038RH- Gestao Da Mudança Organizacional

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Artigo SEMEAD-FEA

VI SEMEAD

ESTUDO DE CASO

RECURSOS HUMANOS

Gesto da Mudana Organizacional: Um Estudo de Caso

Autor:

Sebastio de Oliveira Campos Filho

Ps-Graduado em Psicologia Organizacional pela Universidade Metodista de So Bernardo, atualmente cursando o Programa de Formao em Dinmica de Grupos da Sociedade Brasileira de Dinmica de Grupos (SBDG). Graduado em Marketing pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM).

Dados para Contato:

Endereo: Rua Ablio Soares, 991 Ap. 9 - Paraso So Paulo - SP

CEP: 04005-003

Telefones: Res. (011) 3884-5849 / Cel.: (011) 9404-3608

Janeiro de 2003

Gesto da Mudana Organizacional: Um Estudo de Caso

Resumo

O estudo que segue visa descrever e analisar um caso de mudana organizacional implementado em uma empresa brasileira de mdio porte do setor industrial.

Embora as mudanas organizacionais normalmente envolvam diferentes perspectivas dentro da organizao, este estudo se concentrar fundamentalmente nos aspectos humanos do processo, buscando embasamento conceitual principalmente dentro das teorias de dinmica de grupo para compreender como a implementao de tal projeto foi possvel.

Introduo

Embora existam bastantes relatos sobre mudanas organizacionais, o que anima tal trabalho, o pressuposto de que o tema, embora j bastante explorado, comportar sempre novas possibilidades de leituras e vises. Conforme preconizado por Wood (1995), Caminhar pelo tema da mudana organizacional manter constantemente uma janela aberta para o mundo, agir com sensibilidade crtica e manter a mente aberta.

Assim, o objetivo deste estudo descrever e analisar o processo de mudana ocorrido em uma empresa brasileira de mdio porte do setor industrial ocorrido no perodo de dezembro de 1998 a maro de 2000. A perspectiva terica utilizada ser a da cincia da dinmica de grupos. Tal fato se justifica primeiramente porque foram estes os referenciais tericos que embasaram o projeto poca, e, em segundo lugar, porque todas as alteraes na empresa ocorreram em funo do movimento de seu principal grupo de trabalho.

Inicialmente ser realizada uma introduo ao tema mudana organizacional, assinalando-se sua relevncia para o momento empresarial em que vivemos e inserindo-o no contexto atual do mundo dos negcios. Em seguida, ser realizada uma sntese conceitual dos principais elementos da cincia da dinmica de grupos que serviro de suporte para a anlise do caso apresentado. Na seqncia, sero apresentados o mtodo de pesquisa utilizado e a descrio e anlise do caso, dando-se especial ateno aos fenmenos ocorridos dentro do grupo diretamente envolvido no projeto e dinmica de interao entre seus membros.

Finalmente, a partir do que foi exposto, sero assinaladas as principais concluses que o caso enseja e descritos alguns de seus desdobramentos possveis.

Consideraes Tericas

O sentido e o ritmo das mudanas

A maioria dos estudos sobre o mundo dos negcios retrata que as alteraes esto ocorrendo em uma velocidade alucinante e sob uma lgica nunca antes vista no ambiente corporativo. Em matria destinada a traar um panorama das transformaes em curso, a Revista Exame transcreve os relatos de Robert Baldock, presidente da Artur Andersen, para quem haver mais mudanas nos prximos cinco anos do que houve nos ltimos 20. No mesmo sentido, Naisbitt e Aburdene (in Wood, 1995) pregam que nessa nova era a sociedade de informao substituir a sociedade industrial, mudando radicalmente as estruturas sociais....Frente a essa realidade, as empresas se apressam a fazer mudanas em seu modo de operao, para responder as crises no ambiente externo, para acompanhar os movimentos tecnolgicos, ou simplesmente porque se espera que elas mudem (Wood, 1995). O mesmo autor aponta algumas das provveis alteraes no futuro modo de operao das empresas: ... em termos gerais, acredita-se que a organizao do futuro estar mais voltada para os clientes, colocando no plano central a qualidade de seus produtos e servios; ter uma relao mais prxima com a comunidade, assumindo uma postura de maior responsabilidade para com o meio ambiente; internamente, possuir menor nmero de nveis hierrquicos, e a prpria hierarquia, no sentido atual, desaparecer, dando espao figura do lder como treinador e motivador. As organizaes dependero muito mais do nvel de motivao de sua fora de trabalho, que dever ter um nvel de especializao maior que o atual.

Assim, ao que tudo indica as pessoas sero cada vez mais o elemento central nas estratgias corporativas e nos projetos de mudanas organizacionais necessrios s corporaes.

Dados estes pressupostos um novo problema se coloca. Estaro os executivos, empregados, consultores e demais profissionais envolvidos nos projetos de mudana capacitados para lidar com as pessoas nos processos de transformaes organizacionais? Paul Hersey e Kenneth Blanchard (1974) afirmam que: muitos dos nossos problemas decisivos no esto no mundo das coisas, mas no mundo das pessoas. O maior fracasso do homem tem sido sua incapacidade para conseguir cooperao e compreenso dos outros.

Se no mbito do indivduo essa uma dificuldade concreta, no mbito dos grupos a realidade no parece diferente. Os mesmos autores mostram que o tempo e as dificuldades necessrios para se operar alteraes crescem conforme os nveis da mudana em que se deseja atuar, obedecendo-se ordem: 1) conhecimento 2) atitudes 3) comportamentos individuais e 4) comportamentos de grupo.

Alterar comportamentos dos grupos, portanto, exige que se amplie a compreenso dos fenmenos que neles ocorrem. Para isso, necessrio v-los enquanto fenmenos nicos e individuais, cujos processos e mecanismos de interao no podem ser conhecidos apenas decompondo-os e analisando seus membros individualmente, (Lewin in Mailhiot, 1977).

Consideraes Bsicas Sobre a Cincia da Dinmica dos Grupos

Segundo Cartwright e Zander (1975), a literatura a respeito de grupos remonta a um passado distante. Mills (1967), no entanto, afirma que a pesquisa cuidadosa, o estudo cientfico de grupos em grande parte um fenmeno do sculo XX, e que seu desenvolvimento se deu notadamente aps o incio da dcada de 40.

O termo dinmica de grupo foi introduzido por Kurt Lewin sendo a ele espontaneamente associado (Mailhiot, 1977). Foi ele quem forneceu dinmica de grupo suas hipteses de trabalho mais vlidas, muito embora seja injusto associ-lo simplesmente criao desta ltima (Roza, 1974).

Mas do que trata exatamente a cincia da dinmica de grupos?

Em uma observao superficial, fcil relacionar precipitadamente o estudo da dinmica dos grupos com as tcnicas de manipulao de grupos to utilizadas em treinamentos e cursos vivenciais (Cartwright e Zander, 1975). Os mesmos autores, no entanto, conferem dinmica de grupo um sentido mais amplo quando afirmam que este um campo de pesquisa dedicado a obter conhecimento a respeito da natureza dos grupos, das leis de seu desenvolvimento e de suas inter-relaes com os indivduos, outros grupos e instituies mais amplas. Quando se fizer meno dinmica de grupo nesse estudo, a esta definio que se estar referindo.

importante assinalar que h entre os vrios cientistas sociais algumas distines sobre a definio de grupos, as quais no implicam em diferenas conceituais significativas para efeito desse estudo. Pequenos grupos, microgrupos, grupos face-a-face ou simplesmente grupos sero aqui considerados sinnimos. Uma distino aqui relevante, no entanto, feita por Lewin (in Mailhiot, 1977), entre o scio-grupo, aquele estruturado e orientado em funo de uma tarefa, e o psico-grupo, aquele que objetiva sua prpria formao, estruturado e polarizado sobre si prprio. Nesse sentido, o termo grupo aqui empregado se referir sempre ao scio-grupo.

Dinmica e Gnese dos Grupos

Partindo-se da definio de Cartwright e Zander (1975), conclui-se que a compreenso dos grupos envolve, portanto, trs aspectos fundamentais: 1) compreenso de sua natureza, 2) apreenso das leis que regem seu desenvolvimento e 3) o entendimento de como se do as interaes do indivduo com seu grupo, do grupo com outros grupos e deste com as demais instituies que o envolvem.

Dizer que os grupos possuem uma natureza deriva do pressuposto gestaltista de que o grupo diferente da simples soma de suas partes constituintes, como afirmou Lewin (in Roza, 1974). A conseqncia disso que o grupo passa a ser considerado um todo dinmico, o que, segundo o autor, implica que sua definio se fundamenta na interdependncia entre suas partes. As semelhanas ou as diferenas entre os membros do grupo, por exemplo, passam a ser menos importantes na definio das propriedades do grupo do que como se d a interdependncia entre seus membros (Roza, 1974).

Por sua vez, para reconhecer as leis que regem o desenvolvimento do grupo, necessrio vislumbr-lo como um organismo biolgico, conforme descrito no modelo organsmico citado por Mills (1967). Segundo esse modelo, um grupo se forma, cresce e atinge um estado de maturidade obedecendo sua maneira natural, seu plano de desenvolvimento predeterminado, embora este seja originalmente desconhecido, seja por um observador externo a ele seja por qualquer um de seus membros. Tal qual um organismo vivo, o grupo se desenvolve no sentido de vir a ser aquilo que tem potencial para ser, o que resulta da interrelao dos potenciais individuais de seus membros e diferente destes isoladamente.

Por este modelo, os principais balizadores do desenvolvimento do grupo seriam sua busca por auto-realizao e sua orientao para a autopreservao, seja pela proteo dos perigos externos, seja pela explorao de seu ambiente para satisfazer suas necessidades Mills (1967). O modelo ciberntico para a anlise dos grupos, por sua vez, preconiza ainda que o grupo tem condies de aumentar suas capacidades atravs de mecanismos de feedbacks, o que o transportaria de estgios menos desenvolvidos como de adaptao, passando subseqentemente para o de realizao de objetivos, integrao e o ltimo e mais desenvolvido, de manuteno e extenso de padres, onde o grupo seria capaz de transmitir sua cultura e capacidade aos novos membros, formular a experincia e a aprendizagem do grupo em modo permanente e transmiti-los a outros grupos e posteridade.

Sob o aspecto da interao, importante reconhecer que o grupo uma unidade total em desenvolvimento e essa sua totalidade se assenta no sobre as semelhanas entre seus membros (que podem inclusive nem existir), mas sobre a interdependncia entre estes (Mills, 1967). Para o autor essa interdependncia se manifesta atravs do sistema de interao entre os indivduos e de seus comportamentos padronizados e formas ordenadas (freqentemente ritualizada) de interagir.

Do ponto de vista intragrupal, compreender esse sistema de interaes implica em compreender como so distribudas as atividades entre os membros do grupo, que tipo de rede de comunicao se forma entre seus membros (uma vez que esta tem grande influncia sobre a eficincia do grupo na soluo de problemas e na satisfao pessoal de seus integrantes), quais as variveis que esto influenciando o nvel de interao entre os participantes e como esta se d, etc. (Mills, 1967).

Finalmente, em um aspecto mais amplo, preciso lembrar que os grupos no podem ser analisados sozinhos, como se estivessem fora de um contexto social, e se comportassem como um sistema fechado e isolado daquele. Para Lewin (in Roza, 1974), decorre da a importncia de se reconhecer o carter da atmosfera social onde se situa o grupo, sua estrutura e relaes.

Mtodo de Estudo

Conforme j assinalado anteriormente, o objeto desse estudo o processo de mudana ocorrido em uma empresa de mdio porte do setor industrial brasileiro. Visando-se preservar a identidade da companhia ela ser aqui denominada simbolicamente de PEP-5. O corpo executivo com o qual primordialmente todo o trabalho foi implementado ser denominado de Comit Executivo e originalmente compunha-se de do Presidente, do Gerente Comercial, do Gerente Industrial e do Gerente Financeiro da empresa.

Este projeto iniciou-se em dezembro de 1998, quando a PEP-5, mediante seu principal executivo, decidiu contratar uma equipe de consultores para ajud-lo no processo de mudana que julgava necessrio companhia. Nesse estudo, quem narra o caso um dos consultores que levaram o projeto adiante. O caso finaliza em maro de 2000, com a consultoria se retirando do cliente e este dando seqncia ao novo processo de gesto da companhia.

Os dados coletados para a descrio e anlise do caso provm da prpria pesquisa e ao do autor na interveno da empresa cliente. O mtodo utilizado de pesquisa classifica-se como estudo de caso que, segundo Mattar (1993), uma forma de aprofundar o conhecimento de problemas no suficientemente definidos. Ele pode envolver exame de registros existentes, observao de acontecimentos, entrevistas estruturadas e no estruturadas, etc.

Embora o processo de interveno tenha ocorrido em todos os mbitos da organizao, sua estrutura, estratgias e pessoas, nesse estudo ser dada nfase ao desenvolvimento de todo o processo junto ao Comit Executivo, uma vez que este foi considerado o plo construtor e disseminador da referida mudana.

Descrio do Caso

A PEP5 uma indstria situada em So Paulo e foi fundada h 35 anos. Na maior parte de sua histria atuou principalmente no mercado de livros e nos ltimos anos vem ampliando sua participao no mercado de revistas.

A empresa faz parte de um grupo que detm vrias outras companhias em segmentos diversos. A PEP5 administrada por um presidente, que responde ao conselho do grupo controlador, e comanda o Comit Executivo, formado por 3 gerentes (comercial, produo e financeiro). Abaixo desses na estrutura hierrquica da empresa encontram-se vrios supervisores de reas, chefes de seo e finalmente os demais colaboradores da empresa. No incio deste projeto (dez/98) a empresa possua cerca de 350 funcionrios e faturava cerca de R$ 35 milhes / ano.

Uma situao de dificuldades

Apesar de sua tradio no mercado, a PEP5 passava por algumas dificuldades significativas conforme relatado por seu principal executivo durante a contratao do projeto:

Perda de lucratividade e endividamento da empresa, face ao alto ndice de retrabalho dos materiais produzidos e ao aumento do custo de matrias primas no mercado externo (papel)

Grande concorrncia em seu mercado de atuao

Grande nmero de falhas no processo produtivo, relacionadas com a atuao humana

Fortes traos paternalistas no estilo de gesto

Alta preocupao dos lderes de no magoar as pessoas

Crena reinante entre as pessoas de que nada muda na PEP-5

Decises lentas e que no transformam-se em aes efetivas

Existncia de diversos feudos dentro da organizao e muitos conflitos entre eles

Quando o presidente da empresa contatou o grupo de consultores, sua inteno inicial era implantar um modelo de remunerao varivel que incentivasse uma viso mais empreendedora na equipe e estimulasse o desenvolvimento das pessoas. Aps algumas conversas com o mesmo, chegou-se a um consenso de que tal projeto seria insuficiente para mudar a realidade da empresa.

O projeto de mudanas

O projeto delineado pela consultoria apontava para mudanas fundamentais com relao estrutura da empresa, sua concepo de negcio bem como s pessoas que nela atuavam. Resumidamente tal projeto abrangia:

Estrutura: Mudana do modelo de uma grande estrutura para a atuao em cinco grandes unidades de negcio, com lderes, processos, clientes e resultados especficos

Negcio:Reconcepo do negcio em que a empresa estava, de modo a se buscar novos nichos de mercado onde o valor agregado dos produtos fosse maior

Pessoas:Mudana na formao do Comit Executivo, no modo como o mesmo era gerido, como seus membros lideravam seus subordinados, de forma a criar novos paradigmas para a gesto de pessoas na organizao

Ao se identificar as linhas gerais da mudana necessria no se definiu de imediato exatamente o que seria realizado. A idia dos consultores era procurar solues negociadas com as pessoas da organizao para os diversos problemas desta, fazendo isso em um crescente, primeiramente com o Comit Executivo, em seguida com os lderes de rea e finalmente com todos os funcionrios da organizao.

Assim, o processo de implantao evolui conforme as etapas que seguem.

1. Identificao do problema e formulao do plano de mudanas

Essa fase foi implementadas em aproximadamente 3 meses, mediante reunies peridicas (semanais ou quinzenais), entre os consultores e o Comit Executivo. Os encontros eram realizados fora da empresa e tinham durao de 1 ou dois dias. Tudo quanto foi realizado nessa fase tinha duas vertentes, uma voltada para a tarefa (criao mediante consenso de um plano de mudanas) e outra para as relaes (modificao da dinmica de funcionamento do grupo, que reduzia sua eficincia).

Do ponto de vista tcnico, a soluo inicial apresentada pela consultoria de reconceber a empresa e dividi-la em unidades de negcio parecia interessante, no entanto, conforme previsto, sua implementao encontrou fortes resistncias iniciais em alguns membros do comit executivo. Embora alegassem dificuldades tcnicas para sua implementao, os motivos subjacentes e mais verdadeiros pareciam se relacionar com questes comportamentais (medo do novo, mudana de poder, etc.).

O resultado dessa fase, alm da formulao do referido plano de trabalho, foi o desligamento do Gerente Financeiro e do ingresso de 3 novos executivos nesse grupo. Assim, o novo Comit Executivo passou a ser formado pelo Presidente da companhia, por quatro gerentes de unidades de negcio (dois antigos participantes do comit e dois recm-promovidos a essa condio) e um gerente da unidade de apoio, que at ento atuava na rea administrativa financeira.

2. Negociao das solues com os demais funcionrios

At o final da etapa anterior, todas as discusses estavam circunscritas ao Comit Executivo. Nessa fase, que durou cerca de 4 meses, foram divulgadas as principais mudanas para toda a empresa, mantendo-se a lgica do que fora feito anteriormente com o grupo executivo. Em encontros peridicos procurou-se aumentar a percepo das pessoas para a necessidade de mudanas a serem realizadas na companhia, realizando-se grupos de discusso para se falar das dificuldades pelas quais ela e as demais empresas do setor passavam, para explicar o sentido das mudanas que seriam implementadas e buscar sugestes para sua implementao.

A exemplo do que ocorreu na primeira fase, propositadamente muitas questes tcnicas ainda no foram previamente definidas, como, por exemplo, quais pessoas trabalhariam em quais unidades de negcio e quais os novos procedimentos de operao de cada rea. Tambm nessa fase a idia central era, a partir de um sentido de mudanas concebido, definir os detalhes de como a mesma seria realizada juntamente com os trabalhadores que iriam lev-la adiante.

Embora a estratgia utilizada tenha sido de modo geral bem sucedida, muitas foram as dvidas, confuses e ansiedades desde o momento que se iniciou o anncio do projeto. Como tambm era de se esperar, muitos grupos, sedentos por mudanas, abraaram fortemente as novas bandeiras, ainda que de fato desconhecessem a fundo seu teor. Outros, temerosos de perder posies j conquistadas, opuseram fortes resistncias a elas.

Um dos principais resultados dessa fase parece ter sido a consolidao das definies feitas anteriormente. Ao discutirem as mudanas com as equipes de trabalho, os membros do Comit Executivo solidificavam suas prprias convices sobre o processo e afirmavam seu compromisso em pblico de lev-las at o fim, o que enfraquecia vrias opinies existentes na empresa de que tudo aquilo no duraria alguns meses, at que as coisas voltassem ao normal.

3. Implementaes

Ao final da fase anterior as dvidas fundamentais que mais causavam ansiedade e confuso na PEP-5 j haviam sido esclarecidas. A maioria das pessoas j estava locada em suas novas reas, todos compreendiam razoavelmente bem os motivos pelos quais as mudanas estavam sendo realizadas, a grande maioria comeava a apoi-las e os principais focos de resistncias tinham sido minimizados.

Apesar disso, os ganhos operacionais de eficincia inicialmente previstos estavam longe de serem alcanados. Impossibilitados de utilizar os antigos procedimentos operacionais, que no se adequavam nova estrutura, e incapacitados de utilizar os novos mtodos, ainda no suficientemente disseminados, as pessoas sentiam-se frustradas e paralisadas.

Nessa fase, enquanto o Comit Executivo se reunia semanalmente com a consultoria para avaliar o processo de mudanas e desenvolver novos modelos de liderana, seus membros conduziam processos de desenvolvimento de novos grupos junto aos lderes de rea e aos grupos de trabalho.

Novas ferramentas de gesto participativa foram implementadas junto ao Comit Executivo e subseqentemente difundidas por toda a organizao. Os avanos conseguidos na dinmica desse grupo, tais como, melhoria na comunicao intragrupal, maior transparncia nas relaes, decises mais slidas baseadas no consenso do grupo, maior sinergia de grupo na utilizao do potencial de seus membros, clima mais amistoso entre os participantes, etc., eram sentidas em seguida pelas demais pessoas ligadas ao Comit Executivo.

No existe um marco preciso que aponta o incio e o final desta fase. Ela se desenvolveu ao longo de aproximadamente 8 a 12 meses, tendo se iniciado com a implantao de novos controles gerenciais na empresa e novos modelos de remunerao, to logo as principais dvidas dos funcionrios foram sendo sanadas.

Anlise do Caso

Em grande medida, o histrico de desenvolvimento do caso PEP-5 est diretamente relacionado com o desenvolvimento de seu Comit Executivo. Na verdade, uma das suposies que embasaram o projeto original, era que mudanas organizacionais profundas somente seriam levadas a cabo na organizao se forem iniciadas no alto escalo da empresa e da infiltrada nos nveis mais baixos, conforme preconizou Warren G. Bennis (1969).

Por sua vez, o Comit Executivo tinha como elemento principal o Presidente da empresa que, pela sua posio formal na hierarquia e tambm pelas funes que desempenhava, influenciava-o. Sua participao no grupo at ento era marcada pela presena permissiva, sem grandes interferncias nas rotinas operacionais da empresa. Dedicava grande parte de seu tempo a tratar das relaes entre as pessoas, incentivar o dilogo e raramente impunha decises pessoais ao grupo. As pessoas mais prximas o definiam como um sujeito educado e cordial.

Alm de seu lder, o grupo possua seus personagens simblicos e bem definidos. O Gerente Comercial era o espelho da liderana, afvel, fortemente orientado para as pessoas e considerado muito hbil em conquistar os clientes e o apreo de seus subalternos. Para seus opositores era apenas um relapso e enrolo, para seus aliados, um amigo. O Gerente Industrial, por sua vez, era de esprito prtico, engenheiro de formao, guardava imagem de rigidez, porm, era considerado tecnicamente muito competente e fortemente cumpridor de deveres. Um chato e autoritrio para alguns, um sujeito transparente e direto, para outros. O quarto membro do grupo era o Gerente Administrativo Financeiro. Na viso de muitos, um burocrata por profisso, reticente s inovaes e preso s regras da matemtica financeira. Para outros, no entanto, era o fiel defensor das normas e das polticas internas.

A dinmica do grupo

A base da autoridade dentro no Comit Executivo residia fortemente na capacidade de seu lder de articular relaes com pessoas chaves na empresa e em seu relacionamento exclusivo com os acionistas. Alm de ser quem formalmente respondia pela empresa, era o nico que mantinha contatos formais e peridicos com o conselho diretor do grupo de investidores que a controlava.

A relao de autoridade reinante no grupo antes do projeto de mudana era de dependncia-proteo com relao autoridade, aquela onde os subordinados consideram a autoridade amvel, benfica e sensvel s necessidades dos outros, de modo geral, uma fonte inexaurvel de proteo (Mills, 1967).

O modelo de comunicao preponderante entre os membros do Comit mais se assemelhava ao que Leavit (in Mills, 1967) chamou de roda, onde todos se dirigiam ao elemento central, o Presidente, e raramente se comunicavam entre si, at mesmo porque os cimes e as disputas pelas preferncias do chefe os dividiam e impediam um contato mais prximo entre eles, condio fundamental para que a comunicao se estabelecesse, segundo Lewin (in Roza, 1974).

Semanalmente o grupo se reunia para tratar de questes da operao da empresa. O clima de trabalho no grupo era de uma suposta harmonia. Alguns de seus membros mantinham atividades de convvio alm dos limites do trabalho, jogavam, saam ou bebiam juntos. As discusses de trabalho, no entanto, eram marcadas por conflitos no declarados, e as decises tomadas nessas reunies, dificilmente eram levadas adiante, uma vez que faltava a quem fosse incumbido de coloc-las em prtica, o apoio necessrio dos demais para isso.

Nesses encontros, um conjunto mais ou menos padronizado de comportamentos se seguia a cada semana. Algum trazia ao Presidente um problema que necessitava de soluo conjunta ou pelo menos do consentimento de todos para que pudesse ser equacionado de uma ou outra forma. Discutiam-se horas a fio. As partes colocavam suas consideraes, mais preocupados com a defesa de interesses especficos e utilizando-se para isso posturas visivelmente reativas, ou tecendo consideraes divergentes ou mesmo pouco relacionadas s questes principais em discusso. Em geral, as reunies entravam noite dentro at que, por fim, cansados, todos aprovavam ou consentiam com uma resoluo qualquer para que todos pudessem ir embora.

Em algum momento das semanas posteriores algum se lembrava de cobrar o que tinha ficado por ter sido realizado. Como a soluo no tinha sido implementada, utilizava-se a reunio para discutir os motivos pelos quais no havia sido. Feito isso, o assunto era ento esquecido e o ciclo se fechava at a prxima questo em aberto ser discutida.

Nessa fase, consideraes sobre a noo de ns eram raramente feitas pelos membros do Comit Executivo. Seus membros agiam prioritariamente em funo de objetivos parciais (pessoais ou de suas reas) e, mesmo quando tais objetivos eram semelhantes, a exemplo do preconiza Mills (1967), esses no constituam objetivo de grupo.

O Processo de Mudana no Grupo

A lgica do processo de mudanas operado no Comit Executivo da PEP-5, descrito anteriormente, teve como objetivo fundamental proporcionar o crescimento do grupo e das pessoas que dele faziam parte. Crescimento, conforme conceituado por Mills (1967) no um aumento de seu nmero de participantes, mas um aumento em suas capacidades para atender a amplitude maior de exigncias possveis, o que implicaria, ainda segundo o mesmo autor, levar o grupo a passar de nveis mais primitivos de comportamento e emoo para nveis mais complexos, que incluem uma compreenso da cultura e do objetivo do grupo, aumentando o potencial de seus membro enquanto pessoas e proporcionando ampliao das capacidades do grupo.

Para isso, foi necessrio primeiramente aumentar a percepo do grupo para sua prpria realidade, abrindo-lhes a percepo para novas informaes e novos contatos. Tal processo se aproxima muito do que Lewin (in Hersey e Blanchard, 1974) chamou de descongelamento, cujo objetivo principal motivar e fazer com que os indivduos fiquem preparados para a mudana.

No caso da PEP-5 procurou-se atingir tais objetivos, retirando-se as pessoas de seu espao fsico habitual, trazendo novas informaes que permitissem ver sob outras perspectivas os problemas do grupo e da empresa, e, fundamentalmente, criando um clima de abertura onde os cursos de ao possveis fossem de fato decididos a partir da ampla discusso entre seus membros e no lhes fossem entregues de modo j pr-concebidos.

Um dos pressupostos fundamentais dessa fase era que a participao ativa dos membros do Comit Executivo na discusso e na formulao do projeto de mudana, aumentaria significativamente o compromisso de seus membros com sua implementao, ainda que tal processo despendesse tempo muito maior do que o simples anncio das alteraes a serem realizadas (Lewin, in Roza, 1974). Alm disso, esperava-se que as solues criadas pudessem ser mais satisfatrias se fossem reunidas as diversas capacidades de seu grupo.

J durante a fase de identificao do problema alguns sinais foram aparecendo, dando mostras de que o grupo avanava rumo imerso em nveis mais complexos de interao. Entre outros, percebiam-se uma substituio da apatia inicial s discusses pela procura de novas informaes para subsidi-las, maior receptividade s diferenas individuais, maior cumprimento de prazos de realizao das tarefas prescritas para serem feitas entre um encontro e outro, mudana (inicialmente no nvel do discurso) de eu para o ns e, finalmente, a insero no grupo de novos participantes, derivada tanto da necessidade tcnica de gesto da empresa, como da necessidade sentida pelos prprios membros do grupo original de arejar ainda mais suas percepes e ampliar suas fronteiras.

No caso da PEP-5 os novos elementos do grupo foram escolhidos no somente com base em suas competncia tcnicas, mas principalmente com base no quanto os aspectos fundamentais de sua personalidade e comportamentos pudessem colaborar para que o grupo viesse a ser aquilo que desejava.

De fato, os novatos no grupo proporcionaram oportunidade significativa para os antigos perceberem novos modelos de interao dentro do Comit Executivo e mantiveram com estes relaes de trocas bastante construtivas. Como eram agora jovens executivos, estavam ansiosos por demonstrar o quanto eram capazes, mas ao mesmo tempo, compreendiam haver uma enorme diferena de competncia, formao e experincias entre eles e os antigos do grupo de forma que no competiam em igualdade pelo poder dentro do grupo. Analogamente, os executivos veteranos sentiam-se confortveis, uma vez que no se sentiam ameaados pelos novatos, pelo menos de incio.

Passada essa fase inicial de formulao de solues e negociaes, o grupo visivelmente estava mais preparado para evoluir para alm de suas fronteiras originais. Subgrupos do Comit ou cada um de seus membros individualmente conseguia ser um emissrio deste perante os demais grupos da organizao traduzindo a contento um novo modo de pensar e agir. Mesmo os novatos em pouco tempo apresentavam um alto grau de conhecimento das normas do grupo e compactuavam com seus objetivos, resultando um grupo aparentemente mais coeso (Cartwright e Zander, 1975).

medida que os membros do Comit Executivo discutiam e divulgavam as mudanas para outros grupos da empresa, reforavam suas prprias crenas no processo. Por sua vez os recm-adentrados no Comit Executivo eram vistos simultaneamente como smbolos de um novo tempo e como modelos de identificao junto aos demais colaboradores. Por outro lado, as alteraes na estrutura da PEP-5 obrigavam os funcionrios a mudanas de comportamentos a fim de que conseguissem desempenhar adequadamente seus papis. Os mecanismos de identificao e interiorizao (Lewin in Hersey e Blanchard, 1974), e, em certa medida, o uso da fora da autoridade, foram fazendo com que os novos comportamentos fossem aprendidos e os indivduos, gradativamente adaptados nova situao.

Os momentos subseqentes consolidaram o processo de mudanas junto ao Comit Executivo atravs de trs mecanismos complementares. De um lado, o compromisso pblico que seus membros haviam assumido com a disseminao das novas idias impedia-os de recuar, ainda que em muitos momentos as dificuldades os impelissem a isso. De outro, um conjunto programado de reforos (com treinamentos, discusses e workshops) faziam com que o processo se consolidasse, atravs do que Lewin (in Hersey e Blanchard,1974) chamou de recongelamento dos comportamentos. Finalmente, as mudanas na estrutura da empresa tornaram eventuais retrocessos demasiado caros para a organizao e frustrante para as pessoas, fazendo com que o projeto fosse definitivamente levado adiante.

Concluses

O estudo apresentado sugere que o modelo de interveno mais adequado para proporcionar o desenvolvimento do grupo aquele onde o agente de mudanas deixa de lado suas experincias anteriores e procura, a partir de alguns parmetros vlidos, explorar a dinmica de seu grupo atual. Tal concluso est em consonncia com o que dizem Cartwright e Zander (1975), sobre o especialista em dinmica de grupos, quando afirmam que este deve recusar-se a iniciar suas investigaes supondo que j conhea suas respostas.

A anlise do caso refora tambm a importncia do comprometimento do alto escalo da empresa para que mudanas efetivas aconteam (Bennis, 1969). Muitas barreiras encontradas ao avano do processo na PEP-5 s puderam ser transpostas devido vontade pessoal de seu Presidente e do comprometimento de seu Comit Executivo, obtido em grande parte na fase de contratao do trabalho equipe de consultores e na primeira fase do projeto.

A exemplo do que sugere Wood (1995), processos de mudanas implicam uma viso ampla da realidade organizacional. Tentativas de mudanas organizacionais que no levem em considerao o indivduo, seu grupo e estrutura social onde estes se encontram, parecem ter poucas chances de serem bem sucedidas (Katz e Kahn, 1974).

Finalmente, o estudo deixa em aberto a explorao das conseqncias do referido processo de mudanas para os indivduos que trabalhavam na PEP-5. Uma viso superficial sugeriria, que as alteraes proporcionaram novas oportunidades de desenvolvimento e perspectivas para as pessoas, o que parece verdadeiro. Por outro lado, percebe-se tambm que existe um custo para que ele seja levado adiante, traduzido nas demisses ocorridas ou na prpria imposio de um ritmo de mudanas que pretere a capacidade do indivduo de suport-la em detrimento das necessidades do sistema.

Bibliografia

Bennis, Warren G. Organization development: its nature, origins, and prospects. Reading, Mass., Addison-Wesley Pub. Co.,1969

Cartwright, Dorwin e Zander, Alvin. Dinmica de Grupo Pesquisa e Teoria Vols. I e II.So Paulo: EPU (Editora Pedaggica e Unviersitria) / EDUSP (Editora da Universidade de So Paulo), 1975.

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