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Verinotio - Revista On-line de Educaccedilatildeo e Ciecircncias Humanas Nordm 4 Ano II Abril de 2006 periodicidade semestral ndash Ediccedilatildeo Especial Dossiecirc Marx ndash ISSN 1981-061X
DOSSIEcirc MARX ITINERAacuteRIO
DE UM GRUPO DE PESQUISA
Ester Vaisman[1]
Nada mais adequado para apresentar um conjunto de artigos
resultantes de dissertaccedilotildees de mestrado defendidas junto ao Programa de Poacutes-
Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG do que iniciar pela contribuiccedilatildeo do grande
mentor do grupo de pesquisa que ali se organizou J Chasin Morto
prematuramente no final do ano de 1998 deixou infelizmente obra inconclusa
no auge de sua maturidade intelectual
O leitor encontraraacute portanto nessa Apresentaccedilatildeo o fruto de trabalho de
coleta e organizaccedilatildeo de materiais utilizados por Chasin e por seus alunos em
seu uacuteltimo curso no Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia Foram
encontrados em seus arquivos pessoais esquemas e anotaccedilotildees que serviam de
base para exposiccedilotildees em sala de aula mas tambeacutem para seus trabalhos de
pesquisa e para futura redaccedilatildeo de artigos ou mesmo livros
Assim sendo o texto a seguir estaacute redigido em estilo que difere
profundamente daquele que encontramos nos textos publicados pelo autor isso
natildeo significa no entanto que sejam menos rigorosos talvez um tanto menos
precisos e redigidos em linguagem semi-coloquial Aleacutem disso podem-se
observar lacunas analiacuteticas que muito provavelmente seriam preenchidas ao
longo do processo de reflexatildeo e pesquisa que com certeza teria resultado em
obra claacutessica e decisiva entre os inteacuterpretes de Marx e para a histoacuteria da filosofia
em geral natildeo fora sua suacutebita e traacutegica interrupccedilatildeo
1
Em seus uacuteltimos cursos sobre o tema Chasin insistia em afirmar que a
despeito da valiosa colaboraccedilatildeo lukaacutecsiana para o desvendamento da
contextura ontoloacutegica do pensamento marxiano havia todo um enorme e
complexo campo teoacuterico a ser devidamente explorado o que demandaria com
certeza intenso trabalho de pesquisa a ser realizado ao longo de vaacuterios anos
Assim eacute que suas colocaccedilotildees se caracterizavam como esboccedilos expositivos isto
eacute afloramentos introdutoacuterios passiacuteveis portanto de vaacuterios tipos de correccedilotildees
posteriores
O que deve ser salientado nessa ocasiatildeo eacute justamente a coragem e a
desenvolturas teoacutericas com que Chasin lidava com o assunto em sala de aula
procurando mais do qualquer outra finalidade estimular seus alunos a
compartilharem dessa empreitada onde cada um contribuiria desse modo para
um esforccedilo de pesquisa que dada sua envergadura soacute poderia assumir caraacuteter
coletivo
Assim eacute que depois da publicaccedilatildeo de Marx - Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica em 1995[i] que foi a primeira sistematizaccedilatildeo de
resultados de pesquisa levada a cabo durante quase uma deacutecada sobre a obra
marxiana notadamente seu periacuteodo formativo e o desenvolvimento de vaacuterios
trabalhos de pesquisa - tanto no plano do mestrado quanto no doutorado por ele
orientados parte deles publicados no presente tomo - Chasin chega a esboccedilar
um esquema de trabalho que teria a obra de Marx tanto como ponto de partida
quanto por ponto de chegada e visava dar conta de uma verdadeira histoacuteria da
ontologia Este ambicioso programa de trabalho acabou se impondo como
inevitaacutevel na medida em que a devida compreensatildeo da obra de Marx assim o
exigia Em outras palavras de iniacutecio a pesquisa que se voltava ao pensamento
marxiano e algumas incursotildees na obra de Lukaacutecs acabou demandando pelo
proacuteprios resultados obtidos o seu alargamento para praticamente todo o
conjunto da histoacuteria da filosofia Aleacutem do resgate da contraposiccedilatildeo metafiacutesica
2
versus ontologia desde o renascimento ateacute Kant o plano de pesquisa incluiacutea a
anaacutelise das posiccedilotildees ontoloacutegicas dos preacute-socraacuteticos ateacute Heidegger bem como
um conjunto de glosas a E Husserl N Hartmann E Gilson E Cassirer G
Lukaacutecs e E Bloch
Mas os desafios teoacutericos que o tema da ontologia acarreta implicaram
que a atenccedilatildeo de Chasin tambeacutem se voltasse agravequilo que teria sido a sua grande
descoberta original - como veremos a seguir - o traccedilo distintivo da histoacuteria da
ontologia a sua dissoluccedilatildeo e seu colapso
Na abertura de seu uacuteltimo curso no Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em
Filosofia da UFMG asseverou Creio que possa ser transposto agrave ontologia o que
Heine afirmou a propoacutesito do cristianismo ainda natildeo haacute nenhuma histoacuteria da
ontologia porque ateacute agora natildeo foi compreendido claramente no que consiste a
posiccedilatildeo ontoloacutegica e porque superficialidades foram tomadas pelo essencial
Antecipo sob essa analogia que superficial em ontologia eacute pressupor
que ela se caracterize e resolva por andamentos autocircnomos e a priori da razatildeo
o que tem induzido a conferir grande importacircncia agraves querelas da
fundamentaccedilatildeo isto eacute que a ontologia por natureza seja um movimento
cognitivo desenvolvido por via de alguma forma de razatildeo auto-sustentada
Superficialidade que se manifesta porque a ontologia por caraacuteter propoacutesitos e
ateacute mesmo por definiccedilatildeo claacutessica tem por alvo o reconhecimento do por-si das
coisas ou em versatildeo jaacute reduzida e desnaturada pela oacutetica gnoseoloacutegica do em
si uma vez que o para-noacutes soacute pode ser um consequumlente ou resultante em toda
e qualquer ordem de representaccedilatildeo um derivado que sob diapasatildeo
gnosioloacutegico eacute afetado ou condicionado pela proacutepria relaccedilatildeo cognitiva ou seja
por uma operaccedilatildeo que redunda na perda do atributo fundamental do por-si isto
eacute de sua prioridade em face de qualquer relaccedilatildeo com o sujeito praacutetico e teoacuterico
De outra parte a histoacuteria real da ontologia eacute a parte mais antiga e
intrincada da filosofia pois esta nasceu por demanda de uma questatildeo de caraacuteter
3
ou espiacuterito ontoloacutegico de que eacute feito o mundo perguntavam os preacute-socraacuteticos
qual eacute o elemento primordial do universo
Nascida como ontologia sem que tivesse esse nome sem que tivesse
outro nome que natildeo o de filosofia esta foi por cerca de dois milecircnios e meio
antes de tudo ontologia (metafiacutesica) ou explicitamente desde Platatildeo e
Aristoacuteteles ateacute Leibniz-Cristian Wolff a ontologia foi a atmosfera e o andaime da
reflexatildeo Seja como base e norteamento do conhecimento seja como alicerce
movediccedilo e desorientador em sua histoacuteria imanentemente contraditoacuteria a um
tempo auto-constituinte e auto-dissolutora de si proacutepria Numa palavra parece
que a aproximaccedilatildeo dos seres ou entes vale dizer da realidade pura e simples
em sua complexa efetividade tem se mostrado como a mais difiacutecil e penosa de
todas as tarefas do homem Paradoxal sob o prisma de que os homens natildeo
vivem a natildeo ser no proacuteprio mundo real essa dificuldade natildeo eacute tatildeo improacutepria ou
inocente na medida em que se considera
1) que o homem soacute muito lentamente constitui seu proacuteprio mundo e a si
mesmo e em ritmo semelhante destes se apropria objetiva e subjetivamente
2) que essa dupla constituiccedilatildeoapropriaccedilatildeo do mundo e de si tem sido
operada sob processos infinitamente complexos e contraditoacuterios geradores de
matizados e superpostos niacuteveis de esclarecimento e ocultaccedilatildeo
Para aleacutem dessas dificuldades de fundo eacute necessaacuterio levar em conta
tambeacutem que nos dias atuais a pesquisa ontoloacutegica em especial nos seus
lineamentos mais evoluiacutedos - o estatuto ontoloacutegico marxiano - se daacute em
contexto histoacuterico amplamente desfavoraacutevel tanto no que diz respeito agrave histoacuteria
das formaccedilotildees reais quanto agravequela das formaccedilotildees ideais
De tal modo que poder-se-ia dizer agora parafraseando Marx de A
Sagrada Famiacutelia a propoacutesito de Szeliga que as proposituras ontoloacutegicas
dominantes no seacuteculo XX convertem em misteacuterios o que satildeo verdadeiras
4
trivialidades Sua arte natildeo consiste em revelar o oculto mas ocultar o
revelado[ii]
Em suma para dar iniacutecio ao delineamento da histoacuteria da ontologia eacute
preciso em primeiro lugar abandonar sua pretensatildeo infantil agrave atemporalidade e
se dar conta de que seja compulsoriamente histoacuterica de que se faz no tempo
tatildeo contraditoriatmente quanto a proacutepria entificaccedilatildeo de seu histoacuterico agente
Em segundo lugar Chasin considerava inadiaacutevel reprocessar a
decifraccedilatildeo ou o entendimento de Marx em determinaccedilatildeo reciacuteproca com as
vicissitudes da histoacuteria da ontologia na tentativa de ultrapassar as derrotas
sofridas ao longo dos uacuteltimos 150 anos e principalmente a partir do
entendimento efetivo do pensamento marxiano e tambeacutem do atual
desenvolvimento do capital redimensionar a perspectiva dos alvos e rumos
teoacutericos e praacuteticos a exercitar no presente e levar a efeito no futuro
O debate dito ontoloacutegico do seacuteculo XX girou em torno de conhecido
conjunto de fontes Enquanto Hartmann com o volume I de sua Ontologia de
1934 eacute uma contraposiccedilatildeo agrave desontologizaccedilatildeo em geral e agraves novas tendecircncias
do seacuteculo principalmente Heidegger feita do ponto de vista
fenomenoloacutegiconeokantiano Eacute Gilson eacute a resposta neotomista no interior da
filosofia francesa ao desafio posto por O Ser eo Nada (1943) de Sartre cujo
sub-tiacutetulo ensaio de ontologia fenomenoloacutegica logo aponta para a sua afiliaccedilatildeo
a Husserl e o tributo pago de toda a maneira a Heidegger que o conduziram a
inviabilizaccedilotildees definitivas e irremissiacuteveis que natildeo desobriga todavia de
distinguir radicalmente seu propoacutesito e sua personalidade do autor de Ser e
Tempo (1926) dedicada a Edmund Husserl Em testemunho de Admiraccedilatildeo e
Amizade
De acordo com a posiccedilatildeo que Chasin veio assumir nos seus uacuteltimos
anos de vida nas muacuteltiplas diacutevidas contraiacutedas pelo marxismo no seacuteculo XX
figura precisamente esta ter entrado muito tardia e restritamente nessa
5
discussatildeo vale dizer soacute quando a vitoacuteria temporaacuteria jaacute havia pendido para o
outro lado natildeo apenas por sua exclusiva presenccedila na arena mas porque
condicionado e impulsionado pelo proacuteprio caraacuteter de nossos tempos Os arautos
que se impuseram satildeo muito conhecidos tomaram o espaccedilo sem ter que
enfrentar o adversaacuterio efetivo uacutenico capaz de contraditar e oferecer alternativa
Este em vez disso perdeu-se sem luta sucumbiu agrave linha dominante do
cientificismo e acabou junto com os melhores tambeacutem perdido nesse campo
Nem eacute preciso referir o leste europeu mas com o politicismo generalizado o
marxismo se perdeu inclusive com os melhores que o seacuteculo produziu
Apenas em fins da deacutecada de 60 quando tudo estava desabando
Lukaacutecs de traveacutes se deu conta do misteacuterio Eacute muito significativo que nesse
despertar obliacutequumlo tenha tido que se voltar agrave refutaccedilatildeo entre outros de
Heidegger quando este escrever seu livro principal no miacutenimo em parte em
oposiccedilatildeo a Histoacuteria e Consciecircncia de Classe (textos de 1919-22) Eacute igualmente
sintomaacutetico que soacute tenha retomado deliberadamente a preocupaccedilatildeo ontoloacutegica
ao final da vida e sucumbido ao objeto em obra inconclusa motivada acima de
tudo pelo vieacutes excecircntrico de conferir poder regenerador agrave eacutetica Mas eacute sabido
que junto com seu meacuterito natildeo pereceu sozinho Por exemplo onde estatildeo
Hartman Gilson e ateacute mesmo Sartre
As dificuldades para o devido enfrentamento da questatildeo ontoloacutegica hoje
satildeo enormes e jaacute eram conhecidas por Lukaacutecs muito embora o filoacutesofo huacutengaro
morto em 1971 natildeo tenha assistido o pleno triunfo de concepccedilotildees que
consagram o homem derrelito denominaccedilatildeo essa empregada por ele mesmo ao
se reportar a Heidegger por exemplo
Tais dificuldades grosso modo poderiam ser atribuiacutedas inicialmente agraves
tendecircncias que tecircm como ponto de partida o criticismo kantiano que se
impuseram na viragem do seacuteculo XIX para o XX com a reduccedilatildeo da filosofia ao
circuito da problemaacutetica do conhecimento
6
Embora se possa assim considerar o criticismo kantiano como uma
espeacutecie de divisor de aacuteguas natildeo se deve obliterar o fato de que com a
metafiacutesica claacutessica ou qualquer uma de suas variantes antecedentes ou
subsequumlentes sob o pretexto de alcanccedilar a priori a certeza cognitiva gera-se
uma grave distorccedilatildeo no plano teoacuterico pela qual o ente eacute perdido para sempre
Para evitar tal descaminho Chasin propotildee o designativo posiccedilatildeo ontoloacutegica
pois com ela pretende tambeacutem pelo menos precaver contra a unilateralidade
decorrente da postura gnoseoloacutegica (sempre uma forma meramente
especulativa a respeito da morfologia do funcionamento ou seja da
organizaccedilatildeo e atividade da subjetividade) instigando e se rigorosamente
praticada orientando com rigor a pensar as coisas em seus proacuteprios nexos em
direccedilatildeo a uma totalidade mais plena de determinaccedilotildees A expressatildeo pretende
pois sinalizar e induzir agrave praacutetica intelectual de caraacuteter ontoloacutegico concebida em
sua forma mais consistente e consequumlente
Chasin pois pretendeu recuperar o sentido de ontologia enquanto
consideraccedilatildeo daquilo que eacute em sua efetividade Natildeo alguma distorccedilatildeo ou
dissoluccedilatildeo do ente enquanto ente seja sob sua forma do sentido do ente do
ser da apariccedilatildeo ou qualquer outra variaacutevel do tipo que embora possam incluir
dimensotildees do sensiacutevel sempre compreendem implicam ou tecircm por condiccedilatildeo de
possibilidade um sujeito mesmo que este seja o obervador da produccedilatildeo de
representaccedilotildees de caraacuteter racional Estudo pois das coisas em sua
independecircncia em sua exterioridade em face de possiacuteveis relaccedilotildees praacuteticas e
teoacutericas em que estatildeo ou possam vir a estar presentes inclusive aquelas pelas
quais em gecircnero superior de entificaccedilatildeo as coisas satildeo postas ou engendradas
De tal sorte que ainda e mesmo que todo o plano cognitivo possa ou
tenha de ser impugnado que toda ciecircncia possa ou tenha que ser posta em
duacutevida e considerada simples ilusatildeo ou equiacutevoco ou ter seu acircmbito reduzido agrave
pura convenccedilatildeo resta o fundamental o universo da praacutetica ou da vida vivida em
sua qualidade de confirmaccedilatildeo da dupla certeza da existecircncia do mundo e dos
homens e enquanto tal tem de ser reconhecido como ponto de partida da
7
intenccedilatildeo ontoloacutegica cujo propoacutesito eacute se constituir em base conceitual de sua
dilucidaccedilatildeo
Ainda no contexto da afirmaccedilatildeo da posiccedilatildeo ontoloacutegica e rejeiccedilatildeo seja
do vieacutes gnosioloacutegico ou cientificista seja das concepccedilotildees reinantes ditas
ontoloacutegicas Chasin de modo provocativo indaga Por que a foacutermula simples
do cogito eacute mais evidente ou funcional para efeito de fundamentaccedilatildeo do que a
evidecircncia do complexo sensiacutevel do gozo Por que a evidecircncia do cogito - o
pensamento do indiviacuteduo isolado - eacute superior agrave evidecircncia do existir que inclui a
presenccedila e a relaccedilatildeo viva dos outros e das coisas Chasin continua na mesma
direccedilatildeo no questionamento da pretensa superioridade do cogito indagando o
quecirc se esconde sob ela e acrescenta O cogito o truque cartesiano eacute a
conquista da certeza agrave custa de trecircs absurdidades o cogito desencarnado a
encarnaccedilatildeo divina da perfeiccedilatildeo e o mundo reduzido agrave extensatildeo A essas trecircs
conquistas digamos assim Chasin denomina de verdade alienada isto eacute
verdade emergente da subjetividade na forma da alienaccedilatildeo
A exercitaccedilatildeo ontoloacutegica ao contraacuterio assume como criteacuterio analiacutetico a
determinaccedilatildeo de que o objeto maturado eacute a chave do esclarecimento de suas
formas precedentes[iii] desde as embrionaacuterias ateacute as mais elaboradas que
antecedem no tempo sua fisionomia acabada Portanto a determinaccedilatildeo
marxiana do objeto maturado eacute produto desse espiacuterito teoacuterico pois soacute faz
sentido em posicionamento ontoloacutegico ou seja em reconhecimento do grau
constitutivo em que se encontra a coisa examinada
Segundo Chasin ainda Aristoacuteteles teve grande meacuterito em sua
propositura de uma filosofia primeira - base ou fundamento para a constituiccedilatildeo
das ciecircncias particulares - mas que por sua resoluccedilatildeo (de caraacuteter platocircnico
conforme jaacute demonstrara Eacute Gilson) e por seus pretendidos atributos ahistoacutericos
- categorias eternas e absolutas imutaacuteveis e perenes - constitui um modo
involuntaacuterio de elaboraccedilatildeo especulativa apesar de seu intento originaacuterio de
conhecer o efetivamente existente o ente enquanto ente Tais limites do intento
8
aristoteacutelico numa linha de argumentaccedilatildeo que confere prioridade agrave realidade
soacutecio-histoacuterica na produccedilatildeo de viabilidades ou inviabilidades teoacutericas e de sua
consequumlente explicaccedilatildeo eram vistos por Chasin como limites produzidos pelo
proacuteprio tempo grego sumariados a seguir
1) praacutetica humano-societaacuteria incipiente e acanhada que ganhou no
artigo O Futuro Ausente beliacutessima caracterizaccedilatildeo inspirada no Marx das
Formen Imaturaccedilatildeo natural e caracteriacutestica das remotas formas sociais em que
a propriedade da terra e a agricultura constituiacuteam a base da atividade material
tendo por objetivo a produccedilatildeo valores de uso ou seja a reproduccedilatildeo dos
indiviacuteduos em peculiares e bem determinadas relaccedilotildees com a comunidade[iv]
onde por via de consequumlecircncia indiviacuteduo e genecircro satildeo imediata e
transparentemente inseparaacuteveis e suas relaccedilotildees traduzem essa unidade
fundamental tornando desconhecida e impensaacutevel qualquer tipo de cissura que
contraponha ou menos ainda torne excludentes entre si as figuras de sua
polaridade[v] Mas a essa dimensatildeo positiva - sintomaticamente tatildeo atraente nos
dias atuais - corresponde uma negativa que Chasin esclarece na sequumlecircncia
todas as formas em que a comunidade pressupotildee sujeitos em determinada
unidade objetiva com as condiccedilotildees da atividade produtiva ou reciprocamente
nas quais uma especiacutefica existecircncia subjetiva faz com que a proacutepria comunidade
seja pressuposta como condiccedilatildeo de produccedilatildeo todas elas diz Marx
correspondem necessariamente e por princiacutepio a um desenvolvimento limitado
das forccedilas produtivas[vi]
2) Consequumlentemente impossibilidade para conceber a historicidade e
a contraditoriedade como categorias fundamentais do ser - que estrangulam a
mais precisa e universal por isso mesmo vaacutelida hoje e para sempre das
formulaccedilotildees atinentes agrave natureza e ao propoacutesito da ontologia
Meacuteritos e limites da filosofia primeira que apenas seratildeo realizados e
superados depois de um longo itineraacuterio repleno de contraposiccedilotildees internas
9
pelos lineamentos perfilados por Marx que tambeacutem herda criticamente
dimensotildees da filosofia moderna - do renascimento ao neohegelianismo
Desse modo com o objetivo de sumariar preliminarmente os conteuacutedos
dessa trajetoacuteria que Marx assimila por via criacutetica Chasin indica alguns deles
sem pretensatildeo alguma de esgotaacute-los
1) Do Renascimento - a infinitude do universo e o espiacuterito da
concepccedilatildeo do homem como o uacutenico ser aberto - existente e conhecido capaz
na potecircncia de seus atributos de conhecer e configurar a si e a seu mundo
ambos entendidos e tomados em sua naturalidade objetividade e o primeiro na
infinitude de sua essecircncia ativa
2) Do materialismo francecircs e inglecircs e do Iluminismo - a ruptura com a
conduta especulativa metafiacutesica e com o espiacuterito de sistema em filosofia que eacute
concebido como freio e obstaacuteculo agrave razatildeo Por meio dessa desobstruccedilatildeo o
iluminismo pode universalizar a filosofia como meio de toda verdade - natural e
espiritual - e ela passa a se voltar agraves tarefas praacuteticas donde a possibilidade e o
escopo de estabelecer a vida humana de modo racional Em outros termos
reconhece no pensamento o poder e o papel de organizar a vida o pensamento
deve ter papel analiacutetico mas tambeacutem fazer nascer a ordem cuja necessidade
ela concebeu[vii] Em contrapartida os limites do pensamento iluminista satildeo
sinteticamente os seguintes acentuaccedilatildeo unilateralizante da racionalidade
herdada do renascimento e distorcida pelo racionalismo do seacuteculo XVIII Aleacutem
disso tem-se o naturalismo vale dizer a ontologia do social demasiadamente
colada agrave ontologia da natureza embora natildeo se possa deixar de reconhecer que
frente ao abstracionismo metafiacutesico trata-se de um meacuterito pretender uma
ontologia ligada agrave natureza que em verdade eacute idealizada Talvez o melhor
exemplo dessa tradiccedilatildeo seja justamente Feuerbach
3) Do criticismo - a impossibilidade de uma ontologia como saber do
em si ou seja do ente enquanto ente pela via do absolutismo racional
10
dedutivista Em Kant em verdade tem-se a impossibilidade de uma ontologia
em Marx ao reveacutes tem-se apenas tal recusa agrave especulaccedilatildeo mas natildeo a
impossibilidade de conhecer o ente enquanto ente vale dizer Marx aceita o
espiacuterito da criacutetica kantiana ao conhecimento absoluto mas natildeo sua resultante
sistemaacutetica a sua vedaccedilatildeo ao conhecimento das coisas enquanto tais
4) Do hegelianismo - a concepccedilatildeo histoacuterica do ser portanto de sua
contrariedade bem como a natureza aproximativa do processo de
conhecimento ao mesmo tempo em que recusa o invoacutelucro miacutestico do
pensamento hegeliano - a dialeacutetica autocircnoma da razatildeo como demiurgo do real
ou da efetividade sensiacutevel ou seja refuta decidamente seu caraacuteter
especulativo
5) Do neohegelianismo - a problemaacutetica do homem e muito
especificamente duas contribuiccedilotildees de Feuerbach a criacutetica agrave especulaccedilatildeo e os
lineamentos mais gerais do ser soacute enquanto ser sensiacutevel ou objetivo (dimensotildees
de uma ontologia geral em seu niacutevel mais abstrato) Mas ao lado desse
aspecto positivo do pensamento feuerbachiano natildeo eacute possiacutevel deixar de
assinalar a objeccedilatildeo fundamental dirigida a ele por Marx sua concepccedilatildeo
naturalista do homem vale dizer sua incapacidade de o determinar como ser
social Assim em Feuerbach o homem eacute sensiacutevel objetivonatural e natildeo
objetivo-social - a grande descoberta marxiana
Grande descoberta que eacute mais amplamente avaliada quando se
considera o conjunto das linhas manifestas pelos principais representantes do
neohegelianismo B Bauer formulador de uma concepccedilatildeo do homem como
auto-consciecircncia racional M Stirner com a elevaccedilatildeo do egoiacutesmo agrave condiccedilatildeo de
essecircncia humana Feuerbach com a concepccedilatildeo naturalista do homem centrada
no amor Nesse cenaacuterio somente Marx comparece com a descoberta da
sociabilidade como substacircncia constitutiva do homem - e natildeo meramente uma
essecircncia imutaacutevel mas histoacuterica e contraditoacuteria produzida e reproduzida pela
proacutepria atividade sensiacutevel dos homens
11
De sorte que do ente enquanto ente aristoteacutelico determinado por sua
forma substancial eterna ao ser social marxiano compreendido em suas
mudanccedilas categoriais - eacute do que consiste a histoacuteria - se vai de uma filosofia
primeira que terminou por sua resoluccedilatildeo originaacuteria na forma de um saber
absoluto a um saber histoacuterico de base que se desenvolve pela infinitude de
aproximaccedilotildees empreendidas em direccedilatildeo ao absoluto entendido pura e
simplesmente como completude ou totalidade que praticamente nunca se
realiza porque desnecessaacuterio para o saber ao qual bastam completudes mais
modestas e ainda mais como saber para a praacutetica
De modo que a filosofia primeira de configuraccedilatildeo marxiana eacute antes de
tudo a afirmaccedilatildeo da objetividade do mundo e a possibilidade ser conhecido
possibilidade que eacute soacutecio-historicamente determinada exercendo a funccedilatildeo de
base e guia para a ciecircncia da histoacuteria especificamente como ontologia regional
do ser social e que nutre das ciecircncias e a elas responde tanto quanto elas
mesmas tem de responder aos lineamentos ontoloacutegicos pelos quais se guiam
mas aos quais natildeo tomam como coaacutegulos de saber imutaacutevel De sorte que
ontologia e ciecircncia se potencializam e se criticam reciacuteproca e
permanentemente
Tambeacutem de acordo com Chasin por essas razotildees a ontologia
marxiana natildeo eacute uma resoluccedilatildeo de caraacuteter absoluto nos moldes do sistema
convencional mas a condiccedilatildeo de possibilidade de resoluccedilatildeo do saber Eacute em
outras palavras um estatuto movente e movido de cientificidade orienta e eacute
orientado pela ciecircncia e pela praacutetica universal dos homens Orienta e eacute
orientada guia e eacute guiada corrige e eacute corrigida Ou seja natildeo eacute um absoluto
inquestionaacutevel uma certeza estabelecida por deduccedilatildeo a partir de axiomas de
uma vez para sempre Mesmo porque a certeza cognitiva natildeo pode estar no
ponto de partida mas compreendida como alvo de uma busca permanente
procura intensiva e extensiva cuja infinitude eacute posta a cada momento entre
parecircnteses no qual o grau de certeza alcanccedilado eacute assumido como realizaccedilatildeo
maacutexima tendo por limites as possibilidades do tempo ou cenaacuterio histoacuterico grau
12
a ser confirmado ou ampliado ou ao inveacutes restringido na parte ou descartado
no todo posteriormente com todas as suas implicaccedilotildees correlatas
Em suma quando se utiliza a expressatildeo posiccedilatildeo ontoloacutegica e natildeo
perspectiva oacutetica prisma ou ponto de vista pretende-se remeter a lugar e agraves
coisas ou seja o reconhecimento do mundo como multiverso de entes reais
objetivos e que por isso mesmo faceiam o observador praacutetico ou teoacuterico natildeo
dependendo deste para existir em face do qual satildeo independentes Eacute
finalmente o reconhecimento da prioridade das coisas nas relaccedilotildees cognitivas
sem desconhecer eacute claro o caraacuteter ativo do investigador
Quando Chasin procura enfatizar o reconhecimento noccedilatildeo
imediatamente conexa a de posiccedilatildeo ontoloacutegica eacute por que aquela tem a
vantagem de colocar em primeiro lugar o caraacuteter natildeo puramente teoacuterico
contemplativo mas sobretudo praacutetico[viii] da aproximaccedilatildeo ao ente aleacutem da
natureza da operaccedilatildeo mental que designa - constataccedilatildeo ou recogniccedilatildeo vale
dizer a admissatildeo de algo a respeito do qual o discurso se pronuncia como forma
imediata de representaccedilatildeo
Relevar o caraacuteter praacutetico de aproximaccedilatildeo ao ente ou em outras
palavras partir ou dar prioridade agrave praacutetica significa por seu turno partir do
caraacuteter essencial do ser do homem por sua exteriorizaccedilatildeo operativa no mundo
que confirma sua forma de vida ou modo de existecircncia Quer dizer eacute um ponto
de partida desde logo sob criteacuterio ontoloacutegico ou seja que considera a
efetividade ocircntica do homem e do mundo de tal sorte que ambos satildeo
reconhecidos enquanto atividade sensiacutevel Caminho que tem o meacuterito de evitar
as vias reflexas[ix] como tambeacutem os engenhos e supostos dos encantamentos
especulativos como cogito sujeito transcendental ou os arqueacutetipos
generalizando uma expressatildeo marxiana os misticismos loacutegicos que nunca
deixam de mostrar sua condiccedilatildeo de artifiacutecios por mais rigorosos e envolventes
que sejam tanto que podem sempre ser contestados de algum modo ao passo
que os indiviacuteduos vivos e ativos os pressupostos dos quais Marx parte em A
13
Ideologia Alematilde natildeo podem nunca ser recusados a natildeo ser na fantasia e sob
pena de cancelar todo e qualquer andamento reflexivo
Em suma reconhecimento ontopraacutetico significa pois tomar como
ponto de partida a praacutetica - desde a praacutetica cotidiana agrave praacutetica cientiacutefica de ponta
- de um tempo dado
O plano ontopraacutetico jaacute bem delineado no texto de 1995 ganha nos
anos seguintes sucessivas correccedilotildees por parte do autor a ponto de se tornar o
eixo a partir do qual Chasin faz a criacutetica das Teorias da Fundamentaccedilatildeo ou
como ele as denomina ironicamente A Querela da Fundamentaccedilatildeo
A esse respeito costumava ele indagar O que eacute um fundamento Uma
Teoria da Subjetividade ou Uma Teoria da Objetividade
Se o fundamento for considerado a partir de uma teoria da
subjetividade por onde comeccedilar Pelo aparato sensorial como no empirismo
Ou pela consciecircncia ou coisa que o valha como o cogito cartesiano a
autoconsciecircncia a razatildeo ou as formas a priori do entendimento Ou ainda uma
teoria da mente
Ainda no plano do fundamento subjetivo poder-se-ia partir da
experiecircncia da vivecircncia do vivido Neste caso o vivido seria o preacute-teoreacutetico
mas enquanto experiecircncia existencial isto eacute as vivecircncias do indiviacuteduo isolado
em experiecircncia aleatoacuteria fortuita acidental
Mas se o fundamento for uma Teoria da Objetividade por onde
comeccedilar Pelos fenocircmenos empiacutericos Mas nesse caso natildeo terminariacuteamos
apenas no fundamento psicoloacutegico isto eacute teriacuteamos o psicologismo como
fundamento da verdade
14
E se partiacutessemos do todo concreto Natildeo findariacuteamos numa visatildeo
caoacutetica e abstrata de conjuntos indeterminados desamparados na companhia
de um punhado de abstraccedilotildees razoaacuteveis e irrazoaacuteveis
Feitas tais indagaccedilotildees Chasin conclui de modo enfaacutetico Toda peticcedilatildeo
de fundamento todo discurso por um fundamento estaacute encerrado na esfera
teoacuterica Aleacutem do mais todo discurso de fundamentaccedilatildeo pretende e implica uma
certeza ou seja de um modo ou de outro a suposiccedilatildeo de um saber absoluto
ainda que um simples momento do saber absoluto Vale dizer o discurso da
fundamentaccedilatildeo desemboca de algum modo na razatildeo especulativa Em outras
palavras implica algo que transcende a proacutepria natureza do saber que eacute um
processo infinito de aproximaccedilotildees
Para Chasin o reconhecimento do ontopraacutetico tem a vantagem de
escapar agrave querela da fundamentaccedilatildeo na medida em que parte da experiecircncia
real melhor dizendo da praacutetica real natildeo de uma experiecircncia isolada
arbitrariamente natildeo da experiecircncia aleatoacuteria da suposta existecircncia existencial
dos indiviacuteduos isolados dos indiviacuteduos em derreliccedilatildeo
O universo ontopraacutetico eacute o necessariamente vivido para que qualquer
pergunta possa se dar Eacute portanto a esfera preacute-teoreacutetica esfera que antecede
qualquer teoria Esfera sem a qual natildeo haacute vida humana e portanto sem a qual
natildeo pode haver qualquer pergunta teoacuterica
A reflexatildeo que tem como ponto de partida o ontopraacutetico estabelece
assim um pressuposto concreto (e natildeo uma verdade ideada) do qual natildeo posso
me afastar a natildeo ser na imaginaccedilatildeo
Em siacutentese a esfera ontopraacutetica representa o complexos dos homens
vivos e ativos A partir dessa abstraccedilatildeo razoaacutevel - o ontopraacutetico - pode-se
encontrar jaacute numa analiacutetica de desentranhamento desse complexo real o
devido lugar da ontologia da epistemologia e da ciecircncia da histoacuteria que
compreende dois grandes ramos natureza e sociedade
15
Em outras palavras sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico torna-se
aleatoacuteria a localizaccedilatildeo que se confere tanto ao ontoloacutegico quanto ao epistecircmico
A opccedilatildeo por um deles se torna uma arbitrariedade teoacuterica e eacute justamente isto
que gera a querela da fundamentaccedilatildeo pois a decisatildeo fica submersa ao plano
teoacuterico ao jogo dos argumentos agrave ambivalecircncia do logos que eacute irresolutivo
Sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico parte-se assim de imediato da
teoria e natildeo do ser que faz da teoria ou deste como uma abstraccedilatildeo da
inteligibilidade ou seja de uma faculdade abstraiacuteda do ser que a possui
gerando com isso um absurdo ontoloacutegico
Eacute portanto a partir da analiacutetica do ontopraacutetico pelo reconhecimento de
seus traccedilos categoriais que tem iniacutecio a elaboraccedilatildeo ontoloacutegica Ou seja a
ontologia nasce como reflexatildeo conscientizaccedilatildeo conceituaccedilatildeo do ontopraacutetico
enquanto primeiro objeto da ontologia que a partir daiacute se encaminha em
direccedilatildeo agrave criacutetica - em termos de sua necessidade e loacutegica especiacutefica - do proacuteprio
ontopraacutetico isto eacute do complexo dos objetos reais aiacute incluiacutedo o homem
Resta ainda em relaccedilatildeo agrave problemaacutetica geral em tela aflorar a questatildeo
da adequatio tal como era tematizada tambeacutem em seus cursos
Polemizando com a denominaccedilatildeo de realismo comumente utilizada
para denominar proposituras que conferem prioridade ao mundo objetual
Chasin afirmava que haacute realismo - antigo - quando eacute suposto que a ordem da
razatildeo agrave idecircntica a ordem do real e que a partir de axiomas por meios racionais-
dedutivos embuiacutedos do espiacuterito de sistema se possa estabelecer a verdade do
mundo
Em Marx entretanto a ordem das coisas e da razatildeo satildeo distintas (um
exemplo expressivo desta postura marxiana pode ser encontrada na famosa
Introduccedilatildeo de 57) ambas mutaacuteveis e processuais - unidade da desidentidade
entre ser e saber Assim o mundo natildeo pode ser deduzido racionalmente mas
reproduzido sob forma de ideacuteia por meio de aproximaccedilotildees - empiacuterico abstrato
16
concreto - num processo intensivo e extensivo historicamente condicionado
possibilitado ou impedido - na dependecircncia que fica da maturaccedilatildeo do objeto e
do posicionamento do sujeito O processo mimeacutetico eacute portanto reproduccedilatildeo
conceitual de efetividades donde se lida com duas ordens de formaccedilotildees real e
ideal A reproduccedilatildeo conceitual apresenta portanto sua proacutepria loacutegica mas no
interior da determinaccedilatildeo soacutecio-histoacuterica do pensamento de modo que uma
teoria do conhecimento (morfologia e dinacircmica da subjetividade in abstratu e
imutaacutevel) eacute incapaz de explicar o processo cognitivo pois a faculdade humana
da forccedila da abstraccedilatildeo depende das possibilidades oferecidas pela
determinaccedilatildeo social do pensamento que por sua vez se manifesta e se
configura pelo desenvolvimento dos objetos e da praacutetica humana que sobre eles
tem incidecircncia
Donde a franca afirmaccedilatildeo marxiana da possibilidade de conhecer natildeo
se confunde com a simplicidade e facilidade da concepccedilatildeo realista nem mesmo
no plano da ingenuidade cotidiana desde logo porque a atividade cotidiana -
que estaacute para aleacutem da ingenuidade ou lanccedila os sujeitos para aleacutem da
ingenuidade - eacute em si um complexo rico e desafiador matrizador inclusive da
intentio recta atitude natural e necessaacuteria da esfera ontopraacutetica
Haacute portanto que distinguir as grandes diferenccedilas ontoloacutegicas entre o
estatuto marxiano e a ontologia realista Na primeira a adequatio digamos
assim eacute correlaccedilatildeo entre formaccedilatildeo real e formaccedilatildeo ideal duas ordens distintas
de configuraccedilatildeo Em outras palavras eacute correlaccedilatildeo conceitual entre entificaccedilatildeo
concreta e reproduccedilatildeo conceitual Em suma a reproduccedilatildeo conceitual nada mais
eacute do que transposiccedilatildeo agrave cabeccedila ordenada pelos nexos do real na forma e pelos
meios da proacutepria atividade mental
I - Tomando Marx por Base e por Ponto de Chegada
17
Considerando como ponto de referecircncia as consideraccedilotildees
desenvolvidas por Marx em O Capital especificamente sobre a dificuldade
encontrada pela humanidade na compreensatildeo do valor ao longo de dois
milecircnios - de Aristoacuteteles a Ricardo - pode-se sustentar segundo Chasin que
um fenocircmeno muito similar a este se produziu no que tange agrave determinaccedilatildeo do
ser ou seja da(s) matriz(es) da(s) realidade(s) ou seja da efetividade
Tomemos as passagens em questatildeo que se encontram no Prefaacutecio agrave
Primeira Ediccedilatildeo de O Capital Todo comeccedilo eacute difiacutecil isso vale para qualquer
ciecircncia A forma do valor cuja figura acabada eacute a forma do dinheiro eacute muito
simples e vazia de conteuacutedo Mesmo assim o espiacuterito humano tem procurado
desvendaacute-la (ergruumlden) em vatildeo haacute mais de 2000 anos enquanto por outro lado
teve ecircxito ao menos aproximado a anaacutelise de formas muito mais complicadas e
replenas de conteuacutedo Por quecirc Porque o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de
estudar do que a ceacutelula do corpo Aleacutem disso na anaacutelise das formas econocircmicas
natildeo podem servir nem o microscoacutepio nem reagentes quiacutemicos A forccedila da
abstraccedilatildeo deve substituir a ambos Para o leigo a anaacutelise parece se perder
em pedantismo Trata-se efetivamente de pedantismo mas daquele de que se
ocupa a anatomia microscoacutepica
De acordo com Chasin eacute necessaacuterio reter os seguintes noacutedulos
significativos da citaccedilatildeo acima
1) todo iniacutecio de uma ciecircncia eacute difiacutecil donde o princiacutepio da ontologia o
princiacutepio da ciecircncia deve ser o mais difiacutecil de todos
2) haacute grande dificuldade na compreensatildeo da forma do valor que eacute um
objeto simples e vazio de conteuacutedo
3) haacute ecircxito maior na anaacutelise de formas mais complicadas e replenas de
conteuacutedo
18
Na mesma citaccedilatildeo Marx enuncia os motivos de tal dificuldade
1) o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de estudar do que a ceacutelula do
corpo
2) meacutetodos experimentais natildeo satildeo aplicaacuteveis a esse tipo de forma
3) a analiacutetica dessa forma pela forccedila da abstraccedilatildeo deve tomar o lugar
da observaccedilatildeo empiacuterica e experimental
4) anaacutelise voltada agrave anatomia microscoacutepica da forma estudada
A partir dessas indicaccedilotildees colhidas no texto de Marx Chasin elabora
um esboccedilo para fins unicamente didaacuteticos em que busca transpassaacute-las para a
proacutepria questatildeo ontoloacutegica afirmando o que se segue
1) o iniacutecio difiacutecil da ontologia perdurou tambeacutem por mais de 2000
anos trajetoacuteria em que se observa tateios imprecisos caracterizados por um
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo ateacute chegar em Marx Tal
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo revela por seu rumo
imanentemente contraditoacuterio por seus caminhos e descaminhos histoacutericos a
dificuldade e a longa incapacidade na formulaccedilatildeo precisa de seu objeto e
alcance ou seja de sua natureza e propoacutesito - de sua funccedilatildeo orientadora e
sustentadora no plano teoacuterico e de sua origem praacutetica preacute-teoreacutetica
2) reconhecimento ontopraacutetico das formas dos seres e analiacutetica da
forma do ser apenas por meio da forccedila da abstraccedilatildeo no reconhecimento
ontopraacutetico os seres satildeo reconhecidos como substantivos e nesse caso ateacute
certo ponto vale para a observaccedilatildeo espontacircnea e observaccedilatildeo comum pois o
desvendamento completo exige forccedila de abstraccedilatildeo como verbo ( o ato de ser
de Gilson) soacute a forccedila da abstraccedilatildeo daiacute a facilidade para se cair no
abstrativismo
19
Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
20
De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
22
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
30
realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
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conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
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estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
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tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
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2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
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7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
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mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
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de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
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[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
Em seus uacuteltimos cursos sobre o tema Chasin insistia em afirmar que a
despeito da valiosa colaboraccedilatildeo lukaacutecsiana para o desvendamento da
contextura ontoloacutegica do pensamento marxiano havia todo um enorme e
complexo campo teoacuterico a ser devidamente explorado o que demandaria com
certeza intenso trabalho de pesquisa a ser realizado ao longo de vaacuterios anos
Assim eacute que suas colocaccedilotildees se caracterizavam como esboccedilos expositivos isto
eacute afloramentos introdutoacuterios passiacuteveis portanto de vaacuterios tipos de correccedilotildees
posteriores
O que deve ser salientado nessa ocasiatildeo eacute justamente a coragem e a
desenvolturas teoacutericas com que Chasin lidava com o assunto em sala de aula
procurando mais do qualquer outra finalidade estimular seus alunos a
compartilharem dessa empreitada onde cada um contribuiria desse modo para
um esforccedilo de pesquisa que dada sua envergadura soacute poderia assumir caraacuteter
coletivo
Assim eacute que depois da publicaccedilatildeo de Marx - Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica em 1995[i] que foi a primeira sistematizaccedilatildeo de
resultados de pesquisa levada a cabo durante quase uma deacutecada sobre a obra
marxiana notadamente seu periacuteodo formativo e o desenvolvimento de vaacuterios
trabalhos de pesquisa - tanto no plano do mestrado quanto no doutorado por ele
orientados parte deles publicados no presente tomo - Chasin chega a esboccedilar
um esquema de trabalho que teria a obra de Marx tanto como ponto de partida
quanto por ponto de chegada e visava dar conta de uma verdadeira histoacuteria da
ontologia Este ambicioso programa de trabalho acabou se impondo como
inevitaacutevel na medida em que a devida compreensatildeo da obra de Marx assim o
exigia Em outras palavras de iniacutecio a pesquisa que se voltava ao pensamento
marxiano e algumas incursotildees na obra de Lukaacutecs acabou demandando pelo
proacuteprios resultados obtidos o seu alargamento para praticamente todo o
conjunto da histoacuteria da filosofia Aleacutem do resgate da contraposiccedilatildeo metafiacutesica
2
versus ontologia desde o renascimento ateacute Kant o plano de pesquisa incluiacutea a
anaacutelise das posiccedilotildees ontoloacutegicas dos preacute-socraacuteticos ateacute Heidegger bem como
um conjunto de glosas a E Husserl N Hartmann E Gilson E Cassirer G
Lukaacutecs e E Bloch
Mas os desafios teoacutericos que o tema da ontologia acarreta implicaram
que a atenccedilatildeo de Chasin tambeacutem se voltasse agravequilo que teria sido a sua grande
descoberta original - como veremos a seguir - o traccedilo distintivo da histoacuteria da
ontologia a sua dissoluccedilatildeo e seu colapso
Na abertura de seu uacuteltimo curso no Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em
Filosofia da UFMG asseverou Creio que possa ser transposto agrave ontologia o que
Heine afirmou a propoacutesito do cristianismo ainda natildeo haacute nenhuma histoacuteria da
ontologia porque ateacute agora natildeo foi compreendido claramente no que consiste a
posiccedilatildeo ontoloacutegica e porque superficialidades foram tomadas pelo essencial
Antecipo sob essa analogia que superficial em ontologia eacute pressupor
que ela se caracterize e resolva por andamentos autocircnomos e a priori da razatildeo
o que tem induzido a conferir grande importacircncia agraves querelas da
fundamentaccedilatildeo isto eacute que a ontologia por natureza seja um movimento
cognitivo desenvolvido por via de alguma forma de razatildeo auto-sustentada
Superficialidade que se manifesta porque a ontologia por caraacuteter propoacutesitos e
ateacute mesmo por definiccedilatildeo claacutessica tem por alvo o reconhecimento do por-si das
coisas ou em versatildeo jaacute reduzida e desnaturada pela oacutetica gnoseoloacutegica do em
si uma vez que o para-noacutes soacute pode ser um consequumlente ou resultante em toda
e qualquer ordem de representaccedilatildeo um derivado que sob diapasatildeo
gnosioloacutegico eacute afetado ou condicionado pela proacutepria relaccedilatildeo cognitiva ou seja
por uma operaccedilatildeo que redunda na perda do atributo fundamental do por-si isto
eacute de sua prioridade em face de qualquer relaccedilatildeo com o sujeito praacutetico e teoacuterico
De outra parte a histoacuteria real da ontologia eacute a parte mais antiga e
intrincada da filosofia pois esta nasceu por demanda de uma questatildeo de caraacuteter
3
ou espiacuterito ontoloacutegico de que eacute feito o mundo perguntavam os preacute-socraacuteticos
qual eacute o elemento primordial do universo
Nascida como ontologia sem que tivesse esse nome sem que tivesse
outro nome que natildeo o de filosofia esta foi por cerca de dois milecircnios e meio
antes de tudo ontologia (metafiacutesica) ou explicitamente desde Platatildeo e
Aristoacuteteles ateacute Leibniz-Cristian Wolff a ontologia foi a atmosfera e o andaime da
reflexatildeo Seja como base e norteamento do conhecimento seja como alicerce
movediccedilo e desorientador em sua histoacuteria imanentemente contraditoacuteria a um
tempo auto-constituinte e auto-dissolutora de si proacutepria Numa palavra parece
que a aproximaccedilatildeo dos seres ou entes vale dizer da realidade pura e simples
em sua complexa efetividade tem se mostrado como a mais difiacutecil e penosa de
todas as tarefas do homem Paradoxal sob o prisma de que os homens natildeo
vivem a natildeo ser no proacuteprio mundo real essa dificuldade natildeo eacute tatildeo improacutepria ou
inocente na medida em que se considera
1) que o homem soacute muito lentamente constitui seu proacuteprio mundo e a si
mesmo e em ritmo semelhante destes se apropria objetiva e subjetivamente
2) que essa dupla constituiccedilatildeoapropriaccedilatildeo do mundo e de si tem sido
operada sob processos infinitamente complexos e contraditoacuterios geradores de
matizados e superpostos niacuteveis de esclarecimento e ocultaccedilatildeo
Para aleacutem dessas dificuldades de fundo eacute necessaacuterio levar em conta
tambeacutem que nos dias atuais a pesquisa ontoloacutegica em especial nos seus
lineamentos mais evoluiacutedos - o estatuto ontoloacutegico marxiano - se daacute em
contexto histoacuterico amplamente desfavoraacutevel tanto no que diz respeito agrave histoacuteria
das formaccedilotildees reais quanto agravequela das formaccedilotildees ideais
De tal modo que poder-se-ia dizer agora parafraseando Marx de A
Sagrada Famiacutelia a propoacutesito de Szeliga que as proposituras ontoloacutegicas
dominantes no seacuteculo XX convertem em misteacuterios o que satildeo verdadeiras
4
trivialidades Sua arte natildeo consiste em revelar o oculto mas ocultar o
revelado[ii]
Em suma para dar iniacutecio ao delineamento da histoacuteria da ontologia eacute
preciso em primeiro lugar abandonar sua pretensatildeo infantil agrave atemporalidade e
se dar conta de que seja compulsoriamente histoacuterica de que se faz no tempo
tatildeo contraditoriatmente quanto a proacutepria entificaccedilatildeo de seu histoacuterico agente
Em segundo lugar Chasin considerava inadiaacutevel reprocessar a
decifraccedilatildeo ou o entendimento de Marx em determinaccedilatildeo reciacuteproca com as
vicissitudes da histoacuteria da ontologia na tentativa de ultrapassar as derrotas
sofridas ao longo dos uacuteltimos 150 anos e principalmente a partir do
entendimento efetivo do pensamento marxiano e tambeacutem do atual
desenvolvimento do capital redimensionar a perspectiva dos alvos e rumos
teoacutericos e praacuteticos a exercitar no presente e levar a efeito no futuro
O debate dito ontoloacutegico do seacuteculo XX girou em torno de conhecido
conjunto de fontes Enquanto Hartmann com o volume I de sua Ontologia de
1934 eacute uma contraposiccedilatildeo agrave desontologizaccedilatildeo em geral e agraves novas tendecircncias
do seacuteculo principalmente Heidegger feita do ponto de vista
fenomenoloacutegiconeokantiano Eacute Gilson eacute a resposta neotomista no interior da
filosofia francesa ao desafio posto por O Ser eo Nada (1943) de Sartre cujo
sub-tiacutetulo ensaio de ontologia fenomenoloacutegica logo aponta para a sua afiliaccedilatildeo
a Husserl e o tributo pago de toda a maneira a Heidegger que o conduziram a
inviabilizaccedilotildees definitivas e irremissiacuteveis que natildeo desobriga todavia de
distinguir radicalmente seu propoacutesito e sua personalidade do autor de Ser e
Tempo (1926) dedicada a Edmund Husserl Em testemunho de Admiraccedilatildeo e
Amizade
De acordo com a posiccedilatildeo que Chasin veio assumir nos seus uacuteltimos
anos de vida nas muacuteltiplas diacutevidas contraiacutedas pelo marxismo no seacuteculo XX
figura precisamente esta ter entrado muito tardia e restritamente nessa
5
discussatildeo vale dizer soacute quando a vitoacuteria temporaacuteria jaacute havia pendido para o
outro lado natildeo apenas por sua exclusiva presenccedila na arena mas porque
condicionado e impulsionado pelo proacuteprio caraacuteter de nossos tempos Os arautos
que se impuseram satildeo muito conhecidos tomaram o espaccedilo sem ter que
enfrentar o adversaacuterio efetivo uacutenico capaz de contraditar e oferecer alternativa
Este em vez disso perdeu-se sem luta sucumbiu agrave linha dominante do
cientificismo e acabou junto com os melhores tambeacutem perdido nesse campo
Nem eacute preciso referir o leste europeu mas com o politicismo generalizado o
marxismo se perdeu inclusive com os melhores que o seacuteculo produziu
Apenas em fins da deacutecada de 60 quando tudo estava desabando
Lukaacutecs de traveacutes se deu conta do misteacuterio Eacute muito significativo que nesse
despertar obliacutequumlo tenha tido que se voltar agrave refutaccedilatildeo entre outros de
Heidegger quando este escrever seu livro principal no miacutenimo em parte em
oposiccedilatildeo a Histoacuteria e Consciecircncia de Classe (textos de 1919-22) Eacute igualmente
sintomaacutetico que soacute tenha retomado deliberadamente a preocupaccedilatildeo ontoloacutegica
ao final da vida e sucumbido ao objeto em obra inconclusa motivada acima de
tudo pelo vieacutes excecircntrico de conferir poder regenerador agrave eacutetica Mas eacute sabido
que junto com seu meacuterito natildeo pereceu sozinho Por exemplo onde estatildeo
Hartman Gilson e ateacute mesmo Sartre
As dificuldades para o devido enfrentamento da questatildeo ontoloacutegica hoje
satildeo enormes e jaacute eram conhecidas por Lukaacutecs muito embora o filoacutesofo huacutengaro
morto em 1971 natildeo tenha assistido o pleno triunfo de concepccedilotildees que
consagram o homem derrelito denominaccedilatildeo essa empregada por ele mesmo ao
se reportar a Heidegger por exemplo
Tais dificuldades grosso modo poderiam ser atribuiacutedas inicialmente agraves
tendecircncias que tecircm como ponto de partida o criticismo kantiano que se
impuseram na viragem do seacuteculo XIX para o XX com a reduccedilatildeo da filosofia ao
circuito da problemaacutetica do conhecimento
6
Embora se possa assim considerar o criticismo kantiano como uma
espeacutecie de divisor de aacuteguas natildeo se deve obliterar o fato de que com a
metafiacutesica claacutessica ou qualquer uma de suas variantes antecedentes ou
subsequumlentes sob o pretexto de alcanccedilar a priori a certeza cognitiva gera-se
uma grave distorccedilatildeo no plano teoacuterico pela qual o ente eacute perdido para sempre
Para evitar tal descaminho Chasin propotildee o designativo posiccedilatildeo ontoloacutegica
pois com ela pretende tambeacutem pelo menos precaver contra a unilateralidade
decorrente da postura gnoseoloacutegica (sempre uma forma meramente
especulativa a respeito da morfologia do funcionamento ou seja da
organizaccedilatildeo e atividade da subjetividade) instigando e se rigorosamente
praticada orientando com rigor a pensar as coisas em seus proacuteprios nexos em
direccedilatildeo a uma totalidade mais plena de determinaccedilotildees A expressatildeo pretende
pois sinalizar e induzir agrave praacutetica intelectual de caraacuteter ontoloacutegico concebida em
sua forma mais consistente e consequumlente
Chasin pois pretendeu recuperar o sentido de ontologia enquanto
consideraccedilatildeo daquilo que eacute em sua efetividade Natildeo alguma distorccedilatildeo ou
dissoluccedilatildeo do ente enquanto ente seja sob sua forma do sentido do ente do
ser da apariccedilatildeo ou qualquer outra variaacutevel do tipo que embora possam incluir
dimensotildees do sensiacutevel sempre compreendem implicam ou tecircm por condiccedilatildeo de
possibilidade um sujeito mesmo que este seja o obervador da produccedilatildeo de
representaccedilotildees de caraacuteter racional Estudo pois das coisas em sua
independecircncia em sua exterioridade em face de possiacuteveis relaccedilotildees praacuteticas e
teoacutericas em que estatildeo ou possam vir a estar presentes inclusive aquelas pelas
quais em gecircnero superior de entificaccedilatildeo as coisas satildeo postas ou engendradas
De tal sorte que ainda e mesmo que todo o plano cognitivo possa ou
tenha de ser impugnado que toda ciecircncia possa ou tenha que ser posta em
duacutevida e considerada simples ilusatildeo ou equiacutevoco ou ter seu acircmbito reduzido agrave
pura convenccedilatildeo resta o fundamental o universo da praacutetica ou da vida vivida em
sua qualidade de confirmaccedilatildeo da dupla certeza da existecircncia do mundo e dos
homens e enquanto tal tem de ser reconhecido como ponto de partida da
7
intenccedilatildeo ontoloacutegica cujo propoacutesito eacute se constituir em base conceitual de sua
dilucidaccedilatildeo
Ainda no contexto da afirmaccedilatildeo da posiccedilatildeo ontoloacutegica e rejeiccedilatildeo seja
do vieacutes gnosioloacutegico ou cientificista seja das concepccedilotildees reinantes ditas
ontoloacutegicas Chasin de modo provocativo indaga Por que a foacutermula simples
do cogito eacute mais evidente ou funcional para efeito de fundamentaccedilatildeo do que a
evidecircncia do complexo sensiacutevel do gozo Por que a evidecircncia do cogito - o
pensamento do indiviacuteduo isolado - eacute superior agrave evidecircncia do existir que inclui a
presenccedila e a relaccedilatildeo viva dos outros e das coisas Chasin continua na mesma
direccedilatildeo no questionamento da pretensa superioridade do cogito indagando o
quecirc se esconde sob ela e acrescenta O cogito o truque cartesiano eacute a
conquista da certeza agrave custa de trecircs absurdidades o cogito desencarnado a
encarnaccedilatildeo divina da perfeiccedilatildeo e o mundo reduzido agrave extensatildeo A essas trecircs
conquistas digamos assim Chasin denomina de verdade alienada isto eacute
verdade emergente da subjetividade na forma da alienaccedilatildeo
A exercitaccedilatildeo ontoloacutegica ao contraacuterio assume como criteacuterio analiacutetico a
determinaccedilatildeo de que o objeto maturado eacute a chave do esclarecimento de suas
formas precedentes[iii] desde as embrionaacuterias ateacute as mais elaboradas que
antecedem no tempo sua fisionomia acabada Portanto a determinaccedilatildeo
marxiana do objeto maturado eacute produto desse espiacuterito teoacuterico pois soacute faz
sentido em posicionamento ontoloacutegico ou seja em reconhecimento do grau
constitutivo em que se encontra a coisa examinada
Segundo Chasin ainda Aristoacuteteles teve grande meacuterito em sua
propositura de uma filosofia primeira - base ou fundamento para a constituiccedilatildeo
das ciecircncias particulares - mas que por sua resoluccedilatildeo (de caraacuteter platocircnico
conforme jaacute demonstrara Eacute Gilson) e por seus pretendidos atributos ahistoacutericos
- categorias eternas e absolutas imutaacuteveis e perenes - constitui um modo
involuntaacuterio de elaboraccedilatildeo especulativa apesar de seu intento originaacuterio de
conhecer o efetivamente existente o ente enquanto ente Tais limites do intento
8
aristoteacutelico numa linha de argumentaccedilatildeo que confere prioridade agrave realidade
soacutecio-histoacuterica na produccedilatildeo de viabilidades ou inviabilidades teoacutericas e de sua
consequumlente explicaccedilatildeo eram vistos por Chasin como limites produzidos pelo
proacuteprio tempo grego sumariados a seguir
1) praacutetica humano-societaacuteria incipiente e acanhada que ganhou no
artigo O Futuro Ausente beliacutessima caracterizaccedilatildeo inspirada no Marx das
Formen Imaturaccedilatildeo natural e caracteriacutestica das remotas formas sociais em que
a propriedade da terra e a agricultura constituiacuteam a base da atividade material
tendo por objetivo a produccedilatildeo valores de uso ou seja a reproduccedilatildeo dos
indiviacuteduos em peculiares e bem determinadas relaccedilotildees com a comunidade[iv]
onde por via de consequumlecircncia indiviacuteduo e genecircro satildeo imediata e
transparentemente inseparaacuteveis e suas relaccedilotildees traduzem essa unidade
fundamental tornando desconhecida e impensaacutevel qualquer tipo de cissura que
contraponha ou menos ainda torne excludentes entre si as figuras de sua
polaridade[v] Mas a essa dimensatildeo positiva - sintomaticamente tatildeo atraente nos
dias atuais - corresponde uma negativa que Chasin esclarece na sequumlecircncia
todas as formas em que a comunidade pressupotildee sujeitos em determinada
unidade objetiva com as condiccedilotildees da atividade produtiva ou reciprocamente
nas quais uma especiacutefica existecircncia subjetiva faz com que a proacutepria comunidade
seja pressuposta como condiccedilatildeo de produccedilatildeo todas elas diz Marx
correspondem necessariamente e por princiacutepio a um desenvolvimento limitado
das forccedilas produtivas[vi]
2) Consequumlentemente impossibilidade para conceber a historicidade e
a contraditoriedade como categorias fundamentais do ser - que estrangulam a
mais precisa e universal por isso mesmo vaacutelida hoje e para sempre das
formulaccedilotildees atinentes agrave natureza e ao propoacutesito da ontologia
Meacuteritos e limites da filosofia primeira que apenas seratildeo realizados e
superados depois de um longo itineraacuterio repleno de contraposiccedilotildees internas
9
pelos lineamentos perfilados por Marx que tambeacutem herda criticamente
dimensotildees da filosofia moderna - do renascimento ao neohegelianismo
Desse modo com o objetivo de sumariar preliminarmente os conteuacutedos
dessa trajetoacuteria que Marx assimila por via criacutetica Chasin indica alguns deles
sem pretensatildeo alguma de esgotaacute-los
1) Do Renascimento - a infinitude do universo e o espiacuterito da
concepccedilatildeo do homem como o uacutenico ser aberto - existente e conhecido capaz
na potecircncia de seus atributos de conhecer e configurar a si e a seu mundo
ambos entendidos e tomados em sua naturalidade objetividade e o primeiro na
infinitude de sua essecircncia ativa
2) Do materialismo francecircs e inglecircs e do Iluminismo - a ruptura com a
conduta especulativa metafiacutesica e com o espiacuterito de sistema em filosofia que eacute
concebido como freio e obstaacuteculo agrave razatildeo Por meio dessa desobstruccedilatildeo o
iluminismo pode universalizar a filosofia como meio de toda verdade - natural e
espiritual - e ela passa a se voltar agraves tarefas praacuteticas donde a possibilidade e o
escopo de estabelecer a vida humana de modo racional Em outros termos
reconhece no pensamento o poder e o papel de organizar a vida o pensamento
deve ter papel analiacutetico mas tambeacutem fazer nascer a ordem cuja necessidade
ela concebeu[vii] Em contrapartida os limites do pensamento iluminista satildeo
sinteticamente os seguintes acentuaccedilatildeo unilateralizante da racionalidade
herdada do renascimento e distorcida pelo racionalismo do seacuteculo XVIII Aleacutem
disso tem-se o naturalismo vale dizer a ontologia do social demasiadamente
colada agrave ontologia da natureza embora natildeo se possa deixar de reconhecer que
frente ao abstracionismo metafiacutesico trata-se de um meacuterito pretender uma
ontologia ligada agrave natureza que em verdade eacute idealizada Talvez o melhor
exemplo dessa tradiccedilatildeo seja justamente Feuerbach
3) Do criticismo - a impossibilidade de uma ontologia como saber do
em si ou seja do ente enquanto ente pela via do absolutismo racional
10
dedutivista Em Kant em verdade tem-se a impossibilidade de uma ontologia
em Marx ao reveacutes tem-se apenas tal recusa agrave especulaccedilatildeo mas natildeo a
impossibilidade de conhecer o ente enquanto ente vale dizer Marx aceita o
espiacuterito da criacutetica kantiana ao conhecimento absoluto mas natildeo sua resultante
sistemaacutetica a sua vedaccedilatildeo ao conhecimento das coisas enquanto tais
4) Do hegelianismo - a concepccedilatildeo histoacuterica do ser portanto de sua
contrariedade bem como a natureza aproximativa do processo de
conhecimento ao mesmo tempo em que recusa o invoacutelucro miacutestico do
pensamento hegeliano - a dialeacutetica autocircnoma da razatildeo como demiurgo do real
ou da efetividade sensiacutevel ou seja refuta decidamente seu caraacuteter
especulativo
5) Do neohegelianismo - a problemaacutetica do homem e muito
especificamente duas contribuiccedilotildees de Feuerbach a criacutetica agrave especulaccedilatildeo e os
lineamentos mais gerais do ser soacute enquanto ser sensiacutevel ou objetivo (dimensotildees
de uma ontologia geral em seu niacutevel mais abstrato) Mas ao lado desse
aspecto positivo do pensamento feuerbachiano natildeo eacute possiacutevel deixar de
assinalar a objeccedilatildeo fundamental dirigida a ele por Marx sua concepccedilatildeo
naturalista do homem vale dizer sua incapacidade de o determinar como ser
social Assim em Feuerbach o homem eacute sensiacutevel objetivonatural e natildeo
objetivo-social - a grande descoberta marxiana
Grande descoberta que eacute mais amplamente avaliada quando se
considera o conjunto das linhas manifestas pelos principais representantes do
neohegelianismo B Bauer formulador de uma concepccedilatildeo do homem como
auto-consciecircncia racional M Stirner com a elevaccedilatildeo do egoiacutesmo agrave condiccedilatildeo de
essecircncia humana Feuerbach com a concepccedilatildeo naturalista do homem centrada
no amor Nesse cenaacuterio somente Marx comparece com a descoberta da
sociabilidade como substacircncia constitutiva do homem - e natildeo meramente uma
essecircncia imutaacutevel mas histoacuterica e contraditoacuteria produzida e reproduzida pela
proacutepria atividade sensiacutevel dos homens
11
De sorte que do ente enquanto ente aristoteacutelico determinado por sua
forma substancial eterna ao ser social marxiano compreendido em suas
mudanccedilas categoriais - eacute do que consiste a histoacuteria - se vai de uma filosofia
primeira que terminou por sua resoluccedilatildeo originaacuteria na forma de um saber
absoluto a um saber histoacuterico de base que se desenvolve pela infinitude de
aproximaccedilotildees empreendidas em direccedilatildeo ao absoluto entendido pura e
simplesmente como completude ou totalidade que praticamente nunca se
realiza porque desnecessaacuterio para o saber ao qual bastam completudes mais
modestas e ainda mais como saber para a praacutetica
De modo que a filosofia primeira de configuraccedilatildeo marxiana eacute antes de
tudo a afirmaccedilatildeo da objetividade do mundo e a possibilidade ser conhecido
possibilidade que eacute soacutecio-historicamente determinada exercendo a funccedilatildeo de
base e guia para a ciecircncia da histoacuteria especificamente como ontologia regional
do ser social e que nutre das ciecircncias e a elas responde tanto quanto elas
mesmas tem de responder aos lineamentos ontoloacutegicos pelos quais se guiam
mas aos quais natildeo tomam como coaacutegulos de saber imutaacutevel De sorte que
ontologia e ciecircncia se potencializam e se criticam reciacuteproca e
permanentemente
Tambeacutem de acordo com Chasin por essas razotildees a ontologia
marxiana natildeo eacute uma resoluccedilatildeo de caraacuteter absoluto nos moldes do sistema
convencional mas a condiccedilatildeo de possibilidade de resoluccedilatildeo do saber Eacute em
outras palavras um estatuto movente e movido de cientificidade orienta e eacute
orientado pela ciecircncia e pela praacutetica universal dos homens Orienta e eacute
orientada guia e eacute guiada corrige e eacute corrigida Ou seja natildeo eacute um absoluto
inquestionaacutevel uma certeza estabelecida por deduccedilatildeo a partir de axiomas de
uma vez para sempre Mesmo porque a certeza cognitiva natildeo pode estar no
ponto de partida mas compreendida como alvo de uma busca permanente
procura intensiva e extensiva cuja infinitude eacute posta a cada momento entre
parecircnteses no qual o grau de certeza alcanccedilado eacute assumido como realizaccedilatildeo
maacutexima tendo por limites as possibilidades do tempo ou cenaacuterio histoacuterico grau
12
a ser confirmado ou ampliado ou ao inveacutes restringido na parte ou descartado
no todo posteriormente com todas as suas implicaccedilotildees correlatas
Em suma quando se utiliza a expressatildeo posiccedilatildeo ontoloacutegica e natildeo
perspectiva oacutetica prisma ou ponto de vista pretende-se remeter a lugar e agraves
coisas ou seja o reconhecimento do mundo como multiverso de entes reais
objetivos e que por isso mesmo faceiam o observador praacutetico ou teoacuterico natildeo
dependendo deste para existir em face do qual satildeo independentes Eacute
finalmente o reconhecimento da prioridade das coisas nas relaccedilotildees cognitivas
sem desconhecer eacute claro o caraacuteter ativo do investigador
Quando Chasin procura enfatizar o reconhecimento noccedilatildeo
imediatamente conexa a de posiccedilatildeo ontoloacutegica eacute por que aquela tem a
vantagem de colocar em primeiro lugar o caraacuteter natildeo puramente teoacuterico
contemplativo mas sobretudo praacutetico[viii] da aproximaccedilatildeo ao ente aleacutem da
natureza da operaccedilatildeo mental que designa - constataccedilatildeo ou recogniccedilatildeo vale
dizer a admissatildeo de algo a respeito do qual o discurso se pronuncia como forma
imediata de representaccedilatildeo
Relevar o caraacuteter praacutetico de aproximaccedilatildeo ao ente ou em outras
palavras partir ou dar prioridade agrave praacutetica significa por seu turno partir do
caraacuteter essencial do ser do homem por sua exteriorizaccedilatildeo operativa no mundo
que confirma sua forma de vida ou modo de existecircncia Quer dizer eacute um ponto
de partida desde logo sob criteacuterio ontoloacutegico ou seja que considera a
efetividade ocircntica do homem e do mundo de tal sorte que ambos satildeo
reconhecidos enquanto atividade sensiacutevel Caminho que tem o meacuterito de evitar
as vias reflexas[ix] como tambeacutem os engenhos e supostos dos encantamentos
especulativos como cogito sujeito transcendental ou os arqueacutetipos
generalizando uma expressatildeo marxiana os misticismos loacutegicos que nunca
deixam de mostrar sua condiccedilatildeo de artifiacutecios por mais rigorosos e envolventes
que sejam tanto que podem sempre ser contestados de algum modo ao passo
que os indiviacuteduos vivos e ativos os pressupostos dos quais Marx parte em A
13
Ideologia Alematilde natildeo podem nunca ser recusados a natildeo ser na fantasia e sob
pena de cancelar todo e qualquer andamento reflexivo
Em suma reconhecimento ontopraacutetico significa pois tomar como
ponto de partida a praacutetica - desde a praacutetica cotidiana agrave praacutetica cientiacutefica de ponta
- de um tempo dado
O plano ontopraacutetico jaacute bem delineado no texto de 1995 ganha nos
anos seguintes sucessivas correccedilotildees por parte do autor a ponto de se tornar o
eixo a partir do qual Chasin faz a criacutetica das Teorias da Fundamentaccedilatildeo ou
como ele as denomina ironicamente A Querela da Fundamentaccedilatildeo
A esse respeito costumava ele indagar O que eacute um fundamento Uma
Teoria da Subjetividade ou Uma Teoria da Objetividade
Se o fundamento for considerado a partir de uma teoria da
subjetividade por onde comeccedilar Pelo aparato sensorial como no empirismo
Ou pela consciecircncia ou coisa que o valha como o cogito cartesiano a
autoconsciecircncia a razatildeo ou as formas a priori do entendimento Ou ainda uma
teoria da mente
Ainda no plano do fundamento subjetivo poder-se-ia partir da
experiecircncia da vivecircncia do vivido Neste caso o vivido seria o preacute-teoreacutetico
mas enquanto experiecircncia existencial isto eacute as vivecircncias do indiviacuteduo isolado
em experiecircncia aleatoacuteria fortuita acidental
Mas se o fundamento for uma Teoria da Objetividade por onde
comeccedilar Pelos fenocircmenos empiacutericos Mas nesse caso natildeo terminariacuteamos
apenas no fundamento psicoloacutegico isto eacute teriacuteamos o psicologismo como
fundamento da verdade
14
E se partiacutessemos do todo concreto Natildeo findariacuteamos numa visatildeo
caoacutetica e abstrata de conjuntos indeterminados desamparados na companhia
de um punhado de abstraccedilotildees razoaacuteveis e irrazoaacuteveis
Feitas tais indagaccedilotildees Chasin conclui de modo enfaacutetico Toda peticcedilatildeo
de fundamento todo discurso por um fundamento estaacute encerrado na esfera
teoacuterica Aleacutem do mais todo discurso de fundamentaccedilatildeo pretende e implica uma
certeza ou seja de um modo ou de outro a suposiccedilatildeo de um saber absoluto
ainda que um simples momento do saber absoluto Vale dizer o discurso da
fundamentaccedilatildeo desemboca de algum modo na razatildeo especulativa Em outras
palavras implica algo que transcende a proacutepria natureza do saber que eacute um
processo infinito de aproximaccedilotildees
Para Chasin o reconhecimento do ontopraacutetico tem a vantagem de
escapar agrave querela da fundamentaccedilatildeo na medida em que parte da experiecircncia
real melhor dizendo da praacutetica real natildeo de uma experiecircncia isolada
arbitrariamente natildeo da experiecircncia aleatoacuteria da suposta existecircncia existencial
dos indiviacuteduos isolados dos indiviacuteduos em derreliccedilatildeo
O universo ontopraacutetico eacute o necessariamente vivido para que qualquer
pergunta possa se dar Eacute portanto a esfera preacute-teoreacutetica esfera que antecede
qualquer teoria Esfera sem a qual natildeo haacute vida humana e portanto sem a qual
natildeo pode haver qualquer pergunta teoacuterica
A reflexatildeo que tem como ponto de partida o ontopraacutetico estabelece
assim um pressuposto concreto (e natildeo uma verdade ideada) do qual natildeo posso
me afastar a natildeo ser na imaginaccedilatildeo
Em siacutentese a esfera ontopraacutetica representa o complexos dos homens
vivos e ativos A partir dessa abstraccedilatildeo razoaacutevel - o ontopraacutetico - pode-se
encontrar jaacute numa analiacutetica de desentranhamento desse complexo real o
devido lugar da ontologia da epistemologia e da ciecircncia da histoacuteria que
compreende dois grandes ramos natureza e sociedade
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Em outras palavras sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico torna-se
aleatoacuteria a localizaccedilatildeo que se confere tanto ao ontoloacutegico quanto ao epistecircmico
A opccedilatildeo por um deles se torna uma arbitrariedade teoacuterica e eacute justamente isto
que gera a querela da fundamentaccedilatildeo pois a decisatildeo fica submersa ao plano
teoacuterico ao jogo dos argumentos agrave ambivalecircncia do logos que eacute irresolutivo
Sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico parte-se assim de imediato da
teoria e natildeo do ser que faz da teoria ou deste como uma abstraccedilatildeo da
inteligibilidade ou seja de uma faculdade abstraiacuteda do ser que a possui
gerando com isso um absurdo ontoloacutegico
Eacute portanto a partir da analiacutetica do ontopraacutetico pelo reconhecimento de
seus traccedilos categoriais que tem iniacutecio a elaboraccedilatildeo ontoloacutegica Ou seja a
ontologia nasce como reflexatildeo conscientizaccedilatildeo conceituaccedilatildeo do ontopraacutetico
enquanto primeiro objeto da ontologia que a partir daiacute se encaminha em
direccedilatildeo agrave criacutetica - em termos de sua necessidade e loacutegica especiacutefica - do proacuteprio
ontopraacutetico isto eacute do complexo dos objetos reais aiacute incluiacutedo o homem
Resta ainda em relaccedilatildeo agrave problemaacutetica geral em tela aflorar a questatildeo
da adequatio tal como era tematizada tambeacutem em seus cursos
Polemizando com a denominaccedilatildeo de realismo comumente utilizada
para denominar proposituras que conferem prioridade ao mundo objetual
Chasin afirmava que haacute realismo - antigo - quando eacute suposto que a ordem da
razatildeo agrave idecircntica a ordem do real e que a partir de axiomas por meios racionais-
dedutivos embuiacutedos do espiacuterito de sistema se possa estabelecer a verdade do
mundo
Em Marx entretanto a ordem das coisas e da razatildeo satildeo distintas (um
exemplo expressivo desta postura marxiana pode ser encontrada na famosa
Introduccedilatildeo de 57) ambas mutaacuteveis e processuais - unidade da desidentidade
entre ser e saber Assim o mundo natildeo pode ser deduzido racionalmente mas
reproduzido sob forma de ideacuteia por meio de aproximaccedilotildees - empiacuterico abstrato
16
concreto - num processo intensivo e extensivo historicamente condicionado
possibilitado ou impedido - na dependecircncia que fica da maturaccedilatildeo do objeto e
do posicionamento do sujeito O processo mimeacutetico eacute portanto reproduccedilatildeo
conceitual de efetividades donde se lida com duas ordens de formaccedilotildees real e
ideal A reproduccedilatildeo conceitual apresenta portanto sua proacutepria loacutegica mas no
interior da determinaccedilatildeo soacutecio-histoacuterica do pensamento de modo que uma
teoria do conhecimento (morfologia e dinacircmica da subjetividade in abstratu e
imutaacutevel) eacute incapaz de explicar o processo cognitivo pois a faculdade humana
da forccedila da abstraccedilatildeo depende das possibilidades oferecidas pela
determinaccedilatildeo social do pensamento que por sua vez se manifesta e se
configura pelo desenvolvimento dos objetos e da praacutetica humana que sobre eles
tem incidecircncia
Donde a franca afirmaccedilatildeo marxiana da possibilidade de conhecer natildeo
se confunde com a simplicidade e facilidade da concepccedilatildeo realista nem mesmo
no plano da ingenuidade cotidiana desde logo porque a atividade cotidiana -
que estaacute para aleacutem da ingenuidade ou lanccedila os sujeitos para aleacutem da
ingenuidade - eacute em si um complexo rico e desafiador matrizador inclusive da
intentio recta atitude natural e necessaacuteria da esfera ontopraacutetica
Haacute portanto que distinguir as grandes diferenccedilas ontoloacutegicas entre o
estatuto marxiano e a ontologia realista Na primeira a adequatio digamos
assim eacute correlaccedilatildeo entre formaccedilatildeo real e formaccedilatildeo ideal duas ordens distintas
de configuraccedilatildeo Em outras palavras eacute correlaccedilatildeo conceitual entre entificaccedilatildeo
concreta e reproduccedilatildeo conceitual Em suma a reproduccedilatildeo conceitual nada mais
eacute do que transposiccedilatildeo agrave cabeccedila ordenada pelos nexos do real na forma e pelos
meios da proacutepria atividade mental
I - Tomando Marx por Base e por Ponto de Chegada
17
Considerando como ponto de referecircncia as consideraccedilotildees
desenvolvidas por Marx em O Capital especificamente sobre a dificuldade
encontrada pela humanidade na compreensatildeo do valor ao longo de dois
milecircnios - de Aristoacuteteles a Ricardo - pode-se sustentar segundo Chasin que
um fenocircmeno muito similar a este se produziu no que tange agrave determinaccedilatildeo do
ser ou seja da(s) matriz(es) da(s) realidade(s) ou seja da efetividade
Tomemos as passagens em questatildeo que se encontram no Prefaacutecio agrave
Primeira Ediccedilatildeo de O Capital Todo comeccedilo eacute difiacutecil isso vale para qualquer
ciecircncia A forma do valor cuja figura acabada eacute a forma do dinheiro eacute muito
simples e vazia de conteuacutedo Mesmo assim o espiacuterito humano tem procurado
desvendaacute-la (ergruumlden) em vatildeo haacute mais de 2000 anos enquanto por outro lado
teve ecircxito ao menos aproximado a anaacutelise de formas muito mais complicadas e
replenas de conteuacutedo Por quecirc Porque o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de
estudar do que a ceacutelula do corpo Aleacutem disso na anaacutelise das formas econocircmicas
natildeo podem servir nem o microscoacutepio nem reagentes quiacutemicos A forccedila da
abstraccedilatildeo deve substituir a ambos Para o leigo a anaacutelise parece se perder
em pedantismo Trata-se efetivamente de pedantismo mas daquele de que se
ocupa a anatomia microscoacutepica
De acordo com Chasin eacute necessaacuterio reter os seguintes noacutedulos
significativos da citaccedilatildeo acima
1) todo iniacutecio de uma ciecircncia eacute difiacutecil donde o princiacutepio da ontologia o
princiacutepio da ciecircncia deve ser o mais difiacutecil de todos
2) haacute grande dificuldade na compreensatildeo da forma do valor que eacute um
objeto simples e vazio de conteuacutedo
3) haacute ecircxito maior na anaacutelise de formas mais complicadas e replenas de
conteuacutedo
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Na mesma citaccedilatildeo Marx enuncia os motivos de tal dificuldade
1) o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de estudar do que a ceacutelula do
corpo
2) meacutetodos experimentais natildeo satildeo aplicaacuteveis a esse tipo de forma
3) a analiacutetica dessa forma pela forccedila da abstraccedilatildeo deve tomar o lugar
da observaccedilatildeo empiacuterica e experimental
4) anaacutelise voltada agrave anatomia microscoacutepica da forma estudada
A partir dessas indicaccedilotildees colhidas no texto de Marx Chasin elabora
um esboccedilo para fins unicamente didaacuteticos em que busca transpassaacute-las para a
proacutepria questatildeo ontoloacutegica afirmando o que se segue
1) o iniacutecio difiacutecil da ontologia perdurou tambeacutem por mais de 2000
anos trajetoacuteria em que se observa tateios imprecisos caracterizados por um
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo ateacute chegar em Marx Tal
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo revela por seu rumo
imanentemente contraditoacuterio por seus caminhos e descaminhos histoacutericos a
dificuldade e a longa incapacidade na formulaccedilatildeo precisa de seu objeto e
alcance ou seja de sua natureza e propoacutesito - de sua funccedilatildeo orientadora e
sustentadora no plano teoacuterico e de sua origem praacutetica preacute-teoreacutetica
2) reconhecimento ontopraacutetico das formas dos seres e analiacutetica da
forma do ser apenas por meio da forccedila da abstraccedilatildeo no reconhecimento
ontopraacutetico os seres satildeo reconhecidos como substantivos e nesse caso ateacute
certo ponto vale para a observaccedilatildeo espontacircnea e observaccedilatildeo comum pois o
desvendamento completo exige forccedila de abstraccedilatildeo como verbo ( o ato de ser
de Gilson) soacute a forccedila da abstraccedilatildeo daiacute a facilidade para se cair no
abstrativismo
19
Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
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De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
22
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
30
realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
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tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
36
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
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de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
versus ontologia desde o renascimento ateacute Kant o plano de pesquisa incluiacutea a
anaacutelise das posiccedilotildees ontoloacutegicas dos preacute-socraacuteticos ateacute Heidegger bem como
um conjunto de glosas a E Husserl N Hartmann E Gilson E Cassirer G
Lukaacutecs e E Bloch
Mas os desafios teoacutericos que o tema da ontologia acarreta implicaram
que a atenccedilatildeo de Chasin tambeacutem se voltasse agravequilo que teria sido a sua grande
descoberta original - como veremos a seguir - o traccedilo distintivo da histoacuteria da
ontologia a sua dissoluccedilatildeo e seu colapso
Na abertura de seu uacuteltimo curso no Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em
Filosofia da UFMG asseverou Creio que possa ser transposto agrave ontologia o que
Heine afirmou a propoacutesito do cristianismo ainda natildeo haacute nenhuma histoacuteria da
ontologia porque ateacute agora natildeo foi compreendido claramente no que consiste a
posiccedilatildeo ontoloacutegica e porque superficialidades foram tomadas pelo essencial
Antecipo sob essa analogia que superficial em ontologia eacute pressupor
que ela se caracterize e resolva por andamentos autocircnomos e a priori da razatildeo
o que tem induzido a conferir grande importacircncia agraves querelas da
fundamentaccedilatildeo isto eacute que a ontologia por natureza seja um movimento
cognitivo desenvolvido por via de alguma forma de razatildeo auto-sustentada
Superficialidade que se manifesta porque a ontologia por caraacuteter propoacutesitos e
ateacute mesmo por definiccedilatildeo claacutessica tem por alvo o reconhecimento do por-si das
coisas ou em versatildeo jaacute reduzida e desnaturada pela oacutetica gnoseoloacutegica do em
si uma vez que o para-noacutes soacute pode ser um consequumlente ou resultante em toda
e qualquer ordem de representaccedilatildeo um derivado que sob diapasatildeo
gnosioloacutegico eacute afetado ou condicionado pela proacutepria relaccedilatildeo cognitiva ou seja
por uma operaccedilatildeo que redunda na perda do atributo fundamental do por-si isto
eacute de sua prioridade em face de qualquer relaccedilatildeo com o sujeito praacutetico e teoacuterico
De outra parte a histoacuteria real da ontologia eacute a parte mais antiga e
intrincada da filosofia pois esta nasceu por demanda de uma questatildeo de caraacuteter
3
ou espiacuterito ontoloacutegico de que eacute feito o mundo perguntavam os preacute-socraacuteticos
qual eacute o elemento primordial do universo
Nascida como ontologia sem que tivesse esse nome sem que tivesse
outro nome que natildeo o de filosofia esta foi por cerca de dois milecircnios e meio
antes de tudo ontologia (metafiacutesica) ou explicitamente desde Platatildeo e
Aristoacuteteles ateacute Leibniz-Cristian Wolff a ontologia foi a atmosfera e o andaime da
reflexatildeo Seja como base e norteamento do conhecimento seja como alicerce
movediccedilo e desorientador em sua histoacuteria imanentemente contraditoacuteria a um
tempo auto-constituinte e auto-dissolutora de si proacutepria Numa palavra parece
que a aproximaccedilatildeo dos seres ou entes vale dizer da realidade pura e simples
em sua complexa efetividade tem se mostrado como a mais difiacutecil e penosa de
todas as tarefas do homem Paradoxal sob o prisma de que os homens natildeo
vivem a natildeo ser no proacuteprio mundo real essa dificuldade natildeo eacute tatildeo improacutepria ou
inocente na medida em que se considera
1) que o homem soacute muito lentamente constitui seu proacuteprio mundo e a si
mesmo e em ritmo semelhante destes se apropria objetiva e subjetivamente
2) que essa dupla constituiccedilatildeoapropriaccedilatildeo do mundo e de si tem sido
operada sob processos infinitamente complexos e contraditoacuterios geradores de
matizados e superpostos niacuteveis de esclarecimento e ocultaccedilatildeo
Para aleacutem dessas dificuldades de fundo eacute necessaacuterio levar em conta
tambeacutem que nos dias atuais a pesquisa ontoloacutegica em especial nos seus
lineamentos mais evoluiacutedos - o estatuto ontoloacutegico marxiano - se daacute em
contexto histoacuterico amplamente desfavoraacutevel tanto no que diz respeito agrave histoacuteria
das formaccedilotildees reais quanto agravequela das formaccedilotildees ideais
De tal modo que poder-se-ia dizer agora parafraseando Marx de A
Sagrada Famiacutelia a propoacutesito de Szeliga que as proposituras ontoloacutegicas
dominantes no seacuteculo XX convertem em misteacuterios o que satildeo verdadeiras
4
trivialidades Sua arte natildeo consiste em revelar o oculto mas ocultar o
revelado[ii]
Em suma para dar iniacutecio ao delineamento da histoacuteria da ontologia eacute
preciso em primeiro lugar abandonar sua pretensatildeo infantil agrave atemporalidade e
se dar conta de que seja compulsoriamente histoacuterica de que se faz no tempo
tatildeo contraditoriatmente quanto a proacutepria entificaccedilatildeo de seu histoacuterico agente
Em segundo lugar Chasin considerava inadiaacutevel reprocessar a
decifraccedilatildeo ou o entendimento de Marx em determinaccedilatildeo reciacuteproca com as
vicissitudes da histoacuteria da ontologia na tentativa de ultrapassar as derrotas
sofridas ao longo dos uacuteltimos 150 anos e principalmente a partir do
entendimento efetivo do pensamento marxiano e tambeacutem do atual
desenvolvimento do capital redimensionar a perspectiva dos alvos e rumos
teoacutericos e praacuteticos a exercitar no presente e levar a efeito no futuro
O debate dito ontoloacutegico do seacuteculo XX girou em torno de conhecido
conjunto de fontes Enquanto Hartmann com o volume I de sua Ontologia de
1934 eacute uma contraposiccedilatildeo agrave desontologizaccedilatildeo em geral e agraves novas tendecircncias
do seacuteculo principalmente Heidegger feita do ponto de vista
fenomenoloacutegiconeokantiano Eacute Gilson eacute a resposta neotomista no interior da
filosofia francesa ao desafio posto por O Ser eo Nada (1943) de Sartre cujo
sub-tiacutetulo ensaio de ontologia fenomenoloacutegica logo aponta para a sua afiliaccedilatildeo
a Husserl e o tributo pago de toda a maneira a Heidegger que o conduziram a
inviabilizaccedilotildees definitivas e irremissiacuteveis que natildeo desobriga todavia de
distinguir radicalmente seu propoacutesito e sua personalidade do autor de Ser e
Tempo (1926) dedicada a Edmund Husserl Em testemunho de Admiraccedilatildeo e
Amizade
De acordo com a posiccedilatildeo que Chasin veio assumir nos seus uacuteltimos
anos de vida nas muacuteltiplas diacutevidas contraiacutedas pelo marxismo no seacuteculo XX
figura precisamente esta ter entrado muito tardia e restritamente nessa
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discussatildeo vale dizer soacute quando a vitoacuteria temporaacuteria jaacute havia pendido para o
outro lado natildeo apenas por sua exclusiva presenccedila na arena mas porque
condicionado e impulsionado pelo proacuteprio caraacuteter de nossos tempos Os arautos
que se impuseram satildeo muito conhecidos tomaram o espaccedilo sem ter que
enfrentar o adversaacuterio efetivo uacutenico capaz de contraditar e oferecer alternativa
Este em vez disso perdeu-se sem luta sucumbiu agrave linha dominante do
cientificismo e acabou junto com os melhores tambeacutem perdido nesse campo
Nem eacute preciso referir o leste europeu mas com o politicismo generalizado o
marxismo se perdeu inclusive com os melhores que o seacuteculo produziu
Apenas em fins da deacutecada de 60 quando tudo estava desabando
Lukaacutecs de traveacutes se deu conta do misteacuterio Eacute muito significativo que nesse
despertar obliacutequumlo tenha tido que se voltar agrave refutaccedilatildeo entre outros de
Heidegger quando este escrever seu livro principal no miacutenimo em parte em
oposiccedilatildeo a Histoacuteria e Consciecircncia de Classe (textos de 1919-22) Eacute igualmente
sintomaacutetico que soacute tenha retomado deliberadamente a preocupaccedilatildeo ontoloacutegica
ao final da vida e sucumbido ao objeto em obra inconclusa motivada acima de
tudo pelo vieacutes excecircntrico de conferir poder regenerador agrave eacutetica Mas eacute sabido
que junto com seu meacuterito natildeo pereceu sozinho Por exemplo onde estatildeo
Hartman Gilson e ateacute mesmo Sartre
As dificuldades para o devido enfrentamento da questatildeo ontoloacutegica hoje
satildeo enormes e jaacute eram conhecidas por Lukaacutecs muito embora o filoacutesofo huacutengaro
morto em 1971 natildeo tenha assistido o pleno triunfo de concepccedilotildees que
consagram o homem derrelito denominaccedilatildeo essa empregada por ele mesmo ao
se reportar a Heidegger por exemplo
Tais dificuldades grosso modo poderiam ser atribuiacutedas inicialmente agraves
tendecircncias que tecircm como ponto de partida o criticismo kantiano que se
impuseram na viragem do seacuteculo XIX para o XX com a reduccedilatildeo da filosofia ao
circuito da problemaacutetica do conhecimento
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Embora se possa assim considerar o criticismo kantiano como uma
espeacutecie de divisor de aacuteguas natildeo se deve obliterar o fato de que com a
metafiacutesica claacutessica ou qualquer uma de suas variantes antecedentes ou
subsequumlentes sob o pretexto de alcanccedilar a priori a certeza cognitiva gera-se
uma grave distorccedilatildeo no plano teoacuterico pela qual o ente eacute perdido para sempre
Para evitar tal descaminho Chasin propotildee o designativo posiccedilatildeo ontoloacutegica
pois com ela pretende tambeacutem pelo menos precaver contra a unilateralidade
decorrente da postura gnoseoloacutegica (sempre uma forma meramente
especulativa a respeito da morfologia do funcionamento ou seja da
organizaccedilatildeo e atividade da subjetividade) instigando e se rigorosamente
praticada orientando com rigor a pensar as coisas em seus proacuteprios nexos em
direccedilatildeo a uma totalidade mais plena de determinaccedilotildees A expressatildeo pretende
pois sinalizar e induzir agrave praacutetica intelectual de caraacuteter ontoloacutegico concebida em
sua forma mais consistente e consequumlente
Chasin pois pretendeu recuperar o sentido de ontologia enquanto
consideraccedilatildeo daquilo que eacute em sua efetividade Natildeo alguma distorccedilatildeo ou
dissoluccedilatildeo do ente enquanto ente seja sob sua forma do sentido do ente do
ser da apariccedilatildeo ou qualquer outra variaacutevel do tipo que embora possam incluir
dimensotildees do sensiacutevel sempre compreendem implicam ou tecircm por condiccedilatildeo de
possibilidade um sujeito mesmo que este seja o obervador da produccedilatildeo de
representaccedilotildees de caraacuteter racional Estudo pois das coisas em sua
independecircncia em sua exterioridade em face de possiacuteveis relaccedilotildees praacuteticas e
teoacutericas em que estatildeo ou possam vir a estar presentes inclusive aquelas pelas
quais em gecircnero superior de entificaccedilatildeo as coisas satildeo postas ou engendradas
De tal sorte que ainda e mesmo que todo o plano cognitivo possa ou
tenha de ser impugnado que toda ciecircncia possa ou tenha que ser posta em
duacutevida e considerada simples ilusatildeo ou equiacutevoco ou ter seu acircmbito reduzido agrave
pura convenccedilatildeo resta o fundamental o universo da praacutetica ou da vida vivida em
sua qualidade de confirmaccedilatildeo da dupla certeza da existecircncia do mundo e dos
homens e enquanto tal tem de ser reconhecido como ponto de partida da
7
intenccedilatildeo ontoloacutegica cujo propoacutesito eacute se constituir em base conceitual de sua
dilucidaccedilatildeo
Ainda no contexto da afirmaccedilatildeo da posiccedilatildeo ontoloacutegica e rejeiccedilatildeo seja
do vieacutes gnosioloacutegico ou cientificista seja das concepccedilotildees reinantes ditas
ontoloacutegicas Chasin de modo provocativo indaga Por que a foacutermula simples
do cogito eacute mais evidente ou funcional para efeito de fundamentaccedilatildeo do que a
evidecircncia do complexo sensiacutevel do gozo Por que a evidecircncia do cogito - o
pensamento do indiviacuteduo isolado - eacute superior agrave evidecircncia do existir que inclui a
presenccedila e a relaccedilatildeo viva dos outros e das coisas Chasin continua na mesma
direccedilatildeo no questionamento da pretensa superioridade do cogito indagando o
quecirc se esconde sob ela e acrescenta O cogito o truque cartesiano eacute a
conquista da certeza agrave custa de trecircs absurdidades o cogito desencarnado a
encarnaccedilatildeo divina da perfeiccedilatildeo e o mundo reduzido agrave extensatildeo A essas trecircs
conquistas digamos assim Chasin denomina de verdade alienada isto eacute
verdade emergente da subjetividade na forma da alienaccedilatildeo
A exercitaccedilatildeo ontoloacutegica ao contraacuterio assume como criteacuterio analiacutetico a
determinaccedilatildeo de que o objeto maturado eacute a chave do esclarecimento de suas
formas precedentes[iii] desde as embrionaacuterias ateacute as mais elaboradas que
antecedem no tempo sua fisionomia acabada Portanto a determinaccedilatildeo
marxiana do objeto maturado eacute produto desse espiacuterito teoacuterico pois soacute faz
sentido em posicionamento ontoloacutegico ou seja em reconhecimento do grau
constitutivo em que se encontra a coisa examinada
Segundo Chasin ainda Aristoacuteteles teve grande meacuterito em sua
propositura de uma filosofia primeira - base ou fundamento para a constituiccedilatildeo
das ciecircncias particulares - mas que por sua resoluccedilatildeo (de caraacuteter platocircnico
conforme jaacute demonstrara Eacute Gilson) e por seus pretendidos atributos ahistoacutericos
- categorias eternas e absolutas imutaacuteveis e perenes - constitui um modo
involuntaacuterio de elaboraccedilatildeo especulativa apesar de seu intento originaacuterio de
conhecer o efetivamente existente o ente enquanto ente Tais limites do intento
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aristoteacutelico numa linha de argumentaccedilatildeo que confere prioridade agrave realidade
soacutecio-histoacuterica na produccedilatildeo de viabilidades ou inviabilidades teoacutericas e de sua
consequumlente explicaccedilatildeo eram vistos por Chasin como limites produzidos pelo
proacuteprio tempo grego sumariados a seguir
1) praacutetica humano-societaacuteria incipiente e acanhada que ganhou no
artigo O Futuro Ausente beliacutessima caracterizaccedilatildeo inspirada no Marx das
Formen Imaturaccedilatildeo natural e caracteriacutestica das remotas formas sociais em que
a propriedade da terra e a agricultura constituiacuteam a base da atividade material
tendo por objetivo a produccedilatildeo valores de uso ou seja a reproduccedilatildeo dos
indiviacuteduos em peculiares e bem determinadas relaccedilotildees com a comunidade[iv]
onde por via de consequumlecircncia indiviacuteduo e genecircro satildeo imediata e
transparentemente inseparaacuteveis e suas relaccedilotildees traduzem essa unidade
fundamental tornando desconhecida e impensaacutevel qualquer tipo de cissura que
contraponha ou menos ainda torne excludentes entre si as figuras de sua
polaridade[v] Mas a essa dimensatildeo positiva - sintomaticamente tatildeo atraente nos
dias atuais - corresponde uma negativa que Chasin esclarece na sequumlecircncia
todas as formas em que a comunidade pressupotildee sujeitos em determinada
unidade objetiva com as condiccedilotildees da atividade produtiva ou reciprocamente
nas quais uma especiacutefica existecircncia subjetiva faz com que a proacutepria comunidade
seja pressuposta como condiccedilatildeo de produccedilatildeo todas elas diz Marx
correspondem necessariamente e por princiacutepio a um desenvolvimento limitado
das forccedilas produtivas[vi]
2) Consequumlentemente impossibilidade para conceber a historicidade e
a contraditoriedade como categorias fundamentais do ser - que estrangulam a
mais precisa e universal por isso mesmo vaacutelida hoje e para sempre das
formulaccedilotildees atinentes agrave natureza e ao propoacutesito da ontologia
Meacuteritos e limites da filosofia primeira que apenas seratildeo realizados e
superados depois de um longo itineraacuterio repleno de contraposiccedilotildees internas
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pelos lineamentos perfilados por Marx que tambeacutem herda criticamente
dimensotildees da filosofia moderna - do renascimento ao neohegelianismo
Desse modo com o objetivo de sumariar preliminarmente os conteuacutedos
dessa trajetoacuteria que Marx assimila por via criacutetica Chasin indica alguns deles
sem pretensatildeo alguma de esgotaacute-los
1) Do Renascimento - a infinitude do universo e o espiacuterito da
concepccedilatildeo do homem como o uacutenico ser aberto - existente e conhecido capaz
na potecircncia de seus atributos de conhecer e configurar a si e a seu mundo
ambos entendidos e tomados em sua naturalidade objetividade e o primeiro na
infinitude de sua essecircncia ativa
2) Do materialismo francecircs e inglecircs e do Iluminismo - a ruptura com a
conduta especulativa metafiacutesica e com o espiacuterito de sistema em filosofia que eacute
concebido como freio e obstaacuteculo agrave razatildeo Por meio dessa desobstruccedilatildeo o
iluminismo pode universalizar a filosofia como meio de toda verdade - natural e
espiritual - e ela passa a se voltar agraves tarefas praacuteticas donde a possibilidade e o
escopo de estabelecer a vida humana de modo racional Em outros termos
reconhece no pensamento o poder e o papel de organizar a vida o pensamento
deve ter papel analiacutetico mas tambeacutem fazer nascer a ordem cuja necessidade
ela concebeu[vii] Em contrapartida os limites do pensamento iluminista satildeo
sinteticamente os seguintes acentuaccedilatildeo unilateralizante da racionalidade
herdada do renascimento e distorcida pelo racionalismo do seacuteculo XVIII Aleacutem
disso tem-se o naturalismo vale dizer a ontologia do social demasiadamente
colada agrave ontologia da natureza embora natildeo se possa deixar de reconhecer que
frente ao abstracionismo metafiacutesico trata-se de um meacuterito pretender uma
ontologia ligada agrave natureza que em verdade eacute idealizada Talvez o melhor
exemplo dessa tradiccedilatildeo seja justamente Feuerbach
3) Do criticismo - a impossibilidade de uma ontologia como saber do
em si ou seja do ente enquanto ente pela via do absolutismo racional
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dedutivista Em Kant em verdade tem-se a impossibilidade de uma ontologia
em Marx ao reveacutes tem-se apenas tal recusa agrave especulaccedilatildeo mas natildeo a
impossibilidade de conhecer o ente enquanto ente vale dizer Marx aceita o
espiacuterito da criacutetica kantiana ao conhecimento absoluto mas natildeo sua resultante
sistemaacutetica a sua vedaccedilatildeo ao conhecimento das coisas enquanto tais
4) Do hegelianismo - a concepccedilatildeo histoacuterica do ser portanto de sua
contrariedade bem como a natureza aproximativa do processo de
conhecimento ao mesmo tempo em que recusa o invoacutelucro miacutestico do
pensamento hegeliano - a dialeacutetica autocircnoma da razatildeo como demiurgo do real
ou da efetividade sensiacutevel ou seja refuta decidamente seu caraacuteter
especulativo
5) Do neohegelianismo - a problemaacutetica do homem e muito
especificamente duas contribuiccedilotildees de Feuerbach a criacutetica agrave especulaccedilatildeo e os
lineamentos mais gerais do ser soacute enquanto ser sensiacutevel ou objetivo (dimensotildees
de uma ontologia geral em seu niacutevel mais abstrato) Mas ao lado desse
aspecto positivo do pensamento feuerbachiano natildeo eacute possiacutevel deixar de
assinalar a objeccedilatildeo fundamental dirigida a ele por Marx sua concepccedilatildeo
naturalista do homem vale dizer sua incapacidade de o determinar como ser
social Assim em Feuerbach o homem eacute sensiacutevel objetivonatural e natildeo
objetivo-social - a grande descoberta marxiana
Grande descoberta que eacute mais amplamente avaliada quando se
considera o conjunto das linhas manifestas pelos principais representantes do
neohegelianismo B Bauer formulador de uma concepccedilatildeo do homem como
auto-consciecircncia racional M Stirner com a elevaccedilatildeo do egoiacutesmo agrave condiccedilatildeo de
essecircncia humana Feuerbach com a concepccedilatildeo naturalista do homem centrada
no amor Nesse cenaacuterio somente Marx comparece com a descoberta da
sociabilidade como substacircncia constitutiva do homem - e natildeo meramente uma
essecircncia imutaacutevel mas histoacuterica e contraditoacuteria produzida e reproduzida pela
proacutepria atividade sensiacutevel dos homens
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De sorte que do ente enquanto ente aristoteacutelico determinado por sua
forma substancial eterna ao ser social marxiano compreendido em suas
mudanccedilas categoriais - eacute do que consiste a histoacuteria - se vai de uma filosofia
primeira que terminou por sua resoluccedilatildeo originaacuteria na forma de um saber
absoluto a um saber histoacuterico de base que se desenvolve pela infinitude de
aproximaccedilotildees empreendidas em direccedilatildeo ao absoluto entendido pura e
simplesmente como completude ou totalidade que praticamente nunca se
realiza porque desnecessaacuterio para o saber ao qual bastam completudes mais
modestas e ainda mais como saber para a praacutetica
De modo que a filosofia primeira de configuraccedilatildeo marxiana eacute antes de
tudo a afirmaccedilatildeo da objetividade do mundo e a possibilidade ser conhecido
possibilidade que eacute soacutecio-historicamente determinada exercendo a funccedilatildeo de
base e guia para a ciecircncia da histoacuteria especificamente como ontologia regional
do ser social e que nutre das ciecircncias e a elas responde tanto quanto elas
mesmas tem de responder aos lineamentos ontoloacutegicos pelos quais se guiam
mas aos quais natildeo tomam como coaacutegulos de saber imutaacutevel De sorte que
ontologia e ciecircncia se potencializam e se criticam reciacuteproca e
permanentemente
Tambeacutem de acordo com Chasin por essas razotildees a ontologia
marxiana natildeo eacute uma resoluccedilatildeo de caraacuteter absoluto nos moldes do sistema
convencional mas a condiccedilatildeo de possibilidade de resoluccedilatildeo do saber Eacute em
outras palavras um estatuto movente e movido de cientificidade orienta e eacute
orientado pela ciecircncia e pela praacutetica universal dos homens Orienta e eacute
orientada guia e eacute guiada corrige e eacute corrigida Ou seja natildeo eacute um absoluto
inquestionaacutevel uma certeza estabelecida por deduccedilatildeo a partir de axiomas de
uma vez para sempre Mesmo porque a certeza cognitiva natildeo pode estar no
ponto de partida mas compreendida como alvo de uma busca permanente
procura intensiva e extensiva cuja infinitude eacute posta a cada momento entre
parecircnteses no qual o grau de certeza alcanccedilado eacute assumido como realizaccedilatildeo
maacutexima tendo por limites as possibilidades do tempo ou cenaacuterio histoacuterico grau
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a ser confirmado ou ampliado ou ao inveacutes restringido na parte ou descartado
no todo posteriormente com todas as suas implicaccedilotildees correlatas
Em suma quando se utiliza a expressatildeo posiccedilatildeo ontoloacutegica e natildeo
perspectiva oacutetica prisma ou ponto de vista pretende-se remeter a lugar e agraves
coisas ou seja o reconhecimento do mundo como multiverso de entes reais
objetivos e que por isso mesmo faceiam o observador praacutetico ou teoacuterico natildeo
dependendo deste para existir em face do qual satildeo independentes Eacute
finalmente o reconhecimento da prioridade das coisas nas relaccedilotildees cognitivas
sem desconhecer eacute claro o caraacuteter ativo do investigador
Quando Chasin procura enfatizar o reconhecimento noccedilatildeo
imediatamente conexa a de posiccedilatildeo ontoloacutegica eacute por que aquela tem a
vantagem de colocar em primeiro lugar o caraacuteter natildeo puramente teoacuterico
contemplativo mas sobretudo praacutetico[viii] da aproximaccedilatildeo ao ente aleacutem da
natureza da operaccedilatildeo mental que designa - constataccedilatildeo ou recogniccedilatildeo vale
dizer a admissatildeo de algo a respeito do qual o discurso se pronuncia como forma
imediata de representaccedilatildeo
Relevar o caraacuteter praacutetico de aproximaccedilatildeo ao ente ou em outras
palavras partir ou dar prioridade agrave praacutetica significa por seu turno partir do
caraacuteter essencial do ser do homem por sua exteriorizaccedilatildeo operativa no mundo
que confirma sua forma de vida ou modo de existecircncia Quer dizer eacute um ponto
de partida desde logo sob criteacuterio ontoloacutegico ou seja que considera a
efetividade ocircntica do homem e do mundo de tal sorte que ambos satildeo
reconhecidos enquanto atividade sensiacutevel Caminho que tem o meacuterito de evitar
as vias reflexas[ix] como tambeacutem os engenhos e supostos dos encantamentos
especulativos como cogito sujeito transcendental ou os arqueacutetipos
generalizando uma expressatildeo marxiana os misticismos loacutegicos que nunca
deixam de mostrar sua condiccedilatildeo de artifiacutecios por mais rigorosos e envolventes
que sejam tanto que podem sempre ser contestados de algum modo ao passo
que os indiviacuteduos vivos e ativos os pressupostos dos quais Marx parte em A
13
Ideologia Alematilde natildeo podem nunca ser recusados a natildeo ser na fantasia e sob
pena de cancelar todo e qualquer andamento reflexivo
Em suma reconhecimento ontopraacutetico significa pois tomar como
ponto de partida a praacutetica - desde a praacutetica cotidiana agrave praacutetica cientiacutefica de ponta
- de um tempo dado
O plano ontopraacutetico jaacute bem delineado no texto de 1995 ganha nos
anos seguintes sucessivas correccedilotildees por parte do autor a ponto de se tornar o
eixo a partir do qual Chasin faz a criacutetica das Teorias da Fundamentaccedilatildeo ou
como ele as denomina ironicamente A Querela da Fundamentaccedilatildeo
A esse respeito costumava ele indagar O que eacute um fundamento Uma
Teoria da Subjetividade ou Uma Teoria da Objetividade
Se o fundamento for considerado a partir de uma teoria da
subjetividade por onde comeccedilar Pelo aparato sensorial como no empirismo
Ou pela consciecircncia ou coisa que o valha como o cogito cartesiano a
autoconsciecircncia a razatildeo ou as formas a priori do entendimento Ou ainda uma
teoria da mente
Ainda no plano do fundamento subjetivo poder-se-ia partir da
experiecircncia da vivecircncia do vivido Neste caso o vivido seria o preacute-teoreacutetico
mas enquanto experiecircncia existencial isto eacute as vivecircncias do indiviacuteduo isolado
em experiecircncia aleatoacuteria fortuita acidental
Mas se o fundamento for uma Teoria da Objetividade por onde
comeccedilar Pelos fenocircmenos empiacutericos Mas nesse caso natildeo terminariacuteamos
apenas no fundamento psicoloacutegico isto eacute teriacuteamos o psicologismo como
fundamento da verdade
14
E se partiacutessemos do todo concreto Natildeo findariacuteamos numa visatildeo
caoacutetica e abstrata de conjuntos indeterminados desamparados na companhia
de um punhado de abstraccedilotildees razoaacuteveis e irrazoaacuteveis
Feitas tais indagaccedilotildees Chasin conclui de modo enfaacutetico Toda peticcedilatildeo
de fundamento todo discurso por um fundamento estaacute encerrado na esfera
teoacuterica Aleacutem do mais todo discurso de fundamentaccedilatildeo pretende e implica uma
certeza ou seja de um modo ou de outro a suposiccedilatildeo de um saber absoluto
ainda que um simples momento do saber absoluto Vale dizer o discurso da
fundamentaccedilatildeo desemboca de algum modo na razatildeo especulativa Em outras
palavras implica algo que transcende a proacutepria natureza do saber que eacute um
processo infinito de aproximaccedilotildees
Para Chasin o reconhecimento do ontopraacutetico tem a vantagem de
escapar agrave querela da fundamentaccedilatildeo na medida em que parte da experiecircncia
real melhor dizendo da praacutetica real natildeo de uma experiecircncia isolada
arbitrariamente natildeo da experiecircncia aleatoacuteria da suposta existecircncia existencial
dos indiviacuteduos isolados dos indiviacuteduos em derreliccedilatildeo
O universo ontopraacutetico eacute o necessariamente vivido para que qualquer
pergunta possa se dar Eacute portanto a esfera preacute-teoreacutetica esfera que antecede
qualquer teoria Esfera sem a qual natildeo haacute vida humana e portanto sem a qual
natildeo pode haver qualquer pergunta teoacuterica
A reflexatildeo que tem como ponto de partida o ontopraacutetico estabelece
assim um pressuposto concreto (e natildeo uma verdade ideada) do qual natildeo posso
me afastar a natildeo ser na imaginaccedilatildeo
Em siacutentese a esfera ontopraacutetica representa o complexos dos homens
vivos e ativos A partir dessa abstraccedilatildeo razoaacutevel - o ontopraacutetico - pode-se
encontrar jaacute numa analiacutetica de desentranhamento desse complexo real o
devido lugar da ontologia da epistemologia e da ciecircncia da histoacuteria que
compreende dois grandes ramos natureza e sociedade
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Em outras palavras sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico torna-se
aleatoacuteria a localizaccedilatildeo que se confere tanto ao ontoloacutegico quanto ao epistecircmico
A opccedilatildeo por um deles se torna uma arbitrariedade teoacuterica e eacute justamente isto
que gera a querela da fundamentaccedilatildeo pois a decisatildeo fica submersa ao plano
teoacuterico ao jogo dos argumentos agrave ambivalecircncia do logos que eacute irresolutivo
Sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico parte-se assim de imediato da
teoria e natildeo do ser que faz da teoria ou deste como uma abstraccedilatildeo da
inteligibilidade ou seja de uma faculdade abstraiacuteda do ser que a possui
gerando com isso um absurdo ontoloacutegico
Eacute portanto a partir da analiacutetica do ontopraacutetico pelo reconhecimento de
seus traccedilos categoriais que tem iniacutecio a elaboraccedilatildeo ontoloacutegica Ou seja a
ontologia nasce como reflexatildeo conscientizaccedilatildeo conceituaccedilatildeo do ontopraacutetico
enquanto primeiro objeto da ontologia que a partir daiacute se encaminha em
direccedilatildeo agrave criacutetica - em termos de sua necessidade e loacutegica especiacutefica - do proacuteprio
ontopraacutetico isto eacute do complexo dos objetos reais aiacute incluiacutedo o homem
Resta ainda em relaccedilatildeo agrave problemaacutetica geral em tela aflorar a questatildeo
da adequatio tal como era tematizada tambeacutem em seus cursos
Polemizando com a denominaccedilatildeo de realismo comumente utilizada
para denominar proposituras que conferem prioridade ao mundo objetual
Chasin afirmava que haacute realismo - antigo - quando eacute suposto que a ordem da
razatildeo agrave idecircntica a ordem do real e que a partir de axiomas por meios racionais-
dedutivos embuiacutedos do espiacuterito de sistema se possa estabelecer a verdade do
mundo
Em Marx entretanto a ordem das coisas e da razatildeo satildeo distintas (um
exemplo expressivo desta postura marxiana pode ser encontrada na famosa
Introduccedilatildeo de 57) ambas mutaacuteveis e processuais - unidade da desidentidade
entre ser e saber Assim o mundo natildeo pode ser deduzido racionalmente mas
reproduzido sob forma de ideacuteia por meio de aproximaccedilotildees - empiacuterico abstrato
16
concreto - num processo intensivo e extensivo historicamente condicionado
possibilitado ou impedido - na dependecircncia que fica da maturaccedilatildeo do objeto e
do posicionamento do sujeito O processo mimeacutetico eacute portanto reproduccedilatildeo
conceitual de efetividades donde se lida com duas ordens de formaccedilotildees real e
ideal A reproduccedilatildeo conceitual apresenta portanto sua proacutepria loacutegica mas no
interior da determinaccedilatildeo soacutecio-histoacuterica do pensamento de modo que uma
teoria do conhecimento (morfologia e dinacircmica da subjetividade in abstratu e
imutaacutevel) eacute incapaz de explicar o processo cognitivo pois a faculdade humana
da forccedila da abstraccedilatildeo depende das possibilidades oferecidas pela
determinaccedilatildeo social do pensamento que por sua vez se manifesta e se
configura pelo desenvolvimento dos objetos e da praacutetica humana que sobre eles
tem incidecircncia
Donde a franca afirmaccedilatildeo marxiana da possibilidade de conhecer natildeo
se confunde com a simplicidade e facilidade da concepccedilatildeo realista nem mesmo
no plano da ingenuidade cotidiana desde logo porque a atividade cotidiana -
que estaacute para aleacutem da ingenuidade ou lanccedila os sujeitos para aleacutem da
ingenuidade - eacute em si um complexo rico e desafiador matrizador inclusive da
intentio recta atitude natural e necessaacuteria da esfera ontopraacutetica
Haacute portanto que distinguir as grandes diferenccedilas ontoloacutegicas entre o
estatuto marxiano e a ontologia realista Na primeira a adequatio digamos
assim eacute correlaccedilatildeo entre formaccedilatildeo real e formaccedilatildeo ideal duas ordens distintas
de configuraccedilatildeo Em outras palavras eacute correlaccedilatildeo conceitual entre entificaccedilatildeo
concreta e reproduccedilatildeo conceitual Em suma a reproduccedilatildeo conceitual nada mais
eacute do que transposiccedilatildeo agrave cabeccedila ordenada pelos nexos do real na forma e pelos
meios da proacutepria atividade mental
I - Tomando Marx por Base e por Ponto de Chegada
17
Considerando como ponto de referecircncia as consideraccedilotildees
desenvolvidas por Marx em O Capital especificamente sobre a dificuldade
encontrada pela humanidade na compreensatildeo do valor ao longo de dois
milecircnios - de Aristoacuteteles a Ricardo - pode-se sustentar segundo Chasin que
um fenocircmeno muito similar a este se produziu no que tange agrave determinaccedilatildeo do
ser ou seja da(s) matriz(es) da(s) realidade(s) ou seja da efetividade
Tomemos as passagens em questatildeo que se encontram no Prefaacutecio agrave
Primeira Ediccedilatildeo de O Capital Todo comeccedilo eacute difiacutecil isso vale para qualquer
ciecircncia A forma do valor cuja figura acabada eacute a forma do dinheiro eacute muito
simples e vazia de conteuacutedo Mesmo assim o espiacuterito humano tem procurado
desvendaacute-la (ergruumlden) em vatildeo haacute mais de 2000 anos enquanto por outro lado
teve ecircxito ao menos aproximado a anaacutelise de formas muito mais complicadas e
replenas de conteuacutedo Por quecirc Porque o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de
estudar do que a ceacutelula do corpo Aleacutem disso na anaacutelise das formas econocircmicas
natildeo podem servir nem o microscoacutepio nem reagentes quiacutemicos A forccedila da
abstraccedilatildeo deve substituir a ambos Para o leigo a anaacutelise parece se perder
em pedantismo Trata-se efetivamente de pedantismo mas daquele de que se
ocupa a anatomia microscoacutepica
De acordo com Chasin eacute necessaacuterio reter os seguintes noacutedulos
significativos da citaccedilatildeo acima
1) todo iniacutecio de uma ciecircncia eacute difiacutecil donde o princiacutepio da ontologia o
princiacutepio da ciecircncia deve ser o mais difiacutecil de todos
2) haacute grande dificuldade na compreensatildeo da forma do valor que eacute um
objeto simples e vazio de conteuacutedo
3) haacute ecircxito maior na anaacutelise de formas mais complicadas e replenas de
conteuacutedo
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Na mesma citaccedilatildeo Marx enuncia os motivos de tal dificuldade
1) o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de estudar do que a ceacutelula do
corpo
2) meacutetodos experimentais natildeo satildeo aplicaacuteveis a esse tipo de forma
3) a analiacutetica dessa forma pela forccedila da abstraccedilatildeo deve tomar o lugar
da observaccedilatildeo empiacuterica e experimental
4) anaacutelise voltada agrave anatomia microscoacutepica da forma estudada
A partir dessas indicaccedilotildees colhidas no texto de Marx Chasin elabora
um esboccedilo para fins unicamente didaacuteticos em que busca transpassaacute-las para a
proacutepria questatildeo ontoloacutegica afirmando o que se segue
1) o iniacutecio difiacutecil da ontologia perdurou tambeacutem por mais de 2000
anos trajetoacuteria em que se observa tateios imprecisos caracterizados por um
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo ateacute chegar em Marx Tal
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo revela por seu rumo
imanentemente contraditoacuterio por seus caminhos e descaminhos histoacutericos a
dificuldade e a longa incapacidade na formulaccedilatildeo precisa de seu objeto e
alcance ou seja de sua natureza e propoacutesito - de sua funccedilatildeo orientadora e
sustentadora no plano teoacuterico e de sua origem praacutetica preacute-teoreacutetica
2) reconhecimento ontopraacutetico das formas dos seres e analiacutetica da
forma do ser apenas por meio da forccedila da abstraccedilatildeo no reconhecimento
ontopraacutetico os seres satildeo reconhecidos como substantivos e nesse caso ateacute
certo ponto vale para a observaccedilatildeo espontacircnea e observaccedilatildeo comum pois o
desvendamento completo exige forccedila de abstraccedilatildeo como verbo ( o ato de ser
de Gilson) soacute a forccedila da abstraccedilatildeo daiacute a facilidade para se cair no
abstrativismo
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Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
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De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
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reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
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Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
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Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
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conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
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relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
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realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
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tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
36
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
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7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
ou espiacuterito ontoloacutegico de que eacute feito o mundo perguntavam os preacute-socraacuteticos
qual eacute o elemento primordial do universo
Nascida como ontologia sem que tivesse esse nome sem que tivesse
outro nome que natildeo o de filosofia esta foi por cerca de dois milecircnios e meio
antes de tudo ontologia (metafiacutesica) ou explicitamente desde Platatildeo e
Aristoacuteteles ateacute Leibniz-Cristian Wolff a ontologia foi a atmosfera e o andaime da
reflexatildeo Seja como base e norteamento do conhecimento seja como alicerce
movediccedilo e desorientador em sua histoacuteria imanentemente contraditoacuteria a um
tempo auto-constituinte e auto-dissolutora de si proacutepria Numa palavra parece
que a aproximaccedilatildeo dos seres ou entes vale dizer da realidade pura e simples
em sua complexa efetividade tem se mostrado como a mais difiacutecil e penosa de
todas as tarefas do homem Paradoxal sob o prisma de que os homens natildeo
vivem a natildeo ser no proacuteprio mundo real essa dificuldade natildeo eacute tatildeo improacutepria ou
inocente na medida em que se considera
1) que o homem soacute muito lentamente constitui seu proacuteprio mundo e a si
mesmo e em ritmo semelhante destes se apropria objetiva e subjetivamente
2) que essa dupla constituiccedilatildeoapropriaccedilatildeo do mundo e de si tem sido
operada sob processos infinitamente complexos e contraditoacuterios geradores de
matizados e superpostos niacuteveis de esclarecimento e ocultaccedilatildeo
Para aleacutem dessas dificuldades de fundo eacute necessaacuterio levar em conta
tambeacutem que nos dias atuais a pesquisa ontoloacutegica em especial nos seus
lineamentos mais evoluiacutedos - o estatuto ontoloacutegico marxiano - se daacute em
contexto histoacuterico amplamente desfavoraacutevel tanto no que diz respeito agrave histoacuteria
das formaccedilotildees reais quanto agravequela das formaccedilotildees ideais
De tal modo que poder-se-ia dizer agora parafraseando Marx de A
Sagrada Famiacutelia a propoacutesito de Szeliga que as proposituras ontoloacutegicas
dominantes no seacuteculo XX convertem em misteacuterios o que satildeo verdadeiras
4
trivialidades Sua arte natildeo consiste em revelar o oculto mas ocultar o
revelado[ii]
Em suma para dar iniacutecio ao delineamento da histoacuteria da ontologia eacute
preciso em primeiro lugar abandonar sua pretensatildeo infantil agrave atemporalidade e
se dar conta de que seja compulsoriamente histoacuterica de que se faz no tempo
tatildeo contraditoriatmente quanto a proacutepria entificaccedilatildeo de seu histoacuterico agente
Em segundo lugar Chasin considerava inadiaacutevel reprocessar a
decifraccedilatildeo ou o entendimento de Marx em determinaccedilatildeo reciacuteproca com as
vicissitudes da histoacuteria da ontologia na tentativa de ultrapassar as derrotas
sofridas ao longo dos uacuteltimos 150 anos e principalmente a partir do
entendimento efetivo do pensamento marxiano e tambeacutem do atual
desenvolvimento do capital redimensionar a perspectiva dos alvos e rumos
teoacutericos e praacuteticos a exercitar no presente e levar a efeito no futuro
O debate dito ontoloacutegico do seacuteculo XX girou em torno de conhecido
conjunto de fontes Enquanto Hartmann com o volume I de sua Ontologia de
1934 eacute uma contraposiccedilatildeo agrave desontologizaccedilatildeo em geral e agraves novas tendecircncias
do seacuteculo principalmente Heidegger feita do ponto de vista
fenomenoloacutegiconeokantiano Eacute Gilson eacute a resposta neotomista no interior da
filosofia francesa ao desafio posto por O Ser eo Nada (1943) de Sartre cujo
sub-tiacutetulo ensaio de ontologia fenomenoloacutegica logo aponta para a sua afiliaccedilatildeo
a Husserl e o tributo pago de toda a maneira a Heidegger que o conduziram a
inviabilizaccedilotildees definitivas e irremissiacuteveis que natildeo desobriga todavia de
distinguir radicalmente seu propoacutesito e sua personalidade do autor de Ser e
Tempo (1926) dedicada a Edmund Husserl Em testemunho de Admiraccedilatildeo e
Amizade
De acordo com a posiccedilatildeo que Chasin veio assumir nos seus uacuteltimos
anos de vida nas muacuteltiplas diacutevidas contraiacutedas pelo marxismo no seacuteculo XX
figura precisamente esta ter entrado muito tardia e restritamente nessa
5
discussatildeo vale dizer soacute quando a vitoacuteria temporaacuteria jaacute havia pendido para o
outro lado natildeo apenas por sua exclusiva presenccedila na arena mas porque
condicionado e impulsionado pelo proacuteprio caraacuteter de nossos tempos Os arautos
que se impuseram satildeo muito conhecidos tomaram o espaccedilo sem ter que
enfrentar o adversaacuterio efetivo uacutenico capaz de contraditar e oferecer alternativa
Este em vez disso perdeu-se sem luta sucumbiu agrave linha dominante do
cientificismo e acabou junto com os melhores tambeacutem perdido nesse campo
Nem eacute preciso referir o leste europeu mas com o politicismo generalizado o
marxismo se perdeu inclusive com os melhores que o seacuteculo produziu
Apenas em fins da deacutecada de 60 quando tudo estava desabando
Lukaacutecs de traveacutes se deu conta do misteacuterio Eacute muito significativo que nesse
despertar obliacutequumlo tenha tido que se voltar agrave refutaccedilatildeo entre outros de
Heidegger quando este escrever seu livro principal no miacutenimo em parte em
oposiccedilatildeo a Histoacuteria e Consciecircncia de Classe (textos de 1919-22) Eacute igualmente
sintomaacutetico que soacute tenha retomado deliberadamente a preocupaccedilatildeo ontoloacutegica
ao final da vida e sucumbido ao objeto em obra inconclusa motivada acima de
tudo pelo vieacutes excecircntrico de conferir poder regenerador agrave eacutetica Mas eacute sabido
que junto com seu meacuterito natildeo pereceu sozinho Por exemplo onde estatildeo
Hartman Gilson e ateacute mesmo Sartre
As dificuldades para o devido enfrentamento da questatildeo ontoloacutegica hoje
satildeo enormes e jaacute eram conhecidas por Lukaacutecs muito embora o filoacutesofo huacutengaro
morto em 1971 natildeo tenha assistido o pleno triunfo de concepccedilotildees que
consagram o homem derrelito denominaccedilatildeo essa empregada por ele mesmo ao
se reportar a Heidegger por exemplo
Tais dificuldades grosso modo poderiam ser atribuiacutedas inicialmente agraves
tendecircncias que tecircm como ponto de partida o criticismo kantiano que se
impuseram na viragem do seacuteculo XIX para o XX com a reduccedilatildeo da filosofia ao
circuito da problemaacutetica do conhecimento
6
Embora se possa assim considerar o criticismo kantiano como uma
espeacutecie de divisor de aacuteguas natildeo se deve obliterar o fato de que com a
metafiacutesica claacutessica ou qualquer uma de suas variantes antecedentes ou
subsequumlentes sob o pretexto de alcanccedilar a priori a certeza cognitiva gera-se
uma grave distorccedilatildeo no plano teoacuterico pela qual o ente eacute perdido para sempre
Para evitar tal descaminho Chasin propotildee o designativo posiccedilatildeo ontoloacutegica
pois com ela pretende tambeacutem pelo menos precaver contra a unilateralidade
decorrente da postura gnoseoloacutegica (sempre uma forma meramente
especulativa a respeito da morfologia do funcionamento ou seja da
organizaccedilatildeo e atividade da subjetividade) instigando e se rigorosamente
praticada orientando com rigor a pensar as coisas em seus proacuteprios nexos em
direccedilatildeo a uma totalidade mais plena de determinaccedilotildees A expressatildeo pretende
pois sinalizar e induzir agrave praacutetica intelectual de caraacuteter ontoloacutegico concebida em
sua forma mais consistente e consequumlente
Chasin pois pretendeu recuperar o sentido de ontologia enquanto
consideraccedilatildeo daquilo que eacute em sua efetividade Natildeo alguma distorccedilatildeo ou
dissoluccedilatildeo do ente enquanto ente seja sob sua forma do sentido do ente do
ser da apariccedilatildeo ou qualquer outra variaacutevel do tipo que embora possam incluir
dimensotildees do sensiacutevel sempre compreendem implicam ou tecircm por condiccedilatildeo de
possibilidade um sujeito mesmo que este seja o obervador da produccedilatildeo de
representaccedilotildees de caraacuteter racional Estudo pois das coisas em sua
independecircncia em sua exterioridade em face de possiacuteveis relaccedilotildees praacuteticas e
teoacutericas em que estatildeo ou possam vir a estar presentes inclusive aquelas pelas
quais em gecircnero superior de entificaccedilatildeo as coisas satildeo postas ou engendradas
De tal sorte que ainda e mesmo que todo o plano cognitivo possa ou
tenha de ser impugnado que toda ciecircncia possa ou tenha que ser posta em
duacutevida e considerada simples ilusatildeo ou equiacutevoco ou ter seu acircmbito reduzido agrave
pura convenccedilatildeo resta o fundamental o universo da praacutetica ou da vida vivida em
sua qualidade de confirmaccedilatildeo da dupla certeza da existecircncia do mundo e dos
homens e enquanto tal tem de ser reconhecido como ponto de partida da
7
intenccedilatildeo ontoloacutegica cujo propoacutesito eacute se constituir em base conceitual de sua
dilucidaccedilatildeo
Ainda no contexto da afirmaccedilatildeo da posiccedilatildeo ontoloacutegica e rejeiccedilatildeo seja
do vieacutes gnosioloacutegico ou cientificista seja das concepccedilotildees reinantes ditas
ontoloacutegicas Chasin de modo provocativo indaga Por que a foacutermula simples
do cogito eacute mais evidente ou funcional para efeito de fundamentaccedilatildeo do que a
evidecircncia do complexo sensiacutevel do gozo Por que a evidecircncia do cogito - o
pensamento do indiviacuteduo isolado - eacute superior agrave evidecircncia do existir que inclui a
presenccedila e a relaccedilatildeo viva dos outros e das coisas Chasin continua na mesma
direccedilatildeo no questionamento da pretensa superioridade do cogito indagando o
quecirc se esconde sob ela e acrescenta O cogito o truque cartesiano eacute a
conquista da certeza agrave custa de trecircs absurdidades o cogito desencarnado a
encarnaccedilatildeo divina da perfeiccedilatildeo e o mundo reduzido agrave extensatildeo A essas trecircs
conquistas digamos assim Chasin denomina de verdade alienada isto eacute
verdade emergente da subjetividade na forma da alienaccedilatildeo
A exercitaccedilatildeo ontoloacutegica ao contraacuterio assume como criteacuterio analiacutetico a
determinaccedilatildeo de que o objeto maturado eacute a chave do esclarecimento de suas
formas precedentes[iii] desde as embrionaacuterias ateacute as mais elaboradas que
antecedem no tempo sua fisionomia acabada Portanto a determinaccedilatildeo
marxiana do objeto maturado eacute produto desse espiacuterito teoacuterico pois soacute faz
sentido em posicionamento ontoloacutegico ou seja em reconhecimento do grau
constitutivo em que se encontra a coisa examinada
Segundo Chasin ainda Aristoacuteteles teve grande meacuterito em sua
propositura de uma filosofia primeira - base ou fundamento para a constituiccedilatildeo
das ciecircncias particulares - mas que por sua resoluccedilatildeo (de caraacuteter platocircnico
conforme jaacute demonstrara Eacute Gilson) e por seus pretendidos atributos ahistoacutericos
- categorias eternas e absolutas imutaacuteveis e perenes - constitui um modo
involuntaacuterio de elaboraccedilatildeo especulativa apesar de seu intento originaacuterio de
conhecer o efetivamente existente o ente enquanto ente Tais limites do intento
8
aristoteacutelico numa linha de argumentaccedilatildeo que confere prioridade agrave realidade
soacutecio-histoacuterica na produccedilatildeo de viabilidades ou inviabilidades teoacutericas e de sua
consequumlente explicaccedilatildeo eram vistos por Chasin como limites produzidos pelo
proacuteprio tempo grego sumariados a seguir
1) praacutetica humano-societaacuteria incipiente e acanhada que ganhou no
artigo O Futuro Ausente beliacutessima caracterizaccedilatildeo inspirada no Marx das
Formen Imaturaccedilatildeo natural e caracteriacutestica das remotas formas sociais em que
a propriedade da terra e a agricultura constituiacuteam a base da atividade material
tendo por objetivo a produccedilatildeo valores de uso ou seja a reproduccedilatildeo dos
indiviacuteduos em peculiares e bem determinadas relaccedilotildees com a comunidade[iv]
onde por via de consequumlecircncia indiviacuteduo e genecircro satildeo imediata e
transparentemente inseparaacuteveis e suas relaccedilotildees traduzem essa unidade
fundamental tornando desconhecida e impensaacutevel qualquer tipo de cissura que
contraponha ou menos ainda torne excludentes entre si as figuras de sua
polaridade[v] Mas a essa dimensatildeo positiva - sintomaticamente tatildeo atraente nos
dias atuais - corresponde uma negativa que Chasin esclarece na sequumlecircncia
todas as formas em que a comunidade pressupotildee sujeitos em determinada
unidade objetiva com as condiccedilotildees da atividade produtiva ou reciprocamente
nas quais uma especiacutefica existecircncia subjetiva faz com que a proacutepria comunidade
seja pressuposta como condiccedilatildeo de produccedilatildeo todas elas diz Marx
correspondem necessariamente e por princiacutepio a um desenvolvimento limitado
das forccedilas produtivas[vi]
2) Consequumlentemente impossibilidade para conceber a historicidade e
a contraditoriedade como categorias fundamentais do ser - que estrangulam a
mais precisa e universal por isso mesmo vaacutelida hoje e para sempre das
formulaccedilotildees atinentes agrave natureza e ao propoacutesito da ontologia
Meacuteritos e limites da filosofia primeira que apenas seratildeo realizados e
superados depois de um longo itineraacuterio repleno de contraposiccedilotildees internas
9
pelos lineamentos perfilados por Marx que tambeacutem herda criticamente
dimensotildees da filosofia moderna - do renascimento ao neohegelianismo
Desse modo com o objetivo de sumariar preliminarmente os conteuacutedos
dessa trajetoacuteria que Marx assimila por via criacutetica Chasin indica alguns deles
sem pretensatildeo alguma de esgotaacute-los
1) Do Renascimento - a infinitude do universo e o espiacuterito da
concepccedilatildeo do homem como o uacutenico ser aberto - existente e conhecido capaz
na potecircncia de seus atributos de conhecer e configurar a si e a seu mundo
ambos entendidos e tomados em sua naturalidade objetividade e o primeiro na
infinitude de sua essecircncia ativa
2) Do materialismo francecircs e inglecircs e do Iluminismo - a ruptura com a
conduta especulativa metafiacutesica e com o espiacuterito de sistema em filosofia que eacute
concebido como freio e obstaacuteculo agrave razatildeo Por meio dessa desobstruccedilatildeo o
iluminismo pode universalizar a filosofia como meio de toda verdade - natural e
espiritual - e ela passa a se voltar agraves tarefas praacuteticas donde a possibilidade e o
escopo de estabelecer a vida humana de modo racional Em outros termos
reconhece no pensamento o poder e o papel de organizar a vida o pensamento
deve ter papel analiacutetico mas tambeacutem fazer nascer a ordem cuja necessidade
ela concebeu[vii] Em contrapartida os limites do pensamento iluminista satildeo
sinteticamente os seguintes acentuaccedilatildeo unilateralizante da racionalidade
herdada do renascimento e distorcida pelo racionalismo do seacuteculo XVIII Aleacutem
disso tem-se o naturalismo vale dizer a ontologia do social demasiadamente
colada agrave ontologia da natureza embora natildeo se possa deixar de reconhecer que
frente ao abstracionismo metafiacutesico trata-se de um meacuterito pretender uma
ontologia ligada agrave natureza que em verdade eacute idealizada Talvez o melhor
exemplo dessa tradiccedilatildeo seja justamente Feuerbach
3) Do criticismo - a impossibilidade de uma ontologia como saber do
em si ou seja do ente enquanto ente pela via do absolutismo racional
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dedutivista Em Kant em verdade tem-se a impossibilidade de uma ontologia
em Marx ao reveacutes tem-se apenas tal recusa agrave especulaccedilatildeo mas natildeo a
impossibilidade de conhecer o ente enquanto ente vale dizer Marx aceita o
espiacuterito da criacutetica kantiana ao conhecimento absoluto mas natildeo sua resultante
sistemaacutetica a sua vedaccedilatildeo ao conhecimento das coisas enquanto tais
4) Do hegelianismo - a concepccedilatildeo histoacuterica do ser portanto de sua
contrariedade bem como a natureza aproximativa do processo de
conhecimento ao mesmo tempo em que recusa o invoacutelucro miacutestico do
pensamento hegeliano - a dialeacutetica autocircnoma da razatildeo como demiurgo do real
ou da efetividade sensiacutevel ou seja refuta decidamente seu caraacuteter
especulativo
5) Do neohegelianismo - a problemaacutetica do homem e muito
especificamente duas contribuiccedilotildees de Feuerbach a criacutetica agrave especulaccedilatildeo e os
lineamentos mais gerais do ser soacute enquanto ser sensiacutevel ou objetivo (dimensotildees
de uma ontologia geral em seu niacutevel mais abstrato) Mas ao lado desse
aspecto positivo do pensamento feuerbachiano natildeo eacute possiacutevel deixar de
assinalar a objeccedilatildeo fundamental dirigida a ele por Marx sua concepccedilatildeo
naturalista do homem vale dizer sua incapacidade de o determinar como ser
social Assim em Feuerbach o homem eacute sensiacutevel objetivonatural e natildeo
objetivo-social - a grande descoberta marxiana
Grande descoberta que eacute mais amplamente avaliada quando se
considera o conjunto das linhas manifestas pelos principais representantes do
neohegelianismo B Bauer formulador de uma concepccedilatildeo do homem como
auto-consciecircncia racional M Stirner com a elevaccedilatildeo do egoiacutesmo agrave condiccedilatildeo de
essecircncia humana Feuerbach com a concepccedilatildeo naturalista do homem centrada
no amor Nesse cenaacuterio somente Marx comparece com a descoberta da
sociabilidade como substacircncia constitutiva do homem - e natildeo meramente uma
essecircncia imutaacutevel mas histoacuterica e contraditoacuteria produzida e reproduzida pela
proacutepria atividade sensiacutevel dos homens
11
De sorte que do ente enquanto ente aristoteacutelico determinado por sua
forma substancial eterna ao ser social marxiano compreendido em suas
mudanccedilas categoriais - eacute do que consiste a histoacuteria - se vai de uma filosofia
primeira que terminou por sua resoluccedilatildeo originaacuteria na forma de um saber
absoluto a um saber histoacuterico de base que se desenvolve pela infinitude de
aproximaccedilotildees empreendidas em direccedilatildeo ao absoluto entendido pura e
simplesmente como completude ou totalidade que praticamente nunca se
realiza porque desnecessaacuterio para o saber ao qual bastam completudes mais
modestas e ainda mais como saber para a praacutetica
De modo que a filosofia primeira de configuraccedilatildeo marxiana eacute antes de
tudo a afirmaccedilatildeo da objetividade do mundo e a possibilidade ser conhecido
possibilidade que eacute soacutecio-historicamente determinada exercendo a funccedilatildeo de
base e guia para a ciecircncia da histoacuteria especificamente como ontologia regional
do ser social e que nutre das ciecircncias e a elas responde tanto quanto elas
mesmas tem de responder aos lineamentos ontoloacutegicos pelos quais se guiam
mas aos quais natildeo tomam como coaacutegulos de saber imutaacutevel De sorte que
ontologia e ciecircncia se potencializam e se criticam reciacuteproca e
permanentemente
Tambeacutem de acordo com Chasin por essas razotildees a ontologia
marxiana natildeo eacute uma resoluccedilatildeo de caraacuteter absoluto nos moldes do sistema
convencional mas a condiccedilatildeo de possibilidade de resoluccedilatildeo do saber Eacute em
outras palavras um estatuto movente e movido de cientificidade orienta e eacute
orientado pela ciecircncia e pela praacutetica universal dos homens Orienta e eacute
orientada guia e eacute guiada corrige e eacute corrigida Ou seja natildeo eacute um absoluto
inquestionaacutevel uma certeza estabelecida por deduccedilatildeo a partir de axiomas de
uma vez para sempre Mesmo porque a certeza cognitiva natildeo pode estar no
ponto de partida mas compreendida como alvo de uma busca permanente
procura intensiva e extensiva cuja infinitude eacute posta a cada momento entre
parecircnteses no qual o grau de certeza alcanccedilado eacute assumido como realizaccedilatildeo
maacutexima tendo por limites as possibilidades do tempo ou cenaacuterio histoacuterico grau
12
a ser confirmado ou ampliado ou ao inveacutes restringido na parte ou descartado
no todo posteriormente com todas as suas implicaccedilotildees correlatas
Em suma quando se utiliza a expressatildeo posiccedilatildeo ontoloacutegica e natildeo
perspectiva oacutetica prisma ou ponto de vista pretende-se remeter a lugar e agraves
coisas ou seja o reconhecimento do mundo como multiverso de entes reais
objetivos e que por isso mesmo faceiam o observador praacutetico ou teoacuterico natildeo
dependendo deste para existir em face do qual satildeo independentes Eacute
finalmente o reconhecimento da prioridade das coisas nas relaccedilotildees cognitivas
sem desconhecer eacute claro o caraacuteter ativo do investigador
Quando Chasin procura enfatizar o reconhecimento noccedilatildeo
imediatamente conexa a de posiccedilatildeo ontoloacutegica eacute por que aquela tem a
vantagem de colocar em primeiro lugar o caraacuteter natildeo puramente teoacuterico
contemplativo mas sobretudo praacutetico[viii] da aproximaccedilatildeo ao ente aleacutem da
natureza da operaccedilatildeo mental que designa - constataccedilatildeo ou recogniccedilatildeo vale
dizer a admissatildeo de algo a respeito do qual o discurso se pronuncia como forma
imediata de representaccedilatildeo
Relevar o caraacuteter praacutetico de aproximaccedilatildeo ao ente ou em outras
palavras partir ou dar prioridade agrave praacutetica significa por seu turno partir do
caraacuteter essencial do ser do homem por sua exteriorizaccedilatildeo operativa no mundo
que confirma sua forma de vida ou modo de existecircncia Quer dizer eacute um ponto
de partida desde logo sob criteacuterio ontoloacutegico ou seja que considera a
efetividade ocircntica do homem e do mundo de tal sorte que ambos satildeo
reconhecidos enquanto atividade sensiacutevel Caminho que tem o meacuterito de evitar
as vias reflexas[ix] como tambeacutem os engenhos e supostos dos encantamentos
especulativos como cogito sujeito transcendental ou os arqueacutetipos
generalizando uma expressatildeo marxiana os misticismos loacutegicos que nunca
deixam de mostrar sua condiccedilatildeo de artifiacutecios por mais rigorosos e envolventes
que sejam tanto que podem sempre ser contestados de algum modo ao passo
que os indiviacuteduos vivos e ativos os pressupostos dos quais Marx parte em A
13
Ideologia Alematilde natildeo podem nunca ser recusados a natildeo ser na fantasia e sob
pena de cancelar todo e qualquer andamento reflexivo
Em suma reconhecimento ontopraacutetico significa pois tomar como
ponto de partida a praacutetica - desde a praacutetica cotidiana agrave praacutetica cientiacutefica de ponta
- de um tempo dado
O plano ontopraacutetico jaacute bem delineado no texto de 1995 ganha nos
anos seguintes sucessivas correccedilotildees por parte do autor a ponto de se tornar o
eixo a partir do qual Chasin faz a criacutetica das Teorias da Fundamentaccedilatildeo ou
como ele as denomina ironicamente A Querela da Fundamentaccedilatildeo
A esse respeito costumava ele indagar O que eacute um fundamento Uma
Teoria da Subjetividade ou Uma Teoria da Objetividade
Se o fundamento for considerado a partir de uma teoria da
subjetividade por onde comeccedilar Pelo aparato sensorial como no empirismo
Ou pela consciecircncia ou coisa que o valha como o cogito cartesiano a
autoconsciecircncia a razatildeo ou as formas a priori do entendimento Ou ainda uma
teoria da mente
Ainda no plano do fundamento subjetivo poder-se-ia partir da
experiecircncia da vivecircncia do vivido Neste caso o vivido seria o preacute-teoreacutetico
mas enquanto experiecircncia existencial isto eacute as vivecircncias do indiviacuteduo isolado
em experiecircncia aleatoacuteria fortuita acidental
Mas se o fundamento for uma Teoria da Objetividade por onde
comeccedilar Pelos fenocircmenos empiacutericos Mas nesse caso natildeo terminariacuteamos
apenas no fundamento psicoloacutegico isto eacute teriacuteamos o psicologismo como
fundamento da verdade
14
E se partiacutessemos do todo concreto Natildeo findariacuteamos numa visatildeo
caoacutetica e abstrata de conjuntos indeterminados desamparados na companhia
de um punhado de abstraccedilotildees razoaacuteveis e irrazoaacuteveis
Feitas tais indagaccedilotildees Chasin conclui de modo enfaacutetico Toda peticcedilatildeo
de fundamento todo discurso por um fundamento estaacute encerrado na esfera
teoacuterica Aleacutem do mais todo discurso de fundamentaccedilatildeo pretende e implica uma
certeza ou seja de um modo ou de outro a suposiccedilatildeo de um saber absoluto
ainda que um simples momento do saber absoluto Vale dizer o discurso da
fundamentaccedilatildeo desemboca de algum modo na razatildeo especulativa Em outras
palavras implica algo que transcende a proacutepria natureza do saber que eacute um
processo infinito de aproximaccedilotildees
Para Chasin o reconhecimento do ontopraacutetico tem a vantagem de
escapar agrave querela da fundamentaccedilatildeo na medida em que parte da experiecircncia
real melhor dizendo da praacutetica real natildeo de uma experiecircncia isolada
arbitrariamente natildeo da experiecircncia aleatoacuteria da suposta existecircncia existencial
dos indiviacuteduos isolados dos indiviacuteduos em derreliccedilatildeo
O universo ontopraacutetico eacute o necessariamente vivido para que qualquer
pergunta possa se dar Eacute portanto a esfera preacute-teoreacutetica esfera que antecede
qualquer teoria Esfera sem a qual natildeo haacute vida humana e portanto sem a qual
natildeo pode haver qualquer pergunta teoacuterica
A reflexatildeo que tem como ponto de partida o ontopraacutetico estabelece
assim um pressuposto concreto (e natildeo uma verdade ideada) do qual natildeo posso
me afastar a natildeo ser na imaginaccedilatildeo
Em siacutentese a esfera ontopraacutetica representa o complexos dos homens
vivos e ativos A partir dessa abstraccedilatildeo razoaacutevel - o ontopraacutetico - pode-se
encontrar jaacute numa analiacutetica de desentranhamento desse complexo real o
devido lugar da ontologia da epistemologia e da ciecircncia da histoacuteria que
compreende dois grandes ramos natureza e sociedade
15
Em outras palavras sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico torna-se
aleatoacuteria a localizaccedilatildeo que se confere tanto ao ontoloacutegico quanto ao epistecircmico
A opccedilatildeo por um deles se torna uma arbitrariedade teoacuterica e eacute justamente isto
que gera a querela da fundamentaccedilatildeo pois a decisatildeo fica submersa ao plano
teoacuterico ao jogo dos argumentos agrave ambivalecircncia do logos que eacute irresolutivo
Sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico parte-se assim de imediato da
teoria e natildeo do ser que faz da teoria ou deste como uma abstraccedilatildeo da
inteligibilidade ou seja de uma faculdade abstraiacuteda do ser que a possui
gerando com isso um absurdo ontoloacutegico
Eacute portanto a partir da analiacutetica do ontopraacutetico pelo reconhecimento de
seus traccedilos categoriais que tem iniacutecio a elaboraccedilatildeo ontoloacutegica Ou seja a
ontologia nasce como reflexatildeo conscientizaccedilatildeo conceituaccedilatildeo do ontopraacutetico
enquanto primeiro objeto da ontologia que a partir daiacute se encaminha em
direccedilatildeo agrave criacutetica - em termos de sua necessidade e loacutegica especiacutefica - do proacuteprio
ontopraacutetico isto eacute do complexo dos objetos reais aiacute incluiacutedo o homem
Resta ainda em relaccedilatildeo agrave problemaacutetica geral em tela aflorar a questatildeo
da adequatio tal como era tematizada tambeacutem em seus cursos
Polemizando com a denominaccedilatildeo de realismo comumente utilizada
para denominar proposituras que conferem prioridade ao mundo objetual
Chasin afirmava que haacute realismo - antigo - quando eacute suposto que a ordem da
razatildeo agrave idecircntica a ordem do real e que a partir de axiomas por meios racionais-
dedutivos embuiacutedos do espiacuterito de sistema se possa estabelecer a verdade do
mundo
Em Marx entretanto a ordem das coisas e da razatildeo satildeo distintas (um
exemplo expressivo desta postura marxiana pode ser encontrada na famosa
Introduccedilatildeo de 57) ambas mutaacuteveis e processuais - unidade da desidentidade
entre ser e saber Assim o mundo natildeo pode ser deduzido racionalmente mas
reproduzido sob forma de ideacuteia por meio de aproximaccedilotildees - empiacuterico abstrato
16
concreto - num processo intensivo e extensivo historicamente condicionado
possibilitado ou impedido - na dependecircncia que fica da maturaccedilatildeo do objeto e
do posicionamento do sujeito O processo mimeacutetico eacute portanto reproduccedilatildeo
conceitual de efetividades donde se lida com duas ordens de formaccedilotildees real e
ideal A reproduccedilatildeo conceitual apresenta portanto sua proacutepria loacutegica mas no
interior da determinaccedilatildeo soacutecio-histoacuterica do pensamento de modo que uma
teoria do conhecimento (morfologia e dinacircmica da subjetividade in abstratu e
imutaacutevel) eacute incapaz de explicar o processo cognitivo pois a faculdade humana
da forccedila da abstraccedilatildeo depende das possibilidades oferecidas pela
determinaccedilatildeo social do pensamento que por sua vez se manifesta e se
configura pelo desenvolvimento dos objetos e da praacutetica humana que sobre eles
tem incidecircncia
Donde a franca afirmaccedilatildeo marxiana da possibilidade de conhecer natildeo
se confunde com a simplicidade e facilidade da concepccedilatildeo realista nem mesmo
no plano da ingenuidade cotidiana desde logo porque a atividade cotidiana -
que estaacute para aleacutem da ingenuidade ou lanccedila os sujeitos para aleacutem da
ingenuidade - eacute em si um complexo rico e desafiador matrizador inclusive da
intentio recta atitude natural e necessaacuteria da esfera ontopraacutetica
Haacute portanto que distinguir as grandes diferenccedilas ontoloacutegicas entre o
estatuto marxiano e a ontologia realista Na primeira a adequatio digamos
assim eacute correlaccedilatildeo entre formaccedilatildeo real e formaccedilatildeo ideal duas ordens distintas
de configuraccedilatildeo Em outras palavras eacute correlaccedilatildeo conceitual entre entificaccedilatildeo
concreta e reproduccedilatildeo conceitual Em suma a reproduccedilatildeo conceitual nada mais
eacute do que transposiccedilatildeo agrave cabeccedila ordenada pelos nexos do real na forma e pelos
meios da proacutepria atividade mental
I - Tomando Marx por Base e por Ponto de Chegada
17
Considerando como ponto de referecircncia as consideraccedilotildees
desenvolvidas por Marx em O Capital especificamente sobre a dificuldade
encontrada pela humanidade na compreensatildeo do valor ao longo de dois
milecircnios - de Aristoacuteteles a Ricardo - pode-se sustentar segundo Chasin que
um fenocircmeno muito similar a este se produziu no que tange agrave determinaccedilatildeo do
ser ou seja da(s) matriz(es) da(s) realidade(s) ou seja da efetividade
Tomemos as passagens em questatildeo que se encontram no Prefaacutecio agrave
Primeira Ediccedilatildeo de O Capital Todo comeccedilo eacute difiacutecil isso vale para qualquer
ciecircncia A forma do valor cuja figura acabada eacute a forma do dinheiro eacute muito
simples e vazia de conteuacutedo Mesmo assim o espiacuterito humano tem procurado
desvendaacute-la (ergruumlden) em vatildeo haacute mais de 2000 anos enquanto por outro lado
teve ecircxito ao menos aproximado a anaacutelise de formas muito mais complicadas e
replenas de conteuacutedo Por quecirc Porque o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de
estudar do que a ceacutelula do corpo Aleacutem disso na anaacutelise das formas econocircmicas
natildeo podem servir nem o microscoacutepio nem reagentes quiacutemicos A forccedila da
abstraccedilatildeo deve substituir a ambos Para o leigo a anaacutelise parece se perder
em pedantismo Trata-se efetivamente de pedantismo mas daquele de que se
ocupa a anatomia microscoacutepica
De acordo com Chasin eacute necessaacuterio reter os seguintes noacutedulos
significativos da citaccedilatildeo acima
1) todo iniacutecio de uma ciecircncia eacute difiacutecil donde o princiacutepio da ontologia o
princiacutepio da ciecircncia deve ser o mais difiacutecil de todos
2) haacute grande dificuldade na compreensatildeo da forma do valor que eacute um
objeto simples e vazio de conteuacutedo
3) haacute ecircxito maior na anaacutelise de formas mais complicadas e replenas de
conteuacutedo
18
Na mesma citaccedilatildeo Marx enuncia os motivos de tal dificuldade
1) o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de estudar do que a ceacutelula do
corpo
2) meacutetodos experimentais natildeo satildeo aplicaacuteveis a esse tipo de forma
3) a analiacutetica dessa forma pela forccedila da abstraccedilatildeo deve tomar o lugar
da observaccedilatildeo empiacuterica e experimental
4) anaacutelise voltada agrave anatomia microscoacutepica da forma estudada
A partir dessas indicaccedilotildees colhidas no texto de Marx Chasin elabora
um esboccedilo para fins unicamente didaacuteticos em que busca transpassaacute-las para a
proacutepria questatildeo ontoloacutegica afirmando o que se segue
1) o iniacutecio difiacutecil da ontologia perdurou tambeacutem por mais de 2000
anos trajetoacuteria em que se observa tateios imprecisos caracterizados por um
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo ateacute chegar em Marx Tal
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo revela por seu rumo
imanentemente contraditoacuterio por seus caminhos e descaminhos histoacutericos a
dificuldade e a longa incapacidade na formulaccedilatildeo precisa de seu objeto e
alcance ou seja de sua natureza e propoacutesito - de sua funccedilatildeo orientadora e
sustentadora no plano teoacuterico e de sua origem praacutetica preacute-teoreacutetica
2) reconhecimento ontopraacutetico das formas dos seres e analiacutetica da
forma do ser apenas por meio da forccedila da abstraccedilatildeo no reconhecimento
ontopraacutetico os seres satildeo reconhecidos como substantivos e nesse caso ateacute
certo ponto vale para a observaccedilatildeo espontacircnea e observaccedilatildeo comum pois o
desvendamento completo exige forccedila de abstraccedilatildeo como verbo ( o ato de ser
de Gilson) soacute a forccedila da abstraccedilatildeo daiacute a facilidade para se cair no
abstrativismo
19
Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
20
De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
22
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
30
realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
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conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
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estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
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tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
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2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
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7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
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mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
trivialidades Sua arte natildeo consiste em revelar o oculto mas ocultar o
revelado[ii]
Em suma para dar iniacutecio ao delineamento da histoacuteria da ontologia eacute
preciso em primeiro lugar abandonar sua pretensatildeo infantil agrave atemporalidade e
se dar conta de que seja compulsoriamente histoacuterica de que se faz no tempo
tatildeo contraditoriatmente quanto a proacutepria entificaccedilatildeo de seu histoacuterico agente
Em segundo lugar Chasin considerava inadiaacutevel reprocessar a
decifraccedilatildeo ou o entendimento de Marx em determinaccedilatildeo reciacuteproca com as
vicissitudes da histoacuteria da ontologia na tentativa de ultrapassar as derrotas
sofridas ao longo dos uacuteltimos 150 anos e principalmente a partir do
entendimento efetivo do pensamento marxiano e tambeacutem do atual
desenvolvimento do capital redimensionar a perspectiva dos alvos e rumos
teoacutericos e praacuteticos a exercitar no presente e levar a efeito no futuro
O debate dito ontoloacutegico do seacuteculo XX girou em torno de conhecido
conjunto de fontes Enquanto Hartmann com o volume I de sua Ontologia de
1934 eacute uma contraposiccedilatildeo agrave desontologizaccedilatildeo em geral e agraves novas tendecircncias
do seacuteculo principalmente Heidegger feita do ponto de vista
fenomenoloacutegiconeokantiano Eacute Gilson eacute a resposta neotomista no interior da
filosofia francesa ao desafio posto por O Ser eo Nada (1943) de Sartre cujo
sub-tiacutetulo ensaio de ontologia fenomenoloacutegica logo aponta para a sua afiliaccedilatildeo
a Husserl e o tributo pago de toda a maneira a Heidegger que o conduziram a
inviabilizaccedilotildees definitivas e irremissiacuteveis que natildeo desobriga todavia de
distinguir radicalmente seu propoacutesito e sua personalidade do autor de Ser e
Tempo (1926) dedicada a Edmund Husserl Em testemunho de Admiraccedilatildeo e
Amizade
De acordo com a posiccedilatildeo que Chasin veio assumir nos seus uacuteltimos
anos de vida nas muacuteltiplas diacutevidas contraiacutedas pelo marxismo no seacuteculo XX
figura precisamente esta ter entrado muito tardia e restritamente nessa
5
discussatildeo vale dizer soacute quando a vitoacuteria temporaacuteria jaacute havia pendido para o
outro lado natildeo apenas por sua exclusiva presenccedila na arena mas porque
condicionado e impulsionado pelo proacuteprio caraacuteter de nossos tempos Os arautos
que se impuseram satildeo muito conhecidos tomaram o espaccedilo sem ter que
enfrentar o adversaacuterio efetivo uacutenico capaz de contraditar e oferecer alternativa
Este em vez disso perdeu-se sem luta sucumbiu agrave linha dominante do
cientificismo e acabou junto com os melhores tambeacutem perdido nesse campo
Nem eacute preciso referir o leste europeu mas com o politicismo generalizado o
marxismo se perdeu inclusive com os melhores que o seacuteculo produziu
Apenas em fins da deacutecada de 60 quando tudo estava desabando
Lukaacutecs de traveacutes se deu conta do misteacuterio Eacute muito significativo que nesse
despertar obliacutequumlo tenha tido que se voltar agrave refutaccedilatildeo entre outros de
Heidegger quando este escrever seu livro principal no miacutenimo em parte em
oposiccedilatildeo a Histoacuteria e Consciecircncia de Classe (textos de 1919-22) Eacute igualmente
sintomaacutetico que soacute tenha retomado deliberadamente a preocupaccedilatildeo ontoloacutegica
ao final da vida e sucumbido ao objeto em obra inconclusa motivada acima de
tudo pelo vieacutes excecircntrico de conferir poder regenerador agrave eacutetica Mas eacute sabido
que junto com seu meacuterito natildeo pereceu sozinho Por exemplo onde estatildeo
Hartman Gilson e ateacute mesmo Sartre
As dificuldades para o devido enfrentamento da questatildeo ontoloacutegica hoje
satildeo enormes e jaacute eram conhecidas por Lukaacutecs muito embora o filoacutesofo huacutengaro
morto em 1971 natildeo tenha assistido o pleno triunfo de concepccedilotildees que
consagram o homem derrelito denominaccedilatildeo essa empregada por ele mesmo ao
se reportar a Heidegger por exemplo
Tais dificuldades grosso modo poderiam ser atribuiacutedas inicialmente agraves
tendecircncias que tecircm como ponto de partida o criticismo kantiano que se
impuseram na viragem do seacuteculo XIX para o XX com a reduccedilatildeo da filosofia ao
circuito da problemaacutetica do conhecimento
6
Embora se possa assim considerar o criticismo kantiano como uma
espeacutecie de divisor de aacuteguas natildeo se deve obliterar o fato de que com a
metafiacutesica claacutessica ou qualquer uma de suas variantes antecedentes ou
subsequumlentes sob o pretexto de alcanccedilar a priori a certeza cognitiva gera-se
uma grave distorccedilatildeo no plano teoacuterico pela qual o ente eacute perdido para sempre
Para evitar tal descaminho Chasin propotildee o designativo posiccedilatildeo ontoloacutegica
pois com ela pretende tambeacutem pelo menos precaver contra a unilateralidade
decorrente da postura gnoseoloacutegica (sempre uma forma meramente
especulativa a respeito da morfologia do funcionamento ou seja da
organizaccedilatildeo e atividade da subjetividade) instigando e se rigorosamente
praticada orientando com rigor a pensar as coisas em seus proacuteprios nexos em
direccedilatildeo a uma totalidade mais plena de determinaccedilotildees A expressatildeo pretende
pois sinalizar e induzir agrave praacutetica intelectual de caraacuteter ontoloacutegico concebida em
sua forma mais consistente e consequumlente
Chasin pois pretendeu recuperar o sentido de ontologia enquanto
consideraccedilatildeo daquilo que eacute em sua efetividade Natildeo alguma distorccedilatildeo ou
dissoluccedilatildeo do ente enquanto ente seja sob sua forma do sentido do ente do
ser da apariccedilatildeo ou qualquer outra variaacutevel do tipo que embora possam incluir
dimensotildees do sensiacutevel sempre compreendem implicam ou tecircm por condiccedilatildeo de
possibilidade um sujeito mesmo que este seja o obervador da produccedilatildeo de
representaccedilotildees de caraacuteter racional Estudo pois das coisas em sua
independecircncia em sua exterioridade em face de possiacuteveis relaccedilotildees praacuteticas e
teoacutericas em que estatildeo ou possam vir a estar presentes inclusive aquelas pelas
quais em gecircnero superior de entificaccedilatildeo as coisas satildeo postas ou engendradas
De tal sorte que ainda e mesmo que todo o plano cognitivo possa ou
tenha de ser impugnado que toda ciecircncia possa ou tenha que ser posta em
duacutevida e considerada simples ilusatildeo ou equiacutevoco ou ter seu acircmbito reduzido agrave
pura convenccedilatildeo resta o fundamental o universo da praacutetica ou da vida vivida em
sua qualidade de confirmaccedilatildeo da dupla certeza da existecircncia do mundo e dos
homens e enquanto tal tem de ser reconhecido como ponto de partida da
7
intenccedilatildeo ontoloacutegica cujo propoacutesito eacute se constituir em base conceitual de sua
dilucidaccedilatildeo
Ainda no contexto da afirmaccedilatildeo da posiccedilatildeo ontoloacutegica e rejeiccedilatildeo seja
do vieacutes gnosioloacutegico ou cientificista seja das concepccedilotildees reinantes ditas
ontoloacutegicas Chasin de modo provocativo indaga Por que a foacutermula simples
do cogito eacute mais evidente ou funcional para efeito de fundamentaccedilatildeo do que a
evidecircncia do complexo sensiacutevel do gozo Por que a evidecircncia do cogito - o
pensamento do indiviacuteduo isolado - eacute superior agrave evidecircncia do existir que inclui a
presenccedila e a relaccedilatildeo viva dos outros e das coisas Chasin continua na mesma
direccedilatildeo no questionamento da pretensa superioridade do cogito indagando o
quecirc se esconde sob ela e acrescenta O cogito o truque cartesiano eacute a
conquista da certeza agrave custa de trecircs absurdidades o cogito desencarnado a
encarnaccedilatildeo divina da perfeiccedilatildeo e o mundo reduzido agrave extensatildeo A essas trecircs
conquistas digamos assim Chasin denomina de verdade alienada isto eacute
verdade emergente da subjetividade na forma da alienaccedilatildeo
A exercitaccedilatildeo ontoloacutegica ao contraacuterio assume como criteacuterio analiacutetico a
determinaccedilatildeo de que o objeto maturado eacute a chave do esclarecimento de suas
formas precedentes[iii] desde as embrionaacuterias ateacute as mais elaboradas que
antecedem no tempo sua fisionomia acabada Portanto a determinaccedilatildeo
marxiana do objeto maturado eacute produto desse espiacuterito teoacuterico pois soacute faz
sentido em posicionamento ontoloacutegico ou seja em reconhecimento do grau
constitutivo em que se encontra a coisa examinada
Segundo Chasin ainda Aristoacuteteles teve grande meacuterito em sua
propositura de uma filosofia primeira - base ou fundamento para a constituiccedilatildeo
das ciecircncias particulares - mas que por sua resoluccedilatildeo (de caraacuteter platocircnico
conforme jaacute demonstrara Eacute Gilson) e por seus pretendidos atributos ahistoacutericos
- categorias eternas e absolutas imutaacuteveis e perenes - constitui um modo
involuntaacuterio de elaboraccedilatildeo especulativa apesar de seu intento originaacuterio de
conhecer o efetivamente existente o ente enquanto ente Tais limites do intento
8
aristoteacutelico numa linha de argumentaccedilatildeo que confere prioridade agrave realidade
soacutecio-histoacuterica na produccedilatildeo de viabilidades ou inviabilidades teoacutericas e de sua
consequumlente explicaccedilatildeo eram vistos por Chasin como limites produzidos pelo
proacuteprio tempo grego sumariados a seguir
1) praacutetica humano-societaacuteria incipiente e acanhada que ganhou no
artigo O Futuro Ausente beliacutessima caracterizaccedilatildeo inspirada no Marx das
Formen Imaturaccedilatildeo natural e caracteriacutestica das remotas formas sociais em que
a propriedade da terra e a agricultura constituiacuteam a base da atividade material
tendo por objetivo a produccedilatildeo valores de uso ou seja a reproduccedilatildeo dos
indiviacuteduos em peculiares e bem determinadas relaccedilotildees com a comunidade[iv]
onde por via de consequumlecircncia indiviacuteduo e genecircro satildeo imediata e
transparentemente inseparaacuteveis e suas relaccedilotildees traduzem essa unidade
fundamental tornando desconhecida e impensaacutevel qualquer tipo de cissura que
contraponha ou menos ainda torne excludentes entre si as figuras de sua
polaridade[v] Mas a essa dimensatildeo positiva - sintomaticamente tatildeo atraente nos
dias atuais - corresponde uma negativa que Chasin esclarece na sequumlecircncia
todas as formas em que a comunidade pressupotildee sujeitos em determinada
unidade objetiva com as condiccedilotildees da atividade produtiva ou reciprocamente
nas quais uma especiacutefica existecircncia subjetiva faz com que a proacutepria comunidade
seja pressuposta como condiccedilatildeo de produccedilatildeo todas elas diz Marx
correspondem necessariamente e por princiacutepio a um desenvolvimento limitado
das forccedilas produtivas[vi]
2) Consequumlentemente impossibilidade para conceber a historicidade e
a contraditoriedade como categorias fundamentais do ser - que estrangulam a
mais precisa e universal por isso mesmo vaacutelida hoje e para sempre das
formulaccedilotildees atinentes agrave natureza e ao propoacutesito da ontologia
Meacuteritos e limites da filosofia primeira que apenas seratildeo realizados e
superados depois de um longo itineraacuterio repleno de contraposiccedilotildees internas
9
pelos lineamentos perfilados por Marx que tambeacutem herda criticamente
dimensotildees da filosofia moderna - do renascimento ao neohegelianismo
Desse modo com o objetivo de sumariar preliminarmente os conteuacutedos
dessa trajetoacuteria que Marx assimila por via criacutetica Chasin indica alguns deles
sem pretensatildeo alguma de esgotaacute-los
1) Do Renascimento - a infinitude do universo e o espiacuterito da
concepccedilatildeo do homem como o uacutenico ser aberto - existente e conhecido capaz
na potecircncia de seus atributos de conhecer e configurar a si e a seu mundo
ambos entendidos e tomados em sua naturalidade objetividade e o primeiro na
infinitude de sua essecircncia ativa
2) Do materialismo francecircs e inglecircs e do Iluminismo - a ruptura com a
conduta especulativa metafiacutesica e com o espiacuterito de sistema em filosofia que eacute
concebido como freio e obstaacuteculo agrave razatildeo Por meio dessa desobstruccedilatildeo o
iluminismo pode universalizar a filosofia como meio de toda verdade - natural e
espiritual - e ela passa a se voltar agraves tarefas praacuteticas donde a possibilidade e o
escopo de estabelecer a vida humana de modo racional Em outros termos
reconhece no pensamento o poder e o papel de organizar a vida o pensamento
deve ter papel analiacutetico mas tambeacutem fazer nascer a ordem cuja necessidade
ela concebeu[vii] Em contrapartida os limites do pensamento iluminista satildeo
sinteticamente os seguintes acentuaccedilatildeo unilateralizante da racionalidade
herdada do renascimento e distorcida pelo racionalismo do seacuteculo XVIII Aleacutem
disso tem-se o naturalismo vale dizer a ontologia do social demasiadamente
colada agrave ontologia da natureza embora natildeo se possa deixar de reconhecer que
frente ao abstracionismo metafiacutesico trata-se de um meacuterito pretender uma
ontologia ligada agrave natureza que em verdade eacute idealizada Talvez o melhor
exemplo dessa tradiccedilatildeo seja justamente Feuerbach
3) Do criticismo - a impossibilidade de uma ontologia como saber do
em si ou seja do ente enquanto ente pela via do absolutismo racional
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dedutivista Em Kant em verdade tem-se a impossibilidade de uma ontologia
em Marx ao reveacutes tem-se apenas tal recusa agrave especulaccedilatildeo mas natildeo a
impossibilidade de conhecer o ente enquanto ente vale dizer Marx aceita o
espiacuterito da criacutetica kantiana ao conhecimento absoluto mas natildeo sua resultante
sistemaacutetica a sua vedaccedilatildeo ao conhecimento das coisas enquanto tais
4) Do hegelianismo - a concepccedilatildeo histoacuterica do ser portanto de sua
contrariedade bem como a natureza aproximativa do processo de
conhecimento ao mesmo tempo em que recusa o invoacutelucro miacutestico do
pensamento hegeliano - a dialeacutetica autocircnoma da razatildeo como demiurgo do real
ou da efetividade sensiacutevel ou seja refuta decidamente seu caraacuteter
especulativo
5) Do neohegelianismo - a problemaacutetica do homem e muito
especificamente duas contribuiccedilotildees de Feuerbach a criacutetica agrave especulaccedilatildeo e os
lineamentos mais gerais do ser soacute enquanto ser sensiacutevel ou objetivo (dimensotildees
de uma ontologia geral em seu niacutevel mais abstrato) Mas ao lado desse
aspecto positivo do pensamento feuerbachiano natildeo eacute possiacutevel deixar de
assinalar a objeccedilatildeo fundamental dirigida a ele por Marx sua concepccedilatildeo
naturalista do homem vale dizer sua incapacidade de o determinar como ser
social Assim em Feuerbach o homem eacute sensiacutevel objetivonatural e natildeo
objetivo-social - a grande descoberta marxiana
Grande descoberta que eacute mais amplamente avaliada quando se
considera o conjunto das linhas manifestas pelos principais representantes do
neohegelianismo B Bauer formulador de uma concepccedilatildeo do homem como
auto-consciecircncia racional M Stirner com a elevaccedilatildeo do egoiacutesmo agrave condiccedilatildeo de
essecircncia humana Feuerbach com a concepccedilatildeo naturalista do homem centrada
no amor Nesse cenaacuterio somente Marx comparece com a descoberta da
sociabilidade como substacircncia constitutiva do homem - e natildeo meramente uma
essecircncia imutaacutevel mas histoacuterica e contraditoacuteria produzida e reproduzida pela
proacutepria atividade sensiacutevel dos homens
11
De sorte que do ente enquanto ente aristoteacutelico determinado por sua
forma substancial eterna ao ser social marxiano compreendido em suas
mudanccedilas categoriais - eacute do que consiste a histoacuteria - se vai de uma filosofia
primeira que terminou por sua resoluccedilatildeo originaacuteria na forma de um saber
absoluto a um saber histoacuterico de base que se desenvolve pela infinitude de
aproximaccedilotildees empreendidas em direccedilatildeo ao absoluto entendido pura e
simplesmente como completude ou totalidade que praticamente nunca se
realiza porque desnecessaacuterio para o saber ao qual bastam completudes mais
modestas e ainda mais como saber para a praacutetica
De modo que a filosofia primeira de configuraccedilatildeo marxiana eacute antes de
tudo a afirmaccedilatildeo da objetividade do mundo e a possibilidade ser conhecido
possibilidade que eacute soacutecio-historicamente determinada exercendo a funccedilatildeo de
base e guia para a ciecircncia da histoacuteria especificamente como ontologia regional
do ser social e que nutre das ciecircncias e a elas responde tanto quanto elas
mesmas tem de responder aos lineamentos ontoloacutegicos pelos quais se guiam
mas aos quais natildeo tomam como coaacutegulos de saber imutaacutevel De sorte que
ontologia e ciecircncia se potencializam e se criticam reciacuteproca e
permanentemente
Tambeacutem de acordo com Chasin por essas razotildees a ontologia
marxiana natildeo eacute uma resoluccedilatildeo de caraacuteter absoluto nos moldes do sistema
convencional mas a condiccedilatildeo de possibilidade de resoluccedilatildeo do saber Eacute em
outras palavras um estatuto movente e movido de cientificidade orienta e eacute
orientado pela ciecircncia e pela praacutetica universal dos homens Orienta e eacute
orientada guia e eacute guiada corrige e eacute corrigida Ou seja natildeo eacute um absoluto
inquestionaacutevel uma certeza estabelecida por deduccedilatildeo a partir de axiomas de
uma vez para sempre Mesmo porque a certeza cognitiva natildeo pode estar no
ponto de partida mas compreendida como alvo de uma busca permanente
procura intensiva e extensiva cuja infinitude eacute posta a cada momento entre
parecircnteses no qual o grau de certeza alcanccedilado eacute assumido como realizaccedilatildeo
maacutexima tendo por limites as possibilidades do tempo ou cenaacuterio histoacuterico grau
12
a ser confirmado ou ampliado ou ao inveacutes restringido na parte ou descartado
no todo posteriormente com todas as suas implicaccedilotildees correlatas
Em suma quando se utiliza a expressatildeo posiccedilatildeo ontoloacutegica e natildeo
perspectiva oacutetica prisma ou ponto de vista pretende-se remeter a lugar e agraves
coisas ou seja o reconhecimento do mundo como multiverso de entes reais
objetivos e que por isso mesmo faceiam o observador praacutetico ou teoacuterico natildeo
dependendo deste para existir em face do qual satildeo independentes Eacute
finalmente o reconhecimento da prioridade das coisas nas relaccedilotildees cognitivas
sem desconhecer eacute claro o caraacuteter ativo do investigador
Quando Chasin procura enfatizar o reconhecimento noccedilatildeo
imediatamente conexa a de posiccedilatildeo ontoloacutegica eacute por que aquela tem a
vantagem de colocar em primeiro lugar o caraacuteter natildeo puramente teoacuterico
contemplativo mas sobretudo praacutetico[viii] da aproximaccedilatildeo ao ente aleacutem da
natureza da operaccedilatildeo mental que designa - constataccedilatildeo ou recogniccedilatildeo vale
dizer a admissatildeo de algo a respeito do qual o discurso se pronuncia como forma
imediata de representaccedilatildeo
Relevar o caraacuteter praacutetico de aproximaccedilatildeo ao ente ou em outras
palavras partir ou dar prioridade agrave praacutetica significa por seu turno partir do
caraacuteter essencial do ser do homem por sua exteriorizaccedilatildeo operativa no mundo
que confirma sua forma de vida ou modo de existecircncia Quer dizer eacute um ponto
de partida desde logo sob criteacuterio ontoloacutegico ou seja que considera a
efetividade ocircntica do homem e do mundo de tal sorte que ambos satildeo
reconhecidos enquanto atividade sensiacutevel Caminho que tem o meacuterito de evitar
as vias reflexas[ix] como tambeacutem os engenhos e supostos dos encantamentos
especulativos como cogito sujeito transcendental ou os arqueacutetipos
generalizando uma expressatildeo marxiana os misticismos loacutegicos que nunca
deixam de mostrar sua condiccedilatildeo de artifiacutecios por mais rigorosos e envolventes
que sejam tanto que podem sempre ser contestados de algum modo ao passo
que os indiviacuteduos vivos e ativos os pressupostos dos quais Marx parte em A
13
Ideologia Alematilde natildeo podem nunca ser recusados a natildeo ser na fantasia e sob
pena de cancelar todo e qualquer andamento reflexivo
Em suma reconhecimento ontopraacutetico significa pois tomar como
ponto de partida a praacutetica - desde a praacutetica cotidiana agrave praacutetica cientiacutefica de ponta
- de um tempo dado
O plano ontopraacutetico jaacute bem delineado no texto de 1995 ganha nos
anos seguintes sucessivas correccedilotildees por parte do autor a ponto de se tornar o
eixo a partir do qual Chasin faz a criacutetica das Teorias da Fundamentaccedilatildeo ou
como ele as denomina ironicamente A Querela da Fundamentaccedilatildeo
A esse respeito costumava ele indagar O que eacute um fundamento Uma
Teoria da Subjetividade ou Uma Teoria da Objetividade
Se o fundamento for considerado a partir de uma teoria da
subjetividade por onde comeccedilar Pelo aparato sensorial como no empirismo
Ou pela consciecircncia ou coisa que o valha como o cogito cartesiano a
autoconsciecircncia a razatildeo ou as formas a priori do entendimento Ou ainda uma
teoria da mente
Ainda no plano do fundamento subjetivo poder-se-ia partir da
experiecircncia da vivecircncia do vivido Neste caso o vivido seria o preacute-teoreacutetico
mas enquanto experiecircncia existencial isto eacute as vivecircncias do indiviacuteduo isolado
em experiecircncia aleatoacuteria fortuita acidental
Mas se o fundamento for uma Teoria da Objetividade por onde
comeccedilar Pelos fenocircmenos empiacutericos Mas nesse caso natildeo terminariacuteamos
apenas no fundamento psicoloacutegico isto eacute teriacuteamos o psicologismo como
fundamento da verdade
14
E se partiacutessemos do todo concreto Natildeo findariacuteamos numa visatildeo
caoacutetica e abstrata de conjuntos indeterminados desamparados na companhia
de um punhado de abstraccedilotildees razoaacuteveis e irrazoaacuteveis
Feitas tais indagaccedilotildees Chasin conclui de modo enfaacutetico Toda peticcedilatildeo
de fundamento todo discurso por um fundamento estaacute encerrado na esfera
teoacuterica Aleacutem do mais todo discurso de fundamentaccedilatildeo pretende e implica uma
certeza ou seja de um modo ou de outro a suposiccedilatildeo de um saber absoluto
ainda que um simples momento do saber absoluto Vale dizer o discurso da
fundamentaccedilatildeo desemboca de algum modo na razatildeo especulativa Em outras
palavras implica algo que transcende a proacutepria natureza do saber que eacute um
processo infinito de aproximaccedilotildees
Para Chasin o reconhecimento do ontopraacutetico tem a vantagem de
escapar agrave querela da fundamentaccedilatildeo na medida em que parte da experiecircncia
real melhor dizendo da praacutetica real natildeo de uma experiecircncia isolada
arbitrariamente natildeo da experiecircncia aleatoacuteria da suposta existecircncia existencial
dos indiviacuteduos isolados dos indiviacuteduos em derreliccedilatildeo
O universo ontopraacutetico eacute o necessariamente vivido para que qualquer
pergunta possa se dar Eacute portanto a esfera preacute-teoreacutetica esfera que antecede
qualquer teoria Esfera sem a qual natildeo haacute vida humana e portanto sem a qual
natildeo pode haver qualquer pergunta teoacuterica
A reflexatildeo que tem como ponto de partida o ontopraacutetico estabelece
assim um pressuposto concreto (e natildeo uma verdade ideada) do qual natildeo posso
me afastar a natildeo ser na imaginaccedilatildeo
Em siacutentese a esfera ontopraacutetica representa o complexos dos homens
vivos e ativos A partir dessa abstraccedilatildeo razoaacutevel - o ontopraacutetico - pode-se
encontrar jaacute numa analiacutetica de desentranhamento desse complexo real o
devido lugar da ontologia da epistemologia e da ciecircncia da histoacuteria que
compreende dois grandes ramos natureza e sociedade
15
Em outras palavras sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico torna-se
aleatoacuteria a localizaccedilatildeo que se confere tanto ao ontoloacutegico quanto ao epistecircmico
A opccedilatildeo por um deles se torna uma arbitrariedade teoacuterica e eacute justamente isto
que gera a querela da fundamentaccedilatildeo pois a decisatildeo fica submersa ao plano
teoacuterico ao jogo dos argumentos agrave ambivalecircncia do logos que eacute irresolutivo
Sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico parte-se assim de imediato da
teoria e natildeo do ser que faz da teoria ou deste como uma abstraccedilatildeo da
inteligibilidade ou seja de uma faculdade abstraiacuteda do ser que a possui
gerando com isso um absurdo ontoloacutegico
Eacute portanto a partir da analiacutetica do ontopraacutetico pelo reconhecimento de
seus traccedilos categoriais que tem iniacutecio a elaboraccedilatildeo ontoloacutegica Ou seja a
ontologia nasce como reflexatildeo conscientizaccedilatildeo conceituaccedilatildeo do ontopraacutetico
enquanto primeiro objeto da ontologia que a partir daiacute se encaminha em
direccedilatildeo agrave criacutetica - em termos de sua necessidade e loacutegica especiacutefica - do proacuteprio
ontopraacutetico isto eacute do complexo dos objetos reais aiacute incluiacutedo o homem
Resta ainda em relaccedilatildeo agrave problemaacutetica geral em tela aflorar a questatildeo
da adequatio tal como era tematizada tambeacutem em seus cursos
Polemizando com a denominaccedilatildeo de realismo comumente utilizada
para denominar proposituras que conferem prioridade ao mundo objetual
Chasin afirmava que haacute realismo - antigo - quando eacute suposto que a ordem da
razatildeo agrave idecircntica a ordem do real e que a partir de axiomas por meios racionais-
dedutivos embuiacutedos do espiacuterito de sistema se possa estabelecer a verdade do
mundo
Em Marx entretanto a ordem das coisas e da razatildeo satildeo distintas (um
exemplo expressivo desta postura marxiana pode ser encontrada na famosa
Introduccedilatildeo de 57) ambas mutaacuteveis e processuais - unidade da desidentidade
entre ser e saber Assim o mundo natildeo pode ser deduzido racionalmente mas
reproduzido sob forma de ideacuteia por meio de aproximaccedilotildees - empiacuterico abstrato
16
concreto - num processo intensivo e extensivo historicamente condicionado
possibilitado ou impedido - na dependecircncia que fica da maturaccedilatildeo do objeto e
do posicionamento do sujeito O processo mimeacutetico eacute portanto reproduccedilatildeo
conceitual de efetividades donde se lida com duas ordens de formaccedilotildees real e
ideal A reproduccedilatildeo conceitual apresenta portanto sua proacutepria loacutegica mas no
interior da determinaccedilatildeo soacutecio-histoacuterica do pensamento de modo que uma
teoria do conhecimento (morfologia e dinacircmica da subjetividade in abstratu e
imutaacutevel) eacute incapaz de explicar o processo cognitivo pois a faculdade humana
da forccedila da abstraccedilatildeo depende das possibilidades oferecidas pela
determinaccedilatildeo social do pensamento que por sua vez se manifesta e se
configura pelo desenvolvimento dos objetos e da praacutetica humana que sobre eles
tem incidecircncia
Donde a franca afirmaccedilatildeo marxiana da possibilidade de conhecer natildeo
se confunde com a simplicidade e facilidade da concepccedilatildeo realista nem mesmo
no plano da ingenuidade cotidiana desde logo porque a atividade cotidiana -
que estaacute para aleacutem da ingenuidade ou lanccedila os sujeitos para aleacutem da
ingenuidade - eacute em si um complexo rico e desafiador matrizador inclusive da
intentio recta atitude natural e necessaacuteria da esfera ontopraacutetica
Haacute portanto que distinguir as grandes diferenccedilas ontoloacutegicas entre o
estatuto marxiano e a ontologia realista Na primeira a adequatio digamos
assim eacute correlaccedilatildeo entre formaccedilatildeo real e formaccedilatildeo ideal duas ordens distintas
de configuraccedilatildeo Em outras palavras eacute correlaccedilatildeo conceitual entre entificaccedilatildeo
concreta e reproduccedilatildeo conceitual Em suma a reproduccedilatildeo conceitual nada mais
eacute do que transposiccedilatildeo agrave cabeccedila ordenada pelos nexos do real na forma e pelos
meios da proacutepria atividade mental
I - Tomando Marx por Base e por Ponto de Chegada
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Considerando como ponto de referecircncia as consideraccedilotildees
desenvolvidas por Marx em O Capital especificamente sobre a dificuldade
encontrada pela humanidade na compreensatildeo do valor ao longo de dois
milecircnios - de Aristoacuteteles a Ricardo - pode-se sustentar segundo Chasin que
um fenocircmeno muito similar a este se produziu no que tange agrave determinaccedilatildeo do
ser ou seja da(s) matriz(es) da(s) realidade(s) ou seja da efetividade
Tomemos as passagens em questatildeo que se encontram no Prefaacutecio agrave
Primeira Ediccedilatildeo de O Capital Todo comeccedilo eacute difiacutecil isso vale para qualquer
ciecircncia A forma do valor cuja figura acabada eacute a forma do dinheiro eacute muito
simples e vazia de conteuacutedo Mesmo assim o espiacuterito humano tem procurado
desvendaacute-la (ergruumlden) em vatildeo haacute mais de 2000 anos enquanto por outro lado
teve ecircxito ao menos aproximado a anaacutelise de formas muito mais complicadas e
replenas de conteuacutedo Por quecirc Porque o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de
estudar do que a ceacutelula do corpo Aleacutem disso na anaacutelise das formas econocircmicas
natildeo podem servir nem o microscoacutepio nem reagentes quiacutemicos A forccedila da
abstraccedilatildeo deve substituir a ambos Para o leigo a anaacutelise parece se perder
em pedantismo Trata-se efetivamente de pedantismo mas daquele de que se
ocupa a anatomia microscoacutepica
De acordo com Chasin eacute necessaacuterio reter os seguintes noacutedulos
significativos da citaccedilatildeo acima
1) todo iniacutecio de uma ciecircncia eacute difiacutecil donde o princiacutepio da ontologia o
princiacutepio da ciecircncia deve ser o mais difiacutecil de todos
2) haacute grande dificuldade na compreensatildeo da forma do valor que eacute um
objeto simples e vazio de conteuacutedo
3) haacute ecircxito maior na anaacutelise de formas mais complicadas e replenas de
conteuacutedo
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Na mesma citaccedilatildeo Marx enuncia os motivos de tal dificuldade
1) o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de estudar do que a ceacutelula do
corpo
2) meacutetodos experimentais natildeo satildeo aplicaacuteveis a esse tipo de forma
3) a analiacutetica dessa forma pela forccedila da abstraccedilatildeo deve tomar o lugar
da observaccedilatildeo empiacuterica e experimental
4) anaacutelise voltada agrave anatomia microscoacutepica da forma estudada
A partir dessas indicaccedilotildees colhidas no texto de Marx Chasin elabora
um esboccedilo para fins unicamente didaacuteticos em que busca transpassaacute-las para a
proacutepria questatildeo ontoloacutegica afirmando o que se segue
1) o iniacutecio difiacutecil da ontologia perdurou tambeacutem por mais de 2000
anos trajetoacuteria em que se observa tateios imprecisos caracterizados por um
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo ateacute chegar em Marx Tal
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo revela por seu rumo
imanentemente contraditoacuterio por seus caminhos e descaminhos histoacutericos a
dificuldade e a longa incapacidade na formulaccedilatildeo precisa de seu objeto e
alcance ou seja de sua natureza e propoacutesito - de sua funccedilatildeo orientadora e
sustentadora no plano teoacuterico e de sua origem praacutetica preacute-teoreacutetica
2) reconhecimento ontopraacutetico das formas dos seres e analiacutetica da
forma do ser apenas por meio da forccedila da abstraccedilatildeo no reconhecimento
ontopraacutetico os seres satildeo reconhecidos como substantivos e nesse caso ateacute
certo ponto vale para a observaccedilatildeo espontacircnea e observaccedilatildeo comum pois o
desvendamento completo exige forccedila de abstraccedilatildeo como verbo ( o ato de ser
de Gilson) soacute a forccedila da abstraccedilatildeo daiacute a facilidade para se cair no
abstrativismo
19
Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
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De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
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reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
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2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
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realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
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tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
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2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
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mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
discussatildeo vale dizer soacute quando a vitoacuteria temporaacuteria jaacute havia pendido para o
outro lado natildeo apenas por sua exclusiva presenccedila na arena mas porque
condicionado e impulsionado pelo proacuteprio caraacuteter de nossos tempos Os arautos
que se impuseram satildeo muito conhecidos tomaram o espaccedilo sem ter que
enfrentar o adversaacuterio efetivo uacutenico capaz de contraditar e oferecer alternativa
Este em vez disso perdeu-se sem luta sucumbiu agrave linha dominante do
cientificismo e acabou junto com os melhores tambeacutem perdido nesse campo
Nem eacute preciso referir o leste europeu mas com o politicismo generalizado o
marxismo se perdeu inclusive com os melhores que o seacuteculo produziu
Apenas em fins da deacutecada de 60 quando tudo estava desabando
Lukaacutecs de traveacutes se deu conta do misteacuterio Eacute muito significativo que nesse
despertar obliacutequumlo tenha tido que se voltar agrave refutaccedilatildeo entre outros de
Heidegger quando este escrever seu livro principal no miacutenimo em parte em
oposiccedilatildeo a Histoacuteria e Consciecircncia de Classe (textos de 1919-22) Eacute igualmente
sintomaacutetico que soacute tenha retomado deliberadamente a preocupaccedilatildeo ontoloacutegica
ao final da vida e sucumbido ao objeto em obra inconclusa motivada acima de
tudo pelo vieacutes excecircntrico de conferir poder regenerador agrave eacutetica Mas eacute sabido
que junto com seu meacuterito natildeo pereceu sozinho Por exemplo onde estatildeo
Hartman Gilson e ateacute mesmo Sartre
As dificuldades para o devido enfrentamento da questatildeo ontoloacutegica hoje
satildeo enormes e jaacute eram conhecidas por Lukaacutecs muito embora o filoacutesofo huacutengaro
morto em 1971 natildeo tenha assistido o pleno triunfo de concepccedilotildees que
consagram o homem derrelito denominaccedilatildeo essa empregada por ele mesmo ao
se reportar a Heidegger por exemplo
Tais dificuldades grosso modo poderiam ser atribuiacutedas inicialmente agraves
tendecircncias que tecircm como ponto de partida o criticismo kantiano que se
impuseram na viragem do seacuteculo XIX para o XX com a reduccedilatildeo da filosofia ao
circuito da problemaacutetica do conhecimento
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Embora se possa assim considerar o criticismo kantiano como uma
espeacutecie de divisor de aacuteguas natildeo se deve obliterar o fato de que com a
metafiacutesica claacutessica ou qualquer uma de suas variantes antecedentes ou
subsequumlentes sob o pretexto de alcanccedilar a priori a certeza cognitiva gera-se
uma grave distorccedilatildeo no plano teoacuterico pela qual o ente eacute perdido para sempre
Para evitar tal descaminho Chasin propotildee o designativo posiccedilatildeo ontoloacutegica
pois com ela pretende tambeacutem pelo menos precaver contra a unilateralidade
decorrente da postura gnoseoloacutegica (sempre uma forma meramente
especulativa a respeito da morfologia do funcionamento ou seja da
organizaccedilatildeo e atividade da subjetividade) instigando e se rigorosamente
praticada orientando com rigor a pensar as coisas em seus proacuteprios nexos em
direccedilatildeo a uma totalidade mais plena de determinaccedilotildees A expressatildeo pretende
pois sinalizar e induzir agrave praacutetica intelectual de caraacuteter ontoloacutegico concebida em
sua forma mais consistente e consequumlente
Chasin pois pretendeu recuperar o sentido de ontologia enquanto
consideraccedilatildeo daquilo que eacute em sua efetividade Natildeo alguma distorccedilatildeo ou
dissoluccedilatildeo do ente enquanto ente seja sob sua forma do sentido do ente do
ser da apariccedilatildeo ou qualquer outra variaacutevel do tipo que embora possam incluir
dimensotildees do sensiacutevel sempre compreendem implicam ou tecircm por condiccedilatildeo de
possibilidade um sujeito mesmo que este seja o obervador da produccedilatildeo de
representaccedilotildees de caraacuteter racional Estudo pois das coisas em sua
independecircncia em sua exterioridade em face de possiacuteveis relaccedilotildees praacuteticas e
teoacutericas em que estatildeo ou possam vir a estar presentes inclusive aquelas pelas
quais em gecircnero superior de entificaccedilatildeo as coisas satildeo postas ou engendradas
De tal sorte que ainda e mesmo que todo o plano cognitivo possa ou
tenha de ser impugnado que toda ciecircncia possa ou tenha que ser posta em
duacutevida e considerada simples ilusatildeo ou equiacutevoco ou ter seu acircmbito reduzido agrave
pura convenccedilatildeo resta o fundamental o universo da praacutetica ou da vida vivida em
sua qualidade de confirmaccedilatildeo da dupla certeza da existecircncia do mundo e dos
homens e enquanto tal tem de ser reconhecido como ponto de partida da
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intenccedilatildeo ontoloacutegica cujo propoacutesito eacute se constituir em base conceitual de sua
dilucidaccedilatildeo
Ainda no contexto da afirmaccedilatildeo da posiccedilatildeo ontoloacutegica e rejeiccedilatildeo seja
do vieacutes gnosioloacutegico ou cientificista seja das concepccedilotildees reinantes ditas
ontoloacutegicas Chasin de modo provocativo indaga Por que a foacutermula simples
do cogito eacute mais evidente ou funcional para efeito de fundamentaccedilatildeo do que a
evidecircncia do complexo sensiacutevel do gozo Por que a evidecircncia do cogito - o
pensamento do indiviacuteduo isolado - eacute superior agrave evidecircncia do existir que inclui a
presenccedila e a relaccedilatildeo viva dos outros e das coisas Chasin continua na mesma
direccedilatildeo no questionamento da pretensa superioridade do cogito indagando o
quecirc se esconde sob ela e acrescenta O cogito o truque cartesiano eacute a
conquista da certeza agrave custa de trecircs absurdidades o cogito desencarnado a
encarnaccedilatildeo divina da perfeiccedilatildeo e o mundo reduzido agrave extensatildeo A essas trecircs
conquistas digamos assim Chasin denomina de verdade alienada isto eacute
verdade emergente da subjetividade na forma da alienaccedilatildeo
A exercitaccedilatildeo ontoloacutegica ao contraacuterio assume como criteacuterio analiacutetico a
determinaccedilatildeo de que o objeto maturado eacute a chave do esclarecimento de suas
formas precedentes[iii] desde as embrionaacuterias ateacute as mais elaboradas que
antecedem no tempo sua fisionomia acabada Portanto a determinaccedilatildeo
marxiana do objeto maturado eacute produto desse espiacuterito teoacuterico pois soacute faz
sentido em posicionamento ontoloacutegico ou seja em reconhecimento do grau
constitutivo em que se encontra a coisa examinada
Segundo Chasin ainda Aristoacuteteles teve grande meacuterito em sua
propositura de uma filosofia primeira - base ou fundamento para a constituiccedilatildeo
das ciecircncias particulares - mas que por sua resoluccedilatildeo (de caraacuteter platocircnico
conforme jaacute demonstrara Eacute Gilson) e por seus pretendidos atributos ahistoacutericos
- categorias eternas e absolutas imutaacuteveis e perenes - constitui um modo
involuntaacuterio de elaboraccedilatildeo especulativa apesar de seu intento originaacuterio de
conhecer o efetivamente existente o ente enquanto ente Tais limites do intento
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aristoteacutelico numa linha de argumentaccedilatildeo que confere prioridade agrave realidade
soacutecio-histoacuterica na produccedilatildeo de viabilidades ou inviabilidades teoacutericas e de sua
consequumlente explicaccedilatildeo eram vistos por Chasin como limites produzidos pelo
proacuteprio tempo grego sumariados a seguir
1) praacutetica humano-societaacuteria incipiente e acanhada que ganhou no
artigo O Futuro Ausente beliacutessima caracterizaccedilatildeo inspirada no Marx das
Formen Imaturaccedilatildeo natural e caracteriacutestica das remotas formas sociais em que
a propriedade da terra e a agricultura constituiacuteam a base da atividade material
tendo por objetivo a produccedilatildeo valores de uso ou seja a reproduccedilatildeo dos
indiviacuteduos em peculiares e bem determinadas relaccedilotildees com a comunidade[iv]
onde por via de consequumlecircncia indiviacuteduo e genecircro satildeo imediata e
transparentemente inseparaacuteveis e suas relaccedilotildees traduzem essa unidade
fundamental tornando desconhecida e impensaacutevel qualquer tipo de cissura que
contraponha ou menos ainda torne excludentes entre si as figuras de sua
polaridade[v] Mas a essa dimensatildeo positiva - sintomaticamente tatildeo atraente nos
dias atuais - corresponde uma negativa que Chasin esclarece na sequumlecircncia
todas as formas em que a comunidade pressupotildee sujeitos em determinada
unidade objetiva com as condiccedilotildees da atividade produtiva ou reciprocamente
nas quais uma especiacutefica existecircncia subjetiva faz com que a proacutepria comunidade
seja pressuposta como condiccedilatildeo de produccedilatildeo todas elas diz Marx
correspondem necessariamente e por princiacutepio a um desenvolvimento limitado
das forccedilas produtivas[vi]
2) Consequumlentemente impossibilidade para conceber a historicidade e
a contraditoriedade como categorias fundamentais do ser - que estrangulam a
mais precisa e universal por isso mesmo vaacutelida hoje e para sempre das
formulaccedilotildees atinentes agrave natureza e ao propoacutesito da ontologia
Meacuteritos e limites da filosofia primeira que apenas seratildeo realizados e
superados depois de um longo itineraacuterio repleno de contraposiccedilotildees internas
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pelos lineamentos perfilados por Marx que tambeacutem herda criticamente
dimensotildees da filosofia moderna - do renascimento ao neohegelianismo
Desse modo com o objetivo de sumariar preliminarmente os conteuacutedos
dessa trajetoacuteria que Marx assimila por via criacutetica Chasin indica alguns deles
sem pretensatildeo alguma de esgotaacute-los
1) Do Renascimento - a infinitude do universo e o espiacuterito da
concepccedilatildeo do homem como o uacutenico ser aberto - existente e conhecido capaz
na potecircncia de seus atributos de conhecer e configurar a si e a seu mundo
ambos entendidos e tomados em sua naturalidade objetividade e o primeiro na
infinitude de sua essecircncia ativa
2) Do materialismo francecircs e inglecircs e do Iluminismo - a ruptura com a
conduta especulativa metafiacutesica e com o espiacuterito de sistema em filosofia que eacute
concebido como freio e obstaacuteculo agrave razatildeo Por meio dessa desobstruccedilatildeo o
iluminismo pode universalizar a filosofia como meio de toda verdade - natural e
espiritual - e ela passa a se voltar agraves tarefas praacuteticas donde a possibilidade e o
escopo de estabelecer a vida humana de modo racional Em outros termos
reconhece no pensamento o poder e o papel de organizar a vida o pensamento
deve ter papel analiacutetico mas tambeacutem fazer nascer a ordem cuja necessidade
ela concebeu[vii] Em contrapartida os limites do pensamento iluminista satildeo
sinteticamente os seguintes acentuaccedilatildeo unilateralizante da racionalidade
herdada do renascimento e distorcida pelo racionalismo do seacuteculo XVIII Aleacutem
disso tem-se o naturalismo vale dizer a ontologia do social demasiadamente
colada agrave ontologia da natureza embora natildeo se possa deixar de reconhecer que
frente ao abstracionismo metafiacutesico trata-se de um meacuterito pretender uma
ontologia ligada agrave natureza que em verdade eacute idealizada Talvez o melhor
exemplo dessa tradiccedilatildeo seja justamente Feuerbach
3) Do criticismo - a impossibilidade de uma ontologia como saber do
em si ou seja do ente enquanto ente pela via do absolutismo racional
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dedutivista Em Kant em verdade tem-se a impossibilidade de uma ontologia
em Marx ao reveacutes tem-se apenas tal recusa agrave especulaccedilatildeo mas natildeo a
impossibilidade de conhecer o ente enquanto ente vale dizer Marx aceita o
espiacuterito da criacutetica kantiana ao conhecimento absoluto mas natildeo sua resultante
sistemaacutetica a sua vedaccedilatildeo ao conhecimento das coisas enquanto tais
4) Do hegelianismo - a concepccedilatildeo histoacuterica do ser portanto de sua
contrariedade bem como a natureza aproximativa do processo de
conhecimento ao mesmo tempo em que recusa o invoacutelucro miacutestico do
pensamento hegeliano - a dialeacutetica autocircnoma da razatildeo como demiurgo do real
ou da efetividade sensiacutevel ou seja refuta decidamente seu caraacuteter
especulativo
5) Do neohegelianismo - a problemaacutetica do homem e muito
especificamente duas contribuiccedilotildees de Feuerbach a criacutetica agrave especulaccedilatildeo e os
lineamentos mais gerais do ser soacute enquanto ser sensiacutevel ou objetivo (dimensotildees
de uma ontologia geral em seu niacutevel mais abstrato) Mas ao lado desse
aspecto positivo do pensamento feuerbachiano natildeo eacute possiacutevel deixar de
assinalar a objeccedilatildeo fundamental dirigida a ele por Marx sua concepccedilatildeo
naturalista do homem vale dizer sua incapacidade de o determinar como ser
social Assim em Feuerbach o homem eacute sensiacutevel objetivonatural e natildeo
objetivo-social - a grande descoberta marxiana
Grande descoberta que eacute mais amplamente avaliada quando se
considera o conjunto das linhas manifestas pelos principais representantes do
neohegelianismo B Bauer formulador de uma concepccedilatildeo do homem como
auto-consciecircncia racional M Stirner com a elevaccedilatildeo do egoiacutesmo agrave condiccedilatildeo de
essecircncia humana Feuerbach com a concepccedilatildeo naturalista do homem centrada
no amor Nesse cenaacuterio somente Marx comparece com a descoberta da
sociabilidade como substacircncia constitutiva do homem - e natildeo meramente uma
essecircncia imutaacutevel mas histoacuterica e contraditoacuteria produzida e reproduzida pela
proacutepria atividade sensiacutevel dos homens
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De sorte que do ente enquanto ente aristoteacutelico determinado por sua
forma substancial eterna ao ser social marxiano compreendido em suas
mudanccedilas categoriais - eacute do que consiste a histoacuteria - se vai de uma filosofia
primeira que terminou por sua resoluccedilatildeo originaacuteria na forma de um saber
absoluto a um saber histoacuterico de base que se desenvolve pela infinitude de
aproximaccedilotildees empreendidas em direccedilatildeo ao absoluto entendido pura e
simplesmente como completude ou totalidade que praticamente nunca se
realiza porque desnecessaacuterio para o saber ao qual bastam completudes mais
modestas e ainda mais como saber para a praacutetica
De modo que a filosofia primeira de configuraccedilatildeo marxiana eacute antes de
tudo a afirmaccedilatildeo da objetividade do mundo e a possibilidade ser conhecido
possibilidade que eacute soacutecio-historicamente determinada exercendo a funccedilatildeo de
base e guia para a ciecircncia da histoacuteria especificamente como ontologia regional
do ser social e que nutre das ciecircncias e a elas responde tanto quanto elas
mesmas tem de responder aos lineamentos ontoloacutegicos pelos quais se guiam
mas aos quais natildeo tomam como coaacutegulos de saber imutaacutevel De sorte que
ontologia e ciecircncia se potencializam e se criticam reciacuteproca e
permanentemente
Tambeacutem de acordo com Chasin por essas razotildees a ontologia
marxiana natildeo eacute uma resoluccedilatildeo de caraacuteter absoluto nos moldes do sistema
convencional mas a condiccedilatildeo de possibilidade de resoluccedilatildeo do saber Eacute em
outras palavras um estatuto movente e movido de cientificidade orienta e eacute
orientado pela ciecircncia e pela praacutetica universal dos homens Orienta e eacute
orientada guia e eacute guiada corrige e eacute corrigida Ou seja natildeo eacute um absoluto
inquestionaacutevel uma certeza estabelecida por deduccedilatildeo a partir de axiomas de
uma vez para sempre Mesmo porque a certeza cognitiva natildeo pode estar no
ponto de partida mas compreendida como alvo de uma busca permanente
procura intensiva e extensiva cuja infinitude eacute posta a cada momento entre
parecircnteses no qual o grau de certeza alcanccedilado eacute assumido como realizaccedilatildeo
maacutexima tendo por limites as possibilidades do tempo ou cenaacuterio histoacuterico grau
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a ser confirmado ou ampliado ou ao inveacutes restringido na parte ou descartado
no todo posteriormente com todas as suas implicaccedilotildees correlatas
Em suma quando se utiliza a expressatildeo posiccedilatildeo ontoloacutegica e natildeo
perspectiva oacutetica prisma ou ponto de vista pretende-se remeter a lugar e agraves
coisas ou seja o reconhecimento do mundo como multiverso de entes reais
objetivos e que por isso mesmo faceiam o observador praacutetico ou teoacuterico natildeo
dependendo deste para existir em face do qual satildeo independentes Eacute
finalmente o reconhecimento da prioridade das coisas nas relaccedilotildees cognitivas
sem desconhecer eacute claro o caraacuteter ativo do investigador
Quando Chasin procura enfatizar o reconhecimento noccedilatildeo
imediatamente conexa a de posiccedilatildeo ontoloacutegica eacute por que aquela tem a
vantagem de colocar em primeiro lugar o caraacuteter natildeo puramente teoacuterico
contemplativo mas sobretudo praacutetico[viii] da aproximaccedilatildeo ao ente aleacutem da
natureza da operaccedilatildeo mental que designa - constataccedilatildeo ou recogniccedilatildeo vale
dizer a admissatildeo de algo a respeito do qual o discurso se pronuncia como forma
imediata de representaccedilatildeo
Relevar o caraacuteter praacutetico de aproximaccedilatildeo ao ente ou em outras
palavras partir ou dar prioridade agrave praacutetica significa por seu turno partir do
caraacuteter essencial do ser do homem por sua exteriorizaccedilatildeo operativa no mundo
que confirma sua forma de vida ou modo de existecircncia Quer dizer eacute um ponto
de partida desde logo sob criteacuterio ontoloacutegico ou seja que considera a
efetividade ocircntica do homem e do mundo de tal sorte que ambos satildeo
reconhecidos enquanto atividade sensiacutevel Caminho que tem o meacuterito de evitar
as vias reflexas[ix] como tambeacutem os engenhos e supostos dos encantamentos
especulativos como cogito sujeito transcendental ou os arqueacutetipos
generalizando uma expressatildeo marxiana os misticismos loacutegicos que nunca
deixam de mostrar sua condiccedilatildeo de artifiacutecios por mais rigorosos e envolventes
que sejam tanto que podem sempre ser contestados de algum modo ao passo
que os indiviacuteduos vivos e ativos os pressupostos dos quais Marx parte em A
13
Ideologia Alematilde natildeo podem nunca ser recusados a natildeo ser na fantasia e sob
pena de cancelar todo e qualquer andamento reflexivo
Em suma reconhecimento ontopraacutetico significa pois tomar como
ponto de partida a praacutetica - desde a praacutetica cotidiana agrave praacutetica cientiacutefica de ponta
- de um tempo dado
O plano ontopraacutetico jaacute bem delineado no texto de 1995 ganha nos
anos seguintes sucessivas correccedilotildees por parte do autor a ponto de se tornar o
eixo a partir do qual Chasin faz a criacutetica das Teorias da Fundamentaccedilatildeo ou
como ele as denomina ironicamente A Querela da Fundamentaccedilatildeo
A esse respeito costumava ele indagar O que eacute um fundamento Uma
Teoria da Subjetividade ou Uma Teoria da Objetividade
Se o fundamento for considerado a partir de uma teoria da
subjetividade por onde comeccedilar Pelo aparato sensorial como no empirismo
Ou pela consciecircncia ou coisa que o valha como o cogito cartesiano a
autoconsciecircncia a razatildeo ou as formas a priori do entendimento Ou ainda uma
teoria da mente
Ainda no plano do fundamento subjetivo poder-se-ia partir da
experiecircncia da vivecircncia do vivido Neste caso o vivido seria o preacute-teoreacutetico
mas enquanto experiecircncia existencial isto eacute as vivecircncias do indiviacuteduo isolado
em experiecircncia aleatoacuteria fortuita acidental
Mas se o fundamento for uma Teoria da Objetividade por onde
comeccedilar Pelos fenocircmenos empiacutericos Mas nesse caso natildeo terminariacuteamos
apenas no fundamento psicoloacutegico isto eacute teriacuteamos o psicologismo como
fundamento da verdade
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E se partiacutessemos do todo concreto Natildeo findariacuteamos numa visatildeo
caoacutetica e abstrata de conjuntos indeterminados desamparados na companhia
de um punhado de abstraccedilotildees razoaacuteveis e irrazoaacuteveis
Feitas tais indagaccedilotildees Chasin conclui de modo enfaacutetico Toda peticcedilatildeo
de fundamento todo discurso por um fundamento estaacute encerrado na esfera
teoacuterica Aleacutem do mais todo discurso de fundamentaccedilatildeo pretende e implica uma
certeza ou seja de um modo ou de outro a suposiccedilatildeo de um saber absoluto
ainda que um simples momento do saber absoluto Vale dizer o discurso da
fundamentaccedilatildeo desemboca de algum modo na razatildeo especulativa Em outras
palavras implica algo que transcende a proacutepria natureza do saber que eacute um
processo infinito de aproximaccedilotildees
Para Chasin o reconhecimento do ontopraacutetico tem a vantagem de
escapar agrave querela da fundamentaccedilatildeo na medida em que parte da experiecircncia
real melhor dizendo da praacutetica real natildeo de uma experiecircncia isolada
arbitrariamente natildeo da experiecircncia aleatoacuteria da suposta existecircncia existencial
dos indiviacuteduos isolados dos indiviacuteduos em derreliccedilatildeo
O universo ontopraacutetico eacute o necessariamente vivido para que qualquer
pergunta possa se dar Eacute portanto a esfera preacute-teoreacutetica esfera que antecede
qualquer teoria Esfera sem a qual natildeo haacute vida humana e portanto sem a qual
natildeo pode haver qualquer pergunta teoacuterica
A reflexatildeo que tem como ponto de partida o ontopraacutetico estabelece
assim um pressuposto concreto (e natildeo uma verdade ideada) do qual natildeo posso
me afastar a natildeo ser na imaginaccedilatildeo
Em siacutentese a esfera ontopraacutetica representa o complexos dos homens
vivos e ativos A partir dessa abstraccedilatildeo razoaacutevel - o ontopraacutetico - pode-se
encontrar jaacute numa analiacutetica de desentranhamento desse complexo real o
devido lugar da ontologia da epistemologia e da ciecircncia da histoacuteria que
compreende dois grandes ramos natureza e sociedade
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Em outras palavras sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico torna-se
aleatoacuteria a localizaccedilatildeo que se confere tanto ao ontoloacutegico quanto ao epistecircmico
A opccedilatildeo por um deles se torna uma arbitrariedade teoacuterica e eacute justamente isto
que gera a querela da fundamentaccedilatildeo pois a decisatildeo fica submersa ao plano
teoacuterico ao jogo dos argumentos agrave ambivalecircncia do logos que eacute irresolutivo
Sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico parte-se assim de imediato da
teoria e natildeo do ser que faz da teoria ou deste como uma abstraccedilatildeo da
inteligibilidade ou seja de uma faculdade abstraiacuteda do ser que a possui
gerando com isso um absurdo ontoloacutegico
Eacute portanto a partir da analiacutetica do ontopraacutetico pelo reconhecimento de
seus traccedilos categoriais que tem iniacutecio a elaboraccedilatildeo ontoloacutegica Ou seja a
ontologia nasce como reflexatildeo conscientizaccedilatildeo conceituaccedilatildeo do ontopraacutetico
enquanto primeiro objeto da ontologia que a partir daiacute se encaminha em
direccedilatildeo agrave criacutetica - em termos de sua necessidade e loacutegica especiacutefica - do proacuteprio
ontopraacutetico isto eacute do complexo dos objetos reais aiacute incluiacutedo o homem
Resta ainda em relaccedilatildeo agrave problemaacutetica geral em tela aflorar a questatildeo
da adequatio tal como era tematizada tambeacutem em seus cursos
Polemizando com a denominaccedilatildeo de realismo comumente utilizada
para denominar proposituras que conferem prioridade ao mundo objetual
Chasin afirmava que haacute realismo - antigo - quando eacute suposto que a ordem da
razatildeo agrave idecircntica a ordem do real e que a partir de axiomas por meios racionais-
dedutivos embuiacutedos do espiacuterito de sistema se possa estabelecer a verdade do
mundo
Em Marx entretanto a ordem das coisas e da razatildeo satildeo distintas (um
exemplo expressivo desta postura marxiana pode ser encontrada na famosa
Introduccedilatildeo de 57) ambas mutaacuteveis e processuais - unidade da desidentidade
entre ser e saber Assim o mundo natildeo pode ser deduzido racionalmente mas
reproduzido sob forma de ideacuteia por meio de aproximaccedilotildees - empiacuterico abstrato
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concreto - num processo intensivo e extensivo historicamente condicionado
possibilitado ou impedido - na dependecircncia que fica da maturaccedilatildeo do objeto e
do posicionamento do sujeito O processo mimeacutetico eacute portanto reproduccedilatildeo
conceitual de efetividades donde se lida com duas ordens de formaccedilotildees real e
ideal A reproduccedilatildeo conceitual apresenta portanto sua proacutepria loacutegica mas no
interior da determinaccedilatildeo soacutecio-histoacuterica do pensamento de modo que uma
teoria do conhecimento (morfologia e dinacircmica da subjetividade in abstratu e
imutaacutevel) eacute incapaz de explicar o processo cognitivo pois a faculdade humana
da forccedila da abstraccedilatildeo depende das possibilidades oferecidas pela
determinaccedilatildeo social do pensamento que por sua vez se manifesta e se
configura pelo desenvolvimento dos objetos e da praacutetica humana que sobre eles
tem incidecircncia
Donde a franca afirmaccedilatildeo marxiana da possibilidade de conhecer natildeo
se confunde com a simplicidade e facilidade da concepccedilatildeo realista nem mesmo
no plano da ingenuidade cotidiana desde logo porque a atividade cotidiana -
que estaacute para aleacutem da ingenuidade ou lanccedila os sujeitos para aleacutem da
ingenuidade - eacute em si um complexo rico e desafiador matrizador inclusive da
intentio recta atitude natural e necessaacuteria da esfera ontopraacutetica
Haacute portanto que distinguir as grandes diferenccedilas ontoloacutegicas entre o
estatuto marxiano e a ontologia realista Na primeira a adequatio digamos
assim eacute correlaccedilatildeo entre formaccedilatildeo real e formaccedilatildeo ideal duas ordens distintas
de configuraccedilatildeo Em outras palavras eacute correlaccedilatildeo conceitual entre entificaccedilatildeo
concreta e reproduccedilatildeo conceitual Em suma a reproduccedilatildeo conceitual nada mais
eacute do que transposiccedilatildeo agrave cabeccedila ordenada pelos nexos do real na forma e pelos
meios da proacutepria atividade mental
I - Tomando Marx por Base e por Ponto de Chegada
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Considerando como ponto de referecircncia as consideraccedilotildees
desenvolvidas por Marx em O Capital especificamente sobre a dificuldade
encontrada pela humanidade na compreensatildeo do valor ao longo de dois
milecircnios - de Aristoacuteteles a Ricardo - pode-se sustentar segundo Chasin que
um fenocircmeno muito similar a este se produziu no que tange agrave determinaccedilatildeo do
ser ou seja da(s) matriz(es) da(s) realidade(s) ou seja da efetividade
Tomemos as passagens em questatildeo que se encontram no Prefaacutecio agrave
Primeira Ediccedilatildeo de O Capital Todo comeccedilo eacute difiacutecil isso vale para qualquer
ciecircncia A forma do valor cuja figura acabada eacute a forma do dinheiro eacute muito
simples e vazia de conteuacutedo Mesmo assim o espiacuterito humano tem procurado
desvendaacute-la (ergruumlden) em vatildeo haacute mais de 2000 anos enquanto por outro lado
teve ecircxito ao menos aproximado a anaacutelise de formas muito mais complicadas e
replenas de conteuacutedo Por quecirc Porque o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de
estudar do que a ceacutelula do corpo Aleacutem disso na anaacutelise das formas econocircmicas
natildeo podem servir nem o microscoacutepio nem reagentes quiacutemicos A forccedila da
abstraccedilatildeo deve substituir a ambos Para o leigo a anaacutelise parece se perder
em pedantismo Trata-se efetivamente de pedantismo mas daquele de que se
ocupa a anatomia microscoacutepica
De acordo com Chasin eacute necessaacuterio reter os seguintes noacutedulos
significativos da citaccedilatildeo acima
1) todo iniacutecio de uma ciecircncia eacute difiacutecil donde o princiacutepio da ontologia o
princiacutepio da ciecircncia deve ser o mais difiacutecil de todos
2) haacute grande dificuldade na compreensatildeo da forma do valor que eacute um
objeto simples e vazio de conteuacutedo
3) haacute ecircxito maior na anaacutelise de formas mais complicadas e replenas de
conteuacutedo
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Na mesma citaccedilatildeo Marx enuncia os motivos de tal dificuldade
1) o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de estudar do que a ceacutelula do
corpo
2) meacutetodos experimentais natildeo satildeo aplicaacuteveis a esse tipo de forma
3) a analiacutetica dessa forma pela forccedila da abstraccedilatildeo deve tomar o lugar
da observaccedilatildeo empiacuterica e experimental
4) anaacutelise voltada agrave anatomia microscoacutepica da forma estudada
A partir dessas indicaccedilotildees colhidas no texto de Marx Chasin elabora
um esboccedilo para fins unicamente didaacuteticos em que busca transpassaacute-las para a
proacutepria questatildeo ontoloacutegica afirmando o que se segue
1) o iniacutecio difiacutecil da ontologia perdurou tambeacutem por mais de 2000
anos trajetoacuteria em que se observa tateios imprecisos caracterizados por um
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo ateacute chegar em Marx Tal
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo revela por seu rumo
imanentemente contraditoacuterio por seus caminhos e descaminhos histoacutericos a
dificuldade e a longa incapacidade na formulaccedilatildeo precisa de seu objeto e
alcance ou seja de sua natureza e propoacutesito - de sua funccedilatildeo orientadora e
sustentadora no plano teoacuterico e de sua origem praacutetica preacute-teoreacutetica
2) reconhecimento ontopraacutetico das formas dos seres e analiacutetica da
forma do ser apenas por meio da forccedila da abstraccedilatildeo no reconhecimento
ontopraacutetico os seres satildeo reconhecidos como substantivos e nesse caso ateacute
certo ponto vale para a observaccedilatildeo espontacircnea e observaccedilatildeo comum pois o
desvendamento completo exige forccedila de abstraccedilatildeo como verbo ( o ato de ser
de Gilson) soacute a forccedila da abstraccedilatildeo daiacute a facilidade para se cair no
abstrativismo
19
Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
20
De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
22
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
30
realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
35
tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
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2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
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7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
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mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
Embora se possa assim considerar o criticismo kantiano como uma
espeacutecie de divisor de aacuteguas natildeo se deve obliterar o fato de que com a
metafiacutesica claacutessica ou qualquer uma de suas variantes antecedentes ou
subsequumlentes sob o pretexto de alcanccedilar a priori a certeza cognitiva gera-se
uma grave distorccedilatildeo no plano teoacuterico pela qual o ente eacute perdido para sempre
Para evitar tal descaminho Chasin propotildee o designativo posiccedilatildeo ontoloacutegica
pois com ela pretende tambeacutem pelo menos precaver contra a unilateralidade
decorrente da postura gnoseoloacutegica (sempre uma forma meramente
especulativa a respeito da morfologia do funcionamento ou seja da
organizaccedilatildeo e atividade da subjetividade) instigando e se rigorosamente
praticada orientando com rigor a pensar as coisas em seus proacuteprios nexos em
direccedilatildeo a uma totalidade mais plena de determinaccedilotildees A expressatildeo pretende
pois sinalizar e induzir agrave praacutetica intelectual de caraacuteter ontoloacutegico concebida em
sua forma mais consistente e consequumlente
Chasin pois pretendeu recuperar o sentido de ontologia enquanto
consideraccedilatildeo daquilo que eacute em sua efetividade Natildeo alguma distorccedilatildeo ou
dissoluccedilatildeo do ente enquanto ente seja sob sua forma do sentido do ente do
ser da apariccedilatildeo ou qualquer outra variaacutevel do tipo que embora possam incluir
dimensotildees do sensiacutevel sempre compreendem implicam ou tecircm por condiccedilatildeo de
possibilidade um sujeito mesmo que este seja o obervador da produccedilatildeo de
representaccedilotildees de caraacuteter racional Estudo pois das coisas em sua
independecircncia em sua exterioridade em face de possiacuteveis relaccedilotildees praacuteticas e
teoacutericas em que estatildeo ou possam vir a estar presentes inclusive aquelas pelas
quais em gecircnero superior de entificaccedilatildeo as coisas satildeo postas ou engendradas
De tal sorte que ainda e mesmo que todo o plano cognitivo possa ou
tenha de ser impugnado que toda ciecircncia possa ou tenha que ser posta em
duacutevida e considerada simples ilusatildeo ou equiacutevoco ou ter seu acircmbito reduzido agrave
pura convenccedilatildeo resta o fundamental o universo da praacutetica ou da vida vivida em
sua qualidade de confirmaccedilatildeo da dupla certeza da existecircncia do mundo e dos
homens e enquanto tal tem de ser reconhecido como ponto de partida da
7
intenccedilatildeo ontoloacutegica cujo propoacutesito eacute se constituir em base conceitual de sua
dilucidaccedilatildeo
Ainda no contexto da afirmaccedilatildeo da posiccedilatildeo ontoloacutegica e rejeiccedilatildeo seja
do vieacutes gnosioloacutegico ou cientificista seja das concepccedilotildees reinantes ditas
ontoloacutegicas Chasin de modo provocativo indaga Por que a foacutermula simples
do cogito eacute mais evidente ou funcional para efeito de fundamentaccedilatildeo do que a
evidecircncia do complexo sensiacutevel do gozo Por que a evidecircncia do cogito - o
pensamento do indiviacuteduo isolado - eacute superior agrave evidecircncia do existir que inclui a
presenccedila e a relaccedilatildeo viva dos outros e das coisas Chasin continua na mesma
direccedilatildeo no questionamento da pretensa superioridade do cogito indagando o
quecirc se esconde sob ela e acrescenta O cogito o truque cartesiano eacute a
conquista da certeza agrave custa de trecircs absurdidades o cogito desencarnado a
encarnaccedilatildeo divina da perfeiccedilatildeo e o mundo reduzido agrave extensatildeo A essas trecircs
conquistas digamos assim Chasin denomina de verdade alienada isto eacute
verdade emergente da subjetividade na forma da alienaccedilatildeo
A exercitaccedilatildeo ontoloacutegica ao contraacuterio assume como criteacuterio analiacutetico a
determinaccedilatildeo de que o objeto maturado eacute a chave do esclarecimento de suas
formas precedentes[iii] desde as embrionaacuterias ateacute as mais elaboradas que
antecedem no tempo sua fisionomia acabada Portanto a determinaccedilatildeo
marxiana do objeto maturado eacute produto desse espiacuterito teoacuterico pois soacute faz
sentido em posicionamento ontoloacutegico ou seja em reconhecimento do grau
constitutivo em que se encontra a coisa examinada
Segundo Chasin ainda Aristoacuteteles teve grande meacuterito em sua
propositura de uma filosofia primeira - base ou fundamento para a constituiccedilatildeo
das ciecircncias particulares - mas que por sua resoluccedilatildeo (de caraacuteter platocircnico
conforme jaacute demonstrara Eacute Gilson) e por seus pretendidos atributos ahistoacutericos
- categorias eternas e absolutas imutaacuteveis e perenes - constitui um modo
involuntaacuterio de elaboraccedilatildeo especulativa apesar de seu intento originaacuterio de
conhecer o efetivamente existente o ente enquanto ente Tais limites do intento
8
aristoteacutelico numa linha de argumentaccedilatildeo que confere prioridade agrave realidade
soacutecio-histoacuterica na produccedilatildeo de viabilidades ou inviabilidades teoacutericas e de sua
consequumlente explicaccedilatildeo eram vistos por Chasin como limites produzidos pelo
proacuteprio tempo grego sumariados a seguir
1) praacutetica humano-societaacuteria incipiente e acanhada que ganhou no
artigo O Futuro Ausente beliacutessima caracterizaccedilatildeo inspirada no Marx das
Formen Imaturaccedilatildeo natural e caracteriacutestica das remotas formas sociais em que
a propriedade da terra e a agricultura constituiacuteam a base da atividade material
tendo por objetivo a produccedilatildeo valores de uso ou seja a reproduccedilatildeo dos
indiviacuteduos em peculiares e bem determinadas relaccedilotildees com a comunidade[iv]
onde por via de consequumlecircncia indiviacuteduo e genecircro satildeo imediata e
transparentemente inseparaacuteveis e suas relaccedilotildees traduzem essa unidade
fundamental tornando desconhecida e impensaacutevel qualquer tipo de cissura que
contraponha ou menos ainda torne excludentes entre si as figuras de sua
polaridade[v] Mas a essa dimensatildeo positiva - sintomaticamente tatildeo atraente nos
dias atuais - corresponde uma negativa que Chasin esclarece na sequumlecircncia
todas as formas em que a comunidade pressupotildee sujeitos em determinada
unidade objetiva com as condiccedilotildees da atividade produtiva ou reciprocamente
nas quais uma especiacutefica existecircncia subjetiva faz com que a proacutepria comunidade
seja pressuposta como condiccedilatildeo de produccedilatildeo todas elas diz Marx
correspondem necessariamente e por princiacutepio a um desenvolvimento limitado
das forccedilas produtivas[vi]
2) Consequumlentemente impossibilidade para conceber a historicidade e
a contraditoriedade como categorias fundamentais do ser - que estrangulam a
mais precisa e universal por isso mesmo vaacutelida hoje e para sempre das
formulaccedilotildees atinentes agrave natureza e ao propoacutesito da ontologia
Meacuteritos e limites da filosofia primeira que apenas seratildeo realizados e
superados depois de um longo itineraacuterio repleno de contraposiccedilotildees internas
9
pelos lineamentos perfilados por Marx que tambeacutem herda criticamente
dimensotildees da filosofia moderna - do renascimento ao neohegelianismo
Desse modo com o objetivo de sumariar preliminarmente os conteuacutedos
dessa trajetoacuteria que Marx assimila por via criacutetica Chasin indica alguns deles
sem pretensatildeo alguma de esgotaacute-los
1) Do Renascimento - a infinitude do universo e o espiacuterito da
concepccedilatildeo do homem como o uacutenico ser aberto - existente e conhecido capaz
na potecircncia de seus atributos de conhecer e configurar a si e a seu mundo
ambos entendidos e tomados em sua naturalidade objetividade e o primeiro na
infinitude de sua essecircncia ativa
2) Do materialismo francecircs e inglecircs e do Iluminismo - a ruptura com a
conduta especulativa metafiacutesica e com o espiacuterito de sistema em filosofia que eacute
concebido como freio e obstaacuteculo agrave razatildeo Por meio dessa desobstruccedilatildeo o
iluminismo pode universalizar a filosofia como meio de toda verdade - natural e
espiritual - e ela passa a se voltar agraves tarefas praacuteticas donde a possibilidade e o
escopo de estabelecer a vida humana de modo racional Em outros termos
reconhece no pensamento o poder e o papel de organizar a vida o pensamento
deve ter papel analiacutetico mas tambeacutem fazer nascer a ordem cuja necessidade
ela concebeu[vii] Em contrapartida os limites do pensamento iluminista satildeo
sinteticamente os seguintes acentuaccedilatildeo unilateralizante da racionalidade
herdada do renascimento e distorcida pelo racionalismo do seacuteculo XVIII Aleacutem
disso tem-se o naturalismo vale dizer a ontologia do social demasiadamente
colada agrave ontologia da natureza embora natildeo se possa deixar de reconhecer que
frente ao abstracionismo metafiacutesico trata-se de um meacuterito pretender uma
ontologia ligada agrave natureza que em verdade eacute idealizada Talvez o melhor
exemplo dessa tradiccedilatildeo seja justamente Feuerbach
3) Do criticismo - a impossibilidade de uma ontologia como saber do
em si ou seja do ente enquanto ente pela via do absolutismo racional
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dedutivista Em Kant em verdade tem-se a impossibilidade de uma ontologia
em Marx ao reveacutes tem-se apenas tal recusa agrave especulaccedilatildeo mas natildeo a
impossibilidade de conhecer o ente enquanto ente vale dizer Marx aceita o
espiacuterito da criacutetica kantiana ao conhecimento absoluto mas natildeo sua resultante
sistemaacutetica a sua vedaccedilatildeo ao conhecimento das coisas enquanto tais
4) Do hegelianismo - a concepccedilatildeo histoacuterica do ser portanto de sua
contrariedade bem como a natureza aproximativa do processo de
conhecimento ao mesmo tempo em que recusa o invoacutelucro miacutestico do
pensamento hegeliano - a dialeacutetica autocircnoma da razatildeo como demiurgo do real
ou da efetividade sensiacutevel ou seja refuta decidamente seu caraacuteter
especulativo
5) Do neohegelianismo - a problemaacutetica do homem e muito
especificamente duas contribuiccedilotildees de Feuerbach a criacutetica agrave especulaccedilatildeo e os
lineamentos mais gerais do ser soacute enquanto ser sensiacutevel ou objetivo (dimensotildees
de uma ontologia geral em seu niacutevel mais abstrato) Mas ao lado desse
aspecto positivo do pensamento feuerbachiano natildeo eacute possiacutevel deixar de
assinalar a objeccedilatildeo fundamental dirigida a ele por Marx sua concepccedilatildeo
naturalista do homem vale dizer sua incapacidade de o determinar como ser
social Assim em Feuerbach o homem eacute sensiacutevel objetivonatural e natildeo
objetivo-social - a grande descoberta marxiana
Grande descoberta que eacute mais amplamente avaliada quando se
considera o conjunto das linhas manifestas pelos principais representantes do
neohegelianismo B Bauer formulador de uma concepccedilatildeo do homem como
auto-consciecircncia racional M Stirner com a elevaccedilatildeo do egoiacutesmo agrave condiccedilatildeo de
essecircncia humana Feuerbach com a concepccedilatildeo naturalista do homem centrada
no amor Nesse cenaacuterio somente Marx comparece com a descoberta da
sociabilidade como substacircncia constitutiva do homem - e natildeo meramente uma
essecircncia imutaacutevel mas histoacuterica e contraditoacuteria produzida e reproduzida pela
proacutepria atividade sensiacutevel dos homens
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De sorte que do ente enquanto ente aristoteacutelico determinado por sua
forma substancial eterna ao ser social marxiano compreendido em suas
mudanccedilas categoriais - eacute do que consiste a histoacuteria - se vai de uma filosofia
primeira que terminou por sua resoluccedilatildeo originaacuteria na forma de um saber
absoluto a um saber histoacuterico de base que se desenvolve pela infinitude de
aproximaccedilotildees empreendidas em direccedilatildeo ao absoluto entendido pura e
simplesmente como completude ou totalidade que praticamente nunca se
realiza porque desnecessaacuterio para o saber ao qual bastam completudes mais
modestas e ainda mais como saber para a praacutetica
De modo que a filosofia primeira de configuraccedilatildeo marxiana eacute antes de
tudo a afirmaccedilatildeo da objetividade do mundo e a possibilidade ser conhecido
possibilidade que eacute soacutecio-historicamente determinada exercendo a funccedilatildeo de
base e guia para a ciecircncia da histoacuteria especificamente como ontologia regional
do ser social e que nutre das ciecircncias e a elas responde tanto quanto elas
mesmas tem de responder aos lineamentos ontoloacutegicos pelos quais se guiam
mas aos quais natildeo tomam como coaacutegulos de saber imutaacutevel De sorte que
ontologia e ciecircncia se potencializam e se criticam reciacuteproca e
permanentemente
Tambeacutem de acordo com Chasin por essas razotildees a ontologia
marxiana natildeo eacute uma resoluccedilatildeo de caraacuteter absoluto nos moldes do sistema
convencional mas a condiccedilatildeo de possibilidade de resoluccedilatildeo do saber Eacute em
outras palavras um estatuto movente e movido de cientificidade orienta e eacute
orientado pela ciecircncia e pela praacutetica universal dos homens Orienta e eacute
orientada guia e eacute guiada corrige e eacute corrigida Ou seja natildeo eacute um absoluto
inquestionaacutevel uma certeza estabelecida por deduccedilatildeo a partir de axiomas de
uma vez para sempre Mesmo porque a certeza cognitiva natildeo pode estar no
ponto de partida mas compreendida como alvo de uma busca permanente
procura intensiva e extensiva cuja infinitude eacute posta a cada momento entre
parecircnteses no qual o grau de certeza alcanccedilado eacute assumido como realizaccedilatildeo
maacutexima tendo por limites as possibilidades do tempo ou cenaacuterio histoacuterico grau
12
a ser confirmado ou ampliado ou ao inveacutes restringido na parte ou descartado
no todo posteriormente com todas as suas implicaccedilotildees correlatas
Em suma quando se utiliza a expressatildeo posiccedilatildeo ontoloacutegica e natildeo
perspectiva oacutetica prisma ou ponto de vista pretende-se remeter a lugar e agraves
coisas ou seja o reconhecimento do mundo como multiverso de entes reais
objetivos e que por isso mesmo faceiam o observador praacutetico ou teoacuterico natildeo
dependendo deste para existir em face do qual satildeo independentes Eacute
finalmente o reconhecimento da prioridade das coisas nas relaccedilotildees cognitivas
sem desconhecer eacute claro o caraacuteter ativo do investigador
Quando Chasin procura enfatizar o reconhecimento noccedilatildeo
imediatamente conexa a de posiccedilatildeo ontoloacutegica eacute por que aquela tem a
vantagem de colocar em primeiro lugar o caraacuteter natildeo puramente teoacuterico
contemplativo mas sobretudo praacutetico[viii] da aproximaccedilatildeo ao ente aleacutem da
natureza da operaccedilatildeo mental que designa - constataccedilatildeo ou recogniccedilatildeo vale
dizer a admissatildeo de algo a respeito do qual o discurso se pronuncia como forma
imediata de representaccedilatildeo
Relevar o caraacuteter praacutetico de aproximaccedilatildeo ao ente ou em outras
palavras partir ou dar prioridade agrave praacutetica significa por seu turno partir do
caraacuteter essencial do ser do homem por sua exteriorizaccedilatildeo operativa no mundo
que confirma sua forma de vida ou modo de existecircncia Quer dizer eacute um ponto
de partida desde logo sob criteacuterio ontoloacutegico ou seja que considera a
efetividade ocircntica do homem e do mundo de tal sorte que ambos satildeo
reconhecidos enquanto atividade sensiacutevel Caminho que tem o meacuterito de evitar
as vias reflexas[ix] como tambeacutem os engenhos e supostos dos encantamentos
especulativos como cogito sujeito transcendental ou os arqueacutetipos
generalizando uma expressatildeo marxiana os misticismos loacutegicos que nunca
deixam de mostrar sua condiccedilatildeo de artifiacutecios por mais rigorosos e envolventes
que sejam tanto que podem sempre ser contestados de algum modo ao passo
que os indiviacuteduos vivos e ativos os pressupostos dos quais Marx parte em A
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Ideologia Alematilde natildeo podem nunca ser recusados a natildeo ser na fantasia e sob
pena de cancelar todo e qualquer andamento reflexivo
Em suma reconhecimento ontopraacutetico significa pois tomar como
ponto de partida a praacutetica - desde a praacutetica cotidiana agrave praacutetica cientiacutefica de ponta
- de um tempo dado
O plano ontopraacutetico jaacute bem delineado no texto de 1995 ganha nos
anos seguintes sucessivas correccedilotildees por parte do autor a ponto de se tornar o
eixo a partir do qual Chasin faz a criacutetica das Teorias da Fundamentaccedilatildeo ou
como ele as denomina ironicamente A Querela da Fundamentaccedilatildeo
A esse respeito costumava ele indagar O que eacute um fundamento Uma
Teoria da Subjetividade ou Uma Teoria da Objetividade
Se o fundamento for considerado a partir de uma teoria da
subjetividade por onde comeccedilar Pelo aparato sensorial como no empirismo
Ou pela consciecircncia ou coisa que o valha como o cogito cartesiano a
autoconsciecircncia a razatildeo ou as formas a priori do entendimento Ou ainda uma
teoria da mente
Ainda no plano do fundamento subjetivo poder-se-ia partir da
experiecircncia da vivecircncia do vivido Neste caso o vivido seria o preacute-teoreacutetico
mas enquanto experiecircncia existencial isto eacute as vivecircncias do indiviacuteduo isolado
em experiecircncia aleatoacuteria fortuita acidental
Mas se o fundamento for uma Teoria da Objetividade por onde
comeccedilar Pelos fenocircmenos empiacutericos Mas nesse caso natildeo terminariacuteamos
apenas no fundamento psicoloacutegico isto eacute teriacuteamos o psicologismo como
fundamento da verdade
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E se partiacutessemos do todo concreto Natildeo findariacuteamos numa visatildeo
caoacutetica e abstrata de conjuntos indeterminados desamparados na companhia
de um punhado de abstraccedilotildees razoaacuteveis e irrazoaacuteveis
Feitas tais indagaccedilotildees Chasin conclui de modo enfaacutetico Toda peticcedilatildeo
de fundamento todo discurso por um fundamento estaacute encerrado na esfera
teoacuterica Aleacutem do mais todo discurso de fundamentaccedilatildeo pretende e implica uma
certeza ou seja de um modo ou de outro a suposiccedilatildeo de um saber absoluto
ainda que um simples momento do saber absoluto Vale dizer o discurso da
fundamentaccedilatildeo desemboca de algum modo na razatildeo especulativa Em outras
palavras implica algo que transcende a proacutepria natureza do saber que eacute um
processo infinito de aproximaccedilotildees
Para Chasin o reconhecimento do ontopraacutetico tem a vantagem de
escapar agrave querela da fundamentaccedilatildeo na medida em que parte da experiecircncia
real melhor dizendo da praacutetica real natildeo de uma experiecircncia isolada
arbitrariamente natildeo da experiecircncia aleatoacuteria da suposta existecircncia existencial
dos indiviacuteduos isolados dos indiviacuteduos em derreliccedilatildeo
O universo ontopraacutetico eacute o necessariamente vivido para que qualquer
pergunta possa se dar Eacute portanto a esfera preacute-teoreacutetica esfera que antecede
qualquer teoria Esfera sem a qual natildeo haacute vida humana e portanto sem a qual
natildeo pode haver qualquer pergunta teoacuterica
A reflexatildeo que tem como ponto de partida o ontopraacutetico estabelece
assim um pressuposto concreto (e natildeo uma verdade ideada) do qual natildeo posso
me afastar a natildeo ser na imaginaccedilatildeo
Em siacutentese a esfera ontopraacutetica representa o complexos dos homens
vivos e ativos A partir dessa abstraccedilatildeo razoaacutevel - o ontopraacutetico - pode-se
encontrar jaacute numa analiacutetica de desentranhamento desse complexo real o
devido lugar da ontologia da epistemologia e da ciecircncia da histoacuteria que
compreende dois grandes ramos natureza e sociedade
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Em outras palavras sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico torna-se
aleatoacuteria a localizaccedilatildeo que se confere tanto ao ontoloacutegico quanto ao epistecircmico
A opccedilatildeo por um deles se torna uma arbitrariedade teoacuterica e eacute justamente isto
que gera a querela da fundamentaccedilatildeo pois a decisatildeo fica submersa ao plano
teoacuterico ao jogo dos argumentos agrave ambivalecircncia do logos que eacute irresolutivo
Sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico parte-se assim de imediato da
teoria e natildeo do ser que faz da teoria ou deste como uma abstraccedilatildeo da
inteligibilidade ou seja de uma faculdade abstraiacuteda do ser que a possui
gerando com isso um absurdo ontoloacutegico
Eacute portanto a partir da analiacutetica do ontopraacutetico pelo reconhecimento de
seus traccedilos categoriais que tem iniacutecio a elaboraccedilatildeo ontoloacutegica Ou seja a
ontologia nasce como reflexatildeo conscientizaccedilatildeo conceituaccedilatildeo do ontopraacutetico
enquanto primeiro objeto da ontologia que a partir daiacute se encaminha em
direccedilatildeo agrave criacutetica - em termos de sua necessidade e loacutegica especiacutefica - do proacuteprio
ontopraacutetico isto eacute do complexo dos objetos reais aiacute incluiacutedo o homem
Resta ainda em relaccedilatildeo agrave problemaacutetica geral em tela aflorar a questatildeo
da adequatio tal como era tematizada tambeacutem em seus cursos
Polemizando com a denominaccedilatildeo de realismo comumente utilizada
para denominar proposituras que conferem prioridade ao mundo objetual
Chasin afirmava que haacute realismo - antigo - quando eacute suposto que a ordem da
razatildeo agrave idecircntica a ordem do real e que a partir de axiomas por meios racionais-
dedutivos embuiacutedos do espiacuterito de sistema se possa estabelecer a verdade do
mundo
Em Marx entretanto a ordem das coisas e da razatildeo satildeo distintas (um
exemplo expressivo desta postura marxiana pode ser encontrada na famosa
Introduccedilatildeo de 57) ambas mutaacuteveis e processuais - unidade da desidentidade
entre ser e saber Assim o mundo natildeo pode ser deduzido racionalmente mas
reproduzido sob forma de ideacuteia por meio de aproximaccedilotildees - empiacuterico abstrato
16
concreto - num processo intensivo e extensivo historicamente condicionado
possibilitado ou impedido - na dependecircncia que fica da maturaccedilatildeo do objeto e
do posicionamento do sujeito O processo mimeacutetico eacute portanto reproduccedilatildeo
conceitual de efetividades donde se lida com duas ordens de formaccedilotildees real e
ideal A reproduccedilatildeo conceitual apresenta portanto sua proacutepria loacutegica mas no
interior da determinaccedilatildeo soacutecio-histoacuterica do pensamento de modo que uma
teoria do conhecimento (morfologia e dinacircmica da subjetividade in abstratu e
imutaacutevel) eacute incapaz de explicar o processo cognitivo pois a faculdade humana
da forccedila da abstraccedilatildeo depende das possibilidades oferecidas pela
determinaccedilatildeo social do pensamento que por sua vez se manifesta e se
configura pelo desenvolvimento dos objetos e da praacutetica humana que sobre eles
tem incidecircncia
Donde a franca afirmaccedilatildeo marxiana da possibilidade de conhecer natildeo
se confunde com a simplicidade e facilidade da concepccedilatildeo realista nem mesmo
no plano da ingenuidade cotidiana desde logo porque a atividade cotidiana -
que estaacute para aleacutem da ingenuidade ou lanccedila os sujeitos para aleacutem da
ingenuidade - eacute em si um complexo rico e desafiador matrizador inclusive da
intentio recta atitude natural e necessaacuteria da esfera ontopraacutetica
Haacute portanto que distinguir as grandes diferenccedilas ontoloacutegicas entre o
estatuto marxiano e a ontologia realista Na primeira a adequatio digamos
assim eacute correlaccedilatildeo entre formaccedilatildeo real e formaccedilatildeo ideal duas ordens distintas
de configuraccedilatildeo Em outras palavras eacute correlaccedilatildeo conceitual entre entificaccedilatildeo
concreta e reproduccedilatildeo conceitual Em suma a reproduccedilatildeo conceitual nada mais
eacute do que transposiccedilatildeo agrave cabeccedila ordenada pelos nexos do real na forma e pelos
meios da proacutepria atividade mental
I - Tomando Marx por Base e por Ponto de Chegada
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Considerando como ponto de referecircncia as consideraccedilotildees
desenvolvidas por Marx em O Capital especificamente sobre a dificuldade
encontrada pela humanidade na compreensatildeo do valor ao longo de dois
milecircnios - de Aristoacuteteles a Ricardo - pode-se sustentar segundo Chasin que
um fenocircmeno muito similar a este se produziu no que tange agrave determinaccedilatildeo do
ser ou seja da(s) matriz(es) da(s) realidade(s) ou seja da efetividade
Tomemos as passagens em questatildeo que se encontram no Prefaacutecio agrave
Primeira Ediccedilatildeo de O Capital Todo comeccedilo eacute difiacutecil isso vale para qualquer
ciecircncia A forma do valor cuja figura acabada eacute a forma do dinheiro eacute muito
simples e vazia de conteuacutedo Mesmo assim o espiacuterito humano tem procurado
desvendaacute-la (ergruumlden) em vatildeo haacute mais de 2000 anos enquanto por outro lado
teve ecircxito ao menos aproximado a anaacutelise de formas muito mais complicadas e
replenas de conteuacutedo Por quecirc Porque o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de
estudar do que a ceacutelula do corpo Aleacutem disso na anaacutelise das formas econocircmicas
natildeo podem servir nem o microscoacutepio nem reagentes quiacutemicos A forccedila da
abstraccedilatildeo deve substituir a ambos Para o leigo a anaacutelise parece se perder
em pedantismo Trata-se efetivamente de pedantismo mas daquele de que se
ocupa a anatomia microscoacutepica
De acordo com Chasin eacute necessaacuterio reter os seguintes noacutedulos
significativos da citaccedilatildeo acima
1) todo iniacutecio de uma ciecircncia eacute difiacutecil donde o princiacutepio da ontologia o
princiacutepio da ciecircncia deve ser o mais difiacutecil de todos
2) haacute grande dificuldade na compreensatildeo da forma do valor que eacute um
objeto simples e vazio de conteuacutedo
3) haacute ecircxito maior na anaacutelise de formas mais complicadas e replenas de
conteuacutedo
18
Na mesma citaccedilatildeo Marx enuncia os motivos de tal dificuldade
1) o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de estudar do que a ceacutelula do
corpo
2) meacutetodos experimentais natildeo satildeo aplicaacuteveis a esse tipo de forma
3) a analiacutetica dessa forma pela forccedila da abstraccedilatildeo deve tomar o lugar
da observaccedilatildeo empiacuterica e experimental
4) anaacutelise voltada agrave anatomia microscoacutepica da forma estudada
A partir dessas indicaccedilotildees colhidas no texto de Marx Chasin elabora
um esboccedilo para fins unicamente didaacuteticos em que busca transpassaacute-las para a
proacutepria questatildeo ontoloacutegica afirmando o que se segue
1) o iniacutecio difiacutecil da ontologia perdurou tambeacutem por mais de 2000
anos trajetoacuteria em que se observa tateios imprecisos caracterizados por um
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo ateacute chegar em Marx Tal
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo revela por seu rumo
imanentemente contraditoacuterio por seus caminhos e descaminhos histoacutericos a
dificuldade e a longa incapacidade na formulaccedilatildeo precisa de seu objeto e
alcance ou seja de sua natureza e propoacutesito - de sua funccedilatildeo orientadora e
sustentadora no plano teoacuterico e de sua origem praacutetica preacute-teoreacutetica
2) reconhecimento ontopraacutetico das formas dos seres e analiacutetica da
forma do ser apenas por meio da forccedila da abstraccedilatildeo no reconhecimento
ontopraacutetico os seres satildeo reconhecidos como substantivos e nesse caso ateacute
certo ponto vale para a observaccedilatildeo espontacircnea e observaccedilatildeo comum pois o
desvendamento completo exige forccedila de abstraccedilatildeo como verbo ( o ato de ser
de Gilson) soacute a forccedila da abstraccedilatildeo daiacute a facilidade para se cair no
abstrativismo
19
Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
20
De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
22
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
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realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
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estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
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tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
36
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
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[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
intenccedilatildeo ontoloacutegica cujo propoacutesito eacute se constituir em base conceitual de sua
dilucidaccedilatildeo
Ainda no contexto da afirmaccedilatildeo da posiccedilatildeo ontoloacutegica e rejeiccedilatildeo seja
do vieacutes gnosioloacutegico ou cientificista seja das concepccedilotildees reinantes ditas
ontoloacutegicas Chasin de modo provocativo indaga Por que a foacutermula simples
do cogito eacute mais evidente ou funcional para efeito de fundamentaccedilatildeo do que a
evidecircncia do complexo sensiacutevel do gozo Por que a evidecircncia do cogito - o
pensamento do indiviacuteduo isolado - eacute superior agrave evidecircncia do existir que inclui a
presenccedila e a relaccedilatildeo viva dos outros e das coisas Chasin continua na mesma
direccedilatildeo no questionamento da pretensa superioridade do cogito indagando o
quecirc se esconde sob ela e acrescenta O cogito o truque cartesiano eacute a
conquista da certeza agrave custa de trecircs absurdidades o cogito desencarnado a
encarnaccedilatildeo divina da perfeiccedilatildeo e o mundo reduzido agrave extensatildeo A essas trecircs
conquistas digamos assim Chasin denomina de verdade alienada isto eacute
verdade emergente da subjetividade na forma da alienaccedilatildeo
A exercitaccedilatildeo ontoloacutegica ao contraacuterio assume como criteacuterio analiacutetico a
determinaccedilatildeo de que o objeto maturado eacute a chave do esclarecimento de suas
formas precedentes[iii] desde as embrionaacuterias ateacute as mais elaboradas que
antecedem no tempo sua fisionomia acabada Portanto a determinaccedilatildeo
marxiana do objeto maturado eacute produto desse espiacuterito teoacuterico pois soacute faz
sentido em posicionamento ontoloacutegico ou seja em reconhecimento do grau
constitutivo em que se encontra a coisa examinada
Segundo Chasin ainda Aristoacuteteles teve grande meacuterito em sua
propositura de uma filosofia primeira - base ou fundamento para a constituiccedilatildeo
das ciecircncias particulares - mas que por sua resoluccedilatildeo (de caraacuteter platocircnico
conforme jaacute demonstrara Eacute Gilson) e por seus pretendidos atributos ahistoacutericos
- categorias eternas e absolutas imutaacuteveis e perenes - constitui um modo
involuntaacuterio de elaboraccedilatildeo especulativa apesar de seu intento originaacuterio de
conhecer o efetivamente existente o ente enquanto ente Tais limites do intento
8
aristoteacutelico numa linha de argumentaccedilatildeo que confere prioridade agrave realidade
soacutecio-histoacuterica na produccedilatildeo de viabilidades ou inviabilidades teoacutericas e de sua
consequumlente explicaccedilatildeo eram vistos por Chasin como limites produzidos pelo
proacuteprio tempo grego sumariados a seguir
1) praacutetica humano-societaacuteria incipiente e acanhada que ganhou no
artigo O Futuro Ausente beliacutessima caracterizaccedilatildeo inspirada no Marx das
Formen Imaturaccedilatildeo natural e caracteriacutestica das remotas formas sociais em que
a propriedade da terra e a agricultura constituiacuteam a base da atividade material
tendo por objetivo a produccedilatildeo valores de uso ou seja a reproduccedilatildeo dos
indiviacuteduos em peculiares e bem determinadas relaccedilotildees com a comunidade[iv]
onde por via de consequumlecircncia indiviacuteduo e genecircro satildeo imediata e
transparentemente inseparaacuteveis e suas relaccedilotildees traduzem essa unidade
fundamental tornando desconhecida e impensaacutevel qualquer tipo de cissura que
contraponha ou menos ainda torne excludentes entre si as figuras de sua
polaridade[v] Mas a essa dimensatildeo positiva - sintomaticamente tatildeo atraente nos
dias atuais - corresponde uma negativa que Chasin esclarece na sequumlecircncia
todas as formas em que a comunidade pressupotildee sujeitos em determinada
unidade objetiva com as condiccedilotildees da atividade produtiva ou reciprocamente
nas quais uma especiacutefica existecircncia subjetiva faz com que a proacutepria comunidade
seja pressuposta como condiccedilatildeo de produccedilatildeo todas elas diz Marx
correspondem necessariamente e por princiacutepio a um desenvolvimento limitado
das forccedilas produtivas[vi]
2) Consequumlentemente impossibilidade para conceber a historicidade e
a contraditoriedade como categorias fundamentais do ser - que estrangulam a
mais precisa e universal por isso mesmo vaacutelida hoje e para sempre das
formulaccedilotildees atinentes agrave natureza e ao propoacutesito da ontologia
Meacuteritos e limites da filosofia primeira que apenas seratildeo realizados e
superados depois de um longo itineraacuterio repleno de contraposiccedilotildees internas
9
pelos lineamentos perfilados por Marx que tambeacutem herda criticamente
dimensotildees da filosofia moderna - do renascimento ao neohegelianismo
Desse modo com o objetivo de sumariar preliminarmente os conteuacutedos
dessa trajetoacuteria que Marx assimila por via criacutetica Chasin indica alguns deles
sem pretensatildeo alguma de esgotaacute-los
1) Do Renascimento - a infinitude do universo e o espiacuterito da
concepccedilatildeo do homem como o uacutenico ser aberto - existente e conhecido capaz
na potecircncia de seus atributos de conhecer e configurar a si e a seu mundo
ambos entendidos e tomados em sua naturalidade objetividade e o primeiro na
infinitude de sua essecircncia ativa
2) Do materialismo francecircs e inglecircs e do Iluminismo - a ruptura com a
conduta especulativa metafiacutesica e com o espiacuterito de sistema em filosofia que eacute
concebido como freio e obstaacuteculo agrave razatildeo Por meio dessa desobstruccedilatildeo o
iluminismo pode universalizar a filosofia como meio de toda verdade - natural e
espiritual - e ela passa a se voltar agraves tarefas praacuteticas donde a possibilidade e o
escopo de estabelecer a vida humana de modo racional Em outros termos
reconhece no pensamento o poder e o papel de organizar a vida o pensamento
deve ter papel analiacutetico mas tambeacutem fazer nascer a ordem cuja necessidade
ela concebeu[vii] Em contrapartida os limites do pensamento iluminista satildeo
sinteticamente os seguintes acentuaccedilatildeo unilateralizante da racionalidade
herdada do renascimento e distorcida pelo racionalismo do seacuteculo XVIII Aleacutem
disso tem-se o naturalismo vale dizer a ontologia do social demasiadamente
colada agrave ontologia da natureza embora natildeo se possa deixar de reconhecer que
frente ao abstracionismo metafiacutesico trata-se de um meacuterito pretender uma
ontologia ligada agrave natureza que em verdade eacute idealizada Talvez o melhor
exemplo dessa tradiccedilatildeo seja justamente Feuerbach
3) Do criticismo - a impossibilidade de uma ontologia como saber do
em si ou seja do ente enquanto ente pela via do absolutismo racional
10
dedutivista Em Kant em verdade tem-se a impossibilidade de uma ontologia
em Marx ao reveacutes tem-se apenas tal recusa agrave especulaccedilatildeo mas natildeo a
impossibilidade de conhecer o ente enquanto ente vale dizer Marx aceita o
espiacuterito da criacutetica kantiana ao conhecimento absoluto mas natildeo sua resultante
sistemaacutetica a sua vedaccedilatildeo ao conhecimento das coisas enquanto tais
4) Do hegelianismo - a concepccedilatildeo histoacuterica do ser portanto de sua
contrariedade bem como a natureza aproximativa do processo de
conhecimento ao mesmo tempo em que recusa o invoacutelucro miacutestico do
pensamento hegeliano - a dialeacutetica autocircnoma da razatildeo como demiurgo do real
ou da efetividade sensiacutevel ou seja refuta decidamente seu caraacuteter
especulativo
5) Do neohegelianismo - a problemaacutetica do homem e muito
especificamente duas contribuiccedilotildees de Feuerbach a criacutetica agrave especulaccedilatildeo e os
lineamentos mais gerais do ser soacute enquanto ser sensiacutevel ou objetivo (dimensotildees
de uma ontologia geral em seu niacutevel mais abstrato) Mas ao lado desse
aspecto positivo do pensamento feuerbachiano natildeo eacute possiacutevel deixar de
assinalar a objeccedilatildeo fundamental dirigida a ele por Marx sua concepccedilatildeo
naturalista do homem vale dizer sua incapacidade de o determinar como ser
social Assim em Feuerbach o homem eacute sensiacutevel objetivonatural e natildeo
objetivo-social - a grande descoberta marxiana
Grande descoberta que eacute mais amplamente avaliada quando se
considera o conjunto das linhas manifestas pelos principais representantes do
neohegelianismo B Bauer formulador de uma concepccedilatildeo do homem como
auto-consciecircncia racional M Stirner com a elevaccedilatildeo do egoiacutesmo agrave condiccedilatildeo de
essecircncia humana Feuerbach com a concepccedilatildeo naturalista do homem centrada
no amor Nesse cenaacuterio somente Marx comparece com a descoberta da
sociabilidade como substacircncia constitutiva do homem - e natildeo meramente uma
essecircncia imutaacutevel mas histoacuterica e contraditoacuteria produzida e reproduzida pela
proacutepria atividade sensiacutevel dos homens
11
De sorte que do ente enquanto ente aristoteacutelico determinado por sua
forma substancial eterna ao ser social marxiano compreendido em suas
mudanccedilas categoriais - eacute do que consiste a histoacuteria - se vai de uma filosofia
primeira que terminou por sua resoluccedilatildeo originaacuteria na forma de um saber
absoluto a um saber histoacuterico de base que se desenvolve pela infinitude de
aproximaccedilotildees empreendidas em direccedilatildeo ao absoluto entendido pura e
simplesmente como completude ou totalidade que praticamente nunca se
realiza porque desnecessaacuterio para o saber ao qual bastam completudes mais
modestas e ainda mais como saber para a praacutetica
De modo que a filosofia primeira de configuraccedilatildeo marxiana eacute antes de
tudo a afirmaccedilatildeo da objetividade do mundo e a possibilidade ser conhecido
possibilidade que eacute soacutecio-historicamente determinada exercendo a funccedilatildeo de
base e guia para a ciecircncia da histoacuteria especificamente como ontologia regional
do ser social e que nutre das ciecircncias e a elas responde tanto quanto elas
mesmas tem de responder aos lineamentos ontoloacutegicos pelos quais se guiam
mas aos quais natildeo tomam como coaacutegulos de saber imutaacutevel De sorte que
ontologia e ciecircncia se potencializam e se criticam reciacuteproca e
permanentemente
Tambeacutem de acordo com Chasin por essas razotildees a ontologia
marxiana natildeo eacute uma resoluccedilatildeo de caraacuteter absoluto nos moldes do sistema
convencional mas a condiccedilatildeo de possibilidade de resoluccedilatildeo do saber Eacute em
outras palavras um estatuto movente e movido de cientificidade orienta e eacute
orientado pela ciecircncia e pela praacutetica universal dos homens Orienta e eacute
orientada guia e eacute guiada corrige e eacute corrigida Ou seja natildeo eacute um absoluto
inquestionaacutevel uma certeza estabelecida por deduccedilatildeo a partir de axiomas de
uma vez para sempre Mesmo porque a certeza cognitiva natildeo pode estar no
ponto de partida mas compreendida como alvo de uma busca permanente
procura intensiva e extensiva cuja infinitude eacute posta a cada momento entre
parecircnteses no qual o grau de certeza alcanccedilado eacute assumido como realizaccedilatildeo
maacutexima tendo por limites as possibilidades do tempo ou cenaacuterio histoacuterico grau
12
a ser confirmado ou ampliado ou ao inveacutes restringido na parte ou descartado
no todo posteriormente com todas as suas implicaccedilotildees correlatas
Em suma quando se utiliza a expressatildeo posiccedilatildeo ontoloacutegica e natildeo
perspectiva oacutetica prisma ou ponto de vista pretende-se remeter a lugar e agraves
coisas ou seja o reconhecimento do mundo como multiverso de entes reais
objetivos e que por isso mesmo faceiam o observador praacutetico ou teoacuterico natildeo
dependendo deste para existir em face do qual satildeo independentes Eacute
finalmente o reconhecimento da prioridade das coisas nas relaccedilotildees cognitivas
sem desconhecer eacute claro o caraacuteter ativo do investigador
Quando Chasin procura enfatizar o reconhecimento noccedilatildeo
imediatamente conexa a de posiccedilatildeo ontoloacutegica eacute por que aquela tem a
vantagem de colocar em primeiro lugar o caraacuteter natildeo puramente teoacuterico
contemplativo mas sobretudo praacutetico[viii] da aproximaccedilatildeo ao ente aleacutem da
natureza da operaccedilatildeo mental que designa - constataccedilatildeo ou recogniccedilatildeo vale
dizer a admissatildeo de algo a respeito do qual o discurso se pronuncia como forma
imediata de representaccedilatildeo
Relevar o caraacuteter praacutetico de aproximaccedilatildeo ao ente ou em outras
palavras partir ou dar prioridade agrave praacutetica significa por seu turno partir do
caraacuteter essencial do ser do homem por sua exteriorizaccedilatildeo operativa no mundo
que confirma sua forma de vida ou modo de existecircncia Quer dizer eacute um ponto
de partida desde logo sob criteacuterio ontoloacutegico ou seja que considera a
efetividade ocircntica do homem e do mundo de tal sorte que ambos satildeo
reconhecidos enquanto atividade sensiacutevel Caminho que tem o meacuterito de evitar
as vias reflexas[ix] como tambeacutem os engenhos e supostos dos encantamentos
especulativos como cogito sujeito transcendental ou os arqueacutetipos
generalizando uma expressatildeo marxiana os misticismos loacutegicos que nunca
deixam de mostrar sua condiccedilatildeo de artifiacutecios por mais rigorosos e envolventes
que sejam tanto que podem sempre ser contestados de algum modo ao passo
que os indiviacuteduos vivos e ativos os pressupostos dos quais Marx parte em A
13
Ideologia Alematilde natildeo podem nunca ser recusados a natildeo ser na fantasia e sob
pena de cancelar todo e qualquer andamento reflexivo
Em suma reconhecimento ontopraacutetico significa pois tomar como
ponto de partida a praacutetica - desde a praacutetica cotidiana agrave praacutetica cientiacutefica de ponta
- de um tempo dado
O plano ontopraacutetico jaacute bem delineado no texto de 1995 ganha nos
anos seguintes sucessivas correccedilotildees por parte do autor a ponto de se tornar o
eixo a partir do qual Chasin faz a criacutetica das Teorias da Fundamentaccedilatildeo ou
como ele as denomina ironicamente A Querela da Fundamentaccedilatildeo
A esse respeito costumava ele indagar O que eacute um fundamento Uma
Teoria da Subjetividade ou Uma Teoria da Objetividade
Se o fundamento for considerado a partir de uma teoria da
subjetividade por onde comeccedilar Pelo aparato sensorial como no empirismo
Ou pela consciecircncia ou coisa que o valha como o cogito cartesiano a
autoconsciecircncia a razatildeo ou as formas a priori do entendimento Ou ainda uma
teoria da mente
Ainda no plano do fundamento subjetivo poder-se-ia partir da
experiecircncia da vivecircncia do vivido Neste caso o vivido seria o preacute-teoreacutetico
mas enquanto experiecircncia existencial isto eacute as vivecircncias do indiviacuteduo isolado
em experiecircncia aleatoacuteria fortuita acidental
Mas se o fundamento for uma Teoria da Objetividade por onde
comeccedilar Pelos fenocircmenos empiacutericos Mas nesse caso natildeo terminariacuteamos
apenas no fundamento psicoloacutegico isto eacute teriacuteamos o psicologismo como
fundamento da verdade
14
E se partiacutessemos do todo concreto Natildeo findariacuteamos numa visatildeo
caoacutetica e abstrata de conjuntos indeterminados desamparados na companhia
de um punhado de abstraccedilotildees razoaacuteveis e irrazoaacuteveis
Feitas tais indagaccedilotildees Chasin conclui de modo enfaacutetico Toda peticcedilatildeo
de fundamento todo discurso por um fundamento estaacute encerrado na esfera
teoacuterica Aleacutem do mais todo discurso de fundamentaccedilatildeo pretende e implica uma
certeza ou seja de um modo ou de outro a suposiccedilatildeo de um saber absoluto
ainda que um simples momento do saber absoluto Vale dizer o discurso da
fundamentaccedilatildeo desemboca de algum modo na razatildeo especulativa Em outras
palavras implica algo que transcende a proacutepria natureza do saber que eacute um
processo infinito de aproximaccedilotildees
Para Chasin o reconhecimento do ontopraacutetico tem a vantagem de
escapar agrave querela da fundamentaccedilatildeo na medida em que parte da experiecircncia
real melhor dizendo da praacutetica real natildeo de uma experiecircncia isolada
arbitrariamente natildeo da experiecircncia aleatoacuteria da suposta existecircncia existencial
dos indiviacuteduos isolados dos indiviacuteduos em derreliccedilatildeo
O universo ontopraacutetico eacute o necessariamente vivido para que qualquer
pergunta possa se dar Eacute portanto a esfera preacute-teoreacutetica esfera que antecede
qualquer teoria Esfera sem a qual natildeo haacute vida humana e portanto sem a qual
natildeo pode haver qualquer pergunta teoacuterica
A reflexatildeo que tem como ponto de partida o ontopraacutetico estabelece
assim um pressuposto concreto (e natildeo uma verdade ideada) do qual natildeo posso
me afastar a natildeo ser na imaginaccedilatildeo
Em siacutentese a esfera ontopraacutetica representa o complexos dos homens
vivos e ativos A partir dessa abstraccedilatildeo razoaacutevel - o ontopraacutetico - pode-se
encontrar jaacute numa analiacutetica de desentranhamento desse complexo real o
devido lugar da ontologia da epistemologia e da ciecircncia da histoacuteria que
compreende dois grandes ramos natureza e sociedade
15
Em outras palavras sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico torna-se
aleatoacuteria a localizaccedilatildeo que se confere tanto ao ontoloacutegico quanto ao epistecircmico
A opccedilatildeo por um deles se torna uma arbitrariedade teoacuterica e eacute justamente isto
que gera a querela da fundamentaccedilatildeo pois a decisatildeo fica submersa ao plano
teoacuterico ao jogo dos argumentos agrave ambivalecircncia do logos que eacute irresolutivo
Sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico parte-se assim de imediato da
teoria e natildeo do ser que faz da teoria ou deste como uma abstraccedilatildeo da
inteligibilidade ou seja de uma faculdade abstraiacuteda do ser que a possui
gerando com isso um absurdo ontoloacutegico
Eacute portanto a partir da analiacutetica do ontopraacutetico pelo reconhecimento de
seus traccedilos categoriais que tem iniacutecio a elaboraccedilatildeo ontoloacutegica Ou seja a
ontologia nasce como reflexatildeo conscientizaccedilatildeo conceituaccedilatildeo do ontopraacutetico
enquanto primeiro objeto da ontologia que a partir daiacute se encaminha em
direccedilatildeo agrave criacutetica - em termos de sua necessidade e loacutegica especiacutefica - do proacuteprio
ontopraacutetico isto eacute do complexo dos objetos reais aiacute incluiacutedo o homem
Resta ainda em relaccedilatildeo agrave problemaacutetica geral em tela aflorar a questatildeo
da adequatio tal como era tematizada tambeacutem em seus cursos
Polemizando com a denominaccedilatildeo de realismo comumente utilizada
para denominar proposituras que conferem prioridade ao mundo objetual
Chasin afirmava que haacute realismo - antigo - quando eacute suposto que a ordem da
razatildeo agrave idecircntica a ordem do real e que a partir de axiomas por meios racionais-
dedutivos embuiacutedos do espiacuterito de sistema se possa estabelecer a verdade do
mundo
Em Marx entretanto a ordem das coisas e da razatildeo satildeo distintas (um
exemplo expressivo desta postura marxiana pode ser encontrada na famosa
Introduccedilatildeo de 57) ambas mutaacuteveis e processuais - unidade da desidentidade
entre ser e saber Assim o mundo natildeo pode ser deduzido racionalmente mas
reproduzido sob forma de ideacuteia por meio de aproximaccedilotildees - empiacuterico abstrato
16
concreto - num processo intensivo e extensivo historicamente condicionado
possibilitado ou impedido - na dependecircncia que fica da maturaccedilatildeo do objeto e
do posicionamento do sujeito O processo mimeacutetico eacute portanto reproduccedilatildeo
conceitual de efetividades donde se lida com duas ordens de formaccedilotildees real e
ideal A reproduccedilatildeo conceitual apresenta portanto sua proacutepria loacutegica mas no
interior da determinaccedilatildeo soacutecio-histoacuterica do pensamento de modo que uma
teoria do conhecimento (morfologia e dinacircmica da subjetividade in abstratu e
imutaacutevel) eacute incapaz de explicar o processo cognitivo pois a faculdade humana
da forccedila da abstraccedilatildeo depende das possibilidades oferecidas pela
determinaccedilatildeo social do pensamento que por sua vez se manifesta e se
configura pelo desenvolvimento dos objetos e da praacutetica humana que sobre eles
tem incidecircncia
Donde a franca afirmaccedilatildeo marxiana da possibilidade de conhecer natildeo
se confunde com a simplicidade e facilidade da concepccedilatildeo realista nem mesmo
no plano da ingenuidade cotidiana desde logo porque a atividade cotidiana -
que estaacute para aleacutem da ingenuidade ou lanccedila os sujeitos para aleacutem da
ingenuidade - eacute em si um complexo rico e desafiador matrizador inclusive da
intentio recta atitude natural e necessaacuteria da esfera ontopraacutetica
Haacute portanto que distinguir as grandes diferenccedilas ontoloacutegicas entre o
estatuto marxiano e a ontologia realista Na primeira a adequatio digamos
assim eacute correlaccedilatildeo entre formaccedilatildeo real e formaccedilatildeo ideal duas ordens distintas
de configuraccedilatildeo Em outras palavras eacute correlaccedilatildeo conceitual entre entificaccedilatildeo
concreta e reproduccedilatildeo conceitual Em suma a reproduccedilatildeo conceitual nada mais
eacute do que transposiccedilatildeo agrave cabeccedila ordenada pelos nexos do real na forma e pelos
meios da proacutepria atividade mental
I - Tomando Marx por Base e por Ponto de Chegada
17
Considerando como ponto de referecircncia as consideraccedilotildees
desenvolvidas por Marx em O Capital especificamente sobre a dificuldade
encontrada pela humanidade na compreensatildeo do valor ao longo de dois
milecircnios - de Aristoacuteteles a Ricardo - pode-se sustentar segundo Chasin que
um fenocircmeno muito similar a este se produziu no que tange agrave determinaccedilatildeo do
ser ou seja da(s) matriz(es) da(s) realidade(s) ou seja da efetividade
Tomemos as passagens em questatildeo que se encontram no Prefaacutecio agrave
Primeira Ediccedilatildeo de O Capital Todo comeccedilo eacute difiacutecil isso vale para qualquer
ciecircncia A forma do valor cuja figura acabada eacute a forma do dinheiro eacute muito
simples e vazia de conteuacutedo Mesmo assim o espiacuterito humano tem procurado
desvendaacute-la (ergruumlden) em vatildeo haacute mais de 2000 anos enquanto por outro lado
teve ecircxito ao menos aproximado a anaacutelise de formas muito mais complicadas e
replenas de conteuacutedo Por quecirc Porque o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de
estudar do que a ceacutelula do corpo Aleacutem disso na anaacutelise das formas econocircmicas
natildeo podem servir nem o microscoacutepio nem reagentes quiacutemicos A forccedila da
abstraccedilatildeo deve substituir a ambos Para o leigo a anaacutelise parece se perder
em pedantismo Trata-se efetivamente de pedantismo mas daquele de que se
ocupa a anatomia microscoacutepica
De acordo com Chasin eacute necessaacuterio reter os seguintes noacutedulos
significativos da citaccedilatildeo acima
1) todo iniacutecio de uma ciecircncia eacute difiacutecil donde o princiacutepio da ontologia o
princiacutepio da ciecircncia deve ser o mais difiacutecil de todos
2) haacute grande dificuldade na compreensatildeo da forma do valor que eacute um
objeto simples e vazio de conteuacutedo
3) haacute ecircxito maior na anaacutelise de formas mais complicadas e replenas de
conteuacutedo
18
Na mesma citaccedilatildeo Marx enuncia os motivos de tal dificuldade
1) o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de estudar do que a ceacutelula do
corpo
2) meacutetodos experimentais natildeo satildeo aplicaacuteveis a esse tipo de forma
3) a analiacutetica dessa forma pela forccedila da abstraccedilatildeo deve tomar o lugar
da observaccedilatildeo empiacuterica e experimental
4) anaacutelise voltada agrave anatomia microscoacutepica da forma estudada
A partir dessas indicaccedilotildees colhidas no texto de Marx Chasin elabora
um esboccedilo para fins unicamente didaacuteticos em que busca transpassaacute-las para a
proacutepria questatildeo ontoloacutegica afirmando o que se segue
1) o iniacutecio difiacutecil da ontologia perdurou tambeacutem por mais de 2000
anos trajetoacuteria em que se observa tateios imprecisos caracterizados por um
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo ateacute chegar em Marx Tal
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo revela por seu rumo
imanentemente contraditoacuterio por seus caminhos e descaminhos histoacutericos a
dificuldade e a longa incapacidade na formulaccedilatildeo precisa de seu objeto e
alcance ou seja de sua natureza e propoacutesito - de sua funccedilatildeo orientadora e
sustentadora no plano teoacuterico e de sua origem praacutetica preacute-teoreacutetica
2) reconhecimento ontopraacutetico das formas dos seres e analiacutetica da
forma do ser apenas por meio da forccedila da abstraccedilatildeo no reconhecimento
ontopraacutetico os seres satildeo reconhecidos como substantivos e nesse caso ateacute
certo ponto vale para a observaccedilatildeo espontacircnea e observaccedilatildeo comum pois o
desvendamento completo exige forccedila de abstraccedilatildeo como verbo ( o ato de ser
de Gilson) soacute a forccedila da abstraccedilatildeo daiacute a facilidade para se cair no
abstrativismo
19
Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
20
De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
22
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
30
realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
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estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
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tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
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2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
aristoteacutelico numa linha de argumentaccedilatildeo que confere prioridade agrave realidade
soacutecio-histoacuterica na produccedilatildeo de viabilidades ou inviabilidades teoacutericas e de sua
consequumlente explicaccedilatildeo eram vistos por Chasin como limites produzidos pelo
proacuteprio tempo grego sumariados a seguir
1) praacutetica humano-societaacuteria incipiente e acanhada que ganhou no
artigo O Futuro Ausente beliacutessima caracterizaccedilatildeo inspirada no Marx das
Formen Imaturaccedilatildeo natural e caracteriacutestica das remotas formas sociais em que
a propriedade da terra e a agricultura constituiacuteam a base da atividade material
tendo por objetivo a produccedilatildeo valores de uso ou seja a reproduccedilatildeo dos
indiviacuteduos em peculiares e bem determinadas relaccedilotildees com a comunidade[iv]
onde por via de consequumlecircncia indiviacuteduo e genecircro satildeo imediata e
transparentemente inseparaacuteveis e suas relaccedilotildees traduzem essa unidade
fundamental tornando desconhecida e impensaacutevel qualquer tipo de cissura que
contraponha ou menos ainda torne excludentes entre si as figuras de sua
polaridade[v] Mas a essa dimensatildeo positiva - sintomaticamente tatildeo atraente nos
dias atuais - corresponde uma negativa que Chasin esclarece na sequumlecircncia
todas as formas em que a comunidade pressupotildee sujeitos em determinada
unidade objetiva com as condiccedilotildees da atividade produtiva ou reciprocamente
nas quais uma especiacutefica existecircncia subjetiva faz com que a proacutepria comunidade
seja pressuposta como condiccedilatildeo de produccedilatildeo todas elas diz Marx
correspondem necessariamente e por princiacutepio a um desenvolvimento limitado
das forccedilas produtivas[vi]
2) Consequumlentemente impossibilidade para conceber a historicidade e
a contraditoriedade como categorias fundamentais do ser - que estrangulam a
mais precisa e universal por isso mesmo vaacutelida hoje e para sempre das
formulaccedilotildees atinentes agrave natureza e ao propoacutesito da ontologia
Meacuteritos e limites da filosofia primeira que apenas seratildeo realizados e
superados depois de um longo itineraacuterio repleno de contraposiccedilotildees internas
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pelos lineamentos perfilados por Marx que tambeacutem herda criticamente
dimensotildees da filosofia moderna - do renascimento ao neohegelianismo
Desse modo com o objetivo de sumariar preliminarmente os conteuacutedos
dessa trajetoacuteria que Marx assimila por via criacutetica Chasin indica alguns deles
sem pretensatildeo alguma de esgotaacute-los
1) Do Renascimento - a infinitude do universo e o espiacuterito da
concepccedilatildeo do homem como o uacutenico ser aberto - existente e conhecido capaz
na potecircncia de seus atributos de conhecer e configurar a si e a seu mundo
ambos entendidos e tomados em sua naturalidade objetividade e o primeiro na
infinitude de sua essecircncia ativa
2) Do materialismo francecircs e inglecircs e do Iluminismo - a ruptura com a
conduta especulativa metafiacutesica e com o espiacuterito de sistema em filosofia que eacute
concebido como freio e obstaacuteculo agrave razatildeo Por meio dessa desobstruccedilatildeo o
iluminismo pode universalizar a filosofia como meio de toda verdade - natural e
espiritual - e ela passa a se voltar agraves tarefas praacuteticas donde a possibilidade e o
escopo de estabelecer a vida humana de modo racional Em outros termos
reconhece no pensamento o poder e o papel de organizar a vida o pensamento
deve ter papel analiacutetico mas tambeacutem fazer nascer a ordem cuja necessidade
ela concebeu[vii] Em contrapartida os limites do pensamento iluminista satildeo
sinteticamente os seguintes acentuaccedilatildeo unilateralizante da racionalidade
herdada do renascimento e distorcida pelo racionalismo do seacuteculo XVIII Aleacutem
disso tem-se o naturalismo vale dizer a ontologia do social demasiadamente
colada agrave ontologia da natureza embora natildeo se possa deixar de reconhecer que
frente ao abstracionismo metafiacutesico trata-se de um meacuterito pretender uma
ontologia ligada agrave natureza que em verdade eacute idealizada Talvez o melhor
exemplo dessa tradiccedilatildeo seja justamente Feuerbach
3) Do criticismo - a impossibilidade de uma ontologia como saber do
em si ou seja do ente enquanto ente pela via do absolutismo racional
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dedutivista Em Kant em verdade tem-se a impossibilidade de uma ontologia
em Marx ao reveacutes tem-se apenas tal recusa agrave especulaccedilatildeo mas natildeo a
impossibilidade de conhecer o ente enquanto ente vale dizer Marx aceita o
espiacuterito da criacutetica kantiana ao conhecimento absoluto mas natildeo sua resultante
sistemaacutetica a sua vedaccedilatildeo ao conhecimento das coisas enquanto tais
4) Do hegelianismo - a concepccedilatildeo histoacuterica do ser portanto de sua
contrariedade bem como a natureza aproximativa do processo de
conhecimento ao mesmo tempo em que recusa o invoacutelucro miacutestico do
pensamento hegeliano - a dialeacutetica autocircnoma da razatildeo como demiurgo do real
ou da efetividade sensiacutevel ou seja refuta decidamente seu caraacuteter
especulativo
5) Do neohegelianismo - a problemaacutetica do homem e muito
especificamente duas contribuiccedilotildees de Feuerbach a criacutetica agrave especulaccedilatildeo e os
lineamentos mais gerais do ser soacute enquanto ser sensiacutevel ou objetivo (dimensotildees
de uma ontologia geral em seu niacutevel mais abstrato) Mas ao lado desse
aspecto positivo do pensamento feuerbachiano natildeo eacute possiacutevel deixar de
assinalar a objeccedilatildeo fundamental dirigida a ele por Marx sua concepccedilatildeo
naturalista do homem vale dizer sua incapacidade de o determinar como ser
social Assim em Feuerbach o homem eacute sensiacutevel objetivonatural e natildeo
objetivo-social - a grande descoberta marxiana
Grande descoberta que eacute mais amplamente avaliada quando se
considera o conjunto das linhas manifestas pelos principais representantes do
neohegelianismo B Bauer formulador de uma concepccedilatildeo do homem como
auto-consciecircncia racional M Stirner com a elevaccedilatildeo do egoiacutesmo agrave condiccedilatildeo de
essecircncia humana Feuerbach com a concepccedilatildeo naturalista do homem centrada
no amor Nesse cenaacuterio somente Marx comparece com a descoberta da
sociabilidade como substacircncia constitutiva do homem - e natildeo meramente uma
essecircncia imutaacutevel mas histoacuterica e contraditoacuteria produzida e reproduzida pela
proacutepria atividade sensiacutevel dos homens
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De sorte que do ente enquanto ente aristoteacutelico determinado por sua
forma substancial eterna ao ser social marxiano compreendido em suas
mudanccedilas categoriais - eacute do que consiste a histoacuteria - se vai de uma filosofia
primeira que terminou por sua resoluccedilatildeo originaacuteria na forma de um saber
absoluto a um saber histoacuterico de base que se desenvolve pela infinitude de
aproximaccedilotildees empreendidas em direccedilatildeo ao absoluto entendido pura e
simplesmente como completude ou totalidade que praticamente nunca se
realiza porque desnecessaacuterio para o saber ao qual bastam completudes mais
modestas e ainda mais como saber para a praacutetica
De modo que a filosofia primeira de configuraccedilatildeo marxiana eacute antes de
tudo a afirmaccedilatildeo da objetividade do mundo e a possibilidade ser conhecido
possibilidade que eacute soacutecio-historicamente determinada exercendo a funccedilatildeo de
base e guia para a ciecircncia da histoacuteria especificamente como ontologia regional
do ser social e que nutre das ciecircncias e a elas responde tanto quanto elas
mesmas tem de responder aos lineamentos ontoloacutegicos pelos quais se guiam
mas aos quais natildeo tomam como coaacutegulos de saber imutaacutevel De sorte que
ontologia e ciecircncia se potencializam e se criticam reciacuteproca e
permanentemente
Tambeacutem de acordo com Chasin por essas razotildees a ontologia
marxiana natildeo eacute uma resoluccedilatildeo de caraacuteter absoluto nos moldes do sistema
convencional mas a condiccedilatildeo de possibilidade de resoluccedilatildeo do saber Eacute em
outras palavras um estatuto movente e movido de cientificidade orienta e eacute
orientado pela ciecircncia e pela praacutetica universal dos homens Orienta e eacute
orientada guia e eacute guiada corrige e eacute corrigida Ou seja natildeo eacute um absoluto
inquestionaacutevel uma certeza estabelecida por deduccedilatildeo a partir de axiomas de
uma vez para sempre Mesmo porque a certeza cognitiva natildeo pode estar no
ponto de partida mas compreendida como alvo de uma busca permanente
procura intensiva e extensiva cuja infinitude eacute posta a cada momento entre
parecircnteses no qual o grau de certeza alcanccedilado eacute assumido como realizaccedilatildeo
maacutexima tendo por limites as possibilidades do tempo ou cenaacuterio histoacuterico grau
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a ser confirmado ou ampliado ou ao inveacutes restringido na parte ou descartado
no todo posteriormente com todas as suas implicaccedilotildees correlatas
Em suma quando se utiliza a expressatildeo posiccedilatildeo ontoloacutegica e natildeo
perspectiva oacutetica prisma ou ponto de vista pretende-se remeter a lugar e agraves
coisas ou seja o reconhecimento do mundo como multiverso de entes reais
objetivos e que por isso mesmo faceiam o observador praacutetico ou teoacuterico natildeo
dependendo deste para existir em face do qual satildeo independentes Eacute
finalmente o reconhecimento da prioridade das coisas nas relaccedilotildees cognitivas
sem desconhecer eacute claro o caraacuteter ativo do investigador
Quando Chasin procura enfatizar o reconhecimento noccedilatildeo
imediatamente conexa a de posiccedilatildeo ontoloacutegica eacute por que aquela tem a
vantagem de colocar em primeiro lugar o caraacuteter natildeo puramente teoacuterico
contemplativo mas sobretudo praacutetico[viii] da aproximaccedilatildeo ao ente aleacutem da
natureza da operaccedilatildeo mental que designa - constataccedilatildeo ou recogniccedilatildeo vale
dizer a admissatildeo de algo a respeito do qual o discurso se pronuncia como forma
imediata de representaccedilatildeo
Relevar o caraacuteter praacutetico de aproximaccedilatildeo ao ente ou em outras
palavras partir ou dar prioridade agrave praacutetica significa por seu turno partir do
caraacuteter essencial do ser do homem por sua exteriorizaccedilatildeo operativa no mundo
que confirma sua forma de vida ou modo de existecircncia Quer dizer eacute um ponto
de partida desde logo sob criteacuterio ontoloacutegico ou seja que considera a
efetividade ocircntica do homem e do mundo de tal sorte que ambos satildeo
reconhecidos enquanto atividade sensiacutevel Caminho que tem o meacuterito de evitar
as vias reflexas[ix] como tambeacutem os engenhos e supostos dos encantamentos
especulativos como cogito sujeito transcendental ou os arqueacutetipos
generalizando uma expressatildeo marxiana os misticismos loacutegicos que nunca
deixam de mostrar sua condiccedilatildeo de artifiacutecios por mais rigorosos e envolventes
que sejam tanto que podem sempre ser contestados de algum modo ao passo
que os indiviacuteduos vivos e ativos os pressupostos dos quais Marx parte em A
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Ideologia Alematilde natildeo podem nunca ser recusados a natildeo ser na fantasia e sob
pena de cancelar todo e qualquer andamento reflexivo
Em suma reconhecimento ontopraacutetico significa pois tomar como
ponto de partida a praacutetica - desde a praacutetica cotidiana agrave praacutetica cientiacutefica de ponta
- de um tempo dado
O plano ontopraacutetico jaacute bem delineado no texto de 1995 ganha nos
anos seguintes sucessivas correccedilotildees por parte do autor a ponto de se tornar o
eixo a partir do qual Chasin faz a criacutetica das Teorias da Fundamentaccedilatildeo ou
como ele as denomina ironicamente A Querela da Fundamentaccedilatildeo
A esse respeito costumava ele indagar O que eacute um fundamento Uma
Teoria da Subjetividade ou Uma Teoria da Objetividade
Se o fundamento for considerado a partir de uma teoria da
subjetividade por onde comeccedilar Pelo aparato sensorial como no empirismo
Ou pela consciecircncia ou coisa que o valha como o cogito cartesiano a
autoconsciecircncia a razatildeo ou as formas a priori do entendimento Ou ainda uma
teoria da mente
Ainda no plano do fundamento subjetivo poder-se-ia partir da
experiecircncia da vivecircncia do vivido Neste caso o vivido seria o preacute-teoreacutetico
mas enquanto experiecircncia existencial isto eacute as vivecircncias do indiviacuteduo isolado
em experiecircncia aleatoacuteria fortuita acidental
Mas se o fundamento for uma Teoria da Objetividade por onde
comeccedilar Pelos fenocircmenos empiacutericos Mas nesse caso natildeo terminariacuteamos
apenas no fundamento psicoloacutegico isto eacute teriacuteamos o psicologismo como
fundamento da verdade
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E se partiacutessemos do todo concreto Natildeo findariacuteamos numa visatildeo
caoacutetica e abstrata de conjuntos indeterminados desamparados na companhia
de um punhado de abstraccedilotildees razoaacuteveis e irrazoaacuteveis
Feitas tais indagaccedilotildees Chasin conclui de modo enfaacutetico Toda peticcedilatildeo
de fundamento todo discurso por um fundamento estaacute encerrado na esfera
teoacuterica Aleacutem do mais todo discurso de fundamentaccedilatildeo pretende e implica uma
certeza ou seja de um modo ou de outro a suposiccedilatildeo de um saber absoluto
ainda que um simples momento do saber absoluto Vale dizer o discurso da
fundamentaccedilatildeo desemboca de algum modo na razatildeo especulativa Em outras
palavras implica algo que transcende a proacutepria natureza do saber que eacute um
processo infinito de aproximaccedilotildees
Para Chasin o reconhecimento do ontopraacutetico tem a vantagem de
escapar agrave querela da fundamentaccedilatildeo na medida em que parte da experiecircncia
real melhor dizendo da praacutetica real natildeo de uma experiecircncia isolada
arbitrariamente natildeo da experiecircncia aleatoacuteria da suposta existecircncia existencial
dos indiviacuteduos isolados dos indiviacuteduos em derreliccedilatildeo
O universo ontopraacutetico eacute o necessariamente vivido para que qualquer
pergunta possa se dar Eacute portanto a esfera preacute-teoreacutetica esfera que antecede
qualquer teoria Esfera sem a qual natildeo haacute vida humana e portanto sem a qual
natildeo pode haver qualquer pergunta teoacuterica
A reflexatildeo que tem como ponto de partida o ontopraacutetico estabelece
assim um pressuposto concreto (e natildeo uma verdade ideada) do qual natildeo posso
me afastar a natildeo ser na imaginaccedilatildeo
Em siacutentese a esfera ontopraacutetica representa o complexos dos homens
vivos e ativos A partir dessa abstraccedilatildeo razoaacutevel - o ontopraacutetico - pode-se
encontrar jaacute numa analiacutetica de desentranhamento desse complexo real o
devido lugar da ontologia da epistemologia e da ciecircncia da histoacuteria que
compreende dois grandes ramos natureza e sociedade
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Em outras palavras sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico torna-se
aleatoacuteria a localizaccedilatildeo que se confere tanto ao ontoloacutegico quanto ao epistecircmico
A opccedilatildeo por um deles se torna uma arbitrariedade teoacuterica e eacute justamente isto
que gera a querela da fundamentaccedilatildeo pois a decisatildeo fica submersa ao plano
teoacuterico ao jogo dos argumentos agrave ambivalecircncia do logos que eacute irresolutivo
Sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico parte-se assim de imediato da
teoria e natildeo do ser que faz da teoria ou deste como uma abstraccedilatildeo da
inteligibilidade ou seja de uma faculdade abstraiacuteda do ser que a possui
gerando com isso um absurdo ontoloacutegico
Eacute portanto a partir da analiacutetica do ontopraacutetico pelo reconhecimento de
seus traccedilos categoriais que tem iniacutecio a elaboraccedilatildeo ontoloacutegica Ou seja a
ontologia nasce como reflexatildeo conscientizaccedilatildeo conceituaccedilatildeo do ontopraacutetico
enquanto primeiro objeto da ontologia que a partir daiacute se encaminha em
direccedilatildeo agrave criacutetica - em termos de sua necessidade e loacutegica especiacutefica - do proacuteprio
ontopraacutetico isto eacute do complexo dos objetos reais aiacute incluiacutedo o homem
Resta ainda em relaccedilatildeo agrave problemaacutetica geral em tela aflorar a questatildeo
da adequatio tal como era tematizada tambeacutem em seus cursos
Polemizando com a denominaccedilatildeo de realismo comumente utilizada
para denominar proposituras que conferem prioridade ao mundo objetual
Chasin afirmava que haacute realismo - antigo - quando eacute suposto que a ordem da
razatildeo agrave idecircntica a ordem do real e que a partir de axiomas por meios racionais-
dedutivos embuiacutedos do espiacuterito de sistema se possa estabelecer a verdade do
mundo
Em Marx entretanto a ordem das coisas e da razatildeo satildeo distintas (um
exemplo expressivo desta postura marxiana pode ser encontrada na famosa
Introduccedilatildeo de 57) ambas mutaacuteveis e processuais - unidade da desidentidade
entre ser e saber Assim o mundo natildeo pode ser deduzido racionalmente mas
reproduzido sob forma de ideacuteia por meio de aproximaccedilotildees - empiacuterico abstrato
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concreto - num processo intensivo e extensivo historicamente condicionado
possibilitado ou impedido - na dependecircncia que fica da maturaccedilatildeo do objeto e
do posicionamento do sujeito O processo mimeacutetico eacute portanto reproduccedilatildeo
conceitual de efetividades donde se lida com duas ordens de formaccedilotildees real e
ideal A reproduccedilatildeo conceitual apresenta portanto sua proacutepria loacutegica mas no
interior da determinaccedilatildeo soacutecio-histoacuterica do pensamento de modo que uma
teoria do conhecimento (morfologia e dinacircmica da subjetividade in abstratu e
imutaacutevel) eacute incapaz de explicar o processo cognitivo pois a faculdade humana
da forccedila da abstraccedilatildeo depende das possibilidades oferecidas pela
determinaccedilatildeo social do pensamento que por sua vez se manifesta e se
configura pelo desenvolvimento dos objetos e da praacutetica humana que sobre eles
tem incidecircncia
Donde a franca afirmaccedilatildeo marxiana da possibilidade de conhecer natildeo
se confunde com a simplicidade e facilidade da concepccedilatildeo realista nem mesmo
no plano da ingenuidade cotidiana desde logo porque a atividade cotidiana -
que estaacute para aleacutem da ingenuidade ou lanccedila os sujeitos para aleacutem da
ingenuidade - eacute em si um complexo rico e desafiador matrizador inclusive da
intentio recta atitude natural e necessaacuteria da esfera ontopraacutetica
Haacute portanto que distinguir as grandes diferenccedilas ontoloacutegicas entre o
estatuto marxiano e a ontologia realista Na primeira a adequatio digamos
assim eacute correlaccedilatildeo entre formaccedilatildeo real e formaccedilatildeo ideal duas ordens distintas
de configuraccedilatildeo Em outras palavras eacute correlaccedilatildeo conceitual entre entificaccedilatildeo
concreta e reproduccedilatildeo conceitual Em suma a reproduccedilatildeo conceitual nada mais
eacute do que transposiccedilatildeo agrave cabeccedila ordenada pelos nexos do real na forma e pelos
meios da proacutepria atividade mental
I - Tomando Marx por Base e por Ponto de Chegada
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Considerando como ponto de referecircncia as consideraccedilotildees
desenvolvidas por Marx em O Capital especificamente sobre a dificuldade
encontrada pela humanidade na compreensatildeo do valor ao longo de dois
milecircnios - de Aristoacuteteles a Ricardo - pode-se sustentar segundo Chasin que
um fenocircmeno muito similar a este se produziu no que tange agrave determinaccedilatildeo do
ser ou seja da(s) matriz(es) da(s) realidade(s) ou seja da efetividade
Tomemos as passagens em questatildeo que se encontram no Prefaacutecio agrave
Primeira Ediccedilatildeo de O Capital Todo comeccedilo eacute difiacutecil isso vale para qualquer
ciecircncia A forma do valor cuja figura acabada eacute a forma do dinheiro eacute muito
simples e vazia de conteuacutedo Mesmo assim o espiacuterito humano tem procurado
desvendaacute-la (ergruumlden) em vatildeo haacute mais de 2000 anos enquanto por outro lado
teve ecircxito ao menos aproximado a anaacutelise de formas muito mais complicadas e
replenas de conteuacutedo Por quecirc Porque o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de
estudar do que a ceacutelula do corpo Aleacutem disso na anaacutelise das formas econocircmicas
natildeo podem servir nem o microscoacutepio nem reagentes quiacutemicos A forccedila da
abstraccedilatildeo deve substituir a ambos Para o leigo a anaacutelise parece se perder
em pedantismo Trata-se efetivamente de pedantismo mas daquele de que se
ocupa a anatomia microscoacutepica
De acordo com Chasin eacute necessaacuterio reter os seguintes noacutedulos
significativos da citaccedilatildeo acima
1) todo iniacutecio de uma ciecircncia eacute difiacutecil donde o princiacutepio da ontologia o
princiacutepio da ciecircncia deve ser o mais difiacutecil de todos
2) haacute grande dificuldade na compreensatildeo da forma do valor que eacute um
objeto simples e vazio de conteuacutedo
3) haacute ecircxito maior na anaacutelise de formas mais complicadas e replenas de
conteuacutedo
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Na mesma citaccedilatildeo Marx enuncia os motivos de tal dificuldade
1) o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de estudar do que a ceacutelula do
corpo
2) meacutetodos experimentais natildeo satildeo aplicaacuteveis a esse tipo de forma
3) a analiacutetica dessa forma pela forccedila da abstraccedilatildeo deve tomar o lugar
da observaccedilatildeo empiacuterica e experimental
4) anaacutelise voltada agrave anatomia microscoacutepica da forma estudada
A partir dessas indicaccedilotildees colhidas no texto de Marx Chasin elabora
um esboccedilo para fins unicamente didaacuteticos em que busca transpassaacute-las para a
proacutepria questatildeo ontoloacutegica afirmando o que se segue
1) o iniacutecio difiacutecil da ontologia perdurou tambeacutem por mais de 2000
anos trajetoacuteria em que se observa tateios imprecisos caracterizados por um
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo ateacute chegar em Marx Tal
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo revela por seu rumo
imanentemente contraditoacuterio por seus caminhos e descaminhos histoacutericos a
dificuldade e a longa incapacidade na formulaccedilatildeo precisa de seu objeto e
alcance ou seja de sua natureza e propoacutesito - de sua funccedilatildeo orientadora e
sustentadora no plano teoacuterico e de sua origem praacutetica preacute-teoreacutetica
2) reconhecimento ontopraacutetico das formas dos seres e analiacutetica da
forma do ser apenas por meio da forccedila da abstraccedilatildeo no reconhecimento
ontopraacutetico os seres satildeo reconhecidos como substantivos e nesse caso ateacute
certo ponto vale para a observaccedilatildeo espontacircnea e observaccedilatildeo comum pois o
desvendamento completo exige forccedila de abstraccedilatildeo como verbo ( o ato de ser
de Gilson) soacute a forccedila da abstraccedilatildeo daiacute a facilidade para se cair no
abstrativismo
19
Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
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De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
22
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
30
realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
35
tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
36
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
37
que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
38
6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
pelos lineamentos perfilados por Marx que tambeacutem herda criticamente
dimensotildees da filosofia moderna - do renascimento ao neohegelianismo
Desse modo com o objetivo de sumariar preliminarmente os conteuacutedos
dessa trajetoacuteria que Marx assimila por via criacutetica Chasin indica alguns deles
sem pretensatildeo alguma de esgotaacute-los
1) Do Renascimento - a infinitude do universo e o espiacuterito da
concepccedilatildeo do homem como o uacutenico ser aberto - existente e conhecido capaz
na potecircncia de seus atributos de conhecer e configurar a si e a seu mundo
ambos entendidos e tomados em sua naturalidade objetividade e o primeiro na
infinitude de sua essecircncia ativa
2) Do materialismo francecircs e inglecircs e do Iluminismo - a ruptura com a
conduta especulativa metafiacutesica e com o espiacuterito de sistema em filosofia que eacute
concebido como freio e obstaacuteculo agrave razatildeo Por meio dessa desobstruccedilatildeo o
iluminismo pode universalizar a filosofia como meio de toda verdade - natural e
espiritual - e ela passa a se voltar agraves tarefas praacuteticas donde a possibilidade e o
escopo de estabelecer a vida humana de modo racional Em outros termos
reconhece no pensamento o poder e o papel de organizar a vida o pensamento
deve ter papel analiacutetico mas tambeacutem fazer nascer a ordem cuja necessidade
ela concebeu[vii] Em contrapartida os limites do pensamento iluminista satildeo
sinteticamente os seguintes acentuaccedilatildeo unilateralizante da racionalidade
herdada do renascimento e distorcida pelo racionalismo do seacuteculo XVIII Aleacutem
disso tem-se o naturalismo vale dizer a ontologia do social demasiadamente
colada agrave ontologia da natureza embora natildeo se possa deixar de reconhecer que
frente ao abstracionismo metafiacutesico trata-se de um meacuterito pretender uma
ontologia ligada agrave natureza que em verdade eacute idealizada Talvez o melhor
exemplo dessa tradiccedilatildeo seja justamente Feuerbach
3) Do criticismo - a impossibilidade de uma ontologia como saber do
em si ou seja do ente enquanto ente pela via do absolutismo racional
10
dedutivista Em Kant em verdade tem-se a impossibilidade de uma ontologia
em Marx ao reveacutes tem-se apenas tal recusa agrave especulaccedilatildeo mas natildeo a
impossibilidade de conhecer o ente enquanto ente vale dizer Marx aceita o
espiacuterito da criacutetica kantiana ao conhecimento absoluto mas natildeo sua resultante
sistemaacutetica a sua vedaccedilatildeo ao conhecimento das coisas enquanto tais
4) Do hegelianismo - a concepccedilatildeo histoacuterica do ser portanto de sua
contrariedade bem como a natureza aproximativa do processo de
conhecimento ao mesmo tempo em que recusa o invoacutelucro miacutestico do
pensamento hegeliano - a dialeacutetica autocircnoma da razatildeo como demiurgo do real
ou da efetividade sensiacutevel ou seja refuta decidamente seu caraacuteter
especulativo
5) Do neohegelianismo - a problemaacutetica do homem e muito
especificamente duas contribuiccedilotildees de Feuerbach a criacutetica agrave especulaccedilatildeo e os
lineamentos mais gerais do ser soacute enquanto ser sensiacutevel ou objetivo (dimensotildees
de uma ontologia geral em seu niacutevel mais abstrato) Mas ao lado desse
aspecto positivo do pensamento feuerbachiano natildeo eacute possiacutevel deixar de
assinalar a objeccedilatildeo fundamental dirigida a ele por Marx sua concepccedilatildeo
naturalista do homem vale dizer sua incapacidade de o determinar como ser
social Assim em Feuerbach o homem eacute sensiacutevel objetivonatural e natildeo
objetivo-social - a grande descoberta marxiana
Grande descoberta que eacute mais amplamente avaliada quando se
considera o conjunto das linhas manifestas pelos principais representantes do
neohegelianismo B Bauer formulador de uma concepccedilatildeo do homem como
auto-consciecircncia racional M Stirner com a elevaccedilatildeo do egoiacutesmo agrave condiccedilatildeo de
essecircncia humana Feuerbach com a concepccedilatildeo naturalista do homem centrada
no amor Nesse cenaacuterio somente Marx comparece com a descoberta da
sociabilidade como substacircncia constitutiva do homem - e natildeo meramente uma
essecircncia imutaacutevel mas histoacuterica e contraditoacuteria produzida e reproduzida pela
proacutepria atividade sensiacutevel dos homens
11
De sorte que do ente enquanto ente aristoteacutelico determinado por sua
forma substancial eterna ao ser social marxiano compreendido em suas
mudanccedilas categoriais - eacute do que consiste a histoacuteria - se vai de uma filosofia
primeira que terminou por sua resoluccedilatildeo originaacuteria na forma de um saber
absoluto a um saber histoacuterico de base que se desenvolve pela infinitude de
aproximaccedilotildees empreendidas em direccedilatildeo ao absoluto entendido pura e
simplesmente como completude ou totalidade que praticamente nunca se
realiza porque desnecessaacuterio para o saber ao qual bastam completudes mais
modestas e ainda mais como saber para a praacutetica
De modo que a filosofia primeira de configuraccedilatildeo marxiana eacute antes de
tudo a afirmaccedilatildeo da objetividade do mundo e a possibilidade ser conhecido
possibilidade que eacute soacutecio-historicamente determinada exercendo a funccedilatildeo de
base e guia para a ciecircncia da histoacuteria especificamente como ontologia regional
do ser social e que nutre das ciecircncias e a elas responde tanto quanto elas
mesmas tem de responder aos lineamentos ontoloacutegicos pelos quais se guiam
mas aos quais natildeo tomam como coaacutegulos de saber imutaacutevel De sorte que
ontologia e ciecircncia se potencializam e se criticam reciacuteproca e
permanentemente
Tambeacutem de acordo com Chasin por essas razotildees a ontologia
marxiana natildeo eacute uma resoluccedilatildeo de caraacuteter absoluto nos moldes do sistema
convencional mas a condiccedilatildeo de possibilidade de resoluccedilatildeo do saber Eacute em
outras palavras um estatuto movente e movido de cientificidade orienta e eacute
orientado pela ciecircncia e pela praacutetica universal dos homens Orienta e eacute
orientada guia e eacute guiada corrige e eacute corrigida Ou seja natildeo eacute um absoluto
inquestionaacutevel uma certeza estabelecida por deduccedilatildeo a partir de axiomas de
uma vez para sempre Mesmo porque a certeza cognitiva natildeo pode estar no
ponto de partida mas compreendida como alvo de uma busca permanente
procura intensiva e extensiva cuja infinitude eacute posta a cada momento entre
parecircnteses no qual o grau de certeza alcanccedilado eacute assumido como realizaccedilatildeo
maacutexima tendo por limites as possibilidades do tempo ou cenaacuterio histoacuterico grau
12
a ser confirmado ou ampliado ou ao inveacutes restringido na parte ou descartado
no todo posteriormente com todas as suas implicaccedilotildees correlatas
Em suma quando se utiliza a expressatildeo posiccedilatildeo ontoloacutegica e natildeo
perspectiva oacutetica prisma ou ponto de vista pretende-se remeter a lugar e agraves
coisas ou seja o reconhecimento do mundo como multiverso de entes reais
objetivos e que por isso mesmo faceiam o observador praacutetico ou teoacuterico natildeo
dependendo deste para existir em face do qual satildeo independentes Eacute
finalmente o reconhecimento da prioridade das coisas nas relaccedilotildees cognitivas
sem desconhecer eacute claro o caraacuteter ativo do investigador
Quando Chasin procura enfatizar o reconhecimento noccedilatildeo
imediatamente conexa a de posiccedilatildeo ontoloacutegica eacute por que aquela tem a
vantagem de colocar em primeiro lugar o caraacuteter natildeo puramente teoacuterico
contemplativo mas sobretudo praacutetico[viii] da aproximaccedilatildeo ao ente aleacutem da
natureza da operaccedilatildeo mental que designa - constataccedilatildeo ou recogniccedilatildeo vale
dizer a admissatildeo de algo a respeito do qual o discurso se pronuncia como forma
imediata de representaccedilatildeo
Relevar o caraacuteter praacutetico de aproximaccedilatildeo ao ente ou em outras
palavras partir ou dar prioridade agrave praacutetica significa por seu turno partir do
caraacuteter essencial do ser do homem por sua exteriorizaccedilatildeo operativa no mundo
que confirma sua forma de vida ou modo de existecircncia Quer dizer eacute um ponto
de partida desde logo sob criteacuterio ontoloacutegico ou seja que considera a
efetividade ocircntica do homem e do mundo de tal sorte que ambos satildeo
reconhecidos enquanto atividade sensiacutevel Caminho que tem o meacuterito de evitar
as vias reflexas[ix] como tambeacutem os engenhos e supostos dos encantamentos
especulativos como cogito sujeito transcendental ou os arqueacutetipos
generalizando uma expressatildeo marxiana os misticismos loacutegicos que nunca
deixam de mostrar sua condiccedilatildeo de artifiacutecios por mais rigorosos e envolventes
que sejam tanto que podem sempre ser contestados de algum modo ao passo
que os indiviacuteduos vivos e ativos os pressupostos dos quais Marx parte em A
13
Ideologia Alematilde natildeo podem nunca ser recusados a natildeo ser na fantasia e sob
pena de cancelar todo e qualquer andamento reflexivo
Em suma reconhecimento ontopraacutetico significa pois tomar como
ponto de partida a praacutetica - desde a praacutetica cotidiana agrave praacutetica cientiacutefica de ponta
- de um tempo dado
O plano ontopraacutetico jaacute bem delineado no texto de 1995 ganha nos
anos seguintes sucessivas correccedilotildees por parte do autor a ponto de se tornar o
eixo a partir do qual Chasin faz a criacutetica das Teorias da Fundamentaccedilatildeo ou
como ele as denomina ironicamente A Querela da Fundamentaccedilatildeo
A esse respeito costumava ele indagar O que eacute um fundamento Uma
Teoria da Subjetividade ou Uma Teoria da Objetividade
Se o fundamento for considerado a partir de uma teoria da
subjetividade por onde comeccedilar Pelo aparato sensorial como no empirismo
Ou pela consciecircncia ou coisa que o valha como o cogito cartesiano a
autoconsciecircncia a razatildeo ou as formas a priori do entendimento Ou ainda uma
teoria da mente
Ainda no plano do fundamento subjetivo poder-se-ia partir da
experiecircncia da vivecircncia do vivido Neste caso o vivido seria o preacute-teoreacutetico
mas enquanto experiecircncia existencial isto eacute as vivecircncias do indiviacuteduo isolado
em experiecircncia aleatoacuteria fortuita acidental
Mas se o fundamento for uma Teoria da Objetividade por onde
comeccedilar Pelos fenocircmenos empiacutericos Mas nesse caso natildeo terminariacuteamos
apenas no fundamento psicoloacutegico isto eacute teriacuteamos o psicologismo como
fundamento da verdade
14
E se partiacutessemos do todo concreto Natildeo findariacuteamos numa visatildeo
caoacutetica e abstrata de conjuntos indeterminados desamparados na companhia
de um punhado de abstraccedilotildees razoaacuteveis e irrazoaacuteveis
Feitas tais indagaccedilotildees Chasin conclui de modo enfaacutetico Toda peticcedilatildeo
de fundamento todo discurso por um fundamento estaacute encerrado na esfera
teoacuterica Aleacutem do mais todo discurso de fundamentaccedilatildeo pretende e implica uma
certeza ou seja de um modo ou de outro a suposiccedilatildeo de um saber absoluto
ainda que um simples momento do saber absoluto Vale dizer o discurso da
fundamentaccedilatildeo desemboca de algum modo na razatildeo especulativa Em outras
palavras implica algo que transcende a proacutepria natureza do saber que eacute um
processo infinito de aproximaccedilotildees
Para Chasin o reconhecimento do ontopraacutetico tem a vantagem de
escapar agrave querela da fundamentaccedilatildeo na medida em que parte da experiecircncia
real melhor dizendo da praacutetica real natildeo de uma experiecircncia isolada
arbitrariamente natildeo da experiecircncia aleatoacuteria da suposta existecircncia existencial
dos indiviacuteduos isolados dos indiviacuteduos em derreliccedilatildeo
O universo ontopraacutetico eacute o necessariamente vivido para que qualquer
pergunta possa se dar Eacute portanto a esfera preacute-teoreacutetica esfera que antecede
qualquer teoria Esfera sem a qual natildeo haacute vida humana e portanto sem a qual
natildeo pode haver qualquer pergunta teoacuterica
A reflexatildeo que tem como ponto de partida o ontopraacutetico estabelece
assim um pressuposto concreto (e natildeo uma verdade ideada) do qual natildeo posso
me afastar a natildeo ser na imaginaccedilatildeo
Em siacutentese a esfera ontopraacutetica representa o complexos dos homens
vivos e ativos A partir dessa abstraccedilatildeo razoaacutevel - o ontopraacutetico - pode-se
encontrar jaacute numa analiacutetica de desentranhamento desse complexo real o
devido lugar da ontologia da epistemologia e da ciecircncia da histoacuteria que
compreende dois grandes ramos natureza e sociedade
15
Em outras palavras sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico torna-se
aleatoacuteria a localizaccedilatildeo que se confere tanto ao ontoloacutegico quanto ao epistecircmico
A opccedilatildeo por um deles se torna uma arbitrariedade teoacuterica e eacute justamente isto
que gera a querela da fundamentaccedilatildeo pois a decisatildeo fica submersa ao plano
teoacuterico ao jogo dos argumentos agrave ambivalecircncia do logos que eacute irresolutivo
Sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico parte-se assim de imediato da
teoria e natildeo do ser que faz da teoria ou deste como uma abstraccedilatildeo da
inteligibilidade ou seja de uma faculdade abstraiacuteda do ser que a possui
gerando com isso um absurdo ontoloacutegico
Eacute portanto a partir da analiacutetica do ontopraacutetico pelo reconhecimento de
seus traccedilos categoriais que tem iniacutecio a elaboraccedilatildeo ontoloacutegica Ou seja a
ontologia nasce como reflexatildeo conscientizaccedilatildeo conceituaccedilatildeo do ontopraacutetico
enquanto primeiro objeto da ontologia que a partir daiacute se encaminha em
direccedilatildeo agrave criacutetica - em termos de sua necessidade e loacutegica especiacutefica - do proacuteprio
ontopraacutetico isto eacute do complexo dos objetos reais aiacute incluiacutedo o homem
Resta ainda em relaccedilatildeo agrave problemaacutetica geral em tela aflorar a questatildeo
da adequatio tal como era tematizada tambeacutem em seus cursos
Polemizando com a denominaccedilatildeo de realismo comumente utilizada
para denominar proposituras que conferem prioridade ao mundo objetual
Chasin afirmava que haacute realismo - antigo - quando eacute suposto que a ordem da
razatildeo agrave idecircntica a ordem do real e que a partir de axiomas por meios racionais-
dedutivos embuiacutedos do espiacuterito de sistema se possa estabelecer a verdade do
mundo
Em Marx entretanto a ordem das coisas e da razatildeo satildeo distintas (um
exemplo expressivo desta postura marxiana pode ser encontrada na famosa
Introduccedilatildeo de 57) ambas mutaacuteveis e processuais - unidade da desidentidade
entre ser e saber Assim o mundo natildeo pode ser deduzido racionalmente mas
reproduzido sob forma de ideacuteia por meio de aproximaccedilotildees - empiacuterico abstrato
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concreto - num processo intensivo e extensivo historicamente condicionado
possibilitado ou impedido - na dependecircncia que fica da maturaccedilatildeo do objeto e
do posicionamento do sujeito O processo mimeacutetico eacute portanto reproduccedilatildeo
conceitual de efetividades donde se lida com duas ordens de formaccedilotildees real e
ideal A reproduccedilatildeo conceitual apresenta portanto sua proacutepria loacutegica mas no
interior da determinaccedilatildeo soacutecio-histoacuterica do pensamento de modo que uma
teoria do conhecimento (morfologia e dinacircmica da subjetividade in abstratu e
imutaacutevel) eacute incapaz de explicar o processo cognitivo pois a faculdade humana
da forccedila da abstraccedilatildeo depende das possibilidades oferecidas pela
determinaccedilatildeo social do pensamento que por sua vez se manifesta e se
configura pelo desenvolvimento dos objetos e da praacutetica humana que sobre eles
tem incidecircncia
Donde a franca afirmaccedilatildeo marxiana da possibilidade de conhecer natildeo
se confunde com a simplicidade e facilidade da concepccedilatildeo realista nem mesmo
no plano da ingenuidade cotidiana desde logo porque a atividade cotidiana -
que estaacute para aleacutem da ingenuidade ou lanccedila os sujeitos para aleacutem da
ingenuidade - eacute em si um complexo rico e desafiador matrizador inclusive da
intentio recta atitude natural e necessaacuteria da esfera ontopraacutetica
Haacute portanto que distinguir as grandes diferenccedilas ontoloacutegicas entre o
estatuto marxiano e a ontologia realista Na primeira a adequatio digamos
assim eacute correlaccedilatildeo entre formaccedilatildeo real e formaccedilatildeo ideal duas ordens distintas
de configuraccedilatildeo Em outras palavras eacute correlaccedilatildeo conceitual entre entificaccedilatildeo
concreta e reproduccedilatildeo conceitual Em suma a reproduccedilatildeo conceitual nada mais
eacute do que transposiccedilatildeo agrave cabeccedila ordenada pelos nexos do real na forma e pelos
meios da proacutepria atividade mental
I - Tomando Marx por Base e por Ponto de Chegada
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Considerando como ponto de referecircncia as consideraccedilotildees
desenvolvidas por Marx em O Capital especificamente sobre a dificuldade
encontrada pela humanidade na compreensatildeo do valor ao longo de dois
milecircnios - de Aristoacuteteles a Ricardo - pode-se sustentar segundo Chasin que
um fenocircmeno muito similar a este se produziu no que tange agrave determinaccedilatildeo do
ser ou seja da(s) matriz(es) da(s) realidade(s) ou seja da efetividade
Tomemos as passagens em questatildeo que se encontram no Prefaacutecio agrave
Primeira Ediccedilatildeo de O Capital Todo comeccedilo eacute difiacutecil isso vale para qualquer
ciecircncia A forma do valor cuja figura acabada eacute a forma do dinheiro eacute muito
simples e vazia de conteuacutedo Mesmo assim o espiacuterito humano tem procurado
desvendaacute-la (ergruumlden) em vatildeo haacute mais de 2000 anos enquanto por outro lado
teve ecircxito ao menos aproximado a anaacutelise de formas muito mais complicadas e
replenas de conteuacutedo Por quecirc Porque o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de
estudar do que a ceacutelula do corpo Aleacutem disso na anaacutelise das formas econocircmicas
natildeo podem servir nem o microscoacutepio nem reagentes quiacutemicos A forccedila da
abstraccedilatildeo deve substituir a ambos Para o leigo a anaacutelise parece se perder
em pedantismo Trata-se efetivamente de pedantismo mas daquele de que se
ocupa a anatomia microscoacutepica
De acordo com Chasin eacute necessaacuterio reter os seguintes noacutedulos
significativos da citaccedilatildeo acima
1) todo iniacutecio de uma ciecircncia eacute difiacutecil donde o princiacutepio da ontologia o
princiacutepio da ciecircncia deve ser o mais difiacutecil de todos
2) haacute grande dificuldade na compreensatildeo da forma do valor que eacute um
objeto simples e vazio de conteuacutedo
3) haacute ecircxito maior na anaacutelise de formas mais complicadas e replenas de
conteuacutedo
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Na mesma citaccedilatildeo Marx enuncia os motivos de tal dificuldade
1) o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de estudar do que a ceacutelula do
corpo
2) meacutetodos experimentais natildeo satildeo aplicaacuteveis a esse tipo de forma
3) a analiacutetica dessa forma pela forccedila da abstraccedilatildeo deve tomar o lugar
da observaccedilatildeo empiacuterica e experimental
4) anaacutelise voltada agrave anatomia microscoacutepica da forma estudada
A partir dessas indicaccedilotildees colhidas no texto de Marx Chasin elabora
um esboccedilo para fins unicamente didaacuteticos em que busca transpassaacute-las para a
proacutepria questatildeo ontoloacutegica afirmando o que se segue
1) o iniacutecio difiacutecil da ontologia perdurou tambeacutem por mais de 2000
anos trajetoacuteria em que se observa tateios imprecisos caracterizados por um
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo ateacute chegar em Marx Tal
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo revela por seu rumo
imanentemente contraditoacuterio por seus caminhos e descaminhos histoacutericos a
dificuldade e a longa incapacidade na formulaccedilatildeo precisa de seu objeto e
alcance ou seja de sua natureza e propoacutesito - de sua funccedilatildeo orientadora e
sustentadora no plano teoacuterico e de sua origem praacutetica preacute-teoreacutetica
2) reconhecimento ontopraacutetico das formas dos seres e analiacutetica da
forma do ser apenas por meio da forccedila da abstraccedilatildeo no reconhecimento
ontopraacutetico os seres satildeo reconhecidos como substantivos e nesse caso ateacute
certo ponto vale para a observaccedilatildeo espontacircnea e observaccedilatildeo comum pois o
desvendamento completo exige forccedila de abstraccedilatildeo como verbo ( o ato de ser
de Gilson) soacute a forccedila da abstraccedilatildeo daiacute a facilidade para se cair no
abstrativismo
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Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
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De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
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conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
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reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
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Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
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categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
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Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
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Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
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conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
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relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
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2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
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realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
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tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
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2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
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mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
dedutivista Em Kant em verdade tem-se a impossibilidade de uma ontologia
em Marx ao reveacutes tem-se apenas tal recusa agrave especulaccedilatildeo mas natildeo a
impossibilidade de conhecer o ente enquanto ente vale dizer Marx aceita o
espiacuterito da criacutetica kantiana ao conhecimento absoluto mas natildeo sua resultante
sistemaacutetica a sua vedaccedilatildeo ao conhecimento das coisas enquanto tais
4) Do hegelianismo - a concepccedilatildeo histoacuterica do ser portanto de sua
contrariedade bem como a natureza aproximativa do processo de
conhecimento ao mesmo tempo em que recusa o invoacutelucro miacutestico do
pensamento hegeliano - a dialeacutetica autocircnoma da razatildeo como demiurgo do real
ou da efetividade sensiacutevel ou seja refuta decidamente seu caraacuteter
especulativo
5) Do neohegelianismo - a problemaacutetica do homem e muito
especificamente duas contribuiccedilotildees de Feuerbach a criacutetica agrave especulaccedilatildeo e os
lineamentos mais gerais do ser soacute enquanto ser sensiacutevel ou objetivo (dimensotildees
de uma ontologia geral em seu niacutevel mais abstrato) Mas ao lado desse
aspecto positivo do pensamento feuerbachiano natildeo eacute possiacutevel deixar de
assinalar a objeccedilatildeo fundamental dirigida a ele por Marx sua concepccedilatildeo
naturalista do homem vale dizer sua incapacidade de o determinar como ser
social Assim em Feuerbach o homem eacute sensiacutevel objetivonatural e natildeo
objetivo-social - a grande descoberta marxiana
Grande descoberta que eacute mais amplamente avaliada quando se
considera o conjunto das linhas manifestas pelos principais representantes do
neohegelianismo B Bauer formulador de uma concepccedilatildeo do homem como
auto-consciecircncia racional M Stirner com a elevaccedilatildeo do egoiacutesmo agrave condiccedilatildeo de
essecircncia humana Feuerbach com a concepccedilatildeo naturalista do homem centrada
no amor Nesse cenaacuterio somente Marx comparece com a descoberta da
sociabilidade como substacircncia constitutiva do homem - e natildeo meramente uma
essecircncia imutaacutevel mas histoacuterica e contraditoacuteria produzida e reproduzida pela
proacutepria atividade sensiacutevel dos homens
11
De sorte que do ente enquanto ente aristoteacutelico determinado por sua
forma substancial eterna ao ser social marxiano compreendido em suas
mudanccedilas categoriais - eacute do que consiste a histoacuteria - se vai de uma filosofia
primeira que terminou por sua resoluccedilatildeo originaacuteria na forma de um saber
absoluto a um saber histoacuterico de base que se desenvolve pela infinitude de
aproximaccedilotildees empreendidas em direccedilatildeo ao absoluto entendido pura e
simplesmente como completude ou totalidade que praticamente nunca se
realiza porque desnecessaacuterio para o saber ao qual bastam completudes mais
modestas e ainda mais como saber para a praacutetica
De modo que a filosofia primeira de configuraccedilatildeo marxiana eacute antes de
tudo a afirmaccedilatildeo da objetividade do mundo e a possibilidade ser conhecido
possibilidade que eacute soacutecio-historicamente determinada exercendo a funccedilatildeo de
base e guia para a ciecircncia da histoacuteria especificamente como ontologia regional
do ser social e que nutre das ciecircncias e a elas responde tanto quanto elas
mesmas tem de responder aos lineamentos ontoloacutegicos pelos quais se guiam
mas aos quais natildeo tomam como coaacutegulos de saber imutaacutevel De sorte que
ontologia e ciecircncia se potencializam e se criticam reciacuteproca e
permanentemente
Tambeacutem de acordo com Chasin por essas razotildees a ontologia
marxiana natildeo eacute uma resoluccedilatildeo de caraacuteter absoluto nos moldes do sistema
convencional mas a condiccedilatildeo de possibilidade de resoluccedilatildeo do saber Eacute em
outras palavras um estatuto movente e movido de cientificidade orienta e eacute
orientado pela ciecircncia e pela praacutetica universal dos homens Orienta e eacute
orientada guia e eacute guiada corrige e eacute corrigida Ou seja natildeo eacute um absoluto
inquestionaacutevel uma certeza estabelecida por deduccedilatildeo a partir de axiomas de
uma vez para sempre Mesmo porque a certeza cognitiva natildeo pode estar no
ponto de partida mas compreendida como alvo de uma busca permanente
procura intensiva e extensiva cuja infinitude eacute posta a cada momento entre
parecircnteses no qual o grau de certeza alcanccedilado eacute assumido como realizaccedilatildeo
maacutexima tendo por limites as possibilidades do tempo ou cenaacuterio histoacuterico grau
12
a ser confirmado ou ampliado ou ao inveacutes restringido na parte ou descartado
no todo posteriormente com todas as suas implicaccedilotildees correlatas
Em suma quando se utiliza a expressatildeo posiccedilatildeo ontoloacutegica e natildeo
perspectiva oacutetica prisma ou ponto de vista pretende-se remeter a lugar e agraves
coisas ou seja o reconhecimento do mundo como multiverso de entes reais
objetivos e que por isso mesmo faceiam o observador praacutetico ou teoacuterico natildeo
dependendo deste para existir em face do qual satildeo independentes Eacute
finalmente o reconhecimento da prioridade das coisas nas relaccedilotildees cognitivas
sem desconhecer eacute claro o caraacuteter ativo do investigador
Quando Chasin procura enfatizar o reconhecimento noccedilatildeo
imediatamente conexa a de posiccedilatildeo ontoloacutegica eacute por que aquela tem a
vantagem de colocar em primeiro lugar o caraacuteter natildeo puramente teoacuterico
contemplativo mas sobretudo praacutetico[viii] da aproximaccedilatildeo ao ente aleacutem da
natureza da operaccedilatildeo mental que designa - constataccedilatildeo ou recogniccedilatildeo vale
dizer a admissatildeo de algo a respeito do qual o discurso se pronuncia como forma
imediata de representaccedilatildeo
Relevar o caraacuteter praacutetico de aproximaccedilatildeo ao ente ou em outras
palavras partir ou dar prioridade agrave praacutetica significa por seu turno partir do
caraacuteter essencial do ser do homem por sua exteriorizaccedilatildeo operativa no mundo
que confirma sua forma de vida ou modo de existecircncia Quer dizer eacute um ponto
de partida desde logo sob criteacuterio ontoloacutegico ou seja que considera a
efetividade ocircntica do homem e do mundo de tal sorte que ambos satildeo
reconhecidos enquanto atividade sensiacutevel Caminho que tem o meacuterito de evitar
as vias reflexas[ix] como tambeacutem os engenhos e supostos dos encantamentos
especulativos como cogito sujeito transcendental ou os arqueacutetipos
generalizando uma expressatildeo marxiana os misticismos loacutegicos que nunca
deixam de mostrar sua condiccedilatildeo de artifiacutecios por mais rigorosos e envolventes
que sejam tanto que podem sempre ser contestados de algum modo ao passo
que os indiviacuteduos vivos e ativos os pressupostos dos quais Marx parte em A
13
Ideologia Alematilde natildeo podem nunca ser recusados a natildeo ser na fantasia e sob
pena de cancelar todo e qualquer andamento reflexivo
Em suma reconhecimento ontopraacutetico significa pois tomar como
ponto de partida a praacutetica - desde a praacutetica cotidiana agrave praacutetica cientiacutefica de ponta
- de um tempo dado
O plano ontopraacutetico jaacute bem delineado no texto de 1995 ganha nos
anos seguintes sucessivas correccedilotildees por parte do autor a ponto de se tornar o
eixo a partir do qual Chasin faz a criacutetica das Teorias da Fundamentaccedilatildeo ou
como ele as denomina ironicamente A Querela da Fundamentaccedilatildeo
A esse respeito costumava ele indagar O que eacute um fundamento Uma
Teoria da Subjetividade ou Uma Teoria da Objetividade
Se o fundamento for considerado a partir de uma teoria da
subjetividade por onde comeccedilar Pelo aparato sensorial como no empirismo
Ou pela consciecircncia ou coisa que o valha como o cogito cartesiano a
autoconsciecircncia a razatildeo ou as formas a priori do entendimento Ou ainda uma
teoria da mente
Ainda no plano do fundamento subjetivo poder-se-ia partir da
experiecircncia da vivecircncia do vivido Neste caso o vivido seria o preacute-teoreacutetico
mas enquanto experiecircncia existencial isto eacute as vivecircncias do indiviacuteduo isolado
em experiecircncia aleatoacuteria fortuita acidental
Mas se o fundamento for uma Teoria da Objetividade por onde
comeccedilar Pelos fenocircmenos empiacutericos Mas nesse caso natildeo terminariacuteamos
apenas no fundamento psicoloacutegico isto eacute teriacuteamos o psicologismo como
fundamento da verdade
14
E se partiacutessemos do todo concreto Natildeo findariacuteamos numa visatildeo
caoacutetica e abstrata de conjuntos indeterminados desamparados na companhia
de um punhado de abstraccedilotildees razoaacuteveis e irrazoaacuteveis
Feitas tais indagaccedilotildees Chasin conclui de modo enfaacutetico Toda peticcedilatildeo
de fundamento todo discurso por um fundamento estaacute encerrado na esfera
teoacuterica Aleacutem do mais todo discurso de fundamentaccedilatildeo pretende e implica uma
certeza ou seja de um modo ou de outro a suposiccedilatildeo de um saber absoluto
ainda que um simples momento do saber absoluto Vale dizer o discurso da
fundamentaccedilatildeo desemboca de algum modo na razatildeo especulativa Em outras
palavras implica algo que transcende a proacutepria natureza do saber que eacute um
processo infinito de aproximaccedilotildees
Para Chasin o reconhecimento do ontopraacutetico tem a vantagem de
escapar agrave querela da fundamentaccedilatildeo na medida em que parte da experiecircncia
real melhor dizendo da praacutetica real natildeo de uma experiecircncia isolada
arbitrariamente natildeo da experiecircncia aleatoacuteria da suposta existecircncia existencial
dos indiviacuteduos isolados dos indiviacuteduos em derreliccedilatildeo
O universo ontopraacutetico eacute o necessariamente vivido para que qualquer
pergunta possa se dar Eacute portanto a esfera preacute-teoreacutetica esfera que antecede
qualquer teoria Esfera sem a qual natildeo haacute vida humana e portanto sem a qual
natildeo pode haver qualquer pergunta teoacuterica
A reflexatildeo que tem como ponto de partida o ontopraacutetico estabelece
assim um pressuposto concreto (e natildeo uma verdade ideada) do qual natildeo posso
me afastar a natildeo ser na imaginaccedilatildeo
Em siacutentese a esfera ontopraacutetica representa o complexos dos homens
vivos e ativos A partir dessa abstraccedilatildeo razoaacutevel - o ontopraacutetico - pode-se
encontrar jaacute numa analiacutetica de desentranhamento desse complexo real o
devido lugar da ontologia da epistemologia e da ciecircncia da histoacuteria que
compreende dois grandes ramos natureza e sociedade
15
Em outras palavras sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico torna-se
aleatoacuteria a localizaccedilatildeo que se confere tanto ao ontoloacutegico quanto ao epistecircmico
A opccedilatildeo por um deles se torna uma arbitrariedade teoacuterica e eacute justamente isto
que gera a querela da fundamentaccedilatildeo pois a decisatildeo fica submersa ao plano
teoacuterico ao jogo dos argumentos agrave ambivalecircncia do logos que eacute irresolutivo
Sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico parte-se assim de imediato da
teoria e natildeo do ser que faz da teoria ou deste como uma abstraccedilatildeo da
inteligibilidade ou seja de uma faculdade abstraiacuteda do ser que a possui
gerando com isso um absurdo ontoloacutegico
Eacute portanto a partir da analiacutetica do ontopraacutetico pelo reconhecimento de
seus traccedilos categoriais que tem iniacutecio a elaboraccedilatildeo ontoloacutegica Ou seja a
ontologia nasce como reflexatildeo conscientizaccedilatildeo conceituaccedilatildeo do ontopraacutetico
enquanto primeiro objeto da ontologia que a partir daiacute se encaminha em
direccedilatildeo agrave criacutetica - em termos de sua necessidade e loacutegica especiacutefica - do proacuteprio
ontopraacutetico isto eacute do complexo dos objetos reais aiacute incluiacutedo o homem
Resta ainda em relaccedilatildeo agrave problemaacutetica geral em tela aflorar a questatildeo
da adequatio tal como era tematizada tambeacutem em seus cursos
Polemizando com a denominaccedilatildeo de realismo comumente utilizada
para denominar proposituras que conferem prioridade ao mundo objetual
Chasin afirmava que haacute realismo - antigo - quando eacute suposto que a ordem da
razatildeo agrave idecircntica a ordem do real e que a partir de axiomas por meios racionais-
dedutivos embuiacutedos do espiacuterito de sistema se possa estabelecer a verdade do
mundo
Em Marx entretanto a ordem das coisas e da razatildeo satildeo distintas (um
exemplo expressivo desta postura marxiana pode ser encontrada na famosa
Introduccedilatildeo de 57) ambas mutaacuteveis e processuais - unidade da desidentidade
entre ser e saber Assim o mundo natildeo pode ser deduzido racionalmente mas
reproduzido sob forma de ideacuteia por meio de aproximaccedilotildees - empiacuterico abstrato
16
concreto - num processo intensivo e extensivo historicamente condicionado
possibilitado ou impedido - na dependecircncia que fica da maturaccedilatildeo do objeto e
do posicionamento do sujeito O processo mimeacutetico eacute portanto reproduccedilatildeo
conceitual de efetividades donde se lida com duas ordens de formaccedilotildees real e
ideal A reproduccedilatildeo conceitual apresenta portanto sua proacutepria loacutegica mas no
interior da determinaccedilatildeo soacutecio-histoacuterica do pensamento de modo que uma
teoria do conhecimento (morfologia e dinacircmica da subjetividade in abstratu e
imutaacutevel) eacute incapaz de explicar o processo cognitivo pois a faculdade humana
da forccedila da abstraccedilatildeo depende das possibilidades oferecidas pela
determinaccedilatildeo social do pensamento que por sua vez se manifesta e se
configura pelo desenvolvimento dos objetos e da praacutetica humana que sobre eles
tem incidecircncia
Donde a franca afirmaccedilatildeo marxiana da possibilidade de conhecer natildeo
se confunde com a simplicidade e facilidade da concepccedilatildeo realista nem mesmo
no plano da ingenuidade cotidiana desde logo porque a atividade cotidiana -
que estaacute para aleacutem da ingenuidade ou lanccedila os sujeitos para aleacutem da
ingenuidade - eacute em si um complexo rico e desafiador matrizador inclusive da
intentio recta atitude natural e necessaacuteria da esfera ontopraacutetica
Haacute portanto que distinguir as grandes diferenccedilas ontoloacutegicas entre o
estatuto marxiano e a ontologia realista Na primeira a adequatio digamos
assim eacute correlaccedilatildeo entre formaccedilatildeo real e formaccedilatildeo ideal duas ordens distintas
de configuraccedilatildeo Em outras palavras eacute correlaccedilatildeo conceitual entre entificaccedilatildeo
concreta e reproduccedilatildeo conceitual Em suma a reproduccedilatildeo conceitual nada mais
eacute do que transposiccedilatildeo agrave cabeccedila ordenada pelos nexos do real na forma e pelos
meios da proacutepria atividade mental
I - Tomando Marx por Base e por Ponto de Chegada
17
Considerando como ponto de referecircncia as consideraccedilotildees
desenvolvidas por Marx em O Capital especificamente sobre a dificuldade
encontrada pela humanidade na compreensatildeo do valor ao longo de dois
milecircnios - de Aristoacuteteles a Ricardo - pode-se sustentar segundo Chasin que
um fenocircmeno muito similar a este se produziu no que tange agrave determinaccedilatildeo do
ser ou seja da(s) matriz(es) da(s) realidade(s) ou seja da efetividade
Tomemos as passagens em questatildeo que se encontram no Prefaacutecio agrave
Primeira Ediccedilatildeo de O Capital Todo comeccedilo eacute difiacutecil isso vale para qualquer
ciecircncia A forma do valor cuja figura acabada eacute a forma do dinheiro eacute muito
simples e vazia de conteuacutedo Mesmo assim o espiacuterito humano tem procurado
desvendaacute-la (ergruumlden) em vatildeo haacute mais de 2000 anos enquanto por outro lado
teve ecircxito ao menos aproximado a anaacutelise de formas muito mais complicadas e
replenas de conteuacutedo Por quecirc Porque o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de
estudar do que a ceacutelula do corpo Aleacutem disso na anaacutelise das formas econocircmicas
natildeo podem servir nem o microscoacutepio nem reagentes quiacutemicos A forccedila da
abstraccedilatildeo deve substituir a ambos Para o leigo a anaacutelise parece se perder
em pedantismo Trata-se efetivamente de pedantismo mas daquele de que se
ocupa a anatomia microscoacutepica
De acordo com Chasin eacute necessaacuterio reter os seguintes noacutedulos
significativos da citaccedilatildeo acima
1) todo iniacutecio de uma ciecircncia eacute difiacutecil donde o princiacutepio da ontologia o
princiacutepio da ciecircncia deve ser o mais difiacutecil de todos
2) haacute grande dificuldade na compreensatildeo da forma do valor que eacute um
objeto simples e vazio de conteuacutedo
3) haacute ecircxito maior na anaacutelise de formas mais complicadas e replenas de
conteuacutedo
18
Na mesma citaccedilatildeo Marx enuncia os motivos de tal dificuldade
1) o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de estudar do que a ceacutelula do
corpo
2) meacutetodos experimentais natildeo satildeo aplicaacuteveis a esse tipo de forma
3) a analiacutetica dessa forma pela forccedila da abstraccedilatildeo deve tomar o lugar
da observaccedilatildeo empiacuterica e experimental
4) anaacutelise voltada agrave anatomia microscoacutepica da forma estudada
A partir dessas indicaccedilotildees colhidas no texto de Marx Chasin elabora
um esboccedilo para fins unicamente didaacuteticos em que busca transpassaacute-las para a
proacutepria questatildeo ontoloacutegica afirmando o que se segue
1) o iniacutecio difiacutecil da ontologia perdurou tambeacutem por mais de 2000
anos trajetoacuteria em que se observa tateios imprecisos caracterizados por um
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo ateacute chegar em Marx Tal
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo revela por seu rumo
imanentemente contraditoacuterio por seus caminhos e descaminhos histoacutericos a
dificuldade e a longa incapacidade na formulaccedilatildeo precisa de seu objeto e
alcance ou seja de sua natureza e propoacutesito - de sua funccedilatildeo orientadora e
sustentadora no plano teoacuterico e de sua origem praacutetica preacute-teoreacutetica
2) reconhecimento ontopraacutetico das formas dos seres e analiacutetica da
forma do ser apenas por meio da forccedila da abstraccedilatildeo no reconhecimento
ontopraacutetico os seres satildeo reconhecidos como substantivos e nesse caso ateacute
certo ponto vale para a observaccedilatildeo espontacircnea e observaccedilatildeo comum pois o
desvendamento completo exige forccedila de abstraccedilatildeo como verbo ( o ato de ser
de Gilson) soacute a forccedila da abstraccedilatildeo daiacute a facilidade para se cair no
abstrativismo
19
Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
20
De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
22
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
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categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
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Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
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Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
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conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
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relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
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2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
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realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
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objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
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conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
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coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
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estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
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tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
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2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
De sorte que do ente enquanto ente aristoteacutelico determinado por sua
forma substancial eterna ao ser social marxiano compreendido em suas
mudanccedilas categoriais - eacute do que consiste a histoacuteria - se vai de uma filosofia
primeira que terminou por sua resoluccedilatildeo originaacuteria na forma de um saber
absoluto a um saber histoacuterico de base que se desenvolve pela infinitude de
aproximaccedilotildees empreendidas em direccedilatildeo ao absoluto entendido pura e
simplesmente como completude ou totalidade que praticamente nunca se
realiza porque desnecessaacuterio para o saber ao qual bastam completudes mais
modestas e ainda mais como saber para a praacutetica
De modo que a filosofia primeira de configuraccedilatildeo marxiana eacute antes de
tudo a afirmaccedilatildeo da objetividade do mundo e a possibilidade ser conhecido
possibilidade que eacute soacutecio-historicamente determinada exercendo a funccedilatildeo de
base e guia para a ciecircncia da histoacuteria especificamente como ontologia regional
do ser social e que nutre das ciecircncias e a elas responde tanto quanto elas
mesmas tem de responder aos lineamentos ontoloacutegicos pelos quais se guiam
mas aos quais natildeo tomam como coaacutegulos de saber imutaacutevel De sorte que
ontologia e ciecircncia se potencializam e se criticam reciacuteproca e
permanentemente
Tambeacutem de acordo com Chasin por essas razotildees a ontologia
marxiana natildeo eacute uma resoluccedilatildeo de caraacuteter absoluto nos moldes do sistema
convencional mas a condiccedilatildeo de possibilidade de resoluccedilatildeo do saber Eacute em
outras palavras um estatuto movente e movido de cientificidade orienta e eacute
orientado pela ciecircncia e pela praacutetica universal dos homens Orienta e eacute
orientada guia e eacute guiada corrige e eacute corrigida Ou seja natildeo eacute um absoluto
inquestionaacutevel uma certeza estabelecida por deduccedilatildeo a partir de axiomas de
uma vez para sempre Mesmo porque a certeza cognitiva natildeo pode estar no
ponto de partida mas compreendida como alvo de uma busca permanente
procura intensiva e extensiva cuja infinitude eacute posta a cada momento entre
parecircnteses no qual o grau de certeza alcanccedilado eacute assumido como realizaccedilatildeo
maacutexima tendo por limites as possibilidades do tempo ou cenaacuterio histoacuterico grau
12
a ser confirmado ou ampliado ou ao inveacutes restringido na parte ou descartado
no todo posteriormente com todas as suas implicaccedilotildees correlatas
Em suma quando se utiliza a expressatildeo posiccedilatildeo ontoloacutegica e natildeo
perspectiva oacutetica prisma ou ponto de vista pretende-se remeter a lugar e agraves
coisas ou seja o reconhecimento do mundo como multiverso de entes reais
objetivos e que por isso mesmo faceiam o observador praacutetico ou teoacuterico natildeo
dependendo deste para existir em face do qual satildeo independentes Eacute
finalmente o reconhecimento da prioridade das coisas nas relaccedilotildees cognitivas
sem desconhecer eacute claro o caraacuteter ativo do investigador
Quando Chasin procura enfatizar o reconhecimento noccedilatildeo
imediatamente conexa a de posiccedilatildeo ontoloacutegica eacute por que aquela tem a
vantagem de colocar em primeiro lugar o caraacuteter natildeo puramente teoacuterico
contemplativo mas sobretudo praacutetico[viii] da aproximaccedilatildeo ao ente aleacutem da
natureza da operaccedilatildeo mental que designa - constataccedilatildeo ou recogniccedilatildeo vale
dizer a admissatildeo de algo a respeito do qual o discurso se pronuncia como forma
imediata de representaccedilatildeo
Relevar o caraacuteter praacutetico de aproximaccedilatildeo ao ente ou em outras
palavras partir ou dar prioridade agrave praacutetica significa por seu turno partir do
caraacuteter essencial do ser do homem por sua exteriorizaccedilatildeo operativa no mundo
que confirma sua forma de vida ou modo de existecircncia Quer dizer eacute um ponto
de partida desde logo sob criteacuterio ontoloacutegico ou seja que considera a
efetividade ocircntica do homem e do mundo de tal sorte que ambos satildeo
reconhecidos enquanto atividade sensiacutevel Caminho que tem o meacuterito de evitar
as vias reflexas[ix] como tambeacutem os engenhos e supostos dos encantamentos
especulativos como cogito sujeito transcendental ou os arqueacutetipos
generalizando uma expressatildeo marxiana os misticismos loacutegicos que nunca
deixam de mostrar sua condiccedilatildeo de artifiacutecios por mais rigorosos e envolventes
que sejam tanto que podem sempre ser contestados de algum modo ao passo
que os indiviacuteduos vivos e ativos os pressupostos dos quais Marx parte em A
13
Ideologia Alematilde natildeo podem nunca ser recusados a natildeo ser na fantasia e sob
pena de cancelar todo e qualquer andamento reflexivo
Em suma reconhecimento ontopraacutetico significa pois tomar como
ponto de partida a praacutetica - desde a praacutetica cotidiana agrave praacutetica cientiacutefica de ponta
- de um tempo dado
O plano ontopraacutetico jaacute bem delineado no texto de 1995 ganha nos
anos seguintes sucessivas correccedilotildees por parte do autor a ponto de se tornar o
eixo a partir do qual Chasin faz a criacutetica das Teorias da Fundamentaccedilatildeo ou
como ele as denomina ironicamente A Querela da Fundamentaccedilatildeo
A esse respeito costumava ele indagar O que eacute um fundamento Uma
Teoria da Subjetividade ou Uma Teoria da Objetividade
Se o fundamento for considerado a partir de uma teoria da
subjetividade por onde comeccedilar Pelo aparato sensorial como no empirismo
Ou pela consciecircncia ou coisa que o valha como o cogito cartesiano a
autoconsciecircncia a razatildeo ou as formas a priori do entendimento Ou ainda uma
teoria da mente
Ainda no plano do fundamento subjetivo poder-se-ia partir da
experiecircncia da vivecircncia do vivido Neste caso o vivido seria o preacute-teoreacutetico
mas enquanto experiecircncia existencial isto eacute as vivecircncias do indiviacuteduo isolado
em experiecircncia aleatoacuteria fortuita acidental
Mas se o fundamento for uma Teoria da Objetividade por onde
comeccedilar Pelos fenocircmenos empiacutericos Mas nesse caso natildeo terminariacuteamos
apenas no fundamento psicoloacutegico isto eacute teriacuteamos o psicologismo como
fundamento da verdade
14
E se partiacutessemos do todo concreto Natildeo findariacuteamos numa visatildeo
caoacutetica e abstrata de conjuntos indeterminados desamparados na companhia
de um punhado de abstraccedilotildees razoaacuteveis e irrazoaacuteveis
Feitas tais indagaccedilotildees Chasin conclui de modo enfaacutetico Toda peticcedilatildeo
de fundamento todo discurso por um fundamento estaacute encerrado na esfera
teoacuterica Aleacutem do mais todo discurso de fundamentaccedilatildeo pretende e implica uma
certeza ou seja de um modo ou de outro a suposiccedilatildeo de um saber absoluto
ainda que um simples momento do saber absoluto Vale dizer o discurso da
fundamentaccedilatildeo desemboca de algum modo na razatildeo especulativa Em outras
palavras implica algo que transcende a proacutepria natureza do saber que eacute um
processo infinito de aproximaccedilotildees
Para Chasin o reconhecimento do ontopraacutetico tem a vantagem de
escapar agrave querela da fundamentaccedilatildeo na medida em que parte da experiecircncia
real melhor dizendo da praacutetica real natildeo de uma experiecircncia isolada
arbitrariamente natildeo da experiecircncia aleatoacuteria da suposta existecircncia existencial
dos indiviacuteduos isolados dos indiviacuteduos em derreliccedilatildeo
O universo ontopraacutetico eacute o necessariamente vivido para que qualquer
pergunta possa se dar Eacute portanto a esfera preacute-teoreacutetica esfera que antecede
qualquer teoria Esfera sem a qual natildeo haacute vida humana e portanto sem a qual
natildeo pode haver qualquer pergunta teoacuterica
A reflexatildeo que tem como ponto de partida o ontopraacutetico estabelece
assim um pressuposto concreto (e natildeo uma verdade ideada) do qual natildeo posso
me afastar a natildeo ser na imaginaccedilatildeo
Em siacutentese a esfera ontopraacutetica representa o complexos dos homens
vivos e ativos A partir dessa abstraccedilatildeo razoaacutevel - o ontopraacutetico - pode-se
encontrar jaacute numa analiacutetica de desentranhamento desse complexo real o
devido lugar da ontologia da epistemologia e da ciecircncia da histoacuteria que
compreende dois grandes ramos natureza e sociedade
15
Em outras palavras sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico torna-se
aleatoacuteria a localizaccedilatildeo que se confere tanto ao ontoloacutegico quanto ao epistecircmico
A opccedilatildeo por um deles se torna uma arbitrariedade teoacuterica e eacute justamente isto
que gera a querela da fundamentaccedilatildeo pois a decisatildeo fica submersa ao plano
teoacuterico ao jogo dos argumentos agrave ambivalecircncia do logos que eacute irresolutivo
Sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico parte-se assim de imediato da
teoria e natildeo do ser que faz da teoria ou deste como uma abstraccedilatildeo da
inteligibilidade ou seja de uma faculdade abstraiacuteda do ser que a possui
gerando com isso um absurdo ontoloacutegico
Eacute portanto a partir da analiacutetica do ontopraacutetico pelo reconhecimento de
seus traccedilos categoriais que tem iniacutecio a elaboraccedilatildeo ontoloacutegica Ou seja a
ontologia nasce como reflexatildeo conscientizaccedilatildeo conceituaccedilatildeo do ontopraacutetico
enquanto primeiro objeto da ontologia que a partir daiacute se encaminha em
direccedilatildeo agrave criacutetica - em termos de sua necessidade e loacutegica especiacutefica - do proacuteprio
ontopraacutetico isto eacute do complexo dos objetos reais aiacute incluiacutedo o homem
Resta ainda em relaccedilatildeo agrave problemaacutetica geral em tela aflorar a questatildeo
da adequatio tal como era tematizada tambeacutem em seus cursos
Polemizando com a denominaccedilatildeo de realismo comumente utilizada
para denominar proposituras que conferem prioridade ao mundo objetual
Chasin afirmava que haacute realismo - antigo - quando eacute suposto que a ordem da
razatildeo agrave idecircntica a ordem do real e que a partir de axiomas por meios racionais-
dedutivos embuiacutedos do espiacuterito de sistema se possa estabelecer a verdade do
mundo
Em Marx entretanto a ordem das coisas e da razatildeo satildeo distintas (um
exemplo expressivo desta postura marxiana pode ser encontrada na famosa
Introduccedilatildeo de 57) ambas mutaacuteveis e processuais - unidade da desidentidade
entre ser e saber Assim o mundo natildeo pode ser deduzido racionalmente mas
reproduzido sob forma de ideacuteia por meio de aproximaccedilotildees - empiacuterico abstrato
16
concreto - num processo intensivo e extensivo historicamente condicionado
possibilitado ou impedido - na dependecircncia que fica da maturaccedilatildeo do objeto e
do posicionamento do sujeito O processo mimeacutetico eacute portanto reproduccedilatildeo
conceitual de efetividades donde se lida com duas ordens de formaccedilotildees real e
ideal A reproduccedilatildeo conceitual apresenta portanto sua proacutepria loacutegica mas no
interior da determinaccedilatildeo soacutecio-histoacuterica do pensamento de modo que uma
teoria do conhecimento (morfologia e dinacircmica da subjetividade in abstratu e
imutaacutevel) eacute incapaz de explicar o processo cognitivo pois a faculdade humana
da forccedila da abstraccedilatildeo depende das possibilidades oferecidas pela
determinaccedilatildeo social do pensamento que por sua vez se manifesta e se
configura pelo desenvolvimento dos objetos e da praacutetica humana que sobre eles
tem incidecircncia
Donde a franca afirmaccedilatildeo marxiana da possibilidade de conhecer natildeo
se confunde com a simplicidade e facilidade da concepccedilatildeo realista nem mesmo
no plano da ingenuidade cotidiana desde logo porque a atividade cotidiana -
que estaacute para aleacutem da ingenuidade ou lanccedila os sujeitos para aleacutem da
ingenuidade - eacute em si um complexo rico e desafiador matrizador inclusive da
intentio recta atitude natural e necessaacuteria da esfera ontopraacutetica
Haacute portanto que distinguir as grandes diferenccedilas ontoloacutegicas entre o
estatuto marxiano e a ontologia realista Na primeira a adequatio digamos
assim eacute correlaccedilatildeo entre formaccedilatildeo real e formaccedilatildeo ideal duas ordens distintas
de configuraccedilatildeo Em outras palavras eacute correlaccedilatildeo conceitual entre entificaccedilatildeo
concreta e reproduccedilatildeo conceitual Em suma a reproduccedilatildeo conceitual nada mais
eacute do que transposiccedilatildeo agrave cabeccedila ordenada pelos nexos do real na forma e pelos
meios da proacutepria atividade mental
I - Tomando Marx por Base e por Ponto de Chegada
17
Considerando como ponto de referecircncia as consideraccedilotildees
desenvolvidas por Marx em O Capital especificamente sobre a dificuldade
encontrada pela humanidade na compreensatildeo do valor ao longo de dois
milecircnios - de Aristoacuteteles a Ricardo - pode-se sustentar segundo Chasin que
um fenocircmeno muito similar a este se produziu no que tange agrave determinaccedilatildeo do
ser ou seja da(s) matriz(es) da(s) realidade(s) ou seja da efetividade
Tomemos as passagens em questatildeo que se encontram no Prefaacutecio agrave
Primeira Ediccedilatildeo de O Capital Todo comeccedilo eacute difiacutecil isso vale para qualquer
ciecircncia A forma do valor cuja figura acabada eacute a forma do dinheiro eacute muito
simples e vazia de conteuacutedo Mesmo assim o espiacuterito humano tem procurado
desvendaacute-la (ergruumlden) em vatildeo haacute mais de 2000 anos enquanto por outro lado
teve ecircxito ao menos aproximado a anaacutelise de formas muito mais complicadas e
replenas de conteuacutedo Por quecirc Porque o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de
estudar do que a ceacutelula do corpo Aleacutem disso na anaacutelise das formas econocircmicas
natildeo podem servir nem o microscoacutepio nem reagentes quiacutemicos A forccedila da
abstraccedilatildeo deve substituir a ambos Para o leigo a anaacutelise parece se perder
em pedantismo Trata-se efetivamente de pedantismo mas daquele de que se
ocupa a anatomia microscoacutepica
De acordo com Chasin eacute necessaacuterio reter os seguintes noacutedulos
significativos da citaccedilatildeo acima
1) todo iniacutecio de uma ciecircncia eacute difiacutecil donde o princiacutepio da ontologia o
princiacutepio da ciecircncia deve ser o mais difiacutecil de todos
2) haacute grande dificuldade na compreensatildeo da forma do valor que eacute um
objeto simples e vazio de conteuacutedo
3) haacute ecircxito maior na anaacutelise de formas mais complicadas e replenas de
conteuacutedo
18
Na mesma citaccedilatildeo Marx enuncia os motivos de tal dificuldade
1) o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de estudar do que a ceacutelula do
corpo
2) meacutetodos experimentais natildeo satildeo aplicaacuteveis a esse tipo de forma
3) a analiacutetica dessa forma pela forccedila da abstraccedilatildeo deve tomar o lugar
da observaccedilatildeo empiacuterica e experimental
4) anaacutelise voltada agrave anatomia microscoacutepica da forma estudada
A partir dessas indicaccedilotildees colhidas no texto de Marx Chasin elabora
um esboccedilo para fins unicamente didaacuteticos em que busca transpassaacute-las para a
proacutepria questatildeo ontoloacutegica afirmando o que se segue
1) o iniacutecio difiacutecil da ontologia perdurou tambeacutem por mais de 2000
anos trajetoacuteria em que se observa tateios imprecisos caracterizados por um
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo ateacute chegar em Marx Tal
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo revela por seu rumo
imanentemente contraditoacuterio por seus caminhos e descaminhos histoacutericos a
dificuldade e a longa incapacidade na formulaccedilatildeo precisa de seu objeto e
alcance ou seja de sua natureza e propoacutesito - de sua funccedilatildeo orientadora e
sustentadora no plano teoacuterico e de sua origem praacutetica preacute-teoreacutetica
2) reconhecimento ontopraacutetico das formas dos seres e analiacutetica da
forma do ser apenas por meio da forccedila da abstraccedilatildeo no reconhecimento
ontopraacutetico os seres satildeo reconhecidos como substantivos e nesse caso ateacute
certo ponto vale para a observaccedilatildeo espontacircnea e observaccedilatildeo comum pois o
desvendamento completo exige forccedila de abstraccedilatildeo como verbo ( o ato de ser
de Gilson) soacute a forccedila da abstraccedilatildeo daiacute a facilidade para se cair no
abstrativismo
19
Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
20
De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
22
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
30
realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
35
tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
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2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
a ser confirmado ou ampliado ou ao inveacutes restringido na parte ou descartado
no todo posteriormente com todas as suas implicaccedilotildees correlatas
Em suma quando se utiliza a expressatildeo posiccedilatildeo ontoloacutegica e natildeo
perspectiva oacutetica prisma ou ponto de vista pretende-se remeter a lugar e agraves
coisas ou seja o reconhecimento do mundo como multiverso de entes reais
objetivos e que por isso mesmo faceiam o observador praacutetico ou teoacuterico natildeo
dependendo deste para existir em face do qual satildeo independentes Eacute
finalmente o reconhecimento da prioridade das coisas nas relaccedilotildees cognitivas
sem desconhecer eacute claro o caraacuteter ativo do investigador
Quando Chasin procura enfatizar o reconhecimento noccedilatildeo
imediatamente conexa a de posiccedilatildeo ontoloacutegica eacute por que aquela tem a
vantagem de colocar em primeiro lugar o caraacuteter natildeo puramente teoacuterico
contemplativo mas sobretudo praacutetico[viii] da aproximaccedilatildeo ao ente aleacutem da
natureza da operaccedilatildeo mental que designa - constataccedilatildeo ou recogniccedilatildeo vale
dizer a admissatildeo de algo a respeito do qual o discurso se pronuncia como forma
imediata de representaccedilatildeo
Relevar o caraacuteter praacutetico de aproximaccedilatildeo ao ente ou em outras
palavras partir ou dar prioridade agrave praacutetica significa por seu turno partir do
caraacuteter essencial do ser do homem por sua exteriorizaccedilatildeo operativa no mundo
que confirma sua forma de vida ou modo de existecircncia Quer dizer eacute um ponto
de partida desde logo sob criteacuterio ontoloacutegico ou seja que considera a
efetividade ocircntica do homem e do mundo de tal sorte que ambos satildeo
reconhecidos enquanto atividade sensiacutevel Caminho que tem o meacuterito de evitar
as vias reflexas[ix] como tambeacutem os engenhos e supostos dos encantamentos
especulativos como cogito sujeito transcendental ou os arqueacutetipos
generalizando uma expressatildeo marxiana os misticismos loacutegicos que nunca
deixam de mostrar sua condiccedilatildeo de artifiacutecios por mais rigorosos e envolventes
que sejam tanto que podem sempre ser contestados de algum modo ao passo
que os indiviacuteduos vivos e ativos os pressupostos dos quais Marx parte em A
13
Ideologia Alematilde natildeo podem nunca ser recusados a natildeo ser na fantasia e sob
pena de cancelar todo e qualquer andamento reflexivo
Em suma reconhecimento ontopraacutetico significa pois tomar como
ponto de partida a praacutetica - desde a praacutetica cotidiana agrave praacutetica cientiacutefica de ponta
- de um tempo dado
O plano ontopraacutetico jaacute bem delineado no texto de 1995 ganha nos
anos seguintes sucessivas correccedilotildees por parte do autor a ponto de se tornar o
eixo a partir do qual Chasin faz a criacutetica das Teorias da Fundamentaccedilatildeo ou
como ele as denomina ironicamente A Querela da Fundamentaccedilatildeo
A esse respeito costumava ele indagar O que eacute um fundamento Uma
Teoria da Subjetividade ou Uma Teoria da Objetividade
Se o fundamento for considerado a partir de uma teoria da
subjetividade por onde comeccedilar Pelo aparato sensorial como no empirismo
Ou pela consciecircncia ou coisa que o valha como o cogito cartesiano a
autoconsciecircncia a razatildeo ou as formas a priori do entendimento Ou ainda uma
teoria da mente
Ainda no plano do fundamento subjetivo poder-se-ia partir da
experiecircncia da vivecircncia do vivido Neste caso o vivido seria o preacute-teoreacutetico
mas enquanto experiecircncia existencial isto eacute as vivecircncias do indiviacuteduo isolado
em experiecircncia aleatoacuteria fortuita acidental
Mas se o fundamento for uma Teoria da Objetividade por onde
comeccedilar Pelos fenocircmenos empiacutericos Mas nesse caso natildeo terminariacuteamos
apenas no fundamento psicoloacutegico isto eacute teriacuteamos o psicologismo como
fundamento da verdade
14
E se partiacutessemos do todo concreto Natildeo findariacuteamos numa visatildeo
caoacutetica e abstrata de conjuntos indeterminados desamparados na companhia
de um punhado de abstraccedilotildees razoaacuteveis e irrazoaacuteveis
Feitas tais indagaccedilotildees Chasin conclui de modo enfaacutetico Toda peticcedilatildeo
de fundamento todo discurso por um fundamento estaacute encerrado na esfera
teoacuterica Aleacutem do mais todo discurso de fundamentaccedilatildeo pretende e implica uma
certeza ou seja de um modo ou de outro a suposiccedilatildeo de um saber absoluto
ainda que um simples momento do saber absoluto Vale dizer o discurso da
fundamentaccedilatildeo desemboca de algum modo na razatildeo especulativa Em outras
palavras implica algo que transcende a proacutepria natureza do saber que eacute um
processo infinito de aproximaccedilotildees
Para Chasin o reconhecimento do ontopraacutetico tem a vantagem de
escapar agrave querela da fundamentaccedilatildeo na medida em que parte da experiecircncia
real melhor dizendo da praacutetica real natildeo de uma experiecircncia isolada
arbitrariamente natildeo da experiecircncia aleatoacuteria da suposta existecircncia existencial
dos indiviacuteduos isolados dos indiviacuteduos em derreliccedilatildeo
O universo ontopraacutetico eacute o necessariamente vivido para que qualquer
pergunta possa se dar Eacute portanto a esfera preacute-teoreacutetica esfera que antecede
qualquer teoria Esfera sem a qual natildeo haacute vida humana e portanto sem a qual
natildeo pode haver qualquer pergunta teoacuterica
A reflexatildeo que tem como ponto de partida o ontopraacutetico estabelece
assim um pressuposto concreto (e natildeo uma verdade ideada) do qual natildeo posso
me afastar a natildeo ser na imaginaccedilatildeo
Em siacutentese a esfera ontopraacutetica representa o complexos dos homens
vivos e ativos A partir dessa abstraccedilatildeo razoaacutevel - o ontopraacutetico - pode-se
encontrar jaacute numa analiacutetica de desentranhamento desse complexo real o
devido lugar da ontologia da epistemologia e da ciecircncia da histoacuteria que
compreende dois grandes ramos natureza e sociedade
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Em outras palavras sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico torna-se
aleatoacuteria a localizaccedilatildeo que se confere tanto ao ontoloacutegico quanto ao epistecircmico
A opccedilatildeo por um deles se torna uma arbitrariedade teoacuterica e eacute justamente isto
que gera a querela da fundamentaccedilatildeo pois a decisatildeo fica submersa ao plano
teoacuterico ao jogo dos argumentos agrave ambivalecircncia do logos que eacute irresolutivo
Sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico parte-se assim de imediato da
teoria e natildeo do ser que faz da teoria ou deste como uma abstraccedilatildeo da
inteligibilidade ou seja de uma faculdade abstraiacuteda do ser que a possui
gerando com isso um absurdo ontoloacutegico
Eacute portanto a partir da analiacutetica do ontopraacutetico pelo reconhecimento de
seus traccedilos categoriais que tem iniacutecio a elaboraccedilatildeo ontoloacutegica Ou seja a
ontologia nasce como reflexatildeo conscientizaccedilatildeo conceituaccedilatildeo do ontopraacutetico
enquanto primeiro objeto da ontologia que a partir daiacute se encaminha em
direccedilatildeo agrave criacutetica - em termos de sua necessidade e loacutegica especiacutefica - do proacuteprio
ontopraacutetico isto eacute do complexo dos objetos reais aiacute incluiacutedo o homem
Resta ainda em relaccedilatildeo agrave problemaacutetica geral em tela aflorar a questatildeo
da adequatio tal como era tematizada tambeacutem em seus cursos
Polemizando com a denominaccedilatildeo de realismo comumente utilizada
para denominar proposituras que conferem prioridade ao mundo objetual
Chasin afirmava que haacute realismo - antigo - quando eacute suposto que a ordem da
razatildeo agrave idecircntica a ordem do real e que a partir de axiomas por meios racionais-
dedutivos embuiacutedos do espiacuterito de sistema se possa estabelecer a verdade do
mundo
Em Marx entretanto a ordem das coisas e da razatildeo satildeo distintas (um
exemplo expressivo desta postura marxiana pode ser encontrada na famosa
Introduccedilatildeo de 57) ambas mutaacuteveis e processuais - unidade da desidentidade
entre ser e saber Assim o mundo natildeo pode ser deduzido racionalmente mas
reproduzido sob forma de ideacuteia por meio de aproximaccedilotildees - empiacuterico abstrato
16
concreto - num processo intensivo e extensivo historicamente condicionado
possibilitado ou impedido - na dependecircncia que fica da maturaccedilatildeo do objeto e
do posicionamento do sujeito O processo mimeacutetico eacute portanto reproduccedilatildeo
conceitual de efetividades donde se lida com duas ordens de formaccedilotildees real e
ideal A reproduccedilatildeo conceitual apresenta portanto sua proacutepria loacutegica mas no
interior da determinaccedilatildeo soacutecio-histoacuterica do pensamento de modo que uma
teoria do conhecimento (morfologia e dinacircmica da subjetividade in abstratu e
imutaacutevel) eacute incapaz de explicar o processo cognitivo pois a faculdade humana
da forccedila da abstraccedilatildeo depende das possibilidades oferecidas pela
determinaccedilatildeo social do pensamento que por sua vez se manifesta e se
configura pelo desenvolvimento dos objetos e da praacutetica humana que sobre eles
tem incidecircncia
Donde a franca afirmaccedilatildeo marxiana da possibilidade de conhecer natildeo
se confunde com a simplicidade e facilidade da concepccedilatildeo realista nem mesmo
no plano da ingenuidade cotidiana desde logo porque a atividade cotidiana -
que estaacute para aleacutem da ingenuidade ou lanccedila os sujeitos para aleacutem da
ingenuidade - eacute em si um complexo rico e desafiador matrizador inclusive da
intentio recta atitude natural e necessaacuteria da esfera ontopraacutetica
Haacute portanto que distinguir as grandes diferenccedilas ontoloacutegicas entre o
estatuto marxiano e a ontologia realista Na primeira a adequatio digamos
assim eacute correlaccedilatildeo entre formaccedilatildeo real e formaccedilatildeo ideal duas ordens distintas
de configuraccedilatildeo Em outras palavras eacute correlaccedilatildeo conceitual entre entificaccedilatildeo
concreta e reproduccedilatildeo conceitual Em suma a reproduccedilatildeo conceitual nada mais
eacute do que transposiccedilatildeo agrave cabeccedila ordenada pelos nexos do real na forma e pelos
meios da proacutepria atividade mental
I - Tomando Marx por Base e por Ponto de Chegada
17
Considerando como ponto de referecircncia as consideraccedilotildees
desenvolvidas por Marx em O Capital especificamente sobre a dificuldade
encontrada pela humanidade na compreensatildeo do valor ao longo de dois
milecircnios - de Aristoacuteteles a Ricardo - pode-se sustentar segundo Chasin que
um fenocircmeno muito similar a este se produziu no que tange agrave determinaccedilatildeo do
ser ou seja da(s) matriz(es) da(s) realidade(s) ou seja da efetividade
Tomemos as passagens em questatildeo que se encontram no Prefaacutecio agrave
Primeira Ediccedilatildeo de O Capital Todo comeccedilo eacute difiacutecil isso vale para qualquer
ciecircncia A forma do valor cuja figura acabada eacute a forma do dinheiro eacute muito
simples e vazia de conteuacutedo Mesmo assim o espiacuterito humano tem procurado
desvendaacute-la (ergruumlden) em vatildeo haacute mais de 2000 anos enquanto por outro lado
teve ecircxito ao menos aproximado a anaacutelise de formas muito mais complicadas e
replenas de conteuacutedo Por quecirc Porque o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de
estudar do que a ceacutelula do corpo Aleacutem disso na anaacutelise das formas econocircmicas
natildeo podem servir nem o microscoacutepio nem reagentes quiacutemicos A forccedila da
abstraccedilatildeo deve substituir a ambos Para o leigo a anaacutelise parece se perder
em pedantismo Trata-se efetivamente de pedantismo mas daquele de que se
ocupa a anatomia microscoacutepica
De acordo com Chasin eacute necessaacuterio reter os seguintes noacutedulos
significativos da citaccedilatildeo acima
1) todo iniacutecio de uma ciecircncia eacute difiacutecil donde o princiacutepio da ontologia o
princiacutepio da ciecircncia deve ser o mais difiacutecil de todos
2) haacute grande dificuldade na compreensatildeo da forma do valor que eacute um
objeto simples e vazio de conteuacutedo
3) haacute ecircxito maior na anaacutelise de formas mais complicadas e replenas de
conteuacutedo
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Na mesma citaccedilatildeo Marx enuncia os motivos de tal dificuldade
1) o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de estudar do que a ceacutelula do
corpo
2) meacutetodos experimentais natildeo satildeo aplicaacuteveis a esse tipo de forma
3) a analiacutetica dessa forma pela forccedila da abstraccedilatildeo deve tomar o lugar
da observaccedilatildeo empiacuterica e experimental
4) anaacutelise voltada agrave anatomia microscoacutepica da forma estudada
A partir dessas indicaccedilotildees colhidas no texto de Marx Chasin elabora
um esboccedilo para fins unicamente didaacuteticos em que busca transpassaacute-las para a
proacutepria questatildeo ontoloacutegica afirmando o que se segue
1) o iniacutecio difiacutecil da ontologia perdurou tambeacutem por mais de 2000
anos trajetoacuteria em que se observa tateios imprecisos caracterizados por um
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo ateacute chegar em Marx Tal
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo revela por seu rumo
imanentemente contraditoacuterio por seus caminhos e descaminhos histoacutericos a
dificuldade e a longa incapacidade na formulaccedilatildeo precisa de seu objeto e
alcance ou seja de sua natureza e propoacutesito - de sua funccedilatildeo orientadora e
sustentadora no plano teoacuterico e de sua origem praacutetica preacute-teoreacutetica
2) reconhecimento ontopraacutetico das formas dos seres e analiacutetica da
forma do ser apenas por meio da forccedila da abstraccedilatildeo no reconhecimento
ontopraacutetico os seres satildeo reconhecidos como substantivos e nesse caso ateacute
certo ponto vale para a observaccedilatildeo espontacircnea e observaccedilatildeo comum pois o
desvendamento completo exige forccedila de abstraccedilatildeo como verbo ( o ato de ser
de Gilson) soacute a forccedila da abstraccedilatildeo daiacute a facilidade para se cair no
abstrativismo
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Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
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De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
22
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
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relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
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realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
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objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
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conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
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coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
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estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
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tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
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2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
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7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
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mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
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O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
Ideologia Alematilde natildeo podem nunca ser recusados a natildeo ser na fantasia e sob
pena de cancelar todo e qualquer andamento reflexivo
Em suma reconhecimento ontopraacutetico significa pois tomar como
ponto de partida a praacutetica - desde a praacutetica cotidiana agrave praacutetica cientiacutefica de ponta
- de um tempo dado
O plano ontopraacutetico jaacute bem delineado no texto de 1995 ganha nos
anos seguintes sucessivas correccedilotildees por parte do autor a ponto de se tornar o
eixo a partir do qual Chasin faz a criacutetica das Teorias da Fundamentaccedilatildeo ou
como ele as denomina ironicamente A Querela da Fundamentaccedilatildeo
A esse respeito costumava ele indagar O que eacute um fundamento Uma
Teoria da Subjetividade ou Uma Teoria da Objetividade
Se o fundamento for considerado a partir de uma teoria da
subjetividade por onde comeccedilar Pelo aparato sensorial como no empirismo
Ou pela consciecircncia ou coisa que o valha como o cogito cartesiano a
autoconsciecircncia a razatildeo ou as formas a priori do entendimento Ou ainda uma
teoria da mente
Ainda no plano do fundamento subjetivo poder-se-ia partir da
experiecircncia da vivecircncia do vivido Neste caso o vivido seria o preacute-teoreacutetico
mas enquanto experiecircncia existencial isto eacute as vivecircncias do indiviacuteduo isolado
em experiecircncia aleatoacuteria fortuita acidental
Mas se o fundamento for uma Teoria da Objetividade por onde
comeccedilar Pelos fenocircmenos empiacutericos Mas nesse caso natildeo terminariacuteamos
apenas no fundamento psicoloacutegico isto eacute teriacuteamos o psicologismo como
fundamento da verdade
14
E se partiacutessemos do todo concreto Natildeo findariacuteamos numa visatildeo
caoacutetica e abstrata de conjuntos indeterminados desamparados na companhia
de um punhado de abstraccedilotildees razoaacuteveis e irrazoaacuteveis
Feitas tais indagaccedilotildees Chasin conclui de modo enfaacutetico Toda peticcedilatildeo
de fundamento todo discurso por um fundamento estaacute encerrado na esfera
teoacuterica Aleacutem do mais todo discurso de fundamentaccedilatildeo pretende e implica uma
certeza ou seja de um modo ou de outro a suposiccedilatildeo de um saber absoluto
ainda que um simples momento do saber absoluto Vale dizer o discurso da
fundamentaccedilatildeo desemboca de algum modo na razatildeo especulativa Em outras
palavras implica algo que transcende a proacutepria natureza do saber que eacute um
processo infinito de aproximaccedilotildees
Para Chasin o reconhecimento do ontopraacutetico tem a vantagem de
escapar agrave querela da fundamentaccedilatildeo na medida em que parte da experiecircncia
real melhor dizendo da praacutetica real natildeo de uma experiecircncia isolada
arbitrariamente natildeo da experiecircncia aleatoacuteria da suposta existecircncia existencial
dos indiviacuteduos isolados dos indiviacuteduos em derreliccedilatildeo
O universo ontopraacutetico eacute o necessariamente vivido para que qualquer
pergunta possa se dar Eacute portanto a esfera preacute-teoreacutetica esfera que antecede
qualquer teoria Esfera sem a qual natildeo haacute vida humana e portanto sem a qual
natildeo pode haver qualquer pergunta teoacuterica
A reflexatildeo que tem como ponto de partida o ontopraacutetico estabelece
assim um pressuposto concreto (e natildeo uma verdade ideada) do qual natildeo posso
me afastar a natildeo ser na imaginaccedilatildeo
Em siacutentese a esfera ontopraacutetica representa o complexos dos homens
vivos e ativos A partir dessa abstraccedilatildeo razoaacutevel - o ontopraacutetico - pode-se
encontrar jaacute numa analiacutetica de desentranhamento desse complexo real o
devido lugar da ontologia da epistemologia e da ciecircncia da histoacuteria que
compreende dois grandes ramos natureza e sociedade
15
Em outras palavras sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico torna-se
aleatoacuteria a localizaccedilatildeo que se confere tanto ao ontoloacutegico quanto ao epistecircmico
A opccedilatildeo por um deles se torna uma arbitrariedade teoacuterica e eacute justamente isto
que gera a querela da fundamentaccedilatildeo pois a decisatildeo fica submersa ao plano
teoacuterico ao jogo dos argumentos agrave ambivalecircncia do logos que eacute irresolutivo
Sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico parte-se assim de imediato da
teoria e natildeo do ser que faz da teoria ou deste como uma abstraccedilatildeo da
inteligibilidade ou seja de uma faculdade abstraiacuteda do ser que a possui
gerando com isso um absurdo ontoloacutegico
Eacute portanto a partir da analiacutetica do ontopraacutetico pelo reconhecimento de
seus traccedilos categoriais que tem iniacutecio a elaboraccedilatildeo ontoloacutegica Ou seja a
ontologia nasce como reflexatildeo conscientizaccedilatildeo conceituaccedilatildeo do ontopraacutetico
enquanto primeiro objeto da ontologia que a partir daiacute se encaminha em
direccedilatildeo agrave criacutetica - em termos de sua necessidade e loacutegica especiacutefica - do proacuteprio
ontopraacutetico isto eacute do complexo dos objetos reais aiacute incluiacutedo o homem
Resta ainda em relaccedilatildeo agrave problemaacutetica geral em tela aflorar a questatildeo
da adequatio tal como era tematizada tambeacutem em seus cursos
Polemizando com a denominaccedilatildeo de realismo comumente utilizada
para denominar proposituras que conferem prioridade ao mundo objetual
Chasin afirmava que haacute realismo - antigo - quando eacute suposto que a ordem da
razatildeo agrave idecircntica a ordem do real e que a partir de axiomas por meios racionais-
dedutivos embuiacutedos do espiacuterito de sistema se possa estabelecer a verdade do
mundo
Em Marx entretanto a ordem das coisas e da razatildeo satildeo distintas (um
exemplo expressivo desta postura marxiana pode ser encontrada na famosa
Introduccedilatildeo de 57) ambas mutaacuteveis e processuais - unidade da desidentidade
entre ser e saber Assim o mundo natildeo pode ser deduzido racionalmente mas
reproduzido sob forma de ideacuteia por meio de aproximaccedilotildees - empiacuterico abstrato
16
concreto - num processo intensivo e extensivo historicamente condicionado
possibilitado ou impedido - na dependecircncia que fica da maturaccedilatildeo do objeto e
do posicionamento do sujeito O processo mimeacutetico eacute portanto reproduccedilatildeo
conceitual de efetividades donde se lida com duas ordens de formaccedilotildees real e
ideal A reproduccedilatildeo conceitual apresenta portanto sua proacutepria loacutegica mas no
interior da determinaccedilatildeo soacutecio-histoacuterica do pensamento de modo que uma
teoria do conhecimento (morfologia e dinacircmica da subjetividade in abstratu e
imutaacutevel) eacute incapaz de explicar o processo cognitivo pois a faculdade humana
da forccedila da abstraccedilatildeo depende das possibilidades oferecidas pela
determinaccedilatildeo social do pensamento que por sua vez se manifesta e se
configura pelo desenvolvimento dos objetos e da praacutetica humana que sobre eles
tem incidecircncia
Donde a franca afirmaccedilatildeo marxiana da possibilidade de conhecer natildeo
se confunde com a simplicidade e facilidade da concepccedilatildeo realista nem mesmo
no plano da ingenuidade cotidiana desde logo porque a atividade cotidiana -
que estaacute para aleacutem da ingenuidade ou lanccedila os sujeitos para aleacutem da
ingenuidade - eacute em si um complexo rico e desafiador matrizador inclusive da
intentio recta atitude natural e necessaacuteria da esfera ontopraacutetica
Haacute portanto que distinguir as grandes diferenccedilas ontoloacutegicas entre o
estatuto marxiano e a ontologia realista Na primeira a adequatio digamos
assim eacute correlaccedilatildeo entre formaccedilatildeo real e formaccedilatildeo ideal duas ordens distintas
de configuraccedilatildeo Em outras palavras eacute correlaccedilatildeo conceitual entre entificaccedilatildeo
concreta e reproduccedilatildeo conceitual Em suma a reproduccedilatildeo conceitual nada mais
eacute do que transposiccedilatildeo agrave cabeccedila ordenada pelos nexos do real na forma e pelos
meios da proacutepria atividade mental
I - Tomando Marx por Base e por Ponto de Chegada
17
Considerando como ponto de referecircncia as consideraccedilotildees
desenvolvidas por Marx em O Capital especificamente sobre a dificuldade
encontrada pela humanidade na compreensatildeo do valor ao longo de dois
milecircnios - de Aristoacuteteles a Ricardo - pode-se sustentar segundo Chasin que
um fenocircmeno muito similar a este se produziu no que tange agrave determinaccedilatildeo do
ser ou seja da(s) matriz(es) da(s) realidade(s) ou seja da efetividade
Tomemos as passagens em questatildeo que se encontram no Prefaacutecio agrave
Primeira Ediccedilatildeo de O Capital Todo comeccedilo eacute difiacutecil isso vale para qualquer
ciecircncia A forma do valor cuja figura acabada eacute a forma do dinheiro eacute muito
simples e vazia de conteuacutedo Mesmo assim o espiacuterito humano tem procurado
desvendaacute-la (ergruumlden) em vatildeo haacute mais de 2000 anos enquanto por outro lado
teve ecircxito ao menos aproximado a anaacutelise de formas muito mais complicadas e
replenas de conteuacutedo Por quecirc Porque o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de
estudar do que a ceacutelula do corpo Aleacutem disso na anaacutelise das formas econocircmicas
natildeo podem servir nem o microscoacutepio nem reagentes quiacutemicos A forccedila da
abstraccedilatildeo deve substituir a ambos Para o leigo a anaacutelise parece se perder
em pedantismo Trata-se efetivamente de pedantismo mas daquele de que se
ocupa a anatomia microscoacutepica
De acordo com Chasin eacute necessaacuterio reter os seguintes noacutedulos
significativos da citaccedilatildeo acima
1) todo iniacutecio de uma ciecircncia eacute difiacutecil donde o princiacutepio da ontologia o
princiacutepio da ciecircncia deve ser o mais difiacutecil de todos
2) haacute grande dificuldade na compreensatildeo da forma do valor que eacute um
objeto simples e vazio de conteuacutedo
3) haacute ecircxito maior na anaacutelise de formas mais complicadas e replenas de
conteuacutedo
18
Na mesma citaccedilatildeo Marx enuncia os motivos de tal dificuldade
1) o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de estudar do que a ceacutelula do
corpo
2) meacutetodos experimentais natildeo satildeo aplicaacuteveis a esse tipo de forma
3) a analiacutetica dessa forma pela forccedila da abstraccedilatildeo deve tomar o lugar
da observaccedilatildeo empiacuterica e experimental
4) anaacutelise voltada agrave anatomia microscoacutepica da forma estudada
A partir dessas indicaccedilotildees colhidas no texto de Marx Chasin elabora
um esboccedilo para fins unicamente didaacuteticos em que busca transpassaacute-las para a
proacutepria questatildeo ontoloacutegica afirmando o que se segue
1) o iniacutecio difiacutecil da ontologia perdurou tambeacutem por mais de 2000
anos trajetoacuteria em que se observa tateios imprecisos caracterizados por um
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo ateacute chegar em Marx Tal
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo revela por seu rumo
imanentemente contraditoacuterio por seus caminhos e descaminhos histoacutericos a
dificuldade e a longa incapacidade na formulaccedilatildeo precisa de seu objeto e
alcance ou seja de sua natureza e propoacutesito - de sua funccedilatildeo orientadora e
sustentadora no plano teoacuterico e de sua origem praacutetica preacute-teoreacutetica
2) reconhecimento ontopraacutetico das formas dos seres e analiacutetica da
forma do ser apenas por meio da forccedila da abstraccedilatildeo no reconhecimento
ontopraacutetico os seres satildeo reconhecidos como substantivos e nesse caso ateacute
certo ponto vale para a observaccedilatildeo espontacircnea e observaccedilatildeo comum pois o
desvendamento completo exige forccedila de abstraccedilatildeo como verbo ( o ato de ser
de Gilson) soacute a forccedila da abstraccedilatildeo daiacute a facilidade para se cair no
abstrativismo
19
Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
20
De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
22
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
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conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
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relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
30
realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
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estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
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tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
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2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
E se partiacutessemos do todo concreto Natildeo findariacuteamos numa visatildeo
caoacutetica e abstrata de conjuntos indeterminados desamparados na companhia
de um punhado de abstraccedilotildees razoaacuteveis e irrazoaacuteveis
Feitas tais indagaccedilotildees Chasin conclui de modo enfaacutetico Toda peticcedilatildeo
de fundamento todo discurso por um fundamento estaacute encerrado na esfera
teoacuterica Aleacutem do mais todo discurso de fundamentaccedilatildeo pretende e implica uma
certeza ou seja de um modo ou de outro a suposiccedilatildeo de um saber absoluto
ainda que um simples momento do saber absoluto Vale dizer o discurso da
fundamentaccedilatildeo desemboca de algum modo na razatildeo especulativa Em outras
palavras implica algo que transcende a proacutepria natureza do saber que eacute um
processo infinito de aproximaccedilotildees
Para Chasin o reconhecimento do ontopraacutetico tem a vantagem de
escapar agrave querela da fundamentaccedilatildeo na medida em que parte da experiecircncia
real melhor dizendo da praacutetica real natildeo de uma experiecircncia isolada
arbitrariamente natildeo da experiecircncia aleatoacuteria da suposta existecircncia existencial
dos indiviacuteduos isolados dos indiviacuteduos em derreliccedilatildeo
O universo ontopraacutetico eacute o necessariamente vivido para que qualquer
pergunta possa se dar Eacute portanto a esfera preacute-teoreacutetica esfera que antecede
qualquer teoria Esfera sem a qual natildeo haacute vida humana e portanto sem a qual
natildeo pode haver qualquer pergunta teoacuterica
A reflexatildeo que tem como ponto de partida o ontopraacutetico estabelece
assim um pressuposto concreto (e natildeo uma verdade ideada) do qual natildeo posso
me afastar a natildeo ser na imaginaccedilatildeo
Em siacutentese a esfera ontopraacutetica representa o complexos dos homens
vivos e ativos A partir dessa abstraccedilatildeo razoaacutevel - o ontopraacutetico - pode-se
encontrar jaacute numa analiacutetica de desentranhamento desse complexo real o
devido lugar da ontologia da epistemologia e da ciecircncia da histoacuteria que
compreende dois grandes ramos natureza e sociedade
15
Em outras palavras sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico torna-se
aleatoacuteria a localizaccedilatildeo que se confere tanto ao ontoloacutegico quanto ao epistecircmico
A opccedilatildeo por um deles se torna uma arbitrariedade teoacuterica e eacute justamente isto
que gera a querela da fundamentaccedilatildeo pois a decisatildeo fica submersa ao plano
teoacuterico ao jogo dos argumentos agrave ambivalecircncia do logos que eacute irresolutivo
Sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico parte-se assim de imediato da
teoria e natildeo do ser que faz da teoria ou deste como uma abstraccedilatildeo da
inteligibilidade ou seja de uma faculdade abstraiacuteda do ser que a possui
gerando com isso um absurdo ontoloacutegico
Eacute portanto a partir da analiacutetica do ontopraacutetico pelo reconhecimento de
seus traccedilos categoriais que tem iniacutecio a elaboraccedilatildeo ontoloacutegica Ou seja a
ontologia nasce como reflexatildeo conscientizaccedilatildeo conceituaccedilatildeo do ontopraacutetico
enquanto primeiro objeto da ontologia que a partir daiacute se encaminha em
direccedilatildeo agrave criacutetica - em termos de sua necessidade e loacutegica especiacutefica - do proacuteprio
ontopraacutetico isto eacute do complexo dos objetos reais aiacute incluiacutedo o homem
Resta ainda em relaccedilatildeo agrave problemaacutetica geral em tela aflorar a questatildeo
da adequatio tal como era tematizada tambeacutem em seus cursos
Polemizando com a denominaccedilatildeo de realismo comumente utilizada
para denominar proposituras que conferem prioridade ao mundo objetual
Chasin afirmava que haacute realismo - antigo - quando eacute suposto que a ordem da
razatildeo agrave idecircntica a ordem do real e que a partir de axiomas por meios racionais-
dedutivos embuiacutedos do espiacuterito de sistema se possa estabelecer a verdade do
mundo
Em Marx entretanto a ordem das coisas e da razatildeo satildeo distintas (um
exemplo expressivo desta postura marxiana pode ser encontrada na famosa
Introduccedilatildeo de 57) ambas mutaacuteveis e processuais - unidade da desidentidade
entre ser e saber Assim o mundo natildeo pode ser deduzido racionalmente mas
reproduzido sob forma de ideacuteia por meio de aproximaccedilotildees - empiacuterico abstrato
16
concreto - num processo intensivo e extensivo historicamente condicionado
possibilitado ou impedido - na dependecircncia que fica da maturaccedilatildeo do objeto e
do posicionamento do sujeito O processo mimeacutetico eacute portanto reproduccedilatildeo
conceitual de efetividades donde se lida com duas ordens de formaccedilotildees real e
ideal A reproduccedilatildeo conceitual apresenta portanto sua proacutepria loacutegica mas no
interior da determinaccedilatildeo soacutecio-histoacuterica do pensamento de modo que uma
teoria do conhecimento (morfologia e dinacircmica da subjetividade in abstratu e
imutaacutevel) eacute incapaz de explicar o processo cognitivo pois a faculdade humana
da forccedila da abstraccedilatildeo depende das possibilidades oferecidas pela
determinaccedilatildeo social do pensamento que por sua vez se manifesta e se
configura pelo desenvolvimento dos objetos e da praacutetica humana que sobre eles
tem incidecircncia
Donde a franca afirmaccedilatildeo marxiana da possibilidade de conhecer natildeo
se confunde com a simplicidade e facilidade da concepccedilatildeo realista nem mesmo
no plano da ingenuidade cotidiana desde logo porque a atividade cotidiana -
que estaacute para aleacutem da ingenuidade ou lanccedila os sujeitos para aleacutem da
ingenuidade - eacute em si um complexo rico e desafiador matrizador inclusive da
intentio recta atitude natural e necessaacuteria da esfera ontopraacutetica
Haacute portanto que distinguir as grandes diferenccedilas ontoloacutegicas entre o
estatuto marxiano e a ontologia realista Na primeira a adequatio digamos
assim eacute correlaccedilatildeo entre formaccedilatildeo real e formaccedilatildeo ideal duas ordens distintas
de configuraccedilatildeo Em outras palavras eacute correlaccedilatildeo conceitual entre entificaccedilatildeo
concreta e reproduccedilatildeo conceitual Em suma a reproduccedilatildeo conceitual nada mais
eacute do que transposiccedilatildeo agrave cabeccedila ordenada pelos nexos do real na forma e pelos
meios da proacutepria atividade mental
I - Tomando Marx por Base e por Ponto de Chegada
17
Considerando como ponto de referecircncia as consideraccedilotildees
desenvolvidas por Marx em O Capital especificamente sobre a dificuldade
encontrada pela humanidade na compreensatildeo do valor ao longo de dois
milecircnios - de Aristoacuteteles a Ricardo - pode-se sustentar segundo Chasin que
um fenocircmeno muito similar a este se produziu no que tange agrave determinaccedilatildeo do
ser ou seja da(s) matriz(es) da(s) realidade(s) ou seja da efetividade
Tomemos as passagens em questatildeo que se encontram no Prefaacutecio agrave
Primeira Ediccedilatildeo de O Capital Todo comeccedilo eacute difiacutecil isso vale para qualquer
ciecircncia A forma do valor cuja figura acabada eacute a forma do dinheiro eacute muito
simples e vazia de conteuacutedo Mesmo assim o espiacuterito humano tem procurado
desvendaacute-la (ergruumlden) em vatildeo haacute mais de 2000 anos enquanto por outro lado
teve ecircxito ao menos aproximado a anaacutelise de formas muito mais complicadas e
replenas de conteuacutedo Por quecirc Porque o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de
estudar do que a ceacutelula do corpo Aleacutem disso na anaacutelise das formas econocircmicas
natildeo podem servir nem o microscoacutepio nem reagentes quiacutemicos A forccedila da
abstraccedilatildeo deve substituir a ambos Para o leigo a anaacutelise parece se perder
em pedantismo Trata-se efetivamente de pedantismo mas daquele de que se
ocupa a anatomia microscoacutepica
De acordo com Chasin eacute necessaacuterio reter os seguintes noacutedulos
significativos da citaccedilatildeo acima
1) todo iniacutecio de uma ciecircncia eacute difiacutecil donde o princiacutepio da ontologia o
princiacutepio da ciecircncia deve ser o mais difiacutecil de todos
2) haacute grande dificuldade na compreensatildeo da forma do valor que eacute um
objeto simples e vazio de conteuacutedo
3) haacute ecircxito maior na anaacutelise de formas mais complicadas e replenas de
conteuacutedo
18
Na mesma citaccedilatildeo Marx enuncia os motivos de tal dificuldade
1) o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de estudar do que a ceacutelula do
corpo
2) meacutetodos experimentais natildeo satildeo aplicaacuteveis a esse tipo de forma
3) a analiacutetica dessa forma pela forccedila da abstraccedilatildeo deve tomar o lugar
da observaccedilatildeo empiacuterica e experimental
4) anaacutelise voltada agrave anatomia microscoacutepica da forma estudada
A partir dessas indicaccedilotildees colhidas no texto de Marx Chasin elabora
um esboccedilo para fins unicamente didaacuteticos em que busca transpassaacute-las para a
proacutepria questatildeo ontoloacutegica afirmando o que se segue
1) o iniacutecio difiacutecil da ontologia perdurou tambeacutem por mais de 2000
anos trajetoacuteria em que se observa tateios imprecisos caracterizados por um
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo ateacute chegar em Marx Tal
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo revela por seu rumo
imanentemente contraditoacuterio por seus caminhos e descaminhos histoacutericos a
dificuldade e a longa incapacidade na formulaccedilatildeo precisa de seu objeto e
alcance ou seja de sua natureza e propoacutesito - de sua funccedilatildeo orientadora e
sustentadora no plano teoacuterico e de sua origem praacutetica preacute-teoreacutetica
2) reconhecimento ontopraacutetico das formas dos seres e analiacutetica da
forma do ser apenas por meio da forccedila da abstraccedilatildeo no reconhecimento
ontopraacutetico os seres satildeo reconhecidos como substantivos e nesse caso ateacute
certo ponto vale para a observaccedilatildeo espontacircnea e observaccedilatildeo comum pois o
desvendamento completo exige forccedila de abstraccedilatildeo como verbo ( o ato de ser
de Gilson) soacute a forccedila da abstraccedilatildeo daiacute a facilidade para se cair no
abstrativismo
19
Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
20
De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
22
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
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relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
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2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
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realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
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estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
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tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
36
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
Em outras palavras sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico torna-se
aleatoacuteria a localizaccedilatildeo que se confere tanto ao ontoloacutegico quanto ao epistecircmico
A opccedilatildeo por um deles se torna uma arbitrariedade teoacuterica e eacute justamente isto
que gera a querela da fundamentaccedilatildeo pois a decisatildeo fica submersa ao plano
teoacuterico ao jogo dos argumentos agrave ambivalecircncia do logos que eacute irresolutivo
Sem a consideraccedilatildeo do ontopraacutetico parte-se assim de imediato da
teoria e natildeo do ser que faz da teoria ou deste como uma abstraccedilatildeo da
inteligibilidade ou seja de uma faculdade abstraiacuteda do ser que a possui
gerando com isso um absurdo ontoloacutegico
Eacute portanto a partir da analiacutetica do ontopraacutetico pelo reconhecimento de
seus traccedilos categoriais que tem iniacutecio a elaboraccedilatildeo ontoloacutegica Ou seja a
ontologia nasce como reflexatildeo conscientizaccedilatildeo conceituaccedilatildeo do ontopraacutetico
enquanto primeiro objeto da ontologia que a partir daiacute se encaminha em
direccedilatildeo agrave criacutetica - em termos de sua necessidade e loacutegica especiacutefica - do proacuteprio
ontopraacutetico isto eacute do complexo dos objetos reais aiacute incluiacutedo o homem
Resta ainda em relaccedilatildeo agrave problemaacutetica geral em tela aflorar a questatildeo
da adequatio tal como era tematizada tambeacutem em seus cursos
Polemizando com a denominaccedilatildeo de realismo comumente utilizada
para denominar proposituras que conferem prioridade ao mundo objetual
Chasin afirmava que haacute realismo - antigo - quando eacute suposto que a ordem da
razatildeo agrave idecircntica a ordem do real e que a partir de axiomas por meios racionais-
dedutivos embuiacutedos do espiacuterito de sistema se possa estabelecer a verdade do
mundo
Em Marx entretanto a ordem das coisas e da razatildeo satildeo distintas (um
exemplo expressivo desta postura marxiana pode ser encontrada na famosa
Introduccedilatildeo de 57) ambas mutaacuteveis e processuais - unidade da desidentidade
entre ser e saber Assim o mundo natildeo pode ser deduzido racionalmente mas
reproduzido sob forma de ideacuteia por meio de aproximaccedilotildees - empiacuterico abstrato
16
concreto - num processo intensivo e extensivo historicamente condicionado
possibilitado ou impedido - na dependecircncia que fica da maturaccedilatildeo do objeto e
do posicionamento do sujeito O processo mimeacutetico eacute portanto reproduccedilatildeo
conceitual de efetividades donde se lida com duas ordens de formaccedilotildees real e
ideal A reproduccedilatildeo conceitual apresenta portanto sua proacutepria loacutegica mas no
interior da determinaccedilatildeo soacutecio-histoacuterica do pensamento de modo que uma
teoria do conhecimento (morfologia e dinacircmica da subjetividade in abstratu e
imutaacutevel) eacute incapaz de explicar o processo cognitivo pois a faculdade humana
da forccedila da abstraccedilatildeo depende das possibilidades oferecidas pela
determinaccedilatildeo social do pensamento que por sua vez se manifesta e se
configura pelo desenvolvimento dos objetos e da praacutetica humana que sobre eles
tem incidecircncia
Donde a franca afirmaccedilatildeo marxiana da possibilidade de conhecer natildeo
se confunde com a simplicidade e facilidade da concepccedilatildeo realista nem mesmo
no plano da ingenuidade cotidiana desde logo porque a atividade cotidiana -
que estaacute para aleacutem da ingenuidade ou lanccedila os sujeitos para aleacutem da
ingenuidade - eacute em si um complexo rico e desafiador matrizador inclusive da
intentio recta atitude natural e necessaacuteria da esfera ontopraacutetica
Haacute portanto que distinguir as grandes diferenccedilas ontoloacutegicas entre o
estatuto marxiano e a ontologia realista Na primeira a adequatio digamos
assim eacute correlaccedilatildeo entre formaccedilatildeo real e formaccedilatildeo ideal duas ordens distintas
de configuraccedilatildeo Em outras palavras eacute correlaccedilatildeo conceitual entre entificaccedilatildeo
concreta e reproduccedilatildeo conceitual Em suma a reproduccedilatildeo conceitual nada mais
eacute do que transposiccedilatildeo agrave cabeccedila ordenada pelos nexos do real na forma e pelos
meios da proacutepria atividade mental
I - Tomando Marx por Base e por Ponto de Chegada
17
Considerando como ponto de referecircncia as consideraccedilotildees
desenvolvidas por Marx em O Capital especificamente sobre a dificuldade
encontrada pela humanidade na compreensatildeo do valor ao longo de dois
milecircnios - de Aristoacuteteles a Ricardo - pode-se sustentar segundo Chasin que
um fenocircmeno muito similar a este se produziu no que tange agrave determinaccedilatildeo do
ser ou seja da(s) matriz(es) da(s) realidade(s) ou seja da efetividade
Tomemos as passagens em questatildeo que se encontram no Prefaacutecio agrave
Primeira Ediccedilatildeo de O Capital Todo comeccedilo eacute difiacutecil isso vale para qualquer
ciecircncia A forma do valor cuja figura acabada eacute a forma do dinheiro eacute muito
simples e vazia de conteuacutedo Mesmo assim o espiacuterito humano tem procurado
desvendaacute-la (ergruumlden) em vatildeo haacute mais de 2000 anos enquanto por outro lado
teve ecircxito ao menos aproximado a anaacutelise de formas muito mais complicadas e
replenas de conteuacutedo Por quecirc Porque o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de
estudar do que a ceacutelula do corpo Aleacutem disso na anaacutelise das formas econocircmicas
natildeo podem servir nem o microscoacutepio nem reagentes quiacutemicos A forccedila da
abstraccedilatildeo deve substituir a ambos Para o leigo a anaacutelise parece se perder
em pedantismo Trata-se efetivamente de pedantismo mas daquele de que se
ocupa a anatomia microscoacutepica
De acordo com Chasin eacute necessaacuterio reter os seguintes noacutedulos
significativos da citaccedilatildeo acima
1) todo iniacutecio de uma ciecircncia eacute difiacutecil donde o princiacutepio da ontologia o
princiacutepio da ciecircncia deve ser o mais difiacutecil de todos
2) haacute grande dificuldade na compreensatildeo da forma do valor que eacute um
objeto simples e vazio de conteuacutedo
3) haacute ecircxito maior na anaacutelise de formas mais complicadas e replenas de
conteuacutedo
18
Na mesma citaccedilatildeo Marx enuncia os motivos de tal dificuldade
1) o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de estudar do que a ceacutelula do
corpo
2) meacutetodos experimentais natildeo satildeo aplicaacuteveis a esse tipo de forma
3) a analiacutetica dessa forma pela forccedila da abstraccedilatildeo deve tomar o lugar
da observaccedilatildeo empiacuterica e experimental
4) anaacutelise voltada agrave anatomia microscoacutepica da forma estudada
A partir dessas indicaccedilotildees colhidas no texto de Marx Chasin elabora
um esboccedilo para fins unicamente didaacuteticos em que busca transpassaacute-las para a
proacutepria questatildeo ontoloacutegica afirmando o que se segue
1) o iniacutecio difiacutecil da ontologia perdurou tambeacutem por mais de 2000
anos trajetoacuteria em que se observa tateios imprecisos caracterizados por um
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo ateacute chegar em Marx Tal
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo revela por seu rumo
imanentemente contraditoacuterio por seus caminhos e descaminhos histoacutericos a
dificuldade e a longa incapacidade na formulaccedilatildeo precisa de seu objeto e
alcance ou seja de sua natureza e propoacutesito - de sua funccedilatildeo orientadora e
sustentadora no plano teoacuterico e de sua origem praacutetica preacute-teoreacutetica
2) reconhecimento ontopraacutetico das formas dos seres e analiacutetica da
forma do ser apenas por meio da forccedila da abstraccedilatildeo no reconhecimento
ontopraacutetico os seres satildeo reconhecidos como substantivos e nesse caso ateacute
certo ponto vale para a observaccedilatildeo espontacircnea e observaccedilatildeo comum pois o
desvendamento completo exige forccedila de abstraccedilatildeo como verbo ( o ato de ser
de Gilson) soacute a forccedila da abstraccedilatildeo daiacute a facilidade para se cair no
abstrativismo
19
Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
20
De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
22
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
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realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
35
tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
36
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
37
que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
38
6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
concreto - num processo intensivo e extensivo historicamente condicionado
possibilitado ou impedido - na dependecircncia que fica da maturaccedilatildeo do objeto e
do posicionamento do sujeito O processo mimeacutetico eacute portanto reproduccedilatildeo
conceitual de efetividades donde se lida com duas ordens de formaccedilotildees real e
ideal A reproduccedilatildeo conceitual apresenta portanto sua proacutepria loacutegica mas no
interior da determinaccedilatildeo soacutecio-histoacuterica do pensamento de modo que uma
teoria do conhecimento (morfologia e dinacircmica da subjetividade in abstratu e
imutaacutevel) eacute incapaz de explicar o processo cognitivo pois a faculdade humana
da forccedila da abstraccedilatildeo depende das possibilidades oferecidas pela
determinaccedilatildeo social do pensamento que por sua vez se manifesta e se
configura pelo desenvolvimento dos objetos e da praacutetica humana que sobre eles
tem incidecircncia
Donde a franca afirmaccedilatildeo marxiana da possibilidade de conhecer natildeo
se confunde com a simplicidade e facilidade da concepccedilatildeo realista nem mesmo
no plano da ingenuidade cotidiana desde logo porque a atividade cotidiana -
que estaacute para aleacutem da ingenuidade ou lanccedila os sujeitos para aleacutem da
ingenuidade - eacute em si um complexo rico e desafiador matrizador inclusive da
intentio recta atitude natural e necessaacuteria da esfera ontopraacutetica
Haacute portanto que distinguir as grandes diferenccedilas ontoloacutegicas entre o
estatuto marxiano e a ontologia realista Na primeira a adequatio digamos
assim eacute correlaccedilatildeo entre formaccedilatildeo real e formaccedilatildeo ideal duas ordens distintas
de configuraccedilatildeo Em outras palavras eacute correlaccedilatildeo conceitual entre entificaccedilatildeo
concreta e reproduccedilatildeo conceitual Em suma a reproduccedilatildeo conceitual nada mais
eacute do que transposiccedilatildeo agrave cabeccedila ordenada pelos nexos do real na forma e pelos
meios da proacutepria atividade mental
I - Tomando Marx por Base e por Ponto de Chegada
17
Considerando como ponto de referecircncia as consideraccedilotildees
desenvolvidas por Marx em O Capital especificamente sobre a dificuldade
encontrada pela humanidade na compreensatildeo do valor ao longo de dois
milecircnios - de Aristoacuteteles a Ricardo - pode-se sustentar segundo Chasin que
um fenocircmeno muito similar a este se produziu no que tange agrave determinaccedilatildeo do
ser ou seja da(s) matriz(es) da(s) realidade(s) ou seja da efetividade
Tomemos as passagens em questatildeo que se encontram no Prefaacutecio agrave
Primeira Ediccedilatildeo de O Capital Todo comeccedilo eacute difiacutecil isso vale para qualquer
ciecircncia A forma do valor cuja figura acabada eacute a forma do dinheiro eacute muito
simples e vazia de conteuacutedo Mesmo assim o espiacuterito humano tem procurado
desvendaacute-la (ergruumlden) em vatildeo haacute mais de 2000 anos enquanto por outro lado
teve ecircxito ao menos aproximado a anaacutelise de formas muito mais complicadas e
replenas de conteuacutedo Por quecirc Porque o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de
estudar do que a ceacutelula do corpo Aleacutem disso na anaacutelise das formas econocircmicas
natildeo podem servir nem o microscoacutepio nem reagentes quiacutemicos A forccedila da
abstraccedilatildeo deve substituir a ambos Para o leigo a anaacutelise parece se perder
em pedantismo Trata-se efetivamente de pedantismo mas daquele de que se
ocupa a anatomia microscoacutepica
De acordo com Chasin eacute necessaacuterio reter os seguintes noacutedulos
significativos da citaccedilatildeo acima
1) todo iniacutecio de uma ciecircncia eacute difiacutecil donde o princiacutepio da ontologia o
princiacutepio da ciecircncia deve ser o mais difiacutecil de todos
2) haacute grande dificuldade na compreensatildeo da forma do valor que eacute um
objeto simples e vazio de conteuacutedo
3) haacute ecircxito maior na anaacutelise de formas mais complicadas e replenas de
conteuacutedo
18
Na mesma citaccedilatildeo Marx enuncia os motivos de tal dificuldade
1) o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de estudar do que a ceacutelula do
corpo
2) meacutetodos experimentais natildeo satildeo aplicaacuteveis a esse tipo de forma
3) a analiacutetica dessa forma pela forccedila da abstraccedilatildeo deve tomar o lugar
da observaccedilatildeo empiacuterica e experimental
4) anaacutelise voltada agrave anatomia microscoacutepica da forma estudada
A partir dessas indicaccedilotildees colhidas no texto de Marx Chasin elabora
um esboccedilo para fins unicamente didaacuteticos em que busca transpassaacute-las para a
proacutepria questatildeo ontoloacutegica afirmando o que se segue
1) o iniacutecio difiacutecil da ontologia perdurou tambeacutem por mais de 2000
anos trajetoacuteria em que se observa tateios imprecisos caracterizados por um
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo ateacute chegar em Marx Tal
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo revela por seu rumo
imanentemente contraditoacuterio por seus caminhos e descaminhos histoacutericos a
dificuldade e a longa incapacidade na formulaccedilatildeo precisa de seu objeto e
alcance ou seja de sua natureza e propoacutesito - de sua funccedilatildeo orientadora e
sustentadora no plano teoacuterico e de sua origem praacutetica preacute-teoreacutetica
2) reconhecimento ontopraacutetico das formas dos seres e analiacutetica da
forma do ser apenas por meio da forccedila da abstraccedilatildeo no reconhecimento
ontopraacutetico os seres satildeo reconhecidos como substantivos e nesse caso ateacute
certo ponto vale para a observaccedilatildeo espontacircnea e observaccedilatildeo comum pois o
desvendamento completo exige forccedila de abstraccedilatildeo como verbo ( o ato de ser
de Gilson) soacute a forccedila da abstraccedilatildeo daiacute a facilidade para se cair no
abstrativismo
19
Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
20
De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
22
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
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realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
35
tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
36
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
37
que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
38
6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
Considerando como ponto de referecircncia as consideraccedilotildees
desenvolvidas por Marx em O Capital especificamente sobre a dificuldade
encontrada pela humanidade na compreensatildeo do valor ao longo de dois
milecircnios - de Aristoacuteteles a Ricardo - pode-se sustentar segundo Chasin que
um fenocircmeno muito similar a este se produziu no que tange agrave determinaccedilatildeo do
ser ou seja da(s) matriz(es) da(s) realidade(s) ou seja da efetividade
Tomemos as passagens em questatildeo que se encontram no Prefaacutecio agrave
Primeira Ediccedilatildeo de O Capital Todo comeccedilo eacute difiacutecil isso vale para qualquer
ciecircncia A forma do valor cuja figura acabada eacute a forma do dinheiro eacute muito
simples e vazia de conteuacutedo Mesmo assim o espiacuterito humano tem procurado
desvendaacute-la (ergruumlden) em vatildeo haacute mais de 2000 anos enquanto por outro lado
teve ecircxito ao menos aproximado a anaacutelise de formas muito mais complicadas e
replenas de conteuacutedo Por quecirc Porque o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de
estudar do que a ceacutelula do corpo Aleacutem disso na anaacutelise das formas econocircmicas
natildeo podem servir nem o microscoacutepio nem reagentes quiacutemicos A forccedila da
abstraccedilatildeo deve substituir a ambos Para o leigo a anaacutelise parece se perder
em pedantismo Trata-se efetivamente de pedantismo mas daquele de que se
ocupa a anatomia microscoacutepica
De acordo com Chasin eacute necessaacuterio reter os seguintes noacutedulos
significativos da citaccedilatildeo acima
1) todo iniacutecio de uma ciecircncia eacute difiacutecil donde o princiacutepio da ontologia o
princiacutepio da ciecircncia deve ser o mais difiacutecil de todos
2) haacute grande dificuldade na compreensatildeo da forma do valor que eacute um
objeto simples e vazio de conteuacutedo
3) haacute ecircxito maior na anaacutelise de formas mais complicadas e replenas de
conteuacutedo
18
Na mesma citaccedilatildeo Marx enuncia os motivos de tal dificuldade
1) o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de estudar do que a ceacutelula do
corpo
2) meacutetodos experimentais natildeo satildeo aplicaacuteveis a esse tipo de forma
3) a analiacutetica dessa forma pela forccedila da abstraccedilatildeo deve tomar o lugar
da observaccedilatildeo empiacuterica e experimental
4) anaacutelise voltada agrave anatomia microscoacutepica da forma estudada
A partir dessas indicaccedilotildees colhidas no texto de Marx Chasin elabora
um esboccedilo para fins unicamente didaacuteticos em que busca transpassaacute-las para a
proacutepria questatildeo ontoloacutegica afirmando o que se segue
1) o iniacutecio difiacutecil da ontologia perdurou tambeacutem por mais de 2000
anos trajetoacuteria em que se observa tateios imprecisos caracterizados por um
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo ateacute chegar em Marx Tal
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo revela por seu rumo
imanentemente contraditoacuterio por seus caminhos e descaminhos histoacutericos a
dificuldade e a longa incapacidade na formulaccedilatildeo precisa de seu objeto e
alcance ou seja de sua natureza e propoacutesito - de sua funccedilatildeo orientadora e
sustentadora no plano teoacuterico e de sua origem praacutetica preacute-teoreacutetica
2) reconhecimento ontopraacutetico das formas dos seres e analiacutetica da
forma do ser apenas por meio da forccedila da abstraccedilatildeo no reconhecimento
ontopraacutetico os seres satildeo reconhecidos como substantivos e nesse caso ateacute
certo ponto vale para a observaccedilatildeo espontacircnea e observaccedilatildeo comum pois o
desvendamento completo exige forccedila de abstraccedilatildeo como verbo ( o ato de ser
de Gilson) soacute a forccedila da abstraccedilatildeo daiacute a facilidade para se cair no
abstrativismo
19
Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
20
De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
22
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
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realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
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estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
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tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
36
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
Na mesma citaccedilatildeo Marx enuncia os motivos de tal dificuldade
1) o corpo desenvolvido eacute mais faacutecil de estudar do que a ceacutelula do
corpo
2) meacutetodos experimentais natildeo satildeo aplicaacuteveis a esse tipo de forma
3) a analiacutetica dessa forma pela forccedila da abstraccedilatildeo deve tomar o lugar
da observaccedilatildeo empiacuterica e experimental
4) anaacutelise voltada agrave anatomia microscoacutepica da forma estudada
A partir dessas indicaccedilotildees colhidas no texto de Marx Chasin elabora
um esboccedilo para fins unicamente didaacuteticos em que busca transpassaacute-las para a
proacutepria questatildeo ontoloacutegica afirmando o que se segue
1) o iniacutecio difiacutecil da ontologia perdurou tambeacutem por mais de 2000
anos trajetoacuteria em que se observa tateios imprecisos caracterizados por um
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo ateacute chegar em Marx Tal
movimento simultacircneo de constituiccedilatildeodissoluccedilatildeo revela por seu rumo
imanentemente contraditoacuterio por seus caminhos e descaminhos histoacutericos a
dificuldade e a longa incapacidade na formulaccedilatildeo precisa de seu objeto e
alcance ou seja de sua natureza e propoacutesito - de sua funccedilatildeo orientadora e
sustentadora no plano teoacuterico e de sua origem praacutetica preacute-teoreacutetica
2) reconhecimento ontopraacutetico das formas dos seres e analiacutetica da
forma do ser apenas por meio da forccedila da abstraccedilatildeo no reconhecimento
ontopraacutetico os seres satildeo reconhecidos como substantivos e nesse caso ateacute
certo ponto vale para a observaccedilatildeo espontacircnea e observaccedilatildeo comum pois o
desvendamento completo exige forccedila de abstraccedilatildeo como verbo ( o ato de ser
de Gilson) soacute a forccedila da abstraccedilatildeo daiacute a facilidade para se cair no
abstrativismo
19
Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
20
De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
22
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
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relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
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2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
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realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
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tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
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2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
Eacute nesse preciso momento da exposiccedilatildeo chasiniana que surgem as
primeiras referecircncias a Eacute Gilson assim como a N Hartmann momentos mais agrave
frente Evidentemente que esse procedimento natildeo ocorre por acaso pois o que
estaacute em questatildeo agora satildeo as tentativas contemporacircneas de resgate da
tematizaccedilatildeo ontoloacutegica
Eacute Gilson afirma que o mais fundamental dos problemas da filosofia - a
relaccedilatildeo entre essecircncia e existecircncia que por seu turno diz respeito agrave distinccedilatildeo
de ser como nome isto eacute como substantivo em latim ens (ente) e como verbo
esse Eacute sabido que o esse tomista eacute concebido como ato de ser - actus essendi -
significando portanto existecircncia ato de existir ato de ser
Chasin comenta a ambiguumlidade da noccedilatildeo de ser para qual Gilson
chama atenccedilatildeo afirmando o que se segue
1) Ens eacute um nome que significa um ser (determinado) ou seja a
natureza e a essecircncia de qualquer existente ou entatildeo - o ser mesmo - uma
propriedade comum a tudo aquilo que se pode dizer que eacute (que pertence a)
Em suma enquanto nome ou substantivo ser designa um existente
qualquer ou uma propriedade comum a todos os existentes designa o que
verdadeiramente eacute ou uma propriedade geral eacute um ente ou uma entidade
2) Enquanto verbo ser designa a accedilatildeo ou o ato de ser exercido pelo
ente Assim como verbo natildeo significa que algo eacute nem a existecircncia em geral
mas o ato mesmo pelo qual qualquer realidade dada eacute de fato ou existe
Precisamente a este ato Gilson chama de ser em contraposiccedilatildeo a ente
De todo modo feita a distinccedilatildeo Chasin considera existir um seacuterio
problema ao tomar em separado ens e esse indagando eacute possiacutevel pensar em
duas figuras no isolamento Seraacute que essa configuraccedilatildeo eacute de fato o mais
fundamental dos problemas ou eacute o mais antigo o mais remoto e o mais cultuado
dos equiacutevocos da histoacuteria da filosofia
20
De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
22
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
30
realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
35
tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
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2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
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7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
De um lado a compreensatildeo da forma de ser enquanto verbo como
pura significaccedilatildeo verbal de existir de estar presente enquanto significaccedilatildeo de
ato ou presenccedila o verbo eacute forma simples e vazia de conteuacutedo pois reduzida ao
predicado mais geral e comum das coisas denota apenas sua existecircncia De
outro lado ocorre o mesmo problema com o substantivo ser - ens - pois redunda
em essecircncia imutaacutevel Em outras palavras na histoacuteria da filosofia nesses dois
caminhos houve de longa data polecircmica sobre o que existe em que plano se daacute
a existecircncia e assim por diante No caso do ser como verbo o ser eacute muito
parcamente categorial reduzido agrave presenccedila no tempo e no espaccedilo soacute possui o
predicado abstrato da existecircncia no caso do substantivo tomado sem o ato de
existir se converte em complexo de propriedades ou entidades perenes
A resoluccedilatildeo para tal questatildeo reside segundo Chasin em tomar o ser
enquanto complexo categorial daquilo que eacute como ente que existe Nesse
sentido o desvendamento tem ecircxito maior como mostra a ciecircncia que toma
para anaacutelise formas mais complicadas e replenas de conteuacutedo vale dizer uma
vez que tem por alvo o ser por sua efetividade e determinado por suas
qualidades natildeo apenas pelo reconhecimento de sua presenccedila mas pelo seu
complexo categorial
Ora arremata Chasin a forma sensiacutevel do ente compreende o ens e o
esse ou seja a plena riqueza do complexo categorial
- Loacutegica e Ciecircncia
Neste item Chasin defende a tese de que na medida em que
pretendeu e pretenda ser uma disciplina ou ciecircncia de chegada isto eacute
21
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
22
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
30
realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
35
tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
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2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
38
6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
conclusiva autocircnoma e sistemaacutetica a ontologia acaba por ser transmutada em
loacutegica ou ciecircncia
Talvez possa ser dito que nas ontologias onde predomine
unilateralmente o ser como verbo ou o ente como essecircncia terminem por ser
uma loacutegica que de alguma forma acaba por ter a pretensatildeo de constituir o ser
a loacutegica eacute entatildeo o segredo uacuteltimo do ser ou sua base cognitiva e por essa via
sua base ontoloacutegica - que assim nega a ontologia ou seja o reconhecimento do
ser por si
De outra parte predominando o ser como substantivo o fim da
ontologia acaba por ser uma forma de ciecircncia ou seja a ontologia eacute novamente
negada como ocorreu com a ciecircncia moderna donde sua pretendida auto-
suficiecircncia que apenas admite por fundamento uma forma qualquer de
gnosiologia isto eacute uma forma a priori da operatividade subjetiva
desaparecendo assim a regecircncia do objeto o que ao contraacuterio caracteriza o
espiacuterito e o propoacutesito ontoloacutegicos ou seja o reconhecimento do ente enquanto
ente o oacuten qua oacuten ou ser por si
Em suma a ontologia quando centrada no ser como verbo rarefeita
pelo vazio de sua forma termina por ser loacutegica por outro lado quando centrada
no ser como substantivo agraves voltas com gecircneros formados por complexos
qualitativos termina por se constituir em ciecircncia particular e autocircnoma Assim
ao pretender ser tudo concludente sistemaacutetica e independente por sua forma
mais vazia ou por suas categorias abstratas e perenes a ontologia acaba por
ser negada pela loacutegica ou pela ciecircncia Pretendendo ser tudo acaba por
desaparecer
Ora ao tomar o ser como verbo a ontologia tem de compreender que
natildeo pode ser mais do que a anatomia de uma propriedade do ser - de sua
propriedade mais geral e vazia - a propriedade de sua presenccedila enquanto corpo
real ausente ou presenccedila de um complexo categorial abstraiacutedo O ser aqui eacute
22
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
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2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
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realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
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tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
36
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
37
que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
38
6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
reduzido agrave forma mais vazia a simples propriedade de um todo que escapa
completamente agrave sua jurisdiccedilatildeo Donde seu desenlace em loacutegica
De outra parte quando o ser eacute tomado em sua denotaccedilatildeo substantiva
ou seja na multiplicidade de suas propriedades qualitativas em interconexatildeo
especiacutefica transborda em ciecircncia na medida em que a ontologia pretenda a
condiccedilatildeo de disciplina ou ciecircncia sistemaacutetica
Donde a impossibilidade de a ontologia ficar adstrita agrave forma do verbo
nem se realizar como dilucidaccedilatildeo concreta do substantivo Assim deve-se
reconhecer que a ontologia natildeo pode se realizar em nenhum desses dois poacutelos
nem simples tematizaccedilatildeo do ato geneacuterico da presenccedila - que redundaria em
simples compoacutesito tautoloacutegico nem tematizaccedilatildeo do ser substantivo concreto
pois aiacute se desnaturaria em ciecircncia especiacutefica
Conclusivamente a ontologia nem eacute simples tautologia do ser em ato
nem efetivaccedilatildeo cientiacutefico-concreta do desvendamento do ser como substantivo
Enquanto tal a ontologia eacute uma realizaccedilatildeo necessaacuteria no espaccedilo que antecede
aqueles dois poacutelos em verdade a plataforma que leva da constataccedilatildeo mais
abstrata do ser (tanto como substantivo quanto verbo) agrave sua reproduccedilatildeo
cientiacutefica como substantivo Enquanto tal eacute um estatuto - uma filosofia primeira
o cacircnon da legalidade do ser matrizado pelos traccedilos ou vetores categoriais
fundamentais do ser por si que matriza a cientificidade tanto em sua forma mais
abstrata - loacutegica - quanto em sua forma mais concreta - ciecircncia
O problema fundamental da filosofia primeira - philosophia prima - eacute o
problema das categorias mais gerais do ser aiacute incluso o ato de ser donde em
sua plenitude o ato sensiacutevel de ser - ens e esse o ens essendi complexo
categorial pleno no ato de existir
Essa plataforma estatutaacuteria natildeo eacute uma disciplina situada entre outras
disciplinas entre a loacutegica e a ciecircncia como um campo intermediaacuterio entre o
verbo e o substantivo entre a maacutexima abstratividade e a efetividade concreta
23
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
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realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
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estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
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tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
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2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
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7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
Essa distribuiccedilatildeo topograacutefica confere agrave abstraccedilatildeo a condiccedilatildeo de fundaccedilatildeo
(determinaccedilatildeo originaacuteriaontoloacutegica) e fundamento (ponto de partida
epistemoloacutegico) Se assim fosse perderia a condiccedilatildeo de filosofia primeira
Enquanto filosofia primeira eacute o reconhecimento do substantivo verbal
do substantivo que eacute do ens essendi natildeo de uma substantividade qualquer em
abstrato mas da substantividade que existe por todas as modalidades
categoriais isto eacute reais (sensiacuteveis) natildeo apenas um substantivo pensado que
dependeria para ser do pensamento mas do substantivo que eacute por-si
independentemente se ser pensado o que requer o complexo categorial
da sensibilidade por isso eacute que soacute eacute ser o ser sensiacutevel Vale dizer o ser como
verbo eacute resultado do ser substantivo soacute um sujeito (em suas diversas formas na
cadeia do ser) eacute (soacute um sujeito existe eacute faz sente pensa etc de acordo com
seu grau na cadeia do ser)
A ontologia do puro verbo ser ou das puras essecircncias (complexo
categorial abstrativante e eterno) eacute a autonomizaccedilatildeo das categorias ou da
existecircncia em relaccedilatildeo ao ser e existir reais agraves formas reais de ser e existir satildeo
as categorias e a existecircncia sem corpo ou sujeito mais do que isso satildeo as
categorias (essecircncia) e existecircncia em geral universal e abstrata tornadas
sujeito a essecircncia ou a existecircncia abstratas personificadas - e isso satildeo
puramente figuras do pensamento o que jaacute eacute especulaccedilatildeo natildeo ontologia
Marx agrave semelhanccedila de Feuerbach soacute admite como ente ou melhor
como entificaccedilatildeo o ens essendi - o ente sendo o ente no ato de ser o ente
revestido de existecircncia atual - objetivo o ente no exerciacutecio da accedilatildeo ou ato de
ser eacute portanto um ente existente ou seja o ente que estaacute sendo o ente no ato
de existir
Donde do mesmo modo que em Feuerbach o ser eacute inseparaacutevel de sua
existecircncia Ser e existir constituem uma unidade indissoluacutevel complexo
24
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
30
realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
35
tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
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2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
38
6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
categorial no ato de ser pela atualizaccedilatildeo do complexo categorial essecircncia
determinada e mutaacutevel na mutabilidade de ser e ir sendo (essendi)
Eacute chegada a hora depois desta etapa analiacutetica de vislumbrar qual eacute o
cenaacuterio em Marx que esse conjunto de questotildees se coloca Com esse objetivo e
como eacute tiacutepico de seu procedimento investigativo junto aos textos daquele autor
Chasin toma para anaacutelise o item 1 O Processo de Trabalho do capiacutetulo V de O
Capital Nele pode-se identificar em primeiro lugar a natureza geral (universal)
da atualizaccedilatildeo da forccedila de trabalho que se encontra em potecircncia nos indiviacuteduos
A produccedilatildeo de valores de uso ou bens natildeo muda sua natureza geral por se
realizar para o capitalista e sob seu controle Por isso o processo de trabalho
deve ser considerado de iniacutecio independentemente de qualquer forma social
determinada[x]
Por que o processo de trabalho deve ser considerado de iniacutecio
independentemente de qualquer forma social determinada indaga Chasin A
resposta eacute formulada em estilo direto Para natildeo ser perdida a natureza do
trabalho sua positividade enquanto atividade humana vital
Tem-se nessa passagem segundo Chasin um exemplo do exerciacutecio
de uma ontologia estatutaacuteria - a positividade (sua efetividade ou operosidade)
universal do trabalho enquanto atributo vital e inalienaacutevel do homem
independentemente de suas formas concretas que se apresentam na forma do
trabalho alienado
Eacute a determinaccedilatildeo universal do trabalho o traccedilo de sua legalidade
uacuteltima sua determinaccedilatildeo mais geral e essencial dimensatildeo que natildeo desaparece
nem mesmo sob suas formas concretas mais negativas
A ontologia estatutaacuteria registra o traccedilo ou rastro dessa dimensatildeo
permanente que atravessa as formas concretas em sua efetividade contraditoacuteria
e especialmente desfavoraacutevel para o homem enquanto maioria subjugada ao
longo de toda a preacute-histoacuteria da humanidade
25
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
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realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
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estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
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tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
36
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
Permanente mas permanente processual mutaacutevel diversamente
positivo quantitativa e qualitativamente em cada uma das formas concretas em
que o trabalho aparece nas configuraccedilotildees sociais determinadas
Nesse sentido abstratamente permanente abstratamente positivo mas
onde essa abstratividade natildeo corresponde a uma simples determinaccedilatildeo
conceitual Corresponde a uma efetividade em sua figura proacutepria em cada forma
social determinada
Agrave ontologia estatutaacuteria compete o reconhecimento dessa dimensatildeo mais
geral base para a decifraccedilatildeo cientiacutefica concreta dos casos efetivos que por sua
vez confirmam ou natildeo criticamente a determinaccedilatildeo mais geral ontoloacutegica Natildeo
haacute portanto um abismo separando ontologia de ciecircncia mas a continuidade de
momentos distintos de uma mesma unidade de conhecimento que interagem e
se medem reciprocamente se apoacuteiam estimulam e criticam um infinito processo
constitutivo das certezas
Continuando a anaacutelise do texto marxiano tem-se a descriccedilatildeo do
trabalho e o reconhecimento analiacutetico de sua natureza Antes de tudo [aqui
Chasin faz uma pequena observaccedilatildeo assinalando ou seja na raiz em seu
fundamento diria uma linguagem mais convencional e ciosa de suas
pretendidas atribuiccedilotildees] o trabalho eacute um processo entre o homem e a
natureza um processo em que o homem por sua proacutepria accedilatildeo medeia regula
controla seu metabolismo com a natureza Ele mesmo se defronta com a
mateacuteria natural Ele potildee em movimento as forccedilas naturais pertencentes agrave sua
corporalidade braccedilos e pernas cabeccedila e matildeo a fim de se apropriar da mateacuteria
natural numa forma uacutetil para a sua proacutepria vida Ao atuar por meio desse
movimento sobre a natureza externa a ele e ao modificaacute-la ele modifica ao
mesmo tempo sua proacutepria natureza Ele desenvolve as potecircncias nela
adormecidas e sujeita o jogo de suas forccedilas a seu proacuteprio domiacutenio[xi]
26
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
30
realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
35
tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
36
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
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7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
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mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
Observe-se que diz Chasin ao trabalhar ao mudar a forma da
natureza ao construir sua proacutepria mundaneidade o homem ele proacuteprio por
meio de seu proacuteprio trabalho transforma a sua proacutepria natureza Ou seja de ser
natural para social eis um novo exemplo de lineamento reconhecido e recolhido
agrave ontologia estatutaacuteria
Prosseguindo na especificaccedilatildeo Marx afirmaPressupomos o trabalho
numa forma que pertence exclusivamente ao homem Uma aranha executa
operaccedilotildees semelhantes agraves do tecelatildeo e a abelha envergonha mais de um
arquiteto humano com a construccedilatildeo dos favos de suas colmeacuteias Mas o que
distingue de antematildeo o pior arquiteto da melhor abelha eacute que ele construiu o
favo em sua cabeccedila antes de construiacute-lo em cera No fim do processo de
trabalho obteacutem-se um resultado que jaacute no iniacutecio deste existiu na imaginaccedilatildeo do
trabalhador e portanto idealmente Ele natildeo apenas efetua uma transformaccedilatildeo
da forma da mateacuteria natural realiza ao mesmo tempo na mateacuteria natural seu
objetivo que ele sabe que determina como lei a espeacutecie e o modo de sua
atividade e ao qual tem de subordina sua vontade E essa subordinaccedilatildeo natildeo eacute
um ato isolado Aleacutem do esforccedilo dos oacutergatildeos que trabalham eacute exigida a vontade
orientada a um fim que se manifesta como atenccedilatildeo durante todo o tempo de
trabalho e isso tanto mais quanto menos esse trabalho pelo proacuteprio conteuacutedo e
pela espeacutecie modo de sua execuccedilatildeo atrai o trabalhador portanto quanto
menos ele o aproveita como jogo de suas proacuteprias forccedilas fiacutesicas e espirituais[xii]
Chasin chama atenccedilatildeo para as seguintes observaccedilotildees
1) a preacutevia-ideaccedilatildeo do resultado (do fim) a existecircncia ideal do mesmo
na imaginaccedilatildeo donde o objeto ou um complexo categorial in mente e ante
res[xiii]
Preacutevia-ideaccedilatildeo e teleologia satildeo ou podem ser momentos confluentes
mas natildeo satildeo idecircnticos a preacutevia-ideaccedilatildeo estaacute no comeccedilo e eacute um desenho ideal
que implica o conhecimento da espeacutecie e do modo da atividade a realizar
27
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
30
realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
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estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
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tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
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2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
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7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
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mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
conhecimento das malhas causais teleologia eacute simplesmente finalidade fim
objetivo podendo se apresentar de modo meramente volitivo e bem abstrato
natildeo mobilizante dos ou sem os meios de sua realizaccedilatildeo ou seja ter teleologia
sem preacutevia-ideaccedilatildeo natildeo conduz a nenhum processo de trabalho Quero assinar
que o termo teleologia pode ser demasiado vago no sentido de mero conceito
filosoacutefico convencional nesse sentido apenas alusivo e natildeo instrumentador de
operaccedilotildees na esfera da atividade sensiacutevel Pode ser entendido mais como
manifestaccedilatildeo de espiacuterito do que como exigecircncia de efetuaccedilatildeo de mudanccedila de
forma da mateacuteria natural e objetivaccedilatildeo de propoacutesito E de toda forma indica
antes de tudo que o fim o realizado estaacute no fim do processo fala do obtido ou
do a ser obtido nada nos diz da travessia que realiza da travessia que passa do
ideal para o real natildeo nos fala da mobilizaccedilatildeo ideal e material necessaacuterias
Quando a teleologia se manifesta como resultado jaacute natildeo eacute preciso dizer mais
nada a respeito Basta saudar e usufruir de sua apariccedilatildeo que nada tem de
maacutegica ou misteriosa mas antes de reconhececirc-la como produto das
metamorfoses de subjetividade e objetividade Ou seja em suas distintas
naturezas inconfundiacuteveis enquanto tais objetividade e subjetividade satildeo
entificaccedilotildees na mundaneidade humana e nessa qualidade estados ou momentos
do ser social momentos regidos pela atividade ideal e sensiacutevel do mesmo
Penso que Lukaacutecs ao transpor a questatildeo para a linguagem filosoacutefica
tradicional pode ter dissociado demais fins e meios o que natildeo eacute o caso dos
textos de Marx Por isso Lukaacutecs se vecirc obrigado depois a buscar a rearticulaccedilatildeo
entre teleologia e causalidade e nisso encontre natildeo poucas dificuldades (como
uma passa para outra e vice-versa parecendo que lida ao limite com
substacircncias incomunicaacuteveis natildeo as compreendendo em suas metamorfoses) e
deixe que se perca certa substacircncia da questatildeo antes de tudo o interfluxo entre
objetividade e subjetividade com seus distintos momentos preponderantes em
cada um dos passos dos momentos embricados dos processos Creio que as
duas esferas ficam sempre tradicionalmente um tanto estranhas uma em
28
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
30
realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
35
tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
36
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
37
que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
relaccedilatildeo agrave outra seja para preservar a objetividade e aiacute se torna objetivista seja
para ressaltar a subjetividade e aiacute desliza para o subjetivismo
2) No fim do processo tem-se seu resultado que eacute a transformaccedilatildeo da
forma de uma dada mateacuteria natural e a realizaccedilatildeo do objetivo do trabalho que
existiu antes como preconfiguraccedilatildeo ideal Portanto o trabalho transforma
imagem ideal em ente real complexo categorial in rebus
Em suma no pensamento de Marx as categorias ou complexos
categoriais satildeo reconhecidos sob as trecircs formas in mente (existem idealmente
na imaginaccedilatildeo ou como reproduccedilatildeo mental das coisas categorias da
representaccedilatildeo) ante res (preacutevia-ideaccedilatildeo) e in rebus como efetividades quando
estatildeo na forma de ser Como confirmaccedilatildeo tome-se mais esta passagem do
mesmo capiacutetulo No processo de trabalho a atividade do homem efetua
portanto mediante o meio de trabalho uma transformaccedilatildeo do objeto de
trabalho pretendida desde o princiacutepio O processo extingue-se no produto Seu
produto eacute um valor de uso uma mateacuteria natural adaptada agraves necessidades
humanas mediante transformaccedilatildeo da forma O trabalho se uniu com seu objeto
O trabalho estaacute objetivado e o objeto trabalhado O que do lado do trabalhador
aparecia na forma de mobilidade aparece agora como propriedade imoacutevel na
forma do ser[xiv] do lado do produto Ele fiou e o produto eacute um fio[xv]
Como arremate analiacutetico dessa famosa mas muitas vezes mal
compreendida passagem de O Capital Chasin conclui ao mesmo tempo em que
visualiza uma nova tarefa Se assim eacute se as categorias podem aparecer nas
trecircs formas - in rebus - in mente - ante res - haacute entatildeo que determinar o que satildeo
cada uma dessas formas
Esquematicamente Chasin propotildee o seguinte
1) se estatildeo in rebus (nas coisas) estatildeo na forma do ser
29
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
30
realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
35
tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
36
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
37
que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
38
6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
2) se estatildeo in mente (na cabeccedila) estatildeo na forma da reproduccedilatildeo ideal
das coisas Trata-se da subjetividade receptora[xvi] que reproduz as coisas natildeo
captando apenas seus dados empiacutericos superando pois o empirismo e elabora
portanto a reproduccedilatildeo ideal dos entes e onde a subsunccedilatildeo aos objetos eacute a
atividade de sua elaboraccedilatildeo ideal
3) se estatildeo ante res (antes das coisas) estatildeo na forma da finalidade da
preacutevia mentalizaccedilatildeo de objetivos e meios
Poreacutem no segundo e terceiro casos as categorias estatildeo na forma de
espeacutecies de pensamento representaccedilotildees e projeccedilotildees do ser do vir-a-ser dos
meios materiais instrumentais processuais e dinacircmicos de entificaccedilatildeo dos
seres
Concluindo essa parte dizer pois que o homem e o mundo satildeo
atividade sensiacutevel que por criar seu mundo cria a si mesmo eacute determinar o
homem como a criatura criadora de seres
No entanto na medida em que apenas na configuraccedilatildeo histoacuterica regida
pela loacutegica do capital ou seja na plenitude da produccedilatildeo da riqueza entendida
por sua essecircncia subjetiva que eacute o trabalho que se atinou para determinaccedilatildeo
do homem como a criatura criadora de seres foi possiacutevel agrave reflexatildeo pode se
dar conta potencialmente da verdadeira problemaacutetica do ser
Em outras palavras eacute pela criacutetica ao criador de criaturas na forma da
alienaccedilatildeo - criacutetica marxiana agrave sociedade capitalista - eacute que a ontologia pode
atinar com seu verdadeiro objeto e modo de determinaccedilatildeo Natildeo eacute casual que
tenha emergido pela criacutetica feuerbachiana ao sistema hegeliano (a criaccedilatildeo
especulada dos entes) e ganho seus contornos efetivos no advento de uma
nova forma de pensamento e concepccedilatildeo de praacutetica - a doutrina de Marx
Resumindo no caso de Marx ontologia eacute estatuto ou filosofia primeira
do ser social que enquanto tal norteia a concreccedilatildeo cientiacutefica do mesmo cuja
30
realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
35
tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
36
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
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mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
realizaccedilatildeo corrige e enriquece o proacuteprio estatuto donde a sinergia e a reciacuteproca
dimensatildeo criacutetica entre estatuto ontoloacutegico e ciecircncia da histoacuteria em seus diversos
departamentos possiacuteveis estabelecidos jaacute por criteacuterio ontoloacutegico ou seja que
respeita a integridade das coisas em suas qualidades e processos interconexos
que as constituem em seu ser por si e enquanto tais satildeo reproduzidas
teoricamente
Enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma da legalidade objetiva (material
e espiritual) do ser social ou seja enquanto malha de asserccedilotildees ou
determinaccedilotildees de seu complexo categorial enquanto o permanente na forma de
processo a ontologia estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a
sociabilidade como substacircncia desse grau maacuteximo da cadeia do ser
Mas substacircncia como complexo categorial como siacutentese de categorias
essenciais que denota uma forma especiacutefica determinada de presenccedila ou
existecircncia plenamente qualificada
Por isso eacute estatuto ontoloacutegico pois a plataforma canocircnica do ser eacute o
coacutedigo do substantivo verbal como substacircncia substrato) assim o estatuto
ontoloacutegico do complexo substantivo do ser social deve reconhecer a
sociabilidade como substacircncia A sociabilidade como substrato dos homens
seja na forma da alienaccedilatildeo seja na forma de sua latecircncia de substancialidade
em vir-a-ser no caminho infinito de sua realizaccedilatildeo
Trata-se portanto em Marx de estatuto e natildeo sistema pois como
sistema seria um agregado de abstraccedilotildees uma filosofia que uma vez obtidas
noccedilotildees fundamentais passa a se edificar por si ou seja as noccedilotildees seriam
coaacutegulos inteligiacuteveis que passam por auto-sustentaccedilatildeo a configurar
dedutivamente o mundo Ao passo que estatuto eacute uma ordem a legalidade do
ser sensiacutevel - o ser na plenitude de seus atributos
tempo (histoacuteriaprocessoduraccedilatildeomutabilidade) lugar e sensibilidade
especificamente a legalidade do ser social imanente a si em sua especiacutefica
31
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
35
tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
36
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
38
6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
objetividade O ser sensiacutevel eacute a forma do ser porque eacute a plenitude das
categorias possiacuteveis
E as formaccedilotildees ideais
Segundo Chasin as formaccedilotildees ideais do mesmo modo que as
formaccedilotildees reais - formas do ser - tecircm lugar e tempo como categorias - o tempo
e o espaccedilo das formaccedilotildees sociais que satildeo engendradas mas estatildeo privadas de
sensibilidade
O sensiacutevel soacute eacute predicaccedilatildeo inerecircncia agrave forma do ser que conteacutem a
plenitude dos predicados possiacuteveis (sensibilidade espaccedilo tempo)
Essa forma de conceber o ser eacute reconhecer substancialidade ao
complexu agrave unidade totalizada ou seja ao conjunto pleno de atributos em ato
Em outras palavras ser eacute complexo categorial - tem a forma de ser -
completude ou forma conferida pelo sensiacutevel que se desdobra em muacuteltiplos
atributos e se condensa de infinitas maneiras no gradiente do ser
Em suma segundo Chasin tomando Marx como base e ponto de
referecircncia permanentes ser eacute plenitude categorial ou seja a plenitude
categorial eacute sua forma e por ser sensiacutevel compreende lugar e tempo
Donde se admitido o princiacutepio metoacutedico de Marx saber eacute saber do ser
que antes de tudo eacute um complexo sensiacutevel - tudo que eacute existe eacute sempre um
complexo natildeo uma substacircncia ou essecircncia pura e cristalina E a cadeia do ser eacute
o conjunto de graus do ser - do menos ao mais complexo
O preceito metodoloacutegico marxiano eacute pois ontoloacutegico sabe-se o que eacute
como se formou se desenvolveu e como depereceraacute
Por via de consequumlecircncia e diante das vicissitudes da histoacuteria da
ontologia de seu processo constitutivo e dissolutor diante da penosa rota da
32
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
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tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
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2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
38
6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
conquista teoacuterica do real homoacuteloga ou equivalente agrave necessidade humana de
produzir a sua mundaneidade e a si mesmo a ontologia eacute o que pode ser - o
que natildeo eacute pouco - a esfera teoacuterica da incerteza propulsora positiva
afirmativamente organizada O patamar do incerto ordenado como plataforma da
busca infinita da certeza Impulsatildeo incontornaacutevel que natildeo pode ser eludida pela
presenccedila imperativa dos circuitos ontopraacuteticos
Talvez agora o estatuto ontoloacutegico marxiano possa ser enunciado do
seguinte modo eacute o estudo das categorias fundamentais - em traccedilos essenciais
abstratos em suas determinaccedilotildees mais gerais - da existecircncia social
historicamente constatada e reconhecida sendo possiacutevel exemplificar com as
seguintes categorias historicidade (processualidade ou mutabilidade)
concreticidade ou objetividade atividade sensiacutevel e ideal (trabalho e
reproduccedilatildeo) subjetividade (receptiva e proponente) valor individualidade
gecircnero (sociabilidade) Tudo isso perfilando o complexo de complexos da auto
realizaccedilatildeo do ser humano-societaacuterio entendido que o fim dos fins eacute a infinitude
da realizaccedilatildeo do humano - do autopor-se do aberto ser humano-societaacuterio
Estatuto que em outros termos eacute a ordem do reconhecimento ou
reproduccedilatildeo teoacuterica da identidade natureza e constituiccedilatildeo das coisas por si por
seus complexos categoriais decisivos independentemente em qualquer plano
de se tornarem objetos de praacutetica ou reflexatildeo
Enquanto tal eacute a teoria do reconhecimento da objetividade histoacuterico-
social imanente em suas distintas formas de apresentaccedilatildeo (natureza e
sociedade) Em termos muito breves eacute o momento mais abstrato do
reconhecimento da identidade das coisas por si enquanto tal um dos momentos
distintos da unidade do saber do qual participa um segundo sob forma
concreta que eacute a ciecircncia
Pela proacutepria natureza histoacuterica processual do ser a ontologia marxiana
natildeo corresponde nem poderia corresponder por simples imperativo de
33
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
35
tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
36
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
37
que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
38
6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
coerecircncia agrave forma de um saber universal plantado sobre uma racionalidade
auto-sustentada ou seja fundado na razatildeo universal nada mais a versatildeo laica
ou profana de Deus no dizer de Feuerbach Ou seja trata-se enfim de uma
forma de ontologia sem parentesco com o saber absoluto e que recusa qualquer
tipo de fundamento especulativo pois absolutizaccedilatildeo de uma teoria da
fundamentaccedilatildeo eacute simplesmente a firmaccedilatildeo especulativa da razatildeo autocircnoma ou
de um princiacutepio de inteligibilidade situado para aleacutem das coisas que garante a
presenccedila e o conhecimento do sagrado e a vitoacuteria antecipada do idealismo Natildeo
correspondendo agrave qualquer forma de saber universal a ontologia marxiana
sustenta a possibilidade efetiva como jaacute vimos de um saber real
Por sua praacutetica teoacuterica e por um conjunto de lineamentos expliacutecitos
Marx deixou o legado de um especiacutefico estatuto ontoloacutegico natildeo um ontologia de
talhe convencional ou tradicional e natildeo apenas por que careceu de tempo
necessaacuterio para a realizaccedilatildeo de uma obra desse tipo mas fundamentalmente
pela distinccedilatildeo de natureza de seu estatuto ontoloacutegico radicalmente oposto ao
tratamento especulativo da mateacuteria
Esse estatuto eacute constituiacutedo a partir do universo praacutetico onticamente
referido ou seja eacute um estatuto ocircntico-ontoloacutegico pois evolve da efetividade
histoacuterica das coisas de suas relaccedilotildees e processos para sua reproduccedilatildeo
conceitual no plano de uma trama categorial em sua expressatildeo mais abstrata
Reconhecimento e Determinaccedilatildeo da Sociabilidade como Substacircncia
Vimos que segundo Chasin enquanto estatuto coacutedigo ou plataforma
da legalidade do ser social em sua materialidade e espiritualidade[pode-se dizer
tambeacutem em sua objetividade sensiacutevel e supra-sensiacutevel] ou seja enquanto
malha de asserccedilotildees ou determinaccedilotildees de seu complexo categorial a ontologia
34
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
35
tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
36
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
38
6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
estatutaacuteria tem de reconhecer e expor a sociabilidade como substacircncia desse
grau maacuteximo do ser
Embora Chasin natildeo tenha desenvolvido plenamente a questatildeo da
objetividade supra-sensiacutevel como tambeacutem a da sociabilidade como substacircncia
julgo conveniente transcrever tambeacutem algumas notas e comentaacuterios feitos em
sala de aula dada a importacircncia do tema
Em relaccedilatildeo agrave noccedilatildeo de substacircncia Chasin retoma sua noccedilatildeo mais geral
e tradicional Ou seja deixando de fora qualquer conotaccedilatildeo relativa a formas de
idealidade o que existe por si eacute um auto-engendrado a uacuteltima instacircncia de um
dado gecircnero de entificaccedilatildeo enquanto tal na medida em que eacute uma efetividade
eacute um complexo que a noccedilatildeo de substacircncia refere no mais alto grau de
abstraccedilatildeo Vale pois como abstraccedilatildeo razoaacutevel tal como todo conceito
marxiano nesse niacutevel de generalizaccedilatildeo a partir do qual pela via dos processos
de concreccedilatildeo satildeo determinaacuteveis as formas concretas de substacircncia
correspondentes agraves formaccedilotildees sociais reais
Dessa forma a substacircncia eacute um complexo histoacuterico natildeo uma
idealidade natildeo um construto da razatildeo auto-sustentada mas o resumo de uma
extraccedilatildeo justificada
Naturalidade e Sociabilidade
Sempre que se potildee a questatildeo da naturalidade e da sociabilidade essa
uacuteltima tende a ser examinada in statu nascendi ou de um estado original
imaginaacuterio natildeo se parte portanto de fatos pois os desconhecemos se eacute que
35
tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
36
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
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que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
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6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
tenham existido mas de um mito E do mito se quer saltar para o quadro de uma
realidade complexa
Mas acompanhando Marx lembremos das pobres robinsonadas do
seacuteculo XVIII referidas logo agraves primeiras linhas da Introduccedilatildeo de 57 a) O
caccedilador e o pescador individuais e isolados de que partem Smith e Ricardo b)
o contrat social de Rousseau que relaciona e liga sujeitos independentes por
natureza por meio de um contrato Essas robinsonadas natildeo repousam sobre
(o) naturalismo E a argumentaccedilatildeo prossegue Trata-se ao contraacuterio de uma
antecipaccedilatildeo da sociedade (buumlrgelichen Gesellschaft) que se preparava desde
o seacuteculo XVI e no seacuteculo XVIII deu larguiacutessimos passos em direccedilatildeo agrave sua
maturidade Nesta sociedade da livre concorrecircncia o indiviacuteduo aparece
desprendido dos laccedilos naturais que em eacutepocas histoacutericas remotas fizeram dele
um acessoacuterio de um conglomerado humano limitado e determinado Os profetas
do seacuteculo XVIII sobre cujos ombros se apoacuteiam inteiramente Smith e Ricardo
imaginam o indiviacuteduo do seacuteculo XVIII como um ideal que teria existido no
passado Vecircem-no natildeo como um resultado histoacuterico mas como ponto de partida
da Histoacuteria porque o consideram como um indiviacuteduo conforme agrave natureza -
dentro da representaccedilatildeo que tinham da natureza humana - que natildeo se originou
historicamente mas foi posto como tal pela natureza[xvii]
Segundo Chasin tomando Marx novamente como ponto de referecircncia
os equiacutevocos que aparecem ao se tratar a relaccedilatildeo naturalidade sociabilidade
satildeo os seguintes
1) procurar deduzir em graus diferentes em cada caso o ser social do
natural esquecendo que se trata da emergecircncia do novo de uma configuraccedilatildeo
ontoloacutegica nova e que o novo nunca eacute um simples desdobramento do estaacutegio
anterior no caso - do grau de ser antecedente ou seja que entre os dois niacuteveis
ocorre o que se chama de salto um intervalo em que a potecircncia causal do
antecedente natildeo conteacutem a capacidade a potecircncia ou a potencialidade para
gerar o novo Um intervalo que fica assim indeterminado
36
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
37
que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
38
6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
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7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
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mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
2) o procedimento acima abre para a mera especulaccedilatildeo pois tende a
deduzir a indeterminaccedilatildeo a querer estabelecer nexos onde eles inexistem
tende a preencher o que de fato eacute um vazio A rigor natildeo se trata de um natildeo-
sabido mas da ausecircncia factual de um objeto ou processo em outros termos
se trata de um vazio ontoloacutegico de uma ausecircncia de nexos ontoloacutegicos
O correto segundo o modus operandi marxiano natildeo eacute partir da semente
ou do embriatildeo mas do complexo real maturado uma vez que
especialiacutessimamente na esfera social a loacutegica do gerado eacute diversa da loacutegica de
sua gecircnese aleacutem de que nesse acircmbito as entificaccedilotildees configuradas apagam a
rota e a loacutegica de sua formaccedilatildeo
Desse modo partindo do jaacute configurado e considerando que se trata de
uma configuraccedilatildeo infinita que compreende mutaccedilotildees qualitativas muito
importantes e natildeo esquecendo que permanecemos no estaacutegio preacute-histoacuterico (em
momento especialmente desequilibrado e contraditoacuterio) podemos e devemos
reconhecer por meio de algumas abstraccedilotildees razoaacuteveis o seguinte
1) A formaccedilatildeo do ser social eacute um processo da animalidade agrave
hominidade o andamento da naturalidade agrave sociabilidade o caminho infinito da
naturalidade dada agrave sociabilidade natildeo-dada em produccedilatildeo e reproduccedilatildeo
perenes
2)Trata-se pois de uma entificaccedilatildeo processual entre dois niacuteveis ou
poacutelos da escala do ser sendo processo eacute intrinsecamente uma contradiccedilatildeo e soacute
enquanto tal se move eliminada a contradiccedilatildeo cessaria a possibilidade do
processo Com isso eacute dito algo muito importante pois ao reconhecer a
contraditoriedade entre naturalidade e sociabilidade natildeo eacute mais possiacutevel pensar
as mesmas a propoacutesito do ser social como um simples conjugado de fatores
mas obrigatoriamente como uma conjugaccedilatildeo contraditoacuteria de legalidades Isso
vai na esteira do que eacute compreendido desde Hegel - que o ser eacute uma unidade
contraditoacuteria - todavia com o acreacutescimo do problema da dupla legalidade De
37
que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
38
6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
que modo ou feiccedilatildeo chega cada uma delas agrave unidade contraditoacuteria do ser Pois
haacute que pensar na unidade ou siacutentese a natildeo ser que se queira desenhar o ser
social como uma aberraccedilatildeo hiacutebrida pode ser esta a fisionomia do grau mais
elevado do gradiente dos seres Assim tomada na devida consideraccedilatildeo essa
determinaccedilatildeo ontoloacutegica sem a qual a reflexatildeo perde o rumo trata-se de
compreender a dinacircmica especiacutefica dessa contradiccedilatildeo peculiar Vejamos
3) Em primeiro lugar esse processo contraditoacuterio gera novas
contradiccedilotildees agora dominantemente contradiccedilotildees da sociabilidade em
formaccedilatildeo de sorte que se trata de um processo cumulativo de
contraditoriedades no qual as novas contradiccedilotildees progressivamente vatildeo
tomando o lugar predominante e decisivo vale dizer a contradiccedilatildeo originaacuteria
cada vez mais coabita com contradiccedilotildees de outro gecircnero diante das quais sua
presenccedila vai mudando de forccedila e configuraccedilatildeo natildeo desaparece mas sua
qualidade vai mudando na proporccedilatildeo mesmo do desenvolvimento da
apropriaccedilatildeo societaacuteria da natureza cada vez mais puramente social - eacute no que
consiste de acordo com as palavras de Marx o progressivo afastamento das
barreiras naturais
4) Ou seja a matriz e a medida do afastamento eacute a forma cada vez
mais social de produzir e reproduzir as bases materiais da vida pela qual eacute
gerado o novo ser em direccedilatildeo agrave sua potecircncia ampliada de se auto-por de ir em
direccedilatildeo a si mesmo um si mesmo que natildeo eacute dado mas gerado na progressatildeo
da auto-posiccedilatildeo do auto-assentamento ou da auto-enformaccedilatildeo que inclui a
proacutepria daccedilatildeo de forma e resoluccedilatildeo ao predicado natural ou bioloacutegico daccedilatildeo de
forma que em suma eacute daccedilatildeo de forma social ao predicado natural
5) Essa possibilidade de daccedilatildeo de forma eacute afirmaccedilatildeo e realizaccedilatildeo da
essecircncia social que eacute o conjunto de relaccedilotildees sociais configuradas em cada
momento pelo modo de produzir da base material modo por sua vez que eacute
determinado pelo desenvolvimento das forccedilas produtivas entre as quais figura o
proacuteprio modo de organizaccedilatildeo do conjunto das relaccedilotildees sociais
38
6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
39
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
6) Daccedilatildeo de forma eacute alteraccedilatildeo do lugar resolutivo e todo ente que muda
de lugar muda de natureza sem alterar uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo material
Vale dizer que a contradiccedilatildeo originaacuteria entre naturalidade e sociabilidade eacute
resolvida por uma nova contradiccedilatildeo - a da naturalidade que soacute se realiza na
forma e por meios sociais - no afastamento que eacute superaccedilatildeo da naturalidade
(processo histoacuterico) a legalidade natural eacute submetida agrave legalidade social
(diferentemente em cada modo de produccedilatildeo e de acordo com o
desenvolvimento das forccedilas produtivas) o fator natural natildeo eacute suprimido
suprimida eacute sua capacidade de autodeterminaccedilatildeo resta portanto
simplesmente o que natildeo eacute pouco como um predicado do ser humano um
predicado insuprimiacutevel mas apenas como predicado bioloacutegico de um ser de
outra natureza e essecircncia A naturalidade eacute retida como predicado
imprescindiacutevel mas natildeo como essecircncia Donde natildeo satildeo mais duas legalidades
ontoloacutegicas que coexistem mas a legalidade superior mais complexa subsume
a legalidade natural que natildeo mais se autodetermina mas eacute resolvida pela e do
interior da outra Assim o predicado natural do homem recebe forma e
resoluccedilatildeo sociais ou seja o predicado natural eacute subsumido agrave legalidade social
Natildeo resta mais o choque de duas legalidades contrapostas na
contradiccedilatildeo originaacuteria A legalidade natural vai sucumbindo na ruptura e
progressivamente agrave legalidade social em sua efetividade no ser social a
legalidade natural natildeo mais atua por si eacute dependente do social natildeo eacute mais a
legalidade de um ser pois natildeo haacute mais aiacute um ser natural mas um atributo
natural dependente da essecircncia social O homem eacute um ser social que
compreende sua essecircncia especiacutefica (variaacutevel) suas contingecircncias e seu
predicado bioloacutegico Na entificaccedilatildeo do ser social uacuteltimo grau da cadeia do ser a
legalidade natural eacute subalternizada agrave social por mais ruacutestica e restrita que seja a
essecircncia social primitiva e por mais precaacuteria que seja essa subalternizaccedilatildeo de
iniacutecio O processo de afastamento das barreiras naturais eacute assim o curso dessa
subalternizaccedilatildeo que desponta no iniacutecio na ruptura com a legalidade natural e
por mais longo e contraditoacuterio em avanccedilos e recuos que seja esse processo
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7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
7) de outra parte a loacutegica do predicado bioloacutegico natildeo soluciona natildeo
tem resposta para o complexo problemaacutetico da sociabilidade enquanto que esta
daacute soluccedilatildeo aos imperativos daquela Como diz Marx nos Manuscritos de 44 o
homem contempla a natureza e a si mesmo com um produto social [dos homens
interativos] com pleno direito mesmo que natildeo com elevada consciecircncia ou altos
valores
8) Donde a foacutermula lukaacutecsiana da dupla base eacute falsa pois a plataforma
eacute a sociabilidade enquanto a naturalidade eacute apenas o insuprimiacutevel predicado
bioloacutegico que passa a vigir na forma e sob a regecircncia da sociabilidade Natildeo
perde por isso uma ceacutelula de sua composiccedilatildeo orgacircnica mas na sua efetividade
muda de caraacuteter No interiro da esfera societaacuteria o predicado bioloacutegico eacute um
outro de si Se originariamente foi o ponto de partida agora eacute produzido e
reproduzido pela legalidade de um ser que o ultrapassa e o domina vive e soacute
pode viver na subjugaccedilatildeo de um novo estatuto Ou seja ao integrar como
predicado o ser de niacutevel mais elevado realiza a sua maacutexima potecircncia e isso eacute
ao mesmo tempo sua desnaturalizaccedilatildeo ou perecimento Impereciacutevel como
predicado natildeo eacute base pois determina soacute por seus limites pelas carecircncias natildeo
pelas determinaccedilotildees resolutivas nem mesmo em suas forccedilas e sentidos pois
enquanto virtualidades estas soacute satildeo humanas e superiores em resoluccedilatildeo
societaacuteria Ademais natildeo eacute nunca um criador de novas necessidades o que
caracteriza a legalidade social
9) A argumentaccedilatildeo acima diz respeito diretamente ao ser social em sua
configuraccedilatildeo bipolar (indiviacuteduo e gecircnero) e desenvolvida em especial no poacutelo da
individualidade tendo por esteio o andamento do gecircnero e ao falar deste se diz
do seu metabolismo com a natureza Esse metabolismo fundamental que eacute em
suma a atividade vital do homem ao gerar produtos sociais
(utilidadesmercadorias) sem que se possa transpor a estes as mesmas
determinaccedilotildees que foram feitas para o ser social desde logo satildeo entes sociais
mas em outro grau da escala do ser social mas tambeacutem tecircm mudada a sua
natureza de naturais a utilidades (e na forma da alienaccedilatildeofetichismo as
40
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
mercadorias) de sorte que a apropriaccedilatildeo da natureza eacute igualmente sua
desnaturalizaccedilatildeo eacute forccedilaacute-las a deixar de ser o que satildeo em sua peculiaridade
para se tornarem um outro de si sob a regecircncia do estatuto societaacuterio Isso eacute a
manifestaccedilatildeo do poder e da superioridade do grau maacuteximo do ser Nenhum
outro ser realiza qualquer coisa semelhante nem longinquumlamente Repetindo
Kant e Hegel Marx tinha toda razatildeo quando disse que haacute mais grandeza e
misteacuterio na cabeccedila de um becircbado do que no conjunto do universo
10) a Sociabilidade imperfeita substacircncia ainda natildeo realizada enquanto
tal ou seja ainda incapaz de autonomia como complexo estruturado conduz agrave
poliacutetica Natildeo compreendida como substacircncia mas como simples organizaccedilatildeo
potildee o homem no outro poacutelo na dicotomia homemsociedade ou seja na
representaccedilatildeo socioloacutegica ou politoloacutegica o homem eacute um outro
Determinada ou compreendida como substacircncia eacute substacircncia humana
(perfeita e imperfeita com todas as grandezas e miseacuterias produzidas
modificadas suprimidas e repostas no curso histoacuterico) eacute a essecircncia mutante do
ser auto-engendrado e enquanto mutante e por ser mutante distinta tambeacutem
por essa mutabilidade do predicado bioloacutegico atemporalmente necessaacuterio mas
sempre e progressivamente insuficiente do ser social
O tomo IV do primeiro nuacutemero da Revista Ensaios Ad Hominem eacute
composto de seis artigos - aleacutem do texto de abertura de autoria de J Chasin -
que resultaram de siacutenteses ou modificaccedilatildeo de partes ou capiacutetulos de
dissertaccedilotildees defendidas entre os anos de 1998 e 1999 junto ao Programa de
Poacutes-Graduaccedilatildeo em Filosofia da UFMG
41
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
O artigo que abre a presente coletacircnea intitulado A Razatildeo como
Tribunal da Criacutetica Marx e A Gazeta Renana de autoria de Celso Eidt versa
sobre a concepccedilatildeo do jovem Marx sobre o papel da imprensa natildeo apenas como
o locus privilegiado para o debate filosoacutefico mas fundamentalmente para os
processos educativos tendo em vista a realizaccedilatildeo plena da liberdade humana Eacute
bom ressaltar que no periacuteodo em que tais artigos satildeo redigidos Marx
compartilha de uma visatildeo antropoloacutegica racional em que a natureza humana eacute
concebida como espiacuterito livre e racional enquanto esteio da proacutepria vida eacutetica
ou seja da praacutetica humana fundada na razatildeo universal
Ana Selva Albinati autora do artigo A Determinaccedilatildeo dos Valores
Morais nos textos de Marx de 1841 a 1847 se debruccedila justamente sobre tal
campo de reflexatildeo Seu trabalho eacute uma tentativa de sistematizaccedilatildeo das
consideraccedilotildees sobre os valores morais nos textos do periacuteodo que se inicia com
sua tese doutoral Diferenccedilas entre as Filosofias da Natureza de Demoacutecrito e
Epicuro prosseguindo ateacute A Miseacuteria da Filosofia Ana Selva procura demonstrar
que esse periacuteodo normalmente referido como sendo o da juventude de Marx eacute
na verdade constituiacutedo de dois momentos de sua elaboraccedilatildeo teoacuterica que tem
como momento de clivagem a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel de meados
de 1843 em que Marx rompe com o referencial teoacuterico do idealismo alematildeo Em
relaccedilatildeo agraves determinaccedilotildees sobre a moral essa ruptura se reflete na inflexatildeo
radical que diferencia a compreensatildeo da moralidade no primeiro e segundo
momentos de tal forma que a moralidade passa a ser compreendida como um
dos modos da consciecircncia socialmente determinada concepccedilatildeo completamente
distinta da primeira fase em que os valores morais eram compreendidos como
expressotildees da liberdade e da racionalidade humanas idealmente concebidas
No artigo A criacutetica da Especulaccedilatildeo nas Glosas de Kreuznach Milney
Chasin analisa o momento inicial e ao mesmo tempo decisivo da ruptura que
se verifica entre Marx e Hegel no plano das determinaccedilotildees do ser Desse modo
a Criacutetica da Filosofia do Direito de Hegel inaugura a criacutetica marxiana da
especulaccedilatildeo no seu cerne o de rejeitar o procedimento especulativo
42
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
caracteriacutestico de se provir tudo da ideacuteia real de tornaacute-la sujeito isto eacute de
capacitar a abstraccedilatildeo ou conceito automovido - a partir das metamorfoses
hegelianas - de pocircr o multiverso sensiacutevel Em outros termos Milney Chasin no
referido artigo evidencia como a criacutetica da especulaccedilatildeo permite a Marx
ultrapassar os horizontes do idealismo alematildeo na direccedilatildeo do devido
reconhecimento da distinccedilatildeo entre ser e pensar de caracterizar a impropriedade
ontoloacutegica da loacutegica hegeliana de apurar os limites gnosioloacutegicos e
incongruecircncias de toda ordem Em suma permite o desvelamento da substacircncia
miacutestica oferecendo a explicitaccedilatildeo do meacutetodo hegeliano - das diabruras do
conceito autoposto - que articula abstraccedilotildees e finitude restando a esta a mera
condiccedilatildeo de apecircndice dissolvido isto eacute momento virtual da realizaccedilatildeo da
idealidade
O quarto artigo desta coletacircnea intitulado A Exteriorizaccedilatildeo da Vida nos
Manuscritos de 44 eacute parte da dissertaccedilatildeo de mestrado As Categorias
Lebensaumlusserung Entaumlusserung Entfremdung e Veraumlusserung nos Manuscritos
Economico-Filosoacuteficos de Karl Marxdefendida por Mocircnica H M da Costa em
que o interesse era acima de tudo averiguar se alienaccedilatildeo (Entaumlusserung) e
estranhamento (Entfremdung) teriam significados distintos A pesquisa acabou
opor apontar no entanto uma outra categoria como eixo desses manuscritos
Lebensaumlusserung traduzida por exteriorizaccedilatildeo da vida De fato o fio condutor
dos Manuscritos eacute a centralidade do trabalho na produccedilatildeo material e espiritual
da vida humana Tomando para anaacutelise criacutetica pela primeira vez os
economistas claacutessicos Marx explicita sua proacutepria compreensatildeo da forma
peculiar de engendramento da existecircncia do homem A criacutetica a Hegel completa
o quadro desta tematizaccedilatildeo que natildeo seraacute abandonada ateacute os uacuteltimos trabalhos
de Marx
Sabina Maura Silva no artigo A Fenomenologia do Egoiacutesmo Stirner e a
Criacutetica Marxiana tem como objetivo fundamental apresentar a concepccedilatildeo de
homem presente na obra O Uacutenico e Sua Propriedade de autoria do filoacutesofo
neohegeliano Max Stirner e expor a criacutetica de Marx a este autor contida em A
43
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
Ideologia Alematilde A autora mostra que para Stirner o Eu tomado como
individualidade singular eacute o fundamento de sua esfera existencial No entanto
para esse autor tudo tem determinado a existecircncia dos indiviacuteduos natildeo tendo
sido permitido a eles determinaacute-la O objetivo de Stirner eacute pois remeter ao
indiviacuteduo - fundamento uacuteltimo e intransponiacutevel - o que dele foi alienado e erigido
como algo autocircnomo Por seu turno a criacutetica de Marx tem como fim explicitar o
caraacuteter especulativo da anaacutelise stirneana em relaccedilatildeo ao homem e ao mundo
bem como salientar o aspecto pseudorevolucionaacuterio de suas proposituras
Assim segundo Marx Stirner tatildeo somente interpreta diferentemente o
existente isto eacute reconhece o existente mediante outra
interpretaccedilatildeoTransformando as contradiccedilotildees objetivas em contradiccedilotildees
subjetivas Stirner conserva e justifica as condiccedilotildees e estruturas efetivas que
esmagam e impedem a autodeterminaccedilatildeo das individualidades ao reconhecer
as circunstacircncias como determinaccedilotildees dos indiviacuteduos Acolhendo acriacutetica e
especulativamente em suas feiccedilotildees mais aparentes as manifestaccedilotildees
estranhadas de um momento histoacuterico particular da individuaccedilatildeo humana
Stirner erige como individualidade um ente que empobrecido e constrangido
pelas condiccedilotildees objetivas engendradas no curso contraditoacuterio da interatividade
social pode somente se comprazer com a ilusatildeo de uma potecircncia imaginaacuteria
sobre si e sobre o mundo
O uacuteltimo artigo do tomo IV da Revista Ensaios Ad Hominem eacute de
autoria de Antocircnio Joseacute Lopes Alves e leva o tiacutetulo de A Individualidade
Moderna nos Grundrisse Neste texto o autor procura demonstrar que a
moderna sociabilidade do capital eacute compreendida por Marx como forma
instaurada a partir da dissoluccedilatildeo dos liames sociais que uniam em tempos
anteriores os indiviacuteduos agrave comunidade Aleacutem disso destaca o fato apontado por
Marx de que tal processo se constitui numa verdadeira reconversatildeo ontoloacutegica
tanto dos indiviacuteduos quanto das condiccedilotildees da atividade vital ocorrendo uma
radical transformaccedilatildeo na forma de ser de ambos Sinteticamente trata-se de
reconfiguraccedilatildeo ontoloacutegica que determina como entes autocircnomos os indiviacuteduos
44
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
de um lado e as condiccedilotildees de trabalho de outro vale dizer do divoacutercio entre os
indiviacuteduos ativos e as condiccedilotildees de sua atividade Antocircnio Lopes buscou em
suma alinhar as determinaccedilotildees mais essenciais dos indiviacuteduos e da
sociablidade modernos no que respeita agrave forma mesma das relaccedilotildees sociais da
atividade sensiacutevel bem como da respectiva expressatildeo ideal como por exemplo
a configuraccedilatildeo das categorias da igualdade e liberdade
O leitor encontraraacute nas paacuteginas que se seguem o resultado do esforccedilo
de pesquisa voltado ao resgate da obra marxiana caracterizado pela busca do
rigor na leitura e interpretaccedilatildeo do pensamento de um autor cuja heranccedila
intelectual conheceu um destino traacutegico Natildeo eacute faacutecil portanto voltar-se a ela
sem os preconceitos da moda - como jaacute havia advertido Lukaacutecs Natildeo posso
afirmar com total certeza que um intento dessa natureza tenha sido plenamente
alcanccedilado Todavia eacute faacutecil perceber as diferenccedilas desse tipo de produccedilatildeo teoacuterica
com aquela apresentada tanto pelo marxismo adstringido e suas dissidecircncias
como pelo marxismo vulgar para utilizar as expressotildees cunhadas por Chasin no
intuito de designar as duas variantes de interpretaccedilatildeo da obra marxiana
Faccedilo aqui ao leitor interessado o convite para participar dessa
avaliaccedilatildeo
[1] Professora do Departamento de Filosofia da UFMG coordenadora
do Grupo de Pesquisa Marxologia Filosofia e Estudos Confluentes
45
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
[i] J CHASIN Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica in
Teixeira FJS Pensando com Marx Editora Ensaio Satildeo Paulo 1995
[ii] K MARX amp F ENGELS A Sagrada Famiacutelia Ed Grijalbo trad
Wenceslao Roces Meacutexico DF 1960 p 120
[iii] Ver a respeito J CHASIN Marx - Estatuto Ontoloacutegico e Resoluccedilatildeo
Metodoloacutegica opcit
[iv] J CHASIN O Futuro Ausente in Ensaios Ad Hominem 1 tomo III
Estudos e Ediccedilotildees Ad Hominem Satildeo Paulo 2000 p 166
[v] Ib p 167
[vi] Id
[vii] E CASSIRER A Filosofia do Iluminismo Editora da Unicamp
Campinas 1992 p 11
[viii] G LUKAacuteCS La Riproduzionein Per lOntologia delle Essere
Sociale Roma Editori Riuniti tomo II 1981 pp 180-81
[ix] N HARTMANN Ontologia Fondo de Cultura Econoacutemica Meacutexico D
F vol 1 1986
[x] K MARX O Capital vol I Ediccedilatildeo Abril Cultural Satildeo Paulo p 149
[xi] Id
[xii] Ib p 150
[xiii] (a respeito dessas categorias ver N HARTMANN Ontologia op cit
vol I p XII
46
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126
47
[xiv] No original alematildeo in der Form des Seins Dietz Verlag 1971 p
195
[xv] Ib p 151
[xvi] Ver a respeito em J CHASIN Marx-Estatuto Ontoloacutegico e
Resoluccedilatildeo Metodoloacutegica op cit
[xvii] K MARX op Cit p 126