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ISSN: 1984-6444 | http://dx.doi.org/10.5902/1984644435694 Educação | Santa Maria | v. 44 |2019 Disponível em: https://periodicos.ufsm.br/reveducacao 1 Residência pedagógica em educação infantil: uma experiência em formação de professores Pedagogical residence in child education: an experience in teacher training Edna Martins Universidade Federal de São Paulo Maria de Fátima Carvalho Universidade Federal de São Paulo Renata Marcilio Cândido Universidade Federal de São Paulo Recebido em 18 de novembro de 2018 Aprovado em 12 de dezembro de 2018 RESUMO O presente texto descreve uma experiência realizada em um Programa de Residência Pedagógica em Educação Infantil concebido e levado a efeito em uma universidade pública do Estado de São Paulo. Objetiva-se contextualizar detalhadamente como ocorre a imersão de residentes nas escolas-campo de Educação infantil, tomando como elementos de análise as inquietações, observações e reflexões registradas em cadernos de campo referentes aos anos de 2015, 2016 e 2017. Tal análise incide sobre as questões de maior abrangência relatadas pelos estudantes no processo cotidiano de estágio e versam sobre as temáticas: organização do espaço; rotina; gestão escolar; relação escola-família; o contato com a escrita e a diversidade na escola. Conclui-se que tal experiência pode ser compreendida como forma de romper a dicotomia entre teoria/prática, apresentando-se como lugar de muitas vozes em diálogos correlatos à cultura escolar e à formação de professores com vistas a uma práxis educativa que possa ser calcada no respeito à escola pública de educação pela infância. Palavras-chave: Residência pedagógica; Formação de professores; Estágio supervisionado. ABSTRACT This paper describes an experience of a Pedagogical Residence Program in Early Childhood Education conceived and carried out at a public university in the State of São Paulo. The purpose of this study is to contextualize in detail the immersion of residents in the schools of children's education, taking as elements of analysis the

1 Residência pedagógica em educação infantil: uma experiência em formação de ... · 2019. 11. 4. · projeto de estágio em formação docente foi implantado em 2009, em uma

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Residecircncia pedagoacutegica em educaccedilatildeo infantil uma

experiecircncia em formaccedilatildeo de professores

Pedagogical residence in child education an experience in teacher

training

Edna Martins

Universidade Federal de Satildeo Paulo

Maria de Faacutetima Carvalho

Universidade Federal de Satildeo Paulo

Renata Marcilio Cacircndido

Universidade Federal de Satildeo Paulo

Recebido em 18 de novembro de 2018 Aprovado em 12 de dezembro de 2018

RESUMO

O presente texto descreve uma experiecircncia realizada em um Programa de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil concebido e levado a efeito em uma universidade puacuteblica do Estado de Satildeo Paulo Objetiva-se contextualizar detalhadamente como ocorre a imersatildeo de residentes nas escolas-campo de Educaccedilatildeo infantil tomando como elementos de anaacutelise as inquietaccedilotildees observaccedilotildees e reflexotildees registradas em cadernos de campo referentes aos anos de 2015 2016 e 2017 Tal anaacutelise incide sobre as questotildees de maior abrangecircncia relatadas pelos estudantes no processo cotidiano de estaacutegio e versam sobre as temaacuteticas organizaccedilatildeo do espaccedilo rotina gestatildeo escolar relaccedilatildeo escola-famiacutelia o contato com a escrita e a diversidade na escola Conclui-se que tal experiecircncia pode ser compreendida como forma de romper a dicotomia entre teoriapraacutetica apresentando-se como lugar de muitas vozes em diaacutelogos correlatos agrave cultura escolar e agrave formaccedilatildeo de professores com vistas a uma praacutexis educativa que possa ser calcada no respeito agrave escola puacuteblica de educaccedilatildeo pela infacircncia Palavras-chave Residecircncia pedagoacutegica Formaccedilatildeo de professores Estaacutegio

supervisionado

ABSTRACT

This paper describes an experience of a Pedagogical Residence Program in Early Childhood Education conceived and carried out at a public university in the State of Satildeo Paulo The purpose of this study is to contextualize in detail the immersion of residents in the schools of childrens education taking as elements of analysis the

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concerns observations and reflections recorded in fieldwork notebook referring to the years 2015 2016 and 2017 The analysis are made based on the issues of greater concern reported by the students in the daily process of internship and are on the themes space organization routine school management school-family relationship the contact with writing skills and diversity in school It is concluded that such experience can be understood as a way of breaking the dichotomy between theory and practice presenting itself as a place for many voices in dialogues related to school culture and teacher training with a view to an educational praxis that can be traced in the childrens public school Keywords Pedagogical residence Teacher training Supervised internship

Introduccedilatildeo

Historicamente a universidade tem buscado novas formas e modelos no

trabalho de formaccedilatildeo de professores para a educaccedilatildeo baacutesica Nessa direccedilatildeo Tardif

(2013) ao abordar a formaccedilatildeo para a docecircncia afirma que esta modalidade de ensino

estaacute subordinada aos paradigmas ou crenccedilas de cada eacutepoca histoacuterica No contexto

brasileiro nos dias atuais lidamos com uma profusatildeo de reformas educacionais que

em linhas gerais desde a deacutecada de 80 visam a democratizaccedilatildeo dos espaccedilos e

saberes universitaacuterios em experiecircncias como por exemplo as realizadas durante os

estaacutegios de formaccedilatildeo docente

Pensando no campo da formaccedilatildeo de professores e buscando o diaacutelogo entre a

universidade e escola puacuteblica algumas iniciativas brasileiras buscam caminhos que

possibilitem essa dinacircmica como indicado na pesquisa de Martins e Slavez (2015)

Neste estudo os autores fazem um levantamento de experiecircncias inovadoras que tecircm

como base a promoccedilatildeo e inserccedilatildeo de docentes em formaccedilatildeo em escolas de educaccedilatildeo

baacutesica com vistas agrave possibilitar formas de articulaccedilatildeo entre professores experientes

dessas instituiccedilotildees e aqueles que desempenham o papel de formadores nas

universidades O estudo analisou programas como o Programa Institucional de Bolsa

de Iniciaccedilatildeo agrave Docecircncia (PIBID) mantido pela Coordenaccedilatildeo de Aperfeiccediloamento de

Pessoal de Niacutevel Superior (Capes) e o Programa de Residecircncia Pedagoacutegica (PRP)

oferecido pela Universidade Federal de Satildeo Paulo (Unifesp) concluindo que tais

accedilotildees satildeo de extrema importacircncia para a formaccedilatildeo profissional dos estudantes

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A proposta da Residecircncia Pedagoacutegica aqui abordada tem como base os

mesmos princiacutepios utilizados ao se pensar a institucionalizaccedilatildeo da Residecircncia meacutedica

no Brasil Feuerwerker (1998) aponta que ao implantar os programas de Residecircncia

na medicina foi importante considerar a hipoacutetese de que a formaccedilatildeo geral do meacutedico

na graduaccedilatildeo tendo em vista o desenvolvimento tecnoloacutegico e cientiacutefico naquele

momento natildeo era capaz de assegurar o niacutevel necessaacuterio de treinamento e

incorporaccedilatildeo de conhecimentos especiacuteficos aos estudantes em todas as possiacuteveis

atividades praacuteticas do cotidiano profissional A autora ainda afirma que

A praacutetica profissional historicamente tem sido transmitida atraveacutes de treinamento em serviccedilo Eacute no processo de combinar os conhecimentos teoacutericos adquiridos com a experiecircncia cliacutenica (indicando relacionamento com pacientes) que se encontra a ldquomaacutegicardquo da praacutetica profissional meacutedica Somente a experiecircncia adquirida na praacutetica pode completar a formaccedilatildeo (cientiacutefica) do meacutedico eacute pela experiecircncia cliacutenica que o profissional se apropria dos doentes (e natildeo mais apenas das doenccedilas) Eacute pela praacutetica que se constroacutei a experiecircncia cliacutenica e eacute mediante o aprendizado em serviccedilo que o futuro profissional constroacutei tambeacutem a eacutetica de suas relaccedilotildees com os pacientes baseada no exemplo e na experimentaccedilatildeo (FEUERWERKER 1998 p 59)

Dada a importacircncia da profissatildeo do professor seria possiacutevel a consideraccedilatildeo

dessas mesmas premissas para o campo do exerciacutecio da docecircncia Quais formas

possiacuteveis para instrumentalizar os futuros professores para lidar com as vicissitudes

das praacuteticas cotidianas das escolas Como aliar as teorias pedagoacutegicas agraves praacuteticas

docentes no exerciacutecio da profissatildeo Eacute possiacutevel dizer que pela praacutetica se constroacutei a

experiecircncia docente e eacute mediante o aprendizado na praacutetica que o futuro professor

constroacutei a eacutetica de suas interaccedilotildees com os alunos a partir de exemplos diaacuterios e da

experimentaccedilatildeo

Partindo dessas questotildees o Programa de Residecircncia Pedagoacutegica (PRP)

projeto de estaacutegio em formaccedilatildeo docente foi implantado em 2009 em uma

universidade puacuteblica federal do Estado de Satildeo Paulo A proposta concebida por

docentes do curso de Pedagogia buscou a superaccedilatildeo dos modos convencionais de

realizaccedilatildeo de estaacutegios de formaccedilatildeo nos quais os estudantes estagiaacuterios limitam sua

accedilatildeo agrave simples observaccedilatildeo assistemaacutetica de experiecircncias esparsas de praacuteticas

pedagoacutegicas em diferentes salas de aulas Tal iniciativa teve sua metodologia

desenvolvida por docentes da Universidade tendo como bases para consolidaccedilatildeo e

desenvolvimento uma ampla investigaccedilatildeo realizada com professores das redes

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puacuteblicas de um sistema de ensino puacuteblico da regiatildeo metropolitana de Satildeo Paulo entre

os anos de 2007 e 2008 assim como contou com subsiacutedios do Programa da Capes

intitulado ldquoProdocecircnciardquo

Pesquisas como as de Moretti 2011 Martins 2012 Moretti e Martins 2015

Giglio 2010 Giglio e Lugli 2014 Poladian 2014 sob diferentes perspectivas teoacutericas

tecircm tentado buscar compreender aspectos especiacuteficos dessa experiecircncia de estaacutegio

e em sua maioria assinalam tal iniciativa como um dos processos inovadores na aacuterea

de formaccedilatildeo de professores principalmente no que se refere agrave superaccedilatildeo da

dicotomia entre teoria e praacutetica vigente nos estaacutegios dos cursos de formaccedilatildeo de

professores das universidades brasileiras Compreende-se que a formaccedilatildeo do

profissional docente integra um conjunto de desafios destacando-se nos cursos de

formaccedilatildeo inicial a necessidade de ofertar juntamente com subsiacutedios

teoacutericoscientiacuteficos tambeacutem um acesso agraves praacuteticas pedagoacutegicas que instrumentalizem

o professor para a atuaccedilatildeo profissional Nesta direccedilatildeo destaca-se a conduccedilatildeo do

graduando agrave estaacutegios curriculares capazes de iniciaacute-los na praacutetica profissional de

forma efetiva e reflexiva para que com o aporte de professores supervisores

construam conhecimentos que envolvam o pensar e o agir sobre a escola

Quase dez anos apoacutes a criaccedilatildeo do Programa de Residecircncia pedagoacutegica criado

pela Universidade Federal de Satildeo Paulo (Unifesp) em 2018 foi lanccedilado pelo Governo

Federal o Edital CAPES No62018 apresentando a ideia de Residecircncia Pedagoacutegica

como proposta de induccedilatildeo agrave experiecircncias inovadoras na formaccedilatildeo inicial de

professores ao mesmo tempo em que altera as caracteriacutesticas originais do PIBID no

Edital No72018 O edital retoma termos e objetivos bastante proacuteximos dos utilizados

no Programa de Residecircncia aqui abordado entretanto diferencia-se deste e conveacutem

apontar alguns dos elementos definidores desta diferenccedila como por exemplo a

proposiccedilatildeo de um nuacutemero limitado de bolsas aos residentes o que natildeo atenderia a

demanda de estudantes da universidade onde o programa teve origem a previsatildeo

de um nuacutemero maior de residentes por preceptor extrapolando o nuacutemero maacuteximo

indicado pelo Programa base de nosso estudo para a educaccedilatildeo baacutesica Aleacutem disso a

proposta de Residecircncia Pedagoacutegica apresentada no edital referido daacute pouca ou

nenhuma ecircnfase a duas outras modalidades de residecircncia presentes no projeto da

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Unifesp que satildeo a Residecircncia Pedagoacutegica em Gestatildeo Escolar e em Educaccedilatildeo de

Jovens e Adultos

Accedilotildees formativas da Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil (RPEI)

Antes de apresentarmos mais detalhadamente o Programa de Residecircncia em

Educaccedilatildeo infantil (RPEI) eacute importante destacar que o trabalho de formaccedilatildeo de

professores nesta perspectiva comeccedila com o aporte teoacuterico das disciplinas

obrigatoacuterias que contemplam as temaacuteticas do campo Vencida a etapa teoacuterica os

estudantes comeccedilam o programa de estaacutegio contemplado nesta modalidade que

atende o curso de Pedagogia e eacute constituiacuteda como uma unidade curricular obrigatoacuteria

Somente a partir do 5o semestre do curso os alunos devem se matricular e cumprir

135 horas de estaacutegio as quais compreendem momentos de imersatildeo na escola e

supervisatildeo na universidade sendo tal experiecircncia realizada em escolas puacuteblicas

municipais que possuem parceria com a Universidade

Durante todo o processo a atuaccedilatildeo do professor preceptor possui destaque

segundo Moretti e Martins (2015) pois ele faz os primeiros contatos com os

estudantes de cada grupo que vai para a escola e eacute quem supervisiona o estaacutegio

acompanhando o aluno durante todo o percurso do programa Em todas as

modalidades de Residecircncia Pedagoacutegica antes de iniciar a imersatildeo na escola os

estudantes participam de encontros pontuais com seus preceptores para discussatildeo

do programa de atividades da Unidade Curricular No caso da Educaccedilatildeo Infantil

nessas ocasiotildees de encontros realizam-se estudos sobre temaacuteticas relevantes e

discussatildeo de leituras introdutoacuterias agrave atividade de estaacutegio e tambeacutem para orientaccedilotildees

mais praacuteticas sobre por exemplo as regras a serem observadas durante o periacuteodo

de estaacutegio o conhecimento das publicaccedilotildees do PRP para a modalidade especiacutefica a

construccedilatildeo do diaacuterio de campo o papel do professor preceptor e do professor

formador (aquele que o residente acompanharaacute na escola) Todas essas orientaccedilotildees

constam de um manual e satildeo retomadas pelos preceptores em leituras coletivas que

objetivam ajudar os estudantes a usarem o material de suporte enfatizando que o

estaacutegio realizado nesta perspectiva implica mais que observaccedilatildeo passiva a

participaccedilatildeo nas atividades escolares seu registro e reflexatildeo Os primeiros encontros

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tambeacutem envolvem a orientaccedilatildeo sobre aspectos de ordem legal como por exemplo

jamais assumir sozinho a sala de aula em que estatildeo fazendo a residecircncia

Como unidade curricular obrigatoacuteria a RPEI prevecirc em sua ementa que os

alunos deveratildeo construir conhecimentos a partir de identificaccedilatildeo e anaacutelise de relaccedilotildees

e praacuteticas que perfazem o dia a dia da escola de Educaccedilatildeo Infantil atentando para o

seu caraacuteter educacional e pedagoacutegico assim como para os processos de gestatildeo

institucional Esse processo de construccedilatildeo de conhecimentos sobre o que vivenciam

eacute mediado pelo uso de instrumentos de pesquisa qualitativa em educaccedilatildeo

Concomitantemente enquanto participam do dia a dia na escola planejam e elaboram

planos de accedilatildeo pedagoacutegica em colaboraccedilatildeo com os supervisores do estaacutegio e

educadores das escolas-campo

No processo de imersatildeo espera-se que o residente natildeo apenas observe mas

possa dar apoio ao professor de classe em suas praacuteticas pedagoacutegicas cotidianas e na

sua relaccedilatildeo com as crianccedilas com idade entre 0 e 5 anos Cotidianamente tais

residentes devem ser encorajados a atuarem com pequenas accedilotildees junto agraves crianccedilas

com a orientaccedilatildeo dos professores que o acompanham Durante quatro semanas no

processo intenso de imersatildeo na realidade da escola os residentes devem construir

registros diaacuterios das experiecircncias vividas em campo aleacutem de outros materiais que

tecircm origem na observaccedilatildeo participativa do dia a dia escolar e serviratildeo de avaliaccedilatildeo

final tendo elaboraccedilatildeo orientada e aferida pelo professor preceptor da Universidade

Dessa perspectiva o residente tambeacutem eacute solicitado a refletir sobre sua proacutepria

atuaccedilatildeo participando ativamente de um processo de contiacutenua auto avaliaccedilatildeo

Eacute objetivo do Programa em todas as suas modalidades que os graduandos

possam retomar de forma reflexiva o que vivenciam na escola Na modalidade de

Educaccedilatildeo Infantil eacute esperado que o estudante residente possa desenvolver anaacutelises

criacutetico-reflexivas acerca da instituiccedilatildeo no qual estaacute imerso no que se refere agrave interaccedilatildeo

com as famiacutelias e agrave comunidade em seu entorno assim como sobre as praacuteticas

pedagoacutegicas realizadas nesses locais a partir do reconhecimento da crianccedila como

sujeito de direito e de toda a legislaccedilatildeo que diz respeito a essa modalidade de ensino

De acordo com o cronograma da Unidade Curricular Residecircncia Pedagoacutegica

em Educaccedilatildeo Infantil os estudantes devem ir durante quatro dias da semana para a

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escola e um dia para a Universidade para supervisatildeo com o preceptor que eacute um

docente da Universidade Na escola cumprem o horaacuterio da turma que acompanham

em turno que pode ser matutino vespertino ou intermediaacuterio Natildeo satildeo toleradas faltas

ou atrasos sem justificativa meacutedica objetivando-se desta forma colocar os alunos

diante da responsabilidade do compromisso profissional assumido perante a escola

Durante as duas primeiras semanas de imersatildeo os estudantes satildeo orientados

a descrever no diaacuterio de campo o que observam e suas impressotildees sobre a escola

as relaccedilotildees entre professorcrianccedilas crianccedilacrianccedila escolacomunidade

famiacuteliasescola professorprofessor professorgestatildeo e praacuteticas educativas do

cotidiano que satildeo observadas mais atentamente Neste primeiro momento aleacutem da

cobranccedila para que o aluno escreva sobre suas vivecircncias o preceptor busca ajudaacute-lo

na construccedilatildeo dos registros do caderno de campo assinalando sobre as posturas de

descriccedilatildeo e de reflexatildeo na elaboraccedilatildeo sobre suas impressotildees sobre aquilo que eacute

observado

Antes de serem executados os planos pedagoacutegicos de cada estudante satildeo

apresentados para os professores formadores e coordenador nas escolas durante

reuniatildeo realizada na ldquoHora Atividaderdquo com a participaccedilatildeo do professor preceptor Este

tem se constituiacutedo um momento iacutempar de aprendizagem para todos os envolvidos jaacute

que nesta ocasiatildeo os estudantes compartilham seus conhecimentos suas

experiecircncias expectativas e apreensotildees e onde explicitam-se possibilidades de

articulaccedilatildeo escola-universidade no acircmbito da formaccedilatildeo de professores Eacute na uacuteltima

semana de imersatildeo que os estudantes colocam seus planos de accedilatildeo pedagoacutegica em

praacutetica nas salas em que estatildeo imersos fechando o ciclo previsto pelo estaacutegio

Metodologia analisando as temaacuteticas do caderno de campo online (Blog)

Alguns grupos de residentes da RPEI conforme opccedilatildeo dos professores

preceptores usam um blog para a construccedilatildeo online de um caderno de campo que

integra a elaboraccedilatildeo de seus registros sobre a imersatildeo na escola Esses registros ndash

que chamamos de postagens aleacutem de possibilitar um olhar mais apurado sobre as

praacuteticas cotidianas podem contribuir para a orientaccedilatildeo e a construccedilatildeo do Plano de

Accedilatildeo Pedagoacutegica de cada residente e posteriormente para a escrita de um relatoacuterio

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final de estaacutegio pelo grupo Eacute sobre os registros do blog que incidiraacute nossa anaacutelise

considerando para tanto inquietaccedilotildees observaccedilotildees e reflexotildees registradas pelos

residentes nos anos de 2015 2016 e 2017

O blog da residecircncia ou diaacuterio de campo online consiste em uma ferramenta

virtual na qual satildeo realizados os registros de observaccedilotildees e experiecircncias significativas

vividas pelos residentes cotidianamente na escola Destaca-se que tal ferramenta eacute

de acesso restrito e apenas um uacutenico grupo de alunos e professores preceptores da

Universidade podem participar em cada escola acompanhada Deste modo nem os

professores ou quaisquer pessoas das escolas-campo podem acessar tal instrumento

O blog eacute construiacutedo pelo professor preceptor a cada novo grupo de residentes

assegurando o sigilo das informaccedilotildees registradas A ferramenta possibilita a

construccedilatildeo coletiva de diaacutelogos sobre questotildees observadas e a mediaccedilatildeo dos

conhecimentos dos residentes pelos seus supervisores Assim os estudantes podem

realizar trocas sobre suas vivecircncias muitas vezes similares agraves que ocorrem na mesma

instituiccedilatildeo ainda que estejam em turmas de idades diferentes Permite tambeacutem que

preceptores acompanhem diariamente seus residentes respondendo as indagaccedilotildees

e inquietaccedilotildees do grupo que participa do dia-a-dia na escola

Aleacutem de cumprir todos os objetivos de um caderno de campo comum o blog

permite ao preceptor mesmo agrave distacircncia o acompanhamento contiacutenuo do grupo de

estudantes o que lhe permite planejar as atividades semanais de supervisatildeo de forma

a responder as demandas dos alunos e esses uacuteltimos de compartilharem seus

diferentes pontos de vistas e as accedilotildees desenvolvidas na escola Assim no contexto

da residecircncia pedagoacutegica o blog ou caderno de campo online eacute o espaccedilomomento

de realizaccedilatildeo dos registros de observaccedilotildees e experiecircncias significativas vividas

cotidianamente na escola de educaccedilatildeo infantil e de acompanhamento e

problematizaccedilatildeo dessas vivecircncias pelos preceptores

Nesse caminho assinala-se a contribuiccedilatildeo de Vygotsky (1981) quando aponta

que as relaccedilotildees humanas satildeo sempre mediadas pelo meio social e pelos instrumentos

e signos que fazem parte das relaccedilotildees e dos contextos em que o homem estaacute inserido

Desse modo

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A atividade praacutetica do homem portanto se faz duplamente mediada de uma parte estaacute mediada pelas ferramentas no sentido literal da palavra e de outra parte mediada pelas ferramentas no sentido figurado pelas ferramentas do pensamento pelos meios com a ajuda dos quais se realiza a operaccedilatildeo intelectual ou seja mediada com a ajuda das palavras (VYGOTSKI 19302006a p 165)

Nessa direccedilatildeo conveacutem destacar a importacircncia do blog como instrumento social

representativo da incorporaccedilatildeo da tecnologia ao dia a dia dos estudantes e da

consideraccedilatildeo da mediaccedilatildeo tecnoloacutegica em processos de aprendizagem e

desenvolvimento dos graduandos

Diferente de outras formas de relacionamento virtual (e-mail chat instant

messages listas de discussatildeo etc) e de ferramentas virtuais convencionais ndash como

os sites ndash o blog caracteriza-se pela facilidade de sua criaccedilatildeo e manutenccedilatildeo o que eacute

definido pela organizaccedilatildeo automaacutetica das mensagens ndash posts ndash pelo sistema

dinamizando seu uso e favorecendo a construccedilatildeo de diaacuterios coletivos mantidos por

vaacuterios usuaacuterios Tais caracteriacutesticas favorecem o uso do blog em processos de ensino-

aprendizagem tendo em vista a interaccedilatildeo a troca o diaacutelogo como forma de partilha e

construccedilatildeo de conhecimentos (MARQUES MULLER 2012)

O blog permite portanto o compartilhamento de informaccedilotildees e a interaccedilatildeo

entre estudantes do mesmo grupo e o mesmo preceptor em uma mesma escola

Todos podem ler e comentar as postagens funcionando como um ponto de encontro

entre alunos e preceptores Assim nossa atenccedilatildeo agraves postagens dos estudantes no

blog eacute dirigida pelo objetivo de dar visibilidade a dimensatildeo social das praacuteticas de

registro do observadovivido nos processos formativos que emergem na experiecircncia

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil Assumimos o caraacuteter histoacuterico-

cultural da pesquisa do meacutetodo do objeto de estudo e do proacuteprio conhecimento como

construccedilatildeo que se realiza entre sujeitos (FREITAS 2009) Dessa forma acredita-se

que o momento de elaboraccedilatildeo do vivido ndash o registro no caderno de campoblog ndash

deflagra no estudante a necessidade de reflexatildeo sobre os processos de ensino-

aprendizagem em curso no acircmbito do estaacutegio-residecircncia pedagoacutegica

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Registros no caderno de campo online o olhar do residente sobre a escola de

educaccedilatildeo infantil

Nos primeiros dias de imersatildeo na escola os residentes satildeo orientados a

realizar uma observaccedilatildeo atenta dos espaccedilos da instituiccedilatildeo A partir da leitura do texto

de Silva e Bufalo (2011) sobre culturas escolares os residentes descrevem em seus

primeiros registros detalhes fiacutesicos sobre a escola Muitos acabam desenhando a

planta baixa ou tirando fotos de salas de aulas parques e paacutetios e compartilhando no

caderno de campo online (blog) para comeccedilarem a pensar sobre o contexto e os

espaccedilos que podem favorecer a aprendizagem e o desenvolvimento da crianccedila

pequena como descrito no excerto abaixo

Uma coisa que me chamou atenccedilatildeo foi que natildeo possuem um espaccedilo para atividade fiacutesica essas satildeo realizadas no paacutetio que eacute proacuteximo as salas o barulho acaba atrapalhando os demais O parque estaacute interditado por ordem da diretora ou seja natildeo possuem lugar para brincar O dia das crianccedilas foi pautado em ficar sentado e quieto vendo um filme que a maioria jaacute tinha assistido (Relato da residente N 2017)

Formas de organizaccedilatildeo de espaccedilos e tempos remetem agrave organizaccedilatildeo da rotina

Sobre esse tema grande quantidade de postagens textos diz respeito a como as

atividades diaacuterias satildeo organizadas na escola Em alguns registros como o

apresentado a seguir aparece a problematizaccedilatildeo da forma de organizaccedilatildeo das

atividades

730 (15min) - a professora colocou o cabeccedilalho na lousa com a data e fez a contagem coletiva das crianccedilas 745 (45min) - a professora retomou o que eles haviam aprendido sobre os iacutendios entregou massinha e os orientou a modelar utensiacutelios indiacutegenas 830 (35min) - pintura de desenho xerocado que seraacute colado na capa do caderno de atividades 905 (25min) - brincadeira livre no paacutetio interno no brinquedatildeo que fica no final da escadarampa sup2940 (30min) - brincadeira em sala Gato mia 1010 (ateacute as crianccedilas irem embora) - a professora entregou uma folha com a letra da canccedilatildeo 1 2 3 indiozinhos cantou a muacutesica com eles sentados em seus lugares pediu para eles circularem as letras A e I e depois pintar a ilustraccedilatildeo () (Relato da residente J 2015)

A rotina observada e registrada pela residente configura-se como um dos

aspectos mais relevantes na vida da crianccedila que se encontra na escola de Educaccedilatildeo

Infantil Barbosa (2006) aponta que esse eacute um dos elementos que integram as praacuteticas

educativas que devem ser observadas e planejadas com regularidade objetivando a

operacionalizaccedilatildeo do cotidiano da escola de maneira que possa contribuir na

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constituiccedilatildeo da subjetividade dos atores escolares Desse modo pensar e

compreender a rotina como um fator presente e essencial na educaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute um passo promissor para que o residente acompanhe como as atividades

cotidianas da escola se materializam e datildeo base para a organizaccedilatildeo da praacutetica

pedagoacutegica devendo estar presente no desenvolvimento curricular

O planejamento das atividades na educaccedilatildeo infantil tem estreita ligaccedilatildeo com a

rotina Ao observar e refletir sobre a vida e as experiecircncias das crianccedilas na escola os

residentes satildeo remetidos a memoacuteria agrave lembranccedila do que tambeacutem foi um dia vivido

por eles em suas experiecircncias escolares Como apontado por Meksenas (2002)

ldquonunca somos testemunhas objetivas observando objetos e sim sujeitos observando

outros sujeitosrdquo (p 116)

Estive tentando lembrar nas uacuteltimas semanas o que eu fazia na minha preacute-escola Eu comecei no maternal com 3 anos ()Tenho vagas lembranccedilas de duas salas de aula uma do preacute III e a outra acho que era do preacute I Era uma escola particular dessas pequenas de bairro Lembro que a turma natildeo era tatildeo numerosa quanto essa que estou vendo na residecircncia mas a sala tinha uma organizaccedilatildeo parecida eram mesas e cadeiras enfileiradas nas duas () Eu estava com 5 anos Lembro que a gente tinha uma apostila no preacute I eu gostava de terminar tudo raacutepido para dormir Depois a professora comeccedilou a me dar gibi para eu ficar folheando Tenho na minha memoacuteria que as coisas que a gente fazia na escola eram chatas e muito infantis bobas demais Agora eu penso talvez as professoras ficassem me ocupando com massinha e pinturas todo dia tambeacutem como eu vejo na residecircncia e por isso eu achava muito chato O que seraacute que essas crianccedilas pensam disso O que seraacute que elas acham mais legal na escola Eu vejo que elas gostam muito de fazer liccedilatildeo essas de folhinha que a professora daacute e todos os dias elas perguntam Mas eu natildeo me conformo como elas acham isso tatildeo legal (Relato da Residente F 2017)

Sabemos que a memoacuteria eacute mediada pelo signo pelas interaccedilotildees sociais pelo

outro Braga (1997) dirige nosso olhar para o ldquoprocesso de apropriaccedilatildeo das formas

culturais de interaccedilatildeo que caracterizam a memoacuteria humanardquo Para a autora ldquoa

memoacuteria do homem soacute se configura no movimento discursivo e coletivo por sua

natureza cultural e simboacutelicardquo No registro acima o observado mobiliza as lembranccedilas

da residente aquilo que foi tambeacutem vivido na escola de sua infacircncia Entre lembranccedilas

e interrogaccedilotildees emergem as construccedilotildees formativas em um processo dinacircmico ndash

interativo cultural e simboacutelico Processo que potildeem em relaccedilatildeo vivecircncias atuais e

passadas que invocam sentidos e significados atribuiacutedos ao vivido que ocorre nas

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contradiccedilotildees entre aquilo que eacute rememorado pela estudante e o que efetivamente eacute

observado nas relaccedilotildees estabelecidas no contato com o cotidiano da escola

Aleacutem da rotina e da organizaccedilatildeo de tempos e espaccedilos em sua relaccedilatildeo com as

praacuteticas pedagoacutegicas os relatos dos estudantes se reportam agraves diferentes dimensotildees

da gestatildeo escolar Os registros destacam suas observaccedilotildees nas H A (hora atividade)

ou reuniotildees que eventualmente participam e com frequecircncia observam a postura da

equipe em relaccedilatildeo a presenccedila do residente Em seus relatos questionam o caraacuteter

da gestatildeo a qualidade da relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo entre os professores as discussotildees

que remetem a construccedilatildeo e discussatildeo do projeto poliacutetico pedagoacutegico e os papeis

desempenhados pelos diferentes educadores na construccedilatildeo do trabalho de educaccedilatildeo

da infacircncia

Completamos nesta semana 4 dias de participaccedilatildeo nas Horas Atividades (HA) destinada agrave formaccedilatildeo docente organizaccedilatildeo dos registros e planejamento das atividades pedagoacutegicas O que pude por meio da observaccedilatildeo constatar que o papel do Coordenador Pedagoacutegico que eacute fundamental nesse momento de formaccedilatildeo pois eacute ele o mediador desse processo acaba por se tornar distante e sem intervenccedilotildees no que adentra a orientaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico docente (Relato da estudante M 2015)

Na experiecircncia cotidiana de imersatildeo na escola eacute possiacutevel verificar as tensotildees

vivenciadas entre os professores e o papel da coordenaccedilatildeo pedagoacutegica A teoria

discutida na universidade pelos residentes assinala a importacircncia do papel do

coordenador pedagoacutegico na educaccedilatildeo infantil na praacutetica o residente percebe o quanto

a sua mediaccedilatildeo eacute fundamental na organizaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico e por outro

lado o quanto a sua ausecircncia pode interferir de forma negativa na orientaccedilatildeo das

atividades dos professores

Outra personagem que acaba sendo central na gestatildeo escolar eacute a direccedilatildeo que

nessa experiecircncia do residente tambeacutem eacute observada de forma criacutetica

A figura da diretora na escola foi a que mais me chamou a atenccedilatildeo ()imaginem que em nenhum momento percebi qualquer aproximaccedilatildeo da diretora com as crianccedilas em vaacuterios momentos acreditei que ela fosse algum teacutecnico administrativo pois apesar de estar no topo da piracircmide a referecircncia da gestatildeo a mesma se restringia a secretaria e natildeo se relacionava natildeo nos conhecia nem procurava nos conhecer Passou diversas vezes por grupos de crianccedilas e em nenhuma das vezes sequer olhou para elas Nunca apareceu em uma HA nunca percebi o seu contato com os professores e por diversas vezes me perguntei como eles se falavam qual era o seu relacionamento (Relato da residente B 2015)

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Sobre esse assunto estudos como os de Paro (2005) e Castro (2009) tem

assinalado o papel da gestatildeo e da administraccedilatildeo escolar como alicerce fundamental

nos processos de transformaccedilatildeo da escola puacuteblica brasileira Tais trabalhos tecircm

apontado a centralidade da direccedilatildeo escolar nas questotildees que envolvem os processos

de ensino e aprendizagem e as relaccedilotildees humanas presentes na equipe de trabalho

para aleacutem dos trabalhos administrativos e burocraacuteticos Natildeo eacute objetivo deste trabalho

fazer uma anaacutelise do papel do diretor na escola de educaccedilatildeo infantil mas cabe

assinalar que os estudantes residentes apontam o tema em seus registros e atentos

agraves demandas relativas ao papel do diretor indagam se como e quanto as lideranccedilas

escolares tecircm se envolvido com o trabalho administrativo dispendendo tempo para

um olhar mais atento agraves relaccedilotildees entre os professoresalunos funcionaacuterios da escola

observada

Em relaccedilatildeo agraves interaccedilotildees humanas outros registros dos residentes nos

remetem agraves maneiras como a escola lida com as famiacutelias das crianccedilas matriculadas

nas escolas Tais relatos natildeo satildeo tatildeo frequentes possivelmente porque essa eacute uma

relaccedilatildeo que se caracteriza pela assimetria de poderes e eacute pouco valorizada no dia a

dia escolar Os registros evocam situaccedilotildees vividas comentaacuterios ouvidos e

principalmente a necessidade de mudanccedila dos modos de conceber a crianccedila e suas

famiacutelias e de interagir com elas

A relaccedilatildeo entre professor e famiacutelia eacute mais uma dessas conexotildees que fazemos pela vida Por um lado haacute um profissional uma pessoa que estudou e eacute especialista em cuidar de crianccedilas Por outro famiacutelias que dificilmente conseguimos de fato perceber como satildeo suas estruturadas Famiacutelia hoje eacute coisa difiacutecil de entender Eacute matildee que mora sozinha com o filho eacute pais que trabalham e deixam os filhos na semana com tios avoacutes Eacute matildee solteira Eacute filho criado por pai viuacutevo Eacute histoacuteria que natildeo acaba mais Na hora da saiacuteda vamos conhecendo um pouquinho da estrutura familiar de cada crianccedila tentando perceber como se daacute a relaccedilatildeo entre a famiacutelia e a escola mas devemos ter um pouco de cuidado com esse processo (Relato do estudante J 2015)

Aleacutem da residente ter um olhar para os diferentes tipos de arranjos familiares

tambeacutem busca compreender a especificidade de cada famiacutelia considerando o papel

da mulher e de matildee trabalhadora com filhos na escola puacuteblica

(hellip) Veja esses apontamentos uma menina na sala estaacute com piolho a professora disse que jaacute alertou a matildee mas como eacute matildee solteira soacute pode cuidar da filha no domingo O outro menino que natildeo se interessa pelas atividades e responde a educadora tambeacutem teve a matildee notificada mas como

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a mesma eacute separada do marido natildeo faz nada O fato da mulher trabalhar a semana e ter folga aos domingos natildeo significa que ela seja uma maacute matildee pelo contraacuterio significa que ela rala muito para colocar comida no prato A presenccedila ou natildeo de um homem natildeo condiciona nada A escola natildeo pode ser um ambiente de roacutetulos ela deve estar aberta agraves diferenccedilas acolhendo e buscando outras maneiras e formas de aproximaccedilatildeo com a famiacutelia compreendendo a responsabilidade compartilhada que carregam (Registro da residente B 2015)

Os relatos demonstram natildeo soacute o quanto estatildeo atentos para como a escola lida

com as relaccedilotildees familiares mas sobretudo assinalam como tecircm se configurado as

formaccedilotildees das famiacutelias na atualidade Um estudo de Martins (2012) aponta o quanto

a experiecircncia de residecircncia pedagoacutegica possibilita aos estudantes um contato mais

expressivo com a realidade da escola puacuteblica de periferia urbana Aleacutem de observar

as relaccedilotildees institucionais o residente pode ser sensibilizado frente agraves dificuldades

vividas pelas famiacutelias e tendem a perceber o preconceito em relaccedilatildeo aos vaacuterios

arranjos familiares vivenciados pelas crianccedilas mais pobres e como a escolarizaccedilatildeo

dos pais pode afetar a vida dos filhos Os registros dos residentes demonstram como

ldquoos contextos de vida das crianccedilas que frequentam a escola puacuteblica de periferia

passam a ser compreendidos de uma forma concreta e as relaccedilotildees do espaccedilo familiar

com o espaccedilo escolar passam a ter uma conexatildeo cotidianardquo (MARTINS 2012 p 95)

Outra temaacutetica recorrente nos registros dos estudantes diz respeito ao processo

de escolarizaccedilatildeo das praacuteticas da educaccedilatildeo da infacircncia Tal perspectiva surge quando

os residentes referem aos usos dos brinquedos e agraves brincadeiras agrave presenccedila da

leitura e contaccedilatildeo de histoacuterias aos modos de introduccedilatildeo do desenho ao uso de novas

tecnologias e aos modos de avaliar agraves crianccedilas Tal perspectiva escolarizante emerge

em oposiccedilatildeo ao luacutedico como princiacutepio e forma de organizaccedilatildeo das praacuteticas de

educaccedilatildeo junto agraves crianccedilas pequenas e algumas vezes a ela ainda se articula a

preocupaccedilatildeo em disciplinar as vivecircncias escolares sondagens filas broncas e

silecircncios coexistem com desenhos Tv computadores e brincadeiras Os registros nos

dizem de uma escola que hesita entre coibir e promover a expressatildeo das muitas

linguagens da imaginaccedilatildeo e movimento das crianccedilas

Na semana de 2310 a 2710 e como previsto na reuniatildeo de pais a professora realizou a sondagem com as crianccedilas Teoricamente sei como funciona o procedimento mas me questiono se deve ser realizada na Ed Infantil Tambeacutem me pergunto se a sondagem vai muito aleacutem do conhecimento das crianccedilas Por exemplo algumas escrevem o proacuteprio nome

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e algumas palavras mais comuns a elas outras ainda nem reconhecem as letras do alfabeto A sondagem feita abarcou o nome palavras simples um pouco mais complexas e uma frase inteira A minha duacutevida eacute se a sondagem que vai muito aleacutem dos conhecimentos da sala eacute comum e necessaacuteria ainda mais na Ed Infantil (Relato do residente N 2017)

O debate em torno das questotildees que envolvem a escolarizaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute bastante antigo e recorrente Pesquisas como as de Neves Castanheira

e Gouveia (2015) assinalam a partir de autores que estudaram essa temaacutetica como

a perspectiva escolarizante de trabalho com a crianccedila pequena traz seacuterias implicaccedilotildees

para o desenvolvimento infantil justamente porque rompe com as formas como elas

ldquointeragem com a escrita fora da escola destituindo-a de significados pessoais e

sociais e dificulta portanto que as atividades desenvolvidas no espaccedilo escolar

envolvam a ludicidade caracteriacutestica fundamental dessa fase do desenvolvimentordquo

(p 217)

Os residentes parecem estar muito atentos a essas questotildees porque participam

de discussotildees sistemaacuteticas sobre o assunto tanto nas aulas teoacutericas na Universidade

quanto nas reuniotildees de orientaccedilatildeo com os preceptores do Programa de Residecircncia

Muitos estudantes satildeo levados a refletir sobre o assunto logo nos primeiros dias de

imersatildeo na escola

Resolvi mudar o formato do meu relato referente agrave imersatildeo inicial Pois passei por uma situaccedilatildeo em sala que me provocou tal accedilatildeo Devido agrave imposiccedilatildeo de escolarizaccedilatildeo percebida na turma na qual acompanho Onde hoje me emocionei com o choro insistente do aluno BG com as matildeos estremecidas na tentativa de segurar o laacutepis para ldquofazer liccedilatildeordquo (Relato da Residente M 2015)

A partir do relato da residente percebe-se o quanto a questatildeo eacute relevante para

o campo da educaccedilatildeo infantil e da formaccedilatildeo de professores Nas observaccedilotildees e

relatos dos cadernos de campo natildeo eacute incomum aparecerem longas narrativas sobre

os equiacutevocos que ocorrem nas praacuteticas pedagoacutegicas que envolvem a alfabetizaccedilatildeo e

letramento das crianccedilas pequenas Consideramos que questotildees como essas quando

problematizadas pelos estudantes nos horaacuterios de preceptoria ou mesmo nas

discussotildees com professores especialistas sobre o tema tendem a aproximaacute-los de

uma futura praacutetica profissional em que o trabalho com o desenvolvimento da escrita

seja realizado de forma a respeitar a infacircncia natildeo negando agrave crianccedila o seu direito ao

luacutedico mas tratando a apresentaccedilatildeo do mundo letrado como mais um momento

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prazeroso de aprendizagens Tal reflexatildeo eacute importante para os futuros professores

para que busquem compreender como inserir as crianccedilas no mundo letrado de

maneira que possam romper com a dicotomia entre o brincar e a leituraescrita

tomando como referecircncia o significado dessas accedilotildees para a crianccedila possibilitando a

conduccedilatildeo dos trabalhos na educaccedilatildeo infantil que tornem possiacutevel o brincar ldquoletrando

e alfabetizandordquo (NEVES CASTANHEIRA E GOUVEIA 2015)

Outra temaacutetica que aparece num nuacutemero expressivo de postagens diz respeito

ao olhar do residente para as praacuteticas educativas e as interaccedilotildees que ocorrem na

escola com relaccedilatildeo agrave inclusatildeo escolar das crianccedilas percebidas como ldquodiferentesrdquo

Destaca-se nesta temaacutetica observaccedilotildees a respeito de diferenccedilas de religiatildeo gecircnero

raccedilacor e tambeacutem aquelas relacionadas agrave deficiecircncia Haacute descriccedilotildees sobre como as

crianccedilas lidam com as diferenccedilas e as formas como os professores trabalham com

aquelas que possuem alguma dificuldade Algumas postagens ressaltam a

necessidade de formaccedilatildeo inicial e continuada dos educadores para lidarem com a

diversidade na escola

Pela primeira vez vivenciei preconceito racial de uma crianccedila com outra Nos momentos em que a profa distribui lego para as crianccedilas ela daacute tambeacutem um bonequinho para cada crianccedila Tem bonecos adultos crianccedilas homens mulheres e de diversas cores Os bonecos satildeo dados aleatoriamente ou escolhidos pela crianccedila conforme a professora passa de mesa em mesa Neste dia um menino negro estava com um boneco negro Um garoto se aproximou e disse ldquoCredo que boneco feio parece vocecircrdquo se direcionando ao menino O menino deu de ombros e continuou a brincar e poucos minutos depois a menina que estava ao seu lado me perguntou ldquoPor que o boneco dele eacute pretinho Eacute muito feiordquo Claro que conversei com ela e com o outro menino em outro momento calmamente falando das diversas cores que as pessoas tecircm e que natildeo haacute isso de feio e bonito aproveitando para falar sobre diversidade e etc Mais para o final da conversa a menina me disse ldquoMeu pai eacute pretinho ele eacute bonitordquo Respondi a menina dizendo que a beleza natildeo estaacute na cor da pele do cabelo ou dos olhos A cena toda me fez refletir que a menina jaacute deve ter ouvido esse tipo de afirmaccedilatildeo errocircnea Jaacute comentei mais de uma vez sobre o preconceito de gecircnero ser muito forte mas e o racial algueacutem mais vivenciou esse tipo de preconceito durante esta residecircncia (Relato do residente T 2017)

Rosemberg (2014) chama a atenccedilatildeo para o tema da diversidade como uma

questatildeo circunscrita na histoacuteria da humanidade A diferenciaccedilatildeo entre os grupos

humanos ou pessoas com atributos que classificam e separam o ldquoeurdquo do ldquooutrordquo

parece constituir as diversas manifestaccedilotildees de culturas humanas Assim a autora

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desnaturaliza a identidade e a diferenccedila apontando o seu caraacuteter cultural social e

histoacuterico Contudo esse eacute um dos temas que tem chamado cada vez mais a atenccedilatildeo

de educadores desde a educaccedilatildeo infantil jaacute que muitas vezes as questotildees que

envolvem a diferenccedila e o diferente passam por processos discriminatoacuterios e

preconceituosos como apontado no relato do estudante ao observar as interaccedilotildees

entre as crianccedilas no que se refere ao quesito raccedilacor

Marinho e Martins (2016) em estudo sobre formaccedilatildeo de professoras que atuam

na educaccedilatildeo infantil constatam a escassez ou inexistecircncia de disciplinas na formaccedilatildeo

inicial de professores que abarquem as questotildees eacutetnico-raciais denunciando o natildeo

cumprimento das leis que entre outras prescriccedilotildees preveem que instituiccedilotildees de niacutevel

superior proporcionem aos futuros(as) professoresas a formaccedilatildeo adequada para

lidarem com as relaccedilotildees raciais multieacutetnica e multicultural da sociedade brasileira

Nesse sentido ao trazerem suas inquietaccedilotildees sobre como as crianccedilas lidam com as

diferenccedilas no contexto da escola os residentes se aproximam das discussotildees a

respeito dos processos discriminatoacuterios oportunizando momentos em que tais

temaacuteticas possam ser discutidas entre professores preceptores e colegas do

programa de estaacutegio

Aleacutem da questatildeo racial outros relatos nos datildeo conta de refletir e discutir sobre

as relaccedilotildees que envolvem as crianccedilas com deficiecircncia na escola

() O que me chamou atenccedilatildeo foi que na quarta (2204) H chegou na escola e decidiu mudar de lugar foi sentar bem ao lado do D (uma crianccedila que foi diagnosticada com autismo de ldquograu leverdquo segundo a professora) eu fiquei observando como seria a relaccedilatildeo deles H trouxe um caderno de desenho o abriu na mesa e dividiu metade da folha para ele e para D depois na hora de descer ele segurou a matildeo do D e ficou durante o almoccedilo todo cuidando de D o orientou a pegar a comida sentar comer devagar e quando natildeo quisesse mais deveria jogar a comida no lixo e durante todo o dia H permaneceu cuidando de D A professora achou estranho pois naquele dia ela natildeo havia chamado a atenccedilatildeo de H ateacute me falou ldquoEle deve estar aprontando e D eacute bobatildeo pode se machucarrdquo e decidiu intervir e pediu para que H mudasse de lugar e parasse de cuidar de (Relato do residente L 2015)

A partir da narrativa eacute possiacutevel refletir sobre o preparo dos professores para

lidar com as diferenccedilas individuais na educaccedilatildeo infantil A inclusatildeo escolar de crianccedilas

com deficiecircncia ocorre mediante poliacuteticas puacuteblicas de inclusatildeo contudo haacute uma

grande distacircncia entre a poliacutetica puacuteblica e a praacutetica pedagoacutegica nos contextos

escolares pois natildeo se aprofunda ldquoo debate sobre os meios os fins e as estrateacutegias

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para a implementaccedilatildeo da poliacutetica de ampliaccedilatildeo da rede de educaccedilatildeo infantilrdquo

(BRUNO 2008 p 59)

Outros registros que tratam da temaacutetica da inclusatildeo de crianccedilas com

deficiecircncia mostram o quanto a escola estaacute despreparada para lidar com essa

questatildeo Os relatos e inquietaccedilotildees dos estudantes nos possibilitam a identificaccedilatildeo de

processos discriminatoacuterios de resistecircncias e acomodaccedilotildees dos profissionais e do

distanciamento de uma praacutetica verdadeiramente inclusiva na esfera das praacuteticas

educativas cotidianas O que se percebe nas discussotildees sobre o assunto eacute que os

residentes enquanto futuros professores muito tecircm a aprender sobre a acolhida das

famiacutelias e das crianccedilas ldquodiferentesrdquo ou com deficiecircncia na constante reflexatildeo sobre o

comportamento atitudes e posturas do educador frente ao trabalho pedagoacutegico

Outras temaacuteticas tatildeo importantes como as que discutimos aqui tem sido objeto

de interesse dos estudantes em processo de imersatildeo nas escolas-campo Haacute uma

gama de registros sobre categorias que envolvem a crianccedila pequena nas atividades

do brincar a disciplina e a coerccedilatildeo dos educadores na tentativa de manter o controle

das crianccedilas e dos comportamentos considerados inadequados Muitos residentes se

surpreendem como essa coerccedilatildeo ocorre demasiadas vezes na escola e nas reuniotildees

de supervisatildeo eacute muito comum questionarem junto ao preceptor formas de

compreender por que algumas praacuteticas coercitivas satildeo tatildeo presentes na educaccedilatildeo

infantil

Consideraccedilotildees Finais

A experiecircncia de estaacutegio no Programa de Residecircncia Pedagoacutegica requer de

estudantes e professores uma atitude de intensa accedilatildeo e reflexatildeo Na perspectiva de

observaccedilatildeo participante eacute que a imersatildeo dos residentes na escola eacute orientada

embora natildeo haja uma intervenccedilatildeo direta planejada e sistemaacutetica sobre os modos de

fazer da escola e dos professores Possiacuteveis intervenccedilotildees sobre a escola suscitadas

pela presenccedila da universidade (de preceptores e residentes) satildeo uma contingecircncia

dos processos de formaccedilatildeo de condiccedilotildees e modos de seu desenvolvimento e eacute assim

que se define o lugar do residente e da preceptoria junto a escola o caraacuteter da

observaccedilatildeo participante a ser realizada durante o estaacutegio e sua conduccedilatildeo e discussatildeo

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no acircmbito escolar As posiccedilotildees dos residentes reeditam questotildees que mobilizam a

imersatildeo e reflexatildeo sobre o vivido como e quando participar O que como e quando

registrar sobre a observaccedilatildeo participante sobre o que se vivencia Como fazer uso

das ferramentas disponiacuteveis na escola e dos subsiacutedios teoacutericos oferecidos durante a

proacutepria residecircncia ou estudados no curso de pedagogia elaborando impressotildees sobre

o que descreve e refletindo sobre o que vive e elabora

A retomada dos escritos e reflexotildees dos estudantes participantes do Programa

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil nos trazem pistas relevantes para a

compreensatildeo natildeo somente dos seus processos formativos mas tambeacutem suscitam

atenccedilatildeo aos temas e questotildees emergentes do cotidiano das crianccedilas nas escolas de

Educaccedilatildeo Infantil Sabe-se que o processo de escrita eacute composto de idas e vindas

de avanccedilos e retrocessos de duacutevidas e certezas percebidas nos textos e contextos

apresentados pelos estudantes neste processo formativo especiacutefico

As postagens guardam caracteriacutesticas especiacuteficas correlatas ao vivido nas

praacuteticas de estaacutegio de acordo com as finalidades comunicativas e formativas do

caderno de campoblog e com especificidades ndash limites e possibilidades ndash que se

dimensionam nestas praacuteticas Os estudantes registram o que observam o que

vivenciam mas natildeo soacute Em muitos registros suas impressotildees (con)fundem-se com o

observado vatildeo aleacutem da descriccedilatildeo interpretando o visto o vivido e outras vezes para

alguns o registro se faz espaccedilo de recuperaccedilatildeo das proacuteprias vivecircncias e dos

elementos teoacutericos estudados

Nesta experiecircncia a liberdade na escolha e escrita dos temas dos cadernos de

campo tem permitido que o processo formativo de cada estudante aconteccedila de forma

uacutenica e original pois apesar de estarem imersos em ambientes semelhantes (em

alguns casos mesmas escolas-campo) e possuiacuterem referenciais teoacutericos semelhantes

(provenientes das unidades curriculares obrigatoacuterias e eletivas do Curso de

Pedagogia) os temas e questotildees que recebem a atenccedilatildeo de cada um satildeo distintos e

trabalhados teoricamente a partir das anguacutestias e inquietaccedilotildees individuais Entretanto

apesar das produccedilotildees escritas serem individuais ao serem publicizadas em reuniotildees

de orientaccedilatildeo ou ateacute no suporte virtual do blog elas podem ser compartilhadas e

tornam-se objeto comum de discussotildees e aprendizagens

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

Referecircncias bibliograacuteficas

BARBOSA Maria Carmem Silveira Por amor e por forccedila rotinas na Educaccedilatildeo Infantil Porto Alegre Artmed 2006

BRAGA Elizabeth dos Santos Viacutedeo escritas leituras recordaccedilotildees cultura e memoacuteria na sala de aula GOacuteES Maria Cecilia Rafael e SMOLKA Ana Luiza Bustamante A significaccedilatildeo nos espaccedilos Educacionais ndash Interaccedilatildeo social e subjetivaccedilatildeo Campinas Papirus Editora1997 p 87-110

BRUNO Marilda Moraes Garcia A construccedilatildeo da escola inclusiva um a anaacutelise das poliacuteticas puacuteblicas e da praacutetica pedagoacutegica no contexto da educaccedilatildeo infantil Revistambienteeducaccedilatildeo v 1 n 2 p56-67 2008

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FREITAS Maria Teresa Assunccedilatildeo A pesquisa de abordagem histoacuterico-cultural um espaccedilo educativo de constituiccedilatildeo de sujeitos Revista Teias v 10 n 19 p 01-12 2009

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Horizonte Autecircntica v 1 p 375-392 2010

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto LUGLI Rosaacuterio Silvana Genta Diaacutelogos pertinentes na formaccedilatildeo inicial e continuada de professores e gestores escolares A concepccedilatildeo

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VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

Correspondecircncia

Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Maria de Faacutetima Carvalho ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

E-mail emartinsunifespgmailcom ndash carvalhomdfgmailcom ndash

remarciliogmailcom

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concerns observations and reflections recorded in fieldwork notebook referring to the years 2015 2016 and 2017 The analysis are made based on the issues of greater concern reported by the students in the daily process of internship and are on the themes space organization routine school management school-family relationship the contact with writing skills and diversity in school It is concluded that such experience can be understood as a way of breaking the dichotomy between theory and practice presenting itself as a place for many voices in dialogues related to school culture and teacher training with a view to an educational praxis that can be traced in the childrens public school Keywords Pedagogical residence Teacher training Supervised internship

Introduccedilatildeo

Historicamente a universidade tem buscado novas formas e modelos no

trabalho de formaccedilatildeo de professores para a educaccedilatildeo baacutesica Nessa direccedilatildeo Tardif

(2013) ao abordar a formaccedilatildeo para a docecircncia afirma que esta modalidade de ensino

estaacute subordinada aos paradigmas ou crenccedilas de cada eacutepoca histoacuterica No contexto

brasileiro nos dias atuais lidamos com uma profusatildeo de reformas educacionais que

em linhas gerais desde a deacutecada de 80 visam a democratizaccedilatildeo dos espaccedilos e

saberes universitaacuterios em experiecircncias como por exemplo as realizadas durante os

estaacutegios de formaccedilatildeo docente

Pensando no campo da formaccedilatildeo de professores e buscando o diaacutelogo entre a

universidade e escola puacuteblica algumas iniciativas brasileiras buscam caminhos que

possibilitem essa dinacircmica como indicado na pesquisa de Martins e Slavez (2015)

Neste estudo os autores fazem um levantamento de experiecircncias inovadoras que tecircm

como base a promoccedilatildeo e inserccedilatildeo de docentes em formaccedilatildeo em escolas de educaccedilatildeo

baacutesica com vistas agrave possibilitar formas de articulaccedilatildeo entre professores experientes

dessas instituiccedilotildees e aqueles que desempenham o papel de formadores nas

universidades O estudo analisou programas como o Programa Institucional de Bolsa

de Iniciaccedilatildeo agrave Docecircncia (PIBID) mantido pela Coordenaccedilatildeo de Aperfeiccediloamento de

Pessoal de Niacutevel Superior (Capes) e o Programa de Residecircncia Pedagoacutegica (PRP)

oferecido pela Universidade Federal de Satildeo Paulo (Unifesp) concluindo que tais

accedilotildees satildeo de extrema importacircncia para a formaccedilatildeo profissional dos estudantes

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A proposta da Residecircncia Pedagoacutegica aqui abordada tem como base os

mesmos princiacutepios utilizados ao se pensar a institucionalizaccedilatildeo da Residecircncia meacutedica

no Brasil Feuerwerker (1998) aponta que ao implantar os programas de Residecircncia

na medicina foi importante considerar a hipoacutetese de que a formaccedilatildeo geral do meacutedico

na graduaccedilatildeo tendo em vista o desenvolvimento tecnoloacutegico e cientiacutefico naquele

momento natildeo era capaz de assegurar o niacutevel necessaacuterio de treinamento e

incorporaccedilatildeo de conhecimentos especiacuteficos aos estudantes em todas as possiacuteveis

atividades praacuteticas do cotidiano profissional A autora ainda afirma que

A praacutetica profissional historicamente tem sido transmitida atraveacutes de treinamento em serviccedilo Eacute no processo de combinar os conhecimentos teoacutericos adquiridos com a experiecircncia cliacutenica (indicando relacionamento com pacientes) que se encontra a ldquomaacutegicardquo da praacutetica profissional meacutedica Somente a experiecircncia adquirida na praacutetica pode completar a formaccedilatildeo (cientiacutefica) do meacutedico eacute pela experiecircncia cliacutenica que o profissional se apropria dos doentes (e natildeo mais apenas das doenccedilas) Eacute pela praacutetica que se constroacutei a experiecircncia cliacutenica e eacute mediante o aprendizado em serviccedilo que o futuro profissional constroacutei tambeacutem a eacutetica de suas relaccedilotildees com os pacientes baseada no exemplo e na experimentaccedilatildeo (FEUERWERKER 1998 p 59)

Dada a importacircncia da profissatildeo do professor seria possiacutevel a consideraccedilatildeo

dessas mesmas premissas para o campo do exerciacutecio da docecircncia Quais formas

possiacuteveis para instrumentalizar os futuros professores para lidar com as vicissitudes

das praacuteticas cotidianas das escolas Como aliar as teorias pedagoacutegicas agraves praacuteticas

docentes no exerciacutecio da profissatildeo Eacute possiacutevel dizer que pela praacutetica se constroacutei a

experiecircncia docente e eacute mediante o aprendizado na praacutetica que o futuro professor

constroacutei a eacutetica de suas interaccedilotildees com os alunos a partir de exemplos diaacuterios e da

experimentaccedilatildeo

Partindo dessas questotildees o Programa de Residecircncia Pedagoacutegica (PRP)

projeto de estaacutegio em formaccedilatildeo docente foi implantado em 2009 em uma

universidade puacuteblica federal do Estado de Satildeo Paulo A proposta concebida por

docentes do curso de Pedagogia buscou a superaccedilatildeo dos modos convencionais de

realizaccedilatildeo de estaacutegios de formaccedilatildeo nos quais os estudantes estagiaacuterios limitam sua

accedilatildeo agrave simples observaccedilatildeo assistemaacutetica de experiecircncias esparsas de praacuteticas

pedagoacutegicas em diferentes salas de aulas Tal iniciativa teve sua metodologia

desenvolvida por docentes da Universidade tendo como bases para consolidaccedilatildeo e

desenvolvimento uma ampla investigaccedilatildeo realizada com professores das redes

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puacuteblicas de um sistema de ensino puacuteblico da regiatildeo metropolitana de Satildeo Paulo entre

os anos de 2007 e 2008 assim como contou com subsiacutedios do Programa da Capes

intitulado ldquoProdocecircnciardquo

Pesquisas como as de Moretti 2011 Martins 2012 Moretti e Martins 2015

Giglio 2010 Giglio e Lugli 2014 Poladian 2014 sob diferentes perspectivas teoacutericas

tecircm tentado buscar compreender aspectos especiacuteficos dessa experiecircncia de estaacutegio

e em sua maioria assinalam tal iniciativa como um dos processos inovadores na aacuterea

de formaccedilatildeo de professores principalmente no que se refere agrave superaccedilatildeo da

dicotomia entre teoria e praacutetica vigente nos estaacutegios dos cursos de formaccedilatildeo de

professores das universidades brasileiras Compreende-se que a formaccedilatildeo do

profissional docente integra um conjunto de desafios destacando-se nos cursos de

formaccedilatildeo inicial a necessidade de ofertar juntamente com subsiacutedios

teoacutericoscientiacuteficos tambeacutem um acesso agraves praacuteticas pedagoacutegicas que instrumentalizem

o professor para a atuaccedilatildeo profissional Nesta direccedilatildeo destaca-se a conduccedilatildeo do

graduando agrave estaacutegios curriculares capazes de iniciaacute-los na praacutetica profissional de

forma efetiva e reflexiva para que com o aporte de professores supervisores

construam conhecimentos que envolvam o pensar e o agir sobre a escola

Quase dez anos apoacutes a criaccedilatildeo do Programa de Residecircncia pedagoacutegica criado

pela Universidade Federal de Satildeo Paulo (Unifesp) em 2018 foi lanccedilado pelo Governo

Federal o Edital CAPES No62018 apresentando a ideia de Residecircncia Pedagoacutegica

como proposta de induccedilatildeo agrave experiecircncias inovadoras na formaccedilatildeo inicial de

professores ao mesmo tempo em que altera as caracteriacutesticas originais do PIBID no

Edital No72018 O edital retoma termos e objetivos bastante proacuteximos dos utilizados

no Programa de Residecircncia aqui abordado entretanto diferencia-se deste e conveacutem

apontar alguns dos elementos definidores desta diferenccedila como por exemplo a

proposiccedilatildeo de um nuacutemero limitado de bolsas aos residentes o que natildeo atenderia a

demanda de estudantes da universidade onde o programa teve origem a previsatildeo

de um nuacutemero maior de residentes por preceptor extrapolando o nuacutemero maacuteximo

indicado pelo Programa base de nosso estudo para a educaccedilatildeo baacutesica Aleacutem disso a

proposta de Residecircncia Pedagoacutegica apresentada no edital referido daacute pouca ou

nenhuma ecircnfase a duas outras modalidades de residecircncia presentes no projeto da

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Unifesp que satildeo a Residecircncia Pedagoacutegica em Gestatildeo Escolar e em Educaccedilatildeo de

Jovens e Adultos

Accedilotildees formativas da Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil (RPEI)

Antes de apresentarmos mais detalhadamente o Programa de Residecircncia em

Educaccedilatildeo infantil (RPEI) eacute importante destacar que o trabalho de formaccedilatildeo de

professores nesta perspectiva comeccedila com o aporte teoacuterico das disciplinas

obrigatoacuterias que contemplam as temaacuteticas do campo Vencida a etapa teoacuterica os

estudantes comeccedilam o programa de estaacutegio contemplado nesta modalidade que

atende o curso de Pedagogia e eacute constituiacuteda como uma unidade curricular obrigatoacuteria

Somente a partir do 5o semestre do curso os alunos devem se matricular e cumprir

135 horas de estaacutegio as quais compreendem momentos de imersatildeo na escola e

supervisatildeo na universidade sendo tal experiecircncia realizada em escolas puacuteblicas

municipais que possuem parceria com a Universidade

Durante todo o processo a atuaccedilatildeo do professor preceptor possui destaque

segundo Moretti e Martins (2015) pois ele faz os primeiros contatos com os

estudantes de cada grupo que vai para a escola e eacute quem supervisiona o estaacutegio

acompanhando o aluno durante todo o percurso do programa Em todas as

modalidades de Residecircncia Pedagoacutegica antes de iniciar a imersatildeo na escola os

estudantes participam de encontros pontuais com seus preceptores para discussatildeo

do programa de atividades da Unidade Curricular No caso da Educaccedilatildeo Infantil

nessas ocasiotildees de encontros realizam-se estudos sobre temaacuteticas relevantes e

discussatildeo de leituras introdutoacuterias agrave atividade de estaacutegio e tambeacutem para orientaccedilotildees

mais praacuteticas sobre por exemplo as regras a serem observadas durante o periacuteodo

de estaacutegio o conhecimento das publicaccedilotildees do PRP para a modalidade especiacutefica a

construccedilatildeo do diaacuterio de campo o papel do professor preceptor e do professor

formador (aquele que o residente acompanharaacute na escola) Todas essas orientaccedilotildees

constam de um manual e satildeo retomadas pelos preceptores em leituras coletivas que

objetivam ajudar os estudantes a usarem o material de suporte enfatizando que o

estaacutegio realizado nesta perspectiva implica mais que observaccedilatildeo passiva a

participaccedilatildeo nas atividades escolares seu registro e reflexatildeo Os primeiros encontros

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tambeacutem envolvem a orientaccedilatildeo sobre aspectos de ordem legal como por exemplo

jamais assumir sozinho a sala de aula em que estatildeo fazendo a residecircncia

Como unidade curricular obrigatoacuteria a RPEI prevecirc em sua ementa que os

alunos deveratildeo construir conhecimentos a partir de identificaccedilatildeo e anaacutelise de relaccedilotildees

e praacuteticas que perfazem o dia a dia da escola de Educaccedilatildeo Infantil atentando para o

seu caraacuteter educacional e pedagoacutegico assim como para os processos de gestatildeo

institucional Esse processo de construccedilatildeo de conhecimentos sobre o que vivenciam

eacute mediado pelo uso de instrumentos de pesquisa qualitativa em educaccedilatildeo

Concomitantemente enquanto participam do dia a dia na escola planejam e elaboram

planos de accedilatildeo pedagoacutegica em colaboraccedilatildeo com os supervisores do estaacutegio e

educadores das escolas-campo

No processo de imersatildeo espera-se que o residente natildeo apenas observe mas

possa dar apoio ao professor de classe em suas praacuteticas pedagoacutegicas cotidianas e na

sua relaccedilatildeo com as crianccedilas com idade entre 0 e 5 anos Cotidianamente tais

residentes devem ser encorajados a atuarem com pequenas accedilotildees junto agraves crianccedilas

com a orientaccedilatildeo dos professores que o acompanham Durante quatro semanas no

processo intenso de imersatildeo na realidade da escola os residentes devem construir

registros diaacuterios das experiecircncias vividas em campo aleacutem de outros materiais que

tecircm origem na observaccedilatildeo participativa do dia a dia escolar e serviratildeo de avaliaccedilatildeo

final tendo elaboraccedilatildeo orientada e aferida pelo professor preceptor da Universidade

Dessa perspectiva o residente tambeacutem eacute solicitado a refletir sobre sua proacutepria

atuaccedilatildeo participando ativamente de um processo de contiacutenua auto avaliaccedilatildeo

Eacute objetivo do Programa em todas as suas modalidades que os graduandos

possam retomar de forma reflexiva o que vivenciam na escola Na modalidade de

Educaccedilatildeo Infantil eacute esperado que o estudante residente possa desenvolver anaacutelises

criacutetico-reflexivas acerca da instituiccedilatildeo no qual estaacute imerso no que se refere agrave interaccedilatildeo

com as famiacutelias e agrave comunidade em seu entorno assim como sobre as praacuteticas

pedagoacutegicas realizadas nesses locais a partir do reconhecimento da crianccedila como

sujeito de direito e de toda a legislaccedilatildeo que diz respeito a essa modalidade de ensino

De acordo com o cronograma da Unidade Curricular Residecircncia Pedagoacutegica

em Educaccedilatildeo Infantil os estudantes devem ir durante quatro dias da semana para a

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escola e um dia para a Universidade para supervisatildeo com o preceptor que eacute um

docente da Universidade Na escola cumprem o horaacuterio da turma que acompanham

em turno que pode ser matutino vespertino ou intermediaacuterio Natildeo satildeo toleradas faltas

ou atrasos sem justificativa meacutedica objetivando-se desta forma colocar os alunos

diante da responsabilidade do compromisso profissional assumido perante a escola

Durante as duas primeiras semanas de imersatildeo os estudantes satildeo orientados

a descrever no diaacuterio de campo o que observam e suas impressotildees sobre a escola

as relaccedilotildees entre professorcrianccedilas crianccedilacrianccedila escolacomunidade

famiacuteliasescola professorprofessor professorgestatildeo e praacuteticas educativas do

cotidiano que satildeo observadas mais atentamente Neste primeiro momento aleacutem da

cobranccedila para que o aluno escreva sobre suas vivecircncias o preceptor busca ajudaacute-lo

na construccedilatildeo dos registros do caderno de campo assinalando sobre as posturas de

descriccedilatildeo e de reflexatildeo na elaboraccedilatildeo sobre suas impressotildees sobre aquilo que eacute

observado

Antes de serem executados os planos pedagoacutegicos de cada estudante satildeo

apresentados para os professores formadores e coordenador nas escolas durante

reuniatildeo realizada na ldquoHora Atividaderdquo com a participaccedilatildeo do professor preceptor Este

tem se constituiacutedo um momento iacutempar de aprendizagem para todos os envolvidos jaacute

que nesta ocasiatildeo os estudantes compartilham seus conhecimentos suas

experiecircncias expectativas e apreensotildees e onde explicitam-se possibilidades de

articulaccedilatildeo escola-universidade no acircmbito da formaccedilatildeo de professores Eacute na uacuteltima

semana de imersatildeo que os estudantes colocam seus planos de accedilatildeo pedagoacutegica em

praacutetica nas salas em que estatildeo imersos fechando o ciclo previsto pelo estaacutegio

Metodologia analisando as temaacuteticas do caderno de campo online (Blog)

Alguns grupos de residentes da RPEI conforme opccedilatildeo dos professores

preceptores usam um blog para a construccedilatildeo online de um caderno de campo que

integra a elaboraccedilatildeo de seus registros sobre a imersatildeo na escola Esses registros ndash

que chamamos de postagens aleacutem de possibilitar um olhar mais apurado sobre as

praacuteticas cotidianas podem contribuir para a orientaccedilatildeo e a construccedilatildeo do Plano de

Accedilatildeo Pedagoacutegica de cada residente e posteriormente para a escrita de um relatoacuterio

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final de estaacutegio pelo grupo Eacute sobre os registros do blog que incidiraacute nossa anaacutelise

considerando para tanto inquietaccedilotildees observaccedilotildees e reflexotildees registradas pelos

residentes nos anos de 2015 2016 e 2017

O blog da residecircncia ou diaacuterio de campo online consiste em uma ferramenta

virtual na qual satildeo realizados os registros de observaccedilotildees e experiecircncias significativas

vividas pelos residentes cotidianamente na escola Destaca-se que tal ferramenta eacute

de acesso restrito e apenas um uacutenico grupo de alunos e professores preceptores da

Universidade podem participar em cada escola acompanhada Deste modo nem os

professores ou quaisquer pessoas das escolas-campo podem acessar tal instrumento

O blog eacute construiacutedo pelo professor preceptor a cada novo grupo de residentes

assegurando o sigilo das informaccedilotildees registradas A ferramenta possibilita a

construccedilatildeo coletiva de diaacutelogos sobre questotildees observadas e a mediaccedilatildeo dos

conhecimentos dos residentes pelos seus supervisores Assim os estudantes podem

realizar trocas sobre suas vivecircncias muitas vezes similares agraves que ocorrem na mesma

instituiccedilatildeo ainda que estejam em turmas de idades diferentes Permite tambeacutem que

preceptores acompanhem diariamente seus residentes respondendo as indagaccedilotildees

e inquietaccedilotildees do grupo que participa do dia-a-dia na escola

Aleacutem de cumprir todos os objetivos de um caderno de campo comum o blog

permite ao preceptor mesmo agrave distacircncia o acompanhamento contiacutenuo do grupo de

estudantes o que lhe permite planejar as atividades semanais de supervisatildeo de forma

a responder as demandas dos alunos e esses uacuteltimos de compartilharem seus

diferentes pontos de vistas e as accedilotildees desenvolvidas na escola Assim no contexto

da residecircncia pedagoacutegica o blog ou caderno de campo online eacute o espaccedilomomento

de realizaccedilatildeo dos registros de observaccedilotildees e experiecircncias significativas vividas

cotidianamente na escola de educaccedilatildeo infantil e de acompanhamento e

problematizaccedilatildeo dessas vivecircncias pelos preceptores

Nesse caminho assinala-se a contribuiccedilatildeo de Vygotsky (1981) quando aponta

que as relaccedilotildees humanas satildeo sempre mediadas pelo meio social e pelos instrumentos

e signos que fazem parte das relaccedilotildees e dos contextos em que o homem estaacute inserido

Desse modo

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A atividade praacutetica do homem portanto se faz duplamente mediada de uma parte estaacute mediada pelas ferramentas no sentido literal da palavra e de outra parte mediada pelas ferramentas no sentido figurado pelas ferramentas do pensamento pelos meios com a ajuda dos quais se realiza a operaccedilatildeo intelectual ou seja mediada com a ajuda das palavras (VYGOTSKI 19302006a p 165)

Nessa direccedilatildeo conveacutem destacar a importacircncia do blog como instrumento social

representativo da incorporaccedilatildeo da tecnologia ao dia a dia dos estudantes e da

consideraccedilatildeo da mediaccedilatildeo tecnoloacutegica em processos de aprendizagem e

desenvolvimento dos graduandos

Diferente de outras formas de relacionamento virtual (e-mail chat instant

messages listas de discussatildeo etc) e de ferramentas virtuais convencionais ndash como

os sites ndash o blog caracteriza-se pela facilidade de sua criaccedilatildeo e manutenccedilatildeo o que eacute

definido pela organizaccedilatildeo automaacutetica das mensagens ndash posts ndash pelo sistema

dinamizando seu uso e favorecendo a construccedilatildeo de diaacuterios coletivos mantidos por

vaacuterios usuaacuterios Tais caracteriacutesticas favorecem o uso do blog em processos de ensino-

aprendizagem tendo em vista a interaccedilatildeo a troca o diaacutelogo como forma de partilha e

construccedilatildeo de conhecimentos (MARQUES MULLER 2012)

O blog permite portanto o compartilhamento de informaccedilotildees e a interaccedilatildeo

entre estudantes do mesmo grupo e o mesmo preceptor em uma mesma escola

Todos podem ler e comentar as postagens funcionando como um ponto de encontro

entre alunos e preceptores Assim nossa atenccedilatildeo agraves postagens dos estudantes no

blog eacute dirigida pelo objetivo de dar visibilidade a dimensatildeo social das praacuteticas de

registro do observadovivido nos processos formativos que emergem na experiecircncia

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil Assumimos o caraacuteter histoacuterico-

cultural da pesquisa do meacutetodo do objeto de estudo e do proacuteprio conhecimento como

construccedilatildeo que se realiza entre sujeitos (FREITAS 2009) Dessa forma acredita-se

que o momento de elaboraccedilatildeo do vivido ndash o registro no caderno de campoblog ndash

deflagra no estudante a necessidade de reflexatildeo sobre os processos de ensino-

aprendizagem em curso no acircmbito do estaacutegio-residecircncia pedagoacutegica

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Registros no caderno de campo online o olhar do residente sobre a escola de

educaccedilatildeo infantil

Nos primeiros dias de imersatildeo na escola os residentes satildeo orientados a

realizar uma observaccedilatildeo atenta dos espaccedilos da instituiccedilatildeo A partir da leitura do texto

de Silva e Bufalo (2011) sobre culturas escolares os residentes descrevem em seus

primeiros registros detalhes fiacutesicos sobre a escola Muitos acabam desenhando a

planta baixa ou tirando fotos de salas de aulas parques e paacutetios e compartilhando no

caderno de campo online (blog) para comeccedilarem a pensar sobre o contexto e os

espaccedilos que podem favorecer a aprendizagem e o desenvolvimento da crianccedila

pequena como descrito no excerto abaixo

Uma coisa que me chamou atenccedilatildeo foi que natildeo possuem um espaccedilo para atividade fiacutesica essas satildeo realizadas no paacutetio que eacute proacuteximo as salas o barulho acaba atrapalhando os demais O parque estaacute interditado por ordem da diretora ou seja natildeo possuem lugar para brincar O dia das crianccedilas foi pautado em ficar sentado e quieto vendo um filme que a maioria jaacute tinha assistido (Relato da residente N 2017)

Formas de organizaccedilatildeo de espaccedilos e tempos remetem agrave organizaccedilatildeo da rotina

Sobre esse tema grande quantidade de postagens textos diz respeito a como as

atividades diaacuterias satildeo organizadas na escola Em alguns registros como o

apresentado a seguir aparece a problematizaccedilatildeo da forma de organizaccedilatildeo das

atividades

730 (15min) - a professora colocou o cabeccedilalho na lousa com a data e fez a contagem coletiva das crianccedilas 745 (45min) - a professora retomou o que eles haviam aprendido sobre os iacutendios entregou massinha e os orientou a modelar utensiacutelios indiacutegenas 830 (35min) - pintura de desenho xerocado que seraacute colado na capa do caderno de atividades 905 (25min) - brincadeira livre no paacutetio interno no brinquedatildeo que fica no final da escadarampa sup2940 (30min) - brincadeira em sala Gato mia 1010 (ateacute as crianccedilas irem embora) - a professora entregou uma folha com a letra da canccedilatildeo 1 2 3 indiozinhos cantou a muacutesica com eles sentados em seus lugares pediu para eles circularem as letras A e I e depois pintar a ilustraccedilatildeo () (Relato da residente J 2015)

A rotina observada e registrada pela residente configura-se como um dos

aspectos mais relevantes na vida da crianccedila que se encontra na escola de Educaccedilatildeo

Infantil Barbosa (2006) aponta que esse eacute um dos elementos que integram as praacuteticas

educativas que devem ser observadas e planejadas com regularidade objetivando a

operacionalizaccedilatildeo do cotidiano da escola de maneira que possa contribuir na

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constituiccedilatildeo da subjetividade dos atores escolares Desse modo pensar e

compreender a rotina como um fator presente e essencial na educaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute um passo promissor para que o residente acompanhe como as atividades

cotidianas da escola se materializam e datildeo base para a organizaccedilatildeo da praacutetica

pedagoacutegica devendo estar presente no desenvolvimento curricular

O planejamento das atividades na educaccedilatildeo infantil tem estreita ligaccedilatildeo com a

rotina Ao observar e refletir sobre a vida e as experiecircncias das crianccedilas na escola os

residentes satildeo remetidos a memoacuteria agrave lembranccedila do que tambeacutem foi um dia vivido

por eles em suas experiecircncias escolares Como apontado por Meksenas (2002)

ldquonunca somos testemunhas objetivas observando objetos e sim sujeitos observando

outros sujeitosrdquo (p 116)

Estive tentando lembrar nas uacuteltimas semanas o que eu fazia na minha preacute-escola Eu comecei no maternal com 3 anos ()Tenho vagas lembranccedilas de duas salas de aula uma do preacute III e a outra acho que era do preacute I Era uma escola particular dessas pequenas de bairro Lembro que a turma natildeo era tatildeo numerosa quanto essa que estou vendo na residecircncia mas a sala tinha uma organizaccedilatildeo parecida eram mesas e cadeiras enfileiradas nas duas () Eu estava com 5 anos Lembro que a gente tinha uma apostila no preacute I eu gostava de terminar tudo raacutepido para dormir Depois a professora comeccedilou a me dar gibi para eu ficar folheando Tenho na minha memoacuteria que as coisas que a gente fazia na escola eram chatas e muito infantis bobas demais Agora eu penso talvez as professoras ficassem me ocupando com massinha e pinturas todo dia tambeacutem como eu vejo na residecircncia e por isso eu achava muito chato O que seraacute que essas crianccedilas pensam disso O que seraacute que elas acham mais legal na escola Eu vejo que elas gostam muito de fazer liccedilatildeo essas de folhinha que a professora daacute e todos os dias elas perguntam Mas eu natildeo me conformo como elas acham isso tatildeo legal (Relato da Residente F 2017)

Sabemos que a memoacuteria eacute mediada pelo signo pelas interaccedilotildees sociais pelo

outro Braga (1997) dirige nosso olhar para o ldquoprocesso de apropriaccedilatildeo das formas

culturais de interaccedilatildeo que caracterizam a memoacuteria humanardquo Para a autora ldquoa

memoacuteria do homem soacute se configura no movimento discursivo e coletivo por sua

natureza cultural e simboacutelicardquo No registro acima o observado mobiliza as lembranccedilas

da residente aquilo que foi tambeacutem vivido na escola de sua infacircncia Entre lembranccedilas

e interrogaccedilotildees emergem as construccedilotildees formativas em um processo dinacircmico ndash

interativo cultural e simboacutelico Processo que potildeem em relaccedilatildeo vivecircncias atuais e

passadas que invocam sentidos e significados atribuiacutedos ao vivido que ocorre nas

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contradiccedilotildees entre aquilo que eacute rememorado pela estudante e o que efetivamente eacute

observado nas relaccedilotildees estabelecidas no contato com o cotidiano da escola

Aleacutem da rotina e da organizaccedilatildeo de tempos e espaccedilos em sua relaccedilatildeo com as

praacuteticas pedagoacutegicas os relatos dos estudantes se reportam agraves diferentes dimensotildees

da gestatildeo escolar Os registros destacam suas observaccedilotildees nas H A (hora atividade)

ou reuniotildees que eventualmente participam e com frequecircncia observam a postura da

equipe em relaccedilatildeo a presenccedila do residente Em seus relatos questionam o caraacuteter

da gestatildeo a qualidade da relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo entre os professores as discussotildees

que remetem a construccedilatildeo e discussatildeo do projeto poliacutetico pedagoacutegico e os papeis

desempenhados pelos diferentes educadores na construccedilatildeo do trabalho de educaccedilatildeo

da infacircncia

Completamos nesta semana 4 dias de participaccedilatildeo nas Horas Atividades (HA) destinada agrave formaccedilatildeo docente organizaccedilatildeo dos registros e planejamento das atividades pedagoacutegicas O que pude por meio da observaccedilatildeo constatar que o papel do Coordenador Pedagoacutegico que eacute fundamental nesse momento de formaccedilatildeo pois eacute ele o mediador desse processo acaba por se tornar distante e sem intervenccedilotildees no que adentra a orientaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico docente (Relato da estudante M 2015)

Na experiecircncia cotidiana de imersatildeo na escola eacute possiacutevel verificar as tensotildees

vivenciadas entre os professores e o papel da coordenaccedilatildeo pedagoacutegica A teoria

discutida na universidade pelos residentes assinala a importacircncia do papel do

coordenador pedagoacutegico na educaccedilatildeo infantil na praacutetica o residente percebe o quanto

a sua mediaccedilatildeo eacute fundamental na organizaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico e por outro

lado o quanto a sua ausecircncia pode interferir de forma negativa na orientaccedilatildeo das

atividades dos professores

Outra personagem que acaba sendo central na gestatildeo escolar eacute a direccedilatildeo que

nessa experiecircncia do residente tambeacutem eacute observada de forma criacutetica

A figura da diretora na escola foi a que mais me chamou a atenccedilatildeo ()imaginem que em nenhum momento percebi qualquer aproximaccedilatildeo da diretora com as crianccedilas em vaacuterios momentos acreditei que ela fosse algum teacutecnico administrativo pois apesar de estar no topo da piracircmide a referecircncia da gestatildeo a mesma se restringia a secretaria e natildeo se relacionava natildeo nos conhecia nem procurava nos conhecer Passou diversas vezes por grupos de crianccedilas e em nenhuma das vezes sequer olhou para elas Nunca apareceu em uma HA nunca percebi o seu contato com os professores e por diversas vezes me perguntei como eles se falavam qual era o seu relacionamento (Relato da residente B 2015)

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Sobre esse assunto estudos como os de Paro (2005) e Castro (2009) tem

assinalado o papel da gestatildeo e da administraccedilatildeo escolar como alicerce fundamental

nos processos de transformaccedilatildeo da escola puacuteblica brasileira Tais trabalhos tecircm

apontado a centralidade da direccedilatildeo escolar nas questotildees que envolvem os processos

de ensino e aprendizagem e as relaccedilotildees humanas presentes na equipe de trabalho

para aleacutem dos trabalhos administrativos e burocraacuteticos Natildeo eacute objetivo deste trabalho

fazer uma anaacutelise do papel do diretor na escola de educaccedilatildeo infantil mas cabe

assinalar que os estudantes residentes apontam o tema em seus registros e atentos

agraves demandas relativas ao papel do diretor indagam se como e quanto as lideranccedilas

escolares tecircm se envolvido com o trabalho administrativo dispendendo tempo para

um olhar mais atento agraves relaccedilotildees entre os professoresalunos funcionaacuterios da escola

observada

Em relaccedilatildeo agraves interaccedilotildees humanas outros registros dos residentes nos

remetem agraves maneiras como a escola lida com as famiacutelias das crianccedilas matriculadas

nas escolas Tais relatos natildeo satildeo tatildeo frequentes possivelmente porque essa eacute uma

relaccedilatildeo que se caracteriza pela assimetria de poderes e eacute pouco valorizada no dia a

dia escolar Os registros evocam situaccedilotildees vividas comentaacuterios ouvidos e

principalmente a necessidade de mudanccedila dos modos de conceber a crianccedila e suas

famiacutelias e de interagir com elas

A relaccedilatildeo entre professor e famiacutelia eacute mais uma dessas conexotildees que fazemos pela vida Por um lado haacute um profissional uma pessoa que estudou e eacute especialista em cuidar de crianccedilas Por outro famiacutelias que dificilmente conseguimos de fato perceber como satildeo suas estruturadas Famiacutelia hoje eacute coisa difiacutecil de entender Eacute matildee que mora sozinha com o filho eacute pais que trabalham e deixam os filhos na semana com tios avoacutes Eacute matildee solteira Eacute filho criado por pai viuacutevo Eacute histoacuteria que natildeo acaba mais Na hora da saiacuteda vamos conhecendo um pouquinho da estrutura familiar de cada crianccedila tentando perceber como se daacute a relaccedilatildeo entre a famiacutelia e a escola mas devemos ter um pouco de cuidado com esse processo (Relato do estudante J 2015)

Aleacutem da residente ter um olhar para os diferentes tipos de arranjos familiares

tambeacutem busca compreender a especificidade de cada famiacutelia considerando o papel

da mulher e de matildee trabalhadora com filhos na escola puacuteblica

(hellip) Veja esses apontamentos uma menina na sala estaacute com piolho a professora disse que jaacute alertou a matildee mas como eacute matildee solteira soacute pode cuidar da filha no domingo O outro menino que natildeo se interessa pelas atividades e responde a educadora tambeacutem teve a matildee notificada mas como

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a mesma eacute separada do marido natildeo faz nada O fato da mulher trabalhar a semana e ter folga aos domingos natildeo significa que ela seja uma maacute matildee pelo contraacuterio significa que ela rala muito para colocar comida no prato A presenccedila ou natildeo de um homem natildeo condiciona nada A escola natildeo pode ser um ambiente de roacutetulos ela deve estar aberta agraves diferenccedilas acolhendo e buscando outras maneiras e formas de aproximaccedilatildeo com a famiacutelia compreendendo a responsabilidade compartilhada que carregam (Registro da residente B 2015)

Os relatos demonstram natildeo soacute o quanto estatildeo atentos para como a escola lida

com as relaccedilotildees familiares mas sobretudo assinalam como tecircm se configurado as

formaccedilotildees das famiacutelias na atualidade Um estudo de Martins (2012) aponta o quanto

a experiecircncia de residecircncia pedagoacutegica possibilita aos estudantes um contato mais

expressivo com a realidade da escola puacuteblica de periferia urbana Aleacutem de observar

as relaccedilotildees institucionais o residente pode ser sensibilizado frente agraves dificuldades

vividas pelas famiacutelias e tendem a perceber o preconceito em relaccedilatildeo aos vaacuterios

arranjos familiares vivenciados pelas crianccedilas mais pobres e como a escolarizaccedilatildeo

dos pais pode afetar a vida dos filhos Os registros dos residentes demonstram como

ldquoos contextos de vida das crianccedilas que frequentam a escola puacuteblica de periferia

passam a ser compreendidos de uma forma concreta e as relaccedilotildees do espaccedilo familiar

com o espaccedilo escolar passam a ter uma conexatildeo cotidianardquo (MARTINS 2012 p 95)

Outra temaacutetica recorrente nos registros dos estudantes diz respeito ao processo

de escolarizaccedilatildeo das praacuteticas da educaccedilatildeo da infacircncia Tal perspectiva surge quando

os residentes referem aos usos dos brinquedos e agraves brincadeiras agrave presenccedila da

leitura e contaccedilatildeo de histoacuterias aos modos de introduccedilatildeo do desenho ao uso de novas

tecnologias e aos modos de avaliar agraves crianccedilas Tal perspectiva escolarizante emerge

em oposiccedilatildeo ao luacutedico como princiacutepio e forma de organizaccedilatildeo das praacuteticas de

educaccedilatildeo junto agraves crianccedilas pequenas e algumas vezes a ela ainda se articula a

preocupaccedilatildeo em disciplinar as vivecircncias escolares sondagens filas broncas e

silecircncios coexistem com desenhos Tv computadores e brincadeiras Os registros nos

dizem de uma escola que hesita entre coibir e promover a expressatildeo das muitas

linguagens da imaginaccedilatildeo e movimento das crianccedilas

Na semana de 2310 a 2710 e como previsto na reuniatildeo de pais a professora realizou a sondagem com as crianccedilas Teoricamente sei como funciona o procedimento mas me questiono se deve ser realizada na Ed Infantil Tambeacutem me pergunto se a sondagem vai muito aleacutem do conhecimento das crianccedilas Por exemplo algumas escrevem o proacuteprio nome

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e algumas palavras mais comuns a elas outras ainda nem reconhecem as letras do alfabeto A sondagem feita abarcou o nome palavras simples um pouco mais complexas e uma frase inteira A minha duacutevida eacute se a sondagem que vai muito aleacutem dos conhecimentos da sala eacute comum e necessaacuteria ainda mais na Ed Infantil (Relato do residente N 2017)

O debate em torno das questotildees que envolvem a escolarizaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute bastante antigo e recorrente Pesquisas como as de Neves Castanheira

e Gouveia (2015) assinalam a partir de autores que estudaram essa temaacutetica como

a perspectiva escolarizante de trabalho com a crianccedila pequena traz seacuterias implicaccedilotildees

para o desenvolvimento infantil justamente porque rompe com as formas como elas

ldquointeragem com a escrita fora da escola destituindo-a de significados pessoais e

sociais e dificulta portanto que as atividades desenvolvidas no espaccedilo escolar

envolvam a ludicidade caracteriacutestica fundamental dessa fase do desenvolvimentordquo

(p 217)

Os residentes parecem estar muito atentos a essas questotildees porque participam

de discussotildees sistemaacuteticas sobre o assunto tanto nas aulas teoacutericas na Universidade

quanto nas reuniotildees de orientaccedilatildeo com os preceptores do Programa de Residecircncia

Muitos estudantes satildeo levados a refletir sobre o assunto logo nos primeiros dias de

imersatildeo na escola

Resolvi mudar o formato do meu relato referente agrave imersatildeo inicial Pois passei por uma situaccedilatildeo em sala que me provocou tal accedilatildeo Devido agrave imposiccedilatildeo de escolarizaccedilatildeo percebida na turma na qual acompanho Onde hoje me emocionei com o choro insistente do aluno BG com as matildeos estremecidas na tentativa de segurar o laacutepis para ldquofazer liccedilatildeordquo (Relato da Residente M 2015)

A partir do relato da residente percebe-se o quanto a questatildeo eacute relevante para

o campo da educaccedilatildeo infantil e da formaccedilatildeo de professores Nas observaccedilotildees e

relatos dos cadernos de campo natildeo eacute incomum aparecerem longas narrativas sobre

os equiacutevocos que ocorrem nas praacuteticas pedagoacutegicas que envolvem a alfabetizaccedilatildeo e

letramento das crianccedilas pequenas Consideramos que questotildees como essas quando

problematizadas pelos estudantes nos horaacuterios de preceptoria ou mesmo nas

discussotildees com professores especialistas sobre o tema tendem a aproximaacute-los de

uma futura praacutetica profissional em que o trabalho com o desenvolvimento da escrita

seja realizado de forma a respeitar a infacircncia natildeo negando agrave crianccedila o seu direito ao

luacutedico mas tratando a apresentaccedilatildeo do mundo letrado como mais um momento

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prazeroso de aprendizagens Tal reflexatildeo eacute importante para os futuros professores

para que busquem compreender como inserir as crianccedilas no mundo letrado de

maneira que possam romper com a dicotomia entre o brincar e a leituraescrita

tomando como referecircncia o significado dessas accedilotildees para a crianccedila possibilitando a

conduccedilatildeo dos trabalhos na educaccedilatildeo infantil que tornem possiacutevel o brincar ldquoletrando

e alfabetizandordquo (NEVES CASTANHEIRA E GOUVEIA 2015)

Outra temaacutetica que aparece num nuacutemero expressivo de postagens diz respeito

ao olhar do residente para as praacuteticas educativas e as interaccedilotildees que ocorrem na

escola com relaccedilatildeo agrave inclusatildeo escolar das crianccedilas percebidas como ldquodiferentesrdquo

Destaca-se nesta temaacutetica observaccedilotildees a respeito de diferenccedilas de religiatildeo gecircnero

raccedilacor e tambeacutem aquelas relacionadas agrave deficiecircncia Haacute descriccedilotildees sobre como as

crianccedilas lidam com as diferenccedilas e as formas como os professores trabalham com

aquelas que possuem alguma dificuldade Algumas postagens ressaltam a

necessidade de formaccedilatildeo inicial e continuada dos educadores para lidarem com a

diversidade na escola

Pela primeira vez vivenciei preconceito racial de uma crianccedila com outra Nos momentos em que a profa distribui lego para as crianccedilas ela daacute tambeacutem um bonequinho para cada crianccedila Tem bonecos adultos crianccedilas homens mulheres e de diversas cores Os bonecos satildeo dados aleatoriamente ou escolhidos pela crianccedila conforme a professora passa de mesa em mesa Neste dia um menino negro estava com um boneco negro Um garoto se aproximou e disse ldquoCredo que boneco feio parece vocecircrdquo se direcionando ao menino O menino deu de ombros e continuou a brincar e poucos minutos depois a menina que estava ao seu lado me perguntou ldquoPor que o boneco dele eacute pretinho Eacute muito feiordquo Claro que conversei com ela e com o outro menino em outro momento calmamente falando das diversas cores que as pessoas tecircm e que natildeo haacute isso de feio e bonito aproveitando para falar sobre diversidade e etc Mais para o final da conversa a menina me disse ldquoMeu pai eacute pretinho ele eacute bonitordquo Respondi a menina dizendo que a beleza natildeo estaacute na cor da pele do cabelo ou dos olhos A cena toda me fez refletir que a menina jaacute deve ter ouvido esse tipo de afirmaccedilatildeo errocircnea Jaacute comentei mais de uma vez sobre o preconceito de gecircnero ser muito forte mas e o racial algueacutem mais vivenciou esse tipo de preconceito durante esta residecircncia (Relato do residente T 2017)

Rosemberg (2014) chama a atenccedilatildeo para o tema da diversidade como uma

questatildeo circunscrita na histoacuteria da humanidade A diferenciaccedilatildeo entre os grupos

humanos ou pessoas com atributos que classificam e separam o ldquoeurdquo do ldquooutrordquo

parece constituir as diversas manifestaccedilotildees de culturas humanas Assim a autora

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desnaturaliza a identidade e a diferenccedila apontando o seu caraacuteter cultural social e

histoacuterico Contudo esse eacute um dos temas que tem chamado cada vez mais a atenccedilatildeo

de educadores desde a educaccedilatildeo infantil jaacute que muitas vezes as questotildees que

envolvem a diferenccedila e o diferente passam por processos discriminatoacuterios e

preconceituosos como apontado no relato do estudante ao observar as interaccedilotildees

entre as crianccedilas no que se refere ao quesito raccedilacor

Marinho e Martins (2016) em estudo sobre formaccedilatildeo de professoras que atuam

na educaccedilatildeo infantil constatam a escassez ou inexistecircncia de disciplinas na formaccedilatildeo

inicial de professores que abarquem as questotildees eacutetnico-raciais denunciando o natildeo

cumprimento das leis que entre outras prescriccedilotildees preveem que instituiccedilotildees de niacutevel

superior proporcionem aos futuros(as) professoresas a formaccedilatildeo adequada para

lidarem com as relaccedilotildees raciais multieacutetnica e multicultural da sociedade brasileira

Nesse sentido ao trazerem suas inquietaccedilotildees sobre como as crianccedilas lidam com as

diferenccedilas no contexto da escola os residentes se aproximam das discussotildees a

respeito dos processos discriminatoacuterios oportunizando momentos em que tais

temaacuteticas possam ser discutidas entre professores preceptores e colegas do

programa de estaacutegio

Aleacutem da questatildeo racial outros relatos nos datildeo conta de refletir e discutir sobre

as relaccedilotildees que envolvem as crianccedilas com deficiecircncia na escola

() O que me chamou atenccedilatildeo foi que na quarta (2204) H chegou na escola e decidiu mudar de lugar foi sentar bem ao lado do D (uma crianccedila que foi diagnosticada com autismo de ldquograu leverdquo segundo a professora) eu fiquei observando como seria a relaccedilatildeo deles H trouxe um caderno de desenho o abriu na mesa e dividiu metade da folha para ele e para D depois na hora de descer ele segurou a matildeo do D e ficou durante o almoccedilo todo cuidando de D o orientou a pegar a comida sentar comer devagar e quando natildeo quisesse mais deveria jogar a comida no lixo e durante todo o dia H permaneceu cuidando de D A professora achou estranho pois naquele dia ela natildeo havia chamado a atenccedilatildeo de H ateacute me falou ldquoEle deve estar aprontando e D eacute bobatildeo pode se machucarrdquo e decidiu intervir e pediu para que H mudasse de lugar e parasse de cuidar de (Relato do residente L 2015)

A partir da narrativa eacute possiacutevel refletir sobre o preparo dos professores para

lidar com as diferenccedilas individuais na educaccedilatildeo infantil A inclusatildeo escolar de crianccedilas

com deficiecircncia ocorre mediante poliacuteticas puacuteblicas de inclusatildeo contudo haacute uma

grande distacircncia entre a poliacutetica puacuteblica e a praacutetica pedagoacutegica nos contextos

escolares pois natildeo se aprofunda ldquoo debate sobre os meios os fins e as estrateacutegias

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para a implementaccedilatildeo da poliacutetica de ampliaccedilatildeo da rede de educaccedilatildeo infantilrdquo

(BRUNO 2008 p 59)

Outros registros que tratam da temaacutetica da inclusatildeo de crianccedilas com

deficiecircncia mostram o quanto a escola estaacute despreparada para lidar com essa

questatildeo Os relatos e inquietaccedilotildees dos estudantes nos possibilitam a identificaccedilatildeo de

processos discriminatoacuterios de resistecircncias e acomodaccedilotildees dos profissionais e do

distanciamento de uma praacutetica verdadeiramente inclusiva na esfera das praacuteticas

educativas cotidianas O que se percebe nas discussotildees sobre o assunto eacute que os

residentes enquanto futuros professores muito tecircm a aprender sobre a acolhida das

famiacutelias e das crianccedilas ldquodiferentesrdquo ou com deficiecircncia na constante reflexatildeo sobre o

comportamento atitudes e posturas do educador frente ao trabalho pedagoacutegico

Outras temaacuteticas tatildeo importantes como as que discutimos aqui tem sido objeto

de interesse dos estudantes em processo de imersatildeo nas escolas-campo Haacute uma

gama de registros sobre categorias que envolvem a crianccedila pequena nas atividades

do brincar a disciplina e a coerccedilatildeo dos educadores na tentativa de manter o controle

das crianccedilas e dos comportamentos considerados inadequados Muitos residentes se

surpreendem como essa coerccedilatildeo ocorre demasiadas vezes na escola e nas reuniotildees

de supervisatildeo eacute muito comum questionarem junto ao preceptor formas de

compreender por que algumas praacuteticas coercitivas satildeo tatildeo presentes na educaccedilatildeo

infantil

Consideraccedilotildees Finais

A experiecircncia de estaacutegio no Programa de Residecircncia Pedagoacutegica requer de

estudantes e professores uma atitude de intensa accedilatildeo e reflexatildeo Na perspectiva de

observaccedilatildeo participante eacute que a imersatildeo dos residentes na escola eacute orientada

embora natildeo haja uma intervenccedilatildeo direta planejada e sistemaacutetica sobre os modos de

fazer da escola e dos professores Possiacuteveis intervenccedilotildees sobre a escola suscitadas

pela presenccedila da universidade (de preceptores e residentes) satildeo uma contingecircncia

dos processos de formaccedilatildeo de condiccedilotildees e modos de seu desenvolvimento e eacute assim

que se define o lugar do residente e da preceptoria junto a escola o caraacuteter da

observaccedilatildeo participante a ser realizada durante o estaacutegio e sua conduccedilatildeo e discussatildeo

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no acircmbito escolar As posiccedilotildees dos residentes reeditam questotildees que mobilizam a

imersatildeo e reflexatildeo sobre o vivido como e quando participar O que como e quando

registrar sobre a observaccedilatildeo participante sobre o que se vivencia Como fazer uso

das ferramentas disponiacuteveis na escola e dos subsiacutedios teoacutericos oferecidos durante a

proacutepria residecircncia ou estudados no curso de pedagogia elaborando impressotildees sobre

o que descreve e refletindo sobre o que vive e elabora

A retomada dos escritos e reflexotildees dos estudantes participantes do Programa

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil nos trazem pistas relevantes para a

compreensatildeo natildeo somente dos seus processos formativos mas tambeacutem suscitam

atenccedilatildeo aos temas e questotildees emergentes do cotidiano das crianccedilas nas escolas de

Educaccedilatildeo Infantil Sabe-se que o processo de escrita eacute composto de idas e vindas

de avanccedilos e retrocessos de duacutevidas e certezas percebidas nos textos e contextos

apresentados pelos estudantes neste processo formativo especiacutefico

As postagens guardam caracteriacutesticas especiacuteficas correlatas ao vivido nas

praacuteticas de estaacutegio de acordo com as finalidades comunicativas e formativas do

caderno de campoblog e com especificidades ndash limites e possibilidades ndash que se

dimensionam nestas praacuteticas Os estudantes registram o que observam o que

vivenciam mas natildeo soacute Em muitos registros suas impressotildees (con)fundem-se com o

observado vatildeo aleacutem da descriccedilatildeo interpretando o visto o vivido e outras vezes para

alguns o registro se faz espaccedilo de recuperaccedilatildeo das proacuteprias vivecircncias e dos

elementos teoacutericos estudados

Nesta experiecircncia a liberdade na escolha e escrita dos temas dos cadernos de

campo tem permitido que o processo formativo de cada estudante aconteccedila de forma

uacutenica e original pois apesar de estarem imersos em ambientes semelhantes (em

alguns casos mesmas escolas-campo) e possuiacuterem referenciais teoacutericos semelhantes

(provenientes das unidades curriculares obrigatoacuterias e eletivas do Curso de

Pedagogia) os temas e questotildees que recebem a atenccedilatildeo de cada um satildeo distintos e

trabalhados teoricamente a partir das anguacutestias e inquietaccedilotildees individuais Entretanto

apesar das produccedilotildees escritas serem individuais ao serem publicizadas em reuniotildees

de orientaccedilatildeo ou ateacute no suporte virtual do blog elas podem ser compartilhadas e

tornam-se objeto comum de discussotildees e aprendizagens

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

Referecircncias bibliograacuteficas

BARBOSA Maria Carmem Silveira Por amor e por forccedila rotinas na Educaccedilatildeo Infantil Porto Alegre Artmed 2006

BRAGA Elizabeth dos Santos Viacutedeo escritas leituras recordaccedilotildees cultura e memoacuteria na sala de aula GOacuteES Maria Cecilia Rafael e SMOLKA Ana Luiza Bustamante A significaccedilatildeo nos espaccedilos Educacionais ndash Interaccedilatildeo social e subjetivaccedilatildeo Campinas Papirus Editora1997 p 87-110

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Horizonte Autecircntica v 1 p 375-392 2010

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto LUGLI Rosaacuterio Silvana Genta Diaacutelogos pertinentes na formaccedilatildeo inicial e continuada de professores e gestores escolares A concepccedilatildeo

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do Programa de Residecircncia Pedagoacutegica na UNIFESP Cadernos de Educaccedilatildeo n

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MARTINS Thaiacutes Regina Miranda SLAVEZ Milka Helena Carrilho Um estudo sobre programas de iniciaccedilatildeo agrave praacutetica profissional de professores no Brasil o PIBID e o estaacutegio de Residecircncia Ensino amp Pesquisa v 13 n 01 p 29-41 2016

MARQUES Danielle Vieira Aquino MUumlLLER Fernanda Experiecircncias com blog na pesquisa e na formaccedilatildeo inicial de professoras de educaccedilatildeo infantil ETD-Educaccedilatildeo Temaacutetica Digital v 14 n 1 p 43-61 2012

MARTINS E Famiacutelia e escola no contexto de um programa de residecircncia pedagoacutegica um estudo a partir do enfoque histoacuterico-cultural Educaccedilatildeo Sociedade amp Culturas v 37 p 89-107 2012

MEKSENAS Paulo Sociologia da educaccedilatildeo uma introduccedilatildeo ao estudo da escola no processo de transformaccedilatildeo social Satildeo Paulo Loyola 2002

MORETTI Vanessa Dias MARTINS Edna Atividade de ensino mediaccedilatildeo e aprendizagem da docecircncia na residecircncia pedagoacutegica uma anaacutelise a partir da teoria histoacuterico-cultural Revista Contrapontos v 15 n 3 p 394-411 2015

MORETTI Vanessa Dias A articulaccedilatildeo entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores que ensinam matemaacutetica o caso da Residecircncia Pedagoacutegica da Unifesp Revista Educaccedilatildeo Porto Alegre 2011 v 34 n 3 p 385-390 2011

NEVES Vanessa Ferraz Almeida CASTANHEIRA Maria Luacutecia GOUVEcircA Maria Cristina Soares O letramento e o brincar em processos de socializaccedilatildeo na educaccedilatildeo infantil brincadeiras diferentes Revista Brasileira de Educaccedilatildeo v 20 n 60 p 215-

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NOacuteVOA Antoacutenio Os professores e as Histoacuterias da Sua Vida In NOacuteVOA Antoacutenio (org) Vidas de Professores 2ordf ed Porto Porto Editora p 18-30 2000

PARO Vitor Henrique A educaccedilatildeo a poliacutetica e a administraccedilatildeo reflexotildees sobre a praacutetica do diretor de escola Educaccedilatildeo e Pesquisa v 36 n 3 p 763-778 2010

POLADIAN Marina Lopes Pedrosa Estudo sobre o Programa de residecircncia pedagoacutegica da Unifesp uma articulaccedilatildeo entre Universidade e escola na formaccedilatildeo de professores Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia da Educaccedilatildeo) - Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Satildeo Paulo 2014

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ROSEMBERG Fulvia Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees raciais a tensatildeo entre igualdade e diversidade Cadernos de Pesquisa v 44 n 153 p 742-759 2014

SILVA Adriana BUFALO Joseane O espaccedilo na pedagogia da educaccedilatildeo infantil faacutebula perversidade e possibilidade In Culturas infantis em creches e preacute-escolas estaacutegio e pesquisa Campinas SP Autores Associados 2011

TARDIF Maurice A profissionalizaccedilatildeo do ensino passados trinta anos dois passos para a frente trecircs para traacutes Educaccedilatildeo e Sociedade Campinas SP v34 n123 p

551-571 2013

VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

Correspondecircncia

Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Maria de Faacutetima Carvalho ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

E-mail emartinsunifespgmailcom ndash carvalhomdfgmailcom ndash

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A proposta da Residecircncia Pedagoacutegica aqui abordada tem como base os

mesmos princiacutepios utilizados ao se pensar a institucionalizaccedilatildeo da Residecircncia meacutedica

no Brasil Feuerwerker (1998) aponta que ao implantar os programas de Residecircncia

na medicina foi importante considerar a hipoacutetese de que a formaccedilatildeo geral do meacutedico

na graduaccedilatildeo tendo em vista o desenvolvimento tecnoloacutegico e cientiacutefico naquele

momento natildeo era capaz de assegurar o niacutevel necessaacuterio de treinamento e

incorporaccedilatildeo de conhecimentos especiacuteficos aos estudantes em todas as possiacuteveis

atividades praacuteticas do cotidiano profissional A autora ainda afirma que

A praacutetica profissional historicamente tem sido transmitida atraveacutes de treinamento em serviccedilo Eacute no processo de combinar os conhecimentos teoacutericos adquiridos com a experiecircncia cliacutenica (indicando relacionamento com pacientes) que se encontra a ldquomaacutegicardquo da praacutetica profissional meacutedica Somente a experiecircncia adquirida na praacutetica pode completar a formaccedilatildeo (cientiacutefica) do meacutedico eacute pela experiecircncia cliacutenica que o profissional se apropria dos doentes (e natildeo mais apenas das doenccedilas) Eacute pela praacutetica que se constroacutei a experiecircncia cliacutenica e eacute mediante o aprendizado em serviccedilo que o futuro profissional constroacutei tambeacutem a eacutetica de suas relaccedilotildees com os pacientes baseada no exemplo e na experimentaccedilatildeo (FEUERWERKER 1998 p 59)

Dada a importacircncia da profissatildeo do professor seria possiacutevel a consideraccedilatildeo

dessas mesmas premissas para o campo do exerciacutecio da docecircncia Quais formas

possiacuteveis para instrumentalizar os futuros professores para lidar com as vicissitudes

das praacuteticas cotidianas das escolas Como aliar as teorias pedagoacutegicas agraves praacuteticas

docentes no exerciacutecio da profissatildeo Eacute possiacutevel dizer que pela praacutetica se constroacutei a

experiecircncia docente e eacute mediante o aprendizado na praacutetica que o futuro professor

constroacutei a eacutetica de suas interaccedilotildees com os alunos a partir de exemplos diaacuterios e da

experimentaccedilatildeo

Partindo dessas questotildees o Programa de Residecircncia Pedagoacutegica (PRP)

projeto de estaacutegio em formaccedilatildeo docente foi implantado em 2009 em uma

universidade puacuteblica federal do Estado de Satildeo Paulo A proposta concebida por

docentes do curso de Pedagogia buscou a superaccedilatildeo dos modos convencionais de

realizaccedilatildeo de estaacutegios de formaccedilatildeo nos quais os estudantes estagiaacuterios limitam sua

accedilatildeo agrave simples observaccedilatildeo assistemaacutetica de experiecircncias esparsas de praacuteticas

pedagoacutegicas em diferentes salas de aulas Tal iniciativa teve sua metodologia

desenvolvida por docentes da Universidade tendo como bases para consolidaccedilatildeo e

desenvolvimento uma ampla investigaccedilatildeo realizada com professores das redes

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puacuteblicas de um sistema de ensino puacuteblico da regiatildeo metropolitana de Satildeo Paulo entre

os anos de 2007 e 2008 assim como contou com subsiacutedios do Programa da Capes

intitulado ldquoProdocecircnciardquo

Pesquisas como as de Moretti 2011 Martins 2012 Moretti e Martins 2015

Giglio 2010 Giglio e Lugli 2014 Poladian 2014 sob diferentes perspectivas teoacutericas

tecircm tentado buscar compreender aspectos especiacuteficos dessa experiecircncia de estaacutegio

e em sua maioria assinalam tal iniciativa como um dos processos inovadores na aacuterea

de formaccedilatildeo de professores principalmente no que se refere agrave superaccedilatildeo da

dicotomia entre teoria e praacutetica vigente nos estaacutegios dos cursos de formaccedilatildeo de

professores das universidades brasileiras Compreende-se que a formaccedilatildeo do

profissional docente integra um conjunto de desafios destacando-se nos cursos de

formaccedilatildeo inicial a necessidade de ofertar juntamente com subsiacutedios

teoacutericoscientiacuteficos tambeacutem um acesso agraves praacuteticas pedagoacutegicas que instrumentalizem

o professor para a atuaccedilatildeo profissional Nesta direccedilatildeo destaca-se a conduccedilatildeo do

graduando agrave estaacutegios curriculares capazes de iniciaacute-los na praacutetica profissional de

forma efetiva e reflexiva para que com o aporte de professores supervisores

construam conhecimentos que envolvam o pensar e o agir sobre a escola

Quase dez anos apoacutes a criaccedilatildeo do Programa de Residecircncia pedagoacutegica criado

pela Universidade Federal de Satildeo Paulo (Unifesp) em 2018 foi lanccedilado pelo Governo

Federal o Edital CAPES No62018 apresentando a ideia de Residecircncia Pedagoacutegica

como proposta de induccedilatildeo agrave experiecircncias inovadoras na formaccedilatildeo inicial de

professores ao mesmo tempo em que altera as caracteriacutesticas originais do PIBID no

Edital No72018 O edital retoma termos e objetivos bastante proacuteximos dos utilizados

no Programa de Residecircncia aqui abordado entretanto diferencia-se deste e conveacutem

apontar alguns dos elementos definidores desta diferenccedila como por exemplo a

proposiccedilatildeo de um nuacutemero limitado de bolsas aos residentes o que natildeo atenderia a

demanda de estudantes da universidade onde o programa teve origem a previsatildeo

de um nuacutemero maior de residentes por preceptor extrapolando o nuacutemero maacuteximo

indicado pelo Programa base de nosso estudo para a educaccedilatildeo baacutesica Aleacutem disso a

proposta de Residecircncia Pedagoacutegica apresentada no edital referido daacute pouca ou

nenhuma ecircnfase a duas outras modalidades de residecircncia presentes no projeto da

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Unifesp que satildeo a Residecircncia Pedagoacutegica em Gestatildeo Escolar e em Educaccedilatildeo de

Jovens e Adultos

Accedilotildees formativas da Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil (RPEI)

Antes de apresentarmos mais detalhadamente o Programa de Residecircncia em

Educaccedilatildeo infantil (RPEI) eacute importante destacar que o trabalho de formaccedilatildeo de

professores nesta perspectiva comeccedila com o aporte teoacuterico das disciplinas

obrigatoacuterias que contemplam as temaacuteticas do campo Vencida a etapa teoacuterica os

estudantes comeccedilam o programa de estaacutegio contemplado nesta modalidade que

atende o curso de Pedagogia e eacute constituiacuteda como uma unidade curricular obrigatoacuteria

Somente a partir do 5o semestre do curso os alunos devem se matricular e cumprir

135 horas de estaacutegio as quais compreendem momentos de imersatildeo na escola e

supervisatildeo na universidade sendo tal experiecircncia realizada em escolas puacuteblicas

municipais que possuem parceria com a Universidade

Durante todo o processo a atuaccedilatildeo do professor preceptor possui destaque

segundo Moretti e Martins (2015) pois ele faz os primeiros contatos com os

estudantes de cada grupo que vai para a escola e eacute quem supervisiona o estaacutegio

acompanhando o aluno durante todo o percurso do programa Em todas as

modalidades de Residecircncia Pedagoacutegica antes de iniciar a imersatildeo na escola os

estudantes participam de encontros pontuais com seus preceptores para discussatildeo

do programa de atividades da Unidade Curricular No caso da Educaccedilatildeo Infantil

nessas ocasiotildees de encontros realizam-se estudos sobre temaacuteticas relevantes e

discussatildeo de leituras introdutoacuterias agrave atividade de estaacutegio e tambeacutem para orientaccedilotildees

mais praacuteticas sobre por exemplo as regras a serem observadas durante o periacuteodo

de estaacutegio o conhecimento das publicaccedilotildees do PRP para a modalidade especiacutefica a

construccedilatildeo do diaacuterio de campo o papel do professor preceptor e do professor

formador (aquele que o residente acompanharaacute na escola) Todas essas orientaccedilotildees

constam de um manual e satildeo retomadas pelos preceptores em leituras coletivas que

objetivam ajudar os estudantes a usarem o material de suporte enfatizando que o

estaacutegio realizado nesta perspectiva implica mais que observaccedilatildeo passiva a

participaccedilatildeo nas atividades escolares seu registro e reflexatildeo Os primeiros encontros

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tambeacutem envolvem a orientaccedilatildeo sobre aspectos de ordem legal como por exemplo

jamais assumir sozinho a sala de aula em que estatildeo fazendo a residecircncia

Como unidade curricular obrigatoacuteria a RPEI prevecirc em sua ementa que os

alunos deveratildeo construir conhecimentos a partir de identificaccedilatildeo e anaacutelise de relaccedilotildees

e praacuteticas que perfazem o dia a dia da escola de Educaccedilatildeo Infantil atentando para o

seu caraacuteter educacional e pedagoacutegico assim como para os processos de gestatildeo

institucional Esse processo de construccedilatildeo de conhecimentos sobre o que vivenciam

eacute mediado pelo uso de instrumentos de pesquisa qualitativa em educaccedilatildeo

Concomitantemente enquanto participam do dia a dia na escola planejam e elaboram

planos de accedilatildeo pedagoacutegica em colaboraccedilatildeo com os supervisores do estaacutegio e

educadores das escolas-campo

No processo de imersatildeo espera-se que o residente natildeo apenas observe mas

possa dar apoio ao professor de classe em suas praacuteticas pedagoacutegicas cotidianas e na

sua relaccedilatildeo com as crianccedilas com idade entre 0 e 5 anos Cotidianamente tais

residentes devem ser encorajados a atuarem com pequenas accedilotildees junto agraves crianccedilas

com a orientaccedilatildeo dos professores que o acompanham Durante quatro semanas no

processo intenso de imersatildeo na realidade da escola os residentes devem construir

registros diaacuterios das experiecircncias vividas em campo aleacutem de outros materiais que

tecircm origem na observaccedilatildeo participativa do dia a dia escolar e serviratildeo de avaliaccedilatildeo

final tendo elaboraccedilatildeo orientada e aferida pelo professor preceptor da Universidade

Dessa perspectiva o residente tambeacutem eacute solicitado a refletir sobre sua proacutepria

atuaccedilatildeo participando ativamente de um processo de contiacutenua auto avaliaccedilatildeo

Eacute objetivo do Programa em todas as suas modalidades que os graduandos

possam retomar de forma reflexiva o que vivenciam na escola Na modalidade de

Educaccedilatildeo Infantil eacute esperado que o estudante residente possa desenvolver anaacutelises

criacutetico-reflexivas acerca da instituiccedilatildeo no qual estaacute imerso no que se refere agrave interaccedilatildeo

com as famiacutelias e agrave comunidade em seu entorno assim como sobre as praacuteticas

pedagoacutegicas realizadas nesses locais a partir do reconhecimento da crianccedila como

sujeito de direito e de toda a legislaccedilatildeo que diz respeito a essa modalidade de ensino

De acordo com o cronograma da Unidade Curricular Residecircncia Pedagoacutegica

em Educaccedilatildeo Infantil os estudantes devem ir durante quatro dias da semana para a

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escola e um dia para a Universidade para supervisatildeo com o preceptor que eacute um

docente da Universidade Na escola cumprem o horaacuterio da turma que acompanham

em turno que pode ser matutino vespertino ou intermediaacuterio Natildeo satildeo toleradas faltas

ou atrasos sem justificativa meacutedica objetivando-se desta forma colocar os alunos

diante da responsabilidade do compromisso profissional assumido perante a escola

Durante as duas primeiras semanas de imersatildeo os estudantes satildeo orientados

a descrever no diaacuterio de campo o que observam e suas impressotildees sobre a escola

as relaccedilotildees entre professorcrianccedilas crianccedilacrianccedila escolacomunidade

famiacuteliasescola professorprofessor professorgestatildeo e praacuteticas educativas do

cotidiano que satildeo observadas mais atentamente Neste primeiro momento aleacutem da

cobranccedila para que o aluno escreva sobre suas vivecircncias o preceptor busca ajudaacute-lo

na construccedilatildeo dos registros do caderno de campo assinalando sobre as posturas de

descriccedilatildeo e de reflexatildeo na elaboraccedilatildeo sobre suas impressotildees sobre aquilo que eacute

observado

Antes de serem executados os planos pedagoacutegicos de cada estudante satildeo

apresentados para os professores formadores e coordenador nas escolas durante

reuniatildeo realizada na ldquoHora Atividaderdquo com a participaccedilatildeo do professor preceptor Este

tem se constituiacutedo um momento iacutempar de aprendizagem para todos os envolvidos jaacute

que nesta ocasiatildeo os estudantes compartilham seus conhecimentos suas

experiecircncias expectativas e apreensotildees e onde explicitam-se possibilidades de

articulaccedilatildeo escola-universidade no acircmbito da formaccedilatildeo de professores Eacute na uacuteltima

semana de imersatildeo que os estudantes colocam seus planos de accedilatildeo pedagoacutegica em

praacutetica nas salas em que estatildeo imersos fechando o ciclo previsto pelo estaacutegio

Metodologia analisando as temaacuteticas do caderno de campo online (Blog)

Alguns grupos de residentes da RPEI conforme opccedilatildeo dos professores

preceptores usam um blog para a construccedilatildeo online de um caderno de campo que

integra a elaboraccedilatildeo de seus registros sobre a imersatildeo na escola Esses registros ndash

que chamamos de postagens aleacutem de possibilitar um olhar mais apurado sobre as

praacuteticas cotidianas podem contribuir para a orientaccedilatildeo e a construccedilatildeo do Plano de

Accedilatildeo Pedagoacutegica de cada residente e posteriormente para a escrita de um relatoacuterio

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final de estaacutegio pelo grupo Eacute sobre os registros do blog que incidiraacute nossa anaacutelise

considerando para tanto inquietaccedilotildees observaccedilotildees e reflexotildees registradas pelos

residentes nos anos de 2015 2016 e 2017

O blog da residecircncia ou diaacuterio de campo online consiste em uma ferramenta

virtual na qual satildeo realizados os registros de observaccedilotildees e experiecircncias significativas

vividas pelos residentes cotidianamente na escola Destaca-se que tal ferramenta eacute

de acesso restrito e apenas um uacutenico grupo de alunos e professores preceptores da

Universidade podem participar em cada escola acompanhada Deste modo nem os

professores ou quaisquer pessoas das escolas-campo podem acessar tal instrumento

O blog eacute construiacutedo pelo professor preceptor a cada novo grupo de residentes

assegurando o sigilo das informaccedilotildees registradas A ferramenta possibilita a

construccedilatildeo coletiva de diaacutelogos sobre questotildees observadas e a mediaccedilatildeo dos

conhecimentos dos residentes pelos seus supervisores Assim os estudantes podem

realizar trocas sobre suas vivecircncias muitas vezes similares agraves que ocorrem na mesma

instituiccedilatildeo ainda que estejam em turmas de idades diferentes Permite tambeacutem que

preceptores acompanhem diariamente seus residentes respondendo as indagaccedilotildees

e inquietaccedilotildees do grupo que participa do dia-a-dia na escola

Aleacutem de cumprir todos os objetivos de um caderno de campo comum o blog

permite ao preceptor mesmo agrave distacircncia o acompanhamento contiacutenuo do grupo de

estudantes o que lhe permite planejar as atividades semanais de supervisatildeo de forma

a responder as demandas dos alunos e esses uacuteltimos de compartilharem seus

diferentes pontos de vistas e as accedilotildees desenvolvidas na escola Assim no contexto

da residecircncia pedagoacutegica o blog ou caderno de campo online eacute o espaccedilomomento

de realizaccedilatildeo dos registros de observaccedilotildees e experiecircncias significativas vividas

cotidianamente na escola de educaccedilatildeo infantil e de acompanhamento e

problematizaccedilatildeo dessas vivecircncias pelos preceptores

Nesse caminho assinala-se a contribuiccedilatildeo de Vygotsky (1981) quando aponta

que as relaccedilotildees humanas satildeo sempre mediadas pelo meio social e pelos instrumentos

e signos que fazem parte das relaccedilotildees e dos contextos em que o homem estaacute inserido

Desse modo

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A atividade praacutetica do homem portanto se faz duplamente mediada de uma parte estaacute mediada pelas ferramentas no sentido literal da palavra e de outra parte mediada pelas ferramentas no sentido figurado pelas ferramentas do pensamento pelos meios com a ajuda dos quais se realiza a operaccedilatildeo intelectual ou seja mediada com a ajuda das palavras (VYGOTSKI 19302006a p 165)

Nessa direccedilatildeo conveacutem destacar a importacircncia do blog como instrumento social

representativo da incorporaccedilatildeo da tecnologia ao dia a dia dos estudantes e da

consideraccedilatildeo da mediaccedilatildeo tecnoloacutegica em processos de aprendizagem e

desenvolvimento dos graduandos

Diferente de outras formas de relacionamento virtual (e-mail chat instant

messages listas de discussatildeo etc) e de ferramentas virtuais convencionais ndash como

os sites ndash o blog caracteriza-se pela facilidade de sua criaccedilatildeo e manutenccedilatildeo o que eacute

definido pela organizaccedilatildeo automaacutetica das mensagens ndash posts ndash pelo sistema

dinamizando seu uso e favorecendo a construccedilatildeo de diaacuterios coletivos mantidos por

vaacuterios usuaacuterios Tais caracteriacutesticas favorecem o uso do blog em processos de ensino-

aprendizagem tendo em vista a interaccedilatildeo a troca o diaacutelogo como forma de partilha e

construccedilatildeo de conhecimentos (MARQUES MULLER 2012)

O blog permite portanto o compartilhamento de informaccedilotildees e a interaccedilatildeo

entre estudantes do mesmo grupo e o mesmo preceptor em uma mesma escola

Todos podem ler e comentar as postagens funcionando como um ponto de encontro

entre alunos e preceptores Assim nossa atenccedilatildeo agraves postagens dos estudantes no

blog eacute dirigida pelo objetivo de dar visibilidade a dimensatildeo social das praacuteticas de

registro do observadovivido nos processos formativos que emergem na experiecircncia

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil Assumimos o caraacuteter histoacuterico-

cultural da pesquisa do meacutetodo do objeto de estudo e do proacuteprio conhecimento como

construccedilatildeo que se realiza entre sujeitos (FREITAS 2009) Dessa forma acredita-se

que o momento de elaboraccedilatildeo do vivido ndash o registro no caderno de campoblog ndash

deflagra no estudante a necessidade de reflexatildeo sobre os processos de ensino-

aprendizagem em curso no acircmbito do estaacutegio-residecircncia pedagoacutegica

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Registros no caderno de campo online o olhar do residente sobre a escola de

educaccedilatildeo infantil

Nos primeiros dias de imersatildeo na escola os residentes satildeo orientados a

realizar uma observaccedilatildeo atenta dos espaccedilos da instituiccedilatildeo A partir da leitura do texto

de Silva e Bufalo (2011) sobre culturas escolares os residentes descrevem em seus

primeiros registros detalhes fiacutesicos sobre a escola Muitos acabam desenhando a

planta baixa ou tirando fotos de salas de aulas parques e paacutetios e compartilhando no

caderno de campo online (blog) para comeccedilarem a pensar sobre o contexto e os

espaccedilos que podem favorecer a aprendizagem e o desenvolvimento da crianccedila

pequena como descrito no excerto abaixo

Uma coisa que me chamou atenccedilatildeo foi que natildeo possuem um espaccedilo para atividade fiacutesica essas satildeo realizadas no paacutetio que eacute proacuteximo as salas o barulho acaba atrapalhando os demais O parque estaacute interditado por ordem da diretora ou seja natildeo possuem lugar para brincar O dia das crianccedilas foi pautado em ficar sentado e quieto vendo um filme que a maioria jaacute tinha assistido (Relato da residente N 2017)

Formas de organizaccedilatildeo de espaccedilos e tempos remetem agrave organizaccedilatildeo da rotina

Sobre esse tema grande quantidade de postagens textos diz respeito a como as

atividades diaacuterias satildeo organizadas na escola Em alguns registros como o

apresentado a seguir aparece a problematizaccedilatildeo da forma de organizaccedilatildeo das

atividades

730 (15min) - a professora colocou o cabeccedilalho na lousa com a data e fez a contagem coletiva das crianccedilas 745 (45min) - a professora retomou o que eles haviam aprendido sobre os iacutendios entregou massinha e os orientou a modelar utensiacutelios indiacutegenas 830 (35min) - pintura de desenho xerocado que seraacute colado na capa do caderno de atividades 905 (25min) - brincadeira livre no paacutetio interno no brinquedatildeo que fica no final da escadarampa sup2940 (30min) - brincadeira em sala Gato mia 1010 (ateacute as crianccedilas irem embora) - a professora entregou uma folha com a letra da canccedilatildeo 1 2 3 indiozinhos cantou a muacutesica com eles sentados em seus lugares pediu para eles circularem as letras A e I e depois pintar a ilustraccedilatildeo () (Relato da residente J 2015)

A rotina observada e registrada pela residente configura-se como um dos

aspectos mais relevantes na vida da crianccedila que se encontra na escola de Educaccedilatildeo

Infantil Barbosa (2006) aponta que esse eacute um dos elementos que integram as praacuteticas

educativas que devem ser observadas e planejadas com regularidade objetivando a

operacionalizaccedilatildeo do cotidiano da escola de maneira que possa contribuir na

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constituiccedilatildeo da subjetividade dos atores escolares Desse modo pensar e

compreender a rotina como um fator presente e essencial na educaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute um passo promissor para que o residente acompanhe como as atividades

cotidianas da escola se materializam e datildeo base para a organizaccedilatildeo da praacutetica

pedagoacutegica devendo estar presente no desenvolvimento curricular

O planejamento das atividades na educaccedilatildeo infantil tem estreita ligaccedilatildeo com a

rotina Ao observar e refletir sobre a vida e as experiecircncias das crianccedilas na escola os

residentes satildeo remetidos a memoacuteria agrave lembranccedila do que tambeacutem foi um dia vivido

por eles em suas experiecircncias escolares Como apontado por Meksenas (2002)

ldquonunca somos testemunhas objetivas observando objetos e sim sujeitos observando

outros sujeitosrdquo (p 116)

Estive tentando lembrar nas uacuteltimas semanas o que eu fazia na minha preacute-escola Eu comecei no maternal com 3 anos ()Tenho vagas lembranccedilas de duas salas de aula uma do preacute III e a outra acho que era do preacute I Era uma escola particular dessas pequenas de bairro Lembro que a turma natildeo era tatildeo numerosa quanto essa que estou vendo na residecircncia mas a sala tinha uma organizaccedilatildeo parecida eram mesas e cadeiras enfileiradas nas duas () Eu estava com 5 anos Lembro que a gente tinha uma apostila no preacute I eu gostava de terminar tudo raacutepido para dormir Depois a professora comeccedilou a me dar gibi para eu ficar folheando Tenho na minha memoacuteria que as coisas que a gente fazia na escola eram chatas e muito infantis bobas demais Agora eu penso talvez as professoras ficassem me ocupando com massinha e pinturas todo dia tambeacutem como eu vejo na residecircncia e por isso eu achava muito chato O que seraacute que essas crianccedilas pensam disso O que seraacute que elas acham mais legal na escola Eu vejo que elas gostam muito de fazer liccedilatildeo essas de folhinha que a professora daacute e todos os dias elas perguntam Mas eu natildeo me conformo como elas acham isso tatildeo legal (Relato da Residente F 2017)

Sabemos que a memoacuteria eacute mediada pelo signo pelas interaccedilotildees sociais pelo

outro Braga (1997) dirige nosso olhar para o ldquoprocesso de apropriaccedilatildeo das formas

culturais de interaccedilatildeo que caracterizam a memoacuteria humanardquo Para a autora ldquoa

memoacuteria do homem soacute se configura no movimento discursivo e coletivo por sua

natureza cultural e simboacutelicardquo No registro acima o observado mobiliza as lembranccedilas

da residente aquilo que foi tambeacutem vivido na escola de sua infacircncia Entre lembranccedilas

e interrogaccedilotildees emergem as construccedilotildees formativas em um processo dinacircmico ndash

interativo cultural e simboacutelico Processo que potildeem em relaccedilatildeo vivecircncias atuais e

passadas que invocam sentidos e significados atribuiacutedos ao vivido que ocorre nas

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contradiccedilotildees entre aquilo que eacute rememorado pela estudante e o que efetivamente eacute

observado nas relaccedilotildees estabelecidas no contato com o cotidiano da escola

Aleacutem da rotina e da organizaccedilatildeo de tempos e espaccedilos em sua relaccedilatildeo com as

praacuteticas pedagoacutegicas os relatos dos estudantes se reportam agraves diferentes dimensotildees

da gestatildeo escolar Os registros destacam suas observaccedilotildees nas H A (hora atividade)

ou reuniotildees que eventualmente participam e com frequecircncia observam a postura da

equipe em relaccedilatildeo a presenccedila do residente Em seus relatos questionam o caraacuteter

da gestatildeo a qualidade da relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo entre os professores as discussotildees

que remetem a construccedilatildeo e discussatildeo do projeto poliacutetico pedagoacutegico e os papeis

desempenhados pelos diferentes educadores na construccedilatildeo do trabalho de educaccedilatildeo

da infacircncia

Completamos nesta semana 4 dias de participaccedilatildeo nas Horas Atividades (HA) destinada agrave formaccedilatildeo docente organizaccedilatildeo dos registros e planejamento das atividades pedagoacutegicas O que pude por meio da observaccedilatildeo constatar que o papel do Coordenador Pedagoacutegico que eacute fundamental nesse momento de formaccedilatildeo pois eacute ele o mediador desse processo acaba por se tornar distante e sem intervenccedilotildees no que adentra a orientaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico docente (Relato da estudante M 2015)

Na experiecircncia cotidiana de imersatildeo na escola eacute possiacutevel verificar as tensotildees

vivenciadas entre os professores e o papel da coordenaccedilatildeo pedagoacutegica A teoria

discutida na universidade pelos residentes assinala a importacircncia do papel do

coordenador pedagoacutegico na educaccedilatildeo infantil na praacutetica o residente percebe o quanto

a sua mediaccedilatildeo eacute fundamental na organizaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico e por outro

lado o quanto a sua ausecircncia pode interferir de forma negativa na orientaccedilatildeo das

atividades dos professores

Outra personagem que acaba sendo central na gestatildeo escolar eacute a direccedilatildeo que

nessa experiecircncia do residente tambeacutem eacute observada de forma criacutetica

A figura da diretora na escola foi a que mais me chamou a atenccedilatildeo ()imaginem que em nenhum momento percebi qualquer aproximaccedilatildeo da diretora com as crianccedilas em vaacuterios momentos acreditei que ela fosse algum teacutecnico administrativo pois apesar de estar no topo da piracircmide a referecircncia da gestatildeo a mesma se restringia a secretaria e natildeo se relacionava natildeo nos conhecia nem procurava nos conhecer Passou diversas vezes por grupos de crianccedilas e em nenhuma das vezes sequer olhou para elas Nunca apareceu em uma HA nunca percebi o seu contato com os professores e por diversas vezes me perguntei como eles se falavam qual era o seu relacionamento (Relato da residente B 2015)

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Sobre esse assunto estudos como os de Paro (2005) e Castro (2009) tem

assinalado o papel da gestatildeo e da administraccedilatildeo escolar como alicerce fundamental

nos processos de transformaccedilatildeo da escola puacuteblica brasileira Tais trabalhos tecircm

apontado a centralidade da direccedilatildeo escolar nas questotildees que envolvem os processos

de ensino e aprendizagem e as relaccedilotildees humanas presentes na equipe de trabalho

para aleacutem dos trabalhos administrativos e burocraacuteticos Natildeo eacute objetivo deste trabalho

fazer uma anaacutelise do papel do diretor na escola de educaccedilatildeo infantil mas cabe

assinalar que os estudantes residentes apontam o tema em seus registros e atentos

agraves demandas relativas ao papel do diretor indagam se como e quanto as lideranccedilas

escolares tecircm se envolvido com o trabalho administrativo dispendendo tempo para

um olhar mais atento agraves relaccedilotildees entre os professoresalunos funcionaacuterios da escola

observada

Em relaccedilatildeo agraves interaccedilotildees humanas outros registros dos residentes nos

remetem agraves maneiras como a escola lida com as famiacutelias das crianccedilas matriculadas

nas escolas Tais relatos natildeo satildeo tatildeo frequentes possivelmente porque essa eacute uma

relaccedilatildeo que se caracteriza pela assimetria de poderes e eacute pouco valorizada no dia a

dia escolar Os registros evocam situaccedilotildees vividas comentaacuterios ouvidos e

principalmente a necessidade de mudanccedila dos modos de conceber a crianccedila e suas

famiacutelias e de interagir com elas

A relaccedilatildeo entre professor e famiacutelia eacute mais uma dessas conexotildees que fazemos pela vida Por um lado haacute um profissional uma pessoa que estudou e eacute especialista em cuidar de crianccedilas Por outro famiacutelias que dificilmente conseguimos de fato perceber como satildeo suas estruturadas Famiacutelia hoje eacute coisa difiacutecil de entender Eacute matildee que mora sozinha com o filho eacute pais que trabalham e deixam os filhos na semana com tios avoacutes Eacute matildee solteira Eacute filho criado por pai viuacutevo Eacute histoacuteria que natildeo acaba mais Na hora da saiacuteda vamos conhecendo um pouquinho da estrutura familiar de cada crianccedila tentando perceber como se daacute a relaccedilatildeo entre a famiacutelia e a escola mas devemos ter um pouco de cuidado com esse processo (Relato do estudante J 2015)

Aleacutem da residente ter um olhar para os diferentes tipos de arranjos familiares

tambeacutem busca compreender a especificidade de cada famiacutelia considerando o papel

da mulher e de matildee trabalhadora com filhos na escola puacuteblica

(hellip) Veja esses apontamentos uma menina na sala estaacute com piolho a professora disse que jaacute alertou a matildee mas como eacute matildee solteira soacute pode cuidar da filha no domingo O outro menino que natildeo se interessa pelas atividades e responde a educadora tambeacutem teve a matildee notificada mas como

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a mesma eacute separada do marido natildeo faz nada O fato da mulher trabalhar a semana e ter folga aos domingos natildeo significa que ela seja uma maacute matildee pelo contraacuterio significa que ela rala muito para colocar comida no prato A presenccedila ou natildeo de um homem natildeo condiciona nada A escola natildeo pode ser um ambiente de roacutetulos ela deve estar aberta agraves diferenccedilas acolhendo e buscando outras maneiras e formas de aproximaccedilatildeo com a famiacutelia compreendendo a responsabilidade compartilhada que carregam (Registro da residente B 2015)

Os relatos demonstram natildeo soacute o quanto estatildeo atentos para como a escola lida

com as relaccedilotildees familiares mas sobretudo assinalam como tecircm se configurado as

formaccedilotildees das famiacutelias na atualidade Um estudo de Martins (2012) aponta o quanto

a experiecircncia de residecircncia pedagoacutegica possibilita aos estudantes um contato mais

expressivo com a realidade da escola puacuteblica de periferia urbana Aleacutem de observar

as relaccedilotildees institucionais o residente pode ser sensibilizado frente agraves dificuldades

vividas pelas famiacutelias e tendem a perceber o preconceito em relaccedilatildeo aos vaacuterios

arranjos familiares vivenciados pelas crianccedilas mais pobres e como a escolarizaccedilatildeo

dos pais pode afetar a vida dos filhos Os registros dos residentes demonstram como

ldquoos contextos de vida das crianccedilas que frequentam a escola puacuteblica de periferia

passam a ser compreendidos de uma forma concreta e as relaccedilotildees do espaccedilo familiar

com o espaccedilo escolar passam a ter uma conexatildeo cotidianardquo (MARTINS 2012 p 95)

Outra temaacutetica recorrente nos registros dos estudantes diz respeito ao processo

de escolarizaccedilatildeo das praacuteticas da educaccedilatildeo da infacircncia Tal perspectiva surge quando

os residentes referem aos usos dos brinquedos e agraves brincadeiras agrave presenccedila da

leitura e contaccedilatildeo de histoacuterias aos modos de introduccedilatildeo do desenho ao uso de novas

tecnologias e aos modos de avaliar agraves crianccedilas Tal perspectiva escolarizante emerge

em oposiccedilatildeo ao luacutedico como princiacutepio e forma de organizaccedilatildeo das praacuteticas de

educaccedilatildeo junto agraves crianccedilas pequenas e algumas vezes a ela ainda se articula a

preocupaccedilatildeo em disciplinar as vivecircncias escolares sondagens filas broncas e

silecircncios coexistem com desenhos Tv computadores e brincadeiras Os registros nos

dizem de uma escola que hesita entre coibir e promover a expressatildeo das muitas

linguagens da imaginaccedilatildeo e movimento das crianccedilas

Na semana de 2310 a 2710 e como previsto na reuniatildeo de pais a professora realizou a sondagem com as crianccedilas Teoricamente sei como funciona o procedimento mas me questiono se deve ser realizada na Ed Infantil Tambeacutem me pergunto se a sondagem vai muito aleacutem do conhecimento das crianccedilas Por exemplo algumas escrevem o proacuteprio nome

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e algumas palavras mais comuns a elas outras ainda nem reconhecem as letras do alfabeto A sondagem feita abarcou o nome palavras simples um pouco mais complexas e uma frase inteira A minha duacutevida eacute se a sondagem que vai muito aleacutem dos conhecimentos da sala eacute comum e necessaacuteria ainda mais na Ed Infantil (Relato do residente N 2017)

O debate em torno das questotildees que envolvem a escolarizaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute bastante antigo e recorrente Pesquisas como as de Neves Castanheira

e Gouveia (2015) assinalam a partir de autores que estudaram essa temaacutetica como

a perspectiva escolarizante de trabalho com a crianccedila pequena traz seacuterias implicaccedilotildees

para o desenvolvimento infantil justamente porque rompe com as formas como elas

ldquointeragem com a escrita fora da escola destituindo-a de significados pessoais e

sociais e dificulta portanto que as atividades desenvolvidas no espaccedilo escolar

envolvam a ludicidade caracteriacutestica fundamental dessa fase do desenvolvimentordquo

(p 217)

Os residentes parecem estar muito atentos a essas questotildees porque participam

de discussotildees sistemaacuteticas sobre o assunto tanto nas aulas teoacutericas na Universidade

quanto nas reuniotildees de orientaccedilatildeo com os preceptores do Programa de Residecircncia

Muitos estudantes satildeo levados a refletir sobre o assunto logo nos primeiros dias de

imersatildeo na escola

Resolvi mudar o formato do meu relato referente agrave imersatildeo inicial Pois passei por uma situaccedilatildeo em sala que me provocou tal accedilatildeo Devido agrave imposiccedilatildeo de escolarizaccedilatildeo percebida na turma na qual acompanho Onde hoje me emocionei com o choro insistente do aluno BG com as matildeos estremecidas na tentativa de segurar o laacutepis para ldquofazer liccedilatildeordquo (Relato da Residente M 2015)

A partir do relato da residente percebe-se o quanto a questatildeo eacute relevante para

o campo da educaccedilatildeo infantil e da formaccedilatildeo de professores Nas observaccedilotildees e

relatos dos cadernos de campo natildeo eacute incomum aparecerem longas narrativas sobre

os equiacutevocos que ocorrem nas praacuteticas pedagoacutegicas que envolvem a alfabetizaccedilatildeo e

letramento das crianccedilas pequenas Consideramos que questotildees como essas quando

problematizadas pelos estudantes nos horaacuterios de preceptoria ou mesmo nas

discussotildees com professores especialistas sobre o tema tendem a aproximaacute-los de

uma futura praacutetica profissional em que o trabalho com o desenvolvimento da escrita

seja realizado de forma a respeitar a infacircncia natildeo negando agrave crianccedila o seu direito ao

luacutedico mas tratando a apresentaccedilatildeo do mundo letrado como mais um momento

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prazeroso de aprendizagens Tal reflexatildeo eacute importante para os futuros professores

para que busquem compreender como inserir as crianccedilas no mundo letrado de

maneira que possam romper com a dicotomia entre o brincar e a leituraescrita

tomando como referecircncia o significado dessas accedilotildees para a crianccedila possibilitando a

conduccedilatildeo dos trabalhos na educaccedilatildeo infantil que tornem possiacutevel o brincar ldquoletrando

e alfabetizandordquo (NEVES CASTANHEIRA E GOUVEIA 2015)

Outra temaacutetica que aparece num nuacutemero expressivo de postagens diz respeito

ao olhar do residente para as praacuteticas educativas e as interaccedilotildees que ocorrem na

escola com relaccedilatildeo agrave inclusatildeo escolar das crianccedilas percebidas como ldquodiferentesrdquo

Destaca-se nesta temaacutetica observaccedilotildees a respeito de diferenccedilas de religiatildeo gecircnero

raccedilacor e tambeacutem aquelas relacionadas agrave deficiecircncia Haacute descriccedilotildees sobre como as

crianccedilas lidam com as diferenccedilas e as formas como os professores trabalham com

aquelas que possuem alguma dificuldade Algumas postagens ressaltam a

necessidade de formaccedilatildeo inicial e continuada dos educadores para lidarem com a

diversidade na escola

Pela primeira vez vivenciei preconceito racial de uma crianccedila com outra Nos momentos em que a profa distribui lego para as crianccedilas ela daacute tambeacutem um bonequinho para cada crianccedila Tem bonecos adultos crianccedilas homens mulheres e de diversas cores Os bonecos satildeo dados aleatoriamente ou escolhidos pela crianccedila conforme a professora passa de mesa em mesa Neste dia um menino negro estava com um boneco negro Um garoto se aproximou e disse ldquoCredo que boneco feio parece vocecircrdquo se direcionando ao menino O menino deu de ombros e continuou a brincar e poucos minutos depois a menina que estava ao seu lado me perguntou ldquoPor que o boneco dele eacute pretinho Eacute muito feiordquo Claro que conversei com ela e com o outro menino em outro momento calmamente falando das diversas cores que as pessoas tecircm e que natildeo haacute isso de feio e bonito aproveitando para falar sobre diversidade e etc Mais para o final da conversa a menina me disse ldquoMeu pai eacute pretinho ele eacute bonitordquo Respondi a menina dizendo que a beleza natildeo estaacute na cor da pele do cabelo ou dos olhos A cena toda me fez refletir que a menina jaacute deve ter ouvido esse tipo de afirmaccedilatildeo errocircnea Jaacute comentei mais de uma vez sobre o preconceito de gecircnero ser muito forte mas e o racial algueacutem mais vivenciou esse tipo de preconceito durante esta residecircncia (Relato do residente T 2017)

Rosemberg (2014) chama a atenccedilatildeo para o tema da diversidade como uma

questatildeo circunscrita na histoacuteria da humanidade A diferenciaccedilatildeo entre os grupos

humanos ou pessoas com atributos que classificam e separam o ldquoeurdquo do ldquooutrordquo

parece constituir as diversas manifestaccedilotildees de culturas humanas Assim a autora

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desnaturaliza a identidade e a diferenccedila apontando o seu caraacuteter cultural social e

histoacuterico Contudo esse eacute um dos temas que tem chamado cada vez mais a atenccedilatildeo

de educadores desde a educaccedilatildeo infantil jaacute que muitas vezes as questotildees que

envolvem a diferenccedila e o diferente passam por processos discriminatoacuterios e

preconceituosos como apontado no relato do estudante ao observar as interaccedilotildees

entre as crianccedilas no que se refere ao quesito raccedilacor

Marinho e Martins (2016) em estudo sobre formaccedilatildeo de professoras que atuam

na educaccedilatildeo infantil constatam a escassez ou inexistecircncia de disciplinas na formaccedilatildeo

inicial de professores que abarquem as questotildees eacutetnico-raciais denunciando o natildeo

cumprimento das leis que entre outras prescriccedilotildees preveem que instituiccedilotildees de niacutevel

superior proporcionem aos futuros(as) professoresas a formaccedilatildeo adequada para

lidarem com as relaccedilotildees raciais multieacutetnica e multicultural da sociedade brasileira

Nesse sentido ao trazerem suas inquietaccedilotildees sobre como as crianccedilas lidam com as

diferenccedilas no contexto da escola os residentes se aproximam das discussotildees a

respeito dos processos discriminatoacuterios oportunizando momentos em que tais

temaacuteticas possam ser discutidas entre professores preceptores e colegas do

programa de estaacutegio

Aleacutem da questatildeo racial outros relatos nos datildeo conta de refletir e discutir sobre

as relaccedilotildees que envolvem as crianccedilas com deficiecircncia na escola

() O que me chamou atenccedilatildeo foi que na quarta (2204) H chegou na escola e decidiu mudar de lugar foi sentar bem ao lado do D (uma crianccedila que foi diagnosticada com autismo de ldquograu leverdquo segundo a professora) eu fiquei observando como seria a relaccedilatildeo deles H trouxe um caderno de desenho o abriu na mesa e dividiu metade da folha para ele e para D depois na hora de descer ele segurou a matildeo do D e ficou durante o almoccedilo todo cuidando de D o orientou a pegar a comida sentar comer devagar e quando natildeo quisesse mais deveria jogar a comida no lixo e durante todo o dia H permaneceu cuidando de D A professora achou estranho pois naquele dia ela natildeo havia chamado a atenccedilatildeo de H ateacute me falou ldquoEle deve estar aprontando e D eacute bobatildeo pode se machucarrdquo e decidiu intervir e pediu para que H mudasse de lugar e parasse de cuidar de (Relato do residente L 2015)

A partir da narrativa eacute possiacutevel refletir sobre o preparo dos professores para

lidar com as diferenccedilas individuais na educaccedilatildeo infantil A inclusatildeo escolar de crianccedilas

com deficiecircncia ocorre mediante poliacuteticas puacuteblicas de inclusatildeo contudo haacute uma

grande distacircncia entre a poliacutetica puacuteblica e a praacutetica pedagoacutegica nos contextos

escolares pois natildeo se aprofunda ldquoo debate sobre os meios os fins e as estrateacutegias

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para a implementaccedilatildeo da poliacutetica de ampliaccedilatildeo da rede de educaccedilatildeo infantilrdquo

(BRUNO 2008 p 59)

Outros registros que tratam da temaacutetica da inclusatildeo de crianccedilas com

deficiecircncia mostram o quanto a escola estaacute despreparada para lidar com essa

questatildeo Os relatos e inquietaccedilotildees dos estudantes nos possibilitam a identificaccedilatildeo de

processos discriminatoacuterios de resistecircncias e acomodaccedilotildees dos profissionais e do

distanciamento de uma praacutetica verdadeiramente inclusiva na esfera das praacuteticas

educativas cotidianas O que se percebe nas discussotildees sobre o assunto eacute que os

residentes enquanto futuros professores muito tecircm a aprender sobre a acolhida das

famiacutelias e das crianccedilas ldquodiferentesrdquo ou com deficiecircncia na constante reflexatildeo sobre o

comportamento atitudes e posturas do educador frente ao trabalho pedagoacutegico

Outras temaacuteticas tatildeo importantes como as que discutimos aqui tem sido objeto

de interesse dos estudantes em processo de imersatildeo nas escolas-campo Haacute uma

gama de registros sobre categorias que envolvem a crianccedila pequena nas atividades

do brincar a disciplina e a coerccedilatildeo dos educadores na tentativa de manter o controle

das crianccedilas e dos comportamentos considerados inadequados Muitos residentes se

surpreendem como essa coerccedilatildeo ocorre demasiadas vezes na escola e nas reuniotildees

de supervisatildeo eacute muito comum questionarem junto ao preceptor formas de

compreender por que algumas praacuteticas coercitivas satildeo tatildeo presentes na educaccedilatildeo

infantil

Consideraccedilotildees Finais

A experiecircncia de estaacutegio no Programa de Residecircncia Pedagoacutegica requer de

estudantes e professores uma atitude de intensa accedilatildeo e reflexatildeo Na perspectiva de

observaccedilatildeo participante eacute que a imersatildeo dos residentes na escola eacute orientada

embora natildeo haja uma intervenccedilatildeo direta planejada e sistemaacutetica sobre os modos de

fazer da escola e dos professores Possiacuteveis intervenccedilotildees sobre a escola suscitadas

pela presenccedila da universidade (de preceptores e residentes) satildeo uma contingecircncia

dos processos de formaccedilatildeo de condiccedilotildees e modos de seu desenvolvimento e eacute assim

que se define o lugar do residente e da preceptoria junto a escola o caraacuteter da

observaccedilatildeo participante a ser realizada durante o estaacutegio e sua conduccedilatildeo e discussatildeo

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no acircmbito escolar As posiccedilotildees dos residentes reeditam questotildees que mobilizam a

imersatildeo e reflexatildeo sobre o vivido como e quando participar O que como e quando

registrar sobre a observaccedilatildeo participante sobre o que se vivencia Como fazer uso

das ferramentas disponiacuteveis na escola e dos subsiacutedios teoacutericos oferecidos durante a

proacutepria residecircncia ou estudados no curso de pedagogia elaborando impressotildees sobre

o que descreve e refletindo sobre o que vive e elabora

A retomada dos escritos e reflexotildees dos estudantes participantes do Programa

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil nos trazem pistas relevantes para a

compreensatildeo natildeo somente dos seus processos formativos mas tambeacutem suscitam

atenccedilatildeo aos temas e questotildees emergentes do cotidiano das crianccedilas nas escolas de

Educaccedilatildeo Infantil Sabe-se que o processo de escrita eacute composto de idas e vindas

de avanccedilos e retrocessos de duacutevidas e certezas percebidas nos textos e contextos

apresentados pelos estudantes neste processo formativo especiacutefico

As postagens guardam caracteriacutesticas especiacuteficas correlatas ao vivido nas

praacuteticas de estaacutegio de acordo com as finalidades comunicativas e formativas do

caderno de campoblog e com especificidades ndash limites e possibilidades ndash que se

dimensionam nestas praacuteticas Os estudantes registram o que observam o que

vivenciam mas natildeo soacute Em muitos registros suas impressotildees (con)fundem-se com o

observado vatildeo aleacutem da descriccedilatildeo interpretando o visto o vivido e outras vezes para

alguns o registro se faz espaccedilo de recuperaccedilatildeo das proacuteprias vivecircncias e dos

elementos teoacutericos estudados

Nesta experiecircncia a liberdade na escolha e escrita dos temas dos cadernos de

campo tem permitido que o processo formativo de cada estudante aconteccedila de forma

uacutenica e original pois apesar de estarem imersos em ambientes semelhantes (em

alguns casos mesmas escolas-campo) e possuiacuterem referenciais teoacutericos semelhantes

(provenientes das unidades curriculares obrigatoacuterias e eletivas do Curso de

Pedagogia) os temas e questotildees que recebem a atenccedilatildeo de cada um satildeo distintos e

trabalhados teoricamente a partir das anguacutestias e inquietaccedilotildees individuais Entretanto

apesar das produccedilotildees escritas serem individuais ao serem publicizadas em reuniotildees

de orientaccedilatildeo ou ateacute no suporte virtual do blog elas podem ser compartilhadas e

tornam-se objeto comum de discussotildees e aprendizagens

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

Referecircncias bibliograacuteficas

BARBOSA Maria Carmem Silveira Por amor e por forccedila rotinas na Educaccedilatildeo Infantil Porto Alegre Artmed 2006

BRAGA Elizabeth dos Santos Viacutedeo escritas leituras recordaccedilotildees cultura e memoacuteria na sala de aula GOacuteES Maria Cecilia Rafael e SMOLKA Ana Luiza Bustamante A significaccedilatildeo nos espaccedilos Educacionais ndash Interaccedilatildeo social e subjetivaccedilatildeo Campinas Papirus Editora1997 p 87-110

BRUNO Marilda Moraes Garcia A construccedilatildeo da escola inclusiva um a anaacutelise das poliacuteticas puacuteblicas e da praacutetica pedagoacutegica no contexto da educaccedilatildeo infantil Revistambienteeducaccedilatildeo v 1 n 2 p56-67 2008

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FREITAS Maria Teresa Assunccedilatildeo A pesquisa de abordagem histoacuterico-cultural um espaccedilo educativo de constituiccedilatildeo de sujeitos Revista Teias v 10 n 19 p 01-12 2009

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Horizonte Autecircntica v 1 p 375-392 2010

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto LUGLI Rosaacuterio Silvana Genta Diaacutelogos pertinentes na formaccedilatildeo inicial e continuada de professores e gestores escolares A concepccedilatildeo

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MARQUES Danielle Vieira Aquino MUumlLLER Fernanda Experiecircncias com blog na pesquisa e na formaccedilatildeo inicial de professoras de educaccedilatildeo infantil ETD-Educaccedilatildeo Temaacutetica Digital v 14 n 1 p 43-61 2012

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NEVES Vanessa Ferraz Almeida CASTANHEIRA Maria Luacutecia GOUVEcircA Maria Cristina Soares O letramento e o brincar em processos de socializaccedilatildeo na educaccedilatildeo infantil brincadeiras diferentes Revista Brasileira de Educaccedilatildeo v 20 n 60 p 215-

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SILVA Adriana BUFALO Joseane O espaccedilo na pedagogia da educaccedilatildeo infantil faacutebula perversidade e possibilidade In Culturas infantis em creches e preacute-escolas estaacutegio e pesquisa Campinas SP Autores Associados 2011

TARDIF Maurice A profissionalizaccedilatildeo do ensino passados trinta anos dois passos para a frente trecircs para traacutes Educaccedilatildeo e Sociedade Campinas SP v34 n123 p

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VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

Correspondecircncia

Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Maria de Faacutetima Carvalho ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

E-mail emartinsunifespgmailcom ndash carvalhomdfgmailcom ndash

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puacuteblicas de um sistema de ensino puacuteblico da regiatildeo metropolitana de Satildeo Paulo entre

os anos de 2007 e 2008 assim como contou com subsiacutedios do Programa da Capes

intitulado ldquoProdocecircnciardquo

Pesquisas como as de Moretti 2011 Martins 2012 Moretti e Martins 2015

Giglio 2010 Giglio e Lugli 2014 Poladian 2014 sob diferentes perspectivas teoacutericas

tecircm tentado buscar compreender aspectos especiacuteficos dessa experiecircncia de estaacutegio

e em sua maioria assinalam tal iniciativa como um dos processos inovadores na aacuterea

de formaccedilatildeo de professores principalmente no que se refere agrave superaccedilatildeo da

dicotomia entre teoria e praacutetica vigente nos estaacutegios dos cursos de formaccedilatildeo de

professores das universidades brasileiras Compreende-se que a formaccedilatildeo do

profissional docente integra um conjunto de desafios destacando-se nos cursos de

formaccedilatildeo inicial a necessidade de ofertar juntamente com subsiacutedios

teoacutericoscientiacuteficos tambeacutem um acesso agraves praacuteticas pedagoacutegicas que instrumentalizem

o professor para a atuaccedilatildeo profissional Nesta direccedilatildeo destaca-se a conduccedilatildeo do

graduando agrave estaacutegios curriculares capazes de iniciaacute-los na praacutetica profissional de

forma efetiva e reflexiva para que com o aporte de professores supervisores

construam conhecimentos que envolvam o pensar e o agir sobre a escola

Quase dez anos apoacutes a criaccedilatildeo do Programa de Residecircncia pedagoacutegica criado

pela Universidade Federal de Satildeo Paulo (Unifesp) em 2018 foi lanccedilado pelo Governo

Federal o Edital CAPES No62018 apresentando a ideia de Residecircncia Pedagoacutegica

como proposta de induccedilatildeo agrave experiecircncias inovadoras na formaccedilatildeo inicial de

professores ao mesmo tempo em que altera as caracteriacutesticas originais do PIBID no

Edital No72018 O edital retoma termos e objetivos bastante proacuteximos dos utilizados

no Programa de Residecircncia aqui abordado entretanto diferencia-se deste e conveacutem

apontar alguns dos elementos definidores desta diferenccedila como por exemplo a

proposiccedilatildeo de um nuacutemero limitado de bolsas aos residentes o que natildeo atenderia a

demanda de estudantes da universidade onde o programa teve origem a previsatildeo

de um nuacutemero maior de residentes por preceptor extrapolando o nuacutemero maacuteximo

indicado pelo Programa base de nosso estudo para a educaccedilatildeo baacutesica Aleacutem disso a

proposta de Residecircncia Pedagoacutegica apresentada no edital referido daacute pouca ou

nenhuma ecircnfase a duas outras modalidades de residecircncia presentes no projeto da

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Unifesp que satildeo a Residecircncia Pedagoacutegica em Gestatildeo Escolar e em Educaccedilatildeo de

Jovens e Adultos

Accedilotildees formativas da Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil (RPEI)

Antes de apresentarmos mais detalhadamente o Programa de Residecircncia em

Educaccedilatildeo infantil (RPEI) eacute importante destacar que o trabalho de formaccedilatildeo de

professores nesta perspectiva comeccedila com o aporte teoacuterico das disciplinas

obrigatoacuterias que contemplam as temaacuteticas do campo Vencida a etapa teoacuterica os

estudantes comeccedilam o programa de estaacutegio contemplado nesta modalidade que

atende o curso de Pedagogia e eacute constituiacuteda como uma unidade curricular obrigatoacuteria

Somente a partir do 5o semestre do curso os alunos devem se matricular e cumprir

135 horas de estaacutegio as quais compreendem momentos de imersatildeo na escola e

supervisatildeo na universidade sendo tal experiecircncia realizada em escolas puacuteblicas

municipais que possuem parceria com a Universidade

Durante todo o processo a atuaccedilatildeo do professor preceptor possui destaque

segundo Moretti e Martins (2015) pois ele faz os primeiros contatos com os

estudantes de cada grupo que vai para a escola e eacute quem supervisiona o estaacutegio

acompanhando o aluno durante todo o percurso do programa Em todas as

modalidades de Residecircncia Pedagoacutegica antes de iniciar a imersatildeo na escola os

estudantes participam de encontros pontuais com seus preceptores para discussatildeo

do programa de atividades da Unidade Curricular No caso da Educaccedilatildeo Infantil

nessas ocasiotildees de encontros realizam-se estudos sobre temaacuteticas relevantes e

discussatildeo de leituras introdutoacuterias agrave atividade de estaacutegio e tambeacutem para orientaccedilotildees

mais praacuteticas sobre por exemplo as regras a serem observadas durante o periacuteodo

de estaacutegio o conhecimento das publicaccedilotildees do PRP para a modalidade especiacutefica a

construccedilatildeo do diaacuterio de campo o papel do professor preceptor e do professor

formador (aquele que o residente acompanharaacute na escola) Todas essas orientaccedilotildees

constam de um manual e satildeo retomadas pelos preceptores em leituras coletivas que

objetivam ajudar os estudantes a usarem o material de suporte enfatizando que o

estaacutegio realizado nesta perspectiva implica mais que observaccedilatildeo passiva a

participaccedilatildeo nas atividades escolares seu registro e reflexatildeo Os primeiros encontros

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tambeacutem envolvem a orientaccedilatildeo sobre aspectos de ordem legal como por exemplo

jamais assumir sozinho a sala de aula em que estatildeo fazendo a residecircncia

Como unidade curricular obrigatoacuteria a RPEI prevecirc em sua ementa que os

alunos deveratildeo construir conhecimentos a partir de identificaccedilatildeo e anaacutelise de relaccedilotildees

e praacuteticas que perfazem o dia a dia da escola de Educaccedilatildeo Infantil atentando para o

seu caraacuteter educacional e pedagoacutegico assim como para os processos de gestatildeo

institucional Esse processo de construccedilatildeo de conhecimentos sobre o que vivenciam

eacute mediado pelo uso de instrumentos de pesquisa qualitativa em educaccedilatildeo

Concomitantemente enquanto participam do dia a dia na escola planejam e elaboram

planos de accedilatildeo pedagoacutegica em colaboraccedilatildeo com os supervisores do estaacutegio e

educadores das escolas-campo

No processo de imersatildeo espera-se que o residente natildeo apenas observe mas

possa dar apoio ao professor de classe em suas praacuteticas pedagoacutegicas cotidianas e na

sua relaccedilatildeo com as crianccedilas com idade entre 0 e 5 anos Cotidianamente tais

residentes devem ser encorajados a atuarem com pequenas accedilotildees junto agraves crianccedilas

com a orientaccedilatildeo dos professores que o acompanham Durante quatro semanas no

processo intenso de imersatildeo na realidade da escola os residentes devem construir

registros diaacuterios das experiecircncias vividas em campo aleacutem de outros materiais que

tecircm origem na observaccedilatildeo participativa do dia a dia escolar e serviratildeo de avaliaccedilatildeo

final tendo elaboraccedilatildeo orientada e aferida pelo professor preceptor da Universidade

Dessa perspectiva o residente tambeacutem eacute solicitado a refletir sobre sua proacutepria

atuaccedilatildeo participando ativamente de um processo de contiacutenua auto avaliaccedilatildeo

Eacute objetivo do Programa em todas as suas modalidades que os graduandos

possam retomar de forma reflexiva o que vivenciam na escola Na modalidade de

Educaccedilatildeo Infantil eacute esperado que o estudante residente possa desenvolver anaacutelises

criacutetico-reflexivas acerca da instituiccedilatildeo no qual estaacute imerso no que se refere agrave interaccedilatildeo

com as famiacutelias e agrave comunidade em seu entorno assim como sobre as praacuteticas

pedagoacutegicas realizadas nesses locais a partir do reconhecimento da crianccedila como

sujeito de direito e de toda a legislaccedilatildeo que diz respeito a essa modalidade de ensino

De acordo com o cronograma da Unidade Curricular Residecircncia Pedagoacutegica

em Educaccedilatildeo Infantil os estudantes devem ir durante quatro dias da semana para a

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escola e um dia para a Universidade para supervisatildeo com o preceptor que eacute um

docente da Universidade Na escola cumprem o horaacuterio da turma que acompanham

em turno que pode ser matutino vespertino ou intermediaacuterio Natildeo satildeo toleradas faltas

ou atrasos sem justificativa meacutedica objetivando-se desta forma colocar os alunos

diante da responsabilidade do compromisso profissional assumido perante a escola

Durante as duas primeiras semanas de imersatildeo os estudantes satildeo orientados

a descrever no diaacuterio de campo o que observam e suas impressotildees sobre a escola

as relaccedilotildees entre professorcrianccedilas crianccedilacrianccedila escolacomunidade

famiacuteliasescola professorprofessor professorgestatildeo e praacuteticas educativas do

cotidiano que satildeo observadas mais atentamente Neste primeiro momento aleacutem da

cobranccedila para que o aluno escreva sobre suas vivecircncias o preceptor busca ajudaacute-lo

na construccedilatildeo dos registros do caderno de campo assinalando sobre as posturas de

descriccedilatildeo e de reflexatildeo na elaboraccedilatildeo sobre suas impressotildees sobre aquilo que eacute

observado

Antes de serem executados os planos pedagoacutegicos de cada estudante satildeo

apresentados para os professores formadores e coordenador nas escolas durante

reuniatildeo realizada na ldquoHora Atividaderdquo com a participaccedilatildeo do professor preceptor Este

tem se constituiacutedo um momento iacutempar de aprendizagem para todos os envolvidos jaacute

que nesta ocasiatildeo os estudantes compartilham seus conhecimentos suas

experiecircncias expectativas e apreensotildees e onde explicitam-se possibilidades de

articulaccedilatildeo escola-universidade no acircmbito da formaccedilatildeo de professores Eacute na uacuteltima

semana de imersatildeo que os estudantes colocam seus planos de accedilatildeo pedagoacutegica em

praacutetica nas salas em que estatildeo imersos fechando o ciclo previsto pelo estaacutegio

Metodologia analisando as temaacuteticas do caderno de campo online (Blog)

Alguns grupos de residentes da RPEI conforme opccedilatildeo dos professores

preceptores usam um blog para a construccedilatildeo online de um caderno de campo que

integra a elaboraccedilatildeo de seus registros sobre a imersatildeo na escola Esses registros ndash

que chamamos de postagens aleacutem de possibilitar um olhar mais apurado sobre as

praacuteticas cotidianas podem contribuir para a orientaccedilatildeo e a construccedilatildeo do Plano de

Accedilatildeo Pedagoacutegica de cada residente e posteriormente para a escrita de um relatoacuterio

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final de estaacutegio pelo grupo Eacute sobre os registros do blog que incidiraacute nossa anaacutelise

considerando para tanto inquietaccedilotildees observaccedilotildees e reflexotildees registradas pelos

residentes nos anos de 2015 2016 e 2017

O blog da residecircncia ou diaacuterio de campo online consiste em uma ferramenta

virtual na qual satildeo realizados os registros de observaccedilotildees e experiecircncias significativas

vividas pelos residentes cotidianamente na escola Destaca-se que tal ferramenta eacute

de acesso restrito e apenas um uacutenico grupo de alunos e professores preceptores da

Universidade podem participar em cada escola acompanhada Deste modo nem os

professores ou quaisquer pessoas das escolas-campo podem acessar tal instrumento

O blog eacute construiacutedo pelo professor preceptor a cada novo grupo de residentes

assegurando o sigilo das informaccedilotildees registradas A ferramenta possibilita a

construccedilatildeo coletiva de diaacutelogos sobre questotildees observadas e a mediaccedilatildeo dos

conhecimentos dos residentes pelos seus supervisores Assim os estudantes podem

realizar trocas sobre suas vivecircncias muitas vezes similares agraves que ocorrem na mesma

instituiccedilatildeo ainda que estejam em turmas de idades diferentes Permite tambeacutem que

preceptores acompanhem diariamente seus residentes respondendo as indagaccedilotildees

e inquietaccedilotildees do grupo que participa do dia-a-dia na escola

Aleacutem de cumprir todos os objetivos de um caderno de campo comum o blog

permite ao preceptor mesmo agrave distacircncia o acompanhamento contiacutenuo do grupo de

estudantes o que lhe permite planejar as atividades semanais de supervisatildeo de forma

a responder as demandas dos alunos e esses uacuteltimos de compartilharem seus

diferentes pontos de vistas e as accedilotildees desenvolvidas na escola Assim no contexto

da residecircncia pedagoacutegica o blog ou caderno de campo online eacute o espaccedilomomento

de realizaccedilatildeo dos registros de observaccedilotildees e experiecircncias significativas vividas

cotidianamente na escola de educaccedilatildeo infantil e de acompanhamento e

problematizaccedilatildeo dessas vivecircncias pelos preceptores

Nesse caminho assinala-se a contribuiccedilatildeo de Vygotsky (1981) quando aponta

que as relaccedilotildees humanas satildeo sempre mediadas pelo meio social e pelos instrumentos

e signos que fazem parte das relaccedilotildees e dos contextos em que o homem estaacute inserido

Desse modo

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A atividade praacutetica do homem portanto se faz duplamente mediada de uma parte estaacute mediada pelas ferramentas no sentido literal da palavra e de outra parte mediada pelas ferramentas no sentido figurado pelas ferramentas do pensamento pelos meios com a ajuda dos quais se realiza a operaccedilatildeo intelectual ou seja mediada com a ajuda das palavras (VYGOTSKI 19302006a p 165)

Nessa direccedilatildeo conveacutem destacar a importacircncia do blog como instrumento social

representativo da incorporaccedilatildeo da tecnologia ao dia a dia dos estudantes e da

consideraccedilatildeo da mediaccedilatildeo tecnoloacutegica em processos de aprendizagem e

desenvolvimento dos graduandos

Diferente de outras formas de relacionamento virtual (e-mail chat instant

messages listas de discussatildeo etc) e de ferramentas virtuais convencionais ndash como

os sites ndash o blog caracteriza-se pela facilidade de sua criaccedilatildeo e manutenccedilatildeo o que eacute

definido pela organizaccedilatildeo automaacutetica das mensagens ndash posts ndash pelo sistema

dinamizando seu uso e favorecendo a construccedilatildeo de diaacuterios coletivos mantidos por

vaacuterios usuaacuterios Tais caracteriacutesticas favorecem o uso do blog em processos de ensino-

aprendizagem tendo em vista a interaccedilatildeo a troca o diaacutelogo como forma de partilha e

construccedilatildeo de conhecimentos (MARQUES MULLER 2012)

O blog permite portanto o compartilhamento de informaccedilotildees e a interaccedilatildeo

entre estudantes do mesmo grupo e o mesmo preceptor em uma mesma escola

Todos podem ler e comentar as postagens funcionando como um ponto de encontro

entre alunos e preceptores Assim nossa atenccedilatildeo agraves postagens dos estudantes no

blog eacute dirigida pelo objetivo de dar visibilidade a dimensatildeo social das praacuteticas de

registro do observadovivido nos processos formativos que emergem na experiecircncia

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil Assumimos o caraacuteter histoacuterico-

cultural da pesquisa do meacutetodo do objeto de estudo e do proacuteprio conhecimento como

construccedilatildeo que se realiza entre sujeitos (FREITAS 2009) Dessa forma acredita-se

que o momento de elaboraccedilatildeo do vivido ndash o registro no caderno de campoblog ndash

deflagra no estudante a necessidade de reflexatildeo sobre os processos de ensino-

aprendizagem em curso no acircmbito do estaacutegio-residecircncia pedagoacutegica

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Registros no caderno de campo online o olhar do residente sobre a escola de

educaccedilatildeo infantil

Nos primeiros dias de imersatildeo na escola os residentes satildeo orientados a

realizar uma observaccedilatildeo atenta dos espaccedilos da instituiccedilatildeo A partir da leitura do texto

de Silva e Bufalo (2011) sobre culturas escolares os residentes descrevem em seus

primeiros registros detalhes fiacutesicos sobre a escola Muitos acabam desenhando a

planta baixa ou tirando fotos de salas de aulas parques e paacutetios e compartilhando no

caderno de campo online (blog) para comeccedilarem a pensar sobre o contexto e os

espaccedilos que podem favorecer a aprendizagem e o desenvolvimento da crianccedila

pequena como descrito no excerto abaixo

Uma coisa que me chamou atenccedilatildeo foi que natildeo possuem um espaccedilo para atividade fiacutesica essas satildeo realizadas no paacutetio que eacute proacuteximo as salas o barulho acaba atrapalhando os demais O parque estaacute interditado por ordem da diretora ou seja natildeo possuem lugar para brincar O dia das crianccedilas foi pautado em ficar sentado e quieto vendo um filme que a maioria jaacute tinha assistido (Relato da residente N 2017)

Formas de organizaccedilatildeo de espaccedilos e tempos remetem agrave organizaccedilatildeo da rotina

Sobre esse tema grande quantidade de postagens textos diz respeito a como as

atividades diaacuterias satildeo organizadas na escola Em alguns registros como o

apresentado a seguir aparece a problematizaccedilatildeo da forma de organizaccedilatildeo das

atividades

730 (15min) - a professora colocou o cabeccedilalho na lousa com a data e fez a contagem coletiva das crianccedilas 745 (45min) - a professora retomou o que eles haviam aprendido sobre os iacutendios entregou massinha e os orientou a modelar utensiacutelios indiacutegenas 830 (35min) - pintura de desenho xerocado que seraacute colado na capa do caderno de atividades 905 (25min) - brincadeira livre no paacutetio interno no brinquedatildeo que fica no final da escadarampa sup2940 (30min) - brincadeira em sala Gato mia 1010 (ateacute as crianccedilas irem embora) - a professora entregou uma folha com a letra da canccedilatildeo 1 2 3 indiozinhos cantou a muacutesica com eles sentados em seus lugares pediu para eles circularem as letras A e I e depois pintar a ilustraccedilatildeo () (Relato da residente J 2015)

A rotina observada e registrada pela residente configura-se como um dos

aspectos mais relevantes na vida da crianccedila que se encontra na escola de Educaccedilatildeo

Infantil Barbosa (2006) aponta que esse eacute um dos elementos que integram as praacuteticas

educativas que devem ser observadas e planejadas com regularidade objetivando a

operacionalizaccedilatildeo do cotidiano da escola de maneira que possa contribuir na

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constituiccedilatildeo da subjetividade dos atores escolares Desse modo pensar e

compreender a rotina como um fator presente e essencial na educaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute um passo promissor para que o residente acompanhe como as atividades

cotidianas da escola se materializam e datildeo base para a organizaccedilatildeo da praacutetica

pedagoacutegica devendo estar presente no desenvolvimento curricular

O planejamento das atividades na educaccedilatildeo infantil tem estreita ligaccedilatildeo com a

rotina Ao observar e refletir sobre a vida e as experiecircncias das crianccedilas na escola os

residentes satildeo remetidos a memoacuteria agrave lembranccedila do que tambeacutem foi um dia vivido

por eles em suas experiecircncias escolares Como apontado por Meksenas (2002)

ldquonunca somos testemunhas objetivas observando objetos e sim sujeitos observando

outros sujeitosrdquo (p 116)

Estive tentando lembrar nas uacuteltimas semanas o que eu fazia na minha preacute-escola Eu comecei no maternal com 3 anos ()Tenho vagas lembranccedilas de duas salas de aula uma do preacute III e a outra acho que era do preacute I Era uma escola particular dessas pequenas de bairro Lembro que a turma natildeo era tatildeo numerosa quanto essa que estou vendo na residecircncia mas a sala tinha uma organizaccedilatildeo parecida eram mesas e cadeiras enfileiradas nas duas () Eu estava com 5 anos Lembro que a gente tinha uma apostila no preacute I eu gostava de terminar tudo raacutepido para dormir Depois a professora comeccedilou a me dar gibi para eu ficar folheando Tenho na minha memoacuteria que as coisas que a gente fazia na escola eram chatas e muito infantis bobas demais Agora eu penso talvez as professoras ficassem me ocupando com massinha e pinturas todo dia tambeacutem como eu vejo na residecircncia e por isso eu achava muito chato O que seraacute que essas crianccedilas pensam disso O que seraacute que elas acham mais legal na escola Eu vejo que elas gostam muito de fazer liccedilatildeo essas de folhinha que a professora daacute e todos os dias elas perguntam Mas eu natildeo me conformo como elas acham isso tatildeo legal (Relato da Residente F 2017)

Sabemos que a memoacuteria eacute mediada pelo signo pelas interaccedilotildees sociais pelo

outro Braga (1997) dirige nosso olhar para o ldquoprocesso de apropriaccedilatildeo das formas

culturais de interaccedilatildeo que caracterizam a memoacuteria humanardquo Para a autora ldquoa

memoacuteria do homem soacute se configura no movimento discursivo e coletivo por sua

natureza cultural e simboacutelicardquo No registro acima o observado mobiliza as lembranccedilas

da residente aquilo que foi tambeacutem vivido na escola de sua infacircncia Entre lembranccedilas

e interrogaccedilotildees emergem as construccedilotildees formativas em um processo dinacircmico ndash

interativo cultural e simboacutelico Processo que potildeem em relaccedilatildeo vivecircncias atuais e

passadas que invocam sentidos e significados atribuiacutedos ao vivido que ocorre nas

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contradiccedilotildees entre aquilo que eacute rememorado pela estudante e o que efetivamente eacute

observado nas relaccedilotildees estabelecidas no contato com o cotidiano da escola

Aleacutem da rotina e da organizaccedilatildeo de tempos e espaccedilos em sua relaccedilatildeo com as

praacuteticas pedagoacutegicas os relatos dos estudantes se reportam agraves diferentes dimensotildees

da gestatildeo escolar Os registros destacam suas observaccedilotildees nas H A (hora atividade)

ou reuniotildees que eventualmente participam e com frequecircncia observam a postura da

equipe em relaccedilatildeo a presenccedila do residente Em seus relatos questionam o caraacuteter

da gestatildeo a qualidade da relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo entre os professores as discussotildees

que remetem a construccedilatildeo e discussatildeo do projeto poliacutetico pedagoacutegico e os papeis

desempenhados pelos diferentes educadores na construccedilatildeo do trabalho de educaccedilatildeo

da infacircncia

Completamos nesta semana 4 dias de participaccedilatildeo nas Horas Atividades (HA) destinada agrave formaccedilatildeo docente organizaccedilatildeo dos registros e planejamento das atividades pedagoacutegicas O que pude por meio da observaccedilatildeo constatar que o papel do Coordenador Pedagoacutegico que eacute fundamental nesse momento de formaccedilatildeo pois eacute ele o mediador desse processo acaba por se tornar distante e sem intervenccedilotildees no que adentra a orientaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico docente (Relato da estudante M 2015)

Na experiecircncia cotidiana de imersatildeo na escola eacute possiacutevel verificar as tensotildees

vivenciadas entre os professores e o papel da coordenaccedilatildeo pedagoacutegica A teoria

discutida na universidade pelos residentes assinala a importacircncia do papel do

coordenador pedagoacutegico na educaccedilatildeo infantil na praacutetica o residente percebe o quanto

a sua mediaccedilatildeo eacute fundamental na organizaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico e por outro

lado o quanto a sua ausecircncia pode interferir de forma negativa na orientaccedilatildeo das

atividades dos professores

Outra personagem que acaba sendo central na gestatildeo escolar eacute a direccedilatildeo que

nessa experiecircncia do residente tambeacutem eacute observada de forma criacutetica

A figura da diretora na escola foi a que mais me chamou a atenccedilatildeo ()imaginem que em nenhum momento percebi qualquer aproximaccedilatildeo da diretora com as crianccedilas em vaacuterios momentos acreditei que ela fosse algum teacutecnico administrativo pois apesar de estar no topo da piracircmide a referecircncia da gestatildeo a mesma se restringia a secretaria e natildeo se relacionava natildeo nos conhecia nem procurava nos conhecer Passou diversas vezes por grupos de crianccedilas e em nenhuma das vezes sequer olhou para elas Nunca apareceu em uma HA nunca percebi o seu contato com os professores e por diversas vezes me perguntei como eles se falavam qual era o seu relacionamento (Relato da residente B 2015)

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Sobre esse assunto estudos como os de Paro (2005) e Castro (2009) tem

assinalado o papel da gestatildeo e da administraccedilatildeo escolar como alicerce fundamental

nos processos de transformaccedilatildeo da escola puacuteblica brasileira Tais trabalhos tecircm

apontado a centralidade da direccedilatildeo escolar nas questotildees que envolvem os processos

de ensino e aprendizagem e as relaccedilotildees humanas presentes na equipe de trabalho

para aleacutem dos trabalhos administrativos e burocraacuteticos Natildeo eacute objetivo deste trabalho

fazer uma anaacutelise do papel do diretor na escola de educaccedilatildeo infantil mas cabe

assinalar que os estudantes residentes apontam o tema em seus registros e atentos

agraves demandas relativas ao papel do diretor indagam se como e quanto as lideranccedilas

escolares tecircm se envolvido com o trabalho administrativo dispendendo tempo para

um olhar mais atento agraves relaccedilotildees entre os professoresalunos funcionaacuterios da escola

observada

Em relaccedilatildeo agraves interaccedilotildees humanas outros registros dos residentes nos

remetem agraves maneiras como a escola lida com as famiacutelias das crianccedilas matriculadas

nas escolas Tais relatos natildeo satildeo tatildeo frequentes possivelmente porque essa eacute uma

relaccedilatildeo que se caracteriza pela assimetria de poderes e eacute pouco valorizada no dia a

dia escolar Os registros evocam situaccedilotildees vividas comentaacuterios ouvidos e

principalmente a necessidade de mudanccedila dos modos de conceber a crianccedila e suas

famiacutelias e de interagir com elas

A relaccedilatildeo entre professor e famiacutelia eacute mais uma dessas conexotildees que fazemos pela vida Por um lado haacute um profissional uma pessoa que estudou e eacute especialista em cuidar de crianccedilas Por outro famiacutelias que dificilmente conseguimos de fato perceber como satildeo suas estruturadas Famiacutelia hoje eacute coisa difiacutecil de entender Eacute matildee que mora sozinha com o filho eacute pais que trabalham e deixam os filhos na semana com tios avoacutes Eacute matildee solteira Eacute filho criado por pai viuacutevo Eacute histoacuteria que natildeo acaba mais Na hora da saiacuteda vamos conhecendo um pouquinho da estrutura familiar de cada crianccedila tentando perceber como se daacute a relaccedilatildeo entre a famiacutelia e a escola mas devemos ter um pouco de cuidado com esse processo (Relato do estudante J 2015)

Aleacutem da residente ter um olhar para os diferentes tipos de arranjos familiares

tambeacutem busca compreender a especificidade de cada famiacutelia considerando o papel

da mulher e de matildee trabalhadora com filhos na escola puacuteblica

(hellip) Veja esses apontamentos uma menina na sala estaacute com piolho a professora disse que jaacute alertou a matildee mas como eacute matildee solteira soacute pode cuidar da filha no domingo O outro menino que natildeo se interessa pelas atividades e responde a educadora tambeacutem teve a matildee notificada mas como

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a mesma eacute separada do marido natildeo faz nada O fato da mulher trabalhar a semana e ter folga aos domingos natildeo significa que ela seja uma maacute matildee pelo contraacuterio significa que ela rala muito para colocar comida no prato A presenccedila ou natildeo de um homem natildeo condiciona nada A escola natildeo pode ser um ambiente de roacutetulos ela deve estar aberta agraves diferenccedilas acolhendo e buscando outras maneiras e formas de aproximaccedilatildeo com a famiacutelia compreendendo a responsabilidade compartilhada que carregam (Registro da residente B 2015)

Os relatos demonstram natildeo soacute o quanto estatildeo atentos para como a escola lida

com as relaccedilotildees familiares mas sobretudo assinalam como tecircm se configurado as

formaccedilotildees das famiacutelias na atualidade Um estudo de Martins (2012) aponta o quanto

a experiecircncia de residecircncia pedagoacutegica possibilita aos estudantes um contato mais

expressivo com a realidade da escola puacuteblica de periferia urbana Aleacutem de observar

as relaccedilotildees institucionais o residente pode ser sensibilizado frente agraves dificuldades

vividas pelas famiacutelias e tendem a perceber o preconceito em relaccedilatildeo aos vaacuterios

arranjos familiares vivenciados pelas crianccedilas mais pobres e como a escolarizaccedilatildeo

dos pais pode afetar a vida dos filhos Os registros dos residentes demonstram como

ldquoos contextos de vida das crianccedilas que frequentam a escola puacuteblica de periferia

passam a ser compreendidos de uma forma concreta e as relaccedilotildees do espaccedilo familiar

com o espaccedilo escolar passam a ter uma conexatildeo cotidianardquo (MARTINS 2012 p 95)

Outra temaacutetica recorrente nos registros dos estudantes diz respeito ao processo

de escolarizaccedilatildeo das praacuteticas da educaccedilatildeo da infacircncia Tal perspectiva surge quando

os residentes referem aos usos dos brinquedos e agraves brincadeiras agrave presenccedila da

leitura e contaccedilatildeo de histoacuterias aos modos de introduccedilatildeo do desenho ao uso de novas

tecnologias e aos modos de avaliar agraves crianccedilas Tal perspectiva escolarizante emerge

em oposiccedilatildeo ao luacutedico como princiacutepio e forma de organizaccedilatildeo das praacuteticas de

educaccedilatildeo junto agraves crianccedilas pequenas e algumas vezes a ela ainda se articula a

preocupaccedilatildeo em disciplinar as vivecircncias escolares sondagens filas broncas e

silecircncios coexistem com desenhos Tv computadores e brincadeiras Os registros nos

dizem de uma escola que hesita entre coibir e promover a expressatildeo das muitas

linguagens da imaginaccedilatildeo e movimento das crianccedilas

Na semana de 2310 a 2710 e como previsto na reuniatildeo de pais a professora realizou a sondagem com as crianccedilas Teoricamente sei como funciona o procedimento mas me questiono se deve ser realizada na Ed Infantil Tambeacutem me pergunto se a sondagem vai muito aleacutem do conhecimento das crianccedilas Por exemplo algumas escrevem o proacuteprio nome

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e algumas palavras mais comuns a elas outras ainda nem reconhecem as letras do alfabeto A sondagem feita abarcou o nome palavras simples um pouco mais complexas e uma frase inteira A minha duacutevida eacute se a sondagem que vai muito aleacutem dos conhecimentos da sala eacute comum e necessaacuteria ainda mais na Ed Infantil (Relato do residente N 2017)

O debate em torno das questotildees que envolvem a escolarizaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute bastante antigo e recorrente Pesquisas como as de Neves Castanheira

e Gouveia (2015) assinalam a partir de autores que estudaram essa temaacutetica como

a perspectiva escolarizante de trabalho com a crianccedila pequena traz seacuterias implicaccedilotildees

para o desenvolvimento infantil justamente porque rompe com as formas como elas

ldquointeragem com a escrita fora da escola destituindo-a de significados pessoais e

sociais e dificulta portanto que as atividades desenvolvidas no espaccedilo escolar

envolvam a ludicidade caracteriacutestica fundamental dessa fase do desenvolvimentordquo

(p 217)

Os residentes parecem estar muito atentos a essas questotildees porque participam

de discussotildees sistemaacuteticas sobre o assunto tanto nas aulas teoacutericas na Universidade

quanto nas reuniotildees de orientaccedilatildeo com os preceptores do Programa de Residecircncia

Muitos estudantes satildeo levados a refletir sobre o assunto logo nos primeiros dias de

imersatildeo na escola

Resolvi mudar o formato do meu relato referente agrave imersatildeo inicial Pois passei por uma situaccedilatildeo em sala que me provocou tal accedilatildeo Devido agrave imposiccedilatildeo de escolarizaccedilatildeo percebida na turma na qual acompanho Onde hoje me emocionei com o choro insistente do aluno BG com as matildeos estremecidas na tentativa de segurar o laacutepis para ldquofazer liccedilatildeordquo (Relato da Residente M 2015)

A partir do relato da residente percebe-se o quanto a questatildeo eacute relevante para

o campo da educaccedilatildeo infantil e da formaccedilatildeo de professores Nas observaccedilotildees e

relatos dos cadernos de campo natildeo eacute incomum aparecerem longas narrativas sobre

os equiacutevocos que ocorrem nas praacuteticas pedagoacutegicas que envolvem a alfabetizaccedilatildeo e

letramento das crianccedilas pequenas Consideramos que questotildees como essas quando

problematizadas pelos estudantes nos horaacuterios de preceptoria ou mesmo nas

discussotildees com professores especialistas sobre o tema tendem a aproximaacute-los de

uma futura praacutetica profissional em que o trabalho com o desenvolvimento da escrita

seja realizado de forma a respeitar a infacircncia natildeo negando agrave crianccedila o seu direito ao

luacutedico mas tratando a apresentaccedilatildeo do mundo letrado como mais um momento

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prazeroso de aprendizagens Tal reflexatildeo eacute importante para os futuros professores

para que busquem compreender como inserir as crianccedilas no mundo letrado de

maneira que possam romper com a dicotomia entre o brincar e a leituraescrita

tomando como referecircncia o significado dessas accedilotildees para a crianccedila possibilitando a

conduccedilatildeo dos trabalhos na educaccedilatildeo infantil que tornem possiacutevel o brincar ldquoletrando

e alfabetizandordquo (NEVES CASTANHEIRA E GOUVEIA 2015)

Outra temaacutetica que aparece num nuacutemero expressivo de postagens diz respeito

ao olhar do residente para as praacuteticas educativas e as interaccedilotildees que ocorrem na

escola com relaccedilatildeo agrave inclusatildeo escolar das crianccedilas percebidas como ldquodiferentesrdquo

Destaca-se nesta temaacutetica observaccedilotildees a respeito de diferenccedilas de religiatildeo gecircnero

raccedilacor e tambeacutem aquelas relacionadas agrave deficiecircncia Haacute descriccedilotildees sobre como as

crianccedilas lidam com as diferenccedilas e as formas como os professores trabalham com

aquelas que possuem alguma dificuldade Algumas postagens ressaltam a

necessidade de formaccedilatildeo inicial e continuada dos educadores para lidarem com a

diversidade na escola

Pela primeira vez vivenciei preconceito racial de uma crianccedila com outra Nos momentos em que a profa distribui lego para as crianccedilas ela daacute tambeacutem um bonequinho para cada crianccedila Tem bonecos adultos crianccedilas homens mulheres e de diversas cores Os bonecos satildeo dados aleatoriamente ou escolhidos pela crianccedila conforme a professora passa de mesa em mesa Neste dia um menino negro estava com um boneco negro Um garoto se aproximou e disse ldquoCredo que boneco feio parece vocecircrdquo se direcionando ao menino O menino deu de ombros e continuou a brincar e poucos minutos depois a menina que estava ao seu lado me perguntou ldquoPor que o boneco dele eacute pretinho Eacute muito feiordquo Claro que conversei com ela e com o outro menino em outro momento calmamente falando das diversas cores que as pessoas tecircm e que natildeo haacute isso de feio e bonito aproveitando para falar sobre diversidade e etc Mais para o final da conversa a menina me disse ldquoMeu pai eacute pretinho ele eacute bonitordquo Respondi a menina dizendo que a beleza natildeo estaacute na cor da pele do cabelo ou dos olhos A cena toda me fez refletir que a menina jaacute deve ter ouvido esse tipo de afirmaccedilatildeo errocircnea Jaacute comentei mais de uma vez sobre o preconceito de gecircnero ser muito forte mas e o racial algueacutem mais vivenciou esse tipo de preconceito durante esta residecircncia (Relato do residente T 2017)

Rosemberg (2014) chama a atenccedilatildeo para o tema da diversidade como uma

questatildeo circunscrita na histoacuteria da humanidade A diferenciaccedilatildeo entre os grupos

humanos ou pessoas com atributos que classificam e separam o ldquoeurdquo do ldquooutrordquo

parece constituir as diversas manifestaccedilotildees de culturas humanas Assim a autora

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desnaturaliza a identidade e a diferenccedila apontando o seu caraacuteter cultural social e

histoacuterico Contudo esse eacute um dos temas que tem chamado cada vez mais a atenccedilatildeo

de educadores desde a educaccedilatildeo infantil jaacute que muitas vezes as questotildees que

envolvem a diferenccedila e o diferente passam por processos discriminatoacuterios e

preconceituosos como apontado no relato do estudante ao observar as interaccedilotildees

entre as crianccedilas no que se refere ao quesito raccedilacor

Marinho e Martins (2016) em estudo sobre formaccedilatildeo de professoras que atuam

na educaccedilatildeo infantil constatam a escassez ou inexistecircncia de disciplinas na formaccedilatildeo

inicial de professores que abarquem as questotildees eacutetnico-raciais denunciando o natildeo

cumprimento das leis que entre outras prescriccedilotildees preveem que instituiccedilotildees de niacutevel

superior proporcionem aos futuros(as) professoresas a formaccedilatildeo adequada para

lidarem com as relaccedilotildees raciais multieacutetnica e multicultural da sociedade brasileira

Nesse sentido ao trazerem suas inquietaccedilotildees sobre como as crianccedilas lidam com as

diferenccedilas no contexto da escola os residentes se aproximam das discussotildees a

respeito dos processos discriminatoacuterios oportunizando momentos em que tais

temaacuteticas possam ser discutidas entre professores preceptores e colegas do

programa de estaacutegio

Aleacutem da questatildeo racial outros relatos nos datildeo conta de refletir e discutir sobre

as relaccedilotildees que envolvem as crianccedilas com deficiecircncia na escola

() O que me chamou atenccedilatildeo foi que na quarta (2204) H chegou na escola e decidiu mudar de lugar foi sentar bem ao lado do D (uma crianccedila que foi diagnosticada com autismo de ldquograu leverdquo segundo a professora) eu fiquei observando como seria a relaccedilatildeo deles H trouxe um caderno de desenho o abriu na mesa e dividiu metade da folha para ele e para D depois na hora de descer ele segurou a matildeo do D e ficou durante o almoccedilo todo cuidando de D o orientou a pegar a comida sentar comer devagar e quando natildeo quisesse mais deveria jogar a comida no lixo e durante todo o dia H permaneceu cuidando de D A professora achou estranho pois naquele dia ela natildeo havia chamado a atenccedilatildeo de H ateacute me falou ldquoEle deve estar aprontando e D eacute bobatildeo pode se machucarrdquo e decidiu intervir e pediu para que H mudasse de lugar e parasse de cuidar de (Relato do residente L 2015)

A partir da narrativa eacute possiacutevel refletir sobre o preparo dos professores para

lidar com as diferenccedilas individuais na educaccedilatildeo infantil A inclusatildeo escolar de crianccedilas

com deficiecircncia ocorre mediante poliacuteticas puacuteblicas de inclusatildeo contudo haacute uma

grande distacircncia entre a poliacutetica puacuteblica e a praacutetica pedagoacutegica nos contextos

escolares pois natildeo se aprofunda ldquoo debate sobre os meios os fins e as estrateacutegias

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para a implementaccedilatildeo da poliacutetica de ampliaccedilatildeo da rede de educaccedilatildeo infantilrdquo

(BRUNO 2008 p 59)

Outros registros que tratam da temaacutetica da inclusatildeo de crianccedilas com

deficiecircncia mostram o quanto a escola estaacute despreparada para lidar com essa

questatildeo Os relatos e inquietaccedilotildees dos estudantes nos possibilitam a identificaccedilatildeo de

processos discriminatoacuterios de resistecircncias e acomodaccedilotildees dos profissionais e do

distanciamento de uma praacutetica verdadeiramente inclusiva na esfera das praacuteticas

educativas cotidianas O que se percebe nas discussotildees sobre o assunto eacute que os

residentes enquanto futuros professores muito tecircm a aprender sobre a acolhida das

famiacutelias e das crianccedilas ldquodiferentesrdquo ou com deficiecircncia na constante reflexatildeo sobre o

comportamento atitudes e posturas do educador frente ao trabalho pedagoacutegico

Outras temaacuteticas tatildeo importantes como as que discutimos aqui tem sido objeto

de interesse dos estudantes em processo de imersatildeo nas escolas-campo Haacute uma

gama de registros sobre categorias que envolvem a crianccedila pequena nas atividades

do brincar a disciplina e a coerccedilatildeo dos educadores na tentativa de manter o controle

das crianccedilas e dos comportamentos considerados inadequados Muitos residentes se

surpreendem como essa coerccedilatildeo ocorre demasiadas vezes na escola e nas reuniotildees

de supervisatildeo eacute muito comum questionarem junto ao preceptor formas de

compreender por que algumas praacuteticas coercitivas satildeo tatildeo presentes na educaccedilatildeo

infantil

Consideraccedilotildees Finais

A experiecircncia de estaacutegio no Programa de Residecircncia Pedagoacutegica requer de

estudantes e professores uma atitude de intensa accedilatildeo e reflexatildeo Na perspectiva de

observaccedilatildeo participante eacute que a imersatildeo dos residentes na escola eacute orientada

embora natildeo haja uma intervenccedilatildeo direta planejada e sistemaacutetica sobre os modos de

fazer da escola e dos professores Possiacuteveis intervenccedilotildees sobre a escola suscitadas

pela presenccedila da universidade (de preceptores e residentes) satildeo uma contingecircncia

dos processos de formaccedilatildeo de condiccedilotildees e modos de seu desenvolvimento e eacute assim

que se define o lugar do residente e da preceptoria junto a escola o caraacuteter da

observaccedilatildeo participante a ser realizada durante o estaacutegio e sua conduccedilatildeo e discussatildeo

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no acircmbito escolar As posiccedilotildees dos residentes reeditam questotildees que mobilizam a

imersatildeo e reflexatildeo sobre o vivido como e quando participar O que como e quando

registrar sobre a observaccedilatildeo participante sobre o que se vivencia Como fazer uso

das ferramentas disponiacuteveis na escola e dos subsiacutedios teoacutericos oferecidos durante a

proacutepria residecircncia ou estudados no curso de pedagogia elaborando impressotildees sobre

o que descreve e refletindo sobre o que vive e elabora

A retomada dos escritos e reflexotildees dos estudantes participantes do Programa

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil nos trazem pistas relevantes para a

compreensatildeo natildeo somente dos seus processos formativos mas tambeacutem suscitam

atenccedilatildeo aos temas e questotildees emergentes do cotidiano das crianccedilas nas escolas de

Educaccedilatildeo Infantil Sabe-se que o processo de escrita eacute composto de idas e vindas

de avanccedilos e retrocessos de duacutevidas e certezas percebidas nos textos e contextos

apresentados pelos estudantes neste processo formativo especiacutefico

As postagens guardam caracteriacutesticas especiacuteficas correlatas ao vivido nas

praacuteticas de estaacutegio de acordo com as finalidades comunicativas e formativas do

caderno de campoblog e com especificidades ndash limites e possibilidades ndash que se

dimensionam nestas praacuteticas Os estudantes registram o que observam o que

vivenciam mas natildeo soacute Em muitos registros suas impressotildees (con)fundem-se com o

observado vatildeo aleacutem da descriccedilatildeo interpretando o visto o vivido e outras vezes para

alguns o registro se faz espaccedilo de recuperaccedilatildeo das proacuteprias vivecircncias e dos

elementos teoacutericos estudados

Nesta experiecircncia a liberdade na escolha e escrita dos temas dos cadernos de

campo tem permitido que o processo formativo de cada estudante aconteccedila de forma

uacutenica e original pois apesar de estarem imersos em ambientes semelhantes (em

alguns casos mesmas escolas-campo) e possuiacuterem referenciais teoacutericos semelhantes

(provenientes das unidades curriculares obrigatoacuterias e eletivas do Curso de

Pedagogia) os temas e questotildees que recebem a atenccedilatildeo de cada um satildeo distintos e

trabalhados teoricamente a partir das anguacutestias e inquietaccedilotildees individuais Entretanto

apesar das produccedilotildees escritas serem individuais ao serem publicizadas em reuniotildees

de orientaccedilatildeo ou ateacute no suporte virtual do blog elas podem ser compartilhadas e

tornam-se objeto comum de discussotildees e aprendizagens

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

Referecircncias bibliograacuteficas

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GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto LUGLI Rosaacuterio Silvana Genta Diaacutelogos pertinentes na formaccedilatildeo inicial e continuada de professores e gestores escolares A concepccedilatildeo

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MARTINS Thaiacutes Regina Miranda SLAVEZ Milka Helena Carrilho Um estudo sobre programas de iniciaccedilatildeo agrave praacutetica profissional de professores no Brasil o PIBID e o estaacutegio de Residecircncia Ensino amp Pesquisa v 13 n 01 p 29-41 2016

MARQUES Danielle Vieira Aquino MUumlLLER Fernanda Experiecircncias com blog na pesquisa e na formaccedilatildeo inicial de professoras de educaccedilatildeo infantil ETD-Educaccedilatildeo Temaacutetica Digital v 14 n 1 p 43-61 2012

MARTINS E Famiacutelia e escola no contexto de um programa de residecircncia pedagoacutegica um estudo a partir do enfoque histoacuterico-cultural Educaccedilatildeo Sociedade amp Culturas v 37 p 89-107 2012

MEKSENAS Paulo Sociologia da educaccedilatildeo uma introduccedilatildeo ao estudo da escola no processo de transformaccedilatildeo social Satildeo Paulo Loyola 2002

MORETTI Vanessa Dias MARTINS Edna Atividade de ensino mediaccedilatildeo e aprendizagem da docecircncia na residecircncia pedagoacutegica uma anaacutelise a partir da teoria histoacuterico-cultural Revista Contrapontos v 15 n 3 p 394-411 2015

MORETTI Vanessa Dias A articulaccedilatildeo entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores que ensinam matemaacutetica o caso da Residecircncia Pedagoacutegica da Unifesp Revista Educaccedilatildeo Porto Alegre 2011 v 34 n 3 p 385-390 2011

NEVES Vanessa Ferraz Almeida CASTANHEIRA Maria Luacutecia GOUVEcircA Maria Cristina Soares O letramento e o brincar em processos de socializaccedilatildeo na educaccedilatildeo infantil brincadeiras diferentes Revista Brasileira de Educaccedilatildeo v 20 n 60 p 215-

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Correspondecircncia

Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Maria de Faacutetima Carvalho ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

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Unifesp que satildeo a Residecircncia Pedagoacutegica em Gestatildeo Escolar e em Educaccedilatildeo de

Jovens e Adultos

Accedilotildees formativas da Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil (RPEI)

Antes de apresentarmos mais detalhadamente o Programa de Residecircncia em

Educaccedilatildeo infantil (RPEI) eacute importante destacar que o trabalho de formaccedilatildeo de

professores nesta perspectiva comeccedila com o aporte teoacuterico das disciplinas

obrigatoacuterias que contemplam as temaacuteticas do campo Vencida a etapa teoacuterica os

estudantes comeccedilam o programa de estaacutegio contemplado nesta modalidade que

atende o curso de Pedagogia e eacute constituiacuteda como uma unidade curricular obrigatoacuteria

Somente a partir do 5o semestre do curso os alunos devem se matricular e cumprir

135 horas de estaacutegio as quais compreendem momentos de imersatildeo na escola e

supervisatildeo na universidade sendo tal experiecircncia realizada em escolas puacuteblicas

municipais que possuem parceria com a Universidade

Durante todo o processo a atuaccedilatildeo do professor preceptor possui destaque

segundo Moretti e Martins (2015) pois ele faz os primeiros contatos com os

estudantes de cada grupo que vai para a escola e eacute quem supervisiona o estaacutegio

acompanhando o aluno durante todo o percurso do programa Em todas as

modalidades de Residecircncia Pedagoacutegica antes de iniciar a imersatildeo na escola os

estudantes participam de encontros pontuais com seus preceptores para discussatildeo

do programa de atividades da Unidade Curricular No caso da Educaccedilatildeo Infantil

nessas ocasiotildees de encontros realizam-se estudos sobre temaacuteticas relevantes e

discussatildeo de leituras introdutoacuterias agrave atividade de estaacutegio e tambeacutem para orientaccedilotildees

mais praacuteticas sobre por exemplo as regras a serem observadas durante o periacuteodo

de estaacutegio o conhecimento das publicaccedilotildees do PRP para a modalidade especiacutefica a

construccedilatildeo do diaacuterio de campo o papel do professor preceptor e do professor

formador (aquele que o residente acompanharaacute na escola) Todas essas orientaccedilotildees

constam de um manual e satildeo retomadas pelos preceptores em leituras coletivas que

objetivam ajudar os estudantes a usarem o material de suporte enfatizando que o

estaacutegio realizado nesta perspectiva implica mais que observaccedilatildeo passiva a

participaccedilatildeo nas atividades escolares seu registro e reflexatildeo Os primeiros encontros

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tambeacutem envolvem a orientaccedilatildeo sobre aspectos de ordem legal como por exemplo

jamais assumir sozinho a sala de aula em que estatildeo fazendo a residecircncia

Como unidade curricular obrigatoacuteria a RPEI prevecirc em sua ementa que os

alunos deveratildeo construir conhecimentos a partir de identificaccedilatildeo e anaacutelise de relaccedilotildees

e praacuteticas que perfazem o dia a dia da escola de Educaccedilatildeo Infantil atentando para o

seu caraacuteter educacional e pedagoacutegico assim como para os processos de gestatildeo

institucional Esse processo de construccedilatildeo de conhecimentos sobre o que vivenciam

eacute mediado pelo uso de instrumentos de pesquisa qualitativa em educaccedilatildeo

Concomitantemente enquanto participam do dia a dia na escola planejam e elaboram

planos de accedilatildeo pedagoacutegica em colaboraccedilatildeo com os supervisores do estaacutegio e

educadores das escolas-campo

No processo de imersatildeo espera-se que o residente natildeo apenas observe mas

possa dar apoio ao professor de classe em suas praacuteticas pedagoacutegicas cotidianas e na

sua relaccedilatildeo com as crianccedilas com idade entre 0 e 5 anos Cotidianamente tais

residentes devem ser encorajados a atuarem com pequenas accedilotildees junto agraves crianccedilas

com a orientaccedilatildeo dos professores que o acompanham Durante quatro semanas no

processo intenso de imersatildeo na realidade da escola os residentes devem construir

registros diaacuterios das experiecircncias vividas em campo aleacutem de outros materiais que

tecircm origem na observaccedilatildeo participativa do dia a dia escolar e serviratildeo de avaliaccedilatildeo

final tendo elaboraccedilatildeo orientada e aferida pelo professor preceptor da Universidade

Dessa perspectiva o residente tambeacutem eacute solicitado a refletir sobre sua proacutepria

atuaccedilatildeo participando ativamente de um processo de contiacutenua auto avaliaccedilatildeo

Eacute objetivo do Programa em todas as suas modalidades que os graduandos

possam retomar de forma reflexiva o que vivenciam na escola Na modalidade de

Educaccedilatildeo Infantil eacute esperado que o estudante residente possa desenvolver anaacutelises

criacutetico-reflexivas acerca da instituiccedilatildeo no qual estaacute imerso no que se refere agrave interaccedilatildeo

com as famiacutelias e agrave comunidade em seu entorno assim como sobre as praacuteticas

pedagoacutegicas realizadas nesses locais a partir do reconhecimento da crianccedila como

sujeito de direito e de toda a legislaccedilatildeo que diz respeito a essa modalidade de ensino

De acordo com o cronograma da Unidade Curricular Residecircncia Pedagoacutegica

em Educaccedilatildeo Infantil os estudantes devem ir durante quatro dias da semana para a

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escola e um dia para a Universidade para supervisatildeo com o preceptor que eacute um

docente da Universidade Na escola cumprem o horaacuterio da turma que acompanham

em turno que pode ser matutino vespertino ou intermediaacuterio Natildeo satildeo toleradas faltas

ou atrasos sem justificativa meacutedica objetivando-se desta forma colocar os alunos

diante da responsabilidade do compromisso profissional assumido perante a escola

Durante as duas primeiras semanas de imersatildeo os estudantes satildeo orientados

a descrever no diaacuterio de campo o que observam e suas impressotildees sobre a escola

as relaccedilotildees entre professorcrianccedilas crianccedilacrianccedila escolacomunidade

famiacuteliasescola professorprofessor professorgestatildeo e praacuteticas educativas do

cotidiano que satildeo observadas mais atentamente Neste primeiro momento aleacutem da

cobranccedila para que o aluno escreva sobre suas vivecircncias o preceptor busca ajudaacute-lo

na construccedilatildeo dos registros do caderno de campo assinalando sobre as posturas de

descriccedilatildeo e de reflexatildeo na elaboraccedilatildeo sobre suas impressotildees sobre aquilo que eacute

observado

Antes de serem executados os planos pedagoacutegicos de cada estudante satildeo

apresentados para os professores formadores e coordenador nas escolas durante

reuniatildeo realizada na ldquoHora Atividaderdquo com a participaccedilatildeo do professor preceptor Este

tem se constituiacutedo um momento iacutempar de aprendizagem para todos os envolvidos jaacute

que nesta ocasiatildeo os estudantes compartilham seus conhecimentos suas

experiecircncias expectativas e apreensotildees e onde explicitam-se possibilidades de

articulaccedilatildeo escola-universidade no acircmbito da formaccedilatildeo de professores Eacute na uacuteltima

semana de imersatildeo que os estudantes colocam seus planos de accedilatildeo pedagoacutegica em

praacutetica nas salas em que estatildeo imersos fechando o ciclo previsto pelo estaacutegio

Metodologia analisando as temaacuteticas do caderno de campo online (Blog)

Alguns grupos de residentes da RPEI conforme opccedilatildeo dos professores

preceptores usam um blog para a construccedilatildeo online de um caderno de campo que

integra a elaboraccedilatildeo de seus registros sobre a imersatildeo na escola Esses registros ndash

que chamamos de postagens aleacutem de possibilitar um olhar mais apurado sobre as

praacuteticas cotidianas podem contribuir para a orientaccedilatildeo e a construccedilatildeo do Plano de

Accedilatildeo Pedagoacutegica de cada residente e posteriormente para a escrita de um relatoacuterio

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final de estaacutegio pelo grupo Eacute sobre os registros do blog que incidiraacute nossa anaacutelise

considerando para tanto inquietaccedilotildees observaccedilotildees e reflexotildees registradas pelos

residentes nos anos de 2015 2016 e 2017

O blog da residecircncia ou diaacuterio de campo online consiste em uma ferramenta

virtual na qual satildeo realizados os registros de observaccedilotildees e experiecircncias significativas

vividas pelos residentes cotidianamente na escola Destaca-se que tal ferramenta eacute

de acesso restrito e apenas um uacutenico grupo de alunos e professores preceptores da

Universidade podem participar em cada escola acompanhada Deste modo nem os

professores ou quaisquer pessoas das escolas-campo podem acessar tal instrumento

O blog eacute construiacutedo pelo professor preceptor a cada novo grupo de residentes

assegurando o sigilo das informaccedilotildees registradas A ferramenta possibilita a

construccedilatildeo coletiva de diaacutelogos sobre questotildees observadas e a mediaccedilatildeo dos

conhecimentos dos residentes pelos seus supervisores Assim os estudantes podem

realizar trocas sobre suas vivecircncias muitas vezes similares agraves que ocorrem na mesma

instituiccedilatildeo ainda que estejam em turmas de idades diferentes Permite tambeacutem que

preceptores acompanhem diariamente seus residentes respondendo as indagaccedilotildees

e inquietaccedilotildees do grupo que participa do dia-a-dia na escola

Aleacutem de cumprir todos os objetivos de um caderno de campo comum o blog

permite ao preceptor mesmo agrave distacircncia o acompanhamento contiacutenuo do grupo de

estudantes o que lhe permite planejar as atividades semanais de supervisatildeo de forma

a responder as demandas dos alunos e esses uacuteltimos de compartilharem seus

diferentes pontos de vistas e as accedilotildees desenvolvidas na escola Assim no contexto

da residecircncia pedagoacutegica o blog ou caderno de campo online eacute o espaccedilomomento

de realizaccedilatildeo dos registros de observaccedilotildees e experiecircncias significativas vividas

cotidianamente na escola de educaccedilatildeo infantil e de acompanhamento e

problematizaccedilatildeo dessas vivecircncias pelos preceptores

Nesse caminho assinala-se a contribuiccedilatildeo de Vygotsky (1981) quando aponta

que as relaccedilotildees humanas satildeo sempre mediadas pelo meio social e pelos instrumentos

e signos que fazem parte das relaccedilotildees e dos contextos em que o homem estaacute inserido

Desse modo

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A atividade praacutetica do homem portanto se faz duplamente mediada de uma parte estaacute mediada pelas ferramentas no sentido literal da palavra e de outra parte mediada pelas ferramentas no sentido figurado pelas ferramentas do pensamento pelos meios com a ajuda dos quais se realiza a operaccedilatildeo intelectual ou seja mediada com a ajuda das palavras (VYGOTSKI 19302006a p 165)

Nessa direccedilatildeo conveacutem destacar a importacircncia do blog como instrumento social

representativo da incorporaccedilatildeo da tecnologia ao dia a dia dos estudantes e da

consideraccedilatildeo da mediaccedilatildeo tecnoloacutegica em processos de aprendizagem e

desenvolvimento dos graduandos

Diferente de outras formas de relacionamento virtual (e-mail chat instant

messages listas de discussatildeo etc) e de ferramentas virtuais convencionais ndash como

os sites ndash o blog caracteriza-se pela facilidade de sua criaccedilatildeo e manutenccedilatildeo o que eacute

definido pela organizaccedilatildeo automaacutetica das mensagens ndash posts ndash pelo sistema

dinamizando seu uso e favorecendo a construccedilatildeo de diaacuterios coletivos mantidos por

vaacuterios usuaacuterios Tais caracteriacutesticas favorecem o uso do blog em processos de ensino-

aprendizagem tendo em vista a interaccedilatildeo a troca o diaacutelogo como forma de partilha e

construccedilatildeo de conhecimentos (MARQUES MULLER 2012)

O blog permite portanto o compartilhamento de informaccedilotildees e a interaccedilatildeo

entre estudantes do mesmo grupo e o mesmo preceptor em uma mesma escola

Todos podem ler e comentar as postagens funcionando como um ponto de encontro

entre alunos e preceptores Assim nossa atenccedilatildeo agraves postagens dos estudantes no

blog eacute dirigida pelo objetivo de dar visibilidade a dimensatildeo social das praacuteticas de

registro do observadovivido nos processos formativos que emergem na experiecircncia

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil Assumimos o caraacuteter histoacuterico-

cultural da pesquisa do meacutetodo do objeto de estudo e do proacuteprio conhecimento como

construccedilatildeo que se realiza entre sujeitos (FREITAS 2009) Dessa forma acredita-se

que o momento de elaboraccedilatildeo do vivido ndash o registro no caderno de campoblog ndash

deflagra no estudante a necessidade de reflexatildeo sobre os processos de ensino-

aprendizagem em curso no acircmbito do estaacutegio-residecircncia pedagoacutegica

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Registros no caderno de campo online o olhar do residente sobre a escola de

educaccedilatildeo infantil

Nos primeiros dias de imersatildeo na escola os residentes satildeo orientados a

realizar uma observaccedilatildeo atenta dos espaccedilos da instituiccedilatildeo A partir da leitura do texto

de Silva e Bufalo (2011) sobre culturas escolares os residentes descrevem em seus

primeiros registros detalhes fiacutesicos sobre a escola Muitos acabam desenhando a

planta baixa ou tirando fotos de salas de aulas parques e paacutetios e compartilhando no

caderno de campo online (blog) para comeccedilarem a pensar sobre o contexto e os

espaccedilos que podem favorecer a aprendizagem e o desenvolvimento da crianccedila

pequena como descrito no excerto abaixo

Uma coisa que me chamou atenccedilatildeo foi que natildeo possuem um espaccedilo para atividade fiacutesica essas satildeo realizadas no paacutetio que eacute proacuteximo as salas o barulho acaba atrapalhando os demais O parque estaacute interditado por ordem da diretora ou seja natildeo possuem lugar para brincar O dia das crianccedilas foi pautado em ficar sentado e quieto vendo um filme que a maioria jaacute tinha assistido (Relato da residente N 2017)

Formas de organizaccedilatildeo de espaccedilos e tempos remetem agrave organizaccedilatildeo da rotina

Sobre esse tema grande quantidade de postagens textos diz respeito a como as

atividades diaacuterias satildeo organizadas na escola Em alguns registros como o

apresentado a seguir aparece a problematizaccedilatildeo da forma de organizaccedilatildeo das

atividades

730 (15min) - a professora colocou o cabeccedilalho na lousa com a data e fez a contagem coletiva das crianccedilas 745 (45min) - a professora retomou o que eles haviam aprendido sobre os iacutendios entregou massinha e os orientou a modelar utensiacutelios indiacutegenas 830 (35min) - pintura de desenho xerocado que seraacute colado na capa do caderno de atividades 905 (25min) - brincadeira livre no paacutetio interno no brinquedatildeo que fica no final da escadarampa sup2940 (30min) - brincadeira em sala Gato mia 1010 (ateacute as crianccedilas irem embora) - a professora entregou uma folha com a letra da canccedilatildeo 1 2 3 indiozinhos cantou a muacutesica com eles sentados em seus lugares pediu para eles circularem as letras A e I e depois pintar a ilustraccedilatildeo () (Relato da residente J 2015)

A rotina observada e registrada pela residente configura-se como um dos

aspectos mais relevantes na vida da crianccedila que se encontra na escola de Educaccedilatildeo

Infantil Barbosa (2006) aponta que esse eacute um dos elementos que integram as praacuteticas

educativas que devem ser observadas e planejadas com regularidade objetivando a

operacionalizaccedilatildeo do cotidiano da escola de maneira que possa contribuir na

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constituiccedilatildeo da subjetividade dos atores escolares Desse modo pensar e

compreender a rotina como um fator presente e essencial na educaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute um passo promissor para que o residente acompanhe como as atividades

cotidianas da escola se materializam e datildeo base para a organizaccedilatildeo da praacutetica

pedagoacutegica devendo estar presente no desenvolvimento curricular

O planejamento das atividades na educaccedilatildeo infantil tem estreita ligaccedilatildeo com a

rotina Ao observar e refletir sobre a vida e as experiecircncias das crianccedilas na escola os

residentes satildeo remetidos a memoacuteria agrave lembranccedila do que tambeacutem foi um dia vivido

por eles em suas experiecircncias escolares Como apontado por Meksenas (2002)

ldquonunca somos testemunhas objetivas observando objetos e sim sujeitos observando

outros sujeitosrdquo (p 116)

Estive tentando lembrar nas uacuteltimas semanas o que eu fazia na minha preacute-escola Eu comecei no maternal com 3 anos ()Tenho vagas lembranccedilas de duas salas de aula uma do preacute III e a outra acho que era do preacute I Era uma escola particular dessas pequenas de bairro Lembro que a turma natildeo era tatildeo numerosa quanto essa que estou vendo na residecircncia mas a sala tinha uma organizaccedilatildeo parecida eram mesas e cadeiras enfileiradas nas duas () Eu estava com 5 anos Lembro que a gente tinha uma apostila no preacute I eu gostava de terminar tudo raacutepido para dormir Depois a professora comeccedilou a me dar gibi para eu ficar folheando Tenho na minha memoacuteria que as coisas que a gente fazia na escola eram chatas e muito infantis bobas demais Agora eu penso talvez as professoras ficassem me ocupando com massinha e pinturas todo dia tambeacutem como eu vejo na residecircncia e por isso eu achava muito chato O que seraacute que essas crianccedilas pensam disso O que seraacute que elas acham mais legal na escola Eu vejo que elas gostam muito de fazer liccedilatildeo essas de folhinha que a professora daacute e todos os dias elas perguntam Mas eu natildeo me conformo como elas acham isso tatildeo legal (Relato da Residente F 2017)

Sabemos que a memoacuteria eacute mediada pelo signo pelas interaccedilotildees sociais pelo

outro Braga (1997) dirige nosso olhar para o ldquoprocesso de apropriaccedilatildeo das formas

culturais de interaccedilatildeo que caracterizam a memoacuteria humanardquo Para a autora ldquoa

memoacuteria do homem soacute se configura no movimento discursivo e coletivo por sua

natureza cultural e simboacutelicardquo No registro acima o observado mobiliza as lembranccedilas

da residente aquilo que foi tambeacutem vivido na escola de sua infacircncia Entre lembranccedilas

e interrogaccedilotildees emergem as construccedilotildees formativas em um processo dinacircmico ndash

interativo cultural e simboacutelico Processo que potildeem em relaccedilatildeo vivecircncias atuais e

passadas que invocam sentidos e significados atribuiacutedos ao vivido que ocorre nas

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contradiccedilotildees entre aquilo que eacute rememorado pela estudante e o que efetivamente eacute

observado nas relaccedilotildees estabelecidas no contato com o cotidiano da escola

Aleacutem da rotina e da organizaccedilatildeo de tempos e espaccedilos em sua relaccedilatildeo com as

praacuteticas pedagoacutegicas os relatos dos estudantes se reportam agraves diferentes dimensotildees

da gestatildeo escolar Os registros destacam suas observaccedilotildees nas H A (hora atividade)

ou reuniotildees que eventualmente participam e com frequecircncia observam a postura da

equipe em relaccedilatildeo a presenccedila do residente Em seus relatos questionam o caraacuteter

da gestatildeo a qualidade da relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo entre os professores as discussotildees

que remetem a construccedilatildeo e discussatildeo do projeto poliacutetico pedagoacutegico e os papeis

desempenhados pelos diferentes educadores na construccedilatildeo do trabalho de educaccedilatildeo

da infacircncia

Completamos nesta semana 4 dias de participaccedilatildeo nas Horas Atividades (HA) destinada agrave formaccedilatildeo docente organizaccedilatildeo dos registros e planejamento das atividades pedagoacutegicas O que pude por meio da observaccedilatildeo constatar que o papel do Coordenador Pedagoacutegico que eacute fundamental nesse momento de formaccedilatildeo pois eacute ele o mediador desse processo acaba por se tornar distante e sem intervenccedilotildees no que adentra a orientaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico docente (Relato da estudante M 2015)

Na experiecircncia cotidiana de imersatildeo na escola eacute possiacutevel verificar as tensotildees

vivenciadas entre os professores e o papel da coordenaccedilatildeo pedagoacutegica A teoria

discutida na universidade pelos residentes assinala a importacircncia do papel do

coordenador pedagoacutegico na educaccedilatildeo infantil na praacutetica o residente percebe o quanto

a sua mediaccedilatildeo eacute fundamental na organizaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico e por outro

lado o quanto a sua ausecircncia pode interferir de forma negativa na orientaccedilatildeo das

atividades dos professores

Outra personagem que acaba sendo central na gestatildeo escolar eacute a direccedilatildeo que

nessa experiecircncia do residente tambeacutem eacute observada de forma criacutetica

A figura da diretora na escola foi a que mais me chamou a atenccedilatildeo ()imaginem que em nenhum momento percebi qualquer aproximaccedilatildeo da diretora com as crianccedilas em vaacuterios momentos acreditei que ela fosse algum teacutecnico administrativo pois apesar de estar no topo da piracircmide a referecircncia da gestatildeo a mesma se restringia a secretaria e natildeo se relacionava natildeo nos conhecia nem procurava nos conhecer Passou diversas vezes por grupos de crianccedilas e em nenhuma das vezes sequer olhou para elas Nunca apareceu em uma HA nunca percebi o seu contato com os professores e por diversas vezes me perguntei como eles se falavam qual era o seu relacionamento (Relato da residente B 2015)

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Sobre esse assunto estudos como os de Paro (2005) e Castro (2009) tem

assinalado o papel da gestatildeo e da administraccedilatildeo escolar como alicerce fundamental

nos processos de transformaccedilatildeo da escola puacuteblica brasileira Tais trabalhos tecircm

apontado a centralidade da direccedilatildeo escolar nas questotildees que envolvem os processos

de ensino e aprendizagem e as relaccedilotildees humanas presentes na equipe de trabalho

para aleacutem dos trabalhos administrativos e burocraacuteticos Natildeo eacute objetivo deste trabalho

fazer uma anaacutelise do papel do diretor na escola de educaccedilatildeo infantil mas cabe

assinalar que os estudantes residentes apontam o tema em seus registros e atentos

agraves demandas relativas ao papel do diretor indagam se como e quanto as lideranccedilas

escolares tecircm se envolvido com o trabalho administrativo dispendendo tempo para

um olhar mais atento agraves relaccedilotildees entre os professoresalunos funcionaacuterios da escola

observada

Em relaccedilatildeo agraves interaccedilotildees humanas outros registros dos residentes nos

remetem agraves maneiras como a escola lida com as famiacutelias das crianccedilas matriculadas

nas escolas Tais relatos natildeo satildeo tatildeo frequentes possivelmente porque essa eacute uma

relaccedilatildeo que se caracteriza pela assimetria de poderes e eacute pouco valorizada no dia a

dia escolar Os registros evocam situaccedilotildees vividas comentaacuterios ouvidos e

principalmente a necessidade de mudanccedila dos modos de conceber a crianccedila e suas

famiacutelias e de interagir com elas

A relaccedilatildeo entre professor e famiacutelia eacute mais uma dessas conexotildees que fazemos pela vida Por um lado haacute um profissional uma pessoa que estudou e eacute especialista em cuidar de crianccedilas Por outro famiacutelias que dificilmente conseguimos de fato perceber como satildeo suas estruturadas Famiacutelia hoje eacute coisa difiacutecil de entender Eacute matildee que mora sozinha com o filho eacute pais que trabalham e deixam os filhos na semana com tios avoacutes Eacute matildee solteira Eacute filho criado por pai viuacutevo Eacute histoacuteria que natildeo acaba mais Na hora da saiacuteda vamos conhecendo um pouquinho da estrutura familiar de cada crianccedila tentando perceber como se daacute a relaccedilatildeo entre a famiacutelia e a escola mas devemos ter um pouco de cuidado com esse processo (Relato do estudante J 2015)

Aleacutem da residente ter um olhar para os diferentes tipos de arranjos familiares

tambeacutem busca compreender a especificidade de cada famiacutelia considerando o papel

da mulher e de matildee trabalhadora com filhos na escola puacuteblica

(hellip) Veja esses apontamentos uma menina na sala estaacute com piolho a professora disse que jaacute alertou a matildee mas como eacute matildee solteira soacute pode cuidar da filha no domingo O outro menino que natildeo se interessa pelas atividades e responde a educadora tambeacutem teve a matildee notificada mas como

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a mesma eacute separada do marido natildeo faz nada O fato da mulher trabalhar a semana e ter folga aos domingos natildeo significa que ela seja uma maacute matildee pelo contraacuterio significa que ela rala muito para colocar comida no prato A presenccedila ou natildeo de um homem natildeo condiciona nada A escola natildeo pode ser um ambiente de roacutetulos ela deve estar aberta agraves diferenccedilas acolhendo e buscando outras maneiras e formas de aproximaccedilatildeo com a famiacutelia compreendendo a responsabilidade compartilhada que carregam (Registro da residente B 2015)

Os relatos demonstram natildeo soacute o quanto estatildeo atentos para como a escola lida

com as relaccedilotildees familiares mas sobretudo assinalam como tecircm se configurado as

formaccedilotildees das famiacutelias na atualidade Um estudo de Martins (2012) aponta o quanto

a experiecircncia de residecircncia pedagoacutegica possibilita aos estudantes um contato mais

expressivo com a realidade da escola puacuteblica de periferia urbana Aleacutem de observar

as relaccedilotildees institucionais o residente pode ser sensibilizado frente agraves dificuldades

vividas pelas famiacutelias e tendem a perceber o preconceito em relaccedilatildeo aos vaacuterios

arranjos familiares vivenciados pelas crianccedilas mais pobres e como a escolarizaccedilatildeo

dos pais pode afetar a vida dos filhos Os registros dos residentes demonstram como

ldquoos contextos de vida das crianccedilas que frequentam a escola puacuteblica de periferia

passam a ser compreendidos de uma forma concreta e as relaccedilotildees do espaccedilo familiar

com o espaccedilo escolar passam a ter uma conexatildeo cotidianardquo (MARTINS 2012 p 95)

Outra temaacutetica recorrente nos registros dos estudantes diz respeito ao processo

de escolarizaccedilatildeo das praacuteticas da educaccedilatildeo da infacircncia Tal perspectiva surge quando

os residentes referem aos usos dos brinquedos e agraves brincadeiras agrave presenccedila da

leitura e contaccedilatildeo de histoacuterias aos modos de introduccedilatildeo do desenho ao uso de novas

tecnologias e aos modos de avaliar agraves crianccedilas Tal perspectiva escolarizante emerge

em oposiccedilatildeo ao luacutedico como princiacutepio e forma de organizaccedilatildeo das praacuteticas de

educaccedilatildeo junto agraves crianccedilas pequenas e algumas vezes a ela ainda se articula a

preocupaccedilatildeo em disciplinar as vivecircncias escolares sondagens filas broncas e

silecircncios coexistem com desenhos Tv computadores e brincadeiras Os registros nos

dizem de uma escola que hesita entre coibir e promover a expressatildeo das muitas

linguagens da imaginaccedilatildeo e movimento das crianccedilas

Na semana de 2310 a 2710 e como previsto na reuniatildeo de pais a professora realizou a sondagem com as crianccedilas Teoricamente sei como funciona o procedimento mas me questiono se deve ser realizada na Ed Infantil Tambeacutem me pergunto se a sondagem vai muito aleacutem do conhecimento das crianccedilas Por exemplo algumas escrevem o proacuteprio nome

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e algumas palavras mais comuns a elas outras ainda nem reconhecem as letras do alfabeto A sondagem feita abarcou o nome palavras simples um pouco mais complexas e uma frase inteira A minha duacutevida eacute se a sondagem que vai muito aleacutem dos conhecimentos da sala eacute comum e necessaacuteria ainda mais na Ed Infantil (Relato do residente N 2017)

O debate em torno das questotildees que envolvem a escolarizaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute bastante antigo e recorrente Pesquisas como as de Neves Castanheira

e Gouveia (2015) assinalam a partir de autores que estudaram essa temaacutetica como

a perspectiva escolarizante de trabalho com a crianccedila pequena traz seacuterias implicaccedilotildees

para o desenvolvimento infantil justamente porque rompe com as formas como elas

ldquointeragem com a escrita fora da escola destituindo-a de significados pessoais e

sociais e dificulta portanto que as atividades desenvolvidas no espaccedilo escolar

envolvam a ludicidade caracteriacutestica fundamental dessa fase do desenvolvimentordquo

(p 217)

Os residentes parecem estar muito atentos a essas questotildees porque participam

de discussotildees sistemaacuteticas sobre o assunto tanto nas aulas teoacutericas na Universidade

quanto nas reuniotildees de orientaccedilatildeo com os preceptores do Programa de Residecircncia

Muitos estudantes satildeo levados a refletir sobre o assunto logo nos primeiros dias de

imersatildeo na escola

Resolvi mudar o formato do meu relato referente agrave imersatildeo inicial Pois passei por uma situaccedilatildeo em sala que me provocou tal accedilatildeo Devido agrave imposiccedilatildeo de escolarizaccedilatildeo percebida na turma na qual acompanho Onde hoje me emocionei com o choro insistente do aluno BG com as matildeos estremecidas na tentativa de segurar o laacutepis para ldquofazer liccedilatildeordquo (Relato da Residente M 2015)

A partir do relato da residente percebe-se o quanto a questatildeo eacute relevante para

o campo da educaccedilatildeo infantil e da formaccedilatildeo de professores Nas observaccedilotildees e

relatos dos cadernos de campo natildeo eacute incomum aparecerem longas narrativas sobre

os equiacutevocos que ocorrem nas praacuteticas pedagoacutegicas que envolvem a alfabetizaccedilatildeo e

letramento das crianccedilas pequenas Consideramos que questotildees como essas quando

problematizadas pelos estudantes nos horaacuterios de preceptoria ou mesmo nas

discussotildees com professores especialistas sobre o tema tendem a aproximaacute-los de

uma futura praacutetica profissional em que o trabalho com o desenvolvimento da escrita

seja realizado de forma a respeitar a infacircncia natildeo negando agrave crianccedila o seu direito ao

luacutedico mas tratando a apresentaccedilatildeo do mundo letrado como mais um momento

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prazeroso de aprendizagens Tal reflexatildeo eacute importante para os futuros professores

para que busquem compreender como inserir as crianccedilas no mundo letrado de

maneira que possam romper com a dicotomia entre o brincar e a leituraescrita

tomando como referecircncia o significado dessas accedilotildees para a crianccedila possibilitando a

conduccedilatildeo dos trabalhos na educaccedilatildeo infantil que tornem possiacutevel o brincar ldquoletrando

e alfabetizandordquo (NEVES CASTANHEIRA E GOUVEIA 2015)

Outra temaacutetica que aparece num nuacutemero expressivo de postagens diz respeito

ao olhar do residente para as praacuteticas educativas e as interaccedilotildees que ocorrem na

escola com relaccedilatildeo agrave inclusatildeo escolar das crianccedilas percebidas como ldquodiferentesrdquo

Destaca-se nesta temaacutetica observaccedilotildees a respeito de diferenccedilas de religiatildeo gecircnero

raccedilacor e tambeacutem aquelas relacionadas agrave deficiecircncia Haacute descriccedilotildees sobre como as

crianccedilas lidam com as diferenccedilas e as formas como os professores trabalham com

aquelas que possuem alguma dificuldade Algumas postagens ressaltam a

necessidade de formaccedilatildeo inicial e continuada dos educadores para lidarem com a

diversidade na escola

Pela primeira vez vivenciei preconceito racial de uma crianccedila com outra Nos momentos em que a profa distribui lego para as crianccedilas ela daacute tambeacutem um bonequinho para cada crianccedila Tem bonecos adultos crianccedilas homens mulheres e de diversas cores Os bonecos satildeo dados aleatoriamente ou escolhidos pela crianccedila conforme a professora passa de mesa em mesa Neste dia um menino negro estava com um boneco negro Um garoto se aproximou e disse ldquoCredo que boneco feio parece vocecircrdquo se direcionando ao menino O menino deu de ombros e continuou a brincar e poucos minutos depois a menina que estava ao seu lado me perguntou ldquoPor que o boneco dele eacute pretinho Eacute muito feiordquo Claro que conversei com ela e com o outro menino em outro momento calmamente falando das diversas cores que as pessoas tecircm e que natildeo haacute isso de feio e bonito aproveitando para falar sobre diversidade e etc Mais para o final da conversa a menina me disse ldquoMeu pai eacute pretinho ele eacute bonitordquo Respondi a menina dizendo que a beleza natildeo estaacute na cor da pele do cabelo ou dos olhos A cena toda me fez refletir que a menina jaacute deve ter ouvido esse tipo de afirmaccedilatildeo errocircnea Jaacute comentei mais de uma vez sobre o preconceito de gecircnero ser muito forte mas e o racial algueacutem mais vivenciou esse tipo de preconceito durante esta residecircncia (Relato do residente T 2017)

Rosemberg (2014) chama a atenccedilatildeo para o tema da diversidade como uma

questatildeo circunscrita na histoacuteria da humanidade A diferenciaccedilatildeo entre os grupos

humanos ou pessoas com atributos que classificam e separam o ldquoeurdquo do ldquooutrordquo

parece constituir as diversas manifestaccedilotildees de culturas humanas Assim a autora

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desnaturaliza a identidade e a diferenccedila apontando o seu caraacuteter cultural social e

histoacuterico Contudo esse eacute um dos temas que tem chamado cada vez mais a atenccedilatildeo

de educadores desde a educaccedilatildeo infantil jaacute que muitas vezes as questotildees que

envolvem a diferenccedila e o diferente passam por processos discriminatoacuterios e

preconceituosos como apontado no relato do estudante ao observar as interaccedilotildees

entre as crianccedilas no que se refere ao quesito raccedilacor

Marinho e Martins (2016) em estudo sobre formaccedilatildeo de professoras que atuam

na educaccedilatildeo infantil constatam a escassez ou inexistecircncia de disciplinas na formaccedilatildeo

inicial de professores que abarquem as questotildees eacutetnico-raciais denunciando o natildeo

cumprimento das leis que entre outras prescriccedilotildees preveem que instituiccedilotildees de niacutevel

superior proporcionem aos futuros(as) professoresas a formaccedilatildeo adequada para

lidarem com as relaccedilotildees raciais multieacutetnica e multicultural da sociedade brasileira

Nesse sentido ao trazerem suas inquietaccedilotildees sobre como as crianccedilas lidam com as

diferenccedilas no contexto da escola os residentes se aproximam das discussotildees a

respeito dos processos discriminatoacuterios oportunizando momentos em que tais

temaacuteticas possam ser discutidas entre professores preceptores e colegas do

programa de estaacutegio

Aleacutem da questatildeo racial outros relatos nos datildeo conta de refletir e discutir sobre

as relaccedilotildees que envolvem as crianccedilas com deficiecircncia na escola

() O que me chamou atenccedilatildeo foi que na quarta (2204) H chegou na escola e decidiu mudar de lugar foi sentar bem ao lado do D (uma crianccedila que foi diagnosticada com autismo de ldquograu leverdquo segundo a professora) eu fiquei observando como seria a relaccedilatildeo deles H trouxe um caderno de desenho o abriu na mesa e dividiu metade da folha para ele e para D depois na hora de descer ele segurou a matildeo do D e ficou durante o almoccedilo todo cuidando de D o orientou a pegar a comida sentar comer devagar e quando natildeo quisesse mais deveria jogar a comida no lixo e durante todo o dia H permaneceu cuidando de D A professora achou estranho pois naquele dia ela natildeo havia chamado a atenccedilatildeo de H ateacute me falou ldquoEle deve estar aprontando e D eacute bobatildeo pode se machucarrdquo e decidiu intervir e pediu para que H mudasse de lugar e parasse de cuidar de (Relato do residente L 2015)

A partir da narrativa eacute possiacutevel refletir sobre o preparo dos professores para

lidar com as diferenccedilas individuais na educaccedilatildeo infantil A inclusatildeo escolar de crianccedilas

com deficiecircncia ocorre mediante poliacuteticas puacuteblicas de inclusatildeo contudo haacute uma

grande distacircncia entre a poliacutetica puacuteblica e a praacutetica pedagoacutegica nos contextos

escolares pois natildeo se aprofunda ldquoo debate sobre os meios os fins e as estrateacutegias

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para a implementaccedilatildeo da poliacutetica de ampliaccedilatildeo da rede de educaccedilatildeo infantilrdquo

(BRUNO 2008 p 59)

Outros registros que tratam da temaacutetica da inclusatildeo de crianccedilas com

deficiecircncia mostram o quanto a escola estaacute despreparada para lidar com essa

questatildeo Os relatos e inquietaccedilotildees dos estudantes nos possibilitam a identificaccedilatildeo de

processos discriminatoacuterios de resistecircncias e acomodaccedilotildees dos profissionais e do

distanciamento de uma praacutetica verdadeiramente inclusiva na esfera das praacuteticas

educativas cotidianas O que se percebe nas discussotildees sobre o assunto eacute que os

residentes enquanto futuros professores muito tecircm a aprender sobre a acolhida das

famiacutelias e das crianccedilas ldquodiferentesrdquo ou com deficiecircncia na constante reflexatildeo sobre o

comportamento atitudes e posturas do educador frente ao trabalho pedagoacutegico

Outras temaacuteticas tatildeo importantes como as que discutimos aqui tem sido objeto

de interesse dos estudantes em processo de imersatildeo nas escolas-campo Haacute uma

gama de registros sobre categorias que envolvem a crianccedila pequena nas atividades

do brincar a disciplina e a coerccedilatildeo dos educadores na tentativa de manter o controle

das crianccedilas e dos comportamentos considerados inadequados Muitos residentes se

surpreendem como essa coerccedilatildeo ocorre demasiadas vezes na escola e nas reuniotildees

de supervisatildeo eacute muito comum questionarem junto ao preceptor formas de

compreender por que algumas praacuteticas coercitivas satildeo tatildeo presentes na educaccedilatildeo

infantil

Consideraccedilotildees Finais

A experiecircncia de estaacutegio no Programa de Residecircncia Pedagoacutegica requer de

estudantes e professores uma atitude de intensa accedilatildeo e reflexatildeo Na perspectiva de

observaccedilatildeo participante eacute que a imersatildeo dos residentes na escola eacute orientada

embora natildeo haja uma intervenccedilatildeo direta planejada e sistemaacutetica sobre os modos de

fazer da escola e dos professores Possiacuteveis intervenccedilotildees sobre a escola suscitadas

pela presenccedila da universidade (de preceptores e residentes) satildeo uma contingecircncia

dos processos de formaccedilatildeo de condiccedilotildees e modos de seu desenvolvimento e eacute assim

que se define o lugar do residente e da preceptoria junto a escola o caraacuteter da

observaccedilatildeo participante a ser realizada durante o estaacutegio e sua conduccedilatildeo e discussatildeo

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no acircmbito escolar As posiccedilotildees dos residentes reeditam questotildees que mobilizam a

imersatildeo e reflexatildeo sobre o vivido como e quando participar O que como e quando

registrar sobre a observaccedilatildeo participante sobre o que se vivencia Como fazer uso

das ferramentas disponiacuteveis na escola e dos subsiacutedios teoacutericos oferecidos durante a

proacutepria residecircncia ou estudados no curso de pedagogia elaborando impressotildees sobre

o que descreve e refletindo sobre o que vive e elabora

A retomada dos escritos e reflexotildees dos estudantes participantes do Programa

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil nos trazem pistas relevantes para a

compreensatildeo natildeo somente dos seus processos formativos mas tambeacutem suscitam

atenccedilatildeo aos temas e questotildees emergentes do cotidiano das crianccedilas nas escolas de

Educaccedilatildeo Infantil Sabe-se que o processo de escrita eacute composto de idas e vindas

de avanccedilos e retrocessos de duacutevidas e certezas percebidas nos textos e contextos

apresentados pelos estudantes neste processo formativo especiacutefico

As postagens guardam caracteriacutesticas especiacuteficas correlatas ao vivido nas

praacuteticas de estaacutegio de acordo com as finalidades comunicativas e formativas do

caderno de campoblog e com especificidades ndash limites e possibilidades ndash que se

dimensionam nestas praacuteticas Os estudantes registram o que observam o que

vivenciam mas natildeo soacute Em muitos registros suas impressotildees (con)fundem-se com o

observado vatildeo aleacutem da descriccedilatildeo interpretando o visto o vivido e outras vezes para

alguns o registro se faz espaccedilo de recuperaccedilatildeo das proacuteprias vivecircncias e dos

elementos teoacutericos estudados

Nesta experiecircncia a liberdade na escolha e escrita dos temas dos cadernos de

campo tem permitido que o processo formativo de cada estudante aconteccedila de forma

uacutenica e original pois apesar de estarem imersos em ambientes semelhantes (em

alguns casos mesmas escolas-campo) e possuiacuterem referenciais teoacutericos semelhantes

(provenientes das unidades curriculares obrigatoacuterias e eletivas do Curso de

Pedagogia) os temas e questotildees que recebem a atenccedilatildeo de cada um satildeo distintos e

trabalhados teoricamente a partir das anguacutestias e inquietaccedilotildees individuais Entretanto

apesar das produccedilotildees escritas serem individuais ao serem publicizadas em reuniotildees

de orientaccedilatildeo ou ateacute no suporte virtual do blog elas podem ser compartilhadas e

tornam-se objeto comum de discussotildees e aprendizagens

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

Referecircncias bibliograacuteficas

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GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto LUGLI Rosaacuterio Silvana Genta Diaacutelogos pertinentes na formaccedilatildeo inicial e continuada de professores e gestores escolares A concepccedilatildeo

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MARQUES Danielle Vieira Aquino MUumlLLER Fernanda Experiecircncias com blog na pesquisa e na formaccedilatildeo inicial de professoras de educaccedilatildeo infantil ETD-Educaccedilatildeo Temaacutetica Digital v 14 n 1 p 43-61 2012

MARTINS E Famiacutelia e escola no contexto de um programa de residecircncia pedagoacutegica um estudo a partir do enfoque histoacuterico-cultural Educaccedilatildeo Sociedade amp Culturas v 37 p 89-107 2012

MEKSENAS Paulo Sociologia da educaccedilatildeo uma introduccedilatildeo ao estudo da escola no processo de transformaccedilatildeo social Satildeo Paulo Loyola 2002

MORETTI Vanessa Dias MARTINS Edna Atividade de ensino mediaccedilatildeo e aprendizagem da docecircncia na residecircncia pedagoacutegica uma anaacutelise a partir da teoria histoacuterico-cultural Revista Contrapontos v 15 n 3 p 394-411 2015

MORETTI Vanessa Dias A articulaccedilatildeo entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores que ensinam matemaacutetica o caso da Residecircncia Pedagoacutegica da Unifesp Revista Educaccedilatildeo Porto Alegre 2011 v 34 n 3 p 385-390 2011

NEVES Vanessa Ferraz Almeida CASTANHEIRA Maria Luacutecia GOUVEcircA Maria Cristina Soares O letramento e o brincar em processos de socializaccedilatildeo na educaccedilatildeo infantil brincadeiras diferentes Revista Brasileira de Educaccedilatildeo v 20 n 60 p 215-

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NOacuteVOA Antoacutenio Os professores e as Histoacuterias da Sua Vida In NOacuteVOA Antoacutenio (org) Vidas de Professores 2ordf ed Porto Porto Editora p 18-30 2000

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ROSEMBERG Fulvia Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees raciais a tensatildeo entre igualdade e diversidade Cadernos de Pesquisa v 44 n 153 p 742-759 2014

SILVA Adriana BUFALO Joseane O espaccedilo na pedagogia da educaccedilatildeo infantil faacutebula perversidade e possibilidade In Culturas infantis em creches e preacute-escolas estaacutegio e pesquisa Campinas SP Autores Associados 2011

TARDIF Maurice A profissionalizaccedilatildeo do ensino passados trinta anos dois passos para a frente trecircs para traacutes Educaccedilatildeo e Sociedade Campinas SP v34 n123 p

551-571 2013

VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

Correspondecircncia

Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Maria de Faacutetima Carvalho ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

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tambeacutem envolvem a orientaccedilatildeo sobre aspectos de ordem legal como por exemplo

jamais assumir sozinho a sala de aula em que estatildeo fazendo a residecircncia

Como unidade curricular obrigatoacuteria a RPEI prevecirc em sua ementa que os

alunos deveratildeo construir conhecimentos a partir de identificaccedilatildeo e anaacutelise de relaccedilotildees

e praacuteticas que perfazem o dia a dia da escola de Educaccedilatildeo Infantil atentando para o

seu caraacuteter educacional e pedagoacutegico assim como para os processos de gestatildeo

institucional Esse processo de construccedilatildeo de conhecimentos sobre o que vivenciam

eacute mediado pelo uso de instrumentos de pesquisa qualitativa em educaccedilatildeo

Concomitantemente enquanto participam do dia a dia na escola planejam e elaboram

planos de accedilatildeo pedagoacutegica em colaboraccedilatildeo com os supervisores do estaacutegio e

educadores das escolas-campo

No processo de imersatildeo espera-se que o residente natildeo apenas observe mas

possa dar apoio ao professor de classe em suas praacuteticas pedagoacutegicas cotidianas e na

sua relaccedilatildeo com as crianccedilas com idade entre 0 e 5 anos Cotidianamente tais

residentes devem ser encorajados a atuarem com pequenas accedilotildees junto agraves crianccedilas

com a orientaccedilatildeo dos professores que o acompanham Durante quatro semanas no

processo intenso de imersatildeo na realidade da escola os residentes devem construir

registros diaacuterios das experiecircncias vividas em campo aleacutem de outros materiais que

tecircm origem na observaccedilatildeo participativa do dia a dia escolar e serviratildeo de avaliaccedilatildeo

final tendo elaboraccedilatildeo orientada e aferida pelo professor preceptor da Universidade

Dessa perspectiva o residente tambeacutem eacute solicitado a refletir sobre sua proacutepria

atuaccedilatildeo participando ativamente de um processo de contiacutenua auto avaliaccedilatildeo

Eacute objetivo do Programa em todas as suas modalidades que os graduandos

possam retomar de forma reflexiva o que vivenciam na escola Na modalidade de

Educaccedilatildeo Infantil eacute esperado que o estudante residente possa desenvolver anaacutelises

criacutetico-reflexivas acerca da instituiccedilatildeo no qual estaacute imerso no que se refere agrave interaccedilatildeo

com as famiacutelias e agrave comunidade em seu entorno assim como sobre as praacuteticas

pedagoacutegicas realizadas nesses locais a partir do reconhecimento da crianccedila como

sujeito de direito e de toda a legislaccedilatildeo que diz respeito a essa modalidade de ensino

De acordo com o cronograma da Unidade Curricular Residecircncia Pedagoacutegica

em Educaccedilatildeo Infantil os estudantes devem ir durante quatro dias da semana para a

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escola e um dia para a Universidade para supervisatildeo com o preceptor que eacute um

docente da Universidade Na escola cumprem o horaacuterio da turma que acompanham

em turno que pode ser matutino vespertino ou intermediaacuterio Natildeo satildeo toleradas faltas

ou atrasos sem justificativa meacutedica objetivando-se desta forma colocar os alunos

diante da responsabilidade do compromisso profissional assumido perante a escola

Durante as duas primeiras semanas de imersatildeo os estudantes satildeo orientados

a descrever no diaacuterio de campo o que observam e suas impressotildees sobre a escola

as relaccedilotildees entre professorcrianccedilas crianccedilacrianccedila escolacomunidade

famiacuteliasescola professorprofessor professorgestatildeo e praacuteticas educativas do

cotidiano que satildeo observadas mais atentamente Neste primeiro momento aleacutem da

cobranccedila para que o aluno escreva sobre suas vivecircncias o preceptor busca ajudaacute-lo

na construccedilatildeo dos registros do caderno de campo assinalando sobre as posturas de

descriccedilatildeo e de reflexatildeo na elaboraccedilatildeo sobre suas impressotildees sobre aquilo que eacute

observado

Antes de serem executados os planos pedagoacutegicos de cada estudante satildeo

apresentados para os professores formadores e coordenador nas escolas durante

reuniatildeo realizada na ldquoHora Atividaderdquo com a participaccedilatildeo do professor preceptor Este

tem se constituiacutedo um momento iacutempar de aprendizagem para todos os envolvidos jaacute

que nesta ocasiatildeo os estudantes compartilham seus conhecimentos suas

experiecircncias expectativas e apreensotildees e onde explicitam-se possibilidades de

articulaccedilatildeo escola-universidade no acircmbito da formaccedilatildeo de professores Eacute na uacuteltima

semana de imersatildeo que os estudantes colocam seus planos de accedilatildeo pedagoacutegica em

praacutetica nas salas em que estatildeo imersos fechando o ciclo previsto pelo estaacutegio

Metodologia analisando as temaacuteticas do caderno de campo online (Blog)

Alguns grupos de residentes da RPEI conforme opccedilatildeo dos professores

preceptores usam um blog para a construccedilatildeo online de um caderno de campo que

integra a elaboraccedilatildeo de seus registros sobre a imersatildeo na escola Esses registros ndash

que chamamos de postagens aleacutem de possibilitar um olhar mais apurado sobre as

praacuteticas cotidianas podem contribuir para a orientaccedilatildeo e a construccedilatildeo do Plano de

Accedilatildeo Pedagoacutegica de cada residente e posteriormente para a escrita de um relatoacuterio

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final de estaacutegio pelo grupo Eacute sobre os registros do blog que incidiraacute nossa anaacutelise

considerando para tanto inquietaccedilotildees observaccedilotildees e reflexotildees registradas pelos

residentes nos anos de 2015 2016 e 2017

O blog da residecircncia ou diaacuterio de campo online consiste em uma ferramenta

virtual na qual satildeo realizados os registros de observaccedilotildees e experiecircncias significativas

vividas pelos residentes cotidianamente na escola Destaca-se que tal ferramenta eacute

de acesso restrito e apenas um uacutenico grupo de alunos e professores preceptores da

Universidade podem participar em cada escola acompanhada Deste modo nem os

professores ou quaisquer pessoas das escolas-campo podem acessar tal instrumento

O blog eacute construiacutedo pelo professor preceptor a cada novo grupo de residentes

assegurando o sigilo das informaccedilotildees registradas A ferramenta possibilita a

construccedilatildeo coletiva de diaacutelogos sobre questotildees observadas e a mediaccedilatildeo dos

conhecimentos dos residentes pelos seus supervisores Assim os estudantes podem

realizar trocas sobre suas vivecircncias muitas vezes similares agraves que ocorrem na mesma

instituiccedilatildeo ainda que estejam em turmas de idades diferentes Permite tambeacutem que

preceptores acompanhem diariamente seus residentes respondendo as indagaccedilotildees

e inquietaccedilotildees do grupo que participa do dia-a-dia na escola

Aleacutem de cumprir todos os objetivos de um caderno de campo comum o blog

permite ao preceptor mesmo agrave distacircncia o acompanhamento contiacutenuo do grupo de

estudantes o que lhe permite planejar as atividades semanais de supervisatildeo de forma

a responder as demandas dos alunos e esses uacuteltimos de compartilharem seus

diferentes pontos de vistas e as accedilotildees desenvolvidas na escola Assim no contexto

da residecircncia pedagoacutegica o blog ou caderno de campo online eacute o espaccedilomomento

de realizaccedilatildeo dos registros de observaccedilotildees e experiecircncias significativas vividas

cotidianamente na escola de educaccedilatildeo infantil e de acompanhamento e

problematizaccedilatildeo dessas vivecircncias pelos preceptores

Nesse caminho assinala-se a contribuiccedilatildeo de Vygotsky (1981) quando aponta

que as relaccedilotildees humanas satildeo sempre mediadas pelo meio social e pelos instrumentos

e signos que fazem parte das relaccedilotildees e dos contextos em que o homem estaacute inserido

Desse modo

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A atividade praacutetica do homem portanto se faz duplamente mediada de uma parte estaacute mediada pelas ferramentas no sentido literal da palavra e de outra parte mediada pelas ferramentas no sentido figurado pelas ferramentas do pensamento pelos meios com a ajuda dos quais se realiza a operaccedilatildeo intelectual ou seja mediada com a ajuda das palavras (VYGOTSKI 19302006a p 165)

Nessa direccedilatildeo conveacutem destacar a importacircncia do blog como instrumento social

representativo da incorporaccedilatildeo da tecnologia ao dia a dia dos estudantes e da

consideraccedilatildeo da mediaccedilatildeo tecnoloacutegica em processos de aprendizagem e

desenvolvimento dos graduandos

Diferente de outras formas de relacionamento virtual (e-mail chat instant

messages listas de discussatildeo etc) e de ferramentas virtuais convencionais ndash como

os sites ndash o blog caracteriza-se pela facilidade de sua criaccedilatildeo e manutenccedilatildeo o que eacute

definido pela organizaccedilatildeo automaacutetica das mensagens ndash posts ndash pelo sistema

dinamizando seu uso e favorecendo a construccedilatildeo de diaacuterios coletivos mantidos por

vaacuterios usuaacuterios Tais caracteriacutesticas favorecem o uso do blog em processos de ensino-

aprendizagem tendo em vista a interaccedilatildeo a troca o diaacutelogo como forma de partilha e

construccedilatildeo de conhecimentos (MARQUES MULLER 2012)

O blog permite portanto o compartilhamento de informaccedilotildees e a interaccedilatildeo

entre estudantes do mesmo grupo e o mesmo preceptor em uma mesma escola

Todos podem ler e comentar as postagens funcionando como um ponto de encontro

entre alunos e preceptores Assim nossa atenccedilatildeo agraves postagens dos estudantes no

blog eacute dirigida pelo objetivo de dar visibilidade a dimensatildeo social das praacuteticas de

registro do observadovivido nos processos formativos que emergem na experiecircncia

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil Assumimos o caraacuteter histoacuterico-

cultural da pesquisa do meacutetodo do objeto de estudo e do proacuteprio conhecimento como

construccedilatildeo que se realiza entre sujeitos (FREITAS 2009) Dessa forma acredita-se

que o momento de elaboraccedilatildeo do vivido ndash o registro no caderno de campoblog ndash

deflagra no estudante a necessidade de reflexatildeo sobre os processos de ensino-

aprendizagem em curso no acircmbito do estaacutegio-residecircncia pedagoacutegica

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Registros no caderno de campo online o olhar do residente sobre a escola de

educaccedilatildeo infantil

Nos primeiros dias de imersatildeo na escola os residentes satildeo orientados a

realizar uma observaccedilatildeo atenta dos espaccedilos da instituiccedilatildeo A partir da leitura do texto

de Silva e Bufalo (2011) sobre culturas escolares os residentes descrevem em seus

primeiros registros detalhes fiacutesicos sobre a escola Muitos acabam desenhando a

planta baixa ou tirando fotos de salas de aulas parques e paacutetios e compartilhando no

caderno de campo online (blog) para comeccedilarem a pensar sobre o contexto e os

espaccedilos que podem favorecer a aprendizagem e o desenvolvimento da crianccedila

pequena como descrito no excerto abaixo

Uma coisa que me chamou atenccedilatildeo foi que natildeo possuem um espaccedilo para atividade fiacutesica essas satildeo realizadas no paacutetio que eacute proacuteximo as salas o barulho acaba atrapalhando os demais O parque estaacute interditado por ordem da diretora ou seja natildeo possuem lugar para brincar O dia das crianccedilas foi pautado em ficar sentado e quieto vendo um filme que a maioria jaacute tinha assistido (Relato da residente N 2017)

Formas de organizaccedilatildeo de espaccedilos e tempos remetem agrave organizaccedilatildeo da rotina

Sobre esse tema grande quantidade de postagens textos diz respeito a como as

atividades diaacuterias satildeo organizadas na escola Em alguns registros como o

apresentado a seguir aparece a problematizaccedilatildeo da forma de organizaccedilatildeo das

atividades

730 (15min) - a professora colocou o cabeccedilalho na lousa com a data e fez a contagem coletiva das crianccedilas 745 (45min) - a professora retomou o que eles haviam aprendido sobre os iacutendios entregou massinha e os orientou a modelar utensiacutelios indiacutegenas 830 (35min) - pintura de desenho xerocado que seraacute colado na capa do caderno de atividades 905 (25min) - brincadeira livre no paacutetio interno no brinquedatildeo que fica no final da escadarampa sup2940 (30min) - brincadeira em sala Gato mia 1010 (ateacute as crianccedilas irem embora) - a professora entregou uma folha com a letra da canccedilatildeo 1 2 3 indiozinhos cantou a muacutesica com eles sentados em seus lugares pediu para eles circularem as letras A e I e depois pintar a ilustraccedilatildeo () (Relato da residente J 2015)

A rotina observada e registrada pela residente configura-se como um dos

aspectos mais relevantes na vida da crianccedila que se encontra na escola de Educaccedilatildeo

Infantil Barbosa (2006) aponta que esse eacute um dos elementos que integram as praacuteticas

educativas que devem ser observadas e planejadas com regularidade objetivando a

operacionalizaccedilatildeo do cotidiano da escola de maneira que possa contribuir na

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constituiccedilatildeo da subjetividade dos atores escolares Desse modo pensar e

compreender a rotina como um fator presente e essencial na educaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute um passo promissor para que o residente acompanhe como as atividades

cotidianas da escola se materializam e datildeo base para a organizaccedilatildeo da praacutetica

pedagoacutegica devendo estar presente no desenvolvimento curricular

O planejamento das atividades na educaccedilatildeo infantil tem estreita ligaccedilatildeo com a

rotina Ao observar e refletir sobre a vida e as experiecircncias das crianccedilas na escola os

residentes satildeo remetidos a memoacuteria agrave lembranccedila do que tambeacutem foi um dia vivido

por eles em suas experiecircncias escolares Como apontado por Meksenas (2002)

ldquonunca somos testemunhas objetivas observando objetos e sim sujeitos observando

outros sujeitosrdquo (p 116)

Estive tentando lembrar nas uacuteltimas semanas o que eu fazia na minha preacute-escola Eu comecei no maternal com 3 anos ()Tenho vagas lembranccedilas de duas salas de aula uma do preacute III e a outra acho que era do preacute I Era uma escola particular dessas pequenas de bairro Lembro que a turma natildeo era tatildeo numerosa quanto essa que estou vendo na residecircncia mas a sala tinha uma organizaccedilatildeo parecida eram mesas e cadeiras enfileiradas nas duas () Eu estava com 5 anos Lembro que a gente tinha uma apostila no preacute I eu gostava de terminar tudo raacutepido para dormir Depois a professora comeccedilou a me dar gibi para eu ficar folheando Tenho na minha memoacuteria que as coisas que a gente fazia na escola eram chatas e muito infantis bobas demais Agora eu penso talvez as professoras ficassem me ocupando com massinha e pinturas todo dia tambeacutem como eu vejo na residecircncia e por isso eu achava muito chato O que seraacute que essas crianccedilas pensam disso O que seraacute que elas acham mais legal na escola Eu vejo que elas gostam muito de fazer liccedilatildeo essas de folhinha que a professora daacute e todos os dias elas perguntam Mas eu natildeo me conformo como elas acham isso tatildeo legal (Relato da Residente F 2017)

Sabemos que a memoacuteria eacute mediada pelo signo pelas interaccedilotildees sociais pelo

outro Braga (1997) dirige nosso olhar para o ldquoprocesso de apropriaccedilatildeo das formas

culturais de interaccedilatildeo que caracterizam a memoacuteria humanardquo Para a autora ldquoa

memoacuteria do homem soacute se configura no movimento discursivo e coletivo por sua

natureza cultural e simboacutelicardquo No registro acima o observado mobiliza as lembranccedilas

da residente aquilo que foi tambeacutem vivido na escola de sua infacircncia Entre lembranccedilas

e interrogaccedilotildees emergem as construccedilotildees formativas em um processo dinacircmico ndash

interativo cultural e simboacutelico Processo que potildeem em relaccedilatildeo vivecircncias atuais e

passadas que invocam sentidos e significados atribuiacutedos ao vivido que ocorre nas

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contradiccedilotildees entre aquilo que eacute rememorado pela estudante e o que efetivamente eacute

observado nas relaccedilotildees estabelecidas no contato com o cotidiano da escola

Aleacutem da rotina e da organizaccedilatildeo de tempos e espaccedilos em sua relaccedilatildeo com as

praacuteticas pedagoacutegicas os relatos dos estudantes se reportam agraves diferentes dimensotildees

da gestatildeo escolar Os registros destacam suas observaccedilotildees nas H A (hora atividade)

ou reuniotildees que eventualmente participam e com frequecircncia observam a postura da

equipe em relaccedilatildeo a presenccedila do residente Em seus relatos questionam o caraacuteter

da gestatildeo a qualidade da relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo entre os professores as discussotildees

que remetem a construccedilatildeo e discussatildeo do projeto poliacutetico pedagoacutegico e os papeis

desempenhados pelos diferentes educadores na construccedilatildeo do trabalho de educaccedilatildeo

da infacircncia

Completamos nesta semana 4 dias de participaccedilatildeo nas Horas Atividades (HA) destinada agrave formaccedilatildeo docente organizaccedilatildeo dos registros e planejamento das atividades pedagoacutegicas O que pude por meio da observaccedilatildeo constatar que o papel do Coordenador Pedagoacutegico que eacute fundamental nesse momento de formaccedilatildeo pois eacute ele o mediador desse processo acaba por se tornar distante e sem intervenccedilotildees no que adentra a orientaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico docente (Relato da estudante M 2015)

Na experiecircncia cotidiana de imersatildeo na escola eacute possiacutevel verificar as tensotildees

vivenciadas entre os professores e o papel da coordenaccedilatildeo pedagoacutegica A teoria

discutida na universidade pelos residentes assinala a importacircncia do papel do

coordenador pedagoacutegico na educaccedilatildeo infantil na praacutetica o residente percebe o quanto

a sua mediaccedilatildeo eacute fundamental na organizaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico e por outro

lado o quanto a sua ausecircncia pode interferir de forma negativa na orientaccedilatildeo das

atividades dos professores

Outra personagem que acaba sendo central na gestatildeo escolar eacute a direccedilatildeo que

nessa experiecircncia do residente tambeacutem eacute observada de forma criacutetica

A figura da diretora na escola foi a que mais me chamou a atenccedilatildeo ()imaginem que em nenhum momento percebi qualquer aproximaccedilatildeo da diretora com as crianccedilas em vaacuterios momentos acreditei que ela fosse algum teacutecnico administrativo pois apesar de estar no topo da piracircmide a referecircncia da gestatildeo a mesma se restringia a secretaria e natildeo se relacionava natildeo nos conhecia nem procurava nos conhecer Passou diversas vezes por grupos de crianccedilas e em nenhuma das vezes sequer olhou para elas Nunca apareceu em uma HA nunca percebi o seu contato com os professores e por diversas vezes me perguntei como eles se falavam qual era o seu relacionamento (Relato da residente B 2015)

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Sobre esse assunto estudos como os de Paro (2005) e Castro (2009) tem

assinalado o papel da gestatildeo e da administraccedilatildeo escolar como alicerce fundamental

nos processos de transformaccedilatildeo da escola puacuteblica brasileira Tais trabalhos tecircm

apontado a centralidade da direccedilatildeo escolar nas questotildees que envolvem os processos

de ensino e aprendizagem e as relaccedilotildees humanas presentes na equipe de trabalho

para aleacutem dos trabalhos administrativos e burocraacuteticos Natildeo eacute objetivo deste trabalho

fazer uma anaacutelise do papel do diretor na escola de educaccedilatildeo infantil mas cabe

assinalar que os estudantes residentes apontam o tema em seus registros e atentos

agraves demandas relativas ao papel do diretor indagam se como e quanto as lideranccedilas

escolares tecircm se envolvido com o trabalho administrativo dispendendo tempo para

um olhar mais atento agraves relaccedilotildees entre os professoresalunos funcionaacuterios da escola

observada

Em relaccedilatildeo agraves interaccedilotildees humanas outros registros dos residentes nos

remetem agraves maneiras como a escola lida com as famiacutelias das crianccedilas matriculadas

nas escolas Tais relatos natildeo satildeo tatildeo frequentes possivelmente porque essa eacute uma

relaccedilatildeo que se caracteriza pela assimetria de poderes e eacute pouco valorizada no dia a

dia escolar Os registros evocam situaccedilotildees vividas comentaacuterios ouvidos e

principalmente a necessidade de mudanccedila dos modos de conceber a crianccedila e suas

famiacutelias e de interagir com elas

A relaccedilatildeo entre professor e famiacutelia eacute mais uma dessas conexotildees que fazemos pela vida Por um lado haacute um profissional uma pessoa que estudou e eacute especialista em cuidar de crianccedilas Por outro famiacutelias que dificilmente conseguimos de fato perceber como satildeo suas estruturadas Famiacutelia hoje eacute coisa difiacutecil de entender Eacute matildee que mora sozinha com o filho eacute pais que trabalham e deixam os filhos na semana com tios avoacutes Eacute matildee solteira Eacute filho criado por pai viuacutevo Eacute histoacuteria que natildeo acaba mais Na hora da saiacuteda vamos conhecendo um pouquinho da estrutura familiar de cada crianccedila tentando perceber como se daacute a relaccedilatildeo entre a famiacutelia e a escola mas devemos ter um pouco de cuidado com esse processo (Relato do estudante J 2015)

Aleacutem da residente ter um olhar para os diferentes tipos de arranjos familiares

tambeacutem busca compreender a especificidade de cada famiacutelia considerando o papel

da mulher e de matildee trabalhadora com filhos na escola puacuteblica

(hellip) Veja esses apontamentos uma menina na sala estaacute com piolho a professora disse que jaacute alertou a matildee mas como eacute matildee solteira soacute pode cuidar da filha no domingo O outro menino que natildeo se interessa pelas atividades e responde a educadora tambeacutem teve a matildee notificada mas como

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a mesma eacute separada do marido natildeo faz nada O fato da mulher trabalhar a semana e ter folga aos domingos natildeo significa que ela seja uma maacute matildee pelo contraacuterio significa que ela rala muito para colocar comida no prato A presenccedila ou natildeo de um homem natildeo condiciona nada A escola natildeo pode ser um ambiente de roacutetulos ela deve estar aberta agraves diferenccedilas acolhendo e buscando outras maneiras e formas de aproximaccedilatildeo com a famiacutelia compreendendo a responsabilidade compartilhada que carregam (Registro da residente B 2015)

Os relatos demonstram natildeo soacute o quanto estatildeo atentos para como a escola lida

com as relaccedilotildees familiares mas sobretudo assinalam como tecircm se configurado as

formaccedilotildees das famiacutelias na atualidade Um estudo de Martins (2012) aponta o quanto

a experiecircncia de residecircncia pedagoacutegica possibilita aos estudantes um contato mais

expressivo com a realidade da escola puacuteblica de periferia urbana Aleacutem de observar

as relaccedilotildees institucionais o residente pode ser sensibilizado frente agraves dificuldades

vividas pelas famiacutelias e tendem a perceber o preconceito em relaccedilatildeo aos vaacuterios

arranjos familiares vivenciados pelas crianccedilas mais pobres e como a escolarizaccedilatildeo

dos pais pode afetar a vida dos filhos Os registros dos residentes demonstram como

ldquoos contextos de vida das crianccedilas que frequentam a escola puacuteblica de periferia

passam a ser compreendidos de uma forma concreta e as relaccedilotildees do espaccedilo familiar

com o espaccedilo escolar passam a ter uma conexatildeo cotidianardquo (MARTINS 2012 p 95)

Outra temaacutetica recorrente nos registros dos estudantes diz respeito ao processo

de escolarizaccedilatildeo das praacuteticas da educaccedilatildeo da infacircncia Tal perspectiva surge quando

os residentes referem aos usos dos brinquedos e agraves brincadeiras agrave presenccedila da

leitura e contaccedilatildeo de histoacuterias aos modos de introduccedilatildeo do desenho ao uso de novas

tecnologias e aos modos de avaliar agraves crianccedilas Tal perspectiva escolarizante emerge

em oposiccedilatildeo ao luacutedico como princiacutepio e forma de organizaccedilatildeo das praacuteticas de

educaccedilatildeo junto agraves crianccedilas pequenas e algumas vezes a ela ainda se articula a

preocupaccedilatildeo em disciplinar as vivecircncias escolares sondagens filas broncas e

silecircncios coexistem com desenhos Tv computadores e brincadeiras Os registros nos

dizem de uma escola que hesita entre coibir e promover a expressatildeo das muitas

linguagens da imaginaccedilatildeo e movimento das crianccedilas

Na semana de 2310 a 2710 e como previsto na reuniatildeo de pais a professora realizou a sondagem com as crianccedilas Teoricamente sei como funciona o procedimento mas me questiono se deve ser realizada na Ed Infantil Tambeacutem me pergunto se a sondagem vai muito aleacutem do conhecimento das crianccedilas Por exemplo algumas escrevem o proacuteprio nome

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e algumas palavras mais comuns a elas outras ainda nem reconhecem as letras do alfabeto A sondagem feita abarcou o nome palavras simples um pouco mais complexas e uma frase inteira A minha duacutevida eacute se a sondagem que vai muito aleacutem dos conhecimentos da sala eacute comum e necessaacuteria ainda mais na Ed Infantil (Relato do residente N 2017)

O debate em torno das questotildees que envolvem a escolarizaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute bastante antigo e recorrente Pesquisas como as de Neves Castanheira

e Gouveia (2015) assinalam a partir de autores que estudaram essa temaacutetica como

a perspectiva escolarizante de trabalho com a crianccedila pequena traz seacuterias implicaccedilotildees

para o desenvolvimento infantil justamente porque rompe com as formas como elas

ldquointeragem com a escrita fora da escola destituindo-a de significados pessoais e

sociais e dificulta portanto que as atividades desenvolvidas no espaccedilo escolar

envolvam a ludicidade caracteriacutestica fundamental dessa fase do desenvolvimentordquo

(p 217)

Os residentes parecem estar muito atentos a essas questotildees porque participam

de discussotildees sistemaacuteticas sobre o assunto tanto nas aulas teoacutericas na Universidade

quanto nas reuniotildees de orientaccedilatildeo com os preceptores do Programa de Residecircncia

Muitos estudantes satildeo levados a refletir sobre o assunto logo nos primeiros dias de

imersatildeo na escola

Resolvi mudar o formato do meu relato referente agrave imersatildeo inicial Pois passei por uma situaccedilatildeo em sala que me provocou tal accedilatildeo Devido agrave imposiccedilatildeo de escolarizaccedilatildeo percebida na turma na qual acompanho Onde hoje me emocionei com o choro insistente do aluno BG com as matildeos estremecidas na tentativa de segurar o laacutepis para ldquofazer liccedilatildeordquo (Relato da Residente M 2015)

A partir do relato da residente percebe-se o quanto a questatildeo eacute relevante para

o campo da educaccedilatildeo infantil e da formaccedilatildeo de professores Nas observaccedilotildees e

relatos dos cadernos de campo natildeo eacute incomum aparecerem longas narrativas sobre

os equiacutevocos que ocorrem nas praacuteticas pedagoacutegicas que envolvem a alfabetizaccedilatildeo e

letramento das crianccedilas pequenas Consideramos que questotildees como essas quando

problematizadas pelos estudantes nos horaacuterios de preceptoria ou mesmo nas

discussotildees com professores especialistas sobre o tema tendem a aproximaacute-los de

uma futura praacutetica profissional em que o trabalho com o desenvolvimento da escrita

seja realizado de forma a respeitar a infacircncia natildeo negando agrave crianccedila o seu direito ao

luacutedico mas tratando a apresentaccedilatildeo do mundo letrado como mais um momento

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prazeroso de aprendizagens Tal reflexatildeo eacute importante para os futuros professores

para que busquem compreender como inserir as crianccedilas no mundo letrado de

maneira que possam romper com a dicotomia entre o brincar e a leituraescrita

tomando como referecircncia o significado dessas accedilotildees para a crianccedila possibilitando a

conduccedilatildeo dos trabalhos na educaccedilatildeo infantil que tornem possiacutevel o brincar ldquoletrando

e alfabetizandordquo (NEVES CASTANHEIRA E GOUVEIA 2015)

Outra temaacutetica que aparece num nuacutemero expressivo de postagens diz respeito

ao olhar do residente para as praacuteticas educativas e as interaccedilotildees que ocorrem na

escola com relaccedilatildeo agrave inclusatildeo escolar das crianccedilas percebidas como ldquodiferentesrdquo

Destaca-se nesta temaacutetica observaccedilotildees a respeito de diferenccedilas de religiatildeo gecircnero

raccedilacor e tambeacutem aquelas relacionadas agrave deficiecircncia Haacute descriccedilotildees sobre como as

crianccedilas lidam com as diferenccedilas e as formas como os professores trabalham com

aquelas que possuem alguma dificuldade Algumas postagens ressaltam a

necessidade de formaccedilatildeo inicial e continuada dos educadores para lidarem com a

diversidade na escola

Pela primeira vez vivenciei preconceito racial de uma crianccedila com outra Nos momentos em que a profa distribui lego para as crianccedilas ela daacute tambeacutem um bonequinho para cada crianccedila Tem bonecos adultos crianccedilas homens mulheres e de diversas cores Os bonecos satildeo dados aleatoriamente ou escolhidos pela crianccedila conforme a professora passa de mesa em mesa Neste dia um menino negro estava com um boneco negro Um garoto se aproximou e disse ldquoCredo que boneco feio parece vocecircrdquo se direcionando ao menino O menino deu de ombros e continuou a brincar e poucos minutos depois a menina que estava ao seu lado me perguntou ldquoPor que o boneco dele eacute pretinho Eacute muito feiordquo Claro que conversei com ela e com o outro menino em outro momento calmamente falando das diversas cores que as pessoas tecircm e que natildeo haacute isso de feio e bonito aproveitando para falar sobre diversidade e etc Mais para o final da conversa a menina me disse ldquoMeu pai eacute pretinho ele eacute bonitordquo Respondi a menina dizendo que a beleza natildeo estaacute na cor da pele do cabelo ou dos olhos A cena toda me fez refletir que a menina jaacute deve ter ouvido esse tipo de afirmaccedilatildeo errocircnea Jaacute comentei mais de uma vez sobre o preconceito de gecircnero ser muito forte mas e o racial algueacutem mais vivenciou esse tipo de preconceito durante esta residecircncia (Relato do residente T 2017)

Rosemberg (2014) chama a atenccedilatildeo para o tema da diversidade como uma

questatildeo circunscrita na histoacuteria da humanidade A diferenciaccedilatildeo entre os grupos

humanos ou pessoas com atributos que classificam e separam o ldquoeurdquo do ldquooutrordquo

parece constituir as diversas manifestaccedilotildees de culturas humanas Assim a autora

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desnaturaliza a identidade e a diferenccedila apontando o seu caraacuteter cultural social e

histoacuterico Contudo esse eacute um dos temas que tem chamado cada vez mais a atenccedilatildeo

de educadores desde a educaccedilatildeo infantil jaacute que muitas vezes as questotildees que

envolvem a diferenccedila e o diferente passam por processos discriminatoacuterios e

preconceituosos como apontado no relato do estudante ao observar as interaccedilotildees

entre as crianccedilas no que se refere ao quesito raccedilacor

Marinho e Martins (2016) em estudo sobre formaccedilatildeo de professoras que atuam

na educaccedilatildeo infantil constatam a escassez ou inexistecircncia de disciplinas na formaccedilatildeo

inicial de professores que abarquem as questotildees eacutetnico-raciais denunciando o natildeo

cumprimento das leis que entre outras prescriccedilotildees preveem que instituiccedilotildees de niacutevel

superior proporcionem aos futuros(as) professoresas a formaccedilatildeo adequada para

lidarem com as relaccedilotildees raciais multieacutetnica e multicultural da sociedade brasileira

Nesse sentido ao trazerem suas inquietaccedilotildees sobre como as crianccedilas lidam com as

diferenccedilas no contexto da escola os residentes se aproximam das discussotildees a

respeito dos processos discriminatoacuterios oportunizando momentos em que tais

temaacuteticas possam ser discutidas entre professores preceptores e colegas do

programa de estaacutegio

Aleacutem da questatildeo racial outros relatos nos datildeo conta de refletir e discutir sobre

as relaccedilotildees que envolvem as crianccedilas com deficiecircncia na escola

() O que me chamou atenccedilatildeo foi que na quarta (2204) H chegou na escola e decidiu mudar de lugar foi sentar bem ao lado do D (uma crianccedila que foi diagnosticada com autismo de ldquograu leverdquo segundo a professora) eu fiquei observando como seria a relaccedilatildeo deles H trouxe um caderno de desenho o abriu na mesa e dividiu metade da folha para ele e para D depois na hora de descer ele segurou a matildeo do D e ficou durante o almoccedilo todo cuidando de D o orientou a pegar a comida sentar comer devagar e quando natildeo quisesse mais deveria jogar a comida no lixo e durante todo o dia H permaneceu cuidando de D A professora achou estranho pois naquele dia ela natildeo havia chamado a atenccedilatildeo de H ateacute me falou ldquoEle deve estar aprontando e D eacute bobatildeo pode se machucarrdquo e decidiu intervir e pediu para que H mudasse de lugar e parasse de cuidar de (Relato do residente L 2015)

A partir da narrativa eacute possiacutevel refletir sobre o preparo dos professores para

lidar com as diferenccedilas individuais na educaccedilatildeo infantil A inclusatildeo escolar de crianccedilas

com deficiecircncia ocorre mediante poliacuteticas puacuteblicas de inclusatildeo contudo haacute uma

grande distacircncia entre a poliacutetica puacuteblica e a praacutetica pedagoacutegica nos contextos

escolares pois natildeo se aprofunda ldquoo debate sobre os meios os fins e as estrateacutegias

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para a implementaccedilatildeo da poliacutetica de ampliaccedilatildeo da rede de educaccedilatildeo infantilrdquo

(BRUNO 2008 p 59)

Outros registros que tratam da temaacutetica da inclusatildeo de crianccedilas com

deficiecircncia mostram o quanto a escola estaacute despreparada para lidar com essa

questatildeo Os relatos e inquietaccedilotildees dos estudantes nos possibilitam a identificaccedilatildeo de

processos discriminatoacuterios de resistecircncias e acomodaccedilotildees dos profissionais e do

distanciamento de uma praacutetica verdadeiramente inclusiva na esfera das praacuteticas

educativas cotidianas O que se percebe nas discussotildees sobre o assunto eacute que os

residentes enquanto futuros professores muito tecircm a aprender sobre a acolhida das

famiacutelias e das crianccedilas ldquodiferentesrdquo ou com deficiecircncia na constante reflexatildeo sobre o

comportamento atitudes e posturas do educador frente ao trabalho pedagoacutegico

Outras temaacuteticas tatildeo importantes como as que discutimos aqui tem sido objeto

de interesse dos estudantes em processo de imersatildeo nas escolas-campo Haacute uma

gama de registros sobre categorias que envolvem a crianccedila pequena nas atividades

do brincar a disciplina e a coerccedilatildeo dos educadores na tentativa de manter o controle

das crianccedilas e dos comportamentos considerados inadequados Muitos residentes se

surpreendem como essa coerccedilatildeo ocorre demasiadas vezes na escola e nas reuniotildees

de supervisatildeo eacute muito comum questionarem junto ao preceptor formas de

compreender por que algumas praacuteticas coercitivas satildeo tatildeo presentes na educaccedilatildeo

infantil

Consideraccedilotildees Finais

A experiecircncia de estaacutegio no Programa de Residecircncia Pedagoacutegica requer de

estudantes e professores uma atitude de intensa accedilatildeo e reflexatildeo Na perspectiva de

observaccedilatildeo participante eacute que a imersatildeo dos residentes na escola eacute orientada

embora natildeo haja uma intervenccedilatildeo direta planejada e sistemaacutetica sobre os modos de

fazer da escola e dos professores Possiacuteveis intervenccedilotildees sobre a escola suscitadas

pela presenccedila da universidade (de preceptores e residentes) satildeo uma contingecircncia

dos processos de formaccedilatildeo de condiccedilotildees e modos de seu desenvolvimento e eacute assim

que se define o lugar do residente e da preceptoria junto a escola o caraacuteter da

observaccedilatildeo participante a ser realizada durante o estaacutegio e sua conduccedilatildeo e discussatildeo

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no acircmbito escolar As posiccedilotildees dos residentes reeditam questotildees que mobilizam a

imersatildeo e reflexatildeo sobre o vivido como e quando participar O que como e quando

registrar sobre a observaccedilatildeo participante sobre o que se vivencia Como fazer uso

das ferramentas disponiacuteveis na escola e dos subsiacutedios teoacutericos oferecidos durante a

proacutepria residecircncia ou estudados no curso de pedagogia elaborando impressotildees sobre

o que descreve e refletindo sobre o que vive e elabora

A retomada dos escritos e reflexotildees dos estudantes participantes do Programa

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil nos trazem pistas relevantes para a

compreensatildeo natildeo somente dos seus processos formativos mas tambeacutem suscitam

atenccedilatildeo aos temas e questotildees emergentes do cotidiano das crianccedilas nas escolas de

Educaccedilatildeo Infantil Sabe-se que o processo de escrita eacute composto de idas e vindas

de avanccedilos e retrocessos de duacutevidas e certezas percebidas nos textos e contextos

apresentados pelos estudantes neste processo formativo especiacutefico

As postagens guardam caracteriacutesticas especiacuteficas correlatas ao vivido nas

praacuteticas de estaacutegio de acordo com as finalidades comunicativas e formativas do

caderno de campoblog e com especificidades ndash limites e possibilidades ndash que se

dimensionam nestas praacuteticas Os estudantes registram o que observam o que

vivenciam mas natildeo soacute Em muitos registros suas impressotildees (con)fundem-se com o

observado vatildeo aleacutem da descriccedilatildeo interpretando o visto o vivido e outras vezes para

alguns o registro se faz espaccedilo de recuperaccedilatildeo das proacuteprias vivecircncias e dos

elementos teoacutericos estudados

Nesta experiecircncia a liberdade na escolha e escrita dos temas dos cadernos de

campo tem permitido que o processo formativo de cada estudante aconteccedila de forma

uacutenica e original pois apesar de estarem imersos em ambientes semelhantes (em

alguns casos mesmas escolas-campo) e possuiacuterem referenciais teoacutericos semelhantes

(provenientes das unidades curriculares obrigatoacuterias e eletivas do Curso de

Pedagogia) os temas e questotildees que recebem a atenccedilatildeo de cada um satildeo distintos e

trabalhados teoricamente a partir das anguacutestias e inquietaccedilotildees individuais Entretanto

apesar das produccedilotildees escritas serem individuais ao serem publicizadas em reuniotildees

de orientaccedilatildeo ou ateacute no suporte virtual do blog elas podem ser compartilhadas e

tornam-se objeto comum de discussotildees e aprendizagens

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

Referecircncias bibliograacuteficas

BARBOSA Maria Carmem Silveira Por amor e por forccedila rotinas na Educaccedilatildeo Infantil Porto Alegre Artmed 2006

BRAGA Elizabeth dos Santos Viacutedeo escritas leituras recordaccedilotildees cultura e memoacuteria na sala de aula GOacuteES Maria Cecilia Rafael e SMOLKA Ana Luiza Bustamante A significaccedilatildeo nos espaccedilos Educacionais ndash Interaccedilatildeo social e subjetivaccedilatildeo Campinas Papirus Editora1997 p 87-110

BRUNO Marilda Moraes Garcia A construccedilatildeo da escola inclusiva um a anaacutelise das poliacuteticas puacuteblicas e da praacutetica pedagoacutegica no contexto da educaccedilatildeo infantil Revistambienteeducaccedilatildeo v 1 n 2 p56-67 2008

CASTRO Marta Luz Sisson de Formaccedilatildeo do Diretor de Escola do Estado do Rio Grande do Sul implicaccedilotildees para a praacutetica Educaccedilatildeo v 32 n 2 p 114-121 2009

FEUERWERKER Laura Mudanccedilas na educaccedilatildeo meacutedica e residecircncia meacutedica no Brasil Interface comum sauacutede educaccedilatildeo vol 2 n3 p 51-71 1998

FREITAS Maria Teresa Assunccedilatildeo A pesquisa de abordagem histoacuterico-cultural um espaccedilo educativo de constituiccedilatildeo de sujeitos Revista Teias v 10 n 19 p 01-12 2009

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto Residecircncia Pedagoacutegica como diaacutelogo permanente entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores In DALBEN A et al (org) Convergecircncias e tensotildees no campo da formaccedilatildeo e do trabalho docente Belo

Horizonte Autecircntica v 1 p 375-392 2010

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto LUGLI Rosaacuterio Silvana Genta Diaacutelogos pertinentes na formaccedilatildeo inicial e continuada de professores e gestores escolares A concepccedilatildeo

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do Programa de Residecircncia Pedagoacutegica na UNIFESP Cadernos de Educaccedilatildeo n

46 p 62-82 2014

MARINHO Ceacutesar Henrique MARTINS Edna Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees eacutetnico-raciais impactos da formaccedilatildeo docente nas praacuteticas educativas Revista Educaccedilatildeo e Cultura Contemporacircnea v 14 n 34 p 42-63 2016

MARTINS Thaiacutes Regina Miranda SLAVEZ Milka Helena Carrilho Um estudo sobre programas de iniciaccedilatildeo agrave praacutetica profissional de professores no Brasil o PIBID e o estaacutegio de Residecircncia Ensino amp Pesquisa v 13 n 01 p 29-41 2016

MARQUES Danielle Vieira Aquino MUumlLLER Fernanda Experiecircncias com blog na pesquisa e na formaccedilatildeo inicial de professoras de educaccedilatildeo infantil ETD-Educaccedilatildeo Temaacutetica Digital v 14 n 1 p 43-61 2012

MARTINS E Famiacutelia e escola no contexto de um programa de residecircncia pedagoacutegica um estudo a partir do enfoque histoacuterico-cultural Educaccedilatildeo Sociedade amp Culturas v 37 p 89-107 2012

MEKSENAS Paulo Sociologia da educaccedilatildeo uma introduccedilatildeo ao estudo da escola no processo de transformaccedilatildeo social Satildeo Paulo Loyola 2002

MORETTI Vanessa Dias MARTINS Edna Atividade de ensino mediaccedilatildeo e aprendizagem da docecircncia na residecircncia pedagoacutegica uma anaacutelise a partir da teoria histoacuterico-cultural Revista Contrapontos v 15 n 3 p 394-411 2015

MORETTI Vanessa Dias A articulaccedilatildeo entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores que ensinam matemaacutetica o caso da Residecircncia Pedagoacutegica da Unifesp Revista Educaccedilatildeo Porto Alegre 2011 v 34 n 3 p 385-390 2011

NEVES Vanessa Ferraz Almeida CASTANHEIRA Maria Luacutecia GOUVEcircA Maria Cristina Soares O letramento e o brincar em processos de socializaccedilatildeo na educaccedilatildeo infantil brincadeiras diferentes Revista Brasileira de Educaccedilatildeo v 20 n 60 p 215-

244 2015

NOacuteVOA Antoacutenio Os professores e as Histoacuterias da Sua Vida In NOacuteVOA Antoacutenio (org) Vidas de Professores 2ordf ed Porto Porto Editora p 18-30 2000

PARO Vitor Henrique A educaccedilatildeo a poliacutetica e a administraccedilatildeo reflexotildees sobre a praacutetica do diretor de escola Educaccedilatildeo e Pesquisa v 36 n 3 p 763-778 2010

POLADIAN Marina Lopes Pedrosa Estudo sobre o Programa de residecircncia pedagoacutegica da Unifesp uma articulaccedilatildeo entre Universidade e escola na formaccedilatildeo de professores Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia da Educaccedilatildeo) - Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Satildeo Paulo 2014

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ROSEMBERG Fulvia Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees raciais a tensatildeo entre igualdade e diversidade Cadernos de Pesquisa v 44 n 153 p 742-759 2014

SILVA Adriana BUFALO Joseane O espaccedilo na pedagogia da educaccedilatildeo infantil faacutebula perversidade e possibilidade In Culturas infantis em creches e preacute-escolas estaacutegio e pesquisa Campinas SP Autores Associados 2011

TARDIF Maurice A profissionalizaccedilatildeo do ensino passados trinta anos dois passos para a frente trecircs para traacutes Educaccedilatildeo e Sociedade Campinas SP v34 n123 p

551-571 2013

VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

Correspondecircncia

Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Maria de Faacutetima Carvalho ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

E-mail emartinsunifespgmailcom ndash carvalhomdfgmailcom ndash

remarciliogmailcom

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escola e um dia para a Universidade para supervisatildeo com o preceptor que eacute um

docente da Universidade Na escola cumprem o horaacuterio da turma que acompanham

em turno que pode ser matutino vespertino ou intermediaacuterio Natildeo satildeo toleradas faltas

ou atrasos sem justificativa meacutedica objetivando-se desta forma colocar os alunos

diante da responsabilidade do compromisso profissional assumido perante a escola

Durante as duas primeiras semanas de imersatildeo os estudantes satildeo orientados

a descrever no diaacuterio de campo o que observam e suas impressotildees sobre a escola

as relaccedilotildees entre professorcrianccedilas crianccedilacrianccedila escolacomunidade

famiacuteliasescola professorprofessor professorgestatildeo e praacuteticas educativas do

cotidiano que satildeo observadas mais atentamente Neste primeiro momento aleacutem da

cobranccedila para que o aluno escreva sobre suas vivecircncias o preceptor busca ajudaacute-lo

na construccedilatildeo dos registros do caderno de campo assinalando sobre as posturas de

descriccedilatildeo e de reflexatildeo na elaboraccedilatildeo sobre suas impressotildees sobre aquilo que eacute

observado

Antes de serem executados os planos pedagoacutegicos de cada estudante satildeo

apresentados para os professores formadores e coordenador nas escolas durante

reuniatildeo realizada na ldquoHora Atividaderdquo com a participaccedilatildeo do professor preceptor Este

tem se constituiacutedo um momento iacutempar de aprendizagem para todos os envolvidos jaacute

que nesta ocasiatildeo os estudantes compartilham seus conhecimentos suas

experiecircncias expectativas e apreensotildees e onde explicitam-se possibilidades de

articulaccedilatildeo escola-universidade no acircmbito da formaccedilatildeo de professores Eacute na uacuteltima

semana de imersatildeo que os estudantes colocam seus planos de accedilatildeo pedagoacutegica em

praacutetica nas salas em que estatildeo imersos fechando o ciclo previsto pelo estaacutegio

Metodologia analisando as temaacuteticas do caderno de campo online (Blog)

Alguns grupos de residentes da RPEI conforme opccedilatildeo dos professores

preceptores usam um blog para a construccedilatildeo online de um caderno de campo que

integra a elaboraccedilatildeo de seus registros sobre a imersatildeo na escola Esses registros ndash

que chamamos de postagens aleacutem de possibilitar um olhar mais apurado sobre as

praacuteticas cotidianas podem contribuir para a orientaccedilatildeo e a construccedilatildeo do Plano de

Accedilatildeo Pedagoacutegica de cada residente e posteriormente para a escrita de um relatoacuterio

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final de estaacutegio pelo grupo Eacute sobre os registros do blog que incidiraacute nossa anaacutelise

considerando para tanto inquietaccedilotildees observaccedilotildees e reflexotildees registradas pelos

residentes nos anos de 2015 2016 e 2017

O blog da residecircncia ou diaacuterio de campo online consiste em uma ferramenta

virtual na qual satildeo realizados os registros de observaccedilotildees e experiecircncias significativas

vividas pelos residentes cotidianamente na escola Destaca-se que tal ferramenta eacute

de acesso restrito e apenas um uacutenico grupo de alunos e professores preceptores da

Universidade podem participar em cada escola acompanhada Deste modo nem os

professores ou quaisquer pessoas das escolas-campo podem acessar tal instrumento

O blog eacute construiacutedo pelo professor preceptor a cada novo grupo de residentes

assegurando o sigilo das informaccedilotildees registradas A ferramenta possibilita a

construccedilatildeo coletiva de diaacutelogos sobre questotildees observadas e a mediaccedilatildeo dos

conhecimentos dos residentes pelos seus supervisores Assim os estudantes podem

realizar trocas sobre suas vivecircncias muitas vezes similares agraves que ocorrem na mesma

instituiccedilatildeo ainda que estejam em turmas de idades diferentes Permite tambeacutem que

preceptores acompanhem diariamente seus residentes respondendo as indagaccedilotildees

e inquietaccedilotildees do grupo que participa do dia-a-dia na escola

Aleacutem de cumprir todos os objetivos de um caderno de campo comum o blog

permite ao preceptor mesmo agrave distacircncia o acompanhamento contiacutenuo do grupo de

estudantes o que lhe permite planejar as atividades semanais de supervisatildeo de forma

a responder as demandas dos alunos e esses uacuteltimos de compartilharem seus

diferentes pontos de vistas e as accedilotildees desenvolvidas na escola Assim no contexto

da residecircncia pedagoacutegica o blog ou caderno de campo online eacute o espaccedilomomento

de realizaccedilatildeo dos registros de observaccedilotildees e experiecircncias significativas vividas

cotidianamente na escola de educaccedilatildeo infantil e de acompanhamento e

problematizaccedilatildeo dessas vivecircncias pelos preceptores

Nesse caminho assinala-se a contribuiccedilatildeo de Vygotsky (1981) quando aponta

que as relaccedilotildees humanas satildeo sempre mediadas pelo meio social e pelos instrumentos

e signos que fazem parte das relaccedilotildees e dos contextos em que o homem estaacute inserido

Desse modo

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A atividade praacutetica do homem portanto se faz duplamente mediada de uma parte estaacute mediada pelas ferramentas no sentido literal da palavra e de outra parte mediada pelas ferramentas no sentido figurado pelas ferramentas do pensamento pelos meios com a ajuda dos quais se realiza a operaccedilatildeo intelectual ou seja mediada com a ajuda das palavras (VYGOTSKI 19302006a p 165)

Nessa direccedilatildeo conveacutem destacar a importacircncia do blog como instrumento social

representativo da incorporaccedilatildeo da tecnologia ao dia a dia dos estudantes e da

consideraccedilatildeo da mediaccedilatildeo tecnoloacutegica em processos de aprendizagem e

desenvolvimento dos graduandos

Diferente de outras formas de relacionamento virtual (e-mail chat instant

messages listas de discussatildeo etc) e de ferramentas virtuais convencionais ndash como

os sites ndash o blog caracteriza-se pela facilidade de sua criaccedilatildeo e manutenccedilatildeo o que eacute

definido pela organizaccedilatildeo automaacutetica das mensagens ndash posts ndash pelo sistema

dinamizando seu uso e favorecendo a construccedilatildeo de diaacuterios coletivos mantidos por

vaacuterios usuaacuterios Tais caracteriacutesticas favorecem o uso do blog em processos de ensino-

aprendizagem tendo em vista a interaccedilatildeo a troca o diaacutelogo como forma de partilha e

construccedilatildeo de conhecimentos (MARQUES MULLER 2012)

O blog permite portanto o compartilhamento de informaccedilotildees e a interaccedilatildeo

entre estudantes do mesmo grupo e o mesmo preceptor em uma mesma escola

Todos podem ler e comentar as postagens funcionando como um ponto de encontro

entre alunos e preceptores Assim nossa atenccedilatildeo agraves postagens dos estudantes no

blog eacute dirigida pelo objetivo de dar visibilidade a dimensatildeo social das praacuteticas de

registro do observadovivido nos processos formativos que emergem na experiecircncia

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil Assumimos o caraacuteter histoacuterico-

cultural da pesquisa do meacutetodo do objeto de estudo e do proacuteprio conhecimento como

construccedilatildeo que se realiza entre sujeitos (FREITAS 2009) Dessa forma acredita-se

que o momento de elaboraccedilatildeo do vivido ndash o registro no caderno de campoblog ndash

deflagra no estudante a necessidade de reflexatildeo sobre os processos de ensino-

aprendizagem em curso no acircmbito do estaacutegio-residecircncia pedagoacutegica

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Registros no caderno de campo online o olhar do residente sobre a escola de

educaccedilatildeo infantil

Nos primeiros dias de imersatildeo na escola os residentes satildeo orientados a

realizar uma observaccedilatildeo atenta dos espaccedilos da instituiccedilatildeo A partir da leitura do texto

de Silva e Bufalo (2011) sobre culturas escolares os residentes descrevem em seus

primeiros registros detalhes fiacutesicos sobre a escola Muitos acabam desenhando a

planta baixa ou tirando fotos de salas de aulas parques e paacutetios e compartilhando no

caderno de campo online (blog) para comeccedilarem a pensar sobre o contexto e os

espaccedilos que podem favorecer a aprendizagem e o desenvolvimento da crianccedila

pequena como descrito no excerto abaixo

Uma coisa que me chamou atenccedilatildeo foi que natildeo possuem um espaccedilo para atividade fiacutesica essas satildeo realizadas no paacutetio que eacute proacuteximo as salas o barulho acaba atrapalhando os demais O parque estaacute interditado por ordem da diretora ou seja natildeo possuem lugar para brincar O dia das crianccedilas foi pautado em ficar sentado e quieto vendo um filme que a maioria jaacute tinha assistido (Relato da residente N 2017)

Formas de organizaccedilatildeo de espaccedilos e tempos remetem agrave organizaccedilatildeo da rotina

Sobre esse tema grande quantidade de postagens textos diz respeito a como as

atividades diaacuterias satildeo organizadas na escola Em alguns registros como o

apresentado a seguir aparece a problematizaccedilatildeo da forma de organizaccedilatildeo das

atividades

730 (15min) - a professora colocou o cabeccedilalho na lousa com a data e fez a contagem coletiva das crianccedilas 745 (45min) - a professora retomou o que eles haviam aprendido sobre os iacutendios entregou massinha e os orientou a modelar utensiacutelios indiacutegenas 830 (35min) - pintura de desenho xerocado que seraacute colado na capa do caderno de atividades 905 (25min) - brincadeira livre no paacutetio interno no brinquedatildeo que fica no final da escadarampa sup2940 (30min) - brincadeira em sala Gato mia 1010 (ateacute as crianccedilas irem embora) - a professora entregou uma folha com a letra da canccedilatildeo 1 2 3 indiozinhos cantou a muacutesica com eles sentados em seus lugares pediu para eles circularem as letras A e I e depois pintar a ilustraccedilatildeo () (Relato da residente J 2015)

A rotina observada e registrada pela residente configura-se como um dos

aspectos mais relevantes na vida da crianccedila que se encontra na escola de Educaccedilatildeo

Infantil Barbosa (2006) aponta que esse eacute um dos elementos que integram as praacuteticas

educativas que devem ser observadas e planejadas com regularidade objetivando a

operacionalizaccedilatildeo do cotidiano da escola de maneira que possa contribuir na

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constituiccedilatildeo da subjetividade dos atores escolares Desse modo pensar e

compreender a rotina como um fator presente e essencial na educaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute um passo promissor para que o residente acompanhe como as atividades

cotidianas da escola se materializam e datildeo base para a organizaccedilatildeo da praacutetica

pedagoacutegica devendo estar presente no desenvolvimento curricular

O planejamento das atividades na educaccedilatildeo infantil tem estreita ligaccedilatildeo com a

rotina Ao observar e refletir sobre a vida e as experiecircncias das crianccedilas na escola os

residentes satildeo remetidos a memoacuteria agrave lembranccedila do que tambeacutem foi um dia vivido

por eles em suas experiecircncias escolares Como apontado por Meksenas (2002)

ldquonunca somos testemunhas objetivas observando objetos e sim sujeitos observando

outros sujeitosrdquo (p 116)

Estive tentando lembrar nas uacuteltimas semanas o que eu fazia na minha preacute-escola Eu comecei no maternal com 3 anos ()Tenho vagas lembranccedilas de duas salas de aula uma do preacute III e a outra acho que era do preacute I Era uma escola particular dessas pequenas de bairro Lembro que a turma natildeo era tatildeo numerosa quanto essa que estou vendo na residecircncia mas a sala tinha uma organizaccedilatildeo parecida eram mesas e cadeiras enfileiradas nas duas () Eu estava com 5 anos Lembro que a gente tinha uma apostila no preacute I eu gostava de terminar tudo raacutepido para dormir Depois a professora comeccedilou a me dar gibi para eu ficar folheando Tenho na minha memoacuteria que as coisas que a gente fazia na escola eram chatas e muito infantis bobas demais Agora eu penso talvez as professoras ficassem me ocupando com massinha e pinturas todo dia tambeacutem como eu vejo na residecircncia e por isso eu achava muito chato O que seraacute que essas crianccedilas pensam disso O que seraacute que elas acham mais legal na escola Eu vejo que elas gostam muito de fazer liccedilatildeo essas de folhinha que a professora daacute e todos os dias elas perguntam Mas eu natildeo me conformo como elas acham isso tatildeo legal (Relato da Residente F 2017)

Sabemos que a memoacuteria eacute mediada pelo signo pelas interaccedilotildees sociais pelo

outro Braga (1997) dirige nosso olhar para o ldquoprocesso de apropriaccedilatildeo das formas

culturais de interaccedilatildeo que caracterizam a memoacuteria humanardquo Para a autora ldquoa

memoacuteria do homem soacute se configura no movimento discursivo e coletivo por sua

natureza cultural e simboacutelicardquo No registro acima o observado mobiliza as lembranccedilas

da residente aquilo que foi tambeacutem vivido na escola de sua infacircncia Entre lembranccedilas

e interrogaccedilotildees emergem as construccedilotildees formativas em um processo dinacircmico ndash

interativo cultural e simboacutelico Processo que potildeem em relaccedilatildeo vivecircncias atuais e

passadas que invocam sentidos e significados atribuiacutedos ao vivido que ocorre nas

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contradiccedilotildees entre aquilo que eacute rememorado pela estudante e o que efetivamente eacute

observado nas relaccedilotildees estabelecidas no contato com o cotidiano da escola

Aleacutem da rotina e da organizaccedilatildeo de tempos e espaccedilos em sua relaccedilatildeo com as

praacuteticas pedagoacutegicas os relatos dos estudantes se reportam agraves diferentes dimensotildees

da gestatildeo escolar Os registros destacam suas observaccedilotildees nas H A (hora atividade)

ou reuniotildees que eventualmente participam e com frequecircncia observam a postura da

equipe em relaccedilatildeo a presenccedila do residente Em seus relatos questionam o caraacuteter

da gestatildeo a qualidade da relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo entre os professores as discussotildees

que remetem a construccedilatildeo e discussatildeo do projeto poliacutetico pedagoacutegico e os papeis

desempenhados pelos diferentes educadores na construccedilatildeo do trabalho de educaccedilatildeo

da infacircncia

Completamos nesta semana 4 dias de participaccedilatildeo nas Horas Atividades (HA) destinada agrave formaccedilatildeo docente organizaccedilatildeo dos registros e planejamento das atividades pedagoacutegicas O que pude por meio da observaccedilatildeo constatar que o papel do Coordenador Pedagoacutegico que eacute fundamental nesse momento de formaccedilatildeo pois eacute ele o mediador desse processo acaba por se tornar distante e sem intervenccedilotildees no que adentra a orientaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico docente (Relato da estudante M 2015)

Na experiecircncia cotidiana de imersatildeo na escola eacute possiacutevel verificar as tensotildees

vivenciadas entre os professores e o papel da coordenaccedilatildeo pedagoacutegica A teoria

discutida na universidade pelos residentes assinala a importacircncia do papel do

coordenador pedagoacutegico na educaccedilatildeo infantil na praacutetica o residente percebe o quanto

a sua mediaccedilatildeo eacute fundamental na organizaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico e por outro

lado o quanto a sua ausecircncia pode interferir de forma negativa na orientaccedilatildeo das

atividades dos professores

Outra personagem que acaba sendo central na gestatildeo escolar eacute a direccedilatildeo que

nessa experiecircncia do residente tambeacutem eacute observada de forma criacutetica

A figura da diretora na escola foi a que mais me chamou a atenccedilatildeo ()imaginem que em nenhum momento percebi qualquer aproximaccedilatildeo da diretora com as crianccedilas em vaacuterios momentos acreditei que ela fosse algum teacutecnico administrativo pois apesar de estar no topo da piracircmide a referecircncia da gestatildeo a mesma se restringia a secretaria e natildeo se relacionava natildeo nos conhecia nem procurava nos conhecer Passou diversas vezes por grupos de crianccedilas e em nenhuma das vezes sequer olhou para elas Nunca apareceu em uma HA nunca percebi o seu contato com os professores e por diversas vezes me perguntei como eles se falavam qual era o seu relacionamento (Relato da residente B 2015)

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Sobre esse assunto estudos como os de Paro (2005) e Castro (2009) tem

assinalado o papel da gestatildeo e da administraccedilatildeo escolar como alicerce fundamental

nos processos de transformaccedilatildeo da escola puacuteblica brasileira Tais trabalhos tecircm

apontado a centralidade da direccedilatildeo escolar nas questotildees que envolvem os processos

de ensino e aprendizagem e as relaccedilotildees humanas presentes na equipe de trabalho

para aleacutem dos trabalhos administrativos e burocraacuteticos Natildeo eacute objetivo deste trabalho

fazer uma anaacutelise do papel do diretor na escola de educaccedilatildeo infantil mas cabe

assinalar que os estudantes residentes apontam o tema em seus registros e atentos

agraves demandas relativas ao papel do diretor indagam se como e quanto as lideranccedilas

escolares tecircm se envolvido com o trabalho administrativo dispendendo tempo para

um olhar mais atento agraves relaccedilotildees entre os professoresalunos funcionaacuterios da escola

observada

Em relaccedilatildeo agraves interaccedilotildees humanas outros registros dos residentes nos

remetem agraves maneiras como a escola lida com as famiacutelias das crianccedilas matriculadas

nas escolas Tais relatos natildeo satildeo tatildeo frequentes possivelmente porque essa eacute uma

relaccedilatildeo que se caracteriza pela assimetria de poderes e eacute pouco valorizada no dia a

dia escolar Os registros evocam situaccedilotildees vividas comentaacuterios ouvidos e

principalmente a necessidade de mudanccedila dos modos de conceber a crianccedila e suas

famiacutelias e de interagir com elas

A relaccedilatildeo entre professor e famiacutelia eacute mais uma dessas conexotildees que fazemos pela vida Por um lado haacute um profissional uma pessoa que estudou e eacute especialista em cuidar de crianccedilas Por outro famiacutelias que dificilmente conseguimos de fato perceber como satildeo suas estruturadas Famiacutelia hoje eacute coisa difiacutecil de entender Eacute matildee que mora sozinha com o filho eacute pais que trabalham e deixam os filhos na semana com tios avoacutes Eacute matildee solteira Eacute filho criado por pai viuacutevo Eacute histoacuteria que natildeo acaba mais Na hora da saiacuteda vamos conhecendo um pouquinho da estrutura familiar de cada crianccedila tentando perceber como se daacute a relaccedilatildeo entre a famiacutelia e a escola mas devemos ter um pouco de cuidado com esse processo (Relato do estudante J 2015)

Aleacutem da residente ter um olhar para os diferentes tipos de arranjos familiares

tambeacutem busca compreender a especificidade de cada famiacutelia considerando o papel

da mulher e de matildee trabalhadora com filhos na escola puacuteblica

(hellip) Veja esses apontamentos uma menina na sala estaacute com piolho a professora disse que jaacute alertou a matildee mas como eacute matildee solteira soacute pode cuidar da filha no domingo O outro menino que natildeo se interessa pelas atividades e responde a educadora tambeacutem teve a matildee notificada mas como

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a mesma eacute separada do marido natildeo faz nada O fato da mulher trabalhar a semana e ter folga aos domingos natildeo significa que ela seja uma maacute matildee pelo contraacuterio significa que ela rala muito para colocar comida no prato A presenccedila ou natildeo de um homem natildeo condiciona nada A escola natildeo pode ser um ambiente de roacutetulos ela deve estar aberta agraves diferenccedilas acolhendo e buscando outras maneiras e formas de aproximaccedilatildeo com a famiacutelia compreendendo a responsabilidade compartilhada que carregam (Registro da residente B 2015)

Os relatos demonstram natildeo soacute o quanto estatildeo atentos para como a escola lida

com as relaccedilotildees familiares mas sobretudo assinalam como tecircm se configurado as

formaccedilotildees das famiacutelias na atualidade Um estudo de Martins (2012) aponta o quanto

a experiecircncia de residecircncia pedagoacutegica possibilita aos estudantes um contato mais

expressivo com a realidade da escola puacuteblica de periferia urbana Aleacutem de observar

as relaccedilotildees institucionais o residente pode ser sensibilizado frente agraves dificuldades

vividas pelas famiacutelias e tendem a perceber o preconceito em relaccedilatildeo aos vaacuterios

arranjos familiares vivenciados pelas crianccedilas mais pobres e como a escolarizaccedilatildeo

dos pais pode afetar a vida dos filhos Os registros dos residentes demonstram como

ldquoos contextos de vida das crianccedilas que frequentam a escola puacuteblica de periferia

passam a ser compreendidos de uma forma concreta e as relaccedilotildees do espaccedilo familiar

com o espaccedilo escolar passam a ter uma conexatildeo cotidianardquo (MARTINS 2012 p 95)

Outra temaacutetica recorrente nos registros dos estudantes diz respeito ao processo

de escolarizaccedilatildeo das praacuteticas da educaccedilatildeo da infacircncia Tal perspectiva surge quando

os residentes referem aos usos dos brinquedos e agraves brincadeiras agrave presenccedila da

leitura e contaccedilatildeo de histoacuterias aos modos de introduccedilatildeo do desenho ao uso de novas

tecnologias e aos modos de avaliar agraves crianccedilas Tal perspectiva escolarizante emerge

em oposiccedilatildeo ao luacutedico como princiacutepio e forma de organizaccedilatildeo das praacuteticas de

educaccedilatildeo junto agraves crianccedilas pequenas e algumas vezes a ela ainda se articula a

preocupaccedilatildeo em disciplinar as vivecircncias escolares sondagens filas broncas e

silecircncios coexistem com desenhos Tv computadores e brincadeiras Os registros nos

dizem de uma escola que hesita entre coibir e promover a expressatildeo das muitas

linguagens da imaginaccedilatildeo e movimento das crianccedilas

Na semana de 2310 a 2710 e como previsto na reuniatildeo de pais a professora realizou a sondagem com as crianccedilas Teoricamente sei como funciona o procedimento mas me questiono se deve ser realizada na Ed Infantil Tambeacutem me pergunto se a sondagem vai muito aleacutem do conhecimento das crianccedilas Por exemplo algumas escrevem o proacuteprio nome

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e algumas palavras mais comuns a elas outras ainda nem reconhecem as letras do alfabeto A sondagem feita abarcou o nome palavras simples um pouco mais complexas e uma frase inteira A minha duacutevida eacute se a sondagem que vai muito aleacutem dos conhecimentos da sala eacute comum e necessaacuteria ainda mais na Ed Infantil (Relato do residente N 2017)

O debate em torno das questotildees que envolvem a escolarizaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute bastante antigo e recorrente Pesquisas como as de Neves Castanheira

e Gouveia (2015) assinalam a partir de autores que estudaram essa temaacutetica como

a perspectiva escolarizante de trabalho com a crianccedila pequena traz seacuterias implicaccedilotildees

para o desenvolvimento infantil justamente porque rompe com as formas como elas

ldquointeragem com a escrita fora da escola destituindo-a de significados pessoais e

sociais e dificulta portanto que as atividades desenvolvidas no espaccedilo escolar

envolvam a ludicidade caracteriacutestica fundamental dessa fase do desenvolvimentordquo

(p 217)

Os residentes parecem estar muito atentos a essas questotildees porque participam

de discussotildees sistemaacuteticas sobre o assunto tanto nas aulas teoacutericas na Universidade

quanto nas reuniotildees de orientaccedilatildeo com os preceptores do Programa de Residecircncia

Muitos estudantes satildeo levados a refletir sobre o assunto logo nos primeiros dias de

imersatildeo na escola

Resolvi mudar o formato do meu relato referente agrave imersatildeo inicial Pois passei por uma situaccedilatildeo em sala que me provocou tal accedilatildeo Devido agrave imposiccedilatildeo de escolarizaccedilatildeo percebida na turma na qual acompanho Onde hoje me emocionei com o choro insistente do aluno BG com as matildeos estremecidas na tentativa de segurar o laacutepis para ldquofazer liccedilatildeordquo (Relato da Residente M 2015)

A partir do relato da residente percebe-se o quanto a questatildeo eacute relevante para

o campo da educaccedilatildeo infantil e da formaccedilatildeo de professores Nas observaccedilotildees e

relatos dos cadernos de campo natildeo eacute incomum aparecerem longas narrativas sobre

os equiacutevocos que ocorrem nas praacuteticas pedagoacutegicas que envolvem a alfabetizaccedilatildeo e

letramento das crianccedilas pequenas Consideramos que questotildees como essas quando

problematizadas pelos estudantes nos horaacuterios de preceptoria ou mesmo nas

discussotildees com professores especialistas sobre o tema tendem a aproximaacute-los de

uma futura praacutetica profissional em que o trabalho com o desenvolvimento da escrita

seja realizado de forma a respeitar a infacircncia natildeo negando agrave crianccedila o seu direito ao

luacutedico mas tratando a apresentaccedilatildeo do mundo letrado como mais um momento

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prazeroso de aprendizagens Tal reflexatildeo eacute importante para os futuros professores

para que busquem compreender como inserir as crianccedilas no mundo letrado de

maneira que possam romper com a dicotomia entre o brincar e a leituraescrita

tomando como referecircncia o significado dessas accedilotildees para a crianccedila possibilitando a

conduccedilatildeo dos trabalhos na educaccedilatildeo infantil que tornem possiacutevel o brincar ldquoletrando

e alfabetizandordquo (NEVES CASTANHEIRA E GOUVEIA 2015)

Outra temaacutetica que aparece num nuacutemero expressivo de postagens diz respeito

ao olhar do residente para as praacuteticas educativas e as interaccedilotildees que ocorrem na

escola com relaccedilatildeo agrave inclusatildeo escolar das crianccedilas percebidas como ldquodiferentesrdquo

Destaca-se nesta temaacutetica observaccedilotildees a respeito de diferenccedilas de religiatildeo gecircnero

raccedilacor e tambeacutem aquelas relacionadas agrave deficiecircncia Haacute descriccedilotildees sobre como as

crianccedilas lidam com as diferenccedilas e as formas como os professores trabalham com

aquelas que possuem alguma dificuldade Algumas postagens ressaltam a

necessidade de formaccedilatildeo inicial e continuada dos educadores para lidarem com a

diversidade na escola

Pela primeira vez vivenciei preconceito racial de uma crianccedila com outra Nos momentos em que a profa distribui lego para as crianccedilas ela daacute tambeacutem um bonequinho para cada crianccedila Tem bonecos adultos crianccedilas homens mulheres e de diversas cores Os bonecos satildeo dados aleatoriamente ou escolhidos pela crianccedila conforme a professora passa de mesa em mesa Neste dia um menino negro estava com um boneco negro Um garoto se aproximou e disse ldquoCredo que boneco feio parece vocecircrdquo se direcionando ao menino O menino deu de ombros e continuou a brincar e poucos minutos depois a menina que estava ao seu lado me perguntou ldquoPor que o boneco dele eacute pretinho Eacute muito feiordquo Claro que conversei com ela e com o outro menino em outro momento calmamente falando das diversas cores que as pessoas tecircm e que natildeo haacute isso de feio e bonito aproveitando para falar sobre diversidade e etc Mais para o final da conversa a menina me disse ldquoMeu pai eacute pretinho ele eacute bonitordquo Respondi a menina dizendo que a beleza natildeo estaacute na cor da pele do cabelo ou dos olhos A cena toda me fez refletir que a menina jaacute deve ter ouvido esse tipo de afirmaccedilatildeo errocircnea Jaacute comentei mais de uma vez sobre o preconceito de gecircnero ser muito forte mas e o racial algueacutem mais vivenciou esse tipo de preconceito durante esta residecircncia (Relato do residente T 2017)

Rosemberg (2014) chama a atenccedilatildeo para o tema da diversidade como uma

questatildeo circunscrita na histoacuteria da humanidade A diferenciaccedilatildeo entre os grupos

humanos ou pessoas com atributos que classificam e separam o ldquoeurdquo do ldquooutrordquo

parece constituir as diversas manifestaccedilotildees de culturas humanas Assim a autora

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desnaturaliza a identidade e a diferenccedila apontando o seu caraacuteter cultural social e

histoacuterico Contudo esse eacute um dos temas que tem chamado cada vez mais a atenccedilatildeo

de educadores desde a educaccedilatildeo infantil jaacute que muitas vezes as questotildees que

envolvem a diferenccedila e o diferente passam por processos discriminatoacuterios e

preconceituosos como apontado no relato do estudante ao observar as interaccedilotildees

entre as crianccedilas no que se refere ao quesito raccedilacor

Marinho e Martins (2016) em estudo sobre formaccedilatildeo de professoras que atuam

na educaccedilatildeo infantil constatam a escassez ou inexistecircncia de disciplinas na formaccedilatildeo

inicial de professores que abarquem as questotildees eacutetnico-raciais denunciando o natildeo

cumprimento das leis que entre outras prescriccedilotildees preveem que instituiccedilotildees de niacutevel

superior proporcionem aos futuros(as) professoresas a formaccedilatildeo adequada para

lidarem com as relaccedilotildees raciais multieacutetnica e multicultural da sociedade brasileira

Nesse sentido ao trazerem suas inquietaccedilotildees sobre como as crianccedilas lidam com as

diferenccedilas no contexto da escola os residentes se aproximam das discussotildees a

respeito dos processos discriminatoacuterios oportunizando momentos em que tais

temaacuteticas possam ser discutidas entre professores preceptores e colegas do

programa de estaacutegio

Aleacutem da questatildeo racial outros relatos nos datildeo conta de refletir e discutir sobre

as relaccedilotildees que envolvem as crianccedilas com deficiecircncia na escola

() O que me chamou atenccedilatildeo foi que na quarta (2204) H chegou na escola e decidiu mudar de lugar foi sentar bem ao lado do D (uma crianccedila que foi diagnosticada com autismo de ldquograu leverdquo segundo a professora) eu fiquei observando como seria a relaccedilatildeo deles H trouxe um caderno de desenho o abriu na mesa e dividiu metade da folha para ele e para D depois na hora de descer ele segurou a matildeo do D e ficou durante o almoccedilo todo cuidando de D o orientou a pegar a comida sentar comer devagar e quando natildeo quisesse mais deveria jogar a comida no lixo e durante todo o dia H permaneceu cuidando de D A professora achou estranho pois naquele dia ela natildeo havia chamado a atenccedilatildeo de H ateacute me falou ldquoEle deve estar aprontando e D eacute bobatildeo pode se machucarrdquo e decidiu intervir e pediu para que H mudasse de lugar e parasse de cuidar de (Relato do residente L 2015)

A partir da narrativa eacute possiacutevel refletir sobre o preparo dos professores para

lidar com as diferenccedilas individuais na educaccedilatildeo infantil A inclusatildeo escolar de crianccedilas

com deficiecircncia ocorre mediante poliacuteticas puacuteblicas de inclusatildeo contudo haacute uma

grande distacircncia entre a poliacutetica puacuteblica e a praacutetica pedagoacutegica nos contextos

escolares pois natildeo se aprofunda ldquoo debate sobre os meios os fins e as estrateacutegias

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para a implementaccedilatildeo da poliacutetica de ampliaccedilatildeo da rede de educaccedilatildeo infantilrdquo

(BRUNO 2008 p 59)

Outros registros que tratam da temaacutetica da inclusatildeo de crianccedilas com

deficiecircncia mostram o quanto a escola estaacute despreparada para lidar com essa

questatildeo Os relatos e inquietaccedilotildees dos estudantes nos possibilitam a identificaccedilatildeo de

processos discriminatoacuterios de resistecircncias e acomodaccedilotildees dos profissionais e do

distanciamento de uma praacutetica verdadeiramente inclusiva na esfera das praacuteticas

educativas cotidianas O que se percebe nas discussotildees sobre o assunto eacute que os

residentes enquanto futuros professores muito tecircm a aprender sobre a acolhida das

famiacutelias e das crianccedilas ldquodiferentesrdquo ou com deficiecircncia na constante reflexatildeo sobre o

comportamento atitudes e posturas do educador frente ao trabalho pedagoacutegico

Outras temaacuteticas tatildeo importantes como as que discutimos aqui tem sido objeto

de interesse dos estudantes em processo de imersatildeo nas escolas-campo Haacute uma

gama de registros sobre categorias que envolvem a crianccedila pequena nas atividades

do brincar a disciplina e a coerccedilatildeo dos educadores na tentativa de manter o controle

das crianccedilas e dos comportamentos considerados inadequados Muitos residentes se

surpreendem como essa coerccedilatildeo ocorre demasiadas vezes na escola e nas reuniotildees

de supervisatildeo eacute muito comum questionarem junto ao preceptor formas de

compreender por que algumas praacuteticas coercitivas satildeo tatildeo presentes na educaccedilatildeo

infantil

Consideraccedilotildees Finais

A experiecircncia de estaacutegio no Programa de Residecircncia Pedagoacutegica requer de

estudantes e professores uma atitude de intensa accedilatildeo e reflexatildeo Na perspectiva de

observaccedilatildeo participante eacute que a imersatildeo dos residentes na escola eacute orientada

embora natildeo haja uma intervenccedilatildeo direta planejada e sistemaacutetica sobre os modos de

fazer da escola e dos professores Possiacuteveis intervenccedilotildees sobre a escola suscitadas

pela presenccedila da universidade (de preceptores e residentes) satildeo uma contingecircncia

dos processos de formaccedilatildeo de condiccedilotildees e modos de seu desenvolvimento e eacute assim

que se define o lugar do residente e da preceptoria junto a escola o caraacuteter da

observaccedilatildeo participante a ser realizada durante o estaacutegio e sua conduccedilatildeo e discussatildeo

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no acircmbito escolar As posiccedilotildees dos residentes reeditam questotildees que mobilizam a

imersatildeo e reflexatildeo sobre o vivido como e quando participar O que como e quando

registrar sobre a observaccedilatildeo participante sobre o que se vivencia Como fazer uso

das ferramentas disponiacuteveis na escola e dos subsiacutedios teoacutericos oferecidos durante a

proacutepria residecircncia ou estudados no curso de pedagogia elaborando impressotildees sobre

o que descreve e refletindo sobre o que vive e elabora

A retomada dos escritos e reflexotildees dos estudantes participantes do Programa

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil nos trazem pistas relevantes para a

compreensatildeo natildeo somente dos seus processos formativos mas tambeacutem suscitam

atenccedilatildeo aos temas e questotildees emergentes do cotidiano das crianccedilas nas escolas de

Educaccedilatildeo Infantil Sabe-se que o processo de escrita eacute composto de idas e vindas

de avanccedilos e retrocessos de duacutevidas e certezas percebidas nos textos e contextos

apresentados pelos estudantes neste processo formativo especiacutefico

As postagens guardam caracteriacutesticas especiacuteficas correlatas ao vivido nas

praacuteticas de estaacutegio de acordo com as finalidades comunicativas e formativas do

caderno de campoblog e com especificidades ndash limites e possibilidades ndash que se

dimensionam nestas praacuteticas Os estudantes registram o que observam o que

vivenciam mas natildeo soacute Em muitos registros suas impressotildees (con)fundem-se com o

observado vatildeo aleacutem da descriccedilatildeo interpretando o visto o vivido e outras vezes para

alguns o registro se faz espaccedilo de recuperaccedilatildeo das proacuteprias vivecircncias e dos

elementos teoacutericos estudados

Nesta experiecircncia a liberdade na escolha e escrita dos temas dos cadernos de

campo tem permitido que o processo formativo de cada estudante aconteccedila de forma

uacutenica e original pois apesar de estarem imersos em ambientes semelhantes (em

alguns casos mesmas escolas-campo) e possuiacuterem referenciais teoacutericos semelhantes

(provenientes das unidades curriculares obrigatoacuterias e eletivas do Curso de

Pedagogia) os temas e questotildees que recebem a atenccedilatildeo de cada um satildeo distintos e

trabalhados teoricamente a partir das anguacutestias e inquietaccedilotildees individuais Entretanto

apesar das produccedilotildees escritas serem individuais ao serem publicizadas em reuniotildees

de orientaccedilatildeo ou ateacute no suporte virtual do blog elas podem ser compartilhadas e

tornam-se objeto comum de discussotildees e aprendizagens

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

Referecircncias bibliograacuteficas

BARBOSA Maria Carmem Silveira Por amor e por forccedila rotinas na Educaccedilatildeo Infantil Porto Alegre Artmed 2006

BRAGA Elizabeth dos Santos Viacutedeo escritas leituras recordaccedilotildees cultura e memoacuteria na sala de aula GOacuteES Maria Cecilia Rafael e SMOLKA Ana Luiza Bustamante A significaccedilatildeo nos espaccedilos Educacionais ndash Interaccedilatildeo social e subjetivaccedilatildeo Campinas Papirus Editora1997 p 87-110

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Horizonte Autecircntica v 1 p 375-392 2010

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto LUGLI Rosaacuterio Silvana Genta Diaacutelogos pertinentes na formaccedilatildeo inicial e continuada de professores e gestores escolares A concepccedilatildeo

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MARTINS Thaiacutes Regina Miranda SLAVEZ Milka Helena Carrilho Um estudo sobre programas de iniciaccedilatildeo agrave praacutetica profissional de professores no Brasil o PIBID e o estaacutegio de Residecircncia Ensino amp Pesquisa v 13 n 01 p 29-41 2016

MARQUES Danielle Vieira Aquino MUumlLLER Fernanda Experiecircncias com blog na pesquisa e na formaccedilatildeo inicial de professoras de educaccedilatildeo infantil ETD-Educaccedilatildeo Temaacutetica Digital v 14 n 1 p 43-61 2012

MARTINS E Famiacutelia e escola no contexto de um programa de residecircncia pedagoacutegica um estudo a partir do enfoque histoacuterico-cultural Educaccedilatildeo Sociedade amp Culturas v 37 p 89-107 2012

MEKSENAS Paulo Sociologia da educaccedilatildeo uma introduccedilatildeo ao estudo da escola no processo de transformaccedilatildeo social Satildeo Paulo Loyola 2002

MORETTI Vanessa Dias MARTINS Edna Atividade de ensino mediaccedilatildeo e aprendizagem da docecircncia na residecircncia pedagoacutegica uma anaacutelise a partir da teoria histoacuterico-cultural Revista Contrapontos v 15 n 3 p 394-411 2015

MORETTI Vanessa Dias A articulaccedilatildeo entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores que ensinam matemaacutetica o caso da Residecircncia Pedagoacutegica da Unifesp Revista Educaccedilatildeo Porto Alegre 2011 v 34 n 3 p 385-390 2011

NEVES Vanessa Ferraz Almeida CASTANHEIRA Maria Luacutecia GOUVEcircA Maria Cristina Soares O letramento e o brincar em processos de socializaccedilatildeo na educaccedilatildeo infantil brincadeiras diferentes Revista Brasileira de Educaccedilatildeo v 20 n 60 p 215-

244 2015

NOacuteVOA Antoacutenio Os professores e as Histoacuterias da Sua Vida In NOacuteVOA Antoacutenio (org) Vidas de Professores 2ordf ed Porto Porto Editora p 18-30 2000

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POLADIAN Marina Lopes Pedrosa Estudo sobre o Programa de residecircncia pedagoacutegica da Unifesp uma articulaccedilatildeo entre Universidade e escola na formaccedilatildeo de professores Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia da Educaccedilatildeo) - Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Satildeo Paulo 2014

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ROSEMBERG Fulvia Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees raciais a tensatildeo entre igualdade e diversidade Cadernos de Pesquisa v 44 n 153 p 742-759 2014

SILVA Adriana BUFALO Joseane O espaccedilo na pedagogia da educaccedilatildeo infantil faacutebula perversidade e possibilidade In Culturas infantis em creches e preacute-escolas estaacutegio e pesquisa Campinas SP Autores Associados 2011

TARDIF Maurice A profissionalizaccedilatildeo do ensino passados trinta anos dois passos para a frente trecircs para traacutes Educaccedilatildeo e Sociedade Campinas SP v34 n123 p

551-571 2013

VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

Correspondecircncia

Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Maria de Faacutetima Carvalho ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

E-mail emartinsunifespgmailcom ndash carvalhomdfgmailcom ndash

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final de estaacutegio pelo grupo Eacute sobre os registros do blog que incidiraacute nossa anaacutelise

considerando para tanto inquietaccedilotildees observaccedilotildees e reflexotildees registradas pelos

residentes nos anos de 2015 2016 e 2017

O blog da residecircncia ou diaacuterio de campo online consiste em uma ferramenta

virtual na qual satildeo realizados os registros de observaccedilotildees e experiecircncias significativas

vividas pelos residentes cotidianamente na escola Destaca-se que tal ferramenta eacute

de acesso restrito e apenas um uacutenico grupo de alunos e professores preceptores da

Universidade podem participar em cada escola acompanhada Deste modo nem os

professores ou quaisquer pessoas das escolas-campo podem acessar tal instrumento

O blog eacute construiacutedo pelo professor preceptor a cada novo grupo de residentes

assegurando o sigilo das informaccedilotildees registradas A ferramenta possibilita a

construccedilatildeo coletiva de diaacutelogos sobre questotildees observadas e a mediaccedilatildeo dos

conhecimentos dos residentes pelos seus supervisores Assim os estudantes podem

realizar trocas sobre suas vivecircncias muitas vezes similares agraves que ocorrem na mesma

instituiccedilatildeo ainda que estejam em turmas de idades diferentes Permite tambeacutem que

preceptores acompanhem diariamente seus residentes respondendo as indagaccedilotildees

e inquietaccedilotildees do grupo que participa do dia-a-dia na escola

Aleacutem de cumprir todos os objetivos de um caderno de campo comum o blog

permite ao preceptor mesmo agrave distacircncia o acompanhamento contiacutenuo do grupo de

estudantes o que lhe permite planejar as atividades semanais de supervisatildeo de forma

a responder as demandas dos alunos e esses uacuteltimos de compartilharem seus

diferentes pontos de vistas e as accedilotildees desenvolvidas na escola Assim no contexto

da residecircncia pedagoacutegica o blog ou caderno de campo online eacute o espaccedilomomento

de realizaccedilatildeo dos registros de observaccedilotildees e experiecircncias significativas vividas

cotidianamente na escola de educaccedilatildeo infantil e de acompanhamento e

problematizaccedilatildeo dessas vivecircncias pelos preceptores

Nesse caminho assinala-se a contribuiccedilatildeo de Vygotsky (1981) quando aponta

que as relaccedilotildees humanas satildeo sempre mediadas pelo meio social e pelos instrumentos

e signos que fazem parte das relaccedilotildees e dos contextos em que o homem estaacute inserido

Desse modo

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A atividade praacutetica do homem portanto se faz duplamente mediada de uma parte estaacute mediada pelas ferramentas no sentido literal da palavra e de outra parte mediada pelas ferramentas no sentido figurado pelas ferramentas do pensamento pelos meios com a ajuda dos quais se realiza a operaccedilatildeo intelectual ou seja mediada com a ajuda das palavras (VYGOTSKI 19302006a p 165)

Nessa direccedilatildeo conveacutem destacar a importacircncia do blog como instrumento social

representativo da incorporaccedilatildeo da tecnologia ao dia a dia dos estudantes e da

consideraccedilatildeo da mediaccedilatildeo tecnoloacutegica em processos de aprendizagem e

desenvolvimento dos graduandos

Diferente de outras formas de relacionamento virtual (e-mail chat instant

messages listas de discussatildeo etc) e de ferramentas virtuais convencionais ndash como

os sites ndash o blog caracteriza-se pela facilidade de sua criaccedilatildeo e manutenccedilatildeo o que eacute

definido pela organizaccedilatildeo automaacutetica das mensagens ndash posts ndash pelo sistema

dinamizando seu uso e favorecendo a construccedilatildeo de diaacuterios coletivos mantidos por

vaacuterios usuaacuterios Tais caracteriacutesticas favorecem o uso do blog em processos de ensino-

aprendizagem tendo em vista a interaccedilatildeo a troca o diaacutelogo como forma de partilha e

construccedilatildeo de conhecimentos (MARQUES MULLER 2012)

O blog permite portanto o compartilhamento de informaccedilotildees e a interaccedilatildeo

entre estudantes do mesmo grupo e o mesmo preceptor em uma mesma escola

Todos podem ler e comentar as postagens funcionando como um ponto de encontro

entre alunos e preceptores Assim nossa atenccedilatildeo agraves postagens dos estudantes no

blog eacute dirigida pelo objetivo de dar visibilidade a dimensatildeo social das praacuteticas de

registro do observadovivido nos processos formativos que emergem na experiecircncia

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil Assumimos o caraacuteter histoacuterico-

cultural da pesquisa do meacutetodo do objeto de estudo e do proacuteprio conhecimento como

construccedilatildeo que se realiza entre sujeitos (FREITAS 2009) Dessa forma acredita-se

que o momento de elaboraccedilatildeo do vivido ndash o registro no caderno de campoblog ndash

deflagra no estudante a necessidade de reflexatildeo sobre os processos de ensino-

aprendizagem em curso no acircmbito do estaacutegio-residecircncia pedagoacutegica

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Registros no caderno de campo online o olhar do residente sobre a escola de

educaccedilatildeo infantil

Nos primeiros dias de imersatildeo na escola os residentes satildeo orientados a

realizar uma observaccedilatildeo atenta dos espaccedilos da instituiccedilatildeo A partir da leitura do texto

de Silva e Bufalo (2011) sobre culturas escolares os residentes descrevem em seus

primeiros registros detalhes fiacutesicos sobre a escola Muitos acabam desenhando a

planta baixa ou tirando fotos de salas de aulas parques e paacutetios e compartilhando no

caderno de campo online (blog) para comeccedilarem a pensar sobre o contexto e os

espaccedilos que podem favorecer a aprendizagem e o desenvolvimento da crianccedila

pequena como descrito no excerto abaixo

Uma coisa que me chamou atenccedilatildeo foi que natildeo possuem um espaccedilo para atividade fiacutesica essas satildeo realizadas no paacutetio que eacute proacuteximo as salas o barulho acaba atrapalhando os demais O parque estaacute interditado por ordem da diretora ou seja natildeo possuem lugar para brincar O dia das crianccedilas foi pautado em ficar sentado e quieto vendo um filme que a maioria jaacute tinha assistido (Relato da residente N 2017)

Formas de organizaccedilatildeo de espaccedilos e tempos remetem agrave organizaccedilatildeo da rotina

Sobre esse tema grande quantidade de postagens textos diz respeito a como as

atividades diaacuterias satildeo organizadas na escola Em alguns registros como o

apresentado a seguir aparece a problematizaccedilatildeo da forma de organizaccedilatildeo das

atividades

730 (15min) - a professora colocou o cabeccedilalho na lousa com a data e fez a contagem coletiva das crianccedilas 745 (45min) - a professora retomou o que eles haviam aprendido sobre os iacutendios entregou massinha e os orientou a modelar utensiacutelios indiacutegenas 830 (35min) - pintura de desenho xerocado que seraacute colado na capa do caderno de atividades 905 (25min) - brincadeira livre no paacutetio interno no brinquedatildeo que fica no final da escadarampa sup2940 (30min) - brincadeira em sala Gato mia 1010 (ateacute as crianccedilas irem embora) - a professora entregou uma folha com a letra da canccedilatildeo 1 2 3 indiozinhos cantou a muacutesica com eles sentados em seus lugares pediu para eles circularem as letras A e I e depois pintar a ilustraccedilatildeo () (Relato da residente J 2015)

A rotina observada e registrada pela residente configura-se como um dos

aspectos mais relevantes na vida da crianccedila que se encontra na escola de Educaccedilatildeo

Infantil Barbosa (2006) aponta que esse eacute um dos elementos que integram as praacuteticas

educativas que devem ser observadas e planejadas com regularidade objetivando a

operacionalizaccedilatildeo do cotidiano da escola de maneira que possa contribuir na

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constituiccedilatildeo da subjetividade dos atores escolares Desse modo pensar e

compreender a rotina como um fator presente e essencial na educaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute um passo promissor para que o residente acompanhe como as atividades

cotidianas da escola se materializam e datildeo base para a organizaccedilatildeo da praacutetica

pedagoacutegica devendo estar presente no desenvolvimento curricular

O planejamento das atividades na educaccedilatildeo infantil tem estreita ligaccedilatildeo com a

rotina Ao observar e refletir sobre a vida e as experiecircncias das crianccedilas na escola os

residentes satildeo remetidos a memoacuteria agrave lembranccedila do que tambeacutem foi um dia vivido

por eles em suas experiecircncias escolares Como apontado por Meksenas (2002)

ldquonunca somos testemunhas objetivas observando objetos e sim sujeitos observando

outros sujeitosrdquo (p 116)

Estive tentando lembrar nas uacuteltimas semanas o que eu fazia na minha preacute-escola Eu comecei no maternal com 3 anos ()Tenho vagas lembranccedilas de duas salas de aula uma do preacute III e a outra acho que era do preacute I Era uma escola particular dessas pequenas de bairro Lembro que a turma natildeo era tatildeo numerosa quanto essa que estou vendo na residecircncia mas a sala tinha uma organizaccedilatildeo parecida eram mesas e cadeiras enfileiradas nas duas () Eu estava com 5 anos Lembro que a gente tinha uma apostila no preacute I eu gostava de terminar tudo raacutepido para dormir Depois a professora comeccedilou a me dar gibi para eu ficar folheando Tenho na minha memoacuteria que as coisas que a gente fazia na escola eram chatas e muito infantis bobas demais Agora eu penso talvez as professoras ficassem me ocupando com massinha e pinturas todo dia tambeacutem como eu vejo na residecircncia e por isso eu achava muito chato O que seraacute que essas crianccedilas pensam disso O que seraacute que elas acham mais legal na escola Eu vejo que elas gostam muito de fazer liccedilatildeo essas de folhinha que a professora daacute e todos os dias elas perguntam Mas eu natildeo me conformo como elas acham isso tatildeo legal (Relato da Residente F 2017)

Sabemos que a memoacuteria eacute mediada pelo signo pelas interaccedilotildees sociais pelo

outro Braga (1997) dirige nosso olhar para o ldquoprocesso de apropriaccedilatildeo das formas

culturais de interaccedilatildeo que caracterizam a memoacuteria humanardquo Para a autora ldquoa

memoacuteria do homem soacute se configura no movimento discursivo e coletivo por sua

natureza cultural e simboacutelicardquo No registro acima o observado mobiliza as lembranccedilas

da residente aquilo que foi tambeacutem vivido na escola de sua infacircncia Entre lembranccedilas

e interrogaccedilotildees emergem as construccedilotildees formativas em um processo dinacircmico ndash

interativo cultural e simboacutelico Processo que potildeem em relaccedilatildeo vivecircncias atuais e

passadas que invocam sentidos e significados atribuiacutedos ao vivido que ocorre nas

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contradiccedilotildees entre aquilo que eacute rememorado pela estudante e o que efetivamente eacute

observado nas relaccedilotildees estabelecidas no contato com o cotidiano da escola

Aleacutem da rotina e da organizaccedilatildeo de tempos e espaccedilos em sua relaccedilatildeo com as

praacuteticas pedagoacutegicas os relatos dos estudantes se reportam agraves diferentes dimensotildees

da gestatildeo escolar Os registros destacam suas observaccedilotildees nas H A (hora atividade)

ou reuniotildees que eventualmente participam e com frequecircncia observam a postura da

equipe em relaccedilatildeo a presenccedila do residente Em seus relatos questionam o caraacuteter

da gestatildeo a qualidade da relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo entre os professores as discussotildees

que remetem a construccedilatildeo e discussatildeo do projeto poliacutetico pedagoacutegico e os papeis

desempenhados pelos diferentes educadores na construccedilatildeo do trabalho de educaccedilatildeo

da infacircncia

Completamos nesta semana 4 dias de participaccedilatildeo nas Horas Atividades (HA) destinada agrave formaccedilatildeo docente organizaccedilatildeo dos registros e planejamento das atividades pedagoacutegicas O que pude por meio da observaccedilatildeo constatar que o papel do Coordenador Pedagoacutegico que eacute fundamental nesse momento de formaccedilatildeo pois eacute ele o mediador desse processo acaba por se tornar distante e sem intervenccedilotildees no que adentra a orientaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico docente (Relato da estudante M 2015)

Na experiecircncia cotidiana de imersatildeo na escola eacute possiacutevel verificar as tensotildees

vivenciadas entre os professores e o papel da coordenaccedilatildeo pedagoacutegica A teoria

discutida na universidade pelos residentes assinala a importacircncia do papel do

coordenador pedagoacutegico na educaccedilatildeo infantil na praacutetica o residente percebe o quanto

a sua mediaccedilatildeo eacute fundamental na organizaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico e por outro

lado o quanto a sua ausecircncia pode interferir de forma negativa na orientaccedilatildeo das

atividades dos professores

Outra personagem que acaba sendo central na gestatildeo escolar eacute a direccedilatildeo que

nessa experiecircncia do residente tambeacutem eacute observada de forma criacutetica

A figura da diretora na escola foi a que mais me chamou a atenccedilatildeo ()imaginem que em nenhum momento percebi qualquer aproximaccedilatildeo da diretora com as crianccedilas em vaacuterios momentos acreditei que ela fosse algum teacutecnico administrativo pois apesar de estar no topo da piracircmide a referecircncia da gestatildeo a mesma se restringia a secretaria e natildeo se relacionava natildeo nos conhecia nem procurava nos conhecer Passou diversas vezes por grupos de crianccedilas e em nenhuma das vezes sequer olhou para elas Nunca apareceu em uma HA nunca percebi o seu contato com os professores e por diversas vezes me perguntei como eles se falavam qual era o seu relacionamento (Relato da residente B 2015)

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Sobre esse assunto estudos como os de Paro (2005) e Castro (2009) tem

assinalado o papel da gestatildeo e da administraccedilatildeo escolar como alicerce fundamental

nos processos de transformaccedilatildeo da escola puacuteblica brasileira Tais trabalhos tecircm

apontado a centralidade da direccedilatildeo escolar nas questotildees que envolvem os processos

de ensino e aprendizagem e as relaccedilotildees humanas presentes na equipe de trabalho

para aleacutem dos trabalhos administrativos e burocraacuteticos Natildeo eacute objetivo deste trabalho

fazer uma anaacutelise do papel do diretor na escola de educaccedilatildeo infantil mas cabe

assinalar que os estudantes residentes apontam o tema em seus registros e atentos

agraves demandas relativas ao papel do diretor indagam se como e quanto as lideranccedilas

escolares tecircm se envolvido com o trabalho administrativo dispendendo tempo para

um olhar mais atento agraves relaccedilotildees entre os professoresalunos funcionaacuterios da escola

observada

Em relaccedilatildeo agraves interaccedilotildees humanas outros registros dos residentes nos

remetem agraves maneiras como a escola lida com as famiacutelias das crianccedilas matriculadas

nas escolas Tais relatos natildeo satildeo tatildeo frequentes possivelmente porque essa eacute uma

relaccedilatildeo que se caracteriza pela assimetria de poderes e eacute pouco valorizada no dia a

dia escolar Os registros evocam situaccedilotildees vividas comentaacuterios ouvidos e

principalmente a necessidade de mudanccedila dos modos de conceber a crianccedila e suas

famiacutelias e de interagir com elas

A relaccedilatildeo entre professor e famiacutelia eacute mais uma dessas conexotildees que fazemos pela vida Por um lado haacute um profissional uma pessoa que estudou e eacute especialista em cuidar de crianccedilas Por outro famiacutelias que dificilmente conseguimos de fato perceber como satildeo suas estruturadas Famiacutelia hoje eacute coisa difiacutecil de entender Eacute matildee que mora sozinha com o filho eacute pais que trabalham e deixam os filhos na semana com tios avoacutes Eacute matildee solteira Eacute filho criado por pai viuacutevo Eacute histoacuteria que natildeo acaba mais Na hora da saiacuteda vamos conhecendo um pouquinho da estrutura familiar de cada crianccedila tentando perceber como se daacute a relaccedilatildeo entre a famiacutelia e a escola mas devemos ter um pouco de cuidado com esse processo (Relato do estudante J 2015)

Aleacutem da residente ter um olhar para os diferentes tipos de arranjos familiares

tambeacutem busca compreender a especificidade de cada famiacutelia considerando o papel

da mulher e de matildee trabalhadora com filhos na escola puacuteblica

(hellip) Veja esses apontamentos uma menina na sala estaacute com piolho a professora disse que jaacute alertou a matildee mas como eacute matildee solteira soacute pode cuidar da filha no domingo O outro menino que natildeo se interessa pelas atividades e responde a educadora tambeacutem teve a matildee notificada mas como

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a mesma eacute separada do marido natildeo faz nada O fato da mulher trabalhar a semana e ter folga aos domingos natildeo significa que ela seja uma maacute matildee pelo contraacuterio significa que ela rala muito para colocar comida no prato A presenccedila ou natildeo de um homem natildeo condiciona nada A escola natildeo pode ser um ambiente de roacutetulos ela deve estar aberta agraves diferenccedilas acolhendo e buscando outras maneiras e formas de aproximaccedilatildeo com a famiacutelia compreendendo a responsabilidade compartilhada que carregam (Registro da residente B 2015)

Os relatos demonstram natildeo soacute o quanto estatildeo atentos para como a escola lida

com as relaccedilotildees familiares mas sobretudo assinalam como tecircm se configurado as

formaccedilotildees das famiacutelias na atualidade Um estudo de Martins (2012) aponta o quanto

a experiecircncia de residecircncia pedagoacutegica possibilita aos estudantes um contato mais

expressivo com a realidade da escola puacuteblica de periferia urbana Aleacutem de observar

as relaccedilotildees institucionais o residente pode ser sensibilizado frente agraves dificuldades

vividas pelas famiacutelias e tendem a perceber o preconceito em relaccedilatildeo aos vaacuterios

arranjos familiares vivenciados pelas crianccedilas mais pobres e como a escolarizaccedilatildeo

dos pais pode afetar a vida dos filhos Os registros dos residentes demonstram como

ldquoos contextos de vida das crianccedilas que frequentam a escola puacuteblica de periferia

passam a ser compreendidos de uma forma concreta e as relaccedilotildees do espaccedilo familiar

com o espaccedilo escolar passam a ter uma conexatildeo cotidianardquo (MARTINS 2012 p 95)

Outra temaacutetica recorrente nos registros dos estudantes diz respeito ao processo

de escolarizaccedilatildeo das praacuteticas da educaccedilatildeo da infacircncia Tal perspectiva surge quando

os residentes referem aos usos dos brinquedos e agraves brincadeiras agrave presenccedila da

leitura e contaccedilatildeo de histoacuterias aos modos de introduccedilatildeo do desenho ao uso de novas

tecnologias e aos modos de avaliar agraves crianccedilas Tal perspectiva escolarizante emerge

em oposiccedilatildeo ao luacutedico como princiacutepio e forma de organizaccedilatildeo das praacuteticas de

educaccedilatildeo junto agraves crianccedilas pequenas e algumas vezes a ela ainda se articula a

preocupaccedilatildeo em disciplinar as vivecircncias escolares sondagens filas broncas e

silecircncios coexistem com desenhos Tv computadores e brincadeiras Os registros nos

dizem de uma escola que hesita entre coibir e promover a expressatildeo das muitas

linguagens da imaginaccedilatildeo e movimento das crianccedilas

Na semana de 2310 a 2710 e como previsto na reuniatildeo de pais a professora realizou a sondagem com as crianccedilas Teoricamente sei como funciona o procedimento mas me questiono se deve ser realizada na Ed Infantil Tambeacutem me pergunto se a sondagem vai muito aleacutem do conhecimento das crianccedilas Por exemplo algumas escrevem o proacuteprio nome

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e algumas palavras mais comuns a elas outras ainda nem reconhecem as letras do alfabeto A sondagem feita abarcou o nome palavras simples um pouco mais complexas e uma frase inteira A minha duacutevida eacute se a sondagem que vai muito aleacutem dos conhecimentos da sala eacute comum e necessaacuteria ainda mais na Ed Infantil (Relato do residente N 2017)

O debate em torno das questotildees que envolvem a escolarizaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute bastante antigo e recorrente Pesquisas como as de Neves Castanheira

e Gouveia (2015) assinalam a partir de autores que estudaram essa temaacutetica como

a perspectiva escolarizante de trabalho com a crianccedila pequena traz seacuterias implicaccedilotildees

para o desenvolvimento infantil justamente porque rompe com as formas como elas

ldquointeragem com a escrita fora da escola destituindo-a de significados pessoais e

sociais e dificulta portanto que as atividades desenvolvidas no espaccedilo escolar

envolvam a ludicidade caracteriacutestica fundamental dessa fase do desenvolvimentordquo

(p 217)

Os residentes parecem estar muito atentos a essas questotildees porque participam

de discussotildees sistemaacuteticas sobre o assunto tanto nas aulas teoacutericas na Universidade

quanto nas reuniotildees de orientaccedilatildeo com os preceptores do Programa de Residecircncia

Muitos estudantes satildeo levados a refletir sobre o assunto logo nos primeiros dias de

imersatildeo na escola

Resolvi mudar o formato do meu relato referente agrave imersatildeo inicial Pois passei por uma situaccedilatildeo em sala que me provocou tal accedilatildeo Devido agrave imposiccedilatildeo de escolarizaccedilatildeo percebida na turma na qual acompanho Onde hoje me emocionei com o choro insistente do aluno BG com as matildeos estremecidas na tentativa de segurar o laacutepis para ldquofazer liccedilatildeordquo (Relato da Residente M 2015)

A partir do relato da residente percebe-se o quanto a questatildeo eacute relevante para

o campo da educaccedilatildeo infantil e da formaccedilatildeo de professores Nas observaccedilotildees e

relatos dos cadernos de campo natildeo eacute incomum aparecerem longas narrativas sobre

os equiacutevocos que ocorrem nas praacuteticas pedagoacutegicas que envolvem a alfabetizaccedilatildeo e

letramento das crianccedilas pequenas Consideramos que questotildees como essas quando

problematizadas pelos estudantes nos horaacuterios de preceptoria ou mesmo nas

discussotildees com professores especialistas sobre o tema tendem a aproximaacute-los de

uma futura praacutetica profissional em que o trabalho com o desenvolvimento da escrita

seja realizado de forma a respeitar a infacircncia natildeo negando agrave crianccedila o seu direito ao

luacutedico mas tratando a apresentaccedilatildeo do mundo letrado como mais um momento

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prazeroso de aprendizagens Tal reflexatildeo eacute importante para os futuros professores

para que busquem compreender como inserir as crianccedilas no mundo letrado de

maneira que possam romper com a dicotomia entre o brincar e a leituraescrita

tomando como referecircncia o significado dessas accedilotildees para a crianccedila possibilitando a

conduccedilatildeo dos trabalhos na educaccedilatildeo infantil que tornem possiacutevel o brincar ldquoletrando

e alfabetizandordquo (NEVES CASTANHEIRA E GOUVEIA 2015)

Outra temaacutetica que aparece num nuacutemero expressivo de postagens diz respeito

ao olhar do residente para as praacuteticas educativas e as interaccedilotildees que ocorrem na

escola com relaccedilatildeo agrave inclusatildeo escolar das crianccedilas percebidas como ldquodiferentesrdquo

Destaca-se nesta temaacutetica observaccedilotildees a respeito de diferenccedilas de religiatildeo gecircnero

raccedilacor e tambeacutem aquelas relacionadas agrave deficiecircncia Haacute descriccedilotildees sobre como as

crianccedilas lidam com as diferenccedilas e as formas como os professores trabalham com

aquelas que possuem alguma dificuldade Algumas postagens ressaltam a

necessidade de formaccedilatildeo inicial e continuada dos educadores para lidarem com a

diversidade na escola

Pela primeira vez vivenciei preconceito racial de uma crianccedila com outra Nos momentos em que a profa distribui lego para as crianccedilas ela daacute tambeacutem um bonequinho para cada crianccedila Tem bonecos adultos crianccedilas homens mulheres e de diversas cores Os bonecos satildeo dados aleatoriamente ou escolhidos pela crianccedila conforme a professora passa de mesa em mesa Neste dia um menino negro estava com um boneco negro Um garoto se aproximou e disse ldquoCredo que boneco feio parece vocecircrdquo se direcionando ao menino O menino deu de ombros e continuou a brincar e poucos minutos depois a menina que estava ao seu lado me perguntou ldquoPor que o boneco dele eacute pretinho Eacute muito feiordquo Claro que conversei com ela e com o outro menino em outro momento calmamente falando das diversas cores que as pessoas tecircm e que natildeo haacute isso de feio e bonito aproveitando para falar sobre diversidade e etc Mais para o final da conversa a menina me disse ldquoMeu pai eacute pretinho ele eacute bonitordquo Respondi a menina dizendo que a beleza natildeo estaacute na cor da pele do cabelo ou dos olhos A cena toda me fez refletir que a menina jaacute deve ter ouvido esse tipo de afirmaccedilatildeo errocircnea Jaacute comentei mais de uma vez sobre o preconceito de gecircnero ser muito forte mas e o racial algueacutem mais vivenciou esse tipo de preconceito durante esta residecircncia (Relato do residente T 2017)

Rosemberg (2014) chama a atenccedilatildeo para o tema da diversidade como uma

questatildeo circunscrita na histoacuteria da humanidade A diferenciaccedilatildeo entre os grupos

humanos ou pessoas com atributos que classificam e separam o ldquoeurdquo do ldquooutrordquo

parece constituir as diversas manifestaccedilotildees de culturas humanas Assim a autora

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desnaturaliza a identidade e a diferenccedila apontando o seu caraacuteter cultural social e

histoacuterico Contudo esse eacute um dos temas que tem chamado cada vez mais a atenccedilatildeo

de educadores desde a educaccedilatildeo infantil jaacute que muitas vezes as questotildees que

envolvem a diferenccedila e o diferente passam por processos discriminatoacuterios e

preconceituosos como apontado no relato do estudante ao observar as interaccedilotildees

entre as crianccedilas no que se refere ao quesito raccedilacor

Marinho e Martins (2016) em estudo sobre formaccedilatildeo de professoras que atuam

na educaccedilatildeo infantil constatam a escassez ou inexistecircncia de disciplinas na formaccedilatildeo

inicial de professores que abarquem as questotildees eacutetnico-raciais denunciando o natildeo

cumprimento das leis que entre outras prescriccedilotildees preveem que instituiccedilotildees de niacutevel

superior proporcionem aos futuros(as) professoresas a formaccedilatildeo adequada para

lidarem com as relaccedilotildees raciais multieacutetnica e multicultural da sociedade brasileira

Nesse sentido ao trazerem suas inquietaccedilotildees sobre como as crianccedilas lidam com as

diferenccedilas no contexto da escola os residentes se aproximam das discussotildees a

respeito dos processos discriminatoacuterios oportunizando momentos em que tais

temaacuteticas possam ser discutidas entre professores preceptores e colegas do

programa de estaacutegio

Aleacutem da questatildeo racial outros relatos nos datildeo conta de refletir e discutir sobre

as relaccedilotildees que envolvem as crianccedilas com deficiecircncia na escola

() O que me chamou atenccedilatildeo foi que na quarta (2204) H chegou na escola e decidiu mudar de lugar foi sentar bem ao lado do D (uma crianccedila que foi diagnosticada com autismo de ldquograu leverdquo segundo a professora) eu fiquei observando como seria a relaccedilatildeo deles H trouxe um caderno de desenho o abriu na mesa e dividiu metade da folha para ele e para D depois na hora de descer ele segurou a matildeo do D e ficou durante o almoccedilo todo cuidando de D o orientou a pegar a comida sentar comer devagar e quando natildeo quisesse mais deveria jogar a comida no lixo e durante todo o dia H permaneceu cuidando de D A professora achou estranho pois naquele dia ela natildeo havia chamado a atenccedilatildeo de H ateacute me falou ldquoEle deve estar aprontando e D eacute bobatildeo pode se machucarrdquo e decidiu intervir e pediu para que H mudasse de lugar e parasse de cuidar de (Relato do residente L 2015)

A partir da narrativa eacute possiacutevel refletir sobre o preparo dos professores para

lidar com as diferenccedilas individuais na educaccedilatildeo infantil A inclusatildeo escolar de crianccedilas

com deficiecircncia ocorre mediante poliacuteticas puacuteblicas de inclusatildeo contudo haacute uma

grande distacircncia entre a poliacutetica puacuteblica e a praacutetica pedagoacutegica nos contextos

escolares pois natildeo se aprofunda ldquoo debate sobre os meios os fins e as estrateacutegias

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para a implementaccedilatildeo da poliacutetica de ampliaccedilatildeo da rede de educaccedilatildeo infantilrdquo

(BRUNO 2008 p 59)

Outros registros que tratam da temaacutetica da inclusatildeo de crianccedilas com

deficiecircncia mostram o quanto a escola estaacute despreparada para lidar com essa

questatildeo Os relatos e inquietaccedilotildees dos estudantes nos possibilitam a identificaccedilatildeo de

processos discriminatoacuterios de resistecircncias e acomodaccedilotildees dos profissionais e do

distanciamento de uma praacutetica verdadeiramente inclusiva na esfera das praacuteticas

educativas cotidianas O que se percebe nas discussotildees sobre o assunto eacute que os

residentes enquanto futuros professores muito tecircm a aprender sobre a acolhida das

famiacutelias e das crianccedilas ldquodiferentesrdquo ou com deficiecircncia na constante reflexatildeo sobre o

comportamento atitudes e posturas do educador frente ao trabalho pedagoacutegico

Outras temaacuteticas tatildeo importantes como as que discutimos aqui tem sido objeto

de interesse dos estudantes em processo de imersatildeo nas escolas-campo Haacute uma

gama de registros sobre categorias que envolvem a crianccedila pequena nas atividades

do brincar a disciplina e a coerccedilatildeo dos educadores na tentativa de manter o controle

das crianccedilas e dos comportamentos considerados inadequados Muitos residentes se

surpreendem como essa coerccedilatildeo ocorre demasiadas vezes na escola e nas reuniotildees

de supervisatildeo eacute muito comum questionarem junto ao preceptor formas de

compreender por que algumas praacuteticas coercitivas satildeo tatildeo presentes na educaccedilatildeo

infantil

Consideraccedilotildees Finais

A experiecircncia de estaacutegio no Programa de Residecircncia Pedagoacutegica requer de

estudantes e professores uma atitude de intensa accedilatildeo e reflexatildeo Na perspectiva de

observaccedilatildeo participante eacute que a imersatildeo dos residentes na escola eacute orientada

embora natildeo haja uma intervenccedilatildeo direta planejada e sistemaacutetica sobre os modos de

fazer da escola e dos professores Possiacuteveis intervenccedilotildees sobre a escola suscitadas

pela presenccedila da universidade (de preceptores e residentes) satildeo uma contingecircncia

dos processos de formaccedilatildeo de condiccedilotildees e modos de seu desenvolvimento e eacute assim

que se define o lugar do residente e da preceptoria junto a escola o caraacuteter da

observaccedilatildeo participante a ser realizada durante o estaacutegio e sua conduccedilatildeo e discussatildeo

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no acircmbito escolar As posiccedilotildees dos residentes reeditam questotildees que mobilizam a

imersatildeo e reflexatildeo sobre o vivido como e quando participar O que como e quando

registrar sobre a observaccedilatildeo participante sobre o que se vivencia Como fazer uso

das ferramentas disponiacuteveis na escola e dos subsiacutedios teoacutericos oferecidos durante a

proacutepria residecircncia ou estudados no curso de pedagogia elaborando impressotildees sobre

o que descreve e refletindo sobre o que vive e elabora

A retomada dos escritos e reflexotildees dos estudantes participantes do Programa

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil nos trazem pistas relevantes para a

compreensatildeo natildeo somente dos seus processos formativos mas tambeacutem suscitam

atenccedilatildeo aos temas e questotildees emergentes do cotidiano das crianccedilas nas escolas de

Educaccedilatildeo Infantil Sabe-se que o processo de escrita eacute composto de idas e vindas

de avanccedilos e retrocessos de duacutevidas e certezas percebidas nos textos e contextos

apresentados pelos estudantes neste processo formativo especiacutefico

As postagens guardam caracteriacutesticas especiacuteficas correlatas ao vivido nas

praacuteticas de estaacutegio de acordo com as finalidades comunicativas e formativas do

caderno de campoblog e com especificidades ndash limites e possibilidades ndash que se

dimensionam nestas praacuteticas Os estudantes registram o que observam o que

vivenciam mas natildeo soacute Em muitos registros suas impressotildees (con)fundem-se com o

observado vatildeo aleacutem da descriccedilatildeo interpretando o visto o vivido e outras vezes para

alguns o registro se faz espaccedilo de recuperaccedilatildeo das proacuteprias vivecircncias e dos

elementos teoacutericos estudados

Nesta experiecircncia a liberdade na escolha e escrita dos temas dos cadernos de

campo tem permitido que o processo formativo de cada estudante aconteccedila de forma

uacutenica e original pois apesar de estarem imersos em ambientes semelhantes (em

alguns casos mesmas escolas-campo) e possuiacuterem referenciais teoacutericos semelhantes

(provenientes das unidades curriculares obrigatoacuterias e eletivas do Curso de

Pedagogia) os temas e questotildees que recebem a atenccedilatildeo de cada um satildeo distintos e

trabalhados teoricamente a partir das anguacutestias e inquietaccedilotildees individuais Entretanto

apesar das produccedilotildees escritas serem individuais ao serem publicizadas em reuniotildees

de orientaccedilatildeo ou ateacute no suporte virtual do blog elas podem ser compartilhadas e

tornam-se objeto comum de discussotildees e aprendizagens

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

Referecircncias bibliograacuteficas

BARBOSA Maria Carmem Silveira Por amor e por forccedila rotinas na Educaccedilatildeo Infantil Porto Alegre Artmed 2006

BRAGA Elizabeth dos Santos Viacutedeo escritas leituras recordaccedilotildees cultura e memoacuteria na sala de aula GOacuteES Maria Cecilia Rafael e SMOLKA Ana Luiza Bustamante A significaccedilatildeo nos espaccedilos Educacionais ndash Interaccedilatildeo social e subjetivaccedilatildeo Campinas Papirus Editora1997 p 87-110

BRUNO Marilda Moraes Garcia A construccedilatildeo da escola inclusiva um a anaacutelise das poliacuteticas puacuteblicas e da praacutetica pedagoacutegica no contexto da educaccedilatildeo infantil Revistambienteeducaccedilatildeo v 1 n 2 p56-67 2008

CASTRO Marta Luz Sisson de Formaccedilatildeo do Diretor de Escola do Estado do Rio Grande do Sul implicaccedilotildees para a praacutetica Educaccedilatildeo v 32 n 2 p 114-121 2009

FEUERWERKER Laura Mudanccedilas na educaccedilatildeo meacutedica e residecircncia meacutedica no Brasil Interface comum sauacutede educaccedilatildeo vol 2 n3 p 51-71 1998

FREITAS Maria Teresa Assunccedilatildeo A pesquisa de abordagem histoacuterico-cultural um espaccedilo educativo de constituiccedilatildeo de sujeitos Revista Teias v 10 n 19 p 01-12 2009

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto Residecircncia Pedagoacutegica como diaacutelogo permanente entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores In DALBEN A et al (org) Convergecircncias e tensotildees no campo da formaccedilatildeo e do trabalho docente Belo

Horizonte Autecircntica v 1 p 375-392 2010

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto LUGLI Rosaacuterio Silvana Genta Diaacutelogos pertinentes na formaccedilatildeo inicial e continuada de professores e gestores escolares A concepccedilatildeo

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do Programa de Residecircncia Pedagoacutegica na UNIFESP Cadernos de Educaccedilatildeo n

46 p 62-82 2014

MARINHO Ceacutesar Henrique MARTINS Edna Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees eacutetnico-raciais impactos da formaccedilatildeo docente nas praacuteticas educativas Revista Educaccedilatildeo e Cultura Contemporacircnea v 14 n 34 p 42-63 2016

MARTINS Thaiacutes Regina Miranda SLAVEZ Milka Helena Carrilho Um estudo sobre programas de iniciaccedilatildeo agrave praacutetica profissional de professores no Brasil o PIBID e o estaacutegio de Residecircncia Ensino amp Pesquisa v 13 n 01 p 29-41 2016

MARQUES Danielle Vieira Aquino MUumlLLER Fernanda Experiecircncias com blog na pesquisa e na formaccedilatildeo inicial de professoras de educaccedilatildeo infantil ETD-Educaccedilatildeo Temaacutetica Digital v 14 n 1 p 43-61 2012

MARTINS E Famiacutelia e escola no contexto de um programa de residecircncia pedagoacutegica um estudo a partir do enfoque histoacuterico-cultural Educaccedilatildeo Sociedade amp Culturas v 37 p 89-107 2012

MEKSENAS Paulo Sociologia da educaccedilatildeo uma introduccedilatildeo ao estudo da escola no processo de transformaccedilatildeo social Satildeo Paulo Loyola 2002

MORETTI Vanessa Dias MARTINS Edna Atividade de ensino mediaccedilatildeo e aprendizagem da docecircncia na residecircncia pedagoacutegica uma anaacutelise a partir da teoria histoacuterico-cultural Revista Contrapontos v 15 n 3 p 394-411 2015

MORETTI Vanessa Dias A articulaccedilatildeo entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores que ensinam matemaacutetica o caso da Residecircncia Pedagoacutegica da Unifesp Revista Educaccedilatildeo Porto Alegre 2011 v 34 n 3 p 385-390 2011

NEVES Vanessa Ferraz Almeida CASTANHEIRA Maria Luacutecia GOUVEcircA Maria Cristina Soares O letramento e o brincar em processos de socializaccedilatildeo na educaccedilatildeo infantil brincadeiras diferentes Revista Brasileira de Educaccedilatildeo v 20 n 60 p 215-

244 2015

NOacuteVOA Antoacutenio Os professores e as Histoacuterias da Sua Vida In NOacuteVOA Antoacutenio (org) Vidas de Professores 2ordf ed Porto Porto Editora p 18-30 2000

PARO Vitor Henrique A educaccedilatildeo a poliacutetica e a administraccedilatildeo reflexotildees sobre a praacutetica do diretor de escola Educaccedilatildeo e Pesquisa v 36 n 3 p 763-778 2010

POLADIAN Marina Lopes Pedrosa Estudo sobre o Programa de residecircncia pedagoacutegica da Unifesp uma articulaccedilatildeo entre Universidade e escola na formaccedilatildeo de professores Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia da Educaccedilatildeo) - Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Satildeo Paulo 2014

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ROSEMBERG Fulvia Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees raciais a tensatildeo entre igualdade e diversidade Cadernos de Pesquisa v 44 n 153 p 742-759 2014

SILVA Adriana BUFALO Joseane O espaccedilo na pedagogia da educaccedilatildeo infantil faacutebula perversidade e possibilidade In Culturas infantis em creches e preacute-escolas estaacutegio e pesquisa Campinas SP Autores Associados 2011

TARDIF Maurice A profissionalizaccedilatildeo do ensino passados trinta anos dois passos para a frente trecircs para traacutes Educaccedilatildeo e Sociedade Campinas SP v34 n123 p

551-571 2013

VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

Correspondecircncia

Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Maria de Faacutetima Carvalho ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

E-mail emartinsunifespgmailcom ndash carvalhomdfgmailcom ndash

remarciliogmailcom

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A atividade praacutetica do homem portanto se faz duplamente mediada de uma parte estaacute mediada pelas ferramentas no sentido literal da palavra e de outra parte mediada pelas ferramentas no sentido figurado pelas ferramentas do pensamento pelos meios com a ajuda dos quais se realiza a operaccedilatildeo intelectual ou seja mediada com a ajuda das palavras (VYGOTSKI 19302006a p 165)

Nessa direccedilatildeo conveacutem destacar a importacircncia do blog como instrumento social

representativo da incorporaccedilatildeo da tecnologia ao dia a dia dos estudantes e da

consideraccedilatildeo da mediaccedilatildeo tecnoloacutegica em processos de aprendizagem e

desenvolvimento dos graduandos

Diferente de outras formas de relacionamento virtual (e-mail chat instant

messages listas de discussatildeo etc) e de ferramentas virtuais convencionais ndash como

os sites ndash o blog caracteriza-se pela facilidade de sua criaccedilatildeo e manutenccedilatildeo o que eacute

definido pela organizaccedilatildeo automaacutetica das mensagens ndash posts ndash pelo sistema

dinamizando seu uso e favorecendo a construccedilatildeo de diaacuterios coletivos mantidos por

vaacuterios usuaacuterios Tais caracteriacutesticas favorecem o uso do blog em processos de ensino-

aprendizagem tendo em vista a interaccedilatildeo a troca o diaacutelogo como forma de partilha e

construccedilatildeo de conhecimentos (MARQUES MULLER 2012)

O blog permite portanto o compartilhamento de informaccedilotildees e a interaccedilatildeo

entre estudantes do mesmo grupo e o mesmo preceptor em uma mesma escola

Todos podem ler e comentar as postagens funcionando como um ponto de encontro

entre alunos e preceptores Assim nossa atenccedilatildeo agraves postagens dos estudantes no

blog eacute dirigida pelo objetivo de dar visibilidade a dimensatildeo social das praacuteticas de

registro do observadovivido nos processos formativos que emergem na experiecircncia

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil Assumimos o caraacuteter histoacuterico-

cultural da pesquisa do meacutetodo do objeto de estudo e do proacuteprio conhecimento como

construccedilatildeo que se realiza entre sujeitos (FREITAS 2009) Dessa forma acredita-se

que o momento de elaboraccedilatildeo do vivido ndash o registro no caderno de campoblog ndash

deflagra no estudante a necessidade de reflexatildeo sobre os processos de ensino-

aprendizagem em curso no acircmbito do estaacutegio-residecircncia pedagoacutegica

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Registros no caderno de campo online o olhar do residente sobre a escola de

educaccedilatildeo infantil

Nos primeiros dias de imersatildeo na escola os residentes satildeo orientados a

realizar uma observaccedilatildeo atenta dos espaccedilos da instituiccedilatildeo A partir da leitura do texto

de Silva e Bufalo (2011) sobre culturas escolares os residentes descrevem em seus

primeiros registros detalhes fiacutesicos sobre a escola Muitos acabam desenhando a

planta baixa ou tirando fotos de salas de aulas parques e paacutetios e compartilhando no

caderno de campo online (blog) para comeccedilarem a pensar sobre o contexto e os

espaccedilos que podem favorecer a aprendizagem e o desenvolvimento da crianccedila

pequena como descrito no excerto abaixo

Uma coisa que me chamou atenccedilatildeo foi que natildeo possuem um espaccedilo para atividade fiacutesica essas satildeo realizadas no paacutetio que eacute proacuteximo as salas o barulho acaba atrapalhando os demais O parque estaacute interditado por ordem da diretora ou seja natildeo possuem lugar para brincar O dia das crianccedilas foi pautado em ficar sentado e quieto vendo um filme que a maioria jaacute tinha assistido (Relato da residente N 2017)

Formas de organizaccedilatildeo de espaccedilos e tempos remetem agrave organizaccedilatildeo da rotina

Sobre esse tema grande quantidade de postagens textos diz respeito a como as

atividades diaacuterias satildeo organizadas na escola Em alguns registros como o

apresentado a seguir aparece a problematizaccedilatildeo da forma de organizaccedilatildeo das

atividades

730 (15min) - a professora colocou o cabeccedilalho na lousa com a data e fez a contagem coletiva das crianccedilas 745 (45min) - a professora retomou o que eles haviam aprendido sobre os iacutendios entregou massinha e os orientou a modelar utensiacutelios indiacutegenas 830 (35min) - pintura de desenho xerocado que seraacute colado na capa do caderno de atividades 905 (25min) - brincadeira livre no paacutetio interno no brinquedatildeo que fica no final da escadarampa sup2940 (30min) - brincadeira em sala Gato mia 1010 (ateacute as crianccedilas irem embora) - a professora entregou uma folha com a letra da canccedilatildeo 1 2 3 indiozinhos cantou a muacutesica com eles sentados em seus lugares pediu para eles circularem as letras A e I e depois pintar a ilustraccedilatildeo () (Relato da residente J 2015)

A rotina observada e registrada pela residente configura-se como um dos

aspectos mais relevantes na vida da crianccedila que se encontra na escola de Educaccedilatildeo

Infantil Barbosa (2006) aponta que esse eacute um dos elementos que integram as praacuteticas

educativas que devem ser observadas e planejadas com regularidade objetivando a

operacionalizaccedilatildeo do cotidiano da escola de maneira que possa contribuir na

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constituiccedilatildeo da subjetividade dos atores escolares Desse modo pensar e

compreender a rotina como um fator presente e essencial na educaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute um passo promissor para que o residente acompanhe como as atividades

cotidianas da escola se materializam e datildeo base para a organizaccedilatildeo da praacutetica

pedagoacutegica devendo estar presente no desenvolvimento curricular

O planejamento das atividades na educaccedilatildeo infantil tem estreita ligaccedilatildeo com a

rotina Ao observar e refletir sobre a vida e as experiecircncias das crianccedilas na escola os

residentes satildeo remetidos a memoacuteria agrave lembranccedila do que tambeacutem foi um dia vivido

por eles em suas experiecircncias escolares Como apontado por Meksenas (2002)

ldquonunca somos testemunhas objetivas observando objetos e sim sujeitos observando

outros sujeitosrdquo (p 116)

Estive tentando lembrar nas uacuteltimas semanas o que eu fazia na minha preacute-escola Eu comecei no maternal com 3 anos ()Tenho vagas lembranccedilas de duas salas de aula uma do preacute III e a outra acho que era do preacute I Era uma escola particular dessas pequenas de bairro Lembro que a turma natildeo era tatildeo numerosa quanto essa que estou vendo na residecircncia mas a sala tinha uma organizaccedilatildeo parecida eram mesas e cadeiras enfileiradas nas duas () Eu estava com 5 anos Lembro que a gente tinha uma apostila no preacute I eu gostava de terminar tudo raacutepido para dormir Depois a professora comeccedilou a me dar gibi para eu ficar folheando Tenho na minha memoacuteria que as coisas que a gente fazia na escola eram chatas e muito infantis bobas demais Agora eu penso talvez as professoras ficassem me ocupando com massinha e pinturas todo dia tambeacutem como eu vejo na residecircncia e por isso eu achava muito chato O que seraacute que essas crianccedilas pensam disso O que seraacute que elas acham mais legal na escola Eu vejo que elas gostam muito de fazer liccedilatildeo essas de folhinha que a professora daacute e todos os dias elas perguntam Mas eu natildeo me conformo como elas acham isso tatildeo legal (Relato da Residente F 2017)

Sabemos que a memoacuteria eacute mediada pelo signo pelas interaccedilotildees sociais pelo

outro Braga (1997) dirige nosso olhar para o ldquoprocesso de apropriaccedilatildeo das formas

culturais de interaccedilatildeo que caracterizam a memoacuteria humanardquo Para a autora ldquoa

memoacuteria do homem soacute se configura no movimento discursivo e coletivo por sua

natureza cultural e simboacutelicardquo No registro acima o observado mobiliza as lembranccedilas

da residente aquilo que foi tambeacutem vivido na escola de sua infacircncia Entre lembranccedilas

e interrogaccedilotildees emergem as construccedilotildees formativas em um processo dinacircmico ndash

interativo cultural e simboacutelico Processo que potildeem em relaccedilatildeo vivecircncias atuais e

passadas que invocam sentidos e significados atribuiacutedos ao vivido que ocorre nas

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contradiccedilotildees entre aquilo que eacute rememorado pela estudante e o que efetivamente eacute

observado nas relaccedilotildees estabelecidas no contato com o cotidiano da escola

Aleacutem da rotina e da organizaccedilatildeo de tempos e espaccedilos em sua relaccedilatildeo com as

praacuteticas pedagoacutegicas os relatos dos estudantes se reportam agraves diferentes dimensotildees

da gestatildeo escolar Os registros destacam suas observaccedilotildees nas H A (hora atividade)

ou reuniotildees que eventualmente participam e com frequecircncia observam a postura da

equipe em relaccedilatildeo a presenccedila do residente Em seus relatos questionam o caraacuteter

da gestatildeo a qualidade da relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo entre os professores as discussotildees

que remetem a construccedilatildeo e discussatildeo do projeto poliacutetico pedagoacutegico e os papeis

desempenhados pelos diferentes educadores na construccedilatildeo do trabalho de educaccedilatildeo

da infacircncia

Completamos nesta semana 4 dias de participaccedilatildeo nas Horas Atividades (HA) destinada agrave formaccedilatildeo docente organizaccedilatildeo dos registros e planejamento das atividades pedagoacutegicas O que pude por meio da observaccedilatildeo constatar que o papel do Coordenador Pedagoacutegico que eacute fundamental nesse momento de formaccedilatildeo pois eacute ele o mediador desse processo acaba por se tornar distante e sem intervenccedilotildees no que adentra a orientaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico docente (Relato da estudante M 2015)

Na experiecircncia cotidiana de imersatildeo na escola eacute possiacutevel verificar as tensotildees

vivenciadas entre os professores e o papel da coordenaccedilatildeo pedagoacutegica A teoria

discutida na universidade pelos residentes assinala a importacircncia do papel do

coordenador pedagoacutegico na educaccedilatildeo infantil na praacutetica o residente percebe o quanto

a sua mediaccedilatildeo eacute fundamental na organizaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico e por outro

lado o quanto a sua ausecircncia pode interferir de forma negativa na orientaccedilatildeo das

atividades dos professores

Outra personagem que acaba sendo central na gestatildeo escolar eacute a direccedilatildeo que

nessa experiecircncia do residente tambeacutem eacute observada de forma criacutetica

A figura da diretora na escola foi a que mais me chamou a atenccedilatildeo ()imaginem que em nenhum momento percebi qualquer aproximaccedilatildeo da diretora com as crianccedilas em vaacuterios momentos acreditei que ela fosse algum teacutecnico administrativo pois apesar de estar no topo da piracircmide a referecircncia da gestatildeo a mesma se restringia a secretaria e natildeo se relacionava natildeo nos conhecia nem procurava nos conhecer Passou diversas vezes por grupos de crianccedilas e em nenhuma das vezes sequer olhou para elas Nunca apareceu em uma HA nunca percebi o seu contato com os professores e por diversas vezes me perguntei como eles se falavam qual era o seu relacionamento (Relato da residente B 2015)

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Sobre esse assunto estudos como os de Paro (2005) e Castro (2009) tem

assinalado o papel da gestatildeo e da administraccedilatildeo escolar como alicerce fundamental

nos processos de transformaccedilatildeo da escola puacuteblica brasileira Tais trabalhos tecircm

apontado a centralidade da direccedilatildeo escolar nas questotildees que envolvem os processos

de ensino e aprendizagem e as relaccedilotildees humanas presentes na equipe de trabalho

para aleacutem dos trabalhos administrativos e burocraacuteticos Natildeo eacute objetivo deste trabalho

fazer uma anaacutelise do papel do diretor na escola de educaccedilatildeo infantil mas cabe

assinalar que os estudantes residentes apontam o tema em seus registros e atentos

agraves demandas relativas ao papel do diretor indagam se como e quanto as lideranccedilas

escolares tecircm se envolvido com o trabalho administrativo dispendendo tempo para

um olhar mais atento agraves relaccedilotildees entre os professoresalunos funcionaacuterios da escola

observada

Em relaccedilatildeo agraves interaccedilotildees humanas outros registros dos residentes nos

remetem agraves maneiras como a escola lida com as famiacutelias das crianccedilas matriculadas

nas escolas Tais relatos natildeo satildeo tatildeo frequentes possivelmente porque essa eacute uma

relaccedilatildeo que se caracteriza pela assimetria de poderes e eacute pouco valorizada no dia a

dia escolar Os registros evocam situaccedilotildees vividas comentaacuterios ouvidos e

principalmente a necessidade de mudanccedila dos modos de conceber a crianccedila e suas

famiacutelias e de interagir com elas

A relaccedilatildeo entre professor e famiacutelia eacute mais uma dessas conexotildees que fazemos pela vida Por um lado haacute um profissional uma pessoa que estudou e eacute especialista em cuidar de crianccedilas Por outro famiacutelias que dificilmente conseguimos de fato perceber como satildeo suas estruturadas Famiacutelia hoje eacute coisa difiacutecil de entender Eacute matildee que mora sozinha com o filho eacute pais que trabalham e deixam os filhos na semana com tios avoacutes Eacute matildee solteira Eacute filho criado por pai viuacutevo Eacute histoacuteria que natildeo acaba mais Na hora da saiacuteda vamos conhecendo um pouquinho da estrutura familiar de cada crianccedila tentando perceber como se daacute a relaccedilatildeo entre a famiacutelia e a escola mas devemos ter um pouco de cuidado com esse processo (Relato do estudante J 2015)

Aleacutem da residente ter um olhar para os diferentes tipos de arranjos familiares

tambeacutem busca compreender a especificidade de cada famiacutelia considerando o papel

da mulher e de matildee trabalhadora com filhos na escola puacuteblica

(hellip) Veja esses apontamentos uma menina na sala estaacute com piolho a professora disse que jaacute alertou a matildee mas como eacute matildee solteira soacute pode cuidar da filha no domingo O outro menino que natildeo se interessa pelas atividades e responde a educadora tambeacutem teve a matildee notificada mas como

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a mesma eacute separada do marido natildeo faz nada O fato da mulher trabalhar a semana e ter folga aos domingos natildeo significa que ela seja uma maacute matildee pelo contraacuterio significa que ela rala muito para colocar comida no prato A presenccedila ou natildeo de um homem natildeo condiciona nada A escola natildeo pode ser um ambiente de roacutetulos ela deve estar aberta agraves diferenccedilas acolhendo e buscando outras maneiras e formas de aproximaccedilatildeo com a famiacutelia compreendendo a responsabilidade compartilhada que carregam (Registro da residente B 2015)

Os relatos demonstram natildeo soacute o quanto estatildeo atentos para como a escola lida

com as relaccedilotildees familiares mas sobretudo assinalam como tecircm se configurado as

formaccedilotildees das famiacutelias na atualidade Um estudo de Martins (2012) aponta o quanto

a experiecircncia de residecircncia pedagoacutegica possibilita aos estudantes um contato mais

expressivo com a realidade da escola puacuteblica de periferia urbana Aleacutem de observar

as relaccedilotildees institucionais o residente pode ser sensibilizado frente agraves dificuldades

vividas pelas famiacutelias e tendem a perceber o preconceito em relaccedilatildeo aos vaacuterios

arranjos familiares vivenciados pelas crianccedilas mais pobres e como a escolarizaccedilatildeo

dos pais pode afetar a vida dos filhos Os registros dos residentes demonstram como

ldquoos contextos de vida das crianccedilas que frequentam a escola puacuteblica de periferia

passam a ser compreendidos de uma forma concreta e as relaccedilotildees do espaccedilo familiar

com o espaccedilo escolar passam a ter uma conexatildeo cotidianardquo (MARTINS 2012 p 95)

Outra temaacutetica recorrente nos registros dos estudantes diz respeito ao processo

de escolarizaccedilatildeo das praacuteticas da educaccedilatildeo da infacircncia Tal perspectiva surge quando

os residentes referem aos usos dos brinquedos e agraves brincadeiras agrave presenccedila da

leitura e contaccedilatildeo de histoacuterias aos modos de introduccedilatildeo do desenho ao uso de novas

tecnologias e aos modos de avaliar agraves crianccedilas Tal perspectiva escolarizante emerge

em oposiccedilatildeo ao luacutedico como princiacutepio e forma de organizaccedilatildeo das praacuteticas de

educaccedilatildeo junto agraves crianccedilas pequenas e algumas vezes a ela ainda se articula a

preocupaccedilatildeo em disciplinar as vivecircncias escolares sondagens filas broncas e

silecircncios coexistem com desenhos Tv computadores e brincadeiras Os registros nos

dizem de uma escola que hesita entre coibir e promover a expressatildeo das muitas

linguagens da imaginaccedilatildeo e movimento das crianccedilas

Na semana de 2310 a 2710 e como previsto na reuniatildeo de pais a professora realizou a sondagem com as crianccedilas Teoricamente sei como funciona o procedimento mas me questiono se deve ser realizada na Ed Infantil Tambeacutem me pergunto se a sondagem vai muito aleacutem do conhecimento das crianccedilas Por exemplo algumas escrevem o proacuteprio nome

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e algumas palavras mais comuns a elas outras ainda nem reconhecem as letras do alfabeto A sondagem feita abarcou o nome palavras simples um pouco mais complexas e uma frase inteira A minha duacutevida eacute se a sondagem que vai muito aleacutem dos conhecimentos da sala eacute comum e necessaacuteria ainda mais na Ed Infantil (Relato do residente N 2017)

O debate em torno das questotildees que envolvem a escolarizaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute bastante antigo e recorrente Pesquisas como as de Neves Castanheira

e Gouveia (2015) assinalam a partir de autores que estudaram essa temaacutetica como

a perspectiva escolarizante de trabalho com a crianccedila pequena traz seacuterias implicaccedilotildees

para o desenvolvimento infantil justamente porque rompe com as formas como elas

ldquointeragem com a escrita fora da escola destituindo-a de significados pessoais e

sociais e dificulta portanto que as atividades desenvolvidas no espaccedilo escolar

envolvam a ludicidade caracteriacutestica fundamental dessa fase do desenvolvimentordquo

(p 217)

Os residentes parecem estar muito atentos a essas questotildees porque participam

de discussotildees sistemaacuteticas sobre o assunto tanto nas aulas teoacutericas na Universidade

quanto nas reuniotildees de orientaccedilatildeo com os preceptores do Programa de Residecircncia

Muitos estudantes satildeo levados a refletir sobre o assunto logo nos primeiros dias de

imersatildeo na escola

Resolvi mudar o formato do meu relato referente agrave imersatildeo inicial Pois passei por uma situaccedilatildeo em sala que me provocou tal accedilatildeo Devido agrave imposiccedilatildeo de escolarizaccedilatildeo percebida na turma na qual acompanho Onde hoje me emocionei com o choro insistente do aluno BG com as matildeos estremecidas na tentativa de segurar o laacutepis para ldquofazer liccedilatildeordquo (Relato da Residente M 2015)

A partir do relato da residente percebe-se o quanto a questatildeo eacute relevante para

o campo da educaccedilatildeo infantil e da formaccedilatildeo de professores Nas observaccedilotildees e

relatos dos cadernos de campo natildeo eacute incomum aparecerem longas narrativas sobre

os equiacutevocos que ocorrem nas praacuteticas pedagoacutegicas que envolvem a alfabetizaccedilatildeo e

letramento das crianccedilas pequenas Consideramos que questotildees como essas quando

problematizadas pelos estudantes nos horaacuterios de preceptoria ou mesmo nas

discussotildees com professores especialistas sobre o tema tendem a aproximaacute-los de

uma futura praacutetica profissional em que o trabalho com o desenvolvimento da escrita

seja realizado de forma a respeitar a infacircncia natildeo negando agrave crianccedila o seu direito ao

luacutedico mas tratando a apresentaccedilatildeo do mundo letrado como mais um momento

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prazeroso de aprendizagens Tal reflexatildeo eacute importante para os futuros professores

para que busquem compreender como inserir as crianccedilas no mundo letrado de

maneira que possam romper com a dicotomia entre o brincar e a leituraescrita

tomando como referecircncia o significado dessas accedilotildees para a crianccedila possibilitando a

conduccedilatildeo dos trabalhos na educaccedilatildeo infantil que tornem possiacutevel o brincar ldquoletrando

e alfabetizandordquo (NEVES CASTANHEIRA E GOUVEIA 2015)

Outra temaacutetica que aparece num nuacutemero expressivo de postagens diz respeito

ao olhar do residente para as praacuteticas educativas e as interaccedilotildees que ocorrem na

escola com relaccedilatildeo agrave inclusatildeo escolar das crianccedilas percebidas como ldquodiferentesrdquo

Destaca-se nesta temaacutetica observaccedilotildees a respeito de diferenccedilas de religiatildeo gecircnero

raccedilacor e tambeacutem aquelas relacionadas agrave deficiecircncia Haacute descriccedilotildees sobre como as

crianccedilas lidam com as diferenccedilas e as formas como os professores trabalham com

aquelas que possuem alguma dificuldade Algumas postagens ressaltam a

necessidade de formaccedilatildeo inicial e continuada dos educadores para lidarem com a

diversidade na escola

Pela primeira vez vivenciei preconceito racial de uma crianccedila com outra Nos momentos em que a profa distribui lego para as crianccedilas ela daacute tambeacutem um bonequinho para cada crianccedila Tem bonecos adultos crianccedilas homens mulheres e de diversas cores Os bonecos satildeo dados aleatoriamente ou escolhidos pela crianccedila conforme a professora passa de mesa em mesa Neste dia um menino negro estava com um boneco negro Um garoto se aproximou e disse ldquoCredo que boneco feio parece vocecircrdquo se direcionando ao menino O menino deu de ombros e continuou a brincar e poucos minutos depois a menina que estava ao seu lado me perguntou ldquoPor que o boneco dele eacute pretinho Eacute muito feiordquo Claro que conversei com ela e com o outro menino em outro momento calmamente falando das diversas cores que as pessoas tecircm e que natildeo haacute isso de feio e bonito aproveitando para falar sobre diversidade e etc Mais para o final da conversa a menina me disse ldquoMeu pai eacute pretinho ele eacute bonitordquo Respondi a menina dizendo que a beleza natildeo estaacute na cor da pele do cabelo ou dos olhos A cena toda me fez refletir que a menina jaacute deve ter ouvido esse tipo de afirmaccedilatildeo errocircnea Jaacute comentei mais de uma vez sobre o preconceito de gecircnero ser muito forte mas e o racial algueacutem mais vivenciou esse tipo de preconceito durante esta residecircncia (Relato do residente T 2017)

Rosemberg (2014) chama a atenccedilatildeo para o tema da diversidade como uma

questatildeo circunscrita na histoacuteria da humanidade A diferenciaccedilatildeo entre os grupos

humanos ou pessoas com atributos que classificam e separam o ldquoeurdquo do ldquooutrordquo

parece constituir as diversas manifestaccedilotildees de culturas humanas Assim a autora

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desnaturaliza a identidade e a diferenccedila apontando o seu caraacuteter cultural social e

histoacuterico Contudo esse eacute um dos temas que tem chamado cada vez mais a atenccedilatildeo

de educadores desde a educaccedilatildeo infantil jaacute que muitas vezes as questotildees que

envolvem a diferenccedila e o diferente passam por processos discriminatoacuterios e

preconceituosos como apontado no relato do estudante ao observar as interaccedilotildees

entre as crianccedilas no que se refere ao quesito raccedilacor

Marinho e Martins (2016) em estudo sobre formaccedilatildeo de professoras que atuam

na educaccedilatildeo infantil constatam a escassez ou inexistecircncia de disciplinas na formaccedilatildeo

inicial de professores que abarquem as questotildees eacutetnico-raciais denunciando o natildeo

cumprimento das leis que entre outras prescriccedilotildees preveem que instituiccedilotildees de niacutevel

superior proporcionem aos futuros(as) professoresas a formaccedilatildeo adequada para

lidarem com as relaccedilotildees raciais multieacutetnica e multicultural da sociedade brasileira

Nesse sentido ao trazerem suas inquietaccedilotildees sobre como as crianccedilas lidam com as

diferenccedilas no contexto da escola os residentes se aproximam das discussotildees a

respeito dos processos discriminatoacuterios oportunizando momentos em que tais

temaacuteticas possam ser discutidas entre professores preceptores e colegas do

programa de estaacutegio

Aleacutem da questatildeo racial outros relatos nos datildeo conta de refletir e discutir sobre

as relaccedilotildees que envolvem as crianccedilas com deficiecircncia na escola

() O que me chamou atenccedilatildeo foi que na quarta (2204) H chegou na escola e decidiu mudar de lugar foi sentar bem ao lado do D (uma crianccedila que foi diagnosticada com autismo de ldquograu leverdquo segundo a professora) eu fiquei observando como seria a relaccedilatildeo deles H trouxe um caderno de desenho o abriu na mesa e dividiu metade da folha para ele e para D depois na hora de descer ele segurou a matildeo do D e ficou durante o almoccedilo todo cuidando de D o orientou a pegar a comida sentar comer devagar e quando natildeo quisesse mais deveria jogar a comida no lixo e durante todo o dia H permaneceu cuidando de D A professora achou estranho pois naquele dia ela natildeo havia chamado a atenccedilatildeo de H ateacute me falou ldquoEle deve estar aprontando e D eacute bobatildeo pode se machucarrdquo e decidiu intervir e pediu para que H mudasse de lugar e parasse de cuidar de (Relato do residente L 2015)

A partir da narrativa eacute possiacutevel refletir sobre o preparo dos professores para

lidar com as diferenccedilas individuais na educaccedilatildeo infantil A inclusatildeo escolar de crianccedilas

com deficiecircncia ocorre mediante poliacuteticas puacuteblicas de inclusatildeo contudo haacute uma

grande distacircncia entre a poliacutetica puacuteblica e a praacutetica pedagoacutegica nos contextos

escolares pois natildeo se aprofunda ldquoo debate sobre os meios os fins e as estrateacutegias

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para a implementaccedilatildeo da poliacutetica de ampliaccedilatildeo da rede de educaccedilatildeo infantilrdquo

(BRUNO 2008 p 59)

Outros registros que tratam da temaacutetica da inclusatildeo de crianccedilas com

deficiecircncia mostram o quanto a escola estaacute despreparada para lidar com essa

questatildeo Os relatos e inquietaccedilotildees dos estudantes nos possibilitam a identificaccedilatildeo de

processos discriminatoacuterios de resistecircncias e acomodaccedilotildees dos profissionais e do

distanciamento de uma praacutetica verdadeiramente inclusiva na esfera das praacuteticas

educativas cotidianas O que se percebe nas discussotildees sobre o assunto eacute que os

residentes enquanto futuros professores muito tecircm a aprender sobre a acolhida das

famiacutelias e das crianccedilas ldquodiferentesrdquo ou com deficiecircncia na constante reflexatildeo sobre o

comportamento atitudes e posturas do educador frente ao trabalho pedagoacutegico

Outras temaacuteticas tatildeo importantes como as que discutimos aqui tem sido objeto

de interesse dos estudantes em processo de imersatildeo nas escolas-campo Haacute uma

gama de registros sobre categorias que envolvem a crianccedila pequena nas atividades

do brincar a disciplina e a coerccedilatildeo dos educadores na tentativa de manter o controle

das crianccedilas e dos comportamentos considerados inadequados Muitos residentes se

surpreendem como essa coerccedilatildeo ocorre demasiadas vezes na escola e nas reuniotildees

de supervisatildeo eacute muito comum questionarem junto ao preceptor formas de

compreender por que algumas praacuteticas coercitivas satildeo tatildeo presentes na educaccedilatildeo

infantil

Consideraccedilotildees Finais

A experiecircncia de estaacutegio no Programa de Residecircncia Pedagoacutegica requer de

estudantes e professores uma atitude de intensa accedilatildeo e reflexatildeo Na perspectiva de

observaccedilatildeo participante eacute que a imersatildeo dos residentes na escola eacute orientada

embora natildeo haja uma intervenccedilatildeo direta planejada e sistemaacutetica sobre os modos de

fazer da escola e dos professores Possiacuteveis intervenccedilotildees sobre a escola suscitadas

pela presenccedila da universidade (de preceptores e residentes) satildeo uma contingecircncia

dos processos de formaccedilatildeo de condiccedilotildees e modos de seu desenvolvimento e eacute assim

que se define o lugar do residente e da preceptoria junto a escola o caraacuteter da

observaccedilatildeo participante a ser realizada durante o estaacutegio e sua conduccedilatildeo e discussatildeo

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no acircmbito escolar As posiccedilotildees dos residentes reeditam questotildees que mobilizam a

imersatildeo e reflexatildeo sobre o vivido como e quando participar O que como e quando

registrar sobre a observaccedilatildeo participante sobre o que se vivencia Como fazer uso

das ferramentas disponiacuteveis na escola e dos subsiacutedios teoacutericos oferecidos durante a

proacutepria residecircncia ou estudados no curso de pedagogia elaborando impressotildees sobre

o que descreve e refletindo sobre o que vive e elabora

A retomada dos escritos e reflexotildees dos estudantes participantes do Programa

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil nos trazem pistas relevantes para a

compreensatildeo natildeo somente dos seus processos formativos mas tambeacutem suscitam

atenccedilatildeo aos temas e questotildees emergentes do cotidiano das crianccedilas nas escolas de

Educaccedilatildeo Infantil Sabe-se que o processo de escrita eacute composto de idas e vindas

de avanccedilos e retrocessos de duacutevidas e certezas percebidas nos textos e contextos

apresentados pelos estudantes neste processo formativo especiacutefico

As postagens guardam caracteriacutesticas especiacuteficas correlatas ao vivido nas

praacuteticas de estaacutegio de acordo com as finalidades comunicativas e formativas do

caderno de campoblog e com especificidades ndash limites e possibilidades ndash que se

dimensionam nestas praacuteticas Os estudantes registram o que observam o que

vivenciam mas natildeo soacute Em muitos registros suas impressotildees (con)fundem-se com o

observado vatildeo aleacutem da descriccedilatildeo interpretando o visto o vivido e outras vezes para

alguns o registro se faz espaccedilo de recuperaccedilatildeo das proacuteprias vivecircncias e dos

elementos teoacutericos estudados

Nesta experiecircncia a liberdade na escolha e escrita dos temas dos cadernos de

campo tem permitido que o processo formativo de cada estudante aconteccedila de forma

uacutenica e original pois apesar de estarem imersos em ambientes semelhantes (em

alguns casos mesmas escolas-campo) e possuiacuterem referenciais teoacutericos semelhantes

(provenientes das unidades curriculares obrigatoacuterias e eletivas do Curso de

Pedagogia) os temas e questotildees que recebem a atenccedilatildeo de cada um satildeo distintos e

trabalhados teoricamente a partir das anguacutestias e inquietaccedilotildees individuais Entretanto

apesar das produccedilotildees escritas serem individuais ao serem publicizadas em reuniotildees

de orientaccedilatildeo ou ateacute no suporte virtual do blog elas podem ser compartilhadas e

tornam-se objeto comum de discussotildees e aprendizagens

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

Referecircncias bibliograacuteficas

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BRAGA Elizabeth dos Santos Viacutedeo escritas leituras recordaccedilotildees cultura e memoacuteria na sala de aula GOacuteES Maria Cecilia Rafael e SMOLKA Ana Luiza Bustamante A significaccedilatildeo nos espaccedilos Educacionais ndash Interaccedilatildeo social e subjetivaccedilatildeo Campinas Papirus Editora1997 p 87-110

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MARQUES Danielle Vieira Aquino MUumlLLER Fernanda Experiecircncias com blog na pesquisa e na formaccedilatildeo inicial de professoras de educaccedilatildeo infantil ETD-Educaccedilatildeo Temaacutetica Digital v 14 n 1 p 43-61 2012

MARTINS E Famiacutelia e escola no contexto de um programa de residecircncia pedagoacutegica um estudo a partir do enfoque histoacuterico-cultural Educaccedilatildeo Sociedade amp Culturas v 37 p 89-107 2012

MEKSENAS Paulo Sociologia da educaccedilatildeo uma introduccedilatildeo ao estudo da escola no processo de transformaccedilatildeo social Satildeo Paulo Loyola 2002

MORETTI Vanessa Dias MARTINS Edna Atividade de ensino mediaccedilatildeo e aprendizagem da docecircncia na residecircncia pedagoacutegica uma anaacutelise a partir da teoria histoacuterico-cultural Revista Contrapontos v 15 n 3 p 394-411 2015

MORETTI Vanessa Dias A articulaccedilatildeo entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores que ensinam matemaacutetica o caso da Residecircncia Pedagoacutegica da Unifesp Revista Educaccedilatildeo Porto Alegre 2011 v 34 n 3 p 385-390 2011

NEVES Vanessa Ferraz Almeida CASTANHEIRA Maria Luacutecia GOUVEcircA Maria Cristina Soares O letramento e o brincar em processos de socializaccedilatildeo na educaccedilatildeo infantil brincadeiras diferentes Revista Brasileira de Educaccedilatildeo v 20 n 60 p 215-

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ROSEMBERG Fulvia Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees raciais a tensatildeo entre igualdade e diversidade Cadernos de Pesquisa v 44 n 153 p 742-759 2014

SILVA Adriana BUFALO Joseane O espaccedilo na pedagogia da educaccedilatildeo infantil faacutebula perversidade e possibilidade In Culturas infantis em creches e preacute-escolas estaacutegio e pesquisa Campinas SP Autores Associados 2011

TARDIF Maurice A profissionalizaccedilatildeo do ensino passados trinta anos dois passos para a frente trecircs para traacutes Educaccedilatildeo e Sociedade Campinas SP v34 n123 p

551-571 2013

VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

Correspondecircncia

Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Maria de Faacutetima Carvalho ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

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Registros no caderno de campo online o olhar do residente sobre a escola de

educaccedilatildeo infantil

Nos primeiros dias de imersatildeo na escola os residentes satildeo orientados a

realizar uma observaccedilatildeo atenta dos espaccedilos da instituiccedilatildeo A partir da leitura do texto

de Silva e Bufalo (2011) sobre culturas escolares os residentes descrevem em seus

primeiros registros detalhes fiacutesicos sobre a escola Muitos acabam desenhando a

planta baixa ou tirando fotos de salas de aulas parques e paacutetios e compartilhando no

caderno de campo online (blog) para comeccedilarem a pensar sobre o contexto e os

espaccedilos que podem favorecer a aprendizagem e o desenvolvimento da crianccedila

pequena como descrito no excerto abaixo

Uma coisa que me chamou atenccedilatildeo foi que natildeo possuem um espaccedilo para atividade fiacutesica essas satildeo realizadas no paacutetio que eacute proacuteximo as salas o barulho acaba atrapalhando os demais O parque estaacute interditado por ordem da diretora ou seja natildeo possuem lugar para brincar O dia das crianccedilas foi pautado em ficar sentado e quieto vendo um filme que a maioria jaacute tinha assistido (Relato da residente N 2017)

Formas de organizaccedilatildeo de espaccedilos e tempos remetem agrave organizaccedilatildeo da rotina

Sobre esse tema grande quantidade de postagens textos diz respeito a como as

atividades diaacuterias satildeo organizadas na escola Em alguns registros como o

apresentado a seguir aparece a problematizaccedilatildeo da forma de organizaccedilatildeo das

atividades

730 (15min) - a professora colocou o cabeccedilalho na lousa com a data e fez a contagem coletiva das crianccedilas 745 (45min) - a professora retomou o que eles haviam aprendido sobre os iacutendios entregou massinha e os orientou a modelar utensiacutelios indiacutegenas 830 (35min) - pintura de desenho xerocado que seraacute colado na capa do caderno de atividades 905 (25min) - brincadeira livre no paacutetio interno no brinquedatildeo que fica no final da escadarampa sup2940 (30min) - brincadeira em sala Gato mia 1010 (ateacute as crianccedilas irem embora) - a professora entregou uma folha com a letra da canccedilatildeo 1 2 3 indiozinhos cantou a muacutesica com eles sentados em seus lugares pediu para eles circularem as letras A e I e depois pintar a ilustraccedilatildeo () (Relato da residente J 2015)

A rotina observada e registrada pela residente configura-se como um dos

aspectos mais relevantes na vida da crianccedila que se encontra na escola de Educaccedilatildeo

Infantil Barbosa (2006) aponta que esse eacute um dos elementos que integram as praacuteticas

educativas que devem ser observadas e planejadas com regularidade objetivando a

operacionalizaccedilatildeo do cotidiano da escola de maneira que possa contribuir na

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constituiccedilatildeo da subjetividade dos atores escolares Desse modo pensar e

compreender a rotina como um fator presente e essencial na educaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute um passo promissor para que o residente acompanhe como as atividades

cotidianas da escola se materializam e datildeo base para a organizaccedilatildeo da praacutetica

pedagoacutegica devendo estar presente no desenvolvimento curricular

O planejamento das atividades na educaccedilatildeo infantil tem estreita ligaccedilatildeo com a

rotina Ao observar e refletir sobre a vida e as experiecircncias das crianccedilas na escola os

residentes satildeo remetidos a memoacuteria agrave lembranccedila do que tambeacutem foi um dia vivido

por eles em suas experiecircncias escolares Como apontado por Meksenas (2002)

ldquonunca somos testemunhas objetivas observando objetos e sim sujeitos observando

outros sujeitosrdquo (p 116)

Estive tentando lembrar nas uacuteltimas semanas o que eu fazia na minha preacute-escola Eu comecei no maternal com 3 anos ()Tenho vagas lembranccedilas de duas salas de aula uma do preacute III e a outra acho que era do preacute I Era uma escola particular dessas pequenas de bairro Lembro que a turma natildeo era tatildeo numerosa quanto essa que estou vendo na residecircncia mas a sala tinha uma organizaccedilatildeo parecida eram mesas e cadeiras enfileiradas nas duas () Eu estava com 5 anos Lembro que a gente tinha uma apostila no preacute I eu gostava de terminar tudo raacutepido para dormir Depois a professora comeccedilou a me dar gibi para eu ficar folheando Tenho na minha memoacuteria que as coisas que a gente fazia na escola eram chatas e muito infantis bobas demais Agora eu penso talvez as professoras ficassem me ocupando com massinha e pinturas todo dia tambeacutem como eu vejo na residecircncia e por isso eu achava muito chato O que seraacute que essas crianccedilas pensam disso O que seraacute que elas acham mais legal na escola Eu vejo que elas gostam muito de fazer liccedilatildeo essas de folhinha que a professora daacute e todos os dias elas perguntam Mas eu natildeo me conformo como elas acham isso tatildeo legal (Relato da Residente F 2017)

Sabemos que a memoacuteria eacute mediada pelo signo pelas interaccedilotildees sociais pelo

outro Braga (1997) dirige nosso olhar para o ldquoprocesso de apropriaccedilatildeo das formas

culturais de interaccedilatildeo que caracterizam a memoacuteria humanardquo Para a autora ldquoa

memoacuteria do homem soacute se configura no movimento discursivo e coletivo por sua

natureza cultural e simboacutelicardquo No registro acima o observado mobiliza as lembranccedilas

da residente aquilo que foi tambeacutem vivido na escola de sua infacircncia Entre lembranccedilas

e interrogaccedilotildees emergem as construccedilotildees formativas em um processo dinacircmico ndash

interativo cultural e simboacutelico Processo que potildeem em relaccedilatildeo vivecircncias atuais e

passadas que invocam sentidos e significados atribuiacutedos ao vivido que ocorre nas

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contradiccedilotildees entre aquilo que eacute rememorado pela estudante e o que efetivamente eacute

observado nas relaccedilotildees estabelecidas no contato com o cotidiano da escola

Aleacutem da rotina e da organizaccedilatildeo de tempos e espaccedilos em sua relaccedilatildeo com as

praacuteticas pedagoacutegicas os relatos dos estudantes se reportam agraves diferentes dimensotildees

da gestatildeo escolar Os registros destacam suas observaccedilotildees nas H A (hora atividade)

ou reuniotildees que eventualmente participam e com frequecircncia observam a postura da

equipe em relaccedilatildeo a presenccedila do residente Em seus relatos questionam o caraacuteter

da gestatildeo a qualidade da relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo entre os professores as discussotildees

que remetem a construccedilatildeo e discussatildeo do projeto poliacutetico pedagoacutegico e os papeis

desempenhados pelos diferentes educadores na construccedilatildeo do trabalho de educaccedilatildeo

da infacircncia

Completamos nesta semana 4 dias de participaccedilatildeo nas Horas Atividades (HA) destinada agrave formaccedilatildeo docente organizaccedilatildeo dos registros e planejamento das atividades pedagoacutegicas O que pude por meio da observaccedilatildeo constatar que o papel do Coordenador Pedagoacutegico que eacute fundamental nesse momento de formaccedilatildeo pois eacute ele o mediador desse processo acaba por se tornar distante e sem intervenccedilotildees no que adentra a orientaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico docente (Relato da estudante M 2015)

Na experiecircncia cotidiana de imersatildeo na escola eacute possiacutevel verificar as tensotildees

vivenciadas entre os professores e o papel da coordenaccedilatildeo pedagoacutegica A teoria

discutida na universidade pelos residentes assinala a importacircncia do papel do

coordenador pedagoacutegico na educaccedilatildeo infantil na praacutetica o residente percebe o quanto

a sua mediaccedilatildeo eacute fundamental na organizaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico e por outro

lado o quanto a sua ausecircncia pode interferir de forma negativa na orientaccedilatildeo das

atividades dos professores

Outra personagem que acaba sendo central na gestatildeo escolar eacute a direccedilatildeo que

nessa experiecircncia do residente tambeacutem eacute observada de forma criacutetica

A figura da diretora na escola foi a que mais me chamou a atenccedilatildeo ()imaginem que em nenhum momento percebi qualquer aproximaccedilatildeo da diretora com as crianccedilas em vaacuterios momentos acreditei que ela fosse algum teacutecnico administrativo pois apesar de estar no topo da piracircmide a referecircncia da gestatildeo a mesma se restringia a secretaria e natildeo se relacionava natildeo nos conhecia nem procurava nos conhecer Passou diversas vezes por grupos de crianccedilas e em nenhuma das vezes sequer olhou para elas Nunca apareceu em uma HA nunca percebi o seu contato com os professores e por diversas vezes me perguntei como eles se falavam qual era o seu relacionamento (Relato da residente B 2015)

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Sobre esse assunto estudos como os de Paro (2005) e Castro (2009) tem

assinalado o papel da gestatildeo e da administraccedilatildeo escolar como alicerce fundamental

nos processos de transformaccedilatildeo da escola puacuteblica brasileira Tais trabalhos tecircm

apontado a centralidade da direccedilatildeo escolar nas questotildees que envolvem os processos

de ensino e aprendizagem e as relaccedilotildees humanas presentes na equipe de trabalho

para aleacutem dos trabalhos administrativos e burocraacuteticos Natildeo eacute objetivo deste trabalho

fazer uma anaacutelise do papel do diretor na escola de educaccedilatildeo infantil mas cabe

assinalar que os estudantes residentes apontam o tema em seus registros e atentos

agraves demandas relativas ao papel do diretor indagam se como e quanto as lideranccedilas

escolares tecircm se envolvido com o trabalho administrativo dispendendo tempo para

um olhar mais atento agraves relaccedilotildees entre os professoresalunos funcionaacuterios da escola

observada

Em relaccedilatildeo agraves interaccedilotildees humanas outros registros dos residentes nos

remetem agraves maneiras como a escola lida com as famiacutelias das crianccedilas matriculadas

nas escolas Tais relatos natildeo satildeo tatildeo frequentes possivelmente porque essa eacute uma

relaccedilatildeo que se caracteriza pela assimetria de poderes e eacute pouco valorizada no dia a

dia escolar Os registros evocam situaccedilotildees vividas comentaacuterios ouvidos e

principalmente a necessidade de mudanccedila dos modos de conceber a crianccedila e suas

famiacutelias e de interagir com elas

A relaccedilatildeo entre professor e famiacutelia eacute mais uma dessas conexotildees que fazemos pela vida Por um lado haacute um profissional uma pessoa que estudou e eacute especialista em cuidar de crianccedilas Por outro famiacutelias que dificilmente conseguimos de fato perceber como satildeo suas estruturadas Famiacutelia hoje eacute coisa difiacutecil de entender Eacute matildee que mora sozinha com o filho eacute pais que trabalham e deixam os filhos na semana com tios avoacutes Eacute matildee solteira Eacute filho criado por pai viuacutevo Eacute histoacuteria que natildeo acaba mais Na hora da saiacuteda vamos conhecendo um pouquinho da estrutura familiar de cada crianccedila tentando perceber como se daacute a relaccedilatildeo entre a famiacutelia e a escola mas devemos ter um pouco de cuidado com esse processo (Relato do estudante J 2015)

Aleacutem da residente ter um olhar para os diferentes tipos de arranjos familiares

tambeacutem busca compreender a especificidade de cada famiacutelia considerando o papel

da mulher e de matildee trabalhadora com filhos na escola puacuteblica

(hellip) Veja esses apontamentos uma menina na sala estaacute com piolho a professora disse que jaacute alertou a matildee mas como eacute matildee solteira soacute pode cuidar da filha no domingo O outro menino que natildeo se interessa pelas atividades e responde a educadora tambeacutem teve a matildee notificada mas como

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a mesma eacute separada do marido natildeo faz nada O fato da mulher trabalhar a semana e ter folga aos domingos natildeo significa que ela seja uma maacute matildee pelo contraacuterio significa que ela rala muito para colocar comida no prato A presenccedila ou natildeo de um homem natildeo condiciona nada A escola natildeo pode ser um ambiente de roacutetulos ela deve estar aberta agraves diferenccedilas acolhendo e buscando outras maneiras e formas de aproximaccedilatildeo com a famiacutelia compreendendo a responsabilidade compartilhada que carregam (Registro da residente B 2015)

Os relatos demonstram natildeo soacute o quanto estatildeo atentos para como a escola lida

com as relaccedilotildees familiares mas sobretudo assinalam como tecircm se configurado as

formaccedilotildees das famiacutelias na atualidade Um estudo de Martins (2012) aponta o quanto

a experiecircncia de residecircncia pedagoacutegica possibilita aos estudantes um contato mais

expressivo com a realidade da escola puacuteblica de periferia urbana Aleacutem de observar

as relaccedilotildees institucionais o residente pode ser sensibilizado frente agraves dificuldades

vividas pelas famiacutelias e tendem a perceber o preconceito em relaccedilatildeo aos vaacuterios

arranjos familiares vivenciados pelas crianccedilas mais pobres e como a escolarizaccedilatildeo

dos pais pode afetar a vida dos filhos Os registros dos residentes demonstram como

ldquoos contextos de vida das crianccedilas que frequentam a escola puacuteblica de periferia

passam a ser compreendidos de uma forma concreta e as relaccedilotildees do espaccedilo familiar

com o espaccedilo escolar passam a ter uma conexatildeo cotidianardquo (MARTINS 2012 p 95)

Outra temaacutetica recorrente nos registros dos estudantes diz respeito ao processo

de escolarizaccedilatildeo das praacuteticas da educaccedilatildeo da infacircncia Tal perspectiva surge quando

os residentes referem aos usos dos brinquedos e agraves brincadeiras agrave presenccedila da

leitura e contaccedilatildeo de histoacuterias aos modos de introduccedilatildeo do desenho ao uso de novas

tecnologias e aos modos de avaliar agraves crianccedilas Tal perspectiva escolarizante emerge

em oposiccedilatildeo ao luacutedico como princiacutepio e forma de organizaccedilatildeo das praacuteticas de

educaccedilatildeo junto agraves crianccedilas pequenas e algumas vezes a ela ainda se articula a

preocupaccedilatildeo em disciplinar as vivecircncias escolares sondagens filas broncas e

silecircncios coexistem com desenhos Tv computadores e brincadeiras Os registros nos

dizem de uma escola que hesita entre coibir e promover a expressatildeo das muitas

linguagens da imaginaccedilatildeo e movimento das crianccedilas

Na semana de 2310 a 2710 e como previsto na reuniatildeo de pais a professora realizou a sondagem com as crianccedilas Teoricamente sei como funciona o procedimento mas me questiono se deve ser realizada na Ed Infantil Tambeacutem me pergunto se a sondagem vai muito aleacutem do conhecimento das crianccedilas Por exemplo algumas escrevem o proacuteprio nome

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e algumas palavras mais comuns a elas outras ainda nem reconhecem as letras do alfabeto A sondagem feita abarcou o nome palavras simples um pouco mais complexas e uma frase inteira A minha duacutevida eacute se a sondagem que vai muito aleacutem dos conhecimentos da sala eacute comum e necessaacuteria ainda mais na Ed Infantil (Relato do residente N 2017)

O debate em torno das questotildees que envolvem a escolarizaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute bastante antigo e recorrente Pesquisas como as de Neves Castanheira

e Gouveia (2015) assinalam a partir de autores que estudaram essa temaacutetica como

a perspectiva escolarizante de trabalho com a crianccedila pequena traz seacuterias implicaccedilotildees

para o desenvolvimento infantil justamente porque rompe com as formas como elas

ldquointeragem com a escrita fora da escola destituindo-a de significados pessoais e

sociais e dificulta portanto que as atividades desenvolvidas no espaccedilo escolar

envolvam a ludicidade caracteriacutestica fundamental dessa fase do desenvolvimentordquo

(p 217)

Os residentes parecem estar muito atentos a essas questotildees porque participam

de discussotildees sistemaacuteticas sobre o assunto tanto nas aulas teoacutericas na Universidade

quanto nas reuniotildees de orientaccedilatildeo com os preceptores do Programa de Residecircncia

Muitos estudantes satildeo levados a refletir sobre o assunto logo nos primeiros dias de

imersatildeo na escola

Resolvi mudar o formato do meu relato referente agrave imersatildeo inicial Pois passei por uma situaccedilatildeo em sala que me provocou tal accedilatildeo Devido agrave imposiccedilatildeo de escolarizaccedilatildeo percebida na turma na qual acompanho Onde hoje me emocionei com o choro insistente do aluno BG com as matildeos estremecidas na tentativa de segurar o laacutepis para ldquofazer liccedilatildeordquo (Relato da Residente M 2015)

A partir do relato da residente percebe-se o quanto a questatildeo eacute relevante para

o campo da educaccedilatildeo infantil e da formaccedilatildeo de professores Nas observaccedilotildees e

relatos dos cadernos de campo natildeo eacute incomum aparecerem longas narrativas sobre

os equiacutevocos que ocorrem nas praacuteticas pedagoacutegicas que envolvem a alfabetizaccedilatildeo e

letramento das crianccedilas pequenas Consideramos que questotildees como essas quando

problematizadas pelos estudantes nos horaacuterios de preceptoria ou mesmo nas

discussotildees com professores especialistas sobre o tema tendem a aproximaacute-los de

uma futura praacutetica profissional em que o trabalho com o desenvolvimento da escrita

seja realizado de forma a respeitar a infacircncia natildeo negando agrave crianccedila o seu direito ao

luacutedico mas tratando a apresentaccedilatildeo do mundo letrado como mais um momento

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prazeroso de aprendizagens Tal reflexatildeo eacute importante para os futuros professores

para que busquem compreender como inserir as crianccedilas no mundo letrado de

maneira que possam romper com a dicotomia entre o brincar e a leituraescrita

tomando como referecircncia o significado dessas accedilotildees para a crianccedila possibilitando a

conduccedilatildeo dos trabalhos na educaccedilatildeo infantil que tornem possiacutevel o brincar ldquoletrando

e alfabetizandordquo (NEVES CASTANHEIRA E GOUVEIA 2015)

Outra temaacutetica que aparece num nuacutemero expressivo de postagens diz respeito

ao olhar do residente para as praacuteticas educativas e as interaccedilotildees que ocorrem na

escola com relaccedilatildeo agrave inclusatildeo escolar das crianccedilas percebidas como ldquodiferentesrdquo

Destaca-se nesta temaacutetica observaccedilotildees a respeito de diferenccedilas de religiatildeo gecircnero

raccedilacor e tambeacutem aquelas relacionadas agrave deficiecircncia Haacute descriccedilotildees sobre como as

crianccedilas lidam com as diferenccedilas e as formas como os professores trabalham com

aquelas que possuem alguma dificuldade Algumas postagens ressaltam a

necessidade de formaccedilatildeo inicial e continuada dos educadores para lidarem com a

diversidade na escola

Pela primeira vez vivenciei preconceito racial de uma crianccedila com outra Nos momentos em que a profa distribui lego para as crianccedilas ela daacute tambeacutem um bonequinho para cada crianccedila Tem bonecos adultos crianccedilas homens mulheres e de diversas cores Os bonecos satildeo dados aleatoriamente ou escolhidos pela crianccedila conforme a professora passa de mesa em mesa Neste dia um menino negro estava com um boneco negro Um garoto se aproximou e disse ldquoCredo que boneco feio parece vocecircrdquo se direcionando ao menino O menino deu de ombros e continuou a brincar e poucos minutos depois a menina que estava ao seu lado me perguntou ldquoPor que o boneco dele eacute pretinho Eacute muito feiordquo Claro que conversei com ela e com o outro menino em outro momento calmamente falando das diversas cores que as pessoas tecircm e que natildeo haacute isso de feio e bonito aproveitando para falar sobre diversidade e etc Mais para o final da conversa a menina me disse ldquoMeu pai eacute pretinho ele eacute bonitordquo Respondi a menina dizendo que a beleza natildeo estaacute na cor da pele do cabelo ou dos olhos A cena toda me fez refletir que a menina jaacute deve ter ouvido esse tipo de afirmaccedilatildeo errocircnea Jaacute comentei mais de uma vez sobre o preconceito de gecircnero ser muito forte mas e o racial algueacutem mais vivenciou esse tipo de preconceito durante esta residecircncia (Relato do residente T 2017)

Rosemberg (2014) chama a atenccedilatildeo para o tema da diversidade como uma

questatildeo circunscrita na histoacuteria da humanidade A diferenciaccedilatildeo entre os grupos

humanos ou pessoas com atributos que classificam e separam o ldquoeurdquo do ldquooutrordquo

parece constituir as diversas manifestaccedilotildees de culturas humanas Assim a autora

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desnaturaliza a identidade e a diferenccedila apontando o seu caraacuteter cultural social e

histoacuterico Contudo esse eacute um dos temas que tem chamado cada vez mais a atenccedilatildeo

de educadores desde a educaccedilatildeo infantil jaacute que muitas vezes as questotildees que

envolvem a diferenccedila e o diferente passam por processos discriminatoacuterios e

preconceituosos como apontado no relato do estudante ao observar as interaccedilotildees

entre as crianccedilas no que se refere ao quesito raccedilacor

Marinho e Martins (2016) em estudo sobre formaccedilatildeo de professoras que atuam

na educaccedilatildeo infantil constatam a escassez ou inexistecircncia de disciplinas na formaccedilatildeo

inicial de professores que abarquem as questotildees eacutetnico-raciais denunciando o natildeo

cumprimento das leis que entre outras prescriccedilotildees preveem que instituiccedilotildees de niacutevel

superior proporcionem aos futuros(as) professoresas a formaccedilatildeo adequada para

lidarem com as relaccedilotildees raciais multieacutetnica e multicultural da sociedade brasileira

Nesse sentido ao trazerem suas inquietaccedilotildees sobre como as crianccedilas lidam com as

diferenccedilas no contexto da escola os residentes se aproximam das discussotildees a

respeito dos processos discriminatoacuterios oportunizando momentos em que tais

temaacuteticas possam ser discutidas entre professores preceptores e colegas do

programa de estaacutegio

Aleacutem da questatildeo racial outros relatos nos datildeo conta de refletir e discutir sobre

as relaccedilotildees que envolvem as crianccedilas com deficiecircncia na escola

() O que me chamou atenccedilatildeo foi que na quarta (2204) H chegou na escola e decidiu mudar de lugar foi sentar bem ao lado do D (uma crianccedila que foi diagnosticada com autismo de ldquograu leverdquo segundo a professora) eu fiquei observando como seria a relaccedilatildeo deles H trouxe um caderno de desenho o abriu na mesa e dividiu metade da folha para ele e para D depois na hora de descer ele segurou a matildeo do D e ficou durante o almoccedilo todo cuidando de D o orientou a pegar a comida sentar comer devagar e quando natildeo quisesse mais deveria jogar a comida no lixo e durante todo o dia H permaneceu cuidando de D A professora achou estranho pois naquele dia ela natildeo havia chamado a atenccedilatildeo de H ateacute me falou ldquoEle deve estar aprontando e D eacute bobatildeo pode se machucarrdquo e decidiu intervir e pediu para que H mudasse de lugar e parasse de cuidar de (Relato do residente L 2015)

A partir da narrativa eacute possiacutevel refletir sobre o preparo dos professores para

lidar com as diferenccedilas individuais na educaccedilatildeo infantil A inclusatildeo escolar de crianccedilas

com deficiecircncia ocorre mediante poliacuteticas puacuteblicas de inclusatildeo contudo haacute uma

grande distacircncia entre a poliacutetica puacuteblica e a praacutetica pedagoacutegica nos contextos

escolares pois natildeo se aprofunda ldquoo debate sobre os meios os fins e as estrateacutegias

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para a implementaccedilatildeo da poliacutetica de ampliaccedilatildeo da rede de educaccedilatildeo infantilrdquo

(BRUNO 2008 p 59)

Outros registros que tratam da temaacutetica da inclusatildeo de crianccedilas com

deficiecircncia mostram o quanto a escola estaacute despreparada para lidar com essa

questatildeo Os relatos e inquietaccedilotildees dos estudantes nos possibilitam a identificaccedilatildeo de

processos discriminatoacuterios de resistecircncias e acomodaccedilotildees dos profissionais e do

distanciamento de uma praacutetica verdadeiramente inclusiva na esfera das praacuteticas

educativas cotidianas O que se percebe nas discussotildees sobre o assunto eacute que os

residentes enquanto futuros professores muito tecircm a aprender sobre a acolhida das

famiacutelias e das crianccedilas ldquodiferentesrdquo ou com deficiecircncia na constante reflexatildeo sobre o

comportamento atitudes e posturas do educador frente ao trabalho pedagoacutegico

Outras temaacuteticas tatildeo importantes como as que discutimos aqui tem sido objeto

de interesse dos estudantes em processo de imersatildeo nas escolas-campo Haacute uma

gama de registros sobre categorias que envolvem a crianccedila pequena nas atividades

do brincar a disciplina e a coerccedilatildeo dos educadores na tentativa de manter o controle

das crianccedilas e dos comportamentos considerados inadequados Muitos residentes se

surpreendem como essa coerccedilatildeo ocorre demasiadas vezes na escola e nas reuniotildees

de supervisatildeo eacute muito comum questionarem junto ao preceptor formas de

compreender por que algumas praacuteticas coercitivas satildeo tatildeo presentes na educaccedilatildeo

infantil

Consideraccedilotildees Finais

A experiecircncia de estaacutegio no Programa de Residecircncia Pedagoacutegica requer de

estudantes e professores uma atitude de intensa accedilatildeo e reflexatildeo Na perspectiva de

observaccedilatildeo participante eacute que a imersatildeo dos residentes na escola eacute orientada

embora natildeo haja uma intervenccedilatildeo direta planejada e sistemaacutetica sobre os modos de

fazer da escola e dos professores Possiacuteveis intervenccedilotildees sobre a escola suscitadas

pela presenccedila da universidade (de preceptores e residentes) satildeo uma contingecircncia

dos processos de formaccedilatildeo de condiccedilotildees e modos de seu desenvolvimento e eacute assim

que se define o lugar do residente e da preceptoria junto a escola o caraacuteter da

observaccedilatildeo participante a ser realizada durante o estaacutegio e sua conduccedilatildeo e discussatildeo

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no acircmbito escolar As posiccedilotildees dos residentes reeditam questotildees que mobilizam a

imersatildeo e reflexatildeo sobre o vivido como e quando participar O que como e quando

registrar sobre a observaccedilatildeo participante sobre o que se vivencia Como fazer uso

das ferramentas disponiacuteveis na escola e dos subsiacutedios teoacutericos oferecidos durante a

proacutepria residecircncia ou estudados no curso de pedagogia elaborando impressotildees sobre

o que descreve e refletindo sobre o que vive e elabora

A retomada dos escritos e reflexotildees dos estudantes participantes do Programa

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil nos trazem pistas relevantes para a

compreensatildeo natildeo somente dos seus processos formativos mas tambeacutem suscitam

atenccedilatildeo aos temas e questotildees emergentes do cotidiano das crianccedilas nas escolas de

Educaccedilatildeo Infantil Sabe-se que o processo de escrita eacute composto de idas e vindas

de avanccedilos e retrocessos de duacutevidas e certezas percebidas nos textos e contextos

apresentados pelos estudantes neste processo formativo especiacutefico

As postagens guardam caracteriacutesticas especiacuteficas correlatas ao vivido nas

praacuteticas de estaacutegio de acordo com as finalidades comunicativas e formativas do

caderno de campoblog e com especificidades ndash limites e possibilidades ndash que se

dimensionam nestas praacuteticas Os estudantes registram o que observam o que

vivenciam mas natildeo soacute Em muitos registros suas impressotildees (con)fundem-se com o

observado vatildeo aleacutem da descriccedilatildeo interpretando o visto o vivido e outras vezes para

alguns o registro se faz espaccedilo de recuperaccedilatildeo das proacuteprias vivecircncias e dos

elementos teoacutericos estudados

Nesta experiecircncia a liberdade na escolha e escrita dos temas dos cadernos de

campo tem permitido que o processo formativo de cada estudante aconteccedila de forma

uacutenica e original pois apesar de estarem imersos em ambientes semelhantes (em

alguns casos mesmas escolas-campo) e possuiacuterem referenciais teoacutericos semelhantes

(provenientes das unidades curriculares obrigatoacuterias e eletivas do Curso de

Pedagogia) os temas e questotildees que recebem a atenccedilatildeo de cada um satildeo distintos e

trabalhados teoricamente a partir das anguacutestias e inquietaccedilotildees individuais Entretanto

apesar das produccedilotildees escritas serem individuais ao serem publicizadas em reuniotildees

de orientaccedilatildeo ou ateacute no suporte virtual do blog elas podem ser compartilhadas e

tornam-se objeto comum de discussotildees e aprendizagens

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

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VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

Correspondecircncia

Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Maria de Faacutetima Carvalho ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

E-mail emartinsunifespgmailcom ndash carvalhomdfgmailcom ndash

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constituiccedilatildeo da subjetividade dos atores escolares Desse modo pensar e

compreender a rotina como um fator presente e essencial na educaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute um passo promissor para que o residente acompanhe como as atividades

cotidianas da escola se materializam e datildeo base para a organizaccedilatildeo da praacutetica

pedagoacutegica devendo estar presente no desenvolvimento curricular

O planejamento das atividades na educaccedilatildeo infantil tem estreita ligaccedilatildeo com a

rotina Ao observar e refletir sobre a vida e as experiecircncias das crianccedilas na escola os

residentes satildeo remetidos a memoacuteria agrave lembranccedila do que tambeacutem foi um dia vivido

por eles em suas experiecircncias escolares Como apontado por Meksenas (2002)

ldquonunca somos testemunhas objetivas observando objetos e sim sujeitos observando

outros sujeitosrdquo (p 116)

Estive tentando lembrar nas uacuteltimas semanas o que eu fazia na minha preacute-escola Eu comecei no maternal com 3 anos ()Tenho vagas lembranccedilas de duas salas de aula uma do preacute III e a outra acho que era do preacute I Era uma escola particular dessas pequenas de bairro Lembro que a turma natildeo era tatildeo numerosa quanto essa que estou vendo na residecircncia mas a sala tinha uma organizaccedilatildeo parecida eram mesas e cadeiras enfileiradas nas duas () Eu estava com 5 anos Lembro que a gente tinha uma apostila no preacute I eu gostava de terminar tudo raacutepido para dormir Depois a professora comeccedilou a me dar gibi para eu ficar folheando Tenho na minha memoacuteria que as coisas que a gente fazia na escola eram chatas e muito infantis bobas demais Agora eu penso talvez as professoras ficassem me ocupando com massinha e pinturas todo dia tambeacutem como eu vejo na residecircncia e por isso eu achava muito chato O que seraacute que essas crianccedilas pensam disso O que seraacute que elas acham mais legal na escola Eu vejo que elas gostam muito de fazer liccedilatildeo essas de folhinha que a professora daacute e todos os dias elas perguntam Mas eu natildeo me conformo como elas acham isso tatildeo legal (Relato da Residente F 2017)

Sabemos que a memoacuteria eacute mediada pelo signo pelas interaccedilotildees sociais pelo

outro Braga (1997) dirige nosso olhar para o ldquoprocesso de apropriaccedilatildeo das formas

culturais de interaccedilatildeo que caracterizam a memoacuteria humanardquo Para a autora ldquoa

memoacuteria do homem soacute se configura no movimento discursivo e coletivo por sua

natureza cultural e simboacutelicardquo No registro acima o observado mobiliza as lembranccedilas

da residente aquilo que foi tambeacutem vivido na escola de sua infacircncia Entre lembranccedilas

e interrogaccedilotildees emergem as construccedilotildees formativas em um processo dinacircmico ndash

interativo cultural e simboacutelico Processo que potildeem em relaccedilatildeo vivecircncias atuais e

passadas que invocam sentidos e significados atribuiacutedos ao vivido que ocorre nas

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contradiccedilotildees entre aquilo que eacute rememorado pela estudante e o que efetivamente eacute

observado nas relaccedilotildees estabelecidas no contato com o cotidiano da escola

Aleacutem da rotina e da organizaccedilatildeo de tempos e espaccedilos em sua relaccedilatildeo com as

praacuteticas pedagoacutegicas os relatos dos estudantes se reportam agraves diferentes dimensotildees

da gestatildeo escolar Os registros destacam suas observaccedilotildees nas H A (hora atividade)

ou reuniotildees que eventualmente participam e com frequecircncia observam a postura da

equipe em relaccedilatildeo a presenccedila do residente Em seus relatos questionam o caraacuteter

da gestatildeo a qualidade da relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo entre os professores as discussotildees

que remetem a construccedilatildeo e discussatildeo do projeto poliacutetico pedagoacutegico e os papeis

desempenhados pelos diferentes educadores na construccedilatildeo do trabalho de educaccedilatildeo

da infacircncia

Completamos nesta semana 4 dias de participaccedilatildeo nas Horas Atividades (HA) destinada agrave formaccedilatildeo docente organizaccedilatildeo dos registros e planejamento das atividades pedagoacutegicas O que pude por meio da observaccedilatildeo constatar que o papel do Coordenador Pedagoacutegico que eacute fundamental nesse momento de formaccedilatildeo pois eacute ele o mediador desse processo acaba por se tornar distante e sem intervenccedilotildees no que adentra a orientaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico docente (Relato da estudante M 2015)

Na experiecircncia cotidiana de imersatildeo na escola eacute possiacutevel verificar as tensotildees

vivenciadas entre os professores e o papel da coordenaccedilatildeo pedagoacutegica A teoria

discutida na universidade pelos residentes assinala a importacircncia do papel do

coordenador pedagoacutegico na educaccedilatildeo infantil na praacutetica o residente percebe o quanto

a sua mediaccedilatildeo eacute fundamental na organizaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico e por outro

lado o quanto a sua ausecircncia pode interferir de forma negativa na orientaccedilatildeo das

atividades dos professores

Outra personagem que acaba sendo central na gestatildeo escolar eacute a direccedilatildeo que

nessa experiecircncia do residente tambeacutem eacute observada de forma criacutetica

A figura da diretora na escola foi a que mais me chamou a atenccedilatildeo ()imaginem que em nenhum momento percebi qualquer aproximaccedilatildeo da diretora com as crianccedilas em vaacuterios momentos acreditei que ela fosse algum teacutecnico administrativo pois apesar de estar no topo da piracircmide a referecircncia da gestatildeo a mesma se restringia a secretaria e natildeo se relacionava natildeo nos conhecia nem procurava nos conhecer Passou diversas vezes por grupos de crianccedilas e em nenhuma das vezes sequer olhou para elas Nunca apareceu em uma HA nunca percebi o seu contato com os professores e por diversas vezes me perguntei como eles se falavam qual era o seu relacionamento (Relato da residente B 2015)

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Sobre esse assunto estudos como os de Paro (2005) e Castro (2009) tem

assinalado o papel da gestatildeo e da administraccedilatildeo escolar como alicerce fundamental

nos processos de transformaccedilatildeo da escola puacuteblica brasileira Tais trabalhos tecircm

apontado a centralidade da direccedilatildeo escolar nas questotildees que envolvem os processos

de ensino e aprendizagem e as relaccedilotildees humanas presentes na equipe de trabalho

para aleacutem dos trabalhos administrativos e burocraacuteticos Natildeo eacute objetivo deste trabalho

fazer uma anaacutelise do papel do diretor na escola de educaccedilatildeo infantil mas cabe

assinalar que os estudantes residentes apontam o tema em seus registros e atentos

agraves demandas relativas ao papel do diretor indagam se como e quanto as lideranccedilas

escolares tecircm se envolvido com o trabalho administrativo dispendendo tempo para

um olhar mais atento agraves relaccedilotildees entre os professoresalunos funcionaacuterios da escola

observada

Em relaccedilatildeo agraves interaccedilotildees humanas outros registros dos residentes nos

remetem agraves maneiras como a escola lida com as famiacutelias das crianccedilas matriculadas

nas escolas Tais relatos natildeo satildeo tatildeo frequentes possivelmente porque essa eacute uma

relaccedilatildeo que se caracteriza pela assimetria de poderes e eacute pouco valorizada no dia a

dia escolar Os registros evocam situaccedilotildees vividas comentaacuterios ouvidos e

principalmente a necessidade de mudanccedila dos modos de conceber a crianccedila e suas

famiacutelias e de interagir com elas

A relaccedilatildeo entre professor e famiacutelia eacute mais uma dessas conexotildees que fazemos pela vida Por um lado haacute um profissional uma pessoa que estudou e eacute especialista em cuidar de crianccedilas Por outro famiacutelias que dificilmente conseguimos de fato perceber como satildeo suas estruturadas Famiacutelia hoje eacute coisa difiacutecil de entender Eacute matildee que mora sozinha com o filho eacute pais que trabalham e deixam os filhos na semana com tios avoacutes Eacute matildee solteira Eacute filho criado por pai viuacutevo Eacute histoacuteria que natildeo acaba mais Na hora da saiacuteda vamos conhecendo um pouquinho da estrutura familiar de cada crianccedila tentando perceber como se daacute a relaccedilatildeo entre a famiacutelia e a escola mas devemos ter um pouco de cuidado com esse processo (Relato do estudante J 2015)

Aleacutem da residente ter um olhar para os diferentes tipos de arranjos familiares

tambeacutem busca compreender a especificidade de cada famiacutelia considerando o papel

da mulher e de matildee trabalhadora com filhos na escola puacuteblica

(hellip) Veja esses apontamentos uma menina na sala estaacute com piolho a professora disse que jaacute alertou a matildee mas como eacute matildee solteira soacute pode cuidar da filha no domingo O outro menino que natildeo se interessa pelas atividades e responde a educadora tambeacutem teve a matildee notificada mas como

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a mesma eacute separada do marido natildeo faz nada O fato da mulher trabalhar a semana e ter folga aos domingos natildeo significa que ela seja uma maacute matildee pelo contraacuterio significa que ela rala muito para colocar comida no prato A presenccedila ou natildeo de um homem natildeo condiciona nada A escola natildeo pode ser um ambiente de roacutetulos ela deve estar aberta agraves diferenccedilas acolhendo e buscando outras maneiras e formas de aproximaccedilatildeo com a famiacutelia compreendendo a responsabilidade compartilhada que carregam (Registro da residente B 2015)

Os relatos demonstram natildeo soacute o quanto estatildeo atentos para como a escola lida

com as relaccedilotildees familiares mas sobretudo assinalam como tecircm se configurado as

formaccedilotildees das famiacutelias na atualidade Um estudo de Martins (2012) aponta o quanto

a experiecircncia de residecircncia pedagoacutegica possibilita aos estudantes um contato mais

expressivo com a realidade da escola puacuteblica de periferia urbana Aleacutem de observar

as relaccedilotildees institucionais o residente pode ser sensibilizado frente agraves dificuldades

vividas pelas famiacutelias e tendem a perceber o preconceito em relaccedilatildeo aos vaacuterios

arranjos familiares vivenciados pelas crianccedilas mais pobres e como a escolarizaccedilatildeo

dos pais pode afetar a vida dos filhos Os registros dos residentes demonstram como

ldquoos contextos de vida das crianccedilas que frequentam a escola puacuteblica de periferia

passam a ser compreendidos de uma forma concreta e as relaccedilotildees do espaccedilo familiar

com o espaccedilo escolar passam a ter uma conexatildeo cotidianardquo (MARTINS 2012 p 95)

Outra temaacutetica recorrente nos registros dos estudantes diz respeito ao processo

de escolarizaccedilatildeo das praacuteticas da educaccedilatildeo da infacircncia Tal perspectiva surge quando

os residentes referem aos usos dos brinquedos e agraves brincadeiras agrave presenccedila da

leitura e contaccedilatildeo de histoacuterias aos modos de introduccedilatildeo do desenho ao uso de novas

tecnologias e aos modos de avaliar agraves crianccedilas Tal perspectiva escolarizante emerge

em oposiccedilatildeo ao luacutedico como princiacutepio e forma de organizaccedilatildeo das praacuteticas de

educaccedilatildeo junto agraves crianccedilas pequenas e algumas vezes a ela ainda se articula a

preocupaccedilatildeo em disciplinar as vivecircncias escolares sondagens filas broncas e

silecircncios coexistem com desenhos Tv computadores e brincadeiras Os registros nos

dizem de uma escola que hesita entre coibir e promover a expressatildeo das muitas

linguagens da imaginaccedilatildeo e movimento das crianccedilas

Na semana de 2310 a 2710 e como previsto na reuniatildeo de pais a professora realizou a sondagem com as crianccedilas Teoricamente sei como funciona o procedimento mas me questiono se deve ser realizada na Ed Infantil Tambeacutem me pergunto se a sondagem vai muito aleacutem do conhecimento das crianccedilas Por exemplo algumas escrevem o proacuteprio nome

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e algumas palavras mais comuns a elas outras ainda nem reconhecem as letras do alfabeto A sondagem feita abarcou o nome palavras simples um pouco mais complexas e uma frase inteira A minha duacutevida eacute se a sondagem que vai muito aleacutem dos conhecimentos da sala eacute comum e necessaacuteria ainda mais na Ed Infantil (Relato do residente N 2017)

O debate em torno das questotildees que envolvem a escolarizaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute bastante antigo e recorrente Pesquisas como as de Neves Castanheira

e Gouveia (2015) assinalam a partir de autores que estudaram essa temaacutetica como

a perspectiva escolarizante de trabalho com a crianccedila pequena traz seacuterias implicaccedilotildees

para o desenvolvimento infantil justamente porque rompe com as formas como elas

ldquointeragem com a escrita fora da escola destituindo-a de significados pessoais e

sociais e dificulta portanto que as atividades desenvolvidas no espaccedilo escolar

envolvam a ludicidade caracteriacutestica fundamental dessa fase do desenvolvimentordquo

(p 217)

Os residentes parecem estar muito atentos a essas questotildees porque participam

de discussotildees sistemaacuteticas sobre o assunto tanto nas aulas teoacutericas na Universidade

quanto nas reuniotildees de orientaccedilatildeo com os preceptores do Programa de Residecircncia

Muitos estudantes satildeo levados a refletir sobre o assunto logo nos primeiros dias de

imersatildeo na escola

Resolvi mudar o formato do meu relato referente agrave imersatildeo inicial Pois passei por uma situaccedilatildeo em sala que me provocou tal accedilatildeo Devido agrave imposiccedilatildeo de escolarizaccedilatildeo percebida na turma na qual acompanho Onde hoje me emocionei com o choro insistente do aluno BG com as matildeos estremecidas na tentativa de segurar o laacutepis para ldquofazer liccedilatildeordquo (Relato da Residente M 2015)

A partir do relato da residente percebe-se o quanto a questatildeo eacute relevante para

o campo da educaccedilatildeo infantil e da formaccedilatildeo de professores Nas observaccedilotildees e

relatos dos cadernos de campo natildeo eacute incomum aparecerem longas narrativas sobre

os equiacutevocos que ocorrem nas praacuteticas pedagoacutegicas que envolvem a alfabetizaccedilatildeo e

letramento das crianccedilas pequenas Consideramos que questotildees como essas quando

problematizadas pelos estudantes nos horaacuterios de preceptoria ou mesmo nas

discussotildees com professores especialistas sobre o tema tendem a aproximaacute-los de

uma futura praacutetica profissional em que o trabalho com o desenvolvimento da escrita

seja realizado de forma a respeitar a infacircncia natildeo negando agrave crianccedila o seu direito ao

luacutedico mas tratando a apresentaccedilatildeo do mundo letrado como mais um momento

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prazeroso de aprendizagens Tal reflexatildeo eacute importante para os futuros professores

para que busquem compreender como inserir as crianccedilas no mundo letrado de

maneira que possam romper com a dicotomia entre o brincar e a leituraescrita

tomando como referecircncia o significado dessas accedilotildees para a crianccedila possibilitando a

conduccedilatildeo dos trabalhos na educaccedilatildeo infantil que tornem possiacutevel o brincar ldquoletrando

e alfabetizandordquo (NEVES CASTANHEIRA E GOUVEIA 2015)

Outra temaacutetica que aparece num nuacutemero expressivo de postagens diz respeito

ao olhar do residente para as praacuteticas educativas e as interaccedilotildees que ocorrem na

escola com relaccedilatildeo agrave inclusatildeo escolar das crianccedilas percebidas como ldquodiferentesrdquo

Destaca-se nesta temaacutetica observaccedilotildees a respeito de diferenccedilas de religiatildeo gecircnero

raccedilacor e tambeacutem aquelas relacionadas agrave deficiecircncia Haacute descriccedilotildees sobre como as

crianccedilas lidam com as diferenccedilas e as formas como os professores trabalham com

aquelas que possuem alguma dificuldade Algumas postagens ressaltam a

necessidade de formaccedilatildeo inicial e continuada dos educadores para lidarem com a

diversidade na escola

Pela primeira vez vivenciei preconceito racial de uma crianccedila com outra Nos momentos em que a profa distribui lego para as crianccedilas ela daacute tambeacutem um bonequinho para cada crianccedila Tem bonecos adultos crianccedilas homens mulheres e de diversas cores Os bonecos satildeo dados aleatoriamente ou escolhidos pela crianccedila conforme a professora passa de mesa em mesa Neste dia um menino negro estava com um boneco negro Um garoto se aproximou e disse ldquoCredo que boneco feio parece vocecircrdquo se direcionando ao menino O menino deu de ombros e continuou a brincar e poucos minutos depois a menina que estava ao seu lado me perguntou ldquoPor que o boneco dele eacute pretinho Eacute muito feiordquo Claro que conversei com ela e com o outro menino em outro momento calmamente falando das diversas cores que as pessoas tecircm e que natildeo haacute isso de feio e bonito aproveitando para falar sobre diversidade e etc Mais para o final da conversa a menina me disse ldquoMeu pai eacute pretinho ele eacute bonitordquo Respondi a menina dizendo que a beleza natildeo estaacute na cor da pele do cabelo ou dos olhos A cena toda me fez refletir que a menina jaacute deve ter ouvido esse tipo de afirmaccedilatildeo errocircnea Jaacute comentei mais de uma vez sobre o preconceito de gecircnero ser muito forte mas e o racial algueacutem mais vivenciou esse tipo de preconceito durante esta residecircncia (Relato do residente T 2017)

Rosemberg (2014) chama a atenccedilatildeo para o tema da diversidade como uma

questatildeo circunscrita na histoacuteria da humanidade A diferenciaccedilatildeo entre os grupos

humanos ou pessoas com atributos que classificam e separam o ldquoeurdquo do ldquooutrordquo

parece constituir as diversas manifestaccedilotildees de culturas humanas Assim a autora

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desnaturaliza a identidade e a diferenccedila apontando o seu caraacuteter cultural social e

histoacuterico Contudo esse eacute um dos temas que tem chamado cada vez mais a atenccedilatildeo

de educadores desde a educaccedilatildeo infantil jaacute que muitas vezes as questotildees que

envolvem a diferenccedila e o diferente passam por processos discriminatoacuterios e

preconceituosos como apontado no relato do estudante ao observar as interaccedilotildees

entre as crianccedilas no que se refere ao quesito raccedilacor

Marinho e Martins (2016) em estudo sobre formaccedilatildeo de professoras que atuam

na educaccedilatildeo infantil constatam a escassez ou inexistecircncia de disciplinas na formaccedilatildeo

inicial de professores que abarquem as questotildees eacutetnico-raciais denunciando o natildeo

cumprimento das leis que entre outras prescriccedilotildees preveem que instituiccedilotildees de niacutevel

superior proporcionem aos futuros(as) professoresas a formaccedilatildeo adequada para

lidarem com as relaccedilotildees raciais multieacutetnica e multicultural da sociedade brasileira

Nesse sentido ao trazerem suas inquietaccedilotildees sobre como as crianccedilas lidam com as

diferenccedilas no contexto da escola os residentes se aproximam das discussotildees a

respeito dos processos discriminatoacuterios oportunizando momentos em que tais

temaacuteticas possam ser discutidas entre professores preceptores e colegas do

programa de estaacutegio

Aleacutem da questatildeo racial outros relatos nos datildeo conta de refletir e discutir sobre

as relaccedilotildees que envolvem as crianccedilas com deficiecircncia na escola

() O que me chamou atenccedilatildeo foi que na quarta (2204) H chegou na escola e decidiu mudar de lugar foi sentar bem ao lado do D (uma crianccedila que foi diagnosticada com autismo de ldquograu leverdquo segundo a professora) eu fiquei observando como seria a relaccedilatildeo deles H trouxe um caderno de desenho o abriu na mesa e dividiu metade da folha para ele e para D depois na hora de descer ele segurou a matildeo do D e ficou durante o almoccedilo todo cuidando de D o orientou a pegar a comida sentar comer devagar e quando natildeo quisesse mais deveria jogar a comida no lixo e durante todo o dia H permaneceu cuidando de D A professora achou estranho pois naquele dia ela natildeo havia chamado a atenccedilatildeo de H ateacute me falou ldquoEle deve estar aprontando e D eacute bobatildeo pode se machucarrdquo e decidiu intervir e pediu para que H mudasse de lugar e parasse de cuidar de (Relato do residente L 2015)

A partir da narrativa eacute possiacutevel refletir sobre o preparo dos professores para

lidar com as diferenccedilas individuais na educaccedilatildeo infantil A inclusatildeo escolar de crianccedilas

com deficiecircncia ocorre mediante poliacuteticas puacuteblicas de inclusatildeo contudo haacute uma

grande distacircncia entre a poliacutetica puacuteblica e a praacutetica pedagoacutegica nos contextos

escolares pois natildeo se aprofunda ldquoo debate sobre os meios os fins e as estrateacutegias

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para a implementaccedilatildeo da poliacutetica de ampliaccedilatildeo da rede de educaccedilatildeo infantilrdquo

(BRUNO 2008 p 59)

Outros registros que tratam da temaacutetica da inclusatildeo de crianccedilas com

deficiecircncia mostram o quanto a escola estaacute despreparada para lidar com essa

questatildeo Os relatos e inquietaccedilotildees dos estudantes nos possibilitam a identificaccedilatildeo de

processos discriminatoacuterios de resistecircncias e acomodaccedilotildees dos profissionais e do

distanciamento de uma praacutetica verdadeiramente inclusiva na esfera das praacuteticas

educativas cotidianas O que se percebe nas discussotildees sobre o assunto eacute que os

residentes enquanto futuros professores muito tecircm a aprender sobre a acolhida das

famiacutelias e das crianccedilas ldquodiferentesrdquo ou com deficiecircncia na constante reflexatildeo sobre o

comportamento atitudes e posturas do educador frente ao trabalho pedagoacutegico

Outras temaacuteticas tatildeo importantes como as que discutimos aqui tem sido objeto

de interesse dos estudantes em processo de imersatildeo nas escolas-campo Haacute uma

gama de registros sobre categorias que envolvem a crianccedila pequena nas atividades

do brincar a disciplina e a coerccedilatildeo dos educadores na tentativa de manter o controle

das crianccedilas e dos comportamentos considerados inadequados Muitos residentes se

surpreendem como essa coerccedilatildeo ocorre demasiadas vezes na escola e nas reuniotildees

de supervisatildeo eacute muito comum questionarem junto ao preceptor formas de

compreender por que algumas praacuteticas coercitivas satildeo tatildeo presentes na educaccedilatildeo

infantil

Consideraccedilotildees Finais

A experiecircncia de estaacutegio no Programa de Residecircncia Pedagoacutegica requer de

estudantes e professores uma atitude de intensa accedilatildeo e reflexatildeo Na perspectiva de

observaccedilatildeo participante eacute que a imersatildeo dos residentes na escola eacute orientada

embora natildeo haja uma intervenccedilatildeo direta planejada e sistemaacutetica sobre os modos de

fazer da escola e dos professores Possiacuteveis intervenccedilotildees sobre a escola suscitadas

pela presenccedila da universidade (de preceptores e residentes) satildeo uma contingecircncia

dos processos de formaccedilatildeo de condiccedilotildees e modos de seu desenvolvimento e eacute assim

que se define o lugar do residente e da preceptoria junto a escola o caraacuteter da

observaccedilatildeo participante a ser realizada durante o estaacutegio e sua conduccedilatildeo e discussatildeo

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no acircmbito escolar As posiccedilotildees dos residentes reeditam questotildees que mobilizam a

imersatildeo e reflexatildeo sobre o vivido como e quando participar O que como e quando

registrar sobre a observaccedilatildeo participante sobre o que se vivencia Como fazer uso

das ferramentas disponiacuteveis na escola e dos subsiacutedios teoacutericos oferecidos durante a

proacutepria residecircncia ou estudados no curso de pedagogia elaborando impressotildees sobre

o que descreve e refletindo sobre o que vive e elabora

A retomada dos escritos e reflexotildees dos estudantes participantes do Programa

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil nos trazem pistas relevantes para a

compreensatildeo natildeo somente dos seus processos formativos mas tambeacutem suscitam

atenccedilatildeo aos temas e questotildees emergentes do cotidiano das crianccedilas nas escolas de

Educaccedilatildeo Infantil Sabe-se que o processo de escrita eacute composto de idas e vindas

de avanccedilos e retrocessos de duacutevidas e certezas percebidas nos textos e contextos

apresentados pelos estudantes neste processo formativo especiacutefico

As postagens guardam caracteriacutesticas especiacuteficas correlatas ao vivido nas

praacuteticas de estaacutegio de acordo com as finalidades comunicativas e formativas do

caderno de campoblog e com especificidades ndash limites e possibilidades ndash que se

dimensionam nestas praacuteticas Os estudantes registram o que observam o que

vivenciam mas natildeo soacute Em muitos registros suas impressotildees (con)fundem-se com o

observado vatildeo aleacutem da descriccedilatildeo interpretando o visto o vivido e outras vezes para

alguns o registro se faz espaccedilo de recuperaccedilatildeo das proacuteprias vivecircncias e dos

elementos teoacutericos estudados

Nesta experiecircncia a liberdade na escolha e escrita dos temas dos cadernos de

campo tem permitido que o processo formativo de cada estudante aconteccedila de forma

uacutenica e original pois apesar de estarem imersos em ambientes semelhantes (em

alguns casos mesmas escolas-campo) e possuiacuterem referenciais teoacutericos semelhantes

(provenientes das unidades curriculares obrigatoacuterias e eletivas do Curso de

Pedagogia) os temas e questotildees que recebem a atenccedilatildeo de cada um satildeo distintos e

trabalhados teoricamente a partir das anguacutestias e inquietaccedilotildees individuais Entretanto

apesar das produccedilotildees escritas serem individuais ao serem publicizadas em reuniotildees

de orientaccedilatildeo ou ateacute no suporte virtual do blog elas podem ser compartilhadas e

tornam-se objeto comum de discussotildees e aprendizagens

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

Referecircncias bibliograacuteficas

BARBOSA Maria Carmem Silveira Por amor e por forccedila rotinas na Educaccedilatildeo Infantil Porto Alegre Artmed 2006

BRAGA Elizabeth dos Santos Viacutedeo escritas leituras recordaccedilotildees cultura e memoacuteria na sala de aula GOacuteES Maria Cecilia Rafael e SMOLKA Ana Luiza Bustamante A significaccedilatildeo nos espaccedilos Educacionais ndash Interaccedilatildeo social e subjetivaccedilatildeo Campinas Papirus Editora1997 p 87-110

BRUNO Marilda Moraes Garcia A construccedilatildeo da escola inclusiva um a anaacutelise das poliacuteticas puacuteblicas e da praacutetica pedagoacutegica no contexto da educaccedilatildeo infantil Revistambienteeducaccedilatildeo v 1 n 2 p56-67 2008

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MEKSENAS Paulo Sociologia da educaccedilatildeo uma introduccedilatildeo ao estudo da escola no processo de transformaccedilatildeo social Satildeo Paulo Loyola 2002

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VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

Correspondecircncia

Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Maria de Faacutetima Carvalho ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

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contradiccedilotildees entre aquilo que eacute rememorado pela estudante e o que efetivamente eacute

observado nas relaccedilotildees estabelecidas no contato com o cotidiano da escola

Aleacutem da rotina e da organizaccedilatildeo de tempos e espaccedilos em sua relaccedilatildeo com as

praacuteticas pedagoacutegicas os relatos dos estudantes se reportam agraves diferentes dimensotildees

da gestatildeo escolar Os registros destacam suas observaccedilotildees nas H A (hora atividade)

ou reuniotildees que eventualmente participam e com frequecircncia observam a postura da

equipe em relaccedilatildeo a presenccedila do residente Em seus relatos questionam o caraacuteter

da gestatildeo a qualidade da relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo entre os professores as discussotildees

que remetem a construccedilatildeo e discussatildeo do projeto poliacutetico pedagoacutegico e os papeis

desempenhados pelos diferentes educadores na construccedilatildeo do trabalho de educaccedilatildeo

da infacircncia

Completamos nesta semana 4 dias de participaccedilatildeo nas Horas Atividades (HA) destinada agrave formaccedilatildeo docente organizaccedilatildeo dos registros e planejamento das atividades pedagoacutegicas O que pude por meio da observaccedilatildeo constatar que o papel do Coordenador Pedagoacutegico que eacute fundamental nesse momento de formaccedilatildeo pois eacute ele o mediador desse processo acaba por se tornar distante e sem intervenccedilotildees no que adentra a orientaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico docente (Relato da estudante M 2015)

Na experiecircncia cotidiana de imersatildeo na escola eacute possiacutevel verificar as tensotildees

vivenciadas entre os professores e o papel da coordenaccedilatildeo pedagoacutegica A teoria

discutida na universidade pelos residentes assinala a importacircncia do papel do

coordenador pedagoacutegico na educaccedilatildeo infantil na praacutetica o residente percebe o quanto

a sua mediaccedilatildeo eacute fundamental na organizaccedilatildeo do trabalho pedagoacutegico e por outro

lado o quanto a sua ausecircncia pode interferir de forma negativa na orientaccedilatildeo das

atividades dos professores

Outra personagem que acaba sendo central na gestatildeo escolar eacute a direccedilatildeo que

nessa experiecircncia do residente tambeacutem eacute observada de forma criacutetica

A figura da diretora na escola foi a que mais me chamou a atenccedilatildeo ()imaginem que em nenhum momento percebi qualquer aproximaccedilatildeo da diretora com as crianccedilas em vaacuterios momentos acreditei que ela fosse algum teacutecnico administrativo pois apesar de estar no topo da piracircmide a referecircncia da gestatildeo a mesma se restringia a secretaria e natildeo se relacionava natildeo nos conhecia nem procurava nos conhecer Passou diversas vezes por grupos de crianccedilas e em nenhuma das vezes sequer olhou para elas Nunca apareceu em uma HA nunca percebi o seu contato com os professores e por diversas vezes me perguntei como eles se falavam qual era o seu relacionamento (Relato da residente B 2015)

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Sobre esse assunto estudos como os de Paro (2005) e Castro (2009) tem

assinalado o papel da gestatildeo e da administraccedilatildeo escolar como alicerce fundamental

nos processos de transformaccedilatildeo da escola puacuteblica brasileira Tais trabalhos tecircm

apontado a centralidade da direccedilatildeo escolar nas questotildees que envolvem os processos

de ensino e aprendizagem e as relaccedilotildees humanas presentes na equipe de trabalho

para aleacutem dos trabalhos administrativos e burocraacuteticos Natildeo eacute objetivo deste trabalho

fazer uma anaacutelise do papel do diretor na escola de educaccedilatildeo infantil mas cabe

assinalar que os estudantes residentes apontam o tema em seus registros e atentos

agraves demandas relativas ao papel do diretor indagam se como e quanto as lideranccedilas

escolares tecircm se envolvido com o trabalho administrativo dispendendo tempo para

um olhar mais atento agraves relaccedilotildees entre os professoresalunos funcionaacuterios da escola

observada

Em relaccedilatildeo agraves interaccedilotildees humanas outros registros dos residentes nos

remetem agraves maneiras como a escola lida com as famiacutelias das crianccedilas matriculadas

nas escolas Tais relatos natildeo satildeo tatildeo frequentes possivelmente porque essa eacute uma

relaccedilatildeo que se caracteriza pela assimetria de poderes e eacute pouco valorizada no dia a

dia escolar Os registros evocam situaccedilotildees vividas comentaacuterios ouvidos e

principalmente a necessidade de mudanccedila dos modos de conceber a crianccedila e suas

famiacutelias e de interagir com elas

A relaccedilatildeo entre professor e famiacutelia eacute mais uma dessas conexotildees que fazemos pela vida Por um lado haacute um profissional uma pessoa que estudou e eacute especialista em cuidar de crianccedilas Por outro famiacutelias que dificilmente conseguimos de fato perceber como satildeo suas estruturadas Famiacutelia hoje eacute coisa difiacutecil de entender Eacute matildee que mora sozinha com o filho eacute pais que trabalham e deixam os filhos na semana com tios avoacutes Eacute matildee solteira Eacute filho criado por pai viuacutevo Eacute histoacuteria que natildeo acaba mais Na hora da saiacuteda vamos conhecendo um pouquinho da estrutura familiar de cada crianccedila tentando perceber como se daacute a relaccedilatildeo entre a famiacutelia e a escola mas devemos ter um pouco de cuidado com esse processo (Relato do estudante J 2015)

Aleacutem da residente ter um olhar para os diferentes tipos de arranjos familiares

tambeacutem busca compreender a especificidade de cada famiacutelia considerando o papel

da mulher e de matildee trabalhadora com filhos na escola puacuteblica

(hellip) Veja esses apontamentos uma menina na sala estaacute com piolho a professora disse que jaacute alertou a matildee mas como eacute matildee solteira soacute pode cuidar da filha no domingo O outro menino que natildeo se interessa pelas atividades e responde a educadora tambeacutem teve a matildee notificada mas como

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a mesma eacute separada do marido natildeo faz nada O fato da mulher trabalhar a semana e ter folga aos domingos natildeo significa que ela seja uma maacute matildee pelo contraacuterio significa que ela rala muito para colocar comida no prato A presenccedila ou natildeo de um homem natildeo condiciona nada A escola natildeo pode ser um ambiente de roacutetulos ela deve estar aberta agraves diferenccedilas acolhendo e buscando outras maneiras e formas de aproximaccedilatildeo com a famiacutelia compreendendo a responsabilidade compartilhada que carregam (Registro da residente B 2015)

Os relatos demonstram natildeo soacute o quanto estatildeo atentos para como a escola lida

com as relaccedilotildees familiares mas sobretudo assinalam como tecircm se configurado as

formaccedilotildees das famiacutelias na atualidade Um estudo de Martins (2012) aponta o quanto

a experiecircncia de residecircncia pedagoacutegica possibilita aos estudantes um contato mais

expressivo com a realidade da escola puacuteblica de periferia urbana Aleacutem de observar

as relaccedilotildees institucionais o residente pode ser sensibilizado frente agraves dificuldades

vividas pelas famiacutelias e tendem a perceber o preconceito em relaccedilatildeo aos vaacuterios

arranjos familiares vivenciados pelas crianccedilas mais pobres e como a escolarizaccedilatildeo

dos pais pode afetar a vida dos filhos Os registros dos residentes demonstram como

ldquoos contextos de vida das crianccedilas que frequentam a escola puacuteblica de periferia

passam a ser compreendidos de uma forma concreta e as relaccedilotildees do espaccedilo familiar

com o espaccedilo escolar passam a ter uma conexatildeo cotidianardquo (MARTINS 2012 p 95)

Outra temaacutetica recorrente nos registros dos estudantes diz respeito ao processo

de escolarizaccedilatildeo das praacuteticas da educaccedilatildeo da infacircncia Tal perspectiva surge quando

os residentes referem aos usos dos brinquedos e agraves brincadeiras agrave presenccedila da

leitura e contaccedilatildeo de histoacuterias aos modos de introduccedilatildeo do desenho ao uso de novas

tecnologias e aos modos de avaliar agraves crianccedilas Tal perspectiva escolarizante emerge

em oposiccedilatildeo ao luacutedico como princiacutepio e forma de organizaccedilatildeo das praacuteticas de

educaccedilatildeo junto agraves crianccedilas pequenas e algumas vezes a ela ainda se articula a

preocupaccedilatildeo em disciplinar as vivecircncias escolares sondagens filas broncas e

silecircncios coexistem com desenhos Tv computadores e brincadeiras Os registros nos

dizem de uma escola que hesita entre coibir e promover a expressatildeo das muitas

linguagens da imaginaccedilatildeo e movimento das crianccedilas

Na semana de 2310 a 2710 e como previsto na reuniatildeo de pais a professora realizou a sondagem com as crianccedilas Teoricamente sei como funciona o procedimento mas me questiono se deve ser realizada na Ed Infantil Tambeacutem me pergunto se a sondagem vai muito aleacutem do conhecimento das crianccedilas Por exemplo algumas escrevem o proacuteprio nome

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e algumas palavras mais comuns a elas outras ainda nem reconhecem as letras do alfabeto A sondagem feita abarcou o nome palavras simples um pouco mais complexas e uma frase inteira A minha duacutevida eacute se a sondagem que vai muito aleacutem dos conhecimentos da sala eacute comum e necessaacuteria ainda mais na Ed Infantil (Relato do residente N 2017)

O debate em torno das questotildees que envolvem a escolarizaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute bastante antigo e recorrente Pesquisas como as de Neves Castanheira

e Gouveia (2015) assinalam a partir de autores que estudaram essa temaacutetica como

a perspectiva escolarizante de trabalho com a crianccedila pequena traz seacuterias implicaccedilotildees

para o desenvolvimento infantil justamente porque rompe com as formas como elas

ldquointeragem com a escrita fora da escola destituindo-a de significados pessoais e

sociais e dificulta portanto que as atividades desenvolvidas no espaccedilo escolar

envolvam a ludicidade caracteriacutestica fundamental dessa fase do desenvolvimentordquo

(p 217)

Os residentes parecem estar muito atentos a essas questotildees porque participam

de discussotildees sistemaacuteticas sobre o assunto tanto nas aulas teoacutericas na Universidade

quanto nas reuniotildees de orientaccedilatildeo com os preceptores do Programa de Residecircncia

Muitos estudantes satildeo levados a refletir sobre o assunto logo nos primeiros dias de

imersatildeo na escola

Resolvi mudar o formato do meu relato referente agrave imersatildeo inicial Pois passei por uma situaccedilatildeo em sala que me provocou tal accedilatildeo Devido agrave imposiccedilatildeo de escolarizaccedilatildeo percebida na turma na qual acompanho Onde hoje me emocionei com o choro insistente do aluno BG com as matildeos estremecidas na tentativa de segurar o laacutepis para ldquofazer liccedilatildeordquo (Relato da Residente M 2015)

A partir do relato da residente percebe-se o quanto a questatildeo eacute relevante para

o campo da educaccedilatildeo infantil e da formaccedilatildeo de professores Nas observaccedilotildees e

relatos dos cadernos de campo natildeo eacute incomum aparecerem longas narrativas sobre

os equiacutevocos que ocorrem nas praacuteticas pedagoacutegicas que envolvem a alfabetizaccedilatildeo e

letramento das crianccedilas pequenas Consideramos que questotildees como essas quando

problematizadas pelos estudantes nos horaacuterios de preceptoria ou mesmo nas

discussotildees com professores especialistas sobre o tema tendem a aproximaacute-los de

uma futura praacutetica profissional em que o trabalho com o desenvolvimento da escrita

seja realizado de forma a respeitar a infacircncia natildeo negando agrave crianccedila o seu direito ao

luacutedico mas tratando a apresentaccedilatildeo do mundo letrado como mais um momento

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prazeroso de aprendizagens Tal reflexatildeo eacute importante para os futuros professores

para que busquem compreender como inserir as crianccedilas no mundo letrado de

maneira que possam romper com a dicotomia entre o brincar e a leituraescrita

tomando como referecircncia o significado dessas accedilotildees para a crianccedila possibilitando a

conduccedilatildeo dos trabalhos na educaccedilatildeo infantil que tornem possiacutevel o brincar ldquoletrando

e alfabetizandordquo (NEVES CASTANHEIRA E GOUVEIA 2015)

Outra temaacutetica que aparece num nuacutemero expressivo de postagens diz respeito

ao olhar do residente para as praacuteticas educativas e as interaccedilotildees que ocorrem na

escola com relaccedilatildeo agrave inclusatildeo escolar das crianccedilas percebidas como ldquodiferentesrdquo

Destaca-se nesta temaacutetica observaccedilotildees a respeito de diferenccedilas de religiatildeo gecircnero

raccedilacor e tambeacutem aquelas relacionadas agrave deficiecircncia Haacute descriccedilotildees sobre como as

crianccedilas lidam com as diferenccedilas e as formas como os professores trabalham com

aquelas que possuem alguma dificuldade Algumas postagens ressaltam a

necessidade de formaccedilatildeo inicial e continuada dos educadores para lidarem com a

diversidade na escola

Pela primeira vez vivenciei preconceito racial de uma crianccedila com outra Nos momentos em que a profa distribui lego para as crianccedilas ela daacute tambeacutem um bonequinho para cada crianccedila Tem bonecos adultos crianccedilas homens mulheres e de diversas cores Os bonecos satildeo dados aleatoriamente ou escolhidos pela crianccedila conforme a professora passa de mesa em mesa Neste dia um menino negro estava com um boneco negro Um garoto se aproximou e disse ldquoCredo que boneco feio parece vocecircrdquo se direcionando ao menino O menino deu de ombros e continuou a brincar e poucos minutos depois a menina que estava ao seu lado me perguntou ldquoPor que o boneco dele eacute pretinho Eacute muito feiordquo Claro que conversei com ela e com o outro menino em outro momento calmamente falando das diversas cores que as pessoas tecircm e que natildeo haacute isso de feio e bonito aproveitando para falar sobre diversidade e etc Mais para o final da conversa a menina me disse ldquoMeu pai eacute pretinho ele eacute bonitordquo Respondi a menina dizendo que a beleza natildeo estaacute na cor da pele do cabelo ou dos olhos A cena toda me fez refletir que a menina jaacute deve ter ouvido esse tipo de afirmaccedilatildeo errocircnea Jaacute comentei mais de uma vez sobre o preconceito de gecircnero ser muito forte mas e o racial algueacutem mais vivenciou esse tipo de preconceito durante esta residecircncia (Relato do residente T 2017)

Rosemberg (2014) chama a atenccedilatildeo para o tema da diversidade como uma

questatildeo circunscrita na histoacuteria da humanidade A diferenciaccedilatildeo entre os grupos

humanos ou pessoas com atributos que classificam e separam o ldquoeurdquo do ldquooutrordquo

parece constituir as diversas manifestaccedilotildees de culturas humanas Assim a autora

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desnaturaliza a identidade e a diferenccedila apontando o seu caraacuteter cultural social e

histoacuterico Contudo esse eacute um dos temas que tem chamado cada vez mais a atenccedilatildeo

de educadores desde a educaccedilatildeo infantil jaacute que muitas vezes as questotildees que

envolvem a diferenccedila e o diferente passam por processos discriminatoacuterios e

preconceituosos como apontado no relato do estudante ao observar as interaccedilotildees

entre as crianccedilas no que se refere ao quesito raccedilacor

Marinho e Martins (2016) em estudo sobre formaccedilatildeo de professoras que atuam

na educaccedilatildeo infantil constatam a escassez ou inexistecircncia de disciplinas na formaccedilatildeo

inicial de professores que abarquem as questotildees eacutetnico-raciais denunciando o natildeo

cumprimento das leis que entre outras prescriccedilotildees preveem que instituiccedilotildees de niacutevel

superior proporcionem aos futuros(as) professoresas a formaccedilatildeo adequada para

lidarem com as relaccedilotildees raciais multieacutetnica e multicultural da sociedade brasileira

Nesse sentido ao trazerem suas inquietaccedilotildees sobre como as crianccedilas lidam com as

diferenccedilas no contexto da escola os residentes se aproximam das discussotildees a

respeito dos processos discriminatoacuterios oportunizando momentos em que tais

temaacuteticas possam ser discutidas entre professores preceptores e colegas do

programa de estaacutegio

Aleacutem da questatildeo racial outros relatos nos datildeo conta de refletir e discutir sobre

as relaccedilotildees que envolvem as crianccedilas com deficiecircncia na escola

() O que me chamou atenccedilatildeo foi que na quarta (2204) H chegou na escola e decidiu mudar de lugar foi sentar bem ao lado do D (uma crianccedila que foi diagnosticada com autismo de ldquograu leverdquo segundo a professora) eu fiquei observando como seria a relaccedilatildeo deles H trouxe um caderno de desenho o abriu na mesa e dividiu metade da folha para ele e para D depois na hora de descer ele segurou a matildeo do D e ficou durante o almoccedilo todo cuidando de D o orientou a pegar a comida sentar comer devagar e quando natildeo quisesse mais deveria jogar a comida no lixo e durante todo o dia H permaneceu cuidando de D A professora achou estranho pois naquele dia ela natildeo havia chamado a atenccedilatildeo de H ateacute me falou ldquoEle deve estar aprontando e D eacute bobatildeo pode se machucarrdquo e decidiu intervir e pediu para que H mudasse de lugar e parasse de cuidar de (Relato do residente L 2015)

A partir da narrativa eacute possiacutevel refletir sobre o preparo dos professores para

lidar com as diferenccedilas individuais na educaccedilatildeo infantil A inclusatildeo escolar de crianccedilas

com deficiecircncia ocorre mediante poliacuteticas puacuteblicas de inclusatildeo contudo haacute uma

grande distacircncia entre a poliacutetica puacuteblica e a praacutetica pedagoacutegica nos contextos

escolares pois natildeo se aprofunda ldquoo debate sobre os meios os fins e as estrateacutegias

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para a implementaccedilatildeo da poliacutetica de ampliaccedilatildeo da rede de educaccedilatildeo infantilrdquo

(BRUNO 2008 p 59)

Outros registros que tratam da temaacutetica da inclusatildeo de crianccedilas com

deficiecircncia mostram o quanto a escola estaacute despreparada para lidar com essa

questatildeo Os relatos e inquietaccedilotildees dos estudantes nos possibilitam a identificaccedilatildeo de

processos discriminatoacuterios de resistecircncias e acomodaccedilotildees dos profissionais e do

distanciamento de uma praacutetica verdadeiramente inclusiva na esfera das praacuteticas

educativas cotidianas O que se percebe nas discussotildees sobre o assunto eacute que os

residentes enquanto futuros professores muito tecircm a aprender sobre a acolhida das

famiacutelias e das crianccedilas ldquodiferentesrdquo ou com deficiecircncia na constante reflexatildeo sobre o

comportamento atitudes e posturas do educador frente ao trabalho pedagoacutegico

Outras temaacuteticas tatildeo importantes como as que discutimos aqui tem sido objeto

de interesse dos estudantes em processo de imersatildeo nas escolas-campo Haacute uma

gama de registros sobre categorias que envolvem a crianccedila pequena nas atividades

do brincar a disciplina e a coerccedilatildeo dos educadores na tentativa de manter o controle

das crianccedilas e dos comportamentos considerados inadequados Muitos residentes se

surpreendem como essa coerccedilatildeo ocorre demasiadas vezes na escola e nas reuniotildees

de supervisatildeo eacute muito comum questionarem junto ao preceptor formas de

compreender por que algumas praacuteticas coercitivas satildeo tatildeo presentes na educaccedilatildeo

infantil

Consideraccedilotildees Finais

A experiecircncia de estaacutegio no Programa de Residecircncia Pedagoacutegica requer de

estudantes e professores uma atitude de intensa accedilatildeo e reflexatildeo Na perspectiva de

observaccedilatildeo participante eacute que a imersatildeo dos residentes na escola eacute orientada

embora natildeo haja uma intervenccedilatildeo direta planejada e sistemaacutetica sobre os modos de

fazer da escola e dos professores Possiacuteveis intervenccedilotildees sobre a escola suscitadas

pela presenccedila da universidade (de preceptores e residentes) satildeo uma contingecircncia

dos processos de formaccedilatildeo de condiccedilotildees e modos de seu desenvolvimento e eacute assim

que se define o lugar do residente e da preceptoria junto a escola o caraacuteter da

observaccedilatildeo participante a ser realizada durante o estaacutegio e sua conduccedilatildeo e discussatildeo

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no acircmbito escolar As posiccedilotildees dos residentes reeditam questotildees que mobilizam a

imersatildeo e reflexatildeo sobre o vivido como e quando participar O que como e quando

registrar sobre a observaccedilatildeo participante sobre o que se vivencia Como fazer uso

das ferramentas disponiacuteveis na escola e dos subsiacutedios teoacutericos oferecidos durante a

proacutepria residecircncia ou estudados no curso de pedagogia elaborando impressotildees sobre

o que descreve e refletindo sobre o que vive e elabora

A retomada dos escritos e reflexotildees dos estudantes participantes do Programa

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil nos trazem pistas relevantes para a

compreensatildeo natildeo somente dos seus processos formativos mas tambeacutem suscitam

atenccedilatildeo aos temas e questotildees emergentes do cotidiano das crianccedilas nas escolas de

Educaccedilatildeo Infantil Sabe-se que o processo de escrita eacute composto de idas e vindas

de avanccedilos e retrocessos de duacutevidas e certezas percebidas nos textos e contextos

apresentados pelos estudantes neste processo formativo especiacutefico

As postagens guardam caracteriacutesticas especiacuteficas correlatas ao vivido nas

praacuteticas de estaacutegio de acordo com as finalidades comunicativas e formativas do

caderno de campoblog e com especificidades ndash limites e possibilidades ndash que se

dimensionam nestas praacuteticas Os estudantes registram o que observam o que

vivenciam mas natildeo soacute Em muitos registros suas impressotildees (con)fundem-se com o

observado vatildeo aleacutem da descriccedilatildeo interpretando o visto o vivido e outras vezes para

alguns o registro se faz espaccedilo de recuperaccedilatildeo das proacuteprias vivecircncias e dos

elementos teoacutericos estudados

Nesta experiecircncia a liberdade na escolha e escrita dos temas dos cadernos de

campo tem permitido que o processo formativo de cada estudante aconteccedila de forma

uacutenica e original pois apesar de estarem imersos em ambientes semelhantes (em

alguns casos mesmas escolas-campo) e possuiacuterem referenciais teoacutericos semelhantes

(provenientes das unidades curriculares obrigatoacuterias e eletivas do Curso de

Pedagogia) os temas e questotildees que recebem a atenccedilatildeo de cada um satildeo distintos e

trabalhados teoricamente a partir das anguacutestias e inquietaccedilotildees individuais Entretanto

apesar das produccedilotildees escritas serem individuais ao serem publicizadas em reuniotildees

de orientaccedilatildeo ou ateacute no suporte virtual do blog elas podem ser compartilhadas e

tornam-se objeto comum de discussotildees e aprendizagens

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

Referecircncias bibliograacuteficas

BARBOSA Maria Carmem Silveira Por amor e por forccedila rotinas na Educaccedilatildeo Infantil Porto Alegre Artmed 2006

BRAGA Elizabeth dos Santos Viacutedeo escritas leituras recordaccedilotildees cultura e memoacuteria na sala de aula GOacuteES Maria Cecilia Rafael e SMOLKA Ana Luiza Bustamante A significaccedilatildeo nos espaccedilos Educacionais ndash Interaccedilatildeo social e subjetivaccedilatildeo Campinas Papirus Editora1997 p 87-110

BRUNO Marilda Moraes Garcia A construccedilatildeo da escola inclusiva um a anaacutelise das poliacuteticas puacuteblicas e da praacutetica pedagoacutegica no contexto da educaccedilatildeo infantil Revistambienteeducaccedilatildeo v 1 n 2 p56-67 2008

CASTRO Marta Luz Sisson de Formaccedilatildeo do Diretor de Escola do Estado do Rio Grande do Sul implicaccedilotildees para a praacutetica Educaccedilatildeo v 32 n 2 p 114-121 2009

FEUERWERKER Laura Mudanccedilas na educaccedilatildeo meacutedica e residecircncia meacutedica no Brasil Interface comum sauacutede educaccedilatildeo vol 2 n3 p 51-71 1998

FREITAS Maria Teresa Assunccedilatildeo A pesquisa de abordagem histoacuterico-cultural um espaccedilo educativo de constituiccedilatildeo de sujeitos Revista Teias v 10 n 19 p 01-12 2009

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto Residecircncia Pedagoacutegica como diaacutelogo permanente entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores In DALBEN A et al (org) Convergecircncias e tensotildees no campo da formaccedilatildeo e do trabalho docente Belo

Horizonte Autecircntica v 1 p 375-392 2010

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto LUGLI Rosaacuterio Silvana Genta Diaacutelogos pertinentes na formaccedilatildeo inicial e continuada de professores e gestores escolares A concepccedilatildeo

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do Programa de Residecircncia Pedagoacutegica na UNIFESP Cadernos de Educaccedilatildeo n

46 p 62-82 2014

MARINHO Ceacutesar Henrique MARTINS Edna Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees eacutetnico-raciais impactos da formaccedilatildeo docente nas praacuteticas educativas Revista Educaccedilatildeo e Cultura Contemporacircnea v 14 n 34 p 42-63 2016

MARTINS Thaiacutes Regina Miranda SLAVEZ Milka Helena Carrilho Um estudo sobre programas de iniciaccedilatildeo agrave praacutetica profissional de professores no Brasil o PIBID e o estaacutegio de Residecircncia Ensino amp Pesquisa v 13 n 01 p 29-41 2016

MARQUES Danielle Vieira Aquino MUumlLLER Fernanda Experiecircncias com blog na pesquisa e na formaccedilatildeo inicial de professoras de educaccedilatildeo infantil ETD-Educaccedilatildeo Temaacutetica Digital v 14 n 1 p 43-61 2012

MARTINS E Famiacutelia e escola no contexto de um programa de residecircncia pedagoacutegica um estudo a partir do enfoque histoacuterico-cultural Educaccedilatildeo Sociedade amp Culturas v 37 p 89-107 2012

MEKSENAS Paulo Sociologia da educaccedilatildeo uma introduccedilatildeo ao estudo da escola no processo de transformaccedilatildeo social Satildeo Paulo Loyola 2002

MORETTI Vanessa Dias MARTINS Edna Atividade de ensino mediaccedilatildeo e aprendizagem da docecircncia na residecircncia pedagoacutegica uma anaacutelise a partir da teoria histoacuterico-cultural Revista Contrapontos v 15 n 3 p 394-411 2015

MORETTI Vanessa Dias A articulaccedilatildeo entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores que ensinam matemaacutetica o caso da Residecircncia Pedagoacutegica da Unifesp Revista Educaccedilatildeo Porto Alegre 2011 v 34 n 3 p 385-390 2011

NEVES Vanessa Ferraz Almeida CASTANHEIRA Maria Luacutecia GOUVEcircA Maria Cristina Soares O letramento e o brincar em processos de socializaccedilatildeo na educaccedilatildeo infantil brincadeiras diferentes Revista Brasileira de Educaccedilatildeo v 20 n 60 p 215-

244 2015

NOacuteVOA Antoacutenio Os professores e as Histoacuterias da Sua Vida In NOacuteVOA Antoacutenio (org) Vidas de Professores 2ordf ed Porto Porto Editora p 18-30 2000

PARO Vitor Henrique A educaccedilatildeo a poliacutetica e a administraccedilatildeo reflexotildees sobre a praacutetica do diretor de escola Educaccedilatildeo e Pesquisa v 36 n 3 p 763-778 2010

POLADIAN Marina Lopes Pedrosa Estudo sobre o Programa de residecircncia pedagoacutegica da Unifesp uma articulaccedilatildeo entre Universidade e escola na formaccedilatildeo de professores Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia da Educaccedilatildeo) - Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Satildeo Paulo 2014

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ROSEMBERG Fulvia Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees raciais a tensatildeo entre igualdade e diversidade Cadernos de Pesquisa v 44 n 153 p 742-759 2014

SILVA Adriana BUFALO Joseane O espaccedilo na pedagogia da educaccedilatildeo infantil faacutebula perversidade e possibilidade In Culturas infantis em creches e preacute-escolas estaacutegio e pesquisa Campinas SP Autores Associados 2011

TARDIF Maurice A profissionalizaccedilatildeo do ensino passados trinta anos dois passos para a frente trecircs para traacutes Educaccedilatildeo e Sociedade Campinas SP v34 n123 p

551-571 2013

VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

Correspondecircncia

Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Maria de Faacutetima Carvalho ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

E-mail emartinsunifespgmailcom ndash carvalhomdfgmailcom ndash

remarciliogmailcom

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Sobre esse assunto estudos como os de Paro (2005) e Castro (2009) tem

assinalado o papel da gestatildeo e da administraccedilatildeo escolar como alicerce fundamental

nos processos de transformaccedilatildeo da escola puacuteblica brasileira Tais trabalhos tecircm

apontado a centralidade da direccedilatildeo escolar nas questotildees que envolvem os processos

de ensino e aprendizagem e as relaccedilotildees humanas presentes na equipe de trabalho

para aleacutem dos trabalhos administrativos e burocraacuteticos Natildeo eacute objetivo deste trabalho

fazer uma anaacutelise do papel do diretor na escola de educaccedilatildeo infantil mas cabe

assinalar que os estudantes residentes apontam o tema em seus registros e atentos

agraves demandas relativas ao papel do diretor indagam se como e quanto as lideranccedilas

escolares tecircm se envolvido com o trabalho administrativo dispendendo tempo para

um olhar mais atento agraves relaccedilotildees entre os professoresalunos funcionaacuterios da escola

observada

Em relaccedilatildeo agraves interaccedilotildees humanas outros registros dos residentes nos

remetem agraves maneiras como a escola lida com as famiacutelias das crianccedilas matriculadas

nas escolas Tais relatos natildeo satildeo tatildeo frequentes possivelmente porque essa eacute uma

relaccedilatildeo que se caracteriza pela assimetria de poderes e eacute pouco valorizada no dia a

dia escolar Os registros evocam situaccedilotildees vividas comentaacuterios ouvidos e

principalmente a necessidade de mudanccedila dos modos de conceber a crianccedila e suas

famiacutelias e de interagir com elas

A relaccedilatildeo entre professor e famiacutelia eacute mais uma dessas conexotildees que fazemos pela vida Por um lado haacute um profissional uma pessoa que estudou e eacute especialista em cuidar de crianccedilas Por outro famiacutelias que dificilmente conseguimos de fato perceber como satildeo suas estruturadas Famiacutelia hoje eacute coisa difiacutecil de entender Eacute matildee que mora sozinha com o filho eacute pais que trabalham e deixam os filhos na semana com tios avoacutes Eacute matildee solteira Eacute filho criado por pai viuacutevo Eacute histoacuteria que natildeo acaba mais Na hora da saiacuteda vamos conhecendo um pouquinho da estrutura familiar de cada crianccedila tentando perceber como se daacute a relaccedilatildeo entre a famiacutelia e a escola mas devemos ter um pouco de cuidado com esse processo (Relato do estudante J 2015)

Aleacutem da residente ter um olhar para os diferentes tipos de arranjos familiares

tambeacutem busca compreender a especificidade de cada famiacutelia considerando o papel

da mulher e de matildee trabalhadora com filhos na escola puacuteblica

(hellip) Veja esses apontamentos uma menina na sala estaacute com piolho a professora disse que jaacute alertou a matildee mas como eacute matildee solteira soacute pode cuidar da filha no domingo O outro menino que natildeo se interessa pelas atividades e responde a educadora tambeacutem teve a matildee notificada mas como

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a mesma eacute separada do marido natildeo faz nada O fato da mulher trabalhar a semana e ter folga aos domingos natildeo significa que ela seja uma maacute matildee pelo contraacuterio significa que ela rala muito para colocar comida no prato A presenccedila ou natildeo de um homem natildeo condiciona nada A escola natildeo pode ser um ambiente de roacutetulos ela deve estar aberta agraves diferenccedilas acolhendo e buscando outras maneiras e formas de aproximaccedilatildeo com a famiacutelia compreendendo a responsabilidade compartilhada que carregam (Registro da residente B 2015)

Os relatos demonstram natildeo soacute o quanto estatildeo atentos para como a escola lida

com as relaccedilotildees familiares mas sobretudo assinalam como tecircm se configurado as

formaccedilotildees das famiacutelias na atualidade Um estudo de Martins (2012) aponta o quanto

a experiecircncia de residecircncia pedagoacutegica possibilita aos estudantes um contato mais

expressivo com a realidade da escola puacuteblica de periferia urbana Aleacutem de observar

as relaccedilotildees institucionais o residente pode ser sensibilizado frente agraves dificuldades

vividas pelas famiacutelias e tendem a perceber o preconceito em relaccedilatildeo aos vaacuterios

arranjos familiares vivenciados pelas crianccedilas mais pobres e como a escolarizaccedilatildeo

dos pais pode afetar a vida dos filhos Os registros dos residentes demonstram como

ldquoos contextos de vida das crianccedilas que frequentam a escola puacuteblica de periferia

passam a ser compreendidos de uma forma concreta e as relaccedilotildees do espaccedilo familiar

com o espaccedilo escolar passam a ter uma conexatildeo cotidianardquo (MARTINS 2012 p 95)

Outra temaacutetica recorrente nos registros dos estudantes diz respeito ao processo

de escolarizaccedilatildeo das praacuteticas da educaccedilatildeo da infacircncia Tal perspectiva surge quando

os residentes referem aos usos dos brinquedos e agraves brincadeiras agrave presenccedila da

leitura e contaccedilatildeo de histoacuterias aos modos de introduccedilatildeo do desenho ao uso de novas

tecnologias e aos modos de avaliar agraves crianccedilas Tal perspectiva escolarizante emerge

em oposiccedilatildeo ao luacutedico como princiacutepio e forma de organizaccedilatildeo das praacuteticas de

educaccedilatildeo junto agraves crianccedilas pequenas e algumas vezes a ela ainda se articula a

preocupaccedilatildeo em disciplinar as vivecircncias escolares sondagens filas broncas e

silecircncios coexistem com desenhos Tv computadores e brincadeiras Os registros nos

dizem de uma escola que hesita entre coibir e promover a expressatildeo das muitas

linguagens da imaginaccedilatildeo e movimento das crianccedilas

Na semana de 2310 a 2710 e como previsto na reuniatildeo de pais a professora realizou a sondagem com as crianccedilas Teoricamente sei como funciona o procedimento mas me questiono se deve ser realizada na Ed Infantil Tambeacutem me pergunto se a sondagem vai muito aleacutem do conhecimento das crianccedilas Por exemplo algumas escrevem o proacuteprio nome

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e algumas palavras mais comuns a elas outras ainda nem reconhecem as letras do alfabeto A sondagem feita abarcou o nome palavras simples um pouco mais complexas e uma frase inteira A minha duacutevida eacute se a sondagem que vai muito aleacutem dos conhecimentos da sala eacute comum e necessaacuteria ainda mais na Ed Infantil (Relato do residente N 2017)

O debate em torno das questotildees que envolvem a escolarizaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute bastante antigo e recorrente Pesquisas como as de Neves Castanheira

e Gouveia (2015) assinalam a partir de autores que estudaram essa temaacutetica como

a perspectiva escolarizante de trabalho com a crianccedila pequena traz seacuterias implicaccedilotildees

para o desenvolvimento infantil justamente porque rompe com as formas como elas

ldquointeragem com a escrita fora da escola destituindo-a de significados pessoais e

sociais e dificulta portanto que as atividades desenvolvidas no espaccedilo escolar

envolvam a ludicidade caracteriacutestica fundamental dessa fase do desenvolvimentordquo

(p 217)

Os residentes parecem estar muito atentos a essas questotildees porque participam

de discussotildees sistemaacuteticas sobre o assunto tanto nas aulas teoacutericas na Universidade

quanto nas reuniotildees de orientaccedilatildeo com os preceptores do Programa de Residecircncia

Muitos estudantes satildeo levados a refletir sobre o assunto logo nos primeiros dias de

imersatildeo na escola

Resolvi mudar o formato do meu relato referente agrave imersatildeo inicial Pois passei por uma situaccedilatildeo em sala que me provocou tal accedilatildeo Devido agrave imposiccedilatildeo de escolarizaccedilatildeo percebida na turma na qual acompanho Onde hoje me emocionei com o choro insistente do aluno BG com as matildeos estremecidas na tentativa de segurar o laacutepis para ldquofazer liccedilatildeordquo (Relato da Residente M 2015)

A partir do relato da residente percebe-se o quanto a questatildeo eacute relevante para

o campo da educaccedilatildeo infantil e da formaccedilatildeo de professores Nas observaccedilotildees e

relatos dos cadernos de campo natildeo eacute incomum aparecerem longas narrativas sobre

os equiacutevocos que ocorrem nas praacuteticas pedagoacutegicas que envolvem a alfabetizaccedilatildeo e

letramento das crianccedilas pequenas Consideramos que questotildees como essas quando

problematizadas pelos estudantes nos horaacuterios de preceptoria ou mesmo nas

discussotildees com professores especialistas sobre o tema tendem a aproximaacute-los de

uma futura praacutetica profissional em que o trabalho com o desenvolvimento da escrita

seja realizado de forma a respeitar a infacircncia natildeo negando agrave crianccedila o seu direito ao

luacutedico mas tratando a apresentaccedilatildeo do mundo letrado como mais um momento

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prazeroso de aprendizagens Tal reflexatildeo eacute importante para os futuros professores

para que busquem compreender como inserir as crianccedilas no mundo letrado de

maneira que possam romper com a dicotomia entre o brincar e a leituraescrita

tomando como referecircncia o significado dessas accedilotildees para a crianccedila possibilitando a

conduccedilatildeo dos trabalhos na educaccedilatildeo infantil que tornem possiacutevel o brincar ldquoletrando

e alfabetizandordquo (NEVES CASTANHEIRA E GOUVEIA 2015)

Outra temaacutetica que aparece num nuacutemero expressivo de postagens diz respeito

ao olhar do residente para as praacuteticas educativas e as interaccedilotildees que ocorrem na

escola com relaccedilatildeo agrave inclusatildeo escolar das crianccedilas percebidas como ldquodiferentesrdquo

Destaca-se nesta temaacutetica observaccedilotildees a respeito de diferenccedilas de religiatildeo gecircnero

raccedilacor e tambeacutem aquelas relacionadas agrave deficiecircncia Haacute descriccedilotildees sobre como as

crianccedilas lidam com as diferenccedilas e as formas como os professores trabalham com

aquelas que possuem alguma dificuldade Algumas postagens ressaltam a

necessidade de formaccedilatildeo inicial e continuada dos educadores para lidarem com a

diversidade na escola

Pela primeira vez vivenciei preconceito racial de uma crianccedila com outra Nos momentos em que a profa distribui lego para as crianccedilas ela daacute tambeacutem um bonequinho para cada crianccedila Tem bonecos adultos crianccedilas homens mulheres e de diversas cores Os bonecos satildeo dados aleatoriamente ou escolhidos pela crianccedila conforme a professora passa de mesa em mesa Neste dia um menino negro estava com um boneco negro Um garoto se aproximou e disse ldquoCredo que boneco feio parece vocecircrdquo se direcionando ao menino O menino deu de ombros e continuou a brincar e poucos minutos depois a menina que estava ao seu lado me perguntou ldquoPor que o boneco dele eacute pretinho Eacute muito feiordquo Claro que conversei com ela e com o outro menino em outro momento calmamente falando das diversas cores que as pessoas tecircm e que natildeo haacute isso de feio e bonito aproveitando para falar sobre diversidade e etc Mais para o final da conversa a menina me disse ldquoMeu pai eacute pretinho ele eacute bonitordquo Respondi a menina dizendo que a beleza natildeo estaacute na cor da pele do cabelo ou dos olhos A cena toda me fez refletir que a menina jaacute deve ter ouvido esse tipo de afirmaccedilatildeo errocircnea Jaacute comentei mais de uma vez sobre o preconceito de gecircnero ser muito forte mas e o racial algueacutem mais vivenciou esse tipo de preconceito durante esta residecircncia (Relato do residente T 2017)

Rosemberg (2014) chama a atenccedilatildeo para o tema da diversidade como uma

questatildeo circunscrita na histoacuteria da humanidade A diferenciaccedilatildeo entre os grupos

humanos ou pessoas com atributos que classificam e separam o ldquoeurdquo do ldquooutrordquo

parece constituir as diversas manifestaccedilotildees de culturas humanas Assim a autora

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desnaturaliza a identidade e a diferenccedila apontando o seu caraacuteter cultural social e

histoacuterico Contudo esse eacute um dos temas que tem chamado cada vez mais a atenccedilatildeo

de educadores desde a educaccedilatildeo infantil jaacute que muitas vezes as questotildees que

envolvem a diferenccedila e o diferente passam por processos discriminatoacuterios e

preconceituosos como apontado no relato do estudante ao observar as interaccedilotildees

entre as crianccedilas no que se refere ao quesito raccedilacor

Marinho e Martins (2016) em estudo sobre formaccedilatildeo de professoras que atuam

na educaccedilatildeo infantil constatam a escassez ou inexistecircncia de disciplinas na formaccedilatildeo

inicial de professores que abarquem as questotildees eacutetnico-raciais denunciando o natildeo

cumprimento das leis que entre outras prescriccedilotildees preveem que instituiccedilotildees de niacutevel

superior proporcionem aos futuros(as) professoresas a formaccedilatildeo adequada para

lidarem com as relaccedilotildees raciais multieacutetnica e multicultural da sociedade brasileira

Nesse sentido ao trazerem suas inquietaccedilotildees sobre como as crianccedilas lidam com as

diferenccedilas no contexto da escola os residentes se aproximam das discussotildees a

respeito dos processos discriminatoacuterios oportunizando momentos em que tais

temaacuteticas possam ser discutidas entre professores preceptores e colegas do

programa de estaacutegio

Aleacutem da questatildeo racial outros relatos nos datildeo conta de refletir e discutir sobre

as relaccedilotildees que envolvem as crianccedilas com deficiecircncia na escola

() O que me chamou atenccedilatildeo foi que na quarta (2204) H chegou na escola e decidiu mudar de lugar foi sentar bem ao lado do D (uma crianccedila que foi diagnosticada com autismo de ldquograu leverdquo segundo a professora) eu fiquei observando como seria a relaccedilatildeo deles H trouxe um caderno de desenho o abriu na mesa e dividiu metade da folha para ele e para D depois na hora de descer ele segurou a matildeo do D e ficou durante o almoccedilo todo cuidando de D o orientou a pegar a comida sentar comer devagar e quando natildeo quisesse mais deveria jogar a comida no lixo e durante todo o dia H permaneceu cuidando de D A professora achou estranho pois naquele dia ela natildeo havia chamado a atenccedilatildeo de H ateacute me falou ldquoEle deve estar aprontando e D eacute bobatildeo pode se machucarrdquo e decidiu intervir e pediu para que H mudasse de lugar e parasse de cuidar de (Relato do residente L 2015)

A partir da narrativa eacute possiacutevel refletir sobre o preparo dos professores para

lidar com as diferenccedilas individuais na educaccedilatildeo infantil A inclusatildeo escolar de crianccedilas

com deficiecircncia ocorre mediante poliacuteticas puacuteblicas de inclusatildeo contudo haacute uma

grande distacircncia entre a poliacutetica puacuteblica e a praacutetica pedagoacutegica nos contextos

escolares pois natildeo se aprofunda ldquoo debate sobre os meios os fins e as estrateacutegias

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para a implementaccedilatildeo da poliacutetica de ampliaccedilatildeo da rede de educaccedilatildeo infantilrdquo

(BRUNO 2008 p 59)

Outros registros que tratam da temaacutetica da inclusatildeo de crianccedilas com

deficiecircncia mostram o quanto a escola estaacute despreparada para lidar com essa

questatildeo Os relatos e inquietaccedilotildees dos estudantes nos possibilitam a identificaccedilatildeo de

processos discriminatoacuterios de resistecircncias e acomodaccedilotildees dos profissionais e do

distanciamento de uma praacutetica verdadeiramente inclusiva na esfera das praacuteticas

educativas cotidianas O que se percebe nas discussotildees sobre o assunto eacute que os

residentes enquanto futuros professores muito tecircm a aprender sobre a acolhida das

famiacutelias e das crianccedilas ldquodiferentesrdquo ou com deficiecircncia na constante reflexatildeo sobre o

comportamento atitudes e posturas do educador frente ao trabalho pedagoacutegico

Outras temaacuteticas tatildeo importantes como as que discutimos aqui tem sido objeto

de interesse dos estudantes em processo de imersatildeo nas escolas-campo Haacute uma

gama de registros sobre categorias que envolvem a crianccedila pequena nas atividades

do brincar a disciplina e a coerccedilatildeo dos educadores na tentativa de manter o controle

das crianccedilas e dos comportamentos considerados inadequados Muitos residentes se

surpreendem como essa coerccedilatildeo ocorre demasiadas vezes na escola e nas reuniotildees

de supervisatildeo eacute muito comum questionarem junto ao preceptor formas de

compreender por que algumas praacuteticas coercitivas satildeo tatildeo presentes na educaccedilatildeo

infantil

Consideraccedilotildees Finais

A experiecircncia de estaacutegio no Programa de Residecircncia Pedagoacutegica requer de

estudantes e professores uma atitude de intensa accedilatildeo e reflexatildeo Na perspectiva de

observaccedilatildeo participante eacute que a imersatildeo dos residentes na escola eacute orientada

embora natildeo haja uma intervenccedilatildeo direta planejada e sistemaacutetica sobre os modos de

fazer da escola e dos professores Possiacuteveis intervenccedilotildees sobre a escola suscitadas

pela presenccedila da universidade (de preceptores e residentes) satildeo uma contingecircncia

dos processos de formaccedilatildeo de condiccedilotildees e modos de seu desenvolvimento e eacute assim

que se define o lugar do residente e da preceptoria junto a escola o caraacuteter da

observaccedilatildeo participante a ser realizada durante o estaacutegio e sua conduccedilatildeo e discussatildeo

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no acircmbito escolar As posiccedilotildees dos residentes reeditam questotildees que mobilizam a

imersatildeo e reflexatildeo sobre o vivido como e quando participar O que como e quando

registrar sobre a observaccedilatildeo participante sobre o que se vivencia Como fazer uso

das ferramentas disponiacuteveis na escola e dos subsiacutedios teoacutericos oferecidos durante a

proacutepria residecircncia ou estudados no curso de pedagogia elaborando impressotildees sobre

o que descreve e refletindo sobre o que vive e elabora

A retomada dos escritos e reflexotildees dos estudantes participantes do Programa

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil nos trazem pistas relevantes para a

compreensatildeo natildeo somente dos seus processos formativos mas tambeacutem suscitam

atenccedilatildeo aos temas e questotildees emergentes do cotidiano das crianccedilas nas escolas de

Educaccedilatildeo Infantil Sabe-se que o processo de escrita eacute composto de idas e vindas

de avanccedilos e retrocessos de duacutevidas e certezas percebidas nos textos e contextos

apresentados pelos estudantes neste processo formativo especiacutefico

As postagens guardam caracteriacutesticas especiacuteficas correlatas ao vivido nas

praacuteticas de estaacutegio de acordo com as finalidades comunicativas e formativas do

caderno de campoblog e com especificidades ndash limites e possibilidades ndash que se

dimensionam nestas praacuteticas Os estudantes registram o que observam o que

vivenciam mas natildeo soacute Em muitos registros suas impressotildees (con)fundem-se com o

observado vatildeo aleacutem da descriccedilatildeo interpretando o visto o vivido e outras vezes para

alguns o registro se faz espaccedilo de recuperaccedilatildeo das proacuteprias vivecircncias e dos

elementos teoacutericos estudados

Nesta experiecircncia a liberdade na escolha e escrita dos temas dos cadernos de

campo tem permitido que o processo formativo de cada estudante aconteccedila de forma

uacutenica e original pois apesar de estarem imersos em ambientes semelhantes (em

alguns casos mesmas escolas-campo) e possuiacuterem referenciais teoacutericos semelhantes

(provenientes das unidades curriculares obrigatoacuterias e eletivas do Curso de

Pedagogia) os temas e questotildees que recebem a atenccedilatildeo de cada um satildeo distintos e

trabalhados teoricamente a partir das anguacutestias e inquietaccedilotildees individuais Entretanto

apesar das produccedilotildees escritas serem individuais ao serem publicizadas em reuniotildees

de orientaccedilatildeo ou ateacute no suporte virtual do blog elas podem ser compartilhadas e

tornam-se objeto comum de discussotildees e aprendizagens

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

Referecircncias bibliograacuteficas

BARBOSA Maria Carmem Silveira Por amor e por forccedila rotinas na Educaccedilatildeo Infantil Porto Alegre Artmed 2006

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BRUNO Marilda Moraes Garcia A construccedilatildeo da escola inclusiva um a anaacutelise das poliacuteticas puacuteblicas e da praacutetica pedagoacutegica no contexto da educaccedilatildeo infantil Revistambienteeducaccedilatildeo v 1 n 2 p56-67 2008

CASTRO Marta Luz Sisson de Formaccedilatildeo do Diretor de Escola do Estado do Rio Grande do Sul implicaccedilotildees para a praacutetica Educaccedilatildeo v 32 n 2 p 114-121 2009

FEUERWERKER Laura Mudanccedilas na educaccedilatildeo meacutedica e residecircncia meacutedica no Brasil Interface comum sauacutede educaccedilatildeo vol 2 n3 p 51-71 1998

FREITAS Maria Teresa Assunccedilatildeo A pesquisa de abordagem histoacuterico-cultural um espaccedilo educativo de constituiccedilatildeo de sujeitos Revista Teias v 10 n 19 p 01-12 2009

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto Residecircncia Pedagoacutegica como diaacutelogo permanente entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores In DALBEN A et al (org) Convergecircncias e tensotildees no campo da formaccedilatildeo e do trabalho docente Belo

Horizonte Autecircntica v 1 p 375-392 2010

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto LUGLI Rosaacuterio Silvana Genta Diaacutelogos pertinentes na formaccedilatildeo inicial e continuada de professores e gestores escolares A concepccedilatildeo

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do Programa de Residecircncia Pedagoacutegica na UNIFESP Cadernos de Educaccedilatildeo n

46 p 62-82 2014

MARINHO Ceacutesar Henrique MARTINS Edna Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees eacutetnico-raciais impactos da formaccedilatildeo docente nas praacuteticas educativas Revista Educaccedilatildeo e Cultura Contemporacircnea v 14 n 34 p 42-63 2016

MARTINS Thaiacutes Regina Miranda SLAVEZ Milka Helena Carrilho Um estudo sobre programas de iniciaccedilatildeo agrave praacutetica profissional de professores no Brasil o PIBID e o estaacutegio de Residecircncia Ensino amp Pesquisa v 13 n 01 p 29-41 2016

MARQUES Danielle Vieira Aquino MUumlLLER Fernanda Experiecircncias com blog na pesquisa e na formaccedilatildeo inicial de professoras de educaccedilatildeo infantil ETD-Educaccedilatildeo Temaacutetica Digital v 14 n 1 p 43-61 2012

MARTINS E Famiacutelia e escola no contexto de um programa de residecircncia pedagoacutegica um estudo a partir do enfoque histoacuterico-cultural Educaccedilatildeo Sociedade amp Culturas v 37 p 89-107 2012

MEKSENAS Paulo Sociologia da educaccedilatildeo uma introduccedilatildeo ao estudo da escola no processo de transformaccedilatildeo social Satildeo Paulo Loyola 2002

MORETTI Vanessa Dias MARTINS Edna Atividade de ensino mediaccedilatildeo e aprendizagem da docecircncia na residecircncia pedagoacutegica uma anaacutelise a partir da teoria histoacuterico-cultural Revista Contrapontos v 15 n 3 p 394-411 2015

MORETTI Vanessa Dias A articulaccedilatildeo entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores que ensinam matemaacutetica o caso da Residecircncia Pedagoacutegica da Unifesp Revista Educaccedilatildeo Porto Alegre 2011 v 34 n 3 p 385-390 2011

NEVES Vanessa Ferraz Almeida CASTANHEIRA Maria Luacutecia GOUVEcircA Maria Cristina Soares O letramento e o brincar em processos de socializaccedilatildeo na educaccedilatildeo infantil brincadeiras diferentes Revista Brasileira de Educaccedilatildeo v 20 n 60 p 215-

244 2015

NOacuteVOA Antoacutenio Os professores e as Histoacuterias da Sua Vida In NOacuteVOA Antoacutenio (org) Vidas de Professores 2ordf ed Porto Porto Editora p 18-30 2000

PARO Vitor Henrique A educaccedilatildeo a poliacutetica e a administraccedilatildeo reflexotildees sobre a praacutetica do diretor de escola Educaccedilatildeo e Pesquisa v 36 n 3 p 763-778 2010

POLADIAN Marina Lopes Pedrosa Estudo sobre o Programa de residecircncia pedagoacutegica da Unifesp uma articulaccedilatildeo entre Universidade e escola na formaccedilatildeo de professores Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia da Educaccedilatildeo) - Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Satildeo Paulo 2014

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ROSEMBERG Fulvia Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees raciais a tensatildeo entre igualdade e diversidade Cadernos de Pesquisa v 44 n 153 p 742-759 2014

SILVA Adriana BUFALO Joseane O espaccedilo na pedagogia da educaccedilatildeo infantil faacutebula perversidade e possibilidade In Culturas infantis em creches e preacute-escolas estaacutegio e pesquisa Campinas SP Autores Associados 2011

TARDIF Maurice A profissionalizaccedilatildeo do ensino passados trinta anos dois passos para a frente trecircs para traacutes Educaccedilatildeo e Sociedade Campinas SP v34 n123 p

551-571 2013

VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

Correspondecircncia

Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Maria de Faacutetima Carvalho ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

E-mail emartinsunifespgmailcom ndash carvalhomdfgmailcom ndash

remarciliogmailcom

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a mesma eacute separada do marido natildeo faz nada O fato da mulher trabalhar a semana e ter folga aos domingos natildeo significa que ela seja uma maacute matildee pelo contraacuterio significa que ela rala muito para colocar comida no prato A presenccedila ou natildeo de um homem natildeo condiciona nada A escola natildeo pode ser um ambiente de roacutetulos ela deve estar aberta agraves diferenccedilas acolhendo e buscando outras maneiras e formas de aproximaccedilatildeo com a famiacutelia compreendendo a responsabilidade compartilhada que carregam (Registro da residente B 2015)

Os relatos demonstram natildeo soacute o quanto estatildeo atentos para como a escola lida

com as relaccedilotildees familiares mas sobretudo assinalam como tecircm se configurado as

formaccedilotildees das famiacutelias na atualidade Um estudo de Martins (2012) aponta o quanto

a experiecircncia de residecircncia pedagoacutegica possibilita aos estudantes um contato mais

expressivo com a realidade da escola puacuteblica de periferia urbana Aleacutem de observar

as relaccedilotildees institucionais o residente pode ser sensibilizado frente agraves dificuldades

vividas pelas famiacutelias e tendem a perceber o preconceito em relaccedilatildeo aos vaacuterios

arranjos familiares vivenciados pelas crianccedilas mais pobres e como a escolarizaccedilatildeo

dos pais pode afetar a vida dos filhos Os registros dos residentes demonstram como

ldquoos contextos de vida das crianccedilas que frequentam a escola puacuteblica de periferia

passam a ser compreendidos de uma forma concreta e as relaccedilotildees do espaccedilo familiar

com o espaccedilo escolar passam a ter uma conexatildeo cotidianardquo (MARTINS 2012 p 95)

Outra temaacutetica recorrente nos registros dos estudantes diz respeito ao processo

de escolarizaccedilatildeo das praacuteticas da educaccedilatildeo da infacircncia Tal perspectiva surge quando

os residentes referem aos usos dos brinquedos e agraves brincadeiras agrave presenccedila da

leitura e contaccedilatildeo de histoacuterias aos modos de introduccedilatildeo do desenho ao uso de novas

tecnologias e aos modos de avaliar agraves crianccedilas Tal perspectiva escolarizante emerge

em oposiccedilatildeo ao luacutedico como princiacutepio e forma de organizaccedilatildeo das praacuteticas de

educaccedilatildeo junto agraves crianccedilas pequenas e algumas vezes a ela ainda se articula a

preocupaccedilatildeo em disciplinar as vivecircncias escolares sondagens filas broncas e

silecircncios coexistem com desenhos Tv computadores e brincadeiras Os registros nos

dizem de uma escola que hesita entre coibir e promover a expressatildeo das muitas

linguagens da imaginaccedilatildeo e movimento das crianccedilas

Na semana de 2310 a 2710 e como previsto na reuniatildeo de pais a professora realizou a sondagem com as crianccedilas Teoricamente sei como funciona o procedimento mas me questiono se deve ser realizada na Ed Infantil Tambeacutem me pergunto se a sondagem vai muito aleacutem do conhecimento das crianccedilas Por exemplo algumas escrevem o proacuteprio nome

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e algumas palavras mais comuns a elas outras ainda nem reconhecem as letras do alfabeto A sondagem feita abarcou o nome palavras simples um pouco mais complexas e uma frase inteira A minha duacutevida eacute se a sondagem que vai muito aleacutem dos conhecimentos da sala eacute comum e necessaacuteria ainda mais na Ed Infantil (Relato do residente N 2017)

O debate em torno das questotildees que envolvem a escolarizaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute bastante antigo e recorrente Pesquisas como as de Neves Castanheira

e Gouveia (2015) assinalam a partir de autores que estudaram essa temaacutetica como

a perspectiva escolarizante de trabalho com a crianccedila pequena traz seacuterias implicaccedilotildees

para o desenvolvimento infantil justamente porque rompe com as formas como elas

ldquointeragem com a escrita fora da escola destituindo-a de significados pessoais e

sociais e dificulta portanto que as atividades desenvolvidas no espaccedilo escolar

envolvam a ludicidade caracteriacutestica fundamental dessa fase do desenvolvimentordquo

(p 217)

Os residentes parecem estar muito atentos a essas questotildees porque participam

de discussotildees sistemaacuteticas sobre o assunto tanto nas aulas teoacutericas na Universidade

quanto nas reuniotildees de orientaccedilatildeo com os preceptores do Programa de Residecircncia

Muitos estudantes satildeo levados a refletir sobre o assunto logo nos primeiros dias de

imersatildeo na escola

Resolvi mudar o formato do meu relato referente agrave imersatildeo inicial Pois passei por uma situaccedilatildeo em sala que me provocou tal accedilatildeo Devido agrave imposiccedilatildeo de escolarizaccedilatildeo percebida na turma na qual acompanho Onde hoje me emocionei com o choro insistente do aluno BG com as matildeos estremecidas na tentativa de segurar o laacutepis para ldquofazer liccedilatildeordquo (Relato da Residente M 2015)

A partir do relato da residente percebe-se o quanto a questatildeo eacute relevante para

o campo da educaccedilatildeo infantil e da formaccedilatildeo de professores Nas observaccedilotildees e

relatos dos cadernos de campo natildeo eacute incomum aparecerem longas narrativas sobre

os equiacutevocos que ocorrem nas praacuteticas pedagoacutegicas que envolvem a alfabetizaccedilatildeo e

letramento das crianccedilas pequenas Consideramos que questotildees como essas quando

problematizadas pelos estudantes nos horaacuterios de preceptoria ou mesmo nas

discussotildees com professores especialistas sobre o tema tendem a aproximaacute-los de

uma futura praacutetica profissional em que o trabalho com o desenvolvimento da escrita

seja realizado de forma a respeitar a infacircncia natildeo negando agrave crianccedila o seu direito ao

luacutedico mas tratando a apresentaccedilatildeo do mundo letrado como mais um momento

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prazeroso de aprendizagens Tal reflexatildeo eacute importante para os futuros professores

para que busquem compreender como inserir as crianccedilas no mundo letrado de

maneira que possam romper com a dicotomia entre o brincar e a leituraescrita

tomando como referecircncia o significado dessas accedilotildees para a crianccedila possibilitando a

conduccedilatildeo dos trabalhos na educaccedilatildeo infantil que tornem possiacutevel o brincar ldquoletrando

e alfabetizandordquo (NEVES CASTANHEIRA E GOUVEIA 2015)

Outra temaacutetica que aparece num nuacutemero expressivo de postagens diz respeito

ao olhar do residente para as praacuteticas educativas e as interaccedilotildees que ocorrem na

escola com relaccedilatildeo agrave inclusatildeo escolar das crianccedilas percebidas como ldquodiferentesrdquo

Destaca-se nesta temaacutetica observaccedilotildees a respeito de diferenccedilas de religiatildeo gecircnero

raccedilacor e tambeacutem aquelas relacionadas agrave deficiecircncia Haacute descriccedilotildees sobre como as

crianccedilas lidam com as diferenccedilas e as formas como os professores trabalham com

aquelas que possuem alguma dificuldade Algumas postagens ressaltam a

necessidade de formaccedilatildeo inicial e continuada dos educadores para lidarem com a

diversidade na escola

Pela primeira vez vivenciei preconceito racial de uma crianccedila com outra Nos momentos em que a profa distribui lego para as crianccedilas ela daacute tambeacutem um bonequinho para cada crianccedila Tem bonecos adultos crianccedilas homens mulheres e de diversas cores Os bonecos satildeo dados aleatoriamente ou escolhidos pela crianccedila conforme a professora passa de mesa em mesa Neste dia um menino negro estava com um boneco negro Um garoto se aproximou e disse ldquoCredo que boneco feio parece vocecircrdquo se direcionando ao menino O menino deu de ombros e continuou a brincar e poucos minutos depois a menina que estava ao seu lado me perguntou ldquoPor que o boneco dele eacute pretinho Eacute muito feiordquo Claro que conversei com ela e com o outro menino em outro momento calmamente falando das diversas cores que as pessoas tecircm e que natildeo haacute isso de feio e bonito aproveitando para falar sobre diversidade e etc Mais para o final da conversa a menina me disse ldquoMeu pai eacute pretinho ele eacute bonitordquo Respondi a menina dizendo que a beleza natildeo estaacute na cor da pele do cabelo ou dos olhos A cena toda me fez refletir que a menina jaacute deve ter ouvido esse tipo de afirmaccedilatildeo errocircnea Jaacute comentei mais de uma vez sobre o preconceito de gecircnero ser muito forte mas e o racial algueacutem mais vivenciou esse tipo de preconceito durante esta residecircncia (Relato do residente T 2017)

Rosemberg (2014) chama a atenccedilatildeo para o tema da diversidade como uma

questatildeo circunscrita na histoacuteria da humanidade A diferenciaccedilatildeo entre os grupos

humanos ou pessoas com atributos que classificam e separam o ldquoeurdquo do ldquooutrordquo

parece constituir as diversas manifestaccedilotildees de culturas humanas Assim a autora

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desnaturaliza a identidade e a diferenccedila apontando o seu caraacuteter cultural social e

histoacuterico Contudo esse eacute um dos temas que tem chamado cada vez mais a atenccedilatildeo

de educadores desde a educaccedilatildeo infantil jaacute que muitas vezes as questotildees que

envolvem a diferenccedila e o diferente passam por processos discriminatoacuterios e

preconceituosos como apontado no relato do estudante ao observar as interaccedilotildees

entre as crianccedilas no que se refere ao quesito raccedilacor

Marinho e Martins (2016) em estudo sobre formaccedilatildeo de professoras que atuam

na educaccedilatildeo infantil constatam a escassez ou inexistecircncia de disciplinas na formaccedilatildeo

inicial de professores que abarquem as questotildees eacutetnico-raciais denunciando o natildeo

cumprimento das leis que entre outras prescriccedilotildees preveem que instituiccedilotildees de niacutevel

superior proporcionem aos futuros(as) professoresas a formaccedilatildeo adequada para

lidarem com as relaccedilotildees raciais multieacutetnica e multicultural da sociedade brasileira

Nesse sentido ao trazerem suas inquietaccedilotildees sobre como as crianccedilas lidam com as

diferenccedilas no contexto da escola os residentes se aproximam das discussotildees a

respeito dos processos discriminatoacuterios oportunizando momentos em que tais

temaacuteticas possam ser discutidas entre professores preceptores e colegas do

programa de estaacutegio

Aleacutem da questatildeo racial outros relatos nos datildeo conta de refletir e discutir sobre

as relaccedilotildees que envolvem as crianccedilas com deficiecircncia na escola

() O que me chamou atenccedilatildeo foi que na quarta (2204) H chegou na escola e decidiu mudar de lugar foi sentar bem ao lado do D (uma crianccedila que foi diagnosticada com autismo de ldquograu leverdquo segundo a professora) eu fiquei observando como seria a relaccedilatildeo deles H trouxe um caderno de desenho o abriu na mesa e dividiu metade da folha para ele e para D depois na hora de descer ele segurou a matildeo do D e ficou durante o almoccedilo todo cuidando de D o orientou a pegar a comida sentar comer devagar e quando natildeo quisesse mais deveria jogar a comida no lixo e durante todo o dia H permaneceu cuidando de D A professora achou estranho pois naquele dia ela natildeo havia chamado a atenccedilatildeo de H ateacute me falou ldquoEle deve estar aprontando e D eacute bobatildeo pode se machucarrdquo e decidiu intervir e pediu para que H mudasse de lugar e parasse de cuidar de (Relato do residente L 2015)

A partir da narrativa eacute possiacutevel refletir sobre o preparo dos professores para

lidar com as diferenccedilas individuais na educaccedilatildeo infantil A inclusatildeo escolar de crianccedilas

com deficiecircncia ocorre mediante poliacuteticas puacuteblicas de inclusatildeo contudo haacute uma

grande distacircncia entre a poliacutetica puacuteblica e a praacutetica pedagoacutegica nos contextos

escolares pois natildeo se aprofunda ldquoo debate sobre os meios os fins e as estrateacutegias

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para a implementaccedilatildeo da poliacutetica de ampliaccedilatildeo da rede de educaccedilatildeo infantilrdquo

(BRUNO 2008 p 59)

Outros registros que tratam da temaacutetica da inclusatildeo de crianccedilas com

deficiecircncia mostram o quanto a escola estaacute despreparada para lidar com essa

questatildeo Os relatos e inquietaccedilotildees dos estudantes nos possibilitam a identificaccedilatildeo de

processos discriminatoacuterios de resistecircncias e acomodaccedilotildees dos profissionais e do

distanciamento de uma praacutetica verdadeiramente inclusiva na esfera das praacuteticas

educativas cotidianas O que se percebe nas discussotildees sobre o assunto eacute que os

residentes enquanto futuros professores muito tecircm a aprender sobre a acolhida das

famiacutelias e das crianccedilas ldquodiferentesrdquo ou com deficiecircncia na constante reflexatildeo sobre o

comportamento atitudes e posturas do educador frente ao trabalho pedagoacutegico

Outras temaacuteticas tatildeo importantes como as que discutimos aqui tem sido objeto

de interesse dos estudantes em processo de imersatildeo nas escolas-campo Haacute uma

gama de registros sobre categorias que envolvem a crianccedila pequena nas atividades

do brincar a disciplina e a coerccedilatildeo dos educadores na tentativa de manter o controle

das crianccedilas e dos comportamentos considerados inadequados Muitos residentes se

surpreendem como essa coerccedilatildeo ocorre demasiadas vezes na escola e nas reuniotildees

de supervisatildeo eacute muito comum questionarem junto ao preceptor formas de

compreender por que algumas praacuteticas coercitivas satildeo tatildeo presentes na educaccedilatildeo

infantil

Consideraccedilotildees Finais

A experiecircncia de estaacutegio no Programa de Residecircncia Pedagoacutegica requer de

estudantes e professores uma atitude de intensa accedilatildeo e reflexatildeo Na perspectiva de

observaccedilatildeo participante eacute que a imersatildeo dos residentes na escola eacute orientada

embora natildeo haja uma intervenccedilatildeo direta planejada e sistemaacutetica sobre os modos de

fazer da escola e dos professores Possiacuteveis intervenccedilotildees sobre a escola suscitadas

pela presenccedila da universidade (de preceptores e residentes) satildeo uma contingecircncia

dos processos de formaccedilatildeo de condiccedilotildees e modos de seu desenvolvimento e eacute assim

que se define o lugar do residente e da preceptoria junto a escola o caraacuteter da

observaccedilatildeo participante a ser realizada durante o estaacutegio e sua conduccedilatildeo e discussatildeo

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no acircmbito escolar As posiccedilotildees dos residentes reeditam questotildees que mobilizam a

imersatildeo e reflexatildeo sobre o vivido como e quando participar O que como e quando

registrar sobre a observaccedilatildeo participante sobre o que se vivencia Como fazer uso

das ferramentas disponiacuteveis na escola e dos subsiacutedios teoacutericos oferecidos durante a

proacutepria residecircncia ou estudados no curso de pedagogia elaborando impressotildees sobre

o que descreve e refletindo sobre o que vive e elabora

A retomada dos escritos e reflexotildees dos estudantes participantes do Programa

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil nos trazem pistas relevantes para a

compreensatildeo natildeo somente dos seus processos formativos mas tambeacutem suscitam

atenccedilatildeo aos temas e questotildees emergentes do cotidiano das crianccedilas nas escolas de

Educaccedilatildeo Infantil Sabe-se que o processo de escrita eacute composto de idas e vindas

de avanccedilos e retrocessos de duacutevidas e certezas percebidas nos textos e contextos

apresentados pelos estudantes neste processo formativo especiacutefico

As postagens guardam caracteriacutesticas especiacuteficas correlatas ao vivido nas

praacuteticas de estaacutegio de acordo com as finalidades comunicativas e formativas do

caderno de campoblog e com especificidades ndash limites e possibilidades ndash que se

dimensionam nestas praacuteticas Os estudantes registram o que observam o que

vivenciam mas natildeo soacute Em muitos registros suas impressotildees (con)fundem-se com o

observado vatildeo aleacutem da descriccedilatildeo interpretando o visto o vivido e outras vezes para

alguns o registro se faz espaccedilo de recuperaccedilatildeo das proacuteprias vivecircncias e dos

elementos teoacutericos estudados

Nesta experiecircncia a liberdade na escolha e escrita dos temas dos cadernos de

campo tem permitido que o processo formativo de cada estudante aconteccedila de forma

uacutenica e original pois apesar de estarem imersos em ambientes semelhantes (em

alguns casos mesmas escolas-campo) e possuiacuterem referenciais teoacutericos semelhantes

(provenientes das unidades curriculares obrigatoacuterias e eletivas do Curso de

Pedagogia) os temas e questotildees que recebem a atenccedilatildeo de cada um satildeo distintos e

trabalhados teoricamente a partir das anguacutestias e inquietaccedilotildees individuais Entretanto

apesar das produccedilotildees escritas serem individuais ao serem publicizadas em reuniotildees

de orientaccedilatildeo ou ateacute no suporte virtual do blog elas podem ser compartilhadas e

tornam-se objeto comum de discussotildees e aprendizagens

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

Referecircncias bibliograacuteficas

BARBOSA Maria Carmem Silveira Por amor e por forccedila rotinas na Educaccedilatildeo Infantil Porto Alegre Artmed 2006

BRAGA Elizabeth dos Santos Viacutedeo escritas leituras recordaccedilotildees cultura e memoacuteria na sala de aula GOacuteES Maria Cecilia Rafael e SMOLKA Ana Luiza Bustamante A significaccedilatildeo nos espaccedilos Educacionais ndash Interaccedilatildeo social e subjetivaccedilatildeo Campinas Papirus Editora1997 p 87-110

BRUNO Marilda Moraes Garcia A construccedilatildeo da escola inclusiva um a anaacutelise das poliacuteticas puacuteblicas e da praacutetica pedagoacutegica no contexto da educaccedilatildeo infantil Revistambienteeducaccedilatildeo v 1 n 2 p56-67 2008

CASTRO Marta Luz Sisson de Formaccedilatildeo do Diretor de Escola do Estado do Rio Grande do Sul implicaccedilotildees para a praacutetica Educaccedilatildeo v 32 n 2 p 114-121 2009

FEUERWERKER Laura Mudanccedilas na educaccedilatildeo meacutedica e residecircncia meacutedica no Brasil Interface comum sauacutede educaccedilatildeo vol 2 n3 p 51-71 1998

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GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto Residecircncia Pedagoacutegica como diaacutelogo permanente entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores In DALBEN A et al (org) Convergecircncias e tensotildees no campo da formaccedilatildeo e do trabalho docente Belo

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GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto LUGLI Rosaacuterio Silvana Genta Diaacutelogos pertinentes na formaccedilatildeo inicial e continuada de professores e gestores escolares A concepccedilatildeo

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do Programa de Residecircncia Pedagoacutegica na UNIFESP Cadernos de Educaccedilatildeo n

46 p 62-82 2014

MARINHO Ceacutesar Henrique MARTINS Edna Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees eacutetnico-raciais impactos da formaccedilatildeo docente nas praacuteticas educativas Revista Educaccedilatildeo e Cultura Contemporacircnea v 14 n 34 p 42-63 2016

MARTINS Thaiacutes Regina Miranda SLAVEZ Milka Helena Carrilho Um estudo sobre programas de iniciaccedilatildeo agrave praacutetica profissional de professores no Brasil o PIBID e o estaacutegio de Residecircncia Ensino amp Pesquisa v 13 n 01 p 29-41 2016

MARQUES Danielle Vieira Aquino MUumlLLER Fernanda Experiecircncias com blog na pesquisa e na formaccedilatildeo inicial de professoras de educaccedilatildeo infantil ETD-Educaccedilatildeo Temaacutetica Digital v 14 n 1 p 43-61 2012

MARTINS E Famiacutelia e escola no contexto de um programa de residecircncia pedagoacutegica um estudo a partir do enfoque histoacuterico-cultural Educaccedilatildeo Sociedade amp Culturas v 37 p 89-107 2012

MEKSENAS Paulo Sociologia da educaccedilatildeo uma introduccedilatildeo ao estudo da escola no processo de transformaccedilatildeo social Satildeo Paulo Loyola 2002

MORETTI Vanessa Dias MARTINS Edna Atividade de ensino mediaccedilatildeo e aprendizagem da docecircncia na residecircncia pedagoacutegica uma anaacutelise a partir da teoria histoacuterico-cultural Revista Contrapontos v 15 n 3 p 394-411 2015

MORETTI Vanessa Dias A articulaccedilatildeo entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores que ensinam matemaacutetica o caso da Residecircncia Pedagoacutegica da Unifesp Revista Educaccedilatildeo Porto Alegre 2011 v 34 n 3 p 385-390 2011

NEVES Vanessa Ferraz Almeida CASTANHEIRA Maria Luacutecia GOUVEcircA Maria Cristina Soares O letramento e o brincar em processos de socializaccedilatildeo na educaccedilatildeo infantil brincadeiras diferentes Revista Brasileira de Educaccedilatildeo v 20 n 60 p 215-

244 2015

NOacuteVOA Antoacutenio Os professores e as Histoacuterias da Sua Vida In NOacuteVOA Antoacutenio (org) Vidas de Professores 2ordf ed Porto Porto Editora p 18-30 2000

PARO Vitor Henrique A educaccedilatildeo a poliacutetica e a administraccedilatildeo reflexotildees sobre a praacutetica do diretor de escola Educaccedilatildeo e Pesquisa v 36 n 3 p 763-778 2010

POLADIAN Marina Lopes Pedrosa Estudo sobre o Programa de residecircncia pedagoacutegica da Unifesp uma articulaccedilatildeo entre Universidade e escola na formaccedilatildeo de professores Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia da Educaccedilatildeo) - Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Satildeo Paulo 2014

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ROSEMBERG Fulvia Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees raciais a tensatildeo entre igualdade e diversidade Cadernos de Pesquisa v 44 n 153 p 742-759 2014

SILVA Adriana BUFALO Joseane O espaccedilo na pedagogia da educaccedilatildeo infantil faacutebula perversidade e possibilidade In Culturas infantis em creches e preacute-escolas estaacutegio e pesquisa Campinas SP Autores Associados 2011

TARDIF Maurice A profissionalizaccedilatildeo do ensino passados trinta anos dois passos para a frente trecircs para traacutes Educaccedilatildeo e Sociedade Campinas SP v34 n123 p

551-571 2013

VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

Correspondecircncia

Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Maria de Faacutetima Carvalho ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

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e algumas palavras mais comuns a elas outras ainda nem reconhecem as letras do alfabeto A sondagem feita abarcou o nome palavras simples um pouco mais complexas e uma frase inteira A minha duacutevida eacute se a sondagem que vai muito aleacutem dos conhecimentos da sala eacute comum e necessaacuteria ainda mais na Ed Infantil (Relato do residente N 2017)

O debate em torno das questotildees que envolvem a escolarizaccedilatildeo de crianccedilas

pequenas eacute bastante antigo e recorrente Pesquisas como as de Neves Castanheira

e Gouveia (2015) assinalam a partir de autores que estudaram essa temaacutetica como

a perspectiva escolarizante de trabalho com a crianccedila pequena traz seacuterias implicaccedilotildees

para o desenvolvimento infantil justamente porque rompe com as formas como elas

ldquointeragem com a escrita fora da escola destituindo-a de significados pessoais e

sociais e dificulta portanto que as atividades desenvolvidas no espaccedilo escolar

envolvam a ludicidade caracteriacutestica fundamental dessa fase do desenvolvimentordquo

(p 217)

Os residentes parecem estar muito atentos a essas questotildees porque participam

de discussotildees sistemaacuteticas sobre o assunto tanto nas aulas teoacutericas na Universidade

quanto nas reuniotildees de orientaccedilatildeo com os preceptores do Programa de Residecircncia

Muitos estudantes satildeo levados a refletir sobre o assunto logo nos primeiros dias de

imersatildeo na escola

Resolvi mudar o formato do meu relato referente agrave imersatildeo inicial Pois passei por uma situaccedilatildeo em sala que me provocou tal accedilatildeo Devido agrave imposiccedilatildeo de escolarizaccedilatildeo percebida na turma na qual acompanho Onde hoje me emocionei com o choro insistente do aluno BG com as matildeos estremecidas na tentativa de segurar o laacutepis para ldquofazer liccedilatildeordquo (Relato da Residente M 2015)

A partir do relato da residente percebe-se o quanto a questatildeo eacute relevante para

o campo da educaccedilatildeo infantil e da formaccedilatildeo de professores Nas observaccedilotildees e

relatos dos cadernos de campo natildeo eacute incomum aparecerem longas narrativas sobre

os equiacutevocos que ocorrem nas praacuteticas pedagoacutegicas que envolvem a alfabetizaccedilatildeo e

letramento das crianccedilas pequenas Consideramos que questotildees como essas quando

problematizadas pelos estudantes nos horaacuterios de preceptoria ou mesmo nas

discussotildees com professores especialistas sobre o tema tendem a aproximaacute-los de

uma futura praacutetica profissional em que o trabalho com o desenvolvimento da escrita

seja realizado de forma a respeitar a infacircncia natildeo negando agrave crianccedila o seu direito ao

luacutedico mas tratando a apresentaccedilatildeo do mundo letrado como mais um momento

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prazeroso de aprendizagens Tal reflexatildeo eacute importante para os futuros professores

para que busquem compreender como inserir as crianccedilas no mundo letrado de

maneira que possam romper com a dicotomia entre o brincar e a leituraescrita

tomando como referecircncia o significado dessas accedilotildees para a crianccedila possibilitando a

conduccedilatildeo dos trabalhos na educaccedilatildeo infantil que tornem possiacutevel o brincar ldquoletrando

e alfabetizandordquo (NEVES CASTANHEIRA E GOUVEIA 2015)

Outra temaacutetica que aparece num nuacutemero expressivo de postagens diz respeito

ao olhar do residente para as praacuteticas educativas e as interaccedilotildees que ocorrem na

escola com relaccedilatildeo agrave inclusatildeo escolar das crianccedilas percebidas como ldquodiferentesrdquo

Destaca-se nesta temaacutetica observaccedilotildees a respeito de diferenccedilas de religiatildeo gecircnero

raccedilacor e tambeacutem aquelas relacionadas agrave deficiecircncia Haacute descriccedilotildees sobre como as

crianccedilas lidam com as diferenccedilas e as formas como os professores trabalham com

aquelas que possuem alguma dificuldade Algumas postagens ressaltam a

necessidade de formaccedilatildeo inicial e continuada dos educadores para lidarem com a

diversidade na escola

Pela primeira vez vivenciei preconceito racial de uma crianccedila com outra Nos momentos em que a profa distribui lego para as crianccedilas ela daacute tambeacutem um bonequinho para cada crianccedila Tem bonecos adultos crianccedilas homens mulheres e de diversas cores Os bonecos satildeo dados aleatoriamente ou escolhidos pela crianccedila conforme a professora passa de mesa em mesa Neste dia um menino negro estava com um boneco negro Um garoto se aproximou e disse ldquoCredo que boneco feio parece vocecircrdquo se direcionando ao menino O menino deu de ombros e continuou a brincar e poucos minutos depois a menina que estava ao seu lado me perguntou ldquoPor que o boneco dele eacute pretinho Eacute muito feiordquo Claro que conversei com ela e com o outro menino em outro momento calmamente falando das diversas cores que as pessoas tecircm e que natildeo haacute isso de feio e bonito aproveitando para falar sobre diversidade e etc Mais para o final da conversa a menina me disse ldquoMeu pai eacute pretinho ele eacute bonitordquo Respondi a menina dizendo que a beleza natildeo estaacute na cor da pele do cabelo ou dos olhos A cena toda me fez refletir que a menina jaacute deve ter ouvido esse tipo de afirmaccedilatildeo errocircnea Jaacute comentei mais de uma vez sobre o preconceito de gecircnero ser muito forte mas e o racial algueacutem mais vivenciou esse tipo de preconceito durante esta residecircncia (Relato do residente T 2017)

Rosemberg (2014) chama a atenccedilatildeo para o tema da diversidade como uma

questatildeo circunscrita na histoacuteria da humanidade A diferenciaccedilatildeo entre os grupos

humanos ou pessoas com atributos que classificam e separam o ldquoeurdquo do ldquooutrordquo

parece constituir as diversas manifestaccedilotildees de culturas humanas Assim a autora

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desnaturaliza a identidade e a diferenccedila apontando o seu caraacuteter cultural social e

histoacuterico Contudo esse eacute um dos temas que tem chamado cada vez mais a atenccedilatildeo

de educadores desde a educaccedilatildeo infantil jaacute que muitas vezes as questotildees que

envolvem a diferenccedila e o diferente passam por processos discriminatoacuterios e

preconceituosos como apontado no relato do estudante ao observar as interaccedilotildees

entre as crianccedilas no que se refere ao quesito raccedilacor

Marinho e Martins (2016) em estudo sobre formaccedilatildeo de professoras que atuam

na educaccedilatildeo infantil constatam a escassez ou inexistecircncia de disciplinas na formaccedilatildeo

inicial de professores que abarquem as questotildees eacutetnico-raciais denunciando o natildeo

cumprimento das leis que entre outras prescriccedilotildees preveem que instituiccedilotildees de niacutevel

superior proporcionem aos futuros(as) professoresas a formaccedilatildeo adequada para

lidarem com as relaccedilotildees raciais multieacutetnica e multicultural da sociedade brasileira

Nesse sentido ao trazerem suas inquietaccedilotildees sobre como as crianccedilas lidam com as

diferenccedilas no contexto da escola os residentes se aproximam das discussotildees a

respeito dos processos discriminatoacuterios oportunizando momentos em que tais

temaacuteticas possam ser discutidas entre professores preceptores e colegas do

programa de estaacutegio

Aleacutem da questatildeo racial outros relatos nos datildeo conta de refletir e discutir sobre

as relaccedilotildees que envolvem as crianccedilas com deficiecircncia na escola

() O que me chamou atenccedilatildeo foi que na quarta (2204) H chegou na escola e decidiu mudar de lugar foi sentar bem ao lado do D (uma crianccedila que foi diagnosticada com autismo de ldquograu leverdquo segundo a professora) eu fiquei observando como seria a relaccedilatildeo deles H trouxe um caderno de desenho o abriu na mesa e dividiu metade da folha para ele e para D depois na hora de descer ele segurou a matildeo do D e ficou durante o almoccedilo todo cuidando de D o orientou a pegar a comida sentar comer devagar e quando natildeo quisesse mais deveria jogar a comida no lixo e durante todo o dia H permaneceu cuidando de D A professora achou estranho pois naquele dia ela natildeo havia chamado a atenccedilatildeo de H ateacute me falou ldquoEle deve estar aprontando e D eacute bobatildeo pode se machucarrdquo e decidiu intervir e pediu para que H mudasse de lugar e parasse de cuidar de (Relato do residente L 2015)

A partir da narrativa eacute possiacutevel refletir sobre o preparo dos professores para

lidar com as diferenccedilas individuais na educaccedilatildeo infantil A inclusatildeo escolar de crianccedilas

com deficiecircncia ocorre mediante poliacuteticas puacuteblicas de inclusatildeo contudo haacute uma

grande distacircncia entre a poliacutetica puacuteblica e a praacutetica pedagoacutegica nos contextos

escolares pois natildeo se aprofunda ldquoo debate sobre os meios os fins e as estrateacutegias

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para a implementaccedilatildeo da poliacutetica de ampliaccedilatildeo da rede de educaccedilatildeo infantilrdquo

(BRUNO 2008 p 59)

Outros registros que tratam da temaacutetica da inclusatildeo de crianccedilas com

deficiecircncia mostram o quanto a escola estaacute despreparada para lidar com essa

questatildeo Os relatos e inquietaccedilotildees dos estudantes nos possibilitam a identificaccedilatildeo de

processos discriminatoacuterios de resistecircncias e acomodaccedilotildees dos profissionais e do

distanciamento de uma praacutetica verdadeiramente inclusiva na esfera das praacuteticas

educativas cotidianas O que se percebe nas discussotildees sobre o assunto eacute que os

residentes enquanto futuros professores muito tecircm a aprender sobre a acolhida das

famiacutelias e das crianccedilas ldquodiferentesrdquo ou com deficiecircncia na constante reflexatildeo sobre o

comportamento atitudes e posturas do educador frente ao trabalho pedagoacutegico

Outras temaacuteticas tatildeo importantes como as que discutimos aqui tem sido objeto

de interesse dos estudantes em processo de imersatildeo nas escolas-campo Haacute uma

gama de registros sobre categorias que envolvem a crianccedila pequena nas atividades

do brincar a disciplina e a coerccedilatildeo dos educadores na tentativa de manter o controle

das crianccedilas e dos comportamentos considerados inadequados Muitos residentes se

surpreendem como essa coerccedilatildeo ocorre demasiadas vezes na escola e nas reuniotildees

de supervisatildeo eacute muito comum questionarem junto ao preceptor formas de

compreender por que algumas praacuteticas coercitivas satildeo tatildeo presentes na educaccedilatildeo

infantil

Consideraccedilotildees Finais

A experiecircncia de estaacutegio no Programa de Residecircncia Pedagoacutegica requer de

estudantes e professores uma atitude de intensa accedilatildeo e reflexatildeo Na perspectiva de

observaccedilatildeo participante eacute que a imersatildeo dos residentes na escola eacute orientada

embora natildeo haja uma intervenccedilatildeo direta planejada e sistemaacutetica sobre os modos de

fazer da escola e dos professores Possiacuteveis intervenccedilotildees sobre a escola suscitadas

pela presenccedila da universidade (de preceptores e residentes) satildeo uma contingecircncia

dos processos de formaccedilatildeo de condiccedilotildees e modos de seu desenvolvimento e eacute assim

que se define o lugar do residente e da preceptoria junto a escola o caraacuteter da

observaccedilatildeo participante a ser realizada durante o estaacutegio e sua conduccedilatildeo e discussatildeo

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no acircmbito escolar As posiccedilotildees dos residentes reeditam questotildees que mobilizam a

imersatildeo e reflexatildeo sobre o vivido como e quando participar O que como e quando

registrar sobre a observaccedilatildeo participante sobre o que se vivencia Como fazer uso

das ferramentas disponiacuteveis na escola e dos subsiacutedios teoacutericos oferecidos durante a

proacutepria residecircncia ou estudados no curso de pedagogia elaborando impressotildees sobre

o que descreve e refletindo sobre o que vive e elabora

A retomada dos escritos e reflexotildees dos estudantes participantes do Programa

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil nos trazem pistas relevantes para a

compreensatildeo natildeo somente dos seus processos formativos mas tambeacutem suscitam

atenccedilatildeo aos temas e questotildees emergentes do cotidiano das crianccedilas nas escolas de

Educaccedilatildeo Infantil Sabe-se que o processo de escrita eacute composto de idas e vindas

de avanccedilos e retrocessos de duacutevidas e certezas percebidas nos textos e contextos

apresentados pelos estudantes neste processo formativo especiacutefico

As postagens guardam caracteriacutesticas especiacuteficas correlatas ao vivido nas

praacuteticas de estaacutegio de acordo com as finalidades comunicativas e formativas do

caderno de campoblog e com especificidades ndash limites e possibilidades ndash que se

dimensionam nestas praacuteticas Os estudantes registram o que observam o que

vivenciam mas natildeo soacute Em muitos registros suas impressotildees (con)fundem-se com o

observado vatildeo aleacutem da descriccedilatildeo interpretando o visto o vivido e outras vezes para

alguns o registro se faz espaccedilo de recuperaccedilatildeo das proacuteprias vivecircncias e dos

elementos teoacutericos estudados

Nesta experiecircncia a liberdade na escolha e escrita dos temas dos cadernos de

campo tem permitido que o processo formativo de cada estudante aconteccedila de forma

uacutenica e original pois apesar de estarem imersos em ambientes semelhantes (em

alguns casos mesmas escolas-campo) e possuiacuterem referenciais teoacutericos semelhantes

(provenientes das unidades curriculares obrigatoacuterias e eletivas do Curso de

Pedagogia) os temas e questotildees que recebem a atenccedilatildeo de cada um satildeo distintos e

trabalhados teoricamente a partir das anguacutestias e inquietaccedilotildees individuais Entretanto

apesar das produccedilotildees escritas serem individuais ao serem publicizadas em reuniotildees

de orientaccedilatildeo ou ateacute no suporte virtual do blog elas podem ser compartilhadas e

tornam-se objeto comum de discussotildees e aprendizagens

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

Referecircncias bibliograacuteficas

BARBOSA Maria Carmem Silveira Por amor e por forccedila rotinas na Educaccedilatildeo Infantil Porto Alegre Artmed 2006

BRAGA Elizabeth dos Santos Viacutedeo escritas leituras recordaccedilotildees cultura e memoacuteria na sala de aula GOacuteES Maria Cecilia Rafael e SMOLKA Ana Luiza Bustamante A significaccedilatildeo nos espaccedilos Educacionais ndash Interaccedilatildeo social e subjetivaccedilatildeo Campinas Papirus Editora1997 p 87-110

BRUNO Marilda Moraes Garcia A construccedilatildeo da escola inclusiva um a anaacutelise das poliacuteticas puacuteblicas e da praacutetica pedagoacutegica no contexto da educaccedilatildeo infantil Revistambienteeducaccedilatildeo v 1 n 2 p56-67 2008

CASTRO Marta Luz Sisson de Formaccedilatildeo do Diretor de Escola do Estado do Rio Grande do Sul implicaccedilotildees para a praacutetica Educaccedilatildeo v 32 n 2 p 114-121 2009

FEUERWERKER Laura Mudanccedilas na educaccedilatildeo meacutedica e residecircncia meacutedica no Brasil Interface comum sauacutede educaccedilatildeo vol 2 n3 p 51-71 1998

FREITAS Maria Teresa Assunccedilatildeo A pesquisa de abordagem histoacuterico-cultural um espaccedilo educativo de constituiccedilatildeo de sujeitos Revista Teias v 10 n 19 p 01-12 2009

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto Residecircncia Pedagoacutegica como diaacutelogo permanente entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores In DALBEN A et al (org) Convergecircncias e tensotildees no campo da formaccedilatildeo e do trabalho docente Belo

Horizonte Autecircntica v 1 p 375-392 2010

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto LUGLI Rosaacuterio Silvana Genta Diaacutelogos pertinentes na formaccedilatildeo inicial e continuada de professores e gestores escolares A concepccedilatildeo

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do Programa de Residecircncia Pedagoacutegica na UNIFESP Cadernos de Educaccedilatildeo n

46 p 62-82 2014

MARINHO Ceacutesar Henrique MARTINS Edna Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees eacutetnico-raciais impactos da formaccedilatildeo docente nas praacuteticas educativas Revista Educaccedilatildeo e Cultura Contemporacircnea v 14 n 34 p 42-63 2016

MARTINS Thaiacutes Regina Miranda SLAVEZ Milka Helena Carrilho Um estudo sobre programas de iniciaccedilatildeo agrave praacutetica profissional de professores no Brasil o PIBID e o estaacutegio de Residecircncia Ensino amp Pesquisa v 13 n 01 p 29-41 2016

MARQUES Danielle Vieira Aquino MUumlLLER Fernanda Experiecircncias com blog na pesquisa e na formaccedilatildeo inicial de professoras de educaccedilatildeo infantil ETD-Educaccedilatildeo Temaacutetica Digital v 14 n 1 p 43-61 2012

MARTINS E Famiacutelia e escola no contexto de um programa de residecircncia pedagoacutegica um estudo a partir do enfoque histoacuterico-cultural Educaccedilatildeo Sociedade amp Culturas v 37 p 89-107 2012

MEKSENAS Paulo Sociologia da educaccedilatildeo uma introduccedilatildeo ao estudo da escola no processo de transformaccedilatildeo social Satildeo Paulo Loyola 2002

MORETTI Vanessa Dias MARTINS Edna Atividade de ensino mediaccedilatildeo e aprendizagem da docecircncia na residecircncia pedagoacutegica uma anaacutelise a partir da teoria histoacuterico-cultural Revista Contrapontos v 15 n 3 p 394-411 2015

MORETTI Vanessa Dias A articulaccedilatildeo entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores que ensinam matemaacutetica o caso da Residecircncia Pedagoacutegica da Unifesp Revista Educaccedilatildeo Porto Alegre 2011 v 34 n 3 p 385-390 2011

NEVES Vanessa Ferraz Almeida CASTANHEIRA Maria Luacutecia GOUVEcircA Maria Cristina Soares O letramento e o brincar em processos de socializaccedilatildeo na educaccedilatildeo infantil brincadeiras diferentes Revista Brasileira de Educaccedilatildeo v 20 n 60 p 215-

244 2015

NOacuteVOA Antoacutenio Os professores e as Histoacuterias da Sua Vida In NOacuteVOA Antoacutenio (org) Vidas de Professores 2ordf ed Porto Porto Editora p 18-30 2000

PARO Vitor Henrique A educaccedilatildeo a poliacutetica e a administraccedilatildeo reflexotildees sobre a praacutetica do diretor de escola Educaccedilatildeo e Pesquisa v 36 n 3 p 763-778 2010

POLADIAN Marina Lopes Pedrosa Estudo sobre o Programa de residecircncia pedagoacutegica da Unifesp uma articulaccedilatildeo entre Universidade e escola na formaccedilatildeo de professores Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia da Educaccedilatildeo) - Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Satildeo Paulo 2014

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ROSEMBERG Fulvia Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees raciais a tensatildeo entre igualdade e diversidade Cadernos de Pesquisa v 44 n 153 p 742-759 2014

SILVA Adriana BUFALO Joseane O espaccedilo na pedagogia da educaccedilatildeo infantil faacutebula perversidade e possibilidade In Culturas infantis em creches e preacute-escolas estaacutegio e pesquisa Campinas SP Autores Associados 2011

TARDIF Maurice A profissionalizaccedilatildeo do ensino passados trinta anos dois passos para a frente trecircs para traacutes Educaccedilatildeo e Sociedade Campinas SP v34 n123 p

551-571 2013

VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

Correspondecircncia

Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Maria de Faacutetima Carvalho ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

E-mail emartinsunifespgmailcom ndash carvalhomdfgmailcom ndash

remarciliogmailcom

This work is licensed under a Creative Commons Attribution-NonCommercial 40 International (CC BY-NC 40)

Page 16: 1 Residência pedagógica em educação infantil: uma experiência em formação de ... · 2019. 11. 4. · projeto de estágio em formação docente foi implantado em 2009, em uma

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prazeroso de aprendizagens Tal reflexatildeo eacute importante para os futuros professores

para que busquem compreender como inserir as crianccedilas no mundo letrado de

maneira que possam romper com a dicotomia entre o brincar e a leituraescrita

tomando como referecircncia o significado dessas accedilotildees para a crianccedila possibilitando a

conduccedilatildeo dos trabalhos na educaccedilatildeo infantil que tornem possiacutevel o brincar ldquoletrando

e alfabetizandordquo (NEVES CASTANHEIRA E GOUVEIA 2015)

Outra temaacutetica que aparece num nuacutemero expressivo de postagens diz respeito

ao olhar do residente para as praacuteticas educativas e as interaccedilotildees que ocorrem na

escola com relaccedilatildeo agrave inclusatildeo escolar das crianccedilas percebidas como ldquodiferentesrdquo

Destaca-se nesta temaacutetica observaccedilotildees a respeito de diferenccedilas de religiatildeo gecircnero

raccedilacor e tambeacutem aquelas relacionadas agrave deficiecircncia Haacute descriccedilotildees sobre como as

crianccedilas lidam com as diferenccedilas e as formas como os professores trabalham com

aquelas que possuem alguma dificuldade Algumas postagens ressaltam a

necessidade de formaccedilatildeo inicial e continuada dos educadores para lidarem com a

diversidade na escola

Pela primeira vez vivenciei preconceito racial de uma crianccedila com outra Nos momentos em que a profa distribui lego para as crianccedilas ela daacute tambeacutem um bonequinho para cada crianccedila Tem bonecos adultos crianccedilas homens mulheres e de diversas cores Os bonecos satildeo dados aleatoriamente ou escolhidos pela crianccedila conforme a professora passa de mesa em mesa Neste dia um menino negro estava com um boneco negro Um garoto se aproximou e disse ldquoCredo que boneco feio parece vocecircrdquo se direcionando ao menino O menino deu de ombros e continuou a brincar e poucos minutos depois a menina que estava ao seu lado me perguntou ldquoPor que o boneco dele eacute pretinho Eacute muito feiordquo Claro que conversei com ela e com o outro menino em outro momento calmamente falando das diversas cores que as pessoas tecircm e que natildeo haacute isso de feio e bonito aproveitando para falar sobre diversidade e etc Mais para o final da conversa a menina me disse ldquoMeu pai eacute pretinho ele eacute bonitordquo Respondi a menina dizendo que a beleza natildeo estaacute na cor da pele do cabelo ou dos olhos A cena toda me fez refletir que a menina jaacute deve ter ouvido esse tipo de afirmaccedilatildeo errocircnea Jaacute comentei mais de uma vez sobre o preconceito de gecircnero ser muito forte mas e o racial algueacutem mais vivenciou esse tipo de preconceito durante esta residecircncia (Relato do residente T 2017)

Rosemberg (2014) chama a atenccedilatildeo para o tema da diversidade como uma

questatildeo circunscrita na histoacuteria da humanidade A diferenciaccedilatildeo entre os grupos

humanos ou pessoas com atributos que classificam e separam o ldquoeurdquo do ldquooutrordquo

parece constituir as diversas manifestaccedilotildees de culturas humanas Assim a autora

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desnaturaliza a identidade e a diferenccedila apontando o seu caraacuteter cultural social e

histoacuterico Contudo esse eacute um dos temas que tem chamado cada vez mais a atenccedilatildeo

de educadores desde a educaccedilatildeo infantil jaacute que muitas vezes as questotildees que

envolvem a diferenccedila e o diferente passam por processos discriminatoacuterios e

preconceituosos como apontado no relato do estudante ao observar as interaccedilotildees

entre as crianccedilas no que se refere ao quesito raccedilacor

Marinho e Martins (2016) em estudo sobre formaccedilatildeo de professoras que atuam

na educaccedilatildeo infantil constatam a escassez ou inexistecircncia de disciplinas na formaccedilatildeo

inicial de professores que abarquem as questotildees eacutetnico-raciais denunciando o natildeo

cumprimento das leis que entre outras prescriccedilotildees preveem que instituiccedilotildees de niacutevel

superior proporcionem aos futuros(as) professoresas a formaccedilatildeo adequada para

lidarem com as relaccedilotildees raciais multieacutetnica e multicultural da sociedade brasileira

Nesse sentido ao trazerem suas inquietaccedilotildees sobre como as crianccedilas lidam com as

diferenccedilas no contexto da escola os residentes se aproximam das discussotildees a

respeito dos processos discriminatoacuterios oportunizando momentos em que tais

temaacuteticas possam ser discutidas entre professores preceptores e colegas do

programa de estaacutegio

Aleacutem da questatildeo racial outros relatos nos datildeo conta de refletir e discutir sobre

as relaccedilotildees que envolvem as crianccedilas com deficiecircncia na escola

() O que me chamou atenccedilatildeo foi que na quarta (2204) H chegou na escola e decidiu mudar de lugar foi sentar bem ao lado do D (uma crianccedila que foi diagnosticada com autismo de ldquograu leverdquo segundo a professora) eu fiquei observando como seria a relaccedilatildeo deles H trouxe um caderno de desenho o abriu na mesa e dividiu metade da folha para ele e para D depois na hora de descer ele segurou a matildeo do D e ficou durante o almoccedilo todo cuidando de D o orientou a pegar a comida sentar comer devagar e quando natildeo quisesse mais deveria jogar a comida no lixo e durante todo o dia H permaneceu cuidando de D A professora achou estranho pois naquele dia ela natildeo havia chamado a atenccedilatildeo de H ateacute me falou ldquoEle deve estar aprontando e D eacute bobatildeo pode se machucarrdquo e decidiu intervir e pediu para que H mudasse de lugar e parasse de cuidar de (Relato do residente L 2015)

A partir da narrativa eacute possiacutevel refletir sobre o preparo dos professores para

lidar com as diferenccedilas individuais na educaccedilatildeo infantil A inclusatildeo escolar de crianccedilas

com deficiecircncia ocorre mediante poliacuteticas puacuteblicas de inclusatildeo contudo haacute uma

grande distacircncia entre a poliacutetica puacuteblica e a praacutetica pedagoacutegica nos contextos

escolares pois natildeo se aprofunda ldquoo debate sobre os meios os fins e as estrateacutegias

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para a implementaccedilatildeo da poliacutetica de ampliaccedilatildeo da rede de educaccedilatildeo infantilrdquo

(BRUNO 2008 p 59)

Outros registros que tratam da temaacutetica da inclusatildeo de crianccedilas com

deficiecircncia mostram o quanto a escola estaacute despreparada para lidar com essa

questatildeo Os relatos e inquietaccedilotildees dos estudantes nos possibilitam a identificaccedilatildeo de

processos discriminatoacuterios de resistecircncias e acomodaccedilotildees dos profissionais e do

distanciamento de uma praacutetica verdadeiramente inclusiva na esfera das praacuteticas

educativas cotidianas O que se percebe nas discussotildees sobre o assunto eacute que os

residentes enquanto futuros professores muito tecircm a aprender sobre a acolhida das

famiacutelias e das crianccedilas ldquodiferentesrdquo ou com deficiecircncia na constante reflexatildeo sobre o

comportamento atitudes e posturas do educador frente ao trabalho pedagoacutegico

Outras temaacuteticas tatildeo importantes como as que discutimos aqui tem sido objeto

de interesse dos estudantes em processo de imersatildeo nas escolas-campo Haacute uma

gama de registros sobre categorias que envolvem a crianccedila pequena nas atividades

do brincar a disciplina e a coerccedilatildeo dos educadores na tentativa de manter o controle

das crianccedilas e dos comportamentos considerados inadequados Muitos residentes se

surpreendem como essa coerccedilatildeo ocorre demasiadas vezes na escola e nas reuniotildees

de supervisatildeo eacute muito comum questionarem junto ao preceptor formas de

compreender por que algumas praacuteticas coercitivas satildeo tatildeo presentes na educaccedilatildeo

infantil

Consideraccedilotildees Finais

A experiecircncia de estaacutegio no Programa de Residecircncia Pedagoacutegica requer de

estudantes e professores uma atitude de intensa accedilatildeo e reflexatildeo Na perspectiva de

observaccedilatildeo participante eacute que a imersatildeo dos residentes na escola eacute orientada

embora natildeo haja uma intervenccedilatildeo direta planejada e sistemaacutetica sobre os modos de

fazer da escola e dos professores Possiacuteveis intervenccedilotildees sobre a escola suscitadas

pela presenccedila da universidade (de preceptores e residentes) satildeo uma contingecircncia

dos processos de formaccedilatildeo de condiccedilotildees e modos de seu desenvolvimento e eacute assim

que se define o lugar do residente e da preceptoria junto a escola o caraacuteter da

observaccedilatildeo participante a ser realizada durante o estaacutegio e sua conduccedilatildeo e discussatildeo

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no acircmbito escolar As posiccedilotildees dos residentes reeditam questotildees que mobilizam a

imersatildeo e reflexatildeo sobre o vivido como e quando participar O que como e quando

registrar sobre a observaccedilatildeo participante sobre o que se vivencia Como fazer uso

das ferramentas disponiacuteveis na escola e dos subsiacutedios teoacutericos oferecidos durante a

proacutepria residecircncia ou estudados no curso de pedagogia elaborando impressotildees sobre

o que descreve e refletindo sobre o que vive e elabora

A retomada dos escritos e reflexotildees dos estudantes participantes do Programa

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil nos trazem pistas relevantes para a

compreensatildeo natildeo somente dos seus processos formativos mas tambeacutem suscitam

atenccedilatildeo aos temas e questotildees emergentes do cotidiano das crianccedilas nas escolas de

Educaccedilatildeo Infantil Sabe-se que o processo de escrita eacute composto de idas e vindas

de avanccedilos e retrocessos de duacutevidas e certezas percebidas nos textos e contextos

apresentados pelos estudantes neste processo formativo especiacutefico

As postagens guardam caracteriacutesticas especiacuteficas correlatas ao vivido nas

praacuteticas de estaacutegio de acordo com as finalidades comunicativas e formativas do

caderno de campoblog e com especificidades ndash limites e possibilidades ndash que se

dimensionam nestas praacuteticas Os estudantes registram o que observam o que

vivenciam mas natildeo soacute Em muitos registros suas impressotildees (con)fundem-se com o

observado vatildeo aleacutem da descriccedilatildeo interpretando o visto o vivido e outras vezes para

alguns o registro se faz espaccedilo de recuperaccedilatildeo das proacuteprias vivecircncias e dos

elementos teoacutericos estudados

Nesta experiecircncia a liberdade na escolha e escrita dos temas dos cadernos de

campo tem permitido que o processo formativo de cada estudante aconteccedila de forma

uacutenica e original pois apesar de estarem imersos em ambientes semelhantes (em

alguns casos mesmas escolas-campo) e possuiacuterem referenciais teoacutericos semelhantes

(provenientes das unidades curriculares obrigatoacuterias e eletivas do Curso de

Pedagogia) os temas e questotildees que recebem a atenccedilatildeo de cada um satildeo distintos e

trabalhados teoricamente a partir das anguacutestias e inquietaccedilotildees individuais Entretanto

apesar das produccedilotildees escritas serem individuais ao serem publicizadas em reuniotildees

de orientaccedilatildeo ou ateacute no suporte virtual do blog elas podem ser compartilhadas e

tornam-se objeto comum de discussotildees e aprendizagens

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

Referecircncias bibliograacuteficas

BARBOSA Maria Carmem Silveira Por amor e por forccedila rotinas na Educaccedilatildeo Infantil Porto Alegre Artmed 2006

BRAGA Elizabeth dos Santos Viacutedeo escritas leituras recordaccedilotildees cultura e memoacuteria na sala de aula GOacuteES Maria Cecilia Rafael e SMOLKA Ana Luiza Bustamante A significaccedilatildeo nos espaccedilos Educacionais ndash Interaccedilatildeo social e subjetivaccedilatildeo Campinas Papirus Editora1997 p 87-110

BRUNO Marilda Moraes Garcia A construccedilatildeo da escola inclusiva um a anaacutelise das poliacuteticas puacuteblicas e da praacutetica pedagoacutegica no contexto da educaccedilatildeo infantil Revistambienteeducaccedilatildeo v 1 n 2 p56-67 2008

CASTRO Marta Luz Sisson de Formaccedilatildeo do Diretor de Escola do Estado do Rio Grande do Sul implicaccedilotildees para a praacutetica Educaccedilatildeo v 32 n 2 p 114-121 2009

FEUERWERKER Laura Mudanccedilas na educaccedilatildeo meacutedica e residecircncia meacutedica no Brasil Interface comum sauacutede educaccedilatildeo vol 2 n3 p 51-71 1998

FREITAS Maria Teresa Assunccedilatildeo A pesquisa de abordagem histoacuterico-cultural um espaccedilo educativo de constituiccedilatildeo de sujeitos Revista Teias v 10 n 19 p 01-12 2009

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto Residecircncia Pedagoacutegica como diaacutelogo permanente entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores In DALBEN A et al (org) Convergecircncias e tensotildees no campo da formaccedilatildeo e do trabalho docente Belo

Horizonte Autecircntica v 1 p 375-392 2010

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto LUGLI Rosaacuterio Silvana Genta Diaacutelogos pertinentes na formaccedilatildeo inicial e continuada de professores e gestores escolares A concepccedilatildeo

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do Programa de Residecircncia Pedagoacutegica na UNIFESP Cadernos de Educaccedilatildeo n

46 p 62-82 2014

MARINHO Ceacutesar Henrique MARTINS Edna Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees eacutetnico-raciais impactos da formaccedilatildeo docente nas praacuteticas educativas Revista Educaccedilatildeo e Cultura Contemporacircnea v 14 n 34 p 42-63 2016

MARTINS Thaiacutes Regina Miranda SLAVEZ Milka Helena Carrilho Um estudo sobre programas de iniciaccedilatildeo agrave praacutetica profissional de professores no Brasil o PIBID e o estaacutegio de Residecircncia Ensino amp Pesquisa v 13 n 01 p 29-41 2016

MARQUES Danielle Vieira Aquino MUumlLLER Fernanda Experiecircncias com blog na pesquisa e na formaccedilatildeo inicial de professoras de educaccedilatildeo infantil ETD-Educaccedilatildeo Temaacutetica Digital v 14 n 1 p 43-61 2012

MARTINS E Famiacutelia e escola no contexto de um programa de residecircncia pedagoacutegica um estudo a partir do enfoque histoacuterico-cultural Educaccedilatildeo Sociedade amp Culturas v 37 p 89-107 2012

MEKSENAS Paulo Sociologia da educaccedilatildeo uma introduccedilatildeo ao estudo da escola no processo de transformaccedilatildeo social Satildeo Paulo Loyola 2002

MORETTI Vanessa Dias MARTINS Edna Atividade de ensino mediaccedilatildeo e aprendizagem da docecircncia na residecircncia pedagoacutegica uma anaacutelise a partir da teoria histoacuterico-cultural Revista Contrapontos v 15 n 3 p 394-411 2015

MORETTI Vanessa Dias A articulaccedilatildeo entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores que ensinam matemaacutetica o caso da Residecircncia Pedagoacutegica da Unifesp Revista Educaccedilatildeo Porto Alegre 2011 v 34 n 3 p 385-390 2011

NEVES Vanessa Ferraz Almeida CASTANHEIRA Maria Luacutecia GOUVEcircA Maria Cristina Soares O letramento e o brincar em processos de socializaccedilatildeo na educaccedilatildeo infantil brincadeiras diferentes Revista Brasileira de Educaccedilatildeo v 20 n 60 p 215-

244 2015

NOacuteVOA Antoacutenio Os professores e as Histoacuterias da Sua Vida In NOacuteVOA Antoacutenio (org) Vidas de Professores 2ordf ed Porto Porto Editora p 18-30 2000

PARO Vitor Henrique A educaccedilatildeo a poliacutetica e a administraccedilatildeo reflexotildees sobre a praacutetica do diretor de escola Educaccedilatildeo e Pesquisa v 36 n 3 p 763-778 2010

POLADIAN Marina Lopes Pedrosa Estudo sobre o Programa de residecircncia pedagoacutegica da Unifesp uma articulaccedilatildeo entre Universidade e escola na formaccedilatildeo de professores Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia da Educaccedilatildeo) - Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Satildeo Paulo 2014

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ROSEMBERG Fulvia Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees raciais a tensatildeo entre igualdade e diversidade Cadernos de Pesquisa v 44 n 153 p 742-759 2014

SILVA Adriana BUFALO Joseane O espaccedilo na pedagogia da educaccedilatildeo infantil faacutebula perversidade e possibilidade In Culturas infantis em creches e preacute-escolas estaacutegio e pesquisa Campinas SP Autores Associados 2011

TARDIF Maurice A profissionalizaccedilatildeo do ensino passados trinta anos dois passos para a frente trecircs para traacutes Educaccedilatildeo e Sociedade Campinas SP v34 n123 p

551-571 2013

VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

Correspondecircncia

Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Maria de Faacutetima Carvalho ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

E-mail emartinsunifespgmailcom ndash carvalhomdfgmailcom ndash

remarciliogmailcom

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Page 17: 1 Residência pedagógica em educação infantil: uma experiência em formação de ... · 2019. 11. 4. · projeto de estágio em formação docente foi implantado em 2009, em uma

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desnaturaliza a identidade e a diferenccedila apontando o seu caraacuteter cultural social e

histoacuterico Contudo esse eacute um dos temas que tem chamado cada vez mais a atenccedilatildeo

de educadores desde a educaccedilatildeo infantil jaacute que muitas vezes as questotildees que

envolvem a diferenccedila e o diferente passam por processos discriminatoacuterios e

preconceituosos como apontado no relato do estudante ao observar as interaccedilotildees

entre as crianccedilas no que se refere ao quesito raccedilacor

Marinho e Martins (2016) em estudo sobre formaccedilatildeo de professoras que atuam

na educaccedilatildeo infantil constatam a escassez ou inexistecircncia de disciplinas na formaccedilatildeo

inicial de professores que abarquem as questotildees eacutetnico-raciais denunciando o natildeo

cumprimento das leis que entre outras prescriccedilotildees preveem que instituiccedilotildees de niacutevel

superior proporcionem aos futuros(as) professoresas a formaccedilatildeo adequada para

lidarem com as relaccedilotildees raciais multieacutetnica e multicultural da sociedade brasileira

Nesse sentido ao trazerem suas inquietaccedilotildees sobre como as crianccedilas lidam com as

diferenccedilas no contexto da escola os residentes se aproximam das discussotildees a

respeito dos processos discriminatoacuterios oportunizando momentos em que tais

temaacuteticas possam ser discutidas entre professores preceptores e colegas do

programa de estaacutegio

Aleacutem da questatildeo racial outros relatos nos datildeo conta de refletir e discutir sobre

as relaccedilotildees que envolvem as crianccedilas com deficiecircncia na escola

() O que me chamou atenccedilatildeo foi que na quarta (2204) H chegou na escola e decidiu mudar de lugar foi sentar bem ao lado do D (uma crianccedila que foi diagnosticada com autismo de ldquograu leverdquo segundo a professora) eu fiquei observando como seria a relaccedilatildeo deles H trouxe um caderno de desenho o abriu na mesa e dividiu metade da folha para ele e para D depois na hora de descer ele segurou a matildeo do D e ficou durante o almoccedilo todo cuidando de D o orientou a pegar a comida sentar comer devagar e quando natildeo quisesse mais deveria jogar a comida no lixo e durante todo o dia H permaneceu cuidando de D A professora achou estranho pois naquele dia ela natildeo havia chamado a atenccedilatildeo de H ateacute me falou ldquoEle deve estar aprontando e D eacute bobatildeo pode se machucarrdquo e decidiu intervir e pediu para que H mudasse de lugar e parasse de cuidar de (Relato do residente L 2015)

A partir da narrativa eacute possiacutevel refletir sobre o preparo dos professores para

lidar com as diferenccedilas individuais na educaccedilatildeo infantil A inclusatildeo escolar de crianccedilas

com deficiecircncia ocorre mediante poliacuteticas puacuteblicas de inclusatildeo contudo haacute uma

grande distacircncia entre a poliacutetica puacuteblica e a praacutetica pedagoacutegica nos contextos

escolares pois natildeo se aprofunda ldquoo debate sobre os meios os fins e as estrateacutegias

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para a implementaccedilatildeo da poliacutetica de ampliaccedilatildeo da rede de educaccedilatildeo infantilrdquo

(BRUNO 2008 p 59)

Outros registros que tratam da temaacutetica da inclusatildeo de crianccedilas com

deficiecircncia mostram o quanto a escola estaacute despreparada para lidar com essa

questatildeo Os relatos e inquietaccedilotildees dos estudantes nos possibilitam a identificaccedilatildeo de

processos discriminatoacuterios de resistecircncias e acomodaccedilotildees dos profissionais e do

distanciamento de uma praacutetica verdadeiramente inclusiva na esfera das praacuteticas

educativas cotidianas O que se percebe nas discussotildees sobre o assunto eacute que os

residentes enquanto futuros professores muito tecircm a aprender sobre a acolhida das

famiacutelias e das crianccedilas ldquodiferentesrdquo ou com deficiecircncia na constante reflexatildeo sobre o

comportamento atitudes e posturas do educador frente ao trabalho pedagoacutegico

Outras temaacuteticas tatildeo importantes como as que discutimos aqui tem sido objeto

de interesse dos estudantes em processo de imersatildeo nas escolas-campo Haacute uma

gama de registros sobre categorias que envolvem a crianccedila pequena nas atividades

do brincar a disciplina e a coerccedilatildeo dos educadores na tentativa de manter o controle

das crianccedilas e dos comportamentos considerados inadequados Muitos residentes se

surpreendem como essa coerccedilatildeo ocorre demasiadas vezes na escola e nas reuniotildees

de supervisatildeo eacute muito comum questionarem junto ao preceptor formas de

compreender por que algumas praacuteticas coercitivas satildeo tatildeo presentes na educaccedilatildeo

infantil

Consideraccedilotildees Finais

A experiecircncia de estaacutegio no Programa de Residecircncia Pedagoacutegica requer de

estudantes e professores uma atitude de intensa accedilatildeo e reflexatildeo Na perspectiva de

observaccedilatildeo participante eacute que a imersatildeo dos residentes na escola eacute orientada

embora natildeo haja uma intervenccedilatildeo direta planejada e sistemaacutetica sobre os modos de

fazer da escola e dos professores Possiacuteveis intervenccedilotildees sobre a escola suscitadas

pela presenccedila da universidade (de preceptores e residentes) satildeo uma contingecircncia

dos processos de formaccedilatildeo de condiccedilotildees e modos de seu desenvolvimento e eacute assim

que se define o lugar do residente e da preceptoria junto a escola o caraacuteter da

observaccedilatildeo participante a ser realizada durante o estaacutegio e sua conduccedilatildeo e discussatildeo

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no acircmbito escolar As posiccedilotildees dos residentes reeditam questotildees que mobilizam a

imersatildeo e reflexatildeo sobre o vivido como e quando participar O que como e quando

registrar sobre a observaccedilatildeo participante sobre o que se vivencia Como fazer uso

das ferramentas disponiacuteveis na escola e dos subsiacutedios teoacutericos oferecidos durante a

proacutepria residecircncia ou estudados no curso de pedagogia elaborando impressotildees sobre

o que descreve e refletindo sobre o que vive e elabora

A retomada dos escritos e reflexotildees dos estudantes participantes do Programa

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil nos trazem pistas relevantes para a

compreensatildeo natildeo somente dos seus processos formativos mas tambeacutem suscitam

atenccedilatildeo aos temas e questotildees emergentes do cotidiano das crianccedilas nas escolas de

Educaccedilatildeo Infantil Sabe-se que o processo de escrita eacute composto de idas e vindas

de avanccedilos e retrocessos de duacutevidas e certezas percebidas nos textos e contextos

apresentados pelos estudantes neste processo formativo especiacutefico

As postagens guardam caracteriacutesticas especiacuteficas correlatas ao vivido nas

praacuteticas de estaacutegio de acordo com as finalidades comunicativas e formativas do

caderno de campoblog e com especificidades ndash limites e possibilidades ndash que se

dimensionam nestas praacuteticas Os estudantes registram o que observam o que

vivenciam mas natildeo soacute Em muitos registros suas impressotildees (con)fundem-se com o

observado vatildeo aleacutem da descriccedilatildeo interpretando o visto o vivido e outras vezes para

alguns o registro se faz espaccedilo de recuperaccedilatildeo das proacuteprias vivecircncias e dos

elementos teoacutericos estudados

Nesta experiecircncia a liberdade na escolha e escrita dos temas dos cadernos de

campo tem permitido que o processo formativo de cada estudante aconteccedila de forma

uacutenica e original pois apesar de estarem imersos em ambientes semelhantes (em

alguns casos mesmas escolas-campo) e possuiacuterem referenciais teoacutericos semelhantes

(provenientes das unidades curriculares obrigatoacuterias e eletivas do Curso de

Pedagogia) os temas e questotildees que recebem a atenccedilatildeo de cada um satildeo distintos e

trabalhados teoricamente a partir das anguacutestias e inquietaccedilotildees individuais Entretanto

apesar das produccedilotildees escritas serem individuais ao serem publicizadas em reuniotildees

de orientaccedilatildeo ou ateacute no suporte virtual do blog elas podem ser compartilhadas e

tornam-se objeto comum de discussotildees e aprendizagens

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

Referecircncias bibliograacuteficas

BARBOSA Maria Carmem Silveira Por amor e por forccedila rotinas na Educaccedilatildeo Infantil Porto Alegre Artmed 2006

BRAGA Elizabeth dos Santos Viacutedeo escritas leituras recordaccedilotildees cultura e memoacuteria na sala de aula GOacuteES Maria Cecilia Rafael e SMOLKA Ana Luiza Bustamante A significaccedilatildeo nos espaccedilos Educacionais ndash Interaccedilatildeo social e subjetivaccedilatildeo Campinas Papirus Editora1997 p 87-110

BRUNO Marilda Moraes Garcia A construccedilatildeo da escola inclusiva um a anaacutelise das poliacuteticas puacuteblicas e da praacutetica pedagoacutegica no contexto da educaccedilatildeo infantil Revistambienteeducaccedilatildeo v 1 n 2 p56-67 2008

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FEUERWERKER Laura Mudanccedilas na educaccedilatildeo meacutedica e residecircncia meacutedica no Brasil Interface comum sauacutede educaccedilatildeo vol 2 n3 p 51-71 1998

FREITAS Maria Teresa Assunccedilatildeo A pesquisa de abordagem histoacuterico-cultural um espaccedilo educativo de constituiccedilatildeo de sujeitos Revista Teias v 10 n 19 p 01-12 2009

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto Residecircncia Pedagoacutegica como diaacutelogo permanente entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores In DALBEN A et al (org) Convergecircncias e tensotildees no campo da formaccedilatildeo e do trabalho docente Belo

Horizonte Autecircntica v 1 p 375-392 2010

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto LUGLI Rosaacuterio Silvana Genta Diaacutelogos pertinentes na formaccedilatildeo inicial e continuada de professores e gestores escolares A concepccedilatildeo

ISSN 1984-6444 | httpdxdoiorg1059021984644435694

Educaccedilatildeo | Santa Maria | v 44 |2019 Disponiacutevel em httpsperiodicosufsmbrreveducacao

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do Programa de Residecircncia Pedagoacutegica na UNIFESP Cadernos de Educaccedilatildeo n

46 p 62-82 2014

MARINHO Ceacutesar Henrique MARTINS Edna Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees eacutetnico-raciais impactos da formaccedilatildeo docente nas praacuteticas educativas Revista Educaccedilatildeo e Cultura Contemporacircnea v 14 n 34 p 42-63 2016

MARTINS Thaiacutes Regina Miranda SLAVEZ Milka Helena Carrilho Um estudo sobre programas de iniciaccedilatildeo agrave praacutetica profissional de professores no Brasil o PIBID e o estaacutegio de Residecircncia Ensino amp Pesquisa v 13 n 01 p 29-41 2016

MARQUES Danielle Vieira Aquino MUumlLLER Fernanda Experiecircncias com blog na pesquisa e na formaccedilatildeo inicial de professoras de educaccedilatildeo infantil ETD-Educaccedilatildeo Temaacutetica Digital v 14 n 1 p 43-61 2012

MARTINS E Famiacutelia e escola no contexto de um programa de residecircncia pedagoacutegica um estudo a partir do enfoque histoacuterico-cultural Educaccedilatildeo Sociedade amp Culturas v 37 p 89-107 2012

MEKSENAS Paulo Sociologia da educaccedilatildeo uma introduccedilatildeo ao estudo da escola no processo de transformaccedilatildeo social Satildeo Paulo Loyola 2002

MORETTI Vanessa Dias MARTINS Edna Atividade de ensino mediaccedilatildeo e aprendizagem da docecircncia na residecircncia pedagoacutegica uma anaacutelise a partir da teoria histoacuterico-cultural Revista Contrapontos v 15 n 3 p 394-411 2015

MORETTI Vanessa Dias A articulaccedilatildeo entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores que ensinam matemaacutetica o caso da Residecircncia Pedagoacutegica da Unifesp Revista Educaccedilatildeo Porto Alegre 2011 v 34 n 3 p 385-390 2011

NEVES Vanessa Ferraz Almeida CASTANHEIRA Maria Luacutecia GOUVEcircA Maria Cristina Soares O letramento e o brincar em processos de socializaccedilatildeo na educaccedilatildeo infantil brincadeiras diferentes Revista Brasileira de Educaccedilatildeo v 20 n 60 p 215-

244 2015

NOacuteVOA Antoacutenio Os professores e as Histoacuterias da Sua Vida In NOacuteVOA Antoacutenio (org) Vidas de Professores 2ordf ed Porto Porto Editora p 18-30 2000

PARO Vitor Henrique A educaccedilatildeo a poliacutetica e a administraccedilatildeo reflexotildees sobre a praacutetica do diretor de escola Educaccedilatildeo e Pesquisa v 36 n 3 p 763-778 2010

POLADIAN Marina Lopes Pedrosa Estudo sobre o Programa de residecircncia pedagoacutegica da Unifesp uma articulaccedilatildeo entre Universidade e escola na formaccedilatildeo de professores Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia da Educaccedilatildeo) - Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Satildeo Paulo 2014

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ROSEMBERG Fulvia Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees raciais a tensatildeo entre igualdade e diversidade Cadernos de Pesquisa v 44 n 153 p 742-759 2014

SILVA Adriana BUFALO Joseane O espaccedilo na pedagogia da educaccedilatildeo infantil faacutebula perversidade e possibilidade In Culturas infantis em creches e preacute-escolas estaacutegio e pesquisa Campinas SP Autores Associados 2011

TARDIF Maurice A profissionalizaccedilatildeo do ensino passados trinta anos dois passos para a frente trecircs para traacutes Educaccedilatildeo e Sociedade Campinas SP v34 n123 p

551-571 2013

VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

Correspondecircncia

Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Maria de Faacutetima Carvalho ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

E-mail emartinsunifespgmailcom ndash carvalhomdfgmailcom ndash

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para a implementaccedilatildeo da poliacutetica de ampliaccedilatildeo da rede de educaccedilatildeo infantilrdquo

(BRUNO 2008 p 59)

Outros registros que tratam da temaacutetica da inclusatildeo de crianccedilas com

deficiecircncia mostram o quanto a escola estaacute despreparada para lidar com essa

questatildeo Os relatos e inquietaccedilotildees dos estudantes nos possibilitam a identificaccedilatildeo de

processos discriminatoacuterios de resistecircncias e acomodaccedilotildees dos profissionais e do

distanciamento de uma praacutetica verdadeiramente inclusiva na esfera das praacuteticas

educativas cotidianas O que se percebe nas discussotildees sobre o assunto eacute que os

residentes enquanto futuros professores muito tecircm a aprender sobre a acolhida das

famiacutelias e das crianccedilas ldquodiferentesrdquo ou com deficiecircncia na constante reflexatildeo sobre o

comportamento atitudes e posturas do educador frente ao trabalho pedagoacutegico

Outras temaacuteticas tatildeo importantes como as que discutimos aqui tem sido objeto

de interesse dos estudantes em processo de imersatildeo nas escolas-campo Haacute uma

gama de registros sobre categorias que envolvem a crianccedila pequena nas atividades

do brincar a disciplina e a coerccedilatildeo dos educadores na tentativa de manter o controle

das crianccedilas e dos comportamentos considerados inadequados Muitos residentes se

surpreendem como essa coerccedilatildeo ocorre demasiadas vezes na escola e nas reuniotildees

de supervisatildeo eacute muito comum questionarem junto ao preceptor formas de

compreender por que algumas praacuteticas coercitivas satildeo tatildeo presentes na educaccedilatildeo

infantil

Consideraccedilotildees Finais

A experiecircncia de estaacutegio no Programa de Residecircncia Pedagoacutegica requer de

estudantes e professores uma atitude de intensa accedilatildeo e reflexatildeo Na perspectiva de

observaccedilatildeo participante eacute que a imersatildeo dos residentes na escola eacute orientada

embora natildeo haja uma intervenccedilatildeo direta planejada e sistemaacutetica sobre os modos de

fazer da escola e dos professores Possiacuteveis intervenccedilotildees sobre a escola suscitadas

pela presenccedila da universidade (de preceptores e residentes) satildeo uma contingecircncia

dos processos de formaccedilatildeo de condiccedilotildees e modos de seu desenvolvimento e eacute assim

que se define o lugar do residente e da preceptoria junto a escola o caraacuteter da

observaccedilatildeo participante a ser realizada durante o estaacutegio e sua conduccedilatildeo e discussatildeo

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no acircmbito escolar As posiccedilotildees dos residentes reeditam questotildees que mobilizam a

imersatildeo e reflexatildeo sobre o vivido como e quando participar O que como e quando

registrar sobre a observaccedilatildeo participante sobre o que se vivencia Como fazer uso

das ferramentas disponiacuteveis na escola e dos subsiacutedios teoacutericos oferecidos durante a

proacutepria residecircncia ou estudados no curso de pedagogia elaborando impressotildees sobre

o que descreve e refletindo sobre o que vive e elabora

A retomada dos escritos e reflexotildees dos estudantes participantes do Programa

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil nos trazem pistas relevantes para a

compreensatildeo natildeo somente dos seus processos formativos mas tambeacutem suscitam

atenccedilatildeo aos temas e questotildees emergentes do cotidiano das crianccedilas nas escolas de

Educaccedilatildeo Infantil Sabe-se que o processo de escrita eacute composto de idas e vindas

de avanccedilos e retrocessos de duacutevidas e certezas percebidas nos textos e contextos

apresentados pelos estudantes neste processo formativo especiacutefico

As postagens guardam caracteriacutesticas especiacuteficas correlatas ao vivido nas

praacuteticas de estaacutegio de acordo com as finalidades comunicativas e formativas do

caderno de campoblog e com especificidades ndash limites e possibilidades ndash que se

dimensionam nestas praacuteticas Os estudantes registram o que observam o que

vivenciam mas natildeo soacute Em muitos registros suas impressotildees (con)fundem-se com o

observado vatildeo aleacutem da descriccedilatildeo interpretando o visto o vivido e outras vezes para

alguns o registro se faz espaccedilo de recuperaccedilatildeo das proacuteprias vivecircncias e dos

elementos teoacutericos estudados

Nesta experiecircncia a liberdade na escolha e escrita dos temas dos cadernos de

campo tem permitido que o processo formativo de cada estudante aconteccedila de forma

uacutenica e original pois apesar de estarem imersos em ambientes semelhantes (em

alguns casos mesmas escolas-campo) e possuiacuterem referenciais teoacutericos semelhantes

(provenientes das unidades curriculares obrigatoacuterias e eletivas do Curso de

Pedagogia) os temas e questotildees que recebem a atenccedilatildeo de cada um satildeo distintos e

trabalhados teoricamente a partir das anguacutestias e inquietaccedilotildees individuais Entretanto

apesar das produccedilotildees escritas serem individuais ao serem publicizadas em reuniotildees

de orientaccedilatildeo ou ateacute no suporte virtual do blog elas podem ser compartilhadas e

tornam-se objeto comum de discussotildees e aprendizagens

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

Referecircncias bibliograacuteficas

BARBOSA Maria Carmem Silveira Por amor e por forccedila rotinas na Educaccedilatildeo Infantil Porto Alegre Artmed 2006

BRAGA Elizabeth dos Santos Viacutedeo escritas leituras recordaccedilotildees cultura e memoacuteria na sala de aula GOacuteES Maria Cecilia Rafael e SMOLKA Ana Luiza Bustamante A significaccedilatildeo nos espaccedilos Educacionais ndash Interaccedilatildeo social e subjetivaccedilatildeo Campinas Papirus Editora1997 p 87-110

BRUNO Marilda Moraes Garcia A construccedilatildeo da escola inclusiva um a anaacutelise das poliacuteticas puacuteblicas e da praacutetica pedagoacutegica no contexto da educaccedilatildeo infantil Revistambienteeducaccedilatildeo v 1 n 2 p56-67 2008

CASTRO Marta Luz Sisson de Formaccedilatildeo do Diretor de Escola do Estado do Rio Grande do Sul implicaccedilotildees para a praacutetica Educaccedilatildeo v 32 n 2 p 114-121 2009

FEUERWERKER Laura Mudanccedilas na educaccedilatildeo meacutedica e residecircncia meacutedica no Brasil Interface comum sauacutede educaccedilatildeo vol 2 n3 p 51-71 1998

FREITAS Maria Teresa Assunccedilatildeo A pesquisa de abordagem histoacuterico-cultural um espaccedilo educativo de constituiccedilatildeo de sujeitos Revista Teias v 10 n 19 p 01-12 2009

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto Residecircncia Pedagoacutegica como diaacutelogo permanente entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores In DALBEN A et al (org) Convergecircncias e tensotildees no campo da formaccedilatildeo e do trabalho docente Belo

Horizonte Autecircntica v 1 p 375-392 2010

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto LUGLI Rosaacuterio Silvana Genta Diaacutelogos pertinentes na formaccedilatildeo inicial e continuada de professores e gestores escolares A concepccedilatildeo

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do Programa de Residecircncia Pedagoacutegica na UNIFESP Cadernos de Educaccedilatildeo n

46 p 62-82 2014

MARINHO Ceacutesar Henrique MARTINS Edna Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees eacutetnico-raciais impactos da formaccedilatildeo docente nas praacuteticas educativas Revista Educaccedilatildeo e Cultura Contemporacircnea v 14 n 34 p 42-63 2016

MARTINS Thaiacutes Regina Miranda SLAVEZ Milka Helena Carrilho Um estudo sobre programas de iniciaccedilatildeo agrave praacutetica profissional de professores no Brasil o PIBID e o estaacutegio de Residecircncia Ensino amp Pesquisa v 13 n 01 p 29-41 2016

MARQUES Danielle Vieira Aquino MUumlLLER Fernanda Experiecircncias com blog na pesquisa e na formaccedilatildeo inicial de professoras de educaccedilatildeo infantil ETD-Educaccedilatildeo Temaacutetica Digital v 14 n 1 p 43-61 2012

MARTINS E Famiacutelia e escola no contexto de um programa de residecircncia pedagoacutegica um estudo a partir do enfoque histoacuterico-cultural Educaccedilatildeo Sociedade amp Culturas v 37 p 89-107 2012

MEKSENAS Paulo Sociologia da educaccedilatildeo uma introduccedilatildeo ao estudo da escola no processo de transformaccedilatildeo social Satildeo Paulo Loyola 2002

MORETTI Vanessa Dias MARTINS Edna Atividade de ensino mediaccedilatildeo e aprendizagem da docecircncia na residecircncia pedagoacutegica uma anaacutelise a partir da teoria histoacuterico-cultural Revista Contrapontos v 15 n 3 p 394-411 2015

MORETTI Vanessa Dias A articulaccedilatildeo entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores que ensinam matemaacutetica o caso da Residecircncia Pedagoacutegica da Unifesp Revista Educaccedilatildeo Porto Alegre 2011 v 34 n 3 p 385-390 2011

NEVES Vanessa Ferraz Almeida CASTANHEIRA Maria Luacutecia GOUVEcircA Maria Cristina Soares O letramento e o brincar em processos de socializaccedilatildeo na educaccedilatildeo infantil brincadeiras diferentes Revista Brasileira de Educaccedilatildeo v 20 n 60 p 215-

244 2015

NOacuteVOA Antoacutenio Os professores e as Histoacuterias da Sua Vida In NOacuteVOA Antoacutenio (org) Vidas de Professores 2ordf ed Porto Porto Editora p 18-30 2000

PARO Vitor Henrique A educaccedilatildeo a poliacutetica e a administraccedilatildeo reflexotildees sobre a praacutetica do diretor de escola Educaccedilatildeo e Pesquisa v 36 n 3 p 763-778 2010

POLADIAN Marina Lopes Pedrosa Estudo sobre o Programa de residecircncia pedagoacutegica da Unifesp uma articulaccedilatildeo entre Universidade e escola na formaccedilatildeo de professores Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia da Educaccedilatildeo) - Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Satildeo Paulo 2014

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ROSEMBERG Fulvia Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees raciais a tensatildeo entre igualdade e diversidade Cadernos de Pesquisa v 44 n 153 p 742-759 2014

SILVA Adriana BUFALO Joseane O espaccedilo na pedagogia da educaccedilatildeo infantil faacutebula perversidade e possibilidade In Culturas infantis em creches e preacute-escolas estaacutegio e pesquisa Campinas SP Autores Associados 2011

TARDIF Maurice A profissionalizaccedilatildeo do ensino passados trinta anos dois passos para a frente trecircs para traacutes Educaccedilatildeo e Sociedade Campinas SP v34 n123 p

551-571 2013

VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

Correspondecircncia

Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Maria de Faacutetima Carvalho ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

E-mail emartinsunifespgmailcom ndash carvalhomdfgmailcom ndash

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Page 19: 1 Residência pedagógica em educação infantil: uma experiência em formação de ... · 2019. 11. 4. · projeto de estágio em formação docente foi implantado em 2009, em uma

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no acircmbito escolar As posiccedilotildees dos residentes reeditam questotildees que mobilizam a

imersatildeo e reflexatildeo sobre o vivido como e quando participar O que como e quando

registrar sobre a observaccedilatildeo participante sobre o que se vivencia Como fazer uso

das ferramentas disponiacuteveis na escola e dos subsiacutedios teoacutericos oferecidos durante a

proacutepria residecircncia ou estudados no curso de pedagogia elaborando impressotildees sobre

o que descreve e refletindo sobre o que vive e elabora

A retomada dos escritos e reflexotildees dos estudantes participantes do Programa

de Residecircncia Pedagoacutegica em Educaccedilatildeo Infantil nos trazem pistas relevantes para a

compreensatildeo natildeo somente dos seus processos formativos mas tambeacutem suscitam

atenccedilatildeo aos temas e questotildees emergentes do cotidiano das crianccedilas nas escolas de

Educaccedilatildeo Infantil Sabe-se que o processo de escrita eacute composto de idas e vindas

de avanccedilos e retrocessos de duacutevidas e certezas percebidas nos textos e contextos

apresentados pelos estudantes neste processo formativo especiacutefico

As postagens guardam caracteriacutesticas especiacuteficas correlatas ao vivido nas

praacuteticas de estaacutegio de acordo com as finalidades comunicativas e formativas do

caderno de campoblog e com especificidades ndash limites e possibilidades ndash que se

dimensionam nestas praacuteticas Os estudantes registram o que observam o que

vivenciam mas natildeo soacute Em muitos registros suas impressotildees (con)fundem-se com o

observado vatildeo aleacutem da descriccedilatildeo interpretando o visto o vivido e outras vezes para

alguns o registro se faz espaccedilo de recuperaccedilatildeo das proacuteprias vivecircncias e dos

elementos teoacutericos estudados

Nesta experiecircncia a liberdade na escolha e escrita dos temas dos cadernos de

campo tem permitido que o processo formativo de cada estudante aconteccedila de forma

uacutenica e original pois apesar de estarem imersos em ambientes semelhantes (em

alguns casos mesmas escolas-campo) e possuiacuterem referenciais teoacutericos semelhantes

(provenientes das unidades curriculares obrigatoacuterias e eletivas do Curso de

Pedagogia) os temas e questotildees que recebem a atenccedilatildeo de cada um satildeo distintos e

trabalhados teoricamente a partir das anguacutestias e inquietaccedilotildees individuais Entretanto

apesar das produccedilotildees escritas serem individuais ao serem publicizadas em reuniotildees

de orientaccedilatildeo ou ateacute no suporte virtual do blog elas podem ser compartilhadas e

tornam-se objeto comum de discussotildees e aprendizagens

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

Referecircncias bibliograacuteficas

BARBOSA Maria Carmem Silveira Por amor e por forccedila rotinas na Educaccedilatildeo Infantil Porto Alegre Artmed 2006

BRAGA Elizabeth dos Santos Viacutedeo escritas leituras recordaccedilotildees cultura e memoacuteria na sala de aula GOacuteES Maria Cecilia Rafael e SMOLKA Ana Luiza Bustamante A significaccedilatildeo nos espaccedilos Educacionais ndash Interaccedilatildeo social e subjetivaccedilatildeo Campinas Papirus Editora1997 p 87-110

BRUNO Marilda Moraes Garcia A construccedilatildeo da escola inclusiva um a anaacutelise das poliacuteticas puacuteblicas e da praacutetica pedagoacutegica no contexto da educaccedilatildeo infantil Revistambienteeducaccedilatildeo v 1 n 2 p56-67 2008

CASTRO Marta Luz Sisson de Formaccedilatildeo do Diretor de Escola do Estado do Rio Grande do Sul implicaccedilotildees para a praacutetica Educaccedilatildeo v 32 n 2 p 114-121 2009

FEUERWERKER Laura Mudanccedilas na educaccedilatildeo meacutedica e residecircncia meacutedica no Brasil Interface comum sauacutede educaccedilatildeo vol 2 n3 p 51-71 1998

FREITAS Maria Teresa Assunccedilatildeo A pesquisa de abordagem histoacuterico-cultural um espaccedilo educativo de constituiccedilatildeo de sujeitos Revista Teias v 10 n 19 p 01-12 2009

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto Residecircncia Pedagoacutegica como diaacutelogo permanente entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores In DALBEN A et al (org) Convergecircncias e tensotildees no campo da formaccedilatildeo e do trabalho docente Belo

Horizonte Autecircntica v 1 p 375-392 2010

GIGLIO Ceacutelia Maria Benedicto LUGLI Rosaacuterio Silvana Genta Diaacutelogos pertinentes na formaccedilatildeo inicial e continuada de professores e gestores escolares A concepccedilatildeo

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do Programa de Residecircncia Pedagoacutegica na UNIFESP Cadernos de Educaccedilatildeo n

46 p 62-82 2014

MARINHO Ceacutesar Henrique MARTINS Edna Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees eacutetnico-raciais impactos da formaccedilatildeo docente nas praacuteticas educativas Revista Educaccedilatildeo e Cultura Contemporacircnea v 14 n 34 p 42-63 2016

MARTINS Thaiacutes Regina Miranda SLAVEZ Milka Helena Carrilho Um estudo sobre programas de iniciaccedilatildeo agrave praacutetica profissional de professores no Brasil o PIBID e o estaacutegio de Residecircncia Ensino amp Pesquisa v 13 n 01 p 29-41 2016

MARQUES Danielle Vieira Aquino MUumlLLER Fernanda Experiecircncias com blog na pesquisa e na formaccedilatildeo inicial de professoras de educaccedilatildeo infantil ETD-Educaccedilatildeo Temaacutetica Digital v 14 n 1 p 43-61 2012

MARTINS E Famiacutelia e escola no contexto de um programa de residecircncia pedagoacutegica um estudo a partir do enfoque histoacuterico-cultural Educaccedilatildeo Sociedade amp Culturas v 37 p 89-107 2012

MEKSENAS Paulo Sociologia da educaccedilatildeo uma introduccedilatildeo ao estudo da escola no processo de transformaccedilatildeo social Satildeo Paulo Loyola 2002

MORETTI Vanessa Dias MARTINS Edna Atividade de ensino mediaccedilatildeo e aprendizagem da docecircncia na residecircncia pedagoacutegica uma anaacutelise a partir da teoria histoacuterico-cultural Revista Contrapontos v 15 n 3 p 394-411 2015

MORETTI Vanessa Dias A articulaccedilatildeo entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores que ensinam matemaacutetica o caso da Residecircncia Pedagoacutegica da Unifesp Revista Educaccedilatildeo Porto Alegre 2011 v 34 n 3 p 385-390 2011

NEVES Vanessa Ferraz Almeida CASTANHEIRA Maria Luacutecia GOUVEcircA Maria Cristina Soares O letramento e o brincar em processos de socializaccedilatildeo na educaccedilatildeo infantil brincadeiras diferentes Revista Brasileira de Educaccedilatildeo v 20 n 60 p 215-

244 2015

NOacuteVOA Antoacutenio Os professores e as Histoacuterias da Sua Vida In NOacuteVOA Antoacutenio (org) Vidas de Professores 2ordf ed Porto Porto Editora p 18-30 2000

PARO Vitor Henrique A educaccedilatildeo a poliacutetica e a administraccedilatildeo reflexotildees sobre a praacutetica do diretor de escola Educaccedilatildeo e Pesquisa v 36 n 3 p 763-778 2010

POLADIAN Marina Lopes Pedrosa Estudo sobre o Programa de residecircncia pedagoacutegica da Unifesp uma articulaccedilatildeo entre Universidade e escola na formaccedilatildeo de professores Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia da Educaccedilatildeo) - Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Satildeo Paulo 2014

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ROSEMBERG Fulvia Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees raciais a tensatildeo entre igualdade e diversidade Cadernos de Pesquisa v 44 n 153 p 742-759 2014

SILVA Adriana BUFALO Joseane O espaccedilo na pedagogia da educaccedilatildeo infantil faacutebula perversidade e possibilidade In Culturas infantis em creches e preacute-escolas estaacutegio e pesquisa Campinas SP Autores Associados 2011

TARDIF Maurice A profissionalizaccedilatildeo do ensino passados trinta anos dois passos para a frente trecircs para traacutes Educaccedilatildeo e Sociedade Campinas SP v34 n123 p

551-571 2013

VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

Correspondecircncia

Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Maria de Faacutetima Carvalho ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

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Por fim concluiacutemos assim como Noacutevoa (2000) a propoacutesito das narrativas (auto)

biograacuteficas que a escrita como parte dos processos formativos de professores eacute

capaz de fazer ldquoreaparecer os sujeitos face agraves estruturas e aos sistemas a qualidade

face agrave quantidade a vivecircncia face ao instituiacutedordquo Nesta linha de pensamento

percebemos que eacute possiacutevel ler o mundo e as relaccedilotildees sociais de um sujeito por meio

da sua narrativa produzindo ldquoum outro tipo de conhecimento mais proacuteximo das

realidades educativasrdquo (NOacuteVOA 2000 p 18 19 grifo do autor) e quiccedila

transformador dessas

Referecircncias bibliograacuteficas

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do Programa de Residecircncia Pedagoacutegica na UNIFESP Cadernos de Educaccedilatildeo n

46 p 62-82 2014

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MARQUES Danielle Vieira Aquino MUumlLLER Fernanda Experiecircncias com blog na pesquisa e na formaccedilatildeo inicial de professoras de educaccedilatildeo infantil ETD-Educaccedilatildeo Temaacutetica Digital v 14 n 1 p 43-61 2012

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MORETTI Vanessa Dias MARTINS Edna Atividade de ensino mediaccedilatildeo e aprendizagem da docecircncia na residecircncia pedagoacutegica uma anaacutelise a partir da teoria histoacuterico-cultural Revista Contrapontos v 15 n 3 p 394-411 2015

MORETTI Vanessa Dias A articulaccedilatildeo entre a formaccedilatildeo inicial e continuada de professores que ensinam matemaacutetica o caso da Residecircncia Pedagoacutegica da Unifesp Revista Educaccedilatildeo Porto Alegre 2011 v 34 n 3 p 385-390 2011

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244 2015

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POLADIAN Marina Lopes Pedrosa Estudo sobre o Programa de residecircncia pedagoacutegica da Unifesp uma articulaccedilatildeo entre Universidade e escola na formaccedilatildeo de professores Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia da Educaccedilatildeo) - Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Satildeo Paulo 2014

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ROSEMBERG Fulvia Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees raciais a tensatildeo entre igualdade e diversidade Cadernos de Pesquisa v 44 n 153 p 742-759 2014

SILVA Adriana BUFALO Joseane O espaccedilo na pedagogia da educaccedilatildeo infantil faacutebula perversidade e possibilidade In Culturas infantis em creches e preacute-escolas estaacutegio e pesquisa Campinas SP Autores Associados 2011

TARDIF Maurice A profissionalizaccedilatildeo do ensino passados trinta anos dois passos para a frente trecircs para traacutes Educaccedilatildeo e Sociedade Campinas SP v34 n123 p

551-571 2013

VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

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Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

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(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Renata Marciacutelio Cacircndido ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo

(UNIFESP) Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

Universidade Federal de Satildeo Paulo Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo R

Sena Madureira 1500 ndash Vila Clementino CEP 04021-001 Satildeo Paulo Satildeo Paulo

Brasil

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Page 21: 1 Residência pedagógica em educação infantil: uma experiência em formação de ... · 2019. 11. 4. · projeto de estágio em formação docente foi implantado em 2009, em uma

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MARINHO Ceacutesar Henrique MARTINS Edna Educaccedilatildeo infantil e relaccedilotildees eacutetnico-raciais impactos da formaccedilatildeo docente nas praacuteticas educativas Revista Educaccedilatildeo e Cultura Contemporacircnea v 14 n 34 p 42-63 2016

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MARTINS E Famiacutelia e escola no contexto de um programa de residecircncia pedagoacutegica um estudo a partir do enfoque histoacuterico-cultural Educaccedilatildeo Sociedade amp Culturas v 37 p 89-107 2012

MEKSENAS Paulo Sociologia da educaccedilatildeo uma introduccedilatildeo ao estudo da escola no processo de transformaccedilatildeo social Satildeo Paulo Loyola 2002

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POLADIAN Marina Lopes Pedrosa Estudo sobre o Programa de residecircncia pedagoacutegica da Unifesp uma articulaccedilatildeo entre Universidade e escola na formaccedilatildeo de professores Dissertaccedilatildeo (Mestrado em Psicologia da Educaccedilatildeo) - Pontifiacutecia Universidade Catoacutelica de Satildeo Paulo 2014

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TARDIF Maurice A profissionalizaccedilatildeo do ensino passados trinta anos dois passos para a frente trecircs para traacutes Educaccedilatildeo e Sociedade Campinas SP v34 n123 p

551-571 2013

VYGOTSKY Lev Semyonovich Desarrollo de las funciones psiacutequicas superiores en la edad de transicion in l s vygotski obras escogidas iv Paidologiacutea del adolescente Madrid Machado Libros Tomo IV 19302006a

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Edna Martins ndash Professora doutora da Universidade Federal de Satildeo Paulo (UNIFESP)

Satildeo Paulo Satildeo Paulo Brasil

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551-571 2013

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