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Universidade de Lisboa
Faculdade de Farmácia
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de
carbapenemases
Rita Emanuela Fernandes Gralha
Relatório de estágio orientado pela Professora Doutora Maria Aida da
Costa e Silva da Conceição Duarte e coorientada pela Doutora Fátima
Maria Madureira Vale
Mestrado em Análises Clínicas
2019
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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Universidade de Lisboa
Faculdade de Farmácia
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de
carbapenemases
Rita Emanuela Fernandes Gralha
Relatório de estágio orientado pela Professora Doutora Maria Aida da
Costa e Silva da Conceição Duarte e coorientada pela Doutora Fátima
Maria Madureira Vale
Mestrado em Análises Clínicas
2019
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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Resumo
O presente relatório refere-se ao estágio decorrido entre Novembro de 2018 e Maio de
2019 no Serviço de Patologia Clínica do Hospital Sousa Martins da Unidade Local de
Saúde da Guarda, no âmbito do curso de Mestrado em Análises Clínicas da Faculdade
de Farmácia da Universidade de Lisboa.
O Serviço de Patologia Clínica desta Unidade Local de Saúde é um serviço constituído
por 6 unidades laboratoriais, Microbiologia, Micobacteriologia, Bioquímica,
Hematologia, Biologia Molecular e Imunologia, que prima pela competência técnica e
pela qualidade dos resultados.
Apesar das inúmeras áreas que compõem um laboratório de análises clínicas, este
relatório visa uma abordagem mais profunda sobre as áreas de Microbiologia,
Micobacteriologia e Bioquímica Clínica.
Na área de Microbiologia e Micobacteriologia tive a oportunidade de realizar técnicas
que permitiam isolar os microrganismos, tornando-os viáveis, e posteriormente semeá-
los em meios de cultura que permitam o crescimento desse mesmo agente patogénico.
Observei vários exames microscópicos diretos que permitem de forma rápida, através
das características morfológicas dos microrganismos, fazer um diagnóstico presuntivo
que pode ser dado ao clínico como provisório até ser obtido um diagnóstico final.
Na área da Bioquímica Clínica tive a oportunidade de proceder à determinação de
vários parâmetros químicos, em amostras de plasma, soro, urina e outros produtos
biológicos, com recurso a aparelhos automatizados e à realização de técnicas manuais.
Durante o presente estágio também foram observadas as fases pré e pós-analítica através
da assistência de colheitas de amostras biológicas e através da visualização, validação e
interpretação de boletins de resultados.
O relatório tem como objetivo descrever a organização e funcionamento, como as
tecnologias e metodologias analíticas aplicadas, evidenciando a utilidade de cada
parâmetro no diagnóstico clínico e monitorização da doença. Além disso, a necessidade
de trabalhar segundo um Sistema de Gestão de Qualidade (SGQ) interno e externo é um
fator diferenciador de um serviço de excelência e como forma de garantia de qualidade
analítica.
Palavras-chave: Microbiologia, Micobacteriologia, Bioquímica Clínica, Parâmetros
Bioquímicos, Microrganismos.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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Abstract
This report refers to the internship that took place between November 2018 and May
2019 at the Clinical Pathology Service of Hospital Sousa Martins - ULS Guarda, within
the Master's degree course in Clinical Analysis, Faculty of Pharmacy, University of
Lisbon.
The Clinical Pathology Service of this Local Health Unit is a service consisting of 6
laboratory units, Microbiology, Mycobacteriology, Biochemistry, Hematology,
Molecular Biology and Immunology, that strives for technical competence and quality
of results. Despite the numerous areas that make up a clinical analysis laboratory, this
report aims at a deeper approach to the areas of Microbiology, Mycobacteriology, and
Clinical Biochemistry.
In the area of Microbiology and Mycobacteriology I had the opportunity to perform
techniques that allowed the isolation of microorganisms, making them viable, and
subsequently sowing them in culture media that allow the growth of the same pathogen.
I have observed several direct microscopic examinations that allow quickly, through the
morphological characteristics of microorganisms, to make a presumptive diagnosis that
can be given to the clinician as provisional until a final diagnosis is obtained.
In the area of Clinical Biochemistry I had the opportunity to determine various chemical
parameters in samples of plasma, serum, urine and other biological products, using
automated devices and performing manual techniques.
During the present stage, the pre and post-analytical phases were also observed through
the assistance of biological sample collections and through the visualization, validation
and interpretation of results bulletins.
The report aims to describe the organization and operation, as the applied technologies
and analytical methodologies, highlighting the usefulness of each parameter in the
clinical diagnosis and monitoring of the disease. In addition, the need to work according
to an internal and external Quality Management System is a differentiating factor of a
service of excellence and as a form of analytical quality assurance.
Keywords: Microbiology, Mycobacteriology, Clinical Biochemistry, Biochemical
Parameters, Microorganisms.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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Lista de abreviaturas
ADA - Adenosina Desaminase
ALP - Fosfatase Alcalina
ALT - Alanina Aminotransferase
AST - Aspartato Aminotransferase
AVC - Acidente Vascular Cerebal
BAAR - Bacilos álcool-ácido resistentes
BNP - Peptídeo Natriurético
CA 125 - Antigénio 125 do Cancro
CA 15.3 - Antigénio 15.3 do Cancro
CA 19.99 - Antigénio Carbohidrato
CAM - Gelose Campylosel
CAN - Gelose de Candida
CEA - Antigénio Carcinoembrionário
CK - Creatinina - quinase
CK-MB - Creatinina-quinase - MB
CLED - Gelose Cystine Lactose Electrolyte Deficient
CMI - Concentração mínimas inibitórias
CUMITECH - Cumulative Techniques and Procedures Clinical Microbiology
DCO - Gelose D-coccosel
DHEA-S - Sulfato de Dehidroepiandrosterona
EAM - Enfarte agudo do miocárdio
EDTA - Ácido etilenodiamino tetra-acético
ELFA - Enzime Linked Fluorescent Assay
EUCAST - European Committee on Antimicrobial Susceptibility Testing
FSH - Hormona Folículo-estimulante Humana
GAR - Gelose Gardnerella
GC - Gelose de Chocolate
GRAN - Gelose Granada
GS - Gelose de Sangue
HbA1c - Hemoglobina Glicada A1c
HDL-C - High Density Lipoprotein Cholesterol
IDL-C - Intermediate Density Lipoprotein Cholesterol
IgA - Imonoglobulina A
IgG - Imonoglobulina G
IgM - Imonoglobulina M
ISEs - Tecnologia de Elétrodos para Iões Específicos
LCR - Líquido cefalorraquidiano
LDH - Lactato Desidrogenase
LDL-C - Low Density Lipoprotein Cholesterol
LH - Hormona Luteinizante
MCK - Gelose MacConkey
MRSA - Gelose Staphylococccus aureus resistentes à meticilina
MSA - Gelose Manitol Salgado
PCP - Fenciclidina
PCR - Proteína C-reativa
PCT - Procalcitonina
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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PSA Total - Antigénio Total Específico da Próstata
PTGO - Prova de Tolerância à Glicose Oral
PTH - Hormona Paratiroideia
SACE - Enzima Conversora da Angiotensina
SGA - Streptococcus do grupo A
SGQ - Sistema de Gestão de Qualidade
SIDA - Síndrome da Imunodeficiência Aquirida
SPC - Serviço de Patologia Clínica
T3 - Triodotironina
T4- Tiroxina
TFG - Taxa de Filtração Glomerular
TG -Tiroglobulina
TGL - Triglicéridos
TIBC - Capacidade Total de Ligação do Ferro
TnT - Troponina T
TRH - Hormona Libertadora de Tireotrofina
TSA - Teste de suscetibilidade antimicrobiana
TSH - Hormona Estimuladora da Tiroide
T3 – triodotironina
T4- tiroxina
UFC - Unidades formadoras de colónias
ULS - Unidade Local de Saúde
USF - Unidade de Saúde Familiar
VDRL - Venereal disease research laboratory
VLDL-C - Very Low Density Lipoprotein Cholesterol
XLD - Gelose Xilose-Lisina-Desoxicolato de sódio
YER - Yersinia agar
β-HCG - Gonadotropina Coriónica Humana
γGT - Gama-glutamil Transferase
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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Índice
Resumo .......................................................................................................................................... 3
Abstract ......................................................................................................................................... 4
Lista de abreviaturas ..................................................................................................................... 5
Lista de Figuras ............................................................................................................................. 9
Lista de Tabelas ........................................................................................................................... 10
1.Introdução ................................................................................................................................ 11
2. Microbiologia .......................................................................................................................... 12
2.1 Fase pré-analítica .................................................................................................................. 12
2.1.1 Colheitas de amostras biológicas ....................................................................................... 12
2.2 Equipamentos ........................................................................................................................ 13
2.3 Fase analítica - Métodos de diagnóstico................................................................................ 14
2.3.1 Técnicas de coloração ........................................................................................................ 15
2.3.2 Meios de Cultura ................................................................................................................ 15
2.3.3 Testes de identificação presuntiva ...................................................................................... 19
2.3.4 Identificação bacteriana e teste de suscetibilidade antimicrobiana (TSA) ......................... 21
2.4 Produtos biológicos ............................................................................................................... 24
2.4.1 Urina ................................................................................................................................... 24
2.4.2 Fezes ................................................................................................................................... 25
2.4.3 Exsudado vaginal e uretral ................................................................................................. 27
2.4.4 Líquido cefalorraquidiano (LCR) ....................................................................................... 28
2.4.5 Outros líquidos ................................................................................................................... 29
2.4.6 Hemoculturas ..................................................................................................................... 30
2.4.7 Produtos respiratórios ......................................................................................................... 31
2.4.8 Amostras de feridas, pus e tecidos ..................................................................................... 33
3. Micobacteriologia ................................................................................................................... 34
4. Bioquímica .............................................................................................................................. 36
4.1 Fase pré-analítica .................................................................................................................. 36
4.1.1 O paciente ........................................................................................................................... 36
4.1.2 A amostra ........................................................................................................................... 36
4.1.3 Receção e preparação de amostras ..................................................................................... 38
4.1.4. Sistema de triagem ............................................................................................................ 38
4.2- Fase analítica ........................................................................................................................ 39
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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4.2.1 Equipamentos ..................................................................................................................... 39
4.3 Parâmetros bioquímicos ........................................................................................................ 42
4.3.1 Ionograma .......................................................................................................................... 42
4.3.2 Perfil lipídico ...................................................................................................................... 43
4.3.3 Perfil pancreático................................................................................................................ 46
4.3.4 Perfil hepático .................................................................................................................... 48
4.3.5 Perfil renal .......................................................................................................................... 50
4.3.6 Perfil endócrino .................................................................................................................. 52
4.3.7 Metabolismo do ferro ......................................................................................................... 55
4.3.8 Proteínas séricas ................................................................................................................. 56
4.3.9 Marcadores cardíacos ......................................................................................................... 58
4.3.10 Marcadores tumorais ........................................................................................................ 59
4.3.11. Monitorização de drogas terapêuticas ............................................................................. 60
4.3.12. Controlo de drogas de abuso ........................................................................................... 61
4.3.13 Outros analitos sanguíneos ............................................................................................... 62
4.3.14 Análise de Urinas ............................................................................................................. 63
4.4 Fase Pós-analítica .................................................................................................................. 64
5. Controlo de Qualidade ............................................................................................................ 65
5.1 Controlo de Qualidade Interno .............................................................................................. 65
5.2 Controlo de Qualidade Externo ............................................................................................. 67
6- Conclusão ................................................................................................................................ 68
7. Bibliografia ............................................................................................................................. 69
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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Lista de Figuras
Figura 1 - Flora comensal do corpo humano. Fonte: Barroso, H. et al, 2014. ............... 14
Figura 2 - Sistema automático de identificação bacteriana - Vitek® 2 Compact e carta
de identificação. Fonte: SPC da ULS da Guarda............................................................ 22
Figura 3 - Esfregaço de uma cultura positiva para BAAR. Fonte: SPC da ULS da
Guarda. ........................................................................................................................... 35
Figura 4 - Diagrama do fluxo de trabalho do Aceleratorp540. Fonte: SPC da ULS da
Guarda. ........................................................................................................................... 38
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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Lista de Tabelas
Tabela 1 - Meios de Cultura sólidos utilizados no SPC da ULS da Guarda. ................. 17
Tabela 2 - Meios de cultura Líquidos utilizados no SPC da ULS da Guarda. ............... 19
Tabela 3 - Testes de identificação presuntiva de microrganismos. ................................ 20
Tabela 4 - Tabela de Murray e Washington. Fonte: Procedimento dos produtos
respiratórios do SPC da ULS da Guarda. ....................................................................... 32
Tabela 5 - Equipamentos utilizados na fase analítica do setor da Bioquímica Clínica. . 41
Tabela 6- Ionograma ....................................................................................................... 42
Tabela 7 - Perfil Lipídico................................................................................................ 45
Tabela 8- Perfil Pancreático ........................................................................................... 47
Tabela 9- Perfil Hepático ................................................................................................ 49
Tabela 10 - Perfil renal ................................................................................................... 51
Tabela 11 - Perfil endócrino ........................................................................................... 53
Tabela 12 - Descrição das Regras de Westgard. Fonte: SPC da ULS da Guarda. ......... 66
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
11
1.Introdução
“(...) o Laboratório é o verdadeiro santuário da ciência médica; é apenas lá que o médico
procura explicações para a vida, no seu estado normal e patológico...”
Claude Bernard (1895)
Nos últimos anos cada vez mais é fundamental a contribuição dos laboratórios de
análises clínicas para uma eficaz monitorização, um rápido diagnóstico e um correto
prognóstico da doença. Para se conseguirem atingir níveis máximos de confiança, a
inovação, a qualidade e o rigor, têm que fazer parte do dia a dia num laboratório de
análises clínicas.
Apostar no diagnóstico precoce da doença é uma opção que traz numerosos benefícios,
não só, na melhoria da qualidade de vida dos utentes, mas também dos ganhos na
Saúde. Como tal, é importante a sensibilização da população no recurso às análises
clínicas como meio de diagnóstico precoce.
A Unidade Local de Saúde (ULS) da Guarda presta cuidados de saúde primários,
diferenciados e continuados. Esta unidade é formada por dois hospitais, o Hospital
Sousa Martins (localizado na Guarda) e o Hospital Nossa Senhora da Assunção
(localizado em Seia). O Serviço de Patologia Clínica (SPC), onde decorreu o presente
estágio, dirigido pela Drª Fátima Maria Madureira Vale, é um serviço de suporte à
prestação de cuidados numa vertente de apoio clínico e técnico, e está localizado no
Hospital Sousa Martins na Guarda, funcionando como laboratório central da ULS da
Guarda. Chegam a este laboratório, amostras dos dois hospitais, dos centros de saúde de
Almeida, de Celorico da Beira, de Figueira de Castelo Rodrigo, de Fornos de Algodres,
de Gouveia, da Guarda, de Manteigas, de Pinhel, da Meda, do Sabugal, de Seia, de
Trancoso e de Vila Nova de Foz Côa, da Unidade de Saúde Familiar da Ribeirinha
(USF) e do Centro de Diagnóstico Pneumológico da Guarda (1).
O Serviço de Patologia Clínica engloba 6 unidades laboratoriais: Laboratório de
Hematologia, Laboratório de Bioquímica, Laboratório de Biologia Molecular,
Laboratório de Imunologia, Laboratório de Microbiologia e Laboratório de
Micobacteriologia.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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2. Microbiologia
A Microbiologia é a ciência que estuda os seres vivos de dimensões microscópicas, para
além de outros que podem ser vistos a olho nu, que têm durante a sua evolução ovos ou
formas larvares microscópicas. O seu nome deriva de três vocábulos gregos: mikros
(pequeno), bios (vida) e logos (ciência). Os microrganismos estão divididos em quatro
grupos: bactérias, vírus, fungos e parasitas.
O laboratório de microbiologia desempenha um papel de extrema importância no
diagnóstico e no controle das doenças infeciosas. As amostras biológicas quando
chegam ao laboratório são triadas e classificadas em função do nível de risco que lhe
está associado, são processadas de acordo com os procedimentos devidamente descritos
em protocolos, recorrendo, sempre que estiver indicado, à utilização das câmaras de
segurança biológica (câmara de fluxo laminar MSC-Advantage™). O laboratório
executa a análise de diversos produtos biológicos sendo os mais frequentes: urinas
assépticas, sangue, produtos respiratórios, fezes e exsudados vaginais.
2.1 Fase pré-analítica
A fase pré-analítica é considerada a fase mais importante dos laboratórios de análises
clínicas. Esta fase corresponde ao período entre a requisição do exame pelo clínico até à
realização do exame laboratorial (fase analítica).
Muitos das amostras que chegam ao laboratório de microbiologia requerem o
isolamento de microrganismos viáveis, o que significa que a amostra deve ser colhida,
entregue rapidamente ao laboratório num sistema de transporte adequado e semeada em
meios de cultura que permitam o crescimento desse mesmo agente patogénico. Por
outro lado, devem ser tomadas medidas que mantenham a amostra livre de
contaminação por microrganismos clinicamente insignificantes que estão presentes no
ambiente ou fazem parte da flora normal do paciente.
2.1.1 Colheitas de amostras biológicas
Ao SPC da ULS da Guarda chegam amostras biológicas dos dois hospitais, dos centros
de saúde, da Unidade de Saúde Familiar e do Centro de Diagnóstico Pneumológico
Guarda. Existem uma grande variedade de amostras biológicas que podem ser
analisadas.
Após a colheita as amostras biológicas são enviadas para o laboratório e procede-se à
triagem. Na triagem efetua-se a receção, verificação, processamento e manipulação
primária das amostras biológicas, bem como a avaliação das condições das mesmas. Os
critérios de rejeição das amostras são estabelecidos de acordo com os requisitos
definidos no Manual de Colheitas do SPC.
Quando as amostras dão entrada no SPC é colocado uma etiqueta com um código de
barras para a sua identificação, de forma a minimizar a possibilidade de trocas de
produtos biológicos. É efetuado um controlo dos dados do utente, o número de análises
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
13
que têm de ser efetuadas e após verificação da integridade da amostra, são
encaminhadas para as diferentes secções de análise de forma a dar início à fase
analítica. As amostras categorizadas como “urgentes” são sempre analisadas com
prioridade.
2.2 Equipamentos
Existem na secção de Microbiologia os seguintes equipamentos:
✓ BACTEC 9000MB da Becton Dickinson - sistema de deteção automatizada de
incubação, agitação e monitorização de hemoculturas que deteta a existência de
microrganismos na amostra testada pela produção de CO2, uma vez que os
microrganismos metabolizam os substratos existentes no meio de cultura. Se o nível
de CO2 não se altera significativamente após cinco dias, a amostra é considerada
negativa;
✓ VITEK® 2 Compact da Biomerieux® - sistema automatizado de identificação
de bactérias e de leveduras e testes de suscetibilidade aos antimicrobianos. A
identificação e os antibiogramas são executadas através da monitorização
contínua do crescimento e da atividade dos microrganismos no interior das
cartas (GN, GP, ANC, YST e NH);
✓ Aerospray® Gram e Aerospray® TB - aparelhos de corar lâminas, utilizados na
coloração de Gram e auramina, respectivamente.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
14
2.3 Fase analítica - Métodos de diagnóstico
O diagnóstico microbiológico é o conjunto de procedimentos e técnicas complementares
utilizados para identificar o agente responsável por uma doença infeciosa.
Como todos os animais, o Homem suporta uma flora comensal microbiana muito
extensa. A maioria destes microrganismos são bactérias e coloniza a pele, as mucosas e
o aparelho respiratório, intestinal, reprodutor e urinário (Figura 1) (2).
A maioria dos microrganismos que constitui a flora comensal do corpo humano pode
ser causadora de doença, originado as chamadas infeções oportunistas. É exemplo disso
se um doente estiver imunodeprimido, se tiver sido submetido a terapêutica
antibacteriana, se tiver sofrido algum trauma acidental ou cirúrgico e no caso de
infeções nosocomiais (infeções associadas aos cuidados de saúde).
Na análise dos produtos biológicos que chegam ao laboratório é muito importante o
conhecimento da flora comensal, para que não sejam obtidos falsos positivos e para que
os verdadeiros agentes patogénicos possam ser identificados.
Figura 1 - Flora comensal do corpo humano. Fonte: Barroso, H. et al, 2014.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
15
2.3.1 Técnicas de coloração
O exame microscópico das preparações coradas permite avaliar as características
morfológicas dos microrganismos (por exemplo a forma, o tamanho, o arranjo celular e
a afinidade para os corantes) e fazer um diagnóstico presuntivo que pode ser dado ao
clínico como provisório até ser obtido um diagnóstico final.
No Laboratório de Microbiologia as colorações mais utilizadas são:
✓ A Coloração de Gram, esta técnica cora diferencialmente as bactérias, algumas
coram de roxo – bactérias Gram positivo – e outras coram de vermelho –
bactérias Gram negativo. Esta coloração reflete a diferente constituição química
da parede celular bacteriana, nas bactérias Gram positivo e Gram negativo;
✓ A Coloração de Ziehl-Neelsen no caso das micobactérias. As bactérias dos
géneros Mycobacterium e Nocardia têm uma parede celular especial contendo
ácidos micólicos, o que não coram pela técnica de Gram, porque a parede é
impenetrável. Estas bactérias requerem coloração enérgica com fucsina
fenolada de Ziehl a quente e a descoloração do esfregaço faz-se com soluto de
Ebner (álcool – ácido clorídrico). As bactérias do género Mycobacterium
resistem a esta descoloração, por isso são designadas por bacilos álcool-ácido
resistentes (BAAR);
✓ A coloração de Leishman permite avaliar a qualidade das amostras (por exemplo
nos produtos respiratórios), a visualização de células epiteliais, leucócitos e
ainda alguns parasitas.
2.3.2 Meios de Cultura
As bactérias e os fungos são capazes de crescer in vitro em meios de cultura contendo
essencialmente fontes de carbono, azoto, fósforo e água.
Existem três tipos de meios:
✓ Meio de cultura enriquecido: meio suplementado com nutrientes que permite o
crescimento de microrganismos mais fastidiosos, para além dos pouco exigentes
(exemplo: gelose sangue e gelose chocolate);
✓ Meio seletivo: meio que contém substâncias que inibem o crescimento de
algumas bactérias, tornando possível o crescimento de outros grupos bacterianos
(exemplo: Manitol salt agar (MSA) e MacConkey agar (MCK));
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
16
✓ Meio diferencial: meio que permite a visualização das atividades metabólicas
das bactérias (exemplo: as fermentadoras e as não fermentadoras da lactose no
meio de CLED agar).
Os meios de cultura podem ser líquidos, sólidos e semi-sólidos. Os meios líquidos são
usados para o enriquecimento de produtos biológicos de baixo inóculo. Os meios
sólidos tornam possível a sementeira de produtos biológicos complexos e isolar as
colónias dos microrganismos existentes. Com este isolamento torna-se possível
identificar os microrganismos de acordo com as suas características morfológicas e
bioquímicas. Os meios semi-sólidos são usados em estudos de mobilidade bacteriana.
Os meios utilizados dependem do tipo da amostra e do tipo de microrganismo
classicamente associado à patogénese/doença da nossa amostra. Na maior parte das
amostras são utilizados meios de enriquecimento para que haja um crescimento
generalizado de todos os microrganismos presentes. Estes meios são observados após 24
horas de incubação sob condições específicas de temperatura, O2 e CO2, e é feita uma
análise macroscópica das colónias que cresceram, ou seja, é avaliado essencialmente o
predomínio, a cor e morfologia das colónias e a presença ou não de hemólise. A
interpretação é feita tendo em conta o tipo de produto, o que pode ser patogénico e o
que é flora comensal. De seguida é feita ou não (caso seja necessário) a repicagem da(s)
bactéria(s) com significado clínico para meios seletivos e/ou diferenciais de maneira a
obter-se colónias isoladas para que possa ser feita a identificação e os testes de
sensibilidade aos antimicrobianos.
A tabela 1 e 2 mostra os principais meios de cultura utilizados para a análise de diversos
produtos biológicos com a respetiva composição e características.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
17
Tabela 1 - Meios de Cultura sólidos utilizados no SPC da ULS da Guarda.
Meios de Cultura Sólidos Composição e Características
Gelose de sangue
(GS)
- Meio não seletivo;
- Permite o isolamento de microrganismos fastidiosos e não
fastidiosos;
- Possui sangue de carneiro que permite a expressão de hemólise
(α, β ou γ), devido à presença do fator X.
Gelose de
Chocolate
(GC)
- Meio não seletivo;
- Permite o isolamento de bactérias fastidiosas, como Neisseria
spp., Haemophilus spp. e Streptococcus pneumoniae;
- Composto por uma base nutritiva enriquecida em fatores X
(hemina) e V (NAD) provenientes da hemoglobina;
- Para crescimento de microrganismos fastidiosos, este meio
deve ser incubado numa estufa de atmosfera enriquecida em
CO2.
Cystine Lactose
Electrolyte
Deficient
(CLED)
- Meio diferencial e não seletivo;
- Utilizado no isolamento de microrganismos presentes na urina;
- Permite a diferenciação entre microrganismos fermentadores
da lactose (colónias amarelas), dos microrganismos não
fermentadores (colónias azuis, verdes ou incolores);
- Limita a invasão (“swarming”) pelo Proteus spp. pela sua
deficiência em eletrólitos.
Gelose
MacConkey
(MCK)
- Meio seletivo diferencial;
- Permite isolamento de bacilos Gram negativo
(Enterobacterales, Pseudomonas spp., entre outros);
- Os sais biliares e o cristal violeta inibem o crescimento da
maioria das bactérias Gram positivo;
- A fermentação da lactose é evidenciada pela viragem do
vermelho neutro (microrganismos fermentadores da lactose
originam colónias rosas ou vermelhas; microrganismos não
fermentadores da lactose originam colónias incolores ou
ligeiramente bege).
Gelose Manitol
Salgado
(MSA)
- Meio seletivo diferencial;
- Permite o isolamento de Staphylococcus spp. e a identificação
presuntiva de S. aureus.;
- A elevada concentração de cloreto de sódio (NaCl) inibe a
maior parte dos Gram negativo permitindo o isolamento de
Staphylococcus spp.;
- A fermentação do manitol, evidenciada pelo vermelho de
fenol, permite a identificação presuntiva de S. aureus (colónias
amarelas).
Gelose
Staphylococcus
aureus Meticilina
Resistente
(MRSA)
- Meio seletivo diferencial e de identificação (cromogénico);
- Permite o isolamento e identificação de Staphylococcus aureus
resistente à meticilina, na presença de cefoxitina.
Gelose D-cocosel
(DCO)
(Bílis Esculina Agar)
- Meio seletivo e diferencial;
- Permite o isolamento de Enterococcus a partir de colheitas
polimicrobianas;
- A hidrólise da esculina dos Enterococcus provoca o
aparecimento de um halo negro à volta das colónias;
- A seletividade do meio em relação às bactérias Gram negativas
é assegurada pela azida sódica. A bílis inibe algumas bactérias
Gram positivas, excetuando os Enterococcus.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
18
Candida
(CAN)
- Meio seletivo diferencial;
- Permite o isolamento de leveduras e a identificação da espécie
Candida albicans e a diferenciação presuntiva de um conjunto
de estirpes como a C. tropicalis, C. lusitaniae e C. kefyr;
- A hidrólise específica de um substrato cromogéneo de
hexosaminidase na presença de um indutor da enzima (patente
da bioMerieux) leva à coloração azul das colónias de C.
albicans;
- A mistura de inibidores permite inibir o crescimento da maior
parte das bactérias.
Sabouraud
Cloranfenicol
Gentamicina
(SGC)
- Meio de isolamento de fungos e leveduras;
- Os fungos e as leveduras são nutridos por glucose e a presença
de cloranfenicol e gentamicina inibe o crescimento bacteriano.
Gelose Xilose-
Lisinina-
Desoxicolato de
sódio
(XLD)
- Meio seletivo diferencial;
- Permite o isolamento de Salmonella spp. e Shigella spp. a
partir de fezes;
- As bactérias que produzem H2S originam colónias com centro
negro;
- A presença de colónias rosas ou vermelhas com ou sem centro
negro (colónias características) representa uma forte presunção
de Salmonella ou de Shigella.
Yersinia agar
(YER)
- Meio de isolamento seletivo e diferencial;
- A presença de manitol e vermelho neutro permite a
diferenciação da Yersinia spp. pela coloração das colónias (rosa
escuro e vermelhas).
Campylosel
(CAM)
- Meio seletivo para o isolamento de Campylobacter spp. a
partir de fezes;
- O meio é enriquecido com sangue de carneiro que facilita o
crescimento destes microrganismos, e possui antibióticos e
antifúngicos que inibem a maior parte dos contaminantes
bacterianos e fúngicos;
- A incubação deste meio de cultura deve ser feita em atmosfera
de microaerofilia
Granada
(GRAN)
- Meio seletivo diferencial;
- Permite o isolamento de Streptococcus do grupo B, utilizado
para sementeiras de zaragatoas vaginais e retais;
- O crescimento de Streptococcus do grupo B é evidenciado pela
presença de colónias cor de laranja.
Gelose chocolate
VCAT
(VCA)
- Meio seletivo para o isolamento de Neisseria gonorrhoeae e
Neisseria meningitidis em colheitas polimicrobianas;
- A seletividade é obtida por associação de antibióticos e
antifúngicos que permitem inibir a maioria das outras bactérias e
leveduras que não as espécies pesquisadas.
Gardnerella
(GAR)
- Meio seletivo destinado à deteção de Gardnerella vaginalis a
partir de colheitas genitais;
- A presença de sangue humano facilita o crescimento da espécie
procurada e permite a obtenção de uma β-hemólise à volta das
colónias;
- Os antibióticos presentes no meio inibem a maioria dos
microrganismos Gram negativos bem como das leveduras.
Mueller Hinton
e
Mueller Hinton
Sangue
- Meios não seletivo;
- Permitem a realização de antibiogramas de bactérias não
fastidiosas por difusão;
- O meio com sangue de carneiro, é utilizado para o mesmo fim,
mas para bactérias que requerem sangue para o seu crescimento
(Streptococcus spp.).
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
19
Tabela 2 - Meios de cultura Líquidos utilizados no SPC da ULS da Guarda.
Meios de Cultura Líquidos Composição e Características Caldo Tripticase
Soja
Composto por uma mistura de peptonas o que permite o crescimento da
maioria dos microrganismos não exigentes (bactérias e fungos).
Caldo Coração-cérebro
(BHI)
Composto por uma base nutritiva enriquecida, está especificamente
adaptado ao crescimento dos microrganismos aeróbios exigentes.
Caldo GN
- Utilizado para o enriquecimento seletivo de organismos gram-negativos,
especialmente a Salmonella spp. e Shigella spp.;
- A alta concentração de manitol acima da concentração de dextrose
favorece o crescimento de Salmonella spp. fermentadora de manitol e
Shigella spp. e desfavorece espécies que não fermentam manitol, como
Proteus.
Caldo Todd
Hewitt +
Antibióticos
(TODD H-T)
- É um caldo de enriquecimento seletivo destinado à deteção dos
Streptococcus do grupo B na mulher grávida;
- Os antibióticos presentes no meio (ácido nalidíxico e colistina) inibem a
maioria dos microrganismos Gram negativos;
- Após a etapa de enriquecimento, o caldo Todd-Hewitt + Antibióticos
deve ser repicado em meios destinados à deteção dos Streptococcus.
Hemoculturas
- Meio não seletivo de enriquecimento;
- Permite a multiplicação de bactérias fastidiosas e não fastidiosas, bem
como de fungos leveduriformes, em amostras de sangue.
2.3.3 Testes de identificação presuntiva
Após observação do crescimento dos microrganismos nos meios de cultura são
executados alguns testes de identificação que orientam e/ou ajudam a fazer uma
identificação presuntiva. Esta identificação permite ao profissional de laboratório
decidir qual o próximo passo na identificação do microrganismo e pode ajudar o clínico
a escolher atempadamente uma terapêutica empírica mais adequada.
A tabela 3 apresenta resumidamente uma breve descrição dos principais testes de
identificação de microrganismos realizados no laboratório de microbiologia.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
20
Tabela 3 - Testes de identificação presuntiva de microrganismos.
Teste Princípio do Teste
Teste da Catalase
- O peróxido de hidrogénio (H2O2) é decomposto em água (H2O) e O2. É
utilizado principalmente para diferenciar as colónias de Staphylococcus
spp. das de Streptococcus spp. isoladas em cultura pura (cocos Gram
positivos).;
- Catalase positiva: formação e libertação imediata e abundante de bolhas
de gás - O2;
- Catalase negativa: não há formação de bolhas de gás - O2.
Teste da Coagulase
- É utilizado para efetuar a identificação presuntiva dos Staphylococcus
aureus (produtores de coagulase) e diferenciá-los das outras espécies de
Staphylococcus (não produtores de coagulase) a partir de colónias isoladas
em cultura pura;
- Quando uma colónia de S. aureus é suspensa num tubo contendo plasma,
a coagulase liga-se ao fator (“clumping fator”) do soro, e este complexo
converte o fibrinogénio em fibrina. Outra forma de testar a presença de S.
aureus é através de kits comerciais que fazem a deteção simultânea do
“clumping fator”, da proteína A e dos polissacarídeos capsulares do S.
aureus. A vantagem do teste comercial é a sua maior sensibilidade e
rapidez.
Teste da Oxidase
- O teste utiliza o reagente de Kovac (dihidrocloreto de tetrametil-p-
fenilenediamina a 1%) que atua como um aceitador artificial de eletrões da
enzima citocromo oxidase que, em aerobiose, é uma enzima produzida por
todas as Pseudomonas, exceto a P. luteola e a P. oryzihabitans. Quando o
reagente é oxidado forma em cerca de 10 a 15 segundos um composto de
cor púrpura (azul de indofenol ou de Wurster);
- Oxidase positivo: Pseudomonas spp.;
- Oxidase negativo: Enterobacterales;
- As Neisseriaceae são também oxidase positivo.
Teste da Optoquina
- Permite testar a sensibilidade do Streptococcus à optoquina. O teste é
utilizado para efetuar a identificação presuntiva das colónias de S.
pneumoniae isoladas em cultura pura e diferenciá-los dos S. viridans (α-
hemolíticos);
- Um halo de inibição igual ou superior a 15 mm significa uma presença
eventual de S. pneumoniae.
Teste da Urease
- Identificação presuntiva de Salmonella spp. e Shigella spp. (negativa);
- A urease é uma enzima que hidrolisa a ureia com libertação de CO2, H2O
e NH3. A amónia em solução resulta numa alcalização do meio pois forma
carbonato de amónio. Uma solução contendo fenolftaleína a pH <8,1
(incolor) com a adição de amónia fica rosa avermelhada devido a
fenolftaleína mudar de cor a pH> 8,1. Proteus spp. (urease +) funciona
como controlo positivo, Klebsiella spp. (urease + fraco) Escherichia coli
(urease -) funciona como controlo negativo.
Testes de
grupagem para
identificação
de
Streptococcus
spp.
- Agrupar segundo a classificação de Lancefield as diferentes classes
de Streptococcus spp.;
- Classificação de Lancefield baseia-se nas características antigénicas de
um polissacarídeo de composição variável, chamado carbohidrato C,
localizado na parede da célula dos Streptococcus spp.. A composição
variável do carbohidrato C permite agrupar os Streptococcus spp. em
diferentes grupos designados por letras do alfabeto (A, B, C, F, G). Esta
prova baseia-se na pesquisa do carbohidrato C através de uma reação de
aglutinação, pelo que são utilizados reagentes compostos por anticorpos
específicos para cada um dos antigénios.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
21
Testes
serológicos
para
classificação
em Grupos de
Salmonellas
De acordo com a espécie de Salmonella spp. em causa, podem ser
identificados diferentes tipos de antigénios, o que permite a sua
classificação em grupos:
- Antigénios somáticos (O) - são compostos por polissacarídeos,
designados por números e classificados como antigénios Major ou Minor;
- Antigénios flagelares (H) - são de natureza proteica, sendo que a cadeia
de aminoácidos é determinada pelos genes H1 e H2 e conferem a presença
e mobilidade dos flagelos;
- Antigénio de superfície (Vi) - só está presente em três serótipos:
Salmonella typhi, S. paratyphi C e S. dublim. Este antigénio permite
mascarar a presença do antigénio O, tornando-o inaglutinável.
Esta prova baseia-se numa reação de aglutinação pelo que são utilizados
reagentes compostos por anticorpos específicos para cada um dos
antigénios. A reação de aglutinação remete para a presença do antigénio
em questão em detrimento dos outros antigénios do mesmo tipo. A
ausência de aglutinação permite inferir a inexistência do antigénio testado.
2.3.4 Identificação bacteriana e teste de suscetibilidade antimicrobiana (TSA)
No SPC a maioria dos microrganismos são identificados e realizados os testes de
suscetibilidade antimicrobiana através do sistema automatizado VITEK® 2 Compact da
Biomerieux®.
Este sistema usa cartas de identificação, que contêm diferentes substratos bioquímicos
que permitem identificar fenotipicamente os diferentes microrganismos e cartas de
antibiogramas, baseados no método das diluições. São utilizadas as seguintes cartas:
✓ GP - Carta de identificação de bactérias Gram positivo;
✓ GN - Carta de identificação de bactérias Gram negativo;
✓ YST - Carta de identificação de leveduras;
✓ NH - Carta de identificação de Campylobacter spp., Neisseria spp.,
Haemophilus spp., entre outros;
✓ ANC - Carta de identificação de bactérias anaeróbicas e corineformes;
✓ N355 - Antibiograma para bacilos Gram negativo aeróbios com significado
clínico (maioria das bactérias isoladas em urinas);
✓ N373 - Antibiograma para bacilos Gram negativo aeróbios com significado
clínico não fermentadores, principalmente Pseudomonas spp. e Acinetobacter
spp;
✓ P648 - Antibiograma direcionado para Staphylococcus spp.;
✓ P586 - Antibiograma direcionado para Enterococcus spp.;
✓ ST03 - Antibiograma direcionado para Streptococcus spp..
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
22
Para a identificação são usadas colónias isoladas que são transferidas para uma solução
salina estéril, de modo a obter uma suspensão de acordo com a escala de MacFarland
dependendo das especificidades do microrganismo a identificar. A suspensão é colocada
nas cartas de identificação e estas inseridas no VITEK que aspira a suspensão para o
interior dos poços, sela as cartas e procede à sua incubação. De 15 em 15 minutos é feita
a monitorização automática da alteração da cor/turvação em cada um dos poços,
obtendo-se a identificação dos microrganismos ao fim de algumas horas (Figura 2).
Para a realização de testes de suscetibilidade antimicrobiana, recorre-se a métodos
automáticos ou utiliza-se discos ou tiras (E-tests) impregnados de antibiótico ou
métodos de micro-diluição.
O sistema automatizado utilizado neste serviço é o Sistema VITEK® 2 Compact da
Biomerieux®, como referido anteriormente, que usa as cartas de antibiograma
específicas para os diferentes microrganismos. A determinação da sensibilidade aos
antibióticos baseia-se no cálculo da concentração mínimas inibitórias (CMI) de
diferentes antibióticos presentes nas cartas. A partir da suspensão preparada para a
identificação, é preparada uma nova suspensão de concentração variável dependendo do
microrganismo em estudo, que é processada de forma semelhante à da identificação.
Nos poços destas cartas existem diferentes concentrações de antibióticos liofilizados. O
equipamento faz a leitura de 15 em 15 minutos e vai medindo a alteração da turvação
nos diferentes poços que é proporcional ao crescimento bacteriano. Posteriormente são
construídas curvas com os valores da CMI dos diferentes antibióticos. Os resultados,
facultados pelo equipamento, são reportados para cada fármaco, como “sensível”,
“intermédio” ou “resistente”.
Figura 2 - Sistema automático de identificação bacteriana - Vitek® 2 Compact e carta de
identificação. Fonte: SPC da ULS da Guarda.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
23
Os resultados são depois analisados pelo equipamento, que reporta o padrão de
sensibilidade e de resistência dos microrganismos em estudo para os diferentes
antibióticos testados.
De seguida, os resultados do equipamento são analisados e os antibióticos são
comunicados ao clínico, tendo em conta o produto, o tipo de infeção e de acordo com as
normas da EUCAST (European Committee on Antimicrobial Susceptibility Testing).
Por vezes no sistema automatizado não é possível detetar a suscetibilidade aos
antimicrobianos porque o antibiótico que se pretende estudar não se encontra nas cartas.
Nestes casos pode-se realizar testes de suscetibilidade recorrendo a discos impregnados
de antibióticos ou a tiras com gradiente de concentração de antibiótico que permitem
determinar a CMI em placa, conhecidos como E-tests.
De acordo com o microrganismo a testar e dependendo das suas características de
crescimento, pode utilizar-se o meio de Muller-Hinton para a maioria dos
microrganismos, a GS para as estirpes de Streptococcus spp. e a GC para estirpes de
crescimento fastidioso, como é o caso dos Haemophilus spp..
O método das diluições baseia-se na rehidratação do antibiótico pela adição de uma
suspensão bacteriana padronizada em cada poço (por exemplo a galeria da colistina).
Após incubação durante 18-24 horas a 35-37ºC, o resultado pode ser lido visualmente e
interpretado. Um poço turvo denota crescimento bacteriano, um poço límpido significa
ausência de crescimento. A CMI é a concentração mais baixa de um antibiótico onde
não se deteta crescimento bacteriano.
Os diferentes métodos também são utilizados para confirmar alguns mecanismos de
resistência, por exemplo, produção de β-lactamases de espectro alargado, β-lactamases
AmpC, metalo-β-lactamases e carbapenemases.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
24
2.4 Produtos biológicos
Os diferentes produtos biológicos quando chegam ao laboratório são processados
segundo procedimentos devidamente escritos, baseados na patogenia da infeção e o
local anatómico. Neste capítulo, para cada produto biológico, são abordados alguns
aspetos importantes relacionados com a colheita, o exame direto, o exame cultural e o
teste de suscetibilidade aos antimicrobianos.
2.4.1 Urina
A infeção urinária é geralmente causada por bactérias da flora intestinal comensal, que
entra no aparelho urinário por via ascendente através da uretra. Os agentes etiológicos
mais frequentes são as Enterobacterales, essencialmente a Escherichia coli, Proteus
spp. e Klebsiella spp. No entanto podem ser encontrados outros microrganismos, como
Enterococcus spp., Pseudomonas spp., Acinetobacter spp., Staphylococcus aureus,
Staphylococcus coagulase negativos e fungos leveduriformes (por exemplo Candida
albicans).
Após desinfeção local, as amostras de urina podem ser obtidas por micção (jato médio),
saco de colheita (por exemplo em crianças que usam fralda), punção supra-púbica ou de
algália.
Quando chega ao laboratório é feita a observação do sedimento, de modo a avaliar a
existência de resposta inflamatória, como a presença de leucócitos, eritrócitos, e ainda
procurar a presença de bactérias, leveduras e células epiteliais escamosas. De seguida é
feito o Gram direto da amostra e semeada em meio de CLED com uma ansa calibrada
de 10 μL para permitir a análise quantitativa das colónias. O meio é incubado em
atmosfera de aerobiose a 35º C, durante 18 a 24 horas.
Na interpretação dos resultados são valorizadas todas as culturas com número de
unidades formadoras de colónias (UFC) ≥ 105 /mL e todas as culturas com número de
colónias entre 104 a 105 UFC/mL de uma ou duas espécies bacterianas. Se a urocultura
não estiver pura procedemos à repicagem das colónias ou sementeira para diferentes
meios, como MSA, DCO e MCK. De seguida, depois de se obter culturas puras ou se
no CLED já estiver pura, procede-se à preparação da suspensão para identificação e
determinação de teste de suscetibilidade aos antimicrobianos no VITEK.
Não são valorizadas culturas com crescimento de 3 espécies de microrganismos ou
mais, reportar como cultura polimicrobiana e recomenda-se repetição de colheira
asséptica.
Na urina podem ser realizados testes rápidos para a pesquisa de antigénios de
Legionella pneumophila Sg1 e Streptococcus pneumoniae que se baseiam em ensaios
imunocromatográficos e que visam a deteção rápida e qualitativa de antigénios solúveis
específicos na urina.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
25
2.4.2 Fezes
As fezes são um produto biológico que têm uma flora comensal mista muito abundante.
Uma grande variedade de bactérias pode causar infeções gastrointestinais, como
Salmonella spp., Shigella spp., Campylobacter spp., Yersinia spp., Escherichia coli
enterohemorrágica, Clostridium spp. e Staphylococcus aureus. Para que estas bactérias
sejam isoladas deve ser recolhida uma amostra de fezes diarreicas ou fezes moldadas.
Quando as fezes chegam ao laboratório são semeadas nos seguintes meios de cultura:
✓ Meio XLD - para Salmonella spp. e Shigella spp. - incubar em aerofilia até 24
horas a 35ºC +/-1;
✓ Meio YER - para Yersinia spp. - incubar em aerofilia até 24 horas a 32ºC +/-1;
✓ Meio CAM - para Campylobacter spp. - incubar em capnofilia até 48 horas a
35ºC +/-1;
✓ Meio MSA - para Staphylococcus aureus - incubar em aerofilia até 24 horas a
35ºC +/-1;
✓ Meio MRSA - para Staphyloccus aureus meticilina resistente - incubar em
aerofilia até às 24 horas a 35ºC +/-1.
De seguida é feito um Leishman, onde se avalia a presença ou não de sangue e de
leucócitos polimorfonucleares (o seu número pode ser indicativo de doença infeciosa), e
um Gram.
As fezes são também semeadas num caldo de enriquecimento para microrganismos
Gram-negativos (caldo GN) e é incubado durante 6-8 horas a 35ºC e ao fim deste
período faz-se uma passagem para o meio XLD para isolamento de Salmonella spp. e
Shigella spp..
Ao fim do período de incubação, observam-se as placas dos diferentes meios para
pesquisa de colónias características. As colónias suspeitas devem ser identificadas e
realizado TSA no VITEK, nos casos que se aplica:
✓ No meio de Yersinia spp. (YER) - as colónias fermentadoras, de cor rosa escura
são consideradas suspeitas;
✓ Nos meios para pesquisa de Salmonella spp. e Shigella spp. (XLD) – as colónias
não fermentadoras da lactose e/ou de centro negro (resultante da produção de
H2S) são consideradas colónias suspeitas, uma vez que os principais agentes de
gastroenterite não têm a capacidade de fermentar a lactose presente no meio e
muitos são produtores de H2S. Há outras bactérias que fazem parte da flora
comensal do intestino, como o Proteus spp., que também originam colónias não
fermentadoras no meio de XLD, mas para distinguir estas bactérias é feito o
teste da urease, sendo que o Proteus spp. é urease positivo e a Salmonella spp. e
a Shigella spp. são urease negativo;
✓ No meio para Campylobacter spp. (CAM) – a presença desta bactéria é feita
pela morfologia das colónias após coloração de Gram;
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
26
✓ No meio para Staphylococcus aureus (MSA) – as colónias fermentadoras do
manitol são suspeitas de ser colónias de S. aureus, que se pode confirmar pelo
teste da catalase e coagulase;
✓ No meio para S. aureus meticilina resistente – as colónias suspeitas aparecem de
cor púrpura neste meio.
Testes rápidos nas fezes
Nas fezes são realizados testes de quimioluminescência para deteção de antigénios do
rotavírus, do adenovírus e do Clostridium dificille. A presença da estirpe toxigénica do
Clostridium dificille é confirmada por biologia molecular.
Pesquisa de sangue oculto nas fezes
A pesquisa de sangue oculto nas fezes é um exame muito importante na deteção precoce
de muitas patologias gastrointestinais, sendo o cancro do colon a mais relevante, devido
à sua alta taxa de mortalidade.
No SPC para a deteção de sangue oculto nas fezes, utiliza-se um teste rápido que
aproximadamente em 10 minutos permite determinar qualitativamente os níveis de
hemoglobina. Este teste baseia-se num método imunocromatográfico, no qual há
migração da amostra de fezes por capilaridade numa membrana, onde estão
impregnados anticorpos anti-hemoglobina. Assim, na presença de sangue nas fezes,
ocorre ligação das moléculas de hemoglobina aos anticorpos específicos anti-
hemoglobina, originando o aparecimento de duas linhas vermelhas na cassete, uma
correspondente ao controlo e outra correspondente ao teste. Na ausência de sangue
oculto nas fezes, na cassete apenas aparecerá uma linha vermelha correspondente à
linha do controlo. Pode ocorrer ainda casos em que o teste é considerado inválido, não
havendo o aparecimento de nenhuma linha na cassete.
Pesquisa de parasitas
Nas fezes, a pesquisa é feita após um método de concentração por sedimentação, sendo
o sedimento observado a fresco entre lâmina e lamela para observação de ovos, quistos
e formas adultas. São processadas três amostras de fezes colhidas em dias diferentes
para aumentar a sensibilidade da técnica.
Os parasitas de maior incidência clínica são Entamoeba histolytica, Giardia lamblia,
Fasciola hepatica, Schistosoma spp., Ascaris lumbricoides, Trichuris trichiura,
Enterobius vermicularis, Hymenolepis spp., Ancylostoma duodenale e Taenia spp.
Adicionalmente é realizada a pesquisa de Giardia lamblia e Cryptosporidium spp. por
um método imunocromatográfico.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
27
2.4.3 Exsudado vaginal e uretral
A vagina e a uretra são os únicos locais do trato urogenital permanentemente
colonizados. A flora vaginal é bastante rica e sofre alterações relacionadas com a idade
e fatores hormonais, já a uretra é relativamente pouco colonizada.
Nos exsudados vaginais por norma pesquisa-se Trichomonas vaginalis, Gardnerella
vaginalis, S. aureus, Neisseria gonorrhoeae, Streptococcus agalactiae - grupo B
(mulheres grávidas entre a 35ª e 37ª semanas para despiste da colonização) e Candida
albicans. Nos exsudados uretrais pesquisa-se a presença de N. gonorrhoeae.
Quando amostra chega ao laboratório é feito um Gram onde se descreve a flora
existente. São avaliadas as células epiteliais, leucócitos, eritrócitos, leveduras e a
presença de T. vaginalis. De seguida é semeada nos seguintes meios:
✓ GS - incuba em aerofilia até às 24 horas a 35ºC +/-1;
✓ GC - incuba em microaerofilia até às 24 horas a 35ºC +/-1;
✓ Gelose VCA - para pesquisa de N. gonorrhoeae - incuba em microaerofilia até
às 24 horas a 35ºC +/-1;
✓ Gelose GAR - para isolamento seletivo de G. vaginalis - incuba em
microaerofilia até às 24 horas a 35ºC +/-1;
✓ Gelose CAN - para pesquisa e isolamento de diferentes espécies de Candida
spp.;
✓ Meio Todd Hewitt e posterior passagem para meio Granada - para pesquisa de
Streptocccus do grupo B - o meio Todd Hewitt incuba em aerofilia até às 24
horas a 35ºC +/-1 e depois é semeado meio de Granada e incubado em
anaerobiose até às 24 horas a 35ºC +/-1 (apenas em mulheres em idade fértil).
Pesquisa de Streptococcus do grupo B
O Streptococcus B (Streptococcus agalactiae) é uma bactéria que pode colonizar o trato
geniturinário ou o trato gastrintestinal da grávida podendo conduzir a infeção por
Streptococcus B no recém-nascido, causando pneumonia, sépsis, e até mesmo
meningite. Uma vez que a colonização por Streptococcus B pode ser transitória, o
“screening” deve ser feito nas grávidas com zaragatoa vaginal e/ou retal, entre as 35ª e
37ª semanas de gravidez para que possa ser feita a descolonização intraparto das
mulheres grávidas infetadas.
Quando as zaragatoas chegam ao laboratório são inseridas num tubo contendo meio de
Todd-Hewitt (meio líquido destinado ao enriquecimento das diferentes espécies de
Streptococcus spp.). Após 24 horas é feita uma passagem para meio de Granada (meio
cromogénico para isolamento de S. agalactiae) que é incubado em atmosfera de
anaerobiose a 35ºC. Após 24 horas as placas são observadas para pesquisa de colónias
alaranjadas que identificam presuntivamente o S. agalactiae. A identificação é
confirmada pelo teste de Lancefield e pela identificação e realização de TSA pelo
VITEK.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
28
Pesquisa de Trichomonas vaginalis em exsudados vaginais
A tricomoníase é a infeção sexualmente transmissível mais comum no mundo. É
causada pelo parasita T. vaginalis e é na maioria dos casos, assintomática e afeta mais
frequentemente as mulheres.
A pesquisa de T. vaginalis em exsudados vaginais é feita através de um teste rápido
imunocromatográfico que deteta a presença de antigénios específicos do protozoário.
2.4.4 Líquido cefalorraquidiano (LCR)
A meningite é uma doença causada pela inflamação das meninges, que são as
membranas que protegem o cérebro e a medula espinal. Essa inflamação é normalmente
resultado de uma infeção do líquido cefalorraquidiano. As bactérias mais
frequentemente envolvidas são a Neisseria meningitidis, o Streptococcus pneumoniae e
o Haemophilus influenzae tipo b, são infeções graves que podem ser fatais. As amostras
de LCR devem ser processadas imediatamente após a colheita, pois estes agentes
patogénicos são pouco resistentes a condições ambientais.
Quando a amostra chega ao laboratório é centrifugada para concentração e o sedimento
é usado para preparar o esfregaço corado pelo método de Gram e é semeado nos
seguintes meios de cultura:
✓ GS - incuba em aerofilia até às 48 horas a 35ºC +/-1;
✓ GC - incuba em microaerofilia até às 48 horas a 35ºC +/-1.
O laboratório deve comunicar ao médico se foram observados microrganismos na
coloração de Gram ou se houve crescimento de colónias ao fim de 24 a 48h. Se houver
crescimento deve ser feito de imediato a sua identificação e TSA no VITEK.
Para que o diagnóstico seja feito com uma maior rapidez são realizados outros exames
como:
✓ Observação macroscópica do líquido para verificação da cor e turvação;
✓ Exame bioquímico do líquido com pesquisa de proteínas totais, glucose e cloro;
✓ Contagem celular por citometria de fluxo;
✓ Pesquisa de antigénios capsulares (teste rápido de aglutinação que pesquisa a
presença dos antigénios da cápsula das principais bactérias responsáveis por
meningite: E. coli K1, Streptococcus Grupo B, S. pneumoniae, N. meningitidis
A,B,C e Y/135, H. influenzae tipo b;
✓ Pesquisa por biologia molecular de um painel de bactérias que podem estar
associadas à meningite, nomeadamente H. influenza, Listeria monocytogenes, N.
meningitidis, S. agalactiae, S. pneumoniae, E. coli K1, dos vírus como
Cytomegalovírus, Enterovirus, Herpes simplex vírus 1, Herpes vírus 2, Human
herpes vírus 6, Human parechovirus, Vírus varicela zoster e de leveduras como
é o caso do Cryptococcus neoformans/gattii.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
29
2.4.5 Outros líquidos
Outros líquidos podem ser colhidos para cultura bacteriológica, como líquido pleural,
sinovial, ascítico e pericárdico. Estes líquidos normalmente são estéreis e qualquer
microrganismo encontrado deve ser pesquisado. A interpretação final deve ter em conta
o estado clínico do doente e o microrganismo isolado.
Quando a amostra chega ao laboratório é realizado um Leishamn e um esfregaço para
corar pelo método de Gram para observação de presença de leucócitos
polimorfonucleares, de células epiteliais e a presença de microrganismos,
respectivamente. De seguida é semeado nos seguintes meios:
✓ GS - incuba em aerofilia até às 48 horas a 35ºC +/-1;
✓ GC - incuba em microaerofilia até às 48 horas a 35ºC +/-1.
Se houver crescimento de colónias ao fim de 24 a 48h é feita a sua identificação e TSA
no VITEK.
Além disso, estes líquidos são sujeitos a contagem celular por citometria de fluxo e a
exame bioquímico para determinação de parâmetros como proteínas totais, glucose, pH
e densidade.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
30
2.4.6 Hemoculturas
A maioria das doenças infeciosas podem decorrer com bacteriemia transitória,
intermitente ou persistente.
O sangue é um produto biológico estéril, como tal se for isolado um microrganismo a
partir de uma hemocultura é geralmente o agente etiológico da infeção. O volume de
sangue colhido deve ser sempre o volume requerido para o tipo de meio de hemocultura
em causa e a hora da colheita, uma vez que o sangue deve ser colhido durante a
ascensão da febre, pois o número de bactérias viáveis no sangue é maior (3). As garrafas de hemoculturas são colocadas num aparelho para incubação de
hemoculturas, o BACTEC 9000MB, durante pelo menos 5 dias ou até deteção de uma
amostra positiva. O aparelho deteta o crescimento bacteriano através da produção de
CO2. Quando o equipamento dá indicação de uma garrafa de hemocultura positiva esta é
retirada do equipamento e após a preparação de uma lâmina para coloração pelo método
de Gram são inoculados os seguintes meios:
✓ GS - incuba em aerofilia até às 48 horas a 35ºC +/-1;
✓ GC - incuba em microaerofilia até às 48 horas a 35ºC +/-1.
Cultura de cateter
Um cateter deve chegar ao laboratório, sempre acompanhado de uma hemocultura, e
deve ser semeado por dois métodos, primeiro pela técnica de Maki que consiste no
rolamento do cateter em placa e segundo semeado quantitativamente após sonicação
para libertação das bactérias do biofilme que se forma no lúmen do catéter. Os meios
para cultura são:
✓ GS - incuba em aerofilia até às 48 horas a 35ºC +/-1;
✓ GC - incuba em microaerofilia até às 48 horas a 35ºC +/-1.
Só deve ser valorizado o crescimento de microrganismos se o mesmo microrganismo
for isolado na hemocultura, caso contrário considera-se que o cateter está colonizado.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
31
2.4.7 Produtos respiratórios
As infeções das vias respiratórias superiores são frequentes, sendo a maior parte de
etiologia viral. Quando a etiologia é bacteriana representa uma tentativa de identificar,
entre uma flora comensal abundante e/ou o(s) agente(s) implicados na infeção.
No aparelho respiratório superior existe uma flora mista abundante, constituída por
aeróbios e anaeróbios, tais como o S. pneumoniae, S. pyogenes, H. influenzae, N.
meningitidis, leveduras e membros das Enterobacterales, podem constituir uma flora
transitória ou estar presente em pequeno número na orofaringe de indivíduos saudáveis.
As principais infeções do trato respiratório superior podem envolver a faringite, a
epiglote e os seios nasais.
Na faringite bacteriana, que também pode ser viral, a principal causa é o Streptococcus
α-hemolítico do grupo A (S. pyogenes). Outras causas de faringite pode ser a N.
gonorrhoeae, Bordetella pertussis e Corynebacterium diphtheriae, devendo a pesquisa
destes agentes ser feita exclusivamente quando existe suspeita clínica e por solicitação
específica do médico.
A epiglotite geralmente é de etiologia bacteriana, sendo na sua maioria provocada pelo
H. influenzae tipo b. A colheita de amostras da epiglote está contra indicada pois pode
originar uma completa obstrução das vias aéreas. O diagnóstico é essencialmente clínico
e através de hemoculturas.
A sinusite é frequentemente de origem endógena, a partir de microrganismos presentes
nas vias aéreas superiores, como é o caso do S. pneumoniae e do H. influenzae (3).
A cultura dos microrganismos do trato respiratório superior faz-se após colheita de
amostra da orofaringe por zaragatoa e posterior sementeira nos seguintes meios:
✓ GS - incuba em aerofilia até às 48 horas a 35ºC +/-1;
✓ GC - incuba em microaerofilia até às 48 horas a 35ºC +/-1.
O diagnóstico das infeções respiratórias inferiores muitas vezes é dificultado pela
contaminação das amostras por flora comensal da orofaringe durante a colheita. As
amostras do trato respiratório inferior incluem as expetorações, as secreções brônquicas,
os aspirados traqueais, os aspirados traqueo-brônquicos, os aspirados brônquicos e os
lavados bronco-alveolares.
O laboratório deve processar apenas as amostras de boa qualidade. De acordo com as
recomendações do Cumulative Techniques and Procedures Clinical Microbiology
(CUMITECH) e a Tabela de Murray e Washington, as amostras biológicas com células
epiteliais ≥ 25 por campo, são geralmente inaceitáveis para exame bacteriológico por
excessiva contaminação orofaríngea. Por isso, para as amostras suscetíveis de
contaminação (expetorações, secreções brônquicas e aspirados traqueais) deve ser feito,
primeiramente, um exame citológico, pela observação microscópica da amostra pela
coloração de Leishman, para que possa ser verificada a sua qualidade pela contagem de
células epiteliais e de leucócitos polimorfonucleares, de acordo com a tabela de Murray
e Washington (Tabela 4).
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
32
Após a observação da lâmina, as amostras dos grupos 4 e 5 da tabela 4 são semeadas
em:
✓ GS - incuba em aerofilia até às 48 horas a 35ºC +/-1;
✓ GC - incuba em microaerofilia até às 48 horas a 35ºC +/-1;
✓ SGC - incuba em aerofilia à temperatura ambiente até às 72 horas (apenas se
semeia neste meio para os aspirados traqueo-brônquicos, os aspirados
brônquicos e os lavados bronco-alveolares).
Após incubação de 24 a 48 horas, observa-se os meios de cultura, para a identificação
das colónias suspeitas. Devido à possibilidade de presença de flora comensal, deve-se
valorizar as colónias presentes em função das bactérias predominantes e das bactérias
visualizadas no Gram.
Os principais microrganismos patogénicos isolados nos produtos respiratórios são os
seguintes:
✓ Streptococcus pneumoniae – colónias α-hemoliticas no meio GS e observados
diplococos Gram-positivo na coloração de Gram. No caso de suspeita da
presença de S. pneumoniae procedemos ao isolamento das colónias suspeitas e à
identificação em sistema automatizado e presuntiva com base na sensibilidade
dos pneumococos à optoquina;
✓ Staphylococcus aureus – colónias β-hemolíticas no meio gelose de sangue e
cocos Gram-positivo em cacho na coloração de Gram. Na presença de colónias
suspeitas, após o isolamento das mesmas, faz-se o teste da catalase e da
coagulase e se forem os dois positivos faz-se a identificação e o antibiograma
em sistema automatizado;
✓ Moraxella catarrhalis - é um diplococo Gram-negativo. A catalase e oxidase são
positivas, faz-se identificação automática e antibiograma manual por E-test;
✓ Enterobacterales e Pseudomonas spp. – Além de crescerem no meio de GS e
GC, crescem também no meio de MCK. No Gram observa-se bacilos Gram-
negativo. Na presença de colónias suspeitas faz-se o teste da oxidase (no caso de
colónias não fermentadoras da lactose) para ajudar na seleção da carta a utilizar
no antibiograma automatizado;
Tabela 4 - Tabela de Murray e Washington. Fonte: Procedimento dos produtos
respiratórios do SPC da ULS da Guarda.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
33
✓ Haemophilus influenzae – cresce apenas em GC. Na presença de colónias
suspeitas, acompanhadas da observação de cocobacilos pleomórficos Gram-
negativo na coloração de Gram, faz-se identificação automática e antibiograma
manual por E-test.
2.4.8 Amostras de feridas, pus e tecidos
Muitas são as situações clínicas e muitos são os respetivos microrganismos responsáveis
por infeções localizadas que conduzem à formação de exsudados purulentos. Assim,
devido às múltiplas variáveis envolvidas, a metodologia para o estudo microbiológico
de qualquer exsudado purulento tem de ter em consideração (3):
✓ Local da infeção;
✓ História clínica, nomeadamente dados epidemiológicos;
✓ Tipo de infeção;
✓ Modo de colheita.
Feridas abertas podem ser frequentemente colonizadas por microrganismos
potencialmente patogénicos não relacionados ao processo infecioso específico. Portanto,
é importante colher amostras na profundidade da ferida após a superfície ter sido bem
limpa. Sempre que possível deve-se evitar a colheita de amostra com zaragatoa, porque
é difícil obter uma amostra representativa sem contaminação com microrganismos que
colonizam a superfície. Da mesma forma, o aspirado de um abcesso fechado deve ser
colhido tanto do centro como das paredes do abcesso, uma vez que a maioria dos
microrganismos se multiplica ativamente na base do abcesso e não no centro.
Os tecidos devem ser obtidos de uma porção representativa do processo infecioso, com
múltiplas amostras colhidas preferencialmente (4).
Após a colheita destas amostras é feito duas lâminas pelo método de Gram e Leishman
e semeadas nos seguintes meios de cultura:
✓ GS - incuba em aerofilia até às 24-48 horas a 35ºC +/-1;
✓ GC - incuba em microaerofilia até às 24-48 horas a 35ºC +/-1;
✓ SGC - incuba em aerofilia à temperatura ambiente até às 72 horas;
✓ DCO - incuba em aerofilia até às 24 horas a 35ºC +/-1;
✓ MSA - incuba em aerofilia até às 24 horas a 35ºC +/-1 ;
✓ MRSA - incuba em aerofilia até às 24 horas a 35ºC +/-1;
✓ MCK - incuba em aerofilia até às 24 horas a 35ºC +/-1.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
34
3. Micobacteriologia
A família das Mycobacteriaceae compreende apenas o género Mycobacterium. Trata-se
de bactérias aeróbias, imóveis, não capsuladas e não formadoras de esporos.
Habitualmente, a maioria das espécies, apresenta uma morfologia bacilar ou
cocobacilar. Caracteristicamente os bacilos são finos, rectos ou ligeiramente
encurvados, apresentando-se isolados, aos pares ou em pequenos agrupamentos de
bacilos paralelos (5).
As bactérias do género Mycobacterium têm uma parede celular que é extremamente rica
em lípidos, que incluem ceras, tendo caracteristicamente ácidos micólicos com cadeias
longas e ramificadas, o que torna a superfície hidrofóbica e confere a estas bactérias
propriedades importantes, não só em termos taxonómicos, como também na patogenia
das respetivas infeções. Assim, estas bactérias são resistentes à coloração por variados
corantes utilizados comumente em bacteriologia, como por exemplo, o método de
Gram. Por outro lado, uma vez coradas, resistem à descoloração por soluções ácido-
alcoólicas, sendo-lhes por isso atribuída a designação de bactérias álcool-ácido-
resistentes (BAAR). Significa isto, que a coloração com um primeiro corante, se
mantém após descoloração com solução álcool-ácida, não adquirindo as bactérias a
coloração com um segundo corante administrado. Embora não seja patognomónica das
micobactérias, a ácido-resistência é talvez a sua característica mais importante em
termos de identificação laboratorial. A metodologia de coloração ácido-resistente mais
utilizada é a coloração de Ziehl-Neelsen (6).
Nas amostras em que é pedido a pesquisa de micobactérias, sendo a mais frequente a
expetoração, é preparado um esfregaço diretamente a partir do produto, para ser corado
pela técnica de auramina e corados pela técnica de Ziehl-Neelsen.
A coloração de auramina é o método de eleição e o recomendado para laboratórios com
microscópio de fluorescência, por se tratar de uma coloração mais sensível, que cora de
amarelo-esverdeado as micobactérias, que ficam fluorescentes num fundo negro, o que
permite distingui-las de outros microrganismos e estruturas celulares presentes na
amostra. Uma vantagem deste método é que permiti a observação numa ampliação de
20x e 40x, o que visualiza mais campos, num menor período de tempo, o que é muito
útil, tendo em conta que, cada esfregaço deve ser observado cuidadosamente para que
possa ser reportado como negativo, pois basta a visualização de um BAAR, para que a
amostra seja reportada como positiva.
Quando são observados num esfregaço BAAR, os resultados devem ser quantificados,
pela técnica de Ziehl-Neelsen para permitir saber qual a quantidade de bacilos
excretados, bem como a extensão da infeção, importante em termos clínicos e
epidemiológicos.
Apesar da elevada sensibilidade e especificidade da observação do esfregaço, a
ocorrência de artefactos durante o processo de coloração pode conduzir a resultados
falsos positivos, como tal em caso de dúvida, um resultado positivo deve ser
confirmado, com novo esfregaço corado por Zihel-Neelsen ou observação por outro
técnico superior/especialista.
A maioria das amostras processadas para a pesquisa de micobactérias contêm outros
microrganismos contaminantes, pelo que, o laboratório deve processar à sua
descontaminação (com hidróxido de sódio-citrato trissódico) e concentração de
amostras, pois permite aumentar a eficiência na recuperação das micobactérias
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
35
existentes na amostra, eliminando todos os outros microrganismos e fluidificando (com
N-acetil-L-cisteína) amostras como as expetorações para um melhor isolamento e
sedimentação.
As amostras depois de descontaminadas e tratadas são inoculadas em meio de
Löwenstein-Jensen e feito também a inoculação num tubo indicador de crescimento
micobacteriano BD BBL MGIT.
Os tubos de Löwenstein-Jensen são incubados até 60 dias na estufa a 37°C e são
observados todas as semanas. Sempre que se observe crescimento suspeito em algum
deles efetua-se uma lâmina corada segundo o protocolo da coloração de Ziehl-Neelsen
para avaliar e pesquisar BAAR. Se algum dos tubos tiver crescimento e for suficiente
procede-se à identificação da bactéria e respetivo antibiograma. Se os tubos não
apresentarem crescimento mantem-se na estufa até 60 dias, após o qual o resultado será
dado como negativo.
Os tubos de BD BBL MGIT contém um caldo de Middlebrook OADC (com albumina
bovina) suplementado com uma mistura de antibióticos, para suprimir a flora normal
das amostras e aumentar a recuperação das micobactérias. A amostra é incubada a 37ºC
no sistema BACTEC MGIT 960. A respiração dos microrganismos aeróbios viáveis
presentes no meio origina uma depleção de oxigénio que provoca um aumento da
fluorescência do sensor do meio. O sensor é monitorizado pelo instrumento
relativamente ao aumento de fluorescência. Uma leitura positiva indica a presença
presuntiva de micobactérias viáveis no meio.
O desenvolvimento das micobactérias é lento e por isso exige períodos de incubação
prolongados, cerca de 42 dias. Caso ocorra crescimento, o sistema notifica a presença de
culturas positivas. Nestes casos, os frascos das culturas são removidos do sistema e
efetuado um esfregaço para coloração pelo método de Ziehl Neelsen para verificar se a
amostra é positiva para BAAR ou se é uma amostra contaminada.
A visualização de BAAR é apenas uma evidência presuntiva de tuberculose. Nestes
casos é feita identificação e antibiograma.
As amostras que se revelem contaminadas, ou seja, se observe a presença de outros
microrganismos (bactérias/leveduras) são submetidas a um novo processo de
descontaminação e incubação.
Paralelamente a estes processos é feito no Laboratório de Biologia Molecular a pesquisa
de Mycobacterium tuberculosis no equipamente GeneXpert, que detecta o DNA
presente nas micobactérias, bem como testes de resistência ao antimicrobiano,
rifampicina.
Figura 3 - Esfregaço de uma cultura positiva para BAAR. Fonte: SPC da ULS da
Guarda.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
36
4. Bioquímica
A bioquímica clínica é uma área das análises clínicas que tem como objetivo a
determinação de parâmetros bioquímicos e sua utilização no diagnóstico, tratamento,
monitorização ou prevenção da doença. É o setor que apresenta o maior fluxo de
amostras diariamente e é, provavelmente, o setor mais automatizado.
4.1 Fase pré-analítica
A fase pré-analítica representa um dos pontos mais importantes e críticos para a
obtenção de resultados fiáveis. Engloba os processos de marcação dos exames, recolha
de informação sobre a preparação e a inscrição do utente, a recolha e preparação das
amostras biológicas e o seu transporte para o laboratório. Nesta fase é onde ocorre a
maior percentagem de erros que afetam a fase analítica e dificultam a interpretação e
validação dos resultados. Os principais erros incluem a perda de amostras ou da
requisição médica, a má preparação do utente, a incorreta identificação da amostra, a má
conservação das amostras biológicas, o transporte incorreto das amostras, a recolha de
quantidade de amostra insuficiente, a contaminação de amostras e a obtenção de
amostras não conforme (como são exemplos as amostras hemolisadas ou contendo
coágulos).
Esta fase envolve cuidados a diferentes níveis, nomeadamente do paciente, da amostra e
da sua receção e triagem.
4.1.1 O paciente
O paciente deve receber todas as informações necessárias sobre os cuidados a ter nesta
fase de pré-colheita de amostras, tais como os tempos de jejum, a ingestão de bebidas
alcoólicas, os tipos de medicamentos que não devem ser consumidos, entre outras que
possam interferir diretamente na qualidade do material colhido.
Nesta fase o registo do utente é muito importante, pois os dados pessoais devem estar
corretos para diminuir qualquer erro, especialmente entre a identificação do paciente e a
amostra.
4.1.2 A amostra
A amostra fornecida deve ser apropriada para o teste solicitado e devem ser
corretamente identificadas e transportadas o mais rapidamente possível para o
laboratório e quando assim não for possível, ou quando a amostra tiver de ser enviada
para um laboratório de referência do exterior para ser analisada, devem ser cumpridos
os requisitos de armazenamento e transporte da amostra para os analitos/métodos em
causa.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
37
Nesta etapa os erros mais comuns são a colheita de quantidade insuficiente de amostra,
amostra colhida em tubo incorreto, tipo de amostra colhida inadequada ao pedido e
identificação incorreta do paciente ou da amostra.
Na área da bioquímica os produtos frequentemente analisados são o sangue,
nomeadamente o soro, pois é o produto de eleição para a realização das análises,
seguido da urina.
Na colheita de sangue podem ser usados diferentes tubos de acordo com a análise que
irá ser processada:
✓ Tubo sem anticoagulante (tubo seco com gel separador – para maioria
das análises imunoquímicas) – SORO;
✓ Tubo com EDTA sódico (por exemplo na determinação de amónia e/ou
peptídeo natriurético (BNP)) – PLASMA;
✓ Tubo com Fluoreto de sódio + EDTA (por exemplo para determinação
de glucose e lactato) – PLASMA;
✓ Tubo de Homocisteína (por exemplo para determinação de homocisteína)
– PLASMA;
✓ Tubo com Heparina (por exemplo para determinações especiais de
bioquímica - Zinco, Chumbo, Cobre) – PLASMA.
O tipo de amostra de urina a ser colhido e o procedimento da colheita depende dos
testes a serem executados.
✓ Urina para Urina sumária e sedimento urinário:
A colheita de urina para urina sumária e sedimento urinário é geralmente
realizada pelo próprio utente. É feita a recolha da primeira urina da
manhã para um recipiente estéril e fechado que deverá ser entregue ao
laboratório o mais breve possível.
✓ Urina de 24 horas:
A colheita da urina de 24 horas implica a recolha de todas as micções
realizadas durante 24 horas. A primeira urina da manhã deve ser
rejeitada, seguido do armazenamento de todas as urinas daquele dia,
inclusive da primeira urina do dia seguinte. Esta urina é usada para
avaliar o funcionamento dos rins, pois é possível definir a taxa de
filtração glomerular, pesquisar a presença de proteínas na urina e
identificar as concentrações na urina de vários sais minerais, como sódio,
potássio, cálcio e fósforo. Permite determinar parâmetros bioquímicos
cujas concentrações sofram alterações ao longo do dia, como é o caso da
creatinina, do cortisol e do péptido C.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
38
4.1.3 Receção e preparação de amostras
Após a colheita, as amostras são entregues no SPC da ULS da Guarda devidamente
acondicionadas e com as respetivas requisições, providas de uma etiqueta com um
número próprio, associado a um código de barras que acompanha a amostra em todo o
seu processamento. Seguidamente, as amostras são triadas e quando necessário
centrifugadas para obtenção do soro ou plasma. Sempre que possível, deve ser
verificado se a amostra se encontra hemolisada, lipémica ou ictérica, ou com qualquer
outro tipo de alteração. Posteriormente, as amostras são colocadas no Aceleratorp540
equipamento inicial que serve para automaticamente, separar, quer em alíquotas que
serão levadas até aos diferentes autoanalisadores, quer para armazenamento e
arquivamento automático.
4.1.4. Sistema de triagem
O sistema de triagem - Acceleratorp540 - separa as amostras de acordo com o pedido de
análise, faz alíquotas se a análise requerida assim necessitar e distribui-as em suportes
destinados aos diferentes equipamentos do laboratório. Terminado o processo analítico,
as amostras são novamente colocadas no Acceleratorp540 e, se todos os testes estiverem
realizados, as amostras são arquivadas automaticamente.
Caso contrário, as amostras são novamente distribuídas, tendo em conta as análises
pendentes. Assim, o Acceleratorp540 permite automatizar as tarefas pré e pós-
analíticas, com as suas funções de descapsulamento, avaliação da quantidade e
distribuição das amostras, realização de alíquotas que irão ser arquivadas e congeladas a
temperaturas de aproximadamente de -50°C e identificação destas por impressão de
novos códigos de barras e arquivamento pós análise.
Figura 4 - Diagrama do fluxo de trabalho do Aceleratorp540. Fonte: SPC da ULS
da Guarda.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
39
4.2- Fase analítica
A fase analítica consiste na montagem e validação das técnicas, execução das análises e
controlo dos resultados e análise do controlo de qualidade interno e/ou externo. Esta
fase apesar de ser a mais automatizada, é importante que seja feita a verificação de
instrumentos e reagentes, a verificação do estado de controle dos sistemas e a
monitorização dos processos de análises.
Após a triagem das amostras, estas são direcionadas para os diferentes autoanalisadores
para o seu processamento.
4.2.1 Equipamentos
O laboratório dispõe de um vasto número de equipamentos automáticos, que permitem
trabalhar um número elevado de amostras que chegam dos vários serviços dos dois
hospitais e dos centros de saúde. Para o processamento das análises existem inúmeros
equipamentos, nomeadamente, o Architectci8200, o Architecti2000sr, o VIDAS 3, o
IMMAGE, o Urisys 2400 e o UF-1000i. Estes equipamentos permitem a análise das
amostras de forma rápida e eficaz, através de diferentes metodologias como a
potenciometria, a fotometria e a quimioluminescência (7).
A potenciometria baseia-se na medição do potencial dum elétrodo indicador em relação
a um elétrodo de referência, quando não passa corrente através da solução em que estão
mergulhados. Geralmente, na maior parte dos métodos eletroquímicos usa-se um
elétrodo indicador em cujo potencial estamos interessados e um elétrodo de referência
cuja função é manter um potencial pelo menos aproximadamente constante. Ambos os
elétrodos estão ligados a um voltímetro, que compara o potencial medido com o
potencial do elétrodo de referência. O potencial corresponde à atividade do ião e está
diretamente relacionado com a sua concentração na solução.
A fotometria é uma técnica que utiliza a luz como forma de energia caracterizada pelos
seus diferentes comprimentos de onda. O espectrofotómetro faz passar um feixe de luz
monocromática através de uma solução (resultante de uma reação enzimática,
colorimétrica ou turbidimétrica) medindo assim a quantidade de luz absorvida
(absorvância) por essa solução no comprimento de onda estabelecido. Esta técnica
relaciona a quantidade de luz absorvida e a fração transmitida e detetada pelo foto-
detetor, com a concentração de sustância a analisar permitindo a sua identificação e
quantificação (2).
A quimioluminescência é um tipo de luminescência em que o evento de excitação é
causado por uma reação química. O evento físico da emissão de luz ocorre num único
estado de excitação em que a luz é emitida quando o eletrão regressa de um nível
energético superior ao seu estado basal de energia. A excitação é causada por uma
reação química que envolve a oxidação de um composto orgânico por um agente
oxidante. A reação ocorre na presença de um catalisador, como as enzimas, iões
metálicos ou complexos metálicos. Este método ultra sensitivo é usado num vasto leque
de imunoensaios automatizados competitivos e não competitivos em “sandwich”, que
utilizam anticorpos ou antigénios ligados a um marcador luminescente. Os marcadores
quimioluminescentes, emitem luz quando combinados com um reagente trigger
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
40
(gatilho), sendo os derivados da acridina os mais usuais. Estes emitem grandes
quantidades de luz sendo mais fácil a sua medição, tornando o método mais sensível.
Todos os equipamentos do SPC são preparados e controlados no início de cada turno de
trabalho, ou seja, são verificados os níveis de reagentes e de consumíveis (pontas,
cuvetes de reação, soluções de lavagem) de cada equipamento e são processados pelo
menos dois níveis de controlo de qualidade interno, para cada parâmetro analisado.
Sempre que necessário (novo lote de reagente, término do prazo de calibração ou falhas
nas regras de controlo de qualidade interno) as diferentes técnicas são calibradas
recorrendo aos calibradores fornecidos pelas casas comerciais.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
41
Tabela 5 - Equipamentos utilizados na fase analítica do setor da Bioquímica Clínica.
Equipamento Metodologia Parâmetros analisados
ArchitectCi8200 Potenciometria
Fotometria
Quimioluminescência
Ionograma, Perfil hepático
Perfil renal, Perfil pancreático
Perfil lipídico, Perfil endócrino
Metabolismo do ferro, Proteínas
séricas
Marcadores cardíacos
Marcadores tumorais
Drogas terapêuticas, Drogas de
abuso
Microbiologia serológica e
antigénica
Architecti2000sr Quimioluminescência Perfil endócrino
Doenças infeciosas
Vidas 3 ELFA (Enzyme Linked
Fluorescent Assay)
Vitamina D
Procalcitonina
Técnicas alternativas para testes
específicos de serologia (Vírus
da Imunodeficiência Humana
(HIV)), Rubéola, Toxoplasma,
Citomegalovirus
Immage Nefelometria
Turbidimetria
Alfa-1-antitripsina
Ceruloplasmina
Apolipoproteína A e B
Lipoproteína A, Haptoglobina
Imunoglobulina A, G e M
Cadeias Kappa e Lamda
Complemento C1q, C3 e C4
Urisys 2400 Fotometria e Reflectância
Sumária urina:
- Cor
- pH
- Densidade
- Bilirrubina
- Urobilinogénio
- Corpos cetónicos
- Glucose
- Proteínas
- Nitritos
- Leucócitos
- Eritrócitos
UF-1000i Citometria de fluxo
Fluorescente
Sedimento urinário:
- Células epiteliais escamosas e
do epitélio renal
- Leucócitos
- Eritrócitos
- Bactérias e leveduras
gemuladas
- Espermatozóides
- Cilindros e cilindros
patogénicos
- Cristais
- Muco
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
42
4.3 Parâmetros bioquímicos
Os parâmetros analíticos que podem ser analisados são imensos e através do seu
enquadramento global e clínico é possível fazer-se o estudo de diferentes patologias.
4.3.1 Ionograma
No organismo humano os eletrólitos desempenham funções diversas que incluem a
manutenção da pressão osmótica, a distribuição de água nos vários
compartimentos/líquidos do organismo, a manutenção do pH, a ativação de enzimas e o
auxílio na contractilidade do miocárdio e na excitabilidade neuromuscular (8).
O ionograma representa a quantificação do sódio, potássio e cloro por potenciometria
indireta realizada com recurso à tecnologia de elétrodos para iões específicos (ISEs),
que consiste na medição da diferença de potencial entre os três elétrodos
correspondentes a cada ião e um elétrodo de prata/cloreto de prata correspondente ao
elétrodo de referência (9).
Tabela 6- Ionograma
Parâmetro Descrição Importância clínica
Sódio
O principal catião
extracelular e é
responsável pela
manutenção do
equilíbrio
hidroeletrolítico do
compartimento
extracelular.
- Um aumento nos valores do sódio pode estar relacionado
com situações de hipovolémia, de desidratação, Síndrome
de Cushing, em que ocorre uma sobreprodução de
aldosterona, ou em situações de consumo elevado de sal
sem a respetiva compensação em água;
- O uso excessivo de diuréticos, vómitos, diminuição da
ingestão de sódio pela dieta ou situações de acidose
metabólica podem levar à hiponatrémia.
Potássio
O principal catião
intracelular envolvido
no balanço e
distribuição de água
no organismo.
- O aumento pode surgir por destruição celular,
insuficiência renal, diminuição da produção de aldosterona,
podendo conduzir a estados de confusão mental, paralisia
ou debilidade generalizada;
- A hipopotassemia, normalmente devido a um aumento da
excreção de potássio, pode estar associada a diurese
osmótica da hiperglicemia, ao hiperaldosteronismo, ao
Síndrome de Cushing, ao uso prolongado de diuréticos e
mineral corticoides, o que conduz a estados de debilidade
muscular, irritabilidade, paralisia, batimento cardíaco
acelerado e, eventualmente paragem cardíaca.
Cloro
O principal anião
extracelular
responsável pela
manutenção do
equilíbrio hídrico e
pressão osmótica.
- O cloro aumenta em situações de acidose associada à
diarreia, doenças dos túbulos renais, hiperparatiroidismo;
- Diminui em situações de vómitos em que há perda de
ácido clorídrico na doença de Addison por deficiente
produção de aldosterona.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
43
Determinação laboratorial do ionograma (Na+, K+ E Cl-):
Amostras - Soro, plasma e urina. A hemólise é um interferente de grande
importância sobretudo no caso do K+.
4.3.2 Perfil lipídico
O perfil lipídico é considerado como potente preditor de doença coronária. No entanto,
alguns dos parâmetros do perfil de risco lipídico podem estar aumentados noutras
doenças como a diabetes, o hipotiroidismo ou a doença renal.
O doseamento dos lípidos, das apolipoproteínas, bem como o lipidograma permitem
caracterizar diferentes hiperlipidémias. A determinação destes analitos são indicados em
indivíduos com valores de colesterol plasmático elevados, indivíduos jovens com
história de enfarte agudo do miocárdio (EAM) e/ou acidente vascular cerebral (AVC) e
nos membros das famílias em que exista um diagnóstico de hipercolesterolémia
familiar, para identificação dos indivíduos com risco elevado de aterosclerose.
As lipoproteínas são partículas complexas de estrutura globular cuja camada externa
fosfolipídica é constituída por apoproteínas e colesterol livre e o seu interior hidrofóbico
constituído, principalmente, por colesterol esterificado e triglicéridos (TGL). As
lipoproteínas classificam-se segundo a sua densidade, nas quais, da menor para a maior
densidade estão os quilomicra, as lipoproteínas de muito baixa densidade (VLDL-C:
very low density lipoprotein cholesterol), lipoproteínas de densidade intermédia (IDL-
C: intermediate density lipoprotein cholesterol), lipoproteínas de baixa densidade (LDL-
C: low density lipoprotein cholesterol) e lipoproteínas de alta densidade (HDL-C: high
density lipoprotein cholesterol) (10).
As LDL-C são as lipoproteínas de maior importância do ponto de vista fisiopatológico,
uma vez que são as que transportam maior percentagem de colesterol. Estas
lipoproteínas são produtos do metabolismo das VLDL-C, que são produzidas no fígado
e que são ricas em TGL, mas uma vez que os ácidos gordos são usados pelo organismo
pela ação da lipoproteína lípase endotelial, as VLDL-C vão perdendo TGL e,
proporcionalmente aumenta a concentração de colesterol que se converte em LDL-C.
Algumas lipoproteínas são variáveis preditivas do risco cardiovascular, como é o caso
das HDL-C que tem a função de remover o colesterol dos tecidos periféricos e
transportá-lo até ao fígado para excreção e das LDL-C que pode depositar-se nos
tecidos periféricos e associar-se a um risco aumentado de doenças cardiovasculares
como aterosclerose, AVC ou EAM, para além dos valores de colesterol total.
O colesterol total é um lípido sintetizado pelo fígado usado para a produção de
hormonas esteroides e constituintes das membranas celulares. O seu doseamento é
importante para o diagnóstico e classificação das lipoproteinémias. Utilizado para
estabelecer o risco de coronariopatias, e na avaliação das hiperlipoproteinémias. A sua
quantificação é utilizada no diagnóstico da função hepática, biliar e funcionamento da
tiroide. O stress, a idade, o equilíbrio hormonal e a gravidez afetam os níveis de
colesterol.
Os triglicéridos são absorvidos através da dieta, ou produzidos por via endógena, a
partir de hidratos de carbono e ácidos gordos. Identificam o risco de desenvolver
coronariopatia, sendo que é determinada em doentes com suspeita de distúrbios do
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
44
metabolismo das gorduras, pois estas são armazenadas e transportadas pelos
triglicéridos.
Atualmente são conhecidas quinze apolipoproteínas diferentes. Na prática corrente
estudam-se apenas as apolipoproteínas A, que são as principais constituintes das HDL e
as apolipoproteínas B, constituintes das LDL, que são sintetizadas pelo fígado e
intestino. A apolipoproteína A é um dos constituintes dos quilomicra e o principal
componente das HDL. Ela ativa a lecitina colesterol acil-transferase, enzima que se
encontra relacionada com a esterificação do colesterol livre nas partículas de HDL,
funcionando como recetor do colesterol que é libertado pelas células, promovendo a sua
eliminação. O doseamento da apolipoproteína A é útil para a identificação de doenças
coronárias. Quanto à apolipoproteína B, existem dois tipos, a apo B-100 e a apo B-48. A
apo B-100 é sintetizada no fígado e é um constituinte estrutural das VLDL, das IDL e é
a proteína exclusiva presente nas LDL. A apolipoproteína B é responsável pelo
transporte e pela remoção das lipoproteínas referidas anteriormente. A apo B-48 é uma
proteína estrutural constituinte dos quilomicra, e é sintetizada no fígado, tendo a função
de ligar as lipoproteínas remanescentes ao seu recetor, removendo-as assim da
circulação. Pacientes que apresentam deficiência na ligação da apo B apresentam
hipercolesterolemia e níveis elevados de LDL. A medição desta é também útil na
identificação de doenças coronárias (10).
O estudo do perfil lipídico é feito neste laboratório por espetrofotometria.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
45
Tabela 7 - Perfil Lipídico
Analito Importância clínica
Colesterol Total
↑ Risco de oclusão da artéria coronária;
↑ Risco de aterosclerose;
↑ Hipertensão arterial;
↑ Risco de enfarte do miocárdio;
↑ Risco cardiovascular generalizado;
↓ Desnutrição;
↓ Disfunções hepáticas.
HDL
(High Density Lipoprotein)
↑ Prevenção de desenvolvimento de doença coronária
(cardioprotetor);
↓ Risco de aterosclerose;
↓ Risco de AVC;
↓ Risco de enfarte do miocárdio.
LDL
(Low Density Lipoprotein)
↑ Risco de aterosclerose;
↑ Risco de AVC;
↑Risco de enfarte do miocárdio.
Triglicéridos
↑ Hipotiroidismo;
↑ Obesidade;
↑ Insuficiência renal;
↑Alimentação rica em hidratos de carbono;
↓ Hipertiroidismo.
Determinação laboratorial dos lípidos e lipoproteínas:
Amostras: Soro ou plasma colhidos em jejum (preferencialmente de 8-12h).
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
46
4.3.3 Perfil pancreático
O pâncreas é uma glândula endócrina e exócrina, desempenhando funções importantes
no processo digestivo. A porção endócrina é composta pelos ilhéus pancreáticos, os
quais produzem hormonas como a insulina e glucagon na corrente sanguínea que são
importantes para a regulação dos níveis plasmáticos de glicose. A porção exócrina
produz um fluido pancreático rico em enzimas digestivas (proteolíticas, amilolíticas e
lipolíticas) e entre outras, como a elastase. Em certas condições patológicas, incluindo
pancreatite, as enzimas pancreáticas começam a aumentar e a produção de hormonas a
diminuir (11).
O estudo da função pancreática faz-se através do doseamento por espetrofotometria, das
principais enzimas pancreáticas, a amílase e a lipase, e de uma forma indireta pelo
doseamento por fotometria, da glucose como resposta à produção ou não de insulina, e
pelo doseamento, por quimioluminescência, do peptídeo C, que é um aminoácido
importante na formação da estrutura da insulina e da pró-insulina, o que permite avaliar
a atividade da secreção das células β-pancreáticas (12).
O diagnóstico de Diabetes Mellitus é feito com base nos seguintes parâmetros e valores
para plasma venoso na população em geral:
✓ Glicemia de jejum ≥ 126 mg/dl (ou ≥ 7,0 mmol/l);
✓ Sintomas clássicos + glicemia ocasional ≥ 200 mg/dl (ou ≥ 11,1 mmol/l);
✓ Glicemia ≥ 200 mg/dl (ou ≥ 11,1 mmol/l) às 2 horas, na prova de tolerância à
glicose oral (PTGO) com 75 g de glicose;
✓ Hemoglobina glicada A1c (HbA1c) ≥ 6,5% (13).
A hemoglobina glicada (HbA1c), corresponde a uma molécula de hemoglobina ligada
covalentemente a uma molécula de glucose. Depende da quantidade de glicose livre em
circulação no sangue no tempo e semivida dos eritrócitos. Forma-se irreversivelmente
durante a vida média do eritrócito. A sua determinação é utilizada como auxiliar no
diagnóstico e monitorização da glicémia em indivíduos com Diabetes Mellitus.
O diagnóstico da diabetes gestacional envolve duas fases temporais distintas a glicemia
em jejum na primeira consulta de vigilância pré-natal e da prova de tolerância à glicose
oral (PTGO) às 24-28 semanas de gestação. Como tal (14):
✓ Um valor de glicemia plasmática em jejum <92 mg/dl (5,1 mmol/L) implica a
realização entre as 24-28 semanas de gestação, de PTGO com sobrecarga de 75
g de glicose;
✓ Um valor da glicemia plasmática em jejum ≥92 mg/dl (5,1 mmol/L) e <126
mg/dl /7,0 mmol/L) faz diagnóstico de diabetes gestacional, não sendo
necessária a realização de PTGO com 75 g de glicose às 24-28 semanas de
gestação;
✓ Um valor de glicemia plasmática em jejum ≥126 mg/dl (7 mmol/L) ou um valor
de glicemia plasmática ocasional >200 mg/dl (11,1 mmol/L) (este valor deve ser
confirmado numa segunda ocasião em dia diferente, com outra glicemia
ocasional ou uma glicemia em jejum) indicia a existência de uma diabetes
provavelmente anterior à gravidez, diagnosticada pela primeira vez na gestação
em curso.
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47
Tabela 8- Perfil Pancreático
Analito Descrição Importância clínica
Amílase
É uma enzima produzida pelo fígado,
pâncreas, glândulas salivares e trompas
de Falópio, que transforma o amido em
açúcar. Associada também a síndromes
abdominais dolorosos sem lesão
pancreática pelo que a amílase, apesar
de sensível, não é especifica de doença
pancreática.
↑ Pancreatite aguda;
↑ Amiloidose;
↑ Doenças das glândulas
salivares;
↑ Inflamação pulmonar.
Lípase
É uma enzima secretada pelo pâncreas
no duodeno. Responsável pelo
processamento dos triglicéridos.
↑ Pancreatite aguda;
↑ Cancro do pâncreas;
↑Obstrução do ducto pancreático.
Glicose
É uma fonte de energia das células,
obtida na alimentação. Em excesso,
leva à produção de insulina através do
pâncreas. Se esta não for secretada, a
glicose fica em níveis elevados
podendo levar à Diabetes mellitus.
Utilizada no diagnóstico e
monitorização de distúrbios
relacionados com o metabolismo dos
hidratos de carbono.
↑ Diabetes mellitus;
↑ Obesidade;
↑ Hepatopatia grave;
↓ Insulinoma;
↓ Tumores pancreáticos;
↓ Insuficiência supra-renal
Determinação laboratorial da amílase e da lípase:
Amostras: Soro, plasma (amostras colhidas em jejum) e urina.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
48
4.3.4 Perfil hepático
O fígado é o órgão do organismo humano que tem a seu cargo numerosas e importantes
funções. Este órgão recebe e processa o sangue venoso, que chega do trato
gastrointestinal, rico em nutrientes, armazena a glicose na forma de glicogénio e
converte-a em aminoácidos e degrada os lípidos. Tem também a função de sintetizar
todas as proteínas plasmáticas, à exceção das imunoglobulinas e liberta os sais biliares
da bílis. Por último, o fígado converte a amónia num metabolito menos tóxico, a ureia, e
é o local por excelência de desintoxicação de compostos exógenos, tais como fármacos,
toxinas e para o catabolismo de várias hormonas, para que possam ser excretadas na
urina e na bílis. Em resumo, o fígado exerce funções vasculares, metabólicas, excretoras
e de biotransformação (11).
O fígado é o único órgão que tem a capacidade de se libertar de produtos de degradação
do heme, a bilirrubina. A bilirrubina é o principal pigmento constituinte da bílis e
resulta da lise dos glóbulos vermelhos.
A sua solubilização no plasma é conseguida através da ligação à albumina, sendo
transportada do local de produção (no baço) ao hepatócito através do sangue sinusoidal.
É captada através da membrana basolateral, por difusão passiva ou por transporte
mediado por proteínas de membrana. Uma vez, no interior do hepatócito liga-se
reversivelmente a proteínas solúveis. Durante o processo metabólico da bilirrubina
existe a formação de dois tipos de bilirrubina que se denominam bilirrubina não
conjugada e bilirrubina conjugada. A bilirrubina não conjugada corresponde à
bilirrubina ligada à albumina e que é insolúvel, não podendo ser nesta forma eliminada
do nosso organismo. A bilirrubina conjugada é a forma solúvel, constituída por
moléculas de bilirrubina ligadas a moléculas de ácido glucorónico, que torna as
moléculas de bilirrubina mais hidrofílicas (11).
A monitorização das funções do fígado, através da determinação de parâmetros
hepáticos é um processo que permite não só identificar anormalidades na função
hepática, como identificar o tipo e o local da lesão.
Os principais testes de avaliação do funcionamento hepático incluem a determinação
por espetrofotometria de substâncias que são libertadas como resultado da ocorrência de
um dano tecidular, tais como a gama-glutamil transferase (γGT), a aspartato
aminotransferase (AST), a alanina aminotransferase (ALT), a fosfatase alcalina (ALP),
a lactato desidrogenase (LDH), a amónia e a bilirrubina total e direta.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
49
Tabela 9- Perfil Hepático
A determinação laboratorial é feita a partir do plasma.
Analito Descrição Importância clínica
Gama-glutamil
transferase
(γ- GT)
É produzida pelo fígado, pâncreas e rins,
aparecendo na corrente sanguínea após lesão destes
órgãos.
↑ Alcoolismo crónico
↑ Drogas
↑ Doenças hepáticas
↑ Hepatocarcinoma
↑ Cancro do pâncreas
Aspartato
aminotransferase
(AST)
É encontrada nos tecidos altamente metabólicos,
como o músculo cardíaco, os hepatócitos, os
eritrócitos, o cérebro e o tecido músculo-
esquelético. Utilizado na determinação do progresso
e prognóstico de pacientes com enfarte do
miocárdio, e diagnóstico e monitorização de
doenças hepáticas.
↑ Embolia pulmonar
↑ Enfarte de miocárdio
↑ Cirrose alcoólica
Alanina
aminotransferase
(ALT)
É encontrada predominantemente no fígado. Não
sendo específica do fígado pode aparecer
aumentada, no enfarte agudo do miocárdio.
↑ Hepatites
↑ Cirrose hepática
↑ Tumores hepáticos
↑ Enfarte agudo do miocárdio
Fosfatase alcalina
(ALP)
É encontrada em grandes quantidades no fígado, no
epitélio do trato biliar e osso. Por ser pouco
específica do fígado aparece aumentada noutras
doenças.
↑ Aumento do metabolismo ósseo
↑ Hipertiroidismo
↑ Linfoma de Hodgkin
↑ Doenças hepáticas
↓ Hipotiroidismo
↓ Desnutrição
↓ Doença celíaca
Lactato desidrogenase
(LDH)
É uma enzima intracelular utilizada para confirmar
o diagnóstico de lesão ou doença que afete o
coração, o fígado, os eritrócitos, os rins, o músculo-
esquelético, o cérebro e os pulmões. É pouco
específico quando isolado e por isso aparece
aumentado em inúmeras doenças.
↑ Anemia Hemolítica
↑ Anemia Megaloblástica
↑ Cirrose hepática
↑ Doenças cardio-respiratórias
↑ Distrofia muscular
↑ Neoplasias
Amónia
É uma substância tóxica para o organismo que
resulta do catabolismo dos aminoácidos, sendo
convertida pelo ciclo da ureia no seu metabolito
menos tóxico, a ureia. A hiperamoniemia pode ser
primária quando ocorrem defeitos genéticos ou
congénitos na formação de enzimas do ciclo da
ureia ou secundária no caso de lesão hepática.
↑Hepatites
↑Neoplasias hepáticas
↑Cirrose hepática
Bilirrubina total
É formada por degradação dos eritrócitos no baço,
fígado e medula óssea. É utilizada na avaliação da
função hepática, na anemia hemolítica e na icterícia
do recém-nascido.
Hiperbilirrubinémia:
↑ Doenças hemolíticas;
↑ Doenças hepáticas;
↑ Obstrução hepática Bilirrubina direta
É a bilirrubina ligada ao ácido glucorónico, que é
excretada para a bílis de forma a ser eliminada pelo
intestino delgado.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
50
4.3.5 Perfil renal
Os rins são como um sistema purificador do organismo, tornando-se o órgão de maior
importância nos mecanismos da homeostase do organismo. Este processo envolve a
filtragem do sangue, regulação do volume sanguíneo, regulação da concentração de
solutos no sangue e regulação do pH do líquido extracelular. Além disso, os rins
secretam a eritropoietina, hormona que regula a síntese dos glóbulos vermelhos na
medula óssea e têm um papel importante no controlo dos níveis de Ca2+ no sangue,
regulando a síntese da Vitamina D.
Existem quatro principais produtos de excreção, nomeadamente, a creatinina, a ureia, o
ácido úrico e a cistatina C, que por terem excreção exclusivamente renal permitem a
monitorização da função do rim (15).
Os três primeiros parâmetros referidos são determinados por espectrofotometria
imunoenzimática, enquanto a cistatina C é determinada com recurso a um ensaio
imunoturbidimétrico (9).
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
51
Tabela 10 - Perfil renal
Analito Descrição Importância clínica
Creatinina
É o produto final do metabolismo da
creatina e encontra-se essencialmente no
tecido músculo-esquelético. É filtrada no
glomérulo e secretada no túbulo proximal
do rim e só uma pequena parte é
reabsorvida sendo utilizado na avaliação da
função renal.
↑ Insuficiência renal crónica ou aguda;
↑ Toxicidade por fármacos;
↑ Exercício físico intenso;
↓ Redução da massa muscular;
↓ Distrofia muscular
Ureia
É um composto azotado intermediário do
metabolismo das proteínas e dos ácidos
nucleicos. Formada no fígado,
maioritariamente excretado pela urina por
filtração glomerular.
↑ Glomerulonefrite;
↑ Pielonefrite;
↑ Insuficiência renal aguda ou crónica;
↑ Dieta rica em proteínas;
↑ Desidratação;
↓ Insuficiência hepática aguda;
↓ Dieta pobre em proteínas
Ácido úrico
É o produto final do metabolismo das
purinas (adenina e guanina) durante a
síntese e degradação de RNA e de DNA.
↑ Insuficiência renal;
↑ Cálculos renais;
↑ Gota;
↑ Envenenamento por chumbo;
↑ Anemia Hemolítica;
↓ Defeitos tubulares renal;
↓ Défice em folatos;
↓ Doença de Wilson.
Cistatina C
A cistatina C é produzida por todas as
células nucleadas, numa taxa constante e é
praticamente toda eliminada da circulação
através da filtração glomerular.
Marcador precoce de dano renal.
A sua concentração sérica é independente da
massa muscular e do sexo no intervalo de 1
a 50 anos e, por isso, surge como um
marcador mais sensível para avaliação da
função renal.
Determinação laboratorial:
Amostras: Soro, plasma e urina
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
52
4.3.6 Perfil endócrino
A análise do perfil endócrino permite o estudo do funcionamento das hormonas no
organismo humano e o diagnóstico de doenças das glândulas endócrinas.
No SPC da ULS da Guarda, a determinação das diferentes hormonas é feita por
espetrofotometria e por imunoensaios de micropartículas por quimioluminescência.
➢ Hormonas sexuais
As hormonas do sistema reprodutor são segregadas principalmente pelos ovários,
testículos, placenta e lobo anterior da hipófise. Estas hormonas são fundamentais para o
desenvolvimento dos órgãos sexuais, bem como para a função sexual e reprodutora. O
estudo do perfil hormonal sexual tem em conta as seguintes hormonas: hormona
folículo-estimulante humana (FSH) e hormona luteinizante (LH), o estradiol, a
progesterona, a prolactina, a gonadotropina coriónica humana (β-HCG) e a testosterona.
A FSH e LH são segregadas pelas células gonadotróficas da hipófise anterior sob a
influência da LH-RH hipotalâmica e atuam em conjunto para provocar a estimulação
das gónadas (ovários e testículos). Na mulher, a FSH assegura a maturação folicular e
estimula as células da granulosa, que provoca a secreção dos estrogénios. A LH
desencadeia a ovulação no momento do seu pico secretório e mantém a secreção do
estradiol e da progesterona pelo corpo amarelo durante a fase luteínica. No homem, a
FSH contribui para a espermatogénese pela sua ação sobre os tubos seminíferos. A LH
atua sobre as células de Leydig que sintetizam a testosterona (16).
O estradiol é o principal estrogénio segregado durante o ciclo ovárico pelos folículos de
Graaf. É o estrogénio da mulher em período de atividade fértil.
A progesterona é produzida principalmente pelo corpo lúteo do ovário nas mulheres
com menstruação regular e em menor quantidade pelo córtex adrenal. As principais
funções da progesterona relacionam-se com a preparação do útero para a implantação
do embrião e manutenção da gravidez.
A prolactina é a hormona responsável pelo desenvolvimento e diferenciação das
glândulas mamárias e o seu aumento está associado à lactação pós-parto, mas também a
situações de hipogonadismo e infertilidade.
A β-HCG é produzida na placenta durante a gravidez e em mulheres não grávidas, o que
pode surgir aumentada em determinados tumores.
A testosterona é o principal androgénio segregado pelas células testiculares de Leydig.
A sua secreção é regulada pelas hormonas gonadotróficas hipofisárias sobre as quais a
testosterona exerce um retrocontrolo negativo.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
53
Tabela 11 - Perfil endócrino
Analito Importância Clínica
Hormona folículo-estimulante humana
(FSH)
Hormona luteinizante
(LH)
Mulheres:
↑ Menopausa
↑ Hipofunção ovariana
↓ Hiperfunção ovariana.
Homens:
↑ Hipogonadismo primário
↓ Hipergonadismo.
Estradiol
O controlo dos níveis de estradiol é importante na
determinação da amenorreia, da puberdade
precoce e do início da menopausa, assim como da
infertilidade masculina e feminina.
Progesterona ↑Gravidez;
↓Infertilidade.
Prolactina
↑ Hiperprolactinémia (lactação pós-parto);
↑ Hipogonadismo;
↑ Infertilidade
Gonadotropina coriónica humana
(β-HCG)
↑ Aborto;
↑ Tumores trofoblásticos e não trofoblásticos;
↑ Tumores das células germinais com
componentes trofoblásticos.
Testosterona
↓ Hipogonadismo;
↓ Insuficiência testicular;
↓ Infertilidade;
↓ Hipopituitarismo.
➢ Hormonas da tiroide
A função tiroideia é regulada a dois níveis, pelo eixo hipotalâmico-hipofisário- tireóide,
onde intervêm a hormona libertadora de tireotrofina (TRH), a hormona estimuladora da
tiroide (TSH) e as hormonas tiroideias (T3 - triodotironina e T4- tiroxina), e pelo iodo
orgânico intraglandular, necessário à síntese das hormonas da tiroide. Em termos
laboratoriais, a análise do perfil tiroideio corresponde à determinação, por
quimioluminescência, dos valores de T3, T4, TSH e TG (tiroglobulina). A função da
hormona paratiroide é analisada tendo em conta a determinação da concentração sérica
da hormona paratiroideia (PTH) (17).
A determinação das concentrações séricas das hormonas T3 e T4 permite fazer o
diagnóstico de hipertiroidismo, com valores de T3 e T4 aumentados, e hipotiroidismo,
com hormonas da tiroide diminuídas. Como estas hormonas exercem um efeito de
“feedback” negativo no eixo hipotalâmico-hipofisário-tireóide, através dos valores de
TSH é possível fazer este diagnóstico diferencial, sendo que para esta hormona os
valores aparecem baixos no hipertiroidismo e altos no hipotiroidismo primário. Esta
hormona permite, ainda, fazer a monitorização da terapêutica com a hormona tiroideia.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
54
A TG é o suporte da síntese, do armazenamento e da libertação das hormonas tiroideias
(T3 e T4). A sua concentração é proporcional à massa tiroideia, sendo útil no
diagnóstico do carcinoma da tiroide folicular metastático ou lesões inflamatórias (18).
A PTH é formada na glândula paratiroideia e tem o papel de regular a concentração de
cálcio ionizado no sangue e nos líquidos corporais, através do efluxo de cálcio dos
ossos, da reabsorção do cálcio urinário e da ativação da vitamina D, com consequente
aumento da reabsorção de cálcio nutricional pelo intestino (19).
➢ Outras hormonas de interesse clínico
O cortisol é a principal hormona glicocorticóide segregada pelo córtex suprarenal. As
suas funções incluem a regulação do metabolismo dos hidratos de carbono e a
distribuição de eletrólitos, tem um efeito imunossupressor e anti-inflamatório e é
indicador direto do estado da glândula suprarrenal e indicador indireto de hiper ou
hipofunção da hipófise (19).
A insulina é segregada pelas células dos ilhéus de Langerhans do pâncreas, é a única
hormona hipoglicemizante. Favorece o armazenamento e utilização da glicose pelo
fígado, a captação da glicose pelas células periféricas e estimula a lipogénese.
A hiperinsulinémia pode levar a hipoglicémia, que por sua vez, leva à diminuição de
insulina que está associada à diabetes, ao aumento da síntese de VLDL, à hipertensão e
a um risco aumentado de doença cardiovascular (19).
O sulfato de dehidroepiandrosterona (DHEA-S) é o androgénio suprarrenal mais
abundante e funciona como neuroesteróide, produzido pelo córtex suprarrenal. As
concentrações séricas declinam com a idade e podem ser utilizadas como fator de
prognóstico em doenças graves e na progressão do cancro da mama. Aparece
aumentado no tumor suprarrenal, na hiperplasia suprarrenal congénita e na síndrome do
ovário poliquístico (19).
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
55
4.3.7 Metabolismo do ferro
O ferro que circula no sangue resulta de um equilíbrio entre as reservas do organismo
(essencialmente hepáticas), a absorção alimentar e a hemólise fisiológica. É um ião
presente em baixas quantidades no organismo humano, estando distribuído
maioritariamente nos eritrócitos e nos seus percursores medulares como parte
constituinte da hemoglobina, encontrando-se ligado a várias enzimas, como cofator, e
estando armazenado na forma de ferritina e hemossiderina.
O estudo do metabolismo do ferro é feito pela determinação da capacidade total de
ligação do ferro (TIBC), das concentrações do ferro, da ferritina, da transferrina, do
ácido fólico e da vitamina B12.
A TIBC é um analito que permite fazer um diagnóstico diferencial dos diferentes tipos
de anemia, pois reflete a concentração máxima de ferro que as proteínas séricas,
principalmente a transferrina, podem ligar nos seus locais de ligação ao ferro, quando
estão saturadas. Aumenta na deficiência de ferro e diminui nas desordens inflamatórias
crónicas.
O ferro é um dos constituintes da hemoglobina e está relacionado com o transporte do
oxigénio até aos tecidos, através dos eritrócitos. A determinação deste analito é útil no
diagnóstico e na monitorização de anemias ferropénicas e em situações de
hemocromatose, devendo ser acompanhada pelo estudo da ferritina e transferrina.
Aparece diminuído na anemia ferropénica, por perda crónica de sangue ou por absorção
inadequada de ferro. Já o seu aumento está associado a anemias sideroblásticas, anemias
hemolíticas, hemocromatose e talassémias.
A ferritina é uma proteína de armazenamento do ferro e abunda no fígado e nos
macrófagos. Por isso, é utilizada no diagnóstico e monitorização da anemia ferropénica
e sideroblástica, onde aparece diminuída, bem como na hemocromatose, onde esta
aparece aumentada. Por ser uma proteína de fase aguda, a ferritinia pode surgir
aumentada em processos inflamatórios agudos (20).
A transferrina é a principal proteína transportadora de ferro no soro e capta o ferro das
reservas (fígado, sistema dos macrófagos mononucleares). Como tal, aumenta nas
anemias por depleção de ferro e apresenta-se diminuída na hemocromatose.
O ácido fólico e a vitamina B12 são utilizados no diagnóstico e monitorização de
anemias megaloblásticas, sendo que o seu papel está relacionado com a síntese,
reparação e funcionamento do RNA, do DNA e de proteínas mitocondriais (21).
✓ Determinação laboratorial do ferro:
Amostras: Soro. Amostra colhida em jejum e preferencialmente pela manhã, pois sofre
variação circadiana.
Método: Espectrofotometria Visível – Ferene S + Ferro complexo corado.
✓ Determinação laboratorial da transferrina:
Amostras: Soro.
Método: Imunoturbidimetria.
✓ Determinação laboratorial da ferritina, folatos e vitamina B12:
Amostras: Soro.
Método: Quimioluminescência (CMIA).
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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4.3.8 Proteínas séricas
As proteínas séricas são parte integrante das células, fluídos e órgãos, estando
envolvidas em numerosos processos orgânicos. A avaliação da concentração de
determinadas proteínas séricas tem considerável valor diagnóstico em desordens agudas
e crónicas. Entre estas proteínas destacam-se a albumina, o valor de proteínas totais e a
proteína C-reativa (PCR), determinadas por fotometria, através de testes colorimétricos.
A albumina é a principal proteína do soro, sendo utilizada como marcador de alteração
do metabolismo proteico e no diagnóstico e na monitorização de doenças inflamatórias
crónicas e renais. Aparece aumentada em situações de hipovolémia como na
desidratação intensa e diminuída nas doenças hepáticas (diminuição da função de
síntese) e em situações de aumento do catabolismo ou baixa absorção (19).
As proteínas totais são sintetizadas no fígado e incluem a albumina e as globulinas α1,
α2, β e γ. A determinação destas é utilizada em diversos distúrbios hepáticos, renais,
metabólicos, nutricionais e relacionados com a medula óssea. São exemplos de
situações de hiperproteinémia o mieloma múltiplo, a cirrose hepática, inúmeras
situações inflamatórias, situações de hipoproteinémia, a gravidez, hepatopatias e
glomerulonefrite (19).
A PCR é uma proteína de fase aguda sintetizada no fígado numa fase precoce da reação
inflamatória sob a influência dos mediadores leucocitários dos quais o mais importante
é a interleucina I. Aparece aumentada em distúrbios inflamatórios, lesão tecidular,
infeções e situações de stress intenso (19).
Outras proteínas, de grande interesse clínico são a procalcitonia, a alfa I-antitripsina, a
ceruloplasmina, a lipoproteína A, a haptoglobina, as imunoglobulinas e as proteínas do
complemento. No SPC as determinações são feitas por turbidimetria e nefolometria.
A procalcitonina (PCT) é uma proteína produzida na tiroide, no fígado, pelos
macrófagos, no pulmão e no pâncreas. É um marcador de fase aguda para detetar
infeções, sobretudo de origem bacteriana, uma vez que nas infeções de outra origem, os
seus valores de concentração não se alteram significativamente e é um ótimo marcador
precoce de sépsis, pois possui uma rápida cinética. A PCT tem funções biológicas,
como mediador da resposta inflamatória (19).
A alfa 1-antitripsina é uma proteína sintetizada pelo fígado e está presente no plasma
numa taxa elevada. A principal função é a inibição de proteases, principalmente a
elastase. Esta protege os tecidos do corpo de serem danificados pela enzima elastase,
presente nos neutrófilos, monócitos e eosinófilos, quando estas entram em ação aquando
de uma inflamação em alguma parte do corpo. As suas pequenas dimensões permitem-
lhe que se difunda nos fluidos corporais facilmente (19).
A ceruloplasmina é uma glicoproteína de origem hepática que assegura o transporte do
cobre no plasma. É uma proteína de fase aguda e a sua principal utilização clínica é no
diagnóstico diferencial de várias doenças hepáticas e da doença de Wilson, a qual é
acompanhada pela diminuição dos níveis séricos de ceruloplasmina (19).
A lipoproteína A é uma lipoproteína funcional, que é considerada um fator de risco
independente para a doença coronária, cerebrovascular, vascular periférica e
tromboembolismo venoso. A sua função fisiológica não é ainda conhecida, no entanto
parece possuir uma função no sistema de coagulação, pois apresenta grande homologia
com o plasminogénio e com o fator ativador do plasminogénio tecidual. Pois esta
proteína compete com o plasminogénio pelas zonas de ligação, levando a uma
fibrinólise reduzida. Estimula também a secreção do inibidor do ativador do
plasminogénio, levando a tromboembolismos (19).
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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A haptoglobina é uma glicoproteína plasmática de fase aguda sintetizada no fígado, que
se liga à hemoglobina, quando esta é libertada por hemólise, formando um complexo
muito estável com a hemoglobina. É importante a nível do controlo de processos
inflamatórios locais, assim como para avaliar a severidade da patologia hemolítica.
Além disso, o complexo haptoglobina-hemoglobina age como uma peroxidase,
hidrolisando os peróxidos libertados durante a fagocitose e impedindo a peroxidação
lipídica. Tem também um papel bacteriostático ao impedir que as bactérias utilizem o
ferro da hemoglobina (19).
As imunoglobulinas são glicoproteínas produzidas pelos plasmócitos em resposta a um
antigénio e que funcionam como anticorpos. Encontram-se presentes nas membranas
dos linfócitos B, conferindo assim especificidade antigénica a estas células, que ao
circularem pelo sangue neutralizam antigénios ou marcam-nos para serem eliminados
(19). Existem três tipos de imunoglobulinas:
✓ A imunoglobulina A (IgA) é a imunoglobulina mais abundante a nível das
secreções externas, como o leite materno, saliva, lágrimas e secreções
gastrointestinais e brônquicas e apresenta uma função importante na proteção do
trato respiratório e do trato genito-urinário contra infeções;
✓ A imunoglobulina G (IgG) é a principal imunoglobulina presente no sangue,
sendo produzida em grandes quantidades durante a resposta imunitária,
desempenhando um papel importante na neutralização de toxinas bacterianas e
na fagocitose de microrganismos;
✓ A imunoglobulina M (IgM) é a primeira classe de imunoglobulinas a ser
produzida pelos recém-nascidos. A sua concentração nos fluídos intracelulares é
baixa devido às suas grandes dimensões. Sendo que esta imunoglobulina
participa na resposta imunitária primária e esta característica permite perceber se
a infeção é aguda ou crónica.
As imunoglobulinas são compostas por quatro cadeias peptídicas, duas cadeias leves
(Kappa e Lambda) e duas cadeias pesadas. A região amino-terminal das cadeias leves e
pesadas variam de anticorpo para anticorpo, conferindo assim diferentes especificidades
entre anticorpos, pois é nesta região que tem lugar a ligação antigénica. A produção de
cadeias leves Kappa é normalmente duas vezes maior do que a produção de cadeias
leves do tipo Lambda. Estes valores de cadeias Kappa e Lambda são importantes para o
diagnóstico e monitorização de algumas patologias, como hepatopatias e mieloma
múltiplo. A principal aplicação da quantificação das cadeias leves reside na
identificação do carácter monoclonal ou policlonal da proliferação de plasmócitos ou de
células linfoides (19).
As proteínas do Complemento C1q, C3, C4 e CH50 são um grupo de proteínas séricas
que identificam e destroem os agentes infeciosos por lise, por opsonização ou por
recrutamento de células fagocíticas e que promovem inflamação. Estas proteínas são
úteis no diagnóstico de inflamações crónicas não infeciosas, doenças sistémicas,
distúrbios necróticos, glomerulonefrite, pneumonia, meningite bacteriana e septicémia
(19).
✓ Determinação laboratorial:
Amostras: Soro e plasma.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
58
4.3.9 Marcadores cardíacos
O enfarte do miocárdio é uma das várias manifestações clínicas associadas à falta de
oxigénio no miocárdio por insuficiência circulatória coronária. A falta de oxigénio
resultante pode causar danos nas células cardíacas e libertação de proteínas no sangue,
designados marcadores cardíacos.
Os biomarcadores cardíacos são um elemento fundamental para o diagnóstico das
síndromes coronárias agudas, uma vez que, a avaliação clínica é frequentemente
limitada em sintomas atípicos e, por vezes, o eletrocardiograma inicial não permite o
diagnóstico por si só. O conhecimento do padrão de subida destas substâncias no sangue
periférico e dos seus valores de referência é fundamental para uma utilização adequada
em contexto clínico, pois fornecem informação prognóstica e permitem uma melhor
orientação terapêutica (22). No laboratório do SPC a determinação destes marcadores é
feita com recurso a imunoensaios de micropartículas por quimioluminescência.
A creatinina-quinase (CK) é uma enzima inespecífica do músculo cardíaco que é
utilizada no diagnóstico e monitorização de doenças associadas ao músculo cardíaco,
músculo esquelético, sistema nervoso central e tiroide. Por sua vez, a creatinina-quinase
- MB (CKMB) é uma isoenzima da CK específica do músculo cardíaco e, por isso, o
aparecimento da CK-MB no soro, na ausência de traumatismo muscular grave, pode
indicar danos cardíacos e, por conseguinte, enfarte agudo do miocárdio.
O BNP é um peptídeo natriurético sintetizado e libertado na corrente sanguínea em
resposta a uma sobrecarga de volume ventricular ou a patologias causadoras de
dilatação ventricular, para controlar a homeostasia dos fluidos e eletrólitos. Níveis
plasmáticos de BNP fornecem informações úteis para o diagnóstico e tratamento da
disfunção do ventrículo esquerdo e insuficiência cardíaca, bem como para avaliar a
gravidade da insuficiência cardíaca (22).
A mioglobina é a proteína de ligação do oxigénio do músculo cardíaco e do músculo
esquelético. A sua determinação fornece um índice de lesão do miocárdio, sendo
utilizado para avaliação inicial de pacientes com suspeita de enfarte agudo do miocárdio
(22).
A troponina T (TnT) é uma proteína que pertence ao complexo do aparelho contráctil
miofibrilar do músculo estriado, que regula a força e rapidez da sua contração. A sua
libertação e elevação na circulação ocorre 4 a 6 horas após lesão cardíaca (22).
✓ Determinação laboratorial:
Amostras: Soro ou plasma
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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4.3.10 Marcadores tumorais
Marcadores tumorais são substâncias usadas como indicadores de malignidade, que
passam de células neoplásicas ao sangue, à urina e aos tecidos biológicos. A sua
presença é um indicador importante para o rastreio e diagnóstico de tumores,
monitorização da eficiência da terapêutica, deteção precoce de recidivas e
estabelecimento do prognóstico, quando utilizados com outros meios (23).
Os marcadores tumorais mais utilizados na clínica são a alfa-fetoproteína, o antigénio
125 do cancro (CA 125), o antigénio total específico da próstata (PSA Total), o
antigénio carbohidrato (CA 19.9), o antigénio carcinoembrionário (CEA), o antigénio
15.3 do cancro (CA 15.3) e o marcador CYFRA 21.1
No SPC a metodologia para o doseamento dos marcadores tumorais é feito por
imunoensaio de micropartículas por quimioluminescência (CMIA).
A alfa-fetoproteína é uma proteína fetal sintetizada pelo fígado, saco vitelino e trato
gastrointestinal, utilizada como marcador de defeitos do tubo neural no feto em
desenvolvimento, do carcinoma hepatocelular e do carcinoma das células germinativas.
O antigénio CA 125 é um antigénio glicoproteico de superfície da família das mucinas,
secretado a partir da superfície das células tumorais do ovário. É útil na avaliação da
terapia e monitorização do cancro dos ovários, bem como de neoplasias do pulmão,
mama, pâncreas e colón.
O antigénio PSA Total é uma glicoproteína sintetizada na glândula da próstata sendo
indicativa de patologias na mesma.
O antigénio CA 19.9 é uma glicoproteína do tipo mucina e de elevado peso molecular.
Permite a monitorização do tratamento e prognóstico do cancro do pâncreas, bem como
do cancro nos ductos biliares, do colón e do recto.
O antigénio CEA é uma glicoproteína pertencente ao grupo dos antigénios carcinofetais
que são produzidos durante o período embrionário. Encontra-se sobretudo no trato
gastrointestinal e no soro do feto. Também é indicativo de outros tumores, como é o
caso do cancro do pulmão, cancro da tiroide e cancro do colon.
O antigénio CA 15.3 é um antigénio tipo mucinoso. É um marcador específico do
cancro da mama, bem como do estômago e ovário. É reconhecido por dois anticorpos
monoclonais, um dirigido contra uma fração rica em antigénios membranares do cancro
da mama, o outro contra as lipoproteínas do leite humano.
O Antigénio CYFRA 21.1 é um antigénio de alta sensibilidade para o carcinoma de
células escamosas, sendo um fator de mau prognóstico no carcinoma do pulmão.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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4.3.11. Monitorização de drogas terapêuticas
A monitorização de drogas terapêuticas é a medida do nível sérico de um fármaco de
forma a garantir uma concentração dentro do intervalo terapêutico. O intervalo
terapêutico sérico de um fármaco é o intervalo de concentrações no qual se sabe que a
droga é eficaz e não causa efeitos tóxicas no paciente. Atualmente defende-se que a
monitorização sérica da terapêutica por si só não é suficiente para um correto
acompanhamento do doente e que é necessário fazer em simultâneo o controlo clínico
de inúmeros biomarcadores de previsão que permitem verificar a ação tóxica do
fármaco ao nível dos órgãos. Esta monitorização é importante essencialmente em
fármacos que apresentam doses terapêuticas estreitas (24).
No SPC faz-se a monitorização por fotometria e por imunoensaio de micropartículas por
quimioluminescência, os seguintes fármacos:
✓ Carbamazepina – antiepiléptico;
✓ Valproato de sódio – antiepiléptico;
✓ Lítio – antidepressivo;
✓ Antidepressivos tricíclicos;
✓ Digoxina - glicosídeo cardíaco;
✓ Teofilina – broncodilatador;
✓ Vancomicina – antibiótico;
✓ Gentamicina – antibiótico;
✓ Tobramicina – antibiótico;
✓ Amicacina – antibiótico;
✓ Paracetamol – analgésico;
✓ Salicilatos - anti-inflamatório.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
61
4.3.12. Controlo de drogas de abuso
Drogas de abuso são substâncias que modificam, aumentam, inibem ou reforçam as
funções fisiológicas, psicológicas ou imunológicas do organismo de maneira transitória
ou permanente (24). Inúmeras drogas de abuso podem ser determinadas no SPC da ULS
da Guarda, neste caso por fotometria com recurso a ensaios imunoenzimáticos:
✓ Canabinóides (Marijuana e/ou haxixe): produzem efeitos alucinogénios e
outros efeitos biológicos;
✓ Anfetamina/metanfetamina: em doses elevadas causam excitação no sistema
nervoso central, euforia, agilidade, apetite reduzido e uma sensação de energia e
potência elevadas;
✓ Metadona: narcótico utilizado para diminuir dores excessivas, sendo também
utilizada no tratamento do vício da heroína;
✓ Fenciclidina (PCP): conhecido como “pó de anjo”, produz sintomas clínicos
que vão desde a confusão, desorientação, estupor, coma e morte, em casos de
sobredosagem;
✓ Opiáceos: substâncias derivadas do ópio, produzem analgesia, e em doses
elevadas produzem euforia, estados hipnóticos e dependência;
✓ Benzodiazepinas: grupo de fármacos ansiolíticos, usados em caso de ansiedade,
insónias, convulsões e epilepsia. Doses elevadas levam a sonolência, tonturas,
letargia e coma;
✓ Cocaína: estimulante e anestésico, age diretamente no sistema nervoso central.
O seu uso provoca aumento de energia, inquietude e tremores;
✓ Álcool etílico: atua inicialmente como estimulante, tendo de seguida efeitos
depressivos sobre o sistema nervoso central. O consumo excessivo de álcool
leva a dependência física e psíquica.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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4.3.13 Outros analitos sanguíneos
Um conjunto de outros analitos sanguíneos é analisado devido à sua importância clínica.
Exemplo disso são adenosina desaminase (ADA), enzima conversora da angiotensina
(SACE), lactato, homocisteína e vitamina D (19).
A adenosina desaminase (ADA) é a enzima conversora da adenosina em inosina, uma
enzima envolvida no metabolismo das purinas, e está distribuída em todo o organismo
apresentando um papel importante no sistema imune, pois possui alta atividade nos
linfócitos T e macrófagos. Útil no diagnóstico da tuberculose, da mononucleose
infeciosa, da febre tifoide, da sarcoidose crónica ativa e da Síndrome da
Imunodeficiência Adquirida (SIDA), situações em que esta enzima aparece aumentada.
A enzima conversora da angiotensina (SACE) é produzida principalmente nas células
epiteliais pulmonares, onde converte angiotensina I em angiotensina II que, por sua vez,
estimula a glândula adrenal para a produção de aldosterona. Muito útil no diagnóstico
de doenças vasculares, no diagnóstico e monitorização de sarcoidose, como auxiliar no
diagnóstico de lepra ou na doença de Gaucher.
O lactato é um dos produtos finais da glicólise anaeróbia, que ocorre em tecidos onde há
hipoxia, o que pode acontecer em doenças como pneumonia e insuficiência cardíaca
congestiva.
A homocisteína é um aminoácido produzida pela desmetilação intracelular da metionina
que circula no plasma. A hiperhomocisteinémia é um fator de risco de trombose venosa
e arterial e pode ser agravada pela deficiência de cofatores do metabolismo da
metionina como a vitamina B6, a vitamina B12 e o ácido fólico. Também induz uma
disfunção endotelial (com perda das propriedades vasodilatadoras e antitrombóticas
dependentes do endotélio) e proliferação do músculo liso vascular, ambos processos-
chave nos modelos atuais de aterogénese e trombose (15).
A vitamina D é uma vitamina lipossolúvel, obtida a partir do colesterol, podendo ser
sintetizada na pele quando esta é exposta a radiação ultravioleta B. Tem funções ao
nível do desenvolvimento e manutenção do tecido ósseo, assim como na manutenção da
hemóstase normal do cálcio e do fósforo. Esta vitamina também estimula o papel dos
osteoclastos, induzindo a reabsorção óssea através destes, aquando da libertação de
cálcio, de modo a manter os níveis extracelulares de cálcio. O doseamento de vitamina
D é utilizado para avaliar potenciais insuficiências desta vitamina.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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4.3.14 Análise de Urinas
A urianálise é um grupo de exames químicos e microscópicos à urina. É uma das provas
mais comuns nos laboratórios de análises clínicas, sendo muito útil no diagnóstico de
doenças renais e do trato urinário. Hoje em dia existem soluções completas de análises
da sumária de urina e do sedimento urinário que permitem trabalhar de forma
automatizada (19).
➢ Sumária de urina - Urina tipo II
A análise sumária de urina é feita por fotometria de refletância num aparelho totalmente
automatizado (Urisys 2400) para medições semi-quantitativas in vitro de tiras de teste
de urina. Um feixe de luz incide sobre a banda reativa e a luz é refletida com uma
intensidade que depende da cor da banda. Os resultados dos testes baseiam-se na leitura
da intensidade da luz refletida. Permite a determinação semi-quantitativa de pH,
leucócitos, nitritos, proteínas, glucose, corpos cetónicos, urobilinogénio, bilirrubina e
sangue na urina. Também permite a determinação da densidade específica (por
refratometria), cor e aspeto de cada amostra (por turbidimetria).
➢ Sedimento urinário
A análise do sedimento urinário é feita através de um equipamento totalmente
automatizado (UF-1000i) para quantificação do sedimento urinário. Utiliza a tecnologia
de citometria de fluxo fluorescente em dois canais de medição dedicados para a
contagem de partículas de urina e bactérias. Esta tecnologia permite diferenciar de
forma precisa partículas de uma amostra heterogénea através da projeção de um feixe de
luz sobre as partículas presentes que foram marcadas previamente com fluorocromos e
consequente medição da luz dispersa e da fluorescência característica de cada partícula.
O UF-1000i permite, desta forma, quantificar o número de células epiteliais escamosas,
células do epitélio renal, leucócitos, eritrócitos, bactérias, leveduras na forma de
gémula, espermatozóides, cilindros, cilindros patológicos, cristais e muco.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
64
4.4 Fase Pós-analítica
A fase pós-analítica consiste na validação dos resultados, emissão do boletim dos
resultados e entrega dos resultados ao doente/médico. Esta fase é posterior ao
processamento de cada amostra e permite assegurar que o resultado foi obtido em
condições técnicas satisfatórias e é compatível com o processo do doente. Após uma
observação correta dos dados, e caso não se suspeite de nenhum erro, procede-se à
validação dos resultados anteriormente obtidos. Sempre que haja dúvidas relativamente
aos resultados obtidos deve-se repetir as análises.
O processo de validação biopatológica de resultados é realizado no software do SPC,
sendo da responsabilidade dos farmacêuticos especialistas do serviço.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
65
5. Controlo de Qualidade
O laboratório tem implementado um Sistema de Controlo de Qualidade que monitoriza
as variáveis essenciais relativas aos ensaios, ou seja, ajuda a entender se existe algum
problema a nível técnico ou a nível do processamento da amostra, para que se proceda a
medidas corretivas, se necessário. Neste âmbito existem dois programas, o controlo de
qualidade interno e o controlo de qualidade externo.
5.1 Controlo de Qualidade Interno
O controlo de qualidade interno, tanto no laboratório de Bioquímica como no de
Microbiologia, deve ser realizado antes do início de cada sessão de trabalho e cada vez
que se proceda à alteração das condições de trabalho, como mudança de lote de
reagentes ou determinadas manutenções dos equipamentos. Para proceder a este
controlo utiliza-se amostras conhecidas que permite avaliar a precisão de todos os
procedimentos, ou seja, o desempenho diário dos equipamentos e se não existe algum
problema a nível técnico ou a nível do processamento da amostra. De modo a interpretar
os resultados obtidos aquando da realização do controlo interno, são construídos
gráficos de Levey-Jennings que são avaliadas de acordo com as regras de Westgard.
Os gráficos de Levey-Jennings representam a dispersão dos valores do controlo em
torno do seu valor alvo em função do seu desvio padrão e permitem de uma forma
rápida avaliar se o valor obtido se encontra dentro dos valores limites do controlo. Estes
gráficos são construídos por uma linha central correspondente ao valor médio do
analito, e por várias linhas respeitantes aos valores limite do controlo estabelecidos,
expressos na forma do valor médio mais ou menos o desvio padrão.
As regras de Westgard permitem interpretar os dados das amostras controlo presentes
nos gráficos de Levey-Jennings, e através da combinação de vários critérios de decisão,
julgar se os valores obtidos por um determinado método são confiáveis. Existem seis
regras de Westgard, divididas em regras de aviso e de rejeição (Tabela 12).
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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Tabela 12 - Descrição das Regras de Westgard. Fonte: SPC da ULS da Guarda.
Regra de Westgard Significado da regra
1:2s
Regra de aviso, indica a ocorrência de um erro aleatório e é quebrada quando o valor
da amostra controlo ultrapassa o intervalo delimitado pela média mais ou menos dois
desvios padrão.
1:3s
Regra de rejeição, indica a ocorrência de um erro aleatório grave ou o início de um
erro sistemático grave, e é quebrada quando o valor da amostra controlo ultrapassa o
intervalo delimitado pela média mais ou menos três desvios padrão.
2:2s
Regra de rejeição, indica a ocorrência de um erro sistemático e é quebrada quando os
valores de duas amostras de controlo ultrapassam o intervalo delimitado pela média
mais ou menos dois desvios padrão, do mesmo lado da média.
R:4s
Regra de rejeição, indica a ocorrência de um erro aleatório grave, e é quebrada
quando a diferença entre dois valores de duas amostras controlo consecutivas é
superior a quatro vezes o valor do desvio padrão.
4:1s
Regra de rejeição, indica a ocorrência de um erro sistemático, e é quebrada quando os
valores de quatro amostras controlo ultrapassam o intervalo delimitado pela média
mais ou menos um desvio padrão.
10:χ
Regra de rejeição, indica a ocorrência de um erro sistemático, e é quebrada quando os
valores de dez amostras controlo consecutivas se situam no mesmo lado da média.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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5.2 Controlo de Qualidade Externo
O controlo de qualidade externo é feito por uma entidade exterior ao laboratório, a qual
envia amostras a vários e diferentes laboratórios, permitindo, deste modo, a avaliação
do desempenho de um laboratório em comparação com outros laboratórios. Existem
vários programas de avaliação externa disponíveis. No SPC da ULS da Guarda são
utilizados o UK NEQAS, o LabQuality e o INSTAND.
As amostras recebidas são processadas nas mesmas condições das amostras dos
pacientes, e os resultados são enviados posteriormente para a entidade referida. A
entidade externa, após realizar o tratamento dos dados provenientes de todos os
laboratórios participantes, transmite um relatório onde consta a apreciação dos
resultados obtidos pelo nosso laboratório. Dependendo dos resultados, caso se verifique
uma discrepância significativa dos nossos resultados em relação à média dos resultados
obtidos pelos outros laboratórios, é necessário a implementação de ações corretivas e/ou
preventivas de modo a melhorar o desempenho do nosso laboratório.
Este sistema de avaliação permite garantir a qualidade dos resultados obtidos pelo nosso
laboratório, promovendo a confiança dos utentes, do pessoal clínico e dos profissionais
de saúde que trabalham no SPC.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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6- Conclusão
Este estágio como parte integrante do Mestrado de Análises Clínicas foi essencial para
consolidar os conhecimentos teóricos e aplicá-los na prática laboratorial de forma a
desenvolver recursos individuais e capacidades técnicas.
As análises clínicas são um dos mais importantes meios de diagnóstico complementares
pois através da recolha de materiais biológicos como urina, sangue, fezes, expetorações
ou outros produtos biológicos permite diagnosticar patologias ou doenças, visto que
estas se manifestam através de alterações analíticas que enquadradas com a clínica
permitem tirar conclusões acerca do estado de saúde do doente.
Os laboratórios de análises clínicas são estruturas muito complexas, cujo funcionamento
exige a aquisição de equipamentos muito dispendiosos, a contratação de pessoal
qualificado, o cumprimento de normas de instalação e funcionamento igualmente
complexas e a implementação de um sistema da qualidade específico.
Todo este percurso contribuiu de forma essencial para a articulação dos conhecimentos
teóricos com a sua aplicação prática, visando a compreensão da contextualização dos
vários achados laboratoriais, da importância dos mesmos e da necessidade de uma
observação crítica antes de validar um resultado e transmiti-lo ao clínico.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
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24- Snozeke, C., McMillin, G. e Moyer, T. (2012). Therapeutic Drugs and Their
Management, in Tietz Textbook of Clinical Chemistry and Molecular Diagnostics, 5th
ed., Eds. Elsevier.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
71
Universidade de Lisboa
Faculdade de Farmácia
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de
carbapenemases
Rita Emanuela Fernandes Gralha
Dissertação orientada pela Professora Doutora Maria Aida da Costa e Silva
da Conceição Duarte e coorientada pela Doutora Fátima Maria Madureira
Vale
Mestrado em Análises Clínicas
2019
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
72
Resumo
Nos últimos anos tem surgido bactérias altamente resistentes, em especial as resistentes
aos “antibióticos de última linha”, como os carbapenemos. Em primeiro plano temos a
as Enterobacterales, nomeadamente a espécie Klebsiella pneumoniae e Escherichia
coli,, seguida das estirpes de Pseudomonas aeruginosa e Acinetobacter spp., como um
dos exemplos mais problemático de resistência aos carbapenemos. Estas resistências
constituem um problema grave para a saúde pública e uma ameaça às economias da
Europa e do mundo pondo em causa a segurança dos doentes.
Nenhum consenso ainda foi alcançado sobre o método de deteção ideal devido aos
diferentes mecanismos de resistência entre os diferentes tipos de carbapenemases. O uso
de métodos fenotípicos conjugados com métodos moleculares, a utilizar quando
possível, pode melhorar bastante a deteção de estirpes produtoras de carbapenemases
em comparação com o uso de um único método.
O tratamento mais apropriado para tratar estirpes resistentes aos carbapenemos ainda é
discutível. Na maioria dos estudos defende-se a terapia combinada em vez da
monoterapia.
É essencial a formação em boas práticas de prevenção e controlo da infeção,
nomeadamente aos profissionais de saúde, assim como sensibilizar as pessoas de modo
a usarem os antibióticos apenas quando estritamente necessário para diminuir a taxa de
resistências.
Uma implementação concertada de medidas em todo o mundo, incluindo melhorias no
controlo e na prevenção de infeções em hospitais e outras instituições de saúde e a
utilização mais prudente de antibióticos pode oferecer uma solução a longo prazo.
O objetivo da presente dissertação inclui uma revisão do grupo de carbapenemos e seus
mecanismos de resistência, analisar a situação epidemiológica e fatores de risco das
infeções por bactérias produtoras de carbapenemases em Portugal e na Unidade Local
de Saúde da Guarda e rever os métodos de deteção e os fármacos utilizados no
tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases. Pretende-se também destacar
medidas de prevenção e uso racional de antibióticos.
Palavras-chave: Antibióticos; Bactérias; Carbapenemos; Carbapenemases;
Enterobacterales
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
73
Abstract
In recent years, highly resistant bacteria have emerged, especially those resistant to
"last-line antibiotics" such as carbapenems. In the foreground we have the
Enterobacterales, namely Klebsiella pneumoniae and Escherichia coli, followed by the
strains of Pseudomonas aeruginosa and Acinetobacter spp., as one of the most
problematic examples of resistance to carbapenems. Such resistance is a serious
problem for public health and a threat to the economies of Europe and the world and put
at risk patient safety.
No consensus has yet been reached on the optimal detection method due to the different
resistance mechanisms between carbapenemases. The use of phenotypic methods
combined with molecular methods, when possible, can greatly improve the detection of
carbapenemase producing strains compared to the use of a single method.
The most appropriate treatment for treating carbapenem resistant strains is still
debatable. In most studies it advocates combination therapy rather than monotherapy.
Training of good infection prevention and control practices, particularly for health
professionals, is essential, as well as sensitizing people to use antibiotics only when
necessary to reduce the rate of resistance.
A concerted implementation of measures around the world, including improvements in
the control and prevention of infections in hospitals and other health institutions, and the
more prudent use of antibiotics may offer a long-term solution.
The objective of the present monograph includes a review of the carbapenem group and
its resistance mechanisms, to analyze the epidemiological situation and risk factors of
the infections caused by carbapenemases bacteria in Portugal and the Guarda Local
Health Unit and to review the methods of detection and the drugs used in the treatment
of carbapenemase-producing bacteria. It is also intended to highlight measures of
prevention and rational use of antibiotics.
Keywords: Antibiotics; Bacteria; Carbapenems; Carbapenemases; Enterobacterales
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
74
Índice
Resumo ........................................................................................................................................ 72
Abstract ....................................................................................................................................... 73
Lista de Figuras ........................................................................................................................... 75
Lista de Tabelas ........................................................................................................................... 77
Lista de Abreviaturas, Acrónimos, Siglas e Símbolos ................................................................ 78
1.Introdução ................................................................................................................................ 80
2. Antibióticos β-lactâmicos ........................................................................................................ 81
2.1 Composição química ............................................................................................................. 81
2.2 Mecanismo de acção dos β-lactâmicos ................................................................................. 81
2.2.1 Carbapenemos .................................................................................................................... 82
2.3 Mecanismos de resistência .................................................................................................... 83
2.3.1Modificação dos alvos (PBPs) ............................................................................................ 83
2.3.2 Bombas de efluxo ............................................................................................................... 84
2.3.3 Impermeabilização da membrana externa .......................................................................... 84
2.3.4 Hidrólise enzimática dos β-lactâmicos por β-lactamases ................................................... 85
2.4 Classificação das β-lactamases.............................................................................................. 85
2.4.1 β-lactamases da Classe A ................................................................................................... 86
2.4.2 β-lactamases da classe B .................................................................................................... 86
2.4.3 β-lactamases da classe D .................................................................................................... 87
3. Epidemiologia ......................................................................................................................... 88
4. Factores de Risco .................................................................................................................... 95
5. Métodos de deteção ................................................................................................................. 96
6. Estirpes produtoras de Carbapenemases na ULS da Guarda ................................................ 101
7. Tratamento ............................................................................................................................ 115
8. Prevenção e perspetivas futuras ............................................................................................ 119
9. Conclusão .............................................................................................................................. 122
10. Bibliografia ......................................................................................................................... 123
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
75
Lista de Figuras
Figura 1 - Estrutura química de um antibiótico carbapenemo. Fonte: Adaptado de Sousa, J.,
2006. ............................................................................................................................................ 82
Figura 2 - Percentagem de isolados de Escherichia coli resistentes aos carbapenemos em
diversos países europeus, em 2017. Fonte: Surveillance of antimicrobial resistance in Europe,
2017. ............................................................................................................................................ 89
Figura 3 - Gráfico da evolução da taxa de resistência a carbapenemos da Escherichia coli em
Portugal, entre 2006 e 2017. Fonte: Surveillance Atlas of Infectious Diseasesdo, ECDC. ........ 89
Figura 4 - Percentagem de isolados de Klebsiella pneumoniae resistentes aos carbapenemos em
diversos países europeus, em 2017. Fonte: Surveillance of antimicrobial resistance in Europe,
2017. ............................................................................................................................................ 90
Figura 5 - Gráfico da evolução da taxa de resistência a carbapenemos da Klebsiella pneumoniae
em Portugal, entre 2006 e 2017. Fonte: Surveillance Atlas of Infectious Diseases, ECDC. ...... 91
Figura 6 - Percentagem de isolados de Pseudomonas aeruginosa resistentes aos carbapenemos
em diversos países europeus, em 2017. Fonte: Surveillance of antimicrobial resistance in
Europe, 2017. .............................................................................................................................. 91
Figura 7 - Gráfico da evolução da taxa de resistência a carbapenemos da Pseudomonas
aeruginosa em Portugal, entre 2006 e 2017. Fonte: Surveillance Atlas of Infectious Diseases do
ECDC. ......................................................................................................................................... 92
Figura 8 - Percentagem de isolados de Acinetobacter spp. resistentes aos carbapenemos em
diversos países europeus, em 2017. Fonte: Surveillance of antimicrobial resistance in Europe,
2017. ............................................................................................................................................ 92
Figura 9 - Evolução da taxa de resistência a carbapenemos da Acinetobacter spp. aeruginosa em
Portugal, entre 2006 e 2017. Fonte: Surveillance Atlas of Infectious Diseases, ECDC ............. 93
Figura 10 - Distribuição do uso de β- lactâmicos no setor hospitalar em Portugal, em 2017
Fonte: ESAC-Net, ECDC. ........................................................................................................... 93
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
76
Figura 11 - RAPIDEC® CARBA NP. Fonte: Adaptado de Tamma P. and Simner P., 2018 ..... 97
Figura 12 - CIM - Resultado positivo para a presença de carbapenemase e resultado negativo.
Fonte: Adaptado de Tamma, P. e Simner, P., 2018. ................................................................... 98
Figura 13 - Evolução do número de estirpes produtoras de carbapenemases na ULS de 2016 a
2018. Fonte: SPC da ULS da Guarda. ....................................................................................... 103
Figura 14 - Percentagem de estirpes produtoras de carbapenemases isoladas na ULS- Guarda, de
2016 a 2019 (Janeiro a Agosto). Fonte: SPC da ULS da Guarda. ............................................ 105
Figura 15- Número de estirpes produtoras de carbapenemases nos diferentes produtos
biológicos, desde 2016 a 2019 (Janeiro a Agosto). Fonte: SPC da ULS da Guarda. ................ 106
Figura 16 - Evolução da percentagem de resistência dos variados antibióticos, de 2016 a 2018.
Fonte: SPC da ULS da Guarda. ................................................................................................. 110
Figura 17 - Algoritmo sugerido para escolha de antibiótico em paciente com bacteremia de
Enterobacterales resistente a carbapenêmicos. Fonte: Alhashem, F. et al., 2017. .................... 117
Figura 18 - Evolução ao longo do tempo da taxa global de adesão à higiene das mãos nos 5
momentos de 2011 a 2016. Fonte: PPCIRA/DGS. Dados Globais Plataforma das PBCI, Higiene
das Mãos. 2016. ......................................................................................................................... 120
Figura 19 - Metas de Saúde para 2020. Fonte: DGS, Programa de prevenção e controlo de
infeções e de resistência aos antimicrobianos - 2017. ............................................................... 121
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
77
Lista de Tabelas
Tabela 1 -Consumo Global de antibacterianos para uso sistémico em Portugal e na Europa, entre
2012 e 2016. Fonte: ECDC: Summary of the latest data on antibiotic consumption in the
European Union- ESAC-Net Surveillance data, 2017. ............................................................... 94
Tabela 2 - Consumo de carbapenemos nos hospitais públicos portugueses entre 2012 e 2016.
Fonte: INFARMED, 2016. .......................................................................................................... 94
Tabela 3 - Número de isolados provenientes do Hospital Sousa Martins (HSM) e do Hospital
Nossa Senhora da Assunção (HNSA), nos anos 2016, 2017, 2018, 2019 (Janeiro a Agosto).
Fonte: SPC da ULS da Guarda. ................................................................................................. 102
Tabela 4 - Perfil fenotípico do doente (Caso clínico 1). Fonte: SPC da ULS da Guarda. ........ 104
Tabela 5 - Perfil fenotípico do doente (Caso clínico 2). Fonte: SPC da ULS da Guarda. ........ 107
Tabela 6 - Perfil fenotípico do doente (caso clínico 3). Fonte: SPC da ULS da Guarda. ......... 107
Tabela 7 - Perfil do doente 1 (Caso clínico 4). Fonte: SPC da ULS da Guarda. ....................... 109
Tabela 8 - Perfil fenotípico do doente 2 (caso clínico 4). Fonte: SPC da ULS da Guarda. ...... 109
Tabela 9 - Perfil fenotípico do doente (caso clínico 5). Fonte: SPC da ULS da Guarda. ......... 110
Tabela 10 - Perfil fenotípico do doente (caso clínico 6). Fonte: SPC da ULS da Guarda. ....... 111
Tabela 11 - Perfil fenotípico do doente (caso clínico 7). Fonte: SPC da ULS da Guarda. ....... 113
Tabela 12 - Perfil fenotípico do doente (caso clínico 8). Fonte: SPC da ULS da Guarda. ....... 114
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
78
Lista de abreviaturas
ABC – ATB -Binding cassete
AmpC - β-lactamases AmpC (cefalosporinases)
CIM - Método de inativação de carbapenemos
CLSI - Clinical Laboratory Standards Institute
CMI -Concentração mínima inibitória
CSP - Cuidados de saúde primários
DGS - Direção Geral de Saúde
DHD - Doses diárias definidas por mil habitantes por dia
dNTPs - Trifosfatos de desoxinucleotídeos
ddNTPs - Trifosfatos de didesoxinucleotídeos
EARS-Net - Rede Europeia de Vigilância da Resistência Antimicrobiana
ECDC - Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças
EDTA - Ácido etilenodiaminotetracético
EEA - Área Econômica Europeia
ESAC-Net - European Surveillance of Antimicrobial Consumption Network
ESBL- β-lactamases de largo espectro
EU - União Europeia
EUCAST - European Committee on Antimicrobial Susceptibility Testing
GES - Guiana extended spectrum
GIM - German imipenemase
HNSA – Hospital Nossa Senhora da Assunção
HSM – Hospital Sousa Martins
IC - Ensaios imunocromatográficos
IMI - Imipenem hydrolyizing beta-lactamase
IMP – Imipenemase Metaloβlactamase
KPC - Klebsiella pneumoniae carbapenemase
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
79
MALDI-TOF - Matrix-Assisted Laser Desorption⁄Ionisation Time-Of-Flight Mass
Spectrometry
MATE – Multidrug and toxic compound extrusion
MBL - metalo-β-lactamases
MFS – Major facilitator superfamily
NDM - New Delhi Metallo-β-lactamase
NMC - Non-metalloenzyme carbapenemase
OMPs - Outer membrane proteins
OXA-48 - Oxacilinase-48
PAPA - Programa de Apoio à Prescrição Antibiótica
PBPs- Penicillin-Binding-Proteins
PCR - Reação em cadeia da polimerase
PPCIRA – Programa de Prevenção e Controlo de Infeções e de Resistência aos
Antimicrobianos
RND – Resistance-nodulation-division
SIM - Seoul imipenemase metalo-beta-lactamase
SME - Serratia marcescens enzyme
SMR – Small multidrug resistance
SPM - São Paulo metalo-beta-lactamase
TSA - Testes de suscetibilidade antimicrobiana
UCI - Unidade de cuidados intensivos
UDP-NAG - uridinodifosfato N–acetilglucosamina
UDP-NAMA - uridinofosfato-ácido N-acetilmurâmico
ULS – Unidade local de saúde
VIM - Verona Integron-encoded Metallo-β-lactamase
WGS - Sequenciação do genoma completo
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
80
1.Introdução
Durante mais de setenta anos a era antimicrobiana foi marcada por sucessivas
descobertas de uma ampla gama de antibióticos e o subsequente surgimento de
resistência a antibióticos. A resistência bacteriana continua a aumentar, e nas indústrias
farmacêuticas não se verifica o desenvolvimento de novos antibióticos e é provável que
assim seja nos próximos anos (1).
Nos últimos anos, o surgimento e a propagação de bactérias altamente resistentes, em
especial as resistentes a antibióticos de última linha como, os carbapenemos e as
polimixinas, nomeadamente a colistina, constituem um problema grave para a saúde
pública e uma ameaça à segurança dos doentes. Até há bem pouco tempo, estes
antibióticos eram eficazes no tratamento adequado dos focos e tipos de infeção para os
quais estavam recomendados. Atualmente, esta certeza já não existe e a possibilidade de
resistência aos carbapenemos leva à procura de outras opções terapêuticas, incluindo a
utilização de antimicrobianos que praticamente foram abandonados da prática clínica
(2).
Os principais microrganismos responsáveis pela propagação da resistência a
carbapenemos, abrangem estirpes de Pseudomonas aeruginosa, Acinetobacter spp. e as
Enterobacterales, destacando-se a espécie Klebsiella pneumoniae (3). Os doentes infetados com bactérias resistentes a antibióticos têm uma probabilidade
mais elevada de desenvolverem complicações, sendo até três vezes mais provável que
morram em resultado da infeção. Em 2050, estima-se que o número global de mortes
provocadas por este tipo de estirpes possa atingir os 10 milhões por ano se não forem
tomadas medidas (4). Na Europa, os hospitais gastam, em média, entre 10 000 a 40 000
euros adicionais no tratamento de cada doente infetado com uma bactéria
multirresistente (5).
Apenas uma implementação concertada de medidas em todo o mundo, incluindo
melhorias no controlo e na prevenção de infeções em hospitais e outras instituições de
saúde, e também a utilização mais prudente de antibióticos, pode oferecer uma solução
de longo prazo. Uma das medidas mais importantes seria a triagem ativa de doentes de
risco em relação a bactérias altamente resistentes que entram nos nossos hospitais.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
81
2. Antibióticos β-lactâmicos
2.1 Composição química
Os antibióticos β-lactâmicos constituem o grupo de antibióticos mais usados em todo o
mundo e incluem as penicilinas, cefalosporinas, monobactâmicos e carbapenemos.
Todos estes antibióticos têm um anel β-lactâmico comum e agem similarmente ligando
e inativando as proteínas de ligação à penicilina (PBPs), que são responsáveis pela
formação da parede celular da bactéria.
Nas penicilinas o anel beta-lactâmico encontra-se unido a um anel de tiazolidina,
enquanto nas cefalosporinas aquele anel existe associado a um anel de di-hidrotiazina.
Os antibióticos monobactâmicos têm a particularidade de possuírem na sua molécula
um grupo 2-oxoazetidina-1-sulfónico.
A classe dos carbapenemos é diferente dos outros beta-lactâmicos porque em vez de
possuir um átomo de enxofre (S) no anel tiazolidina, possui um carbono (C) e uma
dupla ligação (6).
2.2 Mecanismo de acção dos β-lactâmicos
Os antibióticos β-lactâmicos são classificados como antibióticos antiparietais e inibem a
biossíntese do peptidoglicano na sua fase terminal, impedindo a transpeptidação, ou
seja, inibem o estabelecimento de pontes interpeptídicas (cross-linking) entre cadeias
peptídicas vizinhas do peptidoglicano recém-sintetizado. O peptidoglicano faz parte da
parede celular bacteriana, conferindo rigidez à célula e protecção a alterações
osmóticas. A sua destruição torna as bactérias mais susceptíveis à lise quando presente
em ambientes hipotónicos.
A biossíntese do peptidoglicano passa por três fases: fase citoplasmática, fase
membranar e fase parietal. Na fase citoplasmática ocorre a síntese de UDP-NAG
(uridinodifosfato N–acetilglucosamina) e UDP-NAMA-pentapeptídeos (uridinofosfato-
ácido N-acetilmurâmico), pois são as unidades básicas formadoras do peptidoglicano.
Na fase membranar ocorre o transporte de UDP-NAG e UDP-NAMA-pentapeptídeos
através da membrana citoplasmática, com ajuda do lípido membranar – bactoprenol (-
álccol isoprenóide C55 fosforilado), formando o par NAG-NAMA-pentapeptídeo. Na
fase parietal, inicia-se a incorporação do precursor NAG-NAMA-pentapeptídeo no
peptidoglicano pré-formado, estabelecendo-se assim inicialmente ligações glicosídicas
β (1-4) com o peptidoglicano já existente e em seguida ligações peptídicas entre o
último resíduo de glicina e o 4º aminoácido da cadeia peptídica vizinha. Isto pressupõe a
intervenção das enzimas D-D-carboxipeptidases-transpeptidases, localizadas no folheto
externo da membrana citoplasmática. Estas enzimas envolvidas são denominadas PBPs
(Penicillin-Binding-Proteins) devido à sua grande afinidade para as penicilinas. Existem
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
82
também as autolisinas, que requerem a quebra de ligações covalentes no peptidoglicano
já existente, para se formar um novo peptidoglicano (6).
A entrada destes antibióticos na célula bacteriana está directamente relacionada com a
estrutura e composição da parede, a qual vai ser diferente nas bactérias Gram positivo e
Gram negativo.
Nas bactérias de Gram positivo o peptidoglicano é o principal constituinte da parede
celular. A membrana citoplasmática, neste caso encontra-se justaposta à parede e é nesta
estrutura que estão inseridos os alvos dos antibióticos beta-lactâmicos – PBPs no folheto
externo.
Nas bactérias de Gram negativo, a parede celular apresenta-se mais estratificada, sendo
constituída por camadas de lipopolissacarídeos e fosfolípidos, onde se inserem poros
constituídos por porinas (proteínas) sob as quais se encontra a camada de
peptidoglicano. E entre esta camada e a membrana citoplasmática existe o espaço
periplásmico. Neste tipo de bactérias é no folheto externo da membrana citoplasmática
que se localizam os PBP (6).
2.2.1 Carbapenemos
Entre os β-lactâmicos, os carbapenemos são os mais eficazes, ao ponto de lhe chamarem
“gorilamicina”, contra bactérias Gram-positivas e Gram-negativas, incluindo
anaeróbios. Apresentam um amplo espectro de atividade antibacteriana, dada a sua
facilidade de difusão através dos canais de porina da membrana externa (o carbapenemo
é uma moléculta zwitteriónica) e elevada estabilidade à hidrólise por β-lactamases
(TEM-1, SHV-1, ESBLs, IRT). Possuem uma estrutura única que é definida por um
carbapenemo acoplado ao anel β-lactâmico que confere protecção contra a maioria das
β-lactamases (Figura 1) (6).
Figura 1 - Estrutura química de um antibiótico carbapenemo. Fonte: Adaptado de
Sousa, J., 2006.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
83
A resistência aos carbapenemos em Enterobacterales pode ser causada pela presença de
Carbapenemases, ESBL ou Oxacilinases combinadas com a diminuição de
permeabilidade devida à alteração dos canais de porina (por mutações ou expressão
diminuída). Estas enzimas hidrolisam quase todos os β-lactâmicos, conferindo
concentrações mínimas inibitórias (CMIs) elevadas ao carbapenemo codificadas por
genes que são transferíveis por plasmídeos ou transposons e associados a genes que
codificam para outras resistências (7). Além disso, apresentam menos efeitos adversos,
são mais seguros de usar do que outros fármacos de última linha, como as polimixinas.
Por estas razões, o surgimento e disseminação rápida através de todos os continentes de
resistência aos carbapenemos, principalmente entre bactérias Gram-negativas, como K.
pneumoniae, P. aeruginosa e Acinetobacter spp., constitui um problema de saúde
pública importante e contínuo em todo o mundo. (8)
2.3 Mecanismos de resistência
A resistência aos antibióticos β-lactâmicos tem vindo aumentar devido às más práticas a
eles associados e constituem um problema grave para a saúde pública. É preocupante as
bactérias patogénicas adquirirem essas resistências.
As bactérias escapam ao efeito bacteriolítico dos antibióticos beta-lactâmicos por quatro
mecanismos diferentes: modificação dos alvos (PBPs), bombas de efluxo,
impermeabilização da membrana externa e por fim hidrólise enzimática dos beta-
lactâmicos por beta-lactamases (6).
2.3.1Modificação dos alvos (PBPs)
Este tipo de mecanismo de resistência surge através de substituições aminoacídicas na
proteína que constitui o alvo do antibiótico, as PBPs. Na maioria das situações, a
proteína torna-se menos susceptível à ligação com o agente antimicrobiano. Apesar de
este facto ter sido observado em bactérias de Gram negativo, este mecanismo de
resistência é encontrado essencialmente em bactérias de Gram positivo, nomeadamente
nas estirpes MRSA (Staphylococcus aureus resistente à meticilina). Esta resistência
aparece por mutação do gene mecA, que se encontra no cromossoma e codifica a síntese
de PBP2.
A modificação destas proteínas (transpeptidases) pode ser conseguida por um dos
quatro mecanismos: substituição aminoacídica, que promove a diminuição da afinidade
entre antibiótico e PBP; aquisição de novas PBPs; existência de proteínas resultantes da
recombinação entre genes que codificam PBPs associadas à expressão de
suscetibilidade e PBPs que conduzem à resistência ao antibiótico e por fim a
hiperprodução da proteína com consequente aumento do nível de resistência aos
antibióticos beta-lactâmicos (6).
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
84
2.3.2 Bombas de efluxo
Este tipo de mecanismo pode não ser suficiente para expressar resistência clínica,
porém, em conjunto com outros mecanismos pode originar falências terapêuticas. A
resistência é frequentemente causada pelo aumento da síntese das proteínas, que
constituem a bomba, devido por exemplo, a mutações que ocorrem nos repressores
transcricionais destas proteínas. As mutações que podem ocorrer nestes genes podem
levar a um aumento da eficiência do transporte dos antibióticos para o exterior da
célula.
As bombas de efluxo podem ter afinidade para diversos antibióticos, pelo que são
frequentemente associadas a multirresistência.
As bombas de efluxo têm sido agrupadas em cinco famílias, de acordo com a sua
sequência em aminoácidos, a família ABC (ATB-binding cassete), família MFS (Major
facilitator superfamily), família RND (Resistance-nodulation-division), família SMR
(Small multidrug resistance) e a família MATE (Multidrug and toxic compound
extrusion). Os sistemas de transporte tipo MFS predominam nas bactérias Gram
positivo e os sistemas RND e MATE nas bactérias Gram negativo (6).
2.3.3 Impermeabilização da membrana externa
A resistência aos antibióticos está também relacionada com a diminuição da
permeabilidade que ocorre na membrana exterior das bactérias de Gram negativo. O
fluxo de moléculas para o interior da célula é assegurado através de complexos de
proteínas da membrana, denominadas OMPs (Outer membrane proteins), os quais
formam canais de porina. A carga, estrutura e dimensão influenciam a passagem de
moléculas para o interior da célula. Algumas das moléculas que utilizam este percurso
são os antibióticos para atingirem o interior da célula bacteriana ou no caso dos
antibióticos beta-lactâmicos, o espaço periplásmico.
As porinas clássicas são trímeros estáveis que produzem grande permeabilidade a
moléculas neutras, hidrofílicas e de baixo peso molecular (até 600Da). Além destas,
ainda existem as porinas monoméricas que permitem uma difusão lenta e não específica
(por exemplo OmpA de Escherichia coli e OprF de P. aeruginosa).
Por exemplo, em E. coli as proteínas OmpF, OmpC e OmpE são vulgarmente
associadas a resistência aos antibióticos. A perda destas, por mutação dos genes, pode
verdadeiramente causar a diminuição da suscetibilidade a vários antibióticos. A
Pseudomonas aeruginosa não possui porinas clássicas na membrana externa, como tal,
os canais de porina específicos (por exemplo OprD-canal de aminoácidos básicos) têm
um papel importante na entrada de nutrientes. Os antibióticos carbapenemos também
atravessam a membrana externa através dos canais OprD, por isso a modificação da
expressão das OprD2 ou a ausência que ocorre em algumas estirpes de P. aeruginosa
justificam a sua resistência aos carbapenemos (6).
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
85
2.3.4 Hidrólise enzimática dos β-lactâmicos por β-lactamases
O principal mecanismo de resistência aos antibióticos β-lactâmicos consiste na
degradação de antibióticos por enzimas, β-lactamases, que promovem a clivagem do
anel β-lactâmico (ligação CO-N) no espaço periplásmico.
As β-lactamases podem actuar por dois mecanismos: utilização de serina e iões de zinco
capazes de desencadear a ruptura do anel β-lactâmico e utilização da via éster-serina, no
caso das restantes classes de β-lactamases.
As serino-β-lactamases (têm serina no centro activo) associam-se ao antibiótico de uma
forma não-covalente e quebram a ligação amida do anel β-lactâmico, por parte do grupo
hidróxilo da cadeia lateral de um resíduo serina do sítio activo da enzima, originando
um acil-éster covalente. A hidrólise deste éster vai por fim libertar a enzima, que se
encontra activa e disponível para hidrolisar outras moléculas de antibiótico, enquanto o
antibiótico se encontra hidrolisado e inactivo.
As metalo-β-lactamases têm iões zinco no centro activo e têm um largo espectro
degradando os carbapenemos, sendo conhecidas por carbapenemases. Diferem das
serino-β-lactamases porque não há a formação do intermediário peniciloilenzima,
fazendo o ataque directo ao anel beta-lactâmico.
As β-lactamases dependendo da sua especificidade são muitas vezes chamadas
penicilinases, cefalosporinases e carbapenemases. As β-lactamases são os principais
determinantes da resistência bacteriana aos antibióticos β-lactâmicos.
Os mecanismos de resistência aos carbapenemos podem estar dependentes de
carbapenemases, enzimas que hidrolisam os carbapenemos e outros antibióticos β-
lactâmicos (β-lactamases), e os que não dependem da presença de carbapenemases.
Dentro do segundo grupo, encontram-se outros tipos de β-lactamases, as β-lactamases
AmpC (cefalosporinases), Oxacilinases, β-lactamases de largo espectro (ESBLs), e
mecanismos não enzimáticos, como a perda de porinas da membrana externa e o
aumento da expressão de bombas de efluxo (6,10).
2.4 Classificação das β-lactamases
As carbapenemases são β-lactamases que tem a capacidade de hidrolisar quase todos os
antibióticos β-lactâmicos manifestando ainda resistência à acção dos inibidores das β-
lactamases (por exemplo ácido clavulânico, o sulbactam e o tazobactam).
As β-lactamases podem ser agrupadas de acordo com as características funcionais ou de
acordo com as características moleculares.
A classificação funcional classifica estas enzimas em quatro grupos fundamentais, de 1
a 4, com vários subgrupos dentro do grupo 2, baseando-se nas propriedades
bioquímicas, na estrutura molecular e na sequência de nucleotídeos. As maiorias das
carbapenemases encontram-se nos grupos 2f e 3 (9).
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
86
A classificação molecular de Ambler classifica as β-lactamases em quatro classes de A
a D, baseando-se na sequência dos nucleotídeos que se reflete na homologia dos
aminoácidos nestas enzimas. As classes A, C e D possuem um centro activo enzimático
que é constituído pelo aminoácido serina. Na classe B, também conhecida pelas metalo-
β-lactamases (MBL), o centro activo é composto por um ião zinco (Zn2+). Pela sua
frequência, pode-se realçar a KPC (Klebsiella pneumoniae carbapenemase) na classe A,
a NDM-1 (New Delhi Metallo-β-lactamase-1), a VIM (Verona Integron-encoded
Metallo-β-lactamase) e a IMP (Imipenemase) na classe B, família das metalo-β-
lactamases (MBL), e a OXA-48 (oxacilinase-48) na classe D, família das oxacilinases
ou enzimas tipo OXA (6).
As classes A, B e D são as que têm uma importância clínica maior quando presentes em
microrganismos associados a infecções a cuidados de saúde.
2.4.1 β-lactamases da Classe A
As β-lactamases da classe A caracterizam-se pelo facto do seu mecanismo hidrolítico
necessitar de uma serina na posição 70. Esta classe inclui as penicilinases e
cefalosporinases dos grupos TEM, SHV e CTX-M (que não hidrolisam carbapenemos)
e também as ESBL e carbapenemases. Estas β-lactamases podem ser cromossómicas ou
plasmídicas.
Em geral, as enzimas cromossómicas conferem resistência aos carbapenemos, mas, por
vezes, algum grau de suscetibilidade às cefalosporinas de terceira e quarta gerações,
enquanto que as enzimas codificadas em plasmídeos geralmente conferem resistência a
todos os β-lactâmicos (9).
As enzimas SME (Serratia marcescens enzyme), NMC (non-metalloenzyme
carbapenemase) e IMI (imipenem hydrolyizing beta-lactamase) são codificadas por
genes cromossomais. As enzimas codificadas por genes plasmídicos como exemplo as
GES (Guiana extended spectrum) identificada na P. aeruginosa e na K. pneumoniae a
KPC (Klebsiella pneumoniae carbapenemase).
A carbapenemase da classe A, a mais importante, na prática clínica, é a KPC que
confere resistência à maioria dos β-lactâmicos. A KPC pode ser transmitida da K.
pneumoniae a outros géneros como Salmonella spp., Citrobacter spp., Serratia spp. e
Enterobacter spp. e a espécie E. coli (9, 15).
2.4.2 β-lactamases da classe B
As carbapenemases da classe B ou metalo-β-lactamases (MBL) caracterizam-se pela
capacidade de hidrolisar todos os β-lactâmicos excepto o aztreonam, pela resistência a
todos os inibidores de β-lactamases e pela suscetibilidade à inibição pelo ácido
etilenodiaminotetracético (EDTA), um quelante de catiões metálicos.
As famílias mais comuns das MBL inclui IMP (Imipenemase Metaloβlactamase), VIM
(Verona integron-encoded metalo-beta-lactamase), SPM (São Paulo metalo-beta-
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
87
lactamase), GIM (German imipenemase), SIM (Seoul imipenemase metalo-beta-
lactamase), NDM (New Deli metalo-beta-lactamase) que foram encontradas em
diversos géneros de Enterobacterales, nomeadamente Klebsiella spp., Escherichia spp.,
Citrobacter spp., Serratia spp. e Enterobacter spp. As MBL podem ser cromossómicas
ou plasmídicas (adquiridas). As adquiridas estão codificadas em integrões localizados
em plasmídeos e são transferíveis entre géneros (9).
2.4.3 β-lactamases da classe D
As carbapenemases da classe D também referidas como enzimas tipo OXA,
caracterizam-se pela capacidade preferencial de hidrolisar a oxacilina. Estas enzimas
apresentam uma suscetibilidade variável aos carbapenemos e aos inibidores das β-
lactamases. O mecanismo de hidrólise é semelhante as carbapenemases da classe A,
sendo mediado pelo aminoácido serina no centro activo da enzima (9).
Esta classe é constituída por cinco subfamílias principais com actividade hidrolítica
sobre os carbapenemos, a OXA-23, OXA24/OXA-40, OXA-48, OXA-58, OXA-143, e
OXA-51, sendo as cinco primeiras codificadas em plasmídeos e a última é
cromossómica. A maioria das estirpes de A. baumannii resistentes aos carbapenemos
são produtoras de OXA-23, -24, -40 ou -58. Enquanto, as Enterobacterales com OXA-
48 tem suscetibilidade variada aos carbapenemos (9,15).
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
88
3. Epidemiologia
A colonização ou infeção por estirpes produtoras de carbapenemases é um problema
frequente e relevante no contexto dos cuidados de saúde, em meio hospitalar ou na
comunidade nos casos de doentes com história de exposição frequente a cuidados de
saúde (16). Neste sentido, os hospitais, mas principalmente os lares e as unidades de
cuidados continuados parecem ser reservatórios importantes deste tipo de agentes,
contribuindo através das múltiplas transferências de doentes entre instituições de saúde
para a disseminação destas estirpes (17).
Em todo o mundo, os primeiros relatos de carbapenemases ocorreram na década de
1980. A sua propagação levantou uma série de preocupações, o que coincidiram com
anos em que não foi desenvolvido nenhum novo antibiótico contra bactérias Gram-
negativas. O Japão relatou a primeira carbapenemase de um isolado de Aeromonas
hydrophila nos anos 80. Seguiu-se Londres (1982) com a SME-1, a IMI-1 na Califórnia
(1984) e NMC-A na França (1990), ambos em estirpes de Enterobacter cloacae. Em
1996, nos Estados Unidos foi identificada a KPC, alertando assim para o controlo de
propagação da resistência aos carbapenemos (18).
Em Portugal, foram reportadas pela primeira vez em 1998 estirpes produtoras de
carbapenemases, numa estirpe de P. aeruginosa produtora de VIM-2 e numa estirpe de
A. baumannii produtora de IMP-5 (19,20). A primeira estirpe resistente foi reportada
num estudo de 2005, tratando-se duma K. oxytoca produtora de VIM-2 (21). Em 2009,
foi identificada a primeira carbapenemase do tipo KPC, numa estirpe de K. pneumoniae
produtora de KPC-3 (22). Entre 1998 e 2003, foram identificadas as primeiras
carbapenemases do tipo OXA em A. baumannii (23).
O ECDC (Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças) emitiu em 2018 um
relatório onde apresenta resultados baseados em dados de resistência antimicrobiana de
bactérias, que causam infecções graves, comunicados à Rede Europeia de Vigilância da
Resistência Antimicrobiana (EARS-Net) por 30 países da União Europeia (UE) e da
Área Econômica Europeia (EEA). Os dados referem-se a 2017 e a análise de tendências
de dados reportados pelos países participantes no período de 2014 a 2017.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
89
Neste relatório o ECDC concluiu que a resistência aos carbapenemos era rara em E.
coli. Sendo, mais elevada a prevalência na Grécia (1,6%) e Chipre (1,3%) e inferior a
0,4% na maioria dos países (Figura 2) (11). No entanto, a monitorização contínua e
rigorosa continua a ser essencial, uma vez que a E. coli resistente aos carbapenemos
facilmente se propaga nos locais de saúde e na comunidade.
Em Portugal, verifica-se uma taxa oscilante entre 2006 e 2016, um aumento a partir de
2016, e valores relativamente baixos em 2017(0,3%) (Figura 3) (11, 25).
Figura 2 - Percentagem de isolados de Escherichia coli resistentes aos carbapenemos
em diversos países europeus, em 2017. Fonte: Surveillance of antimicrobial resistance
in Europe, 2017.
Figura 3 - Gráfico da evolução da taxa de resistência a carbapenemos da Escherichia
coli em Portugal, entre 2006 e 2017. Fonte: Surveillance Atlas of Infectious
Diseasesdo, ECDC.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
90
Em relação à K. pneumoniae, o relatório do ECDC de 2017, mostrou que a taxa de
resistência a carbapenemos, nesta estirpe, era particularmente elevada na Grécia, onde
registou, dados impressionantes de 64,7%, seguida de Itália com 29,7% e Roménia com
22,5% (Figura 4) (11).
Em Portugal, num estudo de 2012, num hospital universitário de Lisboa, mostrou uma
produção de carbapenemases que ocorre em apenas 5,3% das estirpes de K. pneumoniae
estudadas (24). No entanto, a análise da base de dados Surveillance Atlas of Infectious
Diseases da EARS-Net permite verificar uma tendência crescente da taxa de resistência
aos carbapenemos da K. pneumoniae, a nível nacional, com uma percentagem de 8,6%
em 2017 (Figura 5) (25).
O Surveillance Atlas of Infectious Diseases da EARS-Net é uma ferramenta que
interage com os últimos dados disponíveis sobre várias doenças infeciosas. A interface
permite que os utilizadores interajam e manipulem os dados para produzir uma
variedade de tabelas e mapas. A informação contida no conjunto de dados fornecido
através do atlas é disponibilizada pelo ECDC agrupando dados dos Estados Membros
recolhidos através do Sistema Europeu de Vigilância.
Figura 4 - Percentagem de isolados de Klebsiella pneumoniae resistentes aos
carbapenemos em diversos países europeus, em 2017. Fonte: Surveillance of
antimicrobial resistance in Europe, 2017.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
91
Em 2017, a taxa de resistência da P. aeruginosa aos carbapenemos tem maior
incidência nos países do sudeste europeu, sobretudo na Roménia com uma percentagem
de 63,4%, seguida da Letónia com 57,1% e por fim Eslováquia com 47%. Estas
percentagens diminuiram significativamente entre 2014 e 2017 (Figura 6) (11).
Figura 5 - Gráfico da evolução da taxa de resistência a carbapenemos da
Klebsiella pneumoniae em Portugal, entre 2006 e 2017. Fonte: Surveillance Atlas
of Infectious Diseases, ECDC.
Figura 6 - Percentagem de isolados de Pseudomonas aeruginosa resistentes
aos carbapenemos em diversos países europeus, em 2017. Fonte: Surveillance
of antimicrobial resistance in Europe, 2017.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
92
Em Portugal, a taxa de resistência manteve-se aproximadamente constante e estável,
tendo vindo a diminuir a partir de 2014, apresentando assim uma percentagem de 18,3%
em 2017 (Figura 7) (11, 25).
Em 2017, a taxa de resistência da Acinetobacter spp. aos carbapenemos tem maior
incidência nos países bálticos e do sul e sudeste Europa, sobretudo na Croácia com uma
percentagem de 96,2%, seguida da Grécia com 94,8% e por fim Lituânia com 88,5%
(Figura 8) (11).
Figura 7 - Gráfico da evolução da taxa de resistência a carbapenemos da Pseudomonas
aeruginosa em Portugal, entre 2006 e 2017. Fonte: Surveillance Atlas of Infectious
Diseases do ECDC.
Figura 8 - Percentagem de isolados de Acinetobacter spp. resistentes aos
carbapenemos em diversos países europeus, em 2017. Fonte: Surveillance of
antimicrobial resistance in Europe, 2017.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
93
Figura 9 - Evolução da taxa de resistência a carbapenemos da Acinetobacter spp. em
Portugal, entre 2006 e 2017. Fonte: Surveillance Atlas of Infectious Diseases, ECDC.
Em Portugal a taxa de resistência aos carbapenemos foi de 40,7% em 2017, de 51,9%
em 2016, 57,7% em 2015 e de 53,1 em 2014, tendo vindo a diminuir (Figura 9) (11,
25).
A tendência para o desenvolvimento da resistência parece acompanhar um consumo
exagerado de antimicrobianos, nomeadamente de carbapenemos. A European
Surveillance of Antimicrobial Consumption Network (ESAC-Net), um sistema europeu
de vigilância epidemiológica do consumo de antimicrobianos do ECDC, mostra um
gráfico do consumo de antibióticos no setor hospitalar na Europa em 2017, no qual 41%
corresponde ao consumo de cefalosporinas de terceira geração, seguido de 20,9% de
carbapenemos, uma situação anormal, dado que os carbapenemos são considerados
antibióticos de última linha (Figura 10) (26).
Figura 10 - Distribuição do uso de β- lactâmicos no setor hospitalar em
Portugal, em 2017 Fonte: ESAC-Net, ECDC.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
94
Na tabela 1 indica-se os dados do consumo global de antibióticos em Portugal, expresso
em DHD (doses diárias definidas por mil habitantes por dia). Desde 2012 a 2016, este
consumo quer nos cuidados de saúde primários (CSP), quer nos hospitais têm se
mantido abaixo da média na União Europeia. No entanto, nos CSP mantém-se, num
nível elevado (21,6), ligeiramente menor que da média Europeia (21,9) (98).
Entre 2012-2016, o consumo de carbapenemos nos Hospitais públicos portugueses
sofreu uma diminuição (em 13,3%) (Tabela 2) (98).
Tabela 2 - Consumo de carbapenemos nos hospitais públicos portugueses entre
2012 e 2016. Fonte: INFARMED, 2016.
Figura 5- RAPIDEC® CARBA NP. Fonte: Adaptado de Tamma P. and Simner P.,
2018Tabela 13 - Consumo de carbapenemos nos hospitais públicos portugueses
entre 2012 e 2016. Fonte: INFARMED, 2016.
Tabela 1 - Consumo Global de antibacterianos para uso sistémico em Portugal e na
Europa, entre 2012 e 2016. Fonte: ECDC: Summary of the latest data on antibiotic
consumption in the European Union- ESAC-Net Surveillance data, 2017.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
95
4. Factores de Risco
Os factores de risco que estão associados à colonização ou infecção por bactérias
resistentes aos carbapenemos e/ou produtoras de carbapenemases são variados, sendo os
mais relevantes a exposição a cuidados de saúde e a utilização de antimicrobianos (27).
Nomeadamente no que diz respeito às estirpes de K. pneumoniae resistentes aos
carbapenemos e/ou produtoras de KPC, um dos factores mais importante é a história de
tratamento anterior com alguns antibióticos como os carbapenemos, cefalosporinas,
fluoroquinolonas, algumas penicilinas de espectro alargado, inibidores das beta-
lactamases, vancomicina e metronidazol (28).
Outros factores como a imunossupressão, a gravidade da doença, a história de múltiplos
procedimentos invasivos, a idade avançada, a existência de comorbilidades, bem como a
história de internamento hospitalar anterior, tempo de internamento prolongado,
internamento em unidade de cuidados intensivos, ventilação mecânica, feridas abertas
ou transplantação recente são também importantes, nomeadamente para a aquisição de
Enterobacter spp. ou K. pneumoniae produtora de KPC (29,30, 31).
Ainda a presença de cateter biliar é um factor de risco para a aquisição de E. coli
resistentes aos carbapenemos (30).
Por vezes, encontram-se associações epidemiológicas curiosas entre os fatores de risco e
os tipos de carbapenemases. Por exemplo, um estudo espanhol encontrou uma maior
associação de estirpes produtoras de OXA-48 em lares e enfermarias e de estirpes
produtoras de MBL com internamento em unidade de cuidados intensivos (UCI) (32).
Portanto, a emergência rápida da resistência a carbapenemos por toda a Europa também
se deve provavelmente, e sobretudo, à sua utilização excessiva, muito pela disseminação
de microrganismos produtores de ESBL, nos quais os carbapenemos são uma alternativa
terapêutica (11). Pode-se concluir que qualquer antibiótico de largo espetro pode
contribuir, por pressão seletiva, para a resistência a carbapenemos (31,33). Esta é uma
noção crucial, com implicações profundas nos programas de contenção na prescrição de
antibióticos.
Em novembro de 2013, a Direção Geral de Saúde (DGS) determinou a criação e
implementação do Programa de Apoio à Prescrição Antibiótica (PAPA) em todas as
instituições de prestação de cuidados do Serviço Nacional de Saúde com o objetivo de
anular a utilização de antibióticos em situações onde são empregues sem indicação ou
por tempo superior ao indicado (34).
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
96
5. Métodos de deteção
A identificação rápida de estirpes produtoras de carbapenemases é crucial para melhorar
as medidas de controlo de infeção, na decisão terapêutica adequada e para minimizar a
disseminação desses microrganismos resistentes. O espectro variável da hidrólise das
carbapenemases, bem como o seu perfil fenotípico variável de suscetibilidade aos
antimicrobianos e a presença simultânea de outros mecanismos, geralmente de
resistência aos β-lactâmicos, dificultam a sua identificação (35). Como tal a sua deteção
representa um desafio substancial para muitos laboratórios clínicos. Logo, o
desenvolvimento de métodos de deteção mais rápidos tem grande importância, pois
torna possível a introdução precoce da terapêutica mais adequada, já que o tratamento
empírico inicial pode ter consequências (36).
Os métodos utilizados para detetar as carbapenemases incluem métodos fenótipos e
métodos moleculares. Ambos os métodos apresentam diferentes técnicas para detetar
estas enzimas. Os métodos fenotípicos detetam a atividade das enzimas, com ensaios
baseados em crescimento, métodos colorimétricos rápidos e ensaios
imunocromatográficos. Os métodos moleculares oferecem informação adicional através
da deteção do gene responsável pela resistência (37).
Nos dias de hoje, a maioria dos laboratórios de análises clínicas, após identificação e
análise do perfil de resistência característico, realiza testes de suscetibilidade
antimicrobiana (TSA), métodos colorimétricos (por exemplo CarbaNP) e moleculares
(por PCR). Estes métodos permitem fornecer informações acerca da estirpe causadora
da infeção, assim como a sua suscetibilidade a diversos antimicrobianos e detetar
diferentes mecanismos de resistências (38).
O padrão de suscetibilidade por difusão de disco é considerado um método de primeira
linha para deteção de carbapenemases. O ertapenem foi descrito como o indicador mais
sensível para a atividade de carbapenemases (39). As concentrações mínimas inibitórias
(CMI) dos antibióticos determinadas de acordo com as normas definidas pela European
Committee on Antimicrobial Susceptibility Testing (EUCAST) ou o Clinical Laboratory
Standards Institute (CLSI) podem ser usados como método confirmatório de resistência.
A CMI pode ser determinada por métodos de diluição em meio de cultura sólido ou
líquido que estão na base dos métodos simplificados e automatizados, E-test e Vitek,
respectivamente. Os breakpoints devem ser interpretados de acordo com EUCAST ou
CLSI (37).
Associado à determinação da CMI podem ser feitos testes de sinergia com os inibidores
de β-lactamases, nomeadamente ácido borónico para detecção de KPC, ácido
dipicolínico ou ácido etilenodiaminotetracético (EDTA) para as MBLs, ácido
clavulânico para as ESBLs, cloxacilina para as AmpC e avibactam para testes multi-
disco OXA-48 (40).
Os meios cromogénicos são considerados entre os melhores métodos de triagem para
deteção rápida de bactérias com elevada resistência aos carbapenemos (41). Eles são
baseados em um substrato enzimático cromogénico e antimicrobianos específicos que
os tornam seletivos para uma resistência específica. Existem vários tipos de meios
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
97
suplementados com carbapenemos que são usados para detetar estirpes produtoras de
carbapenemases (por exemplo CHROMagar KPC) (42).
O CarbaNP é um teste fenotípico colorimétrico utilizado para detetar bacilos gram
negativos produtores de carbapenemases. O teste baseia-se na deteção da hidrólise do
carbapenemo (imipenemo) por estirpes produtoras de carbapenemases. A hidrólise
acidifica o meio, resultando na mudança de cor do indicador de pH (vermelho de fenol).
Após a incubação por um período máximo de 2 horas a leitura realiza-se visualmente,
através da comparação de um poço de controlo sem imipenemo com um poço de reação
com imipenemo (Figura 11) (43). O Carba NP tem sido recomendado pelo CLSI e pelo
EUCAST como teste confirmatório para estirpes produtoras de carbapenemases (44).
Algumas publicações referem problemas de sensibilidade em isolados com fenótipo
mucoide e para algumas Enterobacterales produtoras de OXA-48 (45).
O método de inativação de carbapenemos (CIM) é um método fenotípico que deteta in
vitro a inativação do carbapenemo por estirpes resistentes aos carbapenemos. Consiste
numa suspensão de colónias bacterianas em água contendo discos de carbapenemos
(geralmente 10μg meropenem) e incubada por 2 h. O disco de meropenem é
posicionado em Mueller-Hinton agar (MHA) inoculado com uma estirpe de E. coli
sensível ao carbapenemo. Após pelo menos 6 horas de incubação, é medida a zona de
inibição. Se não existir um halo em torno do disco, significa que há produção de
carbapenemase, caso contrário, o microrganismo não é produtor de carbapenemases
Figura 11 - RAPIDEC® CARBA NP. Fonte: Adaptado de Tamma P. and Simner P.,
2018
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
98
(Figura 12) (46). Alguns estudos demonstram que o CIM é mais preciso do que o Carba
NP na deteção de estirpes produtoras de carbapenemases (47).
Os ensaios imunocromatográficos (IC) foram recentemente desenvolvidos e
comercializados para a deteção precisa de carbapenemases em culturas bacterianas.
Esses testes usam tecnologia baseada em ligação anticorpo-antígeno para capturar
antígenos específicos de carbapenemases (37).
Dentro dos métodos não fenotípicos encontra-se o MALDI-TOF (Matrix-Assisted Laser
Desorption⁄Ionisation Time-Of-Flight Mass Spectrometry) e ensaios de fluxo lateral. O
MALDI-TOF é amplamente usado para identificar muitas estirpes com base no peso
molecular de diferentes compostos químicos das células bacterianas e fúngicas. A
identificação é feita por espectrometria de massa capaz de identificar rapidamente os
produtos de degradação do carbapenemo quando as proteínas extraídas das bactérias são
incubadas (normalmente por 2-4 horas) com um substrato de carbapenemo. Também
permite a deteção de um pico proteico conhecido associado ao plasmídeo que possui a
carbapenemase (45, 48). Semelhante ao teste CarbaNP, o MALDI-TOF tem dificuldade
em detetar enzimas do tipo OXA-48.
Um novo ensaio de fluxo lateral imunocromatográfico foi recentemente descrito. O teste
é baseado na captura imunológica de epítopos de OXA-48, usando nanopartículas
coloidais ligadas a uma membrana de nitrocelulose dentro de um dispositivo de fluxo
lateral. Os anticorpos monoclonais anti-OXA-48 são selecionados como reagentes de
captura específicos para identificação direta de enzimas do tipo OXA-48 (42). O ensaio
leva cerca de quatro minutos e foi avaliado tanto em colónias como em garrafas de
hemoculturas (49).
As técnicas moleculares são mais seguras para a deteção de estirpes produtoras de
carbapenemases do que os métodos fenotípicos (50). Estas técnicas incluem métodos
baseados em reação em cadeia da polimerase (PCR), técnicas de hibridação
(microarrays) e sequenciação do genoma completo (WGS).
A maioria das técnicas moleculares para detetar a resistência aos carbapenemos são
métodos baseados em PCR. Um exemplo é o ensaio comercial Xpert Carba-R, que
detecta KPC, NDM, IMP, VIM e OXA-48. O PCR permite a identificação rápida de
genes específicos de carbapenemases usando primers e sondas para ensaios em tempo
real, para regiões conservadas no gene alvo. Este teste é muito específico para um dado
gene e pode ser adaptado para detetar subgrupos específicos de uma família de genes
(51,52).
Figura 12 - CIM - Resultado positivo para a presença de carbapenemase e resultado
negativo. Fonte: Adaptado de Tamma, P. e Simner, P., 2018.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
99
A microarray é uma técnica baseada em hibridização que permite a deteção de um
grande número de genes dentro de uma única reação. O DNA das bactérias é
hibridizado com pares de bases complementares de sondas e, em seguida, digitalizados
para ver a hibridização sonda-alvo. Esta técnica tem sido usada para a identificação de
espécies bacterianas e para identificar genes de resistência (53,54).
A técnica de WGS baseia-se na amplificação do DNA por uma enzima DNA polimerase
usando trifosfatos de desoxinucleotídeos (dNTPs) e trifosfatos de didesoxinucleotídeos
(ddNTPs) que são marcados com 4 fluoróforos diferentes. Os fragmentos resultantes
podem ser analisados por espectrometria de massa ou eletroforese capilar (55,56). Esta
técnica tem sido usada em alguns laboratórios para analisar a sequência de genes de
resistência a antimicrobianos e também fornece informações sobre o tipo de plasmídeo
portador do gene de resistência (57).
Atualmente, a deteção e caracterização de estirpes produtoras de carbapenemases
representam um verdadeiro desafio para muitos laboratórios clínicos em todo o mundo.
Nenhum consenso ainda foi alcançado sobre o método ideal. Ao selecionar um método
de deteção para fins de diagnóstico ou triagem, é importante considerar muitas
características, como rapidez, custo, acessibilidade, facilidade de uso e grau de precisão.
Além disso, os tipos de resistência, a prevalência de bactérias resistentes, a região
geográfica e a população de utentes são fatores importantes a considerar ao selecionar e
implementar um método. Métodos fenotípicos, como métodos baseados em cultura e
meios de triagem, são simples e acessíveis, e são mais atraentes para o uso rotineiro em
laboratoriais clínicos. No entanto, a sensibilidade e especificidade ainda são
inconclusivas e exigem longos períodos de incubação (37).
Embora alguns testes bioquímicos, como o teste de CarbaNP, exibam baixa
sensibilidade a algumas carbapenemases, como OXA-48, estes testes são às vezes
preferíveis, devido à sua rapidez e simplicidade. Ensaios imunocromatográficos têm
ganho mais atenção recentemente porque podem detetar rapidamente estirpes
produtoras de carbapenemases diretamente de amostras clínicas com um alto nível de
precisão. Devido às diferenças na atividade de resistência aos carbapenemos entre as
carbapenemases que podem ser detetadas por diferentes métodos, o uso de dois ou mais
métodos de deteção fenotípica pode melhorar a deteção de estirpes produtoras de
carbapenemases em comparação com o uso de uma única técnica (37).
Os métodos moleculares tornaram-se o método de escolha, porque a maioria pode ser
realizada rapidamente com um alto nível de sensibilidade e especificidade. Estes
métodos também possuem outras vantagens sobre os métodos fenotípicos, como
permitir a deteção direta de estirpes produtoras de carbapenemases a partir das amostras
clínicas e permitir a identificação do mecanismo de resistência a carbapenemos (58).
Estas vantagens são particularmente úteis não apenas para fins epidemiológicos e de
vigilância, mas também para investigações de surtos (59). No entanto, algumas destas
técnicas moleculares são incapazes de detetar novos genes de resistência. Estes métodos
são considerados de referência para confirmação e caracterização de carbapenemases
conhecidas.
A técnica de WGS pode-se tornar uma ferramenta altamente poderosa tanto para
investigações de surtos como para a caracterização molecular de genes de resistência a
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
100
antimicrobianos em laboratórios clínicos de rotina. No entanto, ainda é relativamente
cara, demorada e requer um sistema automatizado de interpretação de dados e um banco
de dados disponível publicamente (37).
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
101
6. Estirpes produtoras de Carbapenemases na ULS da Guarda
No decorrer do meu estágio foi possível analisar a situação epidemiológica das infeções
por estirpes produtoras de carbapenemases da ULS da Guarda, podendo fazer um estudo
comparativo com a realidade de Portugal e outros estudos.
A ULS da Guarda é formada por dois hospitais, o Hospital Sousa Martins na Guarda
(HSM), e o Hospital Nossa Senhora da Assunção em Seia (HNSA) e por 13 centros de
saúde.
Os dados que se seguem foram obtidos no Serviço de Patologia Clínica (nomeadamente
no laboratório de Microbiologia e Biologia Molecular) provenientes dos dois hospitais e
englobou os dados de Janeiro de 2016 a Agosto de 2019 (Tabela 3).
As amostras recebidas pelo laboratório são processadas tendo em conta a natureza do
produto e segundo procedimentos devidamente estabelecidos, sendo cultivadas em
meios de cultura que possibilitem o crescimento dos microrganismos. Após a
identificação e TSA pelo sistema VITEK® 2 Compact da Biomerieux®, a partir do
perfil de resistência aos antibióticos, são identificadas estirpes suspeitas de ser
produtoras de carbapenemases para posterior confirmação. De forma a confirmar a
suspeita de estirpes produtoras de carbapenemases, determinou-se a CMI dos
carbapenemos (ertapenem e meropenem), que foram interpretadas segundo as normas
definidas pela EUCAST. Em simultâneo foram efetuados testes para a pesquisa de
carbapenemases por um método fenotípico (RAPIDEC® CARBA NP) e um método
molecular baseada em PCR em tempo real (Xpert Carba-R). Em situações em que as
bactérias apresentam múltiplas resistências, determinou-se a CMI por E-teste da
ceftazidima-avibactam, a CMI da colistina por microdiluição e nalgumas situações
específicas a CMI da tigeciclina por E-teste, de modo a obter alternativas terapêuticas.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
102
Após analisar a tabela 3 verificou-se um total de 136 estirpes isoladas na ULS da
Guarda, foram identificadas K. pneumoniae (n=123), P. aeruginosa (n=6), Enterobacter
cloacae (n=3), Pseudomona putida (n=1), Proteus mirabilis (n=1), E. coli (n=1) e
Citrobacter freundii (n=1).
Tabela 3 - Número de isolados provenientes do Hospital Sousa Martins (HSM) e do
Hospital Nossa Senhora da Assunção (HNSA), nos anos 2016, 2017, 2018, 2019
(Janeiro a Agosto). Fonte: SPC da ULS da Guarda.
2016 2017 2018 2019 (Janeiro a
Agosto)
Total (n=)
Total (%)
HSM HNSA HSM HNSA HSM HNSA HSM HNSA
C.freundii
VIM 1 1 0.74
E. cloacae 1 1 2
2,2 E. cloacae
VIM 1 1
E. coli
KPC 1 1 0.74
K. pneumoniae 13 13
90,4 K. pneumoniae
KPC 1 3 14 11 30 21 13 14 107
K. pneumoniae
OXA-48 2 1 3
P. putida 1 1 0.74
P. mirabilis 1 1 0.74
P. aeruginosa 1 1 4 6 4,4
Total 20 27 56 33 136
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
103
Caso Clínico 1
Um doente de 58 anos, internado na ULS da Guarda em Outubro
de 2018 foi identificada na urina uma estirpe de E. coli produtora
de KPC, e em Novembro do mesmo ano foi identificada na urina
uma estirpe de K. pneumoniae produtora de KPC. Poderemos
inferir que este doente estava colonizado com estirpes produtoras
de carbapenemases, havendo uma facilidade de transmissão de
genes entre estirpes.
20
27
56
2016 2017 2018
0
10
20
30
40
50
60
Ano
Nú
mer
o d
e es
tirp
es p
rod
uto
ras
de
Ca
rba
pen
ema
ses
Ao observar a Figura 13 verificou-se um aumento significativo de estirpes produtoras de
carbapenemases desde 2016 a 2018.
Segundo o relatório do ECDC de 2017, em Portugal, verifica-se esse mesmo aumento
para estirpes K. pneumoniae e de E. coli e uma ligeira diminuição para P. aeruginosa e
Acinetobacter spp., de 2014 a 2017. Este aumento pode dever-se à facilidade de
transmissão entre estirpes, do gene blakpc em plasmídeos transmissíveis a outros
géneros, e à capacidade inata de adaptação das bactérias (ver caso clínico 1).
Figura 13 - Evolução do número de estirpes produtoras de carbapenemases na
ULS de 2016 a 2018. Fonte: SPC da ULS da Guarda.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
104
Após analisar a tabela 4 pode-se observar que a suscetibilidade do meropenem e da
fosfomicina da estirpe de K. pneumoniae produtora de carbapenemases passou de
sensível para resistente, provavelmente pela pressão seletiva exercida pelo uso de
antibióticos.
Tabela 4 - Perfil fenotípico do doente (Caso clínico 1). Fonte: SPC da ULS da Guarda.
E. coli
(Outubro 2018)
K. pneumoniae
(Novembro 2018)
K.pneumoniae
(Dezembro 2018)
Ampicilina R R R
Amoxicilina/
Ácido clavulânico R R R
Cefuroxima R R R
Cefuroxima Axetil R R R
Cefotaxima R R R
Ceftazidima R R R
Meropenem S S R
Ertapenem S R R
Piperacilina/tazobactam R R R
Trimetoprim/Sulfametazol R R R
Ciprofloxacina R R R
Colistina S S S
Fosfomicina S S R
Tendo em conta a figura 14 verificou-se que 90,4% das estirpes isolados correspondem
à K. pneumoniae, 4,4% à P. aeruginosa, 2,2% ao E. cloacae, e 0,74% às estirpes P.
putida, P. mirabilis, E. coli e C. freundii.
Em 136 estirpes isoladas na ULS da Guarda, 113 foram pesquisadas por PCR em tempo
real, as sequências de genes blaKPC, blaNDM, blaVIM, blaOXA-48 e blaIMP. Do total de 123
K. pneumoniae foram identificadas KPC (n=107) e OXA-48 (n=3), de E. coli KPC
(n=1), de Citrobacter freundii VIM (n=1) e do total de 3 E. cloacae foi identificado
VIM (n=1). Nas restantes 23 estirpes apenas se efetuou o teste RAPIDEC® CARBA NP
com resultado positivo, visto que os testes moleculares são muito dispendiosos e por
isso eram realizados unicamente a pedido do médico. Face aos resultados obtidos,
verifica-se que estão de acordo com outros estudos já realizados, pois indicam que as
Enterobacterales, nomeadamente K. pneumoniae são as principais portadoras de
carbapenemases (2).
Figura 6 - Percentagem de estirpes
produtoras de carbapenemases
isoladas na ULS- Guarda, de 2016 a
2019 (Janeiro a Agosto).
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
105
0 20 40 60 80 100
Pseudomona aerugionsa
Pseudomona putida
Klebsiella pneumoniae
Proteus mirabilis
Enterobacter cloacae
Escherichia coli
Citrobacter freundii
4,4
0,74
90,4
0,74
2,2
0,74
0,74
Percentagem (%)
Esti
rpe
s is
ola
das
Relativamente aos produtos biológicos nos quais foram isoladas as estirpes produtoras
de carbapenemases e tendo como base o figura 15, observou-se que a maioria são
detetados na urina (n=84) seguida das expetorações (n=21), hemoculturas (n=13),
exsudados de ferida não cirúrgica (n=5), aspirados brônquicos (n=4), pus (n=3),
cateteres (n=2), exsudados de ferida cirúrgica (n=2), biópsia (n=1) e de bílis (n=1).
Alguns factores de risco como a utilização de cateteres podem facilitar a entrada destas
estirpes na urina (60) (ver caso clínico 2 e 3).
Figura 14 - Percentagem de estirpes produtoras de carbapenemases isoladas na ULS-
Guarda, de 2016 a 2019 (Janeiro a Agosto). Fonte: SPC da ULS da Guarda.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
106
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
Produto biológico
Nú
mer
o d
e es
tirp
es
pro
du
tora
de
carb
ap
enem
ase
s
2016 2017 2018 2019
Caso clínico 2
O doente de 68 anos tinha uma neoplasia da
bexiga o que levou ao uso de saco de
urostomia. Em 2017, foi identificada na urina
uma estirpe de K. pneumoiae produtora de
carbapenemase.
Caso clínico 2
O doente de 68 anos do sexo masculino tinha
uma neoplasia da bexiga o que levou ao uso
de saco de urostomia. Em 2017, foi
identificada na urina uma estirpe de K.
pneumoiae produtora de carbapenemase.
Caso clínico 3
A doente de 92 anos apresentava uma úlcera de
pressão na região sacrococcígea com bordo
necrosado. Em 2017, foi identificada em uma K.
pneumoniae (KPC) na urina.
Figura 15- Número de estirpes produtoras de carbapenemases nos diferentes produtos
biológicos, desde 2016 a 2019 (Janeiro a Agosto). Fonte: SPC da ULS da Guarda.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
107
Após analisar a tabela 5 pode-se verificar que a suscetibilidade ao imepenem da estirpe
de K. pneumoniae produtora de carbapenemase passou de intermédio para resistente de
Fevereiro para Março.
Do mesmo modo, no caso clínico 3, a suscetibilidade ao ertapenem da estirpe de K.
pneumoniae também se alterou de sensível para intermédio, tabela 6. Nos dois casos a
alteração da suscetibilidade pode dever-se a uma pressão seletiva exercida pelo uso de
antibióticos.
Tabela 5 - Perfil fenotípico do doente (Caso clínico 2). Fonte: SPC da ULS da Guarda.
K. pneumoniae
(Fevereiro 2017)
K. pneumoniae
(Março 2017)
Ampicilina R R
Amoxicilina/
Ácido clavulânico R R
Cefuroxima R R
Cefuroxima Axetil R R
Cefotaxima R R
Ceftazidima R R
Imipenem I R
Ertapenem R R
Trimetoprim/Sulfametazol R R
Ciprofloxacina R R
Colistina S S
Fosfomicina S R
Tabela 6 - Perfil fenotípico do doente (caso clínico 3). Fonte: SPC da ULS da Guarda.
K. pneumoniae
(Agosto 2017)
K. pneumoniae
(Setembro 2017)
Ampicilina R R
Amoxicilina/
Ácido clavulânico R R
Cefuroxima R R
Cefuroxima Axetil R R
Cefotaxima R R
Ceftazidima R R
Meropenem S S
Ertapenem S I
Trimetoprim/Sulfametazol R R
Ciprofloxacina R R
Colistina S S
Fosfomicina S S
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
108
Caso clínico 4
Dois doentes, doente 1 de 81 anos e doente 2 de 91 anos que estiveram os dois
internados no mesmo serviço, Medicina Homens, no Hospital Nossa Senhora da
Assunção. Em Agosto de 2019 foi identificado na urina dos dois doentes uma estirpe de
K. pneumoniae KPC com o mesmo perfil fenótipo de resistência. Provavelmente esta
estirpe foi transmitida do doente 1 para o doente 2, visto que o doente 1 já apresentava
esta estirpe em Abril de 2019. Provavelmente as medidas de isolamento necessárias não
foram eficazes.
Caso clínico 4
Dois doentes, doente 1 de 81 anos e doente 2 de 91 anos que estiveram os dois
internados no mesmo serviço, Medicina Homens, no Hospital Nossa Senhora da
Assunção. Em Agosto de 2019 foi identificado na urina dos dois doentes uma estirpe de
K. pneumoniae KPC com o mesmo perfil fenótipo de resistência. Provavelmente esta
estirpe foi transmitida do doente 1 para o doente 2, visto que o doente 1 já apresentava
esta estirpe em Abril de 2019. Provavelmente as medidas de isolamento necessárias não
foram eficazes.
Além do cateterismo, existem outros factores que podem facilitar aquisição de estirpes
multiresistentes, nomeadamente a transferência destas estirpes entre doentes quando não
são observados os cuidados necessários de isolamento como se pode deduzir do caso
clínico 4.
Também neste caso clínico se verificou alteração da susceptibilidade aos antibióticos
por pressão selectiva à ciprofloxacina no doente 1 (tabela 7).
No doente 2 (tabela 8) foi identificada uma estirpe de E. coli em Julho com um perfil de
susceptibilidade aos antibióticos, diferente do apresentdo pela K. pneumoniae em
Agosto. No entanto o perfil de resistênciaa desta estirpe é igual à K. pneumoniae em
encontrada no doente 1 na mesma data. Embora não tenha sido efectuada a
caracterização molecular das estirpes produtoras de KPC, tudo indica que, pode estar a
acontecer um surto endémico por K. pneumoniae no SPC da ULS da Guarda.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
109
Tabela 7- Perfil do doente 1 (Caso clínico 4). Fonte: SPC da ULS da Guarda.
K. pneumoniae
(Abril 2019)
K. pneumoniae
(Agosto 2019)
Ampicilina R R
Amoxicilina/
Ácido clavulânico R R
Cefuroxima R R
Cefuroxima Axetil R R
Cefotaxima R R
Ceftazidima R R
Meropenem R R
Ertapenem R R
Trimetoprim/Sulfametazol R R
Ciprofloxacina S R
Colistina S S
Fosfomicina S S
Ceftazidima/Avibactam -- S
Tabela 8- Perfil fenotípico do doente 2 (caso clínico 4). Fonte: SPC da ULS da Guarda.
E. coli
(Julho 2017)
K. pneumoniae
(Agosto 2019)
Ampicilina R R
Amoxicilina/
Ácido clavulânico S R
Cefuroxima R R
Cefuroxima Axetil R R
Cefotaxima I R
Ceftazidima S R
Cefepima S R
Meropenem S R
Ertapenem S R
Trimetoprim/Sulfametazol R R
Ciprofloxacina R R
Colistina S S
Fosfomicina S S
Ceftazidima/Avibactam -- S
Figura 7 - Evolução da percentagem de
resistência dos variados antibióticos,
de 2016 a 2018.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
110
0
20
40
60
80
100
120
Antibióticos
Per
cen
tage
m d
e re
sist
ênci
a (%
)
2016 2017 2018
Na figura 16 verifica-se que em 2016 as estirpes produtoras de carbapenemases
apresentavam um perfil fenótipo de resistência não só aos antibióticos β-lactâmicos
como à maioria dos outros grupos de antibióticos, nomeadamente aos aminoglicosídeos,
quinolonas, antimetabolitos.
No entanto, em 2017 e 2018 já se verifica a diminuição das resistências a outras famílias
de antibióticos, o que pode resultar da crescente consciencialização por parte dos
médicos na salvaguarda de alguns antibióticos. A resistência pode ter origens diferentes
podendo actualmente ser atribuída à transferência por plasmídeos entre espécies
bacterianas diferentes, no entanto uma vez que a estirpe prevalente na instituição é a K.
pneumoniae produtora de KPC, pode ser explicado pela disseminação generalizada
destasespécie entre doentes, superficies e também pelas práticas invasivas que os
doentes estão sujeitos.
Tendo em conta os carbapenemos estudados, ertapenem e meropenem, verifica-se
também a diminuição da percentagem de resistência desde 2016 a 2018. Também em
Portugal se tem verificado essa diminuição (98) em que a percentagem de resistência ao
ertapenem é maior do que a do meropenem, o que se pode dever ao facto deste último
carbapenemo ter um espectro de ação mais alargado e ser reservado para as infecções
por P. aeruginosa, o que contribui para que seja menos prescrito (61). Quanto à
colistina, tanto em 2016 como em 2017 foram isoladas 2 estirpes com resistência à
colistina e em 2018 apenas uma estirpe com resistência à colistina. O número de
estirpes isoladas com resistência à colistina não permite tirar conclusões.
Figura 16 - Evolução da percentagem de resistência dos variados antibióticos, de
2016 a 2018. Fonte: SPC da ULS da Guarda.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
111
Entre 2009 e 2013, segundo a Rede Europeia de Vigilância do Consumo de
Antimicrobianos (ESAC-Net), o consumo de polimixinas quase duplicou na Europa,
quando o perfil de resistência in vitro revela a colistina como única opção terapêutica
para este tipo de Enterobacterales (2, 62). O aumento da resistência a este antibiótico
constitui uma grande preocupação dado que em determinadas situações é o último
recurso na terapêutica de estirpes multirresistentes (ver caso clínico 5).
Tabela 9 - Perfil fenotípico do doente (caso clínico 5). Fonte: SPC da ULS da Guarda.
K. pneumoniae
(12 de Agosto 2019)
K . pneumoniae
(29 de Agosto 2019)
Ampicilina R R
Amoxicilina/
Ácido clavulânico R R
Cefuroxima R R
Cefuroxima Axetil R R
Cefotaxima I R
Ceftazidima R R
Cefepima I I
Meropenem S R
Ertapenem R R
Trimetoprim/Sulfametazol R R
Ciprofloxacina R R
Colistina S R
Fosfomicina R R
Ceftazidima/Avibactam S S
Caso clínico 5
Na urina do doente de 88 anos foi identificado em 12 de Agosto de 2019 uma
estirpe de K. pneumoniae do tipo KPC apenas sensível ao meropenem,
ceftazidma/avibactam e à colistina. Em 29 de Agosto de 2019 foi identificada a
mesma estirpe na urina, mas já resistente ao meropenem e à colistina.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
112
Apresento outros casos clínicos, em que nalguns dele até à data não foi possível saber
qual a terapêutica antibiótica instituída (caso clínico 6,7 e 8).
Após analisar a tabela 10 pode-se observar que a suscetibilidade da cefuroxima,
cefuroxima axetil, cefotaxima, ceftazidima, cefepima, meropenem, ertapenem e
trimetoprim/sulfametazol da estirpe de K. pneumoniae passou de sensível para resistente
e intermédio no caso da cefepima. Dado que, a estirpe isolada em Setembro apresenta
susceptibilidade à ciprofloxacina e susceptibilidade intermédia à cefepima pode ser
considerada a hipótese de o doente ter sido contaminado com duas estirpes clonais
diferentes.
Tabela 10 - Perfil fenotípico do doente (caso clínico 6). Fonte: SPC da ULS da Guarda.
K. pneumoniae
(Julho 2019)
K .pneumoniae
(Setembro 2019)
Ampicilina R R
Amoxicilina/
Ácido clavulânico R R
Cefuroxima S R
Cefuroxima Axetil S R
Cefotaxima S R
Ceftazidima S R
Cefepima S I
Meropenem S R
Ertapenem S R
Trimetoprim/Sulfametazol S R
Ciprofloxacina S S
Colistina S S
Fosfomicina S S
Caso clínico 6
Na expectoração do doente de 59 anos, com esclerose lateral aminotrófica, foi
identificado em Julho de 2019 uma estirpe de K. pneumoniae sensível à
maioria dos antibióticos testados e em Setembro do mesmo ano foi identificada
na expectoração uma estirpe de K. pneumoniae produtora de KPC. Em Julho
foi feita antibioterapia empírica com amoxicilina/ácido clavulânico durante 7
dias,ao fim de 3 dias apresentou agravamento clínico e foi iniciada
levofloxacina empiricamente durante 7 dias. Após se obter o perfil fenotípico
do exame cultural de Julho foi administrado cefuroxima durante 7 dias. Até à
data não foi ainda possível obter informação da terapêutica instituída após
identificação da estirpe KPC de Setembro.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
113
Caso clínico 7
Na urina do doente de 84 anos foi identificado em Fevereiro de 2018 uma estirpe
de K. pneumoniae produtora de carbapenemases, apresentando em Abril a
mesma bactériacom suscetibilidade diferentes ao meropenem e ertapenem,
passando de sensível a resistente e de intermédio a resistente, respectivamente.
Caso clínico 7
Na urina do doente de 84 anos foi identificado em Fevereiro de 2018 uma estirpe
de K. pneumoniae produtora de carbapenemases, apresentando em Abril a
mesma bactéria mas com susceptibilidade diferentes no meropenem e ertapenem,
passando de sensível a resistente e de intermédio a resistente, respectivamente.
Tabela 11 - Perfil fenotípico do doente (caso clínico 7). Fonte: SPC da ULS da Guarda.
K. pneumoniae
(Fevereiro
2019)
K. pneumoniae
(16 de Abril
2019)
K. pneumoniae
(23 de Abril
2019)
Ampicilina R R R
Amoxicilina/
Ácido clavulânico R R R
Cefuroxima R R R
Cefuroxima Axetil R R R
Cefotaxima R R R
Ceftazidima R R R
Cefepima I I I
Meropenem S I R
Ertapenem I R R
Trimetoprim/Sulfametazol R R R
Ciprofloxacina S S S
Colistina S S S
Fosfomicina S S S
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
114
Tabela 12 - Perfil fenotípico do doente (caso clínico 8). Fonte: SPC da ULS da Guarda.
Após analisar os oito casos clínicos pode-se concluir o tempo de hospitalização pode ter
sido uma das causas primárias da contaminação com estirpes resistentes endémicas no
hospital; associada ao consumo de antibióticos, que se traduziu por um aumento das
resistências ao meropenem, ertapenem, ciprofloxacina, fosfomicina e colistina e
consequentemente à diminuição de alternativas terapêuticas.
K. pneumoniae
(Julho 2019)
K. pneumoniae
(Setembro 2019)
Ampicilina R R
Amoxicilina/
Ácido clavulânico R R
Cefuroxima R R
Cefuroxima Axetil R R
Cefotaxima R R
Ceftazidima R R
Cefepima I I
Meropenem R R
Ertapenem R R
Trimetoprim/Sulfametazol R R
Ciprofloxacina R S
Colistina S S
Fosfomicina S R
Caso clínico 8
Na urina da doente de 70 anos foi identificado em Julho e Setembro de 2019 uma
estirpe de K. pneumoniae produtora de carbapenemases, KPC, apresentando uma
suscetibilidade à ciprofloxacina de resistente em Julho e passando a sensível em
Setembro. Atè à data não foi possível concluir qual o factor que desencadeou esta
alteração de suscepibilidade. A suscetibilidade da fosfomicina em Julho era sensível e
em Setembro já era resistente, provavelmente pela pressão seletiva exercida pelo uso
de antibióticos.
Caso clínico 8
Na urina da doente MESM de 70 anos foi identificado em Julho e Setembro de 2019
uma estirpe de K. pneumoniae produtora de carbapenemases, KPC, apresentando uma
susceptibilidade à ciprofloxacina de resistente em Julho e passando a sensível em
Setembro. Atè à data não foi possível concluir qual o factor que desencadeou esta
alteração de suscepibilidade. A susceptibilidade da fosfomicina em Julho era sensível e
em Setembro já era resistente, provavelmente pela pressão seletiva exercida pelo uso
de antibióticos.
Figura 8 - Algoritmo sugerido para
escolha de antibiótico em paciente com
bacteremia de Enterobacteriaceae
resistente a carbapenêmicos. Fonte:
Alhashem F et al ., 2017.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
115
7. Tratamento
Até há bem pouco tempo, os carbapenemos eram antibióticos cuja utilização transmitia
um grau de certeza significativo quanto à eficácia do tratamento. No entanto, com o
aumento de resistências aos carbapenemos, o tratamento das infeções torna-se um
desafio. Para evitar o desenvolvimento de mais resistências, é crucial ser seletivo na
escolha dos antimicrobianos. A escolha do antibiótico adequado deve basear-se em
dados clínicos apoiados por um diagnóstico feito o mais rápido possível (63).
O tratamento deve ser iniciado assim que se suspeite de uma infeção provocada por uma
estirpe suspeita de ser produtora de carbapenemases, para prevenir o desenvolvimento
de novas complicações e progressão a uma septicemia e/ou falência de múltiplos
órgãos. Para reduzir a taxa de mortalidade, tem sido defendido o início da antibioterapia
empírica a partir da primeira hora após a infeção. Isto leva a uma redução da taxa de
mortalidade de 13,7% (64).
Embora as infeções provocadas por bactérias de Gram-positivo (especialmente
Staphylococcus) são as mais prevalentes em ambiente hospitalar (62,2%), a maior taxa
de mortalidade está associada a bactérias de Gram-negativo, nomeadamente do grupo
das Enterobacterales resistentes aos carbapenemos, o que implicou o “resgate” de
antibióticos antigos, como a colistina (polimixina E) e aminoglicosídeos, muitos já
praticamente abandonados da prática clínica (65,66). A colistina é uma polimixina com
atividade bactericida contra infeções bacterianas por Gram-negativos, no entanto o uso
deste antibiótico foi proibido por muitos anos devido à sua nefrotoxicidade e
neurotoxicidade (67, 68). A colistina parece ser uma boa alternativa em doentes
vulneráveis (sem qualquer evidência de insuficiência renal) especialmente quando
combinado com outros antibióticos como os carbapenemos. Um estudo feito nos
Estados Unidos verificou uma redução da taxa de mortalidade dos doentes tratados com
carbapenemo/colistina ou carbapenemo/tigeciclina em relação aos tratados com um
único antibiótico (2 em cada 15 doentes, que foram tratados com mais que um
antibiótico morreram em comparação com 11 de 19 doentes tratados só com um
antibiótico), devido a uma associação sinérgica entre a colistina ou tigecilina e os
carbapenemos. (69)
Infelizmente nos últimos anos, surgiram na China, Estados Unidos e em diferentes
países europeus, Enterobacterales resistentes à colistina que já eram resistentes aos
carbapenemos. É mais frequente em Enterobacterales que possuem o gene mcr-1
juntamente com o gene de resistência das carbapenemases (70,71).
Em alternativa à colistina a terapia combinada com ertapenem e meropenem, foi
iniciada num doente idoso com E. coli produtora de KPC com uma contraindicação ao
uso de colistina, devido a um transplante renal tendo apresentado melhorias. (72) Em
conclusão, nestes casos com resistência à colistina, onde as opções terapêuticas são
limitadas, uma combinação de dois carbapenemos poderá ser benéfico (73).
A tigeciclina é uma glicilciclina, que é um derivado da minociclina (tetraciclina) e exibe
amplo espectro de atividade incluindo os microrganismos multiresistentes (74). Muitos
estudos foram realizados para avaliar a eficácia da tigeciclina, no tratamento de infeções
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
116
por Enterobacterales resistentes aos carbapenemos. Em mais que um estudo,
demonstrou que o tratamento com tigeciclina foi associado a uma alta taxa de
mortalidade (72). Enquanto se for combinada particularmente com um aminoglicosídeo
ou a colistina, a taxa de mortalidade diminui, particularmente nas infeções que
envolvem bactérias produtoras de carbapenemases do tipo KPC (75,76).
Os aminoglicosídeos, como a gentamicina, amicacina e tobramicina, têm diferentes
atividades in vitro. Em infeções do trato urinário por Enterobacterales resistentes aos
carbapenemos, a atividade da gentamicina em estirpes sensíveis tem resultados
positivos. A amicacina, neste tipo de infeções, parece ser mais ativa comparado com a
gentamicina ou tobramicina (77). Noutro estudo, a amicacina e a tobramicina mostrou
suscetibilidade baixa em infeções causadas por bactérias Gram-negativas
multirresistentes, o que poderá ser explicado pela presença de enzimas que alteram a
estrutura dos aminoglicosídeos em particular às que têm capacidade de modificar
diferentes estruturas em simultâneo que são frequentes em bactérias multiresistentes. O
uso de aminoglicosídeos em monoterapia em infeções por K. pneumoniae produtoras de
carbapenemases são considerados ineficazes e, portanto, não são recomendados para o
uso clínico (78,79).
A fosfomicina é um antibiótico bactericida que inibe a biossíntese da parede celular
bacteriana, é usado para tratar infeções do trato urinário e tem baixas taxas de
resistência (80,81 e 82).
Para infeções causadas por isolados produtores de metalo-beta-lactamases (MBL), é
sugerido um regime de combinação à base de polimixina, se o isolado for suscetível.
Para estirpes que são altamente resistentes (inclusive às polimixinas), a combinação de
ceftazidima-avibactam mais aztreonam pode ser uma opção possível. As MBLs
conferem resistência a todos os antibióticos do tipo beta-lactâmico, exceto o aztreonam,
mas os isolados produtores de MBL geralmente produzem outras beta-lactamases de
largo espectro que conferem resistência ao aztreonam (83). Embora as MBLs não sejam
inibidas por nenhum dos inibidores de beta-lactamases disponíveis, a combinação de
ceftazidima-avibactam e aztreonam pode ter um efeito sinérgico, já que o avibactam
pode inativar as outras beta-lactamases para tornar o aztreonam ativo. Essa combinação
tem sido usada para tratar com sucesso doentes com estirpes produtoras de MBL
extremamente resistentes (84, 85). As polimixinas são os pilares da terapia para A.
baumannii e P. aeruginosa resistentes aos carbapenemos e são geralmente usadas em
combinação com outros antimicrobianos (86, 87).
Num estudo recente, dois doentes com Enterobacterales resistentes aos carbapenemos
(um doente com uma septicemia e um o outro com suspeita de endocardite) foram
tratados com ceftazidima-avibactam, tendo havido resultados positivos (88). Esta
combinação é eficaz em estirpes produtoras de carbapenemases do tipo KPC e OXA-48
(89).
Outra opção poderá ser a adição de vaborbactam a meropenem. Vaborbactam é um
inibidor potente das carbapenemases de classe A que quando combinado com o
meropenem, restaura a atividade do meropenem e tem mostrado eficácia no tratamento
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
117
de infecções do trato urinário complicadas, incluindo aquelas causadas por
Enterobacterales produtoras de carbapenemases do tipo KPC (90).
A plazomicina que pertence ao grupo dos aminoglicosídeos, entrou recentemente em
ensaio clínico de fase 3 e foi demonstrado que a plazomicina reduziu significativamente
a taxa de mortalidade em doentes com pneumonias associadas à ventilação e a
pneumonias adquiridas nos hospitais por Enterobacterales resistentes aos
carbapenemos. Em comparação com a utilização de colistina, a taxa de mortalidade foi
de 11,4% no grupo tratado com palzomicina, enquanto que com a colistina foi de 40%.
Em infeções do trato urinário, a plazomicina tem a mesma eficácia quando é utilizado o
ertapenem (91).
Ainda é discutível quais os antibióticos mais apropriados para tratar Enterobacterales
resistentes aos carbapenemos. A terapia combinada é preferida à monoterapia na
maioria dos estudos devido ao seu amplo espectro, pois exerce um efeito sinérgico e
impede o desenvolvimento de novas resistências (92,93).
Em doentes gravemente doentes com diferentes comorbilidades, uma combinação de
dois ou mais antibióticos é preferida. Um dos melhores tratamentos até agora tem sido a
combinação de meropenem, tigeciclina e colistina. Uma segunda opção pode ser a
terapia combinada com tigeciclina, gentamicina e meropenem.
Em doentes com doença moderada, recomenda-se administrar tigeciclina e gentamicina.
Se a CMI do meropenem é inferior a 8 μg/mL, é aconselhável mudar para uma terapia
combinada contendo um carbapenemo. No caso de resistência à colistina, uma
combinação de dois carbapenemos pode ser usada (por exemplo, ertapenem com
meropenem) além das combinações mostradas no algoritmo da Figura 17 (94).
Figura 17 - Algoritmo sugerido para escolha de antibiótico em paciente com
bacteremia de Enterobacterales resistente a carbapenêmicos. Fonte: Alhashem, F. et
al., 2017.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
118
Muitos antibióticos promissores estão atualmente sob investigação e serão necessários
mais estudos para perceber o papel destes novos antibióticos no tratamento de infeções
por bactérias resistentes a carbapenemos. O tratamento ideal ainda precisa ser
determinado para vencer a batalha contra as resistências.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
119
8. Prevenção e perspetivas futuras
As infeções associadas a cuidados de saúde e o aumento da resistência das bactérias aos
antibióticos são problemas de elevada importância à escala mundial. Nenhuma ins-
tituição prestadora de cuidados de saúde e nenhum país pode ignorar as implicações
destas infeções e o seu impacto nos doentes, nas unidades de saúde e na comunidade.
Estas infeções aumentam a morbilidade e a mortalidade, prolongam os internamentos e
aumentam os custos em saúde. Acentuam a pressão seletiva geradora de resistências
pelo maior uso de antimicrobianos, inviabilizam a qualidade dos cuidados e são a
principal ameaça à segurança dos cidadãos (95).
Neste sentido, torna-se essencial a implementação de medidas para o controlo deste tipo
de estirpes e para a sua prevenção.
Numa primeira abordagem é importante que cada serviço de saúde esteja informado
sobre as estirpes resistentes aos carbapenemos isoladas nessa instituição, se existe
evidência de transmissão dentro da mesma e que serviços/enfermarias são mais afetados
(96,97). É essencial o estudo dos doentes e portadores assintomáticos relativamente a
fatores de risco, como dados demográficos, história de hospitalização anterior,
procedimentos invasivos ou doença crónica, terapêutica com antimicrobianos, recurso a
cuidados continuados com elevada incidência de estirpes resistentes aos carbapenemos
ou viagens para países endémicos (97,98).
Os ambientes de assistência médica devem ter um programa de gestão antimicrobiana
formalmente definido para assegurar o uso apropriado de antimicrobianos. Os serviços
de saúde devem ter recomendações específicas de tratamento e profilaxia, com base em
diretrizes nacionais e suscetibilidade microbiana local, para auxiliar na seleção
antimicrobiana empírica (99). Os hospitais/instituições de saúde devem rever os
processos de limpeza e reprocessamento de equipamentos, seguir instruções dos
fabricantes e realizar triagem ou auditoria para garantir a qualidade dos processos. Estes
processos devem ser bem definidos e descritos em procedimentos internos em cada
instituição.
As instalações sanitárias devem estar disponíveis para todos os tipos de doentes.
Quando os doentes são incontinentes ou têm diarreia, podem ser indicadas arrastadeiras
ou cadeiras sanitárias para evitar disseminação de estirpes multirresistentes (100).
A higiene das mãos por parte dos profissionais e dos doentes é a medida mais eficaz,
mais simples e mais económica de prevenir as infeções (101). A adesão das unidades de
saúde à monitorização das práticas de higiene das mãos tem vindo a aumentar de forma
gradual, tendo-se registado em 2016 um aumento desta adesão, sobretudo a nível dos
agrupamentos de centros de saúde e das unidades de cuidados continuados integrados.
A taxa de adesão dos profissionais à higiene das mãos foi de 73% (Figura 18) (102).
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
120
A implementação de uma vigilância ativa através de uma triagem de um exsudado retal
ou cultura de amostras de fezes de possíveis portadores de estirpes produtoras de
carbapenemases, à admissão ou após transferência de outra instituição de saúde, deve
ser recomendada, sobretudo em enfermarias com doentes de alto risco (por exemplo
crianças neutropénicas ou doentes hemato-oncológicos). A sua deteção precoce permite
a tomada atempada de medidas de controlo de infeção, visto que os indivíduos
colonizados se encontram em risco de desenvolver uma infeção e têm o potencial de
disseminar estas estirpes (103). Em doentes com dispositivos médicos devem ser
efectuadas amostras do local onde este se encontra implantado para análise
microbiológica (104).
Os gestores de saúde devem garantir que a ocupação da enfermaria não exceda a
capacidade para a qual foi projetada e garantir que as recomendações de construção e
prevenção de infeção são seguidas (105).
Os serviços de saúde devem ter acesso a laboratórios de microbiologia com capacidade
para detetar estirpes produtoras de carbapenemases e ter sistemas implementados para
garantir que os resultados são comunicados pelo laboratório de uma forma atempada aos
profissionais de saúde (100).
Os profissionais de saúde que estejam em contato com utentes portadores de estirpes
produtoras de carbapenemases devem ter formação continuada sobre estas estirpes e
quais os cuidados a ter (100).
Os lares e instituições de cuidados continuados constituem possíveis reservatórios de
estirpes produtoras de carbapenemases, como tal devem ser elaborados estudos de
prevalência e adotadas medidas de prevenção (104).
Figura 18 - Evolução ao longo do tempo da taxa global de adesão à higiene das mãos
nos 5 momentos de 2011 a 2016. Fonte: PPCIRA/DGS. Dados Globais Plataforma das
PBCI, Higiene das Mãos. 2016.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
121
O programa nacional de prevenção e controlo de infeções e das resistências aos
antimicrobianos (PPCIRA) promove a redução das taxas de infeção associadas aos
cuidados de saúde, através da prevenção da sua transmissão, e a criação de condições
para uma redução das resistências aos antimicrobianos, principalmente promovendo o
uso correto destes fármacos. Tem ainda como missão promover ou incentivar e
coordenar a nível nacional, a vigilância epidemiológica de infeções associadas aos
cuidados de saúde, do consumo e das resistências aos antimicrobianos. As metas de
Saúde para 2020 será reduzir o consumo de antibióticos na comunidade, reduzir a taxa
de K. pneumoniae resistente aos carbapenemos e reduzir a prevalência de infeção
adquirida em hospitais e cuidados continuados (Figura 19) (101).
Figura 19 - Metas de Saúde para 2020. Fonte: DGS, Programa de prevenção e
controlo de infeções e de resistência aos antimicrobianos - 2017.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
122
9. Conclusão
A rápida disseminação global de bactérias altamente resistentes, em especial as
resistentes aos carbapenemos, tem evoluído de uma forma descontrolada devido
maioritariamente a uma utilização abusiva dos antibióticos. O que constitui uma ameaça
grave aos doentes pois aumenta a taxa de mortalidade, aumenta os custos do sistema de
saúde e reduz a disponibilidade de terapêuticas alternativas.
A ordem das Enterobacterales é a que apresenta maior impacto epidemiológico,
principalmente a K. pneumoniae. Este tipo de estirpes apresenta vários mecanismos de
resistência, o que torna fundamental a sua deteção, pois permite atuar rapidamente,
decidir o melhor tratamento e implementar medidas de isolamento e prevenção.
Nenhum consenso ainda foi alcançado sobre o método de deteção ideal. Mas devido aos
diferentes mecanismos de resistência entre as carbapenemases podem ser detetadas por
métodos fenotípicos ou moleculares. O uso de dois ou mais métodos de deteção
fenotípica conjugado com métodos moleculares, quando possível, pode melhorar
bastante a deteção de estirpes produtoras de carbapenemases em comparação com o uso
de um único método.
O tratamento mais apropriado para tratar estirpes resistentes aos carbapenemos ainda é
discutível. Na maioria dos estudos defende a terapia combinada em vez da monoterapia,
devido ao seu amplo espectro, pois exerce um efeito sinérgico e impede o
desenvolvimento de novas resistências. Um dos melhores tratamentos até agora tem
sido a combinação de meropenem, colistina e tigeciclina. Uma segunda opção pode ser
a terapia combinada com tigeciclina, gentamicina e meropenem.
Muitos antibióticos estão atualmente sob investigação e serão necessários mais estudos
para perceber os seus mecanismos de acção.
Deve-se promover ações de formação de boas práticas de prevenção e controlo de
infeções, nomeadamente formação dos profissionais de saúde, triagem ativa de doentes
“de risco” na admissão hospitalar, assim como a higiene das mãos que se torna a medida
verdadeiramente mais importante para a prevenção da transmissão de bactérias em
hospitais e instituições de saúde.
É essencial sensibilizar as pessoas de modo a usarem os antibióticos apenas quando
necessário, evitar a sua eliminação para o ambiente e restringir a sua utilização na
pecuária.
A diversidade de uso de antibióticos pode levar à diminuição da taxa de resistências, as
quaisconstituem um grande desafio, mas certamente serão superadas com o uso racional
de antibióticos e com a implementação correta de medidas de prevenção.
Dos casos clínicos apresentados neste estudo conclui-se que os factores de risco
nomeadamente: colonização com estirpes multiressistentes; pressão seletiva exercida
pelos antibióticos; transmissão horizontal de genes de resistência por elementos
genéticos móveis (plasmídeos, transposões e integrões) entre diferentes espécies e
géneros bacterianos, assim como a transmissão subsequente dessas bactérias entre
vários hospedeiros e reservatórios ambientais, podem desempenhar um papel importante
na emergência e disseminação da resistência bacteriana aos antibióticos.
O impacto da antibioterapia no tratamento de bactérias produtoras de carbapenemases
123
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