45
1 Conceitos fundamentais Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética [email protected] CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA EM PESQUISA/2005 EM PESQUISA/2005 Secretaria Estadual da Saúde de Santa Secretaria Estadual da Saúde de Santa Catarina Catarina

1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética [email protected] CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

1

Conceitos fundamentaisConceitos fundamentais

Marlene BrazDoutora em

Ciências/FiocruzPesquisadora em Bioética

[email protected]

CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA EM PESQUISA/2005ÉTICA EM PESQUISA/2005

Secretaria Estadual da Saúde de Santa Secretaria Estadual da Saúde de Santa CatarinaCatarina

Page 2: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

2

“Justiça e eqüidade são valores humanos essenciais. Respeitá-los é indispensável à paz e ao progresso, já que sem eles podem surgir ressentimentos e ocorrer desestabilizações. Embora as pessoas nasçam em circunstâncias sociais e econômicas bastante diversas, grandes disparidades em suas condições ou oportunidades de vida constituem uma afronta ao senso de justiça humano. Sempre que um grande número de cidadãos recebe tratamento injusto ou tem seus direitos negados, e sempre que não se tente corrigir flagrantes desigualdades, o descontento é inevitável e o conflito, provável. (...) Preocupar-se com a eqüidade não é o mesmo que insistir na igualdade, mas requer ações deliberadas para minimizar flagrantes desigualdades, lidar com os fatores que as causam ou perpetuam e promover uma distribuição dos recursos mais justa. Um compromisso maior com a eqüidade e a justiça é fundamental para que se aja de modo mais decidido, a fim de diminuir as disparidades e realizar uma distribuição mais equilibrada de oportunidades em todo mundo”. Relatório da Comissão sobre a Governança Global

Page 3: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

3

“Entre a liberdade e a justiça, me inclinaría pela justiça”.

Jorge Luis Borges. Escritor argentino.

“A justiça é uma construção humana, e é duvidoso que possa ser realizada de uma

única maneira”.Michael Walzer, 2001

“Os seres humanos necessitam justificar suas ações. Porém, as teorias da justiça podem ser

empregadas tanto para justificar como para reprovar soluções pragmáticas. Talvez, cumpram

sua função social mais importante criticando e repudiando a injustiça”.

James F. Drane, 1990

Page 4: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

4

O que é justiça?•Para que a queremos?

•Qual é sua utilidade?

•Qual é sua relevância?

•Onde procurá-la?

O que é Igualdade?

Justiça é a virtude de dar a

cada um o que é seu (?)

(PLATÃO)

Page 5: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

Problema de Problema de justiça justiça Problema de Problema de justiça justiça

Igualdade Igualdade Igualdade Igualdade LiberdadeLiberdadeLiberdadeLiberdade

DiferençDiferençaaDiferençDiferençaa

Igualdade de que?Igualdade de que?

Heterogeneidade básicaHeterogeneidade básica dos seres humanosdos seres humanos

Multiplicidade de variáveisMultiplicidade de variáveis para julgar a igualdadepara julgar a igualdade

Condição objetiva:Condição objetiva:escassez de escassez de

recursosrecursos

Condição subjetiva:Condição subjetiva:pluralismo moral pluralismo moral

(concepção de bem (concepção de bem e justo variam)e justo variam)

Page 6: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

Punição para aqueles quePunição para aqueles quedesrespeitam as leis oudesrespeitam as leis ou

desconsideram normas sociaisdesconsideram normas sociaise morais geralmente aceitase morais geralmente aceitas

Compensação para os queCompensação para os que sofreram danos ou injúrias sofreram danos ou injúrias

Distribuição de cargas e Distribuição de cargas e benefícios na sociedadebenefícios na sociedade(bens sociais e recursos (bens sociais e recursos

materiais)materiais)

Teorias de justiçaTeorias de justiçaTeorias de justiçaTeorias de justiça

JustiçaJustiçaretributivaretributiva

Justiça Justiça compensatóricompensatóri

aa

Justiça Justiça distributivadistributiva

Page 7: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

7

Interpretações distintas

• Justiça como proporcionalidade natural (VI a XVII) – Direito natural: natureza e Deus

• Liberdade contratual- direitos humanos civis e políticos (estado liberal)

• Igualdade social – marxismo (produzir em função de sua capacidade e receber de acordo com sua necessidade.

• Bem estar coletivo – socialismo democrático (direitos negativos do estado liberal e direitos positivos: econômicos, sociais e culturais – educação, saúde, aposentadoria, emprego)

Page 8: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

8

Resumindo

“Dar a cada um aquilo que é seu”Gregos até medievo – desigualdade das pessoas –

tratamento desigual (escravidão)

Igualdade:Estado liberal – igualdade de todos perante

a lei - o próprioMarxismo – igualdade frente aos direitos

garantidos pelo Estado - o necessário

Page 9: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

9

Teorias atuais

• Introdução do conceito de desigualdade: desigual tratamento aos desiguais favorecendo os menos afortunados

• Conceito de pluralismo – respeito aos diferentes valores e interesses particulares

Page 10: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

10

Como avaliar o que é justo?

Dever ser(deontologia)

Ato em si

Finalidade / conseqüência(teleologia)

Conseqüência do ato

Page 11: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

11

O UTILITARISMO

Acredita que a justiça deve ser avaliada pelas conseqüências empíricas de

ações e princípios.

A difusão da autonomia e da liberdade individual deverá resultar na maior

felicidade para um maior número de pessoas, pois se admite a possibilidade de um equilíbrio racional entre os interesses

individuais e os interesses coletivos.

Page 12: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

UTILITARISMO

Julgamento moralJulgamento moral das açõesdas ações

Utilitarismo hedonistaUtilitarismo hedonista Utilitarismo de preferênciaUtilitarismo de preferência

(estados mentais:(estados mentais:prazer e dor)prazer e dor)

(satisfação ou frustração(satisfação ou frustração de preferências)de preferências)

Cálculo daCálculo dautilidadeutilidade

Concepções de bem-Concepções de bem-estarestar

Utilitarismo de Utilitarismo de açãoação

Utilitarismo de Utilitarismo de regraregra

Page 13: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

UTILITARISMO

ConseqüencialismoConseqüencialismoA avaliação moralA avaliação moral

focaliza-se sobre asfocaliza-se sobre asconseqüências da açãoconseqüências da ação

Bem-estarBem-estarAs conseqüências devemAs conseqüências devemser avaliadas em termosser avaliadas em termos

do nível de bem-estar produzidodo nível de bem-estar produzido

SomaSomaO bem-estar produzido é medidoO bem-estar produzido é medido

em termos da soma doem termos da soma dobem-estar dos indivíduosbem-estar dos indivíduos

Características centrais do Características centrais do utilitarismoutilitarismo

Page 14: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

UTILITARISMO

1.1. Dificuldades para medir e comparar a felicidadeDificuldades para medir e comparar a felicidadede pessoas diferentesde pessoas diferentes

2. A felicidade da maioria pode justificar o sacrifício2. A felicidade da maioria pode justificar o sacrifíciodos direitos e liberdades dos indivíduosdos direitos e liberdades dos indivíduos

4. Concebe-se os indivíduos meramente como4. Concebe-se os indivíduos meramente comoagentes racionais e auto-interessadosagentes racionais e auto-interessados

3. Não importa a distribuição da felicidade entre as3. Não importa a distribuição da felicidade entre as pessoas (indiferença distributiva)pessoas (indiferença distributiva)

5. A definição do bem-estar individual 5. A definição do bem-estar individual pode se influenciada por atitudes pode se influenciada por atitudes adaptativasadaptativas

(condicionamento mental)(condicionamento mental)

CríticasCríticas

Page 15: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

15

A respeito da justiça distributiva, a teoria utilitarista propõe a

quantificação de benefícios e encargos para depois escolher a

prática que maximize os primeiros e minimize os segundos.

Os custos e benefícios são quantificados em função da maioria da população, sem consideração dos

casos em particular.

Page 16: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

16

Com suas nuances, a teoria utilitarista foi e continua sendo amplamente

utilizada como critério de formulação de políticas públicas

(e, portanto, de alocação de recursos) pelos Estados Nacionais (Liberais ou

Socialistas), especialmente no campo da Saúde Coletiva.

Prioridade do bem (utilidade) sobre o justo

Page 17: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

17

Justiça como Igualdade

Todas as pessoas são iguais e merecem igual tratamento

frente à lei

Page 18: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

18

Justiça como eqüidadeA concepção de justiça como equidade,

embora muito antiga, foi formulada e sistematizada por John Rawls, em 1971.

Rawls se pergunta como devem ser feitos os acordos entre os sujeitos morais (autônomos) para alcançar uma sociedade “Bem -ordenada”.

Na tentativa de responder esta questão, começa sua teoria da justiça com a metáfora do

“Véu da Ignorância”, na que re-analisa a “situação original” dos sujeitos morais assinantes do contrato social.

Page 19: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

19

A teoria rawlsiana afirma que sobre a base do sujeito moral é possível conceber uma sociedade bem-ordenada, regida por princípios de justiça (coletivamente consensuais e racionais a partir da perspectiva do acordo original) e constituída por indivíduos que se consideram a eles mesmos e a outrem como sendo livres e iguais nas relações políticas e sociais.

Page 20: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

20

De acordo com Rawls, uma sociedade não pode ser considerada justa a menos que certos valores sociais básicos sejam igualmente distribuídos entre todos (Princípio de Igualdade) e que, no caso de ser necessária uma distribuição desigual de algum ou de todos estes valores sociais, a desigualdade deverá redundar em benefício para os mais necessitados (Princípio de Eqüidade)

Page 21: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

21

O que deve ser entendido por

eqüidade?“Eqüidade horizontal” Tratamento

igual aos iguais.

(todos são humanos)

“Eqüidade vertical” Tratamento desigual aos desiguais.

(há pessoas mais necessitadas)

Prioridade do justo sobre o bem

Page 22: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

22

Os bens sociais primários rawlsianos

A idéia central desta teoria da justiça baseia-se na necessidade

de considerar como valores básicos de distribuição as coisas que um homem racional (em sua condição de cidadão livre e igual )

considera necessárias durante toda uma vida, não importa o que mais ele deseje num determinado

momento.

Page 23: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

23

• Liberdades e direitos fundamentais • Liberdade de movimento e de

escolha de ocupação contra um plano de fundo de oportunidades

variadas• Capacidades e prerrogativas de

cargos e posições de responsabilidade nas instituições

políticas e econômicas da estrutura básica da sociedade

• Renda e riqueza • As bases sociais do auto-respeito

Page 24: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

24

“O fim da justiça social” consistiria em “maximizar a liberdade efetiva dos menos

favorecidos”, isto não se alcança nem com o

Utilitarismo nem com o Igual Tratamento, mas com a

Eqüidade

Page 25: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

25

A justiça como eqüidade é uma justiça procedimental pura

A justiça é procedimental pura quando não há outro critério para avaliar moralmente seus resultados que pelo fato de terem sido gerados por procedimentos considerados justos.

Page 26: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

26

Por outro lado, na justiça procedimental pura:

Não é necessário controlar a infindável variedade de circunstâncias nem as posições relativas mutáveis de pessoas particulares.São consideradas as necessidades de tipo padrão dos cidadãos que irão cumprir sua parte em um esquema de cooperação social bem ordenado

Abre um lugar substancial para a “responsabilidade individual” que se apóia na capacidade das pessoas assumirem as conseqüências das próprias ações e de moderar as exigências que fazem às instituições sociais de acordo com o emprego dos bens primários

Page 27: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

Teoria das capacidades

Amartya SenAmartya Sen

Page 28: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

28

Sen acredita que os bens primários rawlsianos não constituem um parâmetro apropriado de distribuição eqüitativa desde que não dão atenção à “liberdade substantiva” das pessoas.

O problema, segundo Sen, é que as “diversidades pessoais” podem afetar a possibilidade de converter os bens primários (incluída a renda) em bem-estar.

AMARTYA SEN

Page 29: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

29

Sen critica o enfoque da economia tradicional

segundo o qual, o bem-estar de uma pessoa é

avaliado pelo seu domínio sobre

bens e serviços.

Sen afirma que este pressuposto

leva à focalização da

variável “renda”

(i.e.: quanto cada pessoa pode consumir).

Page 30: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

30

Sen elabora uma teoria que parte de uma distinção fundamental entre o que significa a “satisfação individual” welfarista (avaliado pela prerrogativa da renda) e o que ele define como “vantagem individual”

A “vantagem individual” é uma categoria avaliatória de bem-estar mais abrangente que permite conceber os “bens individuais” (num sentido amplo, os interesses racionais dos indivíduos) como passíveis de comparação e ordenação.

Page 31: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

31

O bem-estar alcançado através da renda não é uma medida

suficiente da vantagem individual

“As comparações interpessoais de vantagens deveriam se basear,

sobretudo, na liberdade (Substantiva) de alcançar bem-

estar e de escolher entre diferentes tipos de vida”

Page 32: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

32

Sen propõe uma concepção pluralista da justiça distributiva em que o que deve ser igualado são os “funcionamentos básicos das pessoas”, entendidos como a igual capacidade de ação para

obter bens e serviços sociais com liberdade substantiva.

Page 33: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

33

Na perspectiva seniana, a vantagem individual deve ser avaliada pelas oportunidades que uma pessoa tem para alcançar bem-estar,

desta maneira não se valoriza um tipo de vida específico e sim, a

capacidade de escolher (liberdade) entre distintos tipos de vida que as pessoas têm razões para valorizar.

Page 34: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

34

Numa sociedade comprometida com a capacidade igual de funcionar, o nível de bem-estar que cada um alcança, sempre dependerá das

preferências, valores e escolhas de cada qual.

A liberdade de escolha entre diferentes tipos de vida tem um

valor intrínseco que não é captado quando apenas a titularidade de

bens e recursos é levada em conta.

Page 35: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

35

A crítica de Sen a Rawls

A métrica dos bens primários é demasiado inflexível frente às variações interindividuais que fazem com que seja mais difícil para uns do que para outros converter bens primários em capacidade

Somente o foco na capacidade de funcionamentos, em lugar de bens primários, pode captar aquilo (a liberdade em si mesma) que os igualitários de fato prezam

Page 36: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

36

• “Ser carentes de capacidades e talentos consiste numa limitação da liberdade de ter e fazer escolhas”

• A igualdade deve enfocar o funcionamento básico das pessoas

• Não é o que se tem que importa, mas como se funciona (oportunidades para alcançar o bem estar e de escolher entre diferentes tipos de vida)

Page 37: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

37

• Deve-se desviar a atenção da avaliação de desigualdades feita em função de resultados e realizações para a avaliação de desigualdades de oportunidades.

• O foco na igualdade de bens primários fez com que este deslocamento permanecesse incompleto.

• A preocupação não é com os bens primários em si mesmos, mas com que as pessoas, em função de variações individuais significativas, são capazes de fazer com esses bens

Page 38: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

38

Judith Shklar e a cidadania

A base da legitimidade da justiça numa sociedade democrática não deve

ser buscada na “situação originária” do contrato social, mas nas

origens da luta pela cidadania moderna.

Page 39: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

39

“a cidadania moderna emergiu em oposição ao simples status de

‘sujeito’(...) a própria idéia dos direitos do cidadão sempre foi uma tomada de

atitude contra a autoridade estabelecida, que é sempre suspeita”

É o medo à injustiça mais do que a busca pela justiça em si mesma que caracteriza

a cidadania.

Como deve ser entendido o conceito “cidadania” nas sociedades modernas

pluralistas (repúblicas extensas)?

Page 40: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

40

As repúblicas extensas estão constituídas por “agregados de

estrangeiros”, sem ter em comum nem antepassados, nem ideologia, nem “consenso velado” (Rawls) ou

“compreensão compartida” (Walzer) com que se iniciam estas famosas teorias contratualistas da

justiça.

Page 41: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

41

Para Shklar, há um certo “reducionismo” nas teorias ao considerar apenas a

existência de “provedores”, que distribuem os recursos existentes conforme as leis gerais aceitas por

todos, e “consumidores”, que exigem igualdade de direitos e igualdade de

possibilidades, pois isto é ver a justiça só desde o ponto de vista do governo.

Ela está especialmente preocupada com “a justiça que os cidadãos se devem reciprocamente e não só aquela que é

distribuída pelos agentes públicos”

Page 42: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

42

Saúde e Educação

“não são nem a necessidade, nem o mérito os que alegam em favor da

educação e o bem-estar, mas o fato de se tratar dos meios necessários para

fortalecer a cidadania”

“falar em igualdade é só uma brincadeira se não se dispõe dos meios para

compreender o que está em jogo, nem do tempo necessário para dedicar às

questões políticas”

Page 43: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

43

“A exclusão é a primeira forma de injustiça, a mais degradante”

“O fim último da justiça distributiva não seria a distribuição igualitária de bens sociais, mas a inclusão”

“A exclusão social deve ser o objeto principal que permita pôr à

prova as teorias da justiça”

Page 44: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

44

Embora as concepções pluralistas da justiça não constituam uma

solução mágica para os problemas da exclusão,

oferecem recursos mais amplos para a luta contra a exclusão.

Justificam, principalmente, valer-se de todas as formas de ação

associativas da cidadania.

Page 45: 1 Conceitos fundamentais Marlene Braz Doutora em Ciências/Fiocruz Pesquisadora em Bioética braz@iff.fiocruz.br CURSO PARA CAPACITAÇÃO DE COMITÊS DE ÉTICA

45

Mais esse é assunto para outra aula...

Muito obrigada!!!