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Policy Brief Nº 1 Instituto Superior de Administração Pública Dezembro de 2014 Segurança Rodoviária em Moçambique Por: Carlos Shenga 1 , Paulo Magul 2 e Samuel Ngale 3 RESUMO Este Policy Brief , usando dados objectivos, mostra, primeiro, que os níveis de acidentes de viação em Moçambique são muito elevados, embora tendem a diminuir de 2009 a 2013. Segundo, a transgressão do Código de Estradas constitui a principal causa dos acidentes de viação. Terceiro, o esforço com vista à redução dos acidentes de viação circunscreve-se mais na fiscalização rodoviária pelos agentes da Polícia de Trânsito. Quarto, contudo, a fraca sinal- ização rodoviária, educação cívica rodoviária, a qualidade das escolas de condução e a fiscalização dos agentes da Polícia de Trânsito são outros factores que afectam a segurança rodoviária. A fraca sinalização rodoviária, o baixo nível de educação cívica rodoviária, a baixa qualidade das escolas de condução e a fraca fiscalização dos agentes de trânsito contribuem substancialmente para o aumento da sinistralidade rodoviária. Quinto, com vista à uma maior efectividade na redução de acidentes de viação no país, este Policy Brief recomenda uma implementação holística dessa política pública de modo que integre medidas relacionadas com uma melhor sinalização de estradas, maior consciencialização aos peões sobre a travessia ou uso de estradas, melhor qualidade das escolas de condução, e fis- calização aos agentes da Polícia de Trânsito, para além da fiscalização rodoviária. 1 Doutorado em Estudos Políticos pela Universidade de Cape Town, Professor e Director Académico no Instituto Superior de Adminis- tração Pública. 2 Mestre em Gestão de Recursos Humanos pelo Instituto Superior de Administração Pública, Formador e Coordenador do Curso de Certificado Profissional Superior em Administração Pública no Instituto Superior de Administração Pública. È também Pós-Graduado em Governação Políticas Públicas e Democracia pelo Instituto de Estudos Sociais de Haia (Universidade de Erasmus), Holanda. 3 Doutorado em Ciências Religiosas pela Universidade de Cape Town (2011) e Professor de Ética na Administração Pública no Instituto Superior de Administração Pública. 25.00 MT

Policy Brief Nº 1 - Segurança Rodoviária em Moçambique

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Segurança Rodoviária em Moçambique 1

Policy Brief Nº 1Instituto Superior de Administração Pública

Dezembro de 2014

Segurança Rodoviária em Moçambique

Por: Carlos Shenga1, Paulo Magul2 e Samuel Ngale3

RESUMO

Este Policy Brief, usando dados objectivos, mostra, primeiro, que os níveis de acidentes de viação em Moçambique são muito elevados, embora tendem a diminuir de 2009 a 2013. Segundo, a transgressão do Código de Estradas constitui a principal causa dos acidentes de viação. Terceiro, o esforço com vista à redução dos acidentes de viação circunscreve-se mais na fiscalização rodoviária pelos agentes da Polícia de Trânsito. Quarto, contudo, a fraca sinal-ização rodoviária, educação cívica rodoviária, a qualidade das escolas de condução e a fiscalização dos agentes da Polícia de Trânsito são outros factores que afectam a segurança rodoviária. A fraca sinalização rodoviária, o baixo nível de educação cívica rodoviária, a baixa qualidade das escolas de condução e a fraca fiscalização dos agentes de trânsito contribuem substancialmente para o aumento da sinistralidade rodoviária. Quinto, com vista à uma maior efectividade na redução de acidentes de viação no país, este Policy Brief recomenda uma implementação holística dessa política pública de modo que integre medidas relacionadas com uma melhor sinalização de estradas, maior consciencialização aos peões sobre a travessia ou uso de estradas, melhor qualidade das escolas de condução, e fis-calização aos agentes da Polícia de Trânsito, para além da fiscalização rodoviária.

1 Doutorado em Estudos Políticos pela Universidade de Cape Town, Professor e Director Académico no Instituto Superior de Adminis-tração Pública.2 Mestre em Gestão de Recursos Humanos pelo Instituto Superior de Administração Pública, Formador e Coordenador do Curso de Certificado Profissional Superior em Administração Pública no Instituto Superior de Administração Pública. È também Pós-Graduado em Governação Políticas Públicas e Democracia pelo Instituto de Estudos Sociais de Haia (Universidade de Erasmus), Holanda.3 Doutorado em Ciências Religiosas pela Universidade de Cape Town (2011) e Professor de Ética na Administração Pública no Instituto Superior de Administração Pública.

25.00 MT

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1. INTRODUÇÃO

A segurança rodoviária constitui entre outros aspec-tos um grande desafio para Moçambique. Isto porque os números de acidentes de viação no país são muito elevados,4 embora tenham diminuído de 2009 a 2013 (vide os dados das figuras 1 e 2). Ao nível provincial, o número de acidentes de viação é muito elevado na Ci-dade de Maputo e Maputo Província (Figura 2). Cerca da metade (46 porcento) dos acidentes de viação regis-tados no país, ocorrem na Cidade de Maputo e Provín-cia de Maputo (Figura 3).

Este Policy Brief analisa a implementação da política de segurança rodoviária em Moçambique; apresenta e discute alternativas de políticas a seguir; e conclui apresentando recomendações a seguir para mitigar os acidentes de viação.

A segurança rodoviária é importante para o desen-volvimento humano. Nenhum desenvolvimento pode ocorrer enquanto a população não estiver protegida dos acidentes de viação. A protecção da vida humana constitui o pilar do desenvolvimento. Isso sugere que em Moçambique, a redução da pobreza e melhoria das condições de vida dos moçambicanos passa, entre out-ros aspectos, por garantir a segurança rodoviária.

Este Policy Brief analisa a segurança rodoviária usan-do dados provenientes do INATTER (Instituto Nacio-nal dos Transportes Terrestres), observações e/ou ex-periências dos autores sobre o assunto, como utentes da rede rodoviária no maior parque automobilístico do país, e contactos efectuados a informantes chave no Ministério do Interior.

4 http://noticias.sapo.mz/aim/artigo/9840326022014163348.html, acessado no dia 13 de Novembro de 2014.

2. IMPLEMENTAÇÃO DA POLÍTICA DE SEGURANÇA RODOVIÁRIA

O Comando da Polícia da República de Moçambique (PRM) indica que os acidentes de viação são provoca-dos principalmente pela transgressão de diversas regras de condução automóvel.5 De facto, dos 32 acidentes registados na última semana de Abril do corrente ano, 82 por cento foram causados pela transgressão das re-gras elementares de condução automóvel (15 excessos de velocidade, 5 ultrapassagens irregulares e 6 cortes de prioridades) (Tabela 2).

Neste âmbito, com vista a mitigar os acidentes de viação, as autoridades policiais tem estado a interpelar frequentemente os automobilistas para garantir uma implementação efectiva do Código de Estradas.

Embora a transgressão das regras de condução au-tomóvel evidencie-se como o principal factor causador de acidentes de viação em Moçambique, existem outros factores da sinistralidade rodoviária. De facto, os da-dos das autoridades políciais mostram que 9 porcento dos 32 acidentes reportados na última semana de Abril foram causados pela má travessia de peões e 9 porcento por uma outra causa (Tabela 2). Ainda das 30799 fis-calizações efectuadas pela polícia aos automobilistas, 18 por cento encontravam-se em situação irregular, sugerindo que 82 por cento estavam de acordo com o prescrito no Código de Estradas.

Quais são os outros factores causadores de acidentes de viação em Moçambique? As partes seguintes deste Policy Brief apresentam e discutem os seguintes facto-res: 1) sinalização rodoviária; 2) educação rodoviária nas escolas; 3) formação dos automobilistas; e 4) efici-ente implementação do Código de Estradas.

5 Veja-se dados do Comando da Polícia da República de Moçam-bique (Savana, 30 de Abril de 2014, página 4).

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3. POLÍTICAS ALTERNATIVAS ADICIONAIS PARA SEGURANÇA RODOVIÁRIA

1) Sinalização rodoviária Uma eficiente sinalização rodoviária pode garantir a segurança rodoviária. As rodovias bem sinalizadas au-mentam as chances dos automobilistas e os peões não se envolverem em acidentes. Todavia, o maior parque automobilistico de Moçambique (Cidade de Maputo e Matola) é caracterizado por rodovias cujas sinalizações são deficitárias. Nessas cidades é muito frequente: • Os semáforos não funcionarem e ao mesmo tem-

po não existir um polícia no local para regular o trânsito;

• As passadeiras dos peões não estarem sinalizadas; • Uma rotunda não estar sinalizada ou distinguida

com cores branco e preto/vermelho.

2) Educação rodoviária nas escolas A educação rodoviária nas escolas, também pode ga-rantir a segurança rodoviária. As crianças dotadas de conhecimentos sobre segurança rodoviária, atraves-sam as estradas em locais seguros (o exemplo das pas-sadeiras). Contudo, em Moçambique especificamente nos centros urbanos é frequente ver crianças na escola:• Atravessar a estrada correndo;• Deixar as passadeiras, para atravessar a estrada em

locais inseguros;• Desorientadas para atravessar a estrada; e• Sem um guia para lhes ajudar a atravessar a estra-

da.

3) Formação de automobilistasA formação de automobilistas pode garantir a segu-rança rodoviária. Os automobilistas com conheci-mentos sólidos ou bem formados na área de segurança rodoviária minimizam a sinistralidade rodoviária. Os automobilistas bem formados tem maior prudência rodoviária e cometem menos irregularidades. E assim, reduzem os riscos de acidentes de viação. Porém, nos grandes centros urbanos moçambicanos é frequente observar automobilistas que:• Não param no sinal vermelho do semáforo;• Não respeitam a passadeira dos peões no semáforo;• Iniciam a marcha enquanto o sinal vermelho ainda

está visível;• Param ou mesmo estacionam na faixa de rodagem

(colocando apenas sinais de emergência na viatu-ra);

• Não sinalizam quando viram a esquerda ou a di-reita;

• Fazem ultrapassagens irregulares; • Cortam prioridade a outras viaturas;• Dirigem viaturas escutando música com volume

alto e falam ao celular;• Permitem o cobrador do chapa não encartado a

transportar passageiros;• Conduzem veículos não inspeccionados ou com

sérios problemas.

4) Eficiente implementação do Código de Estra-dasUma correcta implementação do Código de Estradas pode garantir a segurança rodoviária. Agentes da PRM que fiscalizam tanto os veículos como os automobilis-tas, correctamente reduzem os índices de acidentes de viação. Em Moçambique é frequente deparar-se com agentes da PRM que:• Deixam passar veículos sem iluminação, sinal-

ização ou não inspeccionados, a troco de favores; e• Deixam passar automobilistas em situação irreg-

ular.6

4. DISCUSSÃO E RECOMENDAÇÕES

A transgressão das regras de condução automóvel é o principal factor da sinistralidade rodoviária mas para reduzir os acidentes de viação, não basta a polí-cia implementar a fiscalização rodoviária, isto porque a fiscalização rodoviária por si só pode não garantir a segurança rodoviária, se alguns agentes da polícia não implementarem eficientemente o Código de Estradas.

Assim, é importante que o comportamento dos in-divíduos seja moldado por instituições - instituições são relevantes.7 As instituições formais do Estado de-vem sinalizar as estradas de modo que ajude a corrigir o comportamento de um automobilista em situação

6 Segundo Ana Gemo, Directora do Gabinete Central de Com-bate Contra a Corrupção, a sinistralidade rodoviária está associa-da à corrupção. Jornal Noticias de 12 de Novembro de 2014, página 1.7 Przeworsky, A. (2004). Institutions Matter? Government and Opposition, 39, 527-540.

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Figura 1: Acidentes de Viação em Moçambique, 1999-2012

Fonte: Instituto Nacional dos Transportes Terrestres, Ministério dos Transportes e Comunicações

irregular. As instituções formais do Estado devem for-mar ou educar os peões sobre como usar uma estrada.Elas devem ainda moldar o comportamento das esco-las de condução, de modo que possam formar devid-amente os automobilistas; e moldar o comportamen-to do agente fiscalizador da segurança rodoviária de modo que não prevarique na implementação do Códi-go de Estradas.

Para além da fiscalização rodoviária - a principal opção para reduzir a sinistralidade rodoviária executada pela PRM, é importante que o país também opte por políti-cas alternativas adicionais.

No âmbito da sinalização rodoviária, recomenda-se que o Instituto Nacional de Transportes Terrestres e os Governos Autárquicos sinalizem regularmente as estradas vertical e horizontalmente.

No âmbito da educação rodoviária, ao nível das es-colas, recomenda-se que a PRM capacite alunos reg-ularmente na travessia nas vias públicas, e até as vezes os pais ou encarregados de educação, com vista a ori-entar as crianças a atravessar as estradas. Essa capac-itação poderá decorrer nas salas de aulas e culminar com uma orientação prática para travessia de estrada. Isso tem um impacto colateral nos adultos pois ao ver-

em as crianças a serem instruidas a atravessar a estrada correctamente, estes poderão seguir o mesmo exemplo e até contar essas experiências ao esposo/a, filhos/as, familiar, vizinho/a ou colega.

No âmbito da formação de automobilistas, recomen-da-se que o Governo Central encerre as escolas de con-dução que não consigam alcançar uma classificação ig-ual ou superior a 14 valores. Note que das 32 escolas de condução existentes na Cidade de Maputo, apenas 4 ti-veram uma classificação igual ou superior a 14 valores; 28 tiveram uma classificação entre 10 a 12 valores.8

No âmbito da eficiente implementação do Código de Estradas, recomenda-se que o Ministério do Interior crie uma unidade de fiscalização do comportamento dos oficiais policiais na fiscalização dos automobilistas.

8 Instituto Nacional dos Transportes Terrestres. Ministério dos Transportes e Comunicações.

5. ANEXOS

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Figura 2: Acidentes de Viação por Província, 2003-2012

Fonte: Instituto Nacional dos Transportes Terrestres, Ministério dos Transportes e Comunicações

Figura 3: Acidentes de Viação por Província mais Cidade de Maputo, 2003-2012

Fonte: Instituto Nacional dos Transportes Terrestres, Ministério dos Transportes e Comunicações

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Tabela 2: Fiscalização Policial aos Automobilistas

Fonte: Dados do Comando da Polícia da República de Moçambique (Savana, 30 de Abril de 2014, página 4)

Fonte: Dados do Comando da Polícia da República de Moçambique (Savana, 30 de Abril de 2014, página 4)

Tabela 1: Acidente de Viação por Causa do Acidente

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SÉRIE DOS POLICY BRIEFS DO ISAP

Nº 1. Shenga, C., Magul, P. e Ngale, S. (2014). Segurança Rodoviária em Moçambique (Dezembro).

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Policy brief é um documento prático, não académico, que visa recomendar e/ou assessorar o Governo e a Administração Pública, em geral, a adoptar as melhores opções de políticas públicas. Os policy briefs podem ser baixados gratuitamente na página web do Instituto Superior de Administração Pública: www.isap.ac.mz.

Os manuscritos para a série dos Policy Brief do ISAP não devem exceder 2500 palavras incluindo o texto, tabelas, gráficos e notas de rodapé. Todas as citações são remetidas a notas de rodapé. Os manuscritos para a série dos Policy Brief do ISAP deverão ser enviados ao seguinte email: [email protected]

Publicações Escola de Governo

Editor:Carlos Shenga

Editor Assistente:Henrique França

Corpo Editorial:Samauel Ngale

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ISAP: 10 Anos Profissionalizando a Administração Pública

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