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Humor e tristeza: O direito de rir

P A P I R U S E D I T O R A

Yves de La Taille

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La Taille, Yves de Humor e tristeza: O direito de rir/Yves de La Taille. – Campinas, SP: Papirus, 2014.

Bibliografia.ISBN 978-85-308-1146-4

1. Humor 2. Humor (Psicologia) 3. Tristeza 4. Psicologia – Aspectos morais e éticos I. Título.

14-07012 CDD-158.1

CapaFoto de capaCoordenação

Copidesque Diagramação

Revisão

1ª Edição – 2014 Proibida a reprodução total ou parcial da obra de acordo com a lei 9.610/98. Editora afiliada à Associação Brasileira dos Direitos Reprográficos (ABDR). DIREITOS RESERVADOS PARA A LÍNGUA PORTUGUESA: © M.R. Cornacchia Livraria e Editora Ltda. – Papirus Editora R. Dr. Gabriel Penteado, 253 – CEP 13041-305 – Vila João Jorge Fone/fax: (19) 3272-4500 – Campinas – São Paulo – Brasil E-mai l : edi [email protected] – www.papirus.com.br

Fernando CornacchiaRennato TestaAna Carolina Freitas e Beatriz MarchesiniBeatriz MarchesiniDPG EditoraEdimara Lisboa, Isabel Petronilha Costa e Julio Cesar Camillo Dias Filho

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Índice para catálogo sistemático:

1. Humor e tristeza: Psicologia aplicada 158.1

Exceto no caso de citações, a

grafia deste livro está atualizada

segundo o Acordo Ortográfico da

Língua Portuguesa adotado no Brasil a partir de 2009.

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Sumário

Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

Riso, humor e tristeza . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11

O direito de rir . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 139

Referências bibliográficas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 251

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O pequeno livro sobre o riso e o humor que agora submeto ao leitor nasceu de um interesse, de um desejo e também de uma preocupação .

O interesse . Sempre apreciei as boas comédias, as piadas inteligentes, os chistes criativos, as caricaturas reveladoras e outras formas mais de humor . E, já na década de 1990, comecei a me interessar pelo que os estudiosos do riso e do humor haviam escrito . Assim, sem critério especial, comprei alguns livros que achei por acaso em livrarias . Por exemplo, o livro de Françoise Bariaud (que, por coincidência, viria a conhecer pessoalmente depois num contexto de cooperação científica) sobre a gênese do humor na criança, o de Robert Escarpit sobre o humor em geral, o de Marcel Pagnol sobre o riso, o de Georges Minois sobre a história do riso e da irrisão, e outros mais . Mas, na época, totalmente dedicado às minhas pesquisas e reflexões na área da psicologia moral, não tinha a intenção de dar a minha contribuição acadêmica pessoal sobre o tema . Porém, em 2009, ousei considerar a possibilidade de dar tal contribuição . Reli então os textos já referidos e li vários outros a fim de me equipar para a nova empreitada . Mas por que essa decisão?

O desejo . Ao longo dos anos 1990 e 2000, tive como foco de meu trabalho a elaboração de uma perspectiva teórica que batizei de Personalidade ética . Publiquei em 2006 um livro – Moral e ética: Dimensões intelectuais e afetivas (Artmed) – que continha os elementos teóricos e empíricos dessa abordagem . Decidi então, de certa forma, “testar” a perspectiva teórica

Introdução

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por mim construída com a colaboração de outros autores, procurando verificar se, com ela, seria possível fazer uma leitura crítica da cultura contemporânea chamada de pós-modernidade . Esse “teste” deu origem ao livro Formação ética: Do tédio ao respeito de si (Artmed, 2009) . Ora, a decisão de me debruçar sobre o riso e o humor nasceu, além do meu interesse de longa data pelo tema, do mesmo desejo de verificar se a perspectiva teórica por mim adotada poderia servir para lançar algumas luzes sobre, por exemplo, as razões pelas quais os seres humanos riem, as motivações de quem decide criar obras de humor, as dimensões morais do humor e outras facetas mais do meu novo objeto de reflexão . Mas não foi apenas por motivos acadêmicos que refleti sobre o riso e o humor: é também porque o seu lugar na cultura atual me preocupa .

A preocupação . Eu já havia escrito o livro Formação ética: Do tédio ao respeito de si não somente com o objetivo de empregar conceitos e análises que me são caros para pensar a cultura contemporânea, mas também porque tal cultura apresentava, para mim, várias dimensões ética e moralmente inquietantes: por exemplo, o culto das celebridades, o hiperconsumismo, o afã de tudo se transformar em espetáculo, as estatísticas de depressão e suicídio, a vaidade, o tédio, a violência e outros elementos mais . Ora, em relação ao riso e ao humor, outras preocupações estão presentes, preocupações estas, aliás, que estão relacionadas àquelas que analisei no livro que acabo de citar . Fico perplexo, por exemplo, com a onipresença do humor na mídia, que criou até canais de televisão por assinatura a ele exclusivamente dedicados . Fico incomodado com a oposição sem nuances entre aqueles que afirmam que os humoristas não têm responsabilidade social, que se pode rir de tudo, de todos, e de qualquer jeito, que, afinal, “uma piada é apenas uma piada”, e aqueles outros, chamados pejorativamente de patrulheiros ou de politicamente corretos, que se arrepiam a cada piada sobre portugueses, a cada esquete que tenha mulheres como objeto, a cada charge que tenha uma celebridade como alvo . Fico indignado quando reparo que muitos empregam a alegação de que fazem coisas “para rir” ou “de brincadeira” para tornar anódinas humilhações

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e injúrias cometidas . E também fico desconfortável com o humor que hoje em dia domina a cena cultural: confesso, rio cada vez menos .

Desse interesse, desse desejo e dessa preocupação nasceu então o livro que hoje entrego à crítica do leitor . Ele é composto de dois capítulos . No primeiro procuro analisar a dimensão ética do humor por intermédio de sua relação com o sentimento de tristeza . No segundo, dedicado ao que chamo de “direito de rir”, meu objetivo não é escrever uma espécie de código que resolva normativamente a questão, mas sim apresentar critérios morais, sociais e políticos para balizar o referido direito . No final de cada um dos dois capítulos, proponho ao leitor uma rápida avaliação do riso e do humor na contemporaneidade, na qual falo de minha perplexidade e de minha preocupação acima referidas .

Antes de abrir o primeiro capítulo, preciso ainda ocupar um pouco o tempo do leitor com dois esclarecimentos .

O primeiro é a definição dos termos ética e moral assumida no livro: por convenção, e seguindo autores como Ricoeur (1990), Savater (2000) e Willians (1990), reservo o conceito de ética ao tema da vida boa (a pergunta ética é “que vida eu quero viver?”) e o conceito de moral ao tema dos deveres (a pergunta moral é “como devo agir?”) . A opção que acabo de explicitar foi adotada por uma razão de ordem psicológica decorrente de meus estudos sobre a moralidade .

O segundo esclarecimento diz respeito à definição de humor que será adotada . Alguns autores reservam o conceito de humor a uma categoria especial das criações que fazem rir . Por exemplo, André Comte-Sponville (1995) opõe humor a ironia; para ele, o humor seria amoroso e a ironia maldosa, arma para ferir quem dela é objeto . Para outro autor, Lucien Guirlinger (1999), ironia e humor não se opõem, mas se complementam e levam ao pensamento filosófico: a primeira etapa seria a da ironia que nos permite a tomada de consciência crítica, a segunda seria a do humor como sublimação da contrariedade provocada pela ironia, e, finalmente, a

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terceira etapa seria a da filosofia entendida como adesão refletida ao ser . Citemos ainda Jean Marc Moura (2010), que não vê oposição entre criações que fazem rir nem as coloca em hierarquia, mas se limita a classificá-las em oito categorias: humor, espírito, ironia, sátira, piada, nonsense (absurdo), sarcasmo e cinismo . No início de minhas reflexões até pensei em empregar diferenciações como as declinadas por Moura, mas logo desisti e acabei concordando com Robert Escarpit (1960) – que intitula a introdução de seu livro “Por que não podemos definir o humor” – e com Eric Blondel (1988) quando nos faz notar que, se consultarmos os especialistas, os dicionários e os filósofos para saber o que significa a palavra humor, teremos muita sorte se conseguirmos alguma clareza a respeito do termo . Como não tive essa sorte, resolvi chamar de humor (e não sou o único a fazê-lo) qualquer criação humana que tem o objetivo de nos fazer rir . Logo, chistes, ironias, sátiras, piadas, nonsense, sarcasmo, entre outros mais, serão considerados como formas de humor no livro que acabo, agora, de introduzir .

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Riso, humor e tristeza*

* Serão citados em francês os nomes das obras, mesmo quando houver edição em português, sempre que tais tiverem sido as fontes consultadas . (N .E .)

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Não terá passado despercebida de ninguém a estranha proximidade entre dois opostos: rir e chorar . São opostos porque, enquanto o riso costuma remeter ao prazer e à alegria, o choro evoca dor e tristeza . Porém, emprega-se a expressão “chorar de rir”, que traduz uma realidade biológica: às vezes, de tanto rir, as lágrimas vêm aos olhos . Há também certa semelhança entre os espasmos que caracterizam o riso e aqueles do choro; tanto é verdade que, ao ver alguém com tais espasmos, podemos não saber ao certo se está rindo ou chorando .1 E notemos que há casos nos quais choro e riso sucedem-se em questão de segundos ou se superpõem . É o caso das pessoas que choram de alegria: choram e riem ao mesmo tempo . É também o caso das pessoas que acabaram de passar por um grande susto: o medo as fez chorar, mas, ao perceberem que nada de mais grave havia acontecido, o riso entremeia-se ao choro ainda persistente . Tal cena se produz com frequência nas crianças, esses seres que choram e riem muito .

1 . No filme Vida de cachorro, de Charles Chaplin, há uma cena na qual Carlitos começa a rir, pois interpreta o choro da pessoa que está ao lado dele como risada . O engano de Carlitos faz eco à dúvida do espectador: ficamos também sem saber ao certo se a personagem ri ou chora . No final da cena compreendemos que se trata de tristeza porque o chorão se zanga com a má interpretação do vagabundo .

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Porém, todos sabem, ou pelo menos intuem, que a relação chorar/rir é humanamente mais profunda do que uma coincidência biológica, fisiológica ou apenas devida a emoções básicas, como o medo .

Estados de espírito de quem ri

A distinção e a oposição entre riso positivo e riso negativo, que devemos a Marcel Pagnol (1990) – ele mesmo humorista de talento –, podem ser entendidas de duas formas . Uma delas é moral: rir de um chiste bem elaborado não apresenta problemas morais; contudo, rir da desgraça alheia, sim . Tratarei dessa delicada questão no próximo capítulo, dedicado ao direito de rir . A outra é ética: que lugar ocupa o riso nos sentimentos do sujeito que ri .

Vejamos situações em que, do ponto de vista do sujeito, o riso pode ser considerado positivo .

Quase todas elas correspondem a diversas situações de alegria . Digo quase todas porque cenas estranhas podem causar riso (por exemplo, uma voz bizarra, certos comportamento animais, o quique inesperado de uma bola etc .) e, nesses casos, não é a alegria que está em jogo . Tampouco se trata necessariamente de alegria quando o riso é desencadeado por alguma forma de humor; tanto é verdade que até uma pessoa em estado de tristeza poderá rir de um bom chiste ou de uma boa piada . Mas voltaremos ao humor, tema central do presente texto, mais adiante . Antes vejamos algumas situações de alegria que causam o riso e, depois, algumas situações opostas que também levam as pessoas a rir .

A satisfação motivada por algum sucesso é uma das fontes mais frequentes do riso: quando alguém obtém boas notas num exame, vence uma partida ou prova esportiva, ganha um prêmio ou é homenageado, consegue ser eleito para algum cargo, vê seu time conquistar um título etc . Em tais casos, como em outros semelhantes, o riso é causado por

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um sentimento de superioridade, sentimento este escolhido por muitos autores como motivação incontornável do riso (voltarei a esse importante tema) . Mas a alegria pode vir de outras causas, como, por exemplo, ter recebido uma boa notícia, participar de uma festa, estar entre amigos, entre familiares, reencontrar alguém que não se vê há muito tempo, apreciar uma boa comida e uma boa bebida, celebrar uma data importante, e assim por diante . Outro exemplo de riso positivo é aquele chamado por Eugène Dupréel (1949) de riso de acolhimento . Trata-se do riso alegre com o qual os membros de um grupo acolhem outro membro que aparece de repente . É também aquele que, provocado por alguma cena inusitada, surge entre pessoas reunidas que não se conhecem, o qual cumpre a função de “quebrar o gelo” e aproximá-las, transformando-as momentaneamente num pequeno grupo, por mais efêmero que ele seja . Com efeito, o “rir junto”, expressão de cumplicidade, é poderoso meio de aproximação social . Podemos terminar os exemplos de alegria lembrando o simples bom humor que leva a pessoa a rir mesmo sem motivo preciso: nesse caso, diz-se que a pessoa “ri à toa” .

Paradoxalmente, o riso pode advir de situações opostas às que acabamos de citar .

Vimos que o orgulho decorrente de um sucesso pode provocar o riso: ora, como bem notou Charles Darwin (1998) em seu estudo sobre a expressão das emoções, a vergonha, oposta ao orgulho, também pode ser causa de riso em quem a experimenta: trata-se de um riso forçado, de uma forma de disfarçar o sentimento negativo perante outrem . A timidez e a insegurança, que certamente não são motivos de alegria, mas sim de desconforto, também causam o riso em alguns indivíduos: por exemplo, veem-se pessoas, mais frequentemente mulheres, fazerem acompanhar as suas falas, seja qual for o assunto, mesmo o mais sério, de repetidas pequenas risadas . Tal fenômeno poderia ser interpretado como tentativa de expressão de simpatia para com o ouvinte (nesse caso, o riso seria positivo), mas creio

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eu que geralmente se trata de expressão de insegurança, como se quem ri passasse a seguinte mensagem: antes que vocês riam do que eu falo, eu mesmo já rio . Trata-se de riso negativo, pois exprime algum sentimento penoso – oposto à alegria, portanto .

Outro exemplo de riso negativo é aquele que pode ser chamado de “histérico”, por traduzir-se pela expressão exagerada e incontrolada da emotividade: a raiva e a frustração podem assim ser expressas pelo riso . Por exemplo, Sempé, grande cartunista francês que passou a infância entre um pai e uma mãe que brigavam cotidianamente a socos, conta que durante algumas dessas cenas bélicas lhe acontecia de rir desbragadamente . Acabemos nossos exemplos com mais uma oposição: ao riso de acolhimento opõe-se o riso de exclusão (Dupréel 1949), aquele que um grupo faz soar para mostrar a alguém que o acham ridículo . Dupréel dá o exemplo de um grupo de autóctones que riem de turistas que se perdem em algum beco sem saída . Podemos dar outro: membros de uma torcida que riem da tropeçada de um jogador da equipe adversa . Alguém poderá aqui dizer que, nesses exemplos de riso de exclusão, quem ri está alegre em razão das desventuras alheias e que, portanto, estaríamos perante um riso positivo . É verdade que tal alegria pode existir, porém, acompanhada de desprezo e até mesmo de ódio, que são sentimentos negativos . Logo, há razoável diferença entre rir de algum sucesso ou de alguma boa notícia, em uma situação prazerosa – situações de pura alegria nas quais nenhum sentimento negativo está presente –, e rir das desgraças alheias, o que revela, no mínimo, uma mistura de alegria e raiva ou desprezo . A mesma coisa pode ser dita da insolência, que não raramente se traduz por pequenas risadas cujo caráter maldoso é conscientemente explicitado por quem as manifesta . Se na risada da insolência pode haver algum átomo de alegria, ela certamente revela mais contrariedade do que satisfação . Falta falar do pior dos risos negativos, que chamarei de riso de humilhação: aquele que é manifestado quando da humilhação de alguém ou de um grupo e que também é fruto de um sentimento de ódio ou forte inveja em relação à pessoa rebaixada .