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A ARTE DE DESPERTAR O GOSTO PELA LEITURA …...concepções distorcidas sobre leitura, onde o aluno não lê mais para melhor compreender a vida, mas para cumprir artificialismos e

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A ARTE DE DESPERTAR O GOSTO PELA LEITURA ESPONTÂNEA E PRAZEROSA

Teresinha Rosane Jaskowiak Domukoski1

Rita Maria Decarli Bottega2

Resumo:

A prática da leitura de obras literárias na sala de aula para alunos do nível

fundamental tem um papel transformador. É uma atividade de assimilação, de

conhecimento, de interiorização, de reflexão. Propicia ao leitor a capacidade de

refletir, pensar, mas também sentir, apurar a sensibilidade, sonhar, relacionar o que

lê com o mundo que o cerca. É fundamental a atuação do professor nessa interação

entre texto e leitor, pois ele é o principal responsável no incentivo à leitura no

contexto escolar. Para tanto, são necessários procedimentos didático-pedagógicos

adequados, o planejamento de estratégias e condições para que se efetive o

crescimento do aluno leitor que, além de despertar o interesse, o gosto e o prazer

pela leitura, podem transcender as dificuldades e avançar no processo do

amadurecimento. Neste sentido, desenvolveram-se atividades com obras literárias,

da escritora Ana Maria Machado, por meio de variados recursos didáticos, entre

eles, a leitura realizada em um espaço diferenciado para aproximar os alunos dos

livros, para que vivenciem e experimentem a sensação de conforto, prazer e alegria

que a leitura literária possibilita através da ficção. Todas as etapas foram

desenvolvidas com o apoio da comunidade escolar. Partindo desses pressupostos, o

presente trabalho é resultado da aplicação do projeto de Implementação

Pedagógica, desenvolvido durante o segundo semestre de 2011, com os alunos do

6º ano do Colégio Estadual Jardim Porto Alegre (Toledo – PR), no qual foram

desenvolvidas atividades que tinham como objetivo principal promover metodologias

e práticas de leitura que estimulassem o prazer, o gosto e o maior conhecimento das

obras de Ana Maria Machado, por meio de atividades lúdicas.

Palavras-Chaves: Leitura Literária, Ensino, Formação de Leitores.

1 Professora do Colégio Estadual Jardim Porto Alegre – Ensino Fundamental, Médio e Profissionalizante (Toledo/PR). Trabalho apresentado como requisito parcial para conclusão do programo PDE. 2 Orientadora. Doutorado em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. Docente da

Unioeste – Curso de Letras do campus de Marechal Cândido Rondon.

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Abstract: The practice of reading literary works in the classroom for the students of

Elementary School has a transforming role. It is an activity of assimilations,

knowledge, internalization and reflection. It provides the reader the capacity of

reflecting, thinking, but also feeling, accurating the sensitivity, dreaming, relating what

is read with the world around them. The performance of the teacher is as he is the

main responsible in encouraging the teaching of reading in the school context. For

that, didatic and education procedures are required, it is necessary to plan strategies

and conditions for the accomplishment of the reader student growth, and arouse

interest, taste and pleasure of reading, which allows students to transcend the

difficulties and advance in the process of maturation. In this sense, activities with the

literary writer Ana Maria Machado have been developed in the reading done, based

on orality in a suitable apace to approach students to books so that they experience

the sensation of comfort, pleasure and joy that reading literary fiction provides. Based

on these assumptions, the present work is the result of all stages of implementation

of the education program conducted during the second half of 2011 with students in

the 6th grade of Jardim Porto Alegre State School (Toledo – PR) in which activities

that have been developed had as the main objective promoting methods and

practices that would encourage reading for pleasure, taste and greater knowledge of

literary works of Ana Maia Machado, through playful activities.

Key Words: literary reading, teaching, readers formation.

1 INTRODUÇÃO

A prática da leitura é um processo de descoberta, uma tarefa desafiadora e

até mesmo lúdica. Porém, será sempre uma atividade de assimilação de

conhecimentos, de interiorização, de reflexão para professores e alunos. Mais que

decodificação, a leitura é uma atividade de interação, onde o leitor interage com o

outro, via texto, tendo em vista objetivos e necessidades socialmente estabelecidos.

Para que o aluno-leitor tenha progresso na leitura do texto, o professor deve

assumir o papel de mediador entre aluno-leitor e o livro, assumir-se como sujeito,

tendo como desafio ensinar a ler e a gostar de ler. Para isso, deve fornecer ao aluno

o maior número e variedade de textos, estimulando novas descobertas, leituras

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críticas, recriações, abrindo espaço para que ocorra uma leitura prazerosa, que

esteja ligada ao interesse do leitor, promovendo uma leitura que lhe permita algumas

escolhas, tanto em relação ao tema, quanto aos autores.

Incentivar a leitura é um ato de coragem do professor. É um desafiar

constante, que leva o docente a organizar eventos, atividades e práticas de leitura

que envolvam os seus leitores alunos. O professor é quem orienta, dinamiza essas

práticas e pode sempre inová-las, promovendo entre seus alunos a leitura crítica,

através da qual o aluno leitor interage com o texto como agente que busca

informações, satisfação e prazer ao ler. A leitura do texto ou de uma obra literária

pode se constituir em um fator de transformação e liberdade para os leitores. Deve

ser colocada como produção, que exige trabalho do sujeito leitor, participação

criadora e, assim, no caso do professor, estará propiciando aos alunos o prazer de

estarem se transformando e transformarem a realidade. Mas para que isso ocorra, é

necessário um desprendimento dos professores de algumas formas tradicionais de

enfoque da leitura com seus alunos, devendo, para tanto, oportunizarem às crianças

a liberdade de escolha, para que sejam conquistadas as condições para que o ato

de ler aconteça com menos artificialismos na sala de aula. Em alguns espaços

escolares, o ato de ler não é acolhido como recurso de interação prazerosa entre o

leitor, o autor e o texto, capaz de proporcionar um perfil novo e significativo ao

processo de leitura, tornando o leitor um produtor de sentidos.

Portanto, há necessidade de rompimento dos rituais mecanicistas e

corriqueiros de leituras desenvolvidas em alguns contextos escolares,

transformando-os em experiências vivas, espontâneas e prazerosas. Neste

contexto, este trabalho tem como objetivo:

a) verificar, a partir do suporte teórico escolhido, como as práticas de

incentivo à leitura literária acontecem ou, se não acontecem, o porquê dessa

realidade no contexto escolar;

b) desenvolver e aplicar alternativas para o desenvolvimento da leitura

ficcional com alunos adolescentes.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

A formação de leitores eficientes e seletivos pode ser resultado de práticas

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de leitura intermediadas nos sistemas educacionais. É por meio delas que é possível

ao aluno abrir as portas de sua percepção leitora. Quando movido por curiosidade,

pelo desejo de crescer, o aluno aprende constantemente, tornando-se cada dia mais

apto a estar no mundo, capaz de compreender as entrelinhas daquilo que ouve e vê,

dos textos presentes no sistema social no qual está inserido. Assim, tem ampliada

sua visão de mundo e seu horizonte de expectativas. Sobre esse aspecto, Lajolo

(2004, p.7) esclarece:

Lê-se para entender o mundo, para viver melhor. Em nossa cultura, quanto mais abrangente a concepção de mundo e de vida, mais intensamente se lê, numa espiral quase sem fim, que pode e deve começar na escola, mas não pode (nem costuma) encerrar-se nela.

Na relação da leitura com o mundo, o contexto escolar costuma ser na

maioria das vezes, o principal local em que a leitura possui espaço consagrado,

tanto em relação à leitura como fruição como instrumental para o trabalho nas mais

diferentes disciplinas. Tomando por base alguns dos problemas enfrentados em

relação à prática da leitura no ambiente escolar, percebe-se que, muitas vezes:

1.1 A leitura literária não é uma atividade geralmente presente no cotidiano da maior

parte dos alunos. Na maioria das vezes, tal prática é realizada como atividade

escolar obrigatória e inadequada. Em outras vezes, é desenvolvida a partir de

concepções distorcidas sobre leitura, onde o aluno não lê mais para melhor

compreender a vida, mas para cumprir artificialismos e pretextos impostos pela

escola. Nesse sentido, alguns fatores dificultam a formação de leitores proficientes e

do gosto pela leitura:

a) relacionamento da leitura com atividades didáticas, vistas com objetivo final

da leitura, tais como: resumos, preenchimento de fichas após leitura de livros,

complementação de horários de aula, uso do espaço da biblioteca para punir alunos

indisciplinados, utilização da leitura para trabalhar questões estruturais da língua,

respostas a questionários imensos sobre o texto lido;

b) a seleção limitada, pouco criteriosa de autores e obras, a ausência de

referência bibliográfica e informações sobre o autor do texto ou da obra, bem como o

contexto no qual foi escrito, resulta numa inadequada escolarização literária na

escola. Segundo Cagliari (1993, p.173):

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A leitura não pode ser uma atividade secundária na sala de aula ou na vida, uma atividade para a qual a professora e a escola não dedicam mais que uns míseros minutos, na ânsia de retornar aos problemas da escrita, julgados mais importantes. Há um descaso enorme pela leitura, pelos textos, pela programação dessa atividade na escola; no entanto, a leitura deveria ser a maior herança legada pela escola aos alunos, pois ela, e não a escrita, será a fonte perene de educação, com ou sem escola.

1.2 A leitura literária, muitas vezes, concretiza-se de forma mecânica e rotineira,

onde o ato de ler caracteriza-se pela decodificação de códigos linguísticos, voltados

para transmissão de conhecimento padrão da língua, com conteúdos fragmentados,

que forçam o leitor a assimilar conhecimentos específicos, descontextualizados,

meramente instrucionais e, desse modo, as práticas leitoras vão perdendo o encanto

e vão se transformando em atividade corriqueira, enfadonha, e desinteressante,

privando o aluno de situar-se enquanto ser social em relação ao texto que leu. Para

Marisa Lajolo (1982, p.59):

Ler não é decifrar, como num jogo de adivinhações, o sentido de um texto. É, a partir do texto, ser capaz de atribuir-lhe significado, conseguir relacioná-lo a todos ou outros textos significativos para cada um, reconhecer nele o tipo de leitura que seu autor pretendia e, dono da própria vontade, entregar-se esta leitura, ou rebelar-se contra ela, propondo outra não prevista.

Desse modo, ao defrontar-se com o texto, o aluno restringe-se muitas vezes

à ação de buscar respostas para meros exercícios, transformando o contato com os

livros, que deveria ser uma porta para o mundo, em uma experiência limitada e

desprazerosa.

A prática da leitura na concepção de linguagem assumida pelas Diretrizes

Curriculares (2010, p.71) é vista como um ato dialógico, interlocutivo. O leitor, nesse

contexto, tem um papel ativo no processo da leitura e, para se efetivar como co-

produtor, procura pistas formais, formula e reformula hipóteses, aceita ou rejeita

conclusões, usa estratégias baseadas no seu conhecimento linguístico, nas suas

experiências e na sua vivência sócio-cultural.

Na qualidade de espaço privilegiado e conveniente para o exercício de uma

política cultural voltada à valorização do ato de ler, em relação ao que é possível

desenvolver na escola, pergunta-se: Como a escola poderia desempenhar o papel

na formação de leitores? Que estratégias de leitura desenvolveria a missão de

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formar verdadeiros leitores, onde predomina a magia, a emoção e o prazer de ler?

Que instrumento e condições a escola prioriza para que a criança tenha contato

positivo com os livros?

Diante do exposto, entende-se que é inviável que algumas escolas

continuem trabalhando a leitura como uma atividade de decodificação, de forma

mecânica, desmotivante, que apenas reproduz o que está explícito no texto, não

propiciando momentos de interação entre leitor, autor e textos. Quando a leitura

literária é realizada apenas com fins didáticos e caracteriza-se apenas como

processo de reconhecimento de signos lingüísticos, não contribui para o crescimento

do aluno enquanto leitor e é destituída de atrativos para conquistá-lo. Geraldi (1997,

p.91), em relação às práticas anteriormente enumeradas, afirma que “Na escola não

se lêem textos, fazem-se exercícios de interpretação e análise de textos. E isso nada

mais é do que simular leituras”.

Constata-se, com muita frequência, o fato de que muitas crianças, na medida

em que avançam no processo de escolarização, perdem o gosto por ler, diminuindo,

com intensidade e muita rapidez o interesse pela leitura e sua relação com o livro de

literatura. Tal situação revela o reflexo do pouco que se realiza pedagogicamente em

certas escolas para aproximar criança e livro de literatura, criando uma situação de

“choque” entre as práticas desenvolvidas em séries iniciais com aquelas realizadas

nas séries finais do Nível Fundamental, por exemplo.

Observa-se ainda, forte envolvimento das crianças com os mais variados

programas televisivos, a interatividade com a Internet, os diferentes apelos das

tecnologias, o desconhecimento da família acerca da importância do ato de ler, o

descaso de alguns professores com a leitura como fator essencial na formação de

leitores, a falta de preparo dos bibliotecários enquanto dinamizadores de acervos

interessantes, são influências que podem contribuir para o afastamento do aluno

para com o livro e a leitura. Essa realidade suscita o questionamento: Como

recuperar e trazer para dentro da escola o prazer de ler? Segundo Martins ( 1994,

p.23):

Muitos educadores não conseguem superar as práticas formalistas e mecânicas enquanto para a maioria dos educandos aprender a ler se resume à decoreba de signos linguísticos, por mais que se doure a pílula com métodos sofisticados e supostamente desalienantes. Prevalece a pedagogia do sacrifício, do aprender por aprender, sem

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colocar o porquê, como, e para quê, impossibilitando compreender verdadeiramente a função da leitura, o seu papel na vida do indivíduo e da sociedade.

Portanto, há necessidade de entender a leitura e como praticá-la de maneira

significativa, transformando o ato de ler num relacionamento espontâneo, dialógico e

afetivo do aluno com o texto, oportunizando assim, espaço onde o prazer de ler

possa ser difundido e a chama da leitura possa permanecer viva. Por essa razão,

tornou-se pertinente a realização desta pesquisa, pois se observa em muitos

espaços escolares momentos de crise em relação à formação de leitores cujas

deficiências estão enumeradas anteriormente.

Para a formação de um leitor de textos literários, é preciso despertar na

criança ou no adolescente o prazer de realizar inúmeras descobertas em um livro,

uma revista, em um gibi, em um jornal, entre outros. Volumes que falem de seus

interesses individuais, da realidade de seus cotidianos, das suas alegrias e tristezas,

das suas dores e inquietações, dos seus sentimentos e de seus desejos secretos.

Além disso, os alunos devem utilizar a leitura para ter acesso a novos conteúdos de

aprendizagem nas diversas áreas que formam o currículo escolar e também os livros

devem recrear e divertir, pré-formando comportamentos e motivando atitudes. As

Diretrizes Curriculares da Educação Básica (2010, p.75) ressaltam:

Que o aluno é o leitor, e como leitor é ele quem atribui significados ao que lê, é ele quem traz vida ao que lê, de acordo com seus conhecimentos prévios, linguísticos, de mundo. Assim, o docente deve partir da recepção dos alunos para, depois de ouvi-los, aprofundar a leitura e ampliar os horizontes de expectativas dos alunos. E ainda, o primeiro olhar para o texto literário deve ser de sensibilidade, de identificação. O professor pode estimular o aluno a projetar-se na narrativa e identificar-se com algum personagem.

É por meio da leitura de fruição, realizada com um objetivo específico, que o

leitor aumenta seus conhecimentos, compreende diferentes visões de mundo,

vivencia emoções, viaja pelo imaginário, pelo subjetivo e intimista, faz análises de

estilos e linguagens, convive com a arte e o estético.

O professor, como leitor experiente, será mediador dessa leitura e intérprete

de um mundo repleto de aventuras onde os alunos passam a experimentar alegria,

tristeza, medo, angústia e encantamento, praticando uma situação que leve os

alunos a construir, aprofundar e ampliar seus conhecimentos, inspirando-lhes o

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desejo por uma leitura prazerosa. Para Geraldi (1997, p.98): “Recuperar na escola e

trazer para dentro dela o que dela se exclui por princípio - prazer - parece o ponto

básico para o sucesso de qualquer esforço honesto de „incentivo à leitura‟”. Quando

o professor trabalha a literatura de forma eficiente, a sala de aula passa a ser o

espaço da variedade de sujeitos, de objetos de leitura e de práticas culturais. O

trabalho literário, além de contribuir para a formação do leitor proficiente, representa

uma das raras (para não dizer única) oportunidades de ler que muitas crianças

possuem.

Neste sentido, a proposta é mais que criar o gosto, o interesse: é criar o

desejo da leitura de fruição, ampliar a concepção do mundo e desenvolver o senso

crítico. O que se pretende é que crianças e jovens melhorem sua habilidade de

leitores e, progressivamente, familiarizem-se com a literatura e tomem gosto pela

leitura literária. Dessa forma, a formação de leitores é também a formação do ser

humano sensível, inteligente e disposto a exercitar a leitura com satisfação e tirar

dela o aprendizado constante e necessário para adaptar-se às exigências da

sociedade atual, neste caso, contrapondo-se à lógica utilitária do mercado (RIOLFI,

2008).

Como já foi explicitado, a leitura é um processo dinâmico, ligado a um

contexto social que não pode ser reduzido a um aprendizado técnico e entendido

como um fato neutro, que resulta apenas em palavras e frases desconectadas e

sem sentido para o leitor. Além disso, ler nas escolas deve estar associado à ação

simbólica sobre o mundo, onde o aluno consiga constituir como sujeito que pensa,

sente e dialoga por meio, dentre outros, do que lê.

No entanto, a escolarização da leitura, na maioria das vezes, ignora o papel

dinâmico que o texto exerce sobre o leitor e prossegue seu trabalho cotidiano,

transmitindo respostas prontas. Desse modo, a tão sonhada faceta de formar leitores

espontâneos, capazes de enxergar no ato de ler uma aventura rica e prazerosa fica

abandonada. De acordo com as leituras realizadas, de modo geral, os autores

apontam que uma das causas dos muitos estudantes não gostarem de ler é a forma

como a leitura é trabalhada em sala de aula, muitas vezes, de maneira burocrática,

descontextualizada, sem nenhum significado para eles. Segundo Aracy Evangelista

( 2006, p.22):

Na realidade escolar o que se pode criticar, o que se deve negar não

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é a escolarização da literatura, mas a inadequada, a errônea, a imprópria escolaridade da literatura, que se traduz em sua deturpação, falsificação, distorção, como resultado de uma didatização mal compreendida que ao transformar o literário em escolar, desfigura-o, desvirtua-o, falseia-o.

Para Silva (2005), “o aluno leitor é uma ilha cercada de textos fragmentados

por todos os lados” e talvez esteja aí a utilização/escolarização errônea da prática de

leitura: o “não gostar de ler” do aluno se explica porque ele se vê envolvido com

atividades utilizadas como pretexto para trabalhar outros aspectos da língua, de

forma descontextualizada, que não fazem nenhum sentido para ele. Pelo exposto, os

dois aspectos sintetizados como escolarização inadequada ou fragmentação dos

textos são apresentadas como críticas ao trabalho de leitura que é, muitas vezes,

desenvolvido nas salas de aula.

Após verificar como as práticas de incentivo à leitura literária acontecem ou,

se não acontecem e o porquê dessa realidade no contexto escolar, é que se propõe

uma intervenção pedagógica, não apenas para diagnosticar os problemas e divulgá-

los, mas no sentido de promover atitudes positivas com o intuito de mudanças desse

cenário. Para que a proposta se efetive, faz-se necessário o envolvimento dos pais,

professores, bibliotecários ou agentes educacionais.

Neste contexto, o trabalho de implementação pedagógica teve como objetivo

propor um espaço diferenciado para a leitura de textos literários, desenvolvendo no

aluno a competência leitora por meio de diversas vivências com a literatura,

procurando promover uma escolarização adequada e um trabalho com

textos/produções completas.

3 ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS DESENVOLVIDOS

Em primeiro momento, é importante a organização de um espaço diferenciado

para a prática da leitura, em um clima de liberdade, espontaneidade, de fácil acesso

da criança com a oferta de diferentes materiais de leitura. Nesse contexto, a

professora será mediadora da relação dialógica leitor-texto, facilitando e contribuindo

para formar na biblioteca e, no espaço direcionado, uma atmosfera de familiaridade,

de convívio e afetividade com os livros literários e outros materiais de leitura.

Foram aplicadas novas e diferentes práticas de leitura, utilizando as obras

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literárias da autora Ana Maria Machado, porque suas histórias são interessantes,

divertidas, muitas inspiradas em fatos reais, que fazem o leitor pensar e “fiquem na

sua cabeça”, dando vontade de reler, ou relembrar, de vez em quando. Em algumas

histórias de seus livros, a autora leva a criança a se ver na história e a induz a lidar

com suas sensações e emoções. Neste sentido, a literatura pode ser um

instrumento para a compreensão da realidade. No caso, a escolha da autora Ana

Maria Machado se deu por ela ser considerada adequada e interessante para alunos

adolescentes do 6º ano.

Dentre as várias práticas de leitura literária, foram elaboradas e contempladas

atividades baseadas na modalidade oral, possibilitando ao aluno o desenvolvimento

das habilidades linguísticas de falar e escutar. Em um espaço com liberdade de

expressão, foram propiciadas dinâmicas criativas e envolventes, o que possibilitou

aos alunos manifestarem suas ideias, sentimentos, experiências, vivenciarem

emoções, vibrarem ou se angustiarem com fatos e com os personagens dos livros e

histórias lidas.

Foram organizadas e propiciadas atividades lúdicas e variadas, pois as obras

dessa autora oportunizam reflexão, imaginação, aprendizagem, questionamentos,

emoção, divertimento, vivência e amadurecimento. Além de adquirir cultura, os

alunos desenvolveram a sensibilidade estética e a expressão linguística.

Este trabalho buscou testar novas metodologias e práticas de leituras em que

o ato de ler se tornasse para os alunos uma prática significativa para a formação de

futuros leitores. Também objetivou-se estimular no aluno a leitura como fonte de

prazer e sabedoria, utilizando a leitura como instrumento privilegiado na construção

de conhecimentos, sua forma de interagir com o mundo, por meio de atividades

lúdicas desenvolvidas a partir das obras literárias da autora Ana Maria Machado.

Para despertar o gosto, a aptidão, o interesse pela leitura, formar futuros e

bons leitores, faz-se necessário planejar atividades lúdicas que instigue o aluno ao

trabalho prazeroso, com os mais diferentes textos, dando especial ênfase ao

literário. Para realizar a prática de leitura, o professor deve transformar o ato de ler

em uma experiência agradável, incentivando os alunos a serem leitores dinâmicos e

fluentes. Para tanto, é necessário fundamentação teórica, que possibilite suporte ao

docente a organizar, planejar atividades de leitura que despertem no aluno a

vontade de ler, repetir e diversificar suas leituras. Para que isso se efetive, a

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mediação do professor é fundamental e indispensável, pois ele é o maior

responsável por dispor de situações para que seus alunos sejam estimulados a ler e

compreender as linhas, além das entrelinhas de um texto, de uma história ou de

uma obra, vivenciando situações de leituras significativas e reflexivas. Segundo

Evangelista (2006, p.265):

Aquele que ensina a ler deve compreender que tem um esforço a fazer diante daquele que aprende também. Quando o aluno, de posse de um texto, perguntar: ”professor, ler para quê?”, é preciso que o professor saiba dizer o que espera dele. Para isso é que é preciso que o professor tenha clareza do que pretende com determinada atividade.

Neste sentido, foram planejadas, organizadas e desenvolvidas atividades de

leitura que oportunizaram ao professor e aos alunos do 6º ano D, do Colégio

Estadual Jardim Porto Alegre – Ensino Fundamental, Médio e Profissionalizante,

durante o segundo semestre de 2011, um encontro com um acervo bibliográfico

variado, cujos textos eram pertencentes a gêneros textuais diferentes: jornais,

revistas, gibis, coleções de adivinhas e piadas, cestos com narrativas como: fábulas,

lendas, mitos, parábolas, contos, entre outros, todos em conformidade com idade e

série.

Também foram selecionadas obras literárias da autora Ana Maria Machado e

narrativas curtas, que tratam de temas diversos, que enfatizam a aventura de viver,

as travessuras do dia-a-dia, a alegria ou conflitos resultantes do convívio humano,

situações familiares facilmente reconhecíveis, valorização das relações eu/outro, as

diferenças, o preconceito, os medos, as perdas que precisam ser enfrentadas e

superadas para o crescimento e amadurecimento do ser. Os protagonistas das

obras e histórias selecionadas, na maioria das vezes, são crianças e adolescentes,

que dão vida ao enredo, que transmitem valores e padrões de comportamento que

foram assimilados e/ou vivenciados pelos alunos. Através de suas histórias, a autora

discute com as crianças, pois sua linguagem é clara, viva e espontânea.

Em um espaço físico previamente organizado e agradável, com o objetivo de

incentivar, motivar e conscientizar os alunos envolvidos no projeto sobre a

importância, o valor e o significado da leitura em nossas conquistas, foram expostos

cartazes com frases motivadoras, painéis, tapete literário e mural com foto legenda,

retratando toda trajetória de vida da autora Ana Maria Machado, da qual algumas

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obras foram lidas em sala pela professora e outras pelos alunos em momentos extra

classe. Após o término da leitura das narrativas, das obras, os alunos em grupo

apresentaram-nas em forma de teatro, confecção de cartazes, criação de maquetes,

desfile dos personagens, entre outras dinâmicas.

Após o delineamento geral dos aspectos pedagógicos que envolveram o

Projeto de Implementação Pedagógica, serão apresentados com maior detalhes as

atividades realizadas, iniciando-se por aquelas que fizeram parte da socialização e,

posteriormente, a apresentação das atividades desenvolvidas com os alunos.

3.1 Socialização do projeto

Antes de desenvolver as práticas de leitura com os alunos, recebi, como

professora, apoio da direção da escola e socializei o Projeto com outros segmentos

da esfera escolar, em duas situações diferentes:

a) Com o apoio da Direção do colégio, Equipe Pedagógica e professores em

geral, foi apresentado na Feira Tribos e Nações o Projeto à comunidade escolar,

oportunizando momentos de leitura, contação de histórias, contato com diversas

obras aos visitantes. Observou-se, neste primeiro contato com os alunos em geral,

grande interesse por histórias curtas com ilustrações, coletâneas de piadas e

adivinhações e os gibis foram os mais solicitados e lidos. Os docentes que visitaram

o espaço revelaram entusiasmo em relação à iniciativa de momentos e espaço

diferenciado para realização da leitura no contexto escolar;

b) Outra oportunidade para a divulgação do projeto foi durante o Curso de

Formação Continuada, realizado no início de julho de 2011, onde a direção, Equipe

Pedagógica dispôs de momento no qual foi apresentado, por meio de slides, aos

docentes, Agentes Educacionais I e II da escola as linhas gerais do projeto, os

objetivos e a importância desta proposta no incentivo à leitura, ressaltando a todos

que desenvolver o gosto pela leitura e formar alunos leitores é compromisso de

todos os envolvidos no contexto escolar. Pelos relatos de docentes, percebeu-se

boa aceitação, por serem atividades práticas e incentivadoras, seria uma proposta

simples, dinâmica e de fácil realização. O desenvolvimento de interesses e hábitos

permanentes de leitura é um processo constante e começa no lar, aperfeiçoa-se na

escola e continua pela vida afora, através das influências da atmosfera cultural e dos

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esforços das pessoas pelos quais a criança é orientada, como pais, amigos,

professores, que por sua vez contribuem imensamente para uma atitude positiva da

criança ou adolescente em relação à leitura. Por esta razão, familiares foram

convidados a conhecer a intenção do projeto e, conseqüentemente, acompanhar o

envolvimento dos filhos na leitura diária, incentivando-os através de diálogos sobre a

história ou obra lida;

c) No terceiro momento, os alunos foram recepcionados com afetividade no

espaço específico para a leitura, ficaram à vontade, tiveram acessibilidade e

liberdade na escolha de obras e textos variados que desejassem ler, conforme seus

interesses e curiosidades. Não houve o direcionamento do professor na indicação do

material, apenas orientação e a observação para conhecer os reais interesses dos

alunos pela leitura e os tipos de textos. Esta etapa foi interessante e produtiva,

porque foi possível observar que os alunos realizaram a leitura de maneira

espontânea, descontraída, compartilhando com os colegas o texto, a mensagem e

até mesmo as imagens, além do relato de alunos que gostariam de continuar por

mais tempo e ler outras histórias que ali se encontravam.

3.2 ATIVIDADES DESENVOLVIDAS

Em vários encontros com os alunos, no decorrer do projeto foram realizadas

pela professora a leitura das obras de Ana Maria Machado: “Palmas para João

Cristiano”, “Menina Bonita do Laço de Fita” e “Raul da Ferrugem”. Em cada obra lida,

foi possível observar as reações, emoções e envolvimentos dos alunos.

a) No encontro em que foi apresentado o livro e a história “Palmas para João

Cristiano”, através de leitura feita pela professora com entonação, ritmo, vivenciando

as emoções desta narrativa, observou-se o envolvimento, atenção e o prazer que os

alunos sentiram em ouvir a história, em que a autora Ana Maria Machado reconta a

vida, a trajetória, o maior sonho de Hans Christian Andersen , que se considerava o

Patinho Feio no mundo dos homens. O sonho dele era ser importante, reconhecido

e aplaudido por muita gente. Então saiu em busca da realização e do

reconhecimento de seu trabalho. Foi emocionante porque o que estava sendo

proposto aos alunos com este projeto tinha uma relação muito significativa com a

história lida.

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No momento da leitura, os alunos se identificaram com a personagem, que

conseguiu vencer na vida e realizar seus sonhos através da leitura, dos estudos,

viagens, aprendendo outras línguas, escrevendo e contando histórias comoventes,

tornando-se um grande escritor dos clássicos da literatura infantil. Após a leitura, os

alunos tiveram a oportunidades de reler e recordar dos clássicos citados no decorrer

da narrativa. Muitos recordaram momentos de leitura que tiveram na infância.

b) Outra situação significativa vivenciada foi com a exibição do filme ”Menina

Bonita do Laço de Fita” e a confecção de painel construído coletivamente com os

próprios alunos, utilizando fotos de seus familiares. A atividade prendeu a atenção

dos alunos, motivou-os socializar as descobertas, as semelhanças, as diferenças, as

idéias sobre os temas, fatos e situações que a narrativa proporcionou. Essa história

oportunizou aos alunos uma reflexão em relação ao preconceito, as diversidades

culturais, auto-estima, o respeito e o reconhecimento de que somos todos diferentes.

Muitos alunos compreenderam a intenção da autora contidas nas entrelinhas da

história e, a partir das discussões, reflexões, relataram experiências marcantes que

vivenciaram na escola, bairro, grupos de amigos em relação às diferenças.

Após a análise do painel, com as fotos dos familiares concluímos que:

ninguém deve ser excluído, marginalizado ignorado por causa da cor da pele, peso,

estatura, das condições financeiras, pelo lugar onde mora, pelas aparências. Foi

uma discussão interessante, porque, além do envolvimento significativo dos alunos

através de depoimentos, concluíram que a história, apesar de ser infantil, levou-os

repensar sobre as diferentes visões de mundo e de homem.

c) Outro encontro marcante e de bons resultados iniciou-se com as

perguntas: “A gente enferruja? Somos enferrujados? Quem se sente enferrujado?

Quando nos sentimos enferrujados? Que atitudes tomamos ou não tomamos que

nos enferrujamos? O que fazer para eliminar ou diminuir nossas ferrugens?” Essas

indagações misteriosas chamaram a atenção dos alunos, provocaram curiosidade e

interesse em conhecer e se encantar por um menino comportado, bonzinho que nos

dá uma lição. A dinâmica utilizada para vivenciar a trama, os medos e as ferrugens

da personagem “Raul da Ferrugem Azul” foi a leitura compartilhada, pois é uma

prática que possibilitou ao professor contagiar os alunos a “viajar com eles na

história”. Porém, para que isso acontecesse com êxito, fez- se necessário conhecer

bem a história, antes de apresentá-la aos alunos. Explorando movimentos corporais,

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tom de voz, para transmitir as sensações e emoções que a narrativa sugere, as

pausas, gestos também contribuíram para o sucesso da apresentação dessa obra.

Concluído a prática da leitura, os alunos assistiram a um trecho do filme:

“Raul da Ferrugem Azul”, o qual possibilitou aos alunos visualizarem o espaço, as

personagens, as manchas, as ansiedades, os medos, os fatos de covardia,

desrespeito e individualismo e comodismo presentes na história. Foi muito

interessante porque os alunos contextualizaram a história ouvida com as imagens e

o contexto atual. Muitos alunos relataram que situações apresentadas na história

estão bem presentes no contexto familiar, no convívio com os colegas, no portão,

nos corredores do colégio, no trânsito em muitos programas de televisão como:

“Chaves- SBT”, novelas, filmes entre outros. Em seguida, tiveram contatos com

jornais, revistas da cidade que apresentam fatos manchetes, notícias, reportagens

que ilustram a trama vivida por Raul. Com todo material selecionado, os estudantes

montaram um mural com a seguinte idéia: “Não se pode fazer ao outro o que não

gostaríamos que fizessem com a gente.” Observou-se que, de maneira suave, com

personagens deliciosos, com muita coerência e esperteza, a autora foi

desenferrujando nossa mente, nossos pensamentos, nosso jeito de ser e de nos

comportarmos em certas situações, abrindo novos caminhos em nossa imaginação.

d) Neste mesmo clima de entusiasmo e envolvimento, foi solicitado aos

alunos que respondessem o seguinte questionamento: “O que se perde que se

ganha?” Eles tiveram alguns dias para pensar, pesquisar e apresentar o resultado.

Foram muitas as respostas e conclusões, porém, alguns alunos concluíram é

impossível ganhar alguma coisa quando se perde. Então distribuí para os grupos os

contos do livro: “Quem Perde Ganha”. Solicitei a leitura, a compreensão, a discussão

e descoberta do que cada personagem ganhou com a perda. Em seguida, os

alunos teriam que planejar, organizar de maneira secreta e apresentar de forma

dinâmica aos colegas da sala o que cada personagem do conto ganhou com a

perda. Após a apresentação de cada conto, os alunos que assistiram à

apresentação deveriam descobrir e revelar os ganhos e as sensações que cada

personagem do conto vivenciou.

Foi um encontro emocionante porque os alunos não se limitaram apenas em

ler, mas transformaram em outra linguagem e utilizaram outro gênero para

dinamizarem muito bem a história. Foram criativos no cenário, caracterizaram os

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personagens de forma surpreendente, o que atraiu atenção da classe toda. Através

de maquetes feitas com objetos, que revelam ganhos com as perdas, e

apresentações dramatizadas, os alunos concluíram que nada se perde, de que tudo

se transforma e quem perde, na verdade, muitas vezes ganha; a perda não é um

fim, mas um recomeço. O resultado da leitura desta obra revelou um espírito

humanitário, porque os alunos realizaram uma campanha de doações de objetos

como: roupas, calçados, brinquedos e doaram para a Pastoral da criança e do

adolescente, ambas coordenadas pela Paróquia Menino Deus, situada no bairro do

colégio. As doações foram encaminhadas para serem distribuídas para as famílias

necessitadas.

Até este momento do projeto desenvolveram-se práticas de leituras com

obras e textos curtos, estimulando novas descobertas, leituras críticas, recriações,

oportunizando espaço em que a leitura se efetivasse de maneira prazerosa, sempre

ligada ao interesse e criatividade do aluno. Conforme as Diretrizes Curriculares

(2010, p.74):

Para a seleção de textos é importante avaliar o contexto da sala de aula, as experiências de leitura dos alunos, os horizontes de expectativas dele se as sugestões sobre textos que gostariam de ler, para então, oferecer textos cada vez mais complexos, que possibilitam ampliar as leituras dos educandos.

Durante a execução das atividades, foi possível observar que ler as histórias

de Ana Maria Machado é realmente descobrir e explorar o prazer da leitura. Os

alunos conseguiram entender que a história é um registro de uma época e do que

pensa, vive e sente a autora. Foram momentos de leitura e discussão que abriram

leque de sensações, reflexões, convívio, compartilhamento de idéia e ideais e

principalmente o prazer de ler um bom texto. Em suas histórias estão retratados os

fatos, o convívio com os avôs, pais, primos, amigos e contexto social em que vivia a

autora desde sua infância, que marcaram e influenciaram sua vida de leitora e

grande escritora hoje. Como nascem os livros da autora e seus personagens? Qual

o papel do escritor e do leitor morando dentro do livro? Para a autora, escrever era

fazer o que ela fazia quando pequena ao brincar: inventar mundos, pessoas e

histórias. Ao escrever ela podia recriar o real, inventar novas vidas, ser outras

pessoas, viver outras vidas.

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Por esta razão, percebeu-se a necessidade, a importância e a oportunidade

de aproximar os alunos de “gente que faz”: pessoa sensível, talentosa como a

escritora Ana Maria Machado. Através de slides, mural com fotos desde sua

infância, até os momentos atuais, exposição de livros, depoimentos da autora

relatando seus obstáculos desejos, painel com frases da autora sobre o valor da

leitura, pequenos vídeos revelaram a trajetória da vida, de conquista, superação e

de sucesso. Socializou-se então, com os alunos a idéia de que para escrever, a

percepção, os sonhos, as fantasias, devaneios, memórias e imaginação estão na

criatividade do escritor e também no trabalho em transformar em palavras as

experiências vividas.

e) Como etapa final foram apresentadas as obras: “O Canto da Praça”, “Bisa

Bia, Bisa Bel”, “Isso ninguém me tira”, “Amigos Secretos”, “História meio ao

Contrário”, “de Carta em carta”, “Bem do seu Tamanho”, “Do outro lado tem

segredos” e “Uma Boa Cantoria”. Essas obras foram sorteadas para os grupos de

alunos que, devidamente orientados, realizaram a leitura, organizaram e

vivenciaram as personagens das obras lidas em forma de desfile das personagens

caracterizadas, colocando-se no lugar dos personagens e vivenciaram momentos

marcantes da história, através de discursos orais depoimentos ou dramatização.

A última atividade foi fundamental por que revelou que as narrativas

ficcionais da Ana Maria Machado constituem fontes de prazer e fruição, porque os

alunos deram vida às personagens presentes na ficção.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A escola precisa oferecer meio e estímulos para que o leitor vença

diferentes etapas, que seja capaz de decifrar novos códigos e se torne leitor

assíduo. A partir de um trabalho contínuo e planejado, proporcionado por mudanças

de atitude com relação à maneira de se apresentar o texto literário aos alunos, é

possível levá-los a um encontro prazeroso e ao mesmo tempo responsável com

obras literárias.

Para que esse desafio se efetivasse, foi necessário o rompimento com os

padrões tradicionais onde as práticas leitoras possuem fins didáticos e utilitários na

transmissão das informações pré-estabelecidas pelo professor, tomando por base o

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currículo escolar. Daí a necessidade de se buscar novas práticas e outros espaços,

fazer valer da criatividade para organizar ações literárias que ultrapassem a

decodificação de signos lingüísticos, superassem as barreiras do didatismo e

transformassem a mera rotina de ler em práticas espontâneas e prazerosas, onde o

prazer de ler pudesse ser difundido, por meio da socialização das leitura realizadas.

A prática de leitura realizada num espaço diferenciado, com ambiente propício

onde se privilegia a literatura espontânea e prazerosa, como um instrumento

motivador de sentidos e fonte propulsora de prazer oportunizou ao aluno a liberdade

e autonomia para interagir com os textos e produzir sentidos. O professor foi

mediador desse e nesse espaço, através dos encontros com os alunos,

transformaram o ato de ler numa atividade mais dinâmica e interativa e o leitor mais

disposto, atraído, ativo, interessado, buscador de sentidos e envolvido pelos

encantos das narrativas e obras literárias.

Para a execução das práticas de leitura foram elaboradas atividades

baseadas na modalidade oral, que possibilitaram ao aluno o desenvolvimento das

habilidades linguísticas de falar e escutar narrativas diversas. Num espaço

específico para o momento de leitura, com liberdade de expressão, os alunos

tiveram a oportunidade de ouvir, ler, contar histórias, conhecer personagens e

apresentar as atividades desenvolvidas a partir da leitura das obras literárias.

Além da autonomia e liberdade de escolha, os alunos envolvidos no projeto

encontraram nas narrativas e nas obras literárias de Ana Maria Machado fonte de

prazer e fruição, tendo oportunidade de confrontar o real com a fantasia para

produzir os sentidos e construir aprendizagens. Isso comprova que os textos

ficcionais se bem utilizados são excelentes motivadores da leitura prazerosa e que

tal prazer não é usufruído em certas escolas devido ao caráter impositivo das

práticas de leitura vivenciadas em sala de aula. Também ficou explícito que para se

conseguir este prazer, faz-se necessário bastante esforço: o de oportunizar aos

alunos o material e o esforço do aluno para ler o texto e socializá-lo, se for o caso.

No decorrer do desenvolvimento da Produção Didático Pedagógica, o

resultado foi satisfatório, produtivo, alunos envolvidos e muito interessados em ler os

textos, obras que foram apresentadas, além disso, constatou-se a possibilidade de

promover mudanças no ensino da literatura juvenil para alunos do Ensino

Fundamental. Isso já está ocorrendo, com a incorporação de novas estratégias

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metodologias no plano de trabalho docente dos demais professores da disciplina de

língua portuguesa, visando fomentar o gosto pela leitura. Além da adequação do

espaço destinado a sala de apoio com material literário – canto da leitura -, a

biblioteca também reorganizou seu visual e adotou novas estratégias para divulgar

as obras literárias disponíveis, a escola no seu todo implantou o momento da leitura

para todas as séries.

Pode-se constatar que o trabalho desenvolvido possibilitou uma reflexão no

sentido de buscar alternativas viáveis, pistas, dinâmicas que venham sugerir práticas

prazerosas de leitura, sem perder de vista a construção de aprendizagens

significativas. Para isso, é fundamental desenvolver um trabalho contínuo e

planejado, com estratégias e dinâmicas de leitura diferenciadas, propondo

mudanças de atitudes, com relação à maneira de apresentar as obras literárias aos

alunos.

No decorrer do primeiro semestre do ano letivo de 2012, acompanhando os

alunos envolvidos no Projeto e tendo contato com a professora regente desta turma,

que conheceu o Projeto através do curso GTR, está motivando e incentivando os

alunos dando continuidade às práticas de leitura literária. Os alunos realizam com

envolvimento e empenho as atividades de leitura propostas. Com isso, percebeu-se

que os alunos freqüentam com mais assiduidade a biblioteca, solicitam novos livros

de literatura e pedem sugestões ao professor quanto à escolha do livro. Também é

possível afirmar que conhecem com maior profundidade a obra da escritora Ana

Maria Machado.

REFERÊNCIAS

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EVANGELISTA, A. A. M.; BRANDÃO, H. M. B.; MACHADO, M. Z. V. E. A

escolarização da leitura literária. 2 ed., Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2006.

FREIRE, P. A importância do ato de ler. 46 ed., São Paulo: Editora Cortez, 2005.

GERALDI J. W. Portos de Passagem. São Paulo: Martins Fontes,1991.

___________. O texto na sala de aula. São Paulo: Ática, 1997.

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LAJOLO, M. Do mundo da leitura para a leitura do mundo. São Paulo: Ática,

1999.

RIOLFI, C. et al. Ensino de Língua Portuguesa. Coleção ideias em ação. São

Paulo: Thomson Learning, 2008.

SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO DO PARANÁ. Diretrizes Curriculares

da Educação Básica - 2010. Disponível em:

<http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/diretrizes/dce_port.pdf>.

Acesso em: 12/02/2012

SILVA, E. T. da. A produção de Leitura na Escola. 2 ed., São Paulo: Ática, 2005.