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CURRENT ISSUES Abril 2003 volume 3 número 1 Fundamentos Teóricos de Metas de Inflação Luiz Nelson Porto Araujo O Brasil, como outros países – desenvolvidos e em desenvolvimento – adota um regime monetário baseado na definição, ex-ante, de uma trajetória para a taxa de inflação. A operacionalização deste regime tem as seguintes características: i) anúncio da meta, ii) escolha entre o nível de preços ou a taxa de inflação, iii) horizonte da meta, iv) nível da meta, v) largura da banda da meta, vi) precisão da taxa de inflação, vii) modelo econo- métrico utilizado para as projeções e viii) transparência e accountability da autoridade monetária. Dentro das recentes modificações da política econômica no Brasil, o Banco Central do Brasil - BACEN anunciou, em 1999, a sua disposição em adotar uma política monetária baseada na definição ex-ante de uma traje- tória para a taxa de inflação. Esta trajetória irá condicionar os instrumentos de política monetária a serem utilizados pelo BACEN. 1 A decisão que fundamentou essa disposição decorre diretamente da percepção das auto- ridades econômicas de que uma baixa e es- tável taxa inflacionária deve ser buscada como condição sine qua non para a reto- mada do processo de desenvolvimento sus- tentado do país. Neste sentido, ela reafirma 1. A literatura sobre este tema é bastante extensa. Ver, por exemplo, Debelle (1997), Fischer (1993), a proposição de que a complicada experiên- cia de transição do regime do padrão-ouro para a administração discricionária de papel- moeda não conversível levou à crença, quase geral, de que a estabilidade dos preços é o mais importante objetivo da política monetá- ria. A adoção de metas de inflação (inflation targeting) é uma indicação explícita desta crença. Em teoria, uma meta de inflação pode ser definida sem maiores dificuldades. O Banco Central faz previsões sobre a trajetória da in- flação; essas previsões são comparadas com a meta; a diferença entre a previsão e a meta McCallum (1998), Rudebusch et al. (1998) e Svens- son (1998).

2003 - Delta - Fundamentos Teóricos de Metas de Inflação

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O Brasil adota um regime monetário baseado em metas de inflação. Este regime tem as seguintes características: i) anúncio da meta, ii) escolha entre o nível de preços ou a taxa de inflação, iii) horizonte da meta, iv) nível da meta, v) largura da banda, vi) precisão da taxa de inflação, vii) modelo econométrico utilizado para as projeções e viii) transparência e accountability da autoridade monetária.

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CURRENT ISSUES

Abril 2003 volume 3 número 1

Fundamentos Teóricos de Metas de Inflação Luiz Nelson Porto Araujo

O Brasil, como outros países – desenvolvidos e em desenvolvimento – adota um regime

monetário baseado na definição, ex-ante, de uma trajetória para a taxa de inflação. A

operacionalização deste regime tem as seguintes características: i) anúncio da meta, ii)

escolha entre o nível de preços ou a taxa de inflação, iii) horizonte da meta, iv) nível da

meta, v) largura da banda da meta, vi) precisão da taxa de inflação, vii) modelo econo-

métrico utilizado para as projeções e viii) transparência e accountability da autoridade

monetária.

Dentro das recentes modificações da política

econômica no Brasil, o Banco Central do

Brasil - BACEN anunciou, em 1999, a sua

disposição em adotar uma política monetária

baseada na definição ex-ante de uma traje-

tória para a taxa de inflação. Esta trajetória

irá condicionar os instrumentos de política

monetária a serem utilizados pelo BACEN.1

A decisão que fundamentou essa disposição

decorre diretamente da percepção das auto-

ridades econômicas de que uma baixa e es-

tável taxa inflacionária deve ser buscada

como condição sine qua non para a reto-

mada do processo de desenvolvimento sus-

tentado do país. Neste sentido, ela reafirma

1. A literatura sobre este tema é bastante extensa.

Ver, por exemplo, Debelle (1997), Fischer (1993),

a proposição de que a complicada experiên-

cia de transição do regime do padrão-ouro

para a administração discricionária de papel-

moeda não conversível levou à crença, quase

geral, de que a estabilidade dos preços é o

mais importante objetivo da política monetá-

ria. A adoção de metas de inflação (inflation

targeting) é uma indicação explícita desta

crença.

Em teoria, uma meta de inflação pode ser

definida sem maiores dificuldades. O Banco

Central faz previsões sobre a trajetória da in-

flação; essas previsões são comparadas com

a meta; a diferença entre a previsão e a meta

McCallum (1998), Rudebusch et al. (1998) e Svens-

son (1998).

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define os ajustes necessários nos instrumen-

tos de política monetária. Na prática, essas

metas foram inicialmente introduzidas como

âncora para a política monetária da Nova Ze-

lândia, em março de 1990, e do Canadá, em

fevereiro de 1991. No entanto, foi apenas

nos últimos cinco anos que inúmeros outros

países basearam as suas respectivas políti-

cas monetárias em metas inflacionárias.

Desde então, o estudo e a avaliação destas

políticas cresceu exponencialmente, ao

ponto do FMI estar recomendando a sua

adoção.

Fundamentos Teóricos

Trade-Off entre Inflação e Desemprego:

A Curva de Phillips

Em geral, a análise de políticas monetárias

baseadas em metas de inflação resgata dis-

cussões anteriores sobre o trade-off entre in-

flação e desemprego (ou produção). Na ver-

dade, pode-se mesmo dizer que a existência

de um trade-off de curto prazo entre estas

variáveis é fundamental nas decisões dos

formuladores da política monetária.

A discussão econômica sobre a existência de

um trade-off entre inflação e desemprego

pode ser analisada ao longo de três períodos

consecutivos. O primeiro iniciou-se com o ar-

tigo de Phillips (1958) sobre o comporta-

mento das taxas de desemprego e os salá-

rios nominais na Inglaterra. O segundo perí-

odo teve como marco fundamental a formu-

lação da hipótese da taxa natural de desem-

prego por Friedman (1968) e Phelps (1967).

O último período está associado com a intro-

dução da hipótese de expectativas racionais

2. Phillips encontrou diversos loops entre estas va-

riáveis e não uma relação linear estável.

3. Ou, então, assumiram expectativas estáticas.

e a aceitação, quase generalizada, de que

não existe um trade-off que possa ser explo-

rado pela autoridade econômica.

Apesar da investigação inicial de Fischer

(1926) da relação negativa entre inflação e

desemprego, foi somente após a publicação

do estudo de Phillips (1958) que ela ganhou

relevância nos círculos acadêmicos e políti-

cos. A principal observação de Phillips foi a

existência de uma correlação inversa signifi-

cativa entre as taxas de desemprego e de va-

riação do salário nominal na Inglaterra. O pe-

ríodo analisado por Phillips compreendeu

quase um século e, portanto, não deveria

causar surpresa o fato de que os resultados

aparentemente indicavam um trade-off, no

qual os benefícios de uma menor inflação se-

riam contrapostos em termos de uma maior

taxa de variação do salário nominal, que po-

deria ser explorado pelo governo.2

O segundo período inicia-se com a formula-

ção da hipótese da taxa natural de desem-

prego por Friedman (1968) e Phelps (1967)

e com os primeiros estudos sobre os funda-

mentos microeconômicos da macroecono-

mia. Ao contrário de Phillips (e posterior-

mente Lipsey (1960)), que não levaram em

consideração o papel das expectativas dos

agentes e encontraram uma relação aparen-

temente estável,3

Friedman e Phelps questi-

onaram exatamente esta suposta estabili-

dade sob condições de mudanças nas ex-

pectativas.4

A discussão dos loops encontrados por Phil-

lips sugere que o trade-off de curto prazo di-

fere daquele de longo prazo. A distinção en-

tre ambos forma a base da Natural Rate

Hypothesis (NRH) de Friedman (1968) e

4. Em termos mais gerais, a crítica destes autores

chamou atenção para o processo de formação das ex-

pectativas, que seria ainda mais relevante nas análises

de Lucas e Sargent sobre a curva de Phillips.

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DELTA ECONOMICS & FINANCE 3

Phelps (1971): apesar de existir um trade-off

no curto prazo, existe também uma taxa na-

tural de desemprego no longo prazo, taxa

essa independente da taxa de inflação no es-

tado estacionário. A implicação da NRH é

que a curva de Phillips no longo prazo é ver-

tical, ou seja, o trade-off é nulo; este

trade-off só existe no curto prazo.

A proposição fundamental é que o trade-off

de curto prazo resulta de erros de expectativa

por parte dos agentes econômicos, ou seja,

são esses erros que permitem à taxa de de-

semprego diferir da taxa natural. Friedman e

Phelps argumentam contra a suposição de

que é possível enganar todos os trabalhado-

res e firmas o tempo todo. Tanto os trabalha-

dores quanto as firmas barganham por salá-

rios reais e, dessa forma, a taxa natural de

desemprego é independente da taxa de in-

flação antecipada.

A existência de um trade-off de curto prazo

decorrente de erros de expectativa não im-

pede, por si só, qualquer efeito da política

monetária sobre o produto, desde que as au-

toridades monetárias sejam capazes de gerar

uma taxa de inflação que não seja anteci-

pada. Na verdade, o uso de expectativas

adaptadas sugere que uma aceleração da

taxa de inflação seria capaz de manter a taxa

de desemprego abaixo da taxa natural. Este

corolário da NRH, conhecido como a versão

aceleracionista da curva de Phillips, foi suge-

rido por Friedman mas foi Phelps quem o de-

monstrou rigorosamente: se um aumento da

taxa de inflação somente reduz a taxa de de-

semprego de forma temporária, então, a

única forma de se manter essa taxa perma-

nentemente abaixo da taxa natural é por

5. Ou seja, as expectativas inflacionárias são ajus-

tadas de acordo com o hiato entre a inflação observada

e a esperada.

meio de um aumento contínuo, a taxas cres-

centes, da inflação, ou seja, acelerando-se a

taxa de inflação.

O terceiro período de análise da curva de

Phillips iniciou-se a partir da percepção de

que, na formulação de Friedman-Phelps, a

diferença entre a curva de curto prazo e a de

longo prazo é uma consequência lógica da

suposição de que as expectativas são forma-

das de acordo com esquemas adaptativos.5

O problema é que a hipótese de expectativas

adaptadas implica, primeiro, que os agentes

cometem erros sistemáticos de previsão (as

expectativas são viesadas) e, segundo, que

o conjunto de informação utilizado pelos

agentes é incompleto, na medida em que só

compreende valores passados dos preços;

em outras palavras, novas informações são

desperdiçadas. Neste período, foi introduzida

a hipótese de expectativas racionais, que

destruiu até mesmo o trade-off da curva de

Phillips de curto prazo.

Na formulação de Robert Lucas, e outros,

uma política monetária previsível não tem

qualquer efeito sobre o nível do produto, na

medida em que o setor privado leva em con-

sideração esta política e ajusta as suas ex-

pectativas de acordo, e, portanto, não existe

a possibilidade de um hiato sistemático entre

a taxa de inflação observada e a esperada. É

importante ressaltar que um modelo com ex-

pectativas racionais também explicita uma

curva de Phillips. No entanto, há uma dife-

rença fundamental deste caso em relação à

formulação de Friedman-Phelps: desvios sis-

temáticos entre a taxa de inflação observada

e a esperada não podem derivar de mudan-

ças na oferta de moeda destinadas a alterar

a taxa de desemprego. Se a taxa de cresci-

mento da oferta de moeda aumenta, e os

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agentes sabem disto, então eles irão rever

suas expectativas de inflação. Em conse-

quência, a curva de Phillips desloca-se. As-

sim que o trade-off é explorado por qualquer

política econômica sistemática ele desapa-

rece, ou seja, no caso das expectativas se-

rem racionais até mesmo a curva de curto

prazo é instável.

Custo da Estabilização

Uma das questões mais controversas na lite-

ratura econômica teórica e empírica refere-

se ao custo de bem-estar da estabilização.6

Suponha que em um certo instante o go-

verno tenha por objetivo reduzir a variabili-

dade de um conjunto de variáveis macroeco-

nômicas.7

A pergunta, aparentemente sim-

ples, que se coloca é a seguinte: qual o custo

de se adotar uma política de estabilização?

A simplicidade da pergunta esconde a volu-

mosa controvérsia sobre eventuais respos-

tas, controvérsia esta decorrente, em grande

parte, da inexistência de modelos comu-

mente aceitos que, em última instância, per-

mitam a quantificação destes custos.

Hall (1982) editou os resultados do Projeto

sobre Inflação do National Bureau of Econo-

mic Research. A preocupação fundamental

era diagnosticar as causas da inflação e des-

crever os seus efeitos.8

Os estudos de Gor-

don (1982) e Sargent (1982), então relata-

dos, apresentam um forte contraste. Apesar

de ambos terem analisado episódios históri-

cos sobre o término da inflação chegaram a

6. Em geral, este custo é medido em termos dos

níveis de produção e de emprego.

7. A razão e a determinação endógena do instante

de tal decisão são irrelevantes para os fins da discus-

são a seguir, apesar de fundamentais na adoção prá-

tica de políticas de estabilização.

8 O Projeto não teve como foco a recomendação

de políticas específicas para o término da inflação.

conclusões dramaticamente distintas à per-

gunta: o que aconteceria com a produção e

o emprego se a inflação fosse eliminada?

Gordon (1982) analisou 14 episódios (Ale-

manha, Brasil, Estados Unidos, França, Is-

rael, Itália, Japão e Suiça), sendo seis ape-

nas nos Estados Unidos, e concluiu que o

término da inflação pode impactar negativa-

mente a produção e o emprego. No entanto,

os seus resultados não são unânimes, ou

seja, nem sempre o término da inflação tem

efeitos adversos sobre o emprego.9

Sua aná-

lise concentrou-se na velocidade e extensão

da resposta da taxa de inflação a mudanças

temporárias e permanentes na taxa de cres-

cimento do produto nominal.

Sargent (1982) estudou o final de quatro hi-

perinflações (Alemanha, Áustria, Hungria e

Polônia) no período entre as duas Grandes

Guerras e concluiu que a passagem de um

período de instabilidade para um de estabili-

dade foi imediata, e que os custos da esta-

bilização em termos de emprego foram insig-

nificantes. Ele mostrou que reformas fiscais

do tipo once-and-for-all foram fundamentais

para o controle da inflação em cada dos qua-

tro episódios. A evidência coletada por ele

sugere que as características comuns de

cada um dos países foram: i) a natureza do

regime fiscal durante cada uma das hiperin-

flações. Cada um dos países apresentou dé-

ficits públicos persistentes e gigantescos; ii)

a natureza das medidas fiscais e monetárias,

compreensivas e drásticas, que foram adota-

das para terminar as hiperinflações; iii) a

imediação com a qual o nível de preços e a

9. Gordon relata que o término da inflação nos Es-

tados Unidos após a Primeira Grande Guerra foi acom-

panhado de uma recessão bastante suave. A Alema-

nha também teve sucesso com políticas de combate à

inflação ao longo dos anos 70. Também a França e a

Itália, em meados dos anos 60, e o Japão, ao final dos

anos 70, conseguiram controlar a inflação sem uma

recessão profunda.

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taxa de câmbio foram estabilizados e iv) o rá-

pido crescimento da base monetária nos me-

ses e anos que sucederam ao término da in-

flação.

Recentemente, Lucas (1987) sugeriu um

modelo teórico que, apesar de simples,

busca responder à pergunta central. A partir

de dados para a economia Americana, no

período pós Segunda Guerra Mundial, ele es-

tima os parâmetros do modelo e, então, in-

daga quanto um agente representativo esta-

ria disposto a pagar em termos do seu nível

de consumo, em cada período, para obter: i)

um aumento na taxa de crescimento do con-

sumo e ii) uma redução na variabilidade do

componente cíclico em relação à tendência.

Apesar da primeira indagação envolver valo-

res substanciais, no caso da segunda eles

são inesperadamente pequenos. A conclu-

são de Lucas é que o ganho de bem estar

derivado de uma redução da variabilidade do

consumo agregado através de políticas de

estabilização é, provavelmente, insignifi-

cante. Em outras palavras, no período anali-

sado o ciclo econômico não é importante do

ponto de vista do bem estar social.10

Regras para a Política Monetária

Em geral, aceita-se que regras de política

monetária convencionais baseadas em me-

tas intermediárias, como o crescimento da

moeda ou do crédito, fundamentam-se na

premissa de que as relações que ajustam es-

ses variáveis à indicadores relevantes do se-

tor não-financeiro, como renda e preços, são

robustas. Quando os mercados financeiros

se alteram e perturbam essas relações, as

regras baseadas em metas intermediárias

não são mais capazes de fornecer um refe-

rencial útil para a condução da política mo-

10. Mais ainda, os benefícios marginais de se desen-

volver tal teoria são potencialmente insignificantes.

netária. Nestas circunstâncias, o banco cen-

tral pode, ao invés, se valer de variáveis

como a moeda e o crédito como variáveis-

informação. Isso irá exigir, inevitavelmente,

julgamentos caso-a-caso. Quanto maior for o

impacto das alterações nos mercados finan-

ceiros, maior será a necessidade do banco

central valer-se de outras informações, ex-

tensamente, no sentido de tirar proveito de

fontes múltiplas e diversas de informações

ao invés de uma única variável, e intensa-

mente, no sentido de permitir menos tempo

entre as decisões de política.

Instituições e Política Monetária

Romer e Romer (1997) demonstram que os

deficiências da política monetária derivam

não apenas de inconsistência dinâmica mas,

mais importante, de uma compreensão im-

perfeita da economia e dos efeitos da polí-

tica. Utilizando-se de episódios históricos e

recentes para os Estados Unidos e outros pa-

íses, eles demonstram que o conhecimento

parcial dos economistas, formuladores de

política, líderes políticos e dos eleitores têm

sido uma fonte importante de deficiências da

política monetária. Estes autores analisam

quais as instituições da política monetária

poderiam tratar os problemas da inconsis-

tência dinâmica do conhecimento limitado e

sugerem que um conjunto de instituições

que poderia realizar este feito é um banco

central significativamente independente com

discrição sobre os objetivos e a conduta da

política, combinado com uma estrutura em

dois níveis onde os líderes eleitos indicaram

um conselho de trustees para o banco cen-

tral o qual, por sua vez, escolhem os formu-

ladores da política. Finalmente, Romer e Ro-

mer também discutem reformas e propostas

de reformas da política monetária e das ins-

tituições em países industrializados.

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Coordenação das Políticas Monetária e

Fiscal

Um dos principais problemas macroeconômi-

cos é a coordenação das políticas monetária

e fiscal.

Banco Central

Os primeiros bancos centrais foram instituí-

dos com o propósito de financiar o governo e

contribuir para o desenvolvimento do sistema

financeiro. Ao longo do século XIX eles pas-

saram a ter como atribuição primária prote-

ger a estabilidade do sistema financeiro e o

valor externo da moeda. Ao longo das déca-

das de 30 e 40, no período inicial da revolu-

ção keynesiana, as atribuições conferidas

aos bancos centrais, geralmente, incluíam a

estabilidade monetária e a promoção do

pleno emprego. A partir de meados dos anos

60, com o fortalecimento das pressões infla-

cionárias que acabaram por destruir o sis-

tema de Bretton Woods, o foco da política

monetária foi redefinido como a manutenção

do valor doméstico da moeda. Atualmente,

os bancos centrais exercem inúmeras atri-

buições, dentre elas:

a administração da oferta de moeda e

de crédito e determinação das taxas de

juros, através do controle da base mo-

netária; o controle, exclusivo ou compar-

tilhado, da taxa de câmbio e das reser-

vas internacionais;

o depósito das reservas compulsórias e

voluntárias dos bancos comerciais;

a responsabilidade pela promoção da

estabilidade do sistema financeiro, atra-

vés da supervisão do sistema, da sua

atuação como emprestador de última

instância e, em alguns casos, da gestão

do seguro depósito;

a atuação como banco do tesouro e, em

alguns casos, a administração total ou

parcial da dívida pública.

De todas essas, a administração da oferta de

moeda e de crédito - a política monetária - é

fundamental, ao conferir ao banco central

um poder enorme, particularmente nas situ-

ações em que a independência do banco é

tal que ele também fixa as taxas de juros.

Na prática, a experiência internacional mos-

tra uma grande disparidade na fixação dos

objetivos do Banco Central. Na Alemanha,

por exemplo, o Bundesbank deve conduzir a

política monetária com o objetivo de preser-

var a moeda. Além disso, ele também deve

apoiar a política econômica do governo fede-

ral, mas apenas na medida em que seja con-

sistente com o seu objetivo primordial de

preservar a moeda. Na França, a lei confere

ao Banque de France a tarefa de assegurar

a estabilidade dos preços, no contexto da po-

lítica econômica do governo. Esse mandato

é similar àquele do Bundesbank, exceto a

provisão de que o mandato para a estabili-

dade dos preços sobrepõe a obrigação de

apoiar a política econômica do governo.

Por sua vez, na Inglaterra, o Bank of England

Act de 1946 não estabeleceu nenhum obje-

tivo específico. No caso da Nova Zelândia, o

Reserve Bank of New Zeland Act de 1989

determinou que "the primary function of the

Bank is to formulate and implement mone-

tary policy directed to the economic objective

of achieving and maintaining stability in the

general level of prices."

Nos Estados Unidos, o Federal Reserve deve

"maintain long-run growth of the monetary

and credit aggregates commensurate with

the economy's long run potential to increase

production, so as to promote effectively the

goals of maximum employment, stable

prices, and moderate long-term interest

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rates".11

Por último, vale a pena ressaltar que

no âmbito da EMU foi definido The European

System of Central Banks (ESCB), formado

pelo European Central Bank e os bancos

centrais dos países membros da EMU. O Ar-

ticle 105(1) do Tratado de Maastricht es-

tabeleceu que "the primary objective of the

ESCB shall be to maintain price stability.

Without prejudice to the objective of price

stability, the ESCB shall support the general

economic policies in the Community with a

view to contributing to the achievement of

the objectives of the Community [...]".

A partir do início dos anos 70, com o colapso

do Sistema de Bretton Woods, a condução

da política monetária foi alterada em diver-

sos países desenvolvidos e emergentes. Essa

alteração contemplou, em particular, os ar-

ranjos institucionais desta política, com a de-

legação de maior independência aos bancos

centrais. O objetivo foi a proteção da autori-

dade monetária de interferências na escolha

dos instrumentos de política monetária e na

busca da estabilidade dos preços. Uma

maior independência da autoridade monetá-

ria significa que ela não precisa comprome-

ter o objetivo de estabilidade dos preços a

favor de outros objetivos conflitantes de curto

prazo, como o equilíbrio do balanço de paga-

mentos e das contas públicas.

Meta de Inflação como um Arcabouço

para a Política Monetária

Dentre os diversos motivos encontrados na

literatura econômica para a adoção de metas

de inflação, dois são particularmente rele-

vantes: i) uma nova ênfase na estabilidade

dos preços como o objetivo fundamental da

política monetária; e ii) proposições teóricas

que argumentam que um comprometimento

11. Este é o objetivo da política monetária definida

no Humphrey-Hawkings Act de 1978.

crível a um objetivo de inflação - por exem-

plo, uma meta - pode eliminar o potencial

viés inflacionário da política monetária.

O objetivo fundamental da política monetária

em um regime de meta inflacionária é o cum-

primento da meta fixada. Neste sentido,

qualquer outro objetivo só pode ser procu-

rado se não for inconsistente com a meta.

Os principais casos usualmente discutidos

na literatura envolvem: i) meta e taxa de

câmbio; ii) meta e pleno emprego e iii) meta

e estabilidade financeira.

Um regime de meta inflacionária não é con-

sistente com um regime de câmbio fixo.12

Dado que a política monetária é endógena

sob um regime de câmbio fixo, geralmente

não é possível fixar como meta (no médio

prazo) uma taxa de inflação, ao contrário do

caso de um país onde a moeda local é atre-

lada à uma outra. Da mesma maneira, um

objetivo de pleno emprego não é, em geral,

inconsistente com uma meta de inflação. O

problema, neste caso, é que a assunção da

existência de um trade-off entre inflação e

emprego pode induzir a autoridade monetá-

ria a incluir na sua função objetivo o nível de

produção (ou de emprego) e, em consequên-

cia, influir na política monetária ótima. O

mesmo acontece com um regime de meta

inflacionária e um objetivo de estabilidade fi-

nanceira (geralmente buscado por bancos

centrais): não são necessariamente incom-

patíveis, apesar de um sistema bancário frá-

gil poder comprometer a grau de flexibilidade

da taxa de juros.

Por último, é importante também ressaltar a

interação entre os objetivos das políticas mo-

netária e fiscal em um regime de meta infla-

12. Na verdade, muitos países que adotaram um re-

gime de metas inflacionárias o fizeram para substituir

um regime de câmbio fixo.

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cionária. Operacionalmente, a política mone-

tária deve levar em consideração o efeito da

política fiscal sobre a previsão para a infla-

ção. Por outro lado, a política fiscal também

deve, em geral, dar apoio à meta de inflação.

Um estoque excessivo da dívida pública pode

gerar expectativas de inflações futuras que,

por sua vez, por tornar mais difícil ao banco

central o cumprimento da meta no curto

prazo. Por sua vez, uma taxa de juros mais

elevada também pode aumentar o serviço da

dívida pública, aumentando o estoque já

existente, resultando em um círculo vicioso

de maior taxa de juros e maior dívida.13

Operacionalização de um Regime

de Metas de Inflação

Anúncio da Meta

A indicação da autoridade responsável pela

meta inflacionária está correlacionado com a

independência do banco central. Esta inde-

pendência não precisa estar relacionada

com a liberdade para a escolha de seus pró-

prios objetivos. Na verdade, argumenta-se

mesmo que pode ser mais apropriado para o

banco central ser dependente, no que diz

respeito aos objetivos (no sentido de que es-

13. Aparentemente isto ocorreu nos estágios iniciais

do regime de metas no Canadá e na Nova Zelândia.

Em ambos os casos, o novo regime foi introduzido

quando o estoque da dívida pública era bastante alto

(mais de 60% e de 50%, ao final dos anos 80, respec-

tivamente). O endividamento existente pode ter au-

mentado o custo do processo desinflacionário em am-

bos os casos, ao minar a credibilidade do esforço de-

sinflacionário, resultando em apertos monetários.

14. O arcabouço atualmente vigente na Nova Zelân-

dia enfatiza a distinção entre independência de objeti-

vos e de instrumentos. Neste país, o Reserve Bank of

New Zeland Act, aprovado em 1989, estabeleceu que

um Policy Target Agreement deve ser pactuado entre o

Governador do Bank e o ministro da Fazenda. Este

acordo define a implementação na prática do objetivo

tes são definidos no seu estatuto ou pelo go-

verno), mas ser independente no tocante à

escolha dos instrumentos, ou seja, não ter

restrições na operacionalização da política

monetária necessária para se atingir os obje-

tivos.14

O divulgador da meta varia entre os países

Em alguns casos (Austrália, Finlândia e Sué-

cia), a meta foi primeiramente divulgada pelo

banco central, sem qualquer apoio explícito

pelo governo. Em outros (Canadá e Nova Ze-

lândia), a meta resultou de acordos conjun-

tos entre o ministro da Fazenda e o Governa-

dor do banco central. Nos casos onde a meta

foi originalmente anunciada pelo banco cen-

tral, na maioria dos casos ela foi subsequen-

temente apoiada pelo governo.15

Uma meta de inflação não é explicitada em

nenhum dos estatutos dos principais bancos

centrais do mundo. Ao contrário, os bancos

centrais que adotam metas justificam-na

como uma interpretação operacional do ob-

jetivo último a ser buscado, qual seja, a es-

tabilidade da moeda. Dado o trade-off de

curto prazo corporificado na Curva de Phillips

de curto prazo, aqueles bancos centrais cu-

jos objetivos incluem o pleno emprego e pe-

quena inflação podem ser vistos como arbi-

trando em favor de um ou outro objetivo.

primário do Bank, qual seja, a estabilidade dos preços.

O conteúdo do acordo é negociado entre o governo e

o Bank e é assinado ao início do mandato de cada Go-

vernador do Bank e permanece em vigor durante o

mandato (de cinco anos); o cumprimento da meta in-

flacionária é o mais importante critério de performance

do contrato de emprego do Governador. O acordo pode

ser anulado para períodos de seis meses, mas a anu-

lação deve ser tornar pública. Este estrutura é seme-

lhante ao incentive-compatible contracts referidos na

literatura sobre a independência do Banco Central.

15. Na Austrália, um comunicado conjunto foi feito

em 1996 pelo novo Governador do Banco Central e

pelo Tesouro, formalmente apoiando o arcabouço de

metas inflacionárias. O governo anterior havia apoiado

o arcabouço em inúmeras outras oportunidades.

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Neste sentido, como observado por Debelle

(1997) "[...] central banks have stressed that

there is no long run trade-off between output

and inflation and that the best way that the

central bank can assist the achievement of

higher growth in the long run is to maintain a

low inflation rate".

Nível de Preços ou Taxa de Inflação

Uma discussão fundamental em um regime

de metas de inflação refere-se à escolha en-

tre uma meta para o nível de preços ou uma

para a taxa de inflação. Os argumentos teó-

ricos a favor do primeiro são os mais aceitos,

o que levou à adoção, na prática deste tipo

de meta. O problema seguinte que se coloca

refere-se à escolha do índice de preços utili-

zado para a fixação da meta.16

Em geral, a prática tem sido especificar a

meta em termos do IPC, ou alguma variante,

ao invés do deflator implícito do PIB, apesar

desse último ser muito mais amplo, por dois

motivos básicos. Primeiro, o IPC é o índice

mais conhecido do público em geral e, se-

gundo, por estar disponível tempestivamente

e não estar sujeito a revisões.

Diversos países usam uma medida da infla-

ção subjacente (underlying) baseada no IPC,

ao invés daquele publicado, ou headline IPC.

O motivo de se utilizar uma taxa de inflação

subjacente é excluir da taxa de inflação de-

terminantes não-monetários. Na prática, a

mensuração da inflação subjacente (core)

exclui os efeitos de primeira ordem de cho-

ques específicos (e que são, portanto, aco-

modados pela política monetária), mas não

os efeitos de segunda ordem desses cho-

ques sobre preços e salários (e que são re-

vertidos por um aperto da política monetá-

ria).

16. Sabe-se que esta escolha reflete as metodolo-

gias alternativas para se mensurar o Índice de Preço

Em muitos países a principal diferença entre

o IPC e a inflação subjacente é que esta úl-

tima exclui o pagamento de juros hipotecá-

rios. O motivo é que se o banco central res-

ponde a um aumento acima da metade da

taxa de inflação esperada elevando as taxas

de juros de curto prazo, a inflação medida

pelo IPC irá aumentar ainda mais com o au-

mento das taxas hipotecárias. O componente

do IPC afetado pela variação no custo das

hipotecas pode ser facilmente identificado,

além do que a taxa expurgada deste custo é

frequentemente publicada pelas agências

responsáveis pela apuração da inflação. Em

outros países, incluindo os Estados Unidos,

este problema é evitado tratando-se os juros

no IPC de maneira diferente.

A adoção de metas de inflação pelos bancos

centrais torna ainda mais importante a esti-

mativa acurada e confiável de variações em

índices agregados de preços. Essa estimativa

é bastante difícil, na medida em que a esti-

mativa do IPC apresenta ruídos transitórios e

viés. O primeiro faz com que mudanças de

curto prazo na inflação reflitam inadequada-

mente movimentos de longo prazo, enquanto

que o viés faz com que a inflação média de

longo prazo seja muito elevada.

Horizonte da Meta

A experiência internacional sugere que o ho-

rizonte da meta de inflação depende, parci-

almente, da taxa de inflação no momento da

adoção da meta. Nos países onde a taxa ini-

cial diferia daquela estabelecida na meta, o

período de implementação foi de aproxima-

damente dois anos, dados os hiatos dos efei-

tos da política monetária sobre a inflação.

Naqueles países onde a inflação já era baixa,

as metas foram adotadas imediatamente e

por prazo indefinido. O horizonte da meta

ao Consumidor (IPC) entre os países e a sensibilidade

relativa do IPC a choques de oferta.

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também reflete a capacidade da política mo-

netária compensar desvios de choques de

curto prazo.

Nível da Meta

Para muitos países o ponto médio da meta

de inflação reflete, em geral, a respectiva de-

finição operacional de estabilidade dos pre-

ços. Do ponto de vista teórico, uma inflação

pode ser vista como equivalente à estabili-

dade dos preços mas, na prática, o conceito

de estabilidade é impactado por questões

como medição e rigidezes nominais.

O viés no cálculo do índice de preços ao con-

sumidor implica que, na prática, a estabili-

dade dos preços, muito provavelmente, es-

tará associada à uma inflação positiva no IPC

do que à uma inflação zero. Esse viés resulta

da introdução de novos bens, viés de substi-

tuição, viés de qualidade e aqueles causados

por ajustes pelos consumidores devido a mu-

danças em preços relativos entre as redefini-

ções periódicas na cesta básica de consumo.

Esses problemas são endêmicos ao cálculo

de índices de preços e, geralmente, não po-

dem ser remediados pela agência responsá-

vel pelo cálculo.

Outros argumentos também foram propostos

para justificar uma meta de inflação maior do

que zero. Primeiro, a possibilidade de rigidez

para baixo nos preços e salários implica em

que uma inflação positiva baixa permite o

ajuste necessário dos preços relativos. Se-

gundo, na medida em que o limite inferior

das taxas nominais de juros é zero, uma

meta de inflação de zero implica em que a

possibilidade de taxas de juros reais negati-

vas é eliminada (o que pode ser necessário

para estimular a recuperação econômica em

uma recessão). Ambos argumentos podem

ter sido motivados pela elevada inflação dos

anos 70 e 80.

Em geral, as metas de inflação estão centra-

das ao redor de uma taxa de 2% ao ano. A

este nível, exista esparsa evidência empírica

de que os benefícios de se buscar uma meta

ainda mais baixa sejam significativos, mas os

custos podem ser relevantes. O benefício

mais importante parece derivar da redução

da incerteza e de uma taxa de inflação mais

estável, independentemente do nível, desde

que seja suficientemente baixo.

Largura da Banda da Meta

Uma diferença importante entre as defini-

ções de metas inflacionárias nos países é a

largura da banda em torno da central target,

ou mesmo se a banda é especificada. Na de-

terminação dessa banda é importante levar

em consideração o fato de que uma banda

estreita pode induzir instabilidade no instru-

mento da política monetária. Para se alcan-

çar um dado movimento na taxa da inflação,

quanto menor o período de tempo, maior a

variação no instrumento da política monetá-

ria. Se a banda é muito estreita, um au-

mento na taxa de juros para coibir o aumento

da inflação acima da banda em um trimestre

pode ser maior do que o necessário para pre-

venir a queda da inflação abaixo da banda no

próximo trimestre. Esses movimentos nas ta-

xas de juros podem desestabilizar os merca-

dos financeiros, mesmo que a meta de infla-

ção continue a ser atendida. Além disso, as

oscilações necessárias nas taxas de juros

para manter a inflação dentro da banda po-

dem ser explosivas ao invés de amortecidas

ao longo do tempo.

Alternativamente, a variação necessária na

taxa de inflação pode ser induzida por mu-

danças na taxa de câmbio. Isso pode permitir

que a meta de inflação seja alcançada mais

facilmente no curto prazo, dependendo da

velocidade do passthrough da taxa de câm-

bio. No entanto, um apoio sistemático na

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taxa de câmbio pode causar conflitos em se

alcançar a meta de inflação no curto e médio

prazo. A variação nas taxas de juros neces-

sárias para induzir o movimento apropriado

na taxa de câmbio no curto prazo, pode cau-

sar um movimento não desejado na de-

manda doméstica e na inflação no médio

prazo. Um problema adicional é que pode

existir um impacto distributivo não desejado

nos setores de bens comerciáveis e não-co-

merciáveis caso muito confiança seja colo-

cada na taxa de câmbio, especialmente se a

fonte de inflação está no setor de bens não-

comerciáveis. A valorização da taxa de câm-

bio, mesmo reduzindo a taxa de inflação dos

bens importados irá reduzir a competitivi-

dade das exportações e do setor substituto

das importações.

Previsão da Taxa de Inflação

Para Debelle (1997) existem diversos crité-

rios que justificam uma previsão de inflação

como o fundamento de um arcabouço de

meta inflacionária. Um arcabouço para pre-

visão satisfatório deve existir. É preciso que

se tenha dados históricos suficientes para se

estimar relações confiáveis. Além disso, es-

sas relações devem ser suficientemente es-

táveis no novo regime. Pode ser difícil para o

banco central acordar sobre o modelo com

base no qual as previsões serão feitas. O

princípio fundamental é que as decisões de

política monetária devem basear-se em uma

projeção para a trajetória futura da inflação

apesar dessa expectativa não precisar estar

baseada em um modelo em particular. Ao

contrário, ela pode resumir informações de

fontes distintas.

No entanto, Debelle (1997) observa que, na

prática, a previsão de inflação de um deter-

minado modelo pode ser apenas um input na

17. Accountability entendida aqui como o dever ou

responsabilidade de prestar contas.

decisão da política monetária. Outras infor-

mações também devem ser utilizadas

mesmo se não puderem ser diretamente in-

corporadas no modelo de previsão da infla-

ção. O apoio em previsões de inflação le-

vanta o problema de erros de previsão, que

também são relevantes na especificação da

banda da meta.

Modelo Econométrico

Uma das principais dificuldades na operacio-

nalização de um regime de metas de inflação

diz respeito à formulação e, posteriormente,

calibração do modelo econométrico para a

economia. O pressuposto é que o banco cen-

tral tenha um modelo para a projeção da tra-

jetória das principais variáveis macroeconô-

micas e que o utilize na estimativa os impac-

tos decorrentes da adoção de determinado

instrumento de política monetária.

Transparência e Accountability

Uma outra questão fundamental associada à

adoção de um regime de metas de inflação

é a transparência e accountability.17

O mo-

tivo é que a atribuição de uma meta de infla-

ção ao banco central define um benchmark

claro e facilmente mensurável que serve para

se avaliar a performance do banco. Qualquer

violação da banda da meta ou desvio signifi-

cante do nível desejado devem requerer uma

explicação detalhada pelo banco central. No

passado, os objetivos do banco central eram

relativamente gerais, implicando em dificul-

dades para se avaliar a sua performance. Os

bancos não podiam ser responsáveis pela

busca de inúmeros, e potencialmente confli-

tantes, objetivos.

Na medida em que exista um hiato relevante

entre os instrumentos de política monetária

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e o objetivo final para a inflação, pode ser

difícil determinar se uma violação da meta foi

causada por erros de política ou devido a

choques fora do controle do banco central.

Um outro problema em usar metas de infla-

ção como medida para a accountability de-

corre dos longos e variáveis hiatos da política

monetária. Os efeitos de qualquer política

não podem ser avaliados em um prazo infe-

rior a um ano, ou talvez mais. Uma maneira

de se contornar esse problema é usar a pre-

visão de inflação como uma medida.

Em geral, os bancos centrais que adotam

metas de inflação são diretamente accoun-

table ao governo. Testemunhos frequentes

ao Parlamento (ou Congresso) e a publica-

ção de relatórios anuais têm sido os princi-

pais mecanismos utilizados por eles para as-

segurar a transparência das metas e a sua

accountability.

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Luiz Nelson Porto Araujo, economista, é sócio-diretor da Delta Economics & Finance. Foi Professor do De-

partamento de Planejamento e Análise Econômica da EAESP-FGV e da FCECA da Universidade Macken-

zie.

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