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1 Seminário de Biopatologia Glomerulonefrites Leccionada por: Prof. Clara Sambade Desgravada por: Pedro Carvalho e Petra Gouveia 2006-12-06 O seminário está organizado da seguinte forma: Comic Sans MS – o seminário propriamente dito (questões) Times New Roman – a resolução do seminário Em caixas de texto foram introduzidas as noções teóricas que a Professora referiu durante a aula - Quais são os 4 componentes morfológicos básicos do rim? Glomérulos, túbulos, interstício e vasos sanguíneos. As lesões podem ser agrupadas de acordo com as suas associações mais frequentes: - glomérulos + vasos sanguíneos - túbulos + interstício Mas não é possível limitar a patologia nestes dois grupos pois, por exemplo: lesões nos glomérulos vão reflectir-se nos túbulos e originar patologia tubulo-intersticial túbulos e interstício podem sofrer na sequência de doença vascular ou, por outro lado, patologia tubulo-intersticial pode originar lesões vasculares Perante qualquer imagem glomerular devemos ser capazes de identificar as seguintes estruturas (que se dispõem sempre pela mesma ordem): - Espaço de filtração - Podóciotos - Membrana Basal - Célula endotelial - Lúmen capilar Em alguns casos logo após a célula endotelial temos matriz ou célula mesangial em substituição da membrana basal.

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Seminário de Biopatologia

Glomerulonefrites

Leccionada por: Prof. Clara Sambade Desgravada por: Pedro Carvalho e Petra Gouveia 2006-12-06

O seminário está organizado da seguinte forma: • Comic Sans MS – o seminário propriamente dito (questões) • Times New Roman – a resolução do seminário • Em caixas de texto foram introduzidas as noções teóricas que a Professora referiu durante a

aula - Quais são os 4 componentes morfológicos básicos do rim?

Glomérulos, túbulos, interstício e vasos sanguíneos.

As lesões podem ser agrupadas de acordo com as suas associações mais frequentes:

- glomérulos + vasos sanguíneos

- túbulos + interstício

Mas não é possível limitar a patologia nestes dois grupos pois, por exemplo:

� lesões nos glomérulos vão reflectir-se nos túbulos e originar patologia tubulo-intersticial

� túbulos e interstício podem sofrer na sequência de doença vascular

� ou, por outro lado, patologia tubulo-intersticial pode originar lesões vasculares

Perante qualquer imagem glomerular devemos ser capazes de identificar as seguintes

estruturas (que se dispõem sempre pela mesma ordem):

- Espaço de filtração

- Podóciotos

- Membrana Basal

- Célula endotelial

- Lúmen capilar

Em alguns casos logo após a célula endotelial temos matriz ou célula mesangial em

substituição da membrana basal.

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- Nas figuras 1, 2 e 3 indique o nome das estruturas apontadas.

Figura 1 Figura 2 Figura 3

A – cápsula de Bowman

(folheto parietal)

A – célula endotelial A – membrana basal

B – espaço de Bowman/

espaço de filtração

B – espaço de Bowman

(pedicelo também era aceite)

B – pedicelos (prolongamentos dos

podócitos)

C – podócito (célula do folheto

visceral da cásula de Bowman)

C – membrana basal C – célula endotelial

D – ansa capilar D – matriz

E – célula endotelial E – célula mesangial

F – célula mesangial

G – membrana basal

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As manifestações clínicas das doenças glomerulares têm várias designações:

1. - Síndrome Nefrítico Agudo

2. - Síndrome Nefrótico

3. - Glomerulonefrite rapidamente progressiva

4. - Insuficiência Renal Aguda

5. - Hematúria ou Proteinúria assimptomática

Glomerulonefrites

Primárias Secundárias

Glomerulonefrite proliferativa difusa Lupus Sistémico Eritematoso

Glomerulonefrite crescêntica Diabetes Mellitus

Glomerulonefrite membranosa Amiloidose

Glomerulosclerose focal e segmentar Síndrome de Goodpasture

Glomerulonefrite membranoproliferativa Pararterite nodosa

Glomerulonefrite crónica Granulomatose de Wegener

Glomerulopatia de lesões mínimas (Nefrose

Lipóide)

Púrpura Henoch-Schönlein

Nefropatia por IgA Endocardite bacteriana

A glomerulonefrite é idiopática. A glomerulonefrite é a manifestação

O doente não apresenta doença sistémica de doença sistémica

A designação das glomerulonefrites é a mesma independentemente se são primárias ou

secundárias. Uma doença (p.e. Lupus) não origina apenas um tipo de glomerulonefrite, pode dar

origem a vários.

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Caso 1

Homem de 19 anos de idade apresenta: Pirexia (38,4 ºC); Edema peri-orbitário;

Oligúria; Hipertensão ligeira; Hematúria; e Proteinúria ligeira (1,1 g/dia).

Os sinais e sintomas tiveram início súbito. Duas semanas antes, o doente teve uma

infecção respiratória, que foi tratada com antibiótico.

- Observe e descreva as figuras 1A, 1B, 1C, 1D e 1E.

• Nas figuras 1A, 1B: Hipercelularidade (infiltrado inflamatório – polimorfonucleares;

proliferação de células endoteliais e mesangiais). Obliteração de ansas capilares.

• Na figura 1C: está um neutrófilo no lúmen do vaso. Vêem depósitos de

imunocomplexos na membrana basal.

• Na figura 1D: depósito de imunocomplexos em localização sub-epitelial � depósitos

em dorso de camelo (“humps”) � surgem normalmente em glomerulonefrites pós-

infecciosas (geralmente estreptocócicas).

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- Como designa a síndrome apresentada

por este doente?

Síndrome nefrítico agudo.

- Qual é o diagnóstico?

Glomerulonefrite proliferativa aguda

difusa pós-estreptocócica.

- Qual a evolução clínica mais provável e qual a menos provável?

Mais provável: recuperação imediata e total

Menos provável: lesões residuais (glomerulonefrite focal e segmentar)

glomerulonefrite progressiva rápida (� insuficiência renal)

glomerulonefrite crónica

Caso 2

Criança de 4 anos de idade, do género feminino, internada com: Edema generalizado;

Proteinúria marcada (3,8 g/dia); Hipoalbuminemia; Hiperlipidemia; e Lipidúria.

Seis dias antes do internamento, a criança teve uma infecção respiratória ligeira,

com duração de 3 dias. - Observe e descreva as figuras 2A, e 2B.

• Figura 2A: glomérulo de aparência normal.

• Figura 2B: achatamento, retracção e hipertrofia dos pedicelos – típico da doença

das lesões mínimas.

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- Como designa a síndrome que este doente apresenta?

Síndrome nefrótico (1 - Proteinúria massiça, 2 - hipoalbuminuremia, 3 - Edema

generalizado – anasarca, 4 - hiperlipidemia e lipidúria)

- O que esperava observar no exame de imunofluorescência?

Nada (ausência de depósitos de imunoglobulinas ou componentes do S. Complemento).

- Qual é o seu diagnóstico?

Doença das lesões mínimas (nefrose lipóide é um termo mais antigo a evitar). É a

causa mais comum de doença glomerular na criança.

- Qual é o prognóstico mais provável?

Recuperação total (com terapêutica: corticosteróides).

Caso 3

Homem de 27 anos de idade apresenta episódios recidivantes de hematúria

macroscópica e proteinúria ligeira, de início súbito e com duração de 6 dias. Exame

físico: sem alterações. Sinais vitais: normais.

- Observe e descreva a figura 3A.

• Proliferação de células mesangiais.

• Espessamento da matriz extracelular.

- Qual é o diagnóstico (morfológico)?

Glomerulonefrite membranoproliferativa

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- Em que doenças pode ocorrer esta glomerulonefrite?

Glomerulonefrite membranoproliferativa

Primária Secundária

Tipo I Tipo II Tipo I

SLE (+ frequente)

Infecção por VHB

Endocardite

Neoplasias malignas

Depósitos de

imunocomplexos

Doença dos depósitos

densos

A membrana basal

está muito densa Outras

É sempre uma doença primária renal isolada!

- Observe agora a figura 3B e faça o

diagnóstico.

Nefropatia por IgA (Doença de Berger).

- O que esperava encontrar no exame de

microscopia electrónica?

Que lesões glomerulares podem ainda ser observadas nesta doença?

• Glomerulonefrite proliferativa focal (a reparação desta lesão pode resultar em

glomerulosclerose focal segmentar)

• Glomerulonefrite crescêntica (muito raro)

• Mas os glomérulos podem parecer normais

Depósitos electrondensos no mesângio.

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Caso 4

Uma senhora de 68 anos de idade é internada por síndrome nefrótica e insuficiência

renal rapidamente progressiva (creatinina 83 µm/l 6 meses antes, 480 µm/l na

admissão). Antecedentes: carcinoma da mama (diagnosticado 7 anos antes), com

metástases ósseas. Fez tratamento com pamidronato 2 meses antes do

internamento actual. Esteve também medicada com omeprazole. Observe as figuras

4A, 4B, e 4C.

- Espessamento da M. basal. - Atingimento heterogéneo do glomérulo.

- Material hialino a +. - Podócitos a +, com adesão à cápsula.

- Presença de linfócitos e monócitos

Atingimento heterogéneo do glomérulo.

Coloração pela prata. (Imagem pouco importante)

Fig 4B: Glomérulo pobre em ansas.

Porção com aspecto normal

Excesso de material amorfo - glomerulosclerose

Fig 4C: Colapso das ansas capilares.

Aspecto final de muitas doenças glomerulares: glomeruloesclerose

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- Qual é o diagnóstico?

Glomerulosclerose focal e segmentar (atinge algumas porções de alguns glomérulos)

- O que espera observar nos exames de microscopia electrónica e de

imunofluorescência?

1. ME: perda e fusão dos podócitos (sinal de agressão epitelial)

2. Imunoflourescência: depósitos de IgM e C3.

- Qual é a etiologia provável?

Secundária ao pamidronato (neste caso) – é muito raro esta doença ter origem em

fármacos!

Situações em que a glomerulosclerose aparece mais frequentemente:

1. Associada a infecção por HIV, dependência de heroína, anemia falciforme e

obesidade mórbida.

2. Como consequência da cicatrização dos glomérulos (ex.: Nefropatia por IgA)

3. Resposta adaptativa por perda de tecido renal (ex.: ablação renal)

4. Formas hereditárias de síndrome nefrótico (mutação de genes codificadores

das proteínas do diafragma podocitário – nefrina, podocinα, α-actinina 4)

5. Idiopática

- Qual é a evolução mais provável?

Insuficiência renal terminal (neste caso).

É mais comum o desenvolvimento de insuficiência renal mas não de forma tão abrupta.

Geralmente são necessários 10-20 anos até ao doente necessitar de diálise ou transplante. (Após

o transplante o risco de recidiva é grande uma vez que os mecanismos que levaram à lesão

continuam presentes)

Secundária

Primária

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Caso 5

Homem de 75 anos de idade é internado por insuficiência renal aguda (IRA):

18 dias antes do internamento No dia do internamento Dia 4 Dia

9

Azoto ureico

(mg/dl)

26

valores normais

71 105 119

Creatinina (mg/dl) 1,1 5,3 13 14,1

No exame físico, os sinais vitais eram normais. Não se observaram sinais de

desidratação (o que exclui IRA de causa pré-renal). Os exames imagiológicos

permitiram afastar IRA de causa pós-renal.

• Causa pré-renal (ex): choque, aporte sanguíneo insuficiente...

• Causa pós-renal (ex): cálculos renais � insuficiência renal de causa obstrutiva

- Concluiu-se que a causa de IRA se devia a doença renal intrínseca, que pode ser

dividida em 4 componentes. Quais são?

Vascular, tubular, glomerular e intersticial. Qualquer doença que atinja um ou mais

destes componentes pode originar insuficiência renal aguda (ex.: glomerulonefrites, necrose

tubular aguda, nefropatias agudas por fármacos / anestésicos, vasculites).

O doente foi submetido a uma biopsia renal.

- Observe e descreva as figuras seguintes (Fig. 5A e 5B).

Glomerulonefrite

crescêntica

Espessamento da matriz

Proliferação de células mesangiais

Glomerulonefrite membranoproliferativa

Presença de células inflamatórias

(neutrófilos)

Crescentes

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- Qual é o diagnóstico?

Glomerulonefrite membranoproliferativa + Glomerulonefrite crescêntica

- Em que doenças pode observar este tipo de glomerulonefrite?

Glomerulonefrite crescêntica

Tipo I (anti-membrana basal) Tipo II (imunocomplexos) Tipo III (Pauci-Imune)

Idiopática Idiopática Idiopática

Síndrome de Goodpasture Infecciosa Associada a ANCAS

SLE Granulomatose de Wegener

Púrpura Henoch-Schölein Panarterite nodosa

Outras

- Observe agora a figura 5C. Que diagnóstico faz?

Glomerulonefrite crescêntica tipo I

(deposição de anticorpos anti-membrana

basal).

Dado que na história clínica não

figuram queixas pulmonares é pouco

provável que o diagnóstico seja Síndrome de

Goodpasture. Logo, admite-se que é uma

glomerulonefrite crescêntica tipo I

idiopática.

- Nesta doença pode coexistir envolvimento de outro(s) orgão(s)?

Caso se tratasse de Síndrome de Goodpasture o pulmão poderia estar envolvido.

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Caso 6

Senhora de 42 anos de idade dirigiu-se a uma clínica para avaliação de hematúria

microscópica crónica. A hematúria microscópica fora detectada 14 anos antes,

durante um episódio de cistite.

• Exame físico: sem alterações;

• Ecografia renal: sem alterações;

• Sedimento urinário:

o 20 a 50 eritrócitos / cga (campo grande de ampliação);

o proteinúria 1+;

o exame microscópico: eritrócitos dismórficos, raros cilindros

eritrocitários (Fig. 6A e 6B);

• Pielografia: sem alterações;

• Hemograma, bioquímica, ureia, creatinina e glicose: normais;

• Exame citológico da urina: negativo para células malignas;

• Antecedentes familiares:

o Pai: morre aos 72 anos de idade, por AVC;

o Mãe: viva; tem diabetes mellitus;

o Irmão: morre aos 46 anos, em diálise, com insuficiência renal terminal

(insuficiência renal causada por abuso de analgésicos, utilizados no

tratamento de gota crónica);

o 2 irmãs: hematúria, função renal aparentemente preservada;

o 2 filhas: sem evidência de doença.

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A hematúria microscópica é geralmente definida como a presença de mais de 1 a 3

eritrócitos por campo grande de ampliação, numa amostra de urina centrifugada. O

diagnóstico diferencial é amplo. A presença de eritrócitos dismórficos e cilindros

eritrocitários é sugestiva de lesão glomerular. - Porquê?

Porque a configuração cilíndrica é adquirida nos túbulos renais. A causa é sempre renal.

Eritrócitos ficam dismórficos na travessia pela membrana basal aquando da filtração.

- Quais os 3 grandes grupos de diagnóstico diferencial na hematúria de origem

glomerular?

Glomerulonefrites:

• Primárias

• Secundárias

• Hereditárias: Nefropatia de membrana basal fina, Síndrome de Alport, doença de

Fabry, Síndrome de “Nail-patella”

Foi realizada uma biopsia renal para diagnóstico e prognóstico, no sentido de

esclarecer a etiologia da doença.

- Observe e descreva as figuras seguintes (Fig. 6C, 6D e 6E).

Fig 6C: Discreta hipercelularidade

Fig 6D e 6E: Membrana basal fina e muito irregular

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- Quais são os diagnósticos possíveis?

• Nefropatia de Membrana Fina

• Síndrome de Alport

- Que genes sequenciaria para avançar no esclarecimento da situação?

e

- Observe agora as figuras 6F e 6G. Qual o diagnóstico?

Nefropatia de membrana basal fina (também denominada Hematúria Familiar Benigna),

pois há uma redução na espessura da membrana basal detectada na imunoflourescência para a

cadeia α3 do colagénio IV)

COL4A3, COL4A4

(codificam as cadeias α3 e

α4 do Colagénio IV)

• Nefropatia de membrana basal fina

• Algumas formas de Síndrome de

Alport (não ligadas ao cromossoma X)

COL4A5

(codifica a cadeia α5

do Colagénio IV)

• Síndrome de Alport ligado ao

cromossoma X