View
220
Download
0
Category
Preview:
Citation preview
SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO SUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL – PDE
PROFESSORA PDE MARCIA DA SILVA TELLES CORREA
DESENHO E LINGUAGEM ESCRITA NO DESENVOLVIMENTO DO EDUCANDO COM NECESSIDADE EDUCACIONAL ESPECIAL – DEFICIÊNCIA INTELECTUAL
TAMBOARA - PR 2009
2
SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO SUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL – PDE
PROFESSORA PDE
MARCIA DA SILVA TELLES CORREA
DESENHO E LINGUAGEM ESCRITA NO DESENVOLVIMENTO DO EDUCANDO COM NECESSIDADE EDUCACIONAL ESPECIAL –
DEFICIÊNCIA INTELECTUAL
Artigo apresentado a SEED/SUED/DIPOL como requisito para obtenção do título de Professor PDE, área de Educação Especial. Orientadora: Prof. Ms. Rita de Cássia Pizoli
TAMBOARA 2009
3
DESENHO E LINGUAGEM ESCRITA NO DESENVOLVIMENTO DO EDUCANDO COM
NECESSIDADE EDUCACIONAL ESPECIAL – DEFICIÊNCIA INTELECTUAL
Marcia da Silva Telles Correa ∗
Rita de Cássia Pizoli – Fafipa∗
RESUMO
O presente artigo apresenta os resultados da pesquisa a respeito da relação entre desenho e linguagem escrita na Educação Especial. A partir do referencial teórico-metodológico materialista histórico e dos teóricos que estudam o desenvolvimento e a aprendizagem na perspectiva históricocultural, apontamos possibilidades de mediação do processo de ensino-aprendizagem de alunos com deficiência intelectual na área de alfabetização. Os objetivos que nortearam a pesquisa permitiram-nos compreender a prática pedagógica singular da escola escolhida dentro do movimento histórico de constituição da modalidade de ensino público da Educação Especial, bem como os fundamentos teórico-metodológicos acerca do desenvolvimento da linguagem e suas relações com o desenho e a escrita. O estudo empírico a partir da intervenção com alunos e professores possibilitou o planejamento de um plano pedagógico permanente, articulado com o Projeto Político Pedagógico da escola, contemplando as ações suscitadas pelo estudo da temática apresentada.
Palavras-chave: Educação Especial; linguagem escrita; desenho; mediação.
ABSTRACT
This article presents the results of research on the relationship between drawing and written language in Special Education. From the theoretical and methodological and historical materialist theorists who study the development and learning in cultural historical perspective, we point out possibilities for mediation of the learning process of students with intellectual disabilities in literacy. The goals that guided the research allowed us to understand the unique pedagogical practice of the closer school inside the movement in the history of the formation mode of public education for special education, as well as the theoretical and methodological foundations of language development and its relationship with the drawing and writing. The empirical study from the intervention with students and teachers allowed the planning of an ongoing educational plan, combined with the political-pedagogical project of the school, watching the actions arising from the study of the theme presented.
Key words: Special education; written language; drawing; mediation.
Introdução
∗ Professora da Rede Pública Estadual – PDE/2008 – UEM/Fafipa, graduada em Pedagogia – Fafipa e pós-graduada em Educação Especial – Fafipa. ∗ Professora Mestre em Educação pela Universidade Estadual de Maringá. Professora Assistente da Faculdade Estadual de Educação, Ciências e Letras de Paranavaí, atuante no curso de Pedagogia, Departamento de Educação.
4
No processo de ensino-aprendizagem dos alunos com necessidades especiais, principalmente dos
alunos com deficiência intelectual, existe uma constante busca, por parte do professor, em entender a
especificidade de cada aluno e oferecer a melhor mediação, adequando o currículo escolar e
proporcionando a estes alunos oportunidades de crescimento.
Entretanto, percebe-se que o atendimento não desenvolve o máximo da potencialidade de cada aluno
com necessidades educativas especiais. Em se tratando sobretudo da linguagem escrita, no processo
de aprendizagem do código formal por alunos classificados como portadores de deficiência mental,
observamos que esta nem sempre é compreendida e interpretada de maneira suficiente a elevar a
aprendizagem do aluno a patamares superiores.
Alguns alunos, sem conseguir dominar o código escrito formal, manifestam seu pensamento por meio
do desenho, que muitas vezes não é explorado e tampouco considerado como uma possibilidade inicial
de expressão escrita. Dessa forma, seu desenvolvimento fica limitado e as atividades repetitivas não
contribuem para seu crescimento, acarretando irritação e desistência ante as atividades intelectuais
mais complexas.
Diante desse problema, na pesquisa realizada durante dois anos na participação do Programa de
formação de professores – PDE1 debruçamo-nos sobre a temática referente às relações entre desenho
e linguagem a fim de potencializar a valorização do desenho como forma de expressão inicial da
escrita. Assim, neste artigo apresentamos os resultados finais da pesquisa e visamos a apontar
possibilidades de mediação do processo de ensino-aprendizagem de alunos com deficiência intelectual
na área de alfabetização.
Durante a trajetória deste estudo, a problematização que nos guiou foi: como a Educação Especial se
organiza na contemporaneidade, particularmente nas escolas especiais? Como e em que contexto
essas escolas foram criadas no Brasil? Quais os fatores históricos que determinaram as políticas para
a Educação Especial? Quais são os problemas enfrentados pelos professores nessas escolas? O que
1 O Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) é oferecido pela Secretaria de Estado da Educação do Paraná
(SEED) e contempla quatro períodos semestrais, distribuídos em dois anos, com várias ações a serem desenvolvidas, tais
como participação em cursos oferecidos pelas IES, tutoria do grupo trabalho em rede (GTR), produção de material didático,
implementação da proposta de intervenção na escola e produção de um artigo científico.
5
impede o pleno desenvolvimento das potencialidades intelectuais da criança com dificuldade de
aprendizagem? Que métodos de alfabetização estão sendo usados nas salas de aulas? Que
alterações metodológicas se fazem necessárias? Quais as relações entre desenho e linguagem
escrita? Como o entendimento dessas relações pode contribuir para a realização de uma mediação
adequada para a alfabetização de crianças com deficiência intelectual?
Para a realização da pesquisa, seguimos os procedimentos metodológicos ancorados na perspectiva
qualitativa, compostos de estudo bibliográfico e pesquisa de campo, com observação, entrevistas
semiestruturadas, intervenção com alunos, coleta de dados, e grupo de estudos com os professores da
escola pesquisada. A coleta de dados foi realizada na Escola de Educação Especial Idalba Abreu
Pierin, no município de Tamboara, localizado no noroeste do Paraná. O grupo de pesquisa foi
constituído por três alunos.
Durante o processo, empreendemos a implementação das propostas desse projeto com o grupo de 10
professores da escola em questão2. Consideraremos as discussões realizadas nesse grupo neste
artigo. Paralelamente, a mesma discussão foi apresentada a 40 professores da rede estadual por meio
de GTR3, possibilitando a sua inclusão virtual na rede, nos estudos, reflexões, discussões e nas
elaborações efetuadas pelo professor PDE na trajetória do programa.
Por meio desse trabalho, desenvolvemos materiais didáticos para serem utilizados nos processos de
intervenção, tanto para a pesquisa empírica como na aplicação do plano de ação e intervenção com os
alunos. Essa prática comprovou a importância do planejamento intencional para a mediação
pedagógica.
Neste sentido, respondemos aos objetivos propostos inicialmente, como compreender as formas
históricas de atendimento ao aluno com necessidades educacionais especiais; refletir sobre a relação
de ensino-aprendizagem, noções de desenvolvimento, desenho e linguagem para a Educação 2 As atividades desenvolvidas no grupo de estudos com os professores no período de 23/03/2009 a 27/05/2009 foram Educação Especial: um breve histórico; Ensino, Aprendizagem, Desenvolvimento Psíquico em Vigotski; Investigação do Desenho como Reprodução da Linguagem Escrita; Algumas Considerações para Análise dos Desenhos; Sugestões de Atividades e Materiais para a Mediação Pedagógica; Elaboração de um Plano de Intervenção Metodológica com Professores. 3 Os Grupos de Trabalho em Rede –(GTR) constituem-se em uma atividade do PDE e caracterizam-se pela interação virtual entre o professor PDE e os demais professores da rede pública estadual, e buscam efetivar o processo de Formação Continuada já em curso, promovido pela SEED/PDE.
6
Especial; estudar as relações entre desenho e linguagem no contexto e realidade escolar dos alunos
com necessidades educacionais especiais da Escola de Educação Especial Idalba Abreu Pierin –
APAE do município de Tamboara, PR; apresentar aos professores da escola o resultado da pesquisa
teórica e empírica relativo aos procedimentos teóricos metodológicos de mediação para o processo de
ensino-aprendizagem dos alunos com necessidades educacionais especiais e refletir com os
professores a necessidade de um trabalho de mediação tendo por base a análise do desenho.
2. Considerações históricas da Educação Especial: situando a escola pesquisada
Apresentamos um breve histórico da Educação Especial no âmbito mundial, nacional e estadual, para
então situarmos a escola onde foi realizada a presente pesquisa, estudo e intervenção.
Para compreendermos melhor a situação atual da Pessoa com Necessidade Educacional Especial, faz-
se necessário relatarmos um pouco da história que influenciou a condição de vida dessas pessoas, a
constante situação de segregação e anulação de suas capacidades, em que suas conquistas e
desenvolvimento estiveram e continuam quase sempre nas mesmas mãos, as de pessoas ligadas a
movimentos particulares, beneficentes, assistencialistas de atendimento às deficiências de acordo com
valores sociais, morais, éticos e religiosos de cada época.
O documento do Paraná apregoa que:
A organização da Educação Especial sempre esteve determinada por um critério básico: a definição de um grupo de sujeitos que, por inúmeras razões, não corresponde à expectativa de normalidade ditada pelos padrões sociais vigentes. (PARANÁ, 2006, p. 17).
Ainda citando tal documento (PARANÁ, 2003), essa concepção que motivou a natureza de
atendimento da Educação Especial esteve vinculada a um movimento social de sistematização de
práticas de disciplinamento relacionadas à caracterização dos indivíduos (loucos, marginais, doentes
mentais, deficientes, a fim de enquadrá-las em categoria que facilitariam seu tratamento). Essa
situação remete à questão histórica dos diagnósticos e prognósticos que, muitas vezes, perpetuaram-
se como práticas de exclusão social.
Em uma retrospectiva histórica, Matos (2003) afirma que a situação das pessoas com deficiência no
contexto mundial, cuja causa e consequências costumam ser agravadas em decorrência do perfil de
desenvolvimento econômico, político e cultural de cada sociedade, o tratamento dispensado a essas
7
pessoas evolui dos cuidados primários e do internamento em instituições e asilos ao reconhecimento do
direito à educação e à reabilitação.
Arnal (2007) assinala que, no Brasil, esse processo foi mais complicado:
O percurso histórico da Educação Especial no Brasil tem aspectos muito delicados e discutíveis, particularmente nas questões de políticas públicas Os principais questionamentos sempre foram levantados por pessoas que tinham influência em sua prática e / ou algum familiar que precisasse de atendimento especial. Nesse sentido, a Educação Especial foi constituindo-se como um sistema paralelo ao sistema educacional geral, com características morais, científicas, políticas, econômicas e legais bem específicos (ARNAL, 2007, p. 24).
Dessa forma, a Educação Especial se organizou tradicionalmente como atendimento educacional
especializado substitutivo ao ensino comum, evidenciando diferentes compreensões, terminologias e
modalidades que levaram à criação de instituições especializadas, escolas especiais e classes
especiais.
Na LDB n°9394/96, a Educação Especial é contemplada com um capítulo, detalhando de maneira
clara as possibilidades de sua caracterização. O artigo 58, parágrafo 1º, postula que “haverá, quando
necessário, serviços de apoio especializados na rede regular para atender às peculiaridades do
alunado de Educação Especial”. O parágrafo 2º desse mesmo artigo define que “o atendimento
educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das
condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino
regular”. Na sequência, o parágrafo 3º expõe que “a oferta de Educação Especial, dever constitucional
do Estado, tem início na faixa etária de zero a seis anos, durante a Educação infantil”.
As APAES, estruturadas pela iniciativa civil e mantidas também pelo poder público, atendem a uma
grande parcela dos alunos com deficiência. Por realizarmos este trabalho de pesquisa e intervenção
em uma Escola Especial historicamente inserida no movimento apaeano, julgamos relevante
apresentar alguns aspectos de sua trajetória no Brasil.
A Educação Especial no Paraná tem pouco mais de 50 anos. Nesse período ocorreram muitas
mudanças relacionadas a sua organização e ao lugar que ocupava no sistema educacional. Desde a
criação da primeira escola especial, em 1939, o Instituto Paranaense de Cegos, reproduzem-se
concepções e práticas atestadas nos movimentos nacionais e internacionais.
8
No entanto, Almeida (1998) enuncia que pelo pioneirismo das ações no estado ambientadas, como a
criação da primeira classe especial na rede pública (atual Escola Estadual Guairá, em Curitiba), em
1958 e a implantação do primeiro serviço de Educação Especial, em nível governamental, em 1963,
coloca o Paraná na vanguarda das políticas de atendimento educacional especializado, em nível
nacional.
Em 12 de maio de 2008 foi inaugurada a primeira Escola Estadual de Educação Especial do Paraná, a
Escola Estadual de Educação Especial Lucy Requião de Mello e Silva, para atendimento superior a 260
alunos portadores de necessidades educacionais especiais.
A partir da década de 1970, com a estruturação do Departamento de Educação Especial, integrando a
organização político-administrativa da SEED, o que se mantém até hoje, é que se intensificaram as
ações no âmbito da escola pública, com a expansão do atendimento em diferentes municípios do
Estado e a implantação de classes especiais voltadas ao atendimento de deficiências, por área.
Com o objetivo de sistematizar uma política pública de inclusão educacional, tendo o Departamento de
Educação Especial à frente desse processo, foi elaborado um documento intitulado “Educação
Inclusiva: linhas de ação para o Estado do Paraná”.
No Paraná, a Deliberação nº. 02/03 - CEE, que fixa as normas para a Educação Especial, modalidade
da Educação Básica para alunos com necessidades especiais no Sistema de Ensino do Estado do
Paraná, assegura a oferta de atendimento educacional especializado aos alunos que apresentam
necessidades educacionais especiais decorrentes de:
I- Deficiência mental, física / neuromotora, visual e auditiva;
II- Condutas típicas de síndromes e quadros psicológico
neurológico ou psiquiátrico;
III- Superdotação/ altas habilidades (PARANÁ, 2003, p.12).
As Diretrizes Curriculares da Educação Especial preconizam que o Estado do Paraná realiza uma
inclusão educacional responsável. Todavia a inclusão, antes de ser educacional é social, e portanto, é
uma conquista de toda sociedade. A educação, aliada à vasta legislação que hoje dispomos para a área
e o essencial envolvimento da sociedade é que fortalecerão os sentimentos éticos e de cidadania da
população paranaense.
9
Nesse movimento, situamos a Escola de Educação Especial Idalba Abreu Perin. De acordo com o
Projeto Político Pedagógico (PPP), a escola, inserida no movimento apaeano, tem se consolidado em
suas ações pedagógicas, garantindo que as pessoas com deficiência sejam respeitadas nas suas
diferenças e ocupem espaços sociais e educacionais, sendo vistas como parte integrante da
sociedade.
A escola está localizada ao Noroeste do Paraná, no município de Tamboara, cuja população é de 4.564
habitantes (IBGE, 2007), integrante do Núcleo Regional de Educação de Paranavaí, a qual fica a 15 km,
tendo como mantenedora a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de Tamboara (APAE).
Desde sua criação, em 24 de setembro de 1999, a escola vem rompendo barreiras para manter-se em
condições de oferecer o atendimento necessário aos educandos e suas famílias. Por ser uma entidade
filantrópica sem fins lucrativos, mantém parcerias com os governos federal, estadual e municipal, os
quais contribuem com pequena parcela, ficando a maior responsabilidade financeira para a sua
mantenedora (APAE), que por sua vez a mantém voluntariamente com promoções, doações da
comunidade do comércio do município.
A organização curricular da escola segue as normas do MEC e processa-se de modo a atender os
níveis de Educação Infantil, Ensino Fundamental (fases iniciais), e as modalidades compatíveis com os
níveis de ensino com os quais atua; segue também a Proposta Curricular da Educação para Jovens e
Adultos, os Parâmetros Curriculares Nacionais – Adaptações Curriculares: Estratégias para Educação
de alunos com Necessidades Educacionais Especiais e o documento da APAE Educadora (FENAPAE,
2001).
No ano 2000, a escola passou a integrar o Sistema Estadual de Educação do Paraná, e a partir desse
marco foi convocada a escrever seu Projeto Político Pedagógico em consonância com o movimento
iniciado em 2002 em todas as escolas do Estado.
Nesse momento, a concepção de aprendizagem da escola está ancorada nos pressupostos da teoria
históricocultural de Vigotski, conforme expõem os excertos do documento:
Ensino–Aprendizagem é o processo pelo qual o indivíduo adquire informações, habilidades, atitudes, valores, etc. a partir de seu contato com a realidade, o meio ambiente e outras pessoas. [...]. Segundo Vigotski (1984), a intervenção é um processo pedagógico privilegiado. O professor tem o importante papel de interferir na
10
zona de desenvolvimento proximal dos alunos provocando avanços que não ocorreriam espontaneamente (PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO, 2007, p. 27).
Em casos de educando com graves comprometimentos mentais e/ou múltiplos, que não possam
beneficiar-se do currículo que não inclua formalmente a base nacional comum, deverá ser
proporcionado um currículo funcional para atender às necessidades práticas da vida.
2. Ensino, aprendizagem e desenvolvimento psíquico em Vigotski: conhecendo as bases
teórico-metodológicas do trabalho proposto
Diante do desafio de oportunizar as máximas conquistas para Pessoa com Necessidades Educacionais
Especiais, em particular Deficiência Intelectual, queremos refletir sobre quais devem ser as práticas
que melhor oportunizem essas conquistas.
Para isso, nos voltamos para a prática pedagógica realizada na escola onde trabalhamos durante seis
anos para buscar um entendimento a respeito de questões que há muito tempo nos afligiam.
Decidimos, então, estudar as relações entre ensino-aprendizagem e desenvolvimento psíquico em
Vygotski4, e partimos do pressuposto de que há uma estreita relação entre o ensino-aprendizagem e o
desenvolvimento psíquico.
Segundo Kassar (2001, p. 29), o enfoque históricocultural vem fundamentando novas pesquisas e
práticas educativas bem como abrindo novas possibilidades para atendimento sobre o desenvolvimento
do ser humano, e consequentemente, da pessoa com deficiências. O autor indica o fato das estruturas
psíquicas ocorrerem dentro das possibilidades oferecidas, em última instância, pelas condições
socioculturais. A partir desses pressupostos, a educação da pessoa com deficiência pode ser
percebida como possível, pela prerrogativa dos fatores sociais do desenvolvimento e, assim, pelo
caráter não-limitante desse desenvolvimento.
Queiroz (2005, p. 45) ensina que o termo defeito ou defectologia foi utilizado por Vigotski para se referir
aos portadores de deficiência física, auditiva, visual e mental na antiga União Soviética, sem que isso
4 O nome do autor é encontrado, nas literaturas consultadas, escrito de várias formas, dependendo do idioma de referência. Adotaremos, neste trabalho, a grafia Vigotski, como é grafada nas traduções em espanhol feitas direto do russo.
11
representasse uma diminuição do sujeito ou uma maneira pejorativa de designar uma pessoa portadora
de algum tipo de deficiência. Procurando explorar as potencialidades desses sujeitos, Vigotski atentou
mais as suas qualidades do que aos seus defeitos.
Ao explicar o processo de desenvolvimento humano, a teoria históricocultural propala que as
consciências humanas resultam dos processos de vida que sujeito estabelece com a sociedade. Parte
do princípio de que o comportamento humano não foi constituído na evolução e desenvolvimento
biológico, mas pela análise do desenvolvimento cultural.
Na abordagem históricocultural, na compreensão dessa autora por nós compartilhada, essa
especificidade da evolução humana deve-se ao desenvolvimento social do homem que, sob a
perspectiva histórico-materialista, torna-se possível no surgimento do trabalho nas sociedades
primitivas. Juntamente a essa organização e devido a ela surgem a linguagem e o pensamento
caracteristicamente humano.
Por esse enfoque, a peculiaridade do desenvolvimento das crianças com deficiência não está no
desaparecimento de suas funções, que podem ser observadas na criança normal, porém nas novas
formações que se constroem como relação ante a deficiência – uma organização especial da estrutura
psíquica – o que Vigotski (1995) chama de “compensação” do processo de desenvolvimento. O
comprometimento de certas funções faz com que sejam criadas novas vias de desenvolvimento,
caracterizando um tipo novo de desenvolvimento.
Em Educação Especial, esse processo tem que ser acreditado e efetivado, no sentido de contribuir
para a construção das estruturas mentais que possibilitem o desenvolvimento da criança com
necessidades educativas especiais, em uma visão socioeducacional, concebendo-a como um ser
capaz de desenvolver suas potencialidades, respeitando suas limitações.
A abordagem teórica de Vigotski (NUNES, 2001) traz implicações para o campo educacional, na
medida em que mostra que a criança aprende basicamente através das interações sociais. Aquilo que
uma criança faz com auxílio hoje, amanhã será capaz de fazer sozinha. Este autor explica que, para
Vigotski, é dessa sequenciação o processo de desenvolvimento realizando-se após o processo de
aprendizado, com o surgimento de dois níveis de desenvolvimento (real e potencial) – que resultam o
que ele denominou Zona de Desenvolvimento Proximal. Na visão de Queiroz (2005) e Goulart (2006), o
12
primeiro nível de desenvolvimento real ou fase pré-intelectual da fala consiste em a criança pequena se
comunicar com adulto através de gestos, choros e balbucios. Apesar de não ter um significado
específico, a criança consegue se fazer entender pelo adulto.
No segundo nível de desenvolvimento proximal – ou a fase da inteligência –, a relação estabelecida
com as pessoas que fazem parte do ambiente no decorrer dos primeiros anos da criança é responsável
pelo desencadeamento dos denominados processos interpsíquicos – os adultos medeiam a ação da
criança para determinados comportamentos.
Nessas duas primeiras fases, os pensamentos e a linguagem não estão interligados, no entanto, à
medida que a criança, em suas interações com o adulto, aprende a usar a linguagem como instrumento
para expressar o seu pensamento, este torna verbal e racional.
No terceiro nível ou desenvolvimento potencial, a resposta ao mundo, anteriormente mediada por
outros seres humanos, se transforma em um processo intrapsíquico (aproximação da fala; ampliação
da capacidade em aprender e a internalizar conceitos, valores sociais presentes em sua cultura).
Portanto, o que foi apropriado pela criança, mediada pela linguagem (signo), será agora utilizado por
ela para orientar a própria ação.
Os autores demonstram em seus estudos que os seres humanos ao nascer são movidos por
comportamentos instintivos: suas respostas ao meio que os rodeia é espontâneo, os primeiros contatos
com outras pessoas em seu ambiente determinarão a manifestação e desenvolvimento das funções
psíquicas (linguagem, pensamento, memória) e esta, enquanto mediada, transforma em capacidade de
aprendizagem (adquire conhecimentos), e essa aprendizagem organizada dará sequência a outros
processos de desenvolvimento, e assim a pessoa consegue, independentemente, conduzir seu próprio
conhecimento, antes mediado por outra pessoa.
Ressaltamos a importância da mediação do professor nesse processo. Seu papel é essencial, pois a
qualidade do pensamento e do raciocínio dos alunos dependerá, diretamente, dos conteúdos por ele
trabalhados em sua prática pedagógica (ARNAL, 2007). Em sua teoria, Saviani destaca esse aspecto:
Cabe ao professor selecionar conteúdos relevantes dentro do conjunto da cultura humana – e as formas adequadas para possibilitar que esses conteúdos sejam
13
apropriados pelos alunos, lembrando sempre que as características humanas são aprendidas, pois são externas as pessoas em seu nascimento.
Para efetivação do trabalho pedagógico, compete ao professor a função de atuar no processo
educativo, buscando o desenvolvimento de experiências de ensino-aprendizagem, fazendo articulação
entre conteúdo e a prática social do aluno, sendo o mediador do desenvolvimento de aprendizagem.
Com relação à investigação do desenho como reprodução da linguagem escrita, esse trabalho é assim
compreendido pela teoria históricocultural: para Vigotski, o desenho deve ser interpretado como um
estágio preliminar do desenvolvimento da linguagem escrita, estágio este entendido mais do que como
uma simples antecedência temporal (LEITE; PATROCINIO, 2000).
Ao longo de sua história, o homem, pela necessidade, vem criando uma diversidade de comunicação,
envolvendo linhas, pontos, símbolos, signo, que utiliza para recordar ou transmitir informações,
determinando convenções em sua representação; neste sentido, a escrita gráfica torna-se um sistema
complexo e exige, para sua aproximação, combinação de detalhes e habilidades específicas, sendo
privilégio para alguns e fracasso para outros.
A primeira tarefa de uma investigação científica é revelar essa pré-história da linguagem escrita; mostrar o que leva as crianças a escrever; mostrar os pontos importantes pelos quais passa esse desenvolvimento pré-histórico e qual a sua relação com aprendizagem escolar (VIGOTSKI, 1984, p. 121 apud AZENHA, 1996).
Nesse âmbito, a escola reflete o modelo social que ainda é dominante. Na prática pedagógica, os
primeiros contatos da criança com o registro da escrita ocorrem de forma primitiva, como emaranhado
de linhas ou desenhos, que é registro de seu conhecimento e evolui conforme a mediação do meio
social em que está inserida. Todavia, raramente esse tipo de registro do aluno é alvo de nossa
atenção, porque estamos determinados pelo próprio sistema escolar a ver e a tratar as relações da
criança com a escrita, como a alfabetização, por critérios convencionais, deixando de dar significado a
esse desenvolvimento, não o contemplando como um momento de prazer e desenvolvimento da
criança.
O desenho como atividade, em muitas das propostas no ambiente escolar, proporciona ao aluno
momentos de desenvolvimento e de descontração, incentiva a criatividade, as possibilidades de
expressão de sentimentos ou mostra o próprio nível de desenvolvimento cognitivo e afetivo das
14
crianças. Para a alfabetização o desenho é um instrumento considerado satisfatório de trabalhar a
coordenação motora dos alunos, a sua capacidade de atenção e concentração, seus conhecimentos
sobre cores, formas de leitura. No entanto, os cálculos gradualmente passam a ocupar o espaço do
desenho e a determinar seu novo papel, como ilustração ou apoio para compreensão de determinados
conteúdos, relegando o desenho a segundo plano.
Cruz e Fontana (1997, p. 146) expõem que “a criança, ao nomear o seu desenho depois que o fez,
relaciona os traços que produziu que podem ou não assemelhar-se a algo real a um objeto concreto. E
pelo ato de renomear, seu desenho torna-se significativo”.
Nesse particular, é importante ressaltarmos que a fala tem, assim, um papel fundamental na
descoberta que a criança faz de que seus rabiscos podem significar algo;, e segundo Vigotski, é
importante lembrar que, antes que a criança nomeie seu desenho, ele é nomeado pelos adultos que a
rodeiam.
Embora a descoberta de que os traços do desenho podem representar objetos reais ocorra nos
primeiros anos da infância, Vigotski observa que essa descoberta ainda não equivale à da função
simbólica do desenho; muitas vezes no decorrer do próprio desenho passa a ser outra, e antes mesmo
de completar o desenho lhe atribui outro significado.
A ideia de que a criança desenha o que sabe, e não o que vê, não é exclusiva de Vigotski, tendo sido
defendida também por Luquet, um dos mais conhecidos estudiosos do desenho infantil, que distinguiu
quatro estágios na evolução dessa atividade (CRUZ; FONTANA, 1997).
Os autores propõem que a preocupação com a correspondência do desenho à realidade revela não só
a valorização de determinado padrão estético, mas também o empenho da escola em desenvolver na
criança habilidades de observação, concentração, discriminação visual, orientação espacial e
coordenação motora.
Fazendo-se útil ao processo de conhecimento, o desenho na escola fundamental possibilita a valorização da linguagem gráfica e das habilidades e ela relacionadas, criando espaços para o seu próprio desenvolvimento e condições de interação e de realização pessoal (CRUZ; FONTANA, 1997).
15
Relatos e experiências foram apresentados na III Conferência de Pesquisa Sociocultural (2000) por
autores que estudam a aprendizagem da linguagem escrita em deficientes mentais, nos quais o
desenho se manifesta ao invés da escrita. Estes autores salientam o respeito e o valor da produção
desses sujeitos como sujeitos ativos na organização de seu próprio conhecimento, com capacidade de
relacionar e criar seus próprios meios. Trata-se de trabalhos de pesquisa históricocultural,
considerando que, independentemente do desenvolvimento humano, a inteligência e a personalidade
resultam dos processos de vida que os sujeitos estabelecem com a sociedade.
Nessa Conferência, os autores apresentam ainda, na perspectiva vigotskiana, o desenvolvimento da
criança com deficiência de forma que em cada uma de suas fases aparece algo próprio de sua
característica, sua particularidade (deficiência), característica esta separada de seu desenvolvimento,
sendo um tipo especial de desenvolvimento, e não como um desvio de medida em relação à do tipo
normal.
Destacamos que, de acordo com Reily (apud LEITE; PATROCINIO, 2000), no desenho da criança
excepcional pode haver um desenvolvimento artístico mais lento, como também pode ocorrer um
estacionamento em algum estágio, sem progresso aparente. Reily (1986) baseia-se nos trabalhos de
Luquet sobre os estágios no desenvolvimento do desenho, salientando o que ocorre em crianças
deficientes.
Para Luquet (1969), no primeiro estágio ou realismo fortuito, a criança descobre o traçado (rabisco no
papel) de forma espontânea, sem intenção de representação; após, relaciona-o a um objeto de sua
realidade. O segundo estágio, chamado de realismo fracassado, a criança começa a dar formas de
seu desenho. Desenha tudo o que vê de forma casual, sem composição dos elementos representados,
e conforme o autor é nessa fase que aparecem os primeiros desenhos da figura humana. No terceiro
estágio, realismo intelectual, a criança tem a intenção de mostrar o que sabe das coisas e não aquilo
que vê, e já demonstra conhecimento do mundo ao seu redor, e as representações aparecem com
transparência. E na quarta fase, realismo visual, característica da adolescência, passa a representar o
mais parecido possível da imagem que vê, procurando nessa composição o mais fiel da realidade,
deixando de fazer as representações gráficas infantis.
Ao lado da consistência teórica dos autores citados percebemos as contribuições que podem ser
significativas ao tema aqui em estudo – Desenho e Linguagem Escrita no Desenvolvimento da Pessoa
16
com Deficiência Intelectual. Nesse contexto, cabe a tarefa de buscar novos caminhos para a superação
de alguns obstáculos presentes na prática pedagógica da escola analisada para este estudo.
Esperamos, com este trabalho, atualização teórico-metodológica que possibilite avanços nas práticas
educativas especiais, contribuindo para que os professores possam analisar e observar o
desenvolvimento dos alunos a partir de seus desenhos, vendo nestes últimos uma representação da
linguagem escrita e não uma barreira em seu aprendizado.
Dessa forma, acreditamos que poderão buscar alguns aspectos relacionados ao processo de
construção de conhecimento e desenvolvimento do Deficiente Intelectual considerando a linguagem
escrita, especialmente o registro gráfico, interpretada por meio desenho, já que para alguns alunos é a
única forma de registro para expressar o seu conhecimento e que, muitas vezes não são valorizados
no ambiente em que estão inseridos como a escola, o meio familiar ou a comunidade.
Como cumprimento de uma das etapas do PDE, constituindo mais uma importante ação do Projeto e
com a finalidade de divulgar, socializar, aplicar e, sobretudo, contribuir com a pertinência do assunto
proposto organizamos estratégias pedagógicas capazes de contribuir para apontar caminhos viáveis
diante dessa problematização.
5. Atividade de Intervenção na escola: buscando alternativas viáveis para o trabalho de
mediação pedagógica
Inicialmente, como procedimentos metodológicos para a implementação desta pesquisa de
intervenção e mediação pedagógica do processo de ensino-aprendizagem, selecionamos um grupo de
três alunos da Escola de Educação Especial Idalba Abreu Pierin (APAE), de Tamboara, sendo dois do
Programa de Escolarização Inicial e um do Programa Iniciação para o Trabalho. A intervenção
proporcionou coleta de dados e aplicação das atividades que constam na Unidade Didática, cumprindo
o objetivo que estabeleceu relações pertinentes do desenho como forma de expressão inicial da
escrita.
Na intervenção realizada com três alunos que apresentam necessidade educacional especial, áreas de
deficiência intelectual, encaminhamos procedimentos metodológicos com a intenção de diagnosticar as
fases do desenho de cada aluno, sua relação com a linguagem oral e escrita e a capacidade de
compreensão dos conceitos. As atividades foram planejadas para atuarem na zona de
17
desenvolvimento proximal, visando a estimular ao máximo a percepção, a memória, a atenção, o
esquema corporal, a coordenação motora, a percepção espaço temporal, a imaginação, a
representação do pensamento por meio da linguagem oral e escrita a partir do desenho.
Realizamos a coleta de dados com o grupo de alunos no segundo semestre de 2008, por meio de
intervenções individuais, realizadas em encontros periódicos. Para o direcionamento dos trabalhos,
nesses encontros utilizávamos os espaços disponíveis, tais como salas da fonoaudióloga, fisioterapia
ou terapeuta ocupacional, compreendidos como ambientes favoráveis pela questão de espaço,
materiais disponíveis e mobílias adequadas.
Os alunos selecionados estavam em fase de escolarização, na idade entre 8 a 18 anos de idade,
sendo portadores de Deficiência Intelectual, prioritariamente com dificuldade no registro gráfico
segundo a norma padrão de escrita. A forma que selecionamos, no entanto, não mostra os dados em
proporção geral dos alunos matriculados na escola, tem apenas a intenção de subsidiar esta pesquisa.
A situação de intervenção destaca a intenção de observarmos fatores que impossibilitam o avanço no
processo do grafismo, com a pretensão de intervirmos no processo individual dos alunos, com as
informações coletadas facilitadoras de descobertas e avanços.
Nossa preocupação primeira é descrever e aqui especificar, de maneira sintetizada, o desenvolvimento
e os dados colhidos na prática e na mediação com os alunos, assim como nos estudos de Vigotski, o
qual preferiu estudar o desenvolvimento e uso de signos.
De acordo com a abordagem históricocultural, “a relação entre homem e meio é sempre mediada por
produtos culturais humanos, como o instrumento5 e o signo6, e pelo ‘outro’” (CRUZ; FONTANA, 1997,
p. 58-59). Para os estudos do desenvolvimento da criança, das patologias e da deficiência mental,
Vigotski baseou-se em observações e experimentação em situações variadas, podendo também ser
realizados em situações de brincadeira, de aprendizado, nas conversações informais, na escola, na 5 Enquanto o instrumento está orientado externamente, ou seja, para modificação do ambiente, o signo é internamente orientado, modificando psicológico do homem. 6 O signo é comparado por Vigotski ao instrumento e denominado por ele “instrumento psicológico”. Tudo o que é utilizado pelo homem para representar, evocar ou tornar presente o que está ausente constitui um signo: a palavra, o desenho, os símbolos... São formas de utilização de signos que ampliam nossas possibilidades de memória, raciocínio, planejamento, imaginação.
18
família ou em um ambiente clínico; logo, as origens e as explicações do fundamento psicológico do
homem devem ser buscadas em interações sociais.
O trabalho inicial desta intervenção foi realizado no segundo semestre de 2008, por meio de
levantamentos de dados históricos de matrícula e avaliação fornecidos pela equipe multidisciplinar. Em
seguida fizemos observações nas turmas e os primeiros contatos com os alunos para o
estabelecimento de vínculos afetivos. Os nomes próprios dos integrantes da pesquisa foram
substituídos por pseudônimos: Rubi, Esmeralda e Diamante, para preservar suas identidades e serem
reconhecidos como referências de preciosidades nesse processo. A partir das constatações,
planejamos as situações de intervenção, organizando-as como uma interação com os educando de
forma que as atividades realizadas durante os encontros foram registradas em desenhos, tendo como
objetivo estudarmos o processo de constituição da atividade mediada.
Rubi tem 8 anos de idade, apresenta deficiência intelectual moderada decorrente de anóxia neonatal.
O aluno apresenta atraso no desenvolvimento de linguagem, com fala ininteligível e déficit nos
aspectos semântico, fonético, fonológico e sintático. Apresenta dificuldade em estabelecer vínculos
afetivos com as pessoas, pois se distrai facilmente e necessita ser alertado constantemente na
execução das atividades. Em determinados momentos, apresenta comportamentos inadequados, foge
da sala ou das pessoas correndo sem destino, necessita de limites e vigia constante de seus impulsos.
Demonstra pouca compreensão, sem reação e expressão facial diante de situações ou emoções
diversas, dependência nas AVAS7, mas com colaboração em tais atividades. Frequenta os setores de
atendimento de Psicologia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional. Está matriculado na Educação
Especializada, turno vespertino, em uma turma com 5 alunos no total.
Durante a pesquisa, em atividades de coordenação motora simples, Rubi executava algumas
atividades, como amassar, pegar, segurar objetos, rasgar com auxílio individual. Em algumas
atividades, reconheceu e identificou em si mesmo os pés e as mãos. No momento que iniciamos nossa
intervenção, apresentou bom relacionamento e se expressou bem gestualmente, demonstrando certo
desenvolvimento em sua linguagem verbal, pronunciando palavras e fazendo tentativas de articulação
de frases completas, pois ao se envolver nas atividades escolares, quer contar os fatos ocorridos e
histórias.
No decorrer das intervenções, observamos um aumento de sua curiosidade: tudo perguntava, 7 Atividades de Vida Autônoma.
19
esperando obter resposta, a observação foi acentuada, procurava colaborar, e parou de fugir da sala.
Em atividades acadêmicas, verificamos que necessita ser estimulado para que faça tentativa de
realização. Executa ordens simples, demonstrando ter certo conhecimento dos objetos a sua volta,
como mesa, cadeira, lápis, lixo, apontador e outros. Constatamos ainda não ter adquirido noções
básicas para ler e escrever e que possui falta de memória, percepção, e dificuldade na cognição.
No primeiro momento, quando fomos observar o cotidiano dos alunos, durante a atividade de
confecção de materiais para exposição na Feira de Ciências, Rubi manteve-se sentado com olhar
disperso, calado. A professora da turma o alertava constantemente para voltar a atenção para o que
estava sendo proposto, contudo ele comunicava-se pouco verbalmente, dava respostas apenas em
forma de sons “am’”! “am”!, porém mostrou compreensão em ordens simples e ocupou-se com o que
acontecia ao seu redor.
Em nosso primeiro encontro individual, conversamos informalmente como meio de estabelecer vínculo,
e Rubi apenas respondia de forma repetitiva ao que ouvia. Falou algumas palavras pela metade ou
emitiu sons parecidos, e na sequência iniciamos a exploração de uma música sobre avião, fazendo
atividades posteriores, como ouvir novamente e dramatizar com gestos usando o próprio corpo, depois
construímos o avião e brincamos com este. Durante todo o trabalho, o aluno mostrou-se estimulado,
tentou realizar a sua maneira e a atividade foi desenvolvida para prender sua atenção.
Objetivando trabalhar a linguagem por meio do desenho, privilegiamos atividades que favorecessem o
enriquecimento do conceito. Quando falamos sobre o avião, respondia “ave-âo” – “ao”. Perguntamos:
onde voa o avião? Em resposta, apenas apontava para cima e dizia “ma” “ma” (cima). Imitou o voo do
avião. Desenhou e apontou algumas partes do avião no desenho. E quando indagamos o que havia
representado, debruçou na mesa e foi traçando e falando a sua maneira, saindo da folha e fazendo
uma linha, ao som de “ão voando lá no céu... lá em cima”. Percebemos que os dados principais não
eram as respostas dadas por Rubi, e sim os meios pelos quais chegava às respostas e as condições
em que ele construía, envolvendo, por exemplo, a linguagem, o pensamento, a memória e a
imaginação, conforme sugere a teoria de Vigotski ao tratar do processo de formação e
desenvolvimento das funções psicológicas superiores.
Em um segundo momento, confeccionamos um cartaz com colagem do avião construído e a palavra
AVIÃO. Como havia percebido anteriormente a falta de limites com relação à pintura, oferecemos
desenho do avião com contorno para colar barbante e pintura com tinta guache.
20
Necessitou de orientação quanto ao uso de tintas, pincel e organização dos materiais na mesa. Usou
as cores destacando o vermelho, o amarelo, o preto, o branco e o verde. Repetimos várias vezes
insistindo na linguagem, mostramos e pedimos para sentir nos dedos as cores, Rubi correspondia
verbalmente: vermelho dizia “elo”; preto “eto”; branco “anco”; verde “erde”. Preferia mais o preto,
quando solicitávamos outra cor de sua preferência, mostrava o preto. Esfregava o pincel em um só
movimento, em um mesmo espaço, chegando a furar a folha. Necessitou de auxílio no movimento com
o pincel e depois pintou outro avião, utilizando giz de cera. Concluímos esse encontro com o desenho
do avião nomeando a representação das partes do mesmo. 1 – “âo” – avião; 2 – “ce” – hélice; 3 – “as”
– asa; 4 – “apontou a traseira do avião” ; 5 – “dinha – rodinha; 6 – “ome” – seu nome.
Como mediadora nesse processo, percebemos a importância da interação da fala com Rubi,
incentivando, auxiliando e oferecendo materiais que melhor o auxiliassem, mas o tempo
dispensado apenas para ele ainda não foi suficiente para impulsionar o processo neste sentido:
Certos pacientes (com lesão cerebral) perdem a capacidade de agir independente do que vêem. Considerando tais pacientes, pode-se avaliar que a liberdade de ação que os adultos e as crianças mais maduras possuem não é adquirida num só instante, mas tem que seguir um longo processo de desenvolvimento (VIGOTSKI, 2003, p. 127).
Verificando a necessidade de investir ainda mais nas necessidades do educando planejamos outras
ações que atuassem ainda mais na zona de desenvolvimento proximal.
Em um terceiro momento, apresentamos diversos objetos com som inicial igual de avião “A”, com
várias repetições na linguagem oral. Fizemos colagem dos objetos seguindo o traçado “A”, formando
um cartaz. Após, pedimos que representasse os objetos colados. Durante essa atividade, percebemos
que houve maior interesse e entusiasmo. Pedimos que representasse os objetos e nessa realização e
para manter sua atenção, tivemos que repetir para ele o que era para desenhar; verbalizou: 1 – “reia” –
areia; 2 – “arrois” – arroz ; 3 – “ão” – avião; 4 – “aio” – alho; – 5 – “Ito” – apito; 6 – “urc” – açúcar; 7
– “ana” – aranha; 8 – “dor” – apontador; 9 – “im” – amendoim.
No quarto momento, mostrou-se mais expressivo, participou ativamente das atividades, contribuindo no
21
desenvolvimento das atividades. Realizou as atividades falando o tempo todo, usando o quadro8 de
desenho. “Em sua fala, – “assim tia” (agora falava de forma espontânea tudo o que fazia no quadro), e
a cada confirmação da professora, víamos o quanto se sentia estimulado a desenhar; “olha, tia, é
assim...”, “olha!”; “Uva” (chuva) tia...”; a professora: “muito bem!“. Desenhou livremente sobre textura no
quadro de desenho.
Continuamos os procedimentos em outros encontros, com intenção de desenvolver as áreas que
necessitavam serem estimuladas, como a cognitiva, motora, afetiva, emocional, imagem, esquema
corporal e acadêmica, utilizando materiais diversificados.
Esmeralda tem 13 anos, apresenta deficiência moderada, com grandes dificuldades nas atividades
acadêmicas e atraso no desenvolvimento da linguagem e cognitivo, com déficit nos aspectos
semântico, sintático e pragmático. Encontra-se em fase de alfabetização, e lê e escreve com
dificuldade, principalmente as frases simples. Demonstra em seu comportamento retraído grande
sentimento de inferioridade, e dificuldade nas relações interpessoais. É independente nas AVAS,
porém necessita de orientação, particularmente com relação à higiene e autocuidado e com seus
pertences. Frequenta a Educação Especializada Escolar, turno vespertino.
No momento em que iniciamos a intervenção, a educanda apresentava boa capacidade de
concentração e interesse pelas atividades escolares, entretanto necessitava de estímulos e auxílio
individual na execução dessas tarefas. Sua linguagem expressiva necessitava ser estimulada, devido a
sua dificuldade e trocas de fonemas na fala. Quanto à leitura, lia pequenos textos, mas nem sempre os
interpretava. Escrevia palavras simples e tinha dificuldades em pronunciar sílabas mais complexas,
bem como na organização e representação das ideias formuladas por ela (formação de frases e
pequenos textos), contudo fazia tentativas após estímulos e auxílio da professora da turma. Observa-se
timidez em seu comportamento, e necessitava ser estimulada verbalmente para comunicar-se
espontaneamente por conta de sua baixa autoestima.
Em um primeiro contato, fomos até uma sala e conversarmos sobre a escola e sobre como Esmeralda
estava se desenvolvendo; e ela respondeu, de forma retraída, “mais ou menos”. Indiretamente,
8 Quadro confeccionado pela pesquisadora, revestido com velcro, possibilita o traçado de linhas, preensão, coordenação dos movimentos; para os alunos que não conseguem utilizar o papel e o controle motor, permite a realização do desenho.
22
iniciamos propondo a brincadeira com o jogo: Trilha de letras.9 Exploramos oralmente a ilustração de
cartela e explicamos as regras do jogo. Durante o jogo, Esmeralda participou sem muita empolgação,
mas pronunciava as palavras com que iniciava as letras. Mostrou trocas de letras com de bola, v
(vaca), k (caneca), e após duas rodadas, pedíamos a Esmeralda que repetisse as palavras que falara
durante o jogo, e registramos a sequência das palavras, que foram 1 – abelha; 2 – ovo; 3 – xícara; 4 –
tatu; 5 – prato; 6 – mágico; 7 – faca; 8 – ovelha.
Quando solicitada para registrar em forma de desenho, deixou de registrar alguns elementos. No final
manteve-se calada, mas percebemos certa satisfação em conseguir concluir a atividade proposta.
Em um segundo momento, por meio de conversa dirigida relativa às brincadeiras desenvolvidas no
encontro anterior; perguntamos de quais brincadeiras também gostava. Demorou para responder, se
mexia, abaixou o olhar e respondeu: “brincar de bola” e parou de falar. A professora da turma interveio,
também indagando: “Que outras brincadeiras?”; “Hein?; “Você brinca de outras brincadeiras?”;
“Quais?”, ao que a aluna demorou para responder. Esmeralda disse: “boneca!”. E novamente a
professora da turma interveio: “fala mais duas”, Esmeralda disse: “escolinha”, “esconde- esconde”; e
professora insistiu: “Qual mais?”. Esmeralda respondeu “barata”, “pula-corda”. Em seguida, pedimos
que representasse, por meio de desenho, o que falou. Esmeralda desenhou de forma silenciosa: 1 –
bola, 2 – boneca, 3 – escolinha, 4 – esconde-esconde, 5 – barata, 6 – pula corda.
Novamente pedimos que escolhesse a brincadeira que mais gostava e realizasse o desenho; como já
tem noção gráfica da escrita, pedimos-lhe que escrevesse algo sobre a brincadeira, e Esmeralda
representou livremente a brincadeira “escolinha”, registrando: “ESCONHA A ESCONHA PARA
ESQUER VERE”.
Representou uma ideia (frase) com palavras unidas, faltando letra. Percebemos que quando são
palavras soltas, Esmeralda as registra com mais acerto, porém quando se trata de organização de
ideias relacionando mais elementos, apresenta dificuldade, necessitando da mediação oral para fazer-
se entender. Esmeralda demonstrou maior motivação na realização do desenho; na escrita demorou a
registrar, olhava para os lados, perguntava, resistiu a escrever.
Observamos, nesse encontro, a necessidade de intervir no processo de desenvolvimento de Esmeralda
9 Possibilita associar a letra aos conceitos; linguagem oral;orientação espacial e temporal; discriminação visual e auditiva; alfabetização.
23
pela dificuldade de organização de ideias e sua representação. Para tanto, planejamos atividades para
contribuir em seu desenvolvimento.
No terceiro dia, Esmeralda manteve-se calada, de cabeça baixa. Iniciamos informalmente, falando do
dia a dia na escola, como se ela estivesse participando normalmente, para que Esmeralda se
descontraísse. No entanto, continuou calada, não respondendo. Quando viu o material, olhou com
interesse e começou observar o livro silenciosamente e em alguns momentos distraía-se e lia alto.
Deixamos como se tudo estivesse normal enquanto organizávamos o material para iniciar. Esmeralda
apenas respondia com a cabeça para afirmar algo, como para as perguntas “você já conhece essa
história?”; “Já ouviu?”; “Gostou?”.
Ouviu a história do CD com atenção e em silêncio, não reproduziu oralmente quando inquirimos: “O
que entendeu da história?”. Após insistência e estímulo oral, falou que havia representado 1 –
Rapunzel ; 2 – príncipe; 3 – a flor com espinhos que furou o olho do príncipe; 4 – sol; 5 – nuvem.
Nesse dia, nosso trabalho teve de ser interrompido, pois Esmeralda tinha aula de canto (coral da
escola), a acompanhamos e observamos que ela também participou da aula de forma retraída, e
quando alguém se dirigia a ela, não dava retorno.
Na sequência, demos continuidade à reprodução da história Rapunzel, já que no dia anterior esta havia
sido interrompida. Esmeralda recusou-se a sair de sala; mas depois acabou concordando. Apresentou-
se calada, não querendo participar. Com muitos estímulos orais, deu início, relembrando de algumas
partes da história. Pedimos que escrevesse da maneira que ela consegue, verificamos que se retraiu
mais e ficou resistente novamente para realizar a atividade, porém acabou registrando: “ABUXA DEU
LAVICO DONTE PARA BECAR”; “RABOZER FELIZ PARA ZEBRE”; ”LELE FICO CEGO MAIS A BUXA
CAIU”;”ABUXA LEFV AMIMENA”. Reescrita: A BRUXA ELA FICOU DOENTE SEMPRE; PEGAR
RAPUNZEL; RAPUNZEL FELIZ PARASEMPRE; ELE FICOU CEGO MAIS A BRUXA CAIU; A BRUXA
LEVOU A MENINA. Não deu tempo de continuar, fomos interrompidos novamente pelo ensaio do coral.
Nesse dia, a produção de Esmeralda apresentou registro gráfico sem sequência ou sentido, e
acrescentou fatos inexistentes na história, enquanto que no desenho representou com maior sentido os
personagens, dando vida a sua representação, o que não aconteceu na grafia das letras.
Em um quinto momento, demonstrou mais participação e mais estímulo, e pedimos que lesse sua
24
produção anterior e ela a leu de forma soletrada, sem entender bem, no entanto quando perguntamos
se estava tudo certo, respondeu: “já”. Explicitamos a atividade com exemplos do texto da história de
Rapunzel e Esmeralda retornou a história, apresentamos a sequência e a organização das ideias do
texto, citamos outras.
Apresentamos material denominado frase fatiada da história10, pedimos que observasse e organizasse
a frase de acordo com a história. Ficou olhando, manuseou cada palavra, demorou para iniciar, e
depois de vários estímulos verbais fez uma tentativa e disse: “é assim!”. Não estava correto. Pedimos
que encontrasse na história onde estava a frase, achou parecido (porque não preparamos idêntica da
história), e conseguiu ordenar a frase. Na sequencia, pedimos-lhe para escrever a frase (sem ver a
escrita), e esta respondeu que não sabia. Repetimos oralmente, e na primeira tentativa não soube
escrever, pegou a frase para copiar, e quando falamos para escrever sem olhar, não quis mais
escrever.
Pedimos-lhe que desenhasse a frase, e na primeira tentativa tivemos que repetir, desenhou um casal e
mais uma pessoa, tivemos de intervir explicando que a frase era sobre um casal de camponeses
vizinhos de uma bruxa. Indagamos: “Quem era esse outro?”, ao que Esmeralda respondeu: “era o cego
da história” (príncipe). Explicamos-lhe que a frase não falava do príncipe, mas mesmo assim
respondeu: “É o filho da bruxa”. Perguntamos, “e na história apareceu o filho da bruxa?”; “E na frase
que estamos representando?”; “Então, temos que representar o que fala na frase”.
Esmeralda apagou esse desenho. Desenhou novamente, insistimos para que escrevesse, porém
demonstrou resistência e disse que não sabia. Repetimos verbalmente as palavras da frase bem
devagar e Esmeralda escreveu, apagou, às vezes olhava esperando ajuda ou respostas que a
auxiliassem mais e escreveu: “ABUXADEU LA VICO DONTE PARA BECAR” “RABOZER FELIZ PARA
ZEBRE.” “LELE FICO GEGO MAIS A BUXA CAIU” “ABUXA LEFV AMIMENA”. Pedimos que
desenhasse e desenhou, representando Rapunzel, a bruxa e o príncipe, enquanto que na escrita
grafou errado o nome e acrescentou outro elemento.
Apresentamos outra frase fatiada com elementos da história, “O CAMPONÊS FOI BUSCAR
RABANETES NO QUINTAL DA BRUXA”. Esmeralda demorou a entender a organização da frase, fez
várias tentativas, necessitou de várias intervenções e mediação da professora da turma e, em uma das
tentativas, sua frase ficou assim,” FOI BUSCAR O CAMPONÊS QUINTAL DA BRUXA” , deixou de lado 10 Um casal de camponês era vizinho de uma bruxa.
25
a palavra “RABANETES”, realizou outras tentativas, pediu o livro, porém mesmo assim não conseguiu,
e depois de várias intervenções e mediação concluiu espontaneamente, todavia, não na ordem correta,
e quando questionada, respondeu: “tá certo assim...” Após repetição da frase pela professora, acabou
concordando e fez a tentativa da escrita “O COPISE FOI BUSCAR RASERER XUXA”, e nesse registro
o que chamou atenção é que fez letra cursiva; depois desenhou.
Continuamos investindo nas produções de Esmeralda, possibilitando o processo de seu
desenvolvimento da linguagem oral, a imaginação, a organização do pensamento, a reprodução oral e
por meio de desenho dos personagens e ações da memória espacial e temporal, oferecidas por meio
de vários instrumentos de apoio planejados de formas intencionais, a partir de diversos gêneros
textuais, com uso de variados recursos, como textos e frases fatiadas, quadro revestido com velcro,
meio pelo qual os conceitos mediados se fixam, permitindo o melhor manuseio bem como o melhor
desenvolvimento.
Diamante tem 18 anos de idade, apresenta disartria decorrente de paralisia cerebral por anóxia
neonatal. Por esse motivo sua fala é ininteligível a maior parte do tempo e apresenta também uma
intensa sialorreia, déficit motor e de linguagem. A locomoção e o equilíbrio são conseguidos com
dificuldade, assim, todas as atividades que exigem habilidades motoras são afetadas, porém tem boa
compreensão, pois seu cognitivo é preservado. Na área acadêmica encontra-se em processo de
alfabetização. Produz frases e pequenos textos oralmente, entretanto demora para verbalizar de forma
compreensível e no registro faz tentativa, mas necessita de muito tempo e esforça-se para concluir. É
uma aluna que falta com frequência em todos os setores de atendimento na escola. Encontra-se na
turma Iniciação para o trabalho, turno vespertino.
Tem seu cognitivo preservado. Na área acadêmica é desenvolvido, no entanto, seu registro gráfico não
é legível devido aos sérios comprometimentos motores. Diamante necessita de instrumentos
adaptados que visam ao empenho de mobilidade do tônus e equilíbrio. Também apresenta intensa
sialorréia11, sua fala é ininteligível e necessita de tempo e calma para expressar-se e fazer-se entender.
Na preensão de lápis ou objetos que envolvem movimentos de pinça precisa de adaptador para facilitar
e ajudar em seus movimentos.
Nos encontros, mostrou-se cooperativa e empenhada em desenvolver o que era proposto e
demonstrou preocupação em realizar as atividades. No primeiro momento, iniciou conversa espontânea 11 Abundância de salivação.
26
para estabelecer vínculo. Devido aos seus limites motor e fonoarticulatório para expressar-se, esforça-
se imensamente retorcendo-se, principalmente em sua expressão facial e membros superiores e
inferiores, tentando fazer gestos para falar o que pensa. Apresentamos o Jogo Trilha de letras. Durante
a realização do mesmo, participou ativamente, interagindo verbalmente, compreendendo o objetivo do
jogo, concluindo com sucesso, se considerarmos suas limitações.
Quando convidada a representar as palavras ditas durante a rodada, quis negar, dizendo não
conseguir. No entanto, com estímulos e elogios, representou as palavras, mas manteve a preocupação
em errar: 1 - HOMEM ; 2 - CEBOLA; 3 - TAMIRES; 4 - NAVIO.Também fez registro gráfico. A
seqüência das palavras orais foi: “1 – homem”; “2 – dedo”; “3 – janela”; “4 – Tamires”; “5 – ovo”; “6 –
hospital”; “7 – navio”; “8 – cebola”.
Em um segundo momento, iniciamos uma conversa dirigida. Indagamos: “o que comemoramos no mês
de agosto?” Diamante respondeu: ”a semana do excepcional”. A professora da turma interveio dizendo:
“isto mesmo, mas também comemoramos o folclore”. E a professora continuou: “O que é folclore?”.
Diamante, com muito esforço na articulação da fala, respondeu: “é lenda”. A professora elogiou: “muito
bem, a lenda faz parte do folclore, temos outros usos e costumes que também fazem parte de nosso
folclore, como...”.
Dramatizamos algumas músicas e adivinhas e, em seguida, apresentamos uma coleção ilustrada com
várias lendas, pedindo-lhe que escolhesse a que mais gostava para ouvirmos no áudio. Li a lenda Saci-
Pererê, e Diamante reproduziu oralmente a história, com dificuldade, necessitando de muito tempo
para concluir verbalmente. Posteriormente, solicitamos que registrasse em forma de desenho o que
sabia da lenda.
Durante a reprodução, falou que tinha um problema, não conseguia desenhar, e após incentivo, disse
que tentaria fazer como sabia. Fez e falou que representou o saci, o saci na garrafa e o cavalo
correndo do saci para não amarrar sua crina. No momento em que pedimos para escrever, teve
preocupação com a grafia correta e fez perguntas como: “correndo é com dois R?”; “Saci escreve com
C”. Diamante gosta muito de conversar, fez várias perguntas pessoais à professora da turma, e
interagiu oralmente com a professora o tempo todo.
Diamante continuou cooperativa e estimulada a participar de nossos encontros, interagindo dentro de
suas possibilidades. Apresentamos a coleção de história de sua preferência. Escolheu Rapunzel. Ao
27
ouvir a história no áudio, manteve-se atenciosa e envolvida. Na sua reprodução oral, contou a história
com todo o seu comprometimento de linguagem (de forma lenta, necessitando de tempo até concluir
seu pensamento, sendo necessário pedir-lhe que repetisse o que queria dizer, por não
compreendermos sua fala). Para realizar o registro e desenhar o que havia entendido da história, com
uso de pincel e tinta, iniciou, mas precisou de orientação com os materiais e posição dos mesmos, já
que não equilibrava os objetos, deixava cair o papel, que não parava na mesa. Pediu um lápis para
desenhar primeiro e depois pintar. Durante sua produção, pediu cores que não tinha. Solicitamos-lhe
que fizesse misturas das cores, e fez. Na conclusão do desenho, indagamos o que desenhara e
respondeu: “1 – Torre, o castelo”; “2 – Rapunzel”; “3 – príncipe”; “4 – a flor que furou o olho do
príncipe”; “5 – A árvore; “6 – O chão”.
Perguntamos que entendera da história ou os valores e atitudes que representa para ela. Respondeu,
com muito esforço na fala, “eu entendi que a gente tem que ser boa para os outros serem bons para
nós”. “Devemos ajudar uns aos outros”.
Em um quarto momento, intensificando sua linguagem oral e treino gráfico, retornou a história
Rapunzel. Ouviu novamente a história com bastante atenção. Em seguida, pedimos-lhe que
escrevesse a história, e iniciou com muita dificuldade no uso do lápis e no firmar a folha na mesa.
Escreveu lentamente e, a todo o momento dizia: “não me lembro, não sei o que aconteceu”...
Tinha preocupação em escrever a grafia correta e perguntava “é com R, RR, Ç ou S”. Percebemos que
consegue memorizar e tem noção da produção de um texto, mas necessita de mediação oral
constante, retomando o que havia escrito. Como demora muito tempo, não terminou nesse dia.
No quinto momento, tentou retornar a escrita, porém nesse dia estava acontecia na escola o Dia da
Beleza, e Diamante disse que não estava bem, estava sentindo dores. Muito educada, pediu desculpas
a sua maneira. No encontro seguinte, Diamante continuou cooperativa e interessada, ilustrou a história
do dia anterior, mostrou-se preocupada com a estética e a limpeza de folha, porque devido a sua
salivação, molha o papel, sujando-o quando força seus movimentos no mesmo. Realizou a escrita a
sua maneira. Devido a outras atividades do cotidiano escolar e à ausência de Diamante na escola,
demoramos para nos encontrar novamente. Demos sequência às atividades da história e Diamante
continuou demonstrando o mesmo comportamento cooperativo. Ouviu com atenção, leu a sua maneira,
e a professora da turma sempre demonstrou respeito por seus limites de linguagem. Em seguida, com
o uso do quadro com velcro, organizou a letra da música sobre a história da Rapunzel. Na tentativa, fez
28
troca de um verso, mas logo percebeu e fez corretamente.
Pedimos-lhe que reproduzisse por escrito a música sem olhar a letra. Diamante perguntou se a palavra
Rapunzel no final é “U” ou “L”. Respondemos o correto. Teve dúvida na palavra, se era perto ou
pertinho, e respondemos “pertinho!”. Percebemos a má postura de seu corpo ao sentar e ao escrever,
procuramos orientá-la para a postura correta. Durante toda a produção salivou muito, encostava a
cabeça muito próxima da mesa, parava, pensava, olhava-nos. Indagamos: “sabe continuar?” Afirmou
que “sim”. Novamente parou e perguntou: “trança é com Ç”; confirmamos, e ela deu continuidade.
Demorou em torno de 25 minutos para escrever os 6 versos12 curtos da música, apresentando boa
memorização. Realizou a escrita como consegue, contudo trocou torre por montanha. Solicitamos-lhe
que desenhasse a música, e desenhou e disse “1 – montanha”; “2 – Rapunzel”; “3 – janela; “4 –
príncipe”. Após a conclusão, a professora fez intervenções na elaboração do desenho, para que este
apresentasse melhor desempenho e compreensão.
6. Avanços e dificuldades no trabalho proposto com os alunos
Nas situações de intervenção com Rubi, analisamos alguns aspectos de sua linguagem, a forma como
interage com o meio social, a compreensão, a ausência de conceitos e o modo de representação
internalizado por ele.
Ao considerarmos sua fala que ainda não está internalizada, entendemos com Vigotski (2003, p. 33-36)
que a linguagem oral adquire uma importância tão vital que, se não for permitido seu uso, as crianças
pequenas não são capazes de resolver a situação durante o processo mediato. Com Rubi, a fala foi
objeto central para distinguir as ações e as soluções mais elaboradas. Durante os encontros, na
relação entre o uso de instrumentos, a fala afeta várias funções psicológicas, em particular a
percepção, as operações sensório-motoras e a atenção, sendo que cada uma delas é parte de um
sistema dinâmico de comportamento. Vigotski afirma que a representação simbólica primária deve ser
atribuída à fala e que utilizando-a como base, todos os outros sistemas de signos são criados.
Identificamos nos desenhos de Rubi o primeiro estágio do desenho, denominado realismo fortuito.
12 Rapunzel, Rapunzel No alho de uma torre... Tão pertinho lá do céu Rapunzel, Rapunzel Jogue suas tranças Que eu te levo pão e mel!
29
Nessa etapa, pelo traçado, as produções criadas mostram o prazer do gesto e da necessidade de
repetição. No entanto, à medida que Rubi faz associação de gestos e traços, ele desenvolve sua
atividade mental, sendo capaz de antecipar o que vai desenhar, diferenciando de suas produções, ou
seja, o seu rabisco exprime sua realidade, possui intencionalidade. Neste sentido, na análise de
Vigotski, esses fatos nos fornecem os elementos para passarmos a interpretar o desenho das crianças
como um estágio preliminar no desenvolvimento da linguagem escrita.
No desenvolvimento subsequente do desenho das crianças, há um momento crítico na passagem dos
simples rabiscos para o uso de grafias, como sinais que representam ou significam algo. Há uma
concordância entre os psicólogos que a criança deve descobrir que os traços feitos por ela podem
significar algo.
Tivemos oportunidade de observar, nas representações de Esmeralda, como o desenho das crianças
se torna linguagem escrita real, quando na atividade de formar frase com palavras fatiadas e desenhar
a aluna montou: “um casal de camponês era vizinhos de uma bruxa”, e depois desenhou a figura de um
casal e outra figura feminina com um chapéu grande de “bruxa”.
Os estudos de Vigotsky possibilitam a análise de que Diamante e Esmeralda, ao desenharem objetos
complexos, não o fizeram pelas suas partes e componentes, e sim pelas suas qualidades gerais. A
representação dos personagens da história, os complementos ou adereços da cena mostram
significados complexos, assim como a representação escrita.
Para dominar esse código, as crianças necessitam trazer dois eixos básicos: codificação e
decodificação. Esta última se dá pela decomposição de elementos que se centram em fonemas e
sinais gráficos. As crianças que apresentam condições desfavorecidas, como as singularidades de
Rubi, Esmeralda e Diamante, demoram mais para adquirir domínio desse código, e esse fato, no
ensino regular e mesmo no ensino especial, necessita ser trabalhado com outro olhar, considerando
outras formas de registro, como o desenho. Vigotski (2003, p. 157) enfatiza que o que deve ser feito é
ensinar às crianças a linguagem escrita, e não apenas a escrita das letras.
A presente pesquisa contou com reflexão e discussão teórica e prática sobre todo o processo aqui
descrito, realizado junto aos professores da escola especial citada, para assegurar e consolidar a
compreensão de nossa realidade a partir dos dados diagnosticados. Foi também organizado
coletivamente um plano de ação para a prática de mediação visando ao desenvolvimento da linguagem
30
escrita por meio de desenho com os alunos de cada professor da escola. Os estudos e a prática do
grupo seguiram as mesmas bases teórico-metodológicas da pesquisa.
O grupo identificou a importância do trabalho do professor para realizar a mediação pedagógica na
alfabetização dos alunos com deficiência intelectual, com ênfase na valorização do desenho, e durante
esse processo conseguimos sistematizar as reflexões acerca da problemática o domínio do código
formal escrito, considerando o desenho como possibilidade inicial de expressão escrita. A partir de
estudos realizados acerca do desenvolvimento do grafismo infantil compreendemos que nenhuma
produção gráfica da criança pode ser considerada um conjunto de rabiscos, ou desenhos desprovidos
de significações. É a forma de representação pela qual a criança manifesta sua visão de mundo,
inserida em um contexto sociocultural e dotada de um determinado nível de desenvolvimento.
Entendemos que o desenho da criança poderá ser considerado não apenas como uma modalidade de
expressão ou de representação de “realidade”, mas também como o resultado de atividade intencional
envolvendo aspectos cognitivos emotivos.
Este plano veio ao encontro da necessidade do professor em planejar procedimentos metodológicos
oportunizando ao aluno a expressão das potencialidades que mais se destacam na Educação Especial
que é o desenho e, por meio deste, o professor poderá explorar a escrita inicial de forma lúdica e
prazerosa. Observamos que, durante a implementação, houve mais interesse, criatividade e os alunos
puderam se expressar e mostrar o que foi aprendido durante o trabalho, através dos materiais
produzidos. Enfim, o trabalho realizado proporcionou aos educadores um conhecimento amplo sobre a
utilização do desenho no trabalho de ensino da linguagem escrita.
O estudo empírico, a revisão bibliográfica e o trabalho teórico prático na escola demonstram que as
questões relativas ao desenho na alfabetização dos alunos com deficiência intelectual estão
estreitamente relacionadas.
Frente às possibilidades apontadas, o registro deve ter significado para os educandos, de que uma
privacidade interior dever ser alertada nelas e escrita apropriada a uma execução necessária e
influente para vida.
Um dos aspectos que precisamos salientar como importante é o papel que concedemos o contexto no
qual foram realizadas as intervenções, já que levamos em consideração os diferentes sujeitos e as
situações em que estão envolvidos; escolas; professor; o aluno; estratégias de ação e recursos
31
pedagógicos, bem como a elaboração conjunta de planejamentos a partir de metas estabelecidos
quanto às capacidades esperadas em cada patamar de aprendizagem.
Assim, uma importante conquista serão as ações desenvolvidas pelo sistema de ensino, com propostas
efetivamente voltadas para as condições de trabalho do professor; ampliação do tempo destinado para
as atividades de planejamento, e garantia de sua formação continuada, na perspectiva valorizada na
proposta por nós apresentada.
Todo investimento supracitado na realização dessas atividades envolve tempo; o tempo de seu
planejamento, o tempo de sua preparação, o tempo de acontecer no momento da aula, quando está
diretamente com as crianças, o tempo a ser assegurado para as intervenções. São inúmeras as
solicitações com as quais nos deparamos em nosso cotidiano: das famílias dos alunos, das campanhas
e dos projetos sociais com informações sobre saúde, alimentação higiene, trânsito, violência e
comportamento, que parece não nos sobrar tempo para investir nas questões pedagógicas.
Reiteramos que a escola desempenha um papel fundamental com a deficiência intelectual, pois é sua a
função de realizar um trabalho pedagógico de qualidade, no sentido de desenvolver as potencialidades
e explorar as habilidades e os talentos intelectuais de um público especial.
REFERÊNCIAS
ARNAL, L.S.P. Educação Escolar inclusiva: a prática pedagógica nas salas de recursos. Dissertação de Mestrado, UEM, Maringá, 2007. Disponível em: www.ppg.uem.br. Acesso em 20de março 2008. AZENHA, M. D. G.. Imagens e letras, Ferreiro e Luria, duas teorias psicogenéticas. 2. ed. São Paulo: Ed. Ática,1996. BRASIL. Ministério da Educação. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei n. 9394/96, 1996. CRUZ, N. FONTANA, R. Psicologia e trabalho pedagógico. São Paulo: Atual, 1997. FENAPAES. Federação Nacional das APAES. APAE Educadora: a escola que buscamos. Brasília, 2001. ______.Federação Nacional das APAES. Manual de pais e dirigentes: uma parceria eficiente. Disponível em >http: www?a=2. Acesso em 20 de jun. 2008.
32
GOULART, A.M.P.L. GHUR, M.L.P. MORI, N.N.R. Mediação em Feuerstein: alguns elementos para compreensão das diferenças individuais. In: Teoria e prática da educação. Maringá, v. 2, n. 4, p. 93-103, junho 2001. KASSAR, M.C.M. Retrospectiva e perspectiva da educação especial no Brasil. In: Teoria e prática da educação. Maringá, v. 2, n. 4, junho 2001. LEITE, L.B. PATROCINIO, W.P. O desenho e suas relações com a linguagem escrita em alunos portadores de deficiência mental. In: III Conferência de pesquisa sócio-cultural. 2000, Campinas, São Paulo. Disponível em: http://www.fae.unicamp.br/br2000/indit.htm. Acesso em 23 março 2008. MATOS, S.R. Educação, cidadania e exclusão a luz da educação especial, retrato da teoria e da vivência. In: Revista nossos meios. Dez 2003. Disponível em > http://200.156.28.7/nucleus/média/common/nossos_meios_RBCRevDez2003_artigo_2.rtf.Acesso:em18de jun.2008. PARANÁ. Secretaria de Estado de Educação. Superintendência de Educação. Ensino fundamental na rede pública de ensino da educação básica do Estado do Paraná. Curitiba: SEED/SUED, 2005. ______Deliberação nº 02/03.Conselho Estadual de Educação. Curitiba, 2003. ______.Departamento de Educação Especial e Inclusão Escolar. Problemas de aprendizagem identificados no cotidiano escolar: deficiência intelectual, dificuldades de aprendizagem e distúrbios de aprendizagem. Curitiba, 2007. ______. Diretrizes Curriculares da Educação Especial para construção de currículos inclusivos (documento preliminar). Curitiba. SEED/SUED/DEE, 2006. Projeto político pedagógico. Escola de Educação Especial Idalba Abreu Pierin. Tamboara, 2007. QUEIROZ, V.D.S. A psicologia históricocultural e sua contribuição para a educação do portador de deficiência mental. Intermeio: Revista do Mestrado em Educação. Campo Grande, v.11, n.22,2005. Disponível em: www.diadiaeducação. sc. gov.br/arquivos_pdfs/PC-SC_educação_especial.pdf.Acesso em 24 maio 2008. RODRIGUES, E.; ROSIN, S. (ORG.). Infância e práticas educativas. UEM. Maringá; 2000.
Recommended