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    COSTA VAL, Maria da Graa. Texto, textualidade e textualizao.IN: CECCANTINI, J.L. Tpias; PEREIRA, Rony F.; ZANCHETTA JR., Juvenal.

    Pedagogia Cidad: cadernos de formao: Lngua Portuguesa. v. 1.So Paulo: UNESP, Pr-Reitoria de Graduao, 2004. p. 113-128.

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    TEXTO, TEXTUALIDADE E TEXTUALIZAO1

    Maria da Graa Costa Val(Faculdade de Letras da UFMG)

    O QUE TEXTO?

    H algum tempo, entendia-se como texto apenas os escritos que

    empregavam uma linguagem cuidada e se mostravam claros e objetivos. J

    no se pensa mais assim.

    Hoje, com o avano dos estudos lingsticos, discursivos, semiticos e

    literrios, mudou bastante o conceito de texto. Falando apenas de texto verbal,

    pode-se definir texto, hoje, como qualquer produo lingstica, falada ou

    escrita, de qualquer tamanho, que possa fazer sentido numa situao de

    comunicao humana, isto , numa situao de interlocuo. Por exemplo:

    uma enciclopdia um texto, uma aula um texto, um e-mail um texto, uma

    conversa por telefone um texto, tambm texto a fala de uma criana que,

    dirigindo-se me, aponta um brinquedo e diz t.

    Um ponto importante nessa definio que possa fazer sentido numa

    situao de interlocuo. Isso significa duas coisas: a) nenhum texto tem

    sentido em si mesmo, por si mesmo; b) todo texto pode fazer sentido, numa

    determinada situao, para determinados interlocutores 2.

    Retomando o exemplo acima, t no chega a ser propriamente nem

    ao menos uma palavra da lngua portuguesa; portanto, isolada, fora da

    situao em que foi usada, no tem nem deixa de ter sentido. No entanto,

    quando pronunciada por uma criana e dirigida me, acompanhada do gesto

    de apontar um brinquedo, passa a ser um texto bom e completo, pode serinterpretada como o verbo quero, pronunciado de acordo com as

    possibilidades do locutor naquele momento, e significando um pedido da

    1 Publicao: COSTA VAL, Maria da Graa. Texto, textualidade e textualizao. IN: CECCANTINI,J.L. Tpias; PEREIRA, Rony F.; ZANCHETTA JR., Juvenal. Pedagogia Cidad: cadernos deformao: Lngua Portuguesa. v. 1. So Paulo: UNESP, Pr-Reitoria de Graduao, 2004.

    2 O termo interlocutor, neste artigo, designa o par locutor/alocutrio, participantes de umainterlocuo. O termo locutorser usado para designar a f igura do autor ou produtor do texto; otermo alocutrio, para designar a figura do destinatrio ou recebedor do texto. Com essa opoterminolgica quero sinalizar a participao ativa das duas figuras nas prticas sociais deinterao verbal, orais e escritas.

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    Pedagogia Cidad: cadernos de formao: Lngua Portuguesa. v. 1.So Paulo: UNESP, Pr-Reitoria de Graduao, 2004. p. 113-128.

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    criana de que a me lhe d o brinquedo. Do mesmo modo, um e-mail que straz a pergunta E a, tudo verde? pode parecer sem sentido para uns, mas

    seria perfeita (e furiosamente...) compreendido um torcedor corintiano que

    recebesse a mensagem de um amigo palmeirense, depois de um jogo de

    futebol em que o Palmeiras tivesse vencido o Corinthians. Por outro lado, um

    livro de Fsica Quntica ou um tratado de Filosofia podem ser claros e

    consistentes para os especialistas e absolutamente incompreensveis para os

    leigos.

    Resumindo: uma produo lingstica que, numa dada circunstncia,

    parea sem p nem cabea, incompreensvel, inadequada, inaceitvel, para

    determinado grupo, pode ser perfeitamente entendida e considerada como sem

    qualquer problema por outros interlocutores, noutra situao, e, para eles,

    funcionar plenamente como texto. Isso quer dizer que o sentido no est no

    texto, no dado pelo texto, mas produzido por locutor e alocutrio a cada

    interao, a cada acontecimento de uso da lngua.

    Essa questo tem tudo a ver com os conceitos de textualidade e de

    textualizao, que sero explicados no prximo item. Esses conceitos so da

    maior importncia e podem ter muitas aplicaes na aula de Lngua

    Portuguesa, no ensino da leitura e da escrita.

    TEXTUALIDADE E TEXTUALIZAO

    O termo textualidade foi definido por Robert-Alain de Beaugrande e

    Wolfgang Dressler, no livro Introduction to Text Linguistics , de 1981, como o

    conjunto de caractersticas que fazem com que um texto seja um texto, e no

    apenas uma seqncia de frases ou palavras. Mais recentemente, num livro de1997 (New foundations for a science of text and discourse: cognition,

    communication and freedom of access to knowledge and society), o prprio

    Beaugrande rediscutiu essa definio, propondo no se perdesse a estreita

    relao entre a textualidade e o processo de textualizao. Atualmente,

    outros estudiosos, como Jean-Paul Bronckart e Bernard Schneuwly,

    focalizando os processos de produo e interpretao de textos, tambm tm

    usado o termo textualizao.

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    Quando se fala em textualidade, muitas pessoas podem compreenderque se esteja considerando o texto como um produto lingstico que traz em si

    mesmo o seu sentido e todas as suas caractersticas. Pensar assim significaria

    acreditar que todos aqueles que ouam ou leiam um determinado texto, mesmo

    que em circunstncias diferentes, vo entend-lo exatamente do mesmo jeito.

    E isso a gente sabe que no verdade. Todos ns j vivenciamos situaes

    em que textos literrios, ou jurdicos, ou religiosos, ou noticiosos, ou da

    conversa cotidiana, foram interpretados diferentemente por pessoas diferentes.

    Essa diversidade de interpretaes acontece porque cada texto pode ser

    textualizado de maneiras diferentes por diferentes ouvintes ou leitores. Por isso

    que se tem preferido, atualmente, falar em textualizao.

    Levando em conta essas ponderaes, podemos definir melhor

    textualidade como um princpio geral que faz parte do conhecimento textual

    dos falantes e que os leva a aplicar a todas as produes lingsticas que

    falam, escrevem, ouvem ou lem um conjunto de fatores capazes de textualizar

    essas produes. Explicando melhor: no vamos entender a textualidade como

    algo que est nos textos, mas como um componente do saber lingstico das

    pessoas. As pessoas sabem que, para um conjunto de palavras constituir um

    texto, preciso que esse conjunto parea aos interlocutores um todo articulado

    e com sentido, pertinente e adequado situao de interao em que ocorre.

    E, ento, aplicam os fatores ou princpios de textualidade a todo conjunto de

    palavras com que se defrontam, buscando fazer com que essas palavras

    possam ser entendidas como um texto compreensvel, normal, com sentido.

    Beaugrande e Dressler (1981) apontaram sete fatores constitutivos da

    textualidade, isto , sete princpios que fazem parte do conhecimento textual

    das pessoas, que elas aplicam aos textos que produzem e esperam encontrar

    nos textos que ouvem ou lem: coerncia, coeso, intencionalidade,aceitabilidade, situacionalidade, informatividade e intertextualidade. Embora os

    autores pretendessem se referir aos processos de produo e interpretao

    textual, sua teoria foi compreendida como relativa ao texto enquanto produto,

    enquanto artefato lingstico. Os conceitos de coerncia e coeso foram

    usados por muita gente, inclusive eu, no livro Redao e Textualidade, como

    definidores de qualidades que um determinado texto tinha ou deixava de ter.

    Se pudesse reescrever meu livro, que foi publicado em 1991, eu hoje

    modificaria a maneira como tratei dessas questes. No diria mais que a

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    redao A tem coerncia e que a redao B no tem; nem que a redao Ctem coeso e a redao D no tem. Diria que eu, na posio de leitora, pude

    textualizar aquelas redaes da maneira X ou Y, e que foi fcil para mim

    produzir coerncia e coeso para as redaes A e C, mas foi difcil fazer o

    mesmo quanto s redaes B e D.

    A seguir, vou tratar dos sete princpios de textualizao propostos por

    Beaugrande e Dressler (1981) e Beaugrande (1997), dando destaque especial

    para a coerncia e a coeso.

    Coerncia

    Podemos entender coerncia como aquilo que faz com que um texto

    nos parea lgico, consistente, aceitvel, com sentido. Quando a gente

    entende um texto, oral ou escrito, porque conseguiu atribuir coerncia a esse

    texto. A coerncia tem a ver com as idias do texto, com os conceitos e as

    relaes entre conceitos que esse texto pe em jogo: de que tpicos o texto

    fala, o que diz sobre eles, como organiza e articula esses tpicos (por exemplo,

    com relaes de causa/conseqncia, ou de anterioridade/simultaneidade/

    posterioridade, ou de incluso/excluso, ou de semelhana/oposio, ou de

    proximidade/distncia). Quer dizer: a coerncia tem a ver com conhecimentos e

    informaes. Ouvir ou ler um texto e entend-lo, consider-lo coerente,

    significa conseguir process-lo com os conhecimentos e a habilidade de

    interpretao que se tem e, ento, avali-lo como compatvel com esses

    conhecimentos.

    Acontece que praticamente nenhum texto diz tudo que necessrio

    para que ele possa ser compreendido. Em geral, os textos trazem muita

    informao implcita ou subentendida e tambm no explicitam todas asrelaes entre as informaes. Ao ouvinte ou leitor que cabe a tarefa de

    identificar e inter-relacionar informaes e, assim, produzir coerncia para o

    texto. Como as pessoas podem ter conhecimentos, habilidades e interesses

    diferentes, normal que haja pontos de divergncia na compreenso que

    produzem de um mesmo texto. A construo do sentido depende dos

    conhecimentos e intenes de quem falou e dos conhecimentos disponveis e

    habilidades interpretativas de quem ouviu.

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    Mas no s isso. Apesar da efetiva diversidade de interpretaes, aspessoas so capazes de se entender, ou seja, h uma parte comum no

    processo de produo de sentido, no trabalho de construo da coerncia

    textual. Isso possvel porque interlocutores que pertencem a uma mesma

    sociedade partilham conhecimentos, crenas e valores. Partilham

    conhecimentos lingsticos (a gramtica e o vocabulrio de uma lngua),

    textuais (quanto a caractersticas de tipos e gneros3 textuais, quanto a

    tendncias gerais de construo da coerncia textual) e pragmticos (por

    exemplo, que atos de fala4 se pode realizar naquela comunidade e com que

    recursos lingsticos); partilham viso de mundo, crenas, expectativas,

    valores, produzidos por aquela sociedade ao longo de sua histria.

    Entre outros estudiosos, Charolles, num artigo publicado em 1978 e

    traduzido para o portugus em 1988, tentou explicitar as regras de coerncia

    que fariam parte do saber lingstico-textual-discursivo das pessoas. A partir do

    que esse autor props, poderamos dizer que as prticas sociais de linguagem,

    ao longo do tempo, teriam sedimentado algumas tendncias gerais de

    coerncia, que as pessoas aplicam na produo e na interpretao de textos.

    Essas tendncias gerais aparecem formuladas em expresses populares que

    revelam a intuio lingstica dos falantes quanto coerncia textual. A

    inteireza, isto , a necessidade de o texto ser percebido como um todo

    significativo, a idia que se percebe em avaliaes do tipo j acabou, u, t

    faltando um pedao, ou e a, como que termina a histria? e em

    expresses como ter comeo, meio e fim. A intuio de que os textos se

    caracterizam pela unidade temtica aparece em julgamentos como fugiu do

    tema, perdeu o fio da meada, ou do que mesmo que eu estava falando?.

    O requisito de integrao e articulao entre as informaes se manifesta em

    reclamaes contra textos que no dizem coisa com coisa. A compatibilidade

    do mundo textual com o mundo real (quando no se trata de fico ou de

    relato de sonhos e fantasias) uma exigncia intuitiva que se exprime na

    condenao a textos que dizem coisas sem p nem cabea.

    3 Tipos: narrativo, descritivo, expositivo, argumentativo, injuntivo; gneros: carta, notcia,reportagem, romance, soneto, conto, catlogo de telefones, e-mail, sermo religioso,pronunciamento poltico, dirio, prova escolar, fofoca de comadre, piada, trova, cano popular,anncio classificado, propaganda, discurso de paraninfo de formatura, tero, novena, etc.

    4 Por exemplo: ato de declarar, pedir, de perguntar, de avisar, de cumprimentar, de bajular, deofender, de irritar, de ameaar, de prometer, de amedrontar, etc.

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    A coerncia um princpio de textualizao que funciona atrelado earticulado com os outros fatores apontados por Beaugrande e Dressler.

    Podemos dizer que a coerncia co-construda pelos interlocutores e depende

    da co-construo da coeso, da situacionalidade, da intencionalidade , da

    aceitabilidade, da informatividade, da intertextualidade. Um texto aceito e

    avaliado pelos interlocutores (aceitabilidade) como coerente quando os

    recursos lingsticos que utiliza so percebidos como integrados num todo

    inteligvel (coeso), que lhes parea adequado situao em que ocorre

    (situacionalidade) e apropriado para a realizao das intenes do locutor

    diante dos ouvintes ou leitores a que se destina ( intencionalidade).

    Na produo e interpretao de um texto, os interlocutores se valem de

    crenas e conhecimentos que fazem parte da histria e da cultura de sua

    sociedade, conhecimentos e crenas que lhes vieram sob a forma de textos

    falados e escritos na famlia, na escola, na igreja, no trabalho, no jornal, no

    rdio, na TV, na literatura, etc. Cada texto, como diz Bakhtin, como um elo na

    grande corrente de produes verbais que circulam numa sociedade. Cada

    texto retoma textos anteriores, reafirmando uns e contestando outros e,

    utilizando sua matria prima, se inclui nessa cadeia verbal, pedindo resposta

    e se propondo como matria prima para outros textos futuros. Ou seja, a

    intertextualidade fundamental, indispensvel, na constituio de qualquer

    texto. Pode ser que o prprio locutor no se d conta de com quantos textos

    se faz o seu texto; pode ser que o alocutrio no (re)conhea todos os textos

    envolvidos na construo dos textos que ele ouve ou l. Mesmo assim, sem

    enxergar todo o processo, esto lidando com a intertextualidade.

    J a informatividade diz respeito ao nvel de novidade que cada um

    atribui a um texto. A tendncia geral que as pessoas entendam e gostem de

    um texto quando encontram informaes conhecidas que lhes servem de basepara processar as novidades que ele lhes traz. Se o nvel de novidade que

    reconhecem num texto lhes parece baixo, elas tendero a avali-lo como intil,

    enfadonho, decepcionante; mas, por outro lado, se o nvel de novidade parecer

    alto demais, no ser possvel entender o texto e a tendncia ento ser

    rejeit-lo. Os exemplos vistos acima, da criana que diz t, do e-mail irnico e

    desaforado que o palmeirense envia ao corintiano, do livro de Fsica e do

    tratado de Filosofia, sero processados como coerentes ou no dependendo

    do nvel de informatividade que os alocutrios atriburem a eles. Por isso que

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    um mesmo texto fcil para uns e difcil para outros; interessante para uns eaborrecido para outros; revolucionrio para uns e banal para outros. O

    processamento da informatividade de um determinado texto varia at mesmo

    para uma nica pessoa, em momentos diferentes. Todo mundo j viveu a

    experincia de se emocionar tremendamente lendo alguma coisa que, mais

    tarde, lhe parece boba, sem graa nenhuma; ou j teve muita dificuldade em

    entender um texto que, retomado algum tempo depois, avaliado como bvio.

    Que aplicao poderiam ter essas idias sobre coerncia textual no

    ensino de Lngua Portuguesa? A meu ver, essa maneira de compreender a

    coerncia maior importncia para o trabalho em sala de aula.

    Em primeiro lugar, porque permite ao professor e aos alunos

    compreenderem que no se pode dizer que um texto bom ou ruim, coerente

    ou incoerente, com sentido ou sem sentido, sem considerar a situao de

    interlocuo em que ele acontece. Todo texto tem que ser pensado em funo

    de seu contexto. Se isso verdade para o funcionamento efetivo dos textos

    nas trocas linguageiras que acontecem de fato na vida social, preciso que os

    alunos compreendam esse fato e aprendam a lidar com ele, na produo e na

    interpretao, de textos falados e escritos. Vamos exemplificar.

    Para contribuir com o desenvolvimento da capacidade de compreenso

    crtica, na leitura e na escuta, as atividades escolares devem propor aos alunos

    que considerem quando, onde, para qu e para quem o texto foi produzido, ou

    seja, que, na construo da coerncia e na apreciao do texto, levem em

    conta a situacionalidade, a intencionalidade, a aceitabilidade pretendida, a

    intertextualidade. Na interpretao, procurar recompor as condies em que o

    texto foi produzido facilita e enriquece o processo de textualizao.

    Paralelamente, o desenvolvimento das habilidades envolvidas naproduo de textos falados e escritos pode ser favorecido quando se ensina os

    alunos a planejarem suas falas e escritas pblicas levando em conta os

    destinatrios de seus textos. Do que sabem e do que gostam esses

    destinatrios, que expectativa e disposio eles tm, em que situao vo ouvir

    ou ler os textos? Como ser possvel, nessas condies, realizar as intenes,

    os objetivos pretendidos? As respostas a essas questes que devero

    orientar o produtor na definio do gnero do texto, na escolha dos recursos

    lingsticos mais adequados, na determinao de elementos como tamanho,

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    ilustraes, apoios grficos ou gestuais, etc. Na auto-avaliao pelo aluno e naavaliao pelo professor, a grande questo no se a fala ou escrita tem ou

    no tem coerncia, mas sim se ela se apresenta de modo a facilitar o trabalho

    de textualizao por parte dos alocutrios, de modo a obter a aceitabilidade

    deles.

    O segundo motivo que me leva a julgar importantes para a sala de aula

    as idias aqui expostas sobre coerncia tem a ver com a construo interna

    dos textos. Na produo falada e escrita, por exemplo, para atender aos

    requisitos de funcionamento eficiente e eficaz do texto numa determinada

    situao, os alunos precisaro cuidar para que seus textos sejam considerados

    por seus ouvintes/leitores como inteiros (com comeo, meio e fim), com

    unidade temtica (sem perder o fio da meada), consistentes, articulados, no

    contraditrios (falando coisa com coisa). Assim, bom que o professor os

    oriente na seleo e no desenvolvimento dos temas, trabalhando a lgica

    interna e o encadeamento das idias, a consistncia dos argumentos, a

    verossimilhana das histrias, nos momentos de planejamento, produo, auto-

    e hetero-avaliao dos textos.

    Outra habilidade que precisa ser sistematicamente trabalhada na

    escola diz respeito escolha e utilizao dos recursos lingsticos com os

    quais se constri a coeso textual, que assunto do prximo item.

    Coeso

    A coeso diz respeito ao inter-relacionamento entre os elementos

    lingsticos do texto. Aparentemente, a coeso j vem feita no texto e o ouvinte

    ou leitor s tem que reconhec-la. Mas, de fato, no isso que ocorre: a

    coeso tambm co-construda pelos interlocutores. A lngua dispe de vriosrecursos com os quais os falantes podem indicar em seus textos as relaes

    que pensaram entre os elementos lingsticos, mas esses recursos apenas

    indicam, sinalizam, instruem. Quem de fato estabelece a relao o ouvinte ou

    leitor.

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    Vejamos como isso acontece, comeando pela chamada coesonominal, que diz respeito aos processos anafricos, aqueles com os quais se

    estabelece a cadeia dos referentes textuais 5. Dois exemplos:

    (1) Era uma vez, num pas muito distante, um rei que tinha uma filhamuito amada, que vivia triste e no sorria nunca. Um dia,

    preocupado com a menina, o rei decidiu convocar todos os seussditos e (...)

    (2) Um vez, num congresso em So Paulo, entrei em um auditriolotado e pensei ter reconhecido, de costas, um velho amigo de

    Recife. No tive dvida: cheguei por trs e lhe dei um beijo naface. Um rosto completamente estranho me olhou assustado,sorriu e retribuiu o beijo. Eu sa de fininho, como se nada de mais

    tivesse acontecido. Ainda bem que o aluno da PUC era educado eteve presena de esprito...

    Os artigos definidos so um dos recursos de coeso nominal

    disponveis na lngua portuguesa. Uma de suas funes indicar que a

    informao que introduzem considerada pelo locutor como conhecida ou

    dada no texto. O fragmento de texto (1), acima, exemplifica o uso considerado

    mais tpico: as informaes novas so marcadas com artigo indefinido (um rei,

    uma filha) e, uma vez apresentadas, quando retomadas so sinalizadas pelo

    artigo definido (a menina, o rei). A relao de retomada no vem pronta no

    texto, mas apenas sinalizada; quem a estabelece o leitor.

    No texto (2) acontece algo um pouco diferente, que torna mais fcil

    compreender que a coeso no vem pronta, mas apenas sinalizada no texto. O

    artigo definido em o aluno da PUC convida o leitor a tomar essa informao

    como dada, conhecida, embora seja a primeira vez que ela aparece no texto.

    Para entender o texto, o leitor dever considerar essa marca lingstica,

    relacion-la com os elementos anteriores congresso, em So Paulo,auditrio e inferir que o rapaz beijado por engano era aluno da PUC. A

    associao entre as expresses o aluno da PUCe um rosto completamente

    estranho no est feita no texto, foi produzida na cabea do autor e precisa

    ser estabelecida pelo leitor. Ao relacionar essas duas expresses, o leitor est

    construindo a coeso, estabelecendo a cadeia de referentes, a partir da qual

    ele produz a coerncia e entende o texto.

    5 Simplificando, pode-se definirreferente textualcomo aquilo de que se fala no texto, aquilo a que otexto se refere.

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    Outro exemplo:

    (3) Ontem fomos olhar apartamento para alugar. Eu gostei muito deum que fica no Centro, mas o condomnio muito caro.

    Como no caso anterior, a expresso ocondomniovem marcada, pelo

    artigo definido, como informao dada, embora esteja aparecendo no texto

    pela primeira vez. Para entender essa fala, o ouvinte ter que acionar seus

    conhecimentos sobre apartamento, que devem incluir elementos como ser

    em um prdio, os moradores do prdio pagam uma taxa de condomnio etc.

    e, assim, relacionar as informaes textuais, interpretando a expresso o

    condomnio como a taxa de condomnio do prdio onde fica o apartamento

    mencionado.

    O artigo definido assim como os demonstrativos e os possessivos

    so recursos que sinalizam do instruo para que o ouvinte/leitor

    considere o termo que eles introduzem como informao dada no texto e,

    ento, relacione esse termo com algum elemento textual, que pode estar

    explicitado ou no. Diferentes tipos de relao podem ser estabelecidos entre a

    expresso lingstica marcada com esses recursos e o outro elemento textual.

    Vejamos:

    No exemplo (1), no caso de um rei/o rei, tem-se a retomada de um

    conceito, indicada pela repetio da palavra (rei) marcada pelo definido (podia

    ser tambm esse rei). A seguir, em uma filha/a menina, tem-se tambm uma

    retomada de conceito, indicada pela substituio da palavra filha por outra

    que, nesse texto, pode ser equivalente a ela e vem marcada com o artigo

    definido. A equivalncia entre os dois termos resultado de uma escolha entre

    outras possibilidades que a lngua oferece e tem conseqncias na construo

    do sentido do texto: dependendo do termo com que se retomasse uma filha,poder-se-ia indicar, alm da retomada, algumas caractersticas dessa

    personagem da histria: sua classe e status social ( a princesa), sua idade (a

    princesinha, a criana, a jovem, a moa), sua aparncia fsica (a linda

    princesinha), traos de sua personalidade (a simptica menina, a infeliz

    criana, a bondosa princesinha).

    No exemplo (2), ao empregar o aluno da PUC (poderia ser tambm

    aquele aluno da PUC), o locutor do texto sinaliza aos seus alocutrios no s

    a retomada de um elemento anterior (um rosto completamente estranho), mas

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    COSTA VAL, Maria da Graa. Texto, textualidade e textualizao.IN: CECCANTINI, J.L. Tpias; PEREIRA, Rony F.; ZANCHETTA JR., Juvenal.

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    tambm a classificao desse elemento num grupo ou categoria (a categoriaaluno da PUC, que diferente da de professor da PUC, ou de estudante

    universitrio). Essa expresso tem implicaes especficas para a construo

    do sentido do texto, diferentes das que teria, por exemplo, o uso de o/aquele

    rapaz .

    No exemplo (3), entre apartamento e o condomnio no h uma

    relao de retomada de conceito, mas sim uma associao entre um conceito e

    outro, que possvel em funo do conhecimento scio-cultural partilhado

    pelos interlocutores a respeito de apartamento, como j se apontou acima. O

    termo o condomnio ancora em apartamento, como diria o Prof. Marcuschi,

    da UFPE, e no h entre os dois relao nem de retomada nem de

    equivalncia.

    Pode-se ainda, marcando uma expresso como informao dada (com

    artigo definido, ou demonstrativo, ou possessivo), indicar que ela deve ser

    conectada a outro elemento do texto, no porque retoma esse elemento, mas

    porque pode ter com ele uma relao metonmica (relao entre a parte e o

    todo, entre o autor e a obra, entre o contedo e o continente, etc.), como em

    (4) No pude sair de bicicleta porque o pneu traseiro estava vazio.

    Ou uma relao hiponmica, em que a segunda expresso representa

    um elemento do conjunto representado pelo termo anterior, como em (5), ou o

    inverso, isto , uma relao hiperonmica, como em (6):

    (5) Meu filho adorava ir de bicicleta para o colgio e tinha o maiororgulho do seu veculo.

    (6) Na pressa de recolher seus instrumentos para ir embora, omarceneiro acabou esquecendo aqui o martelo e a trena.

    possvel tambm uma relao metafrica, como em

    (7) Eu detesto minha vizinha do terceiro andar. Voc acredita queaquela bruxa ontem teve o desplante de dizer que eu estougorda?!...

    Esses exemplos do uma idia das possibilidades de explorao da

    noo de coeso nominal em sala de aula. O emprego do artigo definido, dos

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    demonstrativos e dos possessivos pode ser bastante econmico e expressivo,quando conjugado com o trabalho relativo escolha do vocabulrio. Com

    esses recursos que os interlocutores constroem a cadeia de referentes do

    textos (a cadeia dos elementos de que se fala no texto), que fundamental

    para tecer o fio da meada, a unidade temtica: o locutor sugere e o alocutrio

    percebe relaes metonmicas, metafricas, hiponmicas, hiperonmicas, de

    substituio, de associao, de incluso numa determinada categoria. Na aula

    de Portugus, levar o aluno a atentar para essas relaes, na leitura, contribui

    para a construo e a ampliao da compreenso; na escrita, favorece a

    produo de textos mais elegantes, mais expressivos, mais interessantes.

    Partilhando com os artigos definidos, os demonstrativos e os

    possessivos a funo de sinalizar que devem ser conectados a um elemento

    anterior do texto, os pronomes pessoais (retos e oblquos) tambm so

    recursos lingsticos importantes para a construo da cadeia de referentes

    textuais. A diferena que, com os pronomes pessoais, no se podem sugerir

    relaes de classificao ou categorizao, nem de metonmia, nem de

    metfora entre os dois termos, como se viu nos exemplos de (1) a (7).

    Tradicionalmente, as gramticas apontam como corretos apenas os

    casos em que o pronome concorda em gnero e nmero com o seu

    antecedente; no entanto, no esse o nico uso que se verifica nas prticas

    linguageiras sociais. Em (8) temos o caso mais tradicional:

    (8) Meu sobrinho de cinco anos est cada dia mais esperto eengraado. Outro dia ele me pediu um presente de Dia dasCrianas rpido e sem burocracia!!!

    J em (9) e (10) temos exemplos usuais, embora no cannicos:

    (9) No primeiro dia de aula, ela perguntou o nome de todo mundo,conversou, foi muito simptica, mas j passou tarefa para casa.

    (10) Tenho a maior gratido a essa equipe mdica, porque elessalvaram a vida do meu pai.

    Um exemplo como (9) pode ocorrer numa conversa cotidiana em que o

    tema seja escola e o pronome ela seja usado pelo locutor mesmo sem que

    antes ele tenha se referido a professora. As informaes precedentes permitem

    ao alocutrio inferir que ela s pode ser a professora. O importante que o

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    ouvinte realiza com rapidez e facilidade essa operao de inferncia, em geralsem se dar conta disso e sem reclamar que o texto est incompleto. Exemplos

    como esse so bem mais freqentes no dia a dia do que a gente imagina.

    Do mesmo modo, no caso (10) o ouvinte instrudo a realizar uma

    operao mental que ultrapassa as formas lingsticas: conectar o pronome

    eles, masculino e plural, com essa equipe mdica, expresso substantiva no

    feminino singular, priorizando outros conhecimentos, como o de que uma

    equipe formada por vrias pessoas, entre as quais pode haver homens e

    mulheres. Esse tipo de uso tambm muito comum no nosso cotidiano.

    Os exemplos apresentados at aqui tiveram dois objetivos. O primeiro

    foi mostrar que a coeso no uma caracterstica que vem pronta no texto,

    mas um princpio de textualizao que as pessoas aplicam aos textos que

    falam, ouvem, escrevem e lem com o intuito de atribuir sentido seqncia de

    palavras e frases com que deparam. O segundo objetivo foi apresentar como

    vlidos, e freqentes em prticas linguageiras cotidianas e descontradas,

    alguns usos que a gramtica escolar tradicional condena. Esse ponto

    importante para a reflexo lingstica em sala de aula: a coeso textual pode-

    se valer de diferentes recursos e de diferentes usos desses recursos; a escolha

    adequada vai depender de para quem e para qu se fala ou escreve, em que

    tipo de situao.

    H ainda outros recursos coesivos, cuja funo sinalizar a chamada

    coeso seqencial, que consiste no estabelecimento de conexo e inter-

    relao entre partes do texto atravs de conectivos, advrbios, verbos. Alguns

    estudiosos, como Bronckart (1999) e Schneuwly (1988), chamam esses

    processos de conexo (sinalizada pelos organizadores textuais) e de

    coeso verbal (sinalizada pelos tempos, modos e aspectos verbais).

    Comecemos pela conexo. Entre os organizadores textuais ouarticuladores esto as conjunes e locues conjuntivas, os advrbios e

    locues adverbiais, alm de vrias expresses que se podem usar para

    sinalizar inter-relaes entre informaes textuais (por exemplo, em resumo,

    concluindo, por um lado/por outro lado, ainda, tambm, em outras palavras, ou

    seja). Os organizadores textuais podem sinalizar inter-relaes tanto entre

    oraes de um perodo, como entre frases de uma seqncia ou pargrafo,

    como tambm entre partes do texto. Por exemplo, numa histria, costuma-se

    sinalizar o incio do enredo, da complicao, com articuladores como um dia

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    ver exemplo (1); num texto expositivo, pode-se indicar o incio da concluso oufechamento com organizadores do tipo resumindo, a idia central que.

    Destaquemos o articulador mas, que aparece nos exemplos (3) e (9).

    Esse operador lingstico desencadeia uma srie de operaes interpretativas

    que no esto dadas no texto; so relaes que foram pensadas pelo locutor

    e devem ser tambm estabelecidas pelo alocutrio. Pelo conhecimento

    lingstico, sabemos que esse operador sinaliza relao de oposio entre a

    informao que introduz e a(s) anterior(es). Deparando com ele, o interlocutor

    tem que selecionar no texto informaes que podem se opor e interpretar por

    que e como se opem. No caso do exemplo (3), no vem da realidade, nem

    da lgica a oposio entre gostar de um apartamento no Centro e esse

    apartamento ter uma taxa alta de condomnio. Pode -se at imaginar o

    contrrio: se o Centro for uma regio valorizada na cidade dos parceiros desta

    conversao, ser espervel que a taxa de condomnio seja alta; se o falante

    for uma pessoa rica e esnobe, uma taxa de condomnio alta poder at ser

    considerada qualidade, j que seleciona pelo poder aquisitivo os moradores

    do prdio. Assim, ao estabelecer oposio entre essas duas informaes, o

    alocutrio compreende tambm, por inferncia, que o locutor ou no tem

    dinheiro sobrando, ou uma pessoa econmica... Outra inferncia, sinalizada

    e autorizada pelo operador mas mas no explicitada no texto quanto

    orientao argumentativa dessa fala, que aponta para uma concluso do tipo:

    por isso no vou poder alug-lo ou por isso desisti de alug-lo. Processo

    semelhante pode ser desencadeado na interpretao do exemplo (9), em que

    cabe ao ouvinte ou leitor inferir a oposio entre ser muito simptica e passar

    tarefa para casa no primeiro dia de aula.

    As operaes interpretativas indicadas nesses dez exemplos, criadoras

    de coeso nominal ou de coeso seqencial, so feitas com tanta rapidez efacilidade que os usurios da lngua nem se do conta do processo complicado

    que efetuam para relacionar as expresses lingsticas e, da, entender os

    textos que ouvem e lem. Mas esse processamento interior que explica a

    possibilidade de diferentes interpretaes para um mesmo texto.

    Quanto coeso verbal, vou apenas tentar mostrar como os tempos,

    modos e aspectos verbais tm funo importante na construo de diferentes

    tipos textuais, que compem diferentes gneros de textos.

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    As narrativas geralmente se constroem com os verbos no pretrito,situando-se os acontecimentos narrados como anteriores ao momento da

    enunciao, isto , ao momento da interao verbal em que o texto acontece.

    Elementos importantes para o sentido desse tipo de texto podem ser

    sinalizados pelo uso de tempos verbais que apontam para momentos diversos

    do eixo temporal criado na narrativa, pelo contraste entre os aspectos perfeito e

    imperfeito, ou pelo jogo entre tempos simples e compostos, como se v no

    exemplo (11) a seguir. O autor SG, aluno da 3 srie do Ensino Fundamental

    de uma escola da rede particular de Belo Horizonte, e o texto foi redigido em

    casa, para ser lido em sala de aula para os colegas, com o objetivo de lhes

    contar alguma coisa que desconhecessem, sobre um brinquedo, um bichinho

    de estimao, uma coleo de objetos, etc.

    (11) Meus Animais

    Ns tnhamos uma empregada chamada Maria Jos quetinha uma criao de coelhos em sua casa.

    Um dia perguntei a ela se podia me dar um coelho e ela me

    trouxe esse coelho no dia seguinte.

    Depois de um bom tempo ele fugiu e pedi outro, outro,outro, outro, outro, outro, etc.

    At que chegou um especial: em vez de branco, com nomeP Sujo, marrom, com nome Bombril. Ele era mais legal e maismanso que os outros.

    Um dia voltei da escola e vi que estava sumido. Tinhafugido.

    Mas uma amiga do meu pai me deu um cachorrinho

    pequeno e gordinho e lhe dei o nome Bolinha. Estou com ele athoje.

    Respeitando a instruo de escrever algo que os colegas no

    conhecessem, o aluno autor decide comear do comeo seu relato e sinaliza

    essa deciso pelo uso do pretrito imperfeito, que, tradicionalmente, indica, nas

    narrativas, o cenrio, a situao e as caractersticas dos personagens na fase

    inicial: ns tnhamos uma empregada que tinha (...). O imperfeito vai aparecer

    novamente no texto quando preciso caracterizar um novo personagem, o

    coelho Bombril (ele era mais legal).

    A partir do articulador um dia, que marca o incio da fase central do

    relato, o locutor, com o uso do pretrito perfeito, instrui seu leitor/ouvinte no

    sentido de considerar os episdios seguintes como os de primeiro plano no

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    caso que est contando (perguntei, trouxe, fugiu, pedi, chegou, voltei,vi). Subordinado a perguntei, aparece o nico verbo dessa seqncia que

    no est no pretrito perfeito (podia me trazer). A, a forma coloquial do futuro

    do pretrito, no verbo auxiliar, sinaliza a situao da ao no eixo temporal:

    perguntei se ela poderia trazer o coelho num dia posterior ao dia em que foi

    feita a pergunta.

    O mesmo marcador temporal um dia sinaliza nova mudana de fase

    no relato: a fuga do coelho Bombril caracterizada como episdio dramtico

    que interrompe a seqncia feliz de perder um coelho e imediatamente ga nhar

    outro para substitu-lo. A ruptura sinalizada tambm por alteraes no

    emprego das formas verbais. Em voltei e vi, o pretrito perfeito simples, na

    voz ativa, indica aes pontuais, num determinado momento do eixo temporal:

    o momento em que o narrador chegou da escola. Com relao a esse

    momento, uma construo passiva, com o auxiliar no imperfeito estava

    sumido indica um estado de coisas no pontual, nem imediato, mas j de

    alguma durao. A seguir, o pretrito mais-que-perfeito composto tinha

    fugido sinaliza um fato pontual acontecido num momento anterior ao da

    chegada do narrador.

    No final do texto, o articulador mas e o retorno do pretrito perfeito

    (deu, dei) vm indicar a reverso da tragdia. A, com o uso do presente , o

    locutor sinaliza o encerramento da narrativa, assegurando que o final feliz

    perdura at o momento da enunciao, at o momento da produo do relato

    (estou com ele at hoje).

    Este texto revela a habilidade do aluno autor no emprego das formas

    verbais na construo de um relato que corresponde aos moldes mais usuais,

    mais cannicos. No entanto, a observao e a reflexo sobre diferentes

    possibilidades de correlao entre tempos, modos e aspectos verbais, emnarrativas de autores consagrados, pode contribuir para ampliar essa

    habilidade. Vejamos, por exemplo, o efeito de sentido suscitado pelo jogo entre

    pretrito e presente no incio de um conto infantil de Cora Rnai, intitulado

    Sapomorfose (ou o prncipe que coaxava).

    (12) Era uma vez um sapo num dia de outono.Um sapo que acordou cedo, bem satisfeito com a sua

    vidinha, e com o tempo bonito que estava fazendo.

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    Mergulhou no brejo, nadou, pulou e coaxou feliz; e ficoucom muita fome.

    E comeu cinco moscas comuns, vrios mosquitos, umaliblula descuidada e uma mosca azul linda, linda daquelas quebrilham no sol, paradas no ar.

    E ficou cansado e sem assunto. Depois de encher a pana,o que que um sapo pode fazer, alm de cochilar enquantoespera a hora de encher a pana novamente?

    Foi o que ele fez: dormiu contente num canto escuro,escondidinho por umas folhagens roxas.

    A intromisso do presente (trechos sublinhados) no meio de uma srie

    de verbos no pretrito imperfeito (era, estava fazendo) e no pretrito perfeito(acordou, mergulhou, nadou, pulou, coaxou, ficou, comeu, ficou,

    fez, dormiu) quebra o fluxo da narrativa e introduz a voz do narrador

    comentando a histria, como se puxasse conversa com o leitor. Com essa

    manobra, o narrador aproxima o mundo do faz-de-conta da histria ao mundo

    real que conhecido por ele e pelo leitor (o mundo em que h moscas azuis

    que brilham no ar e em que os sapos costumam dividir seu tempo entre comer

    e dormir), e pode, com isso, tornar sua histria mais verossimilhante e

    envolvente.

    Apenas a ttulo de exemplificao, vejamos com que complexidade se

    correlacionam tempos, modos e aspectos verbais no fragmento a seguir, de um

    conto de Rachel de Queiroz, sinalizando a situao dos fatos em diferentes

    momentos do eixo temporal, convidando o leitor a atribuir a eles diferentes

    duraes e lhe propondo interpret-los ora como acontecidos, ora como

    imaginados ou desejados:

    (13) No pudera acenar uma resposta porque s vira o bilhete aoabrir a revista, depois que o blimp se afas tou. E estimou que

    assim o fosse: sentia-se tremendamente assustada e tmida anteaquela primeira aproximao com o seu aeronauta. Hoje veria seele era alto e belo, louro ou moreno. Pensou em se esconder por

    trs das colunas do porto, para o ver chegar e no lhe falarnada. Ou talvez tivesse coragem maior e desse a ele a sua mo;

    juntos caminhariam at a base, depois danariam um fox

    langoroso, ele lhe faria ao ouvido declaraes de amor em ingls,encostando a face queimada de sol ao seu cabelo. No pensou seo pessoal de casa lhe deixaria aceitar o convite. Tudo se ia

    passando como num sonho e como num sonho se resolveria,sem lutas nem empecilhos.

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    Outros tipos de texto a exposio, a argumentao, a descrio, ainjuno costumam organizar seu eixo temporal em torno do presente e

    sinalizar relaes significativas importantes pela correlao entre os modos

    verbais, por recursos de modalizao como os verbos modais, pelo emprego

    de determinadas classes lxico-semnticas de verbos (verbos de estado, de

    atividade, de realizao, de acabamento, segundo Bronckart, 1999, p. 279).

    Nos textos de tipo injuntivo, como as receitas, as instrues de uso de

    aparelhos e instrumentos, as regras de jogos, por exemplo, diferentes efeitos

    de sentido podem ser suscitados pelo emprego do modo imperativo, ou de

    verbos modais como dever ou ter de/que, ou do infinitivo, ou do futuro do

    presente, que se aliam com diferentes possibilidades de indeterminao do

    sujeito (o coloquial voc de valor impessoal; o verbo na terceira do singular

    com a partcula se, mais formal; o infinitivo sem sujeito expresso). Vejam-se

    alguns exemplos.

    (14) Dissolva os ingredientes em meio litro de leite frio. Coloque tudono fogo e mexa at iniciar a fervura. Abaixe o fogo e deixecozinhar por 10 minutos, mexendo de vez em quando.

    (15) Dissolver os ingredientes em meio litro de leite frio. Colocar tudono fogo e mexer at iniciar a fervura. Abaixar o fogo e deixarcozinhar por 10 minutos, mexendo de vez em quando.

    (16) Dissolvem-se os ingredientes em meio litro de leite frio. Coloca-setudo no fogo e mexe-se at iniciar a fervura. Abaixa-se o fogo edeixa-se cozinhar por 10 minutos, mexendo de vez em quando.

    (17) Para fazer esse doce, voc tem que dissolver os ingredientes emmeio litro de leite frio, depois colocar tudo no fogo e mexer atiniciar a fervura. Da, voc tem que abaixar o fogo e deixarcozinhar por 10 minutos, mexendo de vez em quando.

    (18) Para fazer esse doce, voc dissolve os ingredientes em meio litrode leite frio, depois coloca tudo no fogo e mexe at iniciar afervura. Da, voc abaixa o fogo e deixa cozinhar por 10 minutos,

    mexendo de vez em quando.

    (19) Dissolvers os ingredientes em meio litro de leite frio. Colocarstudo no fogo e mexers at iniciar a fervura. Abaixars o fogo e

    deixars cozinhar por 10 minutos, mexendo de vez em quando.

    Comparando-se essas variaes intencionais de uma receita culinria,

    fcil perceber a diversidade de efeitos resultantes da opo por diferentes

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    maneiras de expressar o modo imperativo. Os casos (17) e (18) ganham umtom coloquial, ao passo que o (19) chega a ficar cmico, em razo do grau

    excessivo de formalidade que costumamos atribuir ao uso do futuro do

    presente, tempo que aparece, por exemplo, na formulao dos Dez

    Mandamentos.

    Com essa brincadeira e os demais exemplos, espero ter demonstrado

    como pode ser positivo focalizar em sala de aula o funcionamento dos verbos

    na co-construo da coeso textual, bem mais til e divertido do que impor aos

    alunos que decorem os paradigmas regulares e irregulares de conjugao. A

    reflexo sistemtica sobre o poder coesivo e expressivo do sistema verbal, na

    leitura e na escrita de gneros diversos, pode representar uma contribuio

    decisiva para o desenvolvimento das habilidades de textualizao dos alunos.

    CONCLUSO

    Num artigo rpido como este, no seria possvel abordar com

    profundidade todos os princpios de textualizao, nem ao menos tratar do

    amplo leque de recursos coesivos disponveis na lngua, explorando

    adequadamente suas possibilidades de uso nas prticas linguageiras sociais e

    de aplicao na aula de Portugus. Procurei, ento, centralizar minha

    exposio em algumas poucas idias bsicas, que retomo aqui, para finalizar.

    As produes lingsticas efetivas so textualizadas pelos

    interlocutores envolvidos num processo de interao verbal; seu sentido e sua

    adequao so mentalmente co-construdos pelos interlocutores, que levam

    em conta seus objetivos e expectativas, os conhecimentos, crenas e valores

    que partilham, as circunstncias fsicas em que as produes ocorrem. Sendoassim, em si mesmas, por si mesmas, isoladas de seu contexto de uso, as

    produes lingsticas no tm nem deixam de ter sentido, no so boas nem

    ms, nem certas nem erradas. No processo de textualizao, um mesmo texto

    pode ser considerado incompreensvel e imprprio por determinados

    interlocutores, em determinada situao, e ser considerado plenamente

    inteligvel e adequado por outros interlocutores, noutra situao.

    Essa concepo pode trazer como conseqncia para o ensino de

    Lngua Portuguesa,

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    Pedagogia Cidad: cadernos de formao: Lngua Portuguesa. v. 1.So Paulo: UNESP, Pr-Reitoria de Graduao, 2004. p. 113-128.

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    a) por um lado, flexibilizao com relao a frmas e modelos textuaise imposio de regras lingsticas prvias, pretensamente

    universais e absolutas;

    b) por outro lado, ateno e acuidade no trabalho com os textos orais

    e escritos interpretados ou produzidos pelos alunos, porque a

    escolha, a reflexo e a avaliao relativas aos recursos lingsticos

    devero levar em conta as circunstncias dos processos de

    produo e interpretao, os conhecimentos e disposies dos

    interlocutores.

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    ATIVIDADE DE APLICAO

    Prepare uma atividade para realizar com seus alunos em sala de aula,

    relativa s posssibilidades de TEXTUALIZAO do texto transcrito abaixo.

    Trata-se de uma carta dirigida ao apresentador de televiso Gugu Liberato.

    Comece por convid-los a refletir sobre a intencionalidade, a

    aceitabilidade e a situacionalidade desse texto, orientando-os a levantar

    hipteses consistentes quanto

    1. Ao locutor:

    a) quais seriam seus conhecimentos lingsticos e textuais;b) quais seriam seus objetivos e suas expectativas ao redigir

    esta carta;c) qual seria a sua compreenso da situao de interlocuo.

    2. Ao alocutrio:a) quais seriam seus conhecimentos lingsticos e textuais;b) qual seria sua expectativa e disponibilidade quanto s

    cartas que recebe;c) qual seria a sua compreenso da situao de interlocuo.

    A partir dessa reconstituio das condies de produo e leitura da

    carta, discuta com seus alunos as possibilidades de TEXTUA LIZA O dessacarta pelo destinatrio. Para isso, examine com eles o grau de adequao

    desse texto, apontando seus pontos positivos e suas falhas com relao

    construo, pelo leitor previsto, da:

    informatividade; intertextualidade; coerncia; coeso;

    dando nfase especial co ern ci a e co eso.

    Proponha a seus alunos a reescrita desse texto, de acordo com a

    anlise feita.

    Estabelea com eles orientaes para essa reescrita e defina com eles

    estratgias de encaminhamento e discusso da atividade (que etapas do

    trabalho sero realizadas individualmente, em duplas, em grupo, ou

    coletivamente?) bem como critrios de avaliao e auto-avaliao.

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    Cuqu Boa tarde

    Estou com muita dificuldade: minha me

    pensionista e eu no posso realisar o meu qrande sonho.

    Eu vi o celugio Prastico na televiso, conversando

    com voc, mais a minha contises finaneira no dar.No posso trabalhar, porque eu ajudo minha me,

    que ela doente, e de idade.

    Eu sei que vo muito humano e muito bacana,

    mesmo que eu pdese trabalhar era muito difcil, porque

    pessoa, passando dos 38 anos, considerada velha.

    Por favor, mm ajuda a realisar o meu sonho,

    qostaria, de consequr uma operao;. no abidomin e nabarriga e no rosto.

    Obs. Agradeo sua colaborao, que Deus de ajuda,

    que voc continua humano e abenado por Deus.

    Muito obriqado de sua Adimiradora

    Obs. Se caso eu consequr a realisar o meu sonho, eu

    gostaria de levar uma pessoa comingo. Porque no

    conheo So Paulo.

    Marilia da Silva

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    Pedagogia Cidad: cadernos de formao: Lngua Portuguesa. v. 1.So Paulo: UNESP, Pr-Reitoria de Graduao, 2004. p. 113-128.

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    BEAUGRANDE, R.-A. de & DRESSLER, W. U. Introduction to Text Linguistics.London, Longman, 1981.

    BEAUGRANDE, Robert de. New foundations for a science of text and discourse:cognition, communication and freedom of access to k nowledge and society.Norwood, New Jersey: Ablex Publishing Corporation, 1997.

    BENTES, Anna Christina. Lingstica Textual. In. BENTES, Anna Christina &MUSSALIN, Fernanda. Introduo lingstica: domnios e fronteiras. SoPaulo: Cortez, 2001. Cap. 7, p. 245-282.

    BRONCKART, Jean Paul. Atividade de linguagem, textos e discursos: por uminteracionismo sociodiscursivo. So Paulo: EDUC, 1999.

    CHAROLLES, Michel. Introduo aos problemas da coerncia dos textos. In:GALVES, C. et al. (org.) O texto: escrita e leitura. Campinas: Pontes, 1988.

    COSTA VAL, M. Graa. Redao e textualidade. So Paulo: Martins Fontes, 1991.

    ___. Repensando a textualidade. In: AZEREDO, Jos Carlos (org.). LnguaPortuguesa em Debate: conhecimento e ensino. Petrpolis: Vozes, 2000. p.34-51.

    ___. O desenvolvimento do conhecimento lingstico-discursivo: o que se aprendequando se aprende a escrever? Veredas Revista de Estudos Lingsticos.Juiz de Fora: Editora da UFJF, v. 5, n. 1, jan./jul. 2001. p. 83-104.

    ___. A gramtica do texto, no texto. Revista de Estudos da Linguagem. BeloHorizonte: Faculdade de Letras da UFMG, v.10, n.2, jul./dez. 2002. p. 107-134.

    ___ e BARROS, L. Fernanda P. Receitas e regras de jogo: a construo de textosinjuntivos por crianas em fase de alfabetizao. In: COSTA VAL, M. G. eROCHA, Gladys. Reflexes sobre prticas escolares de produo de textos:o sujeito autor. Belo Horizonte: CEALE/FAE/UFMG e Autntica, 2003. p.135-165.

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    RNAI, Cora. Sapomorfose (ou o prncipe que coaxava). Rio de Janeiro:Salamandra, 1981.

    SANTOS, Andra Cattermol I. Os processos fricos (anafricos e metafricos) naconstruo da rede de referentes textuais . Belo Horizonte: Programa de Ps-Graduao em Estudos Lingsticos, 2003 (dissertao de mestrado).

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