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A TEORIA CRÍTICA COMO REFERÊNCIA DE PRÁTICAS EMANCIPATÓRIAS
NA ESCOLA PÚBLICA
Zuleyka da Silva Duarte1
Avelino da Rosa Oliveira2
Resumo:
Interessantes são as relações que se estabelecem dentro de uma escola. As justiças, injustiças,
hierarquias e os mais diversos comportamentos advindos daqueles que compõem o espaço
escolar. E como não poderia deixar de ser, tais comportamentos e situações reproduzem com
perfeição as relações que ocorrem na sociedade. Assim sendo, não seria errado afirmar, que a
escola funciona como um instrumento do estado para manter a sua ideologia; mas, por outro
lado, também por ser um espaço dialético, poderá ser um dos meios para transformação
social. Cabe, portanto, aos profissionais comprometidos com seus alunos e suas práticas, estar
sistematicamente problematizando a educação e a função desta, nessa sociedade e em outra
que possa ser mais justa e mais fraterna. Neste trabalho, o objetivo principal é buscar na
Teoria Crítica, autores frankfurtianos e seus estudiosos, elementos e categorias que possam
dar suporte às práticas pedagógicas justificadas como emancipatórias. Em um primeiro
momento, situa-se a escola na sociedade de hoje. Em seguida, a partir de um breve histórico
da Escola de Frankfurt, a importância de ter na Teoria Crítica, Adorno, Horkheimer e seus
estudiosos, bem como a influência Kantiana, um grande referencial para educadores e
educadoras que pensem melhorar sua prática, mesmo que a realidade da escola aponte para
outra direção. Também são propostas algumas reflexões da autora deste trabalho acerca da
importância de tais estudos para o processo ensino – aprendizagem. Para tal, a sugestão de
algumas categorias de análise para uma educação emancipadora na escola pública, proposta
por estudiosos da Escola de Frankfurt. E por fim, a reflexão da real possibilidade da educação
como um instrumento de transformação social.
Palavras-chave: Escola Pública. Educação.
Apresentação
Interessantes são as relações que se estabelecem dentro do espaço escolar. As
conversas na sala dos professores, o recreio, a hora do lanche, os encontros nos corredores, as
carências, o cartão ponto a ser batido, as faltas justificadas. Cada análise lembra a burocracia 1 Professora da rede estadual de educação e mestranda do PPGE/UFPEL. zuduarte@yahoo.com.br2 Orientador. Professor Doutor em Educação, titular da cadeira de Fundamentos da Educação da Faculdade Federal de Pelotas.
social que vivemos hoje. A hierarquia estabelecida, tal como o Estado se constitui. Sem falar
no limite espaço da sala de aula, onde muitas vezes encontramos professores e alunos
isolados à própria sorte, esquecendo do mundo que segue, da história que passa por fora dos
muros e das janelas. É este então, o tempo e o espaço que dispõe a educação formal para a
produção de saberes, processamento do conhecimento, etc. A partir desta reflexão, a escola
aparece inegavelmente como um dos instrumentos de reprodução social, como defende
Althusser. Por outro lado, pensando nas relações dialógicas que também se estabelecem
nestes mesmos espaços, como não dizê-lo também transformador? Portanto este trabalho -
parte do projeto de pesquisa do Mestrado em Educação da Universidade Federal de Pelotas -
que investiga as possibilidades de práticas emancipatórias na escola pública tem o objetivo de
buscar junto à literatura relacionada com a Teoria Crítica, categorias de análise que
contemplem também práticas pedagógicas justificadas como emancipatórias a partir de
leituras feitas de Kant, autores relacionados à Escola de Frankfurt, bem como seus estudiosos.
Uma vez descobertas tais categorias, evidencia-se a importância da Teoria Crítica, como um
grande referencial para a construção de projetos pedagógicos alternativos para a escola
pública ou junto às práticas pedagógicas em sala de aula. Em um primeiro momento, situar a
escola pública a partir de algumas tendências educacionais3: salvacionista, reprodutivista e
transformadora, para então buscar a influência de Kant no que chamamos educação
emancipadora.
Estão abertos os portões da escola... Vamos entrar?
A primeira análise que se pode fazer da escola são os tipos de relações que se
estabelecem dentro dela, pois são reproduzidas de maneira quase fiel às relações que ocorrem
na sociedade de modo geral. Então, em última análise, são relações de produção/trabalho,
onde a força de trabalho é necessária para a manutenção da produção, e que, conforme
Althusser (1985), não sendo infinita nem inesgotável, exige uma reprodução. Na visão do
referido autor, a escola é um dos aparelhos ideológicos do estado, tão importante que substitui
a igreja: O par Escola – Família substitui o par Igreja – Família. (p. 78). De outra forma
3 Leituras adicionais sobre as tendências pedagógicas podem ser encontradas em Althusser, Louis. Aparelhos Ideológicos do Estado. Rio de Janeiro.Luckesi, Cipriano Carlos. Filosofia da Educação. São Paulo: Cortez: 1994Silva, Tomás Tadeu da. A Escola Cidadã no Contexto da Globalização: Uma Introdução. In Silva, Luís Heron da (org). A Escola Cidadã no contexto da Globalização.Petrópolis:Vozes, 2001.Também recomenda-se a leitura do clássico de João Amós Comênio – A Didática Magna: A arte de Ensinar Tudo a Todos..
também Comênio vai dizer que Deus criou o mundo bom e harmonioso, mas pela
desobediência do primeiro casal (Adão e Eva) o ser humano introduziu o pecado na
humanidade. Apesar disso o homem não estava totalmente abandonado, havia soluções. Uma
das soluções era a redenção dos pecados através de Jesus cristo e a outra através dos seus
ensinamentos. Então para contribuir com o processo de regeneração da sociedade, nos é
apontado o caminho da educação. Aparece então, a educação como redenção da sociedade.
Essa tendência é considerada “não crítica”, pois não leva em conta o contexto de que
faz parte a educação e propaga uma visão ingênua da sociedade. Reportando tais
considerações para a sociedade de hoje, percebemos a presença de tal tendência quando
lemos, por exemplo, os PCN’s e encontramos propostas de educação sexual na escola,
inclusão da cultura negra, etc. Não negando a validade de tais práticas, mas tendo a
consciência que a simples inclusão destas questões no currículo escolar, não vai resolver os
problemas de doenças sexualmente transmissíveis, gravidez na adolescência, e outros, como
também abordar a cultura negra não vai nos redimir da barbárie sofrida pelos negros quando
da escravatura, como o preconceito que ainda sofrem. Tais medidas paliativas garantem a
redenção da educação, mas não a transformação da sociedade através da educação.
Se, dentro do espaço escolar, ocorrem ações que levam à problematização da
realidade, a partir de atividades que busquem a reflexão e auto-reflexão como ato educativo, e
a ações concretas que possam impulsionar uma transformação radical na sociedade, pois
como afirma Gadotti, a educação é ato, práxis; não se pode reduzir a complexidade do sistema
educativo apenas às suas relações com o sistema.
Em linhas gerais, pode-se perceber um pouco o papel da escola na sociedade,
obviamente, com o significado de sociedade e com o que realmente o sistema hoje instalado
representa para cada um de nós. Assim, a busca que segue é encontrar na Teoria Crítica
argumentos e categorias necessários para acreditar que uma da maneiras de transformação
social é a educação. Nesse sentido, torna-se bastante significativo o questionamento de
Gadotti:
Se as doutrinas pedagógicas historicamente se estruturam e se desenvolvem em função da emergência da sociedade de classes, nascendo a escola no berço da hierarquização e a desigualdade econômica, quais são as possibilidades de uma educação emancipatória pensada a partir da pedagogia? (Gadotti, 1995:23)
O desafio deste trabalho é encontrar na Teoria Crítica e nos autores frankfurtianos tal
resposta, bem como categorias emancipatórias que se pode buscar na escola pública. Em vista
disso, o que segue é uma breve histórico da Escola de Frankfurt, bem como alguns dos
principais conceitos trabalhados com seus teóricos.
Escola de Frankfurt, educação e emancipação nos dias de hoje
A Escola de Frankfurt foi fundada em 1924, pelo economista e cientista social Félix
Weil, também apoiada pelo economista Friederich Pollock e por Horkheimer. Primeiramente
denominada “Instituto de Pesquisa Social” adotou este nome na década de 50, ainda com
reservas por Horkheimer. O objetivo principal do Instituto era promover em âmbito
universitário, investigações científicas, a partir da obra de Karl Marx (1818 – 1883). Então a
partir de 1930, depois de algumas negociações e em dois postos de administração,
Horkheimer passou a acumular as funções de professor e diretor do Instituto. A partir desse
momento passa a ser elaborada a Teoria Crítica, em (...) oposição a todo pensamento da
identidade, da não contradição, típico da filosofia desde Descarte, denominada pelos
frankfurtianos como Teoria Tradicional. (Mattos, 1993).
Como escreveu Nobre (2004:20):
O que se convencionou chamar Escola de Frankfurt, designa antes de tudo, uma forma de intervenção político-intelectual (mas não partidária), no debate público alemão do pós-guerra, tanto no âmbito acadêmico, como no da esfera pública entendida mais amplamente.
Os nomes de Adorno e Horkheimer são sempre lembrados como pertencentes à Escola
de Frankfurt, os demais componentes variam muito. Na seqüência, é importante analisar
alguns conceitos fundamentais dos frankfurtianos para entender a lógica capitalista que atua
na educação. Uma das questões mais visíveis na escola pública hoje, é a massificação cultural
amplamente absorvida pelos professores, no que resulta um compartilhamento de
conhecimentos entre professores e alunos completamente sem significados. Ramos-de-
Oliveira (1994) afirma que Num mundo de formas, a informação transforma-se em
deformação. E acrescenta que essa falta de noção de totalidade, (entendendo por totalidade a
interação de fatos e fenômenos, que levem à compreensão da realidade) e esta sendo
escamoteada e devidamente seccionada, a realidade se transforma numa massa compacta,
inacessível à compreensão e, portanto, inescapável. (p.136). Esta maneira de trabalhar
evidencia reflexos do mercado, onde aparecem notas, classificações, testes de inteligência e
aptidões, diagnósticos psico-pedagógicos – tudo para estabelecer o preço que o aluno poderá
exigir do mercado quando adulto. (Ramos-de-Oliveira, 1994, p.136). Ele ainda afirma que
com o uso da razão instrumental, ocorre o fenômeno da semi-cultura, ou seja, a conquista do
espírito humano pelo caráter de fetiche da mercadoria. Em outras palavras os objetos se
portam como sujeitos, enquanto os antigos sujeitos são objetivados. Para compreender melhor
a maneira como a razão é abordada pelos frankfurtianos e a relação da mesma com o presente
trabalho, é importante buscar na história a maneira como o iluminismo é abordado por estes
intelectuais. O iluminismo foi um movimento intelectual europeu, constituído no séc. XVIII e
que nasceu e se desenvolveu a partir da valorização da razão. Mas, ao analisar a
contemporaneidade e toda a barbárie apresentada na II Guerra Mundial, os filósofos começam
a questionar por que as promessas iluministas não foram cumpridas. No livro Eclipse da
Razão, Horkheimer buscou inspiração em filósofos como Schopenhauer (onde se afastam do
cientificismo materialista, da crença na ciência e na técnica, como pressupostos de
emancipação social) e Nietzche (que mostra sua gênese extra-racional), entre outros. O que se
percebe, a partir das leituras feitas, é que no Iluminismo a razão surgiu como uma das
possibilidades de emancipação humana, mas com a dominação da ciência e controle da
natureza, a razão se utiliza desses instrumentos para oprimir e manter o sistema burguês,
conquistado com a Revolução Francesa, no que então os frankfurtianos vão criticar a razão
instrumental. Essa visão de razão instrumental vai encontrar suporte, justamente em Kant, que
no segundo prefácio da crítica da razão pura vai dizer que:
Perceberam eles (os iluministas) que a razão não compreende senão aquilo que ela mesma produz um projeto seu; que os princípios dos juízos devem reger-se por leis invariáveis; que a razão deve constranger a natureza a responder às suas perguntas, e não deixar-se conduzir por ela, como se por assim dizer, se encontrasse atrelada à natureza.
Para os frankurtianos, então, é preciso redefinir a razão e estabelecer, segundo Adorno,
as perspectivas nas quais o mundo revele as suas fraturas. Obter essas perspectivas sem
arbitrariedade e sem violência, do simples contato com os objetos, essa é apenas uma das
tarefas do pensamento. (Adorno in Matos, p.64)
Fazendo o caminho de “retorno” à escola encontra-se em Ramos-de-Oliveira a idéia de
que a escola por ser dialética, também tem caráter transformador, e a figura do professor é
fundamental, pois (...) uma ruptura exige conhecimento prévio da situação. È preciso que o
professor se analise. Apenas o esclarecimento pode pouco, quase nada, mas o passo inicial é
importante (1994). Este é um momento bastante importante da análise porque se chega enfim,
ao foco esperado deste trabalho. A partir de um momento que o objetivo e buscar junto a
literatura argumentos que possam servir de categorias para análise de práticas emancipatórias
na escola pública, é fundamental o conceito de esclarecimento e como a partir dele pode-se
chegar à emancipação. Esclarecimento, vindo do termo em alemão, Aufklärung, é segundo
Kant, a saída do homem de sua menoridade, da qual ele próprio é culpado (...), onde
menoridade é a incapacidade de fazer uso se seu entendimento sem a direção de outro
indivíduo. . Desse modo, remontando as práticas na escola pública de hoje, pode-se afirmar
que só atingirão a tal esclarecimento se conseguirem superar a situação de opressão a que
estão submetidos todos os envolvidos no processo ensino-aprendizagem. Neste sentido,
Adorno questiona a possibilidade de transformar a barbárie através da educação. Ele entende
barbárie como:
(...) estando na civilização do mais alto desenvolvimento tecnológico, as pessoas se encontrem atrasados de um modo peculiarmente disforme em relação à sua própria civilização- e não apenas por terem em sua arrasadora maioria, experimentado a formação nos termos correspondentes ao conceito de civilização, mas também por se encontrarem tomadas por uma agressividade primitiva, um ódio primitivo(...) (Adorno, 1995, p.155)
Reafirma também que a tentativa de superar a barbárie é decisiva para a sobrevivência
da humanidade. É certo que o citado autor refere-se a Auschiwtz e aponta a educação como
um caminho absolutamente eficaz pra que tal horror não se repita. Mas parece extremamente
importante que para encontrarmos tal resposta na educação de hoje, é preciso que
identifiquemos junto à escola, quais barbáries ocorrem e que precisam ser superadas, como
passo fundamental para o processo de emancipação, pois, como coloca o próprio Adorno não
me inclinaria a pensar que o simples fato da questão da barbárie estar no centro das
consciências, provocaria por si uma mudança. (p.157). Então, nos nossos dias poderíamos
encarar como barbárie o produto de uma economia de mercado: miséria, fome, guerras,
doenças múltiplas, terrorismo, desemprego, desestruturação da família, do ser humano, etc. e
cujas conseqüências evidenciam-se na escola. Dessa forma para trabalhar emancipação neste
espaço, de certa forma, dominado pelo sistema, é preciso primeiro: entender que a
emancipação difundida por Adorno é, como ele mesmo afirma, sinônimo de esclarecimento
em Kant.
A exigência da emancipação parece ser evidente numa democracia. Para precisar a questão, gostaria de remeter ao início do breve ensaio de Kant intitulado “Resposta à pergunta: o que é esclarecimento?” Ali ele define a menoridade ou tutela e, deste modo, também a emancipação. (Adorno, 1995, p.169)
No âmbito escolar, para trabalhar em uma perspectiva emancipatória, é preciso
desmistificar a educação enquanto um cânone estabelecido e substituir por uma diversidade
de atividades onde os alunos participem e construam seu programa de estudos. Adorno vai
dizer que:
(...) a única concretização efetiva da emancipação consiste em que aquelas poucas pessoas interessadas nesta direção orientem toda a sua energia para que a educação seja uma educação para a contradição e para a resistência. (Adorno, 1995:183)
Outra contribuição vinda da Teoria Crítica é o resgate da formação cultural. Um
novo olhar acerca da cultura que chega com os alunos, fazendo-se um importante apanhado
do que já foi apropriado pela indústria cultural. Esse novo olhar é importante para acentuar a
percepção e aguçar o senso crítico dos envolvidos no processo ensino – aprendizagem. Quem
de alguma forma vivência a escola pública sabe da enormidade de barbáries que nela chegam.
São das mais frágeis situações sociais, até problemas de saúde dos mais diversos. E, não é
possível pensar em práticas emancipatórias, sem buscar s superação dessas condições.
Nenhuma criança, jovem ou até adulto, vai conseguir pensar e buscar ações por si mesmo,
sem a direção de outro, vivendo em situação de risco. E é preciso, pois, que a comunidade
escolar fique sempre em estado de vigíla, mantendo uma crítica permanente ao sistema, e a
todas as instâncias que de alguma maneira, tentam manter tais condições.
Depois do exposto acima, é possível perceber as possibilidades emancipatórias da
Teoria Crítica, no sentido de contribuir para uma teoria pedagógica transformadora. E, tendo
agora o desafio de construir este caminho, é necessário buscar em Bruno Pucci alguns
elementos que ajudem neste sentido:
1. A função crítica do refletir: Ele coloca que ao refletir é possível resgatar uma
dimensão que vai além do círculo da mercadoria, do repetitivo. E isso, sendo Pucci, é
educativo. A afirmação que segue é muito animadora o expressar que:
Educação/formação cultural pela auto-reflexão crítica, significa para Adorno a busca da autonomia, da autodeterminação Kantiana, do homem enquanto sábio fazendo uso público da sua razão, superando os limites da liberdade trazidos pela barbárie, pela semi-cultura. O homem enquanto sábio se torna cidadão do mundo, supera a dimensão do privado, do doméstico, do paroquial, das normas e imposições mil (...). (Cohn, 1986, p.45 apud Pucci 2003, p.45)
2. O resgate da formação cultural como postulado pedagógico de emancipação: fica
bem evidente que a cultura é um elemento de dominação importante ns sociedades capitalistas
monopolistas. A cultura deixou seu caráter formativo e se transformou em semi-cultura (...)
na onipresença do espírito alienado, da padronização, do conformismo. (Pucci, p. 49) No
entanto ele diz que a formação, enquanto apropriação subjetiva da cultura historicamente em
constituição, só tem possibilidade de sobreviver pelo pensamento crítico.
3. A importância da educação e a responsabilidade da escola no processo de
“desbarbarização”: já foi possível perceber anteriormente o significado da barbárie para
Adorno e a influência do nazismo que ele próprio sofreu na pele, e de Auschwitz, que ele dizia
que não era possível deixar acontecer novamente, pois a humanidade não poderia mais viver e
assistir àquele genocídio. Então ele propõe uma educação com duas ênfases peculiares:a) a
educação junto às crianças, (...) onde ocorre o primeiro processo formativo educacional
(Pucci, p.52) e b) a segunda ênfase diz respeito a tese básica de Adorno, o esclarecimento, que
cria uma dimensão espiritual, cultural e social, desmobilizando e despotencializando as
possibilidades de repetição da barbárie (Pucci, p.52).
4. Assimilar o passado como esclarecimento: a dimensão hermenêutica – para evitar
um outro episódio como fascismo ou nazismo, Pucci reafirma a importância da arte da
hermenêutica, a qual ele assim define:
É capacidade de, através da educação, da psicologia, do esclarecimento, decifrar os sinais sombrios do tempo, desvendar as sementes malignas das trevas, conduzir para as luzes as manifestações dolorosas dos irracionais, interpretar a história contraditória dos homens. A hermenêutica é a tentativa de verter em forma de indicativos para o presente as interrogações e exclamações do passado. (Pucci, 2003, p.53)
5. Papel dos intelectuais coletivos no processo de desbarbarização: Além de um
comprometimento com as classes às quais têm vínculo, é preciso outras possibilidades
abordadas por Pucci, como perspectivas da desbarbarização do homem do campo, mas que
podem sim ser adaptadas para o homem da cidade também, por que não? São elas: O
planejamento de transmissões culturais/educativas pela televisão; a organização de grupos
educacionais, de equipe de voluntários que percorram áreas rurais (ou bairros) informando,
ensinando, através de discussões, cursos, ensino adicional (Pucci, p.55)
Enfim, ficam registradas algumas categorias que servem como referência para a
pesquisa, da qual faz parte este trabalho. E adiantando, as práticas pedagógicas que se
enquadram nos elementos acima organizados, como: projetos do ensino de filosofia para
crianças, atividades que evidenciem a formação cultural, ou atividades outras, que
problematizem a situação de miserabilidade que se encontra hoje o ser humano de forma geral
e especificamente, os alunos das escolas pesquisadas. Ou ainda, o comprometimento dos
profissionais da educação com seus colegas e seus alunos; tanto quanto outras práticas que
vierem a contribuir como o processo de esclarecimento e emancipação social, visando uma
transformação nas raízes da sociedade contemporânea, podem contribuir significativamente.
De igual forma, apesar da evidente instrumentalização da escola enquanto um meio de
reprodução da ideologia vigente é possível afirmar que há esperanças sim, de através também
da educação, construir um mundo mais justo e mais fraterno. Da mesma maneira que as
relações burocráticas aparecem, também há nestes mesmos espaços profissionais, pais e
alunos com atitudes de resistência em relação ao sistema. E para corroborar as inquietações
que motivaram a realização deste trabalho, fica uma citação de Nádja Hermann:
As relações do homem com o mundo social estão necessariamente mediadas pelas categorias de racionalidade que foram forjadas no desenvolvimento histórico. Conhecimento e interesse são inseparáveis e o processo de auto-reflexão se impõe para articular o conhecimento com a crítica social e compreender a necessidade de mudanças na sociedade vigente. (Hermann apud Pucci, 1994, p.85)
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