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A FISCALIZAÇÃO DO TRABALHO DOS ESTRANGEIROS NO BRASIL AUDIT OF THE WORK OF FOREIGNERS IN BRAZIL Valeska Frioli Polo- [email protected] - Graduanda em Direito- UNISALESIANO Lins Thábata Biazzuz Veronese – [email protected] Mestre em Direito Negocial – UNISALESIANO Lins RESUMO O Estado brasileiro consagra em sua Constituição Federal uma democracia constituída com base em princípios e direitos fundamentais assegurados aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País, dentre os quais se destaca o princípio da igualdade previsto no caput do art. 5º. Neste contexto, se o ordenamento jurídico brasileiro permite o ingresso de trabalhadores estrangeiros em território nacional, desde que observados os requisitos estabelecidos pela Lei n.º 6.815/1980, bem como as regras estabelecidas pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aplicam-se aos obreiros imigrantes todos os direitos trabalhistas assegurados aos trabalhadores brasileiros. Contudo, diante da dificuldade da obtenção dos vistos, sobretudo os permanentes, além de outros problemas de ordem econômica e a necessidade de um trabalho qualquer, muitos trabalhadores ingressam de forma irregular no território brasileiro, sujeitando-se a trabalhos muitas vezes em desacordo à legislação trabalhista e à dignidade da pessoa humana, havendo casos extremos de situações análogas à escravidão. Palavras Chaves: Trabalhador Estrangeiro. Direitos Trabalhistas. Fiscalização. ABSTRACT

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A FISCALIZAÇÃO DO TRABALHO DOS ESTRANGEIROS NO BRASIL

AUDIT OF THE WORK OF FOREIGNERS IN BRAZIL

Valeska Frioli Polo- [email protected] -

Graduanda em Direito- UNISALESIANO Lins

Thábata Biazzuz Veronese – [email protected]

Mestre em Direito Negocial – UNISALESIANO Lins

RESUMO

O Estado brasileiro consagra em sua Constituição Federal uma democracia constituída com base em princípios e direitos fundamentais assegurados aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País, dentre os quais se destaca o princípio da igualdade previsto no caput do art. 5º. Neste contexto, se o ordenamento jurídico brasileiro permite o ingresso de trabalhadores estrangeiros em território nacional, desde que observados os requisitos estabelecidos pela Lei n.º 6.815/1980, bem como as regras estabelecidas pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aplicam-se aos obreiros imigrantes todos os direitos trabalhistas assegurados aos trabalhadores brasileiros. Contudo, diante da dificuldade da obtenção dos vistos, sobretudo os permanentes, além de outros problemas de ordem econômica e a necessidade de um trabalho qualquer, muitos trabalhadores ingressam de forma irregular no território brasileiro, sujeitando-se a trabalhos muitas vezes em desacordo à legislação trabalhista e à dignidade da pessoa humana, havendo casos extremos de situações análogas à escravidão.

Palavras Chaves: Trabalhador Estrangeiro. Direitos Trabalhistas. Fiscalização.

ABSTRACT

he Brazilian State establishes in its Federal Constitution a democracy constituted based on principles and fundamental rights assured to Brazilians and foreigners residing in the country, among which the principle of equality provided for in the caput of art. 5th. In this context, if the Brazilian legal system permits the entry of foreign workers into national territory, provided that the requirements established by Law No. 6,815 / 1980, as well as the rules established by the Ministry of Labor and Employment are observed, apply to the workers Workers' rights guaranteed to Brazilian workers. However, in view of the difficulty of obtaining visas, especially the permanent ones, besides other economic problems and the need for any work, many workers enter irregularly in the Brazilian territory, subjecting themselves to work often in disagreement with the legislation Labor and the dignity of the human person, and there are extreme cases of situations analogous to slavery.

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KEY WORDS: Foreign Worker. Labor rights. Oversight.

INTRODUÇÃO

Desde os primórdios da civilização no Brasil, houve o ingresso de

estrangeiros no território brasileiro, sendo que o tipo de imigrantes e sua forma

de entrada foram variando conforme a época.

Tendo em vista que a população brasileira se formou pela miscigenação,

característica das constantes imigrações, e, até hoje, percebe-se a diversidade

de etnias e culturas presentes, o que demonstra a importância da imigração

para a sociedade brasileira.

O Brasil, muitas vezes, não consegue abranger a fiscalização da entrada

dos estrangeiros dos países vizinhos, motivo pelo qual acaba havendo o

ingresso de pessoas sem a devida documentação e regulamentação.

Essa situação de clandestinidade oferece diversos riscos para os

estrangeiros, especialmente no que tange ao desrespeito dos direitos

trabalhistas, havendo até situações análogas à escravidão.

No âmbito internacional, a Organização Internacional do Trabalho (OIT)

tem por característica orientar os países a aplicar os princípios internacionais

do trabalho e garantir direitos trabalhistas, por meio de orientações que

proíbem o trabalho infantil, o trabalho escravo, a desigualdade, entre outros.

Importante frisar que os estrangeiros que ingressam no Brasil

desconhecem as leis trabalhistas vigentes nesse território, o que facilita a

exploração da mão de obra desses imigrantes.

Os principais focos desta situação encontram-se nos grandes centros

urbanos, como a cidade de São Paulo, e, principalmente, nas indústrias têxteis,

no setor da construção civil e no trabalho rural, onde se utiliza a servidão por

dívidas, jornadas exaustivas, trabalhos forçados e condições degradantes.

O empregado recebe a proteção da Constituição Federal, da

Consolidação das Leis do Trabalho e demais leis e outras espécies normativas,

por ser a parte mais fraca economicamente da relação jurídica trabalhista, e,

assim, o legislador constitucional e infraconstitucional tentou compensar essa

desigualdade financeira com uma superioridade legislativa.

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Contudo, a proteção conquistada formalmente não se faz presente

muitas vezes nas relações de trabalho, em especial no caso dos trabalhadores

estrangeiros. A realidade demonstra o descompasso entre a igualdade formal e

a igualdade material. O princípio maior da dignidade da pessoa humana, que

deveria ser utilizado como diretriz na relação trabalhista do estrangeiro, sobeja

ignorado. Nesta incongruência entre expectativa e realidade, cumpre investigar

meios de se fazer cumprir o papel do Estado de regulador e fiscal dos direitos

trabalhistas dos estrangeiros.

1 DO CONTRATO DE TRABALHO DO ESTRANGEIRO

Com a alta da economia brasileira nos últimos anos, vários estrangeiros

imigraram para o país em busca de melhores condições de vida,

principalmente os que residem nos países que fazem fronteira com o Brasil,

como bolivianos, paraguaios e peruanos, na maioria das vezes, sem curso

superior e sem qualificação.

A crescente internacionalização da economia brasileira, com o aumento dos investimentos estrangeiros no Brasil e dos investimentos brasileiros no exterior, aumenta a possibilidade de conflitos relativos ao contrato de trabalho de profissionais contratados em um país e que a prestar serviços em outro país. (PORTELA, 2015, p. 489).

Segundo estatística fornecida pelo Ministério do Trabalho, o número de

trabalhadores estrangeiros no mercado formal de trabalho brasileiro cresceu

50,9% entre 2011 e 2013.

Neste caso específico, a Resolução Normativa nº 64/2005 do Conselho

Nacional de Imigração exige alternativamente experiência de dois anos no

exercício de profissão de nível médio, com escolaridade mínima de nove anos

ou experiência de um ano no exercício de profissão de nível superior.

O artigo 5º da Constituição Federal determina que “todos são iguais

perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros

e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à

liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.

E o art. 7º preceitua, na sequencia quais são os direitos dos

trabalhadores urbanos e rurais, sem discriminar, que se dirigem apenas a

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trabalhadores brasileiros de estrangeiros.

Assim, a empresa contratante de estrangeiros deve adotar os mesmos

procedimentos para o registro dos empregados brasileiros e fazer as anotações

dos respectivos dados no livro ou ficha de registro de empregados.

À luz do crescente fenômeno da migração e com a consciência de seu impacto, busca a Convenção contribuir para a harmonização dos Estados através da aceitação de princípios fundamentais relativos ao tratamento dos trabalhadores migrantes e dos membros de suas famílias, considerando a situação de vulnerabilidade em que frequentemente se encontram. Objetiva a Convenção consagrar a proteção internacional dos direitos de todos os trabalhadores migrantes e dos membros das suas famílias (PIOVESAN, 2009, p. 299).

A Súmula n.º 207 foi extinta pelo TST, em abril de 2012, com base no

voto de relatoria da vice-presidente, ministra Maria Cristina Peduzzi, no

processo RR-219000-93.2000.5.01.0019, diante dos conflitos com Lei

7.064/82, que regula em seu artigo 1º “a situação de trabalhadores contratados

no Brasil ou transferidos por seus empregadores para prestar serviço no

exterior” e determina que se aplique a lei nacional mais favorável ao

trabalhador contratado no Brasil e transferido para o exterior.

Ademais, muitas vezes se encontra no trabalhador estrangeiro mão de

obra qualificada que um empregado brasileiro não possui.

Para a contratação da mão de obra dos estrangeiros, permanente ou

temporária, é necessário solicitar a autorização de trabalho junto à

Coordenação Geral de Imigração, órgão do Ministério de Trabalho e Emprego.

Lei n.º 6.815/80 definiu a situação jurídica do estrangeiro no Brasil e

criou o Conselho Nacional de Imigração (CNIG), órgão do Ministério do

Trabalho e Emprego responsável pela política e coordenação de imigração no

País, para autorizar a entrada e a permanência do estrangeiro no País.

Para a contratação do trabalhador estrangeiro deve ser elaborado o

contrato de trabalho de acordo com o visto de permanência do estrangeiro.

Com isso, sua esperança de melhores condições de vida se esvai ao se

deparar com a exploração de sua mão de obra sem respeito aos direitos

trabalhistas e, até mesmo, em condições semelhantes à escravidão.

1.1 Aspectos históricos da imigração no Brasil

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A Imigração consiste no movimento de entrada de pessoas de um país

em outro, com intuito definitivo ou temporário, para trabalho ou moradia.

A imigração no Brasil diz respeito aos povos de diversas partes do

mundo que imigraram para o Brasil ao longo da história e transformou o País

com suas culturas, influenciando a demografia e a economia, transformando o

Brasil neste país miscigenado como se apresenta nos dias de hoje.

A história da imigração no Brasil começou com a chegada dos colonos

Portugueses, que encontraram as riquezas naturais contidas no país. Durante

o período colonial e monárquico, a imigração portuguesa foi a mais expressiva

e presente (OLIVEIRA, 1994, p. 46).

O Brasil foi descoberto e explorado pela nação portuguesa. Os colonizadores, ao chegarem aqui e tomarem posse das terras dos nativos indígenas, sentiram-se legitimados para, como verdadeiros donos desse “novo mundo”, ditarem-lhes os rumos em todos os sentidos. (WOLKMER, 2015, p. 406).

Apesar de todas essas diversidades, a cultura dos negros, seus

costumes, suas crenças e tradições se fazem presentes, de forma razoável em

nossa identidade nacional.

Oliveira (1994) ressalta que em 1988, com a abolição da escravatura, os

fazendeiros não quiseram empregar os ex-escravos para trabalharem em suas

lavouras, motivo que levou a contratação dos trabalhadores europeus, que

viram no Brasil uma oportunidade de vida.

Atualmente o Brasil continua recebendo imigrantes de toda a

parte do mundo, especialmente seus vizinhos bolivianos, paraguaios e

peruanos, entre outros da América do Sul, uma vez que o Brasil, ainda que

seja considerado um país em desenvolvimento, teve um grande período de

crescimento econômico, e, ainda neste momento de crise econômica, ainda se

mostra atrativo por apresentar melhores condições que os países deles.

Também recebeu muitos imigrantes do Haiti e da Síria em razão das graves

situações econômicas daqueles países, agravadas pelos terremotos e pelas

guerras, respectivamente.

O crescimento econômico do Brasil aliado às grandes obras em razão

da Copa do Mundo de 2014 e dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro de 2016,

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além da exploração de petróleo da camada do Pré-Sal tornaram o país ainda

mais atraente aos imigrantes.

Desde meados de 2015, iniciou-se uma crise econômica no Brasil, a

qual originou problemas como demissões em massa e crescimento do

desemprego e alterações dos contratos de trabalho como diminuição de

jornada de trabalho e salário.

Não obstante, muitos imigrantes permanecem no Brasil por diversos

motivos, que variam desde a permanência da crença de que ainda o Brasil seja

melhor do que o seu até a situação de servidão ou escravidão.

2 DO DESRESPEITO DOS DIREITOS DOS TRABALHADORES ESTRANGEIROS

Para que os trabalhadores estrangeiros no Brasil tenham os mesmos

direitos trabalhistas que os trabalhadores brasileiros, sua contratação deve ser

firmada de acordo com os requisitos do contrato de trabalho da CLT e demais

normas específicas, como a Lei n.º 6.815/1980, o Decreto-Lei n.º 691/1969, a

Portaria MTE 132 de 22.03.02, a Resolução Normativa CNH 33 de 27.08.99, e

disposições previstas na CLT a respeito da matéria.

Os trabalhadores estrangeiros, para trabalharem no Brasil, de forma

legal devem possuir a devida autorização dos órgãos competentes.

Todo trabalho executado no Brasil deve ser autorizado pelo Ministério do Trabalho e Emprego, de acordo com os critérios estabelecidos pelo Conselho Nacional de Imigração, salvo nos casos de trabalho voluntário ou situações de urgência. Somente depois de ser concedida esta autorização é que o visto de trabalho poderá ser emitido. (BOMFIM, 2013, p. 325).

Verifica-se que pelas vias normais para que um estrangeiro imigre para

o Brasil é necessário escolaridade, qualificação e recomendação por

empregadores anteriores como requisito para trabalharem no país, tudo aquilo

que os estrangeiros clandestinos não possuem.

O principal motivo da entrada do estrangeiro de forma clandestina é o

fato de não preencherem os requisitos legais para ingressarem no mercado de

trabalho brasileiro de forma irregular.

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O Direito Internacional do Trabalho brasileiro surgiu para proteger e

regulamentar os direitos inerentes às atividades laborais dos estrangeiros,

tendo como princípio básico a proteção da dignidade da pessoa humana, para

que haja paz na sociedade. A regulamentação consiste em um importante

instrumento para regular o combate de certas práticas deletérias para a vida

humana, como a participação de menores de dezoito anos em atividades

criminosas, trabalhos forçados, dentre outras (PORTELA, 2015).

A OIT é uma entidade que vem empreendendo esforços desde o início de suas atividades em prol do estabelecimento de normas do estabelecimento de normas internacionais do trabalho a serem observadas em todo o mundo (PORTELA, 2015, p. 464).

Dessa forma, os direitos dos estrangeiros, mesmo aqueles que

ingressaram de forma irregular no território brasileiro, devem ser respeitados e

garantidos, prevalecendo o princípio da dignidade humana nessas relações,

tendo em vista que o Brasil tem como garantia fundamental a igualdade de

direitos, sem qualquer distinção.

Contudo, a realidade enfrentada pelos trabalhadores que ingressam no

Brasil de forma irregular apresenta-se em dissonância com a garantia

constitucional de igualdade e dignidade da pessoa humana do trabalhador, pois

não têm na prática o amparo das leis que protegem os direitos dos

trabalhadores, restando, muitas vezes, explorados em sua mãos de obra.

2.1 Confrontação entre os Direitos Trabalhistas de Brasileiros e Estrangeiros

Os trabalhadores estrangeiros possuem os mesmos direitos inerentes

aos brasileiros, conforme previsto no artigo 5º, da Constituição Federal, o qual

consagra no caput que todos são iguais perante a lei, sem distinção de

qualquer natureza. Nota-se que não haverá qualquer forma de discriminação

para o contrato de trabalho do estrangeiro residente no Brasil. O trabalhador

estrangeiro recebe toda a proteção do ordenamento jurídico brasileiro correlato,

inclusive pelo Estatuto do Estrangeiro, previsto na Lei n.º 6.815/80.

O princípio da igualdade consiste em um direito fundamental que visa

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coibir diferenciações absurdas que podem levar a atos de tratamentos

desiguais e discriminatórios.

As práticas discriminatórias em razão da origem e que alcançam, entre outros, o estrangeiro, presentes no Brasil e continuamente denunciadas pela imprensa e pelos defensores dos direitos humanos, não constituem novidade. (GARCIA , 2013).

O artigo 3º da Lei Maior prevê entre os objetivos fundamentais da

República Federativa do Brasil, no inciso III, “erradicar a pobreza e a

marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais”, e, no inciso IV,

“promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade

e quaisquer outras formas de discriminação”. O Art. 170 prevê que “ ordem

econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa,

tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça

social, observados”, dentre outros princípios, no inciso VIII, “a busca pelo pleno

emprego”.

A redação constitucional denota a preocupação do constituinte de

promover a igualdade dos trabalhadores e a proteção garantida pelo Estado de

promover a garantia de emprego e a não discriminação nas relações de

trabalho. Todavia, não se pode contentar com a conformação escrita e

assegurada formalmente, mas se faz necessária a transposição dos propósitos

constitucionais para a realidade. Mais do que a dificuldade da conquista, a

aplicação concreta se apresenta ainda mais árdua e incerta.

2.3 A aplicação dos Princípios da Igualdade e da Não Discriminação

O princípio da igualdade exige um tratamento diferenciado para adaptar

as pessoas desiguais nas situações concretas e não permitir o tratamento

desigual de pessoas iguais ou o tratamento igual de pessoas desiguais.

No Direito do Trabalho, o princípio da igualdade se apresenta de suma

importância em razão da desigualdade econômica existente entre as partes

contratantes, uma vez que o empregador é mais forte economicamente e o

empregado pode ser explorado em razão de sua inferioridade econômica e

dependência do emprego para subsistência própria e de sua família.

Para compensar essa desigualdade econômica, o legislador se utiliza

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do princípio da isonomia para tentar garantir uma igualdade jurídica, por meio

de uma superioridade protetiva do empregado na legislação trabalhista, a fim

de se proporcionar uma justiça real e não meramente formal.

A discriminação, portanto, consiste na conduta de negar à pessoa, com

base em critério injusto, tratamento diferenciado e ilegítimo, contrário ao padrão

jurídico previsto para a situação concreta.

A não discriminação é um dos pilares dos Direitos Humanos e do Direito

Internacional do Trabalho, que também é voltado à proteção da dignidade da

pessoa humana, motivo pelo qual não se devem tratar as pessoas de forma

diferente sem haver um fundamento legítimo.

Já o artigo 2º, da mesma declaração, traz em seu bojo que “todos os

seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na

presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, cor,

sexo, língua, religião, opinião política ou outra, origem nacional ou social,

fortuna, nascimento ou outro estatuto.”

A OIT também assegura esses princípios a nível internacional e propõe

diversas orientações se como os países devem proceder em seu tratamento

jurídico para respeitarem a ordem internacional de acordo com os direitos

fundamentais do trabalho. Por exemplo, a Convenção nº19 da OIT aborda a

igualdade de tratamento dos trabalhadores estrangeiros e nacionais em

matéria de indenização por acidente de trabalho.

Internacional e nacionalmente, a legislação apresenta-se satisfatória e

eficientemente capaz de promover a justiça material em consonância com a

igualdade. O problema reside na eficácia material de concretização dos direitos

trabalhistas de brasileiros e estrangeiros em suas relações de trabalho que

deveriam ser protegidas pela CLT, mas, na prática não são.

2.3 A Exploração da Mão de Obra Estrangeira

É notório que o Brasil possui um vasto território e muitas fronteiras que

na maioria das vezes não são fiscalizadas de forma adequada, possibilitando

assim o ingresso de vários estrangeiros de forma ilícita. Em razão dessa falha

de fiscalização, os estrangeiros, em sua maioria, ingressam durante a

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madrugada para não ter perigo de serem pegos.

A maioria dos obreiros que permanece no Brasil de forma irregular não

procura o Poder Judiciário quando ocorre alguma violação aos seus direitos,

devido a suas condições irregulares.

Segundo o artigo 125, VII, da Lei nº 6.815/80 constitui infração, punível

com multa, empregar ou manter ao seu serviço estrangeiro em situação

irregular ou impedido de exercer atividade remunerada.

Ademais, o artigo 359, da CLT, veda à empresa admitir a seu serviço

empregado estrangeiro sem que este exiba a carteira de identidade de

estrangeiro devidamente anotada.

O Ministério Público do Trabalho e Emprego têm se empenhado na

fiscalização de empresas com o objetivo de combater a submissão de

trabalhadores a condições desumanas de trabalho.

Assim, para combater o trabalho escravo no Brasil é necessária a

realização de fiscalizações, onde o meio mais utilizado é o Grupo Móvel, que

atua a partir de denúncias.

O gráfico a seguir ilustra os resultados das fiscalizações durante os

últimos cinco anos, fornecidos pelo Ministério do Trabalho e Emprego.

Observa-se que houve uma diminuição considerável de casos de

trabalhadores em situações análogas à escravidão no ano de 2015 em

2015 2014 2013 2012 2011 2010

143 175 189 150 177 150257 292 313 259 344 310

1010

1752

2808 27712495

2634

Resultados das Fiscalizações para Erradicar o Trabalho Escravo (MTE)

Operações Estabelecimentos InspecionadosTrabalhadores em Condições Análogas a de Escravo

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detrimento dos demais anos, o que leva a crer que as fiscalizações estão

surtindo efeitos positivos, mas ainda insatisfatórios.

Destaca-se ainda que a ONU realça significativos avanços do Brasil na

erradicação do trabalho escravo, como a ratificação das Convenções nº 29 e

105 da OIT, que tratam da eliminação do trabalho forçado ou obrigatório, e

demais tratados internacionais de direitos humanos sobre o tema e a criação

de diversos instrumentos para institucionalizar o combate ao crime como uma

política de Estado. (ONU, 2016).

Sucede-se que ainda há a ocorrência de casos de exploração do

trabalho forçado e degradante dos estrangeiros no território brasileiro, que deve

ser tratada com bastante rigor pelas autoridades competentes para tomarem

providências para erradicar esta prática.

Percebe-se que a legislação aliada aos órgãos governamentais de

fiscalização e punição tem um arcabouço preventivo e repressivo exemplar

teoricamente. Contudo, os resultados indicam que, por mais esforço

empreendido, ainda, na prática, infelizmente, não há supedâneo de pessoa

efetivo para realizar o trabalho de controle e correção das irregularidades.

O Ministério do Trabalho e do Emprego tem a competência para

fiscalizar a aplicação das normas de proteção ao trabalho, por meio dos

auditores fiscais do trabalho (art. 626, CLT).

A fiscalização é feita por funcionários públicos, com a colaboração dos

empregados e empregadores. Os fiscais podem entrar em qualquer

estabelecimento e em qualquer horário, bem como ter acesso a qualquer setor

do estabelecimento e a toda a documentação.

Conforme dispõe o site do Senado, a fiscalização O GEFM (Grupo

Especial de Fiscalização Móvel) foi criado em 1995 e foi essencial para que a

OIT reconhecesse o Brasil como referência na luta contra a exploração da mão

de obra escrava. No centro do combate à escravização da mão de obra no

Brasil está o Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM), ligado à

Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) do Ministério do Trabalho e Emprego

(MTE). Ele é formado por auditores fiscais do trabalho que coordenam as

operações de campo, policiais federais e procuradores do Ministério Público do

Trabalho (MPT). No entanto, depois de quase 40 mil trabalhadores libertados

em 16 anos de atuação, o GEFM tem hoje uma estrutura ainda pequena

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comparada ao tamanho do problema. O MTE conta com cerca de 3 mil

auditores para fiscalizar as relações de trabalho, no campo e na cidade, em

todo o Brasil. Desse total, apenas 25 pessoas estão diretamente envolvidas

com a ação das cinco equipes móveis que compõem o GEFM. Há também

equipes como essas nas superintendências regionais do MTE nos estados

onde historicamente é maior a incidência do trabalho escravo. (SENADO

FEDERAL, 2011)

Portanto, percebe-se que o Estado e o Governo brasileiros tem se

empenhado na elaboração de programas que buscam a erradicação do

trabalho escravo, mas ainda o número de fiscais não conseguem atender a

demanda de situações que violam o direito dos trabalhadores estrangeiros que

se submetem a trabalhos degradantes e forçados.

2.3 Imigração e Direitos Humanos

Os direitos humanos surgiram devido ao grande impacto das atrocidades

cometidas na Segunda Guerra Mundial, tendo como marco de criação o ano

de1948, três anos após a criação da ONU, com o intuito de manter a paz

mundial, prevenindo, assim, possíveis guerras.

Os direitos humanos consistem em direitos e liberdades básicas

inerentes a todos os seres humanos, tendo em vista que todos nascem livres e

iguais em dignidade e direitos, sendo aplicados através detratados e

convenções internacionais, com o objetivo de atingir a todos os povos de todas

as nações.

A OIT, organismo responsável pelo controle e emissão de normas

referentes ao trabalho no âmbito internacional, tem como objetivo regulamentar

as relações de trabalho por meio das convenções, reconvenções e resoluções,

visando proteger as relações entre empregados e empregadores no âmbito

internacional.

A consolidação do Direito Internacional do Trabalho teve como passo

importante a criação, em 1919, da Organização Internacional do Trabalho

(OIT), que veio a se firmar como ponto focal da construção e aplicação do

arcabouço normativo de regulamentação do mundo do trabalho em âmbito

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mundial, a ponto de haver quem identifique o Direito Internacional do Trabalho

como o Direito feito dentro da OIT (PORTELA, 2015, p.462).

Para Romar (2014), a OIT é a instituição mundial responsável pela

elaboração e supervisão da aplicação das normas internacionais do trabalho,

promovendo a justiça social e os direitos humanos e trabalhistas reconhecidos

internacionalmente.

O estrangeiro, ao ingressar no território brasileiro, deve estar munido dos

documentos de viagens e do visto para a permanência no país, caso esta

esteja irregular poderá ser impedido de entrar no território brasileiro, momento

onde os direitos humanos surgem para assegurar o respeito dos direitos

fundamentais desses estrangeiros.

A comissão defende, em síntese, que devem ser respeitadas as normas

de direitos humanos, respeitando-se a dignidade de todas as pessoas que

estão sob jurisdição estatal, sem distinção de qualquer espécie, lembrando que

os Estados devem exercer de seu direito e obrigação de controlar a entrada e

permanência de estrangeiros nos respectivos territórios dentro do marco da

observância desses direitos.

A Lei n.º 6.815, de 19 de agosto de 1980, regula o ingresso dos

estrangeiros no Brasil, assim como atende a segurança nacional, à

organização institucional e interesses políticos, socioeconômicos e, inclusive, a

defesa do trabalhador nacional.

O artigo 5º, 3º, da Constituição Federal, prevê que os tratado e

convenções internacionais de direitos serão equivalentes a emendas

constitucionais, desde que aprovados em cada casa do Congresso Nacional,

em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros.

Contudo, faltam funcionários suficientes para inspecionar e resgatar

trabalhadores em situação análoga à escravidão. Além disso, há a intimidação

por parte de quem explora a mão de obra dos imigrantes, que proferem

ameaças e dificultam a atuação dos fiscais. Isso sem falar nos auditores fiscais

que se corrompem por promessas e propinas que lhes são oferecidas.

O Brasil deveria investir mais do seu capital em organizar as suas

fronteiras e protegê-las, como ocorre com países mais desenvolvidos, mas

sempre observando os direitos humanos destes estrangeiros. Uma fiscalização

maior diminuiria o número de trabalhadores ingressos de forma irregular e,

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consequentemente, vítimas de relações trabalhistas irregulares e

desamparadas da legislação.

CONCLUSÃO

O Brasil se consagrou pela Constituição Federal de 1988 em um Estado

democrático de Direito, constituído com base em princípios e valores que se

propõem a garantir a dignidade da pessoa humana, dentre os quais se destaca

o princípio da igualdade.

Para que seja possível a imigração, o obreiro estrangeiro deve

preencher diversos requisitos para o ingresso no território brasileiro. Por essa

razão a análise do Estatuto do Estrangeiro foi de extrema importância para o

desenvolvimento e evolução desta pesquisa, pois dispõe dos órgãos

responsáveis para conceder os vistos de trabalho para os estrangeiros que

pretendem ingressarem no Brasil.

Recentemente, crises, guerras e terrorismo ocorridos em diversos

países da Europa e seus vizinhos, têm gerado diversos movimentos de

migração, os quais têm sido reprimidos severamente por países que são

procurados, inclusive com policiamento ostensivo, construção de muros, entre

outras medidas de contenção.

Brasil, ainda que em crise eminente, e, ainda que queira seguir pela

linha paternalista acolhedora, de acordo com sua história e cultura, precisa

investir mais em fiscalização para inibir a exploração de trabalhadores

estrangeiros, bem como deve adotar medidas para controlar o ingresso de

imigrantes irregulares nas fronteiras brasileiras.

De um modo ou de outro, para a construção de um Estado democrático

de Direito, conforme os ditames da Constituição Federal de 1988, e a

realização de seus ideais, faz-se necessário, primeiramente, definir,

exatamente, quais são os ideais, em consonância com o propósito da

construção da democracia da nação brasileira em consonância com o propósito

da construção da democracia da nação brasileira. E, infelizmente, os números

das pesquisas de fiscalização, desemprego e corrupção, parecem não estar

nesta sintonia. Por outro lado, felizmente, o povo brasileiro não perde a

esperança. E é exatamente essa esperança que pode ainda mudar a realidade.

Page 15:  · Web viewA não discriminação é um dos pilares dos Direitos Humanos e do Direito Internacional do Trabalho, que também é voltado à proteção da dignidade da pessoa humana,

REFERÊNCIAS

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WOLKMER, Antonio Carlos. Fundamentos de História do Direito. 8ªed, revista atualizada. São Paulo: DelRey, 2010.