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A ascensão da economia colaborativa e a redefinição dos processos corporativos Uma comparação analítica entre empresas tradicionais e empresas P2P. Martin Draghi 20 de Setembro de 2012

A ascensão da economia colaborativa e a redefinição nos processos corporativos

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A ascensão da economia colaborativa e a redefinição dos processos

corporativos

Uma comparação analítica entre empresas tradicionais e empresas P2P.

Martin Draghi

20 de Setembro de 2012

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“Quando voltarmos a enxergar o relacionamento interpessoal como parte inerente à felicidade

humana, iremos entender que a colaboração é a base para obtermos uma qualidade de vida

melhor, baseada plenamente na sustentabilidade interna e externa”

Martin Draghi

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A ascensão da economia colaborativa ou economia do compartilhamento trouxe

significativas mudanças nos processos internos das empresas que estão situados no mercado

P2P. As principais características inerentes a esses mercados são a redefinição do

relacionamento empresarial junto a seu público alvo; o empoderamento dos consumidores na

construção e manutenção dos serviços/produtos e a importância da construção do capital

social (entre os próprios usuários da plataforma) como principal fonte de diferenciação e

alcance de vantagem competitiva. Como forma de aumentar o entendimento sobre os temas

apresentados acima, buscou-se analisar de forma detalhada cada um deles e comparar

exemplos de empresas situadas no mercado P2P com as empresas “tradicionais”.

Redefinição do relacionamento empresarial (P2P)

Nota-se que a principal diferença entre as empresas tradicionais e as plataformas P2P

é a maneira como se dá o relacionamento destas junto a seus consumidores. Se no modelo

“tradicional” as empresas atuam como intermediários ativos na produção, divulgação e

comercialização de produtos, nas plataformas P2P ocorre a redefinição do papel da empresa

como intermediária passiva, ou seja, o core business da empresa é construir um espaço on-

line que aglomere pessoas que tenham interesses comuns em transações comerciais e atuar

como ponto central de validação dessas interações no mundo off-line.

Para aclarar os pontos apresentados acima iremos comparar duas empresas, uma

situada no mercado “tradicional” de comercialização de carros e outra situada no mercado

P2P.

Imagine que você está buscando comprar um carro da marca Ford. Provavelmente, seu

primeiro contato com as opções de compra será através da Internet e mídia impressa.

Influenciado pelos comentários positivos dos seus amigos sobre determinado carro você acaba

selecionando o Ford Focus como desejo de consumo. Uma vez estudada as melhores formas

de pagamento do carro e com dinheiro no bolso você se desloca até uma distribuidora da

marca, interage junto ao vendedor que lhe apresenta os benefícios do carro e paga a bagatela

de R$45.000 para ser o mais novo proprietário de um Ford Focus zero quilômetro. Esse é o

modelo tradicional de compra de carros, onde através da publicidade, da produção e dos

canais de distribuição da Ford você teve toda a facilidade para conseguir concluir a compra.

Agora, peguemos como exemplo uma plataforma P2P de carros, o Relay Rides. Após

ler vários comentários na Internet sobre qual carro seria o melhor para suas necessidades,

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você acaba optando por um Ford Focus, porém, não quer arcar com os custos adicionais de

possuir um veículo e muito menos desembolsar R$45.000 para ser mais um proprietário de um

veículo que possivelmente será utilizado menos de 5 horas por dia.

Pensando em todos os contras de possuir um carro e ao mesmo tempo tendo certa

preocupação com o atraso que o transporte público poderia trazer para seus horários do dia a

dia, você opta por acessar o Relay Rides e buscar algum proprietário que esteja interessado em

alugar seu Ford Focus por algumas horas por dia por 8 dólares a hora* (valor retirado do site

RelayRides). Você faz sua reserva, encontra o proprietário e em poucas horas já tem acesso ao

seu Ford Focus.

Analisemos o comportamento do consumidor e seu relacionamento junto as empresas

para preencher a necessidade que lhe interessava.

Em relação ao consumidor que optou por comprar o Ford Focus, nota-se que

primordialmente o canal de distribuição foi viabilizado pela própria Ford, através de uma

distribuidora dos carros da marca. Toda a relação e interação do consumidor junto a marca até

o momento da compra foi feita através dos esforços de propaganda e marketing da Ford,

afirmando o conceito apresentado acima de intermediário ativo, no qual a empresa mediu

grandes esforços de construção de infra estrutura, canais de distribuição e publicidade para

viabilizar a venda de um de seus carros. Vale ressaltar, que embora exista a preocupação de

criar uma comunicação humanizada para concretizar a venda dos automóveis Ford, as

propagandas são feitas no conceito broadcast, ou seja, de forma a impactar milhões de

potenciais compradores, o que por si só já descaracteriza a possibilidade de um contato

realmente humano e individual junto ao consumidor.

Analisemos agora o consumidor que optou por utilizar o Relay Rides. A primeira

característica dos sistemas P2P é que diferentemente do caso relatado acima, o principal canal

de distribuição do Ford Focus é outra pessoa e não o Relay Rides. Esse ponto afirma que nos

mercados P2P, devido a interação ser individual, existe um contato realmente humano, uma

vez que a negociação é feita diretamente com outra pessoa e não com uma companhia que

tenta através de mecanismos de publicidade e propaganda humanizar uma marca.

Esse ponto é fundamental para diferenciar a experiência do usuário das empresas

tradicionais das empresas baseadas no sistema P2P.

Nesse sentido, fica claro o conceito de intermediário passivo por parte do Relay Rides.

A empresa não criou nenhum tipo de propaganda sobre o carro ou uma infraestrutura física

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para a venda do Ford Focus, porém preocupou-se em criar um espaço on line que agrupasse

pessoas interessadas em alugar seus veículos e pessoas com interesse em apenas ter o acesso

a automóveis quando e onde fosse necessário. O preço do aluguel do veículo, sua

disponibilidade na semana e os horários no qual o Ford Focus poderia ser alugado por outra

pessoa são definidos única e exclusivamente pelo dono do carro. Essa é a premissa básica dos

sistemas P2P, unir pessoas físicas para que tenham acesso ilimitado a produtos a qualquer

hora ou dia da semana. O acesso tendo maior privilégio do que a posse.

Com isso, pode-se enxergar claramente um impacto em todos os 4P´s do marketing.

Preço - Estabelecido pelo próprio dono do carro e não mais pela empresa que desenvolve o

produto e/ou serviço

Praça - O conceito de canais de distribuição sofre uma tremenda mudança. Os antigos “canais

de distribuição” são vistos como pessoas nas plataformas P2P.

Produto – Uma vez que nos sistemas P2P o acesso tem maior importância do que a posse, o

conceito de produto esvazia-se e torna-se um serviço extremamente personalizado as

necessidades do consumidor.

Promoção – A promoção é realizada em parte pelas empresas que desenvolvem os produtos e

serviços e potencializada pelas plataformas P2P, nesse caso o Relay Rides. O boca a boca

torna-se a principal forma de divulgação do Relay Rides e seus custos de comunicação são

significativamente menores do que as empresas tradicionais. Esse cenário será modificado

quando o número de plataformas P2P de compartilhamento de carros aumentarem,

consequentemente aumentando a concorrência no mercado P2P, impactando num aumento

dos custos de comunicação.

O empoderamento dos consumidores na construção e manutenção dos serviços/produtos

Levando em consideração que o sucesso das plataformas P2P depende do nível de

interação entre seus usuários, pode-se afirmar que o sucesso da empresa está intimamente

ligado ao deslocamento de poder da empresa para seus usuários. Deve-se aclarar que a

palavra poder no sentido em que é empregada no texto tem relação com a determinação do

preço dos produtos pelo próprio usuário e a possibilidade de definir como e quando será feita

a transação.

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Nesse tópico, iremos analisar duas empresas situadas no mercado financeiro, uma com

inclinação ao conceito P2P e outra aos modelos tradicionais de transação.

Imaginemos que você deseja pedir um empréstimo ao Santander, pois tem o desejo de

realizar uma reforma em sua casa, porém, não possui os recursos financeiros completos para

realizar tal obra. Dependendo do prazo de devolução do empréstimo solicitado junto ao banco

haverá uma variação na taxa de juros cobrada para tal transação. Porém, quem decide qual

será a taxa de juros relacionada ao empréstimo é o próprio banco, o consumidor não tem forte

influência para barganhar juros menores para realizar a reforma em sua casa. Dessa maneira, o

valor dos juros é imposto sobre o consumidor, que dependendo de sua vontade é realizado ou

não, é dessa forma que a grande maioria dos modelos situados em mercados tradicionais

trabalha.

Analisemos agora a opção de empréstimos via P2P. A plataforma existente chame-se

ZOPA e possui um sistema de empréstimos muito interessante. Imagine que ao invés de

recorrer ao Santander, você decidiu buscar seu empréstimo no ZOPA, você abre uma conta na

plataforma e anuncia o montante de dinheiro que está precisando para realizar sua tão

esperada obra. Nesse momento, a sua proposta de empréstimo é aberta para possíveis

pessoas que tenham interesse no financiamento de seu empréstimo. Os interessados lançam

uma proposta de taxa de juros como se fosse um leilão e o financiador que oferecer a menor

taxa de juros é quem sai como o vencedor, ou seja, irá fornecer o montante necessário para

realização de sua reforma. Nota-se que tanto o montante do empréstimo como a definição da

taxa de juros é escolhida única e exclusivamente pelos usuários da plataforma, o que acaba

sendo o principal ponto de sobrevivência do ZOPA, o poder de definição de valores de troca é

realizado e viabilizado através das interações do conceito P2P, atuando apenas como um

intermediário passivo, e propiciando um espaço onde essas interações possam ser validadas.

Embora a primeira vista muitas pessoas achem que esse tipo de mecanismo não

funcione, o ZOPA apresenta uma taxa infinitamente menor de inadimplência do que os bancos

tradicionais, possuindo uma taxa de 0,65% em comparação com os 10% dos bancos*

*(Dados relacionados a economia Inglesa).

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A importância da construção do capital social como principal fonte de diferenciação e

alcance de vantagem competitiva

Como já mencionado acima, um dos principais pontos que diferenciam as plataformas

P2P é a humanização das relações de troca através da aproximação física de seus usuários.

Embora muitas empresas tentem através das ferramentas de comunicação humanizar suas

marcas, existe uma clara dificuldade de criar um relacionamento realmente humano entre os

consumidores. Essa dificuldade apresenta-se, pois muitas vezes os benefícios emocionais

evocados pelas marcas estão em última instância ligados a comercialização de produtos e

serviços, enxergando a relação das emoções positivas junto as marcas como um meio para

alcançar um fim (a conclusão da venda).

No caso das plataformas P2P, quanto maior for a interação – inicialmente on-line e

posteriormente off-line – de seus usuários, maior será o sucesso da plataforma, pois a

sobrevivência de tais plataformas dependem única e exclusivamente do nível de interação

entre seus consumidores. Nesse sentido, pode-se afirmar que uma plataforma P2P que tenha

baixa interação entre seus usuários não possui vantagem competitiva frente a seus

concorrentes.

Para validar as afirmações acima iremos buscar analisar duas empresas situadas no

mercado hoteleiro, uma com foco na construção do capital social (P2P) e outra no modelo

tradicional do ramo da hotelaria.

Imagine que você irá viajar para Nova York e está querendo ficar em um Sheraton da

região de Manhattan, você pode fazer sua reserva tanto de forma on-line, como através de

uma ligação para o hotel. Após realizar todo o tramite financeiro envolvido na operação você

pode ficar no quarto do Sheraton que reservou e conhecer os principais pontos turísticos da

cidade.

Agora, imagine a mesma situação. Porém, ao invés de buscar uma rede convencional

no ramo de hotelaria você entra no site do AirBnB e procura algum apartamento que tenha um

quarto para alugar pelo seu tempo de estadia. Através do site você pode visualizar os

comentários de pessoas que já ficaram nos quartos cadastrados e ter um breve conhecimento

sobre como essa pessoa é como anfitriã, para esclarecer um pouco esse cenário segue a foto

abaixo de um quarto em Manhattan com os comentários sobre a host.

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Comentário sobre a host Trevite, que aluga o que ela chama de: Spacious 1 BR Close to Central Park

O preço cobrado pela proprietária da casa é de apenas R$80,00 por dia. Além de pagar

uma diária mais barata do que possivelmente seria em um hotel conhecido no ramo de

estadias como é o caso do Sheraton, os viajantes tem uma experiência totalmente diferente

hospedando-se na casa de alguém que mora na localidade.

Ao hospedar-se em um quarto onde a proprietária é uma residente do local, ela

certamente te dará dicas melhores do que os tradicionais passeios turísticos oferecidos no

conceito broadcast para todos os usuários que se hospedam na rede hoteleira convencional.

O viajante terá uma experiência junto a alguém que conhece as particularidades de NY como

nenhum outro passeio turístico possa fazer. Outro ponto importante é que possivelmente a

host irá te apresentar bares e pontos que talvez não fossem frequentados caso você se

hospedasse em um hotel da região, o que acaba aquecendo a economia regional e

principalmente pequenos empreendedores locais ou invés de abastecer empresas

multinacionais que se beneficiam com o turismo relacionado ao conceito broadcast ou turismo

via agências de viagem.

Fica clara que a experiência torna-se única, e é benéfica para os dois lados. Por um

lado a proprietária ganha um dinheiro extra e pelo outro você tem a possibilidade de ter uma

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experiência com um morador da região e não uma mera experiência turística, e no final das

contas o contato foi realmente humano, pois, quem aluga o quarto é realmente uma pessoa

com uma história e não um ramo hoteleiro sem face e sem emoção.