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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS ESCOLA DE COMUNICAÇÃO UM MAPEAMENTO DOS FANZINES IMPRESSOS SOBRE MÚSICA NO BRASIL DE 1989 A 2009 Rodrigo de Sousa Lariú Rio de Janeiro / RJ 2010

Um Mapeamento dos Fanzines Impressos Sobre Música no Brasil de 1989 a 2009

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The main purpose of this study is to describe the history of printed music fanzines published in Brazil between 1989 and 2009. The study will map their development, its graphic changes and how this changes influenced its content. Two decades of fanzine production will be divided into six phases and grouped according to their similarities as we endeavor to identify publishing trends amongst them. Our aim is also to trace the line of evolution in Brazilian printed music fanzines in this period. [port] O objetivo deste mapeamento é rever a história dos fanzines musicais impressos no Brasil entre 1989 e 2009, descrevendo seu desenvolvimento, suas mudanças e a influência destas mudanças em seu conteúdo. Para tal, estas duas décadas serão divididas em seis fases, agrupando os fanzines de acordo com suas semelhanças buscando identificar tendências. Espera-se estabelecer uma “linha evolutiva” que descreva a produção de fanzines musicais brasileiros de 1989 a 2009. LARIÚ, Rodrigo. A mapping of brazilian printed fanzines on music from 1989 to 2009 . Advisor: Dr. Micael Herschmann. Rio de Janeiro, 2010. Monograph in Publishing – Escola de Comunicação, Universidade Federal do Rio de Janeiro. 142 p. Final paper.

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Page 1: Um Mapeamento dos Fanzines Impressos Sobre Música no Brasil de 1989 a 2009

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

ESCOLA DE COMUNICAÇÃO

UM MAPEAMENTO DOS FANZINES IMPRESSOS SOBRE MÚSICA NO BRASIL DE 1989 A 2009

Rodrigo de Sousa Lariú

Rio de Janeiro / RJ 2010

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

ESCOLA DE COMUNICAÇÃO

UM MAPEAMENTO DOS FANZINES IMPRESSOS SOBRE MÚSICA NO BRASIL DE 1989 A 2009

Rodrigo de Sousa Lariú

Monografia de graduação apresentada à Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Comunicação Social, Habilitação Produção Editorial.

Orientador: Prof. Dr. Micael Herschmann

Rio de Janeiro / RJ 2010

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UM MAPEAMENTO DOS FANZINES IMPRESSOS SOBRE MÚSICA NO BRASIL DE 1989 A 2009

Rodrigo de Sousa Lariú

Trabalho apresentado à Coordenação de Projetos Experimentais da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Comunicação Social, Habilitação Produção Editorial.

Aprovado por

_______________________________________________ Prof. Dr. Micael Herschmann – orientador

_______________________________________________ Prof. Dr. Eduardo Granja Coutinho

_______________________________________________ Prof. Paulo César Castro

Aprovada em: Grau:

Rio de Janeiro / RJ 2010

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LARIÚ, Rodrigo. Um mapeamento dos fanzines impressos sobre música no Brasil de 1989 a 2009 / Rodrigo de Sousa Lariú – Rio de Janeiro; UFRJ/ECO, 2010. 142 f. Monografia (graduação em Comunicação) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Escola de Comunicação, 2010. Orientação: Micael Herschmann

1. Fanzines. 2. Música. 3. História da Mídia. 4. História da música brasileira. I. LARIÚ, Rodrigo (Micael Herschmann) II. ECO/UFRJ III. Produção Editorial IV. Título

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Dedico este trabalho à minha esposa Tatiana Germano Lariú, que não me deixou desistir da ideia de concluir uma etapa dos meus estudos, seu apoio e paciência. E que era apenas Germano quando começei e agora, felizmente, é Germano Lariú, quando termino. Dedico também à Dra. Joseti Marques, mãe da Tatiana, que viabilizou de maneira prática e fundamental esta monografia, ajudando nos contatos necessários para a volta à UFRJ, e que também inspirou este trabalho em vários momentos, com discussões de sábados à tarde. Como se não bastasse ainda emprestou vários livros e a sala de sua casa. Dedico à minha mãe, Maria Augusta de Sousa Lariú, professora de História, que não me viu entrar na faculdade, tampouco viu qualquer número do midsummer madness, mas que deixou, de alguma maneira, uma paixão pelo estudo da história, incentivou o gosto pela música e, mesmo não estando presente, inspirou a liberdade de falar, criar e pensar. Dedico ao meu pai, Neilton de Oliveira Lariú, que não pode ver a conclusão do meu curso, mas que sempre apoiou minhas decisões, por mais esdrúxulas que fossem.

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AGRADECIMENTOS

À Tia Tininha, pela cobrança e apoio. À minha irmã Alessandra pela ajuda prática e pelo incentivo nos primeiros números do midsummer madness. À Tom Leão e Carlos Albuquerque (Rio Fanzine do Jornal O Globo) e Fábio Zimbres e Priscila Farias (do Mau, Revista Animal) que inconscientemente incentivaram o midsummer madness, ainda vivo após 21 anos. Ao Profº Paulo César Castro, pela disponibilidade, confiança e apoio. Ao Profº Dr. Micael Herschmann, pela orientação objetiva e inspirada, pela paciência e confiança. À Leonardo De Marchi, pela ajuda inicial. Ao Mario Ribeiro, pela compreensão e apoio profissional. À todos fanzineiros que contribuíram e estimularam ao longo destes 20 anos, e principalmente àqueles que deram ajuda fundamental nestes 2 anos de pesquisas. À amiga Beatriz Lamego por ter me apresentado aos fanzines no longínquo ano de 1988. Ao Pablo Myazawa, Gilberto Custódio, Ana Garcia, Adilson Pereira, Panço, Beto Wilson, Kátia Abreu, Luiz Pimentel, Márcio Sno, J-Pika e Samamb-T, Francisco Ricardo, Gabriela Dias, Messias Bandeira, Hélio Muniz, Pedro Só e todos outros fanzineiros.

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I'll be your mirror ][ rorrim

Reflect what you are,

in case you don't know

Lou Reed & Velvet Underground.

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RESUMO

LARIÚ, Rodrigo. Um mapeamento dos fanzines impressos sobre música no Brasil de 1989 a 2009. Orientador: Micael Herschmann. Rio de Janeiro, 2010.

Monografia (Graduação Em Produção Editorial) – Escola de Comunicação,

Universidade Federal do Rio de Janeiro. 142 p.

O objetivo deste mapeamento é rever a história dos fanzines musicais

impressos no Brasil entre 1989 e 2009, descrevendo seu desenvolvimento, suas

mudanças e a influência destas mudanças em seu conteúdo. Para tal, estas duas

décadas serão divididas em seis fases, agrupando os fanzines de acordo com suas

semelhanças buscando identificar tendências. Espera-se estabelecer uma “linha

evolutiva” que descreva a produção de fanzines musicais brasileiros de 1989 a 2009.

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ABSTRACT

LARIÚ, Rodrigo. A mapping of brazilian printed fanzines on music from 1989 to 2009 . Advisor: Dr. Micael Herschmann. Rio de Janeiro, 2010. Monograph in

Publishing – Escola de Comunicação, Universidade Federal do Rio de Janeiro. 142

p. Final paper.

The main purpose of this study is to describe the history of printed music

fanzines published in Brazil between 1989 and 2009. The study will map their

development, its graphic changes and how this changes influenced its content. Two

decades of fanzine production will be divided into six phases and grouped according

to their similarities as we endeavor to identify publishing trends amongst them. Our

aim is also to trace the line of evolution in Brazilian printed music fanzines in this

period.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

1 – A divulgação de fanzines na seção Maudito Fanzine, Revista Animal n. 15, fev. 1991 ……………………………………………………………………… 33 2 - Página do fanzine brasiliense Hang the DJ, com fotos e logomarca xerocadas do semanário inglês Melody Maker ………………………………. 37 3 - Detalhes da página Rio Fanzine de O Globo …………………..…………. 42 4 - Capa do fanzine FANZ n. 6, com destaque a bandas independentes …. 45 5 - Página do fanzine Gotas ……………………………………………………. 49 6 - Páginas do fanzine Panacea n. 22, misturando diagramação eletrônica e manual …………………………………………………………………………….. 50 7 – Flyer de divulgação do grupo Seres Urbanos, de Fortaleza ……………. 51 8 – Página do Editorial do fanzine Masturbação Iogurte e Rock’n’ Roll e detalhe …………………………………………………………………………….. 52  9 – Detalhe do anúncio da coletânea em fita cassete do zine Drowned’Z … 57 10 - Capa dos fanzines Mayonese e ZINE ……………………………………. 60 11 – Página interna do fanzine Cabrunco …………………….………………. 61 12 - Zine Ó n. 11, em formato mini-tablóide …………………………………... 63 13 - Página interna do fanzine Fútio Indispensável ………………………….. 64 14 - Capa e editorial do fanzine Coquetel Molotov n.1 ………………………. 90 15 - Capa da revista Coquetel Molotov n. 1 …………………………………... 91  

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LISTA DE ABREVIATURAS

AIA – Assessoria de Imprensa Alternativa

AMI – Associação de Mídia Interativa

AOL – America Online (provedor de internet)

BHRIF – Belo Horizonte Rock Independent Festival (festival de música realizado em

Belo Horizonte em 1994)

BOL – Brasil Online (provedor de internet)

CENAPI – Central Nacional de Produtores Independentes

COL – CardosOnline (mail-zine)

FRI – Frente das Revistas Independentes

HTML – Hypertext Markup Language (linguagem de marcação de hipertexto)

IBASE – Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

MP3 – Music Picture Experts Group Phase 3 ou MPG Audio Layer 3 (tipo de arquivo

digital para áudio)

PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios

UFBA – Universidade Federal da Bahia

UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul

UOL – Universo Online (provedor de internet)

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ………………………………………………………………….13 1.1 O que é fanzine? …………………………………………………………… 19 1.2 Uma breve história dos fanzines ………………………………………... 24 2 PRIMEIRA FASE: DEMOCRACIA E CRESCIMENTO (1989 – 1992) ….. 31 3 SEGUNDA FASE: O ÁPICE DA PRODUÇÃO EM XEROX (1992 – 1994) …………………………………………………………………………………….... 44 4 TERCEIRA FASE: A FASE DE OURO DOS FANZINES IMPRESSOS (1994 – 1997) …………………………………………………………………….. 59 5 QUARTA FASE: O INÍCIO DO DECLÍNIO NA PRODUÇÃO IMPRESSA E AS EXPERIÊNCIAS NA INTERNET (1997 – 2000) …………………………. 70 6 QUINTA FASE: TENTATIVAS INOVADORAS (2000 – 2004) …………... 78 7 SEXTA FASE: O FLUXO INVERSO: A INTERNET GERA FANZINES IMPRESSOS (2004 – 2009) ……………………………………………………. 86 8 CONCLUSÃO ………………………………………………………………..... 96 REFERÊNCIAS ………………………………………………………………….. 99 GLOSSÁRIO DE FANZINES USADOS NO MAPEAMENTO ……………. 103 ANEXO 1: ENTREVISTAS …………………………………………………... 117

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CAPÍTULO 1 INTRODUÇÃO

Este trabalho pretende mapear a produção de fanzines especializados em

música impressos no Brasil no período compreendido entre 1989 e 2009. Por

mapeamento entenda-se o levantamento, periodização e análise de publicações que

se enquadrem nos seguintes parâmetros: apenas fanzines impressos (fanzines de

papel) cujo assunto principal seja música, publicados no Brasil entre os anos de

1989 e 2009. O objeto de estudo é a coleção de fanzines deste autor,

complementado por pesquisa bibliográfica e entrevistas com outros editores de

fanzines, ou “fanzineiros”, como são referidos no meio, que publicaram no período

proposto.

Para facilitar o desenvolvimento do estudo, as duas décadas que a pesquisa

abrange serão divididas em “fases” onde os fanzines serão agrupados de acordo

com suas semelhanças. Semelhanças neste caso são similaridades gráficas como

formato da publicação, meio de reprodução (xerox ou offset), ferramentas usadas na

paginação, entre outros. Seções como editoriais, espaço para resenhas de outros

fanzines e de artistas nacionais também serão algumas das características

observadas para identificar tais semelhanças ou diferenças. Estes critérios serão

melhor detalhados adiante.

Os objetivos específicos deste mapeamento são rever a história recente deste

tipo de publicação e descrever seu desenvolvimento sob o ponto de vista da

produção editorial, listando principalmente as mudanças gráficas que aconteceram

nestas duas décadas e a influência destas mudanças no conteúdo dos fanzines.

Desta forma, podemos dizer que o objetivo geral deste estudo é compreender como

as mudanças tecnológicas afetaram a produção de fanzines impressos e desta

forma entender seu desenvolvimento nos últimos vinte anos.

A restrição do mapeamento a fanzines cujo assunto principal seja música

atende primeiramente a uma necessidade: como o número de fanzines publicados

no Brasil entre 1989 e 2009 é enorme, é necessária a redução do campo de estudo.

Estudar todos os fanzines brasileiros nestas duas décadas seria praticamente

inviável. Além disso, o objeto de estudo, que é a coleção de fanzines deste autor, é

composto basicamente por fanzines sobre música. Esta restrição também atende ao

interesse particular do autor pelo assunto música e história da música,

especialmente a história recente da música brasileira. Estudar “fanzines musicais”

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também encaminha o mapeamento para a análise de algumas hipóteses: será que

os fanzines sobre música compoem um registro à parte, para não dizer esquecido,

da recente produção musical brasileira? Será que os fanzines guardam um registro

único de movimentos musicais e de artistas ignorados pela grande imprensa no

Brasil? Como será visto adiante, os fanzines formavam e formam a linha de frente

da imprensa musical, sempre descobrindo e divulgando novos artistas, participando

de movimentos culturais de forma ativa e, por isso, registrando de maneira única

criações e carreiras musicais.

Uma das hipóteses que pretendemos testar com este mapeamento é a de

que fanzines musicais constituem uma “outra visão”, um registro à parte de

movimentos e carreiras musicais não contemplados pela grande imprensa. É

bastante comum encontrar nos fanzines entrevistas, resenhas e artigos a respeito de

bandas nunca mencionadas pela grande imprensa, artistas que jamais “existiriam”

se não fosse o registro feito pelos fanzines musicais, principalmente os impressos.

Além destes “anônimos”, esta hipótese também abre espaço para a confirmação da

existência de um segundo ponto de vista, de um outro olhar sobre carreiras e

movimentos artísticos através registrados por esta “imprensa musical alternativa”.

Além de nomes nunca antes ouvidos, é bastante comum encontrar também

entrevistas, resenhas e artigos a respeito de bandas conhecidas da grande

imprensa, do grande público, mas que têm nos fanzines um registro diferente, uma

análise diferenciada, uma opinião discrepante da registrada pelos grandes veículos.

Mapear fanzines sobre música deste período pode contribuir para a melhor

documentação da produção musical recente no Brasil. E, ao periodizar as mudanças

tecnológicas e sua influência sobre o conteúdo, o autor pretende entender como o

registro “paralelo” dos fanzines contribuiu para a evolução e a estruturação de

movimentos musicais no Brasil.

Como será visto de maneira mais aprofundada adiante, a importância

sóciocultural dos fanzines reside em sua natureza de veículo de comunicação

individual mas com forte teor agregador e em seu caráter underground, de meio de

divulgação de movimentos culturais alternativos. O embasamento teórico exposto a

seguir pretende inserir os fanzines no mesmo patamar de outros veículos de

comunicação como jornais, revistas, TV, rádio e a internet.

É importante frisar que apesar do mapeamento proposto focar em fanzines

musicais impressos que foram editados no Brasil, não serão excluídos da análise

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casos de fanzines que experimentaram versões eletrônicas, muito menos de

fanzines que ampliaram sua gama de assuntos, mesclando quadrinhos, poesia,

literatura e música. As exceções servem para enriquecer o mapeamento,

principalmente em se tratando de um objeto de estudo tão fluído e mutante como o

fanzine.

A metodologia usada será um mapeamento que divide em seis fases as duas

recentes décadas desta produção. Porém, antes de explicar os critérios para esta

divisão de fases, algumas informações importantes precisam ser esclarecidas. O

corpus da pesquisa (a coleção deste autor) contém aproximadamente 390 fanzines.

Este número é aproximado pois aumentou durante a pesquisa. Esta coleção

começou a ser montada em 1989 e permanece arquivada com este autor. O estado

geral da coleção é muito bom, com fanzines armazenados em arquivos pessoais,

protegidos de luz e umidade. Falta à coleção uma catalogação bibliográfica visto que

é uma coleção pessoal e que fanzines, por sua natureza, não apresentam todos os

dados que facilitariam esta organização. Mas foi exatamente a necessidade de uma

organização mínima, para facilitar o acesso ao material, que incentivou o autor a

iniciar o mapeamento e periodização da coleção.

Do total geral de 390 publicações, apenas alguns fanzines foram usados para

ilustrar as características de cada fase. No total, este mapeamento utilizou 85

publicações como objeto de estudo, ou publicações-chave (a lista completa dos

fanzines utilizados está no glossário). Para selecionar ou descartar fanzines que

seriam usados no mapeamento, alguns critérios foram utilizados: foram escolhidas

publicações-chave primeiramente de acordo com o ano (às vezes estimado) de sua

publicação e depois de acordo com características comuns entre elas,

caracterizando uma “fase”. Esta pré-seleção também se baseou no conhecimento do

autor a respeito dos fanzines e de suas características. Suas técnicas de produção,

formatos, modos de reprodução e de distribuição foram algumas das características

levadas em conta para esta divisão.

Depois de selecionado o objeto de estudo com 85 fanzines, todas publicações

foram minuciosamente lidas e revistas para que o estudo pudesse tomar corpo. A

descrição das características de cada fanzine e entrevistas com seus editores

nutriram o mapeamento com exemplos e embasamento para apoiar o estudo

proposto.

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Além do estudo dos fanzines selecionados da coleção do autor e pesquisa

bibliográfica, foram realizadas entrevistas por email com alguns editores e ex-

editores de fanzines para confirmar dados e colher impressões. A escolha dos

entrevistados obedeceu a dois critérios básicos: a facilidade de contato com o editor

do fanzine e o fato do entrevistado ter o seu fanzine selecionado como objeto de

estudo. Foram realizadas 16 entrevistas: Priscila Farias, Leonardo Cardoso (Panço),

Hélio Muniz, Luiz Cesar Pimentel, Gilberto Custódio Jr., Humberto Wilson, Ana

Garcia, Kátia Abreu, Francisco Ricardo da Silva, Adilson Pereira, Thais (Samamb-T)

e Law Tissot; sendo que Marcelo Damaso, Gabriela Dias, Marcelo Ferla e Messias

Bandeira não responderam suas entrevistas a tempo. A íntegra de algumas delas

foram reproduzidas no anexo deste estudo pois constituem documento importante

para comprovar características listadas em determinadas fases do mapeamento.

É necessário dizer que, no universo fluído e anárquico dos fanzines, a divisão

aqui proposta não pode ser encarada como estanque. Não existe uma data exata,

como por exemplo, março de 1997, para delimitar as mudanças de fase. A produção

de fanzines não é linear e, como veremos, fanzines são fundamentalmente

aperiódicos e efêmeros. Por isso, características de fases anteriores e posteriores se

misturam. O objetivo desta divisão em fases é tentar unir fanzines com

características semelhantes, produzidos aproximadamente na mesma época e

identificar tendências.

A divisão de fases proposta neste mapeamento é a seguinte:

1ª fase – Democracia e crescimento (1989 a 1992)

2ª fase – O ápice da produção em Xerox (1992 a 1994)

3ª fase – A fase de ouro dos fanzines impressos (1994 a 1997)

4ª fase – O início do declínio na produção impressa e as experiências na

internet (1997 a 2000)

5ª fase – Tentativas inovadoras (2000 até 2004)

6ª fase – O fluxo inverso: a internet gera fanzines impressos (2004 – 2009)

Cada fase será tratada como um capítulo. Na primeira fase serão analisadas

as condições que propiciaram o crescimento do número de fanzines no Brasil e

demonstradas, através da análise das publicações-chave, como este crescimento

era incentivado. Na segunda fase (1992 a 1994), serão relacionadas popularização

dos computadores pessoais e barateamento dos modos de reprodução como fatores

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decisivos para o crescimento ainda mais significativo que acontecerá na terceira

fase (1994 a 1997). Nesta fase, será demonstrado como a conjuntura econômica

(Plano Real) e a estruturação de uma cena musical alternativa nutriram os fanzines

com estabilidade e conteúdo inédito. É nesta fase que se encontram os principais

registros que podem comprovar a hipótese de uma “história paralela”, não contada,

da produção musical brasileira, e assim serão analisados.

A partir da quarta fase (1997 a 2000), com a popularização da internet

comercial, inicia-se o declínio na produção de fanzines impressos, principalmente

daqueles cujo assunto principal é música. Este mapeamento pretende analisar como

os editores de fanzines impressos se comportaram nesse momento, alguns

experimentando publicações em novos suportes como CD-Rom, CD e outros

dividindo conteúdo entre o impresso e a internet. Se por um lado a internet surgia

como meio facilitador para publicação e circulação de informação sobre música, por

outro lado perdia a característica de registro porque a maioria das experiências

eletrônicas dos fanzines desta época não foi preservada.

Na quinta fase (2000 a 2004) será demonstrado como fanzines impressos já

adaptados à “concorrência da internet” inovam, tornando-se mais opinativos no

conteúdo e ousados no acabamento gráfico. A sexta fase que vai de 2004 até 2009

comprova que fanzines sobre música ainda são impressos no Brasil, e mais, que

alguns fanzines impressos nasceram de publicações eletrônicas. Serão listados

possíveis motivos para tal “persistência”.

Algumas questões a respeito da importância deste mapeamento podem vir a

tona neste momento: por que mapear fanzines sobre música pode ser importante?

Qual valor pode existir nos fanzines musicais que precisa ser estudado? Quais

artistas podem estar registrados nestas publicações e que permanecem

desconhecidos? As respostas à estas questões virão a seguir, com as definições de

mainstream e underground na música e com uma breve história dos fanzines que

situa e define bem este tipo de publicação dentro da história da imprensa recente.

Para o leitor não familiarizado com o universo dos fanzines, ou com o que

Chris Atton (2002) chama de zine culture (ou cultura do fanzine), questões como a

representatividade de um objeto de estudo pré-selecionado ou a relevância da

coleção do autor em relação ao todo também podem surgir neste momento. Como

alerta a este tipo de leitor, este mapeamento não pretende de forma alguma ser

definitivo, ao contrário, este estudo é apenas um primeiro passo para futuras

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análises. O autor entende que sua coleção não representa o todo. Mas ao mesmo

tempo, entende que ela existe e que contém rico material de pesquisa. Além disso, o

autor editou fanzines, conheceu outros editores de fanzines nestas duas décadas e

mantém o corpus da pesquisa preservado por todo este tempo. Por isso, a intenção

primordial deste estudo é resgatar, trazer à tona de maneira organizada e dividida

em fases, um tipo de publicação pouco estudada, um novo objeto de estudo para a

história recente da imprensa e também da música brasileira.

Para tal embasamento teórico são importantes alguns conceitos de estudo da

História, principalmente aquele proposto por François Hartog em seu artigo

“Regimes de Historicidade”. Segundo Hartog (2002), quem se propoe a estudar a

história deve explicitar o mais claramente possível seu ponto de vista, ou, de onde

parte “seu olhar”. Escrever uma história dominada pelo ponto de vista do futuro, como uma teleologia, não é mais possível, restaurar a antiga historia magistra poderia ser tentador mas intelectualmente, e não intelectualmente, não muito satisfatório! E o presente mesmo, como acabamos de ver, não é um chão seguro. (HARTOG, 2002, p.10)

Desta forma, este estudo não tem a pretensão de explicar o presente ou o

futuro dos fanzines impressos, mas pretende olhar o passado, visando organizar um

registro de uma produção cultural recente. Trata-se de um mapeamento (e apenas

isto) para trazer à mesa de estudos mais um objeto. A importância deste

mapeamento pode estar ancorada em alguns pontos: o ineditismo da divisão em

fases; o estudo de um objeto que é íntimo do autor desta monografia, a falta de

estudos e bibliografia sobre o assunto, além da vantagem de estar “olhando do

futuro", quando todo processo já aconteceu.

Mesmo assim, e novamente, este mapeamento é apenas o ponto de vista do

autor. Como sugere Hartog, “a abordagem comparativa parece-me oferecer uma

resposta possível: tanto modesta que complexa” (HARTOG, 2002, p.10). Em

nenhum momento este mapeamento pretende discutir questões mais profundas

sobre imprensa ou música brasileira mas servir de base para estudos aprofundados,

que envolvam a história da comunicação e história da música brasileira.

Por fim, a razão para o recorte temporal coincide com o início da publicação

do fanzine deste autor, o midsummer madness, em junho de 1989. Foi a partir da

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entrada do autor neste universo, publicando seu próprio fanzine, que ele começou a

receber e colecionar publicações similares de todo Brasil. O fanzine midsummer madness (grafado originalmente com letras minúsculas) deixou de ser impresso em

1994, transformando-se numa gravadora e produtora musical.

Em relação ao texto e sua formatação, algumas regras serão quebradas em

prol do melhor entendimento. Primeiro, é importante justificar, a partir de agora, o

uso da primeira pessoa em algumas partes do texto deste mapeamento. Como o

objeto de estudo são publicações fortemente baseadas na iniciativa de indivíduos,

como fazem parte da coleção do autor e também, como este autor foi ele próprio

editor de fanzine, será necessário o uso da primeira pessoa. O autor acredita que,

em alguns momentos, o relato de sua experiência será valiosa para a execução

deste trabalho.

Além disso, nas citações diretas extraídas dos fanzines, os erros de

português e a não conformidade com as atuais regras da ortografia não serão

corrigidos. Também não serão corrigidas as respostas dadas por escrito nas

entrevistas com os fanzineiros. O autor prefere manter os textos como foram

publicados. A referência bibliográfica dos fanzines também terá uma formatação

própria. Como as regras da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) não

contemplam este tipo de publicação e vários fanzines não possuem números de

páginas, ano de publicação ou nem mesmo referência nominal dos reais autores dos

textos, vamos relacionar os fanzines usando como entrada seus títulos,

aproximando nossa referência bibliográfica à regra da ABNT para periódicos. A lista

completa de fanzines usados neste estudo está no glossário deste mapeamento. Em

outro anexo, a reprodução na íntegra das entrevistas realizadas para este

mapeamento, que o autor acredita ser de suma importância para os objetivos deste

estudo.

1.1 O que é fanzine?

Para apresentar o objeto de estudo é necessária a definição de fanzine e um

enquadramento histórico deste tipo de publicação, além da definição de conceitos

como mainstream e underground. Estes conceitos estão intimamente ligados ao

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nascimento dos fanzines e ao mesmo tempo relacionados ao tipo de música

preferencialmente tratado por eles.

Os conceitos de mainstream e underground usados aqui tem a ver

principalmente com o modo como são produzidos determinados produtos culturais,

sejam eles discos, revistas ou fanzines. Usando a definição de Simon Frith, Will

Straw e John Street para estudar a História do Rock, é importante entender como a

tecnologia influencia diretamente a produção cultural. En este sentido, los artefactos electrónicos que se utilizan para producir, distribuir y experimentar la música contemporánea no son simplemente los ‘medios’ técnicos a tráves de los cuales experimentamos la música. La tecnología se ha convertido en un ‘modo’ de producción musical y consumo.1 (FRITH, S., STRAW, W., STREET, J., 2006, p.25)

E continua mostrando como a evolução das tecnologias de gravação

impactaram diretamente no modo de produção da música: Esta continua e imparable ‘democratización’ del mercado del audio es muy relevante puesto que posibilita que los músicos graben su propria música, preservando la estética que más les interesa en una medida hasta ahora inusual en la producción cultural contemporánea.2 (FRITH, S., STRAW, W., STREET, J., 2006, p.36)

Uma definição simplificada dos termos mainstream e underground, baseada

nas idéias de Frith, Straw e Street que interessa a este estudo é: O denominado mainstream (que pode ser traduzido como “fluxo principal”) abriga escolhas de confecção do produto reconhecidamente eficientes, dialogando com elementos de obras consagradas e com sucesso relativamente garantido. Ele também implica uma circulação associada à outros meios de comunicação de massa, […]. As condições de produção e reconhecimento desses produtos são bem diferenciadas, fator que explica o processo de circulação em dimensão ampla e não segmentada. O underground, por outro lado, segue um conjunto de princípios de confecção de produto que requer um repertório mais delimitado para o consumo. Os produtos “subterrâneos” possuem uma organização de produção e circulação particulares e se firmam, quase

                                                        1 Tradução minha: Os artefatos eletrônicos que se utilizam para produzir, distribuir e experimentar a música contemporânea não são simplesmente os ‘meios’ técnicos através dos quais experimentamos a música. A tecnologia se converteu em um ‘modo’ de produção musical e de consumo. 2 Tradução minha: Esta contínua e infindável ‘democratização’ do mercado de aúdio é muito relevante posto que possibilita que os músicos gravem sua própria música preservando a estética que mais lhes interessa, de uma maneira até agora pouco usual na produção cultural contemporânea.

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invariavelmente, a partir da negação do seu “outro” (o mainstream). […] Um produto underground é quase sempre definido como “obra autêntica”, “longe do esquemão”, “produto não-comercial”. Sua circulação está associada a pequenos fanzines, divulgação alternativa, gravadoras independentes etc. […] (CARDOSO FILHO, J., JANOTTI JÚNIOR, J., 2006, p.8)

Embora as definições de mainstream e underground acima estejam

relacionadas à música, para este mapeamento elas encaixam perfeitamente, tanto

que os autores Jorge Cardoso Filho e Jeder Janotti Júnior já citam fanzines como

espaço de circulação de um destes tipos de música. Estas serão as definições

usadas neste estudo para caracterizar tipos de publicação (revistas, fanzines,

jornais), gêneros musicais e artistas. “Grande imprensa” ou “grandes veículos de

imprensa”, “grandes gravadoras” ou “majors” têm o mesmo sentido aqui que

mainstream, assim como “alternativos”, “pequenas publicações” e às vezes o

substantivo “independentes”, associado a músicos, bandas ou a fanzines, servirá

para designar underground.

Já a definição para fanzine é menos complexa: a mais conhecida é a de

“revista de fã”, uma publicação feita por uma pessoa sobre seu assunto predileto,

sobre seu ídolo, ou sobre ambos. A origem da palavra fanzine vem da contração de

dois vocábulos da língua inglesa: fanatic magazine. Esta definição está na maioria

dos livros sobre o assunto: De um modo geral o Fanzine é toda publicação feita pelo fã. Seu nome vem da contração de duas palavras inglesas e significa literalmente revista do fã (de fanatic magazine). (GUIMARÃES, E., 2005, p.11)

É então uma publicação feita inicialmente sem intenção de lucro, reproduzida

em pequenas tiragens e por isso, utiliza métodos de impressão não industriais, na

maioria das vezes artesanais. Como são produções sem objetivo comercial, a

grande maioria dos fanzines é aperiódico e efêmero (MAGALHÃES, 2004, p. 12).

Poucos ultrapassam as dezenas de edições.

Outra definição interessante para o que é fanzine está em sua antítese: Obviamente as revistas profissionais que são vendidas nas bancas não são Fanzines. O principal fator de diferenciação é uma consequência do fato de terem grandes tiragens e darem lucro. A

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revista profissional é feita em função de um mercado pré-existente. (GUIMARÃES, E., 2005, p. 12)

Fanzines raramente são encontrados em bancas de jornais e revistas. Seu

modo de distribuição é interpessoal, de mão em mão. Para o fanzine impresso, o

meio de difusão mais comum sempre foi, é, e será a via postal. Distribuição é fazer a edição chegar ao leitor, inclui receber pedidos, envelopar, postar, colocar em bancas ou lojas especializadas, ou mesmo vender de mão em mão em eventos afins. A maior parte da distribuição dos Fanzines é feita através do correio. As vantagens são muitas: o alcance é grande, chega a toda parte do país, podendo também alcançar outros países; o custo é relativamente baixo. (GUIMARÃES, E., 2005, p.28)

A distribuição dos fanzines também pode ser feita em locais especializados,

por exemplo, fanzines de música em lojas de música e shows; fanzines de cinema

em videolocadoras e clubes de cinema; fanzines sobre quadrinhos em lojas de

quadrinhos, etc; ou, em hoje raras bibliotecas (também chamadas de fanzinotecas)

ou ainda, através da troca de edições entre seus editores, os fanzineiros.

Existem fanzines sobre música, sobre gêneros musicais, fanzines que falam

apenas de um artista, fanzines sobre feminismo, sobre ficção científica, sobre um

determinado filme de ficção científica, enfim, o que define um fanzine é justamente o

nicho de assunto, a especialização. Chris Atton cita uma definição usada por

Michelle Rau no livro “Towards a History of Fanzine Publishing: From APA to Zines”: Rau traces the origin of fanzines as they are generally understood – as self published magazines written and produced by fans of a specific cultural form or of an actor or creator within that form (a genre of fiction, of music, of film; an author, a musician, a film star) – back to the science fiction magazines of the late 1920’s 3 (RAU, 1994, apud ATTON, 2000, p. 55)

A especificidade dos assuntos abordados torna o fanzine uma publicação de

difusão dirigida, produzida e consumida por indivíduos com interesses similares. A

pauta dos fanzines obedece, na maioria das vezes, ao interesse do fanzineiro. Ele

cria um fanzine com a intenção de expor sua opinião sobre um assunto, ou também

                                                        3 Tradução minha: Rau traça a origem dos fanzines como eles geralmente são conhecidos – como revistas autopublicadas escritas e produzidas por fãs de uma forma cultural específica ou de um ator ou criador envolvido com aquela forma (um gênero de ficção, de música, de filme; um autor, um músico, um ator de cinema) – desde os tempos das revistas de ficção científica do final dos anos 1920.

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para expressar, veicular, divulgar sua própria criação artística. Como definiu

Henrique Magalhães: O fanzine é um veículo de indivíduos e de grupos de fãs, sujeitos que dificilmente possuem acesso à grande imprensa. A divulgação das novas bandas de rock é feita, sobretudo, por intermédio do fanzine. Os novos autores de poesias e história em quadrinhos têm no fanzine o espaço para difusão de sua obra. (GUIMARÃES, H., 2005, p.17)

O que também define a pauta é o desejo do editor-fanzineiro em compartilhar

suas opiniões e/ou produções com um público que, a princípio, até ele desconhece.

O fanzine é portanto uma forma de promover intercâmbio. É por meio do fanzine que os fãs se identificam num universo comum, saem do isolamento, encontram terreno adequado para expressar suas paixões, se fortalecem como participantes de um grupo. (GUIMARÃES, H., 2005, p. 15)

O que leva um fanzine a ser publicado é a paixão do fanzineiro pelo assunto e

não a repercussão editorial ou financeira que sua publicação pode causar. Por

causa de sua segmentação e tiragem pequena, dificilmente fanzines trazem

inserções publicitárias. E para viabilizar a distribuição, frequentemente são

distribuídos gratuitamente ou trocados em vez de vendidos. Como aconselham Mike

Gunderloy e Cari Goldberg em seu livro “The World of Zines” (1992), as principais

dicas para começar um fanzine são:

Tap Your Experience. If you’re a punker, stick to music (that’s probably what you planned anyhow, right?). […] Trying to publish a zine on surfing from the Black Hills of South Dakota is probably a bad idea.[…] Be Specialized. No matter how good your music zine is, if you try to compete head-on with Rolling Stone the first week you’re dead meat.[…] You can also specialize by trying to capture the attention of a particular audience. A punk zine directed to lesbians and concentrating on music by womyn might be a hit. 4 (GOLDBERG, C., GUNDERLOY, M., 1992, p.146-147)

                                                        4 Tradução minha: Escoe sua experiência. Se você é um punk fique na música (que é provavelmente o que você planejou de qualquer jeito, certo?).[…] Tentar publicar um fanzine sobre surf morando em Black Hills, South Dakota, é provavelmente uma má ideia. Seja especializado. Não importa quão bom seu zine seja, se você tentar competir cabeça a cabeça com a [revista] Rolling Stone, na primeira semana você estará frito. Você também pode se especializar tentando atrair atenção de um determinado público. Um zine punk voltado para lésbicas focado em música feita por meninas pode ser um sucesso.

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Além de escolher o assunto, também cabe única e exclusivamente ao editor

assumir os riscos de investir ou não em qualidade gráfica e modos de distribuicão.

Alguns fanzines evoluiram para edições mais bem acabadas, e em alguns casos,

com algum sucesso editorial ou comercial. E existem ainda os fanzines que são

experimentações gráficas por definição. Vamos tratar destas diferenciações adiante.

Outra razão que influencia diretamente a criação de fanzines é a falta de

espaço para divulgação de determinados assuntos na grande mídia. É o fanzine o veículo que se contrapõe ao descaso do mercado editorial, que não contempla de forma adequada o fluxo da produção dos artistas nacionais, muito menos a obra dos novos autores. [O fanzine] É o porta-voz de um tipo de cultura que denominamos genericamente de underground, contracultura, alternativa ou independente. (GUIMARÃES, H., 2005, p. 17)

Esta função de “porta-voz do underground” está diretamente ligada às origens

dos fanzines e será analisada mais detalhadamente a seguir. Por enquanto é

importante saber que os fanzines têm esta função.

1.2 Uma breve história dos fanzines.

Apesar de alguns estudiosos sustentarem que fanzines são a evolução

natural da imprensa de pequenas tiragens, remontando ao tempo das primeiras

prensas tipográficas, para este mapeamento o conceito de fanzine está mais ligado

às ideias das publicações amadoras de ficção científica norte-americanas da década

de 1920 e 1930. The first science fiction fan magazine – The Comet – appeared in 1930. […] Science fiction and comic fanzines were necessary to their writers and readers in order to validate genres of fiction that were generally ignored or reviled by the mainstream critics. They also functioned as virtual communities, bringing together fans geographically and socially distant from one another.5 (ATTON, 2000, p. 56)

                                                        5 Tradução minha: A primeira revista de fã de ficção científica – The Comet – surgiu em 1930. […] Fanzines de ficção científica e quadrinhos eram necessários para que seus editores e leitores validassem gêneros de ficção que geralmente eram ignorados ou discriminados por críticos mainstream. Eles [fanzines] também funcionavam como comunidades virtuais, reunindo fãs que estavam social e geograficamente distantes um do outro.

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Como eram consideradas literatura de segunda categoria, escritores, leitores

e fãs de ficção científica começaram a publicar pequenas revistas com artigos,

contos e análises sobre o assunto nas décadas de 1920 e 1930 nos Estados Unidos.

As citações mais comuns marcam o início do conceito de fanzine com Amazing

Stories, publicada por Hugo Gernsback nos Estados Unidos em 1926. Amazing

Stories era uma publicação sobre ficção científica e se assemelhava às demais

revistas da época exceto por dois motivos: Gernsback não pagava seus

colaboradores nos primeiros números (caracterizando o perfil amador da publicação

e viabilizando seu nascimento) e inaugurou um procedimento simples: criou uma

seção com endereços de pessoas interessadas em ficção científca e estimulava

seus leitores a se corresponderem para trocar informações.

Enquanto Amazing Stories chegava a tiragem de 100.000 exemplares em seu

primeiro ano (segundo pesquisa no site Wikipedia6), crescia também a troca de

correspondências entre os fãs de ficção científica, leitores da revista. Devido ao

sucesso, daí para frente, todas as outras revistas passaram a incluir endereços de

leitores para intercâmbio. Alguns leitores escreviam cartas tão longas e

entusiasmadas que passaram a produzir suas próprias publicações, ou fan-

magazines. E mais: alguns leitores tinham que reescrever a mesma carta, o mesmo

artigo, tantas e tantas vezes, que passaram a utilizar métodos rudimentares de

duplicação. Nos anos 1930 e 1940 usava-se papel carbono, hectografia (ou

duplicação à álcool) e logo depois a mimeografia.

Embora seja possível traçar o nascimento do conceito de fanzine de volta aos

anos 1920, foi apenas no ano de 1940 que o termo “fanzine” foi usado pela primeira

vez para designar uma publicação amadora de ficção científica, a Detours, de Russ

Chauvenet. Russ definiu sua publicação como “fan-zine” na tentativa de se

diferenciar das revistas profissionais, produzidas por editoras que pagavam seus

autores pelos artigos, às quais ele próprio chamava de “pro-zines”. O assunto

principal era ficção científica, quadrinhos e filmes de terror.

Durante os anos 1960, no contexto dos movimentos de contracultura,

publicações amadoras sobre assuntos diversos como música, política, cinema e

artes gráficas começaram a crescer. O formato antes utilizado pelos fãs de ficção

                                                        6 Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/Amazing_Stories acessado em 12/10/2010

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científica serviu a grupos preocupados em divulgar outro tipo de informação.

Fanzines, publicações amadoras e imprensa alternativa ou underground se fundem,

num modelo bastante comum dos anos 1960, por sua clara função de servir como

alternativa à mídia oficial, elemento agregador de um grupo com interesses similares

e também como meio de comunicação que validava um determinado segmento de

cultura underground.

É neste momento que aparecem os primeiros fanzines de música. Em 1966,

Paul Williams, David Harris e Greg Shaw, três norte-americanos fãs de ficção

científica, criaram os primeiros fanzines sobre rock 7: Crawdaddy!, de Williams, e

Mojo Navigator Rock and Roll News de Harris e Shaw. Ambos utilizaram a

experiência como editores de fanzines de ficção científica e a aplicaram ao assunto

que os interessava na época: música. Estes dois fanzines eram voltados para

colecionadores de discos raros e antigos. Suas páginas traziam listas de discos,

detalhes das discografias de artistas pouco conhecidos e endereços de

colecionadores dispostos a trocar ou vender cópias de discos fora de catálogo no

eixo Estados Unidos – Reino Unido. Ou seja, estes primeiros fanzines de música

ainda se pareciam muito com as publicações de ficção científica, que tinham no

intercâmbio entre leitores sua principal função.

Entretanto, a mudança não demorou a aparecer. Num artigo de dezembro de

1970 da edição norte americana da revista Rolling Stone, o mesmo Shaw aparece já

não mais como editor do Mojo Navigator mas dedicado a outro fanzine: Stormy Weather. Shaw declarou à revista:

I think there’s the possibility of doing stuff for people who aren’t record collectors, just people that are interested in music and journalism. I’d like to see more intelligible articles on artists that the pro-papers just can’t cover. My approach to the scene is to completely avoid the necessity of having to make a profit. Just publish what you do because you have a real interest in the material and you just do it because you’re so much bursting to have this come out of you that you can’t keep yourself from doing it.8 (WARD, Let a Thousand Fanzines Bloom. Rolling Stone, p.26, 2. Dez.1970)

                                                        7 Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/Fanzine, acessado em 19/09/2010 8 Tradução minha: Eu acho que existe a possibilidade de fazer coisas para pessoas que não são colecionadores de discos, apenas para pessoas interessadas em música e jornalismo. Eu gostaria de ver artigos mais inteligentes sobre artistas que os jornais profissionais não cobrem. Minha cobertura da cena musical se baseia em evitar completamente a necessidade de ter que ter lucro. De apenas publicar o que se publica porque está realmente interessado no material e fazer isso porque quer tanto por pra fora isso que está dentro de você que você não pode simplesmente não fazê-lo.

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O mesmo artigo cita uma dezena de fanzines, a maioria deles mimeografado

ou impresso em offset. No final do artigo, o jornalista publicou uma lista de 10

fanzines, a maioria ingleses. É curioso notar o nível de organização da maioria

deles, que divulgava inclusive o valor de uma assinatura anual.

Enquanto isso, no Brasil, Edson Rontani publicava em Piracicaba o primeiro

fanzine brasileiro que se tem notícia, o Ficção, de 1965. A publicação pertencia a

um clube chamado “Intercâmbio Ciência-Ficção Alex Raymond”. Naquela época aqui

no Brasil ainda se usava o termo “boletim” para o tipo de publicação que Ficção

representava. O termo fanzine só começou a ser usado no país a partir da década

de 1970.

Em julho de 1976 na Inglaterra, o bancário de 19 anos, Mark Perry, criou o

fanzine Sniffin’ Glue, com 8 páginas em xerox. O principal motivo para Mark

começar seu fanzine foi um show da banda punk norte-americana Ramones. Ele

resolveu escrever um artigo sobre o show e distribuir para os amigos. Mark vivia o

início do movimento punk e os fanzines encontravam um ambiente adequado para

crescer. É impossível saber se Mark Perry tinha conhecimento de outros fanzines

musicais quando começou a editar Sniffin’ Glue. Mas isso não importava muito, o

ambiente vivido por ele provavelmente o impeliu a produzir um fanzine.

Na música, o movimento punk pregava a volta ao rock básico, feito por

pessoas comuns; por amadores e não músicos virtuosos. Os shows punks deveriam

ser simples e energéticos em oposição ao rock apoteótico, para grandes platéias em

grandes estádios. Ideologicamente, o punk flertava com ideias anarquistas. A média

de idade dos militantes do movimento punk era muito baixa na Inglaterra e nos

Estados Unidos, por volta de 18 anos, e por isso, o lema mais usado era “a regra é

não ter regras”. Quase tudo no movimento punk se baseava na oposição ao

mainstream, o embate era entre tudo que fosse produzido com intenção comercial

versus produção amadora, underground. Publicar fanzines se tornou um dos pilares

do movimento punk.

Percebe-se dentro do movimento punk que o fanzine tem a clara função de

ser o veículo de oposição ao veículos de comunicação mainstream, uma alternativa,

além de elemento agregador entre simpatizantes e também o único meio de

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comunicação “oficial” do movimento. O editorial do primeiro número do Sniffin’ Glue

dizia:

Ninguém pode definir o punk rock; é rock na sua forma mais baixa – a nível de rua. Garotos tocando juntos nas garagens dos pais. Equipamento barato, roupas justas, cabeças vazias (não há nada a fazer agora que você saiu da escola). Nós não precisamos de Nova Iorque. Temos tudo aqui. Os Sex Pistols, Eddie & The Hot Rods, The Damned, The Stranglers, The Vibrators e Roogalator, para citar apenas alguns. Tudo está acontecendo aqui. Temos apenas que fazer a coisa crescer e melhorar. Os garotos (e claro, os caras que se sentirem jovens) sabem que o punk é ótimo e vamos lá. (PERRY, 1976 apud BIVAR, 1988, p. 51)

É desta época que vêm o lema D.I.Y, ou “do-it-yourself” (faça-você-mesmo),

cunhado pelo mesmo Mark Perry no fanzine Sniffin’ Glue. Mark usou o termo para

responder às inúmeras cartas que recebia. Sua resposta foi: Todos vocês, garotos que lêem o SG, não se satisfaçam com o que nós escrevemos. Saiam e começem seus próprios fanzines, ou mandem suas críticas para a imprensa do Sistema, vamos pegá-los pelos nervos e inundar o mercado com a escrita punk! (PERRY, 1976 apud BIVAR, 1988, p. 55)

Foi nesta conjuntura que os fanzines musicais começaram a aparecer no

Brasil, no final dos anos 1970 com o movimento punk local, que ajudou não só a

aumentar o número de publicações mas também popularizou o termo fanzine. Manifesto Punk, editado por Tatu, da banda Coquetel Molotov, foi o primeiro fanzine punk brasileiro. Ele falava das bandas cariocas e paulistas e de todo mundo. Mesmo com pouca divulgação, os fanzines punks se espalharam rapidamente com o lançamento de Descarga Suburbana, Lixo Reciclado, Revolução Punk, Vitória Punk e Horizonte Negro. (MAGALHÃES, 2004, p.19)

Nesta mesma época, início dos anos 1980, começam a se popularizar as

fotocopiadoras (máquinas de xerox) facilitando a reprodução dos fanzines. Para

pequenas tiragens, as fotocopiadoras barateavam os custos e possibilitavam a

melhor inserção de elementos gráficos como fotos e ilustrações, o que era um

grande empecilho nos fanzines mimeografados.

Enquanto esta primeira onda de fanzines musicais brasileiros, ligados ao

movimento punk, era publicada, explodia outro movimento musical no Brasil: o boom

do rock brasileiro em escala comercial, ou mainstream, com Blitz, Barão Vermelho,

Legião Urbana, Lulu Santos e tantas outras bandas. É importante considerar este

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momento da produção musical no Brasil para o melhor entendimento das razões que

levaram ao crescimento do número de fanzines sobre música no país.

O ambiente deste boom do rock nacional era estranho ao mundo dos

fanzines: todos envolvidos em seu crescimento trabalhavam dentro da máquina do

mercado fonográfico, ou star system, como colocam Frith, Straw e Street (2006). As

principais bandas deste movimento foram lançadas por gravadoras multinacionais

(as majors) e o veículos de comunicação para divulgá-las eram os meios de

comunicação de massa: a TV, o rádio e os grandes jornais. Os fanzines tiveram

pouca atuação neste cenário. Foi justamente neste período que entrou no ar uma

importante rádio FM que tocava exclusivamente rock, a Fluminense FM (em Niterói,

1982) e, logo depois, surgiu uma revista especializada em música no país, a Bizz

(em agosto de 1985). Apesar de não ter sido a primeira revista de música do Brasil,

a Bizz era editada por uma grande empresa, a Editora Azul, tinha alcance nacional e

permaneceu sendo publicada por mais de uma década. Sua criação e crescimento

demonstrava a importância e o foco comercial do movimento roqueiro no Brasil dos

anos 1980.

Apesar de promissores para a indústria da música jovem no Brasil,

especialmente o rock, o início dos anos 1980 não foram tão bons para os fanzines:

A partir de 1986, por vários motivos, iniciou-se a crise desse gênero de publicação, […] Um dos principais motivos que contribuiu para a crise foi o fator econômico. O descontrole da economia do país fez com que o custo dos fanzines subisse, com aumento progressivo do preço do papel, das fotocópias, etc. (MAGALHÃES, 2004, p.36)

Apesar do declínio nos anos 1980, o terreno estava preparado para um

renascimento dos fanzines de música no Brasil. A noção de que qualquer pessoa

poderia publicar um fanzine fora plantada pelo movimento punk; o mercado musical

brasileiro para rock já havia amadurecido; a maior oferta de meios práticos e baratos

de reprodução com as máquinas de xerox; e, apesar da instabilidade econômica, o

Brasil havia deixado a ditadura militar e caminhava para relativa estabilidade política.

A partir do começo da década de 90 a produção de Fanzines volta a ficar mais intensa, o que se mantém até hoje [2002]. Muitos Fanzines são criados e muitos acabam, pelos mais diversos motivos, mas a efervescência do meio continua alta. A diversidade dos Fanzines aumentou, hoje há praticamente todo tipo de Fanzine. Um fato marcante na década foi a consciência da necessidade de expandir o público leitor para viabilizar economicamente edições mais sofisticadas. Diversos editores procuraram se organizar criando

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estruturas de distribuição mais eficientes. (GUIMARÃES, E.; 2005, p. 19)

Alguns encontros de fanzineiros brasileiros aconteceram nesta época: dois

encontros em Araxá (maio de 1988 e outubro de 1989), a 1ª Exposição Internacional

de Fanzines, em Curitiba / PR (maio de 1989) promovido pela Gibiteca de Curitiba,

duas edições da Convenção Nacional de Histórias em Quadrinhos Independentes

em São Paulo (1993 e 1994), a mostra Energetic Zines também em São Paulo (1993

e 1994).

É neste momento de renascimento que se inicia este mapeamento dos

fanzines impressos sobre música no Brasil. A década de 1990 e esta “segunda

vinda” dos fanzines representa um momento muito interessante de auge e declínio

dos fanzines no Brasil, como veremos a seguir.

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CAPÍTULO 2 PRIMEIRA FASE: DEMOCRACIA E CRESCIMENTO (1989 – 1992)

O primeiro momento deste mapeamento começa em 1989 e tem como marco

inicial o nascimento do fanzine deste autor, o midsummer madness. A partir daqui,

vou usar a primeira pessoa.

Minha entrada no universo dos fanzines serve como ponto inicial para a

coleção que hoje é objeto de estudo deste mapeamento. Antes de publicar a

primeira edição (número zero) do fanzine midsummer madness, eu não tinha

acesso a outros fanzines. Após publicar a edição inicial e distribuí-la é que começei

a receber outros fanzines e a participar do intercâmbio. Esta é a razão prática para

usar o ano do nascimento do meu fanzine como marco inicial deste mapeamento.

Cabe agora um breve relato dos motivos que me levaram a publicá-lo. Serei breve

pois não pretendo fazer deste mapeamento uma autobiografia mas sim uma

pesquisa imparcial.

Começei o midsummer madness nas férias escolares de junho de 1989. A

motivação veio do empréstimo de alguns fanzines de uma amiga de escola,

tínhamos 15 anos de idade na ocasião. Conectados por gosto musical similar,

ambos víamos nos fanzines uma opção de leitura especializada no tipo de música

que gostávamos (rock underground europeu e norte americano). Era muito raro ler

artigos a respeito das bandas que admirávamos nas poucas revistas de música

vendidas em bancas no Brasil no final dos anos 1980. Empolgado com a novidade,

resolvi iniciar minha própria publicação pois minha amiga me disse que para ter

acesso a estas publicações, o ideal era eu produzir meu próprio fanzine para trocar.

Em entrevistas realizadas para este mapeamento, outros fanzineiros

contemporâneos, que eu viria a conhecer após o intercâmbio, relataram motivação

similar à minha para começar seus fanzines. Eu queria falar das minhas coisas, das bandas que eu gostava e não via em nenhum lugar. Ainda estava no segundo grau e minha escola - que era federal - ficou em greve por uns 3 meses e me vi sem muita coisa pra fazer, daí passei a pensar em coisas legais pra fazer e um zine foi uma das coisas que eu comecei. Também colaborava com o Cinema Múndi, que era de um amigo de infância, o Renato Portugal. (Leonardo Fernandes, editor do Gnomo da Tasmânia, de 1991, em entrevista ao autor) Começou com o “Cartazine”, no início do segundo grau. Várias coisas serviam de motivação: os preços da cantina, que julgávamos

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altos, e a estética da colagem punk, que fazia a gente ter vontade de colar-e-experimentar... (Adilson Pereira, editor do Cartazine, de 1985, em entrevista ao autor)

Chris Atton, em seu livro sobre mídia alternativa, cita o sistema de trocas para

exemplificar o impulso inicial que fez a maioria dos fanzineiros começarem suas

publicações:

Though not universal, the barter system is common within zine culture. Zines are traded between editors not necessarily according to a fixed monetary or exchange rate; a single copy of an extensive, highly professional zine may attract an exchange of a number of issues of another editor’s smaller, more cheaply produced publication. 9 (ATTON, 2002, p. 59)

Quase todos os fanzines desta fase traziam endereços de outros zines.

Normalmente, para um “não-fanzineiro”, era necessário comprar o fanzine: a

“moeda” eram selos ou dinheiro escondido dentro das cartas. Entretanto, se você

fosse editor de um fanzine, a troca era facilitada: bastava enviar sua publicação para

receber o fanzine do seu destinatário em troca. Era parte da “etiqueta” enviar

fanzines em retorno para aqueles que haviam enviado suas edições. Esta foi uma

das formas que a coleção que hoje serve de objeto de estudo começou a se formar

a partir de 1989.

Se você publicava um fanzine, outra maneira bastante comum de promovê-

los no final dos anos 1980 era enviar a publicação para alguns jornais e revistas que

abriam espaços de divulgação. Em 1989, duas publicações se destacavam: a revista

de quadrinhos ANIMAL (que trazia encartado um suplemento chamado MAU) e o

BOLETIM CENAPI. Nos grandes veículos de imprensa, algumas seções de jornais

também ajudavam nesta divulgação, em especial uma seção do jornal O Globo

chamada RIO FANZINE, editada pelos jornalistas Tom Leão e Carlos Albuquerque.

Caso seu fanzine fosse resenhado nestes canais, e principalmente, se o seu

endereço de correspondência fosse divulgado, estava lançada a senha para receber

inúmeros fanzines. O midsummer madness teve a sorte de ser divulgado nestes

três canais logo na edição número zero. A partir dai, iniciou-se um intercâmbio com

vários fanzineiros da época.                                                         9 Tradução minha: Embora não universal, o sistema de escambo é comum na cultura do zine. Zines são trocados entre os editores sem que necessariamente exista uma moeda ou câmbio fixado; uma única cópia de um grande, altamente profissional zine pode ser trocado por várias edições de uma outra publicação menor, mais barata.

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  33 

1 – A divulgação de fanzines na seção Maudito Fanzine, Revista Animal n. 15, fev. 1991

Mas porquê começar a fazer um fanzine? Minha resposta tem a ver com a

conjuntura do país. Em 1988 o Brasil ganhava uma nova Constituição e em 1989

votava pela primeira vez para Presidente depois do fim da Ditadura Militar. A relativa

estabilidade e otimismo político não refletiam na economia brasileira. Com a inflação

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altíssima, dívidas externa e interna crescentes e sucessivas trocas de moeda, o

mercado interno sofria com as oscilações. E o mercado de música não estava livre

deste problema.

Depois do estouro do rock brasileiro mainstream nos anos 1980, com Blitz,

Lulu Santos, Paralamas do Sucesso, Titãs, Legião Urbana, entre outros, esta

geração que havia conquistado o sucesso comercial enfrentava sua primeira

entressafra com importantes quedas nas vendas. Como relata Arthur Dapieve em

seu livro “BRock – O Rock Brasileiro dos Anos 80”:

O tempo se encarregaria de: primeiro, tirar os produtos das prateleiras, consagrar a cobrança de ágio e reavivar a inflação, ou seja, fazer desmoronar o Plano Cruzado; e segundo, separar o joio do trigo no BRock, redimensionando o fenômeno. As principais bandas do movimento não eram melhores ou piores em função de suas vendas. Além disso, elas vendiam bem antes e venderiam bem depois – apenas venderam estupidamente enquanto durou a euforia do Cruzado. (DAPIEVE, 1995, p. 201)

Nesta entressafra do Rock Brasileiro, as revistas Roll e SomTrês fecharam

as portas e a única publicação especializada em música, distribuída em bancas no

Brasil que se manteve foi a revista Bizz, editada mensalmente pela Editora Azul. Em

1989, a revista teve o número de páginas bastante reduzido. Dapieve enumera as

motivações políticas para saída de cena das bandas do BRock:

Quando Fernando Collor assumiu a presidência, em 1990, houve uma significativa mudança nas relações entre música e política. Com ele, subiram ao poder 35 milhões de eleitores conservadores, na maioria do interior do país. Collor à frente, eles externaram seu apreço pela chorosa música sertaneja de duplas como Leandro & Leonardo, Chitãozinho & Xororó, Zezé Di Camargo & Luciano. Concessionária de serviços públicos, a mídia foi atrás. (DAPIEVE, 1995, p. 202)

É importante ressaltar que a opinião de Arthur Dapieve, além de

preconceituosa, ignorava completamente os fanzines. No universo das publicações

alternativas, a retração do mercado e a entressafra do rock comercial brasileiro, o

momento político-social do país e a falta de publicações especializadas em música

foram motivos que fomentaram a criação de fanzines no início da década de 1990,

inclusive do midsummer madness. Eu simplesmente não achava nas revistas de

música da época as informações que procurava. Esta carência por outro tipo de

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informação não era apenas minha, as provas estão em textos de vários fanzines

publicados entre 1989 e 1990: Para a moçadinha alternativa (!?) que ainda anda com os ouvidinhos viciados na chamada síndrome dos 80’s, ou seja, nostalgia mal consumida, movida a Joy Division / The Sister of Mercy (bandas que dispensam maiores comentários) sintonize, ajuste as antenas e entre nos 90, pois desinformação / ingenuidade, conservadorismo não são sinônimos de alternativos. (Fanzine EUTHANÁZIA, São Paulo, n.2)

Segundo o João ou Gordo, do Ratos de Porão, as bandas de hardcore continuam se proliferando pelo mundo todo, principalmente na Itália, mas por não serem comerciais, não atraem grandes platéias. […] Para quem deseja se interar dessa tendência musical, tem estômago forte e nenhum receio de perder as estribeiras, já pode começar adquirindo o disco Plano Furado, do Ratos de Porão (aliás, vem a calhar) com distribuição nacional, nos ‘States’ e até em disco laser. Também os programas Independência ou Morte, na 97 FM e Comando Metal, na 89 FM, são duas boas opções. (Fanzine RR, São Paulo, n.0, 1990)

- Vale (re)lembrar que a nossa intenção de resistir ao ‘esquemão’ do sistema é tão forte que não desistiremos tão facilmente desta luta. Por isso, taí o quatrão, uma obra suada/ forçada/ malvada! E é por ai que passeia nosso objetivo central. Por uma cultura mais digna, mais verdadeira e mais autêntica. E é isso! - Um abraço maldito! (Boletim CENAPI, Rio de Janeiro, n.4, 1990)

Mesmo com toda essa crise financeira pela qual passa o país, o Zine jamais irá morrer, pois faz parte do inconformismo e da impaciência de gerações abandonadas como foram a dos anos 60 e está sendo a dos anos 80. […] Pode-se afirmar que a febre Zine é uma verdadeira vitória contra a falta de cultura que contagiou o Brasil todo. Uma fórmula que não foi criada em laboratórios e que não tem compromisso com o governo. E que apesar de não ter recursos, defende a educação do país, os menos favorecidos e busca um lugar ao Sol – para todos – nesta terra de brazileirros e brazileirras. (Boletim CENAPI, Rio de Janeiro, n.4, 1989, original escrito por Antônio Vasconcelos do fanzine Ronda Alternativa)

O que os fanzines da época mostram é que havia uma movimentação na

música alternativa que não encontrava espaço nos jornais e revistas e que a

entressafra atingira apenas o BRock, ou o rock brasileiro mainstream: artistas e

bandas que viviam no underground continuavam a compor, a gravar e a fazer shows

com a mesma dificuldade / intensidade de sempre. Adilson Pereira, editor dos

fanzines Cartazine, Punch e Porco Espinho, relata em entrevista a este

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mapeamento de onde vinha o conteúdo que ele usava para preencher as páginas de

seus fanzines:

As bandas eram aquelas dos caras com quem eu me correspondia, com quem trocava fitas e às vezes discos. As informações sobre esse pessoal chegavam pelo correio, em flyers ou noutros zines. Ou então eram bandas ali da esquina, que a gente acabava conhecendo. Camaradas de colégio também apresentavam material. Uma vez por semana, durante muito tempo, talvez anos, encontrava amigos no CCBB e com eles falava sobre sons, quadrinhos, zines, punk etc. Ali, também surgiam pautas e informações sobre música. (Adilson Pereira em entrevista ao autor)

Nesta mesma época na Inglaterra, publicações especializadas em música

como os semanários New Musical Express e Melody Maker, além das revistas

Sounds, Q, The Face, Select, entre várias outras, haviam adotado uma nova

postura perante o mercado fonográfico: as publicações tinham como principal

objetivo criar movimentos musicais que estimulassem as vendas de discos,

ingressos e jornais. Por “criar” entenda-se estimular, divulgar e apoiar de tal maneira

que seus leitores se sentiam obrigados a conhecer e, talvez até “obrigados” a gostar

de algumas bandas e movimentos. Criava-se o “hype”, ou, a “moda”. Assim, 1990 foi

o ano das bandas de Manchester e do movimento Madchester; 1991 favoreceu a

Acid House e, em 1992, todos brigavam para ver quem descobria mais bandas de

uma longínqua cidade norte-americana chamada Seattle e seu movimento musical

intitulado Grunge.

Como as revistas brasileiras não acompanhavam a rapidez e não

compartilhavam os mesmos interesses comerciais e artísticos das publicações do

hemisfério Norte, os fanzines brasileiros sobre música se ocuparam de trazer as

novidades para o Brasil. Era bastante comum nessa fase que fanzineiros

xerocassem matérias inteiras de semanários britânicos, as traduzissem e

republicassem nos seus fanzines. Estes fanzines cumpriam, às vezes

inconscientemente, sua função de catalizadores de guetos e subestilos musicais. A

incapacidade das publicações brasileiras de estarem atualizadas com o que era

novidade no cenário musical estrangeiro não tem a ver com incompetência, mas sim

com uma escolha editorial de destacar o que fosse interessante para o mercado

brasileiro. E com certeza, o hype estrangeiro não interessava a maioria dos leitores

brasileiros. Cabia aos fanzines fazer esta ponte. Ao mesmo tempo, essa função de

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porta-voz das novidades dava aos fanzines o status de pioneiros, de “vanguarda”, no

quesito musical.

2 - Página do fanzine brasiliense Hang the DJ, com fotos e logomarca xerocadas do semanário inglês

Melody Maker

Não pretendo questionar o valor artístico da pauta escolhida pelos fanzines e

revistas. Também não pretendo analisar a competência ou o valor jornalístico da

pesquisa feita tanto pelos fanzines como pelas revistas. Há, ao meu ver, fatores à

favor e contra a postura de ambos. Se por um lado os fanzines simplesmente

copiavam, traduziam e republicavam, por outro lado, as grandes revistas ignoravam

a informação. A maioria dos fanzines de música no Brasil nesta primeira fase do

mapeamento, de 1989 a 1992, cumpriam à risca características clássicas de um

“fan-zine”: divulgavam assuntos do interesse do editor, como uma revista de fã e

serviam como agregadores de indivíduos com interesses comuns.

Os fanzines com matérias traduzidas de revistas britânicas cumpriam um

papel de amplificar informações de estilos segmentados de música estrangeira no

Brasil. As revistas e semanários ingleses antes citados não eram encontradas

facilmente em bancas no Brasil, mesmo com a abertura do mercado nacional posta

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em prática pelo Governo Collor. Portanto, as pessoas que tinham acesso a estas

publicações dispunham de informação privilegiada e valiosa. A maneira mais óbvia

de dividir a informação e, principalmente, de encontrar outras pessoas interessadas

no mesmo tipo de informação era publicar um fanzine com estas matérias

traduzidas.

Cabe aqui uma observação importante: era bastante comum se referir a

fanzines apenas como zines, subtraindo o prefixo “fan”. Esta redução denotava uma

preocupação com a variedade de artistas e assuntos, em oposição à devoção cega

a apenas um ídolo. Os zines musicais desta fase, inspirados nas revistas

estrangeiras, buscavam com a variedade de artistas, serem vistos como publicações

alternativas e não somente um impulso de idolatria a um único artista.

O formato mais comum dos fanzines desta fase eram as folhas A4 ou ofício,

reproduzidos em xerox, grampeados manualmente. O modo de grampeamento mais

comum era o externo, grampeando as páginas pela margem esquerda. Era bastante

comum também formato A5 (folhas A4 dobradas) e, em alguns fanzines deste caso,

as páginas não eram grampeadas. Neste formato, o grampeamento era externo,

como descrito acima, e em poucos casos, o grampeamento interno, no meio da

dobra, o que conferia a estes fanzines um acabamento melhor.

A diagramação era manual, feita com máquinas de escrever normais ou

elétricas, ou escrita à mão. As ilustrações, fotos e desenhos eram montadas

manualmente, por corte e colagem. Neste caso, o formato dos fanzines obedecia à

praticidade de republicar conteúdo estrangeiro: as fotos, ilustrações e tipologias

eram simplesmente xerocadas enquanto o texto era traduzido e reescrito à mão, à

máquina e, em raríssimos casos nesta fase, digitados em computador para serem

primeiro impressos e depois recortados e diagramados à mão, em tiras ou colunas

de textos. Apesar do software PageMaker (da Aldus) ter sido criado em 1985,

diagramação eletrônica ainda era inacessível à amadores nesta época, assim como

eram raros os computadores pessoais.

Voltando ao conteúdo, alguns fanzines tentavam dar um toque pessoal às

suas publicações usando as ilustrações e fotos de semanários britânicos mas não

traduziam o conteúdo: preferiam escrever críticas e opiniões pessoais. Todos

fanzines traziam endereços de outros fanzines: era a única maneira possível de

promover o intercâmbio. Na grande maioria dos fanzines, a primeira página trazia

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um editorial, o endereço de contato do editor e alguns poucos traziam índice de

matérias com numeração das páginas.

Um componente importante deste tipo de fanzine era a criatividade na parte

gráfica, mesmo sendo impresso em xerox. Seus editores criavam tipologias próprias

e experimentavam recursos das máquinas de xerox, como ampliar e reduzir, para

conseguir novos efeitos. Outro recurso bastante usado na maioria dos fanzines

desta época eram os letraset e decadry: tipologias aderentes e formas de letras

vendidas em papelarias. A sobreposição de textos a imagens também era feita

manualmente. A limitação de diagramação imposta pelas máquinas de escrever –

somente vertical ou horizontal, divisão por colunas - era quebrada pelo texto escrito

à mão ou pelos experimentos com corte e colagem, ampliação e redução de textos.

Era bastante comum nessa época que alguns fanzines tivessem apenas uma

página impressa por folha, ou seja, não tinham frente e verso, apenas frente. Isso

acontecia porque a xerox frente e verso era mais cara. O número médio de páginas

variava entre dez e doze páginas com cinco a seis folhas no formato A4 e três a

quatro folhas no formato A5. A maioria das fotos e ilustrações tinham alto constrate

por causa da reprodução precária das máquinas de xerox.

Duas publicações importantes desta fase eram o Boletim CENAPI e o Mau.

Este vinha encartado na revista de quadrinhos Animal, publicada pela editora VHD

Diffusion de São Paulo. As duas publicações eram importantes pois colaboravam

intensamente para a divulgação e o intercâmbio de fanzines no Brasil. No caso do

Mau, a tiragem e a distribuição em bancas da revista Animal para um público

segmentado ajudavam na divulgação dos fanzines.

Já o boletim da Central Nacional de Produtores Independentes, o Boletim CENAPI, tinha como principal objetivo a organização, mapeamento e estímulo a

produção e ao intercâmbio de todo tipo de publicação independente. Fanzines, livros

independentes, revistas de qualquer assunto eram amplamente divulgadas pelo

Boletim, que trazia listas de endereços, pequenas resenhas críticas e artigos sobre a

movimentação da cenário editorial independente brasileiro.

A edição número 4 do Boletim CENAPI, de 1989, traz números interessantes

de uma pesquisa informal feita pelos editores. Segundo eles, “o número de

publicações alternativas” no Brasil naquele ano era de 384 publicações, sendo 102

no estado de São Paulo, seguido por Rio de Janeiro (95) e Minas Gerais (44). A

pesquisa não explica o que são “publicações alternativas”, nem o método utilizado

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para chegar a este número. Mas os editores esclarecem que, apesar de saberem

que o número não é exato, acreditam que ele representa uma amostragem próxima

à realidade da época (Boletim CENAPI, n. 4, p.11, 1989).

Em outro artigo na mesma edição, os autores listam uma série de iniciativas

de integração e associação de editores alternativos para se organizar. O Boletim

CENAPI permitia assinatura, que nesta edição custava CZ$2,10 (dois cruzados e

dez centavos), com um carimbo sobreposto reajustando o valor para CZ$3,50 (três

cruzados e cinquenta centavos) – provavelmente por causa da inflação que assolava

a economia do país. Era necessário o preenchimento de um formulário que deveria

ser enviado por carta junto com um cheque nominal ou vale postal para o editor do

Boletim. Só não estava discriminado a quantas edições a assinatura dava direito,

atestando a falta de periodicidade até das publicações mais organizadas.

A revista ANIMAL existiu entre 1987 e 1991. Foi uma revista de quadrinhos

underground fundada por Rogério de Campos e lançada pela editora VHD Diffusion.

Era editada por Fábio Zimbres, Newton Foot, Rogério de Campos e Celso Singo.

Publicava quadrinhos de artistas estrangeiros pouco conhecidos e também foi uma

das primeiras a dar espaço a novos quadrinhistas brasileiros. Os quadrinhos eram

impressos em papel couché colorido mas a revista contava com um encarte em

papel jornal chamado Mau. Priscila Farias, uma das colaboradoras da Animal

explicou em entrevista para este mapeamento: Mau era um encarte, não era um fanzine. ‘Maudito Fanzine’ era o nome de uma seção deste encarte. Havia algumas seções fixas e outras coisas que mudavam a cada número. Decidíamos a cada número. Publicávamos no MAU histórias e textos em preto e banco, com conteúdo mais agressivo, coisas mais alternativas. (Priscila Farias em entrevista ao autor)

O Mau tratava de música (especialmente de bandas independentes

brasileiras), política, cinema, entre outros assuntos. Com diagramação

propositalmente “suja”, mas com impressão em duas cores, o Mau sempre trazia

duas páginas com resenhas de fanzines recebidos em sua redação. As resenhas

obedeciam ao seguinte modelo: nome do fanzine seguido de seu endereço, número

da edição, formato, número de páginas e uma breve descrição crítica. As páginas

também traziam reproduções de quadrinhos publicados nos fanzines em destaque.

Por ter um leitor segmentado e interessado, a divulgação de fanzines no Mau era

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bastante eficiente e gerava um intercâmbio enorme. Ainda segundo Priscila, a seção

Maudito Fanzine refletia um crescimento no número de fanzines na época: Acho que o número [de fanzines] aumentou durante o período que editamos a revista, e acredito que algumas das causas podem ter sido: maior facilidade de acesso a impressoras xerox, menor preço das impressões, maior interesse pela edição de fanzines, estimulado pelo mercado editorial e musical. (Priscila Farias em entrevista ao autor)

Outro veículo de divulgação bastante importante nesta época, quando a

produção de fanzines musicais crescia, foi a coluna Rio Fanzine do Jornal O Globo.

Criada em 1986 pela jornalista Ana Maria Bahiana, a função seria divulgar toda

semana dentro do Segundo Caderno do Jornal O Globo, manifestações culturais

alternativas. Como a própria jornalista explica no texto da orelha do livro “Rio

Fanzine – 18 anos de cultura alternativa”: Como sempre, havia tribos e paixões. E foi na verdade por isso, mais do que por qualquer uma outra dessas razões acima, que o Rio Fanzine nasceu. Pelo desejo simples de ter uma tenda na taba, uma fogueirinha, um tambor eletrônico batendo no pulsar de nossos corações. Veja como éramos insolentes: achávamos que essa tenda podia ser erguida bem na praça principal da aldeia, nas páginas do suplemento de variedades mais lido de um dos maiores jornais do país. (BAHIANA, 2004, capa)

O Rio Fanzine divulgava semanalmente endereços de zines recebidos em

sua redação. A partir dai, o intercâmbio se dava pela troca de cartas e de

publicações. Por exemplo, logo após a divulgação do midsummer madness no Rio

Fanzine, dezenas de cartas de fanzineiros e de curiosos, além de fitas de

demonstração (as fitas demo) de bandas começaram a chegar no meu endereço.

Outro fator importante de estímulo ao crescimento de fanzines estava no fato

da coluna ter a palavra “fanzine” no seu nome. Ao mesmo tempo que o termo

conferia uma posição de vanguarda à coluna, reforçava e oficializava,

semanalmente, os fanzines como meio de expressão da cultura independente num

dos maiores jornais do país.

A importância do Mau (da revista Animal), do Rio Fanzine do Jornal O Globo

e do Boletim CENAPI foi de promover o intercâmbio e divulgar os fanzines,

fortalecendo uma rede que se provaria fundamental para a próxima fase deste

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mapeamento, que é o ápice da produção de fanzines musicais em xerox no Brasil.

Por causa deste apoio, uma outra vertente de fanzines de música iniciou uma

tendência que seria adotada com mais vigor na fase que analisaremos a seguir: a

produção de conteúdo próprio e original, divulgando artistas independentes que não

tinham espaço nos grandes jornais e revistas.

3 - Detalhes da página Rio Fanzine do Jornal O Globo de 20/09/1992, Segundo Caderno, p. 5

A entressafra do rock comercial nacional, aliada ao acesso a revistas e discos

importados, gerou um novo movimento alternativo no cenário musical: as bandas

brasileiras que cantavam em inglês. Estas bandas não eram bem vistas pelos jornais

e revistas que achavam um retrocesso artistas nacionais cantando em inglês.

No entanto, a maioria das novas bandas retrocedeu, em todos os sentidos. O principal passo atrás foi reempossar o inglês como língua oficial do rock. A má digestão da torrente de informações despejadas pela MTV – instalada no país desde 1990 – e o sonho de uma vitoriosa carreira no exterior – como as de Sepultura e Viper – levaram grupos como Second Come, Anarchy Solid Sound, Pin Ups, Beach Lizards, Dash e Killing Chainsaw, alguns deles bastante interessantes, a renunciar à liberdade conquistada por Cazuza, Renato Russo, Arnaldo Antunes & Cia, se conformando com o culto no gueto. (DAPIEVE, 1995, p. 203)

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Escrito em 1995, este parágrafo que está no capítulo final do livro de Arthur

Dapieve, pode e deve ser reavaliado hoje. A informação mais interessante que ele

traz é a frase “se conformando com o culto no gueto”. Ela serve para comprovar o

papel crucial que os fanzines tiveram na documentação desta produção musical,

que, no ponto de vista de Dapieve, não era importante pois não tinha sucesso

comercial. Mas uma coisa que Dapieve ignorou é que, ainda assim, o número destas

bandas crescia e representava uma parte importante do cenário musical brasileiro

no começo da nova década. Claro que diante de tal rejeição pela grande imprensa,

os fanzines passaram a ser o veículo natural de divulgação desta producão. É o que

veremos no próximo capítulo deste mapeamento.

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CAPÍTULO 3 SEGUNDA FASE: ÁPICE DA PRODUÇÃO EM XEROX (1992 - 1994)

A segunda fase, que se inicia em 1992 e vai até 1994, é a mais fluída e difícil

de delimitar pois é uma curta fase de transição. As características que compoem

este período apontam para um movimento que acontecia no mundo dos fanzines de

música: a tentativa de aprimorar a parte gráfica.

Esta mudança é diretamente influenciada por fatos como o crescimento de

uma nova cena musical no Brasil, a popularização do computador caseiro e dos

programas de editoração eletrônica e pelo barateamento do principal meio de

reprodução dos fanzines, a xerox. O que torna esta fase curta e fluída é a conjuntura

econômica. Ao mesmo tempo que fatores culturais e tecnológicos impeliam fanzines

ao crescimento, a instabilidade da economia tornou este movimento fugaz.

Em 1992, o movimento de impeachment tirou Fernando Collor da Presidência

do Brasil. A situação econômica continuava instável. A reserva de mercado na

informática acabara em 1991. Na cena musical, novos nomes como Skank,

Raimundos, Planet Hemp, Chico Science & Nação Zumbi, Mundo Livre S/A

despontavam para o mainstream e para as grandes gravadoras (as multinacionais

da época como Sony, BMG-Ariola, EMI, Warner/Continental e Polygram/Universal)

depois de relativo sucesso no mercado como artistas independentes. Vale a pena

citar um movimento que ajudou a catapultar a maioria destas bandas e que sempre

esteve ligado aos fanzines: o dos festivais independentes.

No Rio de Janeiro acontecia o Festival Superdemo e o Humaitá pra Peixe; em

Recife, o Abril Pro Rock; em Belo Horizonte, o BHRIF, e em Campinas, o Juntatribo.

A maioria das bandas citadas anteriormente tocou nestes festivais e o principal

veículo de divulgação deste movimento eram os fanzines. A banda brasiliense

Raimundos, por exemplo, teve centenas de fitas demo distribuídas à fanzines,

recebendo sempre muitos elogios. Estes elogios chegavam aos produtores dos

festivais independentes, que escalavam a banda. O Juntatribo, festival realizado em

apenas duas edições (1993 e 1994) na UNICAMP (Campinas / SP) era organizado

pelo editores do fanzine Broken Strings, Thiago Mello e Sérgio Vanalli .

No começo da década de 1990, dezenas de bandas, inclusive algumas das

citadas anteriormente, começaram a criar um circuito independente: distribuiam suas

músicas via fitas cassete, faziam pequenos shows, ajudavam a organizar festivais e

procuravam fanzines como meio de divulgação. Estas mesmas bandas reclamavam

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constantemente da falta de espaço nos grandes jornais, revistas, rádios e até na

única rede de TV dedicada à música, a MTV, que começara a transmitir no Brasil em

1990. O discurso das bandas variava entre “não temos espaço na imprensa” e “não

precisamos da imprensa”. Estabeleceu-se uma tendência de valorizar a “imprensa

independente” que eram os fanzines.

Nesta época, ainda não existiam dados que comprovassem o aumento do

número de bandas no cenário independente no Brasil. Entretanto, o crescimento já

havia começado, tanto que, na próxima fase analisada neste mapeamento, o

aumento se torna evidente com a publicação mensal de um guia de bandas

chamado Underguide. Mais sobre este guia adiante, agora é importante destacar

que havia um crescimento no número de artistas independentes no Brasil.

4 - Capa do fanzine FANZ n. 6, com destaque a várias bandas independentes.

Diante deste cenário de crescimento, os fanzines musicais proliferaram. Na

parte de conteúdo, nota-se uma tendência a valorizar matérias próprias, pautadas e

apuradas pelo editor da publicação, ilustrada com fotos de divulgação das bandas

ou produzidas por fotógrafos iniciantes. É nesta fase que é possível comprovar uma

das hipóteses levantadas por este mapeamento: na busca por matérias originais (em

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oposição às traduções da fase anterior), os fanzines tornaram-se responsáveis pelo

único registro existente de vários artistas e grupos musicais brasileiros. Muitas

bandas jamais tiveram um matéria, nota ou entrevista em qualquer veículo da

imprensa estabelecida, isto é, grandes jornais, revistas, estações de rádio,

programas de TV, etc. Ou seja, se não fossem os fanzines impressos, muito do que

se produziu na música independente brasileira no começo dos anos 1990, teria se

perdido. Nota-se o aumento no número de fanzines que destacaram bandas

alternativas nas suas chamadas de capa.

É interessante destacar que os fanzines, cientes de sua importância neste

movimento musical, buscaram melhorias na parte gráfica e na pauta de suas

publicações. Os editoriais de fanzines da época eram bem claros sobre sua função

neste cenário: A cultura alternativa sempre esteve na frente, apostando numa verdadeira e ousada inovação e apesar de ter seus conceitos distorcidos pela grande imprensa e outros meios comerciais, continua firme com seus ideais rebeldes. (fanzine MASTURBAÇÃO IOGURTE E ROCK’N’ROLL, Fortaleza, 1992) E, por favor, bandas, mandem demos, releases e fotos pra gente… Queremos divulgá-los e engordar o ANTI-EXISTÊNCIA, pois esse é o nosso objetivo: mostrar a força e a competência da nossa cultura underground. (fanzine CAPITÃO CRI CRI, n. 1, 1994)

Um recado importante às bandas que procuram divulgação em qualquer fanzine. Quando entrarem em contato com um fanzineiro, troquem material, zine por demos, etc. Dá menos trabalho para ambos. E, por favor! Quando forem tirar fotos, de preferência P/B, façam-nas em Close. A não ser que os integrantes gostem de ser confundidos com borrões depois de xerocados (mesmo em off-set, como o Drowned’Z, as fotos saem ruins). (fanzine DROWNED’Z, São Paulo, n.1, ano 1,1994)

O zine CARCAÇA é uma publicação independente que quer divulgar um pouco do que está acontecendo e dar uma força para as bandas que estão surgindo. (fanzine CARCAÇA, n. 0, 1995)

Fanzines desta época cobriam extensamente a produção musical

independente, com críticas de fitas demo, vinis e CDs, artigos e entrevistas com

bandas e matérias sobre shows e festivais. Um fanzine em papel jornal, formato

tablóide, chamado Mixer, que existiu entre 1993 e 1994, vendido em banca, trazia

uma matéria sobre as novas bandas de Recife. Quem assinou o texto foi Gastão

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Moreira, na época, apresentador da MTV relatando que nascia na capital

pernambucana “uma explosiva geração de roqueiros” e continua: A boa música continua transbordando de muitos subterrâneos ao redor do mundo. Lugares inusitados estão começando a ter oportunidade de mostrar a sua musicalidade que muitas vezes surpreende até os ouvidos mais complicados. […] Desde o ‘boom’ de bandas nos anos 80, nada de interessante parecia ocorrer. Os que se deram bem, como Barão Vermelho, Titãs e Legião Urbana, consagraram-se. Muitos outros viram as portas fechadas. […] Fui a Recife convidado para apresentar o festival ‘Abril Pro Rock’, tudo que sabia é que se tratava de um festival com bandas que iam do Maracatu (ritmo local) até o Hard Rock cantado em inglês. (fanzine MIXER, n.1, p. 44-45, 1993)

Dai por diante, a matéria de duas páginas se preocupa em listar e descrever

as bandas assistidas no festival Abril Pro Rock: Bluesbróders, Cobaia Kid, Weapon,

Academia do Medo, Paulo Francis vai Pro Céu, Tempo Nublado, além de Mundo

Livre S/A e Chico Science & Nação Zumbi que ficariam bastante conhecidas em

todo Brasil no ano seguinte.

Outro fanzine de 1994, o Mashing Informant, mais voltado para a divulgação

de campeonatos de skate, abriu espaço em um de seus números para relatar como

havia sido a segunda edição do festival Juntatribo: Sabemos que em nosso país falar em independência parece piada, mas podemos dizer que na área da música existe uma certa força (só seria bem mais expressiva se houvesse mais gigs).[…] Juntatribo tem sido aclamado por músicos, críticos e algumas gravadoras como o mais importante evento acontecido no Brasil. (fanzine MASHING INFORMANT, São Paulo, n. 4, ano 2, p.24, 1994)

E lista todas as bandas que se apresentaram nessa edição, entre elas Little

Quail, Virna Lisi e Planet Hemp, que assinariam contratos com gravadoras após o

festival.

Outro fanzine da época, o Drowned’Z, impresso em offset com capa

monotone verde, trazia quarenta e quatro páginas quase que somente com matérias

de bandas independentes brasileiras. A exceção são duas páginas de entrevista

com o quadrinhista Henry Jaepelt. Nas outras páginas do Drowned’Z, o leitor

conhecia bandas como Genocídio, No Violence, Pinheads, Leviaethan, White Frogs,

Panic, No Sense, Dorsal Atlântica, Blessed, HC 137, Safari Hamburguers… Num

trecho da entrevista com Safari Hamburguers, o texto é o seguinte :

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Drowned’Z: Parece que após dez anos o Hardcore brasileiro continua com boas bandas e produzindo, quem você admira nesse cenário? AC [Antonio Carlos, vocalista da banda Safari Hamburguers]: As pessoas que se viram para agitar show mesmo sem grana e que fazem isso porque gostam, e os fanzines que são responsáveis por tudo que rola no underground, passando informações e divulgando bandas novas para a cena HC. (Fanzine DROWNED’Z, São Paulo, n.1, ano 1, p. 20, 1994)

Além destas entrevistas, o Drowned’Z, como a maioria dos fanzines musicais

da época, reservava espaço para divulgação de outros fanzines e discos das bandas

independentes. São sete páginas em formato A5, com tipologia tamanho 8 listando

fanzines, fitas demos e CDs, todos com endereço de contato, uma pequena análise

e dados técnicos. Todas estas citações servem para mostrar o momento de ebulição

da cena musical independente no Brasil. E os fanzines acompanhavam o momento.

A maioria deles buscava aprimoramento na parte gráfica e organização

semiprofissional, como por exemplo, tentar fixar uma periodicidade e criar um

sistema de assinaturas.

Neste momento de busca pelo apuro gráfico, começava a se tornar mais

popular o computador caseiro com recursos de diagramação e edição de textos.

Vários zines mesclavam recursos primários de editoração eletrônica com paginação

feita à mão, textos escritos com nanquim e criação de tipologias próprias.

É bastante comum nessa fase uma mistura de recursos de diagramação.

Softwares de desktop publishing como PageMaker não eram fáceis de usar e

também só podiam ser usados em computadores mais potentes. Era comum a

digitação em editores de texto como Word (em sua versão 2.0 até 3.1), bloco de

notas do Windows ou Word Star. Os textos eram tabulados e impressos em colunas,

como “tripas de textos”. Estas tripas eram recortadas e coladas nas páginas, junto

com as fotos, criando uma paginação mista. Eram raras as páginas que tinham um

acabamento eletrônico total. As imperfeições e a mistura de recursos eram visíveis:

o recorte das tripas, ao ser xerocado, deixava exposto suas bordas, a sobreposição

de fotos criava margens brancas sobre as fotos e as margens das páginas nem

sempre eram uniformes.

Por outro lado, alguns fanzines que tentavam diagramar suas páginas de

forma totalmente eletrônica esbarravam na inexperiência. O fanzine Gotas, editado

pela rádio Brasil 2000 FM de São Paulo, que era vinculada à faculdade Anhembi-

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Morumbi, é um destes exemplos. A edição de julho/ agosto 1993, apesar de

concebida dentro de uma faculdade de comunicação, trazia textos separados em

notas (por isso o nome Gotas) misturando tipologias diferentes, sempre em caixa

alta, o que tornava a leitura bastante cansativa, mesmo em textos curtos. Alguns

recursos da biblioteca de estilos da primeira versão do software Corel Draw também

foram usados exaustivamente na editoração do Gotas.

5 - Página do fanzine Gotas.

O fanzine Panacea número 22, de dezembro de 1992 foi quase todo

diagramado eletrônicamente. Seus editores cursavam a faculdade de editoração da

ECA – USP e o fanzine tinha expediente com créditos para ilustrador da capa,

composição, edição e revisão, ou seja, funções típicas de uma revista. Mesmo

assim, algumas páginas ainda misturavam diagramação eletrônica e manual (que no

glossário deste mapeamento será listado como diagramação mista), em busca de

efeitos que não podiam ser obtidos nos programas disponíveis na época.

A principal dificuldade dos fanzines era a manipulação eletrônica de imagens.

A maioria do editores ainda montava manualmente as imagens na página. O

resultado era um fanzine que não “saía pronto da impressora”, mas que ainda

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precisava ser montado e finalizado à mão, com todas as imperfeições características

deste tipo de montagem. Algumas vezes estas imperfeições eram propositais. Mas

na maioria das vezes, ficava claro que o objetivo dos fanzineiros era a perfeição

eletrônica, a diagramação mais limpa, mais próxima de uma revista alternativa e não

de um fanzine “sujo”.

6 - Páginas do fanzine Panacea n. 22, misturando diagramação eletrônica e manual.

Como foi relatado no início deste capítulo, esta segunda fase é um momento

de transição, portanto de características mistas. É uma fase de passagem, entre o

início do crescimento da cena musical, do aperfeiçoamento gráfico e o auge da

publicação de fanzines impressos no Brasil, que será a próxima fase a ser relatada.

Como pode ser constatado nas citações até agora, há uma variedade de formatos,

tipos de impressões e experimentações. Fanzines se arriscando para lançar edições

diagramadas eletronicamente, outros experimentando offset, misturando

diagramação eletrônica e manual na tentativa de ousar na parte gráfica. Mas o que

marca esta fase de transição é o esmero e a experimentação da maioria no uso da

xerox como recurso de duplicação. Os editores parecem ter dominado as técnicas

de reprodução nas máquinas de xerox. Fanzineiros usavam com maestria recursos

de ampliação e redução de imagens, sobreposição de fotos, contraste de imagens

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para melhor resolução, sangramento de páginas. Foi nesta fase que se produziram

os melhores e mais bem acabados fanzines de música em xerox.

 

 

7 – Flyer de divulgação do grupo Seres Urbanos, de Fortaleza. Destaque para o reforço da xerox como item fundamental na composição dos trabalhos do grupo.

  Nesta fase, um grupo de fanzineiros de Fortaleza, conhecido como “Seres

Urbanos”, publicou vários fanzines muito bem acabados em xerox, a ponto de uma

das publicações ser chamada de Undergraff, a Graphic Zine. O mais relevante

deles é o Masturbação, Iogurte e Rock’n’Roll, lançado em 1992. Com 54 páginas,

um verdadeiro exagero para a época, todo diagramado à mão, o fanzine falava de

música, quadrinhos e sexo. A característica mais marcante de “Masturbação…” é o

capricho com que seu editor, Weaver Lima, diagramava cada página. A impressão

que se tem é a de que cada página era tratada uma obra de arte gráfica em xerox.

Ainda sem usar recursos eletrônicos de editoração, Weaver diagramou cada

página desenhando à mão com nanquim e usando recorte e colagem. Os textos

eram escritos à mão com uma perfeição de entrelinhas e espaçamento que

confunde até os leitores de hoje, acostumados à exatidão do computador. O

Masturbação, Iogurte e Rock’n’Roll parecia ter sido feito eletronicamente mas na

verdade fora pensado para realçar as qualidades de uma boa reprodução em xerox.

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7 – Página do Editorial do fanzine Masturbação Iogurte e Rock’n’ Roll e,

em detalhe, seu perfeito alinhamento manual.

O pesquisador de fanzines e ex-fanzineiro Douglas Utescher entrevistou, no

ano 2010 para seu trabalho de conclusão de curso, alguns importantes fanzineiros

que publicaram durante esta fase para saber como era a “relação” deles com a

reprodução em xerox. As respostas da entrevista, publicadas no artigo “E Por Falar

em Fanzines. Parte 2: Xerox”10 são reveladoras de como nesta fase alguns editores

passaram a encarar a reprodução em xerox como mais um elemento artístico dos

seus fanzines. 2 – Das ocorrências características da impressão xerográfica (manchas, alto contraste, granulações, etc.) alguma lhe agradava ou irritava especialmente? Qual? Márcio Sno [editor do fanzine Argh!] – Gostava muito do contraste que rolava quando eu acertava no preenchimento da página (fundo). […] O que me irritava muito era quando eu preparava uma página bacana e quando copiava, o toner era ruim, ou cortava pedaço do texto e coisas do gênero. Era terrível quando eu exagerava no fundo escuro e a cópia saia esbranquiçada. […] Law [Tissot, editor do fanzine Mutação, entre outros] – Trabalhei muito tempo com copiadoras (xerográficas), isso ampliou meu

                                                        10 Fonte: Blog Ugra – http://ugrapress.wordpress.com/2010/10/28/e-por-falar-em-fanzines-parte-2-xerox/ - acessado em 29/10/2010

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conhecimento técnico, um domínio sobre as possibilidades do equipamento, redução e ampliação da imagem, meio tons reproduzidos de acordo com cores (ou originais), a limpeza de espelhos e demais suprimentos que otimizam uso da máquina e da cópia. De sua lista, o contraste e as granulações das grandes ampliações são fascinantes. Alberto [Monteiro, editor do fanzine AntiUsual] – O que me irritava mais eram aquelas manchas esfumaçadas, depois tinham aquelas linhas cortando tudo, e às vezes a máquina até amarrotava o papel – além de falta de toner, que são aquelas reproduções muito apagadas. Tudo isso era terrível. O que eu gostava era da forma chapada que ficavam as fotos caseiras, parecendo silk screen, o que às vezes não se conseguia de primeira, tinha que tirar xerox mais de uma vez pra se conseguir o resultado. (Blog UGRA, “E Por Falar em Fanzines” acessado em 29/10/2010)

. Outro bom exemplo de crescimento (ou pelo menos, de tentativas de se

profissionalizar) é o fanzine Backstage, que começou como fanzine em xerox,

passou para o formato de jornal, se aventurou como revista distribuída em bancas e

foi obrigado a voltar ao papel jornal por causa da instabilidade econômica da época.

Lançado como fanzine especializado em música, o fanzine era voltado para

divulgação de bandas de heavy metal. A edição número quatro, de janeiro de 1992,

saiu em formato tablóide, com 24 páginas numeradas, impresso em preto e branco

nas rotativas da Tribuna de Imprensa. Na capa, a banda norte-americana Living

Colour junto com chamadas para entrevistas exclusivas com nomes da cena heavy

metal brasileira: Viper, Sarcofago e Korzus. Trazia índice, expediente e editorial. A

diagramação era simples, feita a mão, mas com unidade e coerência na tipologia

para os textos e títulos. A tiragem não foi divulgada. O interessante desta edição era

a mescla de anúncios (lojas de discos, de instrumentos musicais e até de um hotel)

com seções típicas de um fanzine, como resenhas de demos e de shows.

A edição seguinte do Backstage, de maio de 1992, saiu com 44 páginas,

capa colorida em papel couché e miolo em papel jornal, com anúncios coloridos na

segunda, terceira e quarta capas. A diagramação continuava manual, com mistura

de tipologias mas o avanço gráfico era nítido e foi exaltado no editorial: Você não está acreditando, mas é isso mesmo! Este BACKSTAGE que você acaba de adquirir é o mesmo que uma vez foi fanzine ‘xerocado’ e que ultimamente circulava em formato tablóide. Desde o final do ano passado notamos que nosso número de leitores havia aumentado muito e que muitos deles não conseguiam retirar o seu exemplar gratuito em um dos pontos de distribuição. Por isso ficamos parados desde o lançamento da nossa edição de janeiro,

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tentando encontrar um meio pelo qual o BACKSTAGE pudesse chegar até você mais facilmente. Concluímos então que distribuí-lo para as bancas de jornais – ainda que isto implique em sua venda – seria a melhor maneira de atendermos à demanda de leitores. Dai o BACKSTAGE com ‘cara’ de revista, trazendo 40 páginas com o peso do mais puro Rock’n’Roll. (Fanzine BACKSTAGE, Rio de Janeiro, n.5, editorial, 1992)

O formato de revista, vendido em banca, durou apenas três edições. A

explicação, mais uma vez, estava no editorial da edição número oito do Backstage: Olha nós aqui outra vez em forma de jornal! Pois é, a editora que lançava, entre outras, a revista Backstage, encerrou suas atividades e, sem ela, não nos foi possível distribuir e vender nossa publicação nas bancas. Como não queríamos deixá-lo sem informação, resolvemos reeditar o jornal Backstage, com distribuição gratuita. (Fanzine BACKSTAGE, n.8, editorial, 1993)

A edição número oito voltou a ser impressa em jornal, preto e branco, num

formato não convencional (22,5 cm x 30,8 cm) que se assemelhava ao formato de

uma revista. O Backstage voltou à distribuição gratuita sem revelar a tiragem. Ainda

diagramado manualmente, os retrocessos gráficos mais visíveis são: a capa e o

miolo em papel jornal, as páginas não numeradas, a inexistência de índice e a falta

de uma identidade visual. Os destaques são uma entrevista exclusiva com Kurt

Cobain, líder da banda norte americana Nirvana, um ano antes dele cometer

suicídio, e a apresentação de um esquema de venda pelo correio.

A edição número nove só saiu meses depois, em agosto de 1993, em formato

tablóide, papel jornal, com capa colorida e miolo preto e branco. O preço de capa

era de CR$60.000,00 (sessenta mil cruzeiros), doze vezes mais alto que o preço da

edição número cinco, em formato revista e distribuída em bancas. A diagramação já

era totalmente eletrônica mas a confusão de tipologias continuava. Esta edição

contava com os mesmos anunciantes das edições anteriores, o que atesta a

fidelidade dos apoiadores da publicação. Mais uma vez, a explicação estava no

editorial: Pode acreditar, esse tablóide com capa colorida que você acabou de adquirir é o Backstage sim! Aquele mesmo que já foi feito em xerox, depois virou jornal, depois revista e agora jornal outra vez. É, a gente não desiste. Chova ou faça sol, com editora ou sem editora, com anúncios ou sem eles, com foto boa ou foto velha, lá vamos nós com mais uma edição. (Fanzine BACKSTAGE, n.9, editorial, 1993)

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Só que esta foi a última edição do fanzine Backstage. A revista Backstage

que atualmente é vendida em bancas, fala sobre produção musical e instrumentos

musicais é editada por outras pessoas. A história do Backstage ilustra a tentativa de

crescimento de alguns fanzines numa época de hiperinflação. Esta tentativa num

momento instável é o que caracteriza a segunda fase deste mapeamento. Na

próxima fase, um dos fatores que contribuiram para o auge da produção de fanzines

impressos sobre música no Brasil foi justamente a estabilidade econômica do Plano

Real.

Apesar da instabilidade, uma outra publicação teve melhor desempenho

neste mesmo período. Em 1991 começou a ser publicado o fanzine Panacea, com

oito páginas em A5. Editado por José Mauro Kazi, publicava quadrinhos, artigos

sobre música e literatura. O marcante do Panacea foi sua rápida evolução gráfica,

editorial e a regularidade de sua publicação. Seu formato inicial era A5, em xerox,

grampeado e, quando deixou de ser publicado, em dezembro de 1995, o Panacea

número quarenta tinha oitenta páginas, formato 21 x 28 cm, capa em papel couché

colorido e uma diagramação interna bastante moderna para os fanzines, e até para

as revistas da época. O Panacea foi publicado mensalmente, regularidade incomum

aos fanzines.

Em 1992, já na sua edição número vinte e dois, o Panacea tinha vinte e

quatro páginas em formato A5, com tiragem de mil exemplares em xerox e apoio de

uma duplicadora do campus da USP. A diagramação eletrônica se misturava com

algumas artes feitas à mão. Neste mesmo ano, a publicação ganhou o Prêmio

Ângelo Agostini como melhor fanzine, oferecido pela Associação de Quadrinhistas e

Caricaturistas do Estado de São Paulo (AQC – ESP). Este prêmio continua sendo

entregue até hoje.

O Panacea manteve sua regularidade até a primeira mudança gráfica. Em

setembro de 1993 saiu a edição número trinta e um, a primeira impressa em offset,

com trinta e duas páginas e diagramação totalmente eletrônica. O editorial desta

edição dizia: Ah, escusas. É o único modo de começar este editorial: pedindo desculpas. Por causa da gráfica na qual imprimimos – e suas obrigações e falta de recursos -, a edição de julho do Panacea não saiu em julho. Pois é, por causa da ‘morosidade’ da gráfica, nós, para não atrasarmos mais com vocês, leitores (apesar de não termos culpa),

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estamos tentando de tudo – inclusive fechar as edições com dois meses de antecedência. (Fanzine PANACEA, n. 31, editorial, set. 1993)

Percebe-se no editorial acima uma organização que mais se aproxima de

uma revista do que de um fanzine, com data para fechamento das edições. Apesar

dos problemas, o Panacea continuou evoluindo no novo formato. O número de

páginas aumentava a cada edição e para manter a regularidade, os editores

contavam com a colaboração de vários redatores, às vezes reais, às vezes fictícios.

Usando pseudônimos, os editores criavam colaboradores numa estratégia para dar

a impressão de pluralidade ao staff do Panacea (MAGALHÃES, 2004, p.50-51).

Em novembro de 1993, a publicação chegou ao número trinta e três e seu

editor anunciou o “fim do fanzine” prometendo novidades. O número seguinte veio

como uma revista de oitenta páginas e capa colorida. Como Henrique Magalhães

destaca: Panacea foi um ícone dos anseios de toda uma geração de quadrinhistas e editores de fanzines. Era a concretização de um projeto almejado por muitos, ou seja, a transformação dos pequenos fanzines artesanais em publicações compatíveis com as profissionais. (MAGALHÃES, 2004, p.52-53)

O Panacea misturava quadrinhos, música e literatura. A edição trinta e sete,

de janeiro de 1995, foi a primeira a trazer uma banda na capa e os agraciados foram

os brasilienses do Little Quail & the Mad Birds. Com mais de oitenta páginas, esta

edição trazia alguns anúncios, correspondentes na Europa, diagramação totalmente

eletrônica muito bem cuidada e ousada até para os padrões editoriais de 1995. A se

destacar na parte de conteúdo, seções normalmente estranhas à fanzines como

uma seção de cartas com longas 3 páginas e respostas dos editores, um box de

créditos das fotos e ilustrações e promoções sorteando livros e CDs.

Por outro lado, seções características, como uma listagem de fanzines,

resenhas de discos e demos. O Panacea dava especial atenção às análises de

fanzines, com cinco páginas de resenhas cuidadosas, sempre com ficha técnica e

endereço para contato. Outro destaque desta edição era um pequeno artigo falando

sobre internet, já divulgando inclusive um email para envio de e-zines.

As edições seguintes continuaram sendo lançadas mensalmente. O Panacea

era distribuído em bancas e livrarias especializadas através de uma cooperativa de

editores independentes chamada FRI – Frente das Revistas Independentes. O

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“fanzine-revista” também havia tentado criar um sistema de assinaturas (agora mais

fácil de administrar graças à estabilidade do Plano Real) e venda de números

atrasados mas que não foi capaz de financiar a publicação. O Panacea acabou em

dezembro de 1995, na edição número quarenta por causa de problemas financeiros.

Para este mapeamento, incluir o Panacea nesta fase é uma maneira de

mostrar como alguns fanzines estavam se organizando para crescer, mas, em

termos de qualidade, acabamento, conteúdo e até de distribuição, o Panacea foi um

fanzine a frente de seu tempo.

Também foi nesta fase que apareceram as primeiras experiências multimídia

nos fanzines. Algumas publicações anunciavam coletâneas em fita cassete com

bandas independentes. Não existia uma produção em massa, as fitas eram copiadas

manualmente, uma a uma, sob demanda. Para participar destas coletâneas, os

fanzineiros negociavam diretamente com as bandas, que na maioria das vezes

aprovavam a inclusão de suas músicas sem cobrança de direitos autorais. A

participação no lançamento era encarada como uma divulgação necessária, já que

os fanzines eram os únicos veículos que abriam espaço para este tipo de banda.

Para os fanzines, a produção de coletâneas servia como um atrativo a mais. A

produção das fitas cassete era feita de acordo com a chegada dos pedidos. O

fanzine Drowned’Z, trazia uma explicação detalhada em forma de anúncio na quarta

capa:

9 – Detalhe do anúncio da coletânea em fita cassete do fanzine Drowned’Z.

A trilha sonora do Drowned Zine #1 está lançada: ‘Ascensão ao Cadafalso vol. 1’ é uma coletânea com algumas das melhores bandas undergrounds do país: Blessed, Insanity, Dementia, White Frogs, Déjà Vu, A.S.S., Chemical Disaster, Death Slam, The Succulent Fly, G.D.E., Abhorrent, Os Cabelo Duro, Execradores, Crossbones, Odd Job, Anthares e Desertor. Para conseguir a sua

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existem duas maneiras: 1 – envie uma fita virgem e três selos para postagem normal, ou dez selos para postagem registrada. 2 – envie o valor em dinheiro, somente dinheiro, equivalente a quinze selos de primeiro porte, em envelope pardo, e receberá sua tape. (Fanzine DROWNED’Z, São Paulo, n.1, ano 1, 1994)

O primeiro ponto interessante de se notar nesta ação é que os fanzines

encaravam suas coletâneas como lançamentos oficiais, divulgando-os em forma de

anúncios nas suas publicações, dando títulos às fitas como se fossem um álbum, e

produzindo capas no formato fita cassete.

Outro ponto a se destacar é a busca por alternativas de comercialização: por

causa da instabilidade econômica, os fanzines utilizavam moedas alternativas para

comercializar suas fitas, neste caso do Drowned’Z, eram os selos de primeiro porte

do correio brasileiro. Por causa da desvalorização quase diária da moeda brasileira,

os Correios passaram a comercializar selos sem valores fixos impressos. Criaram

um selo que trazia inscrito “1º porte nacional” e este valor mudava diariamente ou

semanalmente, baseado em um índice. Os fanzines, para não ficarem

desatualizados e poder comercializar suas edições e fitas, utilizavam este selo como

moeda alternativa.

Ações como esta, de publicar fitas cassete, reforçam a importância crucial

que os fanzines musicais desempenhavam para a crescente cena independente

brasileira. Como veremos na fase seguinte, a estabilização da moeda brasileira

levou os fanzines e ações multimídia, como as coletâneas de fita cassete, a um novo

patamar.

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CAPÍTULO 4 TERCEIRA FASE: A FASE DE OURO DOS FANZINES IMPRESSOS

(1994 – 1997)

Em 1994, o Brasil vivia um momento único: após 24 anos, a seleção nacional

voltava a ser campeã do Mundo de futebol. O então Ministro da Fazenda do

Governo Itamar Franco, o sociólogo Fernando Henrique Cardoso, aprofundava as

reformas econômicas colocadas em prática desde agosto de 1993 até que, em julho

de 1994, o Brasil tinha uma nova moeda, o Real (R$). A inflação que chegara a 46%

em julho de 1994 foi de aproximadamente 6% em julho de 1994 e dai para frente

continuou diminuindo. Pela primeira vez, uma geração de músicos e fanzineiros

podia conviver com relativa estabilidade econômica que permitia um planejamento a

médio prazo.

Uma das características universais mais marcantes de um fanzine é

justamente a sua falta de periodicidade e fugacidade. Os principais motivos são as

dificuldades financeiras do editor e a impossibilidade de planejamento a médio

prazo, a saber, pelo menos um ou dois anos. Nesta terceira fase do mapeamento,

pela primeira vez, esta conjuntura estava mudando e os fanzines podiam crescer e

experimentar algum planejamento, levando ideias e ações a um estágio novo.

Outra medida do governo nesta época também propiciou melhorias,

principalmente na parte gráfica dos fanzines: a abertura econômica com redução de

tarifas de importação e facilidades para prestação de serviços internacionais. Esta

medida reforçava a necessidade de aperfeiçoar alguns setores da indústria e de

serviços, expondo-os a concorrência. Além disso, o Governo manteve o câmbio

artificialmente valorizado, com a paridade do dólar para o real, facilitando ainda mais

as importações. Foi neste ambiente que se popularizou o computador doméstico e

que a internet comercial começou a surgir.

Novas e melhores máquinas fotocopiadoras estavam disponíveis; o

barateamento de cópias coloridas e a disponibilidade de uma nova gama de tipos de

papéis fez com que alguns fanzines experimentassem novos formatos. Ao mesmo

tempo, com a paridade do real ao dólar, insumos de produção gráfica como papel,

tintas e filmes baratearam, levando a popularização da impressão offset. O que

antes era inacessível aos fanzines agora se tornava extremamente tentador: era

possível rodar fanzines em gráfica, com tiragens de mil exemplares (e o número

mínimo de quatro páginas) com preços competitivos em relação a fotocopiadoras. A

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maioria destes fanzines rodados em gráfica usavam papel jornal, eram impressos

em preto e branco e distribuídos gratuitamente. Adilson Pereira, editor de

importantes fanzines destas três fases iniciais, explicou objetivamente em entrevista

a este mapeamento os motivos que o levaram a migrar da xerox para a impressão

em offset dizendo que queria algo mais “profissional” (aspas do entrevistado), que

gostava da estética e que queria aumentar a tiragem (ver entrevista na íntegra no

anexo).

Além das experiências em offset, a popularização do computador doméstico e

de programas de editoração eletrônica levaram os fanzineiros a melhorar, ou pelo

menos a tentar melhorar, a diagramação de suas publicações. A popularização dos micro-computadores veio praticamente aposentar as velhas máquinas datilográficas. Com os programas gráficos cheios de recursos e ferramentas, os fanzines com sua estética tradicional de recortes e colagens vieram dar lugar a publicações que apresentavam uma programação visual mais limpa, aproximando-se da estética das revistas do mercado e em alguns casos, criando novas feições que depois seriam utilizadas pelas publicações comerciais. (MAGALHÃES, H., 2005, p. 33-34)

10 - Capa dos fanzines Mayonese e ZINE e os recursos de editoração eletrônica.

Mesmo nos fanzines reproduzidos em xerox, notava-se uma mudança na

parte gráfica. A diagramação deixava gradativamente de ser feita à mão para ser

feita em programas de editoração. Não era necessário aprender programas

específicos como Page Maker: em 1995 foi lançado o sistema operacional Windows

95 que trazia o editor de texto Word em sua versão sete, que incluía recursos de

diagramação simples. Ferramentas do programa de ilustração Corel Draw também

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eram bastante usados. As capas e a diagramação dos fanzines Mayonese,

Cabrunco e ZINE mostram isso.

Entretanto, como bem observou Henrique Magalhães, as novas ferramentas

ainda estavam em “fase de testes”: Toda essa facilidade à disposição de qualquer um é certo que gerou algumas extravagâncias. A mistura indiscriminada de tipos, retículas, frisos e outros elementos gráficos, em certas publicações veio mais dificultar a apreensão da mensagem do que enriquecer o visual. (MAGALHÃES, H., 2005 p.34)

11 - Diagramação eletrônica interna do fanzine Cabrunco.  

Alguns fanzines que haviam começado na xerox, aproveitavam parcialmente

os novos recursos, como foi o caso de Fanz, Punch e Hauuzc. Em novas edições,

todos três títulos passaram a ser duplicados em offset, no formato 17 X 24,6 cm (1/4

de tablóide) e misturavam diagramação eletrônica e manual. Os três fanzines

falavam sobre música, cinema, literatura e quadrinhos, e o que mantinha a “sujeira”

da diagramação manual era o gosto pelos quadrinhos, pela intervenção com

nanquim e caneta.

A seção Maudito Fanzine, citada na primeira fase deste mapeamento, que era

publicada no encarte MAU da revista Animal, havia deixado de ser publicada em

1995 e voltou à ativa no número um do Hauuzc, editado por Alberto Monteiro,

Adilson Pereira, Fabio Zimbres, entre outros. A seção misturava textos digitados e

diagramados eletronicamente com textos escritos à mão, desenhos e quadrinhos.

Fábio Zimbres, que cuidava da seção Maudito Zine da Animal, também editava

estas 2 páginas do Hauuzc, e escreveu (a mão) a seguinte introducão :

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O que tem de bom nos fanzines é que é um meio de comunicação altamente pessoal. Cada um pode fazer o seu. Restrições de mercado não existem. Uma espécie de carta, mensagem numa garrafa. E daí surge de tudo. As coisas mais esquisitas. O que está acontecendo agora é uma tendência contrária que ao invés de anular a idéia acima está somando ao mundo dos fanzines. Vários zines estão adotando uma atitude mais profissional, uma outra maneira de produzir. (Fanzine HAUUZC, Rio de Janeiro, n. 1, nov. 1993)

Um dos destaques desta época foi o zine Ó, criado por dois alunos de

jornalismo da UFF, inicialmente de caráter acadêmico mas que continuou a ser

publicado depois da formatura de ambos. O zine Ó saía em formato tablóide, preto e

branco, sempre com 4 páginas, distribuição gratuita em faculdades, livrarias e

pontos culturais do Grande Rio e sua tiragem variava entre 2.000 e 4.000 cópias.

Uma matéria sobre fanzines intitulada “Do mimeógrafo ao ‘off-set’: uma trajetória

marginal” destacava o fato de Ó ser “diagramado com uso de computador a partir do

projeto gráfico elaborado por Ildo Nascimento, professor de programação visual da

UFF” (PEIXOTO, Revista de Comunicação, ano 10, n. 38, p. 27, out. 1994). A

paginação do Ó era bem diferente da usada pela maioria dos fanzines e ousada até

para os padrões editoriais da época. O fanzine usava de maneira equilibrada as

possibilidades de tipologia. Suas páginas eram diagramadas na vertical e na

horizontal, com espaços de “respiro”, o que era bastante diferente da estética da

maioria dos zines, de máximo aproveitamento das páginas.

Algumas edições do Ó traziam pequenos anúncios de lojas de discos, de

quadrinhos, e até de macrobiótica. O número treze, de outubro de 1994, trazia uma

matéria de duas páginas sobre a segunda edicão do festival Juntatribo, com texto

detalhado sobre as bandas que se apresentaram. A mesma matéria da Revista de

Comunicação citada acima dizia que o fanzine era distribuído em todas as

faculdades de comunicação do Rio de Janeiro e também para profissionais da

imprensa. Ronaldo Soares, editor do Ó e baixista da banda Tubarões Voadores,

explicava: “É uma forma de apresentar nosso trabalho. O zine pode ser uma porta

de entrada no mercado.” (PEIXOTO, Revista de Comunicação, ano 10, n. 38, p. 27,

out. 1994).

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12 - Diagramação livre do Zine Ó n. 11, em formato mini-tablóide.

Outro fanzine a ser destacado nesta fase é o Fútio Indispensável, editado

por alunos da faculdade de jornalismo da UFSC. Desde o começo, Fútio

Indispensável foi impresso em mini tablóide, papel offset branco e diagramado

eletrônicamente. Suas capas eram ilustradas pelo editor Frank Maia e sempre

destacava bandas nacionais. Seu slogan “Jornalismo cachaça / quem tá vivo lê”

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oficializava o tom escrachado dos textos. A cobertura do festival independente

BHRIF (Belo Horizonte Rock Independent Festival) tinha como manchete “Dinheiro

público bem gasto” enquanto que a matéria sobre a segunda edição do festival

Juntatribo trazia até um infográfico sobre quanto o repórter havia gasto para viajar

até Campinas e ficar três dias hospedado na UNICAMP para cobrir o festival.

13 - Página interna do fanzine Fútio Indispensável com foto produzida, box, infográfico e um anúncio

pago. Edição n. 5, setembro de 1994, p.15.

O Fútio Indispensável era um dos poucos fanzines desta época que surgiu

com uma logomarca na capa. Todas suas edições obedeciam a uma identidade

visual coerente, com a mesma tipologia, páginas numeradas, seções bem

demarcadas e excelente qualidade de impressão. Ao mesmo tempo, seções

tradicionais de todos fanzines, como resenhas de demos e espaço para divulgação e

análise de outros zines, foram mantidas. Aliando liberdade editorial fanzineira com

textos criativos e bom acabamento gráfico, Fútio Indispensável exemplifica o

porquê desta fase ser caracterizada como o ápice dos fanzines impressos no Brasil.

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Esta ebulição da produção fanzineira foi percebida pela editora carioca Arte

de Ler que em 1995 publicou o “Almanaque de Fanzines – o que são, por que são,

como são”. O primeiro parágrafo do Editorial (à semelhança de um fanzine) resume

o momento: Este Almanaque bem que poderia se chamar ‘o poder dos subterrâneos’, mas não estamos atrás do glamour marginal. Queremos mostrar, isto sim, que há luz na ‘cultura obscura’ dos fanzines. Nesta rede independente dos chefões do mercado cultural, há vida inteligente, verdadeiramente popular, sem pieguismo ou folclorismo. Nós, da Arte de Ler, resolvemos mergulhar nesta realidade virtual, onde o talento maior é o exercício da liberdade de criar. Bonito não? Pois é impressionante como neste circuito tudo funciona (mesmo que sem a regularidade da cultura estabelecida) graças a um mundaréu de pessoas cheias de boa vontade. (ALBERNAZ, B.; PELTIER, M., 1995, p.3)

O livro de quase cem páginas traz uma análise daquele momento da produção de

fanzines no Brasil, entrevistas com alguns fanzineiros importantes (Marcelo Pinto e

Ronaldo Soares do ZINE Ó, Márcia Gonçalves do Backstage, Edgard Guimarães,

autor do livro “O que é Fanzine” e editor do Informativo de Quadrinhos Independentes, J.M.M. Kazi do Panacea, entre outros) quase trinta páginas de

endereços e resenhas de aproximadamente mil fanzines publicados no Brasil sobre

os mais variados assuntos. O livro segue o formato de um fanzine, com

diagramação diferenciada, textos informais e reprodução de seções características,

como editorial e listagem de endereços de outros fanzines.

A última página traz uma pesquisa interessante: para publicar o livro, os

editores recolheram durante um ano fanzines de todo país. Após a pesquisa,

resolveram publicar um balanço do número de fanzines no Brasil em 30 de

dezembro de 1994. Registraram 977 fanzines, sendo 359 do estado de São Paulo,

143 do Rio de Janeiro, 96 do Rio Grande do Sul, 68 do Paraná e 55 de Minas

Gerais. De todos estados, os últimos eram Rondônia e Alagoas com quatro fanzines

cada, Mato Grosso do Sul com 3, Mato Grosso com 1 e Acre, Amapá, Tocantins e

Roraima com nenhum registro de fanzine publicado. Se comparado com a pesquisa

realizada pelo Boletim CENAPI em 1989, percebe-se que o número de fanzines

publicados triplicou (977 x 384) mas que os principais estados produtores

continuaram centralizados na região Sudeste (SP, RJ, MG foram os primeiros na

pesquisa de 1989).

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Foi também nesta fase de ebulição que os fanzines como meio alternativo de

comunicação começaram a interessar à algumas empresas. Multinacionais do

mercado fonográfico como as gravadoras EMI, Warner/Continental, BMG-Ariola,

além das empresas nacionais Rock It! (selo discográfico distribuído pela EMI) e a

MTV (canal musical jovem da Editora Abril) publicaram fanzines.

Eu mesmo, autor deste mapeamento, produzi “fanzines institucionais” para

EMI, Warner/Continental e BMG-Ariola dentro de um projeto chamado Assessoria de

Imprensa Alternativa. A “AIA” era uma assessoria de imprensa para produtos destas

gravadoras voltada para a “imprensa alternativa”. Consistia em publicar fanzines

sobre os produtos (CDs das bandas) e enviá-los a outros fanzines, junto com algum

material promocional (CDs, CDs-single, camisas, adesivos) para estimular a

veiculação de matérias nestas publicações. Foram produzidos fanzines sobre as

bandas Foo Fighters, Terrorvision, Butthole Surfers e Skin (EMI), sobre as bandas

CIV, Melvins, Sugar Ray, 7 Year Bitch, Gufs e Extra Fancy (Warner/Continental),

sobre a compilação Brasil Compacto (Rock-It/EMI) e sobre o selo Plug (BMG-Ariola).

Além da redação, diagramação e reprodução dos fanzines (com tiragens em torno

de 200 a 300 cópias), a AIA também se encarregava de enviar os kits para os

fanzineiros.

A idéia do projeto de Assessoria de Imprensa Alternativa nasceu do contato

de um amigo, Rogério Goulart, com uma executiva da gravadora EMI. Esta

executiva, responsável pela parte de imprensa, pediu a Rogério um plano de

divulgação para alguns de seus produtos de música alternativa junto aos fanzines,

veículos que ela não sabia como atingir mas que reconhecia seu crescimento e

importância. Rogério me chamou para ajudá-lo já que eu publicava o midsummer madness e tinha contato com fanzineiros em todo país. Repetia-se aqui o mesmo

“ritual” de ser um fanzineiro para ter acesso mais fácil ao mundo dos fanzines.

Nos contatos que tive com as empresas contratantes da AIA, todas

mostravam-se preocupadas em chegar até os editores de fanzines musicais mas

não sabiam como. Outro ponto ressaltado pelos contratantes era a

representatividade de um fanzine editado por um fanzineiro e não pelas

multinacionais. Assim, os contratantes faziam questão que eu assinasse a autoria do

fanzine para que o mesmo fosse respeitado e entendido como um “verdadeiro

fanzine” pelos outros fanzineiros. Como a AIA era um serviço pago, os fanzines

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eram profissionais; o que pode parecer um paradoxo mas reforça o ápice que esta

fase do mapeamento pretende mostrar.

Um pequeno editorial no fanzine Por Que As Vacas Estão Loucas?, feito

sob encomenda da EMI explicava: A Assessoria de Imprensa Alternativa funcionou pela primeira vez em maio de 1995 com a banda Foo Fighters. A idéia de fornecer material e informação de divulgação para os alternativos em geral tenta unir a necessidade de aproximação das gravadoras quando estas querem divulgar um artista alternativo, à carência de material e informação atualizada que seus principais mantenedores e interessados têm. Fanzineiros, programas de rádio alternativos, lojas especializadas, público universitário e ‘secundarista’ e outros formadores de opinião recebem em primeira mão material de divulgação de bandas de rock cool que estão sendo lançados no Brasil. Junta-se a fome das gravadoras com a vontade de comer dos alternativos. (Fanzine POR QUE AS VACAS ESTÃO LOUCAS?, Rio de Janeiro, 1995)

Entre outubro de 1994 e meados de 1995, a rede de televisão MTV também

produziu seu fanzine. Apesar de não carregar esta definição, o Maisemetevê trazia

algumas características de fanzine. Sua diagramação era experimental, os textos

falavam sobre a programação do canal mas também sobre bandas e artistas que

não necessariamente tocavam na TV, trazia algumas colunas de seus

apresentadores e seções com endereços de fanzines e análises de fitas e discos

independentes. Impresso num formato atípico (poster de 54 x 54 cm, dobrado até 27

x 13 cm), com duas cores (vermelho e preto), o Maisemetevê funcionava como um

boletim e era enviado como impresso por correio gratuitamente para a casa dos

telespectadores previamente cadastrados.

Toda esta movimentação, de fanzines graficamente mais bem acabados,

empresas se apropriando da estética zineira para aproximar sua comunicação do

público, refletia um momento de crescimento e estruturação de uma nova cena

musical independente no Brasil, que já vinha se organizando desde o começo da

década. Mas agora, com a estabilização da economia e um melhor planejamento

permitia ações mais ousadas. Uma delas se chamou Underguide. A editora paulista

Espetáculo, que publica até hoje listas de contatos de empresários do ramo musical

resolveu criar, no final de 1996, um guia com endereços de bandas, fanzines,

promotores e casas de shows, estúdios de ensaio e de gravação, e outros contatos

que interessavam a bandas independentes.

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O Underguide tinha capa couché colorida, miolo em offset, trazia matérias

pequenas e uma lista enorme, organizada em ordem alfabética, com nome da

banda, estilo musical, nome da pessoa responsável e telefone de contato. A

intenção era funcionar como um guia, uma “páginas amarelas” da cena musical

alternativa. As seções eram separadas: primeiro eram listadas as bandas, depois

fanzines e publicações e, por último, serviços e estúdios. Nas primeiras edições do

Underguide, a seção de fanzines trazia uma pequena resenha com descrição do

formato e do assunto da publicação. Algumas resenhas traziam inclusive a tiragem.

Como eram muitos fanzines, o tamanho da tipologia usada era muito pequena, entre

tamanho seis e oito, o que tornava a leitura cansativa.

Apesar de não ser um fanzine, a publicação do Underguide durante 1996 e

1997 serve para comprovar a intensa atividade que acontecia no cenário musical

independente brasileiro. A quantidade de bandas e fanzines era tão grande, e a rede

que se formava entre eles, tão atuante e conectada, que a cada edição o número de

páginas do Underguide só crescia.

Entretanto, o modelo de negócio do guia estava fadado ao fracasso. Seus

editores imaginavam que os agentes deste meio - bandas, estúdios, lojas -

anunciariam no Underguide, que era distribuído gratuitamente via correio para

todos que se cadastrassem na editora. O guia tinha vários pequenos anúncios,

inclusive de bandas e de fanzines divulgando seus lançamentos, e até alguns

anúncios grandes, financiados principalmente por grandes gravadoras, que, como

na Assessoria de Imprensa Alternativa, buscavam meios de interagir com esta rede

alternativa. Mas a proporção de anúncios era muito menor do que a quantidade de

bandas e fanzines novos que surgiam a cada edição, aumentando

exponencialmente o número de páginas. Some-se a isso, o fato do guia ser enviado

gratuitamente pelo correio para uma quantidade cada vez maior de cadastrados.

A partir da edição número sete, os editores resolveram diminuir a lista de

bandas, fanzines e serviços, incluir matérias e resenhas de discos e demos. Criaram

também uma assinatura paga para aqueles que ainda desejassem receber o guia,

que pretendia ser bimestral. A partir deste momento, o Underguide perdeu força e

deixou de ser publicado após o número oito, em novembro de 1997. Neste ano, não

por acaso, a internet comercial começava a crescer no Brasil.

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O grande boom da rede aconteceu ao longo do ano de 1996. Um pouco pela melhoria nos serviços prestados pela Embratel, mas principalmente pelo crescimento natural do mercado, a Internet brasileira crescia vertiginosamente, tanto em número de usuários quanto de provedores e de serviços prestados através da rede. (Linha do Tempo da Internet no Brasil 11, acessado em 22/08/2010)

A maioria dos fanzines no final desta terceira fase já divulgavam seus

endereços de email e usavam a internet para trocar informações mas ainda não

existia um número considerável de publicações na rede. As primeiras tentativas

esbarravam na precariedade da internet e no desconhecimento técnico. Um fator que desencorajava o uso amplo da Internet era a interface dessas aplicações que, em modo textual, contrastavam com as interfaces gráficas encontradas na maioria das outras aplicações disponíveis para uso nos computadores pessoais da época. Outros fatores inibidores da ampliação do uso da Internet estavam relacionados às dificuldades em se encontrar e usar as informações disponíveis. (CARVALHO, 2006, p.125)

Fica claro que os fanzines impressos no final desta terceira fase encontravam

mais facilidade para serem produzidos do que um fanzine eletrônico na internet.

Apesar do boom comercial da internet, os fanzines não foram os primeiros a publicar

suas páginas na rede. É somente na próxima fase deste mapeamento que a

produção de fanzines impressos começa a declinar no Brasil.

Gilberto Custódio, editor dos fanzines Esquizofrenia, Campo Magnético e

Candy Grrrls desde 1993, é hoje um colecionador de fanzines impressos. Em

entrevista a este mapeamento, ele opina: Antes da explosão da internet, em meados dos anos 90, surgiram diversos fanzines. Foi a melhor fase na minha opinião. Com a internet muitos não viram mais a necessidade de continuar publicando, já que toda e qualquer tipo de informação estava disponível na rede. […] Durante a virada dos anos 2000 o fanzine [Esquizofrenia] também estava na rede […] Ficou dois anos no ar, diversos artigos foram publicados que foram lidos por um número muito maior de pessoas, mas não era mesma coisa. Meu maior tesão sempre foi fazer o fanzine em papel, logo perdi a motivação e voltei a editá-lo como antes. (Gilberto Custódio em entrevista ao autor)

                                                        11 Fonte: http://www.internetnobrasil.net/index.php?title=Introdução - acessado em 22/08/2010

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CAPÍTULO 5 QUARTA FASE: O INÍCIO DO DECLÍNIO DA PRODUÇÃO

IMPRESSA E AS EXPERIÊNCIAS NA INTERNET (1997 – 2000)

Desde 1994 o Governo Brasileiro passou a investir na entrada da internet

comercial no país, que até então estava restrita a iniciativas acadêmicas e do

Terceiro Setor (CARVALHO, 2006). Com suporte estrutural da Embratel e a criação

de um Comitê Gestor, o CGI-Br, em 1995, começou a se organizar a internet para

uso comercial no país. Em abril de 1996, o Grupo Folha inaugurou seu provedor de

acesso, o Universo Online (UOL). Três anos mais tarde, o UOL já teria 350 mil

assinantes. Em 1998 outras empresas de grande porte foram criadas no Brasil para

explorar a internet comercial, como a Brasil Online (BOL) da Editora Abril, o ZAZ da

Nutec Net (que em 2000 seria comprado pela Telefônica) e a entrada da

multinacional America Online (AOL). Em 1997 surgiu outra dezena de pequenos

provedores que comercializavam o acesso à internet. Neste mesmo ano, pela

primeira vez o Imposto de Renda podia ser entregue via internet e o Brasil já

somava quase 2 milhões de usuários da rede12. Dezenas de revistas sobre

informática eram lançadas em bancas explicando como acessar a internet. Várias

destas revistas traziam softwares gratuitos necessários para conexão e navegação.

Conforme dito no capítulo anterior, os fanzines não foram pioneiros na

publicação de páginas na web. Ao contrário da produção impressa, publicar na

internet exigia conhecimento técnico que inviabilizava uma rápida migração do papel

para as telas de computador. Os programas de diagramação eletrônica para

impressos, como Word, Page Maker, Corel Draw, eram mais fáceis de usar e sua

interface gráfica facilitava o trabalho. Publicar na internet exigia conhecimentos de

programação em HTML, o que, de certa forma, era mais complicado.

Nesta fase, entre os anos de 1997 a 2000, o crescimento rápido da internet

fez com que os fanzines testassem possibilidades antes de migrar definitivamente

para a tela do computador. Fanzineiros que tinham acesso à internet em

universidades ou através de precários servidores do Terceiro Setor13 foram os

primeiros a criar mail-zines, ou listas de emails por onde eram enviados boletins e

                                                        12 Fonte: http://www.internetnobrasil.net/index.php?title=1997 - acessado em 30/10/2010 13 “Até o final de 1996, o IBASE atendia 6.000 usuários no Rio de Janeiro e em São Paulo.” Fonte: Marcelo Sávio Revoredo M. de Carvalho, A Trajetória da Internet no Brasil: do Surgimento das Redes de Computadores À Instituição dos Mecanismos de Governança, UFRJ, 2006 

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newsletters. Uma das primeiras listas de emails (também chamadas de listas de

discussão) especializadas em música no Brasil foi criada por Messias Bandeira,

guitarrista e vocalista da banda Brincando de Deus e, na época, aluno da UFBA. A

lista se chamava Indie Brasil e começou a funcionar como uma BBS em 1996.

Outra iniciativa semelhante foi o mail-zine CardosOnline, criado em 1998 por

alunos de Comunicação da UFRGS. Nesta época, o correio eletrônico havia

praticamente substituído a troca de correspondências via postal, acelerando a

comunicação. Segundo Douglas Dickel, autor da monografia de graduação “A

Realidade Pós-Moderna do CardosOnline como Fanzine na Internet”: O COL foi o primeiro mailzine a fazer sucesso no Estado [do Rio Grande do Sul] e no Brasil, chegando a um número de 4.000 leitores assinantes (inclusive brasileiros residentes em diferentes países do mundo, como Estados Unidos e Noruega). Ele é enviado no corpo de texto do e-mail para os cadastrados na lista de distribuição, toda segunda e quinta-feira.[…] Há uma equipe de oito colunistas que se divide ao meio para cada uma das duas edições da semana. Quatro escrevem na segunda, os outros quatro escrevem na quinta. (DICKEL, 2001, p. 25-26)

Antes disso, em 1994 nos Estados Unidos, começara a funcionar o primeiro

navegador de internet, o Netscape Navigator, seguido em 1995 pelo Internet

Explorer, o navegador da Microsoft que já vinha embutido no pacote Windows 95.

Em junho de 1998, a Microsoft lançou o Windows 98 cuja maior novidade era melhor

integração do sistema operacional com os programas da internet. Novas versões

dos programas de emails e de navegação facilitavam a visualização de páginas e,

pela primeira vez, o Pacote de programas de computador Office trazia um programa

específico para criação de websites, o Front Page. A partir dai, com ferramentas

mais práticas para se publicar na internet é que os e-zines, ou webzines,

começaram a aparecer em maior número.

Antes de prosseguir com o mapeamento dos fanzines impressos deste

período, é importante definir o que são fanzines eletrônicos, os e-zines, entender

sua relação com os fanzines impressos para tentar perceber qual pode ter sido (e

qual pode ser) o impacto (ainda hoje) deste novo meio no universo dos zines

impressos de música.

Não foram encontradas definições para webzine e e-zine satisfatórias para

este mapeamento. A definição que proponho, baseado nas leituras que fiz, é a de

que um e-zine (ou ezine, ou webzine) é uma publicação eletrônica, de formato

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variável mas que segue os parâmetros do fanzine impresso principalmente na parte

de conteúdo. Isto é, os assuntos são definidos pelo editor (ou editores) e geralmente

o conteúdo é especializado, segmentado. É importante diferenciar e-zine de blogs e

de outros tipos de sites, como portais. Portais são sites institucionais, que servem

como publicações eletrônicas oficiais de empresas, orgãos públicos e instituições. Já

os blogs poderiam ser cofundidos com e-zines, principalmente depois da

popularização daquele. No meu ponto de vista, o conteúdo dos blogs é mais

pessoal, de teor confessional, como um diário. Já os e-zines são (ou pretendem ser)

veículos com teor mais jornalístico, contendo análises, críticas e resenhas com texto

um pouco mais imparcial.

Chris Atton (2002) acha que a migração dos fanzines para a internet causou

uma ruptura maior do que apenas a mudança de suporte. Ele acredita que o simples

fato de ser possível criar hiperlinks tornou os e-zines “mais difusos e inclusivos” do

que a “estabilizada e de certa forma elitista” (ATTON, 2002, p.55) cultura em torno

dos fanzines impressos. Mais adiante, Atton defende: There is evidence to suggest that the e-zine is not an equal replacement for its printed precursor. When the editor of ‘For the Clerisy’ moved his zine to the internet he found that he not only lost readers who lacked acess to the internet, but he lost readers who preferred the tactile and portable nature of the printed publication. 14 (ATTON, 2002, p. 68)

E prossegue listando o que ele concluiu como desvantagens dos e-zines em

comparação com os zines impressos: The internet might well be a useful distribution mechanism for information, but it’s ill suited as a reading mechanism for discursive texts. Text can always be printed off, but this act results in a set of uniform pages, printed on one side only, that bear little similarity to the variety of formats that the printed zine can offer.15 […] The imagination and experimentation in layout and design that are so common amongst printed zines are largely absent (in printed originals). 16 (ATTON, 2002, p.68)

                                                        14 Tradução minha: Há evidências que sugerem que o e-zine não é um substituto ao seu precurssor impresso. Quando o editor de ‘For the Clerisy’ levou seu zine para a internet, ele percebeu que não apenas perdeu leitores que não tinham acesso a internet como também perdeu aqueles que preferiam a natureza táctil e portátil da publicação impressa. 15 Atton não levou em consideração fanzines publicados e divulgados eletronicamente em formato PDF (portable document file) que permitem a impressão de páginas com maior semelhança gráfica ao original. 16 Tradução minha: A internet pode ser um prático mecanismo de distribuição para informação mas ainda é pouco eficiente como mecanismo de leitura para textos discursivos. Texto sempre pode ser

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Atton prossegue sua avaliação com a pergunta que, para este mapeamento,

corrobora a tese de que a diferença entre blogs, portais e outros tipos de sites para

um zine na internet, ou e-zine, é definitivamente seu conteúdo, ao perguntar: “What,

apart from content, is there to set the e-zine apart from other forms of communication

in cyberspace?” 17 (ATTON, 2002, p.69). Uma citação interessante de Atton revela o

estado de espírito de alguns fanzineiros desta época: Anyone can produce a zine, anyone can read one, goes the philosophy of the zinester: there are few barriers to participation at any level. With the e-zine, cultural distance between the reader and the publication (and its author) is reduced further by erasure of the physical object. For some zine commentators, the late 1990’s saw the ‘death of the zine’. 18 (ATTON, 2002, p. 77)

Fanzines que já existiam no formato impresso se arriscaram pela internet

enquanto outros surgiram direto no mundo virtual: Para o jornalista Tom Leão, com a grande rede, a mensagem pode ser passada mais rapidamente, para mais pessoas, para o mundo todo: por aqui, há os que assumem o formato newsletter, informativos enviados regularmente por email, como o hilário Ackzine, da banda Ack; os que existem no papel e na rede, como o Brujeria e o El Espresso Cucaracha; e os feitos especialmente para o mundo virtual, entre eles Aquário, E-Fanzine, Esfera, London Burning, Electric Head, etc. (MAGALHÃES, H., 2005, p.36)

Para os fanzineiros desta época, uma decisão precisava ser tomada: publicar

um fanzine impresso ou publicá-lo na internet? Para produzir um zine impresso eram

necessários papel, tesoura e cola ou papel, computador e impressora. A reprodução

continuava a ser feita em fotocopiadoras ou em gráficas. O custo de produção,

reprodução e distribuição variava de acordo com a tiragem pretendida. Mas, de

qualquer forma, o fanzine impresso atingia um público restrito, em sua maioria,

editores de outros fanzines.

                                                        impresso mas este ato resulta numa série de páginas uniformes, impressas apenas de um lado, que mantém pouca semelhança à variedade de formatos que o zine impresso pode oferecer. […] A imaginação e experimentação de lay-out que são tão comuns em zines impressos, simplesmente inexistem (em impressões de originais). 17 Tradução minha: O que, além do conteúdo, pode diferenciar um e-zine de outras formas de publicação no ciberespaço? 18 Tradução minha: Qualquer um pode produzir um zine, qualquer um pode ler um zine, e assim segue a filosofia de um fanzineiro: existem poucas barreiras para a participação em qualquer nível. Com o e-zine, a distância cultural entre leitor e a publicação (o autor) é reduzida ainda mais pelo desaparecimento do objeto físico. Para alguns comentaristas de zines, o final da década de 1990 viu “a morte dos zines”.

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A publicação na internet exigia um computador, acesso à rede e algum

conhecimento técnico das linguagens de programação. O resultado, um e-zine, era

uma obra aberta ao Mundo, sem restrição de público. Entretanto, não era uma

produção tão mais barata: além do computador, dos custos com energia elétrica, era

necessário pagar pelo acesso à internet e também pelo uso da rede telefônica.

Outro limite imposto ao e-fanzineiros pioneiros era a baixa velocidade da

transmissão de dados e a instabilidade da conexão discada. Os primeiros

fanzineiros a experimentar a migração para o meio eletrônico criaram simples

adaptações de seus impressos para o novo suporte. Poucos estavam familiarizados

com as possibilidades do hipertexto ou simplesmente desconheciam todas as

técnicas para programar um site (MAGALHÃES, H., 2005, p.44-47).

Mas o reflexo imediato que a popularização da internet causou nos fanzines

impressos foi a diminuição do número de fanzines publicados. Não há dados que

comprovem a redução mas um relato da época sustenta esta afirmação. O

“Esquinas de São Paulo”, um jornal laboratório da Faculdade de Comunicação

Cásper Líbero, na edição de setembro de 1999 trazia uma matéria intitulada

“Fanzines” perguntando: Mas aonde está a nova geração de fanzineiros? Bom, para os garotos e garotas de hoje em dia, recortar, colar e xerocar são atividades pré-históricas. Essa vanguarda volta todo seu interesse para a multimídia, para o mundo da comunicação sem barrreiras. Para quê elaborar uma publicação restrita em número, divulgação e espaço, quando se pode ter uma página na internet, com fotos de qualidade e até músicas? (ALBUQUERQUE, F.; VERNIER, E., Esquinas de S.P., 1999, p. 36)

Os fanzines impressos começaram a seguir novos caminhos como

aperfeiçoamento gráfico, segmentação ainda maior do assunto e novos suportes.

Um exemplo de uso de novos suportes eram os fanzines publicados em CD-Rom. O

fanzine Slam! foi um dos primeiros a contar com uma versão digital em CD-Rom.

Editado por Rogério Velasco, o Slam! Trazia 360 páginas de quadrinhos e algumas

matérias sobre música. Seu autor, em entrevista à revista Esfera declarou: Começei com e-zines logo no início da febre da internet aqui no Brasil, e descobri que não era tão simples fazer um site como eu gostaria. Acabei me desgastando demais para atualizar meu primeiro e-zine, o SLAM Net, e abandonei a idéia. (VELASCO, Esfera – revista de cultura online, 1999, apud MAGALHÃES, H., 2005, p. 43)

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  75 

Outro exemplo era o Grito – Revista de Arte e Cultura Pop, editada por

Marcelo Damaso em CD-Rom. Grito foi produzido em Belém (PA) e teve apenas

uma edição, a número zero, que trazia matérias e entrevistas com bandas locais,

artigos sobre cinema e uma coletânea com onze músicas. O projeto não prosseguiu

pois seu editor não conseguiu levantar recursos para continuar produzindo o CD-

Rom da maneira que imaginava.

Como exemplo de aperfeiçoamento gráfico e segmentação ainda maior no

assunto temos os fanzines The Cure A Fanzine e Sir Rockaby. O primeiro era

dedicado a fãs brasileiros da banda inglesa The Cure, tinha 54 páginas impressas

em off-set, preto e branco e trazia matérias, resenhas e traduções de textos sobre a

banda. Sir Rockaby seguia a mesma linha, só que o artista homenageado era Frank

Black, ou Black Francis, pseudônimos usados pelo vocalista e guitarrista da banda

norte-americana Pixies.

Outros fanzines desta época também passaram a caprichar ainda mais no

acabamento gráfico. São os exemplos de Total Funzine, Shape A e [Mais]. Total Funzine foi publicado entre 1997 e 1998 e chegou a 10 edições. Tinha capa colorida

e miolo em papel jornal, com 20 páginas. Trazia matérias sobre a cena

independente brasileira, novidades sobre campeonatos de skate, além das

tradicionais seções de resenhas de fanzines e de fitas demo. Um dos destaques do

Total Funzine é a edição número sete (outubro / novembro 1998) que trazia uma

entrevista exclusiva com a então nova banda Charlie Brown Jr, recém contratada por

uma gravadora multinacional. Na entrevista, a banda declara: Tô feliz porque o mercado nacional tá mudando, tá dando espaço para as bandas novas. Hoje em dia não são as bandas que tão piradas atrás de gravadoras e sim as gravadoras que tão tendo que correr atrás das bandas. (Fanzine TOTAL FUNZINE, Jundiaí, n. 7, p.13, out./nov. 1998)

O fanzine Shape A número oito, de março e abril de 1997, saía pela primeira

vez impresso em offset, com mil exemplares. Trazia anúncios de diversas lojas de

skate e de roupas, expediente com departamento comercial e projeto gráfico

assinado por um estúdio de design. Os destaques eram a cobertura exclusiva do

campeonato nacional de skate de 1996, entrevista com a banda carioca Beach

Lizards, a cobertura de um evento de tatuagem no Rio de Janeiro e um pequeno

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artigo sobre a morte do cantor pernambucano Chico Science. O Shape A trazia

inclusive uma agenda de shows alternativos do mês, uma ousadia para uma

publicação com periodicidade incerta.

O [Mais] reunia bom acabamento gráfico com segmentação do conteúdo.

Seu principal objetivo era falar da cena musical alternativa de Curitiba. Seu editor

era Manoel José de Souza Neto; o formato A5 com capa couché; tiragem de 3000

exemplares gratuitos. O fanzine tinha diversos anúncios, apoio de uma rádio local e

de uma loja de discos, que inclusive publicava um encarte em papel especial no

miolo do fanzine.

Por volta de 1999 e 2000, a internet comercial no Brasil tinha milhões de

usuários. Mesmo assim, poucos fanzines migraram imediatamente para a rede e,

daqueles que migraram, poucos continuaram a ser editados por muito tempo. Este

fato foi comprovado neste mapeamento já que nenhum e-zine citado nos fanzines

impressos permaneceu online 19. Por exemplo, o fanzine Esquizofrenia, editado por

Gilberto Custódio desde 1993, chegou a ter domínio próprio na internet mas não

durou muito tempo. Boa parte dos meus textos publicados na internet hoje não existem mais. Sumiram. Já os de papel continuam por aí, muita gente coleciona, mostra para os amigos. Guardo os originais com muito mais cuidado, pois tenho enorme carinho e sei que foi bem trabalhoso editá-los. Posso tirar cópias deles a qualquer momento. A diferença é estética. Um fanzine de papel é um artefato pop. (Gilberto Custódio em entrevista ao autor)

Kátia Abreu e outros oito editores começaram seu e-zine em 2000, o

Quadradinho, que durou até 2002. O e-zine era mensal teve aproximadamente 24

edições. Hoje não é possível acessar a página original do Quadradinho

(http://www.quadradinho.com.br) pois, segundo Kátia Abreu, em entrevista para

este mapeamento, “a gente perdeu um ano de back up numa mudança de servidor”.

Nesta mesma entrevista, Kátia, que se assume uma fanzineira pós-impresso, afirma:

                                                        19 Para este mapeamento, “não permanecer online” significa que o editor do e-zine abandonou a publicação ou que os endereços da internet fornecidos pelos autores ou pesquisado nos fanzines impressos não podem mais ser acessados em seu endereço original. Entretanto, vale destacar algumas iniciativas recentes como o site Way Back Machine que arquiva páginas da internet desde 1996. Uma pesquisa feita neste site após a entrevista com os fanzineiros revelou a existência de algumas páginas do e-zine Quadradinho: http://web.archive.org/web/*/http://quadradinho.com.br - acessado em 30/10/2010; e nenhum resultado para as edições online do Esquizofrenia: http://web.archive.org/web/*/http://www.esquizofrenia.com.br

Page 77: Um Mapeamento dos Fanzines Impressos Sobre Música no Brasil de 1989 a 2009

 

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[...] Assim como o Quadradinho (que nunca teve versão impressa). Não peguei a fase de zines de papel. O Quadradinho nasceu e-zine – e depois a gente passou a chamar de Revista Eletrônica. A B*Scene nasceu como revista eletrônica já. É curioso pensar nisso hoje, mas na época que a B*Scene surgiu, eu e a Bárbara Lopes não gostavávamos de usar o termo “zine”. Viamos mais como experimento de jornalismo do que como uma coisa de fã. (Kátia Abreu em entrevista ao autor)

Houve portanto uma redução no número de fanzines impressos sobre música.

A principal causa desta redução tem uma explicação simples: antes da internet, os

fanzines eram a principal fonte de informação sobre música underground. Com os

mailzines, e-zines e a explosão de ferramentas para se ouvir e trocar música na

rede, os fanzines sobre música impressos no Brasil deixaram de ser esta fonte. Mas

isso não seria o suficiente para acabar com a publicação de zines impressos sobre

música no país. A própria Kátia Abreu, que preferia o online ao impresso, acabou

publicando uma versão em papel do e-zine B*Scene, como veremos na próxima

fase deste mapeamento. A gente decidiu fazer uma edição impressa da B*Scene para comemorar um ano de site e também como um experimento. Fizemos em papel jornal, preto e branco, por conta dos custos... mas ela foi concebida como uma edição piloto do que poderia ser a nossa revista impressa. (Kátia Abreu em entrevista ao autor)

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CAPÍTULO 6 QUINTA FASE: TENTATIVAS INOVADORAS (2000 – 2004)

Nos primeiros anos do novo século, editar um fanzine impresso era apenas

uma opção e não a única alternativa para quem achasse que tinha algo mais a dizer.

A internet reinava absoluta como meio mais utilizado para divulgar música e

informação sobre música. Em 1996, o formato do arquivo de áudio MP3 foi

patenteado nos Estados Unidos e em 1999, a gravadora norte-americana Sub Pop

(a mesma que havia lançado a banda Nirvana) foi a primeira a comercializar e

distribuir música no formato MP320. Foi também neste período que surgiu o

programa de troca de arquivos de música Napster; e nesta mesma época que

começaram a surgir vários sites para hospedar e desenvolver blogs; e alguns anos

mais tarde, os fotologs. Todos os principais portais da internet possuiam uma

editoria especializada para música e as revistas mainstream sobre música editavam

seus próprios sites. As notícias frescas agora saiam primeiro nas publicações online

e não mais nos impressos.

Além disso, a facilidade de acesso à informação e à música abria novos

campos de pesquisa aos fanzineiros. Músicos, bandas, grupos antes inacessíveis se

tornavam próximos com um simples clique do mouse. A pesquisa que antes

demandava buscas em revistas importadas, troca de correspondências que duravam

dias, cópias em xerox e a manutenção de um arquivo de textos e imagens, agora

estava disponível com muito mais facilidade e rapidez. No final da década de 1990 e

início dos anos 2000, o Google disparava para o topo dos acessos na internet. Sua

ferramenta de busca era tão eficiente que praticamente qualquer site, blog ou página

da internet publicada em qualquer canto do mundo poderia ser achada. Ao mesmo

tempo, emails aproximavam e aceleravam o contato entre bandas e fanzineiros,

fanzineiros e público, bandas e público. Era possível escrever, publicar, divulgar e

ter seu texto lido no mesmo dia na internet. Antes, este mesmo processo demoraria,

com muito esforço, no mínimo 2 ou 3 dias até chegar nas mãos dos leitores.

Como destacou Henrique Magalhães em seu livro “A Mutação Radical dos

Fanzines”: Com a expansão da Internet, muitos do editores que faziam fanzine impresso ensaiaram a migração para o meio eletrônico, com a criação de sítios. Alguns fizeram simplesmente a transposição do impresso para a tela do computador; outros preferiram criar novos

                                                        20 Fonte: http://inventors.about.com - acessado em 21/09/2010

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títulos, tirando proveito das possibilidades instrumentais e estéticas do novo meio. (MAGALHÃES, H., 2005, p. 45)

Mas o que aconteceu com os fanzines impressos sobre música desta fase? O

número de fanzines impressos reduziu bastante mas é relevante destacar algumas

novidades nesta fase. Os fanzines mais interessantes desta época apresentam dois

encaminhamentos: 1) tornaram-se projetos gráficos mais elaborados com conteúdo

ainda mais especializado; 2) surgiram publicações feitas sob encomenda para

eventos, funcionando como guias de programação de festivais de música por

exemplo, ou como informativos de empresas e lojas.

Para ilustrar o primeiro caso, dos fanzines de música que se sofisticaram

graficamente, temos alguns exemplos como os zines Lo-Fi, o 7” e o Musik-a. Eram

publicações onde a experimentação na parte gráfica justificava a existência do

fanzine tanto quanto o conteúdo. Os textos eram mais elaborados, longos e

opinativos e o bom acabamento gráfico embalava o fanzine de forma a valorizar

ainda mais o conteúdo. Os casos mais interessantes são do zine Lo-Fi e do zine 7”.

O Lo-Fi teve quatro números, sendo o último (de setembro de 2001) o mais

marcante. Esta edição saiu com 104 páginas em papel offset, impresso em preto e

branco, capa em duas cores e com uma coletânea em CD encartada. Em seu índice,

matérias opinativas e “frias” (não-datadas), listas comentadas e textos longos. No

editorial, seu editor Augusto Olivani destacava: O LoFi surgiu tímido, mas com uma idéia ambiciosa. Hoje, tanto eu como David, temos afeição pelos três números anteriores mas não os consideramos mais válidos. Eles são parte de uma evolução. […] É hora de atingirmos outro nível de qualidade, sem deixar de lado a característica de funcionar como ‘alternativa’ ao que é veiculado em larga escala. (Fanzine LO-FI, n. 4, set. 2001)

Infelizmente este foi o último número do Lo-Fi. Várias páginas em branco

nesta mesma edição, apenas com os dizeres irônicos “Espaço reservado para

publicidade” deixavam claro que era impossível bancar um fanzine com tal qualidade

sem recursos financeiros.

Outro fanzine marcante da mesma época, o 7” (leia-se Sete Polegadas)

trazia alguns anúncios e era em parte bancado por uma loja de discos de São Paulo.

O 7” também era impresso em papel offset, a maioria das páginas em preto e

branco com alguns anúncios coloridos também em papel offset, tinha 50 páginas,

Page 80: Um Mapeamento dos Fanzines Impressos Sobre Música no Brasil de 1989 a 2009

 

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capa duas cores e o formato pouco usual de sete polegadas por sete polegadas

(21,2 X 21,2 cm). Além do formato seguir o nome do fanzine, sete polegadas

também é o tamanho de compactos de vinil, o que remetia a publicação ao conteúdo

musical especializado do fanzine. O 7” tinha uma diagramação ousada, com

interposição de textos e imagens. Ficava clara a opção estética ousada dos editores

ao optar por uma capa de duas cores, miolo preto e branco mesmo podendo arcar

com algumas páginas do miolo em quatro cores. O editorial do primeiro número

oficializava as intenções de seu editores: Como nós, muita gente respira música. E essa obsessão, de que se alimenta? A resposta: informação.[…] A 7” é uma revista que quer ter a cara de fanzine, ou um fanzine com cara de revista. Participaram aqui algumas das pessoas que fizeram ou fazem alguns dos melhores fanzines que já li, e que qualquer um que acompanha música sabe que quem faz fanzines são as pessoas que sabem das coisas, a verdadeira imprensa musical. […] Então, a 7” é isso: informação, um pouco de discussão, um pouco de provocação, não necessariamente nessa ordem, nem nessa dose. (Fanzine 7”, São Paulo, n. 0)

Outro fanzine que buscava experimentação gráfica era o Musik-A, editado

em Belo Horizonte por Daniel Albinati, Gustavo Santos e Sérgio Scliar. Focado em

música eletrônica, o Musik-A era impresso em formato mini-tablóide, papel jornal,

preto e branco, com capa duas cores. Sua diagramação seguia as experimentações

similares a do 7”. Mas o Musik-A tinha uma especificidade: era um fanzine de papel

derivado de um site na internet. Ou seja, já começava nesta época um movimento

inverso que caracterizará a próxima fase a ser analisada neste mapeamento. Em

seu editorial, o amor pela música também justificava sua publicação: Este primeiro número é, de alguma forma, fruto do site Musik-A na web desde agosto de 99. De lá pra cá o mundo da música continua evoluindo, e continuamos na nossa missão de preencher uma lacuna no escasso mercado editorial atual, o das publicações direcionadas à produção musical contemporânea, sem em momento se esquecer do passado. Mesmo com a versão impressa gratuita, o site continua, com as matérias das edições impressas na íntegra, com direito áudios, links e notícias sempre atualizadas sobre o mundo da música. (Fanzine MUSIK–A, Belo Horizonte, n.1)

Nestes três fanzines mapeados acima percebe-se uma mudança notável:

nenhum deles publicou a anteriormente indispensável lista de fanzines, com análises

e relação dos endereços para correspondência. Uma característica que nas fases

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  81 

anteriores deste mapeamento ajudava a definir fanzines, isto é, seu engajamento no

intercâmbio, seu esforço para transformar “pessoas comuns” em fanzineiros, agora,

na época da internet, estava esquecida.

De novo recorro a Chris Atton, que no capítulo “What use is a zine?”, relata

alguns casos de fanzines, como o do norte americano MAXIMUMROCKANDROLL,

para mostrar uma característica dos fanzines musicais impressos: o encorajamento

aos leitores a agirem, o que ele chama de “instrumentalização dos leitores”: It [o fanzine MAXIMUMROCKANDROLL] not only provides thorough coverage of the hundreds of tiny, group-owned independent labels as well as coverage of the group’s gigs and interviews with their members, it also seeks to encourage a network of self-sufficient fans and musicians (as with the zine editors and readers, often the same people who will work together to put on gigs, arrange tours for one another and organize local distribution throughout the world). 21 (ATTON, 2002, p. 65)

A não publicação destas relações de fanzines mostra um desengajamento

dos editores da sua função de promover o intercâmbio e também serve para

comprovar a enorme redução no número de fanzines impressos publicados.

Em LoFi, 7” e Musik-A, a informação especializada e opinativa embalada por

uma diagramação moderna e alternativa é o binômio que justifica a publicação

destes impressos. Os “fanzines de papel” sobre música deixam de ser uma

necessidade e tornam-se objetos colecionáveis, publicações cultuadas (“cults”).

Seguindo esta tendência, é interessante notar que a facilidade de acesso à

informação refletiu também no mercado brasileiro de revistas neste período.

No final de 2001 e começo de 2002, duas iniciativas de jornalistas paulistas

chegaram às bancas: as revistas Zero e Frente. A Zero era editada por Luiz César

Pimentel e Alexandre Petillo e nasceu dentro de um blog, o Scream & Yell, que

surgira como fanzine impresso mas logo migrou para a internet. Entre edições de

banca e edições especiais, a Zero teve aproximadamente vinte números, com uma

tiragem máxima de cinquenta mil exemplares e custava em média seis reais e

noventa centavos (R$6,90) nas bancas. Em entrevista a este mapeamento, Luiz

                                                        21 Tradução minha: Ele [o fanzine MAXIMUMROCKANDROLL] não apenas traz uma completa cobertura da centena de pequenos coletivos de bandas e gravadoras independentes, também traz uma cobertura dos shows e entrevistas com membros das bandas, como ainda encoraja a criação de redes de músicos e fãs (assim como de editores de zines e seus leitores, comumente as mesmas pessoas que ajudariam a produzir shows, organizar turnês um para os outros e organizariam a distribuições locais Mundo afora).

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César, atual editor de entretenimento do portal R7, relembra os motivos que o

levaram a criar a Zero: O mesmo motivo pelo qual eu fiz o zine. Não existia um veículo que falava comigo, que tinha pautas e ideias que eu queria ler. Ou seja, foi basicamente uma decisão egoísta - fazer a revista que eu queria ler. […] As matérias eram montadas em camadas - combinação de pauta com direcionamento gráfico, imagens, abordagem. Era uma composição, e não apenas encaixe em espaço. […] [A Zero] era totalmente dependente do apoio da editora (Escala). Eles bancavam a produção (impressão e distribuição) e ficavam com a venda de banca e nós com os anúncios (80% do que entrava em anúncios). (Luiz César Pimentel em entrevista ao autor)

Já a revista Frente tinha uma proposta mais ousada: editada pelos jornalistas

Ricardo Alexandre, Emerson Gasperin e Marcelo Ferla (reunidos sob a sigla REM,

um departamento da Editora Ágata) pretendia levar às bancas, mensalmente, por

dez reais e noventa centavos (R$10,90), uma revista com um CD encartado. As

edições duraram apenas três números, destes, apenas os dois primeiros com CD.

Os CDs da Frente traziam coletâneas de músicas de bandas independentes da

época como Cachorro Grande, Casino, Astromato, Supertrunfo, Vermelho 40,

Pistoleiros, entre outras. Frente fechou as portas deficitária.

Voltando aos fanzines, ainda nesta fase, o conceito de “zine” continou a ser

utilizado por empresas e eventos. A ideia de uma comunicação ágil, livre,

independente e por vezes experimental somava-se ao plano de marketing de

algumas empresas e produtores culturais. Vários festivais independentes publicaram

seus próprios zines que serviam como guias de programação. Era um retorno às

origens: o movimento de festivais independentes, que nasceu apoiado pelos

fanzines no começo dos anos 1990, agora utilizava o conceito do zine impresso para

ampliar sua divulgação.

O objetivo da publicação destes zines era divulgar as atrações do festival sem

ter que depender da mídia tradicional. Como a maioria dos artistas que tocavam nos

festivais eram desconhecidos do público, o fanzine cumpria a função de apresentar

estes novos nomes. Estas publicações eram, na maioria dos casos, guias de

programação impressos somente na ocasião do festival. Quando seus editores

decidem chamá-los de fanzines ou zines, isso reforçava o caráter independente do

festival. Alguns zines, como o guia do festival brasiliense Porão do Rock evoluíram

para edições contínuas, lançadas antes e depois da realização do festival.

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É interessante notar neste movimento que os festivais independentes que

brotavam em várias regiões do Brasil representavam o lado prático da difusão da

produção musical independente. Enquanto os fanzines impressos e eletrônicos se

ocupavam em divulgar os novos músicos e novas bandas, os festivais os colocavam

para tocar. Como os festivais escalavam inúmeras bandas iniciantes, os fanzines

publicados como guias dos festivais acabaram se tornando um registro importante

da produção musical independente desta fase.

Por exemplo, os guias do festival carioca Humaitá Pra Peixe traziam

extensas matérias de sobre as atrações de cada edição. O mesmo acontecia com o

fanzine do projeto Free Jazz Project. Alguns músicos foram entrevistados pela

primeira vez em um veículo impresso para estes guias. Portanto estes textos foram

os primeiros registros perenes de suas carreiras. Trata-se de uma oportunidade

única para entender aquele momento de artistas como Funk Como Le Gusta, Video

Hits, Sonic Junior, Rumbora, Turbo Funk, Otto, Pau de Dá em Doido, Matanza, entre

outros. Como está registrado no editorial do Zine do Free Jazz Project: Seguindo o conceito do Free Jazz Project de mostrar nomes que estão crescendo no cenário musical – perguntamos a todos os entrevistados sobre como é iniciar um novo projeto, criar novos trabalhos. Ouvimos as mais diferentes respostas mas, em geral, o que ficou foi a impressão de que a naturalidade é o que mais conta. (Fanzine FREE JAZZ PROJECT, Rio de Janeiro, n.1, ano 1, ago./set. 2001)

Vale registrar que o Free Jazz Project era um projeto subvencionado por uma

grande marca de cigarros. Apesar disso, a aparência do zine e sua função dentro do

projeto de shows se encaixa dentro da característica que pretendemos destacar

nesta fase, de um novo tipo e uma nova função para os fanzines.

Uma característica deste tipo de zine era sua aperiodicidade. Eles eram

publicados apenas quando ocorriam edições dos festivais. Um dos fanzines que

quebrou esta regra e passou a ser publicado frequentemente foi a Revista Porão do

Rock. Publicada a partir da edição do ano 2000 do festival realizado em Brasília, a

publicação colorida, com páginas em papel couché e formato de revista de bolso

(11,5 X 15 cm), saiu mensalmente durante quase dois anos. As edições com maior

número de páginas foram exatamente aqueles que sairam nos meses do festival,

com matérias sobre todas as atrações, como deixa claro o editorial do número 9, de

julho de 2001:

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Chegamos ao ponto de ebulição de nossas atividades, no qual tudo que foi desenvolvido durante o ano chega ao auge. Afinal, julho é o mês do Festival Porão do Rock, a origem desta publicação mensal. […] A intenção inicial se mantém: fomentar a cena musical, através de informação diferenciada e divulgação da produção local – nos moldes do festival. Reunir pessoas, bandas, produtores, interessados, investidores num mesmo espaço, sob uma mesma ideologia parece absurdo, mas continuamos tentando. Apesar dos obstáculos, temos nos saído bem. (REVISTA PORÃO DO ROCK, Brasília, n.8, jul. 2001)

Nesta edição temos registros raros de bandas como Gramofocas, Mopho,

Prot(o), Di Boresti, Quebra Queixo, Megafone, Nulimit, MF5, RTL, Quadrum – a

maioria delas pouco conhecida na época do festival, e também matérias sobre

outras bandas com mais repercussão na imprensa da época como Mundo Livre S/A,

Ratos de Porão, Pavilhão 9, Detrito Federal e Bidê ou Balde, mas vistas aqui sob o

ponto de vista da imprensa fanzineira.

Seguindo uma linha parecida, outro fanzine que começou na internet como

um guia da produção musical de Pernambuco e passou a ter edições impressas foi o

Recife Rock! Este zine aproveitava grandes eventos na capital pernambucana para

publicar edições impressas. Estas edições saiam em formato de revista de bolso

(10,5 X 14,5 cm), com páginas coloridas e tinham apoio do governo local, do

Ministério de Minas e Energia do Governo Federal. Este apoio vinha através de

inscrição do projeto impresso em editais de fomento à cultura.

O diferencial da versão impressa do Recife Rock! para a versão online,

assim como dos zines dos festivais para os outros zines da mesma época estava no

fato de serem financiados. Nota-se aí uma tentativa inovadora de acabar com um

antigo problema dos fanzines: a falta de recursos. Justamente numa época em que

publicar na internet era muito mais tentador, alguns fanzines acharam um caminho

inteligente para continuar a existir em papel: subvenção, fosse ela do setor privado

ou do setor público.

Em abril de 2004 foi criada uma comunidade na rede social Orkut sobre

fanzines. É uma entre a dezena de comunidades em língua portuguesa sobre o

assunto. Os participantes desta comunidade publicaram em data não divulgada duas

enquetes onde todos poderiam opinar. Uma perguntava como os fanzineiros

publicavam seus zines (era possível votar em mais de uma opção). A enquete teve

111 votos (acesso em 30/10/2010), as opções de resposta e a respectiva contagem

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de votos foram: “Distribuição gratuita” (42 votos); “Cobra pelo preço gasto no

material, xerox e só” (16 votos); “Cobra o preço que acha justo pelo seu trabalho”

(16 votos); “Disponibiliza na internet “(28 votos) e “Outra Forma” (9 votos).

Outra enquete ainda mais interessante e com maior número de votos totais

(218 votos – acesso em 30/10/2010) trazia o seguinte resultado para a seguinte

pergunta: “Você acha que os zines devem ser feitos…”: “Totalmente a mão” (31

votos); “Totalmente no computador (apenas impresso)” (8 votos); “No computador, à

mão, tudo misturado” (59 votos); “Tanto faz, o q interessa é o que o zine qr mostrar”

(111 votos) e “Outra Forma (9 votos). Esta enquete ainda está aberta e os votos

continuam a ser computados. E como o que interessa é o que o zine quer mostrar, a

próxima e última fase deste mapeamento traz uma intrigante pergunta: por que

ainda se publicam fanzines impressos sobre música na primeira década do século

XXI?

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  86 

CAPÍTULO 7 SEXTA FASE: O FLUXO INVERSO - A INTERNET GERA

FANZINES IMPRESSOS (2004 – 2009)

Perto da segunda metade dos anos 2000, a internet já ocupava lugar de

destaque como canal de comunicação no Brasil. Segundo dados do IBGE (PNAD)22

estimava-se que em 2003 o Brasil tinha 5,6 milhões de domicílios com acesso a

internet (banda larga e discada) ou aproximadamente 20 milhões de usuários

domiciliares, sem contar os acessos de empresas e universidades. Os primeiros

serviços de banda larga, mais potentes do que o serviço anterior de conexão

discada, possibilitam a experiência multimídia online de maneira nunca antes

vivenciada: textos, imagens, áudio e vídeo estão disponíveis no mesmo suporte, que

também permite interatividade imediata, ao contrário da televisão, dos impressos e

do rádio.

Os e-zines de música que antes se limitavam a textos, fotos e pequenos

trechos de arquivos de áudio passam a ter vídeos, podcasts e até rádios online

funcionando vinte e quatro horas por dia. Todos estes recursos multimídia são

facilmente inseridos nos e-zines através de ferramentas gratuitas disponíveis na

internet. Não é mais necessário conhecimento técnico de programação para publicar

um e-zine multimídia.

Ao mesmo tempo, um movimento que havia começado na fase anterior, das

redes sociais, se torna ainda mais presente, com inúmeros sites que promovem o

intercâmbio entre indivíduos e também competem entre si para ter o maior número

de usuários. No Brasil, o primeiro foi o Orkut, criado em janeiro de 2004, este site

tem hoje mais de 23 milhões de brasileiros cadastrados 23. Depois vieram outras

redes sociais que não demoraram a ter massiva adesão de brasileiros: YouTube,

Twitter e Facebook. A música também tem sua rede social, o MySpace, que se torna

ponto de partida para músicos divulgarem suas composições no ciberespaço: ter

uma página no MySpace é a condição número um para oficializar a existência de

uma banda ou artista.

É necessário reforçar o que já foi dito anteriormente neste mapeamento: a

“competição” da internet tem impacto direto sobre a produção de fanzines

impressos, principalmente nos fanzines sobre música. Como já foi analisado aqui,

                                                        22 Fonte: http://www.teleco.com.br/comentario/com94.asp - acessado em 10/10/2010 23 Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Orkut - acessado em 29/09/2010

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  87 

uma das funções dos fanzines - aproximar pessoas com interesses similares - passa

a ser desempenhada primordialmente pela internet e suas redes sociais. Outra

função, que era a de servir como fonte de informação sobre música, especialmente

sobre uma produção musical pouco divulgada pela grande imprensa, é desviada

para sites como MySpace, Tramavirtual, Bandas de Garagem, Palco Virtual e

dezenas de outros. Desde o início dos anos 2000, a internet havia tomado o espaço

de divulgação e discussão de música que antes era dos fanzines impressos.

Vale como um exercício deste mapeamento comparar iniciativas como a do

Boletim CENAPI, que no final da década de 1980 lutava pelo intercâmbio de

publicações independentes. Seu esforço de aglutinacão os levou a realizar uma

pesquisa que listava 384 publicações independentes no Brasil no ano de 1989.

Comparando hoje, basta digitar a palavra “fanzine” no Google para ter

aproximadamente 13 milhões de páginas que remetem ao assunto, encontradas em

0.14 segundos. Refinando a busca, encontram-se sites especializados que divulgam

a cultura do fanzine, como a comunidade Fanzine no Orkut, e sites internacionais

como I Make Zines, Zine Wiki e ZineWeekly.

Outra comparação interessante pode ser feita entre a ousada iniciativa dos

editores do Underguide em 1996 e a função hoje desempenhada pelo MySpace.

Imagine se o Underguide tentasse imprimir um diretório de endereços de bandas e

músicos baseado nos dados do MySpace que reúne aproximadamente 110 milhões

de pessoas em todo mundo? Definitivamente, a informação sobre música, e a

própria música, não estão mais baseadas unicamente em suportes físicos, sejam

fanzines ou fitas, CDs e vinis.

Desde o começo dos anos 2000, o mercado fonográfico brasileiro também

começou a experimentar a crise de vendas que modificou vários mercados

importantes do mundo. A indústria do disco como era conhecida até o final do século

passado começou a ruir e novos modelos passaram a ser testados. Inovações como

o Itunes da Apple focam na venda de arquivos de música via internet em oposição a

venda de discos físicos. Outros agentes do meio predizem que os artistas não

deveriam mais depender da venda destes produtos, ou da gravação de sua própria

música, para sustentar suas carreiras mas sim da apresentação de suas músicas ao

vivo, dos shows, com ingressos pagos. Novos modelos de negócio substituem o

padrão anterior onde artistas dependiam de gravadoras que controlavam o mercado.

Novas iniciativas no mercado fonográfico envolvem empresas bancando gravações,

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turnês e até discos físicos de alguns artistas. Por outro lado, nomes importantes do

pop rock internacional lutam contra a circulação gratuita de suas músicas,

interpelando legalmente usuários de programas de troca de arquivos (como fez a

banda Metallica) ou entregam ao público a decisão do valor que acha justo pagar

pela música, mesmo que o público decida não pagar nada (como fez a banda

Radiohead). O denominador comum, o espaço de desenvolvimento de todas estas

iniciativas é a internet.

Diante de tal hegemonia, como explicar a ininterrupta (mesmo que pequena)

produção de fanzines impressos sobre música? A característica marcante desta

última fase é o fluxo de publicação contrário ao que foi mapeado na quarta e quinta

fases: fanzines que começaram eletrônicos decidem lançar versões impressas. O

que pretendemos mostrar nesta fase do mapeamento é que, ao contrário do que se

imagina, a internet não matou o fanzine impresso. É certo que o número de

publicações impressas diminuiu drasticamente, mas fanzines “de papel” sobre

música continuam sendo publicados. Os exemplos relacionados a seguir

exemplificam alguns dos variados motivos que fizeram com que blogueiros ou

internautas “comuns” sujassem suas mãos de tinta e cola para produzir fanzines

impressos.

Um dos motivos é o gosto pelo colecionismo, pelo simples fato de criar

tiragens limitadas, com excelente acabamento gráfico, para serem guardadas por

poucas pessoas como itens raros, valorizando ainda mais o nome da publicação,

fosse ela eletrônica ou impressa. Como relata Henrique Magalhães em seu livro “A

Mutação Radical dos Fanzines”, ao explicar a migração do fanzine eletrônico

Pitomba para uma versão impressa. Vale destacar que o assunto principal do

Pitomba eram histórias em quadrinhos, o que explica ainda melhor a necessidade

de materialidade da publicação: A necessidade, então, de se fazer um fanzine impresso inspirado no sítio pode ser compreendida pelo vínculo de seus editores com aquele meio de publicação, onde tem importância o hábito de colecionismo, da materialidade do objeto de culto, pouco praticável no meio eletrônico. (MAGALHÃES, H., 2005, p. 61)

A melhor expressão deste colecionismo está no editorial do fanzine B*Scene

de dezembro de 2003. O B*Scene era um site, ou “uma revista eletrônica cultural,

atualizada semanalmente”, como descreviam suas editoras Kátia Abreu e Barbara

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Lopes no índice deste mesmo impresso. Em dezembro de 2003, para comemorar

um ano de site no ar, lançaram uma “edição especial” impressa em papel jornal,

formato mini tablóide, com 32 páginas e chamadas de capa para matérias sobre o

“sample” (“O Sample Pede Passagem”), MPB (“Você tem medo da MPB?”) e rock

independente (“Bom momento dos independentes”). No editorial, a razão para uma

edição impressa era descrita como fetiche: Mais do que couro, vinil ou seda, o material que mais desperta fetiche é o papel. Tanto quanto de conceitos, idéias e outras transcendências, a devoção a livros, jornais e revistas depende de seus aspectos físicos, o táctil e o olfativo pari passu com o intelectual. Especialmente para jornalistas. De certa forma, é um anacronismo. As pessoas vão cada vez mais se desligando dos suportes. Troca-se e negocia-se música em arquivos digitais, escritores se revelam em blogs e se reúnem em sites, filmes migram da película para o DVD. Mas para o fetichista, a “coisa-em-si” não tem tanta graça sem o objeto. Então, talvez seja apenas por perversão que a comemoração de um ano da B*Scene seja esta edição impressa. Ela é nosso salto alto, nossa vela e nosso chantily, nossa noite especial de aniversário. (Fanzine B*SCENE, São Paulo, dez./2003)

A edição impressa do B*Scene em questão tem alguns anúncios,

principalmente de gravadoras independentes e lojas de discos, que provavelmente

bancaram os custos de impressão. Ainda assim, o fanzine traz valor de capa de dois

reais (R$2,00). É interessante comparar esta edição impressa com a última versão

do site B*Scene, ainda disponível na internet24, com postagens datadas de

dezembro de 2004, ou seja, um ano após a edição impressa, sem qualquer anúncio

ou banner pago na versão eletrônica.

Nesta época, segundo dados da Associação de Mídia Interativa (AMI), a

publicidade na internet brasileira correspondia a 1,5% do faturamento do mercado

publicitário brasileiro como um todo25. Como o impresso ainda era mais valorizado

pelos possíveis patrocinadores, alguns fanzines enxergavam nas edições de papel

uma maneira de se capitalizar, inclusive para pagar custos da versão eletrônica

(servidores, mensalidades, etc).

                                                        24 Fonte: http://web.archive.org/web/20070218003153rn_1/www.gardenal.org/bscene/ - acessado em 30/10/2010 25 Fonte: artigo “Publicidade na Internet volta a crescer” por Alessandro Barbosa Lima no portal Terra, sem data de publicação, em http://tecnologia.terra.com.br/interna/0,,OI515956-EI4831,00.html acessado em 10/10/2010

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Outro bom exemplo da “volta” ao papel está no zine Coquetel Molotov, de

Recife. O Coquetel Molotov começou como um programa de rádio na Universitária

FM de Recife em 2001, seguido de um site sobre o programa. Em agosto de 2004,

os apresentadores do programa, Ana Garcia, Jarmeson de Lima e Tathianna Nunes

lançaram a primeira versão impressa do fanzine, ainda em xerox, até sair como

revista em dezembro de 2005. Os editores do Coquetel Molotov ainda

transformariam a publicação em um festival de música, com edições anuais

programando inclusive importantes artistas do cenário musical alternativo mundial.

14 - Capa e editorial do fanzine Coquetel Molotov n.1

O editorial do fanzine Coquetel Molotov número 1, impresso em agosto de

2004, revela os motivos por trás da escolha da versão em papel: Finalmente temos a primeira versão impressa do Coquetel Molotov! Woohoo!!! Sim, eu sei que não é uma revistas foderosa com um design maravilhoso de Marcelo Garcia, mas é algo, verdade?! É outra coisa ter um papel na mão e ler sobre suas bandas favoritas. Descobri que nada substituirá o tesão de criar algo e botar no papel. Tudo começou quando Jarmeson (um dos editores) falou que tinha entrevistado a banda Automatics para o site Coquetel Molotov. Mas

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aí pensei… já que eu não sei mexer em flash direito, por que não fazer o nosso primeiro zine? (Fanzine COQUETEL MOLOTOV, Recife, ago. 2004)

Na mesma página, os editores incentivam: “Motto Coquetel Molotov: Mate o

seu site e crie um zine, porra!” O Coquetel Molotov teve aproximadamente doze

edições em xerox, preto e branco, formato A5, usando papel colorido na capa e uma

média de cinco a seis folhas, com dez ou doze páginas por edição. A maioria das

páginas era montada à mão, com textos digitados eletronicamente. A tiragem média

era de cinquenta exemplares por edição do fanzine.

15 - Capa da revista Coquetel Molotov n. 1

Em dezembro de 2005 saiu a edição número um da revista Coquetel Molotov, impressa em papel couché 90g, colorida, com aproximadamente 70

páginas, capa em papel cartão 150g, com aplicação de verniz e design assinado

pelo estúdio Mooz. O acabamento gráfico da revista Coquetel Molotov era

sofisticado, de alto custo para uma publicação alternativa26 e a tiragem da edição

                                                        26 Em entrevista a este mapeamento, Ana Garcia, explicou: “Revista sempre será difícil de viabilizar. Zine você junta R$50,00 e faz um zine foda. […] Site também... os custos são mínimos. Mas a revista é MUITO cara […] gastamos em torno de R$12.000,00 para 2 a 3 mil cópias de uma revista com 68 páginas coloridas, e ainda tem o designer, um ou outro jornalista ou fotógrafo...”

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número um era baixa, de apenas dois mil exemplares distribuídos gratuitamente. O

financiamento para esta edição vinha do apoio do Governo do Estado de

Pernambuco, com anúncio da Secretaria de Educação e Cultura na quarta capa. As

chamadas de capa destacavam alguns artistas independentes brasileiros pouco

conhecidos como Cidadão Instigado, Almir de Oliveira e M. Takara.

Neste mesmo número da revista havia um artigo sobre a segunda edição do

festival No Ar Coquetel Molotov, com artistas brasileiros e internacionais, realizado

em 2005. A edição de 2010 do mesmo festival No Ar Coquetel Molotov teve 20 dias

de atividades e shows, distribuídos entre Recife, Salvador e São Paulo. Os

patrocinadores principais do evento foram Petrobras e a operadora de telefonia Vivo,

além de apoios de marcas como Trident (marca de chicletes), Red Bull (bebida

energética), Faculdades Barros Mello, Rede Globo Pernambuco e também de

órgãos públicos como Governo do Estado de Pernambuco e da Lei de Incentivo a

Cultura do Governo Federal. Resumindo, um projeto que começou como um

programa de rádio e site, passou pelo fanzine impresso e virou um dos eventos mais

bem sucedidos de música alternativa do Brasil. A edição impressa mais recente do

Coquetel Molotov, ainda com apoio do Governo Estadual local, saiu em 2009 em

seu sexto número. O fanzine em xerox não é mais publicado.

A movimentação da cena musical local e o envolvimento com festivais

independentes também foram motivos que levaram Humberto Wilson, ou Beto

Wilson, editor do fanzine Decibélica, junto com Léo Rockefeller e Victor Paulista, a

lançar seis números impressos com tiragens médias de 1500 cópias. O Decibélica

foi impresso em Goiânia entre 2006 e 2007, anos em que a cidade ostentava o título

informal de “Capital Brasileira do Rock” por conta dos festivais independentes que

aconteciam (e ainda acontecem) lá: Goiânia Noise, Bananada, Vaca Amarela,

Release Alternativo, entre outros. O Decibélica tinha “cara” de revista mas, como

explicou Humberto em entrevista a este mapeamento, mantinha uma estrutura de

fanzine: […] toda a estrutura dos textos, de colaboradores; gente que escrevia por gosto e não por grana; era de zine. Mas a ideia desde o início era profissionalizar a coisa, fazer uma revista mensal - apesar de nunca termos conseguido atingir essa meta, era sempre bimestral -, conseguir captar recursos pra manter uma estrutura, fomentar um mercado que era novo: uma revista focada exclusivamente no cenário independente. Acho que no final das contas a Decibélica era um misto das duas coisas. As primeiras edições tem mais cara de

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zine, as últimas já de revista. (Humberto Wilson em entrevista ao autor)

A Decibélica sempre foi impressa colorida em papel couché, com capa em

papel 120g., chegando a ter lombada quadrada a partir da edição número quatro. A

primeira edição saiu com 38 páginas; no número quatro, tinha quase oitenta páginas

e, seu último número, de julho de 2007, saiu com quase 100 páginas. O fanzine foi

impresso em dois formatos de revista: 20,3 X 26,6 cm e 21 X 30,5 cm. As capas

sempre foram dadas à bandas independentes brasileiras, assim como as matérias

principais. Humberto Wilson lista os nomes que passaram pela publicação: MQN, Rollin' Chamas, Rockefellers, Vanguart, Faichecleres, Rockassetes foram capas, além de Macaco Bong, Bang Bang Babies, Johnny Suxxxx... Cara, foi mais de uma centena de bandas ao todo. Mas na verdade eu focava mais em festivais, porque acho que para a pessoa curtir a banda não adiantava ler a respeito apenas, tinha que ir em show, comprar CD em banquinha, participar do movimento. Então divulguei Demo Sul, Noise, Bananada, Maxxima, Marmelada, Grito Rock, Calango, PMW, Porão e os eventos da revista. Deve ter mais um ou outro que nem lembro, mas a ideia era essa: divulgar festivais e bandas. (Humberto Wilson em entrevista ao autor)

Em 2010, os fanzines impressos continuam sendo lançados. Um tópico de

discussão iniciado em 27 de janeiro de 2009, na comunidade Fanzines da rede

social Orkut, pede para que seus participantes falem de seus fanzines. A última

mensagem publicada dentro do tópico, em final de setembro de 2010 27, listava 118

relatos de participantes publicados sobre os mais variados assuntos. Numa pesquisa

informal, lendo os relatos, é possível detectar pelo menos vinte e um fanzines

impressos cujo assunto principal é música. A grande maioria dos fanzines impressos

descritos neste tópico tratavam de literatura (preferencialmente autopublicações de

poesia) e mangás ou animes japoneses.

Em setembro de 2010, um artigo 28 publicado no blog NoZines fala sobre um

aplicativo criado pelos editores do fanzine de papel Preston is My Paris para

iPhone. Preston is My Paris é um fanzine fotográfico impresso, que traz fotos da

pequena cidade inglesa de Preston. O aplicativo mostra num mapa do IPhone, o

                                                        27 Link: http://www.orkut.com.br/Main#CommMsgs?cmm=45185&tid=5295973823089107818 - acessado em 10/10/2010 28 Link: http://www.nozines.com/contenido/ppp-app-iphone-ipad.asp - acessado em 10/10/2010

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local aonde estas fotos foram tiradas. No mesmo blog, NoZines, outro artigo explicita

o espírito dos fanzines em papel de hoje em dia: In times of constant technological revolution and immediate access to information through the network, paper, as a media for the dissemination of culture and information seems destined to disappear. However, the number of independent publications do not stop growing. In fact, different forms of communication, digital and analogue can coexist. It’s about different ways, uses and times ranging between the immediacy of digital and the traditional way of disseminating and consuming cultural creation and art. Its contents tend to be more timeless and invite paused reflection. Beautiful design and text written with loving care in a continuous search for seamless integration between content and form. In general, they are still spaces for dissemination, review and reflection on cultural production. Objects themselves, everlasting, pages of printed paper that can be touched with the fingers, means of underground cultural expression. In the case of experimental magazines involves a different way to approach to these publications, full of visual impact, subject to different interpretations, inexhaustible source of emotions and feelings. They already have a notable presence in art fairs, specialized bookstores and museum shops 29. (Blog No.Zines acessado em 25/09/2010)

Para encerrar o relato das características desta última fase, um fanzine

impresso sobre música merece destaque especial. Em 2009, em Curitiba, um zine

musical chamado FanClip foi impresso por duas adolescentes com matérias sobre

os seus videoclipes prediletos. A edição número um, de julho de 2009, se parece

muito com fanzines editados na terceira fase deste mapeamento. Formato A5, com 2

folhas A4 dobradas, 8 páginas, editoração simples, replicados em xerox. As editoras

J-Pika (completando 14 anos em 2009) e Samamb-T (com 15 anos) abrem a

publicação, que entendem como substantivo feminino, com seus perfis sob o título

“Quem faz a fanzine”. Na página seguinte, em vez de um editorial, uma “Introdução”,

que explica:

                                                        29 Tradução minha: Em tempos de constante revolução tecnológica e acesso imediato à informação pela internet, papel, como mídia para disseminação de cultura e informação parece destinado a desaparecer. Entretanto, o número de publicações independentes não pára de crescer. Na realidade, formas diferentes de comunicação, digital e analógica, podem coexisitir. São maneiras, usos e tempos diferentes, variando entre o imediatismo do digital e a maneira tradicional de disseminar e consumir criações culturais e arte. Seu [do fanzine impresso] conteúdo tende a ser mais perene e convida a lenta reflexão. Design belo e texto escrito com cuidado numa contínua procura por uma inexplicável integração entre conteúdo e forma. Em geral, eles são espaços estáticos para disseminação, análise e reflexão sobre produção cultural. São eles os próprios objetos, duradouros, páginas impressas em papel que podem ser tocadas pelos dedos, canais de expressão cultural underground. Como revistas experimentais, possuem uma maneira diferente, cheios de impacto visual, sujeitos a interpretações diversas, infindável fonte de emoções e sentimentos. Eles já tem notável presença em feiras de arte, livrarias especializadas e lojas de museus.

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A fanzine Fanclip contém comentários sobre diversos video-clipes que estão rolando na televisão e na internet de todo mundo, podem ser eles divertidos, interessantes ou clássicos. O videoclipe começou a ser amplamente utilizado a partir dos anos 1960, pela banda The Beatles, pois não podiam ir a todos os lugares para que se apresentassem ao vivo, daí gravavam-nos cantando e então passavam a ser exibidos na televisão. […] Mas chega de história: o objetivo da fanzine é criticar, aprovar ou desaprovar diversos clipes. A Fanclip é mensal, então você poderá desfrutar de novos conflitos e loucuras a cada mês. (Fanzine FANCLIP, Curitiba, n. 1, 2009)

Em entrevista por email a este mapeamento, a editora Thaís (Samamb-T)

explica os motivos que as levaram a publicar um zine impresso: A nossa fanzine impressa começou como uma parte do projeto Repórter-mirim, da Gazeta do Povo [jornal local], e gostamos do processo tanto que fizemos uma segunda edição por conta própria. Não estamos mais trabalhando com a fanzine impressa, até por causa do custo, mas mantemos o blog30 sempre com novidades. (Thais Samamb-T em entrevista ao autor)

O interessante de Fan-Clip é que suas editoras nem haviam nascido quando

os primeiros fanzines deste mapeamento estavam sendo publicados. Outro ponto

interessante é que Samamb-T e J-Pika aparecem em fotos na “Introdução”

segurando discos de vinil (outra mídia já abandonada pelo mercado mainstream da

música quando elas nasceram) com a logomarca do Fan-Clip no rótulo. E ainda

citam Beatles no texto do editorial (“Introdução”) para justificar o assunto tratado por

sua publicação. Seja por razões financeiras, colecionismo, experimentação artística,

apoio a movimentos musicais ou até pelo simples motivo de querer colocar no papel

aquilo que pensam, fanzines continuaram a ser impressos em papel em 2009.

                                                        30 link: http://f-fanclip.blogspot.com - acessado em 10/10/2010

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CAPÍTULO 8 CONCLUSÃO

Os objetivos principais deste mapeamento eram rever a história de duas

décadas de produção de fanzines musicais impressos no Brasil descrevendo seu

desenvolvimento sob o ponto de vista da produção editorial, listando as principais

mudanças gráficas e a influência destas mudanças no conteúdo destes fanzines. Ao

propor uma divisão em “fases”, foi possível analisar mais profundamente cada

momento, comparar mudanças e aperfeiçoamentos e estabelecer uma possível (e

modesta) periodização de um campo tão vasto.

Através da releitura dos fanzines pré-selecionados foi possível comprovar,

com descrições das publicações e entrevistas com fanzineiros, as características de

cada “fase”. Com tal divisão provada empíricamente, é possível estabelecer uma

“linha evolutiva” na produção de fanzines musicais impressos no Brasil de 1989 até

2009.

Num primeiro momento, de 1989 a 1992, condições políticas (a eleições

diretas para Presidente), tecnológicas (o constante aprimoramento das máquinas

fotocopiadoras), a carência de publicações especializadas, o incentivo de alguns

poucos veículos da grande imprensa (Rio Fanzine e Revista Animal) e o momento

musical (entressafra do BRock) semeiam o terreno para um novo crescimento do

número de fanzines musicais publicados no Brasil. A segunda fase, de 1992 a 1994,

é uma fase intermediária, onde fatores da primeira fase acentuam o crescimento no

número de fanzines produzidos, aprimorando principalmente sua qualidade gráfica

quando reproduzidos em xerox, mas que não pode ainda ser chamada de “fase de

ouro” por meras questões econômicas: a crise financeira não permitia que os

fanzines, assim como o cenário musical independente, pudessem se organizar.

Já a terceira fase (1994 a 1997) foi descrita como a “fase de ouro” do fanzine

musical impresso no Brasil por vários motivos: estabilização da moeda e

possibilidade de planejamento a curto e médio prazo, crescimento e estruturação da

cena musical independente, popularização dos computadores caseiros e dos

softwares de desktop publishing. Todos estes fatores levaram vários fanzines a

tentativas ousadas de profissionalização e aprimoramentos como impressões em

gráfica. Estas tentativas visavam atingir um público maior, como atestam as

entrevistas com os fanzineiros, que comentam a vontade de dar uma “cara de

revista” aos seus fanzines.

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Ainda nesta fase, a ebulição do cenário musical independente no Brasil tinha

nos fanzines seu principal veículo de divulgação pois a internet ainda engatinhava

no país. Tudo isso colaborou para que este período fosse um dos mais produtivos

para os fanzines musicais brasileiros, o ápice da produção impressa.

A fase seguinte, de 1997 a 2000, registra um enorme declínio na quantidade

de fanzines musicais impressos no Brasil por um motivo básico: a popularização da

internet comercial. A conclusão mais importante desta fase não é a de que as

publicações impressas migraram para o meio eletrônico. O que aconteceu foi que o

fanzine impresso como único meio de divulgação de material musical cedeu lugar à

internet. Para saber, ler e ouvir música, a internet era o novo espaço. Isso provocou

nos fanzines impressos, além de uma diminuição drástica na quantidade, uma

mudança de foco: fanzines musicais impressos testaram novas mídias (CD-rom,

alguns poucos sites), ou voltaram ao nicho, como por exemplos “fan-zines”

dedicados ao culto de determinadas bandas e artistas, ou especializados em cenas

locais (como o [MAIS] que falava sobre a cena musical independente curitibana). O

que aconteceu foi uma espécie de “volta ao ninho”, para repensar as funções.

A quinta fase (2000 a 2004) se diferencia da anterior pelo aprofundamento

das experimentações gráficas, quando fanzines musicais eram impressos não

apenas por causa do seu conteúdo (que certamente estaria “defasado” em relação à

internet) mas por causa parte gráfica em si. Acabamentos sofisticados, parcerias

com designers, objetos de culto e colecionismo, tudo isso trouxe aos fanzines desta

quinta fase a importância perdida na quarta fase. Além disso, alguns editores de

fanzines e produtores de festival perceberam na versão impressa uma maneira de

financiar suas publicações, fossem elas originariamente eletrônicas ou impressas (o

impresso captava anúncios quando publicidade na internet ainda era vista com

reservas), e também de disseminar uma informação em eventos segmentados de

música, como os festivais.

Fechando esta proposta de “linha do tempo” na produção de fanzines

musicais impressos no Brasil, a sexta fase tem início em 2004 e se prolonga até

2009, tendo como característica principal o fluxo contrário: editores que começaram

expondo suas idéias em meios eletrônicos (blogs, e-zines) se aventuram em

fanzines impressos. É a internet produzindo fanzines musicais impressos. Ao

contrário do que se imagina, a publicação eletrônica não matou o fanzine impresso

sobre música no Brasil, nem no Mundo. É curioso analisar que pessoas que

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nasceram e foram educadas com a internet como principal veículo de expressão,

que se acostumaram a ouvir música a partir de arquivos de computador, estejam

comprando vinis e se voltando para a publicação de fanzines “de papel”. Isso

comprova que existe no fanzine um valor, uma importância tal que atravessa

décadas e mudanças tecnológicas sem eliminá-lo. Percebe-se portanto, de 1989 a

2009, um movimento de ascensão, queda e ressurgimento do fanzine musical

impresso no Brasil.

Com este mapeamento, pretende-se trazer à mesa um novo e rico campo de

pesquisa musical, de pesquisa de publicações, de mídia e história da mídia recente

no Brasil. Um tipo de publicação, o fanzine, que sobrevive a tal “concorrência” (da

internet) e sobrevive, merece atenção. Depois de passar por tantas mudanças

tecnológicas e ainda manter-se valioso e cultuado, o fanzine musical impresso como

mídia alternativa também deve ser levado em conta como fonte de pesquisa sobre a

música recente produzida no Brasil. E também, porque não dizer, como fonte de

pesquisa sobre a produção de imprensa cultural recente no país.

Um encaminhamento possível que foi imaginado por este mapeamento é o

uso desta pesquisa, e de pesquisas com fanzines, como fonte de informação

genuína sobre a recente produção musical brasileira. Os fanzines musicais contém

registros únicos de artistas “desconhecidos” que merecem ser preservados. Ou, pelo

menos, possuem um outro ponto de vista acerca de uma produção já conhecida,

como entrevistas e matérias com bandas antes independentes, antes anônimas,

mas que viraram sucesso de público e da crítica dita “especializada” que escreve na

grande imprensa.

Espera-se que mapeamentos como este sirvam para mostrar que existe um

universo gigantesco, rico e pouco analisado de produção musical, de jornalismo

musical, capaz de escrever uma outra história da música recente do Brasil, e não

apenas aquela que consta de alguns poucos jornais e revistas, e ainda mais raros,

livros sobre o assunto. Espera-se que fique claro que, daqui a 20 anos, quando se

olhar para o passado novamente, que a música e a imprensa musical brasileira não

se limitem aos artistas do “top 10” ou aos jornalistas das grandes redações.

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FRENTE (Revista) Entrevista com Ricardo Alexandre sobre o fim da Frente http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos/iq010720034.htm - acesso em 12 set. 2010 INTERNET (Linha do tempo ) – http://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_da_Internet_no_Brasil - acesso 22 agosto 2010 INTERNET (Linha do tempo ) – http://www.internetnobrasil.net/ - acesso em 22/ agosto 2010 UGRA (Blog do ex-fanzineiro Douglas Utescher sobre fanzine) http://ugrapress.wordpress.com/2010/09/14/e-por-falar-em-fanzines/ - entrevista de com três fanzineiros sobre a parte gráfica dos fanzines. ______ - http://ugrapress.wordpress.com/2010/10/28/e-por-falar-em-fanzines-parte-2-xerox/ - acesso em 25 set. 2010 ______ - http://www.flickr.com/photos/ugrapress - fotos de fanzines recebidos pelo grupo UGRA em 2010 - acesso em 25 set. 2010. WAYBACK MACHINE ou WEB ARCHIVE – http://webarchive.org – acesso em 30 out. 2010

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GLOSSÁRIO DE FANZINES USADOS NO MAPEAMENTO Em ordem alfabética, estão listadas todas as publicações-chave que serviram

de referência para as análises desenvolvidas neste mapeamento. Algumas

informações como data, editores responsáveis ou periodicidade não estão

disponíveis nos fanzines, por isso foram deixadas em branco. A última linha de

informação denominada “Fase” serve para enquadrar o fanzine dentro de uma das

fases propostas neste mapeamento. Nem todos os fanzines aqui listados foram

citados no texto deste mapeamento.

Nome: 7” nº 0 Data: Periodicidade: Editor: Carlos Farinha, Ronaldo Evangelista, Guilherme Barrella e Edson

Valente. Formato: Revista, 21x21 cm, capa 2 cores, miolo offset preto e branco com

algumas páginas coloridas, diagramação eletrônica, grampeamento interno.

Principais assuntos:

Música, bandas nacionais e internacionais.

Distribuição: Venda pelo correio e em lojas especializadas (R$3) Fase: 5ª fase Nome: ALTERNATIVE VOICES – nº 10, ano 3 Data: Periodicidade: “Quase” bimestral Editor: Guilherme Rivera Formato: Revista, formato 21x 28cm, papel offset, capa 3 cores, miolo offset

preto e branco, diagramação eletrônica. Tiragem anunciada de 3000 exemplares.

Principais assuntos:

Música, bandas nacionais principalmente da região do Vale do Paraíba como Vermelho 40, Elegia, Blemish, College, Revide e Paúra.

Distribuição: Gratuito em lojas de discos e shows. Fase: 5ª fase Nome: B*SCENE Data: Dez. 2003 Periodicidade: Edição única Editor: Kátia Abreu e Bárbara Lopes Formato: Formato revista 21X28cm, papel jornal, preto e branco,

diagramação eletrônica, grampeamento interno Principais assuntos:

Música, literatura, cinema.

Distribuição: Venda pelo correios e em pontos direcionados. (R$2) Fase: 5ª fase

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Nome: BACKSTAGE nºs 4, 5, 8 e 9 Data: Jan. 1992, maio 1992, fevereiro 1993, agosto 1993 Periodicidade: Editor: Márcia Gonçalves Formato: Nº 4 – tablóide, papel jornal, preto e branco, diagramação mixta; nº

5 – revista 21X28cm, capa colorida papel couché, miolo papel jornal preto e branco, diagramação mixta; nº 8 – formato revista 21x28 cm impresso em papel jornal (capa e miolo) preto e branco, sem grampeamento, diagramação mixta; nº 9 – tablóide capa colorida papel jornal, miolo papel jornal preto e branco, diagramação eletrônica, sem grampeamento

Principais assuntos:

Música, bandas nacionais e internacionais de heavy metal.

Distribuição: Gratuito em lojas de discos do RJ, nº 9 em bancas. Fase: 2ª fase Nome: BOLETIM CENAPI – nº 4 Data: 1989 Periodicidade: Quadrimestral Editor: José Fernando Simoni Formato: A4, xerox, preto e branco. Edição de textos em máquina elétrica e

editor de textos, paginação manual. Grampeamento externo. Principais assuntos:

Fanzines, publicações independentes.

Distribuição: Venda por correios, assinatura. Fase: 1ª fase Nome: BROKEN STRINGS nº 1 Data: Periodicidade: Editor: Sérgio Vanalli e Thiago Mello Formato: Ofício horizontal, xerox, preto e branco, textos impressos em

computador e paginados a mão. Grampeamento externo. Principais assuntos:

Músicas, bandas internacionais em artigos opinativos. Cinema. Matérias sobre bandas independentes nacionais como Heaven in Hell, Pin Ups, Killing Chainsaw

Distribuição: Correios Fase: 1ª fase Nome: CABRUNCO ano 2, nº 8 Data: Out. / dez 1996 Periodicidade: Editor: Adolfo Sá, Rafael Jr. Formato: A4, xerox, preto e branco. Diagramação eletrônica. Grampeamento

interno. Principais assuntos:

Música, cinema, quadrinhos. Matéria de capa: “Underground vale a pena?”. Dezenas de resenhas de fitas demos, cds e vinis. Críticas de shows (incluindo Penélope Charmosa, Planet Hemp, Maria Scombona, Living in the Shit), cobertura do festival 5º Garage Rock Festival em Salvador, Expo Alternative 1996. Várias resenhas de fanzines.

Distribuição: Venda por correios e em lojas especializadas (R$1).

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Fase: 1ª fase Nome: CAPITÃO CRI-CRI nº 1 Data: Fev. 1994 Periodicidade: Editor: Sineval Santos, Márcio Destito Formato: A3 dobrado, offset, preto e branco, grampeamento interno.

Diagramado à mão e eletrônicamente. Principais assuntos:

Quadrinhos, música. Matéria com a banda Motorcycle Mama

Distribuição: Correios Fase: 2ª fase Nome: CARCAÇA nº 0 Data: Março 1995 Periodicidade: Editor: Formato: Ofício, xerox, preto e branco. Textos escritos à mão e batidos à

máquina, paginação manual. Grampeamento externo. Principais assuntos:

Somente bandas nacionais: Concreteness, The Cigarettes, Daizy Down, Resist Control, Party Up, Drivellers, Graforréia Xilarmônica, Motorcycle Mama, Lucrezia Borgia, Brincando de Deus, Planet Hemp e Chico Science e Nação Zumbi.

Distribuição: Correios Fase: 2ª fase Nome: CONTRAVENÇÃO nº 1 Data: Jan. 2002 Periodicidade: Editor: Angelo Bruno e Georges Komikiaris Formato: revista 21X28cm, papel jornal preto e branco, diagramação

eletrônica, grampeamento interno. Principais assuntos:

Música, bandas nacionais: Mukeka Di Rato e dezenas de resenhas de discos de hardcore

Distribuição: Venda pelo correio e em shows e lojas especializadas Fase: 5ª fase Nome: COQUETEL MOLOTOV nº 1 a 6, 12 e revista nº 1 Data: Agosto 2004 a janeiro 2005, ??, dezembro 2005 Periodicidade: Fanzine mensal, revista semestral Editor: Ana Garcia, Jarmeson de Lima e Tathianna Nunes Formato: Fanzines nº 1 a 12 – A4, xerox preto e branco, capa em papel

colorido, diagramação mixta, sem grampeamento. Revista nº1 – capa papel cartão 150g com verniz, colorida, miolo couché 90g, colorida, diagramação eletrônica, borda quadrada

Principais assuntos:

Música, bandas nacionais e internacionais

Distribuição: Fanzine vendido por R$1 e revista gratuita, com 3000 exemplares. Fase: 6ª fase Nome: DECIBÉLICA nº 3 e 4 Data: Ago. 2006 e out. 2006 Periodicidade: Bimestral

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Editor: Beto Wilson, Leo Rockefeller e Victor Paulista Formato: Nº 3 formato revista 21x28 cm, capa couché 150g, colorida, miolo

couché colorido 75g, diagramação eletrônica, grampeamento interno. Nº 4 formato revista 21X30,5 cm, capa couché 150g, borda quadrada, miolo couché 75g colorido, diagramação eletrônica.

Principais assuntos:

Música, bandas nacionais, preferencialmente do Centro Oeste, cobertura de festivais independentes.

Distribuição: Gratuito em pontos estratégicos. Fase: 6ª fase Nome: DROWNED’Z – ano 1, nº 1 Data: Periodicidade: Editor: Bruno Furnari Formato: A4, offset, capa duas cores, miolo preto e branco. Diagramação

eletrônica. Grampeamento externo. Principais assuntos:

Música, bandas independentes, dezenas de resenhas sobre demos, discos e fanzines.

Distribuição: Venda por correios. Fase: 2ª fase Nome: EUTHANASIA Data: Início dos anos 90 – 3ª edição Periodicidade: Editor: Iesus Silveira, Roberto Coelho e J.M. Simões Formato: Papel carta dobrado, capa em couché 2 cores, miolo PB offset, 12

páginas. Principais assuntos:

Música, poesia. Matéria sobre as bandas inglesas e norte-americanas de rock alternativo que iriam estourar nos anos 1990, artigos, quadrinhos. Pequenos anúncios de lojas de roupa e bares.

Distribuição Gratuita. Tiragem não informada. Fase 1ª fase Nome: FANCLIP Data: Julho de 2009 – nº 1 Periodicidade: Editor: J-Pika e Samamb-T Formato: A4 dobrado, xerox, 8 páginas Principais assuntos:

Matérias sobre videoclipes de bandas (Gnarl’s Barkley, Paramore, Pussycat Dolls)

Distribuição Gratuita, na FNAC de um shopping de Curitiba Fase 6ª fase Nome: FANZ nº 6 e 8 Data: Abril 1995, junho 1997 Periodicidade: Editor: Marcos Araújo Formato: Nº6 - ofício, xerox, preto e branco. Textos escritos à mão, em

máquina elétrica e editor de textos, paginação manual. Grampeamento externo. Nº8 – ¼ tablóide, papel jornal, preto e branco, diagramação eletrônica, sem grampeamento.

Principais assuntos:

Bandas independentes brasileiras.

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Distribuição: Correios Fase: 2ª e 3ª fase Nome: FREE JAZZ PROJECT ZINE – ano 1, nº 1 Data: Ago. e set. 2001 Periodicidade: Editor: Leonardo Feijó Formato: ¼ de tablóide, papel jornal, azul e branco, diagramação eletrônica,

grampeamento interno. Principais assuntos:

Matérias sobre as bandas que se apresentaram no projeto Free Jazz Project em 2001.

Distribuição: Gratuito para o público do festival. Fase: 5ª fase Nome: FÚTIO INDISPENSÁVEL nº 5 e 6 Data: Set. e out. 1994 e março 1995 Periodicidade: Editor: Emerson Gasperin e Frank Maia Formato: ¼ tablóide, offset, papel offset 75g, preto e branco, diagramação

eletrônica, sem grampeamento Principais assuntos:

Música, cinema, literatura e quadrinhos. Nº 5 traz matéria grande com Little Quail & the Mad Birds e cobertura do Festival Juntatribo. Nº 6 traz várias matérias com a banda catarinense Dazaranha.

Distribuição: Vendas em pontos especializados e pelo correio (R$0,50) Fase: 3ª fase Nome: GOTAS Data: Julho-agosto 1993 Periodicidade: Bimestral Editor: Roberto Maia (jornalista responsável) Formato: A3 dobrado, offset, preto e branco. Diagramação eletrônica.

Grampeamento interno. Principais assuntos:

Música, pequenas notas sobre novidades do rock internacional.

Distribuição: Fase: 2ª fase Nome: GRITO – revista de arte e cultura pop Data: Periodicidade: Edição única Editor: Marcelo Damaso Formato: CD-rom Principais assuntos:

Música. Matérias e entrevistas com músicos paraenses como Euterpia, Edyr, Jorge Eiro. O CD ainda traz 10 músicas de bandas locais. Patrocínio da Oi, Big Music e Roxy.

Distribuição: Locais especializados Fase 4ª fase Nome: HANG THE DJ nº 4 e 5 Data: Periodicidade: Editor: Giulliano Fernandez, guitarrista e vocalista da banda Low Dream Formato: Ofício, xerox, 10 a 12 pá

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Principais assuntos:

Música, matérias xerocadas de semanários ingleses, algumas matérias próprias.

Distribuição: Correios. Fase: 1ª fase Nome: HAUUZC Data: Novembro de 1993 Periodicidade: Editor: Alberto Monteiro Formato: ¼ tablóide, papel jornal, preto e branco, diagramação mixta,

grampeamento interno. Principais assuntos:

Quadrinhos e música

Distribuição: Correios Fase: 3ª fase Nome: HUMAITÁ PRA PEIXE Data: Fanzine publicado durante as edições do festival de música

Humaitá pra Peixe. Periodicidade: Anual Editor: Vários editores, responsável pelo festival: Bruno Levinson Formato: Formatos diversos: revista de bolso colorida; ¼ tablóide em papel

jornal. Principais assuntos:

Pequenas matérias sobre cada uma das bandas que se apresentaram na edição daquele ano.

Distribuição Gratuita a todos presentes ao show. Fase 5ª fase Nome: ÍTEM nº 3 Data: Abril 2004 Periodicidade: Editor: Tiago Velasco e Igor Olszowski Formato: A5, xerox, preto e branco, diagramação eletrônica, grampeamento

interno, capa 2 cores em silk screen Principais assuntos:

Música, cinema, games e TV

Distribuição: Gratuito, possui versão eletrônica www.item.tk Fase: 5ª fase Nome: KASKATA nº 1/2 Data: Periodicidade: Editor: Bruno Lancellotti Formato: Revista, 21X28 cm, capa couché preto e branco, miolo papel offset

preto e branco, diagramação eletrônica, grampeamento interno. Principais assuntos:

Música, bandas brasileiras e internacionais de ska. Matérias com Skamoondongos, Desorden Público e ACS. Várias resenhas de demos e CDs, além de zines.

Distribuição: Venda pelo correio, R$3 Fase: 3ª fase Nome: KASPAR nº 1, 2 e 3 Data: Fevereiro de 1991 – encartado na ANIMAL 15

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Periodicidade: trimestral Editor: Jefferson Santos Formato: A5, xerox. Diagramação mixta, com composição de textos em

tripas e paginação manual. Grampeamento interno nas 3 edições. Principais assuntos:

Música, cinema, bandas independentes brasileiras: The Jynx, Virna Lisi, Adventure

Distribuição: Correios Fase: 1ª fase Nome: LADO R – nºs 7 e 8 Data: Out. 2007 e ?? Periodicidade: Editor: Leandro Menezes, Dimetrius Ferreira e Rafael F. Formato: Offset, 32X10,5 cm, nº 7 em papel cartão pardo, offset, preto e

branco, diagramação eletrônica, grampeamento interno, tiragem de 2000 exemplares. Nº8 com capa em papel cartão pardo, preto e branco, miolo offset papel branco, preto e branco, diagramação eletrônica, tiragem de 2000 exemplares.

Principais assuntos:

Música, política, literatura

Distribuição: Gratuito Fase: 6ª fase Nome: LEGIÃO URBANA UNDERGRAFF Data: Junho 1996 Periodicidade: Editor: Seres Urbanos Formato: Ofício, xerox, preto e branco, diagramação eletrônica, paginado à

mão e eletronicamente, grampeamento externo Principais assuntos:

Fanzine dedicado a banda Legião Urbana, editado pelos mesmos editores de Masturbação Iogurte e Rock’n’Roll

Distribuição: Correios Fase: 3º fase Nome: LO-FI nº 4 Data: Ago. / set. 2001 Periodicidade: Editor: Augusto Olivani Formato: Revista, 21X28 cm, papel offset, capa 2 cores, miolo preto e

branco, diagramação eletrônica, grampeamento interno. Principais assuntos:

Música, bandas nacionais e internacionais. Esta edição acompanhava uma coletânea em CD.

Distribuição: Gratuito em lojas de discos do RJ, nº 9 em bancas. Fase: 2ª fase Nome: MAISEMETEVÊ – 5, 6, 7, 8 e 9 Data: Out. 1994 a janeiro 1995 Periodicidade: mensal Editor: Formato: Poster A3, papel offset, 2 cores, diagramado eletronicamente.

Espécie de zine/ house-organ da MTV Brasil. Principais assuntos:

Programação do canal, música.

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Distribuição: Distribuição via correios para mailing fechado Fase: 3ª fase Nome: [MAIS] Data: Novembro de 1997 – nº 1 Periodicidade: Mensal. Editor: Manoel Neto Formato: A4 dobrado, capa em papel couché, inclui um caderno de 4

páginas em offset laranja que é um suplmento de uma loja de CDs de Curitiba que patrocinou a edição do zine.

Principais assuntos:

Música – pequenas notas sobre lançamentos de discos, demos. Entrevistas e pequenas matérias sobre bandas brasileiras, principalmente de Curitiba e da região Sul. Traz anúncios de bares, agência de viagens, estúdio de design e gráfica. Tiragem: 3000 exemplares

Distribuição: Circulação dirigida, distribuição em pontos estratégicos de Curitiba. Fase: 4ª fase Nome: MASHING INFORMANT ano 2, nº 1 Data: 1994 Periodicidade: Editor: Haydinei S. de Oliveira Formato: Revista, 21x 28cm, capa 2 cores, miolo preto e branco, papel

couché, diagramado eletrônicamente. Principais assuntos:

Skate e música

Distribuição: Correios, lojas de skate Fase: 2ª fase

Nome: MAU Data: Fevereiro de 1991 – encartado na ANIMAL 15 Periodicidade: Bimestral Editor: Priscila Farias, Fabio Zimbres Formato: Encartado na revista animal, 12 a 16 páginas, papel jornal, duas

cores. Principais assuntos:

Música, fanzines, quadrinhos.

Distribuição: Em bancas. Fase: 1ª fase Nome: MASTURBAÇÃO IOGURTE E ROCK’N’ROLL Data: Periodicidade: Editor: Seres Urbanos, Weaver Lima. Formato: A4, preto e branco, xerox, grampeamento externo. Totalmente

diagramado a mão Principais assuntos:

Música, quadrinhos e sexo.

Distribuição: Correios Fase: 2ª fase Nome: MAYONESE nº 1 Data:

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Periodicidade: Editor: Ivã S. Formato: A4, xerox, capa papel azul, xerox preto e branco, miolo papel

branco e xerox preto e branco. Diagramação eletrônica. Grampeamento interno.

Principais assuntos:

Fanzines, publicações independentes.

Distribuição: Venda por correios, assinatura. Fase: 3ª fase Nome: MIXER nº 1 Data: 1993 Periodicidade: mensal Editor: Archimedes Monea, Fernando Mesquita, Ivan Rotundo e Roberto

Maia Formato: Tablóide, capa colorida, miolo preto e branco, papel jornal,

diagramação eletrônica Principais assuntos:

Música: grunge, selos independentes, nova cena de Recife, Ultraje a Rigor em estúdio, Morrissey, David Bowie

Distribuição: Fase: 2º fase Nome: MOSH Data: Periodicidade: Editor: Renato Lima e Lobo Formato: Revista de bolso, capa couché colorida, miolo PB offset, 64 págs,

preço de capa R$3 Principais assuntos:

Quadrinhos e música. Publica quadrinhos de autores independentes, pequenas notas musicais e uma entrevista com a banda The Feitos.

Distribuição: Venda em pontos estratégicos. Fase: 5ª fase Nome: MUSIK-A nº 1 Data: Periodicidade: Editor: Daniel Albinati, Gustavo Santos e Denise Niz Formato: ½ tablóide, papel jornal, capa 2 cores, miolo preto e branco,

diagramação eletrônica, grampeamento interno. Principais assuntos:

Música, literatura e tecnologia. Matérias sobre a música eletrônica de BH, matéria com Multisofá.

Distribuição: Gratuito em lojas de discos do RJ, nº 9 em bancas. Fase: 5ª fase Nome: NOISE nº 3 e 4 Data: Abril/maio 1993 e julho/agosto 1993 Periodicidade: Trimestral Editor: Ivo Augusto Formato: A5, xerox, preto e branco, texto batido à máquina, paginação

manual, criação de tipologias à mão, nº3 sem grampeamento, nº 4 com grampeamento interno.

Principais Bandas internacionais e cena independente nacional. Matérias com

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assuntos: Make Believe, Adventure, Pelvs, Lupe, Beach Lizards, Velouria, Stoned, Deep Noise, Père Lachaise, Low Dream e Primitive Painters.

Distribuição: Correios Fase: 2ª fase Nome: Ó nº 11 e 13 Data: Agosto e outubro de 1994 Periodicidade: mensal Editor: Marcelo Pinto e Ronaldo Soares Formato: Mini tablóide, papel jornal, preto e branco. Diagramação eletrônica. Principais assuntos:

Música, cinema, literatura e assuntos gerais

Distribuição: Distribuição segmentada em faculdades de comunicação e lojas especializadas

Fase: 3ª fase Nome: O DILÚVIO nº 9 Data: Maio 2006 Periodicidade: Editor: Tiago Jucá Oliveira, Marcelo Franco, Fernando Gomes, Mateus

Zimmermann e Pedro Jatobá Formato: Revista formato 21x23 cm, papel offset, capa colorida, miolo preto

e branco, diagramação eletrônica, grampeamento interno. Principais assuntos:

Música, cinema, literatura, política. Podia ser vendida com um CD da banda Seres.

Distribuição: Distribuição dirigida, revista gratuita, revista + CD R$10 Fase: 6ª fase Nome: PANACEA nºs 22, 31, 37 e 40 Data: Fevereiro de 1991 – encartado na ANIMAL 15 Periodicidade: Mensal, de set. 1993 a janeiro de 1996 Editor: José Mauro Kazi Formato: Nº 22 - A4 dobrado, xerox, preto e branco, grampeamento interno,

diagramação mixta; Nº 31 – A4 dobrado, offset, preto e branco, grampeamento interno, diagramação mixta; nº 37 – revista 21x27cm, capa colorida, miolo offset preto e branco, grampeamento interno, diagramação eletrônica; nº 40 – revista 21x27cm, capa colorida, miolo offset preto e branco, grampeamento interno, diagramação eletrônica.

Principais assuntos:

Música, fanzines, quadrinhos.

Distribuição: Em bancas, correios, pontos de venda especializados. Criaram a FRI – Frente das Revistas Independentes que possuia pontos de distribuição em todo país, principalmente em SP

Fase: 2ª fase Nome: PARENTAL ADVISORY: ALTERNATIVE MUSIC Data: Periodicidade: Edição única Editor: Rodrigo Lariú Formato: A3, xerox, preto e branco em papel cartão rosa. Diagramação

eletrônica.

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  113 

Principais assuntos:

Parte integrante da AIA para a gravadora Warner / Continental. Matérias sobre as bandas CIV, Melvins, Sugar Ray, 7 Year Bitch, Extra Fancy e The Gufs.

Distribuição: Distribuição gratuita dirigida Fase: 3ª fase Nome: PINEAPPLE POPSICLE nº 9 Data: Fev. 1998 Periodicidade: mensal Editor: Ary Monteiro Jr. e Fernando Miranda Formato: A4 dobrado, xerox, preto e branco. Diagramação eletrônica. Principais assuntos:

Bandas independentes: matérias com Manifesto 021, críticas de shows, demos e zines, eleição dos melhores de 1997

Distribuição: Distribuição gratuita dirigida Fase: 4ª fase Nome: POR QUE AS VACAS ESTÃO LOUCAS? Data: Periodicidade: Edição única Editor: Rodrigo Lariú Formato: A3, xerox, preto e branco. Diagramação eletrônica. Principais assuntos:

Parte integrante da AIA para a gravadora EMI Brasil. Matérias sobre as bandas Butthole Surfers, Terrorvision e Skin

Distribuição: Distribuição gratuita dirigida Fase: 3ª fase Nome: PLUG Data: Dez. 1996 Periodicidade: Edição única. Editor: Rodrigo Lariú Formato: ¼ tablóide, papel offset branco, preto e branco, diagramação

eletrônica. Principais assuntos:

Parte integrante da AIA para o selo Plug, da BMG Ariola. Matéria com as bandas do selo: Teahouse Band, Omeriah, Athalyba e a Firma, Suinos Tesudos, Pato Fu, Picassos Falsos, Hojerizah, Violeta de Outono e DeFalla.

Distribuição: Distribuição gratuita e dirigida. Fase: 3ª fase Nome: REVISTA PORÃO DO ROCK Data: Julho de 2001 – nº 8 Periodicidade: Mensal Editor: Marcos Pinheiro Formato: Revista de Bolso, papel couché, colorido, 104 págs. Principais assuntos:

Guia da programação do festival Porão do Rock de 2001 com matérias de todas as bandas que se apresentaram no festival naquele ano, seção de cartas, vários anúncios, quadrinhos. Tiragem anunciada: 50 mil exemplars

Distribuição: Gratuita para o público do festival. Fase: 5ª fase Nome: RECIFE ROCK – a revista rock! do Recife Data: 2005 – nº 5

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  114 

Periodicidade: Editor: Juliana Holanda (jornalista responsável) e Guilherme Moura Formato: Revista de bolso, capa colorida couché, miolo PB offset, 32 págs.

Tiragem: 2000 cópias Principais Assuntos:

Música, cena alternativa pernambucana e nordestina. Matéria de capa com Nação Zumbi. Entrevistas com The Playboys, Retrovisores, Eta Carinae. Traz a programação completa dos shows de rock no Carnaval 2005 de Recife. Anúncio de contra-capa da CHESF – Cia. de Energia Elétrica do Estado de Pernambuco.

Distribuição: Gratuita, de mão em mão e em locais estratégicos em Recife. Fase: 5ª fase Nome: RR nº 0 Data: Abril / 1990 Periodicidade: Editor: Roberto Cotrim e Neide Costa Formato: A5, preto e branco, papel cartão branco, offset, diagramado

manualmente, texto batido à máquina. Principais assuntos:

Fanzine produzido pela casa noturna paulista Espaço Retrô, divulgava sua programação e incluia matérias sobre música.

Distribuição: Público da casa Fase: 1ª fase Nome: SHAPE A nº 08 ano II Data: Mar/abril 1997 Periodicidade: bimestral Editor: Pedro de Luna Formato: Revista 19x25 cm, offset, papel offset, preto e branco, diagramação

eletrônica, grampeamento interno. Principais assuntos:

Música, skate. Matérias com as bandas Beach Lizards, Sex Noise e Matanza, Bendis, Suzy’s Down, entre outras

Distribuição: Distribuição gratuita dirigida Fase: 4ª fase Nome: SIR ROCKABY nº 3 Data: Periodicidade: Editor: Jussara Neves, Eline Garcia e Leonardo Pinheiro Formato: Revista, 21x28 cm, papel couché preto e branco, diagramação

eletrônica, grampeamento interno. Principais assuntos:

Fanzine dedicado à música das bandas Pixies e da carreira solo do seu ex-vocalista, Black Francis.

Distribuição: Distribuição gratuita dirigida Fase: 4ª fase Nome: THE CURE A FANZINE nº 3 Data: Julho 1996 Periodicidade: Editor: Viviane Scwager, Juliana Bernardon, Gabriela Verenhitach, Beatriz

Verenhitach e Fet. Formato: Revista 21x28 cm, capa couché preto e branco, miolo em papel

offset preto e branco, diagramação eletrônica, grampeamento

Page 115: Um Mapeamento dos Fanzines Impressos Sobre Música no Brasil de 1989 a 2009

 

  115 

interno. Principais assuntos:

Fanzine dedicado a banda The Cure

Distribuição: Venda pelo correio (R$11) Fase: 4ª fase Nome: TOTAL FUNZINE – ano 2 – nº 7 Data: Out. e novembro 1998 Periodicidade: Editor: Rafael Zochetti Formato: Formato revista 21X28 cm, papel offset, capa 2 cores, miolo offset

preto e branco, diagramação eletrônica, grampeamento interno. Principais assuntos:

Música: entrevistas exclusivas com as bandas Charlie Brown Jr. e Ratos de Porão.

Distribuição: Fase: 4ª fase Nome: TRAMA – Aqui tem Tama Data: Setembro 2005 Periodicidade: Editor: Equipe Trama, editorial por Carlos Eduardo Miranda Formato: Papel carta dobrado, couché colorido, 20 páginas. Principais assuntos:

Catálogo com pequenos textos sobre os artistas da gravadora Trama. Mas com editorial e expediente. Traz matérias sobre Max de Castro, música black brasileira, assinatura de contrato do CSS.

Distribuição Gratuita, direcionada. Fase: 5ª fase Nome: TUPANZINE nº 52 e especial Porão do Rock Data: Setembro 2007 (especial 14 anos) e especial Porão do Rock 2008 Periodicidade: Aperiódico (fanzine publicado desde 1993) Editor: Francisco Ricardo da Silva Formato: Formato tradicional do zine é A4 dobrado, Xerox. Edição especial

do Porão do Rock é A3 poster dobrado, 2 cores, offset. Principais assuntos:

Edição especial fala (à maneira do Tupanzine) sobre as bandas que se apresentaram na edição 2008 do festival.

Distribuição: Público desta edição do festival. Fase: 6ª fase Nome: UNDERGUIDE - ano 2 - nº5 e nº 8 Data: Fevereiro 1997 e novembro 1997 Periodicidade: Bimestral Editor: Daniel Eduardo Gomes Formato: Nº 5 – formato revista 15,5 x 21,5 cm, capa couché colorida, miolo

offset preto e branco, diagramação eletrônica. Nº 8 – formato revista 21x28 cm, capa colorida couché, miolo preto e branco, diagramação eletrônica.

Principais assuntos:

Guia de contatos para bandas independentes.

Distribuição: Distribuição gratuita dirigida Fase: 3ª fase Nome: UNLOVEABLE nº 0

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  116 

Data: Janeiro de 1991 Periodicidade: Editor: Marcelo Colares Formato: Ofício, xerox, preto e branco, escrito à mão e máquina da escrever,

impresso apenas de um lado da folha, grampeamento externo. Principais assuntos:

Zine dedicado à banda The Smiths e seu ex-vocalista, Morrissey.

Distribuição: Correios Fase: 1ª fase Nome: UP DATE! nº 1 Data: Maio de 1992 Periodicidade: Editor: Rogério Cezar Formato: A5, xerox, escrito e diagramado à mão, sem grampeamento Principais assuntos:

Bandas internacionais, matérias traduzidas de revistas estrangeiras.

Distribuição: Correios Fase: 1ª fase Nome: ZINE nº 9 Data: Novembro 1996 Periodicidade: Editor: Agenor Bottene Neto Formato: A4, xerox, preto e branco. Diagramação eletrônica. Grampeamento

interno. Principais assuntos:

Música e quadrinhos.

Distribuição: Correios Fase: 3ª fase

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ANEXO 1 ENTREVISTAS

Priscila Farias (colaboradora da revista Animal)

entrevista feita por email entre 28 e 30 de julho de 2010.

1) O nome correto do fanzine é Maudito Fanzine ou Mau Fanzine? O nome correto é "MAU", e era um encarte, não um fanzine. "Maudito fanzine" era o

nome de uma seção deste encarte. O Mau tinha o subtítulo "feio, sujo e malvado".

2) O Mau existia desde o começo da Animal? De quem foi a idéia? Quem eram os editores?

Sim. Foi idéia dos primeiros editores da Animal: Fábio Zimbres, Newton Foot,

Rogério de Campos e Celso Singo.

3) Qual era a pauta do Mau? Como vocês decidiam o que entrava ?

Havia algumas seções fixas e outras coisas que mudavam a cada número.

Decidíamos a cada número. Publicávamos no MAU histórias e textos em preto e

banco, com conteúdo mais agressivo, coisas mais alternativas.

4) As 2 páginas de resenhas de fanzines eram editadas por quem? Quem

recebia e analisava os fanzines?

O Fabio Zimbres.

5) Você lembra aproximadamente a quantidade de fanzines que recebia para

cada edição?

Não.

6) Você percebeu um aumento na quantidade de fanzines na virada da década,

de 1988, 89 para 91, 92? Se sim ou se não, consegue identificar as causas do aumento / diminuição?

Acho que o número aumentou durante o período que editamos a revista, e acredito

que algumas das causas podem ter sido: maior facilidade de acesso a impressoras

Page 118: Um Mapeamento dos Fanzines Impressos Sobre Música no Brasil de 1989 a 2009

 

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xerox, menor preço das impressões, maior interesse pela edição de fanzines,

estimulado pelo mercado editorial e musical.

7) Por que a necessidade de descrever o formato dos zines (i.e. A4 ou ofício, xerox ou offset, nº de páginas etc) ? Qual era a intenção com esta descrição?

Não sei exatamente o que o Fábio pensou, mas acho que, do ponto de vista do

design gráfico, faz sentido descrever as dimensões e a técnica de impressão de

qualquer impresso.

8) Por que a Animal deixou de ser editada?

Por que o dono da editora cansou de investir na revista, que não dava prejuízo, mas

também não dava lucro.

Leonardo Cardoso (Leonardo “Panço”) (editor do Gnomo da Tasmânia, produtor musical, gerente do selo Tamborete Discos, escritor)

entrevista feita por email entre 22 de setembro e 04 de outubro de 2010.

1) Quais zines você editava? Qual foi o primeiro? Quanto tempo / quantos números durou cada um?

Fiz o Gnomo da Tasmânia (que foi o primeiro), depois Disbablios Biblios e depois o

Bodega, que era na real uma experiência coletiva. Gnomo durou 5 números,

Disbablios uns 3 e o Bodega 8.

2) Em que ano você começou a editar um fanzine? Quantos anos você tinha?

Em 91, tinha 18 anos.

3) Por que você começou a editar zine? Qual era a principal motivação?

Eu queria falar das minhas coisas, das bandas que eu gostava e não via em nenhum

lugar. Ainda estava no segundo grau e minha escola - que era federal - ficou em

greve por uns 3 meses e me vi sem muita coisa pra fazer, daí passei a pensar em

coisas legais pra fazer e um zine foi uma das coisas que eu comecei. Também

colaborava com o Cinema Mundi, que era de um amigo de infância, o Renato

Portugal.

Page 119: Um Mapeamento dos Fanzines Impressos Sobre Música no Brasil de 1989 a 2009

 

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4) Algum fanzine o motivou? Como ficou sabendo da existência de fanzines? Começou a fazer seu 1º fanzine sozinho? Ou era um grupo?

Não lembro mais como fiquei sabendo de zines. Alguns fanzines me motivaram, mas

creio que depois que eu já fazia o meu, como o AHHH!, do Márcio Sno, o Pineapple

Popsicle, o zine do Digão de Curitiba, o Papakapika, o Escarro Napalm do Adelvan,

de Aracaju. Começei sozinho mesmo.

5) Quais eram as suas fontes de endereços e contatos para intercâmbio? Você

comprava ou trocava?

Era tudo via cartas e flyers, nunca comprava. Ou ganhava ou trocava, que era o q

mais acontecia.

6) Qual era a pauta dos zines que você editava? Aonde buscava sua "matéria prima"?

Era só de bandas de rock no começo. Via shows e escrevia, falava sobre demos.

Depois no Bodega é q começamos a ampliar os horizontes e falar sobre outras

coisas, inclusive literatura.

7) Como vou focar em fanzines sobre música, queria saber se este era o assunto principal dos seus fanzines. Por que era? Havia uma carência de publicações sobre música nesta época?

Acho q tinha sim, principalmente fora do mainstream, né. Bandas underground, acho

que só tinha uma pequena sessão na [revista] Rock Brigade, muito pouco.

8) Que tipo de música / bandas seu fanzine focava? E porque?

As coisas que eu gostava mais, principalmente punk rock brasileiro.

9) As matérias que você escrevia era “originais” (no sentido de que você mesmo produzia)? Quem pautava / apurava / escrevia? Eram bandas que

normalmente não apareciam na grande imprensa?

Eu mesmo fazia tudo, acho que no primeiro número ou segundo, entrevistei o

Redson do Cólera lá no Garage, creio que em 91 mesmo.

Page 120: Um Mapeamento dos Fanzines Impressos Sobre Música no Brasil de 1989 a 2009

 

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10) Se eram bandas independentes, que não saiam na grande imprensa, aonde

você procurava / descobria / sabia da existência destas bandas?

No mesmo esquema q falei antes, nos shows, flyers, demos q via nos shows, que

chegavam pelo correio.

11) Pode listar algumas bandas que tiveram material publicado no seu fanzine? (desde as desconhecidas, que acabaram, até as que continuaram e até se tornaram conhecidas) Poindexter, Cólera, P.U.S., Perseguidor, Cuspe na Mente, Funk Fuckers...

12) Qual era o formato dos zines que vc editava? Xerox / grampeado / qtas páginas em média / distribuia gratuitamente ou trocava...?

Cheguei a trocar uma guitarra por cópias de xerox pra fazer um dos zines. Os dois

primeiros eram em xerox. Creio q os 3 primeiros Gnomos eram A4 normal, depois

passou pra A4 dobrado ao meio, q era mais bonitinho. O Disbablios era só uma folha

de A4 ao meio, o Gnomo creio q umas 12 páginas. O Bodega depois era maior,

acho q 24 páginas em jornal, 3 mil exemplares. no geral eu tentava sempre trocar,

mas dava pros amigos também.

13) Qual era a tiragem média das edições? 10, 50, 100 cópias? Mais?

O Bodega eram 3 mil, os outros acho que tipo de 100 a 200.

14) Como você descreveria a "evolução" gráfica (se houve) dos zines que você editava? Da xerox pensou em fazer em offset, chegou a fazer offset?

Foi bem grande. Depois tinha o Renato Portugal que ajudava no computador, depois

o Flock.

15) Como vc diagramava seus zines? Começou a mão, depois máquina ou foi direto para computador... Vc consegue relatar estas mudanças de forma cronológica?

Começou com colagem, papel, tesoura mesmo. depois pro computador. Não sei

quando na verdade.

Page 121: Um Mapeamento dos Fanzines Impressos Sobre Música no Brasil de 1989 a 2009

 

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16) Alguma razão não-artística para estas mudanças de formato? Financeiras?

Facilidade de distribuição, duplicação?

Eram razões estéticas, de ficar com cara de uma revista. Acho q eu queria ter uma

revista, que parecesse mais legível, mas bonitão mesmo.

17) Até quando vc publicou zines? Parou? Por que resolveu parar? Em que ano parou? E qual foi o principal motivo para parar de publicar fanzines impressos? Parei em 2001. Acho q foi quando fiquei com menos tempo mesmo, com emprego

normal, com a Tamborete pra cuidar, contas de adulto, etc.

18) Consegue identificar um aumento no nº de fanzines publicados na mesma época? E depois da internet, por volta de 1997, 1998, identifica uma

diminuição?

Total. A internet fez os zines de papel diminuírem sim. Não se gasta mais $$, fica lá

armazenado, não gasta com correio, etc.

19) Pensou em levar o seu zine para internet? Sim / não? Por que sim / não?

Não. O [Flávio] Flock [designer, vocalista de algumas bandas como Poindexter,

Jason] sim, mas não foi em frente. Passei a ter um pensamento menos coletivo e

mais individual por algumas decepções, então passei a pensar mais apenas em me

divulgar, em mostrar meu próprio trabalho, o que resultou em lançar dois livros e

preparar um terceiro.

20) Publicaria um fanzine impresso hoje?

Não.

Hélio Muniz (ex-editor da seção Zine do Jornal do Brasil, atual Gerente de Comunicação do Grupo Gol Linhas

Aéreas Inteligentes)

entrevista feita por email entre 25 e 27 de setembro de 2010

1) quando começou o projeto do ZINE no Jornal do Brasil?

Page 122: Um Mapeamento dos Fanzines Impressos Sobre Música no Brasil de 1989 a 2009

 

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No início de 1992, com pesquisas, grupos de foco e formação de equipe

2) qual era o objetivo / intenção?

O objetivo era trazer para o jornal um novo público, baixar a média de idade de

nossos leitores e fazer com que esses jovens puxassem seus pais para o JB.

3) Por que o nome ZINE na editoria?

Mais do que qualquer outra coisa, pela sonoridade e capacidade de se transformar

em um logo. Também por ser algo reconhecível pelo público alvo.

4) De onde vinha a inspiração para as experimentações gráficas da página? Dos fanzines, claro. Sabíamos que éramos um veículo mainstream, mas

buscávamos nos zines e nos flyers a inspiração para nosso desenho de páginas.

Também tínhamos designers que vinham do universo zineiro.

5) O que era possível "usar" das ideias e formatos dos fanzines num jornal de grande circulação ?

Como trabalhávamos para um grande público, pensávamos nas pautas que

poderiam ter um interesse mais amplo e mais nacional. Geralmente, fanzines são

destinados a nichos, grupos de pessoas em torno de algum interesse específico.

Nós tínhamos como alvo uma faixa etária, não um grupo de interesse.

6) Quando acabou? Qual motivo que acabou?

Acabou dois anos depois, por problemas de custo.

Luiz César Pimentel (diretor de redação da revista Zero, atual editor executivo de entretenimento do portal R7)

entrevista feita por email em 27 de setembro de 2010

1) Você chegou a editar zines impressos antes da Zero? (Se não, pule para pergunta nº 4) Quais zines você editava? Quanto tempo / quantos números durou cada um?

Page 123: Um Mapeamento dos Fanzines Impressos Sobre Música no Brasil de 1989 a 2009

 

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Sim, na verdade foi bem bem caseirão mesmo. Um zine de heavy metal, quando eu

tinha lá meus 12, 13 anos. Era mimeografado, lembra disso? Como eu nessa época

fazia comércio de fitinhas K7 (eu ia acumulando gravações, comprei um som com

tape duplo e gravava, enviava pelo correio e mandava junto meu zine. Deve ter

durado se tanto um ano, com uns 10 números.

2) Em que ano você começou a editar um fanzine? Quantos anos você tinha? Por que você começou a editar zine? Qual era a principal motivação?

Lá pelos 12, 13 anos mesmo. A motivação era ter pouca publicação que falava para

mim. Só tinha a Rock Brigade, e nem sempre eu concordava com eles.

3) O assunto principal era música? Que tipo de música / bandas seu fanzine focava? E porque?

Era música, heavy metal. Focava mais em thrash metal, que sempre foi o que mais

gostei.

4) Se não era impresso, era um blog? Qual(is) blog(s)? E qual era o assunto

principal?

Não. Nunca tive blog/zine.

5) Você trabalhou em revistas antes da Zero? Quais? Sim, trabalhei na Carta Capital, Trip e Veja Kid (era a Veja pra crianças, ia para

assinantes com a Vejona).

6) Por que montou a Zero? Qual era o objetivo?

O mesmo motivo pelo qual eu fiz o zine. Não existia um veículo que falava comigo,

que tinha pautas e ideias que eu queria ler. Ou seja, foi basicamente uma decisão

egoísta - fazer a revista que eu queria ler.

7) Na época, a internet já dominava a circulação da informação sobre música.

Por que lançar uma revista?

Ainda cabia uma revista de música à época em que saiu, 2002. Quer dizer, ainda

cabe, sempre cabe. Público que gosta de música tem muito da experiência táctil. Se

bem que isso vale para todo tipo de público fiel a um segmento - público de moda

Page 124: Um Mapeamento dos Fanzines Impressos Sobre Música no Brasil de 1989 a 2009

 

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deve preferir uma revista como a Elle em vez de ficar vendo pelo site. Para quem

gosta de determinado assunto a experiência de manuseio, transporte e liberdade de

ler onde e quando quiser é importante.

8) Como a Zero faria frente à internet? Ou não havia esse objetivo?

Não fazia, pois o DNA era diferente. As matérias eram montadas em camadas -

combinação de pauta com direcionamento gráfico, imagens, abordagem. Era uma

composição, e não apenas encaixe em espaço.

9) Quantos números foram editados? Qual foi a tiragem média?

Putz, acho que entre a Zero e especiais dela uns 20. A tiragem média era 50 mil

exemplares, se não me engano.

10) Havia apoio de editora? Vocês conseguiam financiar a revista?

Sim, era totalmente dependente de apoio da editora (Escala). Eles bancavam a

produção (impressão e distribuição) e ficavam com a venda de banca e nós com os

anúncios (80% do que entrava em anúncios)

11) Por que a Zero acabou?

Porque mudou a direção da editora e eles quiseram renegociar e ficar com fatia

maior dos anúncios. Se já era complicado financeiramente, com isso ficou inviável.

12) Publicaria uma revista hoje? Por que sim ou por que não?

Sim, publicaria. Mas pensaria bem na estrutura e direcionamento.

Gilberto Custódio Jr. (editor do fanzine Esquizofrenia, colecionador de fanzines impressos)

entrevista por email realizada entre os dias 25 de setembro e 12 de outubro de 2010 1) Quais zines você editava? Ou foi somente o Esquizofrenia? Qual foi o primeiro? Quanto tempo / quantos números durou cada um?

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Comecei com o Esquizofrenia em 1993, quando saiu a primeira edição. Foi até o #

20, lançado em 2006. Nesse meio tempo também editei o Campo Magnético e o

Candy Grrrls (uma edição de cada).

2) Em que ano você começou a editar um fanzine? Quantos anos você tinha?

Em 1993, tinha 15 anos.

3) Por que você começou a editar zine? Qual era a principal motivação?

Divulgar minhas bandas favoritas. Quase não era publicado nada sobre elas na

grande mídia.

4) Qual era a pauta dos zines que você editava? Aonde buscava sua "matéria

prima"?

Basicamente artigos sobre bandas de rock alternativo da época, sejam elas

nacionais ou gringas. A materá prima vinha de outros fanzines e revistas de música

importadas. Nas últimas edições também escrevia sobre literatura e política, que são

outras de minhas paixões.

5) Como vou focar em fanzines sobre música, queria saber se este era o assunto principal dos seus fanzines. Por que era? Havia uma carência de publicações sobre música nesta época?

Música sempre foi o assunto principal, pois é o que mais gosto na vida. Penso em

música o tempo todo, sempre estou ouvindo música, então foi um caminho natural

começar a escrever sobre música. Existia uma carência de publicações,

principalmente das que abordavam um tipo de música mais desconhecida,

underground mesmo. As revistas de música e os cadernos culturais dos principais

jornais do país se limitavam em publicar resenhas e entrevistas de artistas cujo

discos eram lançados no Brasil - uma fatia muito pequena de todo universo musical

mundial.

6) As matérias que você escrevia era “originais” (no sentido de que você mesmo produzia)? Quem pautava / apurava / escrevia? Eram bandas que normalmente não apareciam na grande imprensa?

Page 126: Um Mapeamento dos Fanzines Impressos Sobre Música no Brasil de 1989 a 2009

 

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Eram originais, eu mesmo fazia pesquisa e escrevia tudo na maioria das vezes, mas

existiam alguns colaboradores, principalmente para resenhas de shows, discos e

uma ou outra entrevista, sempre sobre bandas que não apareciam na grande

imprensa.

7) Pode listar algumas bandas que tiveram material publicado no seu fanzine? (desde as desconhecidas, que acabaram, até as que continuaram e até se tornaram conhecidas) No meio dos anos 90 o Fanzine Esquizofrenia colocou na capa e publicou artigos do

Stereolab, Portishead e The Cardigans, todas ainda desconhecidas do grande

público na época. Teve uma edição inteiramente dedicada ao indiepop sueco, em

2002, com Club 8 na capa. Só anos depois o estilo viria a se tornar mais conhecido

devido ao festival Invasão Sueca. Artigos especiais de diversas página sobre

northern soul, Dexy's Midnight Runners, The Wake, Postcard Records e muitas e

muitas outras.

8) Qual era o formato dos zines que vc editava? Xerox / grampeado / qtas

páginas em média / distribuia gratuitamente ou trocava...?

Xerox, grampeado. Nos anos 90 teve duas edições com 42 páginas, mas depois a

média eram 16 páginas. O fanzine era distribuido gratuitamente na Sensorial Discos,

devido a um acordo com a loja. Eles pagavam todas as cópias e deixavam parte da

tiragem comigo, que trocava por outros zines e vendia pelo correio.

9) Qual era a tiragem média das edições? 10, 50, 100 cópias? Mais?

Umas 300 cópias ou mais.

10) Como você descreveria a "evolução" gráfica (se houve) dos zines que você editava? Da xerox pensou em fazer em offset, chegou a fazer offset?

Sempre foi só xerox. Não teve evolução gráfica, pois sempre curti fazer fanzine com

cara de fanzine: usando papel, cola e tesoura. Computador somente para digitar os

artigos ou mexer no tamanho de alguma foto.

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  127 

11) Como vc diagramava seus zines? Começou a mão, depois máquina ou foi

direto para computador... Vc consegue relatar estas mudanças de forma cronológica?

Sempre usei computador. Em 93 eu não tinha o Microsoft Word (acho que ainda

nem existia), lembro que nas primeiras edições usei o WordStar, que rodava em

12) Alguma razão não-artística para estas mudanças de formato? Financeiras? Facilidade de distribuição, duplicação? Foi a união de ideal artístico com as ferramentas que tinha mais facilmente

disponíveis em casa.

13) Você ainda publica zines? Parou? Se parou, por que resolveu parar? Em que ano parou? E qual foi o principal motivo para parar de publicar fanzines

impressos?

Não publico, mas estou sempre pensando em voltar a publicar. Parei pois

atualmente trabalho em casa, no computador, num quarto. Para editar o fanzine teria

que utilizar o mesmo espaço. Já fico muito tempo dentro desse quarto, trabalhando.

14) Consegue identificar um aumento no nº de fanzines publicados em alguma época (1992 a 1996)? E depois da internet, por volta de 1997, 1998, identifica uma diminuição?

Sim. Antes da explosão da internet, em meados dos anos 90, surgiram diversos

fanzines. Foi a melhor fase na minha opinião. Com a internet muitos não viram mais

a necessidade de continuar publicando, já que toda e qualquer tipo de informação

estava disponível na rede. Muitos começaram a fazer fanzines eletrônicos, muito

mais prático e com uma visibilidade e alcance bem maior.

15) Pensou em levar o seu zine para internet? Sim / não? Por que sim / não?

Sim, durante a virada dos anos 2000 o fanzine também estava na rede, no endereço

http://www.esquizofreniazine.com.br. Ficou dois anos no ar, diversos artigos foram

publicados que foram lidos por um número muito maior de pessoas, mas não era

mesma coisa. Meu maior tesão sempre foi fazer o fanzine em papel, logo perdi a

motivação e voltei a editá-lo como antes.

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  128 

16) Você é um defensor dos fanzines em papel. Por que publicar fanzines em

papel em 2010? O que o fanzine em papel tem de diferente (melhor ou pior) em relação ao zine eletrônico?

Boa parte dos meus textos publicados na internet hoje não existem mais. Sumiram.

Já os de papel continuam por aí, muita gente coleciona, mostra para os amigos.

Guardo os originais com muito mais cuidado, pois tenho enorme carinho e sei que

foi bem trabalhoso editá-los. Posso tirar cópias deles a qualquer momento. A

diferença é estética. Um fanzine de papel é um artefato pop.

17) Você coleciona zines de papel? Quantos fanzines tem em sua coleção?

Coleciono. Devo ter uns 800. De uns anos para cá tenho adquirido fanzines

europeus e norte-americanos, já que no Brasil é muito raro alguém ainda editá-los.

18) Qual é a principal diferença para você? Qual é este tesão que o zine de papel dá que o eletrônico não supre?

Sinto que quando alguma coisa produzida fica somente no virtual, parece que ela

existe só pela metade. Perde um pouco da graça. Ter algo palpável em mãos, poder

levar para qualquer lugar, ler, guardar, reler depois de alguns anos, é uma outra

experiência e a meu ver muito mais graticante. Ter um fanzine na rede acaba

diluindo bastante a força do mesmo, ele fica meio perdido no meio de tanta

informação. Sem contar que cada vez mais dependemos do computador para tudo,

então é sempre bem vindo algo que nos livre dessa dependência e nos deixe

descansar a vista longe de uma tela iluminada.

Para produzir também é bastante diferente. Ao editar um fanzine eletrônico nos

tornamos refém de certas ferramentas bastante irritantes para quem não é usuário

avançado: o computador trava, dúvidas na hora de programar surgem a toda hora, o

resultado nunca é aquele que imaginanos, enfim, dificulta o andamento de um

processo que é bastante fácil e prazeroso quando feito de forma mais simples: no

caso utilizando instrumentos "primitivos" como o papel, a cola e a tesoura.

No mais, sempre existe a possibilidade de escanear o fanzine de papel em arquivo

*.pdf e disponibilizar ele em algum lugar da rede para as pessoas baixarem.

Humberto Wilson (Beto Wilson)

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(editor do fanzine Decibélica, hoje repórter da seção de Cultura do Diário da Manhã de Goiás)

entrevista realizada por email entre no dia 25 de setembro de 2010

1) Você editava algum zine antes do Decibélica? Qual foi o primeiro? Quanto

tempo / quantos números durou?

Não, a Decibélica foi minha primeira experiência com esse tipo de mídia.

2) Vc considera o Decibélica uma revista ou um fanzine? Qual a principal a

diferença para você?

É complicado dizer isso. Toda a estrutura dos textos, todos de colaboradores, gente

que escrevia por gosto e não por grana, era de zine. Mas a ideia desde o início era

profissionalizar a coisa, fazer uma revista mensal - apesar de nunca termos

conseguido atingir essa meta, era sempre bimestral -, conseguir captar recursos pra

manter uma estrutura, fomentar um mercado q era novo, uma revista focada

exclusivamente no cenário independente. Acho que no final das contas a Decibélica

era um misto das duas coisas. As primeiras edições tem mais cara de zine, as

últimas já de revista

3) Em que ano você começou a editar Decibélica? Quantos anos você tinha? E hoje, qtos anos?

Comecei em 2006, com 21. Hoje tenho 27

4) Por que você começou a editar o Decibélica? Qual era a principal motivação?

A idéia sempre foi divulgar o cenário da música independente para o grande público,

sem preconceito. A motivação era dar mais opção de cultura para um povo que é

enganado toda vez q liga a TV e o rádio e nem se toca.

5) Qual era a pauta do Decibélica? Aonde buscava sua "matéria prima"?

A capa era sempre uma banda. A primeira foi a do Léo Rockefeller, os Rockefellers,

pq era a que tínhamos material e eu adorava a proposta musical do southern rock

num estado dito "caipira". Depois Rollin' Chamas, uma banda local que arrebentava,

era uma celebração, um show muito louco. Em seguida Vanguart, uma banda de folk

de Cuiabá q tb tinha uma proposta muito bacana, Rockassetes, que ganhou a capa

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via votação popular no orkut, depois Faichecleres, que tentamos dar um boom bem

na época q estava concorrendo no VMB [premiação da MTV para videoclipes],

vendo se abria um nicho maior pro independente. A última edição foi do MQN,

banda do Fabricio Nobre, da Monstro discos, na qual lançamos um vinil da banda. A

pauta na verdade eram as manifestações culturais que rolavam no país, em todos os

cantos. O canal era aberto, se algum colaborador quisesse mandar material e

tivéssemos espaço, a matéria era veiculada e os créditos devidamente divulgados.

Claro que havia uma organização, uma separação por temas e formatos, mas era

isso.

6) Como vou focar em fanzines sobre música, queria saber se este era o assunto principal dos seus fanzines. Por que era? Havia uma carência de publicações sobre música nesta época?

Definitivamente era o foco principal. (ver resposta anterior) Ah, havia uma carência

sim. Era estranho uma cidade que borbulhava de música e ninguém divulgava isso.

Tinha acabado de chegar de longa temporada na Europa e lá esse tipo de evento.

de arte, tinha uma puta divulgação via zines, revistas gratuitas, e meio que tentei

implantar isso por aqui. Tinha um zine ou outro na cidade, mas coisas “cabeça”

demais, que nem o cara mais underground entendia direito. Pra mim isso serve mais

pro cara se autoafirmar como intelectual underground do que para fomentar um

cenário. Sobre outras revistas, que circulava em Goiânia acho que só mesmo a Bizz,

mas o foco não era o independente. Devia ter alguma outra também, mas não me

recordo ao certo.

7) As matérias que você escrevia era “originais” (no sentido de que você mesmo produzia)? Quem pautava / apurava / escrevia? Eram bandas que

normalmente não apareciam na grande imprensa?

A maioria das matérias, nas primeiras edições, eu mesmo escrevia. Na verdade eu

escrevia, pautava, apurava, corrigia (ou tentava), diagramava, etc. Também

fazíamos contato, eu e o Léo, com quem fomentava o cenário independente em

outros estados e alguns topavam escrever sobre a cena, sobre os problemas de

cada lugar, e a gente abria espaço. Depois, com o tempo, fui escrevendo menos,

contratamos um designer pra diagramar, e foquei mais na edição, na formatação, na

curadoria, com intuito de profissionalizar a coisa.

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8) Se eram bandas independentes, que não saiam na grande imprensa, aonde você procurava / descobria / sabia da existência destas bandas?

Eu ia em festival, fuçava na internet, baixava som de quem disponibilizava e fui

montando uma rede de contatos, que me mostrava mais banda, mais som, mais

festival... aí me convidavam pra um evento ou outro, como o pessoal do Cubo, da

Monstro, da Fósforo, e eu ia conhecendo mais gente, mais banda, igual uma bola de

neve. Era bem bacana.

9) Pode listar algumas bandas que tiveram material publicado no seu fanzine? (desde as desconhecidas, que acabaram, até as que continuaram e até se tornaram conhecidas) MQN, Rollin' Chamas, Rockefellers, Vanguart, Faichecleres, Rockassetes (capas),

além de Macaco Bong, Bang Bang Babies, Johnny Suxxxx... Cara, foi mais de uma

centena de bandas ao todo. Mas na verdade eu focava mais festivais, pq acho que

pra pessoa curtir a banda não adiantava ler a respeito apenas, tinha que ir em show,

comprar cd em banquinha, participar do movimento. Então divulguei Demo Sul,

Noise, Bananada, Maxxima, Marmelada, Grito Rock, Calango, PMW, Porão e os

eventos da revista. Deve ter mais um ou outro q nem lembro, mas a idéia era essa:

divulgar festivais e bandas

10) Quais foram os formatos do Decibélica? Medidas / gráfica / tipo de papel /

qtas páginas em média / distribuia gratuitamente?

A primeira tinha 38 páginas e a última quase 100. O papel era couché 120g. Gráfica

offset colorida. O tamanho era qualquer coisa parecida com um papel ofício um

pouco mais longo. Era bacana, bicho! depois te mando uma edição da 1a e da

última pra vc ver a evolução.

11) Qual era a tiragem média das edições? 10, 50, 100 cópias? Mais?

A primeira rodou 1000. A segunda 1500. A terceira rodou 1000. A quarta 2000. As

duas últimas rodamos 1500.

12) Até quando vc o publicou? Parou? Por que resolveu parar? Em que ano parou? E qual foi o principal motivo para parar de publicar?

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A última lançamos pouco depois de um ano, seis edições. Acabou em julho de 2007.

Paramos pq era uma coisa cara, q não estava dando retorno, os anúncios eram

escassos, e cresceu muito mais do que conseguíamos gerenciar, então pra não cair

a qualidade era melhor parar. E outra, a ideia meio que foi desvirtuada de fazer uma

revista para fazer eventos. Eu queria fazer uma revista, eventos eram bacana e tal,

ajudavam a manter os custos das publicações e divulgar, mas eram uma faca de

dois gumes: quando davam prejuízo, era um Deus nos acuda, não gosto nem de

lembrar.

13) Decibélica existia na internet? Sim / não? Por que sim / não? Qual era a diferença que vcs faziam entre os assuntos da internet para o impresso?

Existia no Orkut, tivemos também um site no ar algum tempo, mas era muito

desorganizado, a equipe era pequena e a grana era curta, então era uma coisa meio

descuidada. O conteúdo era o mesmo da revista, com uma entrevista ou outra a

mais e links dos parceiros, tipo Cubo, Loaded etc

14) Publicaria impresso hoje? Porque?

Ah, cara... Rola uma nostalgia... Até publicaria se tivesse uma lei de incentivo, uma

equipe bacana pra segurar a revista na ativa sem sobrecarregar ninguém, gente

dedicada à causa, que é divulgar o cenário musical independente. Mas pensando

melhor, existem outros formatos que na minha opinião funcionam bem melhor hoje

em dia do que revista impressa, é muito caro e infelizmente o brasileiro não gosta de

ler. Acho que as redes sociais trazem formatos mais interessantes hj em dia.

Ana Garcia (editora do fanzine Coquetel Molotov, da revista Coquetel Molotov, produtora dos festivais Invasão

Sueca e Coquetel Molotov no Ar, apresentadora do programa de rádio Coquetel Molotov e produtora

cultural)

entrevista realizada por email no dia 11 de outubro de 2010

1) Em que ano você começou a editar CM? O que veio primeiro? Programa de

Rádio? Site? Zine?

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O programa de rádio veio primeiro, em 2001. Em 2003, começamos a fazer o

fanzine do Coquetel Molotov. Fui inspirada por Gilberto Custódio e outros amigos da

época, como Eduardo Ramos. A idéia da revista surgiu no mesmo ano, quando eu

ganhei várias edições da Careless Talk Costs Lives. Fiquei impressionada com a

possibilidade de fazer uma revista incrível com poucos recursos financeiros. E

realmente é possível!

2) Por que você começou a editar zine? Qual era a principal motivação? Algum outro fanzine o motivou?

Acho que estava lendo vários zines na época e, eu principalmente, adorava fazer

entrevistas. Os primeiros zines eram feitos por mim com participação de Gilberto

Custódio e Eduardo Ramos. Depois veio a empolgação de Tathi [Tathianna Nunes]

e Jarmeson [Jarmeson de Lima], os meus parceiros do Coquetel Molotov. Eu

adorava o [zine] Esquizofrenia. Nessa mesma época fiz algumas edições do Candy

Girrrls com Gilberto.

3) Em que ano começou cada coisa? Zine, Programa de Rádio, Revista,

Festival... Rádio foi em 2001, zine, revista e festival em 2003 / 2004.

4) Porque fanzine de papel em 2004? Porque não um e-zine? Já tínhamos o site do Coquetel Molotov, mas ler no papel ainda é uma experiência

completamente diferente. E tem todo o cuidado manual da coisa, eu que colava a

matéria com a minha filha, Diana. Pegava desenhos e estampas legais para colar

também... Acho que o impresso ainda tem outro valor. E é muito legal colecioná-los.

5) Qual era a pauta do CM? Aonde buscava sua "matéria prima"?

Sempre o que estávamos escutando na época... Eu lia muito a Chickfactor. Ah, esse

zine me inspirou MUITO! Adorava as entrevistas longas e pessoais. Foi tão legal

fazer entrevistas com bandas que amávamos como Magnetic Fields, etc. Eu sempre

fazia a mesma pergunta para vários artistas responder e tinha tanta gente legal

envolvida, como Daedelus, Clientele, etc...

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6) As matérias que você escrevia era “originais” (no sentido de que vocês

mesmos produziam)? Quem pautava / apurava / escrevia? Eram bandas que normalmente não apareciam na grande imprensa? Como faziam para escrever sobre bandas que não eram brasileiras? As entrevistas eram de vocês mesmos ou vocês reproduziam de outros fanzines?

Sim, originais. Eu fiz a maioria das primeiras edições, mas Tathi e Jar começaram a

colaborar depois. Também fiz uma parceria com o site/programa de rádio Radiola

Urbana para publicar alguns textos. Gilberto Custódio e Eduardo Ramos

colaboravam também. Sim, sempre são bandas que não apareciam na grande

imprensa. Hoje é mais fácil aparecer... indie é o novo pop, novo mercado, etc. Mas

na época nem tinha revistas como a Rolling Stone ou a volta do Bizz.

7) Qual era a tiragem média das edições? 10, 50, 100 cópias? Mais?

Variava... mas normalmente fazíamos umas 50 copias de cada fanzine e vendíamos

por R$1.

8) Você considera o zine diferente da revista? A revista não é um fanzine "mais

bem acabado graficamente"?

Sim, com certeza. O custo, o acabamento, a responsabilidade... Temos uma

preocupação social bem maior com a nossa revista, até porque envolve

patrocinadores de peso, etc. Fanzine era feito antes de tudo para mim. Hahaha

9) Como vc diagramava seus zines? Começou a mão, depois máquina ou foi direto para computador... Vc consegue relatar estas mudanças de forma cronológica?

Totalmente a mão. Até hoje se eu for fazer um zine eu faço a mão... Apenas digitava

a entrevista.

10) Quando começaram com a revista, o zine deixou de ser publicado? Por que?

Não, começamos a revista em torno de 2004 e mesmo assim continuamos com o

zine. A primeira edição parece mesmo um zine só que bem maior, com acabamento

bonito, etc, mas o espírito faça você mesmo estava muito presente. Conseguimos

um apoio da Secretaria de Educação de Pernambuco e imprimimos umas mil cópias.

Page 135: Um Mapeamento dos Fanzines Impressos Sobre Música no Brasil de 1989 a 2009

 

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Acho que foi uma das melhores edições... a responsabilidade não tinha pesado

ainda.

11) Alguma razão não-artística para estas mudanças de formato? Financeiras? Facilidade de distribuição, duplicação?

Acho que queríamos fazer algo maior que pudesse atingir também um publico maior,

então fizemos algo mais como uma revista para ser mais aceito pela sociedade. Na

época, não tinha nada parecido no Recife e não tinha saído ainda a Rolling Stone,

etc... fazia sentido. Claro que tivemos que correr atrás de patrocínio, ao contrario

dos zines.

12) Era mais fácil viabilizar financeiramente a revista do que o fanzine ou o site? A revista se pagava? Dava lucro? Era subsidiada? E o fanzine e o site?

Revista sempre será difícil de viabilizar. Zine você [junta] R$50,00 e faz um zine

foda. Claro que sem cobrar o seu tempo! Site também... os custos são mínimos.

Mas a revista é MUITO cara. Tem que pagar a impressão, gastamos em torno de

R$12.000,00 para [fazer] 2 a 3 mil cópias de uma revista com 68 páginas coloridas,

e ainda tem o designer, um ou outro jornalista ou fotógrafo...

13) Como surgiu o festival nesta história toda? Que ano surgiu e porque resolveram criar o festival?

Na mesma época. Fui morar em SP e pensei em uma forma de ainda colaborar com

o Coquetel Molotov e foi através do festival. Os meus pais são produtores e eles me

ajudaram a escrever um projeto no MinC.

14) A revista ainda é publicada? Qual periodicidade? É subsidiada? E o zine?

Vai voltar?

Está rolando uma pausa, mas volta próximo ano. Era a cada 3 meses. Zine paramos

mesmo...

Kátia Abreu (editora da revista eletrônica Quadradinho e B*Scene) entrevista realizada por email entre 09 e 30 de outubro de 2010

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1) Quais zines você editava? Qual foi o primeiro? Teve algum antes do

B*Scene? Quanto tempo / quantos números durou cada um?

Primeiro editei, junto com amigos na faculdade, o Quadradinho, de 2000 a 2002.

Depois, quando ele acabou, veio a B*Scene, que durou de 2002 a 2005. O

Quadradinho era mensal, e quase nunca atrasávamos... devem ter sido 24 edições,

em dois anos. A B*Scene não faço idéia de quantas edições foram... depois de um

tempo passou a ser “devezenquandenal” e pra ajudar a gente perdeu um ano de

back up numa mudança de servidor...

2) Em que ano você começou a editar um fanzine? Quantos anos você tinha?

Em 2000, eu ia fazer 19 anos. Segundo ano de faculdade, a gente queria escrever

sobre cultura, falávamos muito disso nos intervalos das aulas na ECA e a Juliana

Zambelo, que era mais ligada na cultura de zines e já participava de listas de

discussão por aí, propôs o Quadradinho – que era editado, democraticamente, por 9

amigos, online.

3) O B*Scene nasceu primeiro na internet?

Sim, assim como o Quadradinho (que nunca teve versão impressa). Não peguei a

fase de zines de papel. O Quadradinho nasceu e-zine – e depois a gente passou a

chamar de Revista Eletrônica. A B*Scene nasceu como revista eletrônica já. É

curioso pensar nisso hoje, mas na época que a B*Scene surgiu, eu e a Bárbara

Lopes não gostavávamos de usar o termo “zine”. Viamos mais como experimento de

jornalismo do que como uma coisa de fã.

4) Por que vocês decidiram editar um zine em papel? Qual era a principal motivação?

A gente decidiu fazer uma edição impressa da B*Scene para comemorar um ano de

site e também como um experimento. Fizemos em papel jornal, preto e branco, por

conta dos custos... mas ela foi concebida como uma edição piloto do que poderia ser

a nossa revista impressa.

5) Quantas edições de papel o B*Scene teve? Qual foi a tiragem média do B*Scene? Quais foram os formatos (sempre papel jornal, PB)?

Só teve uma edição. Foram 2 mil cópias, 32 páginas em papel jornal, preto e branco.

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6) Havia uma carência de publicações sobre música nesta época? Que tipo de música / bandas seu fanzine focava? E porque?

Nesse período todo até tiveram revistas dedicadas a música e a cultura pop no

mercado: a volta da Bizz, a Zero, a Play, a Radar... Mas a gente queria ter a nossa.

Jovens, recém saídas da faculdade, cheias de ideias de como uma revista poderia

ser. Falávamos de bandas novas, brasileiras ou gringas, independentes (a grande

maioria), mas também de outras coisas ligadas a cultura pop, de literatura, artes

plásticas, cinema, enfim... E mesmo em relação a música, acompanhávamos a

“revolução” para além dos discos que saiam, dos primeiros passos da Creative

Commons até movimentação de selos e festivais no Brasil. Tentamos registrar e

analisar um pouco do que aconteceu naqueles anos.

7) Como vocês bancaram as edições impressas? Os anúncios eram pagos? Vendemos alguns anúncios para selos e distribuidoras independentes, e

completamos o que faltou com grana emprestada de uma amiga. Fizemos uma

edição barata porque sabíamos que não seria fácil bancá-la.

8) Por que a versão impressa tinha anúncios (pagos??) e o site não? Vocês tentaram vender espaço online?

Vendemos anúncio exclusivamente para bancar a edição impressa. Acho que nunca

chegamos a discutir anúncio no site.

9) Como você descreveria a "evolução" gráfica (se considera que houve) do B*Scene em comparação a outros fanzines da época? Por que não xerox ? Sem modéstia, acho o projeto gráfico da B*Scene comparável ao de revistas. O

Marcio Caparica, que cuidou disso para a gente, é um sujeito muito talentoso e,

como disse antes, a idéia toda era a de um piloto de revista.

10) Lembra de outros zines impressos da mesma época do B*Scene que

começaram na internet e foram para edições em papel?

Não lembro de muitos zines impressos. Tinha o Esquizofrenia, do Gilberto Cústódio,

mas ele é o caminho inverso: nasceu impresso e teve uma vida curta online. O

Coquetel Molotov, online, é contemporâneo nosso e depois virou revista...

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11) Até quando saiu o B*Scene impresso? Por que parou? O online continuou? Por que?

Foi só a edição de dezembro de 2003. Tentamos levar o projeto de revista pra

editora Scala, que não se animou muito... daí a gente foi mantendo o online,

enquanto tivemos tempo e disposição para atualizá-lo.

12) Publicaria um fanzine impresso hoje?

Acho que não. A internet me parece mais interessante e eficaz. Não só pelo fato de

não ter custos e de o acesso ser virtualmente possível a qualquer um; mas pelas

possibilidades de agregar áudio e vídeo.

Adilson Pereira (editor dos fanzines Porco Espinho e Punch) entrevista realizada por email entre 28 de julho e 12 de agosto de 2010

1) Quais zines você editava? Qual foi o primeiro? Quanto tempo / quantos números durou cada um?

Editei o “Cartazine”, o “Porco-Espinho” e o “Punch”, um pequenininho chamado

“Brazilian Cycos”... O “Porco-Espinho” eu fazia sozinho. Os outros eram “encontros”

com camaradas. Tipo 1985, aos 15 anos…

2) Por que você começou a editar zine? Qual era a principal motivação?

Começou com o “Cartazine”, no início do Segundo Grau. Hoje em dia, acho que não

tem mais Segundo Grau. Várias coisas serviam de motivação: os preços da cantina,

que julgávamos altos, e a estética da colagem punk, que fazia a gente ter vontade

de colar-e-experimentar.

3) Mas de onde vinha a estética punk? Discos? Bandas? Revistas? Você usou 1ª pessoa do plural... nós... quem eram os editores?

Isso. Discos. Principalmente discos. A gente via gente usando camisetas, via

neguinho “de visual”, mas os discos foram os principais. Aquele encarte do “Fresh

fruit...”, dos Dead Kennedys, causou um grande impacto, por exemplo.

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4) Qual era a pauta dos zines que você editava? Aonde buscava sua "matéria prima"?

No início, a “inspiração”, a “pauta” vinha do que estava acontecendo em volta.

Depois, conforme foram surgindo contatos com zines de outras cidades, estados e

países, a pauta passou a chegar também de fora. Às vezes, havia colaboradores

que ofereciam coisas já prontas. Podia ser uma resenha, um desenho. Às vezes, eu

fazia o papel de resenhar uma demo, de tentar um pingue-pongue com uma banda

que estivesse lançando um disquinho. Essas coisas. Com o tempo, música e

quadrinhos passaram a ser referências bem fortes e presentes.

5) Eu me lembro do Porco Espinho e do Punch, que tinham matérias sobre música. Como vou focar em fanzines de música, queria saber se as matérias

de música eram originais, no sentido de dar espaço à bandas que não apareciam na grande mídia. Se eram, aonde você procurava/ descobria / sabia da existencia as bandas?

Sim, havia essa preocupação. As bandas eram aquelas dos caras com quem eu me

correspondia, com quem trocava fitas e às vezes discos. As informações sobre esse

pessoal chegava pelo correio, em flyers ou noutros zines. Ou então eram bandas ali

da esquina, que a gente acabava conhecendo. Camaradas de colégio também

apresentavam material. Uma vez por semana, durante muito tempo, talvez anos,

encontrava amigos no CCBB e com eles falava sobre sons, quadrinhos, zines, punk

etc. Ali, também surgiam pautas e informações sobre música.

6) Como você começou a entrar no circuito dos fanzines? Você editou o seu primeiro e dai começou a correr atrás, ou algum zine caiu na sua mão e você

partiu dai? Quais eram as suas fontes de endereços e contatos para intercâmbio?

Sabíamos que existia um negócio chamado “fanzine”. Talvez encarássemos aquilo,

eu e minha galera, como uma grande possibilidade.

Uma referência importante foram as revistas “Chiclete com Banana” e “Animal”.

Cada uma delas, num determinado momento, flertou com uma linguagem “suja” que

era muito convidativa para jovens como eu e os zineiros que estavam na ativa.

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Aquelas revistas – e depois algumas outras – surgiram para virar ponto de encontro

da galera que produzia fanzines xerocados.

7) Eu não sabia dessa referencia Chiclete com Banana. A Animal era pra mim um dos poucos canais onde se falava de Fanzine (fora Rio Fanzine e uma ou

outra citação perdida). Você sabe me dizer se alguma edição da Chiclete teve algum espaço especial para zines?

Cara, na “Chiclete”, lá pelas tantas, passou a rolar uma espécie de “encarte”. Era o

“Jam”, que parecia com aquela parte central da “Animal”. Ali, no “Jam”, vez ou outra

se falava de algum zine. No mínimo, davam o endereço, para quem quisesse entrar

em contato. Isso me rendeu uma história engraçada. Uma vez, do nada, apareceu

na minha casa um punk lá da Baixada. Acho que ele era de São João De Meriti.

Esse cara tinha visto meu endereço numa “Chiclete com Banana”. Naquela época,

eu ainda não tinha caixa postal. Conseguir uma caixa postal, aliás, era difícil.

Havia também os zines gringos fodões, que conheci mais ou menos na mesma

época: “Flipside” e “Maximum Rock’n’Roll”, por exemplo. Eles eram verdadeiros

“sonhos editoriais” para mim e para muita gente que vivia mergulhado naquela

brincadeira de troca de informações. Mais tarde, já com uma razoável rede de

contatos formada, os próprios zines serviam de divulgação uns para os outros.

E havia uma espécie de spam rolando, já naquela época. As pessoas faziam

carimbos, com os nomes e endereços de seus zines. E nos envelopes em que

mandavam os zines mandavam também dezenas de recortes contendo o nome da

publicação e um endereço de contato.

8) Como estes zines gringos chegaram na sua mão naquela época?

Pelo correio. Depois de conseguir um ou outro emprestado, eu invariavelmente

pegava o endereço de correspondência daquela publicação e entrava em contato. A

partir disso, a coisa se desdobrava, crescia numa proporção interessante. Se um

gringo divulgava teu endereço, outros gringos te escreviam. O grande problema

nesse caso era o preço da postagem. Para eles, naquela época, era muito, muito

mais fácil mandar pacotes recheados de “belezinhas”. Mas eu aqui não tinha muita

grana para gastar com isso.

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9) Qual era o formato dos zines que vc editava? xerox / grampeado / qtas páginas em média / distribuia gratuitamente ou trocava…

A grande maioria foi feita em xerox. Mas cheguei a fazer também tablóide, como foi

o caso do “Punch”. Distribuía gratuitamente, trocava. Raramente vendia.

10) Quantas edicões teve cada fanzine? Punch, Cartazine e Porco Espinho. Cara, pra responder isso, só se for revirar as gavetas. E nem sei se tenho mais

todas as matrizes. O “Porco-Espinho” passou de 13 edições. O “Punch” acho que

teve três. O “Cartazine”, umas seis...

11) Qual era a tiragem média de cada um? 100 cópias? Mais?

No caso das xerox, sim. Houve uma edição do “Porco-Espinho” que chegou a ter

300 cópias, acho.

12) O que te fez migrar pro tablóide?

Queria algo mais “profissional”. E gostava da estética. E queria aumentar a tiragem.

13) Como você descreveria a "evolução" gráfica dos zines que você editava? Da xerox pensou em fazer em offset, chegou a fazer offset? Como vc diagramava seus zines? Começou a mão, depois máquina ou foi direto para computador... Você consegue relatar estas mudanças de forma cronológica?

Diagramei tudo na base da colagem. Datilografava, desenhava, reduzia ou ampliava

numa máquina de xerox, voltava pra casa, trabalhava com as novas dimensões. Fiz

zines tamanho ofício, meio ofício, um quarto de ofício, um terço... Foram vários

formatos. Eles começaram grandes, depois foram diminuindo, aumentaram de novo.

14) Alguma razão não-artística para estas mudanças de formato? Financeiras? Facilidade de distribuicão, duplicação?

Sim, dá para dizer que a facilidade de distribuição, no caso de um zininho pequeno,

influenciava. Mas as questões estéticas, por mais que a gente não tivesse formação

nessa área, apitavam muito alto. No caso do tablóide, a ideia era ter uma tiragem

bem grande.

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15) Até quando vc publicou zines? Parou? Por que resolveu parar? Acho que, no início da faculdade de Comunicação, eu ainda fazia zines. Comecei a

faculdade de jornalismo em 1990. Acho que por um ano ou um ano e meio, pelo

menos, continuei fazendo zines. Inclusive na faculdade. Não parei. Todo dia faço

um zine na minha cabeça.

16) Quando vc começou, consegue identificar um aumento no nº de fanzines publicados na mesma época? E depois da internet, por volta de 1997, 1998,

identifica uma diminuição?

Na época em que comecei a publicar, desconfio que: 1) houve um grande aumento

no número de publicações nos dois ou três anos seguintes. Havia semanas em que

eu abria a caixa postal (uma vez por semana) e dava de cara com 20 envelopes e

cada um deles tinha dentro um zine diferente; 2) ou então o que houve foi que essas

publicações já existiam, de forma isolada, sem formar uma rede de contatos e,

depois que essa rede se formou, pode ter provocado a sensação de que houve

aumento no número de publicações (quando na verdade o que houve foi a

possibilidade de essa rede se formar).