View
218
Download
0
Category
Preview:
Citation preview
8/18/2019 Não ao golpe parlamentar, por Maria Luiza Quaresma Tonelli _ GGN.pdf
1/2
TER, 29/03/2016 - 17:11
Não ao golpe parlamentar, por Maria LuizaQuaresma Tonelli
Por Maria Luiza Quaresma Tonelli*
Às vésperas de completar 52 anos do golpe civil-militar que levou o país a uma ditadura que
durou 21 anos, o Brasil assiste a mais uma tentativa de golpe, desta vez não pela via dos
quartéis, mas pelo parlamento. Isso mesmo: um golpe parlamentar que pretende utilizar o
impeachment de forma ilegal e ilegítima para cassar o mandato popular da presidenta eleita com
mais de 54 milhões de votos.
Manipulam mentes e corações os que defendem o impeachment da presidenta Dilma Rousseff a
qualquer custo, simplesmente pelo fato de que o impeachment é um instrumento previsto na
Constituição Federal para impedir o/a chefe do poder executivo de continuar governando.
Impeachment, palavra da língua inglesa (que significa impedimento ou impugnação de mandato)
é o termo utilizado para o processo constitucional a fim de que se obtenha a cassação do mandato
de um presidente pelo Congresso Nacional, de governadores pelas Assembleias Legislativas e de
prefeitos pelas Câmaras Municipais. No Brasil, a Constituição Federal de 1988 elenca de forma
taxativa os motivos pelos quais o presidente da república estará sujeito ao impedimento de seu
mandato, na sessão onde trata “Da responsabilidade do presidente da República”. É exatamente
no artigo 85 que onde se define a possibilidade de cassação do chefe maior do poder executivo:
crimes de responsabilidade.
Vejamos:
Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a
Constituição Federal e, especialmente, contra:
I - a existência da União;
II - o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes
constitucionais das unidades da Federação;
III - o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais;
IV - a segurança interna do País;
V - a probidade na administração;
VI - a lei orçamentária;
VII - o cumprimento das leis e das decisões judiciais.
Parágrafo único. Esses crimes serão definidos em lei especial, que estabelecerá as normas deprocesso e julgamento.
ao golpe parlamentar, por Maria Luiza Quaresma Tonelli | GGN http://jornalggn.com.br/noticia/nao-ao-golpe-parlamentar-por-mar
2 30/03/20
8/18/2019 Não ao golpe parlamentar, por Maria Luiza Quaresma Tonelli _ GGN.pdf
2/2
Parágrafo único. Esses crimes serão definidos em lei especial, que estabelecerá as normas de
processo e julgamento.
Portanto, o impeachment é um processo jurídico-político. Jurídico porque a cassação de um
mandato presidencial está sujeita ao que diz explicitamente a Constituição (crimes de
responsabilidade definidos em lei especial) político porque o julgamento do processo de
impeachment se dá no Congresso Nacional. É desonestidade intelectual ou ignorância afirmar que
o impeachment é um julgamento eminentemente político, como se a sua base legal fosse
secundária. Como se fosse um julgamento mais político do que jurídico simplesmente porque “as
condições políticas”, como “a voz das ruas” ou a “vontade da maioria no parlamento” fossem
condições necessárias e suficientes para cassar não apenas o mandato presidencial, massobretudo a voz das urnas. A democracia tem como fundamento a soberania popular. Sem crime
de responsabilidade devidamente comprovado, cassar o mandato de uma presidenta eleita pela
maioria é cassar a soberania popular, é um processo de impedimento da democracia. É,
sobretudo, uma violação ao princípio da legalidade, em que se baseia o Estado Democrático de
Direito. É uma violação à Constituição Federal.
Dilma Rousseff não cometeu nenhum dos crimes de responsabilidade que atentem contra a
Constituição Federal, segundo o que diz o artigo 85 acima mencionado. Por isso estamos certos
quando dizemos que impeachment sem crime é golpe. É o artifício utilizado pelos derrotados nas
urnas para, com aparência de legalidade e ares de legitimidade, ocupar o poder no tapetão.
Democracia é o regime dos direitos e da luta por direitos, por isso é o regime no qual os conflitos
estão presentes e são legítimos, dada a pluralidade existente na sociedade democrática.
Democracia não se confunde com o Estado de Direito, mas é ele que deve garantir a ordemdemocrática. Vale salientar, contudo, que não é o Estado de Direito que faz a Democracia. É a
Democracia que faz o Estado de Direito ser democrático. Não podem os agentes políticos nem os
profissionais do Direito (como faz a OAB), que por dever de ofício conhecem as leis, defenderem
seus interesses e ideologias, passando por cima da Constituição, a carta política de uma nação.
Defender o mandato da presidenta Dilma Rousseff contra o impeachment sem crime de
responsabilidade não significa defender seu governo, mas a legalidade e a Democracia.
Não vamos permitir, após 52 anos, mais um golpe contra a Democracia. Um golpe travestido de
uma pretensa legalidade. Resistiremos até o fim contra os que devem ser chamados pelo nome
adequado: golpistas.
Muitas vidas foram ceifadas na ditadura, apoiada pelos mesmos que hoje defendem o
impeachment da presidenta Dilma, ela mesma presa e torturada durante o período mais trágico
de nossa história. Muitas pessoas dedicam suas vidas a lutar por direitos conquistados nos
governos Lula e Dilma. São cidadãos comuns que têm apreço pela Política em seu sentido
autêntico, são milhares de jovens politizados, a esperança de futuro deste país, são centenas de
movimentos sociais e populares que resistirão ao golpe que se avizinha. Sejam os golpistas
derrotados ou vencedores, passarão para a história pelo que são: traidores da pátria, traidores da
democracia, traidores do povo. Simplesmente porque impeachment sem crime de
responsabilidade é golpe sim.
*Advogada, mestre e doutora em Filosofia pela USP
ao golpe parlamentar, por Maria Luiza Quaresma Tonelli | GGN http://jornalggn.com.br/noticia/nao-ao-golpe-parlamentar-por-mar
2 30/03/20
Recommended