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C M Y K C M Y K A-26 A-26 26 CORREIO BRAZILIENSE Brasília, quinta-feira, 6 de agosto de 2009 Gastronomia Editora: Ana Paula Macedo [email protected] 3214-1195 • 3214-1172 / fax: 3214-1155 Fotos: Zuleika de Souza/CB/D.A Press A culinária argentina reflete o contraste de suas regiões, gerando pratos com sabores considerados únicos O que imaginar da gastro- nomia de um país tão grande, que se estende da Antártida até o cen- tro da América do Sul e que cole- ciona vales descampados, cordi- lheiras dentre as mais altas do mundo, e a segunda maior costa do continente? Assim é a Argenti- na, um país de grande diversida- de física que reflete na culinária. Os contrastes entre as diferentes regiões geraram pratos únicos, como os famosos vinhos da Pata- gônia, o doce de leite dos Pampas e as empanadas de Santa Fé. Além dos aspectos físicos, a colonização feita por diversos povos também influenciou na culinária. Os nativos pré-colom- bianos deixaram a erva mate, infusão semelhante à consumi- da no sul do Brasil. Os espa- nhóis, que descobriram o país em 1502, contribuíram com o consumo da carne bovina, uma das bases da alimentação argen- tina. Já os italianos, que chega- ram no fim do século 19, trouxe- ram a farinha de trigo, ampla- mente usada em empanadas, panquecas e medialunas. Grande parte dos temperos consumidos no Brasil é de ori- gem africana. Como na Argenti- na, durante a colonização não houve a importação de mão de obra desse continente, o usos de especiarias, como açafrão e pi- menta-do-reino, é bastante raro. Com menos tempero, a comida fica com um sabor mais leve. O azeite, trazido pelos espanhóis, é item básico, fazendo com que os outros tipos de óleos, como o de soja, sejam pouco utilizados. A batata, cultivada desde antes da chegada dos europeus, é a principal fonte de carboidrato, e é consumida principalmente frita, assada junto com carne, ou em purês. As massas, que combinam perfeitamente com os vinhos tin- tos da Patagônia, também são muito presentes. As pizzas argen- tinas se diferenciam das euro- peias pela espessura. São muito mais grossas e levam menos to- mate do que as italianas. Sucesso argentino Uma das opções para quem quer experimentar um pouqui- nho do sabor argentino, sem ter que atravessar os 2.300km que separam Brasília de Buenos Ai- res, e principalmente, sem gastar muito, são as empanadas. Elas estão disponíveis em 25 pontos da cidade que incluem cantinas de escolas de inglês, lojas de con- veniência e lanchonetes de hos- pitais. “Existem argentinos que não gostam de tango ou de vi- nho, mas é impossível encontrar algum que não goste de empana- das”, brinca o gourmet argentino Gustavo Mariasis, 45 anos, dono de uma casa de empanadas. “Em breve, será difícil encontrar um brasiliense que também não te- nha se apaixonado por elas”, afir- ma. Estima-se que por mês se- jam consumidas na cidade até 10 mil unidades do produto. Mariasis conta que uma das principais vantagens da iguaria é o fato de la poder ser consumida a qualquer hora. “Na Argentina, A mesa dos hermanos as empanadas são obrigatórias antes do churrasco, mas podem ser transformadas em lanche, substituir uma refeição, ou virem como aperitivo para uma bebi- da.” Os sabores são variados, vão das tradicionais carnes suaves e carnes com pimenta à sabores mais exóticos, como a mediter- rânea, feita com beringela, ce- noura e abobrinha italiana — de- senvolvida especialmente para quem tem intolerância à lactose — e para vegetarianos. Mas não só de empanadas vi- ve a culinária argentina, outro prato onipresente nas mesas dos hermanos, e mundialmente co- nhecido, é a parrilla (churrasco para os brasileiros). Para os ar- gentinos, o preparo da carne é uma arte e começa desde a cria- ção do boi — que deve ter uma alimentação balanceada e rica em fibras —, passando pela con- servação da carne, que não leva sal grosso. Para assá-la, sempre assada na brasa, de maneira que não absorva cheiro, ou sabor de fumaça. O ponto ideal é outro diferencial: os argentinos prefe- rem a carne malpassada e com menos sal, o que garante a ela um sabor mais leve. Tradição O advogado Tiago Boita Lau- de, 31 anos, é um apaixonado pelo churrasco argentino. “Sem- pre que eu viajava, não abria mão de visitar uma casa de pari- lla, é de um sabor inigualável.” A paixão é tamanha que em 2006 ele resolveu dar fim à loja de ma- teriais de construção e transfor- má-la em restaurante, claro, es- pecializado na cozinha argenti- na: o Corrientes 348. Lá todos os produtos são trazidos especial- mente do país vizinho, para que o sabor seja o mais fiel possível. “Desde a farinha até a carne, tu- do é trazido de lá. O preparo dos alimentos e os utensílios de co- zinha também seguem rigorosa- mente a tradição argentina.” Um dos destaques do cardá- pio é o Ojo del Bife, um corte de carne bovina com pouca gordu- ra, assado na brasa em uma gre- lha especial, com pouco sal e temperos argentinos, servido com batatas e acompanhado de vinho tinto. “Temos que orientar o cliente sobre o ponto da carne, que em geral vem malpassada para os padrões daqui. Com o tempo, ao invés de pedir a carne bempassada, os clientes vão aprendendo a apreciá-la no pon- to argentino”, diz Tiago. Para completar, na sobremesa é servi- do panqueca com doce de leite, feita com matérias-primas da re- gião do Pampa, no norte do país. Quem não gosta de carne, tem como saída a salada Juliana, feita com legumes, mostarda e batata palha, frita à maneira por- tenha. Laude conta que “muita gente nem come carne, mas vai ao restaurante só para experi- mentar a salada”. Para quem não dispensa um bom vinho, vale lembrar que as uvas argentinas estão entre as melhores do mun- do, nas variedades Cabernet Sau- vignon e Merlot. Entretanto, as de maior produção são da varie- dade Malbec, produzidas na re- gião de Mendoza, em plena Cor- dilheira dos Andes, com um sa- bor único, já que se tratam das vinícolas mais ao sul do planeta. Parilla com ojo de bife, servido com vinho tinto é um prato tradicional: corte e prepapro da carne resultam num sabor mais leve para o alimento Tiago Boita Laude: paixão pela parrilha fez com que abrisse restaurante www.correiobraziliense.com.br Veja a receita das empanadas

A Mesa dos Hermanos

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C M Y K C M YK

A-26A-26

26 • CORREIO BRAZILIENSE • Brasília, quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Gastronomia EEddiittoorraa:: Ana Paula [email protected]

3214-1195 • 3214-1172 / fax: 3214-1155

Fotos: Zuleika de Souza/CB/D.A Press

A culinária argentinareflete o contraste de suas regiões, gerando pratos com sabores considerados únicos

O que imaginar da gastro-nomia de um país tãogrande, que se estendeda Antártida até o cen-

tro da América do Sul e que cole-ciona vales descampados, cordi-lheiras dentre as mais altas domundo, e a segunda maior costado continente? Assim é a Argenti-na, um país de grande diversida-de física que reflete na culinária.Os contrastes entre as diferentesregiões geraram pratos únicos,como os famosos vinhos da Pata-gônia, o doce de leite dos Pampase as empanadas de Santa Fé.

Além dos aspectos físicos, acolonização feita por diversospovos também influenciou naculinária. Os nativos pré-colom-bianos deixaram a erva mate,infusão semelhante à consumi-da no sul do Brasil. Os espa-nhóis, que descobriram o paísem 1502, contribuíram com oconsumo da carne bovina, umadas bases da alimentação argen-tina. Já os italianos, que chega-ram no fim do século 19, trouxe-ram a farinha de trigo, ampla-mente usada em empanadas,panquecas e medialunas.

Grande parte dos temperosconsumidos no Brasil é de ori-gem africana. Como na Argenti-na, durante a colonização nãohouve a importação de mão deobra desse continente, o usos deespeciarias, como açafrão e pi-menta-do-reino, é bastante raro.Com menos tempero, a comidafica com um sabor mais leve. Oazeite, trazido pelos espanhóis, éitem básico, fazendo com que osoutros tipos de óleos, como o desoja, sejam pouco utilizados.

A batata, cultivada desde antesda chegada dos europeus, é aprincipal fonte de carboidrato, e éconsumida principalmente frita,assada junto com carne, ou empurês. As massas, que combinamperfeitamente com os vinhos tin-tos da Patagônia, também sãomuito presentes. As pizzas argen-tinas se diferenciam das euro-peias pela espessura. São muitomais grossas e levam menos to-mate do que as italianas.

Sucesso argentinoUma das opções para quem

quer experimentar um pouqui-nho do sabor argentino, sem terque atravessar os 2.300km queseparam Brasília de Buenos Ai-res, e principalmente, sem gastarmuito, são as empanadas. Elasestão disponíveis em 25 pontosda cidade que incluem cantinasde escolas de inglês, lojas de con-veniência e lanchonetes de hos-pitais. “Existem argentinos quenão gostam de tango ou de vi-nho, mas é impossível encontraralgum que não goste de empana-das”, brinca o gourmet argentinoGustavo Mariasis, 45 anos, donode uma casa de empanadas. “Embreve, será difícil encontrar umbrasiliense que também não te-nha se apaixonado por elas”, afir-ma. Estima-se que por mês se-jam consumidas na cidade até 10mil unidades do produto.

Mariasis conta que uma dasprincipais vantagens da iguaria éo fato de la poder ser consumidaa qualquer hora. “Na Argentina,

A mesa doshermanos

as empanadas são obrigatóriasantes do churrasco, mas podemser transformadas em lanche,substituir uma refeição, ou viremcomo aperitivo para uma bebi-da.” Os sabores são variados, vãodas tradicionais carnes suaves ecarnes com pimenta à saboresmais exóticos, como a mediter-rânea, feita com beringela, ce-noura e abobrinha italiana — de-senvolvida especialmente paraquem tem intolerância à lactose— e para vegetarianos.

Mas não só de empanadas vi-ve a culinária argentina, outroprato onipresente nas mesas doshermanos, e mundialmente co-nhecido, é a parrilla (churrascopara os brasileiros). Para os ar-gentinos, o preparo da carne éuma arte e começa desde a cria-ção do boi — que deve ter umaalimentação balanceada e ricaem fibras —, passando pela con-servação da carne, que não levasal grosso. Para assá-la, sempreassada na brasa, de maneira quenão absorva cheiro, ou sabor defumaça. O ponto ideal é outrodiferencial: os argentinos prefe-rem a carne malpassada e commenos sal, o que garante a elaum sabor mais leve.

TradiçãoO advogado Tiago Boita Lau-

de, 31 anos, é um apaixonadopelo churrasco argentino. “Sem-pre que eu viajava, não abriamão de visitar uma casa de pari-lla, é de um sabor inigualável.” Apaixão é tamanha que em 2006ele resolveu dar fim à loja de ma-teriais de construção e transfor-má-la em restaurante, claro, es-pecializado na cozinha argenti-na: o Corrientes 348. Lá todos osprodutos são trazidos especial-mente do país vizinho, para queo sabor seja o mais fiel possível.“Desde a farinha até a carne, tu-do é trazido de lá. O preparo dosalimentos e os utensílios de co-zinha também seguem rigorosa-mente a tradição argentina.”

Um dos destaques do cardá-pio é o Ojo del Bife, um corte decarne bovina com pouca gordu-ra, assado na brasa em uma gre-lha especial, com pouco sal etemperos argentinos, servidocom batatas e acompanhado devinho tinto. “Temos que orientaro cliente sobre o ponto da carne,que em geral vem malpassadapara os padrões daqui. Com otempo, ao invés de pedir a carnebempassada, os clientes vãoaprendendo a apreciá-la no pon-to argentino”, diz Tiago. Paracompletar, na sobremesa é servi-do panqueca com doce de leite,feita com matérias-primas da re-gião do Pampa, no norte do país.

Quem não gosta de carne,tem como saída a salada Juliana,feita com legumes, mostarda ebatata palha, frita à maneira por-tenha. Laude conta que “muitagente nem come carne, mas vaiao restaurante só para experi-mentar a salada”. Para quem nãodispensa um bom vinho, valelembrar que as uvas argentinasestão entre as melhores do mun-do, nas variedades Cabernet Sau-vignon e Merlot. Entretanto, asde maior produção são da varie-dade Malbec, produzidas na re-gião de Mendoza, em plena Cor-dilheira dos Andes, com um sa-bor único, já que se tratam dasvinícolas mais ao sul do planeta.

Parilla com ojo de bife, servido com vinho tinto é um prato tradicional: corte e prepapro da carne resultam num sabor mais leve para o alimento

Tiago Boita Laude: paixão pela parrilha fez com que abrisse restaurante

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Veja a receita das empanadas