2 Marx e Meszaros - Analise Do Capital

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    MARX E MSZROS: UMA ANLISE DA CRISE DO CAPITAL E DATRANSIO SOCIALISTA1

    Wildiana Ktia Monteiro Jovino2

    1. INTRODUO

    Marx evidenciou as crises capitalistas como inerentes dinmica que movimenta a vida

    social no capitalismo. Com igual intensidade, ele assevera as premissas objetivas e

    subjetivas de ruptura do ser social ao atual modo de produo e reproduo social.

    Mszros, por sua vez, corroborando com o pensamento de Marx, fundamenta a

    transcendncia histrica do socialismo como uma construo humana plenamente

    realizvel. Neste sentido, este artigo pretende investigar, por um lado, as premissassubjacentes crise capitalista presentes em Marx e Mszros e, por outro lado, os

    fundamentos que embasam a transio socialista defendido por Mszros. O argumento

    utilizado versar em alguns dos princpios orientadores transformao socialista

    apontados por Mszros, para o qual a ao extraparlamentar a progressiva

    transferncia do poder de deciso aos produtores associados e a igualdade substantiva,

    dentre outros, figuram como importantes aportes no desenvolvimento da conscincia

    socialista. Para clarear tal proposio, guiaremo-nos por uma concepo de mundo quese pe em franca oposio s verdadescarcomidas do capitalismo e pela afirmao da

    teoria revolucionria que dispe dos fundamentos basilares concretizao do projeto

    emancipatrio de sociedade.

    Pretendemos argumentar que, no obstante a proclamao ideolgica neoliberal

    e o niilismo existencial que implode as subjetividades contemporneas, o ideal

    socialista de sociedade no est morto. Esta afirmao no tem por base nenhuma

    crena utpica de terra prometida ou algum devaneio surrealista. As bases das quaispartimos so reais. no interior do prprio modo de produo capitalista, com suas

    tendncias e contradies, que se gestam os elementos para um novo tipo de sociedade,

    precisamente a sociedade comunista, sociedade esta que no demarca o fim da

    caminhada humana, mas apenas o alvorecer da verdadeira histria da humanidade.

    1Artigo inscrito no VII CEMARX - COLQUIO INTERNACIONAL MARX E ENGELS, no GT 09 -Socialismo no Sculo XXI.

    2Doutoranda do Programa de Ps-Graduao em Educao Brasileira da Universidade Federal do Cear UFC, sob a orientao do Prof. Dr. Eduardo F. Chagas (UFC).

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    Antes, porm, de investigar a estratgia orientadora ao socialismo defendida por

    Mszros, iniciaremos este artigo analisando a equao reprodutiva do capital no

    interior do capitalismo, desvendado por Marx, trazendo margem a natureza

    contraditria do sistema do capital.

    2. O Movimento de Acumulao do Capital por Marx

    Em sua forma mais amadurecida, a acumulao do capital se expressa na

    frmula3geral D M D. Nesse circuito, o valor de troca se sobrepe ao valor de uso,

    pois o dinheiro obtido ao final do processo ser quantitativamente maior do que o

    inicialmente investido, e este movimento transforma o dinheiro em capital. Esta

    transformao s pode ser explicada a partir do momento em que as condies

    histricas fazem surgir uma mercadoria peculiar, a fora de trabalho humano, cujo

    processo de consumo seja um processo de criao de valor e de mais valor que ela tem,

    de modo que o possuidor do dinheiro compra mercadorias por seu valor, vende

    mercadorias por seu valor e, mesmo assim, obtm valor excedente, isto , mais-valia.

    Para transformar dinheiro em capital, tem o possuidor dodinheiro de encontrar o trabalhador livre no mercado demercadorias, livre nos dois sentidos, o de dispor, como pessoa

    livre, de sua fora de trabalho como sua mercadoria, e o de estarlivre, inteiramente despojado de todas as coisas necessrias materializao de sua fora de trabalho, no tendo, alm desta,outra mercadoria para vender (MARX, 2008, p. 199).

    O capitalista compra mquinas, utenslios, instrumentos, matrias-primas

    (capital constante) e fora de trabalho (capital varivel) para produzir novas

    mercadorias, as quais tero um valor a mais do que o gasto por ele. a diferena entre o

    inicial investido na compra e o final arrecadado na venda que alimenta e motiva o

    capitalista, o lucro.

    Marx, porm, d-nos os elementos para uma leitura mais apurada dessa

    imediaticidade e nos esclarece que o lucro do capitalista no se origina, de forma

    isolada, na esfera da circulao. A mais-valia, porm, tambm no tem origem fora da

    circulao, mas atravs do uso pelo capitalista da mercadoria fora de trabalho por ele

    comprada, uso este que consiste como processo social de produo. A mais-valia surge

    3No nos deteremos na anlise da forma simples da circulao de mercadorias (M D M), tendo em

    vista que tal equao exprime a satisfao das necessidades humanas,na medida em que se inicia com aconverso de mercadoria em dinheiro e reconverso de dinheiro em mercadoria e esta, por sua vez, consumida como valor de uso, tendo na esfera do consumo a finalizao do processo.

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    do tempo de trabalho excedente, no pago, do trabalhador. Dessa forma, o capitalista

    promove novas e melhores formas de extrao do excedente, de transform-lo

    novamente em capital, e, por sua vez, d andamento sua acumulao ampliada.

    Quando h o prolongamento da jornada de trabalho, o capitalista motiva, por

    exemplo, a produo de 20 cadeiras,ao invs das 15 produzidas nas oito horas habituais

    de trabalho (mais-valia absoluta). Pode-se, ainda, aumentar a produtividade do trabalho,

    reduzindo o tempo de trabalho necessrio produo do equivalente subsistncia do

    trabalhador, que se era de quatro, por exemplo, passa a trs horas, sendo incorporado

    essa diferena como acrscimo ao trabalho excedente, que passa a cinco horas e o

    trabalho necessrio se reduz a trs horas, ou seja, o excedente, que j pertence ao

    capitalista, era de quatro, agora passou a cinco horas (mais-valia relativa).

    Esta proeza o que torna possvel a acumulao do capital, facilitada pela

    aplicao de novos mtodos de produo. Da surge o fetiche da tcnica como condio

    e caminho para o progresso da humanidade. O que esses fetichistas esquecem que o

    trabalho vivo a nica fonte de novo valor. Os disfarces que a produo capitalista

    assume para mascarar seu objetivo predominante tm apenas uma forma, a saber, a

    extrao incessante do excedente do trabalho humano.

    Mas, a produo capitalista no somente a reproduo de mercadorias e mais-

    valia, pressupe tambm a produo e reproduo das relaes sociais de produo que

    lhe servem de base: De um lado, sujeitos aptos a comprar mercadorias a fim de produzir

    outras novas se impem a outros que necessitam vender sua fora de trabalho pelo preo

    que a eles mesmos custam. A equao capitalista, portanto, ainda que se alimente da

    produo de mercadorias e excedentes, necessita igualmente de relaes sociais que lhes

    dem sustentao e legitimidade, pois, para que tenha continuidade,faz-se mister que os

    indivduos adotem as perspectivas gerais da sociedade de mercadorias como limites

    inquestionveis de suas prprias aspiraes (MSZROS, 2006, p. 263-264).

    Ademais, a dinmica que movimenta a vida social confronta a produo

    capitalista com uma tendncia que ergue obstculos ao seu prprio desenvolvimento. Se

    a classe dos capitalistas, para sobreviver concorrncia acirrada, precisa reduzir seus

    custos continuamente e esse objetivo demanda investimentos de forma contnua e

    crescente em maquinrio e matrias-primas, e, como conseqncia, tem-se umadiminuio relativa do capital varivel empregado, em comparao com o constante, ou

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    seja, h uma tendncia negao do trabalho vivo pelo trabalho morto, determinando

    uma elevao no que Marx chama de composio orgnica do capital. Esse aumento na

    composio orgnica do capital implica um estreitamento da base de sustentao do

    processo de valorizao do capital que se projeta na tendncia queda da taxa de lucro.

    Essa barreira ao desenvolvimento da produo capitalista o mistrio que

    atormenta a economia poltica desde Adam Smith e cuja tentativa de formulao terica

    envolve os economistas, anteriores e posteriores Marx, em grandes divergncias4.

    este o paradoxo essencial da produo capitalista, que ao desenvolver-se, a taxa mdia

    geral da mais-valia tenha de exprimir-se em taxa geral cadente de lucro (MARX, 1983, p.

    243). Por um lado, para se obter um lucro superior, necessrio o aumento da

    produtividade do trabalho e a consequente reduo dos custos de produo das

    mercadorias, situao que empurra o conjunto dos capitalistas ao investimento em

    capital constante. Por outro lado, essa operao implica na reduo relativa do capital

    varivel, e, por conseguinte, queda da taxa de lucro, queda esta que , em parte,

    atenuada5pela taxa mais alta de mais-valia da qual se utiliza o capitalista.

    Marx diz:

    [...] e nisto consiste todo o mistrio da tendncia baixa da taxa delucro que os meios de produzir mais-valia relativa reduzem-se, emsuma, ao seguinte: converter a maior quantidade possvel de dadamassa de trabalho em mais-valia, ou empregar a menor quantidadepossvel de trabalho em relao ao capital adiantado. Assim, asmesmas causas que permitem elevar-se o grau de explorao dotrabalho, impedem que se explore com o mesmo capital global amesma quantidade anterior de trabalho. H a tendncias opostas quesimultaneamente atuam no sentido de elevar a taxa de mais-valia e debaixar a massa de mais-valia e por conseguinte a taxa de lucrocorrespondentes a dado capital (MARX, 1983, p. 267).

    4 Segundo observa, embora a economia poltica vislumbrasse a diferena entre capital constante evarivel, no chegou a formul-la claramente; [...] nunca apresentou a mais-valia separada do lucro e aconfigurar o lucro em sua pureza, destacado de seus componentes diversos que ostentam autonomiarecproca, como lucro industrial, lucro comercial, juros, renda fundiria; [...] nunca analisou em seusfundamentos a variao da composio orgnica do capital e por isso tampouco a formao da taxa delucro (MARX, 1983, p. 244).

    5 Cabe ressaltar que, embora a taxa de mais-valia se constituir no elemento fundamental do processo deacumulao e reproduo do capital, a tentativa da classe capitalista de incremento da taxa de lucro pormeio da intensificao do grau de explorao da fora de trabalho se depara sempre com a resistncia,passiva ou velada, da classe operria. Ainda que a taxa de mais-valia seja intensificada atravs deprocessos alternativos que no impliquem um confronto direto com os trabalhadores, essas fontes de

    superexplorao tendem ao progressivo esgotamento, tendo em vista que a mundializao do capitalconduz a uma crescente homogeneizao da produo.

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    Marx adverte, no entanto, que a queda da taxa de lucro tem um carter controlado.

    lei geral da queda da taxa de lucro sobrelevam-se fatores contrrios que anulam a

    consumao absoluta da baixa geral da taxa de lucro, o que lhe imprime o carter de

    tendncia, so eles: O aumento do grau de explorao do trabalho, a reduo dos salrios, abaixa dos preos dos elementos do capital constante, a superpopulao relativa (exrcito

    industrial de reserva), o comrcio exterior e o aumento do capital em aes so os fatores

    contrrios lei da queda do lucro apresentados por Marx, que retardam e/ou paralisam

    parcialmente essa queda (MARX, 1983, p. 267-276).

    A correlao dessas foras, que objetivam suplantar os limites que se interferem

    expanso do capital, no entanto, no altera a regra de que, na produo capitalista, o

    desenvolvimento da produtividade do trabalho equivale reduo da taxa de lucro. Sendo olucro o estimulante da produo capitalista e por ele se impor o aumento da produtividade

    - relao que conduz no ao aumento do trabalho social, mas, de forma inversa,

    diminuio relativa do trabalho vivo em geral - temos, ento, revelada a contradio do

    modo capitalista de produo. Vejamos o que Marx nos diz:

    Mais uma vez revela-se o limite especfico da produo capitalista ev-se que no , de maneira alguma, forma absoluta dodesenvolvimento das foras produtivas e da criao da riqueza,colidindo com este desenvolvimento a partir de certo ponto (MARX,1983, p. 302).

    A contradio permanente entre os objetivos e meios empregados para se atingir o

    desenvolvimento ilimitado da produo colidem com as relaes de produo que lhe

    correspondem. O conflito entre esses elementos antagnicos se realiza, periodicamente, nas

    crises que perturbam o processo de circulao e reproduo do capital. As crises no so

    mais do que solues momentneas e violentas das contradies existentes, erupes

    bruscas que restauram transitoriamente o equilbrio desfeito (Marx, 1983, p. 286). So,

    portanto, inerentes ao modo de produo capitalista, produto das contradies internasque vigoram nas relaes de produo e, ao mesmo tempo, motor funcional de reao,

    restaurao e sobrevida do prprio sistema, pois est na natureza do capital superar as

    barreiras que afrontem a sua fome ininterrupta de expanso. No obstante, ainda que

    postergada indefinidamente em seus conflitos, tender fratura e eis que se apresenta o

    calcanhar de Aquiles. Todavia, importante destacar que o capitalismo no tem limites

    puramente econmicos, devendo ser superado por uma revoluo social. Trata-se, pois,

    de um processo histrico-social diretamente vinculado ao desdobramento da luta de

    classes.

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    2. O Movimento Alternativo de Istvn Mszros

    A reflexo sobre a crise do capital, sua indelvel rede de contradies que

    abarcam a totalidade do complexo social, confronta-nos com posies ideolgicas e

    conhecimentos compatveis a cada um deles - que retratam os embates e distores, com

    os quais o projeto socialista e marxismo tm se deparado ao longo da sua histria.

    Digno de nota acerca desse movimento degenerativo da teoria revolucionria

    pode ser ilustrado com o embate cientfico de Rosa Luxemburgo pela transformao

    socialista do mundo contra o revisionismo de Eduardo Bernstein pela na luta sindical

    e poltica do movimento operrio como forma de reduzir, por etapas, a prpria

    explorao capitalista, arrancar cada vez mais sociedade capitalista o seu carter

    capitalista (Luxemburgo, 1999, p. 59) como estratgia de realizao do objetivo final.

    De fato, circunstncias histricas adversas tm conduzido o movimento operrio

    prtica acomodativa aos interesses do capital, aniquilando a original e impretervel

    unidade internacional da classe trabalhadora em torno da alternativa socialista.

    Soma-se ao quadro a insgnia apologtica da onipresena das contradies

    crnicas do sistema que projeta e conforma nossos crebros ao apelativo letreiro

    luminoso de que nada de novo sob o Sol produzido

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    (Hegel, 1998, p.53). Contrapor-se s tendncias ideolgicas que eternizam o capitalismo sobre outra forma social

    possvel no se constitui tarefa simples, afinal a conscincia social de uma dada poca

    expressa pela ideia da classe hegemnica e assume, de forma aparente e idealista, a

    representao dos interesses universais da sociedade. A consequncia terica dessa

    ideologia reca na condenao do marxismo e na insistente negao das foras possveis

    de emancipao. Como rota de fuga promessa de desvencilhamento das contradies

    sociais que insistem em no desaparecer, novas teorizaes mistificadoras so

    elaboradas: o fim da histria (Fukuyama, 1999), a ps-modernidade, a perda de

    credibilidade do grande relato da emancipao (Lyotard, 2009), a comunidade ideal de

    comunicao intersubjetiva (Habermas apud Mszros, 2004), que so apenas alguns

    exemplos do iderio relativista ps-moderno que busca o consenso poltico e o

    subterfgio das contradies sob a alegativa da inacessibilidade da razo humana

    realidade objetiva. Tal verso, em ltima instncia, procura inviabilizar a transcendncia

    6De acordo com Hegel, apenas nas transformaes que acontecem no campo espiritual surge o novo(HEGEL, 1998, p. 53).

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    do consenso obtido em esferas isoladas e localizadas do discurso ou da linguagem,

    relegando para a terra do nunca o compromisso de luta pelo ideal socialista de

    sociedade. Paradoxalmente, todo esse entorpecimento ideolgico no capaz de

    esgueirar-se da crise do capital, do capitalismo e dos dilemas sociais que se interpem

    para a humanidade.

    Para Mszros, a crise que vivenciamos hoje se diferencia da natureza de

    outrora. Segundo sua anlise, no h mais intervalos cclicos entre expanso e recesso.

    A prpria realizao do valor foi acometida pela lgica irrefutvel de valorizao do

    capital, que corri as engrenagens do sistema sociometablico. O sistema de

    mediaes de segunda ordem a produo alienada e suas personificaes - atrela a

    produo e o consumo degradao do trabalho e da natureza s consequncias

    destrutivas, que mais e mais se intensificam devido ao inerente distanciamento da

    produo voltada s necessidades sociais, humanas, diferentes daquelas dominantes,

    voltadas para a desmedida reproduo do valor.

    Desta feita, a crise nas estruturas do capital demarca limites intransponveis ao

    desenvolvimento humano e expe uma rede nefasta de contradies entre o capital e o

    trabalho que evidncia a exausto do atual modo de produo. A submisso das

    necessidades humanas ao poder alienante da expanso do capital, a desumanizao do

    trabalho vivo transformado em mercadoria, a taxa de utilizao sempre decrescente dos

    bens e servios que pe em colapso o meio ambiente, so alguns dos fenmenos que

    destacam o carter incontrolvel e totalizador do sistema que enlaa todas as relaes e

    esferas sociais sob os mesmos imperativos da viabilidade produtiva. Todavia, ainda que

    as complicaes advindas desse quadro no possam ser refutadas nem mesmo pelas

    apologticas hegemnicas, no podemos, igualmente, cair no ilusrio discurso de que o

    capitalismo est sentenciado ao ponto de no-retorno do colapso geral, no obstantesua indiscutvel capacidade de reinveno.

    A crise estrutural do capital deve ser entendida como o pano de fundo no

    apenas da implacvel confrontao dos limites do capital, mas tambm para novas

    potencialidades histricas. Os problemas que dela emergem abrem caminho para o

    exame crtico de problemas cruciais e estreitamente vinculados ao o salto para alm do

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    capital7, atualidade histrica da ofensiva socialista e teoria da transio socialista

    adequada ao contexto atual (MSZROS, 2009a, p. 76-83).

    No esprito da transio para o socialismo em escala global defendido por Marx,

    Mszros aponta princpios orientadores transformao socialista que devem ser

    considerados numa totalidade integrada de determinaes recprocas e implicaes

    globais que devem estar conjugados negao radical do sistema do capital e do

    capitalismo, de forma a entrincheirar resqucios que possam revitalizar e restaurar as

    antigas estruturas conforme ocorrido no modelo sovitico, afinal o xito relativo da

    restaurao capitalista responsvel pela paralisia ideolgica que mantm as foras

    socialistas refns dessa devastadora internalizao (MSZROS, 2007, p. 228).

    Dentre as princpios necessrios ordem social alternativa, Mszros sobrepuja

    estratgia da participao democrtica da fora de trabalho preconizado pela

    empresa capitalista, a progressiva transferncia do poder de deciso aos produtores

    associados na tomada de deciso em todos os nveis de controle poltico, cultural e

    econmico (Idem, 2007. p. 229). Apenas por este meio pode-se despertar nas massas

    um autntico interesse, identificao e expanso das potencialidades positivas de

    reproduo da existncia social. A participao s ser significativa se os poderes de

    deciso forem realmente transferidos aos trabalhadores associados8, os quais devero

    superar as determinaes conflitantes e autoritrias herdadas do capital e isso s se torna

    realizvel em um outro modo de intercmbio produtivo.

    Na seqncia, a igualdade substantiva ser a consequncia necessria e

    imprescindvel plena realizao da estratgia da participao genuna dos

    trabalhadores, sujeito real do poder e ao xito do projeto socialista. Sem confrontar de

    forma consciente o problema da desigualdade estrutural arraigada ordem do capital, a

    superao dos conflitos internos dos nossos microcosmos sociais torna-se tarefa

    sisifiana. No toa que, no curso do desenvolvimento histrico do capital, grandes

    personalidades que levantaram a bandeira de uma sociedade igualitria tenham

    silenciado ou sucumbiram num cadafalso, e at mesmo a filosofia racionalista se

    mostrou incapaz de fornecer a salvao daquela sociedade ao despotismo e misria.

    7 H, em Mszros, uma distino entre capital e capitalismo. O capital antecede o capitalismo e tambm posterior a ele. A analogia tambm se aplica produo de mercadorias, que precede e no se

    identifica com a produo capitalista de mercadorias (MSZROS, 2009a, p. 76-78).8Para Mszros (2004), o sujeito social da emancipao envolve todo o grupo de trabalhadores.

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    Em lugar das relaes sociais existentes em que a igualdade existe apenas como uma

    exigncia formal/jurdica perfeitamente manipulada em favor de determinados

    interesses ou sob a frmula da igualdade de oportunidades, a plena realizao da

    igualdade substantiva se apresenta como uma necessidade de imensa complexidade e do

    qual o projeto socialista no poder esquivar-se.

    E, naturalmente, essas mudanas (e demais outras no abordadas neste espao)

    no podem realizar-se no interior do domnio poltico constitudo no decurso do

    desenvolvimento do capitalista. Como bem alerta Mszros (2007, p. 281), o capital

    a fora extraparlamentar por excelncia de nossa ordem social e domina

    completamente o parlamento, este edificado historicamente na separao da poltica da

    dimenso reprodutiva material da sociedade. Estamos diante de um dos fatores

    apontados pelo autor que inviabiliza uma soluo sustentvel aos problemas sociais

    genunos no interior da estrutura poltica parlamentar. Com efeito, contrapor-se

    hostilidade de tais foras exige um movimento consciente e ativo das massas engajado

    em todas as lutas sociais e polticas se utilizando das oportunidades parlamentares

    disponveis, por menores que sejam para firmar as demandas necessrias de uma ao

    extraparlamentar.

    Por certo, um movimento revolucionrio organizado conscientemente no pode

    edificar-se no interior da poltica restritiva do parlamento dominado pelos interesses

    reprodutivos do capital e pela sobreposio dos interesses privados sobre a coletividade,

    tampouco pode ser obra de um partido poltico engajado na luta por concesses

    parlamentares, teis somente na medida em que abram espaos para a formao de uma

    fora de combate extraparlamentar.

    Para tanto, o desenvolvimento contnuo da conscincia socialista (Idem, 2007

    p. 298) um dos grandes desafios postos educao das massas, que deve interagir,

    recproca e dialeticamente, com a construo socialista de sociedade, bem como analisar

    claramente as concepes apropriadas aos desafios histricos que temos de enfrentar no

    curso de uma mudana qualitativa.

    REFERNCIAS

    HEGEL, G. W. F.Filosofia da Histria. Traduo Maria Rodrigues e Hans Harden. 2.

    ed. Braslia: Editora Universidade de Braslia, 1998.

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    MARX, K. O Capital: Crtica da Economia Poltica: Livro I: O Processo de Produodo Capital. Vol. I. 26. ed. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 2008b.

    ______. O Capital: Crtica da Economia Poltica: Livro III: O Processo Global da

    Produo Capitalista. Vol. IV. 4. ed. So Paulo: Difel, 1983.MARX, K, F, ENGELS.A Ideologia Alem(I Feuerbach). 8. ed. So Paulo: EditoraHucitec, 1991.

    MSZROS, I.A Crise Estrutural do Capital. So Paulo: Boitempo Editorial. 2009a.

    ______.Para Alm do Capital. So Paulo: Boitempo Editorial. 2009b.

    ______. O Desafio e o Fardo do Tempo Histrico: O Socialismo no Sculo XXI. SoPaulo: Boitempo, 2007.

    ______. O Poder da Ideologia. So Paulo: Boitempo, 2004.

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