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DIVERSIDADE DE SOLUÇÕES PROJETUAIS DE NOVOS PROJETOS DE HABITAÇÃO COLETIVA
Sidnei J. Guadanhim(1); Milena Kanashiro (2); Rafaela Simabukuro(3)
(1) Universidade Estadual de Londrina, Mestrado em Metodologia de Projeto, e-mail: sjg@uel.br; (2) Universidade Estadual de Londrina, Mestrado em Metodologia de Projeto, e-mail: milena@uel.br; (3) Universidade Estadual de Londrina, Bolsista de IC/IS, e-mail: rafa_simabukuro@hotmail.com
RESUMO A estabilização da economia brasileira possibilitou que a construção civil passasse por um duradouro período de aquecimento na década de 2000, cujos reflexos são visíveis da habitação social à de luxo. Observa-se uma perpetuação de modelos consagrados, marcada pela inclemente e monótona repetição. Cenário particularmente diverso é observado na Europa. O trabalho foi norteado por três diretrizes principais: (1) seleção de projetos representativos de 1990-2010; (2) exemplos que permitissem a identificação de características arquitetônicas aplicáveis no Brasil, até no máximo oito pavimentos e (3) propostas já construídas. Com este recorte, esta pesquisa discute temáticas relativas à diversidade de tipos das unidades habitacionais e os arranjos de circulação. Há uma grande diversidade de configurações das unidades habitacionais. Dos 21 conjuntos analisados, 20 apresentam variações nos tamanhos, plantas, tipos e número de dormitórios e arranjos diversificados. Mais de 70% apresentam uma relação abaixo de quatro apartamentos por circulação vertical (1:4) e, destes, 11 exemplos – mais de 50% da amostra – têm relação abaixo de 1:3. E, verifica-se grande variação nas soluções adotadas para as circulações verticais e horizontais. É possível antever a melhoria da habitação coletiva mediante alterações relativamente simples nas estratégias de projeto, pois, não há diferenças substanciais em termos de distribuição interna das unidades e, observa-se em ambos cenários a preocupação com a racionalidade e otimização das áreas construídas. ABSTRACT The stabilization of the Brazilian economy has enabled the growing of the construction in the last decade, whose reflections are visible from public housing to luxury. However, there is a perpetuation of monotonous repetition pattern, nonetheless a reverse scenery is observed in Europe. This study defined three approaches: (1) representative projects from 1990 to 2010; (2) examples with architectural features applicable in Brazil (a maximum of eight floors) and (3) built collective housing. The research discusses issues related to diversity of housing units and the arrangements of stairs and corridors. The analysis showed that there is a variety of arrangements of the housing units. From the 21 analyzed projects, in 20 it was observed a variation in size, plants, types and number of bedrooms and a diversity of arrangements. Over 70% have a ratio below four apartments per vertical circulation (1:4), and of these, 11 examples - more than 50% - have ratio below 1:3. It was verified a various strategies for vertical and horizontal circulation. It is possible to improve the spatial quality by relatively simple design strategies considering that there were observed no substantial differences, in terms of units and internal distribution, and concerning the issues of rationality and optimization.
2
1. INTRODUÇÃO
A estabilização da economia brasileira, iniciada em meados da década de 1990
possibilitou que a construção civil passasse por um importante e duradouro
período de aquecimento na década de 2000. Reduções de juros,
financiamentos públicos e programas habitacionais oficiais, bem como o
aumento do poder aquisitivo incrementaram significativamente a produção de
habitação. Tal crescimento é verificado da habitação social à de luxo.
Entretanto, observa-se uma perpetuação de modelos consagrados quanto ao
atendimento de exigências orçamentárias, porém com características
construtivas e tipológicas conservadoras, marcadas pela inclemente e
monótona repetição.
Por outro lado, no cenário internacional, particularmente o europeu, onde a
estabilidade e o progresso econômico vêm de mais tempo, as últimas duas
décadas foram extremamente férteis na produção de exemplos de habitação
coletiva que não se limitam a repetir o modelo de origem racionalista do pós-
guerra, ao contrário, apresentam uma experimentação formal, espacial e
tipológica bastante rica, cujos exemplos buscam valores superiores e
imateriais, como identidade, legibilidade e criação de “lugares” – muito além do
simples atendimento da demanda, produzindo espaços urbanos ricos e
diversificados.
2. FUNDAMENTAÇÃO E CONTEXTUALIZAÇÃO
A partir da maturidade econômica após décadas de investimento e
desenvolvimento, estabilização demográfica e política, diversas iniciativas
governamentais e supranacionais estabeleceram metas na direção da
requalificação das cidades, promovendo o acabamento do cenário construído
existente1. (BENEVOLO (2007), p. 31). Embora o cenário europeu seja diverso
de todo o restante do mundo, e, principalmente, do brasileiro,
1 Dentre os diversos documentos produzidos, destacam-se: Leipzig Charter, The Fifth National Policy Documento n Spatial Planning (Holanda), CABE Housing Audit e Planning Policy Statement 3 (Reino Unido). (CLEMENTE; DEMATTEIS, 2010; COUSINS, 2009).
3
“a metodologia européia para o aperfeiçoamento do seu sistema de
assentamento permanece uma contribuição aplicável em qualquer lugar, um
corretivo, aliás, para conseguir que as grandes transformações quantitativas
sejam acompanhadas em todo lugar de um devido cuidado qualitativo. (...) A
adaptação aos contextos urbanos, a familiaridade com que as relações
espaciais em escala intermediária, que a tradição confere à “arquitetura”, (...)
marcam até agora a cultura arquitetônica européia e estão na base da sua
ressonância internacional”. (BENEVOLO, 2006, p. 33)
Um olhar sobre as experiências estrangeiras do período correspondente às
duas últimas décadas aponta, no campo da habitação coletiva, para projetos de
“recuperação urbana” ao contrário dos novos conjuntos das décadas de 1920-
30 e dos programas de expansão do pós-guerra. São intervenções qualitativas
nas cidades, como inserção de prédios em quadras já configuradas ou em
brownfields que exigem intervenções em paisagens urbanas pré-existentes,
cuja abordagem requer respostas ao entorno imediato e à geografia local
(FRENCH, 2009, p. 193).
Periódicos, livros e websites especializados têm disseminado amplamente essa
arquitetura contemporânea cujas características facilmente superam, em
termos qualitativos, a produção nacional do período.
Nesses países, assim como tende a ocorrer no Brasil, comunidades cada vez
mais diversificadas não desejam simplesmente edifícios repetidos com apenas
um tipo de planta. Na Europa, projetos flexíveis no sentido de poder acomodar
as constantes mudanças que ocorrerão nas vidas e nas famílias dos
moradores ao longo da vida útil do apartamento têm levado os arquitetos a
experimentarem novos esquemas de planejamento, novas formas urbanas e
reinterpretações de tipologias tradicionais e modernistas. (FRENCH, 2009, p.
193) Tais transformações representam a materialização de preocupações e
teorias iniciadas há cerca de 50 anos, no período pós-modernista, frente ao
fracasso da aplicação pura e simples da produção de habitações em série.
Um rápido levantamento nos principais veículos de disseminação da
4
arquitetura brasileira demonstra a incipiente pesquisa e desenvolvimento da
habitação coletiva no Brasil, apesar de iniciativas pontuais como a promoção
de concursos de projetos e idéias. É possível perceber alguns raros e isolados
esforços de empreendedores, construtoras e arquitetos, no sentido da
qualificação do projeto da habitação coletiva, o que indica potencial para
transformações no cenário nacional. Esse tema é atual diante do grande
volume de recursos injetados no setor, grande parte de origem pública.
Evidentemente, há que se considerar fatores importantes no Brasil que
limitaram o salto qualitativo observado em países mais desenvolvidos, tais
como a grande demanda reprimida em décadas, o limitado poder aquisitivo da
população e a redução da classe média ao longo de décadas, os elevados
custos indiretos do setor produtivo brasileiro, o subdesenvolvimento da
industrialização e racionalização da construção civil, entre outros, mas,
guardadas as ressalvas e as diferenças climáticas, cumpre analisar
cuidadosamente tais exemplos recentes que, sem dúvida apresentam
qualidades importantíssimas para os moradores e para a cidade onde são
implantados É possível supor, dentro da nova realidade econômica brasileira, a
existência de vasta margem para melhoria da habitação coletiva no Brasil
Como referência, Jacobs e Appleyard (1987) apontam cinco características
físicas que aderem qualidade ao espaço: (1) insolação, ar puro, vegetação,
espaços públicos e escala espacial adequada dos edifícios, conforto sonoro e
segurança; (2) certa densidade demográfica mínima e intensidade de uso das
ruas; (3) integração entre atividades cotidianas relativamente próximas; (4)
espaços públicos definidos pelas edificações, e que priorizem os pedestres e
(5) diferentes edificações e espaços com estruturas inter-relacionadas. (HALL
apud KANASHIRO, 2004). É fácil verificar tais preocupações nos projetos
europeus recentes e, ao contrário, enormes equívocos projetuais nas cidades
brasileiras no mesmo período.
3. MÉTODO
O trabalho de pesquisa foi norteado por três diretrizes principais: pela
5
preocupação em selecionar, com abrangência internacional, projetos
representativos de um período recente extenso (1990-2010); pela busca de
exemplos que permitissem a identificação de características arquitetônicas
positivas eventualmente aplicáveis no Brasil, limitando a amostra a edifícios e
conjuntos com, no oito pavimentos no máximo, uma vez que torres verticais
não são objeto de interesse nesse momento; e considerar apenas propostas já
construídas, passíveis de visitação, mesmo que em momentos posteriores.
Desenvolvido basicamente a partir da pesquisa bibliográfica, o trabalho buscou
identificar e compreender exemplos recentes de habitação coletiva, que
possam ser considerados modelos representativos da arquitetura residencial
da virada do século, consequentemente importantes referências para novos
projetos.
O problema inicial residiu no estabelecimento de critérios para seleção dos
exemplos a serem estudados. Diante das evidentes dificuldades em qualificar a
produção recente de habitação coletiva, partiu-se da premissa de que a
arquitetura publicada em veículos com política editorial respeitada tende a
apresentar significado que, com o passar dos anos, constituirá a base para a
compreensão plena de fenômenos – algo possível com o necessário
distanciamento histórico – “uma vez que a publicação já pressupõe uma
valorização por parte do profissional e a construção, por parte do proprietário”
(ACAYABA, 1986, p. 20) Foram elencados dois periódicos internacionais2 com
reconhecida reputação: A+U e Domus. Tais revistas foram citadas por Nesbitt
(2006) entre aquelas que frequentemente assumiram uma postura crítica
desvinculadas das organizações de classe. Domus é publicada desde 1928 e
A+U publica trabalhos seminais com diretrizes editoriais estabelecidas por um
grupo de conselheiros internacionais.
A partir de um levantamento edição a edição, foram encontrados, no período
entre 1990 e 2010 mais de oito dezenas de projetos de interesse no tema. De
modo a refinar a amostra, verificou-se quais projetos haviam sido publicados 2 Embora as mídias eletrônicas sejam cada vez mais comuns e responsáveis pela disseminação arquitetônica, o meio tradicional impresso ainda é uma fonte bibliográfica mais confiável.
6
em ambas as revistas ou em livros sobre o tema, reduzindo-a amostra básica
para 21 exemplos, principalmente de países europeus (Figura 1).
Obra Arquiteto Local Ano Fontes
Meaux Street Renzo Piano B. W. Architects
Paris, França 1991 Domus 1991, n° 729 p. 28-34
French (2009) p. 188-189
Nexus II Mark Mack Architects
Fukuoka, Japão 1991 Domus 1991, n°732 – p. 25-34
Försters (2006) p. 124-125
Void Space / Hinged Space
Steven Holl Architects
Fukuoka, Japão 1991 Domus 1991, n°731 – p. 42-51
French (2009) p. 186-187
Piraeus Block Hans Kollhoff Architekten
Amsterdam, Holanda 1994 Domus 1994, n°763 – p. 7-16
Försters (2006) p. 142
Rua do Teatro Eduardo Souto de Moura
Porto, Portugal 1995 A+U 1997, n°319 – p. 88-99
Segantini (2008) p. 286-289
Broëlberg I Gigon / Guyer Architekten
Kilchberg, Zurique, Suíça
1996 A+U 1997, n° 319 – p. 56-67
Segantini (2008) p. 32-35
Suisses Street Herzog & de Meuron
Paris, França 2000 Domus 2002, n°843 – p. 34-43
Segantini (2008) p. 254-257
The Whale de Architekten Cie Amsterdam, Holanda 2000 A+U 2002, n° 380 – p. 62-67
Domus 2001, n° 839 – p. 128-137
Broëlberg II Gigon / Guyer Architekten
Kilchberg, Zurique, Suíça
2001 A+U 2006, n° 434 – p. 92-99
Segantini (2008) p. 168-171
Junghans A2-A3
Junghans B
Junghans D
Junghans E-1
Junghans G1-G2
Cino Zucchi Architetti
La Giudecca, Veneza, Itália
2002 Domus 2004, n°869 – p. 50-67
Segantini (2008) p. 172-175
Sarphati Street VMX Architects Amsterdam, Holanda 2002 A+U 2004, n° 403 – p. 138-141
Broto (2008) p. 78-87
Albion Riverside Foster + Partners Londres, Reino Unido
2003 A+U 2006, n°429 – p. 78-81
Försters (2006) p. 144
Schots 1+2 S333 Architecture + Urbanism
Groningen, Holanda 2003 A+U 2006, n° 429 – p. 60-65
French (2009) p. 212-215
Stanga Housing Njiric + Nijiric Arhitekti
Rovinj, Croácia 2004 A+U 2006, n° 429 – p. 10-17
Segantini (2008) p. 188-191
Honeycomb OFIS Arhitekti Izola, Eslovênia 2005 A+U 2009, n° 462 – p. 82-87
Segantini (2008) p. 304-305
Carabanchel 102 Dosmasuno Architectos
Madri, Espanha 2008 A+U 2009, n° 467 – p. 74-83
Domus 2009, n° 921 – p. 13-18
Greenwich Millenium
Tovatt Architects and Planners
Londres, Reino Unido
2008 A+U 2004, n°407 – p. 72-79
Cousins (2009) p.104-111
Figura 1 – Exemplos de habitação coletiva selecionados
Dentro do recorte temporal estabelecido, o exemplo mais antigo é o conjunto
do Rua Meaux, em Paris, de Renzo Piano, de 1991 e o mais recente o conjunto
de 102 apartamentos em Carabanchel, Madri, do escritório Dosmasuno
Architectos, de 2008. Foram incluídos conjuntos de portes diversos, desde
pequenos edifícios isolados, como do da Rua do Teatro, no Porto, de Eduardo
Souto de Moura até grandes conjuntos, como o Piraeus Block, um dos land
marks da renovada área portuária do leste de Amsterdam. Quanto à
distribuição geográfica, dos 21 exemplos selecionados, dois localizam-se no
Japão e 19 na Europa, dos quais, quatro na Holanda, dois na Inglaterra, dois
7
na França, dois na Suíça, cinco na Itália (embora tratem-se de uma intervenção
na Ilha da Giudecca, em Veneza e, dependendo do foco, podem ser
considerados em conjunto, pois são projeto do mesmo arquiteto, Cino Zucchi) e
apenas um exemplo da Espanha, de Portugal, da Croácia e da Eslovênia.
A partir da análise do recorte de pesquisa, pode-se inferir uma série de frentes
a serem estudadas no sentido de encontrar caminhos para a melhoria da
qualidade da habitação produzida no Brasil. Entre elas podem ser apontadas,
por exemplo, (i) Características das diretrizes e políticas públicas e legislação
para a ocupação de espaços com habitação coletiva, (ii) Implantação e relação
dos edifícios com o espaço público. (iii), Relação, dimensão, uso e qualidade
dos espaços comuns., (iv) Arranjos de circulação. (v) Diversidade das
unidades, com conseqüente diversidade de moradores; (vi) Altura. (vii)
Tratamento das fachadas, etc.
Devido à complexidade e multiplicidade de aspectos a serem tratados, optou-
se pela separação de alguns temas em dois artigos a serem apresentados
nesse Seminário, os quais apresentam resultados parciais da pesquisa, com o
objetivo de dar suporte e elementos para doravante elaboração de material
para subsidiar novos projetos e demais desdobramentos. Um tratará dos
aspectos relativos à organização espacial, implantação e relação dos edifícios
com os espaços públicos e áreas comuns. Este trabalho pretende discutir os
temas relativos à diversidade de tipos das unidades habitacionais e os arranjos
de circulação.
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
4.1. DIVERSIDADE DE PLANTAS
Um exame dos conjuntos selecionados aponta, quanto ao arranjo adotado nas
plantas dos pavimentos-tipo, grande diversidade de configurações das
unidades habitacionais. Dos 21 conjuntos analisados, 20 apresentam variações
nos tamanhos, plantas, tipos e número de dormitórios3.
3 O edifício da rua Sarphati, em Amsterdam, trata-se de apartamentos destinados a estudantes.
8
Figura 2 – Imagens dos exemplos de habitação coletiva selecionados.
9
Figura 3 – Implantações esquemáticas dos exemplos de habitação coletiva selecionados.
10
Esta característica, não comumente aplicada no Brasil, decorre, claramente,
das políticas habitacionais européias, que visam promover a miscigenação de
público, evitando a criação de “ilhas” ocupadas predominantemente por
determinada classe ou perfil social.
Pode-se apontar como exemplo, o Quinto Documento de Política Nacional de
Planejamento Espacial da Holanda, o qual, entre outras recomendações,
estabelece como critérios de qualidade de projeto aspectos como diversidade
espacial, que implica em composições com variações nas dimensões dos
edifícios e dos tipos, formas e densidades das unidades habitacionais e
também igualdade social, que pressupõe refletir a complexidade da
comunidade envolvida e permitir diversas categorias de posse dos imóveis
(COUSINS, 2009, p. 5, 6).
Obra Dormitórios por Apartamento Circulação Vertical Pav. Tipo / Quantidade Aptos atendidos
Uso misto
Meaux Street 1, 2 e 3 1:4,2 Sim
Nexus II 2, 3 e 4 1:2,5 Sim
Void Space / Hinged Space 2, 3 e 4 1:3,2 Sim
Piraeus Block 1, 2 e 3 1:2,2 Não
Rua do Teatro 3 1:2 Não
Broëlberg I 2, 3 e 3 1:2 Não
Suisses Street 1, 2 e 3 1:2,5 Não
The Whale 2 e 3 1:3,5 Sim
Broëlberg II 2, 4 e 6 1:2 Não
Junghans A2-A3 1 e 2 1:3 Sim
Junghans B 1 1:1,6 Não
Junghans D 1 e 2 1:4 Não
Junghans E-1 1 e 2 1:2 Não
Junghans G1-G2 1 e 2 1:2 Não
Sarphati Street 1 1:2,3 Sim
Albion Riverside 2, 3 e 4 1:3,2 Sim
Schots 1+2 2 e 3 1:8 Sim
Stanga Housing 1 e 2 1:5,5 Não
Honeycomb 1, 2 e 3 1:6 Não
Carabanchel 102 1, 2 e 3 1:3 Não
Greenwich Millenium 1, 2 1:4,2 Não
Figura 4 – Diversidade de Unidades e Esquemas de circulação dos exemplos de habitação coletiva selecionados
Igualmente, a Terceira Declaração de Política de Planejamento (2006) do
governo britânico estabelece como meta a criação de um leque amplo de
habitações de qualidade, de modo a facilitar o acesso e assegurar
comunidades sustentáveis, inclusivas e mistas (COUSINS, 2009, p. 6).
11
Isso ilustra como os arquitetos precisam atender a critérios de qualidade
claramente estabelecidos pelos poderes públicos, indo além do mero
atendimento da viabilidade econômica dos empreendimentos.
Da amostra estudada, verifica-se que, mesmo nos exemplos dos demais
países, tais diretrizes são atendidas, na medida em que é possível encontrar tal
variedade nos conjuntos nos mais diversos contextos. Os apartamentos
apresentam variações tanto com relação ao número de dormitórios, quanto à
configuração espacial, agrupando apartamentos de um quarto a apartamentos
duplex ou triplex com três ou mais dormitórios num mesmo edifício.
Menos comum, mas não a ponto de constituir exceção, verificam-se usos
mistos, com algum espaço do pavimento térreo destinado a comércio e
serviços. Ao passo que evita-se a verticalização em excesso, privilegia-se a
diversidade nos pavimentos térreos, criando ambientes urbanos ricos e
atrativos.
4.2. ARRANJOS DE CIRCULAÇÃO
O sistema de circulação interna dos edifícios, parte vertical (escadas e
elevadores) e parte horizontal (corredores de distribuição) têm grande impacto
no custo global do edifício, em especial nos casos de vários apartamentos por
andar, uma vez que, “(...) quanto mais caro for o sistema de circulação vertical
ou mais barato o de circulação horizontal, mais difícil será que a solução
econômica seja a circulação vertical descentralizada e vice-versa” (MASCARO,
1985 p. 77).
No Brasil, repetem-se soluções historicamente viáveis, mas que, por vezes,
deixam vários aspectos a desejar, como apontam estudos de Avaliação Pós-
Ocupação. No caso de conjuntos verticais, são maioria as plantas em “H”,
desenho que, se por um lado otimiza as áreas de circulação vertical e
horizontal, de outro impede a correta orientação solar das unidades o que, no
clima do país deveria ser item de solução prioritária, o que poderia impactar
positivamente na salubridade e habitabilidade, bem como no consumo de
energia. Tal arranjo é principalmente aplicado a plantas com quatro
12
apartamentos por pavimento, mas recentemente, têm aumentado o número de
empreendimentos com seis ou até oito apartamentos por pavimento. Ademais,
a repetição desse arranjo tipológico provoca conseqüências negativas para as
cidades, em especial nos conjuntos habitacionais implantados pelo Estado em
áreas distantes e sem urbanidade. (RUBANO, 2008)
Assim, uma característica importante a ser examinada em projetos
considerados modelos recentes é a forma como é equacionada a circulação.
Este trabalho limita-se a comparar o número de unidades atendidas por células
de circulação vertical, dado preliminar que permitirá desdobramentos futuros da
pesquisa.
Nos 21 projetos selecionados, verifica-se grande variação nas soluções
adotadas para as circulações verticais e horizontais. Porém, mais de 70%
apresentam uma relação abaixo de quatro apartamentos por circulação vertical
(1:4) e, destes, 11 exemplos – mais de 50% da amostra – têm relação abaixo
de 1:3. Essa constatação implica num número maior de escadas e elevadores
o que, se por um lado eleva o custo relativo das áreas comuns e de circulação,
confere maior privacidade e identidade às unidades.
Por outro lado, nos exemplos em que essa relação é maior, verifica-se certa
generosidade nas configurações das circulações horizontais, muitas delas com
larguras variadas e iluminação natural.
Importante salientar que, destinar maior área às circulações, não significa,
necessariamente ineficiência do projeto ou desperdício de área. Como aponta
Mascaro (1985) pode-se obter compensação se forem adotadas plantas com
maiores profundidades, por exemplo. Os ganhos espaciais e formais
compensam o custo extra, uma vez que, agregar valor às unidades é
fundamental tanto para moradores como para empreendedores4.
Assim, os exemplos de habitação coletiva nas sociedades mais desenvolvidas
4 Ao contrário, no Brasil, como atrativos aos futuros compradores, são apresentadas áreas comuns de lazer, ginástica e gastronomia cada vez maiores que mascaram as deficiências de desenhos obsoletos. Como argumentos de venda há também as chamadas “plantas flexíveis” que, “nos dizeres mercadológicos atendem melhor às necessidades e o estilo de vida de cada um” (VILLA, 2004, p).
13
apontam para edifícios que, ao contrário de parecer blocos similares e
repetidos, buscam integrar-se ao entorno e apresentam novas soluções
construtivas e materiais, representando significativo avanço na arquitetura da
virada do milênio, mantendo os pressupostos positivos do Movimento Moderno,
mas incorporando valores historicamente sedimentados nas cidades
tradicionais.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Agregar valor a um produto é fundamental para sua aceitação e conservação.
Sobre isso, merece referência o trabalho desenvolvido por Benedikt (2008). O
autor discute detalhadamente as necessidades a serem contempladas pela
arquitetura, e, entre outras, menciona segurança (proteção contra intrusão,
contra confisco de propriedade, privacidade e controle de espaços);
legitimidade (identidade social, (...) distinção consideração especial às
pessoas, associação a diferentes instituições e grupos); aprovação, louvor
(valores positivos – estéticos, sociais, econômicos, integração com a
vizinhança, promover o belo, a saúde e a valorização dos ocupantes); e
liberdade (de deslocamento, opinião, espaço, flexibilidade, de exclusão e
privacidade). (BENEDIKT, 2008 apud GRANJA et. al., 2009, p. 89),
Claramente, tais valores intangíveis implicam em soluções físicas que exigem
muito mais do que meros esquemas simples de organização e distribuição de
unidades habitacionais idênticas.
É evidente o empenho quanto ao tratamento das fachadas, que, via de regra
não são mero resultado da repetição dos vários pavimentos que compõe a
volumetria dos edifícios, ao contrário, são cuidadosamente compostas5, bem
como na diversidade de materiais e texturas empregadas.
No Brasil, o estágio de provimento de habitação de interesse social, parcela
significativa da produção de habitação coletiva no país encontra-se em níveis
de exigência qualitativa sensivelmente inferiores, muitas vezes significando
apenas um processo de higienização e desfavelização, provimento de teto. É 5 É possível identificar uma tendência ou modismo para a aleatoriedade da disposição de seus elementos, como janelas e balcões, algo passível de crítica. A esse respeito, Vide MAHFUZ, 2009)
14
preciso reconhecer, amiúde, que mesmo a grande produção de habitação
coletiva para as classes mais ricas sofre de baixa qualidade espacial, como por
exemplo repetição, adensamento inadequado, verticalização excessiva,
isolamento das atividades urbanas, insegurança, escala, etc.
O abismo entre o que tem sido produzido no Brasil e nos países desenvolvidos,
particularmente na Europa, guardadas as devidas ressalvas decorrentes dos
diferentes contextos, clama por maior dedicação e empenho dos agentes
responsáveis pela produção de habitações no sentido da melhoria de sua
qualidade, não apenas no atingimento de metas quantitativas.
Um passo óbvio, mas imprescindível nessa direção, é dedicar mais tempo,
recursos e esforços nas etapas iniciais de projeto e na produção de diretrizes e
políticas de ocupação urbanas voltadas à qualificação espacial. É possível
antever a melhoria da habitação coletiva mediante alterações relativamente
simples nas estratégias de projeto, ou seja, não são necessárias grandes
reviravoltas tecnológicas ou soluções inovadoras em relação ao que se produz
hoje no Brasil para obter uma aproximação em termos de ocupação e
linguagem dos edifícios produzidos em países desenvolvidos, pois, não há
diferenças substanciais em termos de distribuição interna das unidades e em
ambos cenários a preocupação com a racionalidade e otimização das áreas
construídas6.
6 O desempenho das unidades no Brasil, por outro lado, apresenta grande inferioridade diante dos padrões de exigência e qualidade dos países europeus. O desenvolvimento desse aspecto implica em importantes transformações na construção civil no Brasil.
15
6. REFERÊNCIAS
ACAYABA, Marlene M. Residências em São Paulo: 1947-1975. São Paulo: Projeto, 1986.
BROTO, Carles. Nuevos Bloques de Apartamentos II. Barcelona: Links, 2008.
CLEMENTE, Carola e DE MATTEIS, Frederico (edited). Housing for Europe: strategies for quality in urban space, excellence in design, performance in building. Roma: Tipografia del Genio Civile, 2010. (tradução: Maria Aulisa e Martin Maguire). Disponível em: http://urbact.eu/fileadmin/Projects/HOPUS/outputs_media/hopus_final_LOW.pdf Acesso em 2010.
FÖRSTER, Wolfgang. Housing in the 20th and 21st Centuries. Munich: Prestel, 2006.
FRENCH, Hillary. Os mais importantes conjuntos habitacionais do século XX. Porto Alegre: Bookman, 2009.
GRANJA, A. D. et al. A natureza do valor desejado na habitação social -Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 9, n. 2, p. 87-103, abr./jun. 2009.
KANASHIRO, Milena. Da Antiga à Nova Carta de Atenas. Revista Desenvolvimento e Meio Ambiente. v.9. Curitiba: UFPR, 2004. p.33 – 37.
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7. AGRADECIMENTOS
Ao CNPq pelo financiamento da pesquisa.
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