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INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA OPE LEGIS
Carla Maria Martellote Viola1
A possibilidade de inversão do ônus da prova ope legis tem previsão legal nos arts. 12,
§3º, II; 14, §3º, I e 38 do CDC.
O CDC enumera excludentes de responsabilidade do consumidor, deixando a cargo do
fornecedor, seja de produto ou serviço, o ônus de provar a inexistência de defeito. A inversão
do ônus da prova por imposição legal de inexistência de defeito está nos arts. 12, §3º, II e 14,
§3º, I. Isso significa, a contrario sensu, que o consumidor não precisa comprovar a ocorrência
do defeito, pois ela está presumida (iuris tantum). Contudo se o fornecedor fizer prova que
inexiste o defeito, mesmo havendo dano, o fornecedor está isento de responsabilidade.
Assim, o defeito é presumido, basta o consumidor demonstrar o dano e o nexo causal
com o produto ou serviço adquirido. Desnecessário se configura a demonstração da
ocorrência do defeito por parte do consumidor.
Destacam-se na doutrina algumas citações a respeito. Segundo o mestre da
Responsabilidade Civil, professor Sergio Cavalieri:
“Temos aí, induvidosamente, uma inversão do ônus da prova quanto ao nexo causal,
porquanto, em face da prova da primeira aparência, caberá ao fornecedor provar que o defeito
inexiste, ou a ocorrência de qualquer outra causa de exclusão da responsabilidade. Essa
inversão do ônus da prova – cumpre ressaltar – não é igual àquela que está prevista no art. 6º,
VIII. Aqui a inversão é ope legis, isto é, por força da lei; ao passo que ali a inversão é ope
iudicis, que, a critério do juiz, poderá ser feita quando a alegação for verossímil ou quando o
consumidor for hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência. O jovem e
talentoso jurista Carlos Roberto Barbosa Moreira, em sua ‘Notas sobre a inversão do ônus da
prova em benefício do consumidor’, coloca a questão com maestria: ‘Permite a lei que se
atribua ao consumidor a vantagem processual, consubstanciada na dispensa do ônus da prova
de determinado fato, o qual, sem a inversão, lhe tocaria demonstrar, à luz das disposições do
1 Graduada em Publicidade e Propaganda pela Faculdade Hélio Alonso e em Direito pela Universidade Santa
Úrsula. Pós-Graduada em Gestão da Comunicação pelo Instituto de Gestão em Comunicação/FACHA e
cursando Direito do Consumidor e Responsabilidade Civil pela AVM/Candido Mendes – email:
processo civil comum; e se, de um lado, a inversão exime o consumidor daquele ônus, de
outro, transfere ao fornecedor o encargo de provar que o fato – apenas afirmado, mas não
provado pelo consumidor – não aconteceu. Portanto, no tocante ao consumidor, a inversão
representa a isenção de um ônus; quanto à parte contrária, a criação de novo ônus probatório,
que se acrescenta aos demais, existentes desde o início do processo e oriundos do art. 333 do
Código de Processo Civil’ (in Estudos de Direito Processual em Memória de Luiz Machado
Guimarães, Forense, 1997, p. 124).” (p. 516/517).
O eminente processualista Alexandre Câmara (A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA,
Revista da EMERJ, Vol. 5, nº 18, 2002, p. 92/93), por seu lado, reforça:
”O primeiro tipo de inversão do onus probandi que se manifesta no CDC é a inversão
ope legis. Em outras palavras, é a própria lei que inverte o ônus da prova. (…)
A primeira regra a ser examinada trata do ônus da prova nos casos em que se busca
reparação de dano por fato do produto. Neste caso, a existência do defeito é fato constitutivo
do direito do consumidor à reparação do dano. Apesar disso, incumbe ao fornecedor a prova
de que não existe defeito (art. 12, § 3º, II). (…)
Significa isto dizer que, não havendo nos autos prova suficiente para convencer o juiz
de que o defeito alegado pelo autor existe ou não, deverá o fornecedor suportar o prejuízo
decorrente da insuficiência da prova, julgando-se, pois, procedente o pedido do consumidor.”
Cabe ressaltar que a norma inserta nos arts. 12, § 3º, II, e 14, § 3º, I, do CDC, é uma
modalidade peculiar de inversão do ônus da prova, e que trata-se de mais uma vantagem
(processual) concedida ao consumidor.
Assim, o que o consumidor deve provar é o acidente de consumo (dano) e o nexo de
causalidade entre este e o produto ou serviço, cujo defeito o consumidor não deve se
preocupar em provar, bastando quanto a este ponto apenas relatar coerentemente o ocorrido,
pois cabe ao fornecedor se livrar da presunção legal de sua existência.
E ainda faz-se necessário acrescentar que, além das hipóteses descritas (fato do produto
e fato do serviço), a inversão do ônus da prova ope legis também é concedida pelo art. 38 do
CDC, segundo o qual, o ônus da prova da veracidade e correção da informação ou
comunicação publicitária cabe a quem as patrocina. O fornecedor que patrocinou a campanha
publicitária é o responsável direto pelas informações veiculadas a respeito de seus produtos ou
serviços.
Outro aspecto sobre a inversão do ônus da prova é a questão da nulidade da cláusula
contratual que a estabeleça em prejuízo do consumidor (art. 51, II, do CDC).
Observa-se, contudo, que a inversão do ônus da prova não tem o efeito de obrigar a
parte contrária a arcar com as custas da prova requerida pelo consumidor.
O ponto mais polêmico deste assunto era qual o momento de inversão do ônus da prova
que foi finalmente respondido no julgado noticiado no informativo 492 do STJ, considerando
que o tema foi pacificado pela Segunda Seção (que engloba a 3ª e 4ª Turmas).
Segundo o STJ, trata-se de REGRA DE INSTRUÇÃO, devendo a decisão judicial que
determiná-la ser proferida preferencialmente na fase de saneamento do processo ou, pelo
menos, assegurar à parte a quem não incumbia inicialmente o encargo a reabertura de
oportunidade para manifestar-se nos autos. (Segunda Seção. EREsp 422.778-SP, Rel.
originário Min. João Otávio de Noronha, Rel. para o acórdão Min. Maria Isabel Gallotti (art.
52, IV, b, do RISTJ), julgados em 29/2/2012).
Antes dessa decisão, o STJ era completamente dividido sobre o tema.