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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO LINHA DE PESQUISA: ORGANIZAÇÃO ESCOLAR, FORMAÇÃO E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS ROSELY RIBEIRO LIMA O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM DA LÍNGUA PORTUGUESA: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE PROFESSORAS DOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL CUIABÁ - MATO GROSSO MARÇO DE 2013

1 O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE LÍNGUA … · professoras que trabalham de 1º ao 5º ano do ensino fundamental do sistema público municipal urbano do município de Jataí,

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Page 1: 1 O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE LÍNGUA … · professoras que trabalham de 1º ao 5º ano do ensino fundamental do sistema público municipal urbano do município de Jataí,

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

INSTITUTO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

LINHA DE PESQUISA: ORGANIZAÇÃO ESCOLAR, FORMAÇÃO E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

ROSELY RIBEIRO LIMA

O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM DA LÍNGUA PORTUGUESA:

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE PROFESSORAS DOS ANOS INICIAIS DO

ENSINO FUNDAMENTAL

CUIABÁ - MATO GROSSO

MARÇO DE 2013

Page 2: 1 O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE LÍNGUA … · professoras que trabalham de 1º ao 5º ano do ensino fundamental do sistema público municipal urbano do município de Jataí,

ROSELY RIBEIRO LIMA

O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM DA LÍNGUA PORTUGUESA:

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE PROFESSORAS DOS ANOS INICIAIS DO

ENSINO FUNDAMENTAL

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação

(PPGE), Instituto de Educação (IE), Universidade Federal de Mato

Grosso (UFMT), como parte dos requisitos para obtenção do título

de Doutora em Educação; área de concentração: Educação; linha

de pesquisa: Organização Escolar, Formação e Práticas

Pedagógicas.

PROFESSORA DOUTORA FILOMENA MARIA DE ARRUDA MONTEIRO

ORIENTADORA

PROFESSOR DOUTOR CARLO RALPH DE MUSIS

COORIENTADOR

CUIABÁ - MATO GROSSO

MARÇO DE 2013

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DEDICO ESTE TRABALHO

A todos os professores dos anos iniciais do ensino fundamental:

profissionais que merecem reverências pelos esforços enfrentados nas práticas

educativas, também, pelas aprendizagens cidadãs fomentadas.

A todos os meus professores formadores: que me oportunizaram

compartilhar conhecimentos, valores, culturas, sentimentos e crenças, desde a

educação infantil até os períodos atuais. Cada um deles favoreceu muitas

aprendizagens, além do que eu poderia imaginar. Representando todos estes

profissionais, apresento meu respeito e consideração aos seguintes docentes:

Professora Filomena Monteiro, minha orientadora do curso de

doutorado, por sua delicadeza intelectual e de partilha, por sua sensibilidade para a

liberdade da aprendizagem, finalmente, por compreender como eu sou.

Professor Carlo de Musis, meu coorientador do curso de doutorado, por

sua áurea de proteção e cuidado, pessoa sábia e solidária, que me amparou neste

processo formativo. Sem suas atitudes de generosidade, principalmente aquela

presenciada na residência da nossa querida Solange Dias, eu não teria continuado e

terminado este curso.

Professora Eugênia Paredes, minha orientadora do curso de mestrado,

minha dívida de gratidão continuará para todo o sempre. Exemplo de pessoa rigorosa

em relação à produção científica e genial com o que acredita.

Professoras da banca examinadora, Rosa Maria de Oliveira, Lúcia

Maurício, Jorcelina Fernandes, Helena Fontoura e Daniela Andrade, pelas preciosas

contribuições reflexivas enviadas ao presente trabalho.

Professora Solange Dias, minha querida amiga, por ser um exemplo de

pessoa, de professora, de amiga, de mãe, de companheira, de patroa...

Professora Maria Gracilene Lima, minha querida mãe, que me levou em

tantos momentos formativos em meio às suas aulas nos primeiros anos do ensino

fundamental. Ela me permitia ser sua colega-professora-assistente, mesmo eu sendo

apenas uma criança.

A todos os professores que se firmam e se formam na profissão e que

defendem e praticam uma educação transformadora e de qualidade.

Page 6: 1 O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE LÍNGUA … · professoras que trabalham de 1º ao 5º ano do ensino fundamental do sistema público municipal urbano do município de Jataí,

A Deus pelo mundo e por minha vida!

À minha família, meu pai Moacir Mecenas de

Lima; minha mãe Maria Gracilene Ribeiro Lima; meu

namorado Francys Pimenta de Faria; minhas irmãs

Lívia Ribeiro Lima Furtado e Suzana Ribeiro Lima

Oliveira; meus sobrinhos Mateus Lima Furtado, Vitor

Oliveira Lima e Christiano de Oliveira e Silva Filho,

por me enviarem incessantemente seus melhores

sentimentos e cuidados, que foram energizados

diretamente rumo ao meu coração, reavivando

constantemente a minha existência! Amo muito

vocês!

Obrigada!

AGRADECIMENTOS ESPECIAIS

Page 7: 1 O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE LÍNGUA … · professoras que trabalham de 1º ao 5º ano do ensino fundamental do sistema público municipal urbano do município de Jataí,

AGRADECIMENTOS

Todo o trabalho aqui desenvolvido não teria sido possível sem o apoio e o

interesse demonstrado por tantas pessoas a quem agradeço amável e respeitosamente

pelo apoio e contribuição para a produção desta investigação. Cada um ao seu modo

me trouxe a certeza que tudo aquilo que é compartilhado traz felicidade e proporciona a

segurança que tudo dará certo no final. Obrigada queridas pessoas que me carregaram,

direcionaram e deixaram em mim a marca registrada do outro, de vocês em mim! Como

forma de reverência, quero citar cada pessoa que me ajudou a escrever este meu

processo formativo:

Adriana Tomasoni (discente - GEPForDoc/UFMT);

Alessandro Martins (vice-diretor – UFG/CAJ);

Alípio Rodrigues de Sousa Neto (professor - UFG/CAJ);

Ana Kátia Ferreira de Assis (Secretária Municipal de Jataí, período 2009-2011);

Ana Rafaela Pécora (professora - UFMT);

Ari Raimann (professor - UFG/CAJ);

Camila Alberto Vicente de Oliveira (professora - UFG/CAJ);

Carlo Ralph de Musis (professor e coorientador – PPGE/UFMT);

Carlos Alberto Caetano (discente - GEPForDoc/UFMT);

Christiano de Oliveira e Silva Filho (querido sobrinho);

Daniela Barros da Silva Freire Andrade (professora - UFMT - Examinadora Suplente

Interna);

Daniela da Silva Veiga (discente - bolsista-PROLICEN/UFG/CAJ);

Danielle Burgo Taveres (menina das transcrições – Engenheira Agrônoma);

Demilson Benedito do Nascimento (discente - PPGE/UFMT);

Dimas Moraes Peixinho (professor – UFG/CAJ);

Dinara Pereira Lemos Paulino da Costa (professora - UFG/CAJ);

Dionéia da Silva Trindade (amiga - secretária - Revista de Educação Púbica/UFMT);

Dirceu Luiz Hermann (professor - UFG/CAJ);

Edésio Fialho dos Reis (professor - UFG/CAJ);

Edson Gomes Evangelista (discente - GEPForDoc/UFMT);

Edward Madureira Brasil (Reitor – UFG);

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Ekristayne Medeiros de Lima Santos (professora - UFG/CAJ);

Elis Regina da Costa (amiga - professora - UFG/CAJ);

Elizabeth Gottschalg Raimann (professora - UFG/CAJ);

Elizandra de Siqueira (discente - PPGE/UFMT);

Eugênia Coelho Paredes (autora – pesquisadora);

Eunice Tavares Silveira Lima (professora - UFG/CAJ);

Eva Aparecida de Oliveira (professora - UFG/CAJ);

Fábio Mariani (discente - GEPForDoc/UFMT);

Fernando Silva dos Santos (professor - UFG/CAJ);

Fernanda Cândido (professora – UFMT);

Filomena Maria de Arruda Monteiro (coordenadora e orientadora – GEPForDoc/UFMT);

Francys Pimenta de Faria (querido namorado);

Glades Ribeiro Mueller (discente - GEPForDoc/UFMT);

Halline Mariana Santos Silva (professora - UFG/CAJ);

Helena Amaral Da Fontoura (professora - UERJ - Examinadora Suplente Externa)

Hercília Maria Fayão Beneti (professora - UFG/CAJ);

Imara Pizzato Quadros (discente - PPGE/UFMT);

Isa Mara Colombo Scarlati Domingues (professora - UFG/CAJ);

João Batista Pereira Cabral (vice-diretor – UFG/CAJ - período 2007-2011);

Jorcelina Elisabeth Fernandes (professora - UFMT - Examinadora Interna);

José Hilton Pereira da Silva (assistente administrativo – UFG/CAJ);

José Silvio de Oliveira (professor - UFG/CAJ);

Laís Leni Oliveira Lima (professora - UFG/CAJ);

Léa Lima Saul (secretária - Revista de Educação Pública/UFMT);

Leonor Paniago Rocha (professora - UFG/CAJ);

Lilian Auxiliadora Maciel Cardoso (discente - GEPForDoc/UFMT);

Lilian Ferreira Rodrigues Brait (amiga - professora – UFG;CAJ);

Lilian Rose Aguiar Nascimento Garcia de Santana (discente - PPGE/UFMT);

Lilian Simone Leal Machado Urzedo (discente - bolsista-PROLICEN/UFG/CAJ);

Lívia Ribeiro Lima Furtado (querida irmã);

Lúcia Helena Moreira de Medeiros Oliveira (professora - UFG/CAJ);

Lúcia Helena Rodrigues de S. Coelho (coordenadora - Secretaria Municipal de

Educação/Jataí);

Lúcia Velloso Maurício (professora - UERJ - Examinadora Externa);

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Luísa Maria Teixeira Silva Santos (secretária - PPGE/UFMT);

Luiz Augusto Passos (professor - PPGE/UFMT);

Lurdi Haas (pesquisadora - GEPForDoc/UFMT);

Magda Mattos (discente - GEPForDoc/UFMT);

Manoel Napoleão Alves de Oliveira (professor - UFG/CAJ);

Márcia Cristina Machado Pasuch (discente - PPGE/UFMT);

Márcia Santos Anjo Reis (professora - UFG/CAJ);

Maria Aparecida Abreu Vasconcelos (professora - UFG/CAJ);

Maria Aparecida Rezende (discente - PPGE/UFMT);

Maria Gracilene Ribeiro Lima (querida mãe);

Maria Liete Alves Silva (discente - PPGE/UFMT);

Marilda Soares (secretária – RH/UFG/CAJ);

Marina Silveira Martins (professora - UFG/CAJ);

Marinalva Oliveira (secretária executiva – UFG/CAJ);

Marta Maia de Assis Borges (professora - UFG/CAJ);

Mateus Lima Furtado (querido afilhado e sobrinho);

Maurélio Menezes (discente - PPGE/UFMT);

Michael Friedrich Otte (professor - PPGE/UFMT);

Michèle Tomoko Sato (professora - PPGE/UFMT);

Mírian Ross Milani (professora – IFET/MT);

Moacir Mecenas de Lima (querido pai);

Naiara dos Santos Nienow (discente - PPGE/UFMT);

Nicanor Palhares Sá (professor - PPGE/UFMT);

Paula Martins dos Anjos (discente - PPGE/UFMT);

Priscila de Oliveira Xavier (discente - PPGE/UFMT);

Priscyla de Castro Lima (amiga - fisioterapeuta);

Rita Domingues (pesquisadora - GEPForDoc/UFMT);

Rodney Garcia (revisor);

Rodrigo Franco de Carvalho (Secretário Municipal de Jataí);

Rosa Maria Moraes Anunciato de Oliveira (professora - UFSCAR - Examinadora

Externa);

Rosemeire Montanucci (pesquisadora - GEPForDoc/UFMT);

Sibele Neto de Moraes (secretária – RH/UFG/CAJ);

Silas Borges Monteiro (professor - PPGE/UFMT);

Page 10: 1 O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE LÍNGUA … · professoras que trabalham de 1º ao 5º ano do ensino fundamental do sistema público municipal urbano do município de Jataí,

Sílvia Correa Santos (diretora – UFG/CAJ – período 2007-2011);Simone Rezende do

Carmo (assistente administrativo – RH/UFG/CAJ);

Simone Sanches Vicente (amiga - professora - UNIVAG/MT);

Sinara Rosa Carvalho e Silva (pedagoga – UFG/CAJ);

Solange Thomé Gonçalves Dias (amiga - discente – PPGE/UFMT);

Sônia Regina Almeida Cabral (amiga – contadora – IFET/CAJ);

Soraia Rodrigues Chaves Macedo (professora - UFG/CAJ);

Suely dos Santos Silva (professora - UFG/CAJ);

Suely Lima de Assis Pinto (professora - UFG/CAJ);

Suzana Ribeiro Lima Oliveira (querida irmã);

Tânia Maria Lima Beraldo (coordenadora - PPGE/UFMT);

Tatiane Elias de Assis (amiga – engenheira civil);

Victor Emanuel Ribas Mendonça Morgas (menino vitorioso);

Vitor Oliveira Lima (querido sobrinho);

Wagner Gouvêa dos Santos (diretor – UFG/CAJ);

Washington Mendonça Moragas (In memoriam).

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O sentido da profissão docente “Renascido, ele conhece, ele tem piedade. Enfim, pode ensinar”. Renascido, porque ser professor implica um “renascimento”, uma reflexão sobre si mesmo e sobre o trabalho pedagógico. A pessoalidade cruza-se com a profissionalidade. Uma é inseparável da outra. Ele conhece, porque o ensino é sempre um processo cultural, que tem como referência o conhecimento do mundo. Não há educação no vazio. A educação é cultura, arte, ciência. Sem conhecimento não há educação. Ele tem piedade, no sentido filosófico, porque a educação implica altruísmo e generosidade. Não há educação sem o gesto humano da dádiva e do compromisso perante o outro. Enfim, pode ensinar... porque nada substitui um bom professor.

António Nóvoa

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RESUMO

O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM DA LÍNGUA PORTUGUESA: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE PROFESSORAS DOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL A presente pesquisa teve como objetivo compreender as representações sociais de professoras que trabalham de 1º ao 5º ano do ensino fundamental do sistema público municipal urbano do município de Jataí, Estado de Goiás, sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa. A questão que guiou o presente trabalho foi: quais são as representações sociais docentes sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa? Ao longo de aproximadamente três anos realizamos 156 contatos diferenciados para alcançar tais indícios de representações sociais. Primeiramente, realizamos um estudo piloto para conhecer o universo nocional. Nesta etapa conversamos com seis professoras a partir de entrevistas. Posteriormente, realizamos a segunda fase de coleta dos materiais, neste momento contatamos 100 professoras, nos valendo do uso da técnica de associações livres para identificar a estrutura das representações sociais. Finalmente, na terceira fase de recolha de textos de campo, entrevistamos 50 professoras. Algumas profissionais concederam mais de um diálogo conosco, neste momento, tivemos a oportunidade de conhecer o conteúdo representacional em formato contextualizado. Os dizeres professorais foram gravados, transcritos e organizados com o auxílio de dois programas computacionais. O software EVOC foi utilizado para processar o material coletado com a técnica de evocações livres, e o software ALCESTE foi usado para processar os textos de campo recolhidos nos momentos de entrevistas. Norteados pelos fundamentos da Teoria das Representações Sociais, da Teoria do Núcleo Central e de conhecimentos das áreas de Formação de Professores e da Linguagem elaboramos nossas compreensões considerando a especificidade de cada organização dos materiais recolhidos. A partir dos resultados, compreendemos que a representação social docente sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa na escola é constituída por elementos ancorados na valorização social para o uso apropriado da língua na sociedade e por elementos objetivados nas práticas frequentes de leitura em sala de aula. As professoras representam que o princípio fundamental a ser traçado dentro do processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa é o fomento à prática leitura; consequentemente, a prática de leitura norteia outras práticas, como a escrita de textos que seguem as regras ortográficas da língua portuguesa. As professoras recebem diversas influências históricas e sociais para a realização de seus ofícios, como, por exemplo, leis, normas, valores sociais que a família e a sociedade carregam a respeito de como o ensino e a aprendizagem da língua portuguesa deveria ocorrer nas escolas, como, também, são influenciadas pelos valores que atribuem importância para o uso correto da língua portuguesa na sociedade. As inscrições sociais docentes situam-se dentro de uma grande teia de elementos que se inter-relacionam e que produzem efeitos diversos, assim, fomentam formas de ser e agir na profissão de professor/a. Dentro desta rede de elementos, os/as profissionais professores/as constroem seu ofício. Desta maneira, o principal efeito desta sua inscrição social em um espaço múltiplo de meios é exigência para que conheçam todos os elementos contidos na prática educativa e que saibam lidar no plano singular de cada um, como também, no plano plural de relações entre todos os elementos. Palavras-chave: Ensino-aprendizagem. Língua portuguesa. Representações sociais.

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ABSTRACT THE TEACHING LEARNING PROCESS OF PORTUGUESE LANGUAGE: SOCIAL REPRESENTATIONS OF TEACHING IN THE EARLY YEARS OF ELEMENTARY EDUCATION This research aims to understand the social representations of teachers who work from 1st to 5th grade of elementary school in the public system in the municipal urban area of the city of Jatai, State of Goias, about the process of teaching and learning Portuguese. The question that guided this project was: What are the social representations of teachers about the process of teaching and learning Portuguese? Over the nearly three years we did 156 different contact to achieve such indications of social representations. First we realized a pilot study to know the notional universe. In this phase we talked with six teachers Trough interview. After that we conducted the second phase of collecting material data, in this moment we talked with 100 teachers. We used the technique of free association to identify the structure of social representation. Finally in the third phase we collected texts in the field, interviewing 50 teachers. Some professionals gave more than one interview to us. In this moment we had the opportunity to know the representational subject in contextualized format. The words from the teachers were recorded, written and organized with the help of two software. The software EVOC was used to process the material collected with the technique of free evocation and the software ALCESTE was used to process the texts collected in the moment of the interview. Guided by the fundamentals of Social representation theory , theory of the central core and knowledge in the formation area of teachers and the language we had done our comprehension considering the specificity in each organization where the material were collected. From the result we understood that the social representation of teachers about the teaching and learning process of Portuguese language in the school is formed by elements anchored in the social valorization for the specific use of language in the society and by elements targeted in the frequent practice of reading in the classroom. The teachers showed that the main principle to be drawn within the process of teaching and learning the Portuguese language is the promotion of reading practice, therefore the reading practice guides to other practice such as writing texts that follow the spelling rules of Portuguese language. The teachers receive many historic and social influences to do their job, like; laws, rules, social values that the family and the society bring due to the way that teaching and learning Portuguese language must happen in the schools and also they have influence by values that give importance to the correct use of Portuguese language in the society. The social enrollment by the teachers are located within a big web of elements that interrelate and make many effects, then start ways of being and do in the teachers occupation. Inside the web of elements, the professional teachers build their job. Then the main effect of this social enrollment in the multiple space of demanding that they know all the elements inside the educational practice and they learn how to deal in singular plane of each individual and also in the plural plans of relationship among all the elements. Keywords: teaching and learning. Portuguese Language. Social representations.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Ilustração 1 Esquema do quadro de quatro casas dos elementos estruturais das

representações sociais .............................................................................................. 53

Ilustração 2 Elementos estruturais das representações sociais das professoras

acerca do ensino da língua portuguesa - mote espontâneo .................................... 125

Ilustração 3 Elementos estruturais das representações sociais das professoras

referentes ao mote indutor aprendizagem da língua portuguesa – mote espontâneo

................................................................................................................................ 125

Ilustração 4 Mapa dos Elementos do ensino da língua portuguesa contidos na

representação social docente, organizado por OME e OMI .................................... 141

Ilustração 5 Mapa dos Elementos da Aprendizagem da língua portuguesa contidos

na representação social docente, organizado por OME e OMI ............................... 142

Ilustração 6 Classificação e intersecção dos dizeres das professoras que trabalham

no 1º e 2º ano do ensino fundamental sobre o processo de ensino-aprendizagem da

língua portuguesa, por porcentagem ....................................................................... 146

Ilustração 7 Classificação e intersecção dos dizeres das professoras que atuam no

3º, 4º e 5º ano do ensino fundamental sobre o processo de ensino-aprendizagem da

língua portuguesa, por porcentagem ....................................................................... 168

Ilustração 8 Pirâmide de relações entre elementos que contribuem para a formação

da representação social docente sobre o processo de ensino-aprendizagem da

língua portuguesa .................................................................................................... 195

Ilustração 9 Relações entre elementos da representação social docente sobre o

processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa ....................................... 196

Ilustração 10 Relação entre as facilidades e as dificuldades do processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa apresentadas pelas professoras ................... 198

Ilustração 11 Elementos estruturais das representações sociais das professoras

acerca do ensino da língua portuguesa - mote hierarquizado ................................. 226

Ilustração 12 Elementos estruturais das representações sociais das professoras

referentes ao mote indutor aprendizagem da língua portuguesa – mote hierarquizado

................................................................................................................................ 226

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Palavras principais da classe 1 intitulada Dimensão valorativa do processo

de ensino-aprendizagem da língua portuguesa (42%), resultantes dos dizeres das

professoras que atuam no 1º e 2º ano do ensino fundamental, ordenadas por 2 . 149

Tabela 2 Palavras principais da classe 2 intitulada Ensino da língua portuguesa:

práticas, materiais didáticos e conteúdos (20%), resultantes dos dizeres das

professoras que atuam no 1º e 2º ano do ensino fundamental, ordenadas por 2 . 157

Tabela 3 Palavras principais da classe 3 intitulada Dificuldades advindas do

processo e a relação com a família (38%), resultantes dos dizeres das professoras

que atuam no 1º e 2º ano do ensino fundamental, ordenadas por 2 ..................... 162

Tabela 4 Palavras principais da classe 1 intitulada Família: sua importância e a falta

de incentivo aos estudos dos alunos (17%), resultantes dos dizeres das professoras

que atuam no 3º, 4º e 5º ano do ensino fundamental, ordenadas por 2 ................ 171

Tabela 5 Palavras principais da classe 2 intitulada Aprendizagem dos/das alunos/as

(40%), resultantes dos dizeres das professoras que atuam no 3º, 4º e 5º ano do

ensino fundamental, ordenadas por 2 .................................................................... 177

Tabela 6 Palavras principais da classe 3 intitulada Ensino: práticas, materiais

pedagógicos e conteúdos (14%), resultantes dos dizeres das professoras que atuam

no 3º, 4º e 5º ano do ensino fundamental, ciclo, ordenadas por 2 ........................ 181

Tabela 7 Palavras principais da classe 4 intitulada Valor social da língua portuguesa

(20%), resultantes dos dizeres das professoras que atuam no 3º, 4º e 5º ano do

ensino fundamental, ordenadas por 2 .................................................................... 185

Tabela 8 Palavras principais da classe 5 intitulada A prática de leitura e algumas

fontes de informação (9%), resultantes dos dizeres das professoras que atuam no

3º, 4º e 5º ano do ensino fundamental, ordenadas por 2 ....................................... 189

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Informativos censitários: grupo de professoras entrevistadas .................. 46

Quadro 2 Características do sistema central e do sistema periférico de uma

representação ......................................................................................................... 118

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 19

A trajetória percorrida ................................................................................................ 27

CAPÍTULO I METODOLOGIA DA PESQUISA .......................................................... 37

1.1 As vertentes quantitativas e qualitativas da pesquisa ......................................... 37

1.2 O local da pesquisa e o grupo de professoras .................................................... 41

1.3 O estudo piloto e o software ALCESTE............................................................... 49

1.4 As evocações livres e o software EVOC ............................................................. 51

1.5 As últimas entrevistas realizadas ........................................................................ 55

CAPÍTULO II FUNDAMENTOS TEÓRICOS E CONCEITUAIS QUE NORTEARAM

A PESQUISA ............................................................................................................ 58

2.1 O que entendemos sobre formação de professores ........................................... 59

2.2 Elementos constitutivos do processo de ensino-aprendizagem da língua

portuguesa ................................................................................................................ 68

2.2.1 A linguagem entendida como processo de interação e a importância da

mediação entre professor/a e alunos/as dentro da prática educativa ................... 69

2.2.2 O processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa enquanto um

contínuo progressivo de alfabetização .................................................................. 88

2.3 A Teoria das Representações Sociais .............................................................. 101

2.3.1 O conceito do fenômeno representacional ................................................. 109

2.3.2 O princípio de tornar o não-familiar em familiar e os processos formadores

das representações sociais ................................................................................. 112

2.3.3 A Teoria do Núcleo Central das representações sociais ............................ 116

CAPÍTULO III MATERIAIS COLETADOS: COMPREENSÕES POSSÍVEIS ......... 123

3.1 Elementos estruturais das representações sociais de professoras sobre os

processos de ensino e de aprendizagem da língua portuguesa ............................. 123

3.2 representações sociais de professoras sobre o processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa ....................................................................... 144

Compreensão I - Conjunto de segmentos de textos provenientes das entrevistas

concedidas pelas professoras que atuam no 1º e 2º ano do ensino fundamental

sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa .......................... 145

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18

Classe 1 Dimensão valorativa do processo de ensino-aprendizagem da língua

portuguesa (42%) .................................................................................................... 148

Classe 2 Ensino da língua portuguesa: práticas, materiais didáticos e conteúdos

(20%) ....................................................................................................................... 156

Classe 3 Dificuldades advindas do processo e a relação com a família (38%) ...... 161

Compreensão 2 - Conjunto de segmentos de textos provenientes das entrevistas

concedidas pelas professoras que atuam no 3º, 4º e 5º ano do ensino fundamental

sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa .......................... 168

Classe 1 Família: sua importância e a falta de incentivo aos estudos dos alunos

(17%) ....................................................................................................................... 169

Classe 2 Aprendizagem dos/das alunos/as (40%) ................................................. 176

Classe 3 Ensino: práticas, materiais pedagógicos e conteúdos (14%) ................... 180

Classe 4 Valor social da língua portuguesa (20%) ................................................. 184

Classe 5 A prática de leitura e algumas fontes de informação (9%) ....................... 187

CAPÍTULO IV INDÍCIOS DE REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE PROFESSORAS

DOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL SOBRE O PROCESSO DE

ENSINO-APRENDIZAGEM DA LÍNGUA PORTUGUESA: SÍNTESE POSSÍVEL . 193

4.1 O processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa na escola é

importante e necessário .......................................................................................... 194

4.2 O/a aluno/a leitor/a é um/a aluno/a escritor/a .................................................... 196

4.3 Facilidades e dificuldades enfrentadas pelas profissionais no processo educativo

................................................................................................................................ 197

4.4 Considerações finais ......................................................................................... 200

REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 209

APÊNDICE A - Roteiro de entrevista - estudo piloto – 1ª fase ........................................... 221

APÊNDICE B – Lista de trabalhos sobre a língua portuguesa, localizados no Portal Domínio

Público, com informações da Plataforma Lattes ................................................................ 222

APÊNDICE C – Roteiro para evocações livres – 2ª fase ................................................... 224

APÊNDICE D – Elementos estruturais das representações sociais das professoras sobre o

processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa – motes hierarquizados por ordem

de importância (OMI) ......................................................................................................... 226

APÊNDICE E – Roteiro de entrevista – 3ª fase .................................................................. 227

APÊNDICE F – Informativos censitários das participantes................................................. 228

ANEXO A – Autorização para entrada dos/as pesquisadores/as nas escolas ................... 229

ANEXO B – Aprovação do projeto da pesquisa junto ao Comitê de Ética .......................... 230

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INTRODUÇÃO

Este relatório de estudo e pesquisa é parte dos requisitos de produções

junto ao Curso de Doutorado em Educação do Programa de Pós-Graduação em

Educação (PPGE), Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), linha de pesquisa

Organização Escolar, Formação e Práticas Pedagógicas, com admissão no ano de

2009. Os estudos realizados se firmaram junto a dois grupos: Grupo de Pesquisa em

Educação e Psicologia (GPEP/PPGE/UFMT) no período de 2009 a 2011 e Grupo de

Estudos e Pesquisas em Política e Formação Docente: educação infantil, fundamental e

superior (GEPForDoc/PPGE/UFMT) desde o ano de 2011 até o ano de 2013.

O presente registro é resultado de uma pesquisa que teve como objetivo

compreender as representações sociais de professoras que trabalham de 1º ao 5º ano

do ensino fundamental do sistema público municipal urbano do município de Jataí,

Estado de Goiás, sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa. A

presente pesquisa buscou valorizar a profissão docente, que se processa nos primeiros

anos do ensino fundamental, no sentido de conhecer o que dizem estas profissionais

sobre a prática educativa que realizam. Concomitantemente, procurou entendimentos

acerca da prática educativa sob a luz de constructos das áreas de conhecimento

Formação de Professores, Linguagem e da Teoria das Representações Sociais (TRS).

A questão principal que guiou os trabalhos desta pesquisa foi: quais são as

representações sociais docentes sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua

portuguesa? As compreensões construídas junto a esta investigação não são

consideradas como um olhar melhor, mas são entendidas como sendo uma visão

diferente daquela elaborada dentro da escola acerca dos fenômenos educativos.

(SACRISTÁN, 1995). A relevância deste estudo assenta-se em mostrar como as

professoras significam seu trabalho; significação esta construída por processos

representacionais elaborados pelo grupo a partir do que sabem sobre ensinar e aprender

a língua portuguesa na escola.

Com o intuito de conhecer outras investigações que apresentam

elementos semelhantes em relação a presente pesquisa realizei algumas buscas

sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa no banco de teses

e dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

(CAPES); especificamente no portal da rede mundial de computadores – Internet -

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denominado Domínio Público, considerado como sendo uma biblioteca virtual que

disponibiliza informações e conhecimentos diversos de forma livre. Pesquisas em

outras bibliotecas virtuais não foram realizadas, pois a busca teve caráter

exploratório e não havia o objetivo de ser exaustiva. A última coleta foi realizada no

mês de abril do ano de 2012.

Essa busca de informações foi iniciada a partir da inserção de palavras

descritivas junto ao ambiente virtual dessa biblioteca. O termo Educação foi

introduzido no operador do site denominado Área de conhecimento e as palavras

Língua Portuguesa foram inseridas na caixa de texto intitulada Palavras-chave.

Estas inserções de elementos auxiliaram a filtragem dos resultados. Foram

localizados vinte e nove trabalhos, seus títulos podem ser vistos no Apêndice B.

Entre esses trabalhos, três tratam do ensino da língua portuguesa para

pessoas surdas; outro discute o ensino da língua dentro da História da Educação;

um deles fala do ensino da língua portuguesa no ensino superior; outro destes

discute o ensino da língua portuguesa para os primeiros anos do ensino fundamental

de nove anos. Dois outros trabalhos tratam da temática em formato de discussão

para todos os níveis de ensino e, finalmente, vinte e um trabalhos discutem o ensino

da língua portuguesa nos anos finais do ensino fundamental de nove anos e no

ensino médio, sendo estas etapas da educação básica de responsabilidade dos/as

profissionais licenciados/as em Letras.

A maioria das produções foi elaborada por autores que adquiriram a

graduação em Letras, sendo vinte profissionais. Três são formadas em Pedagogia,

uma em Fonoaudiologia e outra apresentou duas formações: Letras e Pedagogia.

Estas informações foram recolhidas junto aos currículos profissionais publicados por

meio da Plataforma Lattes do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e

Tecnológico (CNPq). Espaço este em que três pesquisadores/as não apresentaram

a sua formação em nível de graduação e uma delas não publicou seu currículo na

plataforma. Vinte trabalhos foram produzidos junto a cursos de mestrado e nove de

doutorado. Quatro trabalhos foram defendidos no ano de 2010, dez no ano de 2009,

sete em 2008, cinco em 2007, um em 2006, um em 2005 e um em 2001.

Diante desses materiais, observei que não existem muitos relatórios de

pesquisas entre os anos de 2001 a 2012, disponibilizados nesse site oficial, que

discutem o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa nos anos iniciais

do ensino fundamental. Identificamos a existência de apenas um, intitulado: O jogo

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da enunciação em sala de aula e a formação de sujeitos leitores e produtores de

textos; defendido em 2009, como requisito para obtenção do título de Mestre em

Educação.

Essas pesquisas discutem, em sua maioria, o processo educativo

desenvolvido em todas as etapas e níveis de ensino. A partir dessas informações,

identificamos uma carência de publicações de trabalhos, em formato de relatórios de

pesquisa, que apresentam investigações acerca do ensino e da aprendizagem da

língua portuguesa nos primeiros anos do ensino fundamental.

Considero o portal Domínio Público como sendo uma biblioteca virtual

que disponibiliza um banco de dados importante para o fornecimento de

compreensões científicas advindas de muitas instituições do país. Por este motivo, a

constatação da existência de poucas publicações no site de relatórios de pesquisa

sobre o objeto investigativo apresenta indícios de grande necessidade de ampliar

reflexões sobre esta prática educativa.

Nas reuniões anuais da Associação Nacional de Pós-Graduação e

Pesquisa em Educação (ANPEd), grupos de trabalho (GT) divididos em diversas

áreas, vem mostrando uma substancial preocupação com este nível educativo,

principalmente aqueles vinculados aos GT intitulados Alfabetização, Leitura e

Escrita; Formação de Professores e Educação Fundamental. Outros numerosos

estudos foram realizados para compreender diversos problemas advindos do ensino da

língua na escola (GERALDI, 1996; BAGNO, 2002; SOARES, 2008a, IRELAND, 2007,

MONTEIRO et al, 2007; MONTEIRO, SILVA, 2010; ZUIN, P. B.; REYES, C. R, 2010,

etc.); cada um buscando uma dimensão específica para alcançar uma possível

interpretação das dificuldades, alavancando melhorias.

Juntei-me a esses esforços no sentido de valorizar a prática professoral,

que ocorre nos primeiros anos do ensino fundamental, a partir da construção de um

objeto de pesquisa que contemplasse a maioria dos elementos contidos no processo

educativo da língua portuguesa na escola. Portanto, o norte construído foi localizar e

compreender as representações sociais de professoras sobre toda a prática educativa

acerca da língua portuguesa na escola, partindo de um possível aspecto geral deste

processo para, posteriormente, identificar elementos específicos contidos nele, como,

por exemplo, a leitura, a escrita, a alfabetização, o letramento, entre outros, como

também localizar elementos que não compareceram nas representações sociais

docentes, considerando a literatura especializada sobre o tema.

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Para nortear essa procura, os trabalhos foram fundamentados pelos

preceitos da Teoria das Representações Sociais (TRS), elaborada na França pelo

psicólogo social Serge Moscovici. Para este pesquisador, as representações sociais

manifestam-se na qualidade de sistemas de interpretação sobre objetos da realidade

que regem a relação das pessoas com o mundo e com os outros, em que orientam e

organizam as condutas e as comunicações sociais. Os estudos em representações

sociais apresentam uma importância no sentido de revelarem as negociações que os

sujeitos estabelecem em relação aos outros para que possam significar a vida ao seu

envolto, sendo um fenômeno importante da realidade social.

As formações imaginárias, implícitas ou explicitas nas linguagens,

direcionam as práticas das pessoas, como, por exemplo, as representações sociais do

que seja ser aluno/a, do que seja ser professor, do que seja ser o ensino da língua,

norteiam comportamentos, justificam práticas, produzem conhecimentos e formam

identidades. Além disto, para Smolka (1988) os papéis dos sujeitos que participam do

processo educativo se fundem; todos juntos constituem um processo discursivo para um

objetivo comum.

Os/as professores/as da primeira fase do ensino fundamental, sendo

profissionais que possuem um conjunto de saberes, dentre eles os saberes científicos,

ao mesmo tempo, buscam assimilá-los no movimento de inserção destes na realidade

de sala de aula, são profissionais que procuram lidar com a prática educativa, nela,

produzem significados e modos de pensar e agir em ofício, mediante interações

estabelecidas entre outros atores sociais. Este reconhecimento em relação ao/a

professor/a, enquanto um sujeito que também se forma profissional na prática educativa,

foi inspirado perante as reflexões do filósofo e sociólogo canadense Maurice Tardif

(2000, 2002). Para ele, os/as professores/as são sujeitos do conhecimento, são

produtores de saberes em seu ofício, são profissionais competentes na elaboração de

proposições sobre o saber, saber-fazer e saber-ser no ambiente escolar.

Em uma palestra no ano de 2000, no X Encontro Nacional de Didática e

Prática de Ensino (ENDIPE), realizada na Universidade do Rio de Janeiro, Tardif já

apontava que essa reflexão se fazia presente na produção acadêmica da área

educacional norte-americana e anglo-saxônica desde a década de 80, na Europa na

década de 90 e começou a ser pesquisada no Brasil depois deste período. Este

movimento reflexivo já ganhou espaço em muitos cursos de formação de professores.

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Nesse percurso de discernimento sobre o ofício do/a professor/a,

considero a significação de saber, unida ao conceito apresentado por Tardif (2000), que

compreende os saberes, as competências, as habilidades e as atitudes dos/as

professores/as em um sentido que engloba o chamado saber, saber-fazer e saber-ser.

Para o pesquisador não apenas os saberes advindos da formação universitária norteiam

as práticas professorais, como também os saberes “[...] laborados, incorporados no

processo de trabalho docente, que só têm sentido em relação às situações de trabalho e

que é nessas situações que são construídos, modelados e utilizados de maneira

significativa pelos trabalhadores”. (TARDIF, 2000, p. 11).

Apresentarei alguns possíveis indícios de representações sociais, sob a

aparência de saberes compartilhados, que são construídos nas práticas educativas de

professoras1 da primeira fase do ensino fundamental frente ao processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa. Mostrarei os elementos mais consensuais, aqueles

ditos com maior frequência e com maior grau de importância para as professoras sobre

o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa, aspectos importantes que

destacam os saberes compartilhados pelo grupo sobre essa prática educativa.

Estou falando da prática educativa em um sentido amplo, não apenas

considerando o aspecto didático e de ações restritas de responsabilidade dos/as

professores/as. Ensinar e aprender são práticas sociais, pois são concretizadas nas

interações entre professores/as, alunos/as e outros sujeitos sociais, espelhando e

influenciando culturas e os contextos em que todos estão inseridos. Com as

contribuições de Sacristán (1995), considero que o processo de ensino-aprendizagem

da língua portuguesa está submerso em contextos variados, em práticas aninhadas

umas entre outras. Para o pesquisador, existe um sistema que rege a prática educativa,

cada parte que o compõe afeta a ação do/a professor/a.

Segundo Sacristán (1995, p. 69), “Existe uma prática educativa e de

ensino, em sentido antropológico, anterior e paralela à escolaridade própria de uma

determinada sociedade ou cultura”. Para o autor, as engenhosidades de ensinar e de

aprender estão marcadas pela historicidade dos sujeitos e não são restritas ao ofício

professoral. Desta maneira, os/as professores/as estão inseridos/as em um mundo

cultural, lugar em que existem diversos norteamentos para a apresentação de conteúdos

e aplicação de métodos educativos, portanto, sua profissão deve ser entendida enquanto

1 Obtivemos contribuições de apenas um professor do sexo masculino, por este motivo, escolhemos

chamar todo o grupo de professoras.

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um constituinte alicerçado em costumes, valores, atitudes, saberes e crenças,

socialmente partilhados.

Conforme Sacristán (1995), nesse ambiente cultural as práticas escolares

são desenvolvidas considerando três dimensões: a primeira trata sobre o funcionamento

do sistema escolar; a segunda, da organização específica de cada escola; e a terceira,

sobre o contexto imediato às práticas educativas e didáticas no interior das salas de

aula. Desta forma, as determinações do sistema escolar, as normas coletivas adotadas

por outros/as professores/as e as regulamentações organizacionais regem as decisões

individuais dos/as professores/as para a realização da prática profissional.

Além dessas diversidades, Sacristán (1995) fala da existência de práticas

concorrentes, aquelas que podem ocorrer fora do sistema escolar, que exercem grande

influência sobre o mesmo. Como exemplos deste princípio, estão o desenvolvimento

curricular realizado pela administração educativa; as editorações de manuais escolares e

da própria política educativa, que podem servir como sugestões ou imposições de

práticas, tantas quantas forem as possibilidades de reflexão ou de contestação dos/as

professores/as. Portanto, posso dizer que os/as professores/as detêm uma autonomia

relativa, pois são dependentes de diretrizes político-administrativas reguladoras do

sistema educativo, da escola e da própria prática didática, de responsabilidade imediata

dos/as professores/as.

Dentro dessas práticas aninhadas que ocorrem o processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa que, também, este necessita ser direcionado por

objetivos aninhados. Partindo desses princípios, compreendi que não podemos pensar a

leitura separada da escrita, o dizer sem o ouvir, o/a professor/a longe do/a aluno/a, a

alfabetização sem o letramento, o ensino sem a aprendizagem e, principalmente, pensar

o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa em formato compartimentado,

contendo início, meio e fim. Portanto, compreendo o ensino e a aprendizagem da língua

portuguesa na escola enquanto universo formativo que apresenta objetivo geral, capaz

de produzir sentidos, significados, conhecimentos sobre o mundo físico e social a partir

das práticas de ler, escrever, ouvir, falar, ou seja, produzir a interdiscursividade entre

pessoas, objetos, saberes, representações sociais, etc. Não compreendo todos esses

elementos separados, todos formam uma unidade. Sei que existem práticas educativas

específicas para a obtenção de determinados objetivos da aprendizagem, mas as

especificidades não podem fomentar um entendimento segmentado.

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Este presente trabalho foi estruturado em quatro capítulos. No Capítulo I,

foram apresentados os procedimentos metodológicos utilizados no estudo. A pesquisa

passou por várias etapas, idas e vindas de organizações diversas; estudo piloto e

coletas variadas foram fomentados. Esta diferença de definições metodológicas

estruturou este capítulo em cinco partes. A primeira divisão apresenta alguns

fundamentos teóricos-metodológicos que situaram a presente pesquisa dentro dos

estudos quantitativos e qualitativos. A segunda parte mostrou elementos censitários que

apontaram um possível perfil do grupo de professoras participantes desta investigação.

Na terceira parte foi elaborado um pequeno resumo do estudo piloto que permitiu

conhecer o universo nocional contido nos dizeres das professoras. Na quarta divisão

foram apresentadas as técnicas de recolha e de processamento dos materiais recolhidos

na segunda fase da pesquisa e, finalmente, na última parte, foram mostrados os

procedimentos tomados na terceira fase da pesquisa.

No Capítulo II, intitulado Conhecimentos que nortearam a pesquisa, foram

apresentadas contribuições teóricas e conceituais que serviram como referências para

todas as etapas desta investigação. Todo o trabalho foi norteado por uma compreensão

de formação de professores como desenvolvimento profissional; esta sendo uma

(auto)construção interlocutiva que evolui ao longo da vida e da carreira professoral,

configurada por um universo complexo de histórias, conhecimentos, valores,

crenças, normatizações políticas, sociais, etc. (MARCELO, 2009a).

No Capítulo III, chamado Materiais coletados: compreensões possíveis,

foram construídas apresentações e compreensões concernentes aos materiais

recolhidos no campo de pesquisa, advindas das falas docentes proferidas na

oportunidade dos contatos realizados. Conforme Pimenta (2011), as investigações que

dão voz aos/as professores/as têm se apresentado férteis no desenvolvimento de

processos formativos, principalmente na vertente que compreende a importância do

protagonismo dos sujeitos/professores na sua própria formação a partir de suas

inserções nas práticas escolares.

A formação profissional dos professores se alimenta de cursos

especializados ofertados por faculdades e universidades e ela necessita ser fomentada

continuamente. De outro lado, a formação destes profissionais também é abastecida

pela própria prática educativa que transcorre dentro das escolas. Além disto, as

necessidades formativas surgem a partir do local de trabalho do profissional, pautadas

em suas vivências cotidianas, em que, conforme Di Giorgi (2011) a escola passa por

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mudanças radicais em virtude das mudanças ocorridas nas populações que a

frequentam, refletindo as tensões coletivas da vida moderna.

No Capítulo IV, foi apresentada uma síntese de todo o entendimento

construído na pesquisa, com o objetivo de abrir uma compreensão relacional de tudo

que foi discutido no trabalho, possibilitando novas entradas no devenir reflexivo

sobre o ensinar e o aprender a língua portuguesa na primeira fase do ensino

fundamental de nove anos.

Nesta introdução do trabalho e antes de iniciar os capítulos, foi construído

um mergulho formativo de reflexão acerca do processo de desenvolvimento pessoal e

profissional da pesquisadora, fazendo uma relação com os estudos e pesquisas

realizados na presente investigação. Oportunidade esta de compreensão sobre várias

dimensões que envolvem o processo de desenvolvimento investigativo. “Nós não

somos pesquisadores objetivos. Somos pesquisadores relacionais, atentos à

subjetividade, aos espaços embutidos, relacionais nos quais vidas são vividas. Não

nos postamos metaforicamente do lado de fora, mas somos parte do fenômeno em

estudo”. (CLANDININ, 2010, p. 2-3).

A ideia sobre as multiplicidades de saberes e de outras práticas que

envolvem a profissão de professor/a e que contribuem para o seu desenvolvimento

profissional me fez imergir nas minhas próprias lembranças de vida, de formação escolar

e acadêmica. Este rememorar possibilitou uma reflexão formativa no sentido de

compreender a relação entre as escolhas estabelecidas ao longo da minha vida e os

delineamentos da presente pesquisa.

Muitos trabalhos científicos empenham-se no uso teórico-metodológico

(auto)biográfico para contribuir com reflexões formativas de muitos/as professores/as

acerca de suas jornadas profissionais, que tomam como objeto de estudo as narrativas

biográficas e autobiográficas em suas distintas manifestações individuais, coletivas,

culturais e interculturais. Estes contribuem para a ampliação da compreensão dos

referenciais epistemológicos e metodológicos da pesquisa (auto)biográfica em suas

articulações com a formação, entre outras áreas.

O GEPForDoc/PPGE/UFMT está entre esses grupos de pesquisa que

trabalham com narrativas de professores/as e que fomentam a importância de diálogos e

de trocas entre pesquisadores/as e professores/as para uma possível construção

reflexiva sobre a trajetória professoral, assim, formativa. A inserção neste grupo me

ajudou, entre tantas outras contribuições, a entender a importância de saber de si, de

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compreender a própria formação. Após esta oportunidade, decidi começar este trabalho

falando da relação entre o meu “Eu” e a pesquisa realizada. Esta escolha não trata

autopromoção, mas é uma forma de registrar a importância da compreensão de si na

profissão docente, como também, é uma oportunidade de simbolizar meus sinceros

agradecimentos ao GEPForDoc/PPGE/UFMT que me concedeu este e outros

importantes entendimentos formativos.

Para um melhor entendimento desse princípio, propus mergulhar em uma

(auto)compreensão profissional, relembrando algumas das minhas experiências

vivenciais. Antes de saber sobre o dinamismo da formação de outros/as professores/as,

precisei refletir sobre a minha própria trajetória percorrida. Portanto, compreendi que os

processos formativos de nós professores/as dependem da nossa própria vontade, das

nossas características pessoais e do contexto social que fazemos parte, onde a

formação acontece ao longo de toda a carreira e de toda a vida da pessoa/professor/a.

Os/as professores/as são sujeitos adultos que aprendem e se inserem em

processos formativos que são constituídos por implicações de natureza fisiológica,

cognitiva, pessoal e moral. Quando falo desse longo processo formativo, incluo o

aprendizado que ocorre pela observação, desde o momento que o/a futuro/a professor/a

se insere no ambiente escolar ainda como aluno/a da educação básica, pois considero

que as experiências passadas, desde a infância até a fase adulta, contribuem para a

compreensão do que seja ser professor/a.

A trajetória percorrida

Antigamente eu pensava que o posicionamento pessoal poderia influenciar

os dados de uma pesquisa; consequentemente, isso afetaria o trabalho por um viés não

planejado e não objetivado. Atualmente, reflito que elaborar compreensões sobre o ‘Eu’

promove oportunidades de melhores entendimentos acerca das influências que

contribuem para o desenvolvimento profissional das pessoas. Desta maneira, apresento,

neste item, uma narrativa, de cunho formativo, em que relembrei algumas das minhas

experiências vivenciais. Momento oportuno de entrega, cientificamente falando, em uma

possível apresentação de relações do que ‘Eu’ sou e do que me propus estudar e

pesquisar para a realização deste trabalho sobre ‘Outros’.

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Iniciar uma pesquisa é uma ação firmada em um determinado marco

temporal, mas não significa que ela não tenha sido idealizada ou sublevada em tempos

bem anteriores em relação ao que oficialmente foi registrado. Minha preocupação com a

língua portuguesa, com o nosso português de cada dia, me acompanhou desde a

infância. Isto originou quando eu comecei a perceber as diferenças de dialeto existentes

dentro da escola. Na cidade de Jataí, Estado de Goiás, inserida na primeira fase do

ensino fundamental de uma escola pública, nos meus dez anos de idade, eu pensava

que as pessoas apenas falavam de forma diferente em relação aos meus dizeres,

principalmente as professoras que seguiam os princípios religiosos da Igreja Católica,

enquanto freiras. Elas vinham de diversas regiões do país para lecionarem nesta escola

pública da cidade que tinha convênio com a igreja e nos presenteavam com uma

variedade de expressões e palavras que naquela época eram novas em relação ao meu

vocabulário.

Filha de família pobre, revelação constatada na adolescência -

descendente de pais com formação de nível médio, conquistaram depois que me

graduei - cresci ouvindo as minhas professoras dizendo que eu falava e escrevia errado.

Minha família proferia que eu era uma criança dedicada aos estudos, inteligente, mas

mesmo assim, eu percebia que algo estava errado. Sempre fiz as tarefas de Para Casa,

lia os textos indicados pelas professoras, mas ainda pensava que faltava algo. Mas, o

quê?

Percorri toda a educação infantil, ensino fundamental, médio e superior no

sistema de ensino de oferta pública; sem ele eu não teria caminhado até aqui, neste

também curso de pós-graduação público. O pouco dinheiro que tínhamos não

possibilitou o meu ingresso em instituições que cobram mensalidades, algo que trazia

status e prestígio entre as crianças, jovens e adultos. Mas foi um fato que não me enviou

energia ruim, pois considerava, e ainda considero, que o meu processo educativo foi a

minha única oportunidade.

Passei com boas notas pelo ensino fundamental em uma escola pública

do sistema estadual que tinha convênio com a antiga Escola Técnica Federal de Goiás

(ETFG), excetuando língua portuguesa, naquela época denominada de Comunicação e

Expressão, na qual eu tirava as menores notas, se comparadas com as demais

disciplinas.

Após concluir o ensino fundamental, no período entre os meus 14 até os

19 anos de idade, trabalhei no serviço privado, executando cargos diversos, tais como

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auxiliar odontológica, secretária de vendas, telefonista e vendedora de móveis. Foram

momentos importantes de inserção no mercado de trabalho, fui começando a me sentir

trabalhadora.

Em casa, minha mãe falava e orientava que as filhas dela não iriam lavar

roupas para fora, ou seja, ela não queria nos ver ocupando o cargo de lavadeira de

roupas de outras pessoas. Na escola, a maioria dos/as meus/minhas professores/as

também falava que eu tinha que estudar para conseguir um emprego adequado, ser

alguém na vida. Eu me sentia feliz, pois acreditava que eu estava no caminho certo, já

tinha emprego e não era de lavadeira. Muitos momentos de inocência.

Nesse mesmo percurso, eu só sonhava em ganhar dinheiro rápido, sem

precisar para isto concluir um curso universitário. Eu só pensava em adquirir

conhecimentos que me levariam para uma ascensão profissional. Este objetivo me fez

obter a Carteira de Identidade Profissional nº 7547, junto ao Conselho Regional de

Engenharia e Agronomia de Goiás (CREA-GO), com o Título Profissional denominado

de Técnica Industrial em Edificações, após concluir em quatro anos o ensino médio e

técnico de Edificações na antiga ETFG, unidade de Jataí/GO.

Como muitas empresas não contratavam mulheres para atuar nessa área

no município, me direcionei para o vestibular em Arquitetura e Urbanismo da

Universidade de Brasília (UnB); passei na prova de desenho técnico, mas fui eliminada

na prova objetiva. Neste instante tomei ciência da minha incompletude, não ser

selecionada e não ter maturidade acerca do dinamismo social, muitas vezes de

movimentos de exclusão, me fez sentir impotente. Percebi que não poderia andar em

determinados espaços acadêmicos, pois a porta não se abriria tão fácil assim. A minha

inocência começou a diminuir. Compreendi que a formação escolar que recebi tinha

caráter homogêneo para pessoas diferentes. A escola comum para todos não evita a

classificação e seletividade quase mecânica da origem social dos/as alunos/as. (PÉREZ

GÓMEZ, SACRISTÁN, 1998).

Minha segunda opção foi o curso de Pedagogia, por incentivo familiar. A

prova de redação me ajudou a ser ranqueada em quarto lugar na lista de setenta

candidatos/as selecionados/as. Cursei Pedagogia em meio a avaliações que atribuíram

notas de valor 9,0 para meu desempenho em Biologia Educacional; 9,5 para a matéria

acadêmica de Didática e Prática do Ensino, entre outras, e 6,7 para a Língua

Portuguesa. Já estava na hora de saber o que estava acontecendo.

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Já ingressante no curso, aos 20 anos iniciei a minha jornada de trabalho

no serviço público. Trabalhei quatro anos enquanto Técnica Industrial em Edificações

junto a Secretaria de Obras e Urbanismo do município de Jataí/Goiás, pelo período

diurno e no noturno estudava na universidade. O regime de trabalho era efetivo após

concurso público; sem tal seleção, era difícil a inserção das mulheres nesta área. Foi

uma jornada de imersão em duas áreas muito diferentes. Algumas pessoas pensavam

que isto seria muito ruim para a minha formação acadêmica, mas agora vejo que os

programas computacionais que auxiliam os processamentos de materiais textuais

recolhidos junto à área educacional não me assustam por causa dos aprendizados que

tive no ensino técnico.

Momentos de correções ortográficas e gramaticais por parte de algumas

professoras do Curso de Pedagogia e outros de reflexões teóricas me oportunizaram

tomar consciência da verdadeira diferença do meu “Eu” em relação a outras pessoas. Eu

não tinha apropriado adequadamente as habilidades de escrever e de falar a língua

portuguesa, mesmo sendo uma pessoa dedicada aos estudos e com uma razoável

habilidade para leitura e interpretação. Eu sabia ler oral e mentalmente com

competência, individual e coletivamente, sabia interpretar e desenvolver redações de

forma criativa, mas não sabia escrever sem erros ortográficos e falar sem erros fonéticos

e fonológicos. Confesso que, atualmente, tenho o dicionário Aurélio instalado no meu

computador que me ajuda muito, mas, ainda convivo em meio a dúvidas sobre a língua

portuguesa.

Depois que essa constatação começou a me incomodar, iniciei um

processo de superações das minhas dificuldades. Parti para outra direção, encarei

minha diferença de frente e continuei meu processo formativo. No mesmo ano em que

colei grau, com uma habilidade de escrever um pouco melhor da anterior, entrei no curso

de Mestrado em Educação junto ao Programa de Pós-Graduação em Educação

(PPGE), Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), cidade de Cuiabá, junto ao

Grupo de Pesquisa em Educação e Psicologia (GPEP); coordenado pela Professora

Doutora Eugênia Coelho Paredes. Estudei em regime de dedicação exclusiva para os

estudos e para a pesquisa.

Nesse ambiente de intensos estudos e discussões, fiquei encantada com o

rol de conhecimentos proferidos pelos/as professores/as e alunos/as do curso,

especialmente aos verificados e adquiridos no convívio com a orientadora. Encontrei

solo fértil para iniciar a caminhada de tomada de consciência que propus percorrer. Com

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respeito aos critérios científicos, fui compreendendo o fenômeno de relações entre os

diversos saberes que nos cercam, processos de partilhas e de interações que nos fazem

ser o que somos, trazendo a marca do social na nossa categoria singular, em que a

identidade do sujeito e o social são indissociáveis.

Nessa caminhada, tive a oportunidade de fazer estágio de docência aos

24 anos, como aluna, bolsista pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Mato

Grosso (FAPEMAT), dentro do curso de Graduação em Artes, Habilitação em Música da

UFMT/Cuiabá, colaborando um ano e meio com a matéria acadêmica de Psicologia da

Educação.

Foram tantas aprendizagens, comecei a perceber que aquela criança-

Rosely não estava errada: todo o entendimento interpretativo e criativo que possuía era

proveitoso e fecundo. O contexto em que nasci e estou a desenvolver-me contribuiu na

formação da minha identidade e dos conhecimentos advindos de fenômenos

representacionais, tanto individuais quanto sociais. Foram muitos os entendimentos que

saboreei, várias aberturas maturacionais começaram a entrar na minha cognição, me

fazendo buscar outras respostas.

Após concluir o curso de mestrado, tomei ciência que era necessário a

minha inserção efetiva nos espaços educativos, para que eu pudesse entender um

pouco mais os processos que são dinamizados nestes ambientes de aprendizagens;

assim, começar a trabalhar junto à área que me graduei. Foi neste momento que iniciei

minha jornada de trabalho nas instituições de ensino.

Depois de concluso o mestrado, aos 26 anos de vida, iniciei um longo

processo de candidaturas em concursos públicos. Passei para o cargo efetivo de

professora das séries iniciais do ensino fundamental de nove anos da Secretaria

Estadual de Educação de Goiás, com lotação na cidade de Jataí, oportunidade esta pela

qual exerci por um ano a função. Concomitantemente, passei para o cargo de professora

temporária para ministrar a matéria acadêmica de Metodologia Científica junto ao curso

de Alimentos da Universidade Estadual de Goiás (UEG), campus Jataí, período de

trabalho de um ano. Junto a esses esforços, com 27 anos, passei para o cargo efetivo

de Técnica em Assuntos Educacionais da UFG/CAJ, no qual permaneci dois anos na

função. Exercer três cargos distintos ao mesmo tempo, fazendo os agendamentos

apropriados ao longo do dia, foi muito complicado; por isto, acabei pedindo exoneração

da função no sistema estadual, término de contrato junto a UEG e fiquei apenas com a

função de técnica, por questões salariais.

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Essa escolha me angustiou, pois, em frente ao espelho eu me via

professora, entretanto, ocupando um cargo técnico. Mesmo atuando dentro da

Assessoria de Graduação/UFG/CAJ, já desenvolvendo projetos e ações de assistência

acadêmica aos/as alunos/as, ainda faltava algo. Depois de entender um pouco sobre o

mundo dialético em que vivemos, da dinâmica que nos envolve; das imposições sociais

que passamos, das opressões que sofremos, eu sabia que precisava construir a minha

autonomia diante disto tudo e, por isso, segui, com esperança, um novo caminho rumo à

docência.

Sucessivamente, passei para me firmar em regime efetivo como

professora de diversas matérias do Centro Federal de Educação Tecnológica de

Urutaí/Goiás. Como pensei que as matérias de Sociologia Rural, Legislação de

Informática, Sociologia e Extensão Rural, entre outras, não poderiam ser ministradas

sem as devida especializações, pedi exoneração do cargo. Escolhi, neste momento,

buscar uma docência condizente com os princípios formativos que construí.

Nessa ocasião, avaliei que a minha caminhada ainda estava no início, pois

as dúvidas sobre a escola, a universidade, os processos sociais só aumentavam. Quase

angústias em face de necessidade de resposta, de outras possibilidades que os

conhecimentos rasos sobre as perguntas constantes que se sucediam. Foi neste

período, no ano de 2008, que fiquei sabendo da abertura do edital para ingresso na

primeira turma do curso de Doutorado em Educação, do Programa de Pós-Graduação

em Educação (PPGE) da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), processo em

que fui selecionada para ingresso no ano de 2009, novamente junto ao Grupo de

Pesquisa em Educação e Psicologia (GPEP/UFMT), coordenado pela Professora

Doutora Eugênia Paredes.

Nesse mesmo ano, fui convocada para tomar posse em um concurso para

professora assistente em regime de trabalho efetivo junto ao curso de

Pedagogia/UFG/CAJ. Esta seleção foi realizada no início do ano de 2008, mas a

convocação se deu em 2009. Percorri idas e vindas semanais para cursar as matérias

do doutorado/UFMT/Cuiabá-MT, em regime presencial, por dois anos, e,

simultaneamente, exercer a função de professora na UFG/CAJ.

Nessa trajetória, eu continuava em busca por compreensões acerca dos

processos que cercam o ensinar e o aprender a língua portuguesa na escola. Eu fiquei

focada e até meio cabeça-dura - aqueles que me conhecem irão entender perfeitamente

o que digo - para me trazer saciedade em relação a tantas questões que me envolviam e

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eu nem conseguia ordená-las de forma compreensiva para mim mesma. Eu precisava

muito estudar o objeto desta pesquisa, ele fazia e faz parte de mim.

Uma mestranda do GPEP/UFMT, chamada Lúcia Shiguemi Izawa

Kawahara, de descendência japonesa, realizou um belo estudo transgeracional dentro

de uma Escola de Língua Japonesa (ELJ), em Cuiabá, segundo as representações

sociais de membros da colônia nipônica. Esta pesquisadora, conhecedora do idioma

japonês, na qualidade de nikkei2, pode ouvir e organizar os discursos, principalmente de

sujeitos mais idosos, que jamais dominaram o idioma português, buscando “[...] espelhar

experiências que, embora não tenham sido partilhadas na integralidade, ao longo de um

extenso tempo histórico, revelam aspectos essenciais do espaço de convivência comum

a todos os entrevistados”. (KAWAHARA, 2007, p. 15). Para tanto, o trabalho traçou

como objetivo conhecer o conteúdo das representações sociais existentes entre os

membros da colônia acerca das funções da ELJ de Cuiabá.

Esse estudo mostrou que a ELJ permite a manutenção da cultura

japonesa e dos laços ainda prezados por alguns nikkeis, diferente das outras escolas de

línguas. “É possível apontar que a identidade social da colônia japonesa, enquanto

percebida através dos membros deste grupo reflexivo, é proporcionada pela noção de

uma cultura comum, que desenha as teias através das quais eles se relacionam e se

reconhecem”. (KAWAHARA, 2007, p. 193).

Vocês devem estar se perguntando: como este belo trabalho vinculado à

língua japonesa se relaciona com esse emaranhado de angústias pessoais sobre a

língua portuguesa? Estar inserido em uma escola de língua japonesa é se (re)fazer e se

manter japonês, mesmo longe do Japão, em meio a culturas entre outras dentro do

Brasil. Observa-se que a língua japonesa fomenta o reconhecimento dos sujeitos dentro

dos grupos que se fazem pertencer. De outro lado, estar situado em uma escola que

disponibiliza a aprendizagem da língua portuguesa no Brasil é também estar entre

culturas que trazem interlocuções de reconhecimento ou distanciamento entre os grupos

de sujeitos.

As crianças e os/as professores/as querem se reconhecer no convívio

escolar, todavia, o que percebi ao longo do meu processo formativo foi a negação de um

reconhecimento em meio ao outro; ou mesmo de superioridade, pois ninguém quer se

2 Conforme Kawahara (2007, p. 12), comunidade nikkei, “São as pessoas que deixaram a sua terra

natal para tentar a sorte em um país estrangeiro e passaram por experiências que não podem ser perdidas.

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reconhecer na fala considerada errada do outro, ninguém quer falar que cometeu os

mesmos erros ortográficos em relação à escrita do outro. Sendo diferentes do grupo

nikkei, as pessoas que convivem nas escolas públicas do Brasil se distanciam entre si

quando o uso da língua culta é exigido. Mesmo se reconhecendo como sujeitos

integrantes de grupos dentro das escolas muitos professores/as e alunos/as exercem

um grande esforço de não reconhecimento linguístico aos falantes. Poucas pessoas

querem ser: Nois é jeca mais é jóia3! Mesmo estando contido nesta cultura. Existem

muitas culturas brasileiras que são negadas pelo próprio grupo, em meio a outras.

Buscando conhecer esse e outros exemplos de caminhos investigativos

construídos por outros pesquisadores, compreendi que a pesquisa que me propus

realizar tinha um potencial para além das minhas angústias. Eu não iria investigar algo

para mim mesma, mas sobre uma teia de relações sociais em que eu vivia presa, esta

produzida por várias pessoas. Então, comecei a assumir meus erros ortográficos e

teóricos e não queria mais escondê-los ou superá-los; entendê-los e, assim, caminhar

para outras possibilidades. “Para transformar, é preciso ter consciência e compreensão

das dimensões que se entrecruzam na prática dentro da qual nos movemos”.

(SACRISTÁN; PÉREZ GÓMEZ, 2000, p. 10).

No dia treze de abril de 2011, a Professora Eugênia Paredes sugeriu que

eu buscasse abrigo junto a outro grupo de pesquisa, sob a orientação de colega

igualmente credenciado no PPGE/UFMT. Depois de alguns dias, ela encerrou

definitivamente as suas atividades junto ao GPEP/PPGE/UFMT. Naquela ocasião, o

Professor Doutor Carlo Ralph De Musis solicitou, e lhe foi concedida, a possibilidade de

continuar orientando a pesquisa que me propus realizar. Além dos momentos de

orientação promovidos pelo Professor Carlo De Musis em plataformas virtuais – entre

tantas especialidades, a intimidade com a tecnologia - acompanhou todo o processo de

uma possível inserção minha em outro grupo de pesquisa. Aproveito este relato para

apresentar meus sinceros agradecimentos ao Professor Carlo De Musis, que guiou todo

o meu percurso investigativo, ajudando com os estudos e a pesquisa.

No dia 22 de maio de 2011, Luísa Maria Teixeira Silva Santos, secretária

no PPGE/UFMT, me informou por telefone que o colegiado do PPGE/UFMT encontrou

no meu caso razões para acolher a minha pesquisa junto ao Grupo de Estudos e

Pesquisas em Política e Formação Docente: educação infantil, fundamental e superior

3 Letra de música do compositor Juraildes da Cruz, que conferiu ao artista o Prêmio Sharp em 1997,

atual Prêmio da Música Brasileira.

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(GEPForDoc), coordenado pela Professora Doutora Filomena Maria de Arruda Monteiro,

minha nova orientadora. A continuação do caminhar estava garantida.

No dia 24 de maio de 2011, comecei, oficialmente, minha nova jornada de

estudos e pesquisa, em um conversa de orientação com a Professora Filomena

Monteiro. Momento único de adoção intelectual. Ela me recebeu com todo cuidado de

alguém que se preocupa com os processos formativos de desenvolvimento profissional

de professores/as. Digo mais, ela se preocupa com o lado humano das pessoas. Após

concessão de boas vindas, permitiu que eu continuasse com o mesmo objeto de

pesquisa e exatamente com as reflexões teóricas que havia construído, mesmo não

sendo coerentes com a linha de estudos e pesquisas elaboradas pelo seu grupo.

Agradeço e muito por esta generosidade. Neste encontro, ela me indicou referências

bibliográficas e apresentou orientações fundamentais, assim, tive mais uma

oportunidade de mudar meus pensares, principalmente sobre o tema formação de

professores.

Considerando a data de depósito do relatório desta pesquisa para a

qualificação, eu teria, nesse momento, exatamente um ano e um mês de reestruturação

dos trabalhos. Depois de percorrer, aproximadamente, cinco anos de estudos em uma

mesma linha de pesquisa, avaliei que um ano e um mês era pouco tempo para que eu

pudesse amadurecer compreensões acerca do que pensam os/as pesquisadores/as no

novo grupo. Entretanto, era o tempo CAPES4 que eu tinha. Aproveito o

desencadeamento destas ideias para apresentar meus imensos agradecimentos a

Professora Filomena Monteiro e ao GEPForDoc. Com harmonia e companheirismo,

estes profissionais auxiliaram o desenvolvimento desta pesquisa ao longo deste precioso

tempo dedicado a emoldurar as ideias, os pensares, de modo a consolidar em objeto

próprio de uma tese.

Andando em tantos espaços diferentes, caminhando para novos

entendimentos sobre diversos assuntos educativos, ainda estava ali, no âmago das

minhas preocupações, a dúvida sobre o ensino e a aprendizagem da língua portuguesa.

Mas, agora em formato ampliado, outras dúvidas surgem: como ocorrem os processos

representacionais que nos permitem conhecer mediante o uso da língua portuguesa a

realidade circundante? Como apreendemos socialmente os saberes referentes à língua

portuguesa? Como solucionar as dificuldades dos/as alunos/as encontradas em práticas

4 Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

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de escrita e de oralidade? Há, explicitamente, discursos e representações sociais de

professores/as sobre a língua portuguesa que apresentam a existência do outro e dos

processos interativos dentro das práticas educativas? Os/as professores/as apresentam

dizeres e representações sociais sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua

portuguesa contendo conteúdos da prática em si ou acerca de outros processos, como a

partilha de conhecimentos? Existem reconhecimentos linguísticos, ou a falta deles, neste

convívio escolar? Claro que fiquei perdida em tantas dúvidas, por isto, precisei organizar

tais questionamentos e, assim, iniciei a construção do objeto de pesquisa. No próximo

capítulo poderão ser vistas as principais definições metodológicas delineadas nesta

investigação.

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CAPÍTULO I METODOLOGIA DA PESQUISA

Neste capítulo, que apresenta os principais caminhos percorridos na

pesquisa, com o intuito de valorizar as várias autorias aqui contidas em meio a inúmeras

colaborações, modifico o sujeito dos termos das orações e abro a redação para a

inserção dos dizeres partilhados. Como irei tratar da pesquisa em si, me retiro do centro

da narração e me direciono para o uso do termo nós, estabelecendo como sendo o

sujeito principal das orações do presente relatório.

O objetivo da pesquisa foi compreender as representações sociais de

professoras sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa na primeira

fase do ensino fundamental (1º ao 5º ano). De acordo com este intuito, construímos

outros objetivos para contemplar aspectos específicos necessários a serem delineados.

Foram eles: primeiro, localizar e compreender a estrutura das representações sociais

docentes sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa na primeira

fase do ensino fundamental; segundo, localizar e compreender o conteúdo das

representações sociais docentes sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua

portuguesa na primeira fase do ensino fundamental. Para alcançar cada um destes

objetivos específicos foi preciso proceder de formas diferentes. Estes díspares métodos

que utilizamos na pesquisa serão apresentados neste capítulo. Mesmo sendo desiguais,

foram complementando entre si para que pudéssemos atingir o objetivo geral da

investigação.

Este Capítulo foi dividido em cinco partes. Na primeira apresentamos

algumas definições de princípios teórico-metodológicos que nortearam nossos trabalhos.

Na segunda mostramos alguns informativos censitários sobre o grupo de professoras

que participaram da pesquisa. Na terceira, expusemos como ocorreu o estudo piloto. Na

quarta descrevemos os procedimentos tomados na segunda fase da coleta dos

materiais de campo. Finalmente, na última parte relatamos a definição do traçado

metodológico realizado na terceira fase de coleta dos materiais.

1.1 As vertentes quantitativas e qualitativas da pesquisa

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Há muitos anos, vários pesquisadores apontam relações e diferenças

entre as pesquisas quantitativas e as qualitativas. Antigamente, inspirados por Augusto

Comte (1798-1857), muitos pesquisadores vinculados à abordagem quantitativa,

como por exemplo, Émile Durkheim (1858-1917), estudavam determinados objetos

das ciências sociais no mesmo formato que aqueles pesquisados junto às ciências

naturais, construindo, assim, conhecimentos organizados compreensivamente

mediante regularidades e leis. Julgamentos e crenças do/a pesquisador/a não eram

permitidos, pois pensavam que eles poderiam contaminar os denominados dados

coletados. (GOLDENBERG, 2009).

Conforme Souza (2011)5 - em palestra junto ao GEPForDoc - por

vários fatores, no ano de 1920, as pesquisas quantitativa e qualitativa passaram por

confrontos entre elas, principalmente com o movimento que se chamou de Escola de

Chicago. No campo da Sociologia, um grupo de pesquisadores começou a elaborar

outra perspectiva de pesquisa que não a quantitativa. Refletiram que as dimensões,

os fenômenos e os estados humanos não poderiam ser compreendidos a partir de

uma vertente investigativa positivista, ou mesmo por um modelo único de pesquisa

para todas as ciências, fundamentado nos estudos das ciências da natureza.

Observando que a natureza e a cultura se processam em meio a especificidades,

pesquisadores como Wilhelm Dilthey e Max Weber, entre muitos outros, colocaram

em cena pesquisas que consideravam os valores, as crenças, os sentimentos e as

representações das pessoas e do/a próprio/a pesquisador/a. Estes elementos foram

situados em um contexto de significados importantes para serem considerados nas

pesquisas.

Entretanto, esse novo modelo de investigação não poderia sofrer

equívocos, cheios de parcialidades e de preconceitos advindos do/a pesquisador/a.

Conhecedores deste preceito, alguns pesquisadores buscaram novas alternativas.

Pierre Bourdieu propôs o esforço controlado de conter a subjetividade, denominado

de objetivação, para não fazer do objeto estudado um objeto inventado. Recusando

a denominada neutralidade do/a pesquisador/a, Bourdieu dizia que para enfrentar e

assim excluir o viés nas ciências sociais, é fundamental a apresentação explícita das

premissas valorativas construídas pelos/as pesquisadores/as nos resultados da

pesquisa.

5 Palestra proferida pelo Professor Doutor Elizeu Clementino de Souza, junto ao

GEPForDoc/PPGE/UFMT, em 9 de dezembro de 2011.

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Así como no hay registro perfectamente neutral, tampoco existe uma pregunta neutral. El sociólogo que no somete sus propias interrogaciones a la interrogación sociológica no podría hacer um análisis verdaderamente neutral de las respuestas que provoca. (BOURDIEU, CHAMBOREDON, PASSERON, 2008, p. 69).

Compreendemos, assim, que entramos em uma nova fase de

possibilidades investigativas, pois, atualmente, podemos considerar dentro dos

estudos as especificidades de cada contexto, as possibilidades criativas de estudo

de infinitos objetos visíveis e invisíveis, o/a pesquisador/a e os sujeitos da pesquisa

enquanto interlocutores/as atuantes movidos por sentimentos, valores, crenças,

representações sociais, etc.

Mergulhamos em um mar de possibilidades, contendo, diversas

vertentes teóricas, técnicas de coleta de materiais de campo, de organização e

processamento de materiais textuais, entre outras de que muitos pesquisadores

fazem uso para entender os fenômenos e/ou objetos investigados. Quais seriam,

entre elas, as mais adequadas para a questão investigativa? Compreendemos que

todos os passos investigativos se voltam sempre para o objetivo geral que

construímos. Todas as escolhas são dependentes do que pretendemos conhecer e

também derivam de nossa opção teórico-metodológica.

Conforme Oliveira (2005b), o desenvolvimento metodológico dos

estudos de representações sociais no Brasil se firma aparentemente em oposição

entre métodos quantitativos e qualitativos. Para a autora, apesar de gerar

contradições, estes embates não resultam em dilemas de fato, pois “[...] é possível

observar empiricamente a emergência de resultados similares em estudos

realizados com métodos diferentes, além de, mais recentemente, a utilização

associada de técnicas qualitativas e quantitativas terem permitido a obtenção de

resultados complementares”. (OLIVEIRA, 2005b, p. 86).

O tratamento desenvolvido por Oliveira (2005b) para discutir tal

dicotomia nos ajudou a compreender que a utilização de uma ou outra abordagem

de pesquisa depende de vários fatores: o objeto escolhido; a escolha metodológica

em si não apresenta um caráter de neutralidade. A dimensão a ser alcançada dentro

do fenômeno representacional; o nível em que o/a pesquisadora objetiva acessar a

representação; entre outras; e, principalmente, nos diz que nenhum método isolado

de investigação, por diversificado que possa ser, “[...] permite recuperar

integralmente os dois aspectos fundamentais de uma representação social, ou seja,

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seu conteúdo e sua estrutura interna. Nesse sentido, a configuração da metodologia

a ser empregada em um dado estudo nem sempre segue caminhos estritamente

padronizados”. (OLIVEIRA, 2005b, p. 87).

A questão pode ser sintetizada em, uma vez dado um problema de pesquisa de representação social com características particulares, examina-se quais métodos e técnicas de estudo disponíveis poderiam dar melhor conta do problema, em função das dimensões que se quer explorar ou desvendar: descrição do conteúdo das representações; análise do conteúdo e da estrutura; análise da estrutura. Para cada dimensão destacada, ora a qualidade se imporá como necessária, e ora a quantificação da qualidade poderá ser uma ferramenta imprescindível para a exploração da dimensão pretendida. (OLIVEIRA, 2005, p. 88).

Uma aproximada compreensão foi realizada por Bauer e Gaskell

(2008) em um livro que trata sobre métodos empregados na pesquisa social. Os

autores argumentam que o/a pesquisador/a não pode pensar em quantificar sem

qualificar determinado material recolhido, como também, antes de propor uma

medição dos materiais obtidos, ele precisa ter uma ideia prévia de distinção

qualitativa em meio a categorias sociais.

Diante desses norteamentos, podemos dizer que nossos trabalhos se

situaram dentro das pesquisas quantitativas, pois nos valemos de elementos que

passaram por tratamentos estatísticos. Fundamentados pela Teoria das

Representações Sociais, consideramos a dimensão social como parte essencial do

fenômeno representacional, em que as representações sociais são localizadas

dentro de dizeres de muitos, não apenas de uma pessoa. Seguindo este

norteamento, utilizamos técnicas de processamento de materiais textuais, que

favoreceram a quantificação de palavras, com o intuído de buscarmos a estrutura

interna do saber social do grupo de docentes sobre a sua própria prática, o núcleo

central e os elementos periféricos que estruturaram as representações sociais

docentes sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa. Junto a

esta intenção, as palavras evocadas pelas participantes da pesquisa, na segunda

fase de recolha de materiais com o uso da técnica de evocações livres, foram

submetidas a tratamentos estatísticos. Além disto, buscamos conhecer o conteúdo

das representações sociais, a partir dos dizeres das professoras, coletados nos

momentos de entrevistas, que passaram por processamentos com uso de

ferramenta computacional.

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De outro ponto de vista, nossa pesquisa também é qualitativa, pois

buscamos fundamentos teórico-metodológicos que possibilitaram a construção de

compreensões acerca do fenômeno representacional contido na prática educativa.

Além disto, as referências utilizadas da área da Formação de Professores, da

Linguagem e da Teoria das Representações Sociais consideram a subjetividade do

ser humano e buscam compreender a multiplicidade de dimensões que envolvem

determinados processos contidos nas vivências das pessoas.

Em síntese, nossa pesquisa se insere nas tradições metodológicas

qualitativas ao buscar ver o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa

através dos olhos das professoras participantes da pesquisa e dos sentidos que

estes sujeitos sociais atribuem às práticas educativas que desenvolvem.

1.2 O local da pesquisa e o grupo de professoras

Escolhemos entrar em todas as escolas públicas municipais e urbanas

da cidade de Jataí, município localizado no interior do Estado de Goiás, que ofertam

os anos iniciais do ensino fundamental. Consideramos que cidades pequenas são

espaços que favorecem ao estudo da gênese das representações sociais, pois as

mudanças sociais que ocorrem nestas cidades apresentam um ritmo mais lento ou

diferente em relação aos espaços de grande vida urbana.

Entendemos que o espaço é um conjunto de formas com

particularidades da sociedade em movimentos dinâmicos presentes em determinado

tempo físico e histórico, frações sociais somam-se para o conjunto totalitário de

possibilidades da sociedade. Conforme Santos (1982, p. 38), “[...] o espaço

geográfico é tudo isso e mais a sociedade: cada fração da natureza abriga uma

fração da sociedade atual, e considera como um ponto determinado no tempo, uma

paisagem representa diferentes momentos do desenvolvimento de uma sociedade”.

“[...] formado por um conjunto indissociável, solidário e também contraditório, de

sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas

como um quadro único na qual a história se dá.” (SANTOS, 2009, p. 63). Portanto, o

espaço, tanto físico, quanto social, pertence a uma rede complexa de ligações

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dinâmicas, o que a liga a cidade de Jataí aos processos dinâmicos que ocorrem no

Estado de Goiás, na Região Centro Oeste, como também no Brasil e no mundo.

Jataí é uma cidade situada no sudoeste de Goiás, a 323 km da capital

estadual, Goiânia. Tem uma área de 7.174,23 km² e o bioma predominante é o

Cerrado. Começou a ser povoada em 1836, mas foi solenemente instalada em 1885.

Estima-se que a população é constituída por 88.048 habitantes6. No perfil

agropecuário, nos anos de 2003/2004 e 2005/2006, o município foi considerado o

maior produtor de milho e sorgo do Brasil, como também, o maior de soja de Goiás.

“É o maior produtor de grãos de Goiás e o quinto do Brasil. O município produz

1,08% de toda produção nacional de grãos, por conta destes valores, em Jataí, a

produtividade dos agricultores já superou a dos Estados Unidos”7.

Em Jataí, os anos iniciais do ensino fundamental de nove anos, que se

processam no Sistema Municipal de Ensino, no perímetro urbano, são ofertados em

dezenove escolas, sendo os espaços que percorremos na busca por uma

compreensão sobre o saber social do grupo de professoras acerca do ensino da

língua portuguesa. A reorganização do ensino fundamental para nove anos

fomentou mudanças nos sistemas de ensino, devendo ocorrer até 2010, atendendo

ao disposto na Lei nº 11.274, de 6 de fevereiro de 2006. De acordo com o Ministério

da Educação, esta reformulação teve como objetivos:

a) melhorar as condições de equidade e de qualidade da Educação Básica; b) estruturar um novo ensino fundamental para que as crianças prossigam nos estudos, alcançando maior nível de escolaridade; c) assegurar que, ingressando mais cedo no sistema de ensino, as crianças tenham um tempo mais longo para as aprendizagens da alfabetização e do letramento. (BRASIL/MEC/SEB, 2009, p. 5)

8.

A ampliação da oferta do ensino de oito para nove anos implicou em

alterar o artigo 208 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que

trata da efetivação dos deveres do Estado com a educação mediante apresentação

de cinco incisos que dispõem de garantias para a sua realização; destes a redação

do inciso primeiro estabelece que: “I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4

(quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita

6 Fonte Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Disponível em:

<http://www.ibge.gov.br/cidadesat/painel/painel.php?codmun=521190#>. Acesso em: 23 abr. 2009. 7 Disponível em: <http://www.jataí.go.gov.br>. Acesso em: 23 abr. 2009.

8 BRASIL, MEC/SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA. Ensino Fundamental de nove anos:

passo a passo do processo de implantação, Brasília, 2009. 28 p. Disponível em: <http:// www.mec.gov.br >. Acesso em: jan. 2011

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para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria”; o Art. 32 da Lei

9394/96 – LDB –, modificado pela Lei 11.274, que afirma que o ensino fundamental

é obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando-se

aos 6 (seis) anos de idade, e tem por objetivo a formação básica do cidadão,

mediante: I - o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios

básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo; II – a compreensão do

ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores

em que se fundamenta a sociedade; III - o desenvolvimento da capacidade de

aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a

formação de atitudes e valores; IV - o fortalecimento dos vínculos de família, dos

laços de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida

social. A Lei nº 10.172, de 9 de janeiro de 2001, que aprova o Plano Nacional de

Educação, estabelece o ensino fundamental de nove anos como meta da educação

nacional; a Lei nº 11.114, de 16 de maio de 2005, que altera a Lei nº 9.394/1996 e

torna obrigatória a matrícula das crianças de seis anos de idade no ensino

fundamental, e a Lei nº 11.274, de 6 de fevereiro de 2006, que altera a Lei nº

9.394/1996 e amplia o ensino fundamental para nove anos de duração, com a

matrícula de crianças de seis anos de idade e estabelece prazo de implantação do

ensino fundamental de nove anos pelos sistemas educativos ocorra até o ano de

2010.

Esses documentos legais, entre outros, como resoluções e decretos,

favoreceram a saída da criança de seis anos da educação infantil para ingressar no

ensino fundamental, fomentando uma reestruturação da prática pedagógica9 de

todas as escolas que ofertam esta etapa da educação básica, incluindo aquelas

localizadas no Estado de Goiás, que aderiram oficialmente ao ensino de nove anos,

a partir do ano de 2004, sob os instrumentos legais: Resolução do Conselho

Estadual de Educação (CEE) nº 186/2004, que autoriza a ampliação do ensino

fundamental do sistema educacional do Estado de Goiás e a Resolução CEE nº

258/2005, que regulamenta a ampliação do ensino fundamental do sistema

educativo de Goiás para nove anos. No caso específico do Sistema Municipal de

Educação da cidade de Jataí, Estado de Goiás, nosso locus investigativo, todos os

9 Consideramos que a implantação dessas mudanças no sistema educativo não é imediata, gestores,

coordenadores, pais, alunos e família ainda estão sofrendo com as transições dessas inovações.

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norteamentos sobre o ensino fundamental de nove anos foram recolhidos junto a

estes instrumentos normativos.

Para o BRASIL/MEC/SEB (2009, p. 26), o ensino fundamental de nove

anos implica em acessar mais “[...] cedo à cultura letrada, o que poderá se reverter

em um melhor desempenho dos alunos no que diz respeito à alfabetização e ao

letramento. É preciso ressaltar, no entanto, que as características da etapa de

desenvolvimento devem ser preservadas”. A partir dos direcionamentos do

BRASIL/MEC/SEB (2009), resumidos na próxima citação, fizemos a nossa escolha

metodológica de divisão do corpus textual obtido mediante recolha de conteúdos

advindos das falas das professoras. Sobre o processo de alfabetização, a Secretaria

de Educação Básica/BRASIL/MEC considera que:

Esse primeiro ano constitui uma possibilidade para qualificar o ensino e a aprendizagem dos conteúdos da alfabetização e do letramento. Mas, não se deve restringir o desenvolvimento das crianças de seis anos de idade exclusivamente à alfabetização. Por isso, é importante que o trabalho pedagógico assegure o estudo das diversas expressões e de todas as áreas do conhecimento. Ressalte-se que a alfabetização não deve ocorrer apenas no segundo ano do Ensino Fundamental, uma vez que o acesso à linguagem escrita é um direito de todas as crianças. Os sistemas e todos os profissionais envolvidos com a educação de crianças devem compreender que a alfabetização de algumas crianças pode requerer mais de 200 dias letivos e que é importante acontecer junto com a aprendizagem de outras áreas de conhecimento. O Ensino Fundamental de nove anos ampliou o tempo dos anos iniciais, de quatro para cinco anos, para dar à criança um período mais longo para as aprendizagens próprias desta fase, inclusive da alfabetização. É fundamental considerar o que estabelece o Parecer CNE/CEB nº 4/2008, a saber: 4 – O antigo terceiro período da Pré-Escola não pode se confundir com o primeiro ano do Ensino Fundamental, pois esse primeiro ano é agora parte integrante de um ciclo de três anos de duração, que poderíamos denominar “ciclo da infância”. 5 – Mesmo que o sistema de ensino ou a escola, desde que goze desta autonomia, faça a opção pelo sistema seriado, há necessidade de se considerar esses três anos iniciais como um bloco pedagógico ou ciclo seqüencial de ensino. 6 – Admitir-se-á, entretanto, nos termos dos artigos 8º, 23 e 32 da Lei nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação), o desdobramento do Ensino Fundamental em ciclos, no todo ou em parte. 7 – Os três anos iniciais são importantes para a qualidade da Educação Básica: voltados à alfabetização e ao letramento, é necessário que a ação pedagógica assegure, nesse período, o desenvolvimento das diversas expressões e o aprendizado das áreas de conhecimento estabelecidas nas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental. 8 – Dessa forma, entende-se que a alfabetização dar-se-á nos três anos iniciais do Ensino Fundamental. (BRASIL/MEC/SEB, 2009, p. 23).

Partindo desse norteamento, buscamos saber junto a Secretaria Municipal

de Educação de Jataí/GO se o currículo atualmente do ensino ofertado é organizado

de forma seriada ou ciclada. O ensino fundamental de Jataí apresenta a

nomenclatura por anos de ensino e considera o 1º e 2º ano como sendo o ciclo que

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promove a alfabetização. Dentro deste bloco pedagógico reprovação de alunos/as

não é aceita. O 3º, 4º e 5º anos são considerados como períodos sequenciais,

contendo a possibilidade de reprovação discente em cada um dos anos de ensino.

Como podemos observar, o formato difere da legislação vigente, pois como vimos na

citação anterior, para o BRASIL/MEC/SEB (2009, p. 23), “[...] entende-se que a

alfabetização dar-se-á nos três anos iniciais do Ensino Fundamental”; sendo eles o

1º, 2º e 3º ano, não apenas no 1º e 2º ano.

Consideramos o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa

um contínuo processo de apropriação e de construção adequada de conhecimentos

para uma inserção reflexiva e atuante na sociedade. De acordo com este princípio,

escolhemos fazer uma divisão considerando a realidade das escolas, para organizar

e analisar os materiais coletados.

Consideramos que existem especificidades entre as atuações

professorais com atenção aos respectivos blocos pedagógicos, desta maneira,

decidimos trabalhar com as falas em formato separado, pois os dizeres das

professoras sobre as práticas pedagógicas poderiam ser diferentes em relação aos

blocos pedagógicos, apresentando representações sociais diferentes. Neste sentido,

em todos os materiais coletados consideramos as falas das professoras que atuam

no denominado 1º ciclo ou bloco pedagógico do ensino fundamental (1º e 2º ano)

separadamente daqueles dizeres das professoras que atuam no 2º bloco

pedagógico (3º, 4º e 5º ano).

Tendo posse do Ofício nº 758/2009, recebemos a autorização da

Secretária Municipal de Educação para realizar o nosso estudo junto às escolas

públicas municipais de Jataí. Vide anexo A. Depois, recebemos um parecer

consubstanciado referente ao nosso projeto de pesquisa; protocolado junto ao

Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação

(PRPPG) da Universidade Federal de Goiás (UFG), sede em Goiânia; sob o nº

050/2010, que avaliou o projeto como estando de acordo aos termos definidos na

Resolução CNS nº 196/1996, que aprovou o projeto para a sua realização. Anexo B.

Após recebermos tais autorizações, conversarmos com diretores/as e

coordenadores/as pedagógicos/as das escolas para que tivéssemos o

consentimento de incursão nos ambientes educativos. Agendamos os encontros

com as professoras em diferentes dias e horários, conforme os critérios e

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disponibilidades que se ofereciam. Estes foram realizados em formato individual,

sem a participação dos/as alunos/as e de outros/as colegas docentes.

Buscamos encontrar um espaço na escola que pudesse favorecer tal

procedimento. Entretanto, a infraestrutura das escolas é organizada para atender ao

uso coletivo, em que todos os espaços são compartilhados. Por este motivo, muitos

dos contatos foram realizados no pátio das instituições, como também, nas próprias

salas de aula, sem a presença dos/as alunos/as, na biblioteca, na coordenação

pedagógica e na sala dos/as professores/as. Em alguns encontros, quando

estávamos dialogando com determinada professora, o ir e vir de outras pessoas se

fez presente, variável que favoreceu a possibilidade de outros encontros, como

também, trouxe a negação para participar da pesquisa.

Com o intuito de compreender o conhecimento social do grupo,

inicialmente objetivávamos contatar todos os professores atuantes de 1º ao 5º ano

do ensino fundamental do Sistema Municipal, na rede localizada no perímetro

urbano, universo de 170 profissionais. Alguns fatores dificultaram os contatos, como

por exemplo, evento comemorativo, recesso letivo e a negação para participar da

pesquisa. Estes determinantes possibilitaram a coleta de 100 colaborações, o que

correspondeu a 59,00% do conjunto de professore/as de todo o sistema público

urbano do município.

Dessa amostra, obtivemos contribuições de apenas um professor do

sexo masculino, portanto, iremos tratar o material recolhido, considerando o

quantitativo maior de docentes, em que iremos chamar todo o grupo colaborador de

professoras. Seguem alguns informativos censitários sobre o grupo:

Série (ano) que leciona Formação Titulação Tempo de serviço

Pe

da

go

gia

Ou

tra

s

Gra

du

açã

o

Es

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cia

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ês a

10 a

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20 a

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21 a

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ian

te

23 33 19 14 11 90 10 39 61 59 31 10

Quadro 1 Informativos censitários: grupo de professoras entrevistadas

Fonte: Material coletado na pesquisa.

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Como podemos observar, a amostra foi constituída por 56 professoras

que trabalham na alfabetização, que correspondem ao 1º e 2º ano do ensino

fundamental. Seus/suas alunos/as têm, preferencialmente10, entre 6 a 7 anos.

Somando aos indicativos, 44 docentes, 3º, 4º e 5º ano, recebem alunos/as entre a

faixa etária preferencialmente de 8 a 10 anos. Entendemos que são crianças em

processo de desenvolvimento físico, psíquico e social, buscando a construção de

sua autonomia. Consideramos também que é uma etapa fundamental para a

formação de um sujeito crítico e ativo na sociedade.

Após um ano da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional (LDB), número 9.394, ano de 1996, os profissionais que

trabalhavam na primeira fase do ensino fundamental, por normatização, tiveram que

adequar suas formações para o ensino superior. A maioria possuía apenas o curso

de Magistério, correspondendo ao ensino técnico (médio). Muitas professoras

contatadas, que tinham apenas o ensino técnico, procuraram o curso de Pedagogia,

em caráter emergencial, junto a UFG, campus Jataí, ofertado em parceria com a

prefeitura municipal. Estas instituições ofereceram um curso extra, com vestibular

diferenciado e Projeto Pedagógico de Curso próprio, para os profissionais da

educação do sistema de ensino, contribuindo, assim, para o atendimento de tal

regulamentação. A oferta desta licenciatura iniciou no período de 2004 e em 2007

culminou com a colação de grau de 83 professoras11.

Além desse curso, a UFG, campus Jataí, oferece o curso de Pedagogia

em termos regulares desde o ano de 1985, tendo, atualmente (ano de 2012), 27

anos de funcionamento. Observamos que as profissionais da educação do Sistema

Municipal de Ensino de Jataí conseguiram se adequar às exigências da lei, 90% são

pedagogas e 10% têm formação em outros cursos como Letras, Geografia, História

e Ciências Biológicas, com complementação pedagógica. O Artigo 61 da LDB/1996

discorre que para trabalhar na primeira fase do ensino fundamental, o/a professor/a

deve estar habilitado para atuar no mesmo. Essa habilitação é obtida em cursos de

licenciatura plena em Pedagogia, como também, em cursos de especialização e de

complementação pedagógica.

10

Utilizamos o termo preferencialmente para designar a entrada dos alunos na primeira fase do ensino fundamental a partir de 6 anos de idade, conforme a LDB nº 9394/96. 11

Informações obtidas junto ao Projeto Pedagógico do Curso de Pedagogia da UFG, campus Jataí, ano 2011.

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Norteados pelas contribuições de Marcelo (1999), consideramos que

essa formação profissional inicial é constituída por características pessoais e grupais

dos sujeitos, de interações sociais que se processam em seu interior e ao seu

entorno, de estruturas e conteúdos curriculares e de fatores contextuais que

fomentam o processo de aprender a ensinar. Portanto, se formar professor/a está

para além da obtenção exclusiva de saberes universitários, pois, é um processo

ininterrupto que se desenvolve em contextos sociais e em espaços escolares

imersos em culturas, crenças, valores, ideologias diversificadas, representações

sociais e, se concretiza em práticas educativas aninhadas, que promovem

aprendizagens ligadas diretamente à experiência professoral.

Além do exposto, Marcelo (1999) nos apresenta que as pesquisas

referentes à formação de professores e acerca do saber sobre aprender a ensinar

estão considerando todos os momentos da carreira docente, que se constitui em

uma jornada de aprendizagem da docência transcorrida ao longo de toda a vida

professoral; deste modo, estas investigações preocupam-se com os professores em

formação, os professores principiantes e, também, com os professores em exercício.

O desenvolvimento de uma carreira é, pois, um processo, não uma série de acontecimentos. Para alguns, esse processo pode parecer linear, mas, para outros, há oscilações, regressões, becos sem saída, declives, descontinuidades. O fato de encontrar seqüências-tipo não deveria ocultar o fato de que há pessoas que jamais deixam de explorar, ou que jamais chegam a estabilizar-se, ou que se desestabilizam por motivos de ordem psicológica (tomada de consciência, mudança de interesses, mudança de valores) ou externas (acidentes, mudanças políticas, crises econômicas). (HUBERMAN, 1989 apud GARCIA, 1998, p. 72).

Nossa pesquisa contatou profissionais principiantes e aquelas com

longa experiência professoral, assim distribuída: oito delas apresentaram tempo de

serviço docente de até três anos; dezoito trabalham como professoras entre os

quatro até seis anos; trinta e três professoras estão na faixa de sete até dez anos de

atuação; vinte e sete trabalham entre onze até dezenove anos e, finalmente, catorze

exercem seu ofício há vinte anos ou mais.

Essa amostra de sujeitos permitiu a recolha de materiais apresentados

por professoras de diversos ciclos professorais, por este motivo, tivemos a

possibilidade de localizar possíveis representações sociais contidas no centro das

diversificadas influências pessoais, profissionais e contextuais.

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Entre as 100 professoras contatadas na segunda fase da coleta, das

que se disponibilizaram, escolhemos 50 profissionais para responder algumas

perguntas no momento das entrevistas na terceira fase da coleta. Por este motivo,

consideramos dispensável uma segunda apresentação dos informativos censitários

por se tratar do mesmo grupo. Informativos censitários do grupo podem ser vistos no

Apêndice F.

Definimos que as falas das professoras recolhidas com o uso de

entrevistas seriam numeradas pela ordem em que os contatos foram realizados. A

professora que foi a primeira a ser entrevistada recebeu o número 01 e assim por

diante. Não optamos pela identificação do nome legítimo ou fictício das professoras,

pois preferimos apresentar exemplares da fala de algumas professoras que trazem

indícios de representações sociais do grupo. O saber individual foi considerado para

apontar exemplares dos saberes sociais do grupo.

1.3 O estudo piloto e o software ALCESTE

No início do curso de doutorado decidimos realizar um estudo piloto12 e,

assim, conhecer a realidade vivida pelos/as professores/as que atuam nos primeiros

anos do ensino fundamental. Um primeiro contato foi realizado no ano de 2009,

mediante entrevistas semidirigidas. Buscamos apreender o universo nocional

apresentado por docentes acerca de dois elementos que envolvem o processo de

ensino-aprendizagem da língua portuguesa, leitura e escrita. Também, procuramos

conhecer os espaços escolares em que atuam. Foi um momento importante para

reconhecimento físico, social e coleta de informações sobre as atividades desenvolvidas

pelos/as docentes.

Para a recolha de informações foi construído um instrumento questionador.

Seis professoras dos anos iniciais do ensino fundamental de uma mesma escola pública

localizada na cidade de Jataí, Estado de Goiás, responderam a um conjunto de 13

questões. O roteiro pode ser visto no Apêndice A. Todas as entrevistas foram gravadas

12

Primeira fase de coleta de materiais.

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em arquivo de áudio. Após realizarmos as entrevistas, o material gravado era

transcrito para um arquivo de texto junto ao programa Word.

No final dos contatos, construímos um único arquivo de texto de campo

contendo todas as falas recolhidas. Durante a etapa de digitação, foi realizado um

tratamento do material recolhido para adequar aos padrões do software utilizado

para o processamento e organização das entrevistas. Este software é chamado de

Analyse Lexicale par Contexte d’ un Ensemble de Segments de Texte (ALCESTE).

Esse programa, desenvolvido por Max Reinert, é um programa

computacional que nos fornece índices semânticos do material processado em sua

plataforma. Para Kalampalikis e Moscovici (2005), o software ALCESTE fornece uma

cartografia dos principais lugares comuns de uma comunicação, os mundos lexicais

que são considerados como vestígios meramente semióticos inscritos na

materialidade do texto. A lógica do programa ALCESTE é processada através de um

conjunto de cálculos que fragmentam o corpus textual que foi inserido nele, sendo

estes cortes relativamente análogos.

Tais fragmentos são nomeados como unidades de contexto que podem

ser distinguidas em de dois tipos: unidades de contexto iniciais (UCIs), que

correspondem às divisões feitas pelo/a pesquisador/a, e que identificam, no caso

deste trabalho, as respostas de cada participante; e as unidades de contexto

elementares (UCEs), que durante o processamento dos textos são separadas de

modo a permitir a contextualização do vocabulário típico de cada classe obtida. Os

fragmentos são classificados estatisticamente de acordo com um procedimento

descendente hierárquico. Isto ocorre a partir de uma primeira distribuição dos

fragmentos em duas classes distintas. Esta dupla operação de distribuição e de

classificação possibilita o processamento de um número estável de classes.

(KALAMPALIKIS, MOSCOVICI, 2005).

O programa ALCESTE realiza um processamento de textos que

identifica diferentes e semelhantes campos lexicais presentes no material e, a partir

deles, constrói classes marcadas pelo contraste de seu vocabulário. Desta maneira,

ele favorece um possível reconhecimento, de modo mais ágil, de indícios de

representações sociais ou campos de imagens relacionados a um dado objeto.

(CAMARGO, 2005). Podemos dizer que a organização do material realizada pelo

software trata-se de uma análise de conteúdo. Todavia, antes de qualquer coisa, o

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material recolhido deve ser considerado como excerto de um evento de

comunicação intersubjetiva. (KALAMPALIKIS, MOSCOVICI, 2005).

O estudo piloto realizado foi um momento precioso de treinamento para o

processamento e para leitura de relatórios estatísticos. Foi uma etapa fundamental de

captura de informações importantes que alterou o objeto de pesquisa construído

anteriormente. Anteriormente, buscávamos conhecer e interpretar quais eram as

representações sociais docentes sobre as práticas de leitura e escrita. Após o estudo

piloto, identificamos que seria mais apropriado fazer a união das discussões destas

práticas, pois os dizeres docentes tratavam-nas como justapostas. Finalmente,

compreendemos que seria necessária uma discussão sobre todo o processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa, incluindo as reflexões sobre a leitura e a escrita

como também compreendendo a importância de outros elementos. Esta fase foi

fundamental para traçar novos caminhos investigativos que conduziram para

compreensões que consideram a amplitude de elementos contidos na prática educativa.

Considerando a complexidade dos fenômenos educativos, a singularidade dos

elementos contidos no processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa e a

partilha de saberes entre os profissionais entrevistados; continuamos promovendo a

realização dos trabalhos.

1.4 As evocações livres e o software EVOC

No ano de 2010, realizamos a segunda fase13 de recolha de materiais

advindos do campo de pesquisa para que pudéssemos localizar e sucessivamente

compreender os elementos estruturais das representações sociais docentes sobre o

processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa. Nesta etapa utilizamos a

técnica de evocações livres. Segundo Oliveira (2005a), esta técnica de recolha de

materiais se refere à possibilidade de apreensão das projeções mentais de maneira

espontânea, apresentando conteúdos implícitos e latentes que podem estar

escondidos nos discursos.

13

Consideramos o estudo piloto como sendo a primeira fase de recolha de materiais advindos do campo de pesquisa, pois contribuiu substancialmente na reformulação do trabalho.

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Com a sua utilização, foram recolhidos vocábulos solicitando das

professoras a apresentação de cinco palavras acerca do que pensam sobre o ensino

da língua portuguesa e mais cinco palavras sobre a aprendizagem da língua

portuguesa. Todo o roteiro pode ser visto no Apêndice C. Entendemos que tanto o

ensino, quanto a aprendizagem são processos que apresentam especificidades

diferentes, ao mesmo tempo, se complementam e são fundamentais para as práticas

educativas. Esta possibilidade de relação entre ambos os processos se firma nas

ideias de Pérez Gómez (1998), que considera a aula como espaço de saber

compartilhado, para o autor, o ensino significa:

[...] um processo que facilita a transformação permanente do pensamento, das atitudes e dos comportamentos dos alunos/as, provocando a comparação de suas aquisições mais ou menos espontâneas em sua vida cotidiana com as proposições das disciplinas científicas, artísticas e especulativas, e também estimulando sua experimentação na realidade. (PÉREZ GÓMEZ, 1998, p. 70).

E a aprendizagem significa “[...] um prolongado processo de

assimilação e reconstrução por parte do/a aluno/a da cultura e do conhecimento

público da comunidade geral”. (PÉREZ GÓMEZ, 1998, p. 67). Todavia,

compreendendo a importância da relação entre ensino e aprendizagem no processo

educativo, optamos por uma recolha separada dos temas para que pudéssemos

entender como as professoras tratam os mesmos em suas variadas possibilidades,

não apenas em uma dimensão de justaposição.

Após a fase espontânea de exposição de vocábulos (que contribui para

a organização dos textos colhidos em campo por Ordem Média de Evocação -

OME), pedimos a organização dos mesmos por ordem de importância (Ordem Média

de Hierarquização – OMI). A evocação livre permite a atualização de elementos

implícitos que seriam perdidos ou mascarados nas produções discursivas. A

hierarquização dos termos foi solicitada de modo a considerar a proposta de Abric

(2003), que destaca a relevância da ordem de importância atribuída pelo sujeito na

reflexão acerca das evocações livres a partir da justificativa de que o conteúdo

essencial das associações pode aparecer apenas depois de uma fase de

aquecimento e de redução de mecanismos de defesa.

Finalmente, solicitamos que as professoras apresentassem frases

resumidas justificando as palavras evocadas. As frases foram utilizadas de modo a

auxiliar a padronização dos vocábulos para o seu processamento no programa

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estatístico denominado de Ensemble de programmes permettant l’analyse des

evocations (EVOC), que calculou as palavras mais frequentes e as mais

prontamente evocadas ou hierarquizadas.

A combinação entre critérios estatísticos e a e a Teoria do Núcleo

Central (TNC), proposta por Abric, possibilita a compreensão da estrutura da

representação social; que apresenta uma forma gráfica por meio da distribuição das

palavras evocadas pelos quadrantes de um quadro de quatro casas, “[...] cada um

dos quais comportando, em termos aproximativos, uma interpretação teórica

distinta”. (SÁ et al, 2009, p. 163). Vejamos a próxima ilustração:

OME ou OMI < média ≥ média

F NÚCLEO CENTRAL PRIMEIRA PERIFERIA

≥ média

Palavras com frequência (F) igual ou acima da média e com Ordem Média de Evocação (OME) ou Ordem Média de Hierarquização (OMI) abaixo da média

Palavras com F igual ou acima da média e com OME ou OMI igual ou acima da média

< média

ZONA DE CONTRASTE SEGUNDA PERIFERIA

Palavras com F abaixo da média e com OME ou OMI abaixo da média

Palavras com F abaixo da média e com OME ou OMI igual ou acima da média

Ilustração 1 Esquema do quadro de quatro casas dos elementos estruturais das representações sociais

Fonte: Adaptação da proposta de Abric (2003, 2005, p. 64 apud PÉCORA, 2007, p. 163).

Após processamento, as palavras posicionadas no quadrante superior

esquerdo apresentam frequência de evocação mais elevada e de menor ordem

média de evocação ou de importância. É o quadro que fornece a composição mais

provável do Núcleo Central de uma representação social.

As palavras situadas nos demais quadrantes correspondem ao sistema

periférico de uma representação social, mesmo que se possam fazer distinção entre

elas com base no seu grau de proximidade em relação ao sistema central. Desta

maneira, as palavras situadas no quadrante superior direito, com alta frequência e

maior ordem de evocação ou de importância, compõem a Primeira Periferia. As

palavras do quadrante inferior direito, pouco frequentes e pouco importantes ou que

foram evocadas em últimas posições, fazem parte da Segunda Periferia. As palavras

posicionadas no quadrante inferior esquerdo, que são pouco frequentes, mas

consideradas importantes ou que foram evocadas nas primeiras posições, formam a

Zona de Contrate. Este quadrante “[...] indica a existência de subgrupos que

sustentam uma representação distinta daquela da maioria do grupo, ou mesmo que

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esteja em curso um processo de transformação da representação”. (SÁ et al, 2009,

p. 163).

Sá (2002), um dos principais divulgadores e pesquisadores da TNC no

Brasil, nos esclarece que as representações sociais estão distribuídas em um

Núcleo Central e em periféricos. Quando estão no mundo consensual, definindo a

homogeneidade do grupo, as representações se localizam no Núcleo Central,

tornando-se estáveis, rígidas, resistentes a mudança e pouco sensíveis ao contexto

imediato. Agora, quando permitem a integração das experiências e histórias

individuais, elas se localizam no sistema periférico (Primeira e Segunda Periferia e

Zona de Contraste), que carregam a heterogeneidade do grupo, sendo flexíveis,

evolutivas e sensíveis ao contexto imediato.

Ao iniciar essa etapa, delineamos o ponto de corte referente a cada

mote. Para esta definição utilizamos a lei de Zipf, que, segundo Vergès auxilia a

compreender a distribuição de palavras e frequências. Em um estudo acerca das

manifestações objetivas do fluxo dos discursos, George Kingsley Zipf, preocupado

com a dinâmica das palavras, mostrou certas regularidades estatísticas da

linguagem. A partir deste estudo, a lei de Zipf estabeleceu que o produto da relação

entre um texto e a frequência de cada elemento deste texto é mais ou menos

constante, sob a fórmula rang x frequência. (KALAMPALIKIS, MOSCOVICI, 2005).

Seguindo esta lei, tivemos a oportunidade de identificar uma constância de certas

palavras evocadas.

Assim, a definição dos pontos de corte se deu em função

primeiramente da frequência que marcava uma queda brusca na quantidade de

palavras diferentes e uma relativa estabilização sequente, juntamente com a

consideração do percentual de aproveitamento do corpus textual neste ponto. Nesse

sentido, objetivou-se manter as palavras que obtiveram maior consensualidade no

grupo. O ponto de parada da recolha de evocações livres foi feita pelo procedimento

de avaliação da saturação proposta por De Musis e Carvalho (2010)14.

A apreensão do sentido e do significado que encerram os números das

evocações livres apenas se torna possível com uma leitura compreensiva dos

mesmos, iluminada pelo conhecimento das circunstâncias em que foram produzidas,

aconselhadas pelas vozes das pesquisadas e orientadas pelas teorias científicas,

14

Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/es/v31n110/11.pdf>. Acesso em: 04 jun. 2007.

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55

sendo metaforicamente comparadas a lupas para uma melhor compreensão dos

materiais recolhidos e seus respectivos contextos sociais. Portanto, a apresentação

de sentidos e significados foi construída a partir de compreensões sobre os textos

colhidos no campo se valendo do uso de aportes teórico-metodológicos.

1.5 As últimas entrevistas realizadas

Após compreensões do material de campo obtido junto a 100

professoras mediante o uso da técnica de evocações livres, nos propusemos

adentrar novamente nas escolas e não mais solicitar palavras soltas, mas, agora,

gostaríamos de ouvir o que dizem as profissionais acerca do processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa em momentos de entrevistas. Entre as

professoras contatadas anteriormente, foram entrevistadas 50 profissionais.

Informativos censitários que trazem alguns elementos característicos deste grupo de

participantes podem ser vistos no Apêndice F. Os achados junto às evocações livres

foram fundamentais para a construção de um roteiro de perguntas que norteou todas

as conversas realizadas nesta fase.

Para a coleta dos materiais, produzimos um roteiro de entrevistas,

contendo 09 questões que podem ser vistas no Apêndice E. Para a elaboração

destas questões, tivemos a oportunidade de discutir o material com a Professora

Doutora Denise Jodelet, referência internacional nos estudos em representações

sociais, no mês de maio de 2010, no GPEP/UFMT/Cuiabá. Ela nos orientou que as

melhores informações seriam aquelas que tratassem da prática em si, como sendo

uma narrativa da atuação do/a professor/a.

Valendo-nos desse roteiro, nos dirigimos para o campo de pesquisa.

Ao final do dia, após realizarmos algumas entrevistas, o material gravado era

transcrito para um arquivo de texto junto ao programa Word. No final de todos os

contatos, construímos um único arquivo de texto de campo contendo todas as falas

das 50 entrevistas efetuadas. O material foi processado no software ALCESTE,

sendo o mesmo programa computacional utilizado no estudo piloto. Após o

processamento do material textual, nos atentamos para a necessidade de

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construção de definições dos elementos que coletamos. Deste modo, buscamos

definir se o que recolhemos foram falas, discursos ou textos de campo.

Segundo Nascimento-Schulze e Camargo (2000, p.288), para Wagner

(1998), “[...] ação e fala são parte integral da representação, embora ocorra

frequentemente que os pesquisadores optem por estudar apenas elementos da fala

ou do texto ao desenvolverem seus planos metodológicos”. No nosso caso, também

utilizamos apenas a fala, pois um mergulho na ação seria firmado em uma pesquisa

de cunho etnográfico, algo que nos exigiria uma imersão participante dentro de

todos os espaços das 19 escolas em que fomos fazer os nossos contatos, que para

uma melhor compreensão do fenômeno, necessitaríamos de um período maior de

investigação.

Conforme Nascimento-Schulze e Camargo (2000), fundamentados em

Séguier (1960), existe um problema no desenvolvimento de pesquisas em

representações sociais no Brasil junto ao uso generalizado do termo discurso para

nomear o material textual recolhido. Para os autores (2000, p. 293), “[...] "Discursu" é

diferente de "textu", esta segunda palavra latina indica as próprias palavras que se

leem num autor, num escrito”. Ademais, para esses autores, o termo texto, aponta

duas possibilidades de entendimentos: “(a) ato da fala, que responde a uma situação

dada, transformado em material escrito e (b) material produzido originalmente na

forma escrita e selecionado para ser analisado pelo pesquisador”. (NASCIMENTO-

SCHULZE; CAMARGO, 2000, p. 293).

De outro lado, Bakhtin e Volochinov (2006) afirmam que a prática

discursiva não é uma ação individual, é de natureza social, pois está ligada às

condições das comunicações que estão entrelaçadas às estruturas sociais. Este

norteamento conduz para a afirmação, fundamentada no materialismo-histórico em

que o sujeito se constitui como ser humano no convívio social. A conversação, neste

contexto, possibilita o diálogo entre pessoas, portanto, favorece trocas de

informações, representações, culturas, saberes e modos de entender a realidade,

por sua vez, estão imersos em ideologias que fomentam discursos que transcendem

as barreiras dos tempos e dos espaços físicos e sociais.

Em razão dessa complexidade, Nascimento-Schulze e Camargo (2000)

afirmam que “A natureza do fenômeno das representações sociais remete à

precedência do conteúdo na análise do material linguístico, considerando indicador

deste fenômeno.” (NASCIMENTO-SCHULZE; CAMARGO, 2000, p. 294). Portanto, o

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uso do termo discurso como sinônimo do termo fala pode acarretar simplificações da

definição do primeiro, porque o entendemos como produção derivada de um sujeito,

situado em um local social e que sofre tensões e confrontos entre o indivíduo e a

sociedade (ORLANDI, 2006); enquanto que as falas reunidas se referem aos

elementos de conteúdos de um conhecimento social compartilhado; em que revelam

as representações sociais que são formas de saber com conteúdos de uma

realidade prática, socialmente partilhada em determinado local e tempo, que nem

sempre tem caráter ideológico. (NASCIMENTO-SCHULZE; CAMARGO, 2000).

Buscando coerência entre o material coletado e as linhas de

pensamentos, utilizamos os termos texto, falas e dizeres para fazer uso do material

recolhido, enquanto possibilidade de tratamento estatístico e, finalmente, nos

valemos do termo discurso para compreender processos maiores de influências

sociais que contribuíram para as nossas compreensões dos textos de campo.

No próximo capítulo apresentamos outros fundamentos teóricos e

conceituais que nortearam a pesquisa.

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CAPÍTULO II FUNDAMENTOS TEÓRICOS E CONCEITUAIS QUE

NORTEARAM A PESQUISA

Ao longo dessa nossa investigação, tivemos a possibilidade de

participar de vários encontros de estudos e de orientações dentro de três grupos de

pesquisa. Foram eles, Grupo de Estudos e Pesquisas em Política e Formação

Docente: Educação Infantil, Fundamental e Superior (GEPForDoc), Grupo de

Pesquisa em Educação e Psicologia (GEPEP), ambos da Universidade Federal de

Mato Grosso (UFMT) e Grupo de Pesquisa Formação de Professores e Práticas

Educativas (GPFPPE) da Universidade Federal de Goiás, campus Jataí. Foram,

aproximadamente, quatro anos de discussões presenciais e virtuais, possibilitando

muitas leituras e debates. Fomos a seminários, congressos nacionais e

internacionais, dentre os quais se destacam o Encontro Nacional de Didática e

Práticas de Ensino (ENDIPE), ano 2012, Campinas; III Congreso Latinoamericano

sobre Profesores Principiantes e Inserción Profesional en la Docencia, ano 2012,

Santiago/Chile; Congresso Internacional de Pesquisa (Auto)biográfica (V CIPA), ano

2012, Porto Alegre, Seminário de Educação do Programa de Pós-Graduação em

Educação (/PPGE/UFMT), ano 2009, 2010, 2011, Cuiabá; Congresso de Educação

do Sudoeste Goiano, ano 2009 e 2011, Jataí/Goiás; Encontro de pesquisa em

educação da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação do

Centro Oeste, ano 2010, Uberlândia/Minas Gerais; entre outros. Foram momentos

de muito aprendizado, eventos que oportunizaram localizar nossas referências.

Motivados por discussões sobre educação, formação de professores,

Psicologia Social, língua portuguesa, dentre outros, mergulhamos em uma literatura

diversa que nos permitiu fazer seleções para que pudéssemos vislumbrar o objeto

investigativo. Idas e vindas reflexivas nos permitiram um caminhar em vários

percursos dessemelhantes, mas que possibilitaram definições sistematizadas sobre

nosso entendimento. Todas as discussões em que participamos dentro dos espaços

de aprendizagem foram norteadoras para a produção do trabalho. Apresentamos,

neste capítulo, contribuições de autores sobre elementos conceituais que envolvem

a nossa pesquisa. Mesmo sabendo do caráter inseparável destes elementos,

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escolhemos organizar a redação em itens, para destacar a importância de cada um

para a construção de nosso entendimento.

Inicialmente, buscamos entender o que vem a ser a profissão docente,

como também procuramos compreender o que é a formação de professores.

Posteriormente, buscamos inserir este/a profissional dentro de um processo de

interação entre os/as alunos/as, algo fundamental para a aquisição da

aprendizagem. Logo, dentro desta partilha, a linguagem se faz como elemento de

encontro, de partida, de comunicação e de interação social, como também, de

fomento educativo institucional. Finalmente, não menos importantes dos outros

direcionamentos, o fenômeno representacional se situa como um processo interativo

e identitário que se movimenta em termos dinâmicos para orientar e justificar

condutas na busca dos sujeitos por uma melhor compreensão da realidade.

2.1 O que entendemos sobre formação de professores

Neste item, discutiremos sobre a formação de professores, como

compreendemos a profissão docente e, especificamente, como entendemos a

profissão dos/as professores/as dos anos iniciais do ensino fundamental de nove

anos, por se tratar do período de ensino escolar investigado. Nossas reflexões

partiram de contribuições de autores internacionais e nacionais que, há muitos anos,

investigam e apontam caminhos teóricos e práticos acerca desta área de

conhecimento. Iremos usar em termos basilares e frequentes as referências de

obras de Carlos Marcelo Garcia, nome de referência Marcelo, pois consideramos

como sendo as compreensões que mais respondem nossas questões sobre a

dinâmica da formação de professores.

Segundo Marcelo (2009b), estamos vivendo em uma sociedade em

mudança constante, os conhecimentos são considerados os principais valores de

seus cidadãos, pois as transformações da sociedade se refletem na maneira como

as pessoas compreendem e se organizam no mundo, e que a busca do novo é uma

constante.

Conforme Marcelo (2002), a humanidade entrou em uma nova era que

transformou vários setores, como por exemplo, a produção de energia, as

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comunicações, o comércio, a educação, o trabalho e a família. Influenciadas por tais

transformações sociais, surgiram exigências de criação de novos modos de vida, de

trabalho, de comunicação e de aprendizado. E que a necessidade de aprender ao

longo da vida tornou-se um slogan rotineiro, um desafio, como um determinante para

a própria sobrevivência das pessoas. Para Marcelo (1995), o impacto da sociedade

da informação, o impacto do mundo científico e tecnológico e a internacionalização

da economia influenciam e decidem sobre a importância da formação na sociedade

atual.

Como fazemos parte dessa sociedade, estamos envolvidos por um

universo de exigências, dentro dele, as profissionais, que nos direcionam para uma

permanente prática de aprendizagem e de formação. Diante disto, são muitos os

determinantes de mudanças e permanências da profissão de professor/a, que

contribuem para a construção da identidade docente. Falamos em mudanças

sociais, políticas e culturais que afetam a formação de professores, mas ao mesmo

passo, geram a manutenção de representações sociais e de práticas que não trazem

melhorias para a profissão docente. Segundo Nóvoa (1995), a formação docente

está estrutura em um novo conceito de identidade:

[...] um lugar de lutas e de conflitos, é um espaço de construção de maneiras de ser e de estar na profissão. Por isso, é mais adequado falar em processo identitário, realçando a mescla dinâmica que caracteriza a maneira como cada um se sente e se diz professor. (NÓVOA, 1995a, p. 16).

Perante esse conceito, compreendemos a identidade como resultante

de processos contínuos de desenvolvimento pessoal, social, político e cultural,

segundo os quais, constituem características que atendem o sujeito e a sociedade,

em permanentes processos de construção e reconstrução de compreensões sobre o

mundo para a realização de práticas. Percurso que se faz em meio a contradições,

não sendo, portanto, um processo linear de desenvolvimento. Desta maneira,

considerando os espaços e os tempos sociais, o/a professor/a experimenta e articula

modos de ser, na constante inserção e reinserção nos espaços sociais.

Segundo Nóvoa (1995b), é dentro de práticas, políticas e da própria

historicidade da formação de professores que se produz a profissão docente. Para o

autor, a consolidação da profissão docente foi marcada por apontamentos históricos

que direcionaram práticas e reflexões professorais para caminhos de dominações

políticas.

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Fazendo compreensões dos marcos mais importantes sobre as

políticas adotadas pelo Governo de Portugal para a profissionalização docente,

Nóvoa (1995b, p. 19) afirma que a formação de professores tem aceitado, em

termos implícitos, a degradação do “[...] estatuto socioeconômico da profissão [...]”,

pois permite a consagração da visão “[...] funcionarizada [...]” do professorado,

prejudicando a construção e a consolidação do/a docente como um/a profissional

autônomo/a e reflexivo/a.

Para Marcelo (2009b, p. 128), o desafio principal a ser enfrentado na

profissão docente é de transformá-la em profissão do conhecimento. “Uma profissão

que seja capaz de aproveitar as oportunidades de nossa sociedade para conseguir

que respeite um dos direitos fundamentais: o direito de aprender de todos os alunos

e alunas, adultos e adultas”. Esta afirmação acompanha muitas reflexões deste

pesquisador (MARCELO, 2002, 2009a, 2009b), podemos até entender que ela pode

ser considerada por Marcelo como sendo o alicerce para as suas compreensões

sobre a formação de professores, desenvolvimento e identidade profissional e,

aprender a ensinar.

Muito se tem escrito sobre a influência que as atuais mudanças sociais estão a ter na sociedade propriamente dita, na educação, nas escolas e no trabalho dos professores. Sempre soubemos que a profissão docente é uma “profissão do conhecimento”. O conhecimento, o saber, tem sido o elemento legitimador da profissão docente e a justificação do trabalho docente tem-se baseado no compromisso em transformar esse conhecimento em aprendizagens relevantes para os alunos. Para que este compromisso se renove, sempre foi necessário, e hoje em dia é imprescindível, que os professores — da mesma maneira que é assumido por muitas outras profissões— se convençam da necessidade de ampliar, aprofundar, melhorar a sua competência profissional e pessoal. (MARCELO, 2009a, p. 8).

Mas, para Marcelo (2002), a instituição escolar ainda não conseguiu

alcançar e lidar com tais transformações sociais; mesmo não sendo o principal

objetivo da escola a preparação para o trabalho, ela não pode abster-se do direito

desta nova cidadania para todos, construída para a autonomia e para a reflexão nos

intercâmbios sociais, o ensino não pode permanecer obsoleto às exigências e

demandas da sociedade.

Para ele, alguns sistemas escolares continuam ancorados em

princípios de seletividade e de classificação de níveis de conhecimentos adquiridos

pelos/as alunos/as, em que estes chegam à escola com deficiências que precisam

ser superadas. Por outro lado, Marcelo (2002) apresenta que a escola que

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compreende o direito do/a aluno/a de aprender para se estabelecer neste novo

princípio de cidadania, deve ser entendida como sendo uma comunidade de

aprendizagem, como centros de aprendizagem ao longo da vida das pessoas. Para

contribuir com tais compreensões, situando a aprendizagem no centro da profissão

de professor/a, as mudanças devem ser aceitas e trabalhadas dentro dos espaços

escolares e pelos/as seus/suas profissionais do ensino. Nas palavras do autor:

[...] ser professor no século XXI pressupõe o assumir que o conhecimento e os alunos (as matérias-primas com que trabalham) se transformam a uma velocidade maior à que estávamos habituados e que, para se continuar a dar uma resposta adequada ao direito de aprender dos alunos, teremos de fazer um esforço redobrado para continuar a aprender. (MARCELO, 2009a, p. 8).

É dentro dessa necessidade de assegurar a qualidade da

aprendizagem dos/as alunos/as que devemos situar e compreender essa nova

profissão docente e o seu desenvolvimento. Portanto, para pensarmos uma possível

mudança educativa, o conceito de formação, deve ser situado como um fenômeno

completo e diverso, ele não pode ser identificado e nem mesmo diluído dentro de

outros conceitos como educação, ensino, treino, etc; precisamos entender que a

formação carrega uma dimensão pessoal e global de desenvolvimento humano,

processo formativo que é ativado pela vontade do próprio profissional professor/a,

mesmo não sendo de caráter totalmente autônomo. (MARCELO, 1999). Além mais:

“A Formação de Professores é a área de conhecimentos, investigação e de propostas teóricas e práticas que, no âmbito da Didática e da Organização Escolar, estuda os processos através dos quais os professores – em formação ou em exercício – se implicam individualmente ou em equipe, em experiências de aprendizagem através das quais adquirem ou melhoram os seus conhecimentos, competências e disposições, e que lhes permite intervir profissionalmente no desenvolvimento do seu ensino, do currículo e da escola, com objetivo de melhorar a qualidade da educação que os alunos recebem”. (MARCELO, 1999, p. 26, grifo do autor).

A partir desse conceito e da consideração de Marcelo (1995, p. 12,

grifo do autor) sobre a “[...] Formação de Professores como uma área disciplinar em

desenvolvimento, e não como uma mera prática ateórica [...]”; entendemos que os

processos formativos docentes são pertencentes a cada professor/a, mas que

carregam princípios interligados a outras dimensões. Para Marcelo (1999) -

fundamentado em diferentes trabalhos autorais - existe uma série de princípios que

alicerçam o conceito de formação. Alguns deles são:

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Primeiro: a formação de professores é um contínuo; um processo que

ocorre ao longo de toda a carreira, sendo um processo interativo e de acúmulo de

várias aprendizagens.

Segundo: é um processo de mudança, de inovação e de

desenvolvimento curricular.

Terceiro: está ligado ao desenvolvimento organizacional da instituição

escolar.

Quarto: está integrado aos conteúdos da aprendizagem, sejam eles

acadêmicos e disciplinares, incluindo aqueles da formação pedagógica.

Quinto: está contido dentro da relação entre teoria e prática.

Sexto: “[...] na formação de professores é muito importante a

congruência entre o conhecimento didático do conteúdo e o conhecimento

pedagógico transmitido, e a forma como esse conhecimento se transmite”

(MARCELO, 1999, p. 29).

Sétimo: “[...] a formação de professores se deve basear nas

necessidades e interesses dos participantes, deve estar adaptada ao contexto em

que estes trabalham, e fomentar a participação e reflexão”. (MARCELO, 1999, p.

29).

Compreendemos, assim, que os processos formativos dos/as

professores/as dependem da vontade destes/as profissionais, das características

pessoais e do contexto social em que estão inseridos. Desta forma, combinando

disposição, perfis comportamentais e marcos situacionais, destaca-se que a

formação acontece ao longo de toda a carreira e de toda a vida da

pessoa/professor/a. Os/as professores/as são sujeitos adultos que aprendem e se

inserem em processos formativos que são constituídos por implicações de natureza

fisiológica, cognitiva, pessoal e moral. (MARCELO, 1999).

Quando falamos desse longo processo formativo, incluímos o

aprendizado que ocorre pela observação desde o momento que o/a futuro/a

professor/a se insere no ambiente escolar ainda como aluno/a da educação básica,

pois consideramos que as experiências passadas desde a infância até a fase adulta

contribuem para a compreensão do que seja ser professor/a. Entretanto, atentando

apenas para as etapas em que o/a pessoa inicia formalmente o seu processo

formativo, segundo Marcelo (1999, p. 13), existem três fases, denominadas de: “[...]

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formação inicial, formação durante o período de iniciação e desenvolvimento

profissional”.

Para Marcelo (1999), em termos sintéticos nesta nossa exposição, a

institucionalização das práticas de formação vincula-se aos sistemas nacionais de

educação, o seu currículo é determinado e influenciado por fatores históricos,

sociais, políticos, econômicos, culturais, etc. A formação inicial é compreendida

como sendo o período que o profissional percorre durante os cursos acadêmicos. A

formação durante o período de iniciação ocorre quando o/a professor/a entra em

ofício, ele pode perdurar sendo profissional principiante até três anos15 para transitar

de egressos para professores, sem determinações fixas e, por último, a formação

dos/as professores/as em desenvolvimento profissional é compreendida como sendo

aquela que é percorrida por profissionais em exercício. Todos devem ser

compreendidos junto ao desenvolvimento da escola, do currículo, do ensino, do/a

professor/a e do contexto social circundante.

Mesmo ciente da especificidade das fases de formação que os

profissionais percorrem, sendo necessário entendimentos sobre cada uma delas e

de seus determinantes, Marcelo (1999a, p. 9) nos mostra que é preciso superar a

tradicional justaposição entre a denominada formação inicial e a formação

continuada, trazendo, assim, a elucidação que a formação deve ser entendida em

sua jornada evolutiva, na continuidade de suas fases, enquanto processo de

desenvolvimento profissional.

Deve entender-se o desenvolvimento profissional dos professores enquadrando-o na procura da identidade profissional, na forma como os professores se definem a si mesmos e aos outros. É uma construção do eu profissional, que evolui ao longo das suas carreiras. Que pode ser influenciado pela escola, pelas reformas e contextos políticos, e que integra o compromisso pessoal, a disponibilidade para aprender a ensinar, as crenças, os valores, o conhecimento sobre as matérias que ensinam e como as ensinam, as experiências passadas, assim como a própria vulnerabilidade profissional. As identidades profissionais configuram um complexo emaranhado de histórias, conhecimentos, processos e rituais. (MARCELO, 2009a, p. 7).

A tomada de consciência sobre a complexidade que envolve a

formação de professores está contida no próprio conceito acerca do

15

“[...] a iniciação ao ensino é o período de tempo que abarca os primeiros anos, nos quais os professores fazem a transição de estudantes para professores. É um período de tensões e aprendizagens intensivas em contextos geralmente desconhecidos [...]. Neste primeiro ano, os professores são principiantes, e, em muitos casos, no segundo e terceiro anos podem estar ainda a lutar para estabelecer a sua própria identidade pessoal e profissional”. (MARCELO, 1999, p. 113).

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desenvolvimento profissional docente. Como diz Nóvoa (1995b), o desenvolvimento

profissional produz a profissão docente, sendo esta composta por situações

diversas, de características variadas, atravessadas por problemas e por vitórias que

forçam os/as professores/as a tomar decisões em um terreno de complexidades e de

incertezas. Para que enfrentem a prática resolvendo demandas singulares, que

exigem respostas únicas dos/as profissionais em um processo de

autodesenvolvimento reflexivo.

Eles precisam compreender as variáveis internas e externas ao

processo de ensino e aprendizagem que vão além das formações inicial e

continuada. Desta forma, a qualidade do ensino estaria vinculada à capacidade de

tomada de decisões a partir da interação com a complexidade que constitui o ensino

escolar e a efemeridade do conhecimento, de informações, indo além das respostas

prontas, decorrentes de conceitos lineares, uniformes, que não respondem a

alteridade própria das relações sociais, determinantes da construção e da

desconstrução de conhecimentos.

Para Marcelo (1995), a reflexão deve ser o novo objetivo para a

formação de professores, uma possibilidade de melhoria educativa. O autor nos

informa que é um conceito que está sendo frequentemente utilizado dentro dos

estudos sobre a formação docente, sendo uma perspectiva iniciada por Dewey

(1989) e de grande difusão por Schõn (1983, 1987).

Conforme Schõn (1995), o/a professor/a precisa refletir sobre sua ação

profissional, observar e compreender os processos de aprendizagem dos/as

alunos/as, reconhecer as capacidades e as dificuldades das crianças.

Se o professor quiser familiarizar-se com este tipo de saber, tem de lhe prestar atenção, ser curioso, ouvi-lo, surpreender-se, e actuar como uma espécie de detective que procura descobrir as razões que levam as crianças a dizer certas coisas. Este tipo de professor esforça-se para ir ao encontro do aluno e entender o seu próprio processo de conhecimento, ajudando-o a articular o seu conhecimento-na-ação que exige do professor uma capacidade de individualizar, isto é, de prestar atenção a um aluno, mesmo numa turma de trinta, tendo a noção do seu grau de compreensão e das suas dificuldades. (SCHÕN, 1995, p. 82).

Essa capacidade, também denominada de “conhecimento prático”, é

um processo de “reflexão-na-ação”, ou mesmo um “diálogo reflexivo” com a prática

em si, na mobilização de conhecimentos e valores diversos. Segundo Pérez Gómez,

também se referindo aos trabalhos de Schõn (1987):

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A reflexão implica a imersão consciente do homem no mundo da sua experiência, um mundo carregado de conotações, valores, intercâmbios simbólicos, correspondências afectivas, interesses sociais e cenários políticos. O conhecimento acadêmico, teórico, científico ou técnico, só pode ser considerado instrumento dos processos de reflexão se for integrado significativamente, não em parcelas isoladas da memória semântica, mas em esquemas de pensamento mais genéricos activados pelo indivíduo quando interpreta a realidade concreta em que vive e quando organiza a sua própria experiência. A reflexão não é um conhecimento <<puro>>, mas sim um conhecimento contaminado pelas contingências que rodeiam e impregnam a própria experiência vital. (PÉREZ GÓMEZ, 1995, p. 103).

A prática docente não ocorre de forma linear e nem mesmo é banhada

por uma rotina homogênea, ao contrário, ela ocorre em movimentos constantes de

construção de novas realidades que levam os/as professores/as para mobilizações

de conhecimentos diversos, não só aqueles normatizados pelo sistema educativo e

teorizados pela ciência. É uma realidade construída por processos idiossincráticos,

local de construções de estratégias de ação, de modos de enfrentamento de

problemas. Portanto, “[...] lugar de aprendizagem e de construção do pensamento

prático [...]” dos/as professores/as. (PÉREZ GÓMEZ, 1995, p. 110, grifo do autor).

Para Corradini e Mizukami (2011, p. 54), na sociedade brasileira, a

compreensão acerca da prática reflexiva surge como um molde de atividade

profissional por meio do qual os/as professores/as são motivados a refletir sobre as

suas práticas; ela segue ancorada na premissa básica que considera “[...] as

crenças, os valores, as hipóteses que os professores têm sobre o ensino, a matéria

que lecionam, o conteúdo curricular, os alunos, a aprendizagem estão na base de

sua prática de sala de aula”.

A compreensão na e sobre a prática leva para uma possível

modificação do papel docente como agente transmissor de conhecimentos e passa

para um novo entendimento, os/as professores/as como profissionais práticos

reflexivos que desempenham processos importantes para e na produção de

conhecimento no e sobre o ensino. Segundo Corradini e Mizukami (2011),

O conceito de professor como prático reflexivo reconhece a riqueza da experiência que reside na prática dos bons professores. Reflexão significa o reconhecimento de que o processo de aprender a ensinar se prolonga durante toda a carreira do professor (Zeichner, 1993, p. 17). A reflexão implica intuição, emoção, paixão; não é um conjunto de técnicas que possa ser ensinado. (CORRADINI; MIZUKAMI, 2011, p. 54).

Para Mizukami (2006, sem paginação), a escola é entendida como

agência formadora, ao lado de outros espaços como a universidade, compreensão

esta que está vinculada ao paradigma da racionalidade prática de Schõn (1983,

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67

1987), de Calderhead (1996), de Knowles et al (1994) e de Marcelo (1999). Ela

considera que “[...] os domínios da teoria e os da prática se entrelaçam nos

diferentes momentos da formação profissional e ao longo da carreira docente. Sob

tal perspectiva tanto a universidade quanto as escolas estariam envolvidas com os

domínios da teoria e da prática”. Portanto, a formação é um processo contínuo de

(auto)formação que se faz em contextos diversos e em diferentes comunidades de

aprendizagens constituídas por diversos formadores. (MIZUKAMI, 2006).

Mostrando panorama sobre algumas delimitações, advindas da

literatura atual, referente aos processos de aprendizagem e de desenvolvimento

profissional da docência acerca do que se pensa sobre que professor/a formar,

Mizukami (2006) apresenta algumas direções que devem ser consideradas:

• A natureza individual e coletiva da aprendizagem profissional da docência; • A escola considerada como local de aprendizagem profissional; • A existência de processos não lineares de aprendizagem; • A importância de diferentes tipos de saberes construídos ao longo das trajetórias profissionais, a partir tanto de conhecimento acadêmico científico quanto da prática pedagógica; • A importância da prática profissional para a construção de conhecimentos próprios da docência e de diferentes naturezas; • A necessidade de explicitação da base de conhecimentos e de compreensão de processos de raciocínio pedagógico na construção de conhecimentos da docência; • A consideração da reflexão como orientação conceitual e fonte de aprendizagem profissional; • A influência de crenças, valores, juízos etc. na configuração de práticas pedagógicas; a necessidade de ambiente propício para partilha de idéias e diferentes tipos de conhecimentos dos professores; • A necessidade de tempo e espaço mental para que professores possam se desenvolver profissionalmente; • A importância de uma liderança positiva na escola; • Aprendizagens profissionais possibilitadas por jogos com situações desequilibradoras/equilibradoras; • A escola considerada como organização que aprende a partir de seus participantes; • A força das comunidades de aprendizagem na configuração da cultura escolar, da escola e dos saberes profissionais; • A importância de construir culturas escolares colaborativas a fim de fazer face à complexidade da mudança; • A importância da construção de “comunidades de aprendizagem” que passam a redefinir as práticas de ensino individuais e grupais; • A participação dos professores sendo considerada como ato de adesão, não compulsório; • As aprendizagens não são 'passadas' ou 'entregues sob a forma de pacotes' aos professores, mas são auto-iniciadas, apropriadas e deliberadas; • A necessidade de se contar com a adesão dos professores a programas de desenvolvimento profissional: via de regra eles se engajam em tais programas à procura de novas informações; • Novas técnicas, novos tipos de conhecimento, não para colocarem à prova os conhecimentos que possuem ou a prática que desenvolvem;

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• A necessidade da reconceptualização do ensino ligada a reconceptualização de processos de desenvolvimento profissional; • A importância da consideração de interações entre os pares como fonte de aprendizagem profissional; • A premência de criação de contextos alternativos de desenvolvimento profissional; • A aceitação de processos de negociação: de processos, de conteúdos, de dinâmicas sendo naturais às comunidades de aprendizagem que envolve professores e formadores. (MIZUKAMI, 2006, sem paginação).

Compreender esses determinantes é dizer: isto é ser professor/a. Ser

professor/a é se fazer em um processo colaborativo, participativo, interativo de

aprendizagens específicas para o desenvolvimento da profissão docente. Pois, é

sempre se fazer profissional no devir das experiências, dos problemas e das

conquistas que são adentradas e construídas por muitos, não apenas pelo/a docente

e pelos/as alunos/as. As aprendizagens dos/as discentes são alcançadas por eles,

quando as aprendizagens dos/as docentes, acerca dos vários conhecimentos e

determinantes que estruturam a profissão de professor/a, se processam com

harmonia para o desfecho de encontro entre elas, contribuindo com o devir umas

das outras.

Imerso ao universo múltiplo de elementos que estruturam os processos

de desenvolvimento profissionais dos/as docentes, queremos situar os/as

professores/as em exercício nos primeiros anos do ensino fundamental, período que

apresenta especificidades em relação a outros níveis, espaço de construção de uma

identidade profissional diferente da identidade profissional construída nos últimos

anos do ensino fundamental, como, também, divergente da identidade profissional

elaborada no ensino médio e superior.

As especificidades aumentam se considerarmos as diferentes histórias

de vida dos/as professores/as que contribuem para que se definam enquanto

sujeitos sociais e que exercem uma profissão específica; os contextos sociais,

políticos e culturais que envolvem a escola em que atuam; suas disposições para

aprender a ensinar e para ensinar; as representações sociais que carregam acerca

dos objetos sociais para que possam lidar na sua prática profissional, entre outros.

2.2 Elementos constitutivos do processo de ensino-aprendizagem da língua

portuguesa

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Neste item mostraremos algumas perspectivas que influenciam e

fomentam a realização do processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa,

com o propósito de mapear alguns elementos que constituem esta prática educativa.

Para melhor situar tais elementos, dividimos o texto em duas partes. A primeira

divisão trata da relação entre linguagem e interação dentro da escola e a segunda

parte, traz a relação entre o processo de ensino-aprendizagem da língua e o

processo de alfabetização.

2.2.1 A linguagem entendida como processo de interação e a importância da

mediação entre professor/a e alunos/as dentro da prática educativa

Na atualidade, onde muitas falas, comunicações, informações e

conhecimentos televisivos, computacionais e institucionais sobre variados assuntos

movimentam-se por vários espaços sociais e promovem a constituição dos seres

humanos, nos propusemos a compreender como estão os ensinamentos acerca do

veículo que possibilita tais interações. Buscamos ouvir e compreender os dizeres de

professoras acerca do processo de ensino-aprendizagem de língua portuguesa em

um período em que vivenciamos uma intensa prática de circulação de discursos.

Propusemo-nos a investigar para saber como se dá o processo de ensino-

aprendizagem da língua, assim, saberemos que o entendimento do que venha a ser

a linguagem e o discurso é fundamental para conhecermos a importância do ensino

e da aprendizagem da língua, mediada pelo professor/a para consolidar a

aprendizagem do/a aluno/a.

Reconhecemos que existem diferentes concepções de linguagem que

modificam também a compreensão do que seja o discurso, no entanto, neste

trabalho trataremos a linguagem na perspectiva da interação. Portanto, a linguagem

aqui é entendida como processo de interações dinâmicas e dialéticas entre sujeitos

pertencentes a grupos sociais, em que é influenciada por determinações materiais

em um movimento de interferências sociais, que promovem os discursos e as

práticas dos sujeitos.

Neste item escolhemos unir duas respeitáveis compreensões: uma

ligada à teoria da enunciação, que trata do papel da linguagem em cada momento

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da vida humana e outra vinculada à teoria histórico-cultural, no que tange sobre a

importância da mediação para a formação do sujeito. O motivo surgiu da reflexão

que falar de ambas as vertentes é tratar de um mesmo constructo: a outridade como

fundante do ‘eu’, do ‘outro’ e do social. Assim, buscamos com estes norteamentos

fundamentar a prática de ensino-aprendizagem da língua.

Dois importantes pensadores contribuíram com estas duas vertentes,

cada um com uma teoria específica, entretanto, ambas tratam sobre a interação

como aspecto importante para a formação do sujeito e dos grupos sociais. O

primeiro, Mikhail Mikhailovich Bakhtin, preocupou-se com estudos sobre a linguagem

em uma perspectiva multidimensional, pois ele considerava que a linguagem é

dinâmica, dialógica, histórica, social, ideológica e ao mesmo tempo, singular e única.

Considerando a importância da interação, Bakhtin (2006) compreendia a linguagem

como acontecimento social que se constitui pela interação entre sujeitos/grupos e se

localiza em diversos enunciados. O segundo pesquisador, Lev Semyonovitch

Vygotsky, realizou estudos, entre outros, que buscaram compreender a relação entre

aprendizagem, desenvolvimento e linguagem. Ele defendeu a tese de que a

obtenção destas três potencialidades dos sujeitos é promovida por meio da

mediação do ser humano entre si e com o mundo. (VYGOTSKY et al, 2006).

Para a construção deste caminho textual, partimos das contribuições

de Bakhtin (2006) acerca do conceito de linguagem, de discurso, de signo e de

enunciação e, sucessivamente, construímos uma articulação entre estes conceitos e

aos apontamentos da Teoria Histórico-Cultural de Vygotsky (2006, 2007), referente

ao conceito de mediação. O percurso foi aberto em pontos diversos na trajetória

textual por reflexões de outros autores que tratam do aspecto fundamental da

interação na sociedade, e outros que dizem sobre ela dentro dos espaços escolares.

A compreensão do mundo que dirige a vida das pessoas é organizada

em virtude de fatos em que o ser humano sincroniza seus projetos em um tempo e

espaço que impõem a sua biografia. Nessa ideia, a interação social tem papel

importante na vida cotidiana. É mediante a situação face a face que os sujeitos

podem se constituir enquanto seres sociais, e é através da interação social que

modelos são apreendidos na sociedade e, também, é a partir dela que o sujeito

constrói sua identidade.

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Segundo Berger e Luckmann (2004)16, a sociedade, enquanto

realidade subjetiva, é construída a partir da interiorização de fatos e compreensões

do cotidiano. Assim, é na infância que a criança, através do convívio familiar e,

posteriormente, por meio da escola, apreende os significados sociais e naturaliza

sua participação no mundo e caminha para a autonomia do adulto.

Berger e Luckmann (2004) nos ensinam que, no que tange à

identidade, é possível verificar um movimento dinâmico, pois a identidade constrói o

social, entretanto, é construída socialmente. Deste modo, não somente o

conhecimento e a realidade são produtos da atividade humana, como também, a

própria identidade que não se forma individualmente. Diante do que foi dito, a

singularidade do sujeito é algo social, se considerarmos que só existe em confronto

e conciliação com o ‘outro’, na interação e na relação de partilha de universos de

significados.

Constantemente, o ser humano cria várias significações para lidar com

o mundo. Gestos, linguagens, ferramentas - utensílios domésticos, equipamentos

eletrônicos, entre outros - e interações sociais fazem parte das práticas dos sujeitos

para compreenderem a realidade, agirem nela e se desenvolverem em suas

existências. Depreendemos, desta maneira, que os sujeitos necessitam adquirir e

ampliar seus conhecimentos para melhor viver.

Com o intuito de obter tal grau de compreensão sobre o mundo, os

sujeitos precisam mediar seus entendimentos uns aos ‘outros’ para facilitar suas

vidas. Esta intenção proporcionou a criação do discurso, em que todos podem obter,

conhecer, criar e re-criar reflexões sobre a realidade. Diante do exposto, as

possibilidades de interação, de se fazer entendido e de compreender os significados

atribuídos para diversas realidades e seus objetos são constantemente construídas

e reconstruídas em um dinâmico movimento de influências mútuas.

Conforme Berger e Luckmann (2004), a construção social da realidade

é um processo complexo e dinâmico, é o conhecimento obtido pela simbolização,

significação, interpretação e domínio de fatos e objetos do mundo físico e social.

Conforme o exposto, podemos afirmar que a elaboração de conhecimento do sujeito

e dos grupos sociais e a própria prática discursiva facilitam a criação, como,

16

Buscamos o entendimento do que seja ‘realidade’ na obra de Berger e Luckmann intitulada A construção social da realidade, editada pela empresa Vozes no ano de 2004, na sua 24ª edição. A importância da vertente social é amplamente discutida.

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também, a recriação de conhecimentos, são potencialidades principais para a

consolidação da formação humana, englobando os conhecimentos formados e

mediados pela cultura, tradição, ciência e religião de um povo.

A rotina diária nos mostra que o discurso é mais conhecido como

sendo uma fala planejada para ser proferida a determinado (s) ouvinte (s) que será

envolvido por palavras acerca de determinado tema, como por exemplo, o discurso

político. Entretanto, sua significação na teoria de Bakhtin (2006) penetra-se na

junção entre identidade e alteridade e, ramifica-se e multiplica-se por várias outras

dimensões, conforme nos apresenta Brait (2004, p. 187)17:

Dentro do domínio específico dos estudos da linguagem [...] o termo ‘discurso’ ganha uma significação [...] que engloba, por assim dizer, a linguagem em geral, cobrindo a fala do dia-a-dia, os textos publicitários e jornalísticos, essa fala marcada dos políticos em constante estado de euforia palavrória, a poesia, as artes em geral, os estudos científicos e tudo mais que o homem produz como forma de comunicação, expressão, organização, construção e representação do mundo e de si mesmo por meio de signos verbais, visuais, verbo-visuais.

Dessa maneira, o discurso é compreendido como o momento de

interação do ‘eu’ e do ‘outro’, a possibilidade de conceber a realidade e de se

constituir humano mediante a dimensão fundante do social. É por intermédio da

prática discursiva que as pessoas falam sobre diversos assuntos que conhecem ou

mesmo desconhecem, tentam lidar e capturar significados sobre objetos diversos da

realidade. Tanto influenciados, como também influenciadores, os sujeitos constroem

suas individualidades e sua pertença grupal e cultural.

Bakhtin/Volochinov (2006)18 afirmam que a prática discursiva não é

uma ação individual, ela é de natureza social, pois está ligada às condições das

comunicações, que estão entrelaçadas às estruturas sociais. Este norteamento

conduz para a afirmação fundamentada no materialismo-histórico em que o sujeito

se constitui como ser humano no convívio social. A conversação neste contexto

possibilita o diálogo entre pessoas, portanto, favorece trocas de informações,

17

Trabalho de Elizabeth (Beth) Brat nomeado Linguagem e identidade: um constante trabalho de estilo, publicado no ano de 2004, na revista Trabalho, Educação e Saúde. Este artigo está fundamentado pelos pensamentos bakhtinianos. 18

Roman Jakobson (2006, p. 10), no Prefácio da obra intitulada Marxismo e a Filosofia da Linguagem diz: “Acabou-se descobrindo que o livro em questão e várias outras obras publicadas no final dos anos vinte e começo dos anos trinta com o nome de Volochinov [...] foram na verdade, escritos por Bakhtin (1895-1975) […] Ao que parece, Bakhtin recusava-se a fazer concessões à fraseologia da época e a certos dogmas impostos aos autores”. Por este motivo, escolhemos considerar os dois pensadores na indicação da autoria da obra.

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representações, culturas, saberes e modos de entender a realidade, que, por sua

vez, estão submersos em ideologias.

Observamos que para Bakhtin/Volochinov (2006) os sujeitos se fazem

na dinâmica dialógica de trocas acerca das compreensões sobre o mundo, nas

trocas de significados sobre a realidade circundante. Tudo se concentra na relação

com o ‘outro’, com o próximo. Em um mundo heterogêneo, as pessoas precisam

lidar com o necessário convívio entre elas, as culturas diversas necessitam conviver

de qualquer maneira umas com as outras, querendo ou não as pessoas precisam da

proximidade com o ‘outro’ para compreender o mundo e se fazer humano.

Essa perspectiva de compreensão da linguagem coloca em evidência a

interação, o ‘eu’, o ‘outro’, o local da vivência, o tempo histórico, a cultura e a

ideologia que se movimentam em termos dinâmicos e, principalmente, dialéticos

entre si, para que ocorra a manutenção da natureza humana. Isto se desenvolve de

maneiras contraditórias, pois, a conservação da humanidade está submersa em

contextos de confronto de interesses, promovendo igualdades ou desigualdades

sociais. Essa ideia leva para uma compreensão do sujeito, enquanto um interlocutor

ativo, em um permanente diálogo com ‘outros’ na busca por sentidos para agir no

mundo, este discurso é atravessado por outros discursos diferentes.

Quando utilizamos a linguagem estamos interagindo, atuando sobre o outro, influenciando-o e sendo influenciados. A comunicação é percebida como um processo no qual as pessoas envolvidas procuram negociar sentidos, tentando criar significados partilhados. Não é só “passar” informações, mas compartilhá-las. Assim, a linguagem é a possibilidade de interação comunicativa buscando a produção e construção de significados, de sentidos, enfim, de elaboração de conhecimento. (ANDRADE, 2008, p. 4011)

19.

Esses dizeres que se cruzam são aqueles que adquirimos no passado

com a interação entre sujeitos; são também estes resultados dos diálogos que

realizamos nas situações concretas da realidade, no falar com o ‘outro’ e soma-se

àqueles tantos outros discursos que recebemos da cultura, da sociedade, da arte em

geral, da ciência e da ideologia que nos envolve. Portanto, quando

falamos/ouvimos/gesticulamos/desenhamos/etc sobre algo estamos construindo

19 Utilizamos o artigo de autoria da Maria de Fátima R. Andrade intitulado Interações sociais em sala de aula: o ensino de Língua Portuguesa, publicado em meio eletrônico no ano de 2008 pelo VIII Congresso Nacional de Educação e III Congresso Ibero-Americano sobre Violências nas Escolas, que ocorreu em Curitiba. Neste artigo, a autora discutiu as três principais concepções de linguagem – como expressão do pensamento, enquanto instrumento de comunicação e como forma de interação - e suas implicações na prática educativa.

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significações acerca do assunto tratado a partir das significações que já temos, tanto

em formato singular por nossas vivências, como no ato do diálogo do ‘eu’ com o

‘outro’, além mais, acrescenta-se as significações sociais e ideológicas que estão

inseridas na nossa consciência individual e social.

Na multiplicidade de discursos interiores e exteriores, onde

falamos/ouvimos/gesticulamos/desenhamos/etc obtemos entendimentos acerca do

mundo. Conforme Bakhtin/Volochinov (2006), mediante a alteridade que os sujeitos

se constituem e se modificam constantemente. A alteridade é fundamento da

identidade, pois o homem social interage e interdepende de outros indivíduos.

Assim, a existência do "eu-individual" só faz sentido se estiver contato com o outro.

Desta forma, ao se moldar e modificar, se constitui identidade.

Para Bakhtin/Volochinov (2006) o que determina as interlocuções, os

entendimentos e conhecimentos das pessoas acerca da realidade e também a

própria consciência humana, é a junção entre os significados espacial e

historicamente elaborados pelos sujeitos – signos - acerca de determinado objeto e

a ideologia. Nas palavras dos autores:

A consciência adquire forma e existência nos signos criados por um grupo organizado no curso de suas relações sociais. Os signos são o alimento da consciência individual, a matéria de seu desenvolvimento, e ela reflete sua lógica e suas leis. A lógica da consciência é a lógica da comunicação ideológica, da interação semiótica de um grupo social. Se privarmos a consciência de seu conteúdo semiótico e ideológico, não sobra nada. A imagem, a palavra, o gesto significante, etc. constituem seu único abrigo. Fora desse material, há apenas o simples ato fisiológico, não esclarecido pela consciência, desprovido do sentido que os signos lhe conferem. (BAKHTIN; VOLOCHINOV, 2006, p. 34).

No dinamismo social, o ser humano produz sinais quando fala,

gesticula, escreve, desenha, etc, para criar, reproduzir e mediar significados entre os

sujeitos, que são denominados de signos. Ao elaborar signos, os sujeitos criam suas

existências em formato de pensamentos, de atitudes e de ações culturais,

normativas, políticas, etc.

Mediante estes processos de significações e simbolizações das coisas

do mundo, as pessoas dialogam, formam e organizam suas culturas, expõem e

representam seus pensamentos, criam objetos, práticas e normas sociais. Os signos

são fundamentais, pois fornecem ao sujeito uma dimensão simbólica, que o conecta

as realidades sociais e naturais. Todavia, o entendimento de mundo é vivo, pois o

ser humano é um sujeito histórico-cultural, em que media conhecimentos

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repassados/reproduzidos para novas gerações. Ou seja, a formação humana se dá

nas interações sociais. Entender uma realidade determinada depende dos

conhecimentos locais, grupais em uma específica época.

Nessa linha de ideias, os signos são objetos físicos da realidade, como

por exemplo, palavras, gestos e imagens, que apresentam significações e conceitos

vivos, móveis, plurivalentes e mutáveis, pois recebem significados conforme as

situações reais em que venham a ser utilizados pelas pessoas em diferentes

espaços e tempos sociais. Para uma apresentação refinada, nada melhor do que

destacar o dito dos autores:

Os signos também são objetos naturais, específicos, e, como vimos, todo produto natural, tecnológico ou de consumo pode tornar-se signo e adquirir, assim, um sentido que ultrapasse suas próprias particularidades. Um signo não existe apenas como parte de uma realidade; ele também reflete e refrata uma outra. Ele pode distorcer essa realidade, ser-lhe fiel, ou apreendê-la de um ponto de vista específico, etc. Todo signo está sujeito aos critérios de avaliação ideológica (isto é: se é verdadeiro, falso, correto, justificado, bom, etc.). O domínio do ideológico coincide com o domínio dos signos: são mutuamente correspondentes. Ali onde o signo se encontra, encontra-se também o ideológico. Tudo que é ideológico possui um valor semiótico. (BAKHTIN; VOLOCHINOV, 2006, p. 31).

Para o Grupo de Estudos de Gêneros e Discursos (GEGe, 2009), da

Universidade Federal de São Carlos, em obra com formato de glossário das ideias

de Bakhtin, o signo é construído em um percurso que contém três partes

inseparáveis, uma material, outra de materialidade sócio-histórica e, por último, uma

que trata do ponto de vista do sujeito. Nesta mesma obra, a ideia de ideologia na

vertente bakhtiniana é entendida como expressão, organização, regulamentação e

representação das relações histórico-materiais estabelecidas entre os seres

humanos. Após estas acepções, Bakhtin/Volochinov (2006) afirmam que tudo que é

ideológico é signo, em que este faz parte de uma realidade material, que reflete e

refrata outras realidades. Em seus próprios dizeres: “O que é que determina esta

refração do ser no signo ideológico? O confronto de interesses sociais nos limites de

uma só e mesma comunidade semiótica, ou seja: a luta de classes”. (BAKHTIN;

VOLOCHINOV, 2006, p. 45).

Um discurso nunca será uniforme para diferentes interlocutores, pois

ele é constituído de interesses, conhecimentos, culturas e representações situadas

em um tempo e local social. Determinado discurso, mesmo que se repita várias

vezes, estará carregado de uma vertente singular - o ‘eu’ que apresenta

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conhecimentos prévios adquiridos no convívio, de uma derivação plural - o ‘outro’ no

momento do diálogo - e, por conseguinte, é constituído por uma dimensão

multiangular - o social, que produz a cultura e a ideologia.

Para Bakhtin/Volochinov (2006, p. 35): “Cada domínio possui seu

próprio material ideológico e formula signos e símbolos que lhe são específicos e

que não são aplicáveis a outros domínios. O signo, então, é criado por uma função

ideológica precisa e permanece inseparável dela”. Tendo esta ideia como princípio

norteador, os autores consideraram que os signos fazem parte de conceitos teóricos

que dispensam os interlocutores no processo discursivo, assim, preferem trabalhar

com a categoria da enunciação, como unidade básica para compreender a

linguagem.

Souza (2002), em produção acadêmica20 acerca do Círculo de

Bakhtin/Volochinov/Medvedev21 defende e enfatiza o entendimento que trata o termo

enunciado vinculado ao adjetivo ‘concreto’ - enunciado concreto, pois apresenta as

seguintes características:

a) é um fato real, é criado; b) é uma unidade da comunicação verbal, isto é, uma unidade do gênero; c) apresenta um acabamento real, ou seja, são irreproduzíveis (embora possam ser citados); d) as suas pausas são pausas reais;

e) tem autor (e expressão) e destinatário. (SOUZA, 2002, p. 71-72).

O enunciado, entendido por Souza (2002) acerca dos estudos do

Círculo de Bakhtin, é também enunciação, é uma categoria que traz a importância

da complexidade das relações sociais, pois busca compreender o discurso que

contêm dado conceito e significação na junção entre os interlocutores situados em

um tempo e local de uma realidade concreta, multidimensional e única.

Para Bakhtin/Volochinov (2006), o enunciado é uma produção

discursiva submersa em um contexto. Esta premissa pode ser sintetizada no termo

enunciação, pois este contempla o conceito de que as produções de significados

mediados pelos diversos diálogos presentes em dada circunstância de interação

20

Dissertação intitulada Introdução à teoria do enunciado concreto do círculo Bakhtin/Volochinov/Medvedev, de Geraldo Tadeu Souza, originalmente apresentada como dissertação de mestrado para a Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas/USP. Utilizamos o livro publicado no ano de 2002, 2ª edição. 21

O Círculo de Bakhtin, que é composto por este e também Volochinov e Medvedev, é um grupo de três pesquisadores e pensadores que se uniram para descobrir e compreender “[...] qual é o papel da linguagem em cada acontecimento da existência humana: na vida cotidiana, na arte, na ciência, na religião de uma época determinada.” (SOUZA, 2002, p. 15).

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entre sujeitos são penetrados e construídos pela realidade localizada no ato

praticado, que pode ocorrer em qualquer lugar e em períodos ininterruptos.

Logo, fizemos uma relação entre esses conceitos - linguagem,

discurso, signo e enunciação – e as práticas de ensino-aprendizagem da língua

dentro das escolas. Consideramos que a prática educativa é construída com a

mediação da linguagem, em seu sentido amplo, pois a prática de sala de aula é

arquitetada por várias produções de significados a partir dos discursos internos e

externos aos sujeitos, sejam em termos individuais, grupais, intergrupais e sociais,

situados dentro de uma pluralidade de culturas e demarcados no tempo histório-

cultural.

Compreendemos que esses conceitos e entendimentos da linguagem,

de discurso, de signo e de enunciado/enunciação foram elaborados ao longo da

História e influenciam a maneira que entendemos e refletimos academicamente

sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa. Contudo, a prática

de sala de aula também é norteada por concepções de linguagem que os sujeitos

carregam para resolver processos comunicacionais e pedagógicos.

Fazendo um movimento de relações entre as ideias de

Bakhtin/Volochinov (2006) e a presente investigação, podemos entender que cada

discurso emitido pelas professoras comprometidas com a nossa pesquisa é diferente

um do outro, está situado no espaço-temporal das instituições públicas municipais

de Jataí, no ano de 2010. Cada escola possui uma lógica discursiva, um contexto de

enunciados e significados que produzem a arquitetura compreensiva do ambiente

educativo. O discurso emitido faz parte de uma enunciação.

Todavia, sabemos que existem referências de significados

consensuais, representações sociais que possibilitam entendimentos e práticas

comuns dentro da sala de aula. É neste jogo de relações de unicidade e de

consensualidade de significações sobre a prática educativa, que propusemos saber

quais as representações sociais que as professoras expressam acerca do processo

de ensino-aprendizagem da língua, conhecendo assim, as enunciações que

conectam, ligam, consolidam, constituem, envolvem, entrelaçam, a teia de

compreensões sobre esta realidade.

Reforçamos assim, que esta dialogicidade é composta por discursos

internos e externos ao sujeito e, principalmente submersos em ideias socialmente

construídas, portanto, os dizeres das professoras, emitidos nas situações concretas

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dos contatos realizados para a investigação, acerca do processo de ensino-

aprendizagem da língua estão intimamente relacionados a outros diálogos

professorais, institucionais, sociais e ideológicos existentes.

Além do mais, esses diferentes discursos e representações sociais

podem definir, orientar e justificar as ações das professoras no espaço educacional,

trazendo um caráter identitário para o grupo. Desta maneira, é necessário

compreender como se formam e como funcionam os sistemas de referências que

direcionam os enunciados das professoras que, possivelmente, guiam as práticas

educativas.

Alguns autores, como Andrade (2008), defendem a necessidade da

apropriação pelos/as professores/as sobre a concepção de linguagem que

carregam, pois, assim, favorecerá a compreensão ampla acerca de sua própria

prática educativa, conhecendo o que norteia sua prática e direciona suas atuações

professorais:

[...] o professor precisa conhecer sua concepção de linguagem, pois é ela que irá fundamentar a sua ação pedagógica. A prática escolar, em que a relação professor/aluno e aluno/aluno é mediada pela palavra, não pode ser vista como algo neutro, desvinculado da realidade. Assumir que qualquer proposta metodológica é articulada a uma concepção de mundo e de educação é perceber, de alguma forma, as diferentes concepções de linguagem que estão presentes no cotidiano da sala de aula. (ANDRADE, 2008, p. 4010).

Identificamos nos dizeres das professoras algumas concepções de

linguagem contidas dentro das representações sociais sobre o ensino e a

aprendizagem da língua, que fogem do entendimento enquanto processo de

interação. Alguns materiais textuais sobre esta identificação foram apresentados no

capítulo que tratou sobre os resultados da pesquisa. Para Andrade (2008), dentro de

uma concepção interacional, a linguagem é compreendida:

[...] pelo seu caráter dialógico, onde vários discursos estão presentes e são permitidos. O professor surge, então, para cumprir um papel de mediador na busca dos diversos sentidos possíveis da linguagem, procurando assimilar e organizar as diferentes falas presentes na sala de aula, incentivando a participação, a iniciativa e a cooperação dos alunos e fazendo respeitar as mais variadas opiniões. (ANDRADE, 2008, p. 4012).

Temos ciência que essa compreensão interacional da linguagem

promove práticas educativas multifocais, pois consideram a participação efetiva de

todo os sujeitos e mediadores físicos e abstratos que cercam o ensino e a

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aprendizagem da língua, não centralizadas apenas na figura do/a professor/a, do/a

aluno/a ou mesmo do objeto de ensino e de aprendizagem. Portanto, ela contempla

o consenso e o dissenso dos discursos verbais e não-verbais que emergem da

prática e que chegam até ela.

Segundo Orlandi (2007)22, as pessoas estão submetidas à linguagem

que as envolve, seja pela sua cultura ou de outras circundantes, assim, o ato de

interpretar a realidade e os discursos que nela se movimentam é inevitável. Por

conseguinte, esta autora fala sobre a importância de orientar tal aclaramento de

sentidos para que o sujeito, especialista ou não, possa situar-se de uma melhor

forma quando confrontado com o discurso e, juntamente com o mundo, com outras

pessoas, com os significados acerca do mundo e finalmente com sua historicidade,

se percebam sujeitos e objetos da linguagem.

Nesta pesquisa, esse norteamento foi projetado e praticado enquanto

se valeu por constituir-se em um exercício analítico da compreensão dos discursos e

representações sociais das professoras; que resultou em um banco de

apontamentos e reflexões que podem, possivelmente, retornar para as mãos das

professoras, provocando dúvidas ou mesmo afirmações acerca da prática que

realizam, possibilitando uma compreensão de si mesmas, enquanto professoras da

língua portuguesa e de outras dimensões que envolvem o espaço educativo.

Essa compreensão multidimensional é necessária, pois a falta de

perceber o ‘outro’ nos exercícios educacionais, dificulta a aquisição de

conhecimentos, acarretando desinteresse e ausência de significação sobre a

importância da obtenção de conhecimentos para a vivência e convivência humana.

Neste sentido, as interações que se estabelecem entre o/a professor/a e os

alunos/as, dentro da sala de aula, podem favorecer ou desfavorecer o processo de

ensino-aprendizagem da língua portuguesa; pois estas interações são ramificadas

em sua constituição por crenças, atitudes, opiniões, impressões e representações

sociais que os sujeitos produzem e mediam sobre diversos elementos que envolvem

a educação escolar, como também, acerca da própria instituição, de si mesmos, de

outras pessoas e das próprias práticas sociais. Consequentemente são enunciações

fundamentadas por representações diversas sobre as coisas do mundo em que os

sujeitos reconhecem ou ignoram as interações sociais neste ambiente.

22

Obra sob o título Discurso e Leitura. Publicada pelas editoras: CORTEZ e UNICAMP, na sua 7ª edição em 2006.

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É neste ponto textual que buscamos as contribuições de Vygotsky

(2006, 2007) para destacar o conceito de mediação e a importância da interação na

construção de significados sobre o mundo. O autor buscou fundamentos na teoria

Marxista. Segundo Zuin e Reyes (2010), tecendo reflexões dialógicas sobre as

teorias de Vygotsky e Bakhtin, afirmam que nas ideias de Marx, o conceito de

mediação liga-se ao trabalho realizado pelo sujeito para agir e lidar nas

circunstâncias vivenciais que o envolve. Foi por meio da mediação, através do uso

de instrumentos aplicados ao exercício do trabalho, que os sujeitos se constituíram

enquanto um grupo humanizado, pertencente a uma espécie diferente de seres do

mundo. Seguindo esta consideração, Vygotsky descreveu dois tipos de atividades

mediadoras, os instrumentos e os signos:

A mediação por instrumentos, afirma, possui ligação direta com os postulados marxistas a respeito de sua importância como elemento interposto entre o trabalhador e o objeto de seu trabalho, ou seja, o instrumento é feito com o intuito de um objetivo específico; é, pois, um objeto social e mediador da relação do homem com o mundo. Já a mediação por signos é outro meio inventado pela humanidade a fim de auxiliá-la no campo psicológico. (ZUIN; REYES, 2010, p. 39).

Na busca para agir na realidade e compreender o mundo, ou mesmo,

para melhor lidar com as circunstâncias adversas da vida, como por exemplo, uma

tempestade, um sol intenso, a neve, ou adquirir e produzir alimentos para comer e

até mesmo conviver e, consequentemente se humanizar, o sujeito criou mediadores

diversificados: ferramentas, máquinas, carros, aviões, etc., que podemos chamar de

elementos físicos. Neste mesmo percurso existencial, o ser humano também criou

instrumentos da atividade psicológica, como exemplar, trazemos o signo. Assim, é

pela mediação que o sujeito se relaciona com o ambiente, pois ele não tem acesso

direto aos objetos, mas estabelece relações mediante os sistemas simbólicos que

representam a realidade.

Para Vygotsky (2007), considerando quatro vertentes do ser humano,

enquanto um ser biológico, psíquico, social e individual, é por meio da mediação

tanto em formato de instrumentos, como de signos, que os sujeitos internalizam

conhecimentos da realidade. Aprendem no convívio entre as pessoas, com a grande

importância da linguagem e, assim, promovem o desenvolvimento real - o sujeito

consegue realizar sozinho, os problemas e questões existenciais - e o

desenvolvimento potencial - a pessoa realiza problemas e questões existenciais com

a ajuda de outra.

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Rego (2008) nos apresenta uma possível compreensão sintética dessa

premissa, três exemplos de possibilidades da complexa mediação simbólica: 1º

proporciona ao ser humano lidar com os objetos do mundo exterior mesmo quando

eles estão ausentes. 2º possibilita abstrair, interpretar, generalizar as características

dos objetos e situações. 3º Funciona como uma linguagem, uma possibilidade de

trocas de conhecimentos entre as pessoas, que garante a preservação dos grupos,

a mediação do sujeito com o mundo e o aprendizado de conhecimentos e de

experiências físicas, que são acumulados pela humanidade ao longo da História.

Logo, o domínio dos instrumentos e o domínio dos signos promovem modos

diferentes e mais abstratos de pensar sobre o mundo e possibilitam inúmeras formas

de interação entre pessoas e de interação delas com o conhecimento.

Para Vygotsky et al (2006) a dinâmica das interações dentro do

processo de ensino-aprendizagem deve ser realizada sob a mediação do/a

professor/a nas atividades e construções cognitivas dos/as alunos/as, para um

resultado adequado da aprendizagem. Para ele a mediação é um fator de suma

importância nas relações, sendo que, a aprendizagem e o desenvolvimento são

processos adquiridos e elaborados culturalmente. Para esse autor o processo de

mediação é entendido como uma ponte que liga as relações do sujeito com o

mundo.

Observa-se que, para Vygotsky (2007), a relação do ser humano com o

mundo não é uma ligação direta e sim mediada, sendo que os símbolos são os

elementos intermediários entre o sujeito e a realidade que o cerca, não se une a

determinada relação senão por meio de outra relação. Esta mediação pode ocorrer a

partir das interações entre as pessoas promovidas pela linguagem e pelas práticas

sociais. A intervenção de fatores culturais possibilita formas diferentes de relações

do sujeito com o meio. É, portanto, através do processo de mediação que o sujeito

se humaniza. É dentro desse conceito de mediação que Vygotsky ofereceu uma

significativa contribuição para a área educacional, com seus estudos sobre a Zona

de Desenvolvimento Proximal (ZDP). De acordo com ele, ZDP é:

[...] a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração de companheiros capazes. (VYGOTSKY, 2007, p. 97).

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Para Vygotsky (2007), crianças de mesma idade temporal podem

apresentar idade mental diferenciadas, ou seja, a criança só vai aprender, mesmo

com a ajuda de outra pessoa, a partir do momento em que ela estiver pronta. “Se

uma criança pode fazer tal e tal coisa, independentemente, isso significa que as

funções para tal e tal coisa já amadureceram nela”. (VYGOTSKY, 2007, p. 97).

O/a professor/a como mediador/a de conhecimentos, tem papel

fundamental para o desenvolvimento do/a aluno/a, entretanto, Vygotsky et al (2006)

afirma que não é qualquer pessoa que pode, a partir do auxílio do ‘outro’, realizar

qualquer tarefa. Ele diz que o ‘outro’ só pode ajudar quando o sujeito estiver pronto

para receber essa assistência. O desenvolvimento e o aprendizado estão

relacionados um ao outro, é necessário o desenvolvimento e a organização das

funções psicológicas para a evolução do aprendizado, permitindo o despertar de

processos internos de desenvolvimento, em contato com o ‘outro’ e com o meio em

que vive, para que isso ocorra. Portanto, é fundamental o papel do/a professor/a na

ascensão do desenvolvimento e aprendizado do/a aluno/a.

Vygotsky (2007) afirmava que quando a criança dá um passo evolutivo

no aprendizado, expande em dois passos o desenvolvimento, pois o conhecimento

que aprendeu possibilitou o armazenamento de referências que podem ser utilizadas

em processos cognitivos diferenciados. Assim, podemos dizer que o/a docente

proporciona uma possível contribuição na obtenção dos dois processos por parte

do/a discente, na mediação de situações educativas que se valem do que o/a

aluno/a já conhece, daquilo em que ele consegue realizar sozinho/a, como também,

o/a professor/a precisa saber qual é o potencial cognitivo do/a discente, até qual

nível ele/a pode aprender e se desenvolver com a ajuda do/a professor/a, para

depois conseguir realizar questões e exercícios mais complexos por si mesmo.

Dessa maneira, o/a professor/a precisa considerar o que o/a aluno/a já

sabe antes do processo educativo apresentado; necessita respeitar o momento

cognitivo solitário do/a discente quando está produzindo relações entre os saberes

prévios e referências diversas que auxiliarão na resposta ao problema apresentado

pelo/a docente; como também, o/a professor/a precisa refletir sobre o quê o/a

aluno/a poderá vir a conhecer - o potencial cognitivo que poderá alcançar – e;

principalmente, sabendo destas três importantes vertentes, deve proporcionar uma

mediação educativa que contemple todas essas dimensões.

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A atividade mediadora advinda do signo, que favorece o contato do ser

humano com outros seres sociais e físicos, flui, principalmente, na interação entre

sujeitos, nas inserções grupais que as pessoas são direcionadas e se permitem

adentrar. Quando a criança chega à escola, entra em um novo grupo social, que

marca a primeira grande ruptura social, uma vez que convivia exclusivamente com o

círculo familiar. Neste momento, tem a possibilidade de fazer parte de mais um

grupo social, de se fazer pertencente e participante do mesmo. Entretanto, podemos

considerar que o/a docente e seus/suas alunos/as formam um grupo?

A resposta para a pergunta pode contribuir para compreender este

movimento interpessoal dentro da sala de aula. Para Jesuíno23 (1997, p. 260), o

conceito de grupo está relacionado com o entendimento sobre a interação, a

interdependência e a consciência mútua entre seus membros. Este autor,

fundamentado em McGrath (1984), apresenta quatro direcionamentos para

considerar pouco agregados os sujeitos, tendo menor adesão ao grupo: 1. Quanto

maior o número dos seus membros; 2. Menor a interação entre os membros; 3.

Menor a sua história; 4. Quanto “[...] mais o seu futuro se reduz ao horizonte próximo

da interacção corrente”.

Conforme Jesuíno (1997), os sujeitos agregados que são considerados

como grupos agem conforme as características do coletivo, direcionados pelo poder,

pela autoridade e pela influência dos membros. Os membros de determinada

coligação interagem afeiçoados às suas características pessoais, seus

posicionamentos perante o grupo e em relação às tarefas que irão desempenhar. Se

existe um sujeito com características muito díspares dos outros sujeitos de um

grupo, sendo este considerado como o líder, a dinâmica das interações tem a

possibilidade de caminhar conforme seus direcionamentos. Assim, compreendemos

que o/a docente pode ser visto como este líder que exerce uma influência

significativa no processo de ensino-aprendizagem, sendo de suma importância ouvi-

lo/a para identificar os movimentos e as forças diretivas de suas práticas nas

interações entre os/as alunos/as.

23

No capítulo denominado Estrutura e processos de grupo: interacções e factores de eficácia, do livro Psicologia Social, publicado em Lisboa no ano de 1997, pela Fundação Calouste Gulbenkian, Jesuíno apresenta possibilidades de se pensar acerca dos grupos e das relações interpessoais que se estabelecem dentro dos mesmos.

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O conhecimento social consiste em um conjunto de ideias que

permitem aos sujeitos a compreensão de si mesmos e dos outros, a reflexão das

relações interpessoais e de grupos e o funcionamento geral da sociedade. Desta

maneira, o/a professor/a se faz, enquanto profissional, na relação com o/a aluno/a,

como, também, o/a discente constrói sua identidade e reflexões sobre o mundo na

relação com o/a docente, não esquecendo outras pessoas/culturas/ideologias.

Ambos os sujeitos sociais estão imersos em uma sala de aula que não

se basta como um espaço de mediação de conhecimentos, mas é o lugar que abriga

possibilidades múltiplas para a formação reflexiva de um sujeito pleno, em termos

individuais e de inserção social. Desta forma, evidencia-se que aquele/a que ensina

é tão importante quanto àquele/a que aprende, pois, são dois segmentos de uma

estrutura orgânica com regras e normas de funcionamento de dependência,

estreitamente ligados por um quefazer de alegria e de enfrentamentos orientados

por objetivos maiores do processo de ensino e aprendizagem: promover

conhecimento que, além de associar teoria e prática, promova a cidadania, a

inclusão, a leitura e a interpretação de mundo, enquanto construção e representação

social.

Portanto, o tipo de troca social estabelecida entre professor/a e aluno/a

e aluno/a e aluno/a, autoriza ou desautoriza a construção de uma personalidade

autônoma. A formação da personalidade humana só é possível de ser efetivada

mediante desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a

aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores.

Práticas educativas adequadas de mediações de conhecimentos contribuem para a

formação de um sujeito que saiba elaborar o seu próprio conhecimento, resolver os

diferentes problemas que a vida lhe impõe, transformando-se assim, possivelmente,

em uma pessoa criativa, inventiva, descobridora e solidária.

Para trazer um caráter específico dessa interação, buscamos as

contribuições de Coll e Solé (1996), mesmo sabendo que estudam fundamentos

construtivistas, pois consideramos que contemplam as elucidações aqui expostas da

importância do social para a aquisição de conhecimento pelos sujeitos. Para estes

autores, as interações entre docente e discente provocam repercussões sobre o

ensino e a aprendizagem escolar; a educação é uma atividade social, em que o/a

professor/a desempenha o papel de ensinar, dirigir, guiar e influir sobre a

aprendizagem de conhecimentos, atitudes, valores e normas por parte do/a aluno/a.

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Portanto, nos perguntamos: como são estabelecidas as interações entre

professores/as e alunos/as no processo de ensino e aprendizagem?

Segundo Coll et al (1998, p. 39), quando aprendemos, aprendemos os

conteúdos e também aprendemos que podemos aprender; quando não aprendemos

os conteúdos, podemos aprender algo: que não somos capazes de aprender. Tudo

isso ocorre durante as interações estabelecidas em aula, em torno das tarefas

cotidianas, entre alunos/as e entre os/as alunos/as e o/a professor/a; e durante

essas interações é que se constrói a motivação intrínseca, que não é uma

característica do/a aluno/a, mas da situação de ensino/aprendizagem, e afeta

todos/as os/as protagonistas.

Ao transcorrer do tempo, a reflexão sobre o que seja o ensino e a

aprendizagem foi sendo modificada, como também, a compreensão da dimensão

relacional entre os sujeitos envolvidos nesses processos. Atualmente, conforme Coll

e Solé (1996), essas relações são entendidas em várias pesquisas como um

fenômeno complexo dentro da sala de aula, são influenciadas por diversos fatores,

como, por exemplo, pelas representações que professores/as e alunos/as têm

acerca de si, dos outros seres e de objetos, pela cultura social e institucional, pelas

expectativas dos sujeitos envolvidos nas atividades, entre outros.

Para esses autores, é necessário considerar as características

específicas dos contextos de sala de aula e, também, dos contextos institucionais e

sociais, em que são produzidas as interações, como também, indicam à importância

de se pensar a aula como um espaço comunicativo regido por regras. Ampliamos

esta ideia, considerando a prática educativa como regida por enunciações diversas.

Coll e Solé (1996, p. 295), apresentam que existem dois elementos

essenciais na construção dos contextos de interação na sala de aula. O primeiro se

refere à estrutura de participação elaborada pelos sujeitos, como exemplo, “[...]

quem pode fazer ou dizer algo, o quê, quando, como, com quem, onde, com que

objetivo.” O segundo trata da estrutura do conteúdo e de sua organização. Para

esses autores, o mais importante é compreender que na medida em que

transcorrem as atividades de ensino e de aprendizagem nos contextos de

interações, tanto o/a professor/a, quanto os/as alunos/as constroem conjuntamente

as duas estruturas de articulação, que graças a esta dinâmica, podem produzir

significados compartilhados para as suas ações e verbalizações respectivas, para o

desempenho dentro da sala de aula, como, também, em outros espaços.

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De forma complementar, Silva e Azevedo (1996, p.169) afirmam que

não pode deixar de lado a preocupação pelas competências necessárias da

população para sua participação ativa na sociedade, tanto das habilidades

requeridas para uma inserção adequada no campo do trabalho, como as

necessidades para participar como sujeito ativo nos processos sociais, como sujeito

que é capaz de entender o que está vivendo, que é capaz de dizer sua palavra, de

comunicar-se não somente nos códigos orais, talvez próprios de seu grupo cultural,

mas que pode fazê-lo também nos meios que exigem o código escrito.

Dessa maneira, as representações sociais que ambos carregam sobre

si e os outros e as interações mútuas estabelecidas em relação aos seus pares

afetam a realização da atividade educativa. Ampliando esta mesma compreensão,

segundo Coll e Miras (1996), para estudar os processos de interações que ocorrem

nas escolas, são necessárias observações nos comportamentos realizados nestes

espaços, como também, identificar as cognições relacionadas aos mesmos. Dentro

desta vertente cognitiva entra as representações sociais, sendo um fenômeno

comunicacional e comportamental que têm, entre outras, a função de guiar as ações

das pessoas.

De forma complementar, Coll e Miras (1996) apresentaram uma

pesquisa exemplificadora realizada por Gilly (1980), fundamentado a partir de

diversas pesquisas e por suas próprias investigações, evidencia que as

representações sociais que professores/as carregam de seus alunos/as são

norteadas por fatores principalmente normativos, como por exemplo: atenção,

participação, motivação, responsabilidade, interesse pelo trabalho, respeito às

normas sociais de trato com os colegas e com o/a próprio/a professor/a;

resumidamente, que assumam as regras da instituição escolar. Estas características

definem o bom aluno/a para o/a professor/a.

Outra pesquisa citada - como alunos/as representam seus

professores/as - aponta para a existência de uma diversidade de conteúdos

representacionais considerando algumas variáveis, dentre elas, a idade. As crianças

da educação infantil representam o bom professor na dimensão afetiva, isto vai

modificando ao longo das idades das mesmas, como por exemplo, discentes do

ensino fundamental introduzem aspectos novos como clareza e pertinência da

exposição dos conteúdos, capacidade para despertar o interesse dos/as alunos/as

entre outros.

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Além disso, essas representações podem contribuir para a criação de

expectativas professorais acerca do rendimento escolar discente. Estas podem

contribuir para o êxito ou fracasso das atividades. A profecia do autocumprimento foi

e é de interesse de muitos/as pesquisadores/as, o que se espera de algo ou de

alguém pode influenciar na obtenção de determinados resultados, pois, já se

construiu uma prévia visão destes, que pode ser tanto positiva, quanto negativa.

(COLL; MIRAS, 1996).

Assim sendo, relação professor-aluno fundamenta-se na certeza de

que o conhecimento decorre da participação de ambos, e goza de credibilidade e de

cientificidade suficientes para se permitir fazer uma leitura correta do homem,

enquanto ser social; da sociedade, como produto do homem; das relações sociais,

decorrentes do modo de produção.

Assim, a relação professor-aluno é uma relação que reproduz ou que

liberta. Dependerá das políticas as quais ele/a, o/a professor/a se comprometeu a

praticar dentro e fora da escola. Se a meta for construir conhecimento e formar

consciência, as possibilidades de êxito são maiores.

Neste capítulo, buscamos apresentar alguns conceitos da teoria da

enunciação de Bakhtin e da teoria histórico-cultural de Vygotsky, bem como de

algumas compreensões dos processos de interação entre docente e discente na

prática educativa. Embora pertencentes a áreas distintas de conhecimento, Bakhtin

e Vygotsky tratam o discurso como uma manifestação viva do signo e compreendem

a linguagem como responsável pela interação e constituição humana.

Finalizamos esta parte textual afirmando que dentro do processo de

ensino-aprendizagem da língua, o conhecimento escolar sobre a língua portuguesa,

mediado pela linguagem repleta de significados institucionais, políticos e ideológicos

deve caminhar para o desvelamento do mundo e das relações entre os grupos

sociais. Dentro desta ambiência enunciativa, existe o fenômeno representacional

que auxilia nas atribuições de significados acerca do mundo e seus seres. Por

conseguinte, antes de falarmos sobre o conceito de representações sociais,

precisamos entender o objeto que pode ser submetido a tal processo

representacional, sendo neste nosso estudo: o processo de ensino-aprendizagem da

língua portuguesa, que será discutido no próximo item.

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2.2.2 O processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa enquanto um

contínuo progressivo de alfabetização

Dentro da nossa compreensão acerca do processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa estão contidos os norteamentos da Teoria da

Enunciação de Bakhtin, como também, a Teoria Histórico-Cultural de Vygotsky nos

ajudaram a entender esse processo enquanto atividade cognitiva e discursiva que é

constituída por forças interativas entre interlocutores e os objetos de conhecimentos.

Como escrevemos anteriormente, a concepção de linguagem que

carregamos e a reflexão acerca do processo interativo entre os sujeitos que realizam

a prática educativa, neste item serão apresentados, em síntese, os conceitos que

carregamos sobre educação, ensino, aprendizagem, alfabetização e letramento;

fundamentados nas ideias de teóricos que nos ajudaram a compreender a amplitude

e, principalmente, a fusão de conceitos que promovem significações acerca da

prática educativa escolar.

Para Chaves (1979), a educação é um processo mediante o qual as

pessoas obtêm domínio e compreensão de certos conteúdos considerados valiosos.

Compreendemos, a partir das ideias do autor, que a educação é um movimento

contínuo para aquisição e aprendizagem de conhecimentos, atitudes e valores

avaliados como apropriados para uma determinada cultura, que necessitam de

entendimentos acerca dos mesmos, se valendo de reflexões sobre a significância do

conteúdo.

Os sujeitos podem aprender sobre diversas coisas do mundo

proporcionadas pela socialização e aculturação. Entretanto, a educação só é

adquirida se existir apropriações e compreensões dos saberes, conhecendo “[...] sua

razão de ser, e venha a aceitá-los somente após investigação criteriosa que abranja

não só as normas e os valores em questão, mas também possíveis alternativas”.

(CHAVES, 1979, não paginado).

Para o autor, a educação é compreendida para além de um processo

de incorporação e de inculcação de conteúdos considerados valiosos. Para ser

considerada como educação é necessária a ciência plena da significação dos

saberes para a vida das pessoas.

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Movendo-se em meio aos processos de ensino e de aprendizagem que

podem ocorrer tanto em comunidades educacionais quanto naquelas que são

consideradas como não-educacionais, as pessoas têm a possibilidade de adquirir

normas e valores sociais que são ou não considerados valiosos e apropriados por

determinado grupo; como também, podem ser condicionadas a produzir tipos de

comportamento, em muitos casos, não se vê construção reflexiva dos mesmos,

acarretando injustiças vivenciais advindas das lutas entre classes sociais, e, a luz

das ideias de Chaves (1979), a não apropriação da educação.

Ao contrário dessa provável falta de consciência, ensinar dentro da

área educacional deve se processar na direção de uma linha compreensiva. Práticas

que precisam ser envolvidas por reflexões elaboradas por toda comunidade escolar,

concernente aos conteúdos trabalhados, que serão importantes para além da

utilização na prática de sala de aula. (SACRISTÁN, PÉREZ GÓMEZ, 1998).

Entendemos o ensino escolar como um processo de mediação pelo

qual são providas as condições e os meios para que os/as alunos/as, em sua

diversidade, se construam enquanto sujeitos ativos na assimilação, elaboração e

reflexão compreensiva e significativa de conhecimentos, que podem contribuir para

uma inserção plena nas diversas ambiências sociais. Ensino este que não é de

responsabilidade e de implicações únicas do profissional professor/a. (SACRISTÁN,

PÉREZ GÓMEZ, 1998).

Ademais, conforme Sacristán e Pérez Gómez (1998), a prática

educativa, construída em alicerce ético, com profissionalismo e responsabilidade,

necessita ser compreendida enquanto em meio a heranças do passado, que pode

reproduz hábitos e conhecimentos de demandas já obsoletas. Para os autores,

teorias e pensamentos educativos se apresentam, em determinados casos, como

legitimadores de práticas educativas que ocultam dimensões éticas, sociais,

pedagógicas e profissionais. Portanto, para compreender e transformar o ensino,

são necessários entendimentos dos problemas e das práticas, ambos processados

nos ambientes educativos e para além deles, isto possibilitará dar conteúdo e

sentido à realidade do ensino.

Nessa linha de entendimento, o ensino escolar, compromisso

específico do/a docente, se envolve em diversas funções, como exemplo: organizar

o conteúdo curricular para adequar as especificidades dos sujeitos sociais; ajudar

os/as alunos/as a conhecer suas possibilidades de aprender; indicar os métodos de

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estudo e atividades que serão realizadas; indicar a importância de dirigir e controlar

a ação docente para os objetivos da aprendizagem discente; promover momentos

de tomadas de consciência acerca das implicações sociais que afetam a

singularidade dos/as discentes; entre outras.

Para Sacristán, Pérez e Gómez (1998):

A intervenção compensatória da escola deve revestir-se de um modelo didático flexível e plural que permita atender às diferenças de origem, de modo que o acesso à cultura pública se acomode às exigências de interesses, ritmos, motivações e capacidades iniciais dos que se encontram mais distantes dos códigos e características em que se expressa. Assim, a igualdade de oportunidades de um currículo comum na escola compreensiva obrigatória na é mais do que um princípio e um objetivo necessário numa sociedade democrática. Sua realização é um evidente e complexo desafio que requer flexibilidade, diversidade e pluralidade metodológica e organizativa. (SACRITÁN; PÉREZ GÓMEZ, 1998, p. 23).

A ciência e o trato com a diferença do/aluno/a faz do ensino escolar

uma possibilidade de compensar demandas educativas que por, muitas vezes, se

fazem desiguais. No ensino, está o saber lidar com a diversidade, cuidar e educar o

que se apresenta/interpreta diferente, não para a igualdade, mas para a construção

de oportunidades. Desigualdades que acarretam baixos rendimentos escolares,

causam escassez de oportunidades vivenciais entre pessoas e grupos e geram

injustiças sociais dever ser identificadas e, com esforço entendidas, para serem

enfrentadas e, assim, superadas por sujeitos e grupos em seu processo formativo.

Nesse mesmo curso processual, compreendemos a aprendizagem

como aquisição/reflexão de conhecimentos advindos do mundo, tanto físico, quanto

social. (SACRISTÁN, PÉREZ GÓMEZ, 1998). Esta apropriação interpretativa da

realidade pode ser construída em uma educação que fomenta construções,

(re)construções, significações e (re)significações de conhecimentos, que possibilitam

um caminhar em práticas solidárias com ideais focalizados no bem singular e

comum das pessoas e grupos.

Não é possível ensinarmos sem nos determos nas referências de como

os/as alunos/as aprendem, de buscarmos compreender os processos de

desenvolvimento e de aprendizagem de cada aluno/a. No rol dos desafios

pedagógicos e metodológicos, figuram os conceitos a serem internalizados voltados

às ações pedagógicas, de promoção, de inclusão, de superação e de respeito à

diversidade. Esta compreensão observa a relação entre ensino e aprendizagem, não

como simples transmissão de conteúdos do/a professor/a que ensina para um/a

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aluno/a que aprende. Ao contrário, é uma relação recíproca na qual se destaca a

atividade interlocutiva dos sujeitos envolvidos no processo para a construção de

sentidos e de significados que fomentam os conhecimentos para o sujeito em sua

singularidade, em meio aos ‘outros’, compreenda o ambiente natural e social,

sistema político, a tecnologia, as artes e os valores em que se fundamenta a

sociedade.

Conforme Sacristán e Pérez Gómez (1998), o desenvolvimento da

capacidade de aprender deve ser processado considerando diferentes enfoques

construídos acerca da mesma, uma vez que decorre do ensino, o que requer do

professor a construção contínua de conhecimentos sobre o cotidiano e as

excepcionalidades da sala de aula. Além disso, os métodos que fomentam estes

processos se localizam em meio à complexidade e à singularidade dos fenômenos

educativos e na intencionalidade da prática educativa, composta por planos,

currículos e conteúdos, elaborados em um amplo contorno social, oriundas de

circunstâncias culturais, políticas, econômicas e sociais.

Por via desse entendimento, o/a professor/a assume uma série de

funções nessas relações interativas, entre elas: planejar seu ofício com plasticidade

reflexiva/prática, o que permite uma possível compensação sobre as necessidades

dos/as alunos/as; considerar as contribuições dos/as alunos/as no início e durante

as atividades; auxiliar os/as discentes a encontrar sentido no que fazem; entre

outras. Desta maneira, os conteúdos de aprendizagem só podem ser considerados

relevantes à medida que desenvolvam capacidades dos/as alunos/as para que eles

percebam as transformações ocorridas no tempo e no espaço, modificando a

realidade imediata em decorrência de fenômenos que se manifestam globalmente.

É nessa rede complexa de significações e práticas educativas para a

apropriação efetiva de conhecimentos que se insere o processo de alfabetização, a

possibilidade plena de aquisição das práticas de ler, escrever, ouvir, refletir,

conscientizar e ser conscientizado socialmente sobre o mundo, a partir de práticas

de ensino e aprendizagem da língua. Perante o exposto, o conceito de alfabetização

é carregado por uma significação ampla e cheia de redes de significações do próprio

entendimento sobre o que seja o ensino da língua, portanto, iremos apresentar

alguns conceitos e, só a partir deles, reuniremos os mesmos para uma compreensão

ampliadora.

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Para Smolka (1988), a alfabetização é entendida como um processo

discursivo, uma atividade cognitiva, como também sociocultural, em que existem

interações entre interlocutores para a construção de conhecimentos e,

principalmente, para a elaboração de sentidos e significados sobre os mesmos.

Construindo entendimentos sobre o processo de aquisição da escrita nas crianças,

Smolka (1988, p.63) aponta uma importante dimensão, “[...] a interação, [...] a

interdiscursividade, inclui o aspecto fundamentalmente social das funções, das

condições e do funcionamento da escrita (para que, para quem, onde, como, por

quê?)”.

São questões norteadoras para a atuação docente, pois, sem a

compreensão e aplicação delas, os procedimentos pedagógicos se tornam ou

continuam sendo chamados de mecânicos, se valendo apenas da ação,

esquecendo-se da reflexão para uma prática educativa significativa para a vida do

sujeito. Smolka (1988) não deixa de lado outras dimensões que constituem o

processo de alfabetização, como a atividade cognitiva amplamente discutida por

Piaget, mas apresenta como relevante a função discursiva:

Nesse sentido, a alfabetização é um processo discursivo: a criança aprende a ouvir, a entender o outro pela leitura, aprende a falar, a dizer o que quer pela escrita. (Mas esse aprender significa fazer, usar, praticar, conhecer. Enquanto escreve, a criança aprende a escrever e aprende sobre a escrita.) Isso traz para as implicações pedagógicas os seus aspectos sociais e políticos. Pedagogicamente, as perguntas que se colocam, então, são: as crianças podem falar o que pensam na escola? Podem escrever o que falam? Podem escrever como falam? Quando? Por quê? (SMOLKA, 1988, p. 63).

Podemos incluir nesses questionamentos outras perguntas: os/as

professores/as podem falar o que pensam na escola? Os/as professores/as podem

escrever o que falam? Podem escrever como falam? Quando? Por quê? Refletir

sobre o papel do/a aluno/a, sobre o papel do/a professor/a, sobre a função do ensino

da língua, leva para a busca de uma compreensão do papel social nesta prática:

Ora, isso nos revela então que a construção do conhecimento sobre a escrita (na escola e fora dela) se processa no jogo das representações sociais, das trocas simbólicas, dos interesses circunstanciais e políticos; é permeada pelos usos, pelas funções e pelas experiências sociais de linguagem e de interação verbal. Nesse processo, o papel do “outro” como constitutivo do conhecimento é da maior relevância e significado (o que o outro me diz ou deixa de me dizer é constitutivo do meu conhecimento). (SMOLKA, 1988, p. 61).

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Os principais sujeitos envolvidos no processo de alfabetização, aluno/a

e professor/a, muitas vezes, não escutam as várias vozes e os silêncios que

influenciam a prática educativa e a sua construção identitária e social, isto leva para

a constituição de um processo de alfabetização estruturado por várias dissonâncias.

Portanto, os direcionamentos de Smolka (1988, p. 63) “[...] para que, para quem,

onde, como, por quê [...]” são norteados por objetivos, atitudes e entendimentos

diferentes entre todos os sujeitos participantes da alfabetização.

Pedagogicamente, então, é fundamental observar e considerar, no processo de alfabetização, as situações e as condições em que se processa e se produz o conhecimento escolar sobre a escrita. (Quem usa a escrita na sala de aula? Para quê? Como? Por quê?). (SMOLKA, 1988, p. 61).

Partindo do exposto, compreendemos que não somente na prática de

escrever na escola, como também, nas práticas de ler, ouvir e falar; precisamos

entender quais são os objetivos que os sujeitos carregam para a realização das

referidas práticas. Depois desta identificação, devemos propor uma sintonia de

entendimentos. Isto significa construir um acordo mútuo para a realização de um

objetivo comum. As formações imaginárias, implícitas ou explicitas nas linguagens,

direcionam as práticas das pessoas; portanto, para Smolka (1988) os papéis dos

sujeitos que participam do processo educativo se fundem; todos juntos constituem

um processo discursivo para um objetivo comum.

Assim, ao invés de termos: quem – ensina – o quê – para quem – onde, podemos representar as relações de ensino (na escola e fora dela) de outra forma: [...] onde os lugares do quem podem ser preenchidos tanto pelo aluno como pelo professor, ou por qualquer pessoa. Mas, aí, a questão que se coloca, é: “quem pode ocupar que lugar, quando e por quê?” E voltamos à análise da institucionalização da tarefa de ensinar: da posição e do papel do professor na escola; das representações sociais, das formações imaginárias e do funcionamento implícito; das condições político-econômicas no movimento das transformações históricas. (SMOLKA, 1988, p. 45).

Dessa maneira, a alfabetização, como processo discursivo, é realizada

em uma situação socialmente construída, as leituras realizadas e os textos

elaborados pelos/as alunos/as, desde as primeiras tentativas, produzem momentos

de interlocução, de dizer sobre algo para alguém, considerando seu local

institucional e social. “Nessa atividade, nesse trabalho, nem todo dizer constitui a

leitura e a escritura, mas toda leitura e toda escritura são constitutivas do dizer”.

(SMOLKA, p. 1988, p. 112).

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Para Smolka (1988), a escola na década de oitenta - pensamos que

atualmente as relações pedagógicas continuam semelhantes ou piores – ensinou

os/as alunos/as a escrever, mas não a produzir dizeres:

[...] e sim, repetir – palavras e frases pela escritura; não convém que elas digam o que pensam, que elas escrevam o que dizem, que elas escrevam como dizem (porque o “como dizem” revela as diferenças); a escola tem ensinado as crianças a ler um sentido supostamente unívoco e literal das palavras e dos textos e a escola tem banido aqueles que não conseguem aprender o que ela ensina, culpando-os pela incapacidade de entendimento e de compreensão. O que a escola, como instituição, não percebe, é que a incompreensão não é fruto de uma incapacidade do indivíduo, mas é resultado de uma forma de interação. Assim sendo, as formas de interação nas escolas têm produzido tanto os alfabetizados quanto os considerados iletrados e analfabetos. Isto porque o processo de aquisição da escrita nas crianças se realiza não só na margem ou no percurso do “ilegível” para o “legível”, mas no espaço do “inter-dito”, da “ilegalidade”, da provocação até, na medida em que se processa nas tentativas de legitimação de diferentes modos de dizer pelo trabalho de escrever. (SMOLKA, p. 1988, p. 112).

De forma complementar, as reflexões de Bagno (2002), apontam para

a necessidade de um esforço em linhas de trabalho para que o ensino atual supere

a prática tradicional de repetição de uma norma culta e de uma metalinguagem de

análise da gramática sem contextualização e significação para o/a aluno/a. É

importante compreender a concepção tradicional da língua portuguesa que vigora e

a relação desta compreensão com a sociedade em que ela representou ou

representa. É preciso que ocorram mudanças no ensino para atender a dinâmica

social contemporânea.

Bagno (2002) revela que a imagem social sobre o ensino de língua

portuguesa é o mesmo da gramática normativa, pois, ensinar o português padrão é,

supostamente, transmitir a norma culta. “Esse modo de conceber os fatos de

linguagem condena ao submundo do não-ser todas as manifestações linguísticas

não-normativas, rotuladas automaticamente de “erro” – e, junto com as formas

linguísticas estigmatizadas, condena-se ao silêncio e à quase-inexistência as

pessoas que se servem delas”. (BAGNO, 2002, p. 21). Perante o exposto,

compreendemos que ensinar especificamente um padrão linguístico acarreta um

processo educativo homogêneo, como sendo um produto acabado, pronto para o

consumo, não considerando o heterogêneo e a dinâmica social.

Por outro lado, faz-se necessário, ao discutir o ensino da língua

portuguesa, ou língua padrão, ou norma culta, não incorrer no erro de construirmos

uma pedagogia ou metodologia da justificativa, da negação do outro como sujeito

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capaz de aprender, de sair do senso comum, de modo a interagir com os

conhecimentos que estão além das circunstâncias determinantes de uma língua tida

como inferior, não culta. Nessa perspectiva, o estudo, a aprendizagem e o ensino da

língua têm o desafio de promover a inclusão sem, com isso, negar os fatores

determinantes da fala local.

Pois, tomando como parâmetro o fato de a fala ser representação de

um tipo de pensamento, imbricada em cultura de aceitação ou ruptura, faz-se

necessário ter presente que outras possibilidades de representação existem além da

sombra da caverna. Mais que jogos semânticos ou sombras, ações, devidamente

iluminadas, sem sombras, contribuirão para a passagem da caverna para o universo

de conhecimentos e saberes.

Para o referido autor, o avaliado erro linguístico parece desencadear

preconceitos sociais, como por exemplo, a ideia que “[...] alguém fala errado porque

pensa errado, porque age errado, porque é errado”, de outro lado, a pessoa que “[...]

fala certo pensa certo, age certo, é certo”. Amplia dizendo que não podemos forçar

o/a aluno/a a utilizar regras padronizadas porque assim ele se enquadrará melhor na

vida social: “E se ele não quiser se enquadrar? E se ele considerar que esta

sociedade injusta, excludente e discriminadora não merece o esforço do

enquadramento?” (BAGNO, 2002, p. 77). A língua é uma ferramenta em formato de

signos e significados e ao mesmo tempo é o resultado de um processo de

interlocução, não está pronta nos tempos e espaços, mas é criada exatamente

enquanto vamos utilizando.

Como linha de trabalho, Bagno (2002) indica sobre a necessidade de

uma crítica sobre o ensino de uma gramática normativa na escola em contraposição

aos direcionamentos de uma reflexão linguística advinda do processo de letramento.

Ele questiona (p. 47): “Se a função da escola não é, então, ensinar a todo custo um

padrão lingüístico ideal, qual será o objetivo do ensino de língua”?

[...] o objetivo do ensino tradicional na escola brasileira sempre foi transmitir aos alunos uma língua digna deste nome, uma norma padrão que é identificada com o nome de “português”. Para alcançar esse objetivo, a escola sempre se guiou pela idéia de que para alguém falar e escrever bem era necessário, previamente, adquirir um saber gramatical, um conhecimento integral dos mecanismos de funcionamento da língua, tal como codificado nas gramáticas normativas. Trata-se de um mito, aquele que diz: “É preciso conhecer a gramática para falar e escrever bem”. (BAGNO, 2002, p. 47-48).

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Para o autor (2002, p. 48) isso deve ocorrer ao contrário, na inversão

desse mito: “[...] é preciso saber falar, ler e escrever bem para estudar a gramática”.

“Assim, em vez de ensinar e estudar um universo enorme e rico, que é a língua

portuguesa, a escola se dedica quase exclusivamente a ensinar um pedacinho

ínfimo e miserável desse universo”, a gramática. (BAGNO, 2002, p. 50). O autor

considera a gramática como parte da língua portuguesa, mas que é socialmente

considerada como sendo a própria língua. Como uma possível mudança desta

concepção, o autor apresenta que um dos objetivos do ensino de língua na escola é

a introdução do conceito de letramento.

Para tanto, indica que é necessário trabalhar no processo de ensino-

aprendizagem de língua portuguesa com textos, que se concretizam na forma de

gêneros discursivos, que são apresentados tanto na fala, quanto na escrita. O autor

orienta para a necessidade de “[...] detalhamento de um modelo de aplicação da

pesquisa lingüística que pode ser realizada em sala de aula como ferramenta

pedagógica para substituição do ensino acrítico da nomenclatura gramatical

tradicional e dos exercícios mecânicos de aplicação dela”. (BAGNO, 2002, p. 190).

Bagno (2002) afirma que ainda a sociedade se deixa levar por um

ensino anacrônico de língua portuguesa, profissionais transmitem uma norma

padrão, sem considerar a variação linguística. Para ele, existe uma cobrança da

sociedade e mesmo da família, para que os/as professores/as ensinem o português

conforme aprenderam, com a inculcação da norma padrão, mas não percebem que

forçam os/as docentes/as deste ensino a trabalharem com conteúdos já

ultrapassados para a atualidade, sendo prescritivos e normativos, que não trazem

significação para os/as alunos/as, exemplifica fazendo uma comparação: “Ninguém

espera que os/as professores/as das outras disciplinas na escola (história, geografia,

física, química, biologia, etc.), continuem transmitindo noções, conceitos, dados e

informações que o progresso científico tornou ultrapassados e inoperantes”

(BAGNO, 2002, p. 16), mas solicitam do/a professor/a de língua portuguesa uma

transmissão de conteúdos fixada há muitos anos atrás, mas que já não atendem as

demandas dos dias atuais.

A crítica aqui apresentada parte do pressuposto de que o ensino

tradicional ocupou-se, ao longo dos tempos, em reproduzir as práticas normativas da

língua portuguesa. Com isso, a escola, quer seja por falta de investimento na

qualidade do processo de ensino e aprendizagem, na formação continuada de

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professores, na elaboração de materiais pedagógicos que trabalhem o

desenvolvimento intelectual, psico-sócio-linguísticas de produção, leitura e

interpretação de textos orais e escritos. Ou seja, faz-se necessário ensinar e

socializar a cultura, os conhecimentos culturais, bem como a utilização de

instrumentos que promovam a reflexão e compreensão da realidade de cada

educando, tomando como ponto de partida a realidade imediata do aluno, com vistas

a dinamizar o processo de ensino-aprendizagem, saindo do local para o universal.

Conforme Mortatti (2004), a palavra letramento começou a ser utilizada

no Brasil nos anos 80, dentro das áreas de Educação e Linguística, e está ganhando

espaço em diferentes lugares sociais. A autora informa que este vocábulo surgiu em

momentos de discussão para ampliar o sentido da capacidade mínima de ler e

escrever em uma determinada língua. Mortatti (2004) fala de um novo modelo

denominado de ideológico, em que as atividades de leitura e escrita são

eminentemente sociais.

Para Soares (2009), uma pessoa letrada é aquela que tem condição

não apenas de ler e escrever, mas cultiva e exerce as práticas sociais se valendo de

ambas as habilidades. Segundo Soares (2009, p. 39), letramento é o “[...] resultado

da ação de ensinar e aprender as práticas sociais de leitura e de escrita, o estado ou

condição que adquire um grupo social ou um indivíduo como consequência de ter-se

apropriado da escrita e de suas práticas sociais”.

Segundo Tfouni (2006), a alfabetização trata da aquisição da escrita

enquanto aprendizagem de habilidades para leitura, escrita e as chamadas práticas

de linguagem. Isto ocorre por meio do processo de escolarização e, portanto, da

instrução formal. A alfabetização pertence, assim, ao âmbito do individual. Por outro

lado, para a autora, o letramento está direcionado para os aspectos sócio-históricos

da aquisição da escrita.

Mortatti (2004), por sua vez, afirma que aprender a ler e a escrever não

implica em letramento, uma vez que o alfabetizado não possui a dimensão social do

letramento.

A aquisição da leitura e da escrita, por si só, não garante maior nível de letramento, e, nem mesmo essa aquisição inicial esta sendo efetivada ou garantida a todos os brasileiros. Pode-se considerar, assim, que a alfabetização e a escolarização, bem como a disponibilidade de uma diversidade de material escrito e impresso, em nosso contexto atual, são condições necessárias, mas não suficientes, para o letramento, tanto do ponto de vista individual quanto social. (MORTATTI, 2004, p.108).

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É preciso saber falar, ler e escrever bem para depois construir uma

reflexão linguística sobre os usos da própria língua, de um modo consciente,

sistemático e técnico. Conforme Bagno (2002), isto deverá ocorrer quando os/as

discentes já tiverem obtido um nível de letramento que lhes permite teorizar e

investigar criticamente a utilização da língua.

A alfabetização e o letramento só serão compreendidos em práticas de

ensinar e aprender que ocorrerem em toda jornada vivencial escolar, que serão

entendidos em processos de reflexão antes, durante e depois das ações

pedagógicas, possibilitando, assim, a criação, recriação e divulgação de

conhecimentos que façam sentido à vida dos/as alunos/as, promovendo

intervenções eficientes na sociedade.

Nesse tipo de processo educativo, não se coloca como objetivo

fundamental a substituição de padrões que o/a aluno/a adquiriu, mas a ampliação

dos recursos que possui, de modo que tenha a seu dispor, para uso adequado, a

maior escala possível de potencialidades de sua língua, em todas as situações que

se fizerem necessárias.

Não existe dicotomia entre certo e errado no trabalho com a linguagem,

mas considerações sobre o adequado e não adequado a uma determinada situação

de fala. Assim, nas aulas de língua portuguesa o discente deverá ter sempre

presente o aspecto sócio-comunicativo da linguagem que implica questões do tipo:

quem é o/a interlocutor/a para quem produzo o discurso? Qual é a imagem que o/a

interlocutor/a tem de mim? Qual é a imagem que eu quero que o/a interlocutor/a

tenha de mim? Qual é o meu objetivo com o texto produzido?

O ensinar e o aprender irão se processar, principalmente, através de

aulas de produção de texto - leitura e escrita, considerando seus aspectos

pragmáticos, semântico-conceitual e formal. As gramáticas serão utilizadas, não

como estudo de metalinguagem, mas como ferramentas para melhorar o

entendimento do texto, refletindo sobre o momento que se coloca as regras

gramaticais, não precisando memorizar as normas fora de um contexto; em que a

técnica de memorização tenha significação.

A leitura é uma prática indispensável à vida social. É através dela que

entendemos o mundo e interagimos com o outro, seja nos estudos, na nossa

comunicação, na forma de nos expressarmos, nos conhecimentos que ela nos

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proporciona. A necessidade pela leitura e pelo domínio da linguagem escrita em

nossa sociedade é cada vez mais intensa.

A leitura é a base do processo de alfabetização e da formação da

cidadania. Nesta perspectiva, cada professor/a deve ter clareza de que educa e

ensina para o desenvolvimento das potencialidades do educando, tanto individual

como social. Para isto, é necessário que o/a professor/a apresente uma nova

postura, buscando o aperfeiçoamento e atualização dos conhecimentos aplicados à

leitura e, principalmente, fazendo reflexões sobre o significado do ato de ler. E o

conceito de letramento figura entre as apropriações requeridas.

É um aprender para obter uma educação com significados de

interlocução social competente, em que as regras são utilizadas para melhor envio e

recepção da mensagem. O ensino focado quase exclusivamente nas regras

normativas não fornece a possibilidade de uma produção que passa uma mensagem

coerente para determinado grupo social, pelo contrário, as regras são assimiladas

quando realmente trazem significação para o/a aluno/a em determinado texto e

contexto.

Hoje, a informação está em todos os lugares, de diversas formas e

meios de comunicação, e com uma linguagem variada, transmitindo, educando, por

vezes, desinformando, disponibilizando conhecimentos para o social, como também,

produz e divulga variações linguísticas e forças de poder.

Nesse contexto, o/a professor/a da língua portuguesa continua

transmitindo regras normativas que serviram de ferramentas textuais para uma

geração de anos atrás, mas não constrói um processo educacional com o objetivo

de inserção social atual. A historicidade humana deve fazer parte desta matéria

escolar, a sociedade muda, as formas de discursos são transformadas, como,

também, os saberes e os conhecimentos do mundo, dos humanos, das naturezas.

Saberes próprios dos estudantes, na rede de ciência e tecnologia disponível na

sociedade.

Os conhecimentos mudam, mas as regras normativas que servem

como elementos para uma busca de compreensão plena destes saberes, continuam

sendo praticamente uma doutrinação autoritária. Se considerarmos que os

conhecimentos formam uma estrutura imersa em um processo dinâmico de

transformações, por que os elementos que fazer parte dela e que têm como objetivo,

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indicar normas para uma melhor compreensão da mensagem, não mudam e não

consideram a variação linguística produzida pelo social?

Partindo dessa questão, consideramos que não podemos pensar a

leitura separada da escrita, o dizer sem o ouvir, o/a professor/a longe do/a aluno/a, a

alfabetização sem o letramento, o ensino sem a aprendizagem e, principalmente,

pensar o processo de ensino-aprendizagem da língua compartimentado, com início,

meio e fim.

Não compreendemos esses elementos separados, todos formam uma

unidade, uma vez que ler, escrever e interpretar são conceitos maiores que a

restrição da alfabetização. Sabemos que existem práticas educativas específicas

para a obtenção de determinados objetivos da aprendizagem, mas esta

especificidade não pode trazer um entendimento compartimentado. A aprendizagem

inicial da língua pela criança - que muitos pensadores chamam de alfabetização - e o

aprendizado competente e compreensivo dos usos da língua na escola e na

sociedade - muitos pensadores chamam de letramento - não podem estar

separados, todos fazem parte do processo de ensino-aprendizagem da língua

portuguesa, desde seu início até seu desenvolvimento contínuo e processual.

A criança ou a pessoa considerada analfabeta são sujeitos sociais.

Elas foram formadas institucional (família e/ou escola, etc.) e socialmente para

agirem conforme padrões e normas sociais e se formaram a partir de suas escolhas

pessoais, grupais, ocorridas em um local e tempo histórico. Cada uma delas precisa

de aprendizados específicos, entretanto, com um mesmo objetivo geral: a inserção

plena na sociedade.

Para que o sujeito atue com competência e compreensão na

sociedade, recebendo verdadeiramente oportunidades apropriadas para o seu

percurso vivencial, ele precisa adquirir e produzir significados, conhecimentos,

representações sociais, etc., sobre o mundo que o cerca. O que facilita a obtenção

dessas compreensões, revestidas de simbologias e significados, é a linguagem.

Desta forma, a escola pode ajudar nesta jornada, com a utilização de conhecimentos

mediadores para o melhor uso e compreensão da língua portuguesa, de modo a

consolidar a cidadania do educando.

Enfim, a escola deve promover um processo de alfabetização contínuo

e progressivo para trazer oportunidades compreensivas e existenciais para crianças,

jovens e adultos, ou melhor, fomentar o ensino e a aprendizagem da língua que

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contenha menos conhecimentos gramaticais, maior desempenho linguístico, oral e

escrito e, principalmente, compreensão sobre o mundo, seus objetos e a

complexidade que o constitui. Os aspectos educativos e formativos que se movem

no ambiente escolar, a partir do processo de alfabetização/letramento, como o

ensino da língua portuguesa, devem possibilitar a democratização do saber científico

a todas as crianças, colocando em suas mãos as ferramentas culturais necessárias

ao seu processo emancipatório.

2.3 A Teoria das Representações Sociais

Em artigo intitulado Os primórdios de uma disciplina – curso e

percurso, publicado no ano de 1997 junto ao livro nomeado de Psicologia Social,

organizado por Vala e Monteiro, Santos afirmou que a Psicologia Social teve origem

nos estudos do psicólogo McDougall. Este pesquisador discutia a questão instintiva

do ser humano em seu caráter biológico. Além dos estudos de McDougall, as

investigações realizadas por Ross contribuíram para o surgimento da Psicologia

Social, elas apontavam a dimensão institucional e social do ser humano. A diferença

de entendimentos favoreceu a compreensão de diversos fatores que cercam o ser

humano e a junção destes para caracterizar os sujeitos como integrantes ativos nas

sociedades.

Imersa nessas diferenciações, a dicotomia entre o indivíduo e a

sociedade ainda se faz presente em vários estudos. Todavia, conforme Santos

(1997, p. 15), as pesquisas apontam para uma atualidade suavemente ambígua, “O

homem é produto e produtor da sociedade e/ou da cultura [...]”, mas tudo isto não se

equivale propriamente, pois as contradições são inevitáveis. Como segunda

possibilidade que auxiliou a ampliação das preocupações com o aspecto social

dentro da Psicologia, Santos (1997) discorre sobre as forças investigativas voltadas

para a linguagem. Embasada nelas, surgiram preocupações com a descrição do ser

humano em processos de interações, o homem social e seus grupos, nos

denominados estudos etnográficos.

A terceira possibilidade de ampliação de estudos da Psicologia Social é

estruturada ao redor do conceito de representações advindo da Sociologia, com as

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contribuições do sociólogo Durkheim. Este apresentou que existem diferenças entre

as representações individuais e as coletivas. Estas não são o somatório daquelas,

por mais que possam existir analogias entre ambas, para Durkheim, os fenômenos

individuais eram de responsabilidade da Psicologia e os fenômenos sociais eram de

responsabilidade da Sociologia.

Partindo desses entendimentos, Moscovici utilizou as contribuições dos

estudos de Durkheim sobre representações individuais e coletivas para conceituar o

fenômeno das representações sociais; todavia, elaborou uma abordagem diferente.

Duveen, no texto da Introdução do livro de autoria de Moscovici (2003), chamado

Representações Sociais: investigação em Psicologia Social, discorre que o ponto

principal de distinção entre as representações coletivas de Durkheim e as

representações sociais de Moscovici é a estrutura conservadora e preservadora dos

saberes coletivos da primeira, que ajudam a integrar e conservar a sociedade, ao

contrário da estrutura dinâmica da segunda, que trata das novidades e mudanças

surgidas nas rotinas diárias das pessoas e se transformam em componentes da vida

social.

Há numerosas ciências que estudam a maneira como as pessoas tratam, distribuem e representam o conhecimento. Mas o estudo de como e por que, as pessoas partilham o conhecimento e desse modo constituem sua realidade comum, de como eles transformam ideias em prática – numa palavra, o poder das ideias – é o problema específico da psicologia social. (MOSCOVICI, 1990a, p. 164 apud MOSCOVICI, 2003, p. 8).

Em artigo que trata da Psicologia Social Européia, Jesuíno (1997)

apresenta que Moscovici trouxe três vertentes diferentes de estudos para a

Psicologia Social. O primeiro deles diz respeito ao entendimento do fenômeno risky-

shift, compreendido como sendo um processo das mudanças de riscos ou perigos.

Quando as pessoas estão em grupos, elas tomam a decisão sobre o risco de

maneira diferente quando estão sozinhas. O segundo estudo de Moscovici se refere

às observações investigativas sobre as minorias ativas, considerando que os grupos

minoritários podem influenciar socialmente os majoritários. Finalmente, a terceira

linha investiga o fenômeno das representações sociais. É considerado como sendo

um programa de investigação e um quadro de referência teórico denominado de

Teoria das Representações Sociais (TRS).

A biografia de Moscovici (2005) confirma que o motor de suas

pesquisas se inscreveu na história da sua vida, testemunha da opressão nazista

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durante a Segunda Guerra mundial. Vivendo em meio aos conflitos da época,

Moscovici se preocupou com algumas problemáticas: por que a fé remove

montanhas? Como é possível que os seres humanos se mobilizem a partir de algo

que, aparentemente, supera a razão? Como é possível que sejam conhecimentos

práticos a base para que eles vivam suas vidas? Enquanto teóricos discutiam e

afirmavam a dicotomia entre cultura e razão, Moscovici re-introduziu o conceito de

representação como uma definição possível para compreender os conhecimentos

construídos no meio social.

Nos últimos anos, toda uma série de enfoques foi desenvolvida no

campo da Psicologia Social para tentar esclarecer o fenômeno das representações

sociais, dinamizado em meio aos processos pelos quais os saberes são produzidos,

transformados e disseminados no mundo social. Dentro desta área científica,

Moscovici apresentou a importância de entender os fenômenos sociais inteligíveis

incluindo os conceitos psicológicos, bem como os sociológicos.

Dessa maneira, a TRS nos fornece conhecimentos advindos da

Psicologia Social que nos instrumentaliza de constructos assentados na Psicologia,

na Sociologia e na Antropologia para que possamos compreender a força e o

dinamismo de uma modalidade de saber gerado nas comunicações interpessoais e

intergrupais, com a finalidade prática de orientar os comportamentos nas situações

sociais, ligando sujeitos a objetos da realidade.

Conforme Moscovici (2003), as faculdades individuais de percepção e

observação das coisas externas ao ser humano são capazes de produzir

conhecimentos avaliados como verdadeiros. Por outro lado, a construção social dos

conhecimentos provoca distorções na apreensão da realidade. Logo, para Moscovici

(2003), a Psicologia Social deveria preocupar-se com o estudo referente ao campo

do saber denominado de senso comum, pois é um espaço rico de processos que

fomentam a construção de saberes sociais e que ainda se encontra desvalorizado

por muitos cientistas.

A primeira publicação de seus trabalhos, que inauguraram o campo de

estudos das representações sociais, foi elaborada sob a forma de tese apresentada

como pré-requisito para obtenção do titulo de doutor. A segunda delas foi uma

possível organização da primeira em formato de livro intitulado La psychanalyse: son

image et son public, publicado na França no ano de 1961 e no Brasil no ano de

1978, com o título A representação social da Psicanálise. Nessa investigação, o

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pesquisador se concentra na compreensão de como uma disciplina científica e

técnica como a Psicanálise passa do domínio dos especialistas para a esfera

comum.

Na França, no período de 1950 a 1960, todos os temas científicos eram

pesquisados junto aos seus especialistas correspondentes, ainda não se

consideravam legítimos os estudos que apreciavam o saber comum da população

geral sobre objetos elaborados dentro da área científica. Para tanto, Moscovici

(1978, p. 17) afirmava que as pesquisas da época ignoravam os “[...]

prolongamentos mais vastos de uma ciência, os quais representam uma de suas

funções essenciais, a saber, transformar a existência dos homens”.

Nos estudos moscovicianos, a continuação da construção dos

conhecimentos científicos é processada na aquisição de entendimentos da

sociedade mais ampla como consequência dos fatos e efeitos posteriores aos

conhecimentos elaborados. As compreensões acerca dos objetos do mundo não

ficam reduzidas aos espaços intelectuais e sistemáticos, mas são repercutidos no

social. Como por exemplo, os conceitos provindos da Psicanálise, complexo,

repressão, sonho, ato falho, etc., alcançaram uma difusão social e promoveram

novas formas de convívio. Logo, a difusão do saber sobre a Psicanálise

proporcionou a aquisição de conhecimentos advindos da ciência por parte da

população geral, muitas pessoas traziam consigo informações sobre doenças,

tratamentos de curas, tanto físicos, quanto psicológicos.

Através de pesquisa, Moscovici (1978) observou que as pessoas

alcançaram um nível digno de conhecimento de renomados especialistas sobre a

Psicanálise e que interferiram por este motivo, na repercussão e evolução desta

teoria e no desenvolvimento de sua técnica. Deste modo, ele compreendeu que a

apropriação de saberes pela população não especializada advindos da Psicanálise

alterou o senso comum. A partir deste trabalho, Moscovici (1978) explicou alguns

dos fenômenos sociais que ocorrem no convívio entre os sujeitos, através da TRS.

Mesmo classificando ou escolhendo individualmente as informações do mundo, as

relações são capazes de permitir que as pessoas tenham conhecimentos e opiniões

comuns em seu meio, para que ocorra a vida humana, pois ela só existe, no social.

Os estudos em representações sociais favorecem compreensões sobre

como os grupos constroem saberes comuns para lidar com determinados objetos da

realidade, possibilitando a familiarização de entendimentos sobre eles e a orientação

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das práticas. Segundo Jodelet (2001), para encontrar todos os componentes

contidos nas representações sociais, por exemplo, informações, atitudes, imagens e

valores e, assim, conhecer e entender este fenômeno social e o espaço de estudo

das representações sociais, se faz necessário responder as seguintes perguntas,

que estabelecem relações entre si:

1º “Quem sabe?” As respostas para esta pergunta apontam para o

sujeito alter que representa os objetos concretos e abstratos advindos das vivências

das pessoas. Ele pode ser um sujeito epistêmico na busca por conhecimentos sobre

a realidade; psicológico no sentido da singularidade e subjetividade de cada pessoa;

social mantido pelas relações de emergência para lidar com a prática e com os

grupos; e finalmente coletivo, na vertente histórica e ideológica que forma os

saberes sociais.

Cientes da importância das dimensões epistêmicas, psicológicas e

coletivas do sujeito alter, tivemos a preocupação de situar as professoras que

participaram da pesquisa como pessoas que fazem parte de determinados grupos,

religiosos, familiares, sindicatos, de trabalho, etc. São sujeitos que se inserem em

diversos locais, igrejas, casas residenciais, escolas, centros de convenções, etc.,

profissionais que apresentam características pessoais e profissionais que trazem a

marca de sua singularidade, como por exemplo, sexo, nível escolar de atuação

profissional, formação universitária, tempo de serviço na carreira docente.

Finalmente, recebem diversas influências históricas e sociais para a realização de

seus ofícios, podemos citar as normas promulgadas pela Lei de Diretrizes e Bases

da Educação Nacional, os valores sociais que a família e a sociedade carregam a

respeito de como o ensino e a aprendizagem da língua portuguesa deveria ocorrer

nas escolas, como também, os valores de importância da língua portuguesa para a

sociedade do conhecimento, entre outros.

2º “De onde sabe?” Questão que busca uma compreensão das

condições de produção e circulação das representações sociais que se movimentam

na sociedade, através da cultura (valores, modelos, invariantes), da linguagem e da

comunicação, nas formas interindividual, institucional e midiática. A sociedade vista

como espaço de partilha e de vínculo social, imersa por contextos ideológicos e

históricos, lugar em que os sujeitos constroem suas inscrições sociais (posição,

lugar, função social, pertença grupal) e, principalmente, organizam suas relações

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com os outros e com o mundo em atos interpessoais, institucionais, grupais e

intergrupais.

Compreendemos que as professoras de nossa pesquisa estabelecem,

essencialmente, relações entre si, como também, com os alunos, com as diretoras e

coordenadoras escolares, com as suas próprias famílias e aquelas dos alunos, com

a Secretaria Municipal de Educação, etc. Nestas interações, e por meio de outros

meios de comunicações, como, por exemplo, a televisão e a internet, elas adquirem

informações e outros elementos que contribuem para a formação de representações

sociais.

Essas duas primeiras questões vinculam-se a uma das três grandes

dimensões do campo das representações sociais; especificamente, elas tratam

daquela dimensão relacionada às condições socioculturais que favorecem a

emergência de representações sociais.

3º “O que sabe?” Esta indagação busca identificar o que as pessoas

sabem sobre os objetos, se valendo de suportes provenientes das comunicações,

das imagens midiáticas, das músicas, dos filmes, entre outros. Na nossa pesquisa,

consideramos como sendo o conteúdo das representações sociais.

4º “Como se sabe?” As respostas para esta pergunta permitem

entender os aspectos importantes dos processos representacionais que dão forma

ao objeto de estudo, apontam para a formação, o funcionamento e a transformação

dos estados e das representações sociais que são mecanismos lógicos de obtenção

de saberes, para que os sujeitos interpretem os objetos humanos e materiais.

Valendo-nos desta questão, buscamos identificar os processos de ancoragem e de

objetivação das representações sociais sobre o objeto da pesquisa.

Essas outras duas perguntas vinculam-se à segunda dimensão do

campo das representações sociais, que possibilita a descrição do conteúdo cognitivo

de determinadas representações sociais.

5º “Sobre o que se sabe e com que efeitos?” Vincula-se ao estatuto

epistemológico das representações sociais, compreendendo os valores de verdade

dos conhecimentos naturais e científicos e os valores de realidade dos saberes, que

estão submetidos a certas distorções, subtrações e suplementações. Transfere,

desta forma, um caráter prático para as representações sociais, orientando, assim,

as ações e as relações com o mundo, revelando, dessa maneira, as experiências, as

ações e as comunicações dos grupos, apontando para as funções e para a eficácia

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prática das representações sociais. Sendo esta a terceira dimensão do campo das

representações sociais, que discute a natureza epistêmica em confronto com o

saber erudito.

Como nosso objetivo de pesquisa não contempla essa dimensão, nós

intencionamos responder a quinta pergunta formulada por Jodelet (2001), nos

valendo apenas da construção de possíveis hipóteses. Fizemos a aparente

descrição de possíveis hipóteses da função orientadora das representações sociais

nas práticas educativas para que pudéssemos apontar para a realização de novos

esforços investigativos que trazem comparações entre as representações sociais

identificadas acerca de determinado objeto e as práticas realizadas pelo grupo.

Todas as respostas referentes às perguntas de Jodelet (2001) situam o

sujeito em um contexto ideológico e histórico, conferindo-lhe uma inscrição social

que determina sua posição, função, pertença e seu lugar em um grupo. Jodelet

(2001, p. 20) ensina que as representações sociais se “[...] inscrevem nos quadros

de pensamentos já existentes [...]”, formando uma rede de conhecimentos que irão

interferir em atitudes e julgamentos dos sujeitos sobre os objetos naturais e sociais,

determinando e organizando uma realidade comum a um conjunto social.

Os estudos de representações sociais, valendo-se dos constructos

vinculados ao campo moscoviciano, vem se tornando um trabalho frequente dentro

das ciências humanas, porque este domínio de pesquisa está dotado de

instrumentos conceituais e metodológicos que contribuem para conhecer este

fenômeno que se processa na rotina diária das pessoas. Entretanto, nas pesquisas

científicas, a demarcação da escolha da instrumentalização por meio dos conceitos

e dos métodos advindos da TRS é necessária, pois este campo investigativo é

mapeado como um espaço multidimensional de estudo, assim, recebe uma

multiplicidade de territórios autônomos de pesquisa, em função dos aspectos

específicos problematizados sobre os fenômenos em observação. Aspecto este

apresentado anteriormente em formato de questões investigativas formuladas por

Jodelet (2001), que caracterizam os espaços de estudo das representações sociais.

Em relação a esse vasto campo de estudo e por comportar

proposições que possibilitam o desdobramento de correntes teóricas

complementares, a TRS é tratada como sendo uma grande teoria (DOISE, 1993).

Essas correntes de pensamento provêm da TRS e se configuram enquanto teorias

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complementares; não se tratam, portanto, de abordagens incompatíveis, mesmo

carregando diferenças entre si.

Conforme Sá (1998) e Jodelet (2011), na Europa, existem quatro

principais escolas de pensamento que abrangem os fenômenos representacionais,

são elas: 1º Escola de Paris, liderada por Jodelet, apresenta uma perspectiva mais

simbólica e antropológica, configura-se como uma abordagem processual clássica

que se aproxima das ideias da grande teoria moscoviciana; 2º Escola de Genebra,

liderada por Doise, estuda a gênese sociocognitiva das representações sociais,

considerando os níveis individuais, intergrupais, sociais e ideológicos para investigar

os processos psicossociais; 3º Escola Anglo-saxã, liderada por Wagner na Áustria,

situada dentro das críticas pós-modernistas, para a análise do discurso, da

dialogicidade e da narratividade em termos contextuais; 4° Escola de Aix-en-

Provence, dirigida sucessivamente por Flament, Abric e Joule e outros, desenvolvida

por uma abordagem cognitivo-estrutural.

Conforme Jodelet (2011), o que se passa no campo de estudo

brasileiro das representações sociais é a noção de movimento, não de escola. Para

a autora, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) trabalha com a

perspectiva processual, a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) aparece

como a sede da escola estruturalista, a Universidade de Brasília (UNB) como a sede

da escola de Genebra, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) se

insere na perspectiva centrada na comunicação nos espaços públicos e

comunitários, entre outros. Para a autora, os estudos brasileiros utilizam a TRS

como ferramenta para compreender os problemas e as características da realidade

social e, nela, fomentar uma forma de intervenção. Algo que difere dos trabalhos

europeus.

Em relação a grande teoria, a moscoviciana, buscamos três

balizamentos: 1º o conceito de representações sociais; 2º o princípio de transformar

o não-familiar em familiar, pelo qual podemos explicar a formação de representações

sociais; 3º os processos formadores das representações sociais, ancoragem e

objetivação. Para a apresentação desses direcionamentos, nos valemos de duas

obras de Moscovici publicadas no Brasil, uma no ano de 1978 e outra no ano de

2003. Além destas referências utilizamos obras de outros pesquisadores nacionais e

internacionais que contribuíram com estes estudos. Este delineamento permitiu

conhecer e compreender a possível imagem do processo de ensino aprendizagem

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da língua portuguesa construída pelas professoras, como também, nos

instrumentalizou de conceitos que ajudaram a localizar prováveis fontes que

fomentaram tal construção imagética.

A respeito das escolas que ampliaram o pensamento moscoviciano,

escolhemos os recursos teórico-metodológicos disponíveis para apropriar de uma

entre as abordagens referidas anteriormente em função do objetivo da investigação.

Identificamos que a abordagem estruturalista, desenvolvida na Escola de Aix-en-

Provence, intitulada Teoria do Núcleo Central, nos auxiliaria na identificação dos

conteúdos cognitivos que estruturam as representações sociais e, também,

exploramos o potencial comparativo desta teoria, a partir do princípio de considerar

que existem representações sociais diferentes, se os seus núcleos centrais forem

significativamente diferentes. Isto permitiu a comparação de uma variável que

consideramos de grande influência para a formação de representações sociais

diferentes, sendo ela os ciclos ou blocos de ensino em que as professoras atuam.

Valemo-nos das obras publicadas pelo fundador da Teoria do Núcleo

Central, Abric, publicadas no Brasil nos anos de 1998 e 2003; das produções de Sá

publicadas nos anos de 1998 e 2002, pesquisador que se insere no Movimento da

UERJ, sendo ele o principal pesquisador brasileiro que contribui com o

desenvolvimento da teoria formulada por Abric. Obras estas que apresentam os

princípios basilares da teoria. Além delas, utilizamos um trabalho da autora Menin,

publicado no ano de 2007, que trata do aspecto normativo das representações

sociais. Portanto, entre muitas dimensões que compõem o campo de estudo das

representações sociais, delimitamos alguns aspectos do fenômeno representacional

que contribuíram para compreender o objeto de pesquisa. Nos próximos itens,

mostramos a descrição destas demarcações teórico-metodológicas.

2.3.1 O conceito do fenômeno representacional

Os sujeitos buscam agir no mundo, atribuindo sentidos e significados

aos seres que os cercam, para que possam saber lidar em determinados espaços e

contextos. São modos interligados de pensar, sentir, representar, agir, conviver, etc.,

que estruturam o dinamismo do existir das pessoas e fomentam a construção de

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conhecimentos socialmente partilhados. Em todos os lugares, onde habitam sujeitos,

saberes são criados, transmitidos, transformados e, muitos deles, recebem outros

elementos que favorecem a formação de representações sociais sobre seres da

realidade.

É com base na capacidade de representar a realidade, de fazê-la de novo mentalmente presente, que as diferentes formas do conhecimento verdadeiramente humano são construídas: o senso comum, a consciência filosófica, o conhecimento científico como também a representação social. É com base na capacidade de representação que os homens tornaram possível a armazenagem do conhecimento e sua transmissão, tanto para outros homens no presente, como para as gerações futuras [...]. (LOUREIRO, 2003, p. 110).

Perante esse dinamismo, as representações sociais são definidas

como maneiras de compreender e comunicar sobre as coisas do mundo, são ideias

que influenciam pensamentos, mas não apenas pelo ato da reprodução. São

consideradas como fenômeno que favorece a nomeação e a definição de diversas

coisas e seres existentes no mundo; como também, contribuem para que as

pessoas possam interpretar aspectos de sua vivência, possibilitando a tomada de

decisões.

Para Moscovici (1978, p. 26), “[...] a representação social é uma

modalidade de comportamento particular que tem por função a elaboração de

comportamentos e a comunicação entre indivíduos”. Este fenômeno permite que um

mesmo conjunto de pessoas se comunique e se identifique como grupo de pertença,

emitindo juízos, opiniões e explicações assemelhados sobre temas diversos.

Conforme esse pesquisador, a representação social é:

[...] um corpus organizado de conhecimentos e uma das atividades psíquicas graças às quais os homens tornam inteligível a realidade física e social, inserem-se num grupo ou numa ligação cotidiana de trocas, e liberam os poderes de sua imaginação. (MOSCOVICI, 1978, p. 28).

As pessoas constroem, divulgam, transformam e recorrem às

representações sociais dos seres que as cercam, dentro dos grupos em que estão

inseridas, levando a uma possível partilha de opiniões e práticas, em muitos casos,

sendo seguidas pela maioria. Dessa maneira, as representações sociais se

apresentam como uma “[...] rede de ideias, metáforas e imagens, mais ou menos

interligadas livremente e, por isso, mais móveis e fluidas que teorias”. (MOSCOVICI,

2003, p.210).

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Para Jodelet (2001), existem cinco motivos para que as pessoas criem

representações sociais: 1º informação sobre o mundo à sua volta; 2º ajustamento à

realidade; 3º saber como se comportar; 4º dominar o mundo física e

intelectualmente; e 5º identificar e resolver problemas existenciais. Para esta

pesquisadora, as representações sociais podem ser observadas na circulação das

conversações, são trazidas pelas palavras e veiculadas em mensagens e imagens

midiáticas, cristalizadas em condutas e em organizações materiais e espaciais.

Assim, são consideradas como fenômenos complexos sempre ativados e em ação

na vida real.

A complexidade das representações sociais é reforçada diante da sua

própria constituição, sendo composta por diversos elementos, como, por exemplo,

informativos, cognitivos, ideológicos, normativos, crenças, valores, atitudes, opiniões

e imagens que são organizados sob a aparência de um saber que diz algo sobre o

estado de determinada realidade de um objeto. Deste modo, as representações

sociais são sistemas de interpretação que regem a relação das pessoas com o

mundo e com os outros, em que orientam e organizam as condutas e as

comunicações sociais.

[...] representações sociais são sempre complexas e necessariamente inscritas dentro de um referencial de um pensamento preexistente, sempre dependentes, por conseguinte, de sistemas de crença ancorados em valores, tradições e imagens do mundo e da existência. (MOSCOVICI, 2003, p. 216).

Diante da complexidade do fenômeno e da resistência histórica de

Moscovici em proporcionar uma definição precisa do conceito de representação

social, por receio de que isto poderia acabar resultando na redução do seu alcance

conceitual, nas palavras do teorizador: “É difícil apreender seu conceito, pois está

entre uma série de conceitos sociológicos e de psicológicos”. (MOSCOVICI, 1978, p.

41).

Jodelet (2001) conferiu uma feição mais objetiva nas explicações das

várias proposições básicas que cercam o fenômeno. Assim, ela elaborou a seguinte

sistematização da caracterização da representação social:

[...] é uma forma de conhecimento, socialmente elaborada e partilhada, com um objetivo prático, e que contribui para a construção de uma realidade comum a um conjunto social. Igualmente designada como saber de senso comum ou ainda saber ingênuo, natural, esta forma de conhecimento é diferenciada, entre outras, do conhecimento científico. Entretanto, é tida

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como um objeto de estudo tão legítimo quanto este; devido à sua importância na vida social e à elucidação possibilitadora dos processos cognitivos e das interações sociais. (JODELET, 2001, p. 22).

Portanto, para Jodelet (2001), as representações sociais são, ao

mesmo tempo, produto e processo, pois tratam de uma atividade de apropriação da

realidade exterior ao pensamento e de elaboração psicológica e social dessa

realidade, trazendo a marca do sujeito e de sua atividade, em que todas as funções

mentais são também socializadas.

Para Sheva (2001, p. 75), “[...] as representações agem enquanto guia

das condutas que modelam as formas e entrelaçam as redes das relações sociais,

sendo que estas últimas formam, por sua vez, e estruturam as representações”.

Desta maneira, as representações sociais são fenômenos complexos e dinâmicos,

em que vários sujeitos sociais, com pensamentos e espaços de pertença diversos,

interferem na elaboração das representações sociais, sendo um processo imerso

nas atividades sociais de diversos grupos, que buscam lidar com a vivência diária e

fomentam constantemente criações e modificações em seus processos formativos.

Finalmente, as representações sociais são fenômenos que formam um saber social

e prático de determinado objeto, explicados por uma teoria psicológica e social do

conhecimento.

2.3.2 O princípio de tornar o não-familiar em familiar e os processos

formadores das representações sociais

As circulações de saberes, que se consolidam em termos comuns, são

denominadas por Moscovici (2003) de universos consensuais, em que os indivíduos

não precisam ser peritos para falar sobre seres do mundo. As pessoas são livres

para revelar seus pontos de vista, sobre qualquer conteúdo, expressando suas

opiniões. Compreender o universo consensual é entendê-lo como saberes que são

estabelecidos por pessoas que não são especialistas, dando conta das questões

cotidianas. Em lado oposto, estão os universos reificados, sendo aqueles que

contêm membros especializados em determinadas áreas do saber. Cada indivíduo

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pode apresentar competências de acordo com os conhecimentos científicos

adquiridos, como por exemplo, os psicólogos, os arquitetos e os pedagogos.

No universo consensual, as pessoas também podem conceber

diferentes especializações, mas são iguais para dialogar. Enquanto no reificado, a

hierarquia de papéis é predominante e apenas os especialistas sabem a linguagem

técnica das ciências, só eles têm capacidades para comunicar e atuar em

determinado campo. A oposição de características destes dois mundos leva a

sociedade, conforme Moscovici (2003), a construir representações sociais para

explicar os fenômenos, de modo que se tornem acessíveis as descobertas já

realizadas, facilitando a existência coletiva. As representações sociais são criadas

na esfera consensual, embora os dois universos não sejam totalmente

independentes entre si, porque estão em permanente processo de construção.

Os sujeitos representam os objetos da realidade imersos em processos

de alteridade, nos relacionamentos com o trato das diferenças entre pessoas e

grupos e com o estranhamento das coisas novas que surgem. Assim, a alteridade

pode ser explicada em duas vertentes: a primeira compreende o lado do outro em

termos de lugar, como por exemplo, países e povos; a segunda indica a dimensão

interior dos grupos e pessoas que demarcam as divisões sociais. (JODELET, 2005).

Essas interações fomentam inúmeras conversações, possibilitando a

construção de representações sociais; neste dinamismo, são consideradas como um

ambiente real e concreto. São ideias, mas são ao mesmo tempo realidades, pois são

envolvidas pela tradição e pela cultura que caracterizam objetos e seres do mundo.

(MOSCOVICI, 2003).

Para Moscovici (2003), as representações sociais têm como finalidade

tornar familiar algo não-familiar, sendo a principal função das representações

partilhadas. “Sustento, pois, que as representações sociais têm como finalidade

primeira e fundamental tornar a comunicação, dentro de um grupo, relativamente

não-problemática e reduzir o “vago” através de certo grau de consenso entre seus

membros”. (MOSCOVICI, 2003, p. 208, grifo do autor). Logo, para conferir uma

feição familiar à realidade, é necessário o funcionamento de dois mecanismos de

pensamento, baseados na memória e em referências passadas, denominados de

ancoragem e objetivação, sendo considerados pelo pesquisador como os processos

que formam as representações sociais.

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Para compreender certos conteúdos desconhecidos, os sujeitos

comparam suas dúvidas com saberes já adquiridos por eles, ancorando-os em

conhecimentos já assimilados. Seria o mesmo que dizer metaforicamente que o ser

humano, navegando em um mar de ideias, só ancora seu barco em um porto

conhecido. Transferir o desconhecido para o conhecido é ancorar, classificar e

categorizar o desconhecido, comparando-o com modelos e padrões já estabelecidos

e interiorizados pelos indivíduos. Desta forma, o processo de ancoragem é uma

tentativa de enfrentar os estranhamentos das coisas do mundo.

Moscovici (2003, p. 61), define que “[...] ancorar é, pois, classificar e

dar nome a alguma coisa. Coisas que não são classificadas e que não possuem

nome são estranhas, não existentes e ao mesmo tempo ameaçadoras”. Este

processo ameniza a confusão, a incerteza, a dificuldade de inteligibilidade do

desconhecido e o medo do novo, que as pessoas têm, quando se deparam com

conteúdos não familiares. Isto ocorre porque os indivíduos sentem necessidades de

reconhecer objetos e saberes que os cercam, ou aquilo que possa ser significativo

para suas vidas.

Segundo Moscovici (2003), a representação é um sistema de

classificação e de denotação em que a neutralidade é proibida pela lógica mesma do

sistema. As pessoas selecionam aquelas características que são mais

representativas de um protótipo de referência para entender os seres, fenômenos e

ideias que as cercam. Seguindo esse norte, Moscovici afirma que a TRS exclui a

ideia de pensamento ou percepção que não possua ancoragem, como, igualmente,

afirma que a ancoragem facilita a interpretação das características de uma dada

realidade. Em outras palavras, classificar e dar nomes facilita a compreensão da

vida humana.

Outro processo que contribui para a formação das representações

sociais é denominado de objetivação, que leva as ideias para a prática, para o

concreto da vida social. Nas palavras de Moscovici (2003, p. 71): “[...] objetivação

une a ideia de não-familiaridade com a de realidade, torna-se verdadeira essência

da realidade”. O abstrato se torna concreto nesse processo, porque uma abstração

busca expressar primeiramente uma imagem possível e depois, o conceito como

real. Deste modo, as imagens se tornam elementos da realidade, ao invés de

elementos do pensamento.

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A cultura – mas não a ciência – nos incita, hoje, a construir realidades a partir de idéias geralmente significantes. Existem razões óbvias para isso, dentre as quais a mais óbvia, do ponto de vista da sociedade, é apropriar-se e transformar em característica comum o que originalmente pertencia a um campo ou esfera específica. Os filósofos gastaram muito tempo tentando compreender o processo de transferência de uma esfera a outra. Sem representações, sem a metamorfose das palavras em objetos, é absolutamente impossível existir alguma transferência. (MOSCOVICI, 2003, p. 75).

Escrever sobre os processos que geram as representações sociais é

caracterizar a ancoragem como direcionadora de informações para o interior dos

sujeitos e a objetivação sendo o inverso.

Ancoragem e objetivação são, pois, maneiras de lidar com a memória. A primeira mantém a memória em movimento e a memória é dirigida para dentro, está sempre colocando e tirando objetos, pessoas e acontecimentos, que ela classifica de acordo com um tipo e os rotula com um nome. A segunda, sendo mais ou menos direcionada para fora (para outros), tira daí conceitos e imagens para juntá-los e reproduzi-los no mundo exterior, para fazer as coisas conhecidas a partir do que já é conhecido. (MOSCOVICI, 2003, p. 78).

Diante dessas explicações, podemos dizer que as representações são

sociais, pois também são simbólicas. São sempre de alguma coisa ou de alguém e

que apresenta conteúdo específico. São históricas na sua essência e influenciam o

desenvolvimento do sujeito desde a primeira infância. Portanto, o fenômeno

representacional é processado no dinamismo de relações entre pessoas e/ou grupos

que buscam dar conta de uma realidade que se apresenta no instante que se insere

nela, se valendo de referências anteriores advindas de diversos elementos incluídos

no processo representacional que se aproximam entre si, como por exemplo,

podemos mencionar as informações, as atitudes, as imagens, os valores, as normas

sociais e a memória, produzindo neste movimento de aglomerações de elementos,

uma forma de saber comum sobre objetos da realidade.

Moscovici (1978, 2003) teorizou acerca de um complexo fenômeno

social que resultou na construção de diversas outras proposições que não foram

apresentadas neste relatório por não se constituírem parte do objetivo geral da

pesquisa. No ano de 2012, completaram 51 anos de estudos e pesquisas no campo

de representações sociais, tempo este que permitiu o acolhimento de teorias

complementares que buscaram responder problemáticas advindas de constructos da

grande teoria.

Uma dessas contribuições é denominada de Teoria do Núcleo Central,

que se insere dentro dos estudos da Escola de Aix-en-Provence. A partir de seus

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116

princípios podemos compreender as organizações dos elementos que são eleitos

para participarem dos processos representacionais, identificando assim, a estrutura

cognitiva das representações sociais. Conforme Sá (2002), a Teoria do Núcleo

Central é considerada complementar à Teoria das Representações Sociais por

trazer para o campo de estudos derivações de suas características nas quais a

sistematização da prática experimental se fez presente no início de sua formulação ,

algo diferente das configurações habituais, trazendo com elas uma objetividade para

as proposições da grande teoria. A seguir apresentaremos alguns de suas

proposições.

2.3.3 A Teoria do Núcleo Central das representações sociais

A Teoria do Núcleo Central foi proposta por Abric no ano de 1976,

mediante tese de doutoramento defendida na Université de Provence, intitulada:

Jeux, conflits et représentations sociales. Esta teoria apresenta as funções

geradoras e organizadoras que estruturam as representações sociais, mediante

vínculos de elementos hierarquizados entre si que formam um componente central

nas representações sociais. Este núcleo central estrutura como é representado

determinado objeto da realidade, definindo os possíveis comportamentos futuros dos

sujeitos e está vinculado a sistemas periféricos que complementam a formação da

representação social.

Utilizando como referência os conhecimentos de Heider (1927) sobre

os estudos de atribuição de uma ideia de centralidade aos elementos envolvidos em

processos de percepção social; servindo do trabalho pioneiro de Asch (1926) a

respeito da percepção social, pesquisas estas inseridas na área da Psicologia

Social, Abric trouxe novas contribuições para o desenvolvimento da TRS, a partir do

entendimento da centralidade nos elementos representacionais.

Além dessas fontes, Abric buscou norteamentos na própria teoria

moscoviciana referente à noção de núcleo figurativo, cuja formação é resultante do

processo de objetivação das representações sociais. Abric considera o caráter

figurativo do núcleo das representações sociais apresentados por Moscovici.

Entretanto, se afasta deste princípio de elaboração de imagens e atribui aos

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117

elementos que compõem a estrutura das representações sociais uma natureza

puramente cognitiva, tanto sob formas descritivas, quanto valorativas. (SÁ, 2002).

Conforme Abric (2003), as representações sociais apresentam duas

características de aparências contraditórias: 1ª são ao mesmo tempo estáveis e

móveis, rígidas e flexíveis; 2ª são consensuais e também estão marcadas por

diferenças interindividuais. Abric (2003) propôs que estas características

contraditórias são complementares entre si e constituem a própria estruturação das

representações sociais e de seu modo de funcionamento. Deste modo, as

representações sociais são regidas por um sistema interno duplo, em que cada parte

tem um papel específico e complementar entre si.

Quando as representações sociais estão no mundo consensual,

definindo a homogeneidade do grupo, elas estão localizadas no sistema central,

denominado de núcleo central. Neste sistema, as representações são mais estáveis,

rígidas, resistentes à mudança e pouco sensíveis ao contexto imediato. Agora,

quando permitem a integração das experiências e histórias individuais, elas se

localizam no sistema periférico, suportando a heterogeneidade do grupo, sendo

flexíveis, evolutivas e sensíveis ao contexto imediato.

Abric procurou dar conta dessas aparentes contradições das

características das representações sociais propondo a Teoria do Núcleo Central.

Nela, segundo Sá (2002), uma determinada representação social sobre algum objeto

da realidade é uma entidade unitária regida por um sistema interno duplo, o sistema

central e o sistema periférico, em que cada um deles apresenta um papel específico,

mas complementar ao outro. Deste modo, segundo Abric (1998), para definir uma

representação social é preciso identificar os elementos centrais que a constituem,

fornecem sua significação e estabelecem as relações que unem entre si elementos

do conteúdo da representação e, assim, regem sua evolução e transformação.

Reproduzimos o quadro construído por Abric (1998), que mostra de

forma objetiva as características do sistema central e do sistema periférico de uma

representação social:

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118

SISTEMA CENTRAL SISTEMA PERIFÉRICO

Ligado à memória coletiva e à história do grupo

Permite a integração de experiências e histórias individuais

Consensual

define a homogeneidade de grupo Tolera a heterogeneidade do grupo

Estável

Coerente

Rígido

Flexível

Tolera as contradições

Resiste às mudanças Evolutivo

Pouco sensível ao contexto imediato Sensível ao contexto imediato

Funções:

gera o significado da representação

determina sua organização

Funções:

permite a adaptação à realidade concreta

permite a diferença de conteúdo

Quadro 2 - Características do sistema central e do sistema periférico de uma representação

Fonte: Abric (1998, p. 34).

Para esse pesquisador, o sistema central está ligado aos valores, às

normas sociais, à memória coletiva, à história do grupo, à natureza do envolvimento

do grupo na situação social, sendo os elementos essenciais que formam este

sistema. Ele nos alerta que:

Partilhar uma representação com outros indivíduos significa, então, partilhar com eles os valores centrais associados ao objeto concernido. Não é o fato de partilhar o mesmo conteúdo que define a homogeneidade do grupo em relação a um objeto de representação: é o fato de se referir aos mesmos valores centrais presentes no núcleo. (ABRIC, 2003, p. 40, grifo do autor).

O conjunto de elementos centrais delimita o espaço em torno do qual

se estabelecem as representações sociais. Portanto, Abric (2003) propõe que o

sistema central seja entendido como a manifestação do pensamento social que fixa

a homogeneidade de um grupo e promove estabilidade e coerência à representação,

assim, oportuniza a sua própria definição. Desta maneira, procurar os elementos

centrais de uma representação social é buscar a raiz, o fundamento social da

representação.

Segundo Abric (2003), a ativação de um elemento do núcleo central é

determinada pela finalidade da situação, e pela distância para com o objeto e o

contexto.

Abric (2003) atribui as seguintes funções para esse sistema:

O núcleo central é constituído de um ou alguns elementos sempre em quantidade limitada. Ele assegura três funções essenciais, que significa dizer que ele determina: - o significado da representação (função

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119

generadora); - a organização interna (função organizadora); - a estabilidade (função estabilizadora). (ABRIC, 2003, p. 38).

Mesmo considerando a importância de outros conjuntos de elementos

que dão forma às representações sociais, Abric (2003) considera que a parte

principal da estrutura de uma representação é o núcleo central, pois ela fornece a

geração, a organização e a estabilidade das representações sociais. Desta maneira,

compreendendo os aspectos fundamentais dos elementos que compõem as

representações sociais e da especificidade de contribuições de cada um, vários

trabalhos experimentais colocaram em evidência dois tipos de elementos que fazem

parte do núcleo central, são eles: normativos e funcionais:

Os elementos normativos são diretamente originados do sistema de valores dos indivíduos. Eles constituem a dimensão fundamentalmente social do núcleo – e da representação, pois – ligada à história e à ideologia do grupo. São eles que determinam os julgamentos e as tomadas de posição relativas ao objeto. Os elementos funcionais são associados às características descritivas e à inscrição do objeto nas práticas sociais ou operatórias. São eles que determinam as condutas relativas ao objeto. (ABRIC, 2003, p. 41, grifo do autor).

Segundo Menin (2007), após as definições Abric, com o auxílio de

Tafani, no ano de 1995, referem-se a três elementos. Apresentam que os normativos

“[...] constituem o ponto de referência a partir do qual o objeto é socialmente

avaliado”. (ABRIC; TAFANI, 1995, p. 23 apud MENIN, 2007, p. 125).

Retornando as discussões em relação aos elementos funcionais dizem

que eles estão:

Ligados à inscrição do objeto em práticas sociais ou operatórias. Esses elementos determinam e organizam as condutas relativas aos objetos e definem as práticas que são legítimas de serem desempenhadas quando indivíduos ou grupos são confrontados com o objeto da representação. (ABRIC; TAFANI, 1995, p. 23 apud MENIN, 2007, p. 125).

A ampliação dos elementos ocorreu com a apresentação de um

terceiro conjunto de elementos, denominados mistos. Para Abric e Tafani (1995)

apud Menin (2007), estes elementos apresentam tanto a dimensão normativa,

quanto a funcional e, por isto, eles podem intervir na produção de julgamentos de

valores como na orientação das práticas. Além desses elementos, há também no

núcleo central aqueles que estão relacionados com o grau de importância para o

grupo de sujeitos, sendo eles os principais e os adjuntos. Os primeiros são decisivos

e indispensáveis para as representações, porque eles são absolutos, portanto, são

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pouco submetidos a negociações. Os demais são hierarquicamente secundários em

relação aos primeiros, entretanto, todos são indispensáveis.

Abric e Tafani (1995) desenvolveram uma proposição teórico-

metodológica para conhecer o quanto um elemento contribui para o comportamento

das pessoas em relação ao objeto da representação, denominado de índice de

normatividade. Nesta pesquisa, pediram para que os sujeitos contatados

apontassem a importância dos elementos evocados por eles para aquele objeto da

representação. Os pesquisadores concluíram que:

[...] os elementos do núcleo central não são equivalentes e são organizados de maneira hierárquica, além disso, o contexto social influi na ativação dos elementos de maneira diferenciada: a função do grupo social, as relações que ele mantém com o objeto e a situação que os sujeitos se encontram, podendo provocar ativação de elementos funcionais ou normativos. (MENIN, 2007, p. 126).

Nesta presente pesquisa, nos valemos dessa referência teórico-

metodológica para conhecer a importância dos elementos evocados sobre o objeto

da representação para o grupo de professoras contatadas. Todavia, não utilizamos o

índice de normatividade, mas a ideia de hierarquização de elementos. Solicitamos às

participantes para que nos apontassem a hierarquização por ordem de importância

das cinco palavras que vieram à mente e foram anteriormente evocadas sobre o

ensino e a aprendizagem da língua portuguesa. Procedimento que permitiu

identificar a efetiva saliência dos elementos centrais, como também o caráter

normativo e funcional de todos os elementos que estruturam o objeto de

representação. O detalhamento desta escolha procedimental foi discutido no

capítulo que apresenta a metodologia da nossa pesquisa.

Como complemento indispensável para esse conjunto de elementos

centrais, Abric (2003) propõe a existência de outro sistema que promove a ligação

entre o sistema central e a realidade concreta, denominado de sistema periférico. O

sistema central é, essencialmente, normativo, de outra forma, o sistema periférico é,

principalmente, funcional. Apresentam tais características, mesmo carregando em

seus sistemas estes dois tipos de elementos. (ABRIC, 1994b, apud SÁ, 2002).

Assim, tem a função de fixar a representação na realidade, a partir da concretização

dos elementos centrais em termos de tomadas de posição e de condutas, pois as

posições ocupadas pelas pessoas em relação aos objetos das representações

sociais colaboram no quanto os elementos normativos e funcionais são ativados.

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Neste jogo de relações, o sistema periférico está mais ligado às

características individuais e à realidade imediata, dentro da qual o sujeito está

imerso. Logo, os elementos periféricos contribuem para a concretização, regulação,

prescrição e preservação dos comportamentos, individualizam as representações,

enquanto protegem o núcleo central.

De acordo com Abric (1998, p. 33), o sistema periférico “[...] permite

uma adaptação, uma diferenciação em função do vivido, uma integração das

experiências cotidianas”. O sistema periférico tem maior flexibilidade que o sistema

central e permite a integração e diferenciação de conteúdos para permitir

adaptações à realidade. Como afirma o teórico, o sistema periférico também é

fundamental na estrutura representacional, pois é ele, junto com o sistema central,

que possibilita a imersão dos sujeitos e suas representações sociais na realidade.

Desse modo, segundo Abric (1998), circunvizinho aos elementos

centrais de uma representação social estão organizados os elementos periféricos.

Estes são os componentes com mais acessibilidade, vida e concretude. Estes

elementos são responsáveis por três funções básicas: concretização, regulação e

defesa.

A função de concretização diz respeito à interface entre o sistema

central e a conjuntura na qual a representação é laborada ou colocada em

funcionamento na realidade concreta. A função de regulação fomenta o aspecto

móvel e evolutivo da representação, conforme as transformações advindas do

contexto e das relações entre os grupos. Ao contrário, a função de defesa faz com

que o sistema periférico atue em defesa da representação, cuidando de possíveis

movimentos de mudança que possam vir a atingir o núcleo central e alterar o que é

basilar da representação.

A transformação de uma representação se opera, na maior parte dos casos, através da transformação de seus elementos periféricos: mudança de ponderação, interpretações novas, deformações funcionais defensivas, integração condicional de elementos contraditórios. É no sistema periférico que poderão aparecer e ser toleradas contradições. (ABRIC, 1998, p. 32).

Uma das grandes contribuições da Teoria do Núcleo Central é a

possibilidade teórico-metodológica de identificar nos estudos comparativos

diferenças de representações sociais em grupos distintos sobre o mesmo objeto.

Suas proposições apresentam que dois estados sucessivos de uma mesma

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representação devem ser considerados distintos se, e apenas se, seus respectivos

núcleos centrais tiverem composições claramente diferentes.

Finalmente, essa teoria auxiliou nossos estudos de forma importante

para que pudéssemos conhecer a centralidade de elementos na estrutura das

representações sociais de professoras sobre o processo de ensino-aprendizagem da

língua portuguesa, especialmente, compreendendo as relações entre os diversos

elementos.

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123

CAPÍTULO III MATERIAIS COLETADOS: COMPREENSÕES POSSÍVEIS

No primeiro capítulo deste trabalho já dizíamos que o/a pesquisador/a

se faz participante dentro da investigação que se propõe a desenvolver tanto quanto

aquelas pessoas que foram entrevistadas, pois ele/a também está inserido/a no

processo interlocutivo de produção de significados acerca de determinados objetos

sociais.

Por via deste entendimento, neste capítulo construímos uma possível

apresentação e compreensão de partes do material recolhido em meio a vários

diálogos realizados junto às professoras que trabalham nas escolas públicas e

urbanas do Sistema Municipal de Educação de Jataí, Estado de Goiás, na primeira

fase do ensino fundamental, de 1º ao 5º ano, sobre o processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa.

Este capítulo apresenta duas partes. A primeira traz o material

recolhido com o uso da técnica de evocações livres na segunda fase da pesquisa. A

segunda mostra alguns segmentos de textos reunidos nos momentos de entrevistas

que ocorreram na terceira fase da pesquisa.

3.1 Elementos estruturais das representações sociais de professoras sobre os

processos de ensino e de aprendizagem da língua portuguesa

Na segunda fase de coleta dos materiais, contatamos 100 professoras

com o uso da técnica de evocações livres. Fizemos a seguinte explicação: Eu lhe

direi uma expressão e você me responderá dizendo as cinco primeiras palavras que

vierem de imediato a sua mente. Você deverá dizer as cinco palavras que lhe vierem

à cabeça, palavras soltas mesmo, sem formar frases, que descrevam, caracterizem

ou qualifiquem o que seus colegas professores falam sobre o ensino da língua

portuguesa. Pedido similar foi realizado para que as docentes falassem sobre o

processo de aprendizagem da língua portuguesa. A emissão das evocações foi

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espontânea, permitindo que as palavras fossem prontamente anunciadas pelas

colaboradoras, bem como o caráter hierarquizado foi solicitado, fomentando

reflexões docentes para organizar as palavras evocadas seguindo uma possível

ordem de importância.

Os materiais coletados foram processados no EVOC. O software

organizou as palavras evocadas levando em conta as frequências (f), a ordem média

de evocação (OME) ou a ordem média de hierarquização (OMI). Complementar

explicação da lógica computacional deste programa pode ser vista no capítulo que

trata da metodologia da pesquisa.

A compreensão construída acerca da organização dos materiais

recolhidos foi norteada pela Teoria do Núcleo Central (TNC), formulada por Abric. A

ideia essencial da TNC é a de que toda representação social é um conjunto de

elementos sociocognitivos organizados e estruturados. (ABRIC, 1998). Esta

estrutura é constituída de dois subsistemas: o sistema central e o sistema periférico.

O sistema central reúne elementos mais estáveis de uma

representação, sendo aqueles relacionados aos contextos sociais. De outro lado, o

sistema periférico reúne os elementos mais flexíveis de uma representação social,

sendo aqueles que permitem a concretização do sistema central, pois ele permite

que a representação social seja ancorada na realidade do momento. (SÁ, 1996).

O conjunto de palavras evocadas provenientes do primeiro mote foi

denominado de Elementos do Ensino, e o grupo de palavras evocadas a partir do

segundo mote foi chamado de Elementos da Aprendizagem. Para melhor discussão

do material recolhido, escolhemos mostrar justapostos os elementos dos dois motes.

Vejamos as próximas ilustrações:

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LÍNGUA PORTUGUESA

ELEMENTOS DO ENSINO ELEMENTOS DA APRENDIZAGEM

OME < 3,00 ≥ 3,00

F NÚCLEO CENTRAL PRIMEIRA PERIFERIA

≥ 17

ATRIBUTOS F OME ATRIBUTOS F OME

Leitura 55 2,345 Escrita 40 3,225

Produção 26 3,731

Interpretação 24 3,000

Ortografia 20 3,300

Compreensão 18 3,444

< 17

ZONA DE CONTRASTE SEGUNDA PERIFERIA

ATRIBUTOS F OME ATRIBUTOS F OME

Dificuldade 12 2,000 Conhecimento 16 3,000

Necessário 11 2,364 Aprendizagem 12 3,083

Alfabetização 11 2,182 Oralidade 10 3,800

Letramento 10 2,100 Essencial 7 3,286

Importante 9 1,333 Gramática 6 3,500

Base 6 2,333

Complexo 5 1,800

OME < 3,00 ≥ 3,00

F NÚCLEO CENTRAL PRIMEIRA PERIFERIA

≥ 16

ATRIBUTOS F OME ATRIBUTOS F OME

Leitura 43 2,419 Produção 23 3,478

Escrita 32 2,938 Interpretação 17 3,118

Dificuldade 21 2,143

Conhecimento 18 2,944

< 16

ZONA DE CONTRASTE SEGUNDA PERIFERIA

ATRIBUTOS F OME ATRIBUTOS F OME

Importante 10 2,900 Oralidade 12 3,250

Desinteresse 9 1,778 Ortografia 11 3,182

Necessária 8 2,500 Compromisso 7 3,000

Complicada 7 2,714

Compreensão 6 2,667

Total de palavras do corpus textual: 500 Total de palavras diferentes: 159 Total de palavras dos quadrantes dos elementos estruturais: 298 Total de palavras do Núcleo Central: 55 Frequência mínima considerada no ponto de corte: 5

Total de palavras do corpus textual: 500 Total de palavras diferentes: 192 Total de palavras dos quadrantes dos elementos estruturais: 224 Total de palavras do Núcleo Central: 114 Frequência mínima considerada no ponto de corte: 6

Ilustração 2 Elementos estruturais das representações sociais das professoras acerca do ensino da língua portuguesa - mote espontâneo

Ilustração 3 Elementos estruturais das representações sociais das professoras referentes ao mote indutor aprendizagem da língua portuguesa – mote espontâneo

Fonte: Materiais organizados pela pesquisadora. F = frequência intermediária de palavras; OME = Ordem Média de Evocação, cálculo que organiza as palavras fazendo a média da posição que foram apresentadas.

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As duas ilustrações dispostas uma ao lado da outra apresentam as

organizações do sistema central (Núcleo Central) e do sistema periférico (Primeira

Periferia, Segunda Periferia e Zona de Contraste) que estruturam as possíveis

representações sociais das professoras contatadas sobre os processos de ensino e

de aprendizagem da língua portuguesa. O quadro de quatro casas posicionado do

lado esquerdo apresenta a estrutura representacional docente acerca dos

Elementos do Ensino da língua portuguesa e o quadro de quatro casas que se vê no

lado direito mostra a estrutura representacional docente sobre os Elementos da

Aprendizagem da língua portuguesa.

Segundo Abric (1998), para que possamos localizar uma

representação social de determinado grupo sobre certo objeto é preciso identificar os

elementos centrais que a constituem e que fornecem sua significação. Partindo

desta referência, identificamos nessas evocações livres que a atividade de leitura é

valorizada em ambos os motes indutores, sendo o elemento mais central e saliente

das possíveis representações sociais docentes.

Nos Elementos do Ensino, em termos de frequência e OME, não

ocorreu o aparecimento de qualquer outro elemento para compor o denominado

Núcleo Central. Identificamos, assim, que as representações sociais das professoras

sobre o ensino da língua são estruturadas pela centralidade da prática de leitura no

processo educativo. Isto pode nortear escolhas pedagógicas que priorizam a leitura

em detrimento de outras práticas; ou mesmo favorecer o direcionamento de um

ensino da língua a partir da leitura, entre outras possibilidades.

Além da apresentação de palavras soltas, solicitamos às professoras

que formassem uma frase sobre cada palavra evocada. Sobre o vocábulo leitura, a

maioria das professoras disse que: “1 Se há leitura há conhecimento. 2 A inteligência

é obtida através da leitura. 3 Cultura é o que adquirimos através da leitura. 4 A

Leitura é indispensável para o crescimento do ser humano. 5 A leitura é essencial

para o ensino de português. Não ocorre o ensino sem a leitura e sem a

interpretação, ambos geram conhecimento”. Cada uma destas frases corresponde a

uma contribuição de uma professora que contemplam variados sentidos sobre a

prática de leitura. Entretanto, todas carregam ampla valorização da mesma. São

estas, entre outras significações, que colocaram em evidência a prática de leitura no

ensino da língua, situando as outras práticas em níveis secundários.

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O Núcleo Central dos Elementos da Aprendizagem foi constituído por

quatro vocábulos: leitura, escrita, dificuldade e conhecimento, apontando uma

distribuição da centralidade em quatro elementos e não apenas ao atributo leitura,

como ocorreu no Núcleo Central dos Elementos do Ensino.

Para Abric (2003), o Núcleo Central é o subconjunto de uma

determinada representação social, composto de um ou alguns elementos que

apresentam funções complementares entre si. A partir deste fundamento,

identificamos no material recolhido algumas relações entre os elementos

pertencentes a este sistema.

As palavras leitura e escrita são os elementos mais frequentes e

prontamente evocados pelo grupo. Observamos que existe uma força de atração

entre a leitura e a escrita nas formações imaginárias, pois é comum encontrarmos

nos conteúdos advindos das falas das professoras a normatização “Os alunos

precisam ler muito para escrever melhor”.

Nessa e em outras frases que contextualizaram os atributos evocados,

identificamos uma grande atribuição de valor ao uso correto da língua, como

podemos ver no próximo exemplar de uma dessas frases: “Na alfabetização, os

alunos precisam dominar a leitura, realizando interpretação do que leu, pois, só

assim, eles dominarão a língua portuguesa, dominando as regras de acentuação e

ortografia”.

Observamos que os vocábulos leitura e escrita se unem para valorizar

o ensino da gramática na escola. Desta maneira, a prática de leitura serve como

instrumento de normatização, os/as alunos/as irão ler e entender os códigos

linguísticos para que possam construir uma escrita adequada aos padrões

estabelecidos. Pois, ao observamos as partes que constituem o todo, percebemos

que o significado das evocações das professoras entrevistadas são resultados de

uma certa combinação geradora de sentidos, definidos pelas múltiplas relações que

mantêm entre si, à medida em que estabelecem coerência de sentido, de

representação, sobre o que venha a ser o ensino de língua portuguesa.

Além disso, encontramos outras relações entre os elementos

estruturais a partir das frases que contextualizaram as palavras evocadas. As

professoras anunciaram que a leitura é uma prática que contribui para a aquisição

de conhecimento, este principalmente relacionado aos conteúdos gramaticais e

ortográficos. Vejamos duas frases apresentadas: 1ª “Devemos ter conhecimento da

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128

ortografia correta das palavras”. 2ª “Aprender a Língua Portuguesa ampliará novos

conhecimentos e novos vocabulários”.

As professoras evocaram a palavra leitura e depois apresentaram

frases que relacionam este elemento aos vocábulos conhecimento, ortografia e

vocabulário. Essa conexão de elementos favorece a estruturação de representações

sociais docentes sobre o ensino da língua vinculadas ao saber social que valoriza a

prática de leitura como sendo um veículo de apropriação de conhecimentos,

principalmente aqueles que tratam do uso correto da língua.

Para Abric (2003), o sistema central está ligado aos valores, às normas

sociais, à memória coletiva, à história do grupo e à natureza do envolvimento do

grupo na situação social. Partindo disto, observamos que a centralidade da palavra

leitura recebeu influências das proposições sociais que direcionam o ser humano

para o mundo letrado e de conhecimento, tudo que se diferente dele é inapropriado.

Observa-se, pois, que a prática da leitura se insere como elemento

essencial das práticas curriculares do processo educativo de escolarização, de um

saber essencial para a atuação dos/as alunos/as no ambiente do qual fazem parte e

ao mundo preconizado pelos que defendem a norma da língua, constituindo, assim,

em um sistema discursivo que alimenta a representação social sobre o ensino da

língua portuguesa.

Conforme Abric (2003), uma representação social sobre algum objeto

da realidade é uma entidade unitária regida por um sistema interno duplo, o sistema

central e o sistema periférico, e cada um deles apresenta um papel específico ao

mesmo tempo complementar um ao outro. Seguindo este norte, outras confirmações

da valorização atribuída ao ensino sobre o uso correto da língua foram encontradas

em outros quadros de elementos estruturais. A palavra ortografia se posicionou na

Primeira Periferia dos Elementos do Ensino e na Segunda Periferia dos Elementos

da Aprendizagem; a palavra oralidade situou na Segunda Periferia de ambos os

quadros e a palavra gramática na Segunda Periferia dos Elementos do Ensino,

trazendo uma possível imersão dos sujeitos, por meio de suas representações

sociais, na realidade de sala de aula, mediante o uso de elementos que fomentam

normas educativas escolares.

Ao longo dos anos, o ensino da língua portuguesa era cercado por uma

imagem positiva de valorização da aplicação de conteúdos gramaticais. (BAGNO,

2002). O mais importante para pesquisadores/as, professores/as, alunos/as e para a

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129

família era a adequação correta da linguagem verbal e escrita por parte dos sujeitos,

sendo os conteúdos da gramática normativa os elementos mais importantes do

currículo. Nos materiais recolhidos, a gramática não assumiu o caráter de

centralidade nas representações sociais docentes. Todavia, observamos que

gramática, oralidade e ortografia se posicionaram nos quadros que atribuem

concretude à representação, apresentam uma possível materialidade da

representação social na realidade da sala de aula.

Do ponto de vista do lugar social das professoras, os saberes acerca

da prática educativa são dependentes do contexto em que vivem. Existem regras de

enunciação sociais e institucionais que os sujeitos aderem ou não pela mediação

dos grupos (CAMPOS, 2005). No caso identificado, as normas sociais acerca da

gramática continuam sendo uma representação social hegemônica ao longo do

tempo e estão cristalizadas nas normas educativas escolares.

Com base nas respostas das professoras, observamos que elas

reconhecem na leitura um meio para aquisição de conhecimento e a capacidade de

possibilitar ao educando compreensão dos conteúdos trabalhados em língua

portuguesa. Elas entendem que a leitura proficiente também colabora para a

aprendizagem das normas gramaticais e ajuda no desenvolvimento da escrita.

Manguel (1997), por sua vez, afirma que ler não é um processo

automático de capturar um texto como um papel fotossensível captura a luz, mas um

processo de reconstrução desconcertante, labiríntico, comum e, que podem ser

entendidas como representações resultantes de influências sociais da comunicação

e que constituem as realidades das práticas cotidianas dos/as professores/as e

servem como o principal meio para estabelecer as associações com as quais foram

formados.

Conforme Wagner (1998), representações sociais hegemônicas

refletem a homogeneidade e a estabilidade das representações partilhadas por

todos os membros de um grupo. São passadas ao longo dos anos, tendo um caráter

extenso de existência. Podemos apontar para o fato de que as representações

sociais das professoras acerca do ensino e da aprendizagem da língua portuguesa

estão submersas dentro destes processos de manutenção da importância da

gramática no currículo escolar.

Nos estudos linguísticos, a gramática continua sendo um conjunto de

prescrições e normas importantes para o ensino da língua, o que observamos foi

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uma mudança no modo de trabalhar a gramática em sala de aula. Nesta

representação identificada na pesquisa, foi acrescentada a dimensão da

compreensão plena dos enunciados, os professores são direcionados para

considerarem o contexto que envolve os textos apresentados aos/as alunos/as e

elaborados por eles. Portanto, fomentam uma possível significação dos mesmos.

Esta significação pode ser pronunciada para toda a comunidade escolar e

universitária e, nos materiais coletados, foi nucleada junto à palavra leitura. Todavia,

a normatização da gramática também está contida nos vocábulos coletados, está

também prensada no vocábulo leitura.

O ensino da gramática produziu normas cristalizadas nas práticas

escolares, regulou comportamentos de professores/as e alunos/as desde muito

tempo atrás, prescrevendo possibilidades de ações educativas. A inserção da

gramática é aceitável, é legítima para o grupo de professoras, além de tudo, é

justificável dentro da prática de leitura.

Desta forma, pode-se dizer que quando o ensino da língua portuguesa

desloca-se da palavra ou frases soltas para o discurso ou texto privilegiando-se a

linguagem em uso, ou seja, a atividade comunicativa, o/a professor/a se depara com

um tipo de prática que ele/a mesmo não vivenciou.

Os processos que envolvem a leitura como percepção, decodificação e

processamento de informações, memória, predição (antecipação), inferências,

deduções, evocação, analogia, síntese, análise, avaliação e interpretação ficam

prejudicadas face às representações sobre o que seria leitura, tendo como

parâmetro a gramatica normativa.

Mas, a penetração da gramática dentro das significações sobre a

prática de leitura nas representações sociais das professoras sobre o processo de

ensino-aprendizagem da língua portuguesa está considerando a especificidade de

cada uma? A junção entre leitura e gramática é necessária, como também o

entendimento das particularidades de ambas. Deste modo, precisamos entender se

a junção entre elas se fez para dar um caráter de atualização das práticas ou se fez

para a manutenção de práticas que valorizam os estudos gramaticais em detrimento

de outros.

Ou seja, fora evidenciada a existência de um ideal sobre o ensino da

língua portuguesa, pois pensam que a gramatica, o domínio da gramática, seja o

grande pilar que sustenta o conhecimento sobre a língua portuguesa, sendo esta o

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ponto de chegada da educação formal. Porém, entre o ponto de chegada e o ideal

estipulado por muitos/as professores/as denota, tendo como pano de fundo a

possibilidade de aprendizagem da língua portuguesa a partir dos conhecimentos

estruturados e pela gramatica normativa, que há uma inquietação entre

professores/as sobre o que ensinam e sobre o que alunos/as, de fato, aprendem.

Para Campos (2005), as representações sociais são constituídas na

modernidade e apresentam também a forma de resistência dos grupos, não somente

para protegerem suas identidades, mas para resistir ao domínio da racionalidade

científica e seu exercício de poder por sobre os discursos e os sujeitos sociais. Das

100 docentes contatadas na pesquisa, 41% apresentaram que trabalham há mais de

onze anos nesta profissão, as rotinas exercidas nos espaços educativos já estão

solidificadas, a verdade advinda de suas atuações é mais forte que os saberes em

construção.

Para Bauer (1995, p. 252), “As representações sociais funcionam como

um “sistema cultural imunizante” em um contexto intergrupal: inovações simbólicas

são ativamente neutralizadas através de sua ancoragem em formações tradicionais”.

O presente apontamento de materiais recolhidos indica que as professoras

entendem a leitura ligada à escrita correta -escrever bem - da gramática normativa.

A partir deste entendimento, pode-se interpretar que as professoras orientam suas

práticas, norteadas por um conjunto de regras da língua portuguesa.

Para Pérez Gómez (2001), na escola, as confluências ocorrem entre as

seguintes culturas: cultura crítica (corresponde aos significados e produções

construídas nos diversos campos do saber, ao longo da história); cultura social

(constituída de valores, normas, ideias e comportamentos hegemônicos inseridos no

contexto social; cultura acadêmica (trata-se do que se pretende ensinar, socializar e

problematizar dentro da escola de modo a promover a aprendizagem); cultura

institucional (“[...] conjunto de significados e comportamentos que a escola gera

como instituição escolar [...]”) (PÉREZ GÓMEZ, 2001, p. 131) e cultura experiencial -

é construída na sociedade e na subjetividade humana.

Saberes acadêmicos direcionam os/as professores/as para uma

mudança na cultura escolar historicamente consolidada nas escolas concernente ao

formato didático-pedagógico dos conteúdos normativos da língua; procuram

promover uma compreensão ampla do professorado para um ensino da língua

enquanto processo discursivo, dialógico, que possibilita aos/as alunos/as a

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realização de interpretações significativas de textos para um desvelamento da

realidade social em que fazem parte. Todavia, estes saberes acadêmicos entram em

conflito com os saberes construídos em ofício, querem combater um saber que

chegou ao nível de um valor social hegemônico: o ensino da gramática normativa.

A língua é uma ferramenta em formato de signos e significados e ao

mesmo tempo é o resultado de um processo de interlocução, não está pronta nos

tempos e espaços, mas é criada exatamente enquanto a vamos utilizando. Para

Bagno (2002), a concepção da língua considerada nas escolas brasileiras ainda

carrega vínculos com a norma padrão, transmitida pelas gramáticas normativas, não

considerando o uso real dos recursos linguísticos e suas múltiplas variedades.

Observa-se, assim, que as ações próprias do processo de ensino-

aprendizagem em sala de aula estão em desacordo com as atuais necessidades

exigidas de um sujeito que atua numa sociedade rodeada de textos de todos os

tipos, e apontar possíveis caminhos para minimizar esse problema, enfatizando o

desenvolvimento do/a professor/a leitor/a nos cursos de formação e levá-los à

reflexão crítica sobre sua prática é fundamental.

Além dessas observações, com base na referência de Smolka (1988),

entendemos o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa enquanto um

processo discursivo contínuo de interação em que os papéis dos sujeitos

participantes da prática educativa se fundem para a formação de um objetivo

comum. Diante disto, direcionamos novamente nossos olhares para todos os

elementos dos quadros e não encontramos palavras vinculadas aos processos

interpessoais e intergrupais, que fomentam interlocuções formativas para ensinar e

aprender a língua portuguesa na escola.

Observamos a inexistência de palavras nas organizações estruturais

das evocações livres que revelam processos de interação entre os sujeitos que

realizam a prática educativa. Tanto nos Elementos do Ensino quanto nos Elementos

da Aprendizagem não localizamos palavras ligadas fortemente à figura docente, tão

pouco à imagem discente e aos processos interpessoais, ou, nos termos de Freire

(2001), não fora manifesta a necessidade de transcender a tarefa meramente

instrutiva em favor do desenvolvimento do/a aluno/a.

Segundo Oliveira (2005a), a técnica de evocações livres permite

apreender as projeções mentais construídas de forma espontânea por um grupo de

sujeitos sobre objetos da realidade, apresentando os conteúdos implícitos e latentes

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que podem estar escondidos nos discursos e que evidenciam a centralidade de

elementos das representações sociais. Esta técnica nos auxiliou na identificação dos

elementos estruturais e nucleares das representações sociais do grupo de

professoras sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa e,

também, nos mostrou o que não é nuclear para o grupo, com a ausência de

elementos que são importantes para o processo de ensino-aprendizagem da língua

portuguesa conforme literatura especializada e pesquisadores do assunto, que não

fizeram parte do grupo de palavras mais frequentes e prontamente evocadas.

Com o uso dessa técnica, observamos que as projeções mentais

construídas de forma espontânea pelas professoras apontaram para um possível

indicativo de ausência da percepção de si e do outro, pois elementos importantes

como, por exemplo, aluno, professor, interação, diálogo, comunicação e outros

reveladores de processos de interlocução, não foram evocados, de forma a

pertencerem aos elementos estruturais. Logo, compreendemos que a imagem

construída pelo grupo de professoras é da prática educativa em si, principalmente

realizada com o uso de conteúdos gramaticais, ortográficos e que trabalham a

oralidade, não sendo revelados explicitamente os interlocutores do processo.

Dos fatores que podem ter contribuído para tal ausência de projeções

mentais como, por exemplo, as expectativas diferentes dos interlocutores; as

culturas diversificadas, o uso social da língua, a carga horária de trabalho, a

formação professoral, o contexto favorável ou desfavorável da escola; a própria

mediação realizada por uma única professora de conteúdos disciplinares que fazem

parte do currículo da primeira fase do ensino fundamental, em que esta profissional

trabalha os componentes curriculares de Língua Portuguesa, Matemática, Geografia,

História, Ciências Naturais, Ensino Religioso, Artes e temas transversais, como

exemplo, Meio Ambiente, Saúde, Orientação Sexual, Pluralidade Cultural, Ética, etc.

Além desses fatores, a metodologia da pesquisa, que separou os

Elementos do Ensino dos Elementos da Aprendizagem, poderia ter contribuído com

essa ausência de atributos que trazem explicitamente vocábulos que apresentam os

sujeitos e as interações estabelecidas na prática educativa, pois as professoras

contatadas poderiam ter o entendimento de que pensar o ensino faz evocar as

atividades do/a professor/a e pensar a aprendizagem faz lembrar as atividades do/a

aluno/a.

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Seguindo esse entendimento, no Núcleo Central dos Elementos da

Aprendizagem, que podem estabelecer estreita relação à figura do/a aluno/a,

aparece a palavra dificuldade. Por outro lado, nos Elementos do Ensino,

relacionados à figura professoral, a palavra dificuldade não foi contabilizada para

contribuir com a formação do Núcleo Central das representações sociais. A partir

desse resultado, compreendemos que as práticas que apresentam dificuldades em

sua realização dentro do processo de ensino-aprendizagem estão relacionadas aos

fatores advindos das atuações dos/as alunos/as na rotina educativa.

As professoras construíram os seguintes enunciados sobre a palavra

dificuldade: “1 Os alunos têm dificuldades que a burocracia não vê. 2 Os alunos, de

maneira geral, têm dificuldades de raciocínio. 3 Os alunos são desinteressados,

levando dificuldades para a prática de produção de textos. 4 Existem muitas normas,

por isto dificulta a aprendizagem dos alunos. 5 Os alunos têm dificuldades de

interpretar e escrever. 6 Existem muitos erros de ortografia, por isto, as crianças têm

dificuldades de interpretação, de entendimento sobre o que está por trás das

mensagens dos textos”. A promoção de pensares sobre o ensino da língua não

incitou a produção de discursos consensuais que revelassem imagens de práticas

professorais consideradas difíceis, por outro lado, quando as professoras falaram

sobre a aprendizagem, anunciam dificuldades diversas que comprometem a

aquisição apropriada da língua pelo/a aluno/a.

Elementos ampliadores aos aqui apresentados foram coletados sob a

responsabilidade da Faculdade de Ciências e Letras da Universidade Estadual

Paulista, campus Araraquara, em uma pesquisa desenvolvida junto a um curso de

formação continuada ofertado pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo,

no ano de 2007. Esta investigação contatou 25 professoras que atuavam nas séries

iniciais do ensino fundamental do Sistema público do Estado de São Paulo, com o

objetivo, de identificar as dificuldades apresentadas pelas professoras,

especialmente no que diz respeito à leitura e à escrita.

Ressaltamos que foram realizados vários encontros dentro desse curso

de formação. A técnica de evocação livre não foi utilizada, mas outras formas de

diálogo, como, por exemplo, entrevistas individuais e coletivas. Os resultados dessa

pesquisa apresentaram de uma maneira geral que as principais dificuldades

reveladas pelas professoras sobre a prática docente foram:

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a) fazer a articulação do conhecimento da escrita e da leitura de cada criança; b) promover o uso adequado das características dos vários gêneros discursivos, na linguagem oral e escrita; c) obter a produção de textos considerados coesos e coerentes; d) lidar com as dificuldades relativas às regularidades e irregularidades ortográficas do sistema de escrita; e) lidar com a relação da linguagem, tida como padrão pela escola e a variação linguística do aluno; f) fazer a relação dos processos de avaliação necessários ao conhecimento das dificuldades de seus alunos com a organização das práticas de leitura e escrita mais focadas aos problemas surgidos. (MONTEIRO, SILVA, 2010, p 428).

Conforme Monteiro e Silva (2010, p. 433), as professoras narram sobre

as dificuldades enfrentadas no ensino da leitura e da escrita, conforme a série que

atuam, ou mesmo, complicações que se repetem ao longo do processo seriado. As

pesquisadoras aduzem que esses resultados estão carregados de influências que

podem responder, entre outros fatores, pelo êxito ou fracasso na alfabetização,

apontam que são necessários investimentos na formação inicial e continuada dos/as

professores/as para este campo específico do saber; “Mas, esse investimento deve

procurar responder mais e melhor às necessidades relacionadas à prática docente

das professoras”.

Mesmo se as dificuldades estão relacionadas ao/a professor/a, ao/a

aluno/a, ou ao objeto do conhecimento, precisam ser refletidas junto à prática

educativa, portanto, devem ser compreendidas tanto em processos formativos

iniciais, quanto continuados, considerando a complexidade que move a prática

educativa.

Para Freire (2008), ler e escrever são práticas importantes que

fomentam possibilidades de inserção plena do sujeito na sociedade. O autor

apresenta um discurso sob a questão da luta política da divisão de classes, que

impõe determinados prestígios e privilégios para pequenos grupos sociais. Ele

apresenta que o sujeito tem que sair de uma visão fechada, para a busca de sua

autonomia plena. Isto é semelhante às obras que tratam da Análise do Discurso, em

que muitas vezes, o discurso é instrumento de poder. O autor afirma a importância

de aprender a escrever na prática da escrita e aprender a ler na prática de leitura,

mas em um universo contextual que faz sentido e tem significado para o sujeito

aprendiz, não apenas ler textos, mas interpretar o mundo.

A prática educativa não está isolada das singularidades e coletividades

dos sujeitos e muito menos de seus contextos sociais. Professores/as e alunos/as

sempre irão relacionar os conhecimentos diversos que adquiriram em suas vivências

aos novos conhecimentos que surgem e precisam ser entendidos para que sejam

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assimilados e colocados à disposição para uso reflexivo na rotina diária, com um

fazer voltado para o processo de ensino-aprendizagem, que exigem momentos de

planejamento, de interação, de avaliação e, por meio de variáveis que se relacionam

de forma complexa, e se materializam em sala de aula através do fazer pedagógico

do/a professor/a, revelando uma postura pedagógica de valorização do conteúdo

formal da língua portuguesa e da cultura geral.

A leitura, a escrita e outras práticas escolares são constantemente

relacionadas a outras atividades. A partir deste movimento, são construídas suas

significações. Portanto, fomentar reflexões sobre relações e comparações

conscientes entre os conhecimentos vivenciais e os escolares é fundamental, pois

elas podem evitar a construção de falsos conhecimentos pragmáticos e,

principalmente, podem contribuir para a construção de significações e apropriações

de conhecimentos sintonizados com as necessidades educativas dos sujeitos.

Observa-se, assim, que a representação social do ato de ler e das

implicações pedagógicas subjacentes a seu ensino, parece ser marcada ora por

concepções singulares, ora por concepções plurais. Em muitas delas, essas

significações parecem apontar construções pluralizadas por discursos e ideologias,

marcadas pela escolarização ou pela própria inserção sociocultural, que revezam

entre situações que são produzidas e situações que são produtoras da atual

realidade educacional sobre a leitura.

Esses saberes fazem parte do universo de interpretações das

professoras, pois estão inseridos nos conteúdos advindos do curso de Pedagogia.

Também encontramos indícios da utilização de conhecimentos da literatura

especializada em um mural de uma das escolas visitadas; este quadro foi ilustrado

com uma citação advinda das ideias de Paulo Freire. O maior grupo de professoras

tem formação em Pedagogia e o menor necessitou fazer complementação

pedagógica para trabalhar na primeira fase do ensino fundamental. Tanto a

formação inicial quanto à continuada estão mergulhadas nestes entendimentos

sobre o ensino de língua portuguesa, a educação e o mundo.

Dizemos isso, pois localizamos nos sistemas periféricos dos dois

quadros de elementos estruturais as palavras interpretação, produção e

compreensão. Identificamos que as docentes entendem o ensino da língua materna

como uma atividade geradora de significações. Observamos que existe uma

preocupação em ver o/a discente como um sujeito que necessita adquirir as

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habilidades de leitura, escrita, interpretação e produção de textos para uma

compreensão dos saberes da língua que contribuirão para a vida social. De forma

complementar, as professoras exercem papeis centrais no processo de ensino da

língua portuguesa e representam um modelo a ser seguido pelos/as estudantes.

Especificamente na Zona de Contraste dos Elementos do Ensino localizamos as

palavras letramento e alfabetização que complementam estes indicativos. Por outro

lado, estes dois atributos não compareceram nos Elementos da Aprendizagem.

De acordo com o Ministério da Educação (2008), Letramento é o

estado ou condição que adquire um grupo social ou um indivíduo como

consequência de ter-se apropriado da língua escrita e de ter-se inserido num mundo

organizado diferentemente: a cultura escrita. Como são muito variados os usos

sociais da escrita e as competências a eles associadas (de ler um bilhete simples a

escrever um romance), é frequente levar em consideração níveis de letramento (dos

mais elementares aos mais complexos). Tendo em vista as diferentes funções (para

se distrair, para se informar e se posicionar, por exemplo) e as formas pelas quais as

pessoas têm acesso à língua escrita – com ampla autonomia, com ajuda do/a

professor/a, ou mesmo por meio de alguém que escreve, por exemplo, cartas

ditadas por analfabetos –, a literatura a respeito assume ainda a existência de tipos

de letramento ou de letramentos, no plural.

Atualmente, os espaços escolares receberam a influência de uma visão

mais contextualizada do saber para a atuação diária do sujeito na rotina vivencial,

em que antes se pensava em conhecimentos tradicionais que valorizavam o ensino

da gramática. Para buscar uma modificação deste ensino, Soares (2009) propõe

apresentar o conceito de letramento como sendo a busca por um conceito mais

amplo sobre o ensino escolar e de como se processa a aquisição da língua. As

professoras falam que o ensino da língua portuguesa é necessário para que a

aprendizagem do/a aluno/a seja efetivada com uma compreensão ampla de mundo.

Mas qual é o nível de compreensão que o/a aluno/a pode alcançar segundo as fases

de desenvolvimento apontadas por Piaget e Inhelder (1986)?

Piaget e Inhelder (1986) apresentam que a criança na faixa etária de

sete a doze anos - idade provável para a realização da primeira fase do ensino

fundamental - é capaz de construir um conhecimento mais compatível com o mundo

que a rodeia. O pensamento se apresenta de forma mais flexível em relação aos

anos anteriores, mas o infante precisa ver o concreto para entender as atividades

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propostas. Partindo dessa teoria, consideramos que o pensamento se torna livre das

limitações da realidade concreta após os doze anos, em que o sujeito já pode

pensar de modo lógico e correto, mesmo com um conteúdo incompatível com o real,

que será desencadeado através da soma de um conjunto formativo e constituinte do

desenvolvimento cognitivo e social da criança: o psíquico, o motor, o auditivo, o

visual, o afetivo, o emocional e o social.

Diante da teoria do desenvolvimento humano, questionamos: qual é o

nível de complexidade exigido pelas professoras para que o/a estudante relacione

os conteúdos de língua portuguesa aos outros saberes adquiridos para uma efetiva

compreensão de mundo? Mesmo apresentando a informação acerca da importância

da compreensão dentro do processo de ensino-aprendizagem da língua, as

professoras não evocaram nenhuma palavra frequente reveladora de significados

que fomentam compreensões dos/as alunos/as para a sua inserção social. Palavras

como, por exemplo, poesia, conto, rótulo, reportagem, livros, revistas, jornais,

televisão e internet não apareceram nos dois quadros de elementos estruturais.

Destacamos, ainda, que a relação dos/as alunos/as com os signos não se

desenvolvem a partir de invenções, descobertas súbitas e aleatórias, ou de

adivinhações promovidas por uma descoberta brusca e ao acaso. O uso

instrumental dos signos se desenvolve como resultado de um processo longo e

complexo, a ser produzido através dos fazeres e afazeres pedagógicos. Todavia, no

imaginário docente, identificamos as palavras: gramática, ortografia e oralidade, que

evidenciam o caráter normativo do uso correto da língua.

Esses indicativos apontam para um processo de ensino-aprendizagem

da língua portuguesa fundamentado pela concepção de linguagem enquanto

expressão do pensamento, valorizando o uso correto da língua. Conforme Possenti

(2000), ter uma concepção clara sobre os processos de aprendizagem pode ditar o

comportamento diário do/a professor/a de língua portuguesa em sala de aula. Por

exemplo, se ele/a dá aos/as alunos/as exercícios repetitivos (longas cópias,

exercícios estruturais, preenchimento de espaços vazios, etc.), é porque está

seguindo (saiba ou não) uma concepção de aquisição de conhecimento segundo a

qual não há diferenças significativas entre os homens e os animais em nenhum

domínio de aprendizagem ou de comportamento.

O conjunto de preocupações que orienta a prática pedagógica dos/as

professores/as dá um panorama do processo formativo do corpo docente

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pesquisado. Nesse contexto, além dos elementos próprios do processo de ensino e

aprendizagem, “[...] que há de merecer a acurada atenção dos cursos de formação

de professor de língua portuguesa e o que diz respeito aos procedimentos

pedagógicos a serem utilizados em sala de aula. [...] (BECHARA, 2001, p. 62)”.

Para Geraldi (1996), existem três grandes correntes de pensamentos

sobre a linguagem: 1 - a gramática tradicional, ligada a concepção de linguagem

como expressão do pensamento; 2 – o estruturalismo e o transformacionalismo,

relacionando a linguagem como instrumento de comunicação; 3 – a linguística de

enunciação, abordando a linguagem como forma de interação. Estas divisões de

correntes não abordam todas as ramificações e complexidade dos estudos

linguísticos.

A primeira delas define a linguagem como a externalização do

pensamento. Ela destaca como prioridade a memorização de regras de uma língua

padrão para que a comunicação ocorra adequadamente. Neste entendimento existe

uma dicotomia entre certo e errado, tanto para a verbalização oral, quanto para a

escrita. Regras e normas gramaticais são colocadas como fundamentais para uma

correta linguagem. Esta concepção busca explicar a linguagem a partir das

condições de vida psíquica, individual, do sujeito falante; ela é vista com um ato

puramente individual. É denominada de gramática tradicional e defende a existência

de uma língua superior às outras existentes. Estabelecida como a língua padrão,

todas as outras línguas que se diferenciarem dela serão ignoradas e avaliadas como

erradas.

A segunda concepção de linguagem trata a língua como instrumento

de comunicação. A língua é vista como um código, um conjunto de signos que se

combinam segundo regras, capaz de transmitir ao receptor certa mensagem. “O

domínio desse código possibilita melhores condições da comunicação. A linguagem

é percebida como fenômeno externo, que não faz parte da natureza humana,

servindo como canal para a comunicação entre as pessoas.” (ANDRADE, 2008, p.

4011).

E, finalmente, a terceira concepção entende a linguagem como um

lugar de interação humana, elaborada socialmente e construída em processos

interlocutivos. “Não é só “passar” informações, mas compartilhá-las. Assim, a

linguagem é a possibilidade de interação comunicativa buscando a produção e

construção de significados, de sentidos, enfim, de elaboração de conhecimento”.

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(ANDRADE, 2008, p. 4011). Portanto, os/as aluno/as imersos dentro desta última

concepção são considerados como sujeitos ativos que constroem suas habilidades e

conhecimentos da linguagem oral e escrita em influência mútua com os outros

sujeitos participantes da prática educativa e em interação com a própria língua,

objeto do conhecimento, levando em conta as determinadas circunstâncias de

enunciação e os contextos das práticas discursivas.

Além da valorização da gramática no ensino, localizamos nos sistemas

periféricos de ambos os motes que a própria prática educativa foi avaliada pelo

grupo. As professoras avaliam o ensino da língua portuguesa como necessário,

importante, essencial, complexo e sendo a base para a aprendizagem, como

também, consideram que a aprendizagem da língua portuguesa é importante,

necessária, complicada, precisa de compromisso e sofre desinteresse por parte do

alunado. A palavra desinteresse foi contextualizada por frases que tratam da figura

discente.

Todos esses resultados foram confirmados quando organizamos os

materiais recolhidos estabelecendo uma relação entre a Ordem Média de

Hierarquização das palavras (OMI), ordem de importância atribuída pelas

professoras aos vocábulos, e a frequência das mesmas. Observamos nesta nova

sistematização estatística das palavras que os Elementos do Ensino e os Elementos

da Aprendizagem não sofreram modificações consubstanciais. Esta nova

organização das evocações livres pode ser vista no Apêndice D.

Para buscar ampliar a confirmação dos resultados, realizamos outra

organização do material recolhido. Construímos um mapa representacional referente

às evocações livres dos Elementos do Ensino e outro dos Elementos da

Aprendizagem. Neste momento, nosso objetivo foi sistematizar as evocações livres

considerando todas as variantes disponíveis. Desta forma, a nova organização das

palavras se valeu da Ordem Média de Evocação (OME), da Ordem Média de

Hierarquização (OMI) e da frequência.

Para a compreensão dos mapas das próximas ilustrações, informamos

que o Eixo Y, posicionado na vertical do plano, é correspondente a Ordem Média de

Hierarquização dos vocábulos pela importância (OMI), o Eixo X, posicional na

horizontal do plano, trata-se da Ordem Média de Evocação das palavras pela

espontaneidade (OME), e as cores mostram as frequências dos atributos.

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Ilustração 4 Mapa dos Elementos do ensino da língua portuguesa contidos na representação social docente, organizado por OME e OMI

O mapa dos Elementos do Ensino mostra a evidência da palavra

leitura, com 60% de frequência de todo o corpus processado e aproximadamente 2,4

de OME e de OMI. Ela ficou justaposta às palavras letramento e alfabetização. A

ênfase apresentada aponta para uma possível prática direcionada principalmente

para a habilidade de ler unida aos fundamentos dos processos de letramento e

alfabetização.

O vocábulo escrita foi apresentado em níveis estatísticos secundários

em relação ao atributo leitura, pois recebeu aproximadamente 30% da frequência de

todo o corpus e aproximadamente 3,3 de OME e de OMI. No mapa esta palavra

estabeleceu relações entre os atributos interpretação e conhecimento.

Como estamos falando, neste trabalho, sobre representações sociais

como norteadoras das práticas docentes, certos elementos representacionais podem

nortear algumas práticas em detrimento de outras, neste sentido, se existem valores

estatísticos muito diferentes entre as palavras leitura (60%) e escrita (30%),

possivelmente também apresentam valores normativos diferenciados para o grupo

de professoras. Estes resultados se repetem na organização das evocações livres

dos Elementos da Aprendizagem da língua portuguesa:

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Ilustração 5 Mapa dos Elementos da Aprendizagem da língua portuguesa contidos na

representação social docente, organizado por OME e OMI

Após essa organização do material, nos propusemos a identificar se

dentro de subgrupos de professoras contatadas poderiam existir diferenças ou

semelhanças de representações sociais. Para delinear esta tarefa, separamos as

palavras evocadas pelo grupo de professoras que atuam no 1º e no 2º ano do

ensino fundamental dos vocábulos apresentados pelo grupo de professoras que

atuam no 3º, 4º e 5º ano do ensino fundamental.

A justificativa para tal procedimento se valeu do entendimento que

existem especificidades entre as atuações professorais com atenção aos respectivos

blocos pedagógicos, pois, segundo a Coordenadora Pedagógica da Secretaria

Municipal de Educação, o ensino fundamental da cidade de Jataí-Goiás apresenta o

1º e o 2º ano como sendo o bloco pedagógico em que se processa a alfabetização

das crianças, e o 3º, o 4º e o 5º ano são considerados períodos sequenciais.

Para dividir o material e estabelecer comparações estatísticas entre os

dois grupos de elementos, nós utilizamos o recurso denominado Complex do

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143

programa EVOC, na tentativa de localizar igualdades e especificidades de elementos

entre os conjuntos subdivididos de palavras evocadas pelas professoras.

Esse processamento mostrou duas organizações importantes do material.

A primeira delas apresentou que as professoras que atuam no 1º e no 2º ano do

ensino fundamental evocaram palavras semelhantes ao grupo geral, tanto nos

Elementos do Ensino, quanto nos Elementos da aprendizagem, organizados pela

ordem de evocação e pela ordem de importância para o grupo.

Observamos que o 1º e o 2º ano do ensino fundamental são tratados pela

administração educativa como um período educativo que necessita ser assistido por

profissionais que atuam de forma específica para promover a alfabetização de

crianças. Todavia, a semelhança identificada mostra que as professoras que

trabalham junto ao bloco pedagógico em que se processa a alfabetização de

crianças apresentam um saber comum em relação ao grupo geral. Ou seja, não

apresentaram conhecimentos próprios e específicos para a alfabetização de

crianças pois, enquanto representação social, observa-se que o/a professor/a teria

papel preponderante na viabilização de uma nova concepção de prática

educacional, devolvendo à língua escrita o seu caráter de objeto social;

reconhecendo que todos podem produzir e interpretar a escrita, observando-se os

níveis de aprendizagem; criar contextos que inteirem as crianças com a língua

escrita; considerar a evolução e o aprendizado da criança; não impor a correção

ortográfica como exigência básica à aquisição da escrita.

A segunda organização mostrou que entre os elementos evocados pelo

grupo de professoras que atuam no 3º, 4º e 5º ano do ensino fundamental o

vocábulo ortografia é um elemento específico deste grupo. Esta especificidade foi

revelada na organização das palavras por ordem de evocação e por ordem de

hierarquização nos Elementos do Ensino e nos Elementos da aprendizagem.

A especificidade do elemento ortografia junto ao subgrupo docente que

trabalha no 3º, 4º e 5º ano do ensino fundamental destaca novamente a valorização

atribuída para o ensino do uso correto da língua portuguesa.

A igualdade e a especificidade de elementos localizadas na comparação

realizada entre os dois subgrupos indicam que, ao passar pelas sequências dos

blocos pedagógicos, as professoras aumentam a atribuição de valor ao uso correto

da língua.

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Toda essa compreensão dos textos de campo recolhidos na segunda

fase da pesquisa contribuiu para a verificação de uma possível estrutura

representacional do processo de ensino-aprendizagem de língua portuguesa

construída a partir de três dimensões: 1 a importância funcional da língua na

sociedade, 2 a necessidade do ensino normativo da língua, e 3 as dificuldades

advindas da prática educativa. Estes resultados fomentaram novos diálogos junto ao

grupo docente.

3.2 Indícios de representações sociais de professoras sobre o processo de

ensino-aprendizagem da língua portuguesa

Neste item, serão apresentados alguns materiais textuais recolhidos

mediante entrevistas do tipo semiestruturadas. Elaboramos um roteiro de entrevista,

contendo nove perguntas sobre o tema investigado, como ferramenta para fomentar

os diálogos. Ele pode ser encontrado no Apêndice E.

Escolhemos utilizar o termo texto, pois “A natureza do fenômeno das

representações sociais remete à precedência do conteúdo na análise do material

linguístico, considerando indicador deste fenômeno.” (NASCIMENTO-SCHULZE;

CAMARGO, 2000, p. 294). Portanto, não queremos usar o termo discurso como

sinônimo das falas das professoras, porque entendemos o primeiro como produção

derivada de um sujeito, situado em um local social e que sofre tensões e confrontos

entre o indivíduo e a sociedade (ORLANDI, 2006), enquanto que as falas reunidas

se referem aos elementos de conteúdos de um conhecimento social compartilhado,

em que revelam as representações sociais que são formas de saber com conteúdos

de uma realidade prática, socialmente partilhada, que nem sempre tem caráter

ideológico. (NASCIMENTO-SCHULZE; CAMARGO, 2000).

Quando nos propusemos a compreender o fenômeno representacional

sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa, fizemos uma

escolha conceitual sobre o objeto. Consideramos que este processo é multifacetado

e que apresenta diversas dimensões em sua composição. Podemos citar algumas: o

contexto sócio-político-econômico-cultural que o envolve, a didática e a prática

pedagógica adotada pelas professoras, as relações interpessoais exercidas entre os

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sujeitos e a construção social dos conhecimentos, entre outros. (SMOLKA, 1988).

Mesmo trazendo esses pontos distintos em formato de perguntas,

consideramos que todos compõem o processo educativo que envolve o ensinar e o

aprender a língua portuguesa. Por este motivo, na organização dos materiais

coletados, as falas das professoras foram transcritas em um mesmo arquivo textual

sem separar as respostas emitidas por perguntas. Todo material recolhido foi

processado no software ALCESTE. Este programa fornece uma divisão do corpus

textual em subcorpus que denominamos de classes, que “Ao nível teórico-

metodológico, considerando os limites das manifestações linguísticas, estas classes

podem estar indicando representações sociais ou ao menos campos de imagens

sobre um dado objeto.” (NASCIMENTO-SCHULZE; CAMARGO, 2000, p. 297).

Compreendemos que ensinar a língua portuguesa ao longo da primeira

fase do ensino fundamental de nove anos não ocorre em formato similar em todos

os anos, pois cada etapa do processo de desenvolvimento da criança exige

especificidades educativas. Deste modo, separamos o material coletado e dividimos

esta apresentação em duas partes. Na primeira mostramos as nossas

compreensões sobre o material textual proveniente das falas das professoras que

trabalham no 1º e 2º ano do ensino fundamental. Na segunda compreensão dos

textos de campo, mostramos nossas reflexões sobre os conjuntos de segmentos de

textos apontados pelo programa ALCESTE a partir das falas das professoras do 3º,

4º e 5º ano.

Compreensão I - Conjunto de segmentos de textos provenientes das

entrevistas concedidas pelas professoras que atuam no 1º e 2º ano do ensino

fundamental sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa

Quando intitulamos este item com a expressão Conjunto de segmentos

de textos, queremos dizer sobre o conjunto de textos advindos das falas de 25

professoras que trabalham no 1º e 2º ano do ensino fundamental de nove anos, e

que responderam ao quadro de nove questões. O programa informático ALCESTE

organizou este material textual em 757 Unidades de Contexto Elementares

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(UCEs)24, que correspondem a 76% do total do corpus textual. O programa dividiu o

material em três classes. Os parâmetros considerados pelo ALCESTE no

processamento dos materiais textuais buscam uma classificação em partes distintas

expondo as ideias e os temas mais dominantes no corpus textual, além disto, mostra

a intersecção das classes. Podemos dizer que ele realizou uma análise de conteúdo,

que facilitou o nosso mergulho no material textual recolhido. Na próxima ilustração,

podemos ver as classificações processadas pelo programa e a articulação entre as

classes, que nos mostra o que as professoras falaram sobre o tema da pesquisa em

formato sintetizado das informações relevantes contidas nas falas.

=1ª

Classes sobre o processo de ensino-

aprendizagem da Língua Portuguesa

1ª3ª

Dimensão valorativa do

processo de ensino-aprendizagem da

Língua Portuguesa(42%)

Ensino da Língua Portuguesa:

práticas, materiais didáticos e

conteúdos (20%)

Dificuldades advindas do processo e a

relação com a

família(38%)

Ilustração 6 Classificação e intersecção dos dizeres das professoras que trabalham no 1º e 2º ano do ensino fundamental sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa,

por porcentagem

Observamos que a classe com maior contribuição percentual no corpus

textual foi a de número 1, com 42% de UCEs, posteriormente a 3º com 38% de

UCEs e finalmente a 2º, com 20% de UCEs. Escolhemos discutir os materiais

textuais, respeitando a sucessiva apresentação por nomenclatura. Identificamos que

as classes 1 e 3 estão atreladas a classe 2, e lhe são, ao mesmo tempo, opostas e

24

As UCEs “[...] são segmentos de texto, na maior parte das vezes, do tamanho de três linhas, dimensionadas pelo programa informático em função do tamanho do corpus e, em geral, respeitando a pontuação”. (CAMARGO, 2005, p. 514).

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complementares. A classe 1 também estabelece complementação e oposição em

relação à classe 3. O programa informático ALCESTE nos oferece o número e o

percentual de contribuição de cada classe, os nomes atribuídos foram de nossa

responsabilidade, após interpretarmos cada corpus textual segmentado pelo

programa computacional.

Identificamos que os conteúdos das falas das professoras apresentam

três imagens distintas, mas ao mesmo tempo complementares, sobre a prática

educativa discutida nesta pesquisa. A primeira trata de uma grande valorização da

apropriação do conhecimento da língua para a inserção social das crianças no

mundo letrado, sendo a classe que contém o maior aproveitamento percentual. Ela é

seguida pela imagem de dificuldades advindas da prática pedagógica, em se

tratando do processo de alfabetização de crianças, se estabelecendo como a

segunda classe com maior percentual. A última refere-se aos métodos e

instrumentos pedagógicos utilizados, contendo uma baixa contribuição percentual.

Essas três classes possibilitam a identificação das representações

sociais das professoras entrevistadas acerca do processo de ensino-aprendizagem

da língua portuguesa, através das quais, podemos compreender que sua gênese

está contida na valorização cultural que existe na sociedade brasileira sobre a

importância do aspecto erudito para uma vida de qualidade. Possibilitou

compreender que as professoras representam socialmente que o ensino da língua

pode contribuir para a apropriação de conhecimentos que servirão para uma

inserção social adequada das crianças, futuros adultos, para elas seria uma grande

e importante oportunidade de ascensão social por parte do alunado que apresenta

carências vivenciais.

Além dessa representação, as professoras mostram frequência de

saberes práticos acerca do enfrentamento de problemas no processo educativo,

falam sobre dificuldades advindas das práticas pedagógicas, que, em seus dizeres,

podem ser amenizadas, entre outros fatores, com as contribuições em formato de

apoio da família para com a educação escolar de seus/as alunos/as.

A última imagem consensual apontada pelo programa informático

ALCESTE e interpretada por nós, vincula-se aos materiais, conteúdos e métodos

trabalhados na prática educativa, em que a ludicidade é compreendida pelas

docentes como sendo uma ação inovadora para se sobrepor à abordagem

tradicional do ensino.

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O entrelaçamento dessas classes nos sugere que, para as

entrevistadas, o ensinar e o aprender a língua portuguesa estão relacionados com a

promoção de possibilidades de apropriação de um conhecimento fundamental para

a vivência das crianças, mas, que apresentam dificuldades em sua realização.

Evidenciam que brincadeiras e brinquedos pedagógicos contribuem com o

desenvolvimento das atividades de sala de aula.

Para trazer alguns exemplos de palavras que contribuíram com a

formação de cada classe, buscamos trabalhar com as tabelas das palavras

principais apontadas pelo programa, que auxiliam na apreensão dos pontos

principais das falas de cada classe. Estas podem ser ordenadas, sucessivamente,

pelo qui quadrado (2), por aparecimento nas UCEs da classe e no total do corpus

textual e, finalmente, pela relação de percentuais entre os dois últimos indicadores.

A seguir, iremos expor as tabelas de palavras destacadas pelo

ALCESTE e algumas UCEs correspondentes, que também podemos chamá-las de

frases ou segmentos de textos, para assim, trazermos o detalhamento sintetizado

dos dizeres mais significativos apresentados pelas profissionais. O ponto de corte foi

realizado respeitando o ² de número 10; numerais inferiores foram excluídos da

apresentação por serem secundários em todos os seus valores e ao mesmo tempo

se relacionavam com as palavras apresentadas nas tabelas.

Classe 1 Dimensão valorativa do processo de ensino-aprendizagem da língua

portuguesa (42%)

Na Classe 1, o programa ALCESTE destacou presenças significativas

de palavras que estão inseridas na classificação de verbos, apontando uma força de

uma imagem vinculada à categoria ação; ao exercício prático que envolve o

processo de ensino-aprendizagem. A seguir estão listadas as palavras que

apresentam o maior 2, o maior grau de importância gerado pelo programa

informático em relação aos textos de campo recolhidos mediante as falas

concedidas pelas professoras na oportunidade das entrevistas.

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Tabela 1 Palavras principais da classe 1 intitulada Dimensão valorativa do processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa (42%), resultantes dos dizeres das professoras que atuam no 1º e 2º

ano do ensino fundamental, ordenadas por 2

Palavras na classe Quant. de frases (UCEs) que

contêm as palavras na classe (A) e no corpus (B)

Frequência (F.) por vocábulo ²

F. Total

1

F. Total

2 A B B - A %

Ler (62), lerem (1) 50 63

92

50 58 8 86

Lendo (14) 14 14 14 16 2 88

Le (10) 8 10 8 9 1 89

Leu (5) 5 5 4 4 0 100

Escreve (8), escrevem (1), escrever, (42), escreveu (1) 29 52 59

38 48 10 79

Escrevendo (7) 10 7 7 7 0 100

Importante (33), importantes (1), importantíssima (1) 21 35 32 42 10 76

Ela (76) 19 76 43 63 20 68

Processo (37) 19 37 32 43 9 74

Me (25) 16 25 21 26 5 81

Sabe (16), sabem (13), saber (22) 14 51 37 56 19 66

Fundamental (12) 14 12 10 19 0 100

Precisa (15), precisam (5), precisamos (1), precisando (1), precisar (2)

13 31 25 35 10 71

Acha (10) acham (12), achar (2). Ache (1), acho (49) 12 74 62 108 46 57

Bom (18) 12 18 16 20 4 80

Gosta (4), gostam (7), gostar (5), gostei (1), gosto (6), gostosa (1)

12 23 18 23 5 78

Aprenda (4), aprendam (2), aprende (10), aprender (31), aprendeu (4)

12 60 74

47 78 31 60

Aprendendo (14) 8 14 13 17 4 76

Valoriza (2), valorização (1), valorizada (1), valorizam (4), valorizado (2), valorizar (6)

12 16 11 12 1 92

Peca (7), peco (2) 11 9 8 8 0 100

Ver (15) 11 15 14 17 3 82

Vou (17) 11 17 14 17 3 82

Começa (2), começam (3), começando (4), começar (3), comecei (1), começo (3)

11 17 15 19 4 79

Cria (4), criação (1), criando (1), criar (3) 10 9 7 7 0 100

Moda (1), modo (6) 10 7 7 7 0 100

Observamos na tabela a inexistência de palavras que apresentam a

evidência de um sujeito que realiza a ação; mas alguns verbos, como, por exemplo,

leem, escrevem, precisam, gostam, nos trouxeram a possibilidade de relacioná-los

com a figura do/a aluno/a. Nossa compreensão ficou constatada com a leitura das

UCEs. Como exemplo de textos que incitaram nossa compreensão, mostramos a

seguir parte de conteúdos advindos de uma das falas:

[...] eu entendo que o processo de aprendizagem da Língua Portuguesa é a criança saber ler e escrever. É o básico! Ela tem que

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ler e compreender o que ela está lendo e saber explicar o que leu. (P. 2825).

Essa frase apresentou as práticas realizadas pelos/as alunos/as de ler

e de escrever como sendo as atividades mais importantes no processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa. O sentido desta produção verbal foi

apresentado pela maioria das professoras que colaboraram para a formação desta

categoria.

Identificamos que as representações sociais das professoras trazem

uma tipologia hegemônica, que carrega um núcleo valorativo sobre o processo de

ensino-aprendizagem da língua, formado pela atribuição de importância para as

práticas de ler e escrever26. Portanto, podemos apresentar a premissa que mostra

as ações de ler e de escrever como sendo muito importantes para as professoras.

Desta forma, a língua portuguesa também é muito importante, pois possibilita a

aquisição destas práticas.

A leitura e a escrita alimentam o valor social atribuído para o processo

de ensino-aprendizagem da língua portuguesa. É como se estivéssemos falando de

um mesmo objeto, da indissociabilidade de todos. Compreendendo este contexto,

podemos situar essas significações professorais em uma concepção de linguagem,

enquanto processo de comunicação, pois tratam das habilidades de ler e escrever,

esquecendo a pertença local/universal/temporal dos sujeitos em suas interlocuções

para uma busca de sentidos na existência individual/social dos/as alunos/as.

Precisamos constantemente reafirmar os objetivos do processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa, para não enfatizarmos as ações, mas,

principalmente, trazer o caráter multifacetado de todo o processo educativo.

As professoras falam, em sua maioria, que os/as alunos/as precisam

aprender a ler; e os principais conteúdos e materiais que utilizam para a realização

de leitura são: alfabeto, frases, palavras, textos, histórias, livros, rótulos de produtos

e materiais publicitários expostos nas ruas da cidade27.

Compreendemos que o esforço professoral está voltado para a ampla

25

P. 28 significa professora de número 28 de um total de 50 profissionais que foram entrevistadas na terceira coleta de materiais. A numeração apresentada seguiu a sequência dos contatos realizados, por exemplo, a primeira profissional contatada foi apresentada sob o número 01. Os informativos censitários correspondentes a cada uma delas encontram-se no Apêndice F. Este detalhamento vale para todos os outros indicativos de numeração das entrevistas realizadas. 26

Apontamentos confirmados desde as interpretações advindas das evocações livres. 27

O software ALCESTE processou na Classe 2 esses e outros indicativos. Apresentados detalhadamente no próximo item.

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mediação da leitura, em processos individuais e coletivos. A prática ocorre dentro da

sala de aula, com o direcionamento para o cantinho da leitura, sendo o local dentro

da sala que contém um armário com livros literários. Além disso, indicaram a

condução do/a aluno/a para uma sala de leitura, no nosso entendimento, na

biblioteca da escola. Nos dizeres das professoras:

O ensino de língua portuguesa é mais a leitura. A interpretação da leitura, não só a leitura, mas eles entenderem o que é que estão lendo. Para isso, a gente usa livros literários e diversos. Tem o momento da leitura, dou na sala uns quarenta minutos para a leitura e, geralmente, nesse tempo, vou às carteiras daqueles alunos, principalmente os que têm mais dificuldade com leitura; eu vou lá para ele ler um pedacinho, não a leitura toda, mas um pedacinho. Aí, vou lá ao outro e depois, no final, quando eles terminam a leitura, eu sorteio alguns alunos para contar a leitura que ele leu. Porque, aí, ele vai ler e vai entender porque ele vai contar, nem que seja um pedacinho, e explicar o que ele entendeu daquela leitura. Além das atividades mesmo de interpretação das leituras normais da aula. Você pega uma leitura na segunda, e às vezes, trabalha a semana toda com ela. Contar histórias e eles contarem e recontarem histórias. Sempre a gente tem esse momento na sala. (P. 11).

A gente trabalha bastante com texto, produções de textos, com leituras. O aluno lê, procura livros. A gente tem uma sala de leitura na escola na qual eles vão uma vez por semana nessa salinha, leem espontaneamente, depois, a gente escolhe o livro, aquele que mais chamou atenção e lê para as crianças. (P. 3).

Nosso objetivo de deixar as professoras entrevistadas falarem, sem

momentos de interferência, mostrou uma grande preocupação delas com as

práticas, em detrimento dos conhecimentos advindos da própria matéria pedagógica.

É o que pudemos ver nos dois excertos apresentados anteriormente. Poucas

professoras apresentaram quais eram os conteúdos das leituras realizadas e,

principalmente, nenhuma delas destacou o objetivo específico da realização de cada

leitura promovida.

E a escrita? As professoras discutem sobre o direcionamento desta

prática para a produção de textos, como também, norteiam as atividades para a

realização da reescrita dos mesmos para a correção de erros ortográficos:

O ensino de língua portuguesa é voltado mais, assim, para a prática de leitura, escrita e interpretação de textos. E para ser trabalhado isso, nós usamos os livros didáticos, usamos retroprojetor para reestruturação de textos, para estar expondo os textos originais do aluno, e, a partir daí, estar mostrando para eles as dificuldades que eles encontraram ali. Também é usado o laboratório de informática

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para eles estarem trabalhando as produções, as reestruturações. E, na sala de aula, a leitura, as interpretações, com auxílio do livro didático e o quadro. (P. 2). No decorrer da semana, a gente escolhe uma historinha que eles gostaram muito. A gente faz a produção coletiva com eles, trabalhando bem a questão da estrutura do texto; faz a reescrita daquele texto. Trabalha sem deixar, também, de trabalhar a parte da gramática, que é muito importante. Então, a gente trabalha bastante o português diário, inclusive, interdisciplinar, até mesmo com a disciplina de matemática. (P. 3).

Esses dois fragmentos são exemplos de dizeres em que identificamos

a escrita direcionada, após intenso trabalho de leitura. As crianças escrevem após

ler livros e textos para buscar a compreensão dos mesmos. Entendemos que isto

seja uma representação hegemônica, pois, existe até mesmo um dito escolar que

os/as alunos/as têm que ler muito para escrever melhor28. Muitas professoras, após

verem os erros ortográficos dos/as discentes, indicam a utilização do livro didático

para a correção dos mesmos e o uso do dicionário. Neste sentido, a escrita da

criança parte da busca de referenciais para uma produção própria.

Fundamentos prévios são necessários para a elaboração de textos,

especialmente, quando estamos tratando da aprendizagem de crianças. Entretanto,

se colocarmos a leitura, enquanto ensino, e a escrita como possíveis prova de

aprendizagem, podemos reforçar uma autossuficiência de ambas as práticas.

Sabemos que estas caminham juntas (SACRISTÁN; PÉREZ GOMEZ, p. 1998), mas,

o dito professoral frequente revelado nos materiais textuais recolhidos acerca da

condução da prática de ensino da língua portuguesa traz uma grande evidência para

a leitura, do que para a escrita, ou melhor, as professoras falaram mais sobre suas

atuações no direcionamento da leitura, do que da escrita29.

Devemos ter o cuidado em observar que o/a aluno/a precisa de

referências prévias para elaborar um texto; como também, de aprender a escrever

escrevendo e não apenas ou amplamente aprender a escrever lendo; e

fundamentalmente, tanto a leitura, quanto à escrita são práticas de interlocução, que

apresentam um objetivo não em si mesmo, mas nos saberes, valores e informações

que serão mediados no processo comunicacional entre sujeitos que buscam

diversificados motivos para a realização de ambas as práticas.

28

Frase apresentada pelo grupo de professoras na segunda fase de coleta de materiais no campo de pesquisa. 29

Apontamentos constatados na segunda fase de coleta de materiais.

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Além disso, observamos nas falas docentes que a escrita das crianças

está muito vinculada às cópias das escritas elaboradas no quadro-negro pelas

professoras, e, de outra forma, muitas outras professoras também utilizam de

materiais impressos de atividades para que os/as alunos/as completem os

exercícios. Observamos que estas duas formas de trabalhar com a escrita são as

mais utilizadas em sala de aula. A produção de textos ocorre em dias específicos,

com menor frequência em relação às outras atividades.

Esta Classe 1 foi processada pelo ALCESTE com uma composição

ampla de valorização atribuída pelas professoras para o processo educativo, que

seguiu vinculada à figura docente como o sujeito mais importante para a obtenção

das práticas de ler e escrever pelo/a aluno/a. As representações sociais das

professoras foram objetivadas na imagem delas como fundamentais para a

realização do processo.

Eu me vejo como o pilar, o alicerce. Toda vida eu vejo que o professor é o alicerce. Têm muitos que não querem ser, mas precisam ser, porque senão logo estão excluídos, porque não está cabendo mais. Não vai caber mais. Precisam de qualificação. (P. 6). Eu me sinto como educadora, que a educadora. A professora lá da sala de aula, ela é a peça mais importante. Mais importante, mesmo! Porque se ela não cria momentos de motivação, se não chama a criança para necessidade de aprender, ela vai se dispersar, ela vai achar que ela tem é que brincar com o coleguinha, ela vai sair fora do que é realmente a função da escola, que ela veio para aprender. Então, o professor é que tem que estar chamando, mostrando a importância. E acredito que o professor é fundamental. É a peça mais importante. E ele, o professor, sabendo conduzir essa aula bem dada, ela vai ter sucesso. [...] Para mim, o professor está em primeiro lugar. É a peça chave. (P. 1). Acho que eu me vejo como uma peça muito importante, que tem que saber trabalhar, tem que saber coordenar o trabalho, para que seja bem feito, porque eu sou aqui a moda mestre, vou estar auxiliando, e muito. Então, estão muito dependentes de mim, e eu tenho que estar consciente disso. (P. 30).

A imagem do/a professor/a como o alicerce, como peça fundamental

ou peça chave, revela uma estrutura de condução do processo educativo nucleada

na figura docente. Quando pensamos em alicerce, nos situamos na metáfora

vinculada à construção civil, em que as professoras se situaram como a base

solidificada que permite a sustentação de todo o processo educativo. De outro lado,

quando refletimos que as professoras se percebem como peças fundamentais da

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engrenagem educativa, pensamos que suas configurações imagéticas apontam

suas atuações como nucleares para a realização do processo de ensino-

aprendizagem.

Se elas estão se afirmando como fundamentais para o processo

educativo, podemos identificar a origem da intensa prática de leitura, pois a ênfase

está no processo de ensino, na centralidade das práticas professorais. E o que elas

dizem sobre os/as alunos/as nesta Classe 1?

Tem aluno que tem interesse de aprender, mas a maioria não tem maturidade para estar. Bom, pelo menos eu vejo, assim, de estar entendendo que ele precisa aprender aquilo ali. Você não vê interesse...Vê que a maioria não sente essa necessidade de pensar assim: eu preciso aprender o português, a Língua Portuguesa, a escrever, a ler! Não, eles acham que eles precisam aprender a escrever, mas ele não tem ainda a consciência de que tem necessidade. (P. 19). Eles sabem que é importante, mas tem hora que eles acham cansativo e chato. É muito chato ter que aprender! Por que que eu tenho que interpretar? Por que que eu tenho que entender o que é que é dígrafo? Por que que eu tenho que entender coisas assim? Eles acham isso desnecessário. Mas tia onde que eu vou usar isso? Então, você, como professor, tem que mostrar antes de começar, a explicar por que que ele está aprendendo aquilo. Você tem que achar o motivo dele aprender. Aquela criança tem que entender por que que está interpretando! Você está interpretando porque a sua vida vai ser assim, você vai ter que interpretar documentos, você vai ter que interpretar fichas, quando você for trabalhar vão ter coisas, um jornal, uma revista, então você tem que começar a explicar o porquê que ele está fazendo aquilo ali. Os menores acham legal, muito legal estudar português, interpretar e ler. Os maiores já vão ficando com preguiça, porque vai aumentando a responsabilidade deles. Ele tem que ler mais, já não é mais um texto pequeno, é um texto grande, a prova já é uma interpretação maior. Quanto maior eles vão ficando, maior é a responsabilidade e mais cansados eles vão ficando. E é muita coisa que eles têm que fazer, não é só português. Tem as outras disciplinas, então isso sobrecarrega a criança. Eu acho que o lúdico ele está saindo um pouco da sala de aula e ficando muito preso a questões de ficar estudando, lendo, lê, escreve, copia, escreve, lê, copia, escreve, e a criança cansa. Quando termina o dia, a aula, ela está cansada e não entendeu ao certo, às vezes, o que ela aprendeu naquele horário. (P. 28).

No primeiro trecho de falas, observamos que a professora diz que

os/as alunos/as não valorizam o processo de ensino-aprendizagem da língua

portuguesa, pois ainda não têm maturidade para compreender a importância do

mesmo, que, no relato das professoras é adquirir as práticas de ler e escrever.

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No segundo extrato de dizeres, fazendo uma relação com o primeiro,

identificamos que, ao longo do processo educativo, as crianças, que deveriam

adquirir determinada maturidade para terem uma compreensão valorativa positiva

das práticas de ler e escrever, vão ficando cansadas de tanto ler, escrever e copiar.

Assim, elas acham desnecessário o processo, de outra forma, buscam explicações

das razões para realizar tal prática dentro da sala de aula.

Nos textos de campo recolhidos, a dimensão valorativa positiva do

processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa está vinculada aos

julgamentos das professoras sobre a figura professoral. E a dimensão valorativa

negativa do mesmo está ligada às avaliações acerca dos/as alunos/as. Neste

contexto de valores sociais, o saber ler e saber escrever são os objetivos principais

do ensino da língua portuguesa; em que a prioridade do ensino está na valorização

da prática em detrimento de um amplo contexto de direcionamentos e sentidos

políticos pedagógicos; o/a aluno/a não sabe qual é o seu papel, pois busca

explicações que deveriam estar, a priori, das práticas professorais mediadoras dos

conhecimentos desta matéria.

Portanto, observamos que a Classe 1, a que teve maior índice de

contribuições (42%), nos apresentou os valores atribuídos pelas professoras para o

processo de ensino-aprendizagem da língua em sentido desconectado daqueles

confrontados por elas sobre os valores dos/as alunos/as. Isto nos aponta para uma

possível diferença de representações sociais sobre o mesmo tema para

professores/as e alunos/as. Resta-nos aqui perguntar: o que os/as alunos/as dizem

sobre isto? Como não realizamos tal recolha, ficam aqui nossas reflexões: existem

diferenças de valores que foram identificadas nos textos de campo acerca de um

mesmo objeto, assim nos perguntamos, se as professoras constatam tal imaturidade

ou mesmo atitudes de avaliar como desnecessário o processo educativo por parte

dos/as alunos/as, elas buscam vencer estas dificuldades? Elas falam que precisam

motivar o/a aluno/a, e quem motiva o/a professor/a? Nos textos de campo podemos

interpretar que esta motivação está vinculada ao status de importância de suas

práticas, atribuído por elas próprias, como exemplo, segue o próximo excerto:

Às vezes, a gente se sente angustiada; mas por outro lado, também é muito gratificante você chegar ao final do ano e você ver que seu aluno aprendeu a ler, a escrever e que foi você que ensinou. (P. 25).

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A apropriação da leitura e da escrita pelos/as alunos/as é motivo de

recompensa e de satisfação para as professoras. Isto é um bom motivo para

permanecerem na profissão. São profissionais que estão atuando no 1º e 2º ano do

ensino fundamental e que valorizam majoritariamente a obtenção destas práticas

pelas crianças. Por conseguinte, revelam assim a sua competência professoral para

atuarem nestes respectivos anos educativos, pois se sentem alfabetizadoras. É o

que veremos nos próximos materiais textuais que mostram mais uma classe

processada pelo programa ALCESTE.

Classe 2 Ensino da língua portuguesa: práticas, materiais didáticos e

conteúdos (20%)

Na Classe 1, identificamos que as práticas mais valorizadas pelas

professoras entrevistadas foram as que envolvem a leitura e a escrita para a

realização do processo de alfabetização. Nesta Classe 2, o programa ALCESTE

listou os procedimentos que as professoras realizam na prática pedagógica; os

materiais didáticos que utilizam e os conteúdos apresentados aos/as alunos/as.

Vejamos a próxima tabela:

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Tabela 2 Palavras principais da classe 2 intitulada Ensino da língua portuguesa: práticas, materiais

didáticos e conteúdos (20%), resultantes dos dizeres das professoras que atuam no 1º e 2º ano do ensino

fundamental, ordenadas por 2

Palavras na classe Quant. de frases (UCEs) que

contêm as palavras na classe (A) e no corpus (B)

Frequência (F.) por vocábulo ²

F. Total

1

F. Total

2 A B B - A %

Alfabético (2), alfabéticos (2), alfabeto (39) 131 43

58 33 35 2 94

Alfabetiza (1) alfabetização (8), alfabetizada (1), alfabetizado (1), alfabetizando (3)

13 15 14 31 17 45

Letra (7), letrada (1), letras (28), letrinha (2), letrinhas (3) 82 41 29 38 9 76

Texto (21), textos (27) 75 48 28 38 10 74

Móvel (20) 71 20 17 17 0 100

Palavra (8), palavras (16), palavrinhas (8) 60 32 25 36 11 69

Som (19) 58 19 28

14 14 0 100

Som (7), sonzinho (2) 33 9 8 8 0 100

Jogos (20) 58 20 24

14 14 0 100

Joguinho (1), joguinhos (3) 6 4 4 7 3 57

Trabalha (28), trabalhado (4), trabalham (1) 57 94 56 131 75 43

Escrita (33), escrito (1) 56 34 26 40 14 65

Sílabas (9), Silábico (6), silábicos (1) 54 16 13 13 0 100

Leitura (20) Leituras (2) 35 22 20 34 14 59

Parte (10), partir (6) 24 16 14 24 10 58

Habilidades (10) 24 10 7 8 1 88

Brincadeira (2), brincadeiras (7) 23 9 8 10 2 80

Forma (17) formação (2), formada (2), formando (1), formar (3), formas (1)

22 26 20 42 22 48

Iniciação (1), iniciais (4), inicial (3), iniciando (1), início (4) 22 13 13 22 9 59

Uso (6) 21 6 5 5 0 100

Secretaria (5) 21 5 5 5 0 100

Lúdico (8), lúdicos (1) 20 9 8 11 3 73

Série (6), séries (5) 18 11 9 14 5 64

Tipo (2), tipos (4) 16 6 6 8 2 75

Bingo (3), bingos (1) 16 4 4 4 0 100

Conhece (4), conhecem (3), conhecer (1), conhecerem (1) 16 9 9 15 4 60

Quadro (4) 16 4 4 4 0 100

Construa (1), construam (1), construir (5) 16 7 6 8 2 75

Objetivo (1), objetivos (3) 16 4 4 4 0 100

Pré-silábico (3), pré-silábicos (1) 16 4 4 4 0 100

Banco (5) 15 5 5 6 1 83

Jardim (11) 15 11 8 13 5 62

Segundo (12) 15 12 12 24 10 50

Primeiro ano (5) 15 5 5 6 1 83

Possa (5), possam (4), possível (4) 12 13 12 26 14 46

Segue (3), seguir (1) 12 4 3 3 0 100

De cor (3) 12 3 3 3 0 100

Completar (1), completo (3) 12 4 4 5 1 80

Cantigas (4) 12 4 3 3 0 100

Diversificada (1), diversificadas (2), diversificado (1) 12 4 4 5 1 80

Conhecimento (8), conhecimentos (2) 11 10 8 15 7 53

Didático (4), didáticos (2) 10 6 6 10 4 60

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Podemos traçar um resumo desses indicativos, mostrando que a

prática educativa contida no imaginário das professoras contatadas é a de brincar

para que os/as alunos/as aprendam a ler e a escrever letras, sílabas, palavras e

textos. Para que isto ocorra, elas falam que utilizam o alfabeto móvel, o jogo da

memória, o jogo de bingo, banco de palavras, exercícios de completar palavras e de

cantigas reproduzidas em equipamentos sonoros, além destes indicativos, falam do

uso do quadro-negro.

Identificamos nas falas das professoras principalmente a preocupação

com a assimilação do alfabeto e de palavras pelas crianças, a imagem construída

parte da brincadeira como ferramenta pedagógica que auxilia na obtenção destes

saberes pelos/as aluno/as, como podemos ver nos dizeres de uma das professoras:

Eu trabalho com jogos, com o alfabeto móvel, para tentar trabalhar muito o lúdico com a criança, porque nessa fase inicial você trabalhar só com livro, com atividade em folha não dá, eles não assimilam direito, então tem que ser muito com o lúdico. Trabalho também o joguinho da memória para memorizar bem as palavrinhas, letrinhas. A gente tem que estar sempre estimulando a memória. Eu trabalho muito com o jogo da memória no intervalo de uma aula para outra. É mais ou menos nesse estilo. A gente trabalha letrinha de música, cantando com eles, para completar o texto com as palavrinhas chave. (P. 18).

Para trazer um caráter inovador ao ensino, as professoras entendem a

utilização de jogos como um recurso que possibilita a assimilação de conhecimentos

pelos/as alunos/as. A sala de aula entra como um espaço de ludicidade.

Entendemos que as professoras buscam nesses materiais didáticos e

procedimentos pedagógicos uma prática que provoque o interesse dos/as alunos/as

e a apropriação da habilidade de leitura.

Segundo Weiss (1989), a importância do jogo para o desenvolvimento

da criança foi reconhecida após um longo processo histórico, pois no século

passado predominava a ideia de que o infante era um homem em miniatura;

somente entre os séculos XVII e XVIII que ocorreu a diferenciação entre a fase

adulta e a infantil.

A idéia de infância [...] não existiu sempre, e nem da mesma maneira. Ao contrário, ela aparece com a sociedade capitalista, urbano-industrial, na medida em que mudam a inserção e o papel social da criança na comunidade. Se na sociedade feudal, a criança exercia um papel produtivo direto (“de adulto”) assim que ultrapassava o período de alta mortalidade, na sociedade burguesa ela passa a ser alguém que precisa ser cuidada, escolarizada e preparada para uma atuação futura. Este conceito de

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infância é, pois, determinado historicamente pela modificação das formas de organização da sociedade. (KRAMER, 1992, p. 19).

O infante na sociedade feudal era visto como um adulto. Com o

surgimento da burguesia como uma nova forma de organização social, ele é

reconhecido como um indivíduo que apresenta necessidades de cuidados, de

escolarização e de preparação para sua formação futura. Desta forma, a criança

passa a ter o espaço direcionado ao brincar na infância.

Além dessa visão histórica, Vygostsky (1998) discutindo o

desenvolvimento e a aprendizagem das pessoas, nos ensinou que brincar é uma

experiência basilar para qualquer idade, ao brincar os infantes interagem com o real,

descobrem o mundo que os cerca, se organizam e se socializam. Neste sentido, ele

nos orienta que a brincadeira não pode ser vista na escola como atividade

empregada pelo/a professor/a apenas para recrear as crianças, como uma ação em

si mesma.

Para Vygotsky (2007, p. 109), “Quanto mais rica for a experiência,

maior será o material disponível e acessível à imaginação da criança. Daí a

necessidade do professor ampliar, cada vez mais, as vivências da criança com o

brinquedo e com outras crianças”. Por esta razão, entendemos, com Vygotsky

(2007), que a brincadeira favorece o agir e a aprendizagem da criança na esfera

cognitiva e social. Portanto, é no contato com o brinquedo que a criança desenvolve

suas funções psíquicas, passa a ter noção da realidade em relação às suas

experiências com o meio e com os outros sujeitos sociais.

Além da prática de utilização de jogos, algumas professoras também

acreditam na eficiência de abordagens pedagógicas que fundamentam suas

atividades:

Aqui, na nossa escola, a gente trabalha misturando a maneira lúdica, a tradicional e a construtivista. A gente não segue só uma linha. A criança que não consegue aprender da maneira que nos é orientado pela Secretaria Municipal, a gente tenta de todos os recursos, até voltando mesmo naquele bem tradicional do silábico. (P. 26).

A importância do trato com as especificidades dos discentes no

processo educativo é um fator importantíssimo para uma ação pedagógica

competente. A dinâmica da sala de aula apresentada nos dizeres é tão complexa

que as professoras revelaram a utilização de novos e de antigos métodos para

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atender a demanda da prática educativa. A ludicidade, nesse caso, é percebida

como outra abordagem do ensino, que surgiu desvinculada da concepção tradicional

e das teorias construtivistas incorporadas pela área educacional.

Todavia, entendemos que a prática lúdica precisa ser situada como

modos de organização em dada realidade, que se materializam nas práticas das

crianças; em que traduzem os signos da cultura de seu tempo, sendo referências

norteadoras para posições sociais infantes e possíveis projeções para o mundo

adulto. Portanto, não pode ser considerada como uma abordagem do ensino, mas

como um fenômeno cultural, um estado de ser e agir nos espaços compartilhados;

que não é exclusivo do domínio da infância, mas que contribui para que as crianças

construam ressignificações de elementos da realidade social que observam e dos

quais se apropriam, contribuindo para a elaboração de suas próprias experiências e

conhecimentos sobre a vida social. (BROUGÈRE, 1995).

As crianças também contribuem com as produções sociais e culturais

do mundo, elas não estão separadas do contexto adulto. Desta forma, as atividades

lúdicas devem representar algo, para auxiliar na apropriação de conceitos e imagens

de determinados objetos da realidade, são brincadeiras de faz de conta de algo do

mundo real, e este, faz parte do processo formativo da criança, o adulto de amanhã.

Quando a criança de seis anos entrou no ensino fundamental, não

entrou para exclusivamente praticar atividades escolares que têm o intuito da

instrução, ela inseriu neste nível educativo para se inserir no mundo interlocutivo

(SMOLKA, 1988); considerada como um sujeito de necessidades formativas

específicas, em que precisa brincar para compreender processos que espelham,

refratam, elaboram, ressignificam os valores, as representações sociais, os saberes

da cultura que fazem parte.

Observa-se que, das representações em curso, duas se chocam: a que

afirma que a criança alfabetizada é aquela que reconhece as palavras escritas e

aquela que reconhece a escrita como parte do processo de alfabetização. A

alfabetização é um processo de construção, de interpretação e de intervenção que

se dá de forma simultânea à aplicabilidade das habilidades aprendidas pela criança

e, não será a cópia quem garantirá ao/a aluno/a o emprego ortográfico da escrita;

será a prática, mediante a ampliação do seu domínio linguístico.

Desta forma, a aquisição da escrita por parte da criança é um processo

em permanente construção e como tal, não poderá ser mensurado ou quantificado

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por pré-requisitos. Na verdade, o que chamam de pré-requisitos são finalidades que

se apresentam como consequência da construção do processo de alfabetização e a

maturação infantil. A construção da escrita será resultado da construção e da

desconstrução da língua escrita. Com a binômia construção e desconstrução a

aquisição da escrita é um ato real, que existe fora da criança, portanto um produto

externo, de caráter social. Por assim ser compreendida a aquisição da escrita, a

mesma não ser ensinada de forma fragmentada.

A atividade lúdica revelada pelas professoras está relacionada ao

processo de alfabetização das crianças, em que juntos receberam apenas 20% de

aproveitamento no corpus textual. Isto significa que ambos fazem parte do

imaginário docente, mas não compõem o dito professoral frequente sobre o ensinar

e aprender a língua. Na próxima classe veremos que as professoras também falam

de alfabetização quando vão tratar das dificuldades enfrentadas por elas no

processo educativo.

Classe 3 Dificuldades advindas do processo e a relação com a família (38%)

Nesta Classe, o programa ALCESTE separou o corpus textual

considerando, principalmente, duas perguntas feitas por nós pesquisadores. Uma

delas se refere às dificuldades enfrentadas pelas professoras no processo educativo

e a outra tratava da participação da família na vida escolar dos/as alunos/as. As

palavras mais importantes destacadas estão listadas na próxima tabela:

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Tabela 3 Palavras principais da classe 3 intitulada Dificuldades advindas do processo e a relação com a

família (38%), resultantes dos dizeres das professoras que atuam no 1º e 2º ano do ensino fundamental,

ordenadas por 2

Palavras na classe Quant. de frases (UCEs) que

contêm as palavras na classe (A) e no corpus (B

Frequência (F.) por vocábulo ²

F. Total

1 A B B - A %

Casa (50) 54 50 40 45 5 89

Pai (18 ), pais (41) 44 59 50 67 17 75

Escola (65), escolar (1), escolas (11) 41 77 62 92 30 67

Falta (20), faltam (2), faltando (2), faltar (2) 36 26 23 24 1 96

Apóia (2), apóiam (1), apoiando (1), apoio (24) 31 28 25 29 4 86

Psicóloga (5), psicológica (1), psicológico (2), Psicológicos (3), psicólogo (3)

22 14 13 13 0 100

Tarefa (14), tarefas (3), tarefinha (2) 18 19 16 19 3 84

Ajuda (15), ajudam (3), ajudando (9), ajudar (10), ajudasse (1), ajude (2), ajudou (3)

16 43 34 54 20 63

Deixa (3), deixado (2), deixam (2), deixando (1), deixar (5), deixo (1), deixou (2)

16 16 15 18 3 83

Família (47), familiar (5), famílias (3) 16 55 36 58 22 62

Dificuldade (37), dificuldades (10) 15 47 38 63 25 60

Mãe (15) 13 15 13 16 3 81

Manda (6), mandam (2), mandando (1), mandar (4) 13 13 13 16 3 81

Desejar (8) 13 8 8 8 0 100

Caderno (8) 12 8 7 7 0 100

Pública (3), públicas (4) 12 7 7 7 0 100

Acompanhamento (8) 12 8 7 7 0 100

Problema (11), problemas (7), probleminha (1) 11 19 15 21 6 71

Filho (12), filhos (6) 10 18 18 27 9 67

Médica (2), medicação (1), médico (3) 10 6 6 6 0 100

Encontra (5), encontrada (1), encontrar (1), encontrei (3), encontro (1)

10 11 11 14 3 79

Coordenador (1), coordenadora (4), coordenadores (1) 10 6 6 6 0 100

Observamos na tabela, palavras que estão relacionadas tanto com as

respostas das professoras sobre as dificuldades enfrentadas na sua prática, quanto

com aquelas que tratam da falta de contribuições da família nas atividades escolares

de seus/as filhos/as e que se articulam entre si com aproximação de sentidos. Como

podemos ver nos próximos trechos discursivos:

A maioria das crianças mostra desinteresse, porque hoje em dia está tão difícil ensinar. A criança não tem interesse, os pais não colaboram, os pais não olham o caderno, só perguntam: Você tem tarefa para casa? Se eles falarem que não, ficou por não mesmo,

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mesmo que tendo. Chega na sala de aula, são poucos que fazem, poucos tem responsabilidade, a maioria não tem. Se, pelo menos, os pais olhassem. São poucos que tem vontade de aprender. Por exemplo, eu estou com vinte e seis alunos, dá para contar uns cinco que você olha no caderno tem tarefinha pronta, o caderno bonitinho. A maioria é muito desinteressada. (P. 8). É a questão da dificuldade que vem de casa já. Porque, às vezes, em casa, eles não têm uma família que incentiva muito ou que proporciona para ele em casa um ambiente que facilita a aprendizagem dele aqui na escola. Porque, às vezes, não manda o material didático direito, ou não faz tarefa de casa, então, essa é a minha dificuldade, falta muito na aula e tem crianças que têm dificuldade neurológica, tem dificuldade na fala, e, às vezes, vão meses, semestre inteiro e até anos sem a família ir lá e procurar um profissional competente da área que vai fazer com que essa criança se desenvolva melhor dentro da sala. Aí, vai o ano todo e nada. A gente tentando, mas, tem coisas que não compete ao professor. Ele, sozinho, não dá conta. Ele precisa da ajuda de um profissional daquela área, mas, aí, às vezes, a família não busca isso e aí dificulta o trabalho de alfabetização, do ensino da Língua Portuguesa na sala. (P. 14).

Antes de trazermos considerações sobre esses dois excertos, se faz

necessário narrar um norteamento pedagógico similar em todas as escolas. Existia,

entre os anos de 2009 a 2010, um projeto denominado de Aprendizagem, que a

Secretaria Municipal de Educação disponibilizava, organizava e supervisionava.

Com os norteamentos advindos deste projeto, os/as professores/as precisavam

acompanhar o desempenho dos/as alunos/as e necessitavam fazer um relatório

acerca de suas práticas. No caso dos/as alunos/as especiais, o relatório era

individualizado, o/a professor/a elaborava um texto apresentando todos os

desenvolvimentos realizados pelo/a discente. Eram fichas que iam desde a

quantidade de livros lidos pelos/as alunos/as por mês, até mesmo o relato detalhado

das atividades realizadas por estes. Atualmente (2012), o Projeto Aprendizagem não

é mais aplicado nas escolas. Entretanto, outros norteamentos são direcionados para

as escolas, via reuniões com diretores/as, coordenadores/as e atendimentos

docentes.

Além disso, muitas escolas adotam a prática pedagógica de trabalhar

com projetos, a coordenação encaminha a temática aos/às professores/as e,

estes/as, apresentam livros para os/as discentes lerem - na escola e em casa - e

apresentarem em formato teatral, elaborando poesias e outros textos a partir da obra

indicada.

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A maioria das falas, duas exemplificadas anteriormente, nos revela

que, para as professoras, a família entraria, nesse sentido, como auxiliadora nas

atividades realizadas pelas crianças e, também, no desempenho dos exercícios e de

leituras para casa, algo que não é identificado pelas professoras entrevistadas.

Observa-se que a escola atribui responsabilidades da formação escolar e educativa

da criança também para a família. Esta é uma ação comum nos tempos atuais, mas,

que sofreu mudanças ao proceder dos anos.

Segundo Castro e Regattieri (2010), ao longo do processo histórico, as

instituições escola e família sofreram muitas transformações que influenciaram na

relação entre ambas. Desde o surgimento da escola – com a instituição da

República em 1889 – as crianças recebiam a formação conforme a classe social de

que faziam parte. Para as autoras a prática educacional iniciou “[...] como uma ação

para o atendimento das elites, calcada nos valores da cultura européia, de conteúdo

livresco e aristocrático”. (CASTRO; REGATTIELI, 2010, p. 21). Em formato oposto,

para “[...] as classes populares, a educação, quando existia, voltava-se para a

preparação para o trabalho e era quase uma catequese – o objetivo principal era

moralizar, controlar e conformar os indivíduos às regras sociais”. (Id, Ibid, p. 21).

Nesse contexto, o Estado questiona a capacidade da família para

educar os filhos, ela não estava mais qualificada para as tarefas do ensino das

crianças.

Além de terem de mandar os filhos à escola, os familiares precisavam também ser educados sobre os novos modos de ensinar. O Estado passa a ter um maior poder diante da família, regulando hábitos e comportamentos ligados à higiene, saúde e educação. [...] Enquanto a escola continua a comandar o processo, os pais e responsáveis passam a ocupar uma posição de auxiliar... Com seu status de serviço de interesse público, a educação passa a ser exercida por profissionais com saberes, poderes, técnicas e métodos próprios. Essa demarcação separa familiares e profissionais da educação, distinguindo leigos e doutos na promoção da aprendizagem escolar. A escola afirmava-se como instituição especializada na socialização das crianças, sobrepondo-se à família, às igrejas ou a quaisquer outras iniciativas de organização social. (CASTRO, REGATTIELI, 2010, p. 21-22).

Esse cenário vem mudando após a promulgação da LDB (1996) que,

no Artigo 12, regulamenta para a necessidade da articulação entre família,

comunidade e escola com o objetivo de integração da escola com a sociedade. Mas,

é necessário entender quais são as melhores ações a serem feitas, em que famílias

e comunidade estão imersas em diversas especificidades, dificuldades e diferenças.

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165

Até mesmo as famílias passam a configurar novos perfis que apontam as mudanças

sociais atuais, como por exemplo, elas assumem novos formatos como as “[...]

mães responsáveis pelo sustento dos filhos, pais solteiros, madrastas e

padrastos de segundos casamentos, união entre pessoas do mesmo sexo com

direito a adoção de filhos, etc”. (CASTRO, REGATIELI, 2010, p. 25).

Como acompanhar os filhos, se os familiares trabalham o dia todo ou

são analfabetos? Duas discussões complementares e antagônicas se apresentam a

partir da perspectiva das professoras. A primeira, a quem compete o ensino escolar.

A segunda, a quem compete a educação dos filhos, enquanto valores, bons

costumes, raízes culturais. Sobre esse assunto, poderiam ser levantadas teorias,

para estabelecer as relações de acomodação e de oposição entre os conceitos ou

representações, quer seja da família, quer seja do/a professor/a. Pois, se a família

assumir o papel de ensinar à criança os saberes escolares, estaríamos dizendo que

a função social do/a professor/a é desnecessária. Agora, se o/a professor/a tiver que

educar a criança, ensinando bons modos ou boas maneiras, verificar se a criança

fez a tarefa, estudou, estaria deixando de cumprir sua função social? Entre dilemas e

indagações, uma questão se coloca como fundante, enquanto representação social:

ocorreria o desenvolvimento integral da criança, nos aspectos cognitivos, afetivos,

sociais, científicos, tecnológicos e culturais apenas na escola? Na família? A Escola

responde as demandas do Estado, mesmo sem condições apropriadas para tal, pois

tem a obrigação da oferta educacional, mas a família entra como uma instituição

importante neste processo, que antes era considerada como leiga, agora é vista

como importante para a formação discente.

Castro e Regattieli (2010, p. 32) nos dizem que: “Assim como não é

produtivo exigir que um aluno com dificuldades de aprendizagem cumpra o mesmo

plano de trabalho escolar dos que não têm dificuldades, não se deve exigir das

famílias mais vulneráveis aquilo que elas não têm para dar”. As professoras

entrevistadas nos dizem que:

O caso é sério, você vê um desinteresse muito grande. Eu não acredito que às vezes seja pelas crianças serem de periferia, de classe mais baixa, porque tem crianças na mesma classe, na mesma sala de aula que você vê uma diferenciação. Eu acho que os pais não dão muita importância para o aprendizado, mesmo porque a maioria é analfabeta. Eu acho que eles não têm esse interesse, não compreenderam ainda a importância deste aprendizado, deste conhecimento, da importância da escola. O meu trabalho ali eu deixo

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166

você ir ver os caderninhos, os materiais, as atividades que eu uso. Atividades que você faz em sala, tudo organizado. Quando você manda para casa, tem uns que nem dá vontade de mandar, mas a gente faz. A gente está aqui para esforçar. Quem sabe um dia eles vão reconhecer. Mas, é desse jeito. Então, os pais, a família, tem deixado muito a desejar na escola e, muitas vezes, a gente vai nos cursos, nas capacitações e você escuta muito falar que o professor é que tem que ter a capacidade de sanar essa dificuldade familiar em tudo; e não é assim. Eu acredito que a escola é um todo, de mãos dadas para caminhar juntos, mas, até parei de bater nessa tecla porque fica parecendo que o professor não quer trabalhar e quer deixar a responsabilidade para os pais e não é. Pai tem que ter responsabilidade com a escola do seu filho. (P. 9).

Uma educação de qualidade não é realizada pela solidão profissional

do/a professor/a, mas foi um conteúdo que identificamos nas falas recolhidas. As

professoras nos disseram sobre direcionamentos políticos pedagógicos, sobre

normatizações das coordenações e direções das escolas, acerca das famílias

carentes de diversos atributos sociais, como renda, formação escolar e

responsabilidade com o infante, que situa o/a profissional professor/a como

executor/a de um trabalho repleto de complexidades, desprovido de um apoio bem

próximo de suas práticas. Falamos bem próximo, pois estas professoras revelam

uma problemática da educação escolar amplamente discutida, mas que não saltou

para caminhos que levem a soluções para a atuação dentro das salas de aula.

Após o processamento dos textos de campo dessa fase, voltamos nas

transcrições das falas iniciais no arquivo do programa Word, sendo o original, sem

passar pelo ALCESTE, e procuramos identificar o que as professoras falaram sobre

a alfabetização dentro deste contexto de reflexões sobre o processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa.

Para isso, recortamos as falas do corpus textual que continham

apontamentos sobre o processo de alfabetização e, assim, tivemos a possibilidade

de listar o que dizem sobre o tema. As professoras falaram sobre a alfabetização

como sendo um processo unido ao processo maior de ensino-aprendizagem da

língua. Além mais, as respostas que deram maior ênfase à alfabetização provieram

da pergunta que se refere às dificuldades encontradas no processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa:

A maior dificuldade que eu encontro é a sala ter muitos níveis diferentes, tem crianças de todos os níveis. Tem crianças no pré-silábico, no silábico; tem criança, a minoria, que já está no alfabético.

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Então, é isto que causa problema na sala. Em muitas vezes, você tem que dar trabalhos diferenciados. (P. 1). O aluno passa de qualquer jeito. Ele vai para o segundo ano sem estar alfabetizado, vai para o terceiro ano sem estar alfabetizado e daqui para frente vai ser cada dia pior. (P. 2).

Observamos dizeres que apontam para a complexidade de fatores que

interferem no processo de aquisição das práticas de leitura e escrita. Destes, dois

estão exemplificados anteriormente nos excertos. Sobre essa multiplicidade de

fatores que interferem no processo de alfabetização, Soares (2003) discute sobre a

compreensão que professores/as estão tendo sobre este processo: “[...] o que

lamentavelmente parece estar ocorrendo atualmente é que a percepção que se

começa a ter, de que, se as crianças estão alfabetizadas, parece estar conduzidas à

solução de um retorno à alfabetização como processo autônomo, independente do

letramento e anterior a ele”. (SOARES, 2003, p. 11). Entendemos, com a autora, que

a dificuldade e os problemas ocorridos no processo de alfabetização podem estar

contidos, ou mesmo serem gerados, na separação inadequada que se faz com o

processo de letramento. Ambos os processos caminham juntos, sendo necessário

um melhor aprofundamento reflexivo sobre o conceito de ambos e, por conseguinte,

seu desdobramento em práticas escolares.

Dessa maneira, a alfabetização deve ser compreendida como uma

prática processual e essencial como a própria educação, sendo um tema complexo e

amplo que engloba os processos de ensinar e aprender, juntamente com outros

aspectos cognitivos, sociais, econômicos e políticos. Ela se insere e contribui

significativamente na formação humana, visando modos culturais de ser, estar e agir

necessários à convivência e ao processo de socialização, aprofundando e

ampliando a existência, permitindo ao sujeito reconhecer-se, enquanto ser social,

histórico e cultural pertencente a um mundo letrado. (SMOLKA, 1988).

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Compreensão 2 - Conjunto de segmentos de textos provenientes das

entrevistas concedidas pelas professoras que atuam no 3º, 4º e 5º ano do

ensino fundamental sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua

portuguesa

A partir das falas de 25 profissionais entrevistadas que atuam no 3º, 4º

e 5º ano do ensino fundamental de nove anos, o programa ALCESTE organizou 941

UCEs, que correspondem a 76% do corpus textual. O programa dividiu em cinco

classes o conjunto de segmentos de textos provenientes das falas das professoras.

Na próxima ilustração, podemos ver as classificações processadas pelo programa e

a articulação entre elas:

Ilustração 7 Classificação e intersecção dos dizeres das professoras que atuam no 3º, 4º e 5º ano do

ensino fundamental sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa, por porcentagem

Observamos que a classe com maior contribuição percentual no corpus

textual foi a de número 2, com 40% de UCEs, posteriormente a 4 com 20% de

UCEs, sucessivamente a de número 1, com 17% de UCEs, em seguida a de número

3, com 14% de UCEs e finalmente a 5, com 9% de UCEs.

Quando responderam os nossos questionamentos que tratam do

processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa, observamos que as

2ª3ª

Classes sobre o processo de ensino-

aprendizagem da Língua Portuguesa

Família:sua

importância e a falta de

incentivo ao estudo dos/as

alunos/as(17%)

Aprendizagemdos/das

alunos/as(40%)

Valor social da Língua

Portuguesa(20%)

Ensino:práticas, materiais

pedagógicos e conteúdos

(14%)

A prática de leitura e algumas

fontes de informação

(9%)

=

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professoras anunciam cinco temas mais recorrentes, aqui listados pela ordem das

classes numeradas pelo programa ALCESTE: Família, Aprendizagem, Ensino,

Valores sociais e Leitura. Como apresentado no item anterior, em que discutimos os

materiais textuais recolhidos junto a 25 professoras que atuam no 1º e 2º ano do

ensino fundamental. Trataremos os materiais seguindo a numeração das classes.

O tema Aprendizagem recebeu o mais alto percentual de recorrência

nos dizeres das professoras entrevistadas, com forte ligação ao tema chamado de

Valores sociais e com uma relação mais secundária com o tema Família. Todos eles

receberam as maiores recorrências de falas processadas pelo ALCESTE. De outro

lado, os temas Ensino e Leitura obtiveram as menores recorrências das classes

geradas pelo ALCESTE, ambos, se apresentaram interligados, conforme o

processamento. A seguir apresentaremos cada tema separadamente.

Classe 1 Família: sua importância e a falta de incentivo aos estudos dos

alunos (17%)

O anúncio sobre a falta de incentivo da família em relação às

atividades educativas das crianças retornou neste segundo corpus textual

trabalhado. As professoras dizem que para ocorrer adequadamente o processo

contínuo de aquisição de conhecimentos escolares por parte dos/as alunos/as

também é necessário o apoio da família. Vejamos as falas:

Parece uma coisa bonita para a gente falar: é a união da família, da escola e da sociedade, mas tem que ser isso aí. Se todo mundo parar para raciocinar, se não tiver a união da escola, da família e da sociedade, o que é que acontece com as crianças? A gente vê um monte de coisas nos jornais e dentro da sala de aula e, às vezes, o aluno não tem o respeito pelo professor, mas, por quê? Talvez, ele não aprendeu aquilo. Às vezes, a culpa é dele? É, porque de observar os outros a gente aprende. Mas a culpa também é de outras pessoas que vieram atrás e não mostraram para ele o correto. (P. 1). Esses meninos que eu estou falando, que têm dificuldades não são aqueles meninos danados, são uns meninos bonzinhos. Eu peguei uma turma, esse ano, que é uma belezinha. São uns meninos bons, que prestam a atenção na aula, que participam da aula, mas a tarefa de casa e a participação dos pais estão muito a desejar. (P. 27).

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Ambos os excertos exemplificadores das falas e em outros não

apresentados, que foram separados pelo programa ALCESTE, dando forma para

esta classe, mostram um desejo das professoras para que a família apoie

continuamente o processo de aprendizado dos/as aluno/as para além da sala de

aula. Acreditam que, com o auxílio dos familiares, as crianças iriam ter um

acompanhamento e incentivo maior para os estudos e, especificamente, as

professoras teriam menos dificuldades, ou mesmo, não existiriam dificuldades em

suas atividades. Vejamos outra fala:

A única dificuldade que nós temos aqui, não é total, é só com os pais. Graças a Deus! E essa aula de apoio também, que as meninas são umas gracinhas todas as duas, ajudam a gente, o que a gente falar assim: Vamos trabalhar a leitura hoje? Elas trabalham o que a gente pede para elas, fazem! Então, aqui na escola, graças a Deus, é uma escola que é muito boa! É uma equipe muito boa e cada um ajuda o outro. Então, nós não temos dificuldades. A dificuldade que eu tenho, às vezes, as meninas vão falar que não é, mas comigo, é só os pais! (P. 27).

Elas falam que a maioria dos pais não auxilia no acompanhamento dos

exercícios direcionados pelas professoras para serem realizados em casa, ou

mesmo, os pais não acompanham as atividades realizadas em sala de aula, pois

não olhando os cadernos dos seus filhos, assim, deixam as crianças serem

incentivadas apenas pela escola.

Outras professoras dizem que alguns pais acompanham e se

preocupam com a educação de seus filhos, conversam com as profissionais o ano

todo, vendo progressivamente o desenvolvimento das crianças, mas é uma pequena

parte em relação ao total de responsáveis pelos/as alunos/as. A maioria só irá

conversar com as professoras sobre a educação escolar dos filhos no final do ano,

quando as notas estão ruins, momento este em que as professoras sabem que já

não há tempo para recuperar muitos problemas.

Observemos a tabela das palavras principais desta classe:

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Tabela 4 Palavras principais da classe 1 intitulada Família: sua importância e a falta de incentivo aos

estudos dos alunos (17%), resultantes dos dizeres das professoras que atuam no 3º, 4º e 5º ano do

ensino fundamental, ordenadas por 2

Palavras na classe Quant. de frases (UCEs) que

contêm as palavras na classe (A) e no corpus (B)

Freqüência (F.) por vocábulo ² F.

Total A B B - A %

Pai, pais (47) 133 47 32 36 4 89

Mãe (29), mães (5) 80 34 23 29 6 79

Ajuda (13), ajudam ((5), ajudando (3), ajudar (12), ajudava 1 ajudavam 1

72 35 30 48 18 63

Filho (15) 55 15 14 16 2 88

Vem (27) 41 27 22 40 18 55

Tarefa (13), tarefas (2) 41 15 11 13 2 85

Fala (7), falam (3), falando (5), falar (9), falava (3), falei (14), falo (11), falou (2)

38 54 45 122 77 37

Tive (14) 37 14 9 10 1 90

Projeto (14), projetos (3) 37 17 11 14 3 79

Reprova (2), reprovação (2), reprovam (1), reprovar (7), reprovou (2)

32 14 9 11 2 82

Graças (8) 32 8 8 9 1 89

Deu (2), Deus (9) 30 11 11 16 5 69

Manda (7), mandam (1), mandar (2), mandei (1), mando (1) 30 12 11 16 5 69

Caderno (7) 28 7 6 6 0 100

Pais (26) 27 26 22 49 27 45

Céu (5) 24 5 5 5 0 100

Peleja (1) pelejando (4) pelejo (3) 24 8 5 5 0 100

Lei (8) 23 8 6 7 1 86

Sai (2), saia (1), saio (1) 19 4 4 4 0 100

Negócio (4) 19 4 4 4 0 100

Diretoria (4) 19 4 4 4 0 100

Pede (5) 18 5 5 6 1 83

Meninas (5), menino (5), meninos (7) 17 17 14 31 17 45

Criança (35), crianças (16) 17 51 34 108 74 31

Eu (170) 15 170 79 336 257 24

Olha (12) 15 12 8 14 6 57

Minha (15) 15 15 12 26 14 46

Criação (1), criada (1), criar (1), criei (1) 14 4 4 5 1 80

Direção (3) 14 3 3 3 0 100

Acompanha (1), acompanhada (1), acompanhando (5) 14 7 7 12 5 58

Meu Deus (4) 14 4 4 5 1 80

Coordenador (1), coordenadora (4) 14 5 5 7 2 71

Casa (14) 12 19 19 55 36 35

Liga (7), ligo (4) 11 11 5 8 3 63

Tira (3), tiram (1), tirar (1), tiro (1) 11 6 6 11 5 55

Vindo (4) 10 4 4 6 2 67

Pergunta (2), perguntando (2), perguntar (2), perguntas (3), Pergunto (1)

10 10 9 21 12 43

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Para melhor situar compreensivamente algumas dessas palavras mais

frequentes, e que apresentaram maior importância em termos estatísticos para o

programa ALCESTE, indicaremos o contexto de ideias de algumas. Quando a

maioria das entrevistadas falou o termo pai, elas estavam apresentando um sentido

de responsável, de pais, não o sentido propriamente masculino deste substantivo.

Para a palavra mães, observamos que utilizaram como sendo a figura feminina

materna, realmente da figura da mãe, não citando assim, os outros responsáveis.

Sobre o vocábulo ajuda e seus derivados, elas queriam dizer da grande falta de

apoio familiar e, em poucos casos, da existência desta ajuda da família aos estudos

das crianças. Acerca da palavra projeto, elas informaram o seguinte:

Falei que a escola nossa tem um projeto das crianças levarem livros para ler em casa e o pai tem que estar acompanhando. Porque esse negócio, assim só do professor, só do professor... O professor sozinho não dá conta. E agora, como diz a lei, que é o professor que tem que estar, tem que esquecer pai, tem que esquecer mãe. Eu não acho certo isso. Porque faz muitos anos que eu dou aula e eu acho que o ensino mais para trás era melhor do que hoje. A nossa escola do município era mais ou menos igual escola particular, tinha pai que falava assim: Nossa, professora, o ensino de vocês é igual de escola particular, não tem diferença! Hoje tem diferença! (P. 27).

Referente ao termo reprovação, elas nos disseram que a maioria dos

familiares só preocupa com o desempenho das crianças no final do ano, com medo

da reprovação, de outro lado, nos informaram que certas leis - normatizações

advindas da Secretaria Municipal de Educação - não permitem que o profissional

reprove o/a aluno/a com mau desempenho no 1º e no 2º ano, assim, dificultam o seu

trabalho que é realizado posteriormente. Portanto, interpretamos que elas acreditam

que a reprovação por falta de rendimento da criança no ano correspondente aos

conteúdos trabalhos é necessária, para que os/as alunos/as não cheguem a níveis

de ensino com carências de saberes anteriores a ele.

A palavra Deus foi evidenciada, pois esta classe foi composta por uma

quantidade de narrativas de professoras que atuam em uma escola que tem parceria

com um centro espírita da cidade; e o vocábulo céu faz parte do nome desta escola.

Elas falaram muito o nome da escola, mostrando que é uma instituição diferenciada

das outras do sistema municipal, consideram que é uma ótima escola.

Ligado a todos esses dizeres, as professoras entrevistadas falam que a

família poderia reduzir as dificuldades na aprendizagem das crianças em sala de

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aula, consequentemente, estas iriam aprender mais e melhor. Dentro deste grupo

entrevistado, a imagem que se tem é que a família delegou a responsabilidade da

formação de valores e condutas do/a aluno/a exclusivamente à escola, pois entende

que ela – a escola – dispõe dos meios necessários para “o desenvolvimento da

capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e

habilidades e a formação de atitudes e valores”. (Inciso III, Artigo 32 da LDB n.º

9.394/1996). A escola, por sua vez, entende que “o fortalecimento dos vínculos de

família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se

assenta a vida social”. (Inciso IV, Artigo 32 da LDB n.º 9.394/1996).

Além das representações sociais e regulamentações legais sobre as

responsabilidades da escola e da família, algumas profissionais disseram que existe

uma lei que normatiza a responsabilidade exclusiva do/a professor/a de mediar o

processo de ensino-aprendizagem dos/as alunos/as, não tendo o direito de solicitar

o apoio familiar.

O que aconteceu foram as mudanças de paradigmas. O ensino escolar

ganhou outras nuances, incorporando conceitos como, por exemplo, padrão de

qualidade, acesso, inclusão e permanência, qualidade social. Desta forma, os

paradigmas do passado, embora presentes, enquanto resquícios de um passado, de

uma representação social, são incompatíveis com os apresentados para se

materializar no ensino escolar preconizado para o século XXI. De forma incisiva, o

novo paradigma afirma que a educação é direito universal e se constitui em alicerce

indispensável para o exercício da cidadania em plenitude, da qual depende a

possibilidade de conquistar todos os demais direitos, uma vez que é o conhecimento

que cria as condições necessárias para o exercício pleno da cidadania.

Vejamos o que diz a Resolução 04/2010, do Conselho Nacional da

Educação, que instituiu as Diretrizes Nacionais da Educação Básica:

Art. 8º A garantia de padrão de qualidade, com pleno acesso, inclusão e permanência dos sujeitos das aprendizagens na escola e seu sucesso, com redução da evasão, da retenção e da distorção de idade/ano/série, resulta na qualidade social da educação, que é uma conquista coletiva de todos os sujeitos do processo educativo. Art. 9º A escola de qualidade social adota como centralidade o estudante e a aprendizagem, o que pressupõe atendimento aos seguintes requisitos: I - revisão das referências conceituais quanto aos diferentes espaços e tempos educativos, abrangendo espaços sociais na escola e fora dela;

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174

II - consideração sobre a inclusão, a valorização das diferenças e o atendimento à pluralidade e à diversidade cultural.

Segundo Santos (2009), a educação se encaixa no período

denominado por Kuhn como revolução científica, período esse em que se muda a

forma de olhar para o real e os velhos paradigmas, aos poucos, vão sendo

substituídos pelos novos. Isso já acontece, a educação já é vista com outros olhos,

pois já existem além de várias teorias ou paradigmas emergentes, várias formas de

incentivo à mudança. Exemplos disso são as novas leis, como a Lei de Diretrizes e

Bases da Educação (LDB nº 9394/96), que reforça a democratização do ensino,

estabelece a inclusão social, entre outros; Leis Complementares de Valorização do

Magistério, que destina parte dos recursos financeiros à formação continuada dos

professores, Leis e Resoluções que incluem no currículo a temática histórica e

cultura afro-brasileira, valorizando a diversidade étnica e cultural da sociedade

democrática (Lei nº 10639/03); os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) e os

Referenciais Nacionais (Educação Infantil), direcionando o currículo de forma a

valorizar o sujeito aprendiz e o ensino contextualizado; é possível observar também

que os livros didáticos possuem uma abordagem bem diferente daquela usada 20

anos atrás, valorizando as experiências e o cotidiano do/a aluno/a, até mesmo as

questões de alguns vestibulares, em anos recentes, têm sido abordadas de maneira

a explorá-las, diferentemente de como era feito tradicionalmente, exigindo apenas

uma quantidade grande de informações decoradas ou memorizadas; há, também,

incentivos em forma de bonificações salariais para docentes que buscam

atualizações e que comprovam bom desempenho; além de tudo isso, há outros tipos

de incentivos à inovação.

Opondo-se ao paradigma da educação pós-regime militar, parte dos/as

professores/as brasileiros/as, neste caso, os/as que foram objeto desta pesquisa,

observam que o Artigo 13 da LDB n.º 9.394/1996, Inciso VI, atribui aos/as

professores/as, dentre outras, a incumbência de colaborar com as atividades de

articulação da escola com a família e a comunidade. Partindo deste conceito

advindo da LDB e das aspirações do Estado Democrático de Direito, as professoras

entendem que uma determinada lei não permite que elas exijam o apoio da família.

Perante tais compreensões e incompreensões, questionamos: como deve ser a

interação entre a escola e a família? Quais as causas desse foco de resistência em

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relação às atribuições e competências da família para com a aprendizagem e o

desenvolvimento dos filhos? Vejamos o que Castro e Regattieri (2010) falam sobre o

assunto:

É claro que o trabalho conjugado entre as duas instâncias socializadoras favorece o desenvolvimento integral (incluindo a carreira escolar) das crianças e adolescentes. Mas não podemos esquecer que, sendo o Estado o responsável primário pela educação pública, deve procurar meios para priorizar e garantir esse direito. Ou seja, o sistema de ensino que deposita todas suas expectativas ou a culpa dos resultados escolares de seus alunos exclusivamente na família está, de alguma forma, renunciando a sua missão. O dever da família quanto à educação escolar obrigatória é matricular e enviar regularmente seus filhos às escolas. O não cumprimento deste dever caracteriza negligência passível de punição legal. É preciso que as escolas conheçam as famílias dos alunos para mapearem quantas e quais famílias podem apenas cumprir seu dever legal, quantas e quais famílias têm condições para um acompanhamento sistemático da escolarização dos filhos e quantas e quais podem, além de acompanhar os filhos, participar mais ativamente da gestão escolar e mesmo do apoio a outras crianças e famílias. É nesse sentido que a interação com famílias para conhecimento mútuo destaca-se como uma estratégia importante de planejamento escolar e educacional. [...] De novo, temos que passar da “família esperada” à “família real” para traçar estratégias mais eficazes visando o envolvimento familiar na vida escolar dos alunos. (CASTRO, REGATTIERI, 2010, p. 21).

Os autores nos mostram o que é possível para ser feito em relação à

interação escola-família na atualidade. Dito esse que entra com maior amplitude

para o entendimento das responsabilidades de ambas as instituições. Seria o ideal a

ser pensado e anunciado, mas que está longe dos dizeres das professoras

entrevistadas.

Pensando no programa governamental Todos pela Educação e a

Mobilização pela educação, observamos que o discurso estatal e a mobilização pela

qualidade da educação são discursos sociais institucionalizados, oriundos dos

ideários dos movimentos populares. Caberia, neste caso, a pergunta: quais fatores

impedem que os discursos institucionais - o estatal – não se materialize no chão da

escola, nas práticas pedagógicas? Em termos gerais, os problemas são identificados

e refletidos dentro do contexto educativo, mas as mudanças nas práticas dentro da

sala de aula ainda não foram realmente direcionadas. Como exemplo, segue o

próximo excerto:

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176

A dificuldade maior é que no quinto ano ainda chegam alunos com dificuldades de alfabetização. Nós encontramos alunos que, às vezes, vão escrever uma palavra e querem saber com que letra escreve essa palavra, porque teve muito problema com alfabetização. A gente percebe que quanto mais o tempo passa parece que a cobrança da estatística é maior e, aí querem que passem os alunos. A gente tem uma proposta que vem e que fala que é para trabalhar de uma forma mais construtiva, deixar o aluno pensar. Mas ,ao mesmo tempo, a cobrança que o sistema impõe não deixa você trabalhar dessa forma, porque quer que passe todo mundo. Ao mesmo tempo em que pedem para dar o tempo de cada um, eles querem que todos passem ao mesmo tempo. Então, eu acho que essa cobrança do sistema leva o professor, às vezes, a passar o aluno sem que o aluno chegou no momento; ele não refletiu sobre aquilo, não cumpriu todas as habilidades. Aí, chega no quinto ano, o aluno tem esses problemas. Porque a gente, que é professor, sabe que cada criança tem seu tempo, seu momento. Então, muitas vezes, não é respeitado esse momento. Não é respeitado e vai passando, vai passando e a gente chega com alunos lá no quinto ano que não foram alfabetizados. (P. 47).

Interpretamos que as professoras lidam com a existência de mudanças

legais, a partir das normatizações educativas escolares, sem ter contato real com

tais documentos e sem ter oportunidade de construir reflexões sobre os mesmos.

Quem disse a elas que não podem reprovar os/as alunos/as que apresentam

rendimento escolar inferior ao exigido para determinada fase de ensino? Quem

informou a elas que não podem reprovar os/as alunos/as por causa do censo

escolar que incide nas receitas orçamentárias das escolas, mostrando o número de

alunos/as matriculados e os valores correspondentes para o repasse? Perguntas

que se proponham a discutir o ensino e a aprendizagem escolar não foram

evidenciadas nas angustias das professoras entrevistadas. Ou seja, os paradoxos

da educação, enquanto representação social de uma educação do passado, ecoam

no chão da escola. Observamos que para lidar com esta nova demanda educativa,

as professoras constroem representações sociais que distorcem (JODELET, 2001)

normatizações, pois a difusão dos conhecimentos transforma as redações legais em

outro conteúdo, outro saber.

Classe 2 Aprendizagem dos/das alunos/as (40%)

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Esta classe com o mais alto grau de aproveitamento percentual no

corpus textual é resultante, principalmente, da junção entre os dizeres das

professoras que contribuíram para as questões vinculadas às aprendizagens dos/as

alunos/as com aquelas exposições em que as profissionais apresentam como se

veem dentro deste processo. Identificamos que a união de falas foi construída por

uma grande frequência de referências às dificuldades enfrentadas pelas

professoras. Observemos a próxima tabela:

Tabela 5 Palavras principais da classe 2 intitulada Aprendizagem dos/das alunos/as (40%), resultantes

dos dizeres das professoras que atuam no 3º, 4º e 5º ano do ensino fundamental, ordenadas por 2

Palavras na classe Quant. de frases (UCEs) que

contêm as palavras na classe (A) e no corpus (B)

Frequência (F.) por vocábulo ² F.

Total F. A

F. B

B - A %

Aprendam (1), aprende (23), aprendem (5), aprender (37), aprendeu (12), aprendia (1)

40 79 57 80 23 71

Aluno (84), alunos (55) 32 139 106 189 83 56

Questiona (70), questionado (1), questionando (5), questionar (9) 23 22 18 20 2 90

Passa (60), passado (4), passam (1), passando (5), passar (18), passava (3), passe (1)

18 41 36 55 19 65

Atenção (30) 14 30 24 35 11 69

Encontra (8), encontramos (1), encontrar (3),( encontrei (2), encontro (2)

14 16 14 17 3 82

Conteúdo (19), conteúdos (2) 14 21 17 22 5 77

Nova (1), novas (7), novinha (1), novo (1) 13 10 8 8 0 100

Meio (10), meios (4) 12 14 13 16 3 81

Tenta (6), tentam (1), tentando (6), tentar (4), tente (1), tento (3) 11 21 17 24 7 71

Consegue (16), conseguem (5), conseguia (1), conseguir (4), conseguiu (3)

11 29 25 39 14 64

Dificuldade (50), dificuldades (15) 11 65 60 114 54 53

Sala (23) 11 23 23 35 7 66

Sabe (17), sabem (8), sabemos (2), saber (14), sabia (2) 10 43 35 61 26 57

Tempão (1), tempinho (1), tempo (26) 10 28 23 36 13 64

Deveria (5), deveriam (1) 10 6 6 6 0 100

Alcançar (5), alcançaram (1) 10 6 6 6 0 100

Proposta (4), propostas (2) 10 6 6 6 0 100

Essa tabela mostra as palavras mais importantes em termos de ² e de

frequência no corpus textual da classe, em que estão situadas em um contexto de

apresentações sobre a aprendizagem das crianças em sala de aula e acerca da falta

da mesma. Dentro desse universo de significações sobre a prática educativa, para

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as professoras, as crianças são diferentes no processo de aquisição de

conhecimentos, trazendo com estas especificidades, alguns problemas para as

atuações professorais:

A principal dificuldade que eu encontro é que os alunos andam chegando às séries em diferentes níveis. Muitas vezes, nós pegamos alunos até que não são alfabetizados. Aí, o que ocorre é que complica para o professor, porque, daí, ele vai ter que trabalhar de forma diferenciada e individual diante da realidade de cada aluno que ele recebe. (P. 39).

Nesse dito e em outros dizeres professorais, observamos que existe

uma aproximação das significações acerca dos termos série e ano, que são

utilizados como sendo sinônimos. Identificamos que o imaginário docente está

carregado de conhecimentos enraizados no sistema serial. Mas, a terminologia

mudou como também as normatizações.

Compreender e saber lidar com as diferenças das crianças gera uma

grande preocupação na atuação dessas profissionais. De todas as temáticas aqui

apresentadas, a inquietação com a diferença de ritmo de aprendizado dos/as

alunos/as, a dessemelhança de níveis cognitivos e a divergência de apoio familiar

provoca um força representacional na direção de desconfortos na prática

professoral. Não existem padrões comportamentais para agir dentro da sala de aula,

acarretando uma necessidade constante de aquisição de saberes dinâmicos para a

atuação rotineira escolar. Vejamos outros segmentos de textos:

Uma das dificuldades é a sala muito cheia e os alunos em níveis muito diferentes. Quando tem aquele aluno que conhece o alfabeto no terceiro ano que ele só conhece o alfabeto, ele não consegue formar palavras como aquele aluno que já lê bem. Então, para você fazer um trabalho e ter um bom resultado no final do ano, é muito complicado. A principal dificuldade é essa. Aí, depois, vem o desinteresse dele mesmo, a preguiça, a diferença de idade, às vezes, que tem entre eles, em que uma leitura, uma história que interessa para um, já não é interessante para outro, uma atividade que é boa para um, já não é para o outro. Encontrar as atividades diversificadas para eles, isso é uma das dificuldades. Mas, a principal é a diferença de nível que os alunos chegam ao terceiro ano. Aqueles que não conhecem o alfabeto são poucos, mas ainda tem. Então, é muito difícil esse trabalho. (P. 11). Eu não me lembrei do fato deles estarem permitindo que alunos que não alcançaram as habilidades daquele ano passar para o ano seguinte. Porque eu penso assim: se aquela criança já está com dificuldade naquela série só com aqueles determinados conteúdos se

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passar para a série seguinte vai ser muito mais conteúdo, vai ser muito mais difícil para a criança. Então, eu sou plenamente contra, mas contra mesmo porque se eu pudesse fazer alguma coisa eu faria. Se tivesse jeito de você ir lá e falar assim: não! For um monte de gente lá fazer um protesto ou votar, fazer um abaixo assinado, eu seria a primeira a assinar. Porque acho que acaba que desestimula a criança, porque ela chega no outro ano, ela não sabe e vê os coleguinhas que sabem fazer as coisas, então é muito complicado. Ainda mais de segundo para terceiro ano. Aí, terceiro ano são trinta e cinco alunos na sala. Pensa, se você pegar um aluno lá que não sabe nem ler e nem escrever direito como que vai ser? É muito complicado. Por mais que você tente tirar um tempinho para ele, é difícil. Porque você tem trinta e cinco alunos que você tem que ir lá dar atenção para eles, porque não é porque eles não têm muita dificuldade que você vai deixar de ir lá dar atenção para os que estão precisando. Então eu fiquei muito triste de saber que vai ser desse jeito agora. O aluno passa para o segundo ano mal sabendo ler e escrever. Chega no terceiro, ele tem português, matemática, história, geografia, ciências, artes e ensino religioso. E tudo registra nota no diário. Tudo tem que ter avaliação. Pensa? Se ele não sabe nem escrever direito, como que ele vai fazer isso? Vai ficar muito difícil. Eu fiquei muito triste. Tem horas que eu fico triste com a educação porque, ao invés de melhorar, vai é piorando cada dia mais. Isso que eu penso. (P. 35).

A dificuldade apresentada está em atender a diversidade de diferenças

entre os/as alunos/as no andamento da aquisição das habilidades de ler e escrever.

Observamos que a identificação das diferenças de aprendizagem de leitura e escrita

pelas crianças, principalmente de letras e palavras é feita avaliando a velocidade da

aquisição das habilidades, a rapidez que os/as alunos/as conseguem obter tal ação.

As professoras ancoram a obtenção da aprendizagem dos/as alunos/as em

conteúdos apresentados por elas, na rapidez que desenvolvem os procedimentos

solicitados. A lentidão é tida como algo a ser observado para atendimento

diferenciado por parte do/a professor/a. Após a compreensão dos dizeres das

professoras, interpretamos que a lentidão da obtenção das habilidades também gera

dificuldades na prática educativa.

Entendemos que as professoras falam da relação entre ensino e

aprendizagem, entre aquilo que é planejado, em termos de objetivos, para a

obtenção do conteúdo e a aquisição do saber ou habilidade pelo/a discente. As

principais preocupações estão ligadas ao saber como lidar com o/a aluno/a,

conhecer como a criança aprende, tendo ciência sobre quais os motivos causadores

das diferenças na construção e aquisição de conhecimentos e, em especial, as

professoras se preocupam em saber lidar com tais demandas, implicariam em

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conhecer quais são os métodos utilizados para alcançar a aprendizagem dos/as

discentes.

Compreendemos que o imaginário discursivo recolhido nos permite

interpretar que o processo de ensino precisa de apoio familiar e de um melhor

aprofundamento formativo, entretanto, ele é realizado de uma forma rotineira

tranquila, que gera pouco mal-estar. De outro lado, está o processo de

aprendizagem das crianças, sendo uma preocupação docente, que recebeu o maior

quantitativo entre as entrevistadas, em que promove um grande desconforto nas

atuações das professoras, pois dizem que a existência de disparidade de

aprendizagem, aliadas a distorção idade-série entre os/as alunos/as acarreta novas

exigências nas escolhas de materiais pedagógicos, nas habilidades e nas práticas

diárias das profissionais. Atuar cotidianamente de formas variadas, ser uma

professora diferente para cada 35 ou até 45 alunos/as provoca uma instabilidade na

prática docente.

Classe 3 Ensino: práticas, materiais pedagógicos e conteúdos (14%)

Esta classe que apresentou um baixo aproveitamento no corpus textual

– penúltimo - foi estruturada com os segmentos de textos vinculados principalmente

à questão que discute o ensino. Reuniu dizeres sobre a prática pedagógica em que

as professoras falam dos métodos de ensino adotados, como, também, sobre a

forma de utilizá-los e dos conteúdos trabalhados referentes à língua portuguesa.

Aqui, encontramos o que as professoras fazem para a realização da

mediação dos conhecimentos para os/as alunos/as. Oportunidade esta de fazer uma

aproximação, mesmo que a partir de um universo discursivo, à prática pedagógica

propriamente dita. Podemos, a partir destes segmentos de textos, organizados nesta

classe, localizar o que as professoras fazem dentro da sala de aula, o que utilizam

para os seus procedimentos profissionais e quais são os conteúdos trabalhados no

ensino da língua portuguesa. A seguir, apresentamos a tabela das palavras

principais:

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Tabela 6 Palavras principais da classe 3 intitulada Ensino: práticas, materiais pedagógicos e conteúdos

(14%), resultantes dos dizeres das professoras que atuam no 3º, 4º e 5º ano do ensino fundamental, ciclo,

ordenadas por 2

Palavras na classe Quant. de frases (UCEs) que

contêm as palavras na classe (A) e no corpus (B)

Frequência (F.) por vocábulo ² F.

Total F. A

F. B

B - A %

Texto (32), textos (26) 104 58 34 57 27 60

Jogos (19) 84 19 16 18 2 89

Escrita (29), escritas (1), escrito (2), escritor (1) 67 33 26 48 22 54

Trabalha (26), trabalhado (4), trabalham (2), trabalhamos (4), trabalhando (11)

59 82 56 176 120 32

Leitura (44), leituras (2) 50 32 32 79 49 41

Produção (10), produções (7) 49 17 12 16 4 75

Pontuação (8), pontuações (1) 49 9 8 8 0 100

Dicionário (8) 43 8 7 7 0 100

Alfabeto (11) 42 11 9 11 2 82

Reestruturação (8) reestruturações (1) 42 9 8 9 1 89

Desenvolvendo (10) 37 10 9 12 3 75

Uso (9) 36 9 7 8 1 88

Material didático (16) 35 16 12 20 8 60

Ortografia (13) 34 13 10 15 5 67

Palavras (3), palavras (12), palavrinhas (2) 30 17 12 22 8 55

Diversos (7) 30 7 7 9 2 78

Materiais (8), material (2) 27 10 8 12 4 67

Oral (8) 26 8 7 10 3 70

Didática (3) didático (4) didáticos (4) 26 11 9 15 4 60

Móvel (4) 24 4 4 4 0 100

Explora (2), explorar (6) 24 8 4 4 0 100

Utiliza (1), utilizamos (1), utilizar (2), utilizavam (1) 24 5 5 6 1 83

Sequência (5) 24 5 4 4 0 100

Diferenciada (6), diferenciadas (1), diferenciado (2) 24 9 6 8 2 75

Individual (7$) 22 7 7 11 3 64

Lúdica (1), lúdico (4), lúdicos (1) 19 6 5 7 2 71

Letra (1), letras (6), letrinhas (3) 18 10 10 22 12 45

Silabas (5), silábico (1) 18 6 4 5 1 80

Joguinho (2), joguinhos (2) 18 4 4 5 1 80

Interpretação (10) 18 10 9 19 10 47

Gramática (5), gramatical (1) 15 6 5 8 3 63

Quadro (4) 14 4 4 6 2 67

Coletiva (4) 14 4 4 6 2 67

Poesia (1), poesias (3) 12 3 3 4 1 75

Receita (1), receitas (3) 12 4 3 4 1 75

Aproveitando (2), aproveito (1) 12 3 3 4 1 75

Concreto (3) 12 3 3 4 1 75

Paragrafação (2) parágrafo (1) 12 3 3 4 1 75

Ensina (1), ensino (14) 11 15 14 46 32 30

Construção (2), construo (2) 11 4 4 7 3 57

Atividade (9), atividades (10) 11 19 14 45 31 31

Questão (10), questões (2) 10 12 11 33 22 33

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A apresentação dessa tabela nos faz observar a importância da

utilização de textos para as práticas de leitura, de escrita e de reestruturação de

textos elaborados pelos/as alunos/as para uma possível correção ortográfica. Os

jogos são também utilizados para a apropriação de conhecimentos ortográficos e

semânticos, e o dicionário entra como um material pedagógico de apoio a estes

procedimentos.

Nesta classe, identificamos novamente a predominância da prática de

leitura na rotina educativa, sendo utilizados principalmente textos diversos. No

excerto que se sucede, podemos ver um exemplo deste possível espelho da prática

das professoras:

Quando você trabalha, porque agora é tudo contextualizado, quando você trabalha com um texto que chama a atenção do aluno, desse texto, igual eu falei no começo, você explora inúmeras partes. Você explora tudo o que tem nele. Você pode explorar conjugações, você pode explorar quantidades de sílabas, você pode ver as formações de frases, pode explorar pontuação. Antes, os professores de antigamente não utilizavam o texto dessa forma. Então, hoje, a facilidade que eu vejo é em um texto só. Por exemplo, eu pego um texto de ciências, as estações do ano. Desse texto eu posso usar toda a ciência dentro de estações do ano e todo o português. Isso eu acho uma grande facilidade. E você poder trabalhar com filmes, com uma facilidade que os professores, antigamente, não tinham, que era muito complicado, tem escolas que têm datashow, você trabalha com tudo alí, o aluno visualiza, o aluno quer ter aquela aula, porque aquilo é chique, é bacana, é legal. Então, ele fica motivado. Por isso que eu falei antes, o professor, ele tem que aprender todo dia a ser um novo professor [...] Antes, as professoras faziam tudo separado, então ficava complicado. Mas, mesmo assim, elas conseguiam, porque eu, graças a Deus, fui bem alfabetizada. (P.1).

As professoras dizem que essa leitura é contextualizada, está

vinculada à realidade do/a aluno/a e que pode ser feita com a utilização de textos,

existem possibilidades para a aquisição de conhecimentos gramaticais. A escrita

continua sendo valorizada, em sentido secundário, após a leitura. Podemos

compreender, a partir destes materiais textuais que o ato de escrever é utilizado na

prática pedagógica principalmente para a assimilação de conteúdos da Gramática e

para a verificação e correção de erros ortográficos. Vejamos os próximos segmentos

de texto:

O ensino de língua portuguesa é voltado ,mais assim, para a prática de leitura, escrita e interpretação de textos. E para ser trabalhado isso, nós usamos os livros didáticos, usamos retroprojetor para

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reestruturação de textos, para estar expondo os textos originais do aluno, e, a partir daí, estar mostrando para eles as dificuldades que eles encontraram ali. Também é usado o laboratório de informática, para eles estarem trabalhando as produções, as reestruturações e na sala de aula: leitura, as interpretações com auxílio do livro didático e o quadro. (P. 2). Eu utilizo os livros didáticos que vem do governo para eles, uso muito os meus livros mesmo que eu tenho em casa, coleções, livros de muito tempo atrás que são livros bons mesmo; muita leitura; muita interpretação de texto e produção de texto. Quando chega na produção de texto, eles quase não gostam de fazer produção de texto. Mas, quando é uma leitura, eles gostam! Então eu trabalho muito com o livro didático e, quando eu não tenho, eu pesquiso na internet, peço as colegas para pesquisarem para mim alguma coisa, mas eu dou um jeito. Então é mais é livro didático mesmo. (P. 27).

Observamos, nesses dois segmentos de falas, que as referências

utilizadas no ensino são os livros didáticos, uma das fontes principais. A prioridade

nesta prática está vinculada ao objetivo de proporcionar ao/a aluno/a oportunidade

de conhecer as regras gramaticais e ortográficas. Estes materiais textuais se

estenderam em termos mais frequentes, pois interpretamos que a maioria das falas

das professoras, que estruturaram esta classe, realça que o princípio fundamental a

ser alcançado dentro do processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa é a

obtenção de conhecimentos que levem os/as alunos/as a saber ler e escrever

corretamente, como exemplo; seguem alguns dizeres:

O ensino é gramática, produções de textos, leitura, bastante leitura. Pego algumas atividades diferenciadas como ortografia, brincadeiras para ajudar, material didático, é essa base mesmo. Uso o quebracabeças para montar, o computador, quando tem. Retroprojetor, joguinhos mesmo que a gente confecciona que é o dominó. Esses são os materiais que a gente tem e mais os que a gente confecciona. (P. 33). A gramática é contextualizada. Sempre que a gente vê um texto, a gente está chamando a atenção para as letras maiúsculas, nas palavras diferentes do vocabulário deles. Por exemplo, consulta ao dicionário sempre que possível. Porque tem palavras diferentes do vocabulário que a gente está sempre consultando, tem que consultar o dicionário ou, às vezes, até na oralidade a gente já vai desenvolvendo a interpretação das palavras diferentes do vocabulário deles. (P. 46). São cobradas também as produções de textos, que é onde a gente avalia da melhor forma o aluno, a questão da escrita corretamente, trabalhamos também leitura e interpretação de textos onde a gente diagnostica a leitura, a própria interpretação também do aluno. (P. 31).

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Existe outra vertente de apresentações da prática pedagógica que

mostra outros princípios para o ensino:

No ensino de língua portuguesa, a gente costuma procurar diversas formas para estar trabalhando com os alunos: leitura, interpretação. Procurando, da melhor forma, sempre estar levando ele a pensar a refletir, desenvolver também a sua escrita, levando ele a ler, reler, construir suas ideias, utilizando sempre o que for necessário para que ele consiga se desenvolver. (P. 21).

Essa preocupação com reflexão do/a aluno/a é considerada como uma

compreensão maior dos conteúdos apresentados para que as crianças possam - a

partir dos materiais estudados - construir seus próprios entendimentos acerca dos

conteúdos trabalhados, com a oportunidade da troca de conhecimentos com a

professora em exercício.

Entendemos que fazer uso de procedimentos, práticas, conteúdos e

até mesmo de termos educativos, como didática e prática educativa, lançam

norteamentos para operar em sala de aula e, além do mais, abrem clareiras que nos

mostram os valores sociais construídos pelo grupo professoral entrevistado. O

próximo item tratará destes valores.

Classe 4 Valor social da língua portuguesa (20%)

Essa penúltima classe, processada pelo programa ALCESTE,

organizou segmentos de textos que tratam das questões: Como são os

relacionamentos entre professores/as e alunos/as no processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa? Quais são as dificuldades encontradas pelos

professores no processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa? De um

modo geral, qual é a importância que a família atribui ao processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa? De um modo geral, qual é a importância que o

aluno atribui ao processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa? Como o

professor se vê neste processo educativo? Todavia, o processamento dos materiais

textuais gerou uma formação para esta classe ressaltando os dizeres professorais

acerca dos valores atribuídos pela família, pela sociedade, pelos/as professores/as e

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pelos/as alunos/as ao processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa,

essencialmente à apropriação dos conhecimentos da língua portuguesa com caráter

pragmático de utilização para a vida cotidiana. A seguir apresentaremos a tabela

que contém os vocábulos principais da classe:

Tabela 7 Palavras principais da classe 4 intitulada Valor social da língua portuguesa (20%), resultantes

dos dizeres das professoras que atuam no 3º, 4º e 5º ano do ensino fundamental, ordenadas por 2

Palavras na classe Quant. de frases (UCEs) que

contêm as palavras na classe (A) e no corpus (B)

Frequência (F.) por vocábulo ² F.

Total F. A

F. B

B – A %

Vida (21), vidas (2) 54 23 21 28 7 75

Acredita (7), acreditam (3), acreditar (1), acreditava (1), acredito (12) 48 24 21 30 9 70

Pensa (1), pensado (1), pensam (4), pensando (2), pensar (5), pense (1), penso (5)

43 19 19 27 8 70

Família (29), familiar (1), famílias (7) 42 37 28 50 32 56

Valor (11), valores (1) 40 12 10 10 0 100

Dão (13) 38 13 11 12 1 92

Compromisso (10) 32 10 8 8 0 100

Valoriza (1), valorização (3), valorizado (1), valorizam (1), valorizando (1), valorizar (2)

28 9 7 7 0 100

Acontece (9), aconteceu (1) 23 10 10 14 4 71

Melhora (3), melhorado (1), melhoram (1), melhorando (3), melhorar (7), melhoras (1), melhor (12)

22 17 14 24 10 58

Escola (33), escolar (3), escolas (3) 21 39 34 87 53 39

Geral (10), geralmente (1) 20 11 10 15 5 67

Responsabilidade (8) 19 8 8 11 3 73

Atribui (5) 16 5 4 4 0 100

Vontade (4) 16 4 4 4 0 100

Processo (16) 16 16 16 34 18 47

Importância (16) 16 16 15 31 16 48

Importante (20) 14 20 19 45 26 42

Humano (3) 12 3 3 3 0 100

Reflexão (4) 12 4 3 3 0 100

Resultado (8) 12 8 6 9 3 67

Compreensão (4) 12 4 3 3 0 100

Trabalhador (2), trabalhadoras (1), trabalhadores (1) 12 4 3 3 0 100

Ensino-aprendizagem (6) 12 6 6 9 3 67

Acha (2), acham (5), achei (1), achem (1), acho (39) 11 48 38 120 82 32

Fundamentais (1), fundamental (9) 11 10 10 20 10 50

Pouquinho (5) 11 5 5 7 2 71

Sociedade (5) 11 5 4 5 1 80

Ter (2) 10 25 23 65 32 35

Precisa (15), precisamos (1), preciso (1) 10 17 15 37 22 41

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Identificamos, nesta classe, a atribuição avaliativa de importância aos

conhecimentos da língua portuguesa. Observamos que as professoras concedem

um valor estimável ao processo educativo desta matéria, pois acreditam que a

aquisição destes saberes irá proporcionar uma inscrição social às crianças, futuros

adultos, em uma posição na sociedade com melhores oportunidades, se forem

comparadas a outras pessoas que não conseguiram adquirir tais conhecimentos.

Perante esta grande valorização, elas se inserem como pessoas substancialmente

importantes para que esse processo seja realizado adequadamente, como podemos

identificar no próximo segmento de texto retirado do corpus textual:

Se você dá uma boa aula aquele aluno que tem condições pega. Agora, se você pensa que ele não é capaz, ele não vai pegar. Mas, eu acho isso riquíssimo, importantíssimo e eu dedico. Particularmente, eu dedico cem por cento. A minha família mesmo percebe e fala o tanto que eu me dôo para isso, porque é fundamental na vida do estudante, na nossa vida, para a sociedade, para todos. Eu acho que todo mundo tinha que pensar em valorizar mais, dar importância. (P. 13).

Nessa mesma linha de raciocínio, as professoras nos disseram que a

pertença familiar e social interfere na atribuição de valores aos conhecimentos

advindos da língua:

O contexto social interfere e muito! Porque conforme a situação que ele vive, às vezes, não vai ser tão importante para ele, mas a gente sabe o quanto isso é importante. Tem que despertar nele essa consciência: Olha, isso é importante, é para a sua vida, é para você, é fundamental! Tem que estar sempre alertando eles. (P. 21).

Imersa nessa atribuição de valores positivos pelas professoras à língua

portuguesa, a figura da família é pensada como uma instituição que também atribui

importância para a aquisição destes conhecimentos por parte das crianças,

juntamente com a sociedade, situada em termos mais amplos. Neste encadeamento

de ideias, as entrevistadas consideram que a família acredita na importância da

escolarização para seus filhos, mas não se responsabilizam efetivamente no

acompanhamento das atividades escolares. Sobre este assunto, um exemplo das

falas:

Os pais dos alunos do quinto ano não são muito presentes na escola. Os alunos, geralmente, por terem certa idade, o pai, às vezes, acha que não deve acompanhar nas atividades. É o caso que a gente tem

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muito problema, que as crianças escrevem errado, que lê, mas não aprende o que lê, porque não tem uma base, não tem um alguém que está ali cobrando. O momento que a gente fica na sala de aula é muito pouco e a gente tem as outras disciplinas. A gente, às vezes, até invade a Língua Portuguesa, até invade o espaço das outras disciplinas, por quê? Porque, nós professores, a gente sabe da importância. Como você resolve uma situação problema se você não ler e não interpretar? Como que você vai retirar os dados para você fazer? Então, às vezes, até a gente deixa que se torne até um momento predestinado para aquela aula, se torne um momento maior. Eu acho que os professores, eles, dão mais importância sim a Língua Portuguesa, não desmerecendo as outras disciplinas. (P. 34).

As professoras entrevistadas consideram que os conhecimentos da

língua portuguesa são essenciais para a aquisição de outros saberes, são pilares de

sustentação para a compreensão de outras matérias, como, igualmente, são

sustentáculos para uma adequada inscrição social das crianças no transcorrer de

suas vidas.

Classe 5 A prática de leitura e algumas fontes de informação (9%)

Esta é a classe que obteve o menor aproveitamento percentual em

todo o corpus textual processado pelo programa informático ALCESTE, foi gerada

por uma composição de dizeres sobre a prática de leitura e algumas fontes de

informação utilizadas no processo educativo. Em todas as passagens dos dizeres

das professoras identificamos uma grande valorização da prática de leitura em

detrimento das outras práticas educativas, fato este que possibilitou a formação de

uma classe específica para a mesma.

Poderíamos até dizer que pelo baixo aproveitamento no corpus textual,

esta classe seria a que apresenta menor importância para o grupo entrevistado,

entretanto, o realce de segmentos de textos provenientes dos dizeres das

professoras referente à prática de leitura em formato de classe reforçou ainda mais a

atribuição de importância para ela. Pois o processamento do ALCESTE gerou uma

classe exclusiva para tratar deste tema.

Neste momento, tivemos a oportunidade de localizar as fontes de

informação que foram apresentadas contendo uma frequência maior dentro do

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corpus textual e de importância em termos estatísticos; mostrando-nos as fontes de

referências operadas na prática educativa. Dentre elas, muitas compuseram a

listagem das palavras principais da classe. A seguir mostraremos a tabela das

mesmas:

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Tabela 8 Palavras principais da classe 5 intitulada A prática de leitura e algumas fontes de

informação (9%), resultantes dos dizeres das professoras que atuam no 3º, 4º e 5º ano do

ensino fundamental, ordenadas por 2

Palavras na classe Quant. de frases (UCEs) que contêm as palavras na classe (A) e no corpus (B)

Frequência (F.) por vocábulo ² F.

Total F. A

F. B

B - A %

Livrinho (4), livrinhos (3), livros (26) 113 33 20 33 13 61

Leitura (44), leituras (2) 76 46 28 79 51 35

Contam (1), contar (7), contato (2), conto (1) 75 11 10 13 3 77

Apresenta (3), apresentado (1), apresentaram (1), apresentei (3) 72 8 7 7 0 100

Literário (8), literários (4) 62 12 8 10 2 80

Ler (31), leram (4) 61 35 22 60 38 37

Acessando (1), acesso (7) 53 8 7 9 2 78

Livros (13) 47 13 11 22 11 50

Leu (6) 41 6 5 6 1 83

Leem (4) 41 4 4 4 0 100

Lendo (8) 37 8 8 15 7 53

Dom (3)30

31 3 3 3 0 100

Noticia (10), notícias (1) 31 11 4 5 1 80

Quixote (3) 31 3 3 3 0 100

Propaganda (4)31

31 4 3 3 0 100

Termina (2), terminam (1), terminamos (1) 25 4 4 6 2 67

Canta (1), cantado (1), cantinho (4) 24 6 5 9 4 56

Produz (1), produzem (2), produzir (3), produziram (1) 24 7 5 9 4 56

Fez (7) 21 7 5 10 5 50

Trazem (5), trazer (1) 21 6 5 10 5 50

Assiste (1), assistem (1), assistimos (1) 21 3 3 4 1 75

Principalmente (3) 21 3 3 4 1 75

Lê (7) 20 7 4 7 3 57

Casa (14) 16 14 13 55 42 24

Filme (3) 16 3 3 5 2 60

Semana (5), semanal (1) 16 6 5 12 7 42

Revista (2), revistas (1) 16 3 3 5 2 60

Texto (32), textos (26) 14 13 13 57 44 23

Jornal (3) 12 3 3 6 3 50

Interpretação (10) 12 6 6 19 13 32

Pedacinho (3) 12 3 3 6 3 50

Televisão (2) 12 2 2 3 1 67

Incentivando (1), incentivar (2), incentivo (1) 10 4 4 11 7 36

Internet (3) 10 3 3 7 4 43

30

Utilizam como material de referência o livro intitulado Dom Quixote. 31

Depois da leitura de algum livro, os/as alunos/as são orientados para a realização de uma atividade que consiste em que eles/as elaborem e apresentem oralmente uma propaganda em termos comerciais do livro lido, feita por eles/as mesmos/as.

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Essa tabela apresenta os produtos mais usados pelas professoras para

mediação de conhecimentos e de informação para a aquisição e assimilação de

conteúdos da língua portuguesa pelas crianças, dentro e fora de sala de aula. São

eles: livros, a maioria literários, notícias de jornais, propagandas diversas, revistas,

filmes, televisão e a internet.

No exemplo de uma das falas das professoras entrevistadas,

apresentado a seguir, podemos ter a ciência sobre como utilizam tais materiais:

Eu trabalho com eles essa roda da leitura e eu trabalho também nossa leitura compartilhada, cada dia a gente chega, faz uma acolhida com eles, aí faz a leitura compartilhada. Então nós trabalhamos com livro literário, eu apresentei no início 3 livros que eu sei que adolescentes gostam, que foram: Pollyanna, que as meninas gostam muito, apresentei o Dom Quixote e o Romeu e Julieta, porque, nessa fase, os meninos gostam muito dessa questão de namorado, então ele é um Shakespeare, é um livro muito inspirado, e aí eu apresentei os 3 e perguntei qual eles queriam conhecer primeiro. Todos optaram pelo Romeu e Julieta, e nós, cada dia, na leitura compartilhada, líamos um capítulo, aí encerramos a leitura do livro todo e cada capítulo que a gente lia eles queriam que continuasse o outro. Nós terminamos o livro, assistimos o filme, eles construíram um livrinho, agora hoje nós vamos encerrar o Dom Quixote. Nós já estamos no capítulo 11 e a gente vai fazendo assim também. Então, além dos livros que eles lêem sozinhos, nós temos um livro que a gente lê coletivamente. Às vezes está no final do ano a gente tem vários livros lidos. Porque eu me lembro quando eu estudei, quando eu cheguei na 8ª série na época, foi aí que a minha professora mandou eu ler um livro literário, então, naquela época, você não lia livros, e hoje eu quero dar para os meus alunos tudo o que eles puderem de leitura. Eles gostam muito. Às vezes, você chega e vai conversar com eles alguma notícia no início da aula: “Professora, você não vai ler o Dom Quixote hoje? Vamos ler?”, eles querem. (P. 47).

A prática de leitura é muito utilizada, os direcionamentos para a sua

realização vão desde momentos individuais até mesmo coletivos, dentro e fora de

sala de aula. Identificamos que as professoras falam da grande aceitação para a

realização desta prática por parte do alunado, esta valorização, vinda das crianças,

tem origem na própria prática professoral, pois a prática de escrita é percebida como

uma atividade que deve ser realizada após a leitura. Vejamos uma das falas:

Porque a Língua Portuguesa é a base para o aluno sair bem em todas as outras disciplinas. Se ele lê bem, ele interpreta bem. Então, o aluno leitor é um aluno escritor também, porque ele vai escrever, porque ele sabe o que é que está fazendo. Se ele não tem o hábito

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da leitura ele não vai ter como escrever bem, sair bem na escrita também. Por exemplo, de manhã, na nossa entrada, nós temos a leitura compartilhada. Sempre tem um texto e nesse texto a gente reforça bem valores, a importância do estudo para o dia a dia, para a formação do ser humano, do cidadão consciente. Nós estudamos muito os valores e dentro dos valores a leitura em si. Por exemplo, quando eu peço uma notícia de casa, ele tem que ouvir; entender e escrever. Se ele ouviu e não entendeu ele não vai ter como escrever, registrar por escrito o que ele ouviu. Então nós trabalhamos essa modalidade. Se ele ouve, ele entende, se ele entendeu, ele escreve. (P. 46).

Podemos interpretar de todos os materiais textuais construídos nesta

classe que a apropriação da prática de leitura pelos/as alunos/as é o objetivo

principal do processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa; pois para as

professoras ela desencadeia processos reflexivos sobre os assuntos e conteúdos

trabalhados dentro e fora de sala e que geram a possibilidade de uma apropriação

da prática de escrita.

Compreendemos que a escrita produzida pelos/as alunos/as possibilita

a identificação de um possível aprendizado, sendo um veículo para a elaboração de

instrumentos de avaliação. Ela também é utilizada em diversas situações educativas:

como uma ferramenta de apresentação de interpretações de textos; como objeto de

apropriação da ortografia correta e de conhecimentos gramaticais; como técnica

para uma grafia bonita e legível, como utilidade de registro dos conteúdos da

matéria escolar que são escritos no quadro pelas professoras para que os/as

alunos/as possam consultar o conteúdo trabalhado em momentos futuros, dentro e

fora de sala de aula, entre outras.

De um lado, identificamos a imagem consensual sobre a prática da

leitura em sala de aula como sendo um momento de prazer, de ludicidade, de

possibilidade de aprendizado de assuntos do interesse das crianças e de conteúdos

direcionados pelas professoras e pela Secretaria Municipal de Educação. De outro

lado, localizamos representações sociais das professoras sobre a prática de escrita

em sala de aula, sendo uma ocasião que contém diversas responsabilidades: grafia

bonita, legível e correta, interpretação adequada e de rapidez na cópia de conteúdos

do quadro.

Perante essas compreensões, podemos afirmar que o pensamento do

grupo de entrevistadas sobre o processo de ensino-aprendizagem está carregado de

contradições, como muitos outros pensamentos acerca de objetos sociais. Dentro

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deste imaginário docente, as representações sociais, que possibilitam a orientação

das condutas em sala de aula, favorecem o direcionamento predominante de

práticas de leitura em detrimento de momentos de escrita. Interpretamos que a

escrita trabalhada nestes espaços educativos é carregada de muito peso normativo,

de regras e de avaliações, promovendo descontentamento no grupo de alunos/as e

fomentando um aumento de trabalho docente.

Para trazer um possível resumo de todo o entendimento construído na

pesquisa e para que possamos ainda mais refletir acerca de tantas interpretações

elaboradas entre todos nós acerca da prática educativa, no próximo capítulo,

apresentaremos o que consideramos como finalizações de entendimentos para um

início de outras etapas de reflexão.

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CAPÍTULO IV INDÍCIOS DE REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE PROFESSORAS

DOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL SOBRE O PROCESSO DE

ENSINO-APRENDIZAGEM DA LÍNGUA PORTUGUESA: SÍNTESE POSSÍVEL

A presente pesquisa teve como objetivo compreender as representações

sociais de professoras que trabalham de 1º ao 5º ano do ensino fundamental, em

escolas urbanas, do sistema público municipal de ensino do município de Jataí, Estado

de Goiás, sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa. Desta

maneira, buscou valorizar a profissão docente que se processa nos primeiros anos do

ensino fundamental. A questão que guiou o presente trabalho foi: quais são as

representações sociais docentes sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua

portuguesa? Será neste Capítulo que iremos mostrar os possíveis indícios

representacionais acerca deste objeto de pesquisa.

Ao longo de aproximadamente três anos realizamos 156 contatos

diferenciados para alcançar os indícios de representações sociais. Primeiramente,

realizamos um estudo piloto para conhecer o universo nocional. Nesta etapa,

conversamos com seis professoras, a partir de entrevistas. Posteriormente, realizamos a

segunda fase, a coleta dos materiais, neste momento, foram contatadas 100

professoras, nos valendo do uso da técnica de associações livres para identificar a

estrutura das representações sociais. Finalmente, na terceira fase de recolha de textos

de campo, entrevistamos 50 professoras. Algumas profissionais concederam mais de

um diálogo conosco, nesta etapa tivemos a oportunidade de conhecer o conteúdo

representacional em formato contextualizado.

Os dizeres professorais foram gravados, transcritos e organizados com o

auxílio de dois programas computacionais. O software EVOC foi utilizado para processar

o material coletado com a técnica de evocações livres e o software ALCESTE foi usado

para processar os textos de campo recolhidos nos momentos de entrevistas. Norteados

pelos fundamentos da Teoria das Representações Sociais, da Teoria do Núcleo

Central e de conhecimentos das áreas de Formação de Professores e da Linguagem

elaboramos nossas compreensões considerando a especificidade de cada

organização dos materiais recolhidos.

No capítulo anterior, apresentamos os textos de campo em formato

separado considerando a especificidade das técnicas utilizadas de recolha e de

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processamento dos materiais. Neste item, após realizar uma possível comparação

entre todos os materiais coletados, mostraremos três possíveis indícios de

elementos constitutivos das representações sociais sobre o processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa. Apresentaremos separadamente estes

elementos, mas, consideramos que todos estabelecem relações entre si, portanto,

influenciam a constituição das representações sociais. Ressaltamos que os títulos

que abrem a apresentação dos elementos que formam a representação social sobre

o processo educativo são construções elaboradas a partir dos dizeres docentes.

Escolhemos intitular as subdivisões deste capítulo fazendo uso de elementos

principais apresentados pelo grupo professoral. Posteriormente, serão expostas as

nossas considerações finais.

4.1 O processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa na escola é

importante e necessário

Os resultados desta pesquisa mostram que as professoras contatadas

fomentam processos educativos carregados de valores sociais, que trazem uma alta

valorização do uso correto da língua portuguesa na vida das crianças. Elas avaliam

positivamente o uso correto da língua na sociedade. Consequentemente, dizem que

o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa na escola é importante e

necessário para a formação do sujeito e para uma adequada inserção social.

A língua portuguesa, os processos educativos e a prática de leitura são

indissociáveis em termos de atribuição de valores por parte do grupo professoral.

Esta grande proximidade de elementos organiza as representações sociais docentes

em torno da valorização social do uso da língua padrão, norma culta, na sociedade.

Logo, esta grande valorização fomenta outras que tratam da importância de ensinar

seu conteúdo na escola, principalmente promovendo práticas de leitura.

O termo leitura foi o mais frequente entre todos os outros termos

apresentados pelas professoras. Foi o elemento mais central da representação

social docente, comparecendo em todos os Núcleos Centrais dos elementos

estruturais identificados na segunda fase da pesquisa. Semelhantemente, nos textos

de campo advindos das entrevistas, o elemento leitura compareceu de forma

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importante em uma das classes sistematizadas pelo software ALCESTE. Vejamos o

elemento gráfico a seguir:

Ilustração 8 Pirâmide de relações entre elementos que contribuem para a formação da

representação social docente sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa

Esse esquema de elementos, em formato de pirâmide, apresenta uma

possível relação hierárquica e de interconexão entre dois importantes elementos que

formam a representação social docente. O componente maior, na parte inferior,

simboliza a valorização da sociedade para o uso correto da língua, e que passa por

um estreitamento de baixo para cima para inserir e interferir no processo educativo

que ocorre dentro da escola e, ambos trazem implicações para o último nível da

pirâmide: a prática de leitura.

Essa figura ilustra a representação social docente sobre o processo de

ensino-aprendizagem da língua portuguesa na escola. Ela é constituída por

elementos ancorados na valorização social para o uso apropriado da língua na

sociedade, e por elementos objetivados nas práticas frequentes de leitura em sala

de aula. Tivemos a oportunidade de observar que as docentes objetivam o ato de ler

como uma representação cuja prática desencadeia todos os outros processos

educativos. Deste modo, as professoras compreendem o ensino da língua

portuguesa como uma prática de leitura; sendo esta o carro chefe que guia as outras

práticas educativas.

Leitura

O ensino e a aprendizagem da língua na escola

Valorização da sociedade

para o uso correto da língua portuguesa

Processo de ancoragem

Processo de objetivação

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4.2 O/a aluno/a leitor/a é um/a aluno/a escritor/a

O termo escrita compareceu no material textual coletado como sendo

um elemento menos importante que a leitura, pois, foi ranqueado em segundo lugar

no processamento estatístico junto aos softwares EVOC e ALCESTE. Todavia, as

palavras leitura e escrita são os elementos estruturais mais frequentes e

prontamente evocados pelo grupo. Observamos que existe uma força de atração

entre as práticas de leitura e de escrita nas formações imaginárias, pois é comum

encontrarmos nos conteúdos advindos das falas das professoras a normatização

“Os alunos precisam ler muito para escrever melhor”. Ademais, o relatório do

programa ALCESTE destacou a relação entre as práticas de leitura, de escrita e de

reestruturação de textos elaborados pelos/as alunos/as para uma possível correção

ortográfica. Observemos o próximo esquema:

Ilustração 9 Relações entre elementos da representação social docente sobre o processo de

ensino-aprendizagem da língua portuguesa

Essa figura mostra relações entre os elementos principais da

representação social docente. O tema da pesquisa, sendo ele o processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa, foi exibido no centro. Ao entorno dele, a prática

O processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa

Leitura

Conteúdos

Gramaticais Escrita

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de leitura foi simbolizada na parte superior para destacar a sua importância para o

grupo de professoras. Abaixo do tema, foram simbolizadas as práticas de escrita e

os conteúdos advindos da gramática.

Esse esquema simboliza o segundo indício de elementos da

representação social docente encontrado na pesquisa. As professoras representam

que o princípio fundamental a ser traçado dentro do processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa é o fomento a prática de leitura.

Consequentemente a prática de leitura norteia outras práticas, como a escrita de

textos que seguem as regras ortográficas da língua portuguesa.

4.3 Facilidades e dificuldades enfrentadas pelas profissionais no processo

educativo

Na segunda fase da coleta, observamos que nos elementos estruturais

da representação, constituídos a partir da pergunta sobre ensino da língua, não

apareceram termos consensuais que revelam imagens de práticas professorais

consideradas difíceis; por outro lado, quando as professoras falaram sobre a

aprendizagem, anunciaram frequentemente o termo dificuldade, apontando para

diversos problemas que elas depararam em seu ofício e que comprometem a

aquisição apropriada da língua pelo/a aluno/a. Além disso, na terceira fase de

recolha de materiais, identificamos alguns conteúdos das falas das professoras que

contêm a imagem que representa dificuldades advindas da prática pedagógica,

principalmente, em se tratando do processo de alfabetização de crianças.

Observemos o próximo elemento gráfico:

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Ilustração 10 Relação entre as facilidades e as dificuldades do processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa apresentadas pelas professoras

Esse esquema foi usado para mostrar a comparação entre as

facilidades e as dificuldades no processo de ensino-aprendizagem de língua

portuguesa apresentadas pelas professoras. O lado esquerdo da figura simboliza os

principais elementos que facilitam a prática pedagógica, conforme o material

recolhido em campo. O lado direito da imagem simboliza os elementos com maior

frequência ditos pelas docentes que dificultam a prática pedagógica.

A partir dos textos de campo, tivemos a oportunidade de saber que as

professoras consideram que as práticas ocorrem de uma melhor forma quando as

crianças têm interesse em aprender e, além disso, elas dizem que quando o

processo educativo é também assistido pela família dos/as alunos/as o seu

transcorrer é facilitado. Contudo, as docentes falam que a falta destes dois

elementos na prática educativa traz muitas dificuldades.

Além disso, elas dizem que encontram alunos/as no 4º ou 5º ano do

ensino fundamental que ainda não estão alfabetizados. O processo de alfabetização

é avaliado como o período fundamental no processo de ensino-aprendizagem,

todavia passa por muitos problemas. As professoras consideram que a alfabetização

não termina no 2º ano. Embora, entendam que, neste período, as crianças já

deveriam ter se apropriado das práticas de ler e escrever de forma autônoma, algo

que ainda não se vê com frequência.

Algumas possíveis causas que geraram estas dificuldades foram

Facilidades Dificuldades

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apresentadas pelas professoras. Elas dizem que a sociedade se transformou, agora

existe uma exigência maior para que as pessoas saibam ler e escrever, mas os

diversos veículos de transmissão de informações que se inserem fora das

instituições de ensino concorrem com a prática educativa escolar. Elas falam

também que os/as alunos/as preferem assistir televisão a ler um livro e que os

responsáveis pelas crianças precisam trabalhar, por isto, não acompanham o

desenvolvimento escolar dos seus filhos.

Para saber lidar com esses elementos que geram dificuldades na

realização das práticas educativas, as docentes buscam soluções para os problemas

que surgem, utilizando práticas de ensino inovadoras. Para elas, se faz necessária a

superação de práticas obsoletas que não trazem a assimilação efetiva dos

conteúdos pelas crianças. As atividades lúdicas são consideradas como ferramentas

de superação de tais procedimentos considerados arcaicos, trazendo um caráter de

mudança para a prática educativa. Entendemos que as professoras falam de suas

atuações indicando a utilização de métodos lúdicos como sendo possibilidades

formativas para que o ensino da língua promova motivações nas crianças e uma

melhor assimilação dos conteúdos trabalhados.

As professoras recebem diversas influências históricas e sociais para a

realização de seus ofícios, como por exemplo, leis, normas, valores sociais que a

família e a sociedade carregam a respeito de como o ensino e a aprendizagem da

língua portuguesa deveria ocorrer nas escolas, como também, os valores de

importância da língua portuguesa para a sociedade, entre outros. De forma

complementar, talvez a primeira, as professoras ensinam aquilo que aprenderam.

Ou seja, ensinam os conceitos e técnicas com os quais foram alfabetizadas.

Nesta sociedade, compreendida como espaço de partilha e de vínculo

social, imersa em contextos ideológicos e históricos, lugar em que os sujeitos

constroem suas inscrições sociais - posição, lugar, função social, pertença grupal - e

organizam suas relações com os outros e com o mundo em atos interpessoais,

institucionais, grupais e inter-grupais, as professoras estão dentro de uma grande

teia de elementos que se inter-relacionam e que produzem efeitos diversos e, assim,

fomentam formas de ser e agir na profissão de professor/a.

Dentro dessa rede de elementos, os/as profissionais professores/as

constroem seu ofício. Desta maneira, o principal efeito desta sua inscrição social em

um espaço múltiplo é uma exigência para que conheçam todos os elementos

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contidos na prática educativa e saibam lidar no plano singular de cada elemento,

como também, no plano plural de relações entre elementos que se influenciam entre

si.

4.4 Considerações finais

Este trabalho se insere dentro de quatro campos de compreensões. O

primeiro deles trata sobre a importância de identificar e conhecer os saberes sociais

construídos nas interações e nos processos comunicacionais entre as pessoas e

grupos, valorizando esta construção em conjunto, na partilha de conhecimentos

entre as pessoas, nas trocas de valores, atitudes e opiniões entres sujeitos para que

possam entender os elementos que se fazem presentes em determinada realidade

social. (MOSCOVICI, 2003).

O segundo campo de compreensões vincula-se a área da Formação de

Professores. Entendemos que os saberes docentes não são adquiridos apenas nos

cursos universitários, como também em outros vários espaços em que o/a

profissional se insere ao longo de sua existência. A universidade não é o único

espaço que disponibiliza saberes sobre o que venha a ser o processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa na escola, mas todos os espaços em que os

profissionais se inscrevem socialmente trazem elementos que possibilitam a

construção de significações acerca desta prática. (TARDIF, 2000). Ao longo de sua

vida, a pessoa que se faz professor/a recebe saberes advindos dos universos

reificados e dos universos consensuais, desta maneira, ele/a utiliza estes saberes

adquiridos como âncoras de entendimentos prévios para que possam se apropriar

de novos entendimentos a partir dos saberes adquiridos anteriormente. (MARCELO,

2009a, 2009b, 1999).

O terceiro campo de compreensão considera que a interação do ser

humano com o mundo não é direta e sim mediada. Os símbolos e significações

construídos nesta relação são elementos intermediários entre o sujeito e a realidade

que o cerca. Desta maneira, entendemos que os/as professores/as em ofício não se

unem a determinada interação senão por meio de outra. Esta mediação pode

ocorrer a partir das interações entre as pessoas promovidas pela linguagem e pelas

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práticas sociais e entre os sujeitos e os objetos físicos. Portanto, é através do

processo de mediação que o sujeito se humaniza. (VYGOTSKY, 2007).

O último campo de compreensões considera que o processo de

ensino-aprendizagem da língua portuguesa na escola é contínuo e progressivo. Esta

sequência educativa contribui para que as crianças se apropriem de forma autônoma

das práticas de ler, escrever, ouvir, falar e de construir significados sobre o que

aprenderam em sala de aula, na escola e na sociedade em que se inserem, para

que, finalmente, fomentem compreensões sobre o mundo e seus seres. (SMOLKA,

1988).

Falando a partir destes quatro campos de compreensões, o presente

trabalho observou que o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa na

escola é composto por vários elementos que influenciam a prática pedagógica.

Alguns deles são: os próprios sujeitos, os tipos de relacionamentos estabelecidos

entre as pessoas, as diferentes práticas educativas, os valores sociais, as normas

institucionais. Dentre estes variados componentes, observamos que as docentes

selecionam aqueles que mais atendem às demandas que se apresentam na prática

educativa.

Neste momento (2012), os dizeres docentes sobre o processo de

ensino-aprendizagem da língua portuguesa, que ocorre nas escolas públicas

municipais de Jataí-Goiás, apresentam uma grande valorização social para o uso

correto da língua na sociedade, e mostram indicativos de direcionamentos

apresentados em cursos de formação continuada sobre novas compreensões sobre

como ensinar a língua portuguesa na escola. Identificamos que as docentes se

mobilizam, principalmente, para atender a estas duas demandas.

Nessa mobilização, as professoras selecionam alguns dos elementos

contidos no processo educativo e nos dizem que promovem o processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa, principalmente, fomentando mediações de

práticas de leitura, escrita e reestruturação de texto, a primeira mais valorizada que

as outras. Isto atende a primeira demanda apresentada ao grupo acerca da

valorização social do uso correto da língua. Observamos que todo o grupo não

apresenta pensamento contraditório a este, assim, todas as professoras colaboram

com a promoção desta valorização dentro da escola e buscam fomentar práticas que

contribuem para a sua realização.

Por outro lado, nos dizem que os conhecimentos sobre como ensinar a

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língua portuguesa na escola mudam constantemente. Falam que o ensino escolar

do município passa frequentemente por modificações, principalmente nos projetos

didático-pedagógicos ou político-pedagógicos. Elas nos dizem que o processo

educativo é amparado por projetos que são substituídos conforme o grupo

administrativo da Secretaria Municipal de Educação que atua no momento, pois

quando as pessoas saem da gestão da Secretaria, também saem os projetos que

orientavam as suas práticas. Além disso, falam que os conhecimentos científicos

mudam constantemente e uma prática que antigamente era consolidada como

apropriada agora é vista como tradicional e inapropriada.

Perante as modificações conceituais e metodológicas, a maioria resiste

ao saber apresentado como novo considerando que apenas mudou o seu nome,

mas as práticas não foram alteradas. Por exemplo, a denominação ensino seriado

foi substituída para ensino de nove anos, todavia elas consideram que o ensino

promovido parece o mesmo em relação ao anterior. As professoras lidam com os

novos conhecimentos que se apresentam fazendo comparações com aqueles já

adquiridos e identificam mais semelhanças do que diferenças entre eles. Portanto,

identificamos que elas consideram que existem muitas semelhanças, por este

motivo, as práticas educativas não precisam ser submetidas a grandes mudanças.

Além disso, as professoras falam que a sociedade atual passa por uma

partilha mais veloz de conhecimentos entre pessoas em comparação àquela de

antigamente. Elas consideram que a escola de antes era diferente desta de hoje.

Atualmente, os/as professores/as precisam atentar para a grande quantidade de

informações e saberes que circulam entre pessoas, por meio das conversações

entre pessoas nos diferentes espaços físicos e virtuais existentes. Portanto,

observamos o entendimento que ser professor/a nas escolas de tempos anteriores é

diferente de ser professor/a nas instituições de hoje. Desta forma, a exemplo das

mudanças conceituais e atitudinais ocorridas nas últimas décadas, observa-se a

preocupação das professoras ao novo jeito de pensar, de fazer e de entender os

conceitos paradigmáticos da educação do século XXI. A autoridade dá lugar à

mediação. A transmissão do conhecimento dá lugar ao desenvolvimento da

capacidade de aprender.

Para Marcelo (2009, p. 110), estamos vivendo em uma sociedade do

conhecimento que exige cada vez mais atualização, permanente aprendizado e

formação de seus cidadãos para que possam lidar com as constantes mudanças em

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suas vivências, e “o valor das sociedades atuais está diretamente relacionado com o

nível de formação de seus cidadãos e da capacidade de inovação e

empreendimento que eles possuam”.

Diante do exposto, compreendemos, a partir dos materiais textuais

recolhidos, que as professoras apontam para a existência de um feixe de forças que

saem dessa sociedade do conhecimento e exigem competência docente e sucesso

educativo. Desta forma, todas as professoras entrevistadas têm informações,

opiniões e crenças sobre o trabalho educativo, a simbologia que envolve os

conceitos e preconceitos sobre o ensino da língua portuguesa, a formação de bons

leitores.

Como vimos anteriormente, a diferença da realização deste ofício ao

longo dos anos não é trazida pelos projetos didático-pedagógicos ou pelas novas

compreensões sobre o processo educativo. Conforme as docentes, a diferença é

trazida pelas circulações de informações e saberes contidos na sociedade. Portanto,

o pensamento docente identificado mostra que o aumento das trocas de ideias entre

as pessoas muda o tipo de sociedade e influencia a necessidade de um novo perfil

profissional para o/a professor/a.

Além disso, as docentes nos disseram que quando elas eram alunas,

em escolas de tempos anteriores, os valores estabelecidos na relação entre

professor/a e alunos/as eram diferentes destes atuais. Elas disseram que, na época

em que eram alunas, o/a professor/a era valorizado/a - respeitado/a - pelos/as

alunos/as e suas famílias, como também pela sociedade. Por outro lado, elas dizem

que nos dias de hoje o/a aluno/a não aceita o conhecimento advindo do/a

professor/a de forma inquestionável, este conhecimento é questionado com

frequência. Os conhecimentos apresentados no ambiente escolar são menos

atrativos que aqueles disponibilizados na Internet e na televisão. Elas entendem que

existe um universo mais atrativo do que o da escola, por este motivo, as professoras

se veem em uma demanda diferente em relação aos seus próprios professores do

passado.

A comparação entre a escola de tempos anteriores e a escola da

atualidade contribuiu para a formação de atribuições de valores para os processos

construídos atualmente, como por exemplo, elas consideram que os/as alunos/as de

antes eram mais interessados e hoje os discentes são mais desinteressados/as;

antigamente, a família participava do processo educativo de seus filhos, hoje ela é

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ausente. Estas comparações geraram um estranhamento (MOSCOVICI, 2003) em

relação a estes novos valores trazidos por esta nova geração de alunos/as.

Segundo Marcelo (1999), muitas investigações sobre o pensamento do/a

professor/a que intencionam compreender o saber dos/as professores/as concernente

aos conteúdos que ensinam e sobre as práticas que fomentam apontam a existência de

elaborações de teorias advindas da prática docente, que possibilitam a construção de

destrezas diversas, de atitudes e disposições professorais que alcançam níveis de

reflexões idiossincráticos, ao mesmo tempo, inseparáveis das influências sociais.

Mesmo considerando a singularidade dos sujeitos e dos processos formativos que

fomentam, buscamos conhecer e compreender as significações construídas socialmente

por professoras sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa a partir

de conhecimentos compartilhados pelo grupo, a partir das representações sociais

elaboradas sobre esta prática educativa.

A partir de todos estes resultados obtidos na pesquisa, podemos

considerar que não existe uma mobilização, no ofício professoral, de todos os

elementos contidos no processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa na

escola, pois as professoras selecionam alguns elementos em detrimento de outros, a

partir da demanda que se apresenta urgente em determinado momento que ocorre a

prática educativa na sala de aula. As articulações entre todos os elementos contidos

em determinada prática educativa são realizadas em consonância com as fases de

desenvolvimento profissional e de formação que as professoras estão passando,

como também estão relacionadas com a própria trajetória de experiências pessoais

e profissionais que elas vêm construindo ao longo de suas vidas.

Os resultados dessa pesquisa apontam para a necessidade de

mudanças no processo de formação continuada de professores/as, progresso e

construção do próprio conhecimento, bem como que todos os envolvidos na

educação tenham acesso a estudos, pesquisas e práticas pedagógicas que

favoreçam e permitam decisões adequadas ao processo de ensino-aprendizagem,

entendendo-a na sua totalidade.

Além disso, a necessidade de reflexões comparativas entre a escola de

ontem, imaginada pelo/a professor/a enquanto aluno/a no passado e a escola de

hoje vista pelo/a professor/a, implica em construir caminhos sobre como superar as

dificuldades dentro do processo educativo se fazem necessárias e finalmente, outras

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compreensões necessitam ser fomentadas sobre a rede de relações entre os

elementos que compõem a prática educativa.

Essa preocupação vem sendo estudada por Tardif (2000, 2002) há

alguns anos. Ele nos ensina sobre a importância da realização de estudos e

pesquisas baseados nos saberes profissionais dos/as professores/as, de como eles

os utilizam e mobilizam nas suas práticas cotidianas: “Essa tarefa supõe que os

pesquisadores universitários trabalhem nas escolas e nas salas de aula em

colaboração com os/as professores/as, vistos não como sujeitos ou objetos de

pesquisa, mas [...] como co-elaboradores da pesquisa sobre seus próprios saberes

profissionais”. (TARDIF, 2000, p. 20).

Norteados pelas ideias de Tardif (2000, 2002), como também,

fundamentados pela Teoria das Representações Sociais de Moscovici (1978, 2003)

e pela Teoria do Enunciado de Bakhtin (2006), compreendemos que os saberes e as

representações sociais dos/as professores/as construídos em exercício professoral

formam os sujeitos enquanto profissionais. Diante do exposto, entendemos que as

relações entre as pessoas em seus variados níveis de interlocução promovem a

própria constituição dos sujeitos sociais.

Além da necessidade de saber lidar com cada elemento que constitui o

processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa na escola, os/as

professores/as necessitam compreender a rede de relações entre os elementos na

sua totalidade. Os/as professores/as precisam saber lidar não apenas com um

elemento, como também necessitam saber lidar com todos eles em relações de

interferências mútuas. Identificamos, assim, a importância de construir

caracterizações de cada elemento que compõe o processo educativo, como,

também, de elaborar uma possível sistematização das relações estabelecidas entre

eles.

Como apresentamos anteriormente, as possíveis representações

sociais docentes sobre o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa na

escola estão nucleadas pela prática de leitura, sucessivamente, pela prática da

escrita, de reestruturações de textos conforme as normas ortográficas. Entretanto,

para Smolka (1988), a aquisição da escrita nas crianças precisa ser inserida em uma

importante dimensão, a interdiscursividade, pois ela insere a feição

fundamentalmente social da escrita: para que, para quem, onde, como, por quê?

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Essas questões são norteadoras para a prática professoral, pois

apresentam o aspecto interdiscursivo que rege toda a prática educativa. Os

processos educativos que não trabalham com esta dimensão continuam sendo

chamados de mecânicos, uma vez que utilizam a memorização de regras da língua

portuguesa, esquecendo-se da reflexão para uma prática educativa significativa para

a vida do sujeito. Pois, o ato da transformação das relações entre o ensino e a

aprendizagem da língua portuguesa, não é resultado apenas de procedimentos

metodológicos; é, por excelência, resultado de uma proposta política e pedagógica

da escola, do/a professor/a e da instituição educacional, na viabilização de meios e

de informações e formações teóricas capazes de oferecer aos/as professores/as

uma nova compreensão da aprendizagem como sendo um procedimento

metodológico, político e social, inserido numa realidade plural, determinada por

elementos intra e extra escolares.

Partindo do exposto, compreendemos que precisamos propor uma

sintonia de entendimentos acerca das funções dos vários elementos que compõem

o processo educativo e também necessitamos construir compreensões sobre as

diversas influências que estes elementos estabelecem entre si dentro de uma

grande teia de relações. Isto significa construir um plano de ligações entre os

elementos e um acordo mútuo entre todos os sujeitos que participam da prática

educativa para a realização de um objetivo comum: promover processos de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa na escola que contemplem os conhecimentos

gramaticais, os desempenhos linguísticos orais e escritos e principalmente que

fomentem compreensões sobre o mundo, seus objetos e seres.

Conforme Zeichner (2008, p. 546), “Os professores devem agir com

uma clareza política maior sobre quais interesses estão sendo privilegiados por meio

de suas ações cotidianas. Eles podem ser incapazes de mudar alguns aspectos da

situação atual, mas ao menos estão conscientes do que está acontecendo”. Partindo

desse pressuposto, o respeito pela outridade no processo educativo e investigativo

pode nos direcionar para práticas mais solidárias. Todos nós precisamos refletir

sobre o ‘outro’ nas nossas relações: “[...] as crianças podem falar o que pensam na

escola? Podem escrever o que falam? Podem escrever como falam? Quando? Por

quê?” (SMOLKA, 1988, p. 63). Os/as professores/as podem falar o que pensam na

escola? Os/as professores/as podem escrever o que falam? Podem escrever como

falam? Quando? Por quê? Os/as pesquisadores/as podem falar o que pensam na

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academia? Podem escrever o que falam? Podem escrever como falam? Quando?

Por quê? Estes questionamentos são estendidos para outros locais sociais. Refletir

sobre o papel de cada sujeito e de suas relações leva para a busca de uma

compreensão do papel social dos grupos para a promoção de melhorias para todos.

Vamos, todos juntos, compreender que, muitas vezes, não escutamos

as várias vozes e desconsideramos os silêncios que influenciam a prática educativa

e investigativa, a construção identitária e social de professores/as, alunos/as,

pesquisadores/as, levando para a constituição de um processo educativo e

investigativo estruturado, principalmente, por específicos elementos em detrimento

de outros. As seleções são reais em mundo cheio de diferenças, e podem ser

entendidas como discordâncias apropriadas para uma evolução social, mas são, em

determinados pontos, prejudiciais, pois, se não existem acordos, união de

entendimentos para uma compreensão social da prática educativa, cada sujeito

realiza o processo de ensino-aprendizagem da língua com objetivos diferentes e,

consequentemente, utilizam mobilizações variadas de elementos.

Como desafios para superar a prática pedagógica do ensino de língua

portuguesa fragmentado, de um discurso social valorativo da norma culta, está a de

se buscar meios necessários para assegurar um ensino dinâmico, no qual seja

possível trabalhar a aprendizagem como um processo que leva em consideração a

cultura vigente e a sua transformação, como condição fundamental para a promoção

do conhecimento. Significa dizer que a aprendizagem vai além de se trabalhar um

conteúdo em todas as suas possibilidades de conhecimentos. É também uma

revisão da prática pedagógica do/a professor/a, que, dentre outros elementos,

precisa se empenhar para elaborar e colaborar na construção de um conhecimento

consequente.

Para tanto, será necessário uma formação consequente que subsidie

aos pensamentos e às práticas pedagógicas. Isto é, para intervir numa determinada

realidade, neste caso, nos discursos professorais consolidados. Mais do que

entendimento sobre o ensino da língua portuguesa, os conhecimentos advindos de

estudos ou formação continuada oferecerão condições para determinar que ações

pedagógicas poderão ser desenvolvidas para gerar atitudes novas, que levem à

participação e ao questionamento e, consequentemente, à transformação do que ora

se apresenta como absoluto. Portanto, precisamos construir uma sintonia de

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entendimentos. Isso significa promover um acordo mútuo entre todos para a

realização de um projeto educativo comum.

Finalmente, ressaltamos a necessidade da abertura de um espaço na

escola para que todos/as os/as professores/as possam construir uma síntese

possível sobre o trabalho desenvolvido na sala de aula. Desta maneira, eles/as terão

a oportunidade de ressignificar a prática educacional, para que possam mobilizar e

articular todos os elementos contidos na prática educativa, em sintonia com a busca

da qualidade para o processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa na

escola.

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APÊNDICE A - Roteiro de entrevista - estudo piloto – 1ª fase

ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA OS PROFESSORES

INFORMATIVOS CENSITÁRIOS

1 Escola em que trabalha:

2 Formação: ( ) ensino médio ( ) ensino superior ( ) especialização ( ) outros – Qual: __________ Completo: ( ) Sim ( ) Não

3 Participação em cursos de capacitação: ( ) sim ( ) não – Quantos por ano?

4 Sexo: ( ) Feminino ( ) Masculino

5 Idade:

6 Tempo de profissão como professor (a):

7 Tempo de serviço na educação:

8 Tempo de serviço na escola:

9 Vinculo Empregatício atual: ( ) Efetivo ( ) Contratado

10 Carga Horária: ( ) 20 horas ( ) 30 horas ( ) 40 Horas

QUESTÕES

SOBRE AS ATIVIDADES DE LEITURA E ESCRITA, POR GENTILEZA, APRESENTE SUA OPINIÃO: 1. O que as pessoas acham que seja leitura? 2. De um modo geral, qual é a importância que as pessoas dão às atividades de leitura? (sociedade, família, escola, professores, alunos). 3. Quais as dificuldades que normalmente têm os alunos nas atividades de leitura? 4. Quais as facilidades que normalmente têm os alunos nas atividades de leitura? 5. Quais as dificuldades que os professores mencionam quando ensinam a ler? (nas salas de crianças alfabetizadas). 6. Quais as facilidades que os professores mencionam para ensinar leitura? 7. . O que as pessoas acham que seja escrita? 8. Qual é a importância de escrever? 9. Quais as principais dificuldades dos alunos nas atividades de escrita? 10. Quais as principais facilidades dos alunos nas atividades de escrita? 11. Quais as dificuldades dos professores para ensinar a escrever? 12. Quais as facilidades dos professores para ensinar escrever? 13. Gostaria de contribuir com outras informações? Se a resposta é positiva, o quer gostaria de falar, dentre o que não foi perguntado, sobre o processo de ensino e aprendizagem da leitura e da escrita?

Obrigada pelas suas contribuições!

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APÊNDICE B – Lista de trabalhos sobre a língua portuguesa, localizados no

Portal Domínio Público, com informações da Plataforma Lattes

Título da tese/dissertação Título obtido

Ano da

defesa Formação do autor/a

1 A aprendizagem da língua portuguesa como segunda língua para os surdos: contribuições de estratégias metalingüísticas em língua de sinais

Dr. 2009

Graduação em Fonoaudiologia

Mestrado em Educação Especial

Doutorado em Educação

2 Aspectos mediadores e a identidade docente na sociedade contemporânea: o contexto do ensino de língua portuguesa

Dr. 2009

Graduação em Letras (Português/Inglês)

Mestrado em Estudos Literários

Doutorado em Educação

3 Atividade e sentido: análise de propostas de trabalho em língua portuguesa para quintas e sextas séries do ensino fundamental

Me. 2009 Graduação em Letras

Mestrado em Educação

4

Concepção de educação, formação de professores e ensino de língua portuguesa: história e memória nos anos 50 e 60 do século XX

Me. 2006 Graduação em Letras

Mestrado em Educação

5 Do quadro de giz ao teclado do computador: contextos educativos e desafios à formação do professor de língua portuguesa

Me. 2005

Graduação em Letras (Vernáculas)

Graduação em Pedagogia Mestrado em Educação

6 Educação lingüística continuada: a formação do professor com base nos PCN de língua portuguesa

Me. 2008 Graduação em Letras

Mestrado em Educação

7 Ensino de língua e metodologia de projetos: o caso do ensino médio no CEFET de Uberaba

Me. 2007

Graduação em Letras Mestrado em Educação

Agrícola Doutorado em Agronomia

8 Ensino de língua portuguesa: desafios e encantamentos

Me. 2007 Graduação em Letras

Mestrado em Educação

9 Ensino de português em cursos superiores: razões e concepções

Me. 2009 Graduação em Letras (Português, espanhol)

Mestrado em Educação

10 Escola e histórias em quadrinhos: o agon discursivo

Dr. 2007 Graduação em Letras Mestrado em Letras

Doutorado em Educação

11 Estudo sobre os usos de mecanismos de coesão referencial na produção escrita de alunos de 5ª série

Me. 2010 Graduação em Letras

Mestrado em Educação

12 Eu iscrevu em internetês: o discurso de professores de língua portuguesa sobre a escrita na/da internet

Me. 2009 Gaduação em Letras

(Português/Inglês) Mestrado em Educação

13 Gêneros orais e ensino: trajetórias da construção do conhecimento pessoal prático na paisagem escolar

Dr. 2009 Graduação em Letras Mestrado em Letras

Doutorado em Educação

14 Ideias lingüísticas constitutivas do pensamento de João Wanderley Geraldi sobre o ensino de língua portuguesa

Dr. 2010 Graduação em Letras

Mestrado em Educação

15 Internetês: uma dentre as possíveis influências na escrita da internet sobre a escrita dos discentes do quarto ciclo do ensino fundamental

Me. 2010 Graduação: não publicada Mestrado em Cognição e

Linguagem

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em três escolas (pública e privadas) de Campos dos Goytacaze

16 Jogos Pedagógicos: uma experiência em Lingua Portuguesa, no ensino médio

Me. 2001 Graduação: Não

publicada Mestrado em Educação

17 Leitura do fotojornalismo na escola: uma experiência com alunos da escola básica

Me. 2008

Graduação em Letras (Português, Inglês,

Espanhol e respectivas literaturas)

Graduação em Administração de

Empresas Mestrado em Educação

18 Língua portuguesa: incluir e participar para exercer a cidadania

Me. 2009

Graduação em Letras (Português-Inglês)

Mestrado em Educação Agrícola

19 O aluno surdo no ensino médio da escola pública: o professor fluente em libras atuando como intérprete

Dr. 2007

Graduação em Pedagogia Mestrado em Educação

Especial Doutorado em Educação

Escolar

20 O efeito de histeresis na constituição do habitus linguístico do professor de língua portuguesa

Dr. 2009 Graduação em Letras

Mestrado em Lingüística Doutorado em Lingüística

21 O jogo da enunciação em sala de aula e a formação de sujeitos leitores e produtores de textos

Me. 2009

Graduação em Pedagogia Mestrado Acadêmico em

Educação Doutorado em Educação

22 O jornal televisivo e o ensino/aprendizagem integrado de português língua materna e francês língua estrangeira

Dr. 2008 Currículo lattes não

publicado

23

O papel da disciplina língua portuguesa no desenvolvimento da oralidade do técnico agrícola para o exercício de sua função de agente rural

Me. 2008 Graduação: não publicada

Mestrado em Educação Agrícola

24 O professor regente, o professor orientador e os estágios supervisionados na formação inicial de futuros professores de letras

Me. 2009 Graduação em Letras

(Português/Inglês) Mestrado em Educação

25 O que é escrever bem? Com a palavra, os alunos do Ensino Médio

Me. 2008 Graduação em Letras

Mestrado em Educação

26 Organização e gestão da formação continuada dos professores de língua portuguesa no âmbito municipal: impasses e possibilidades

Me. 2010 Graduação em Letras

Mestrado em Educação

27 Representações de professores de Língua Portuguesa em formação acerca da profissão docente: mediações entre teoria e prática

Me. 2008

Graduação em Letras Mestrado em Educação Doutorado em Estudos

Lingüísticos

28 Um estudo sobre gramática e ensino da língua Dr. 2008 Graduação em Letras Mestrado em Letras

Doutorado em Educação

29 Um estudo sobre os significados atribuídos à língua portuguesa por surdos universitários

Me. 2007

Graduação em Pedagogia – (Educação Especial -

Deficiência Auditiva) Mestrado em Educação

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224

APÊNDICE C – Roteiro para evocações livres – 2ª fase

ESCOLA:________________________________________________

ROTEIRO PARA AS ASSOCIAÇÕES DE PALAVRAS

Este instrumento se destina à obtenção de dados para a elaboração de um trabalho acadêmico no Programa de Pós-Graduação em Educação da UFMT.

Sua colaboração é muito importante e eu lhe sou muito grata por ela.

DADOS CENSITÁRIOS 1 SEXO: ( ) Feminino ( ) Masculino 2 ÁREA DE FORMAÇÃO:________________________________ 3 TITULAÇÃO : ( ) Graduação ( ) Especialização ( ) Mestrado 4 TEMPO DE SERVIÇO COMO PROFESSOR: _________ anos 5 TRABALHA NA ALFABETIZAÇÃO: ( ) Sim ( ) Não

QUESTÕES

Explicação: Eu lhe direi uma expressão e você me responderá dizendo as cinco primeiras palavras que vierem de imediato, a sua mente. Você deverá dizer as cinco palavras que lhe vierem à cabeça, palavras soltas mesmo, sem formar frases, que correspondam, aproximadamente, ao que seus colegas professores conversam sobre o assunto.

1. Apresente, POR FAVOR, CINCO palavras soltas, QUE NÃO FORMEM FRASES, PALAVRAS SOLTAS MESMO, que descrevam, caracterizem ou qualifiquem o que seus colegas professores falam sobre o

ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA:

1

2

3

4

5

Vamos, agora, retornar às palavras que você disse e ver se a ordem de importância delas deve ser mantida, ou modificada. Vamos numerar com 1 aquela que, no seu entender, é a mais importante; depois vamos marcar a segunda mais importante, e assim sucessivamente, está bem? Agora gostaria que você dissesse, de forma breve, Por que você escolheu cada uma dessas palavras? (Escrever a frase) Obs.: O pesquisador deve apresentar cada palavra evocada pelo sujeito e estimulá-lo a falar sobre cada uma delas. Preferencialmente, na sequência espontânea ditada pelo interlocutor, a fim de não excluir algum dos termos. 2. Apresente, POR FAVOR, CINCO palavras soltas, QUE NÃO FORMEM FRASES, PALAVRAS SOLTAS MESMO, que descrevam, caracterizem ou qualifiquem o que seus colegas professores falam sobre a

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225

APRENDIZAGEM DE LÍNGUA PORTUGUESA:

1

2

3

4

5

Vamos, agora, retornar às palavras que você disse e ver se a ordem de importância delas deve ser mantida, ou modificada. Vamos numerar com 1 aquela que, no seu entender, é a mais importante; depois vamos marcar a segunda mais importante, e assim sucessivamente, está bem? Agora gostaria que você dissesse, de forma breve, Por que você escolheu cada uma dessas palavras? (Escrever a frase) Obs.: O pesquisador deve apresentar cada palavra evocada pelo sujeito e estimulá-lo a falar sobre cada uma delas. Preferencialmente, na seqüência espontânea ditada pelo interlocutor, a fim de não excluir algum dos termos.

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APÊNDICE D – Elementos estruturais das representações sociais das professoras sobre o processo de ensino-

aprendizagem da língua portuguesa – motes hierarquizados por ordem de importância (OMI)

LÍNGUA PORTUGUESA

ELEMENTOS DO ENSINO ELEMENTOS DA APRENDIZAGEM

OMI < 3,00 ≥ 3,00

f NÚCLEO CENTRAL PRIMEIRA PERIFERIA

≥ 17

ATRIBUTOS F OME ATRIBUTOS F OME

Leitura 55 1,873 Produção 27 3,593

Escrita 40 2,875 Ortografia 20 4,100

Interpretação 23 2,652

Compreensão 18 2,500

< 17

ZONA DE CONTRASTE SEGUNDA PERIFERIA

ATRIBUTOS F OME ATRIBUTOS F OME

Conhecimento 16 2,625 Aprendizagem 12 3,667

Alfabetizacao 10 2,000 Dificuldade 12 3,417

Letramento 10 2,100 Oralidade 10 3,300

Necessário 10 2,600 Base 6 3,167

Importante 9 1,778 Gramática 6 4,167

Essencial 7 2,571

OMI < 3,00 ≥ 3,00

F NÚCLEO CENTRAL PRIMEIRA PERIFERIA

≥ 16

ATRIBUTOS F OME ATRIBUTOS F OME

Leitura 43 2,070 Produção 23 3,652

Escrita 32 2,844 Conhecimento 18 3,222

Dificuldade 21 2,905

Interpretação 17 2,647

< 16

ZONA DE CONTRASTE SEGUNDA PERIFERIA

ATRIBUTOS F OME ATRIBUTOS F OME

Importante 10 2,900 Oralidade 12 3,333

Desinteresse 9 2,667 Ortografia 11 3,091

Necessária 8 2,125 Complicada 7 3,286

Compromisso 7 2,714

Compreensão 6 2,833

Total de palavras do corpus: 500 Total de palavras diferentes: 159 Total de palavras dos quadrantes dos elementos estruturais: 291 Total de palavras do Núcleo Central: 136 Frequência mínima considerada no ponto de corte: 6

Total de palavras do corpus: 500 Total de palavras diferentes: 192 Total de palavras dos quadrantes dos elementos estruturais: 224 Total de palavras do Núcleo Central: 113 Frequência mínima considerada no ponto de corte: 6

Ilustração 11 Elementos estruturais das representações sociais

das professoras acerca do ensino da língua portuguesa - mote

hierarquizado

Ilustração 12 Elementos estruturais das representações sociais

das professoras referentes ao mote indutor aprendizagem da

língua portuguesa – mote hierarquizado

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APÊNDICE E – Roteiro de entrevista – 3ª fase

ROTEIRO DE ENTREVISTA

DADOS CENSITÁRIOS

1 Escola em que trabalha:____________________________________________ 2 Formação: ( ) ensino médio ( ) ensino superior ( ) especialização ( ) outros – Qual: _______________________ Completo: ( ) Sim ( ) Não 3 Participação em cursos de capacitação: ( ) sim ( ) não – Quantos por ano?________________________ 4 Sexo: ( ) Feminino ( ) Masculino 5 Idade: ___________ 6 Tempo de profissão como professor (a):___________________ 7 Tempo de serviço na escola:_______________________ 8 Vinculo Empregatício atual: ( ) Efetivo ( ) Contratado 9 Carga Horária: ( ) 20 horas ( ) 30 horas ( ) 40 Horas 10 Ano que leciona: ( ) 1 ano ( ) 2 ano ( ) 3 ano ( ) 4 ano ( ) 5 ano

PERGUNTAS 1 Como é o ensino da língua portuguesa? 2 Como é a aprendizagem da língua portuguesa? 3 Como são os relacionamentos entre professores e alunos no processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa? 4 Quais são as dificuldades encontradas pelos professores no processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa? 5 Quais são as facilidades encontradas pelos professores no processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa? 6 De um modo geral, qual é a importância que a família atribui ao processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa? 7 De um modo geral, qual é a importância que o aluno atribui ao processo de ensino-aprendizagem da língua portuguesa? 8 Como o professor se vê neste processo educativo? 9 Gostaria de contribuir com outras informações? Se a resposta é positiva, o quer gostaria de falar, dentre o que não foi perguntado, sobre o processo de ensino e aprendizagem de língua portuguesa?

Obrigada pelas suas contribuições!

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APÊNDICE F – Informativos censitários das participantes

Ind. Formação Tempo de serviço

(professor)

Tempo de serviço (escola)

Vínculo Carga horári

a

Ano (Série)

1 graduação 1 mês a 10 anos 1 mês a 10 anos efetivo 20 3

2 graduação 11 a 20 anos 11 a 20 anos efetivo 30 5

3 especialização 21 anos em diante 11 a 20 anos efetivo 40 2

4 especialização 11 a 20 anos 1 mês a 10 anos efetivo 30 5

5 especialização 11 a 20 anos 1 mês a 10 anos efetivo 30 1

6 graduação 1 mês a 10 anos 1 mês a 10 anos efetivo 30 3

7 graduação 1 mês a 10 anos 1 mês a 10 anos efetivo 60 2

8 graduação 11 a 20 anos 1 mês a 10 anos efetivo 40 2

9 especialização 11 a 20 anos 11 a 20 anos efetivo 40 1

10 especialização 21 anos em diante 11 a 20 anos efetivo 60 2

11 especialização 21 anos em diante 1 mês a 10 anos efetivo 40 3

12 graduação 11 a 20 anos 1 mês a 10 anos efetivo 40 2

13 especialização 11 a 20 anos 11 a 20 anos efetivo 40 3

14 graduação 11 a 20 anos 1 mês a 10 anos efetivo 30 1

15 graduação 1 mês a 10 anos 1 mês a 10 anos efetivo 40 3

16 especialização 21 anos em diante 1 mês a 10 anos efetivo 30 1

17 especialização 1 mês a 10 anos 1 mês a 10 anos efetivo 40 3

18 especialização 11 a 20 anos 1 mês a 10 anos efetivo 40 1

19 especialização 1 mês a 10 anos 1 mês a 10 anos efetivo 40 2

20 especialização 11 a 20 anos 1 mês a 10 anos efetivo 40 1

21 especialização 1 mês a 10 anos 1 mês a 10 anos efetivo 40 5

22 graduação 11 a 20 anos 1 mês a 10 anos efetivo 40 2

23 graduação 11 a 20 anos 11 a 20 anos efetivo 30 1

24 especialização 11 a 20 anos 1 mês a 10 anos efetivo 40 4

25 especialização 1 mês a 10 anos 1 mês a 10 anos efetivo 40 2

26 especialização 1 mês a 10 anos 1 mês a 10 anos efetivo 30 2

27 graduação 11 a 20 anos 11 a 20 anos efetivo 30 3

28 especialização 1 mês a 10 anos 1 mês a 10 anos contratado 20 2

29 especialização 11 a 20 anos 11 a 20 anos efetivo 40 1

30 graduação 1 mês a 10 anos 1 mês a 10 anos efetivo 40 1

31 especialização 1 mês a 10 anos 1 mês a 10 anos contratado 40 4

32 especialização 11 a 20 anos 1 mês a 10 anos efetivo 40 4

33 especialização 11 a 20 anos 1 mês a 10 anos efetivo 40 4

34 especialização 1 mês a 10 anos 1 mês a 10 anos contratado 40 5

35 graduação 11 a 20 anos 11 a 20 anos efetivo 40 3

36 graduação 1 mês a 10 anos 1 mês a 10 anos efetivo 30 2

37 especialização 11 a 20 anos 1 mês a 10 anos efetivo 40 2

38 especialização 11 a 20 anos 1 mês a 10 anos efetivo 40 2

39 especialização 1 mês a 10 anos 1 mês a 10 anos efetivo 20 3

40 especialização 11 a 20 anos 1 mês a 10 anos contratado 40 3

41 especialização 1 mês a 10 anos 1 mês a 10 anos contratado 40 1

42 graduação 11 a 20 anos 11 a 20 anos efetivo 20 2

43 especialização 11 a 20 anos 1 mês a 10 anos efetivo 60 2

44 especialização 1 mês a 10 anos 1 mês a 10 anos efetivo 40 1

45 especialização 21 anos em diante 1 mês a 10 anos efetivo 30 3

46 especialização 11 anos a vinte anos 1 mês a 10 anos efetivo 30 5

47 especialização 21 anos em diante 1 mês a 10 anos efetivo 40 5

48 especialização 11 anos a vinte anos 11 a vinte anos efetivo 60 1

49 especialização 1 mês a 10 anos 1 mês a 10 anos efetivo 60 3

50 especialização 11 anos a vinte anos 11 a vinte anos efetivo 60 3

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ANEXO A – Autorização para entrada dos/as pesquisadores/as nas

escolas

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ANEXO B – Aprovação do projeto da pesquisa junto ao Comitê de Ética

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