria provar que o bem e o mal são apenas ideais

sustentados pelos homens para manter determinada ordem. O problema é que esta ordem

prioriza o próximo e não quem realmente importe, o Eu. Exatamente o que Nietzsche retrata

como a maior falha no homem. Apontando as características egocêntricas e amorais de

Coringa foi possível comprovar que ele é um retrato do super-homem que Nietzsche descreve

em suas obras. Além de se assumir como tal, o palhaço é praticamente o próprio Zaratustra,

porque tenta a todo o momento difundir a sua percepção de como deveria ser o mundo.

Evidentemente de forma mais violenta e insana do que o messias descrito pelo filósofo

alemão.

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Coringa vê em Batman uma vontade de potência como a sua, e então resolve se

divertir com o homem-morcego. Mas Batman não compartilha da mesma opinião que

Coringa, ele acredita nas pessoas e crê que Coringa é só mais um criminoso louco. A

ambigüidade entre os dois é colocada à prova em diversos momentos do filme, sempre com

Coringa tentando mostrar a Batman que eles não são tão diferentes assim, afinal, as pessoas

acham os dois loucos. Pouco a pouco o palhaço vai conseguindo desconstruir Batman, a ponto

de ele cometer atos percebidos por ele mesmo como amorais, como escolher salvar uma

pessoa amada em vez do homem que representava tudo pelo que Batman lutava. Ao tentar

salvar Rachel, ele confirma o que Coringa falava e Nietzsche explica: o homem deve buscar

apenas a autoconservação, o prazer. No final das contas, o bem de Gotham não é o mais

importante, e sim a satisfação pessoal do herói. Porém o maior símbolo de ambigüidade é

aquele que tem este conceito até no nome: Duas-Caras.

No começo do filme ele é o símbolo esperança de Gotham, um promotor de justiça

que ajuda a prender criminosos, contra a corrupção, enfim, luta pelo bem maior. Com o que

Coringa chama de empurrãozinho, Harvey Dent se transforma em um ser que tem como único

objetivo vingar-se pela morte da sua amada. Assumindo a persona de Duas-Caras, ele mata,

tortura e passa de símbolo do bem a símbolo do mal, reafirmando o discurso de Coringa e

perturbando ainda mais Batman que começa a admitir que “Ou você morre um herói, ou vive

o bastante para ver você mesmo se tornar o vilão”. A análise constata, ainda, a rendição de

Batman ao Coringa, sendo que no final do filme ele assume o papel de vilão, para o que ele

acredita ser o bem maior, mas como Nietzsche elucida, é para o seu próprio prazer, de manter

o controle e determinar a ordem a sua maneira, transformando-se por completo no super-

homem.

Ao término deste trabalho conclui-se que é possível identificar no filme Cavaleiro

das Trevas diversas formas de ambivalência dos valores morais, de bem e mal através de seus

personagens principais e também em coadjuvantes como os civis e bandidos na Barca. O bem

e o mal são retratados de forma simples e direta, os bonzinhos trabalhadores que têm família e

os bandidos, assassinos e pecadores. Após uma situação extrema que coloca a vida de todos

em risco, os valores são invertidos, transformando os civis em carrascos hipócritas e os

presidiários em pessoas corretas que tomaram uma decisão pelo bem de todos. Christopher

Nolan, Jonathan Nolan e David S.Goyer buscaram criar uma obra que, além de divertir e até

surpreender os fãs, propusesse uma discussão sobre os valores em que a sociedade se sustenta,

em como o ser humano não é algo fixo que não pode ser mudado, que já vem moldado por

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uma divindade. O homem poder ser tanto o bem quanto o mal, e sendo feito um estudo mais

aprofundado, ele pode não ser nenhum dos dois, ele pode ser simplesmente um super-homem.

É importante salientar que o tema deste trabalho pode e deve ser debatido, estudado e

até complementado por outros pesquisadores, a fim de tornar o estudo cada vez mais rico e

completo em informações. Este trabalho não é o fim de um estudo e sim uma oportunidade

para que acadêmicos e outros pesquisadores possam utilizar como fonte em futuros trabalhos,

dando continuidade em um tema que além de confirmar a importância das HQs como fonte de

cultura, discute algo tão essencial na sociedade em que vivemos como o que torna uma pessoa

do bem ou do mal.

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ANEXO A – Declaração de responsabilidade