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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XIX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Nordeste – Fortaleza - CE – 29/06 a 01/07/2017 1 A caracterização do linguajar cearense nas publicações do personagem “Suricate Seboso” no Facebook 1 Henrique Pereira ROCHA 2 Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, CE Francisco Thiago Barbosa da SILVA 3 Universidade de Fortaleza, Fortaleza, CE RESUMO Este artigo aborda a utilização do linguajar característico do povo cearense observado nas postagens da página do personagem “Suricato Sebosa” no Facebook. A partir deste objeto de estudo procuramos desenvolver uma abordagem sobre a construção do conceito de cearensidade e como essa forma de identidade cultural é expressa na linguagem local através do humor. Observamos na dicotomia linguagem popular e meios digitais de comunicação um processo de intercâmbio de mensagens através de agentes e meios ligados ao folclore e à cultura popular, denominado folkcomunicação. Procuramos exemplificar com a análise de duas postagens que reúnem a expressão da linguagem popular para apresentar problemas observados pelo personagem sobre questões relacionadas a fatos da vida cotidiana ou da atualidade. PALAVRAS-CHAVE: cultura regional; folkcomunicação; mídias sociais. 1. Introdução As experiências de interação entre a cultura popular e tecnologia tem provocado uma reciprocidade no sentido do acesso aos conteúdos que cada uma delas domina. Partindo do princípio de cultura como o conjunto de costumes de um povo em todos os níveis, resultando no desenvolvimento tecnológico e desdobrando-se nas redes sociais difundidas pelas internet, surgem os pontos principais que foram observados neste trabalho: a cultura cearense através de seu linguajar e as redes sociais, tendo como o Facebook exemplo de espaço de difusão de conteúdos. Tomando como exemplo o personagem “Suricate Seboso” e as tirinhas publicadas em sua página no Facebook, a pesquisa adentrou no espaço das redes sociais para verificar 1 Trabalho apresentado no DT 8 – Estudos Interdisciplinares do XIX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Nordeste, realizado de 29 de junho a 1 de julho de 2017. 2 Bacharel em Comunicação Social – Habilitação em Jornalismo (UFC). Especialista em Gestão de Produtos e Serviços Culturais (Uece) e Cultura Folclórica Aplicada (IFCE). Mestre em Psicologia pela Universidade de Fortaleza (Unifor). Doutorando em Ócio, Cultura e Comunicação para o Desenvolvimento Humano pela Universidade de Deusto (Bilbao/Espanha). Produtor Cultural do Instituto de Cultura e Arte (ICA) da Universidade Federal do Ceará (UFC). E-mail: [email protected]. 3 Bacharel em Comunicação Social – Habilitação em Jornalismo pela Faculdade Cearense (FaC). Pós-graduando em Marketing Digital e Mídias Sociais pela Universidade de Fortaleza (Unifor). E-mail: [email protected].

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A caracterização do linguajar cearense nas publicações

do personagem “Suricate Seboso” no Facebook 1

Henrique Pereira ROCHA2 Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, CE

Francisco Thiago Barbosa da SILVA 3 Universidade de Fortaleza, Fortaleza, CE

RESUMO

Este artigo aborda a utilização do linguajar característico do povo cearense observado nas postagens da página do personagem “Suricato Sebosa” no Facebook. A partir deste objeto de estudo procuramos desenvolver uma abordagem sobre a construção do conceito de cearensidade e como essa forma de identidade cultural é expressa na linguagem local através do humor. Observamos na dicotomia linguagem popular e meios digitais de comunicação um processo de intercâmbio de mensagens através de agentes e meios ligados ao folclore e à cultura popular, denominado folkcomunicação. Procuramos exemplificar com a análise de duas postagens que reúnem a expressão da linguagem popular para apresentar problemas observados pelo personagem sobre questões relacionadas a fatos da vida cotidiana ou da atualidade.

PALAVRAS-CHAVE: cultura regional; folkcomunicação; mídias sociais. 1. Introdução

As experiências de interação entre a cultura popular e tecnologia tem provocado uma

reciprocidade no sentido do acesso aos conteúdos que cada uma delas domina. Partindo

do princípio de cultura como o conjunto de costumes de um povo em todos os níveis,

resultando no desenvolvimento tecnológico e desdobrando-se nas redes sociais

difundidas pelas internet, surgem os pontos principais que foram observados neste

trabalho: a cultura cearense através de seu linguajar e as redes sociais, tendo como o

Facebook exemplo de espaço de difusão de conteúdos.

Tomando como exemplo o personagem “Suricate Seboso” e as tirinhas publicadas em

sua página no Facebook, a pesquisa adentrou no espaço das redes sociais para verificar

1 Trabalho apresentado no DT 8 – Estudos Interdisciplinares do XIX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Nordeste, realizado de 29 de junho a 1 de julho de 2017. 2 Bacharel em Comunicação Social – Habilitação em Jornalismo (UFC). Especialista em Gestão de Produtos e Serviços Culturais (Uece) e Cultura Folclórica Aplicada (IFCE). Mestre em Psicologia pela Universidade de Fortaleza (Unifor). Doutorando em Ócio, Cultura e Comunicação para o Desenvolvimento Humano pela Universidade de Deusto (Bilbao/Espanha). Produtor Cultural do Instituto de Cultura e Arte (ICA) da Universidade Federal do Ceará (UFC). E-mail: [email protected]. 3 Bacharel em Comunicação Social – Habilitação em Jornalismo pela Faculdade Cearense (FaC). Pós-graduando em Marketing Digital e Mídias Sociais pela Universidade de Fortaleza (Unifor). E-mail: [email protected].

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como a linguagem e o humor tipicamente cearenses utilizam dessa ferramenta para se

difundir, em um processo de assimilação das novas tecnologias em favor da

folkcomunicação.

A caracterização da linguagem adotada pelo personagem, com expressões tipicamente

nordestinas como “arri égua”, “armaria, nãm”, “arengar”, inclui até expressões que

estavam caindo em desuso, mas foram trazidas à tona, graças às tirinhas de humor

publicadas na página do Suricate Seboso. Esta pesquisa procurou identificar as origens

do estudo desta linguagem, observando sua relação com o universo da cultura popular

cearense e como esta relação ajudou na construção do perfil do personagem e na

identificação por parte do público, receptor das mensagens. Para tanto, foi definida uma

metodologia partindo da pesquisa bibliográfica, em seguida da coleta de dados de

publicações realizadas durante o mês de Outubro de 2014, e posteriormente a análise

dos dados coletados de acordo com os marcos teóricos previamente estabelecidos.

2. A elaboração do conceito de Cearensidade

Não é de agora que o cearense tem se firmado como um povo de características

próprias, tanto culturais, comportamentais e de convívio social. Essas características

fazem parte da formação da imagem do povo cearense, que com o passar do tempo

deram origem ao conceito de cearensidade. Utilizada de diversas maneiras, essa

expressão remete não só à identidade do cearense, mas a todo um conjunto linguístico,

cultural e territorial que estão agregados a esse povo e sua etnia. Do ponto de vista

histórico, os primeiros sinais de construção do que hoje conhecemos como

“cearensidade” se deram através da literatura de José de Alencar no clássico “Iracema”.

Gilmar de Carvalho (2003) se aprofunda nesse conceito por um prisma étnico, em que o

Ceará desponta em sua construção de raça através da relação romântica entre

colonizadores e índios que aqui habitavam. Ao mesmo tempo em que cita a relação

entre raças, o autor comenta como o negro foi excluído como parte integrante dos povos

que participaram ativamente do povoamento do Ceará. Uma certa historiografia e literatura têm tratado essa cearensidade pelo prisma que a mostra como positiva – tendo como paradigma a miscigenação romântica entre o colonizador português católico e a população autóctone – e seu contraponto negativo, o negro. A consequência disso é uma certa africanofobia paradigmática não só inerente à própria produção literária [...] O indianismo romântico veio fortalecer essa construção de miscigenação romântica – o branco e o

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índio – na criação de José de Alencar em seu livro Iracema. (CARVALHO, 2003, p.13)

A relação do conto de José de Alencar com o termo cearensidade é apresentada

inclusive com viés político, onde apresenta-se o uso do termo como legitimador de

elementos políticos, econômicos ou culturais de igualdade popular, e como estratégia

política do ex-governador Lúcio Alcântara durante discurso em 2004 para diferenciar

simbolicamente seu governo do anterior. [...] a palavra Ceará torna-se recorrente e associasse a ideia do mito fundador Iracema na construção de um discurso de uma cearensidade [...] Ora, este discurso que pode ser analisado a partir do objeto analisado encontra eco em outras práticas políticas desde a nomeação do centro do governo, Palácio Iracema, até discursos proferidos em situações ímpares como justificativa de situações políticas econômicas e como elemento de persuasão e legitimidade de soberania popular, construindo um sentido próprio e estratégico de igualdade popular nomeado cearensidade. Esse discurso foi usado como estratégia de diferenciação simbólica do governo com seu antecessor que o apoiara em campanha. A cearensidade apresentava-se então como uma palavra essencializada, porém fluida com o intuito de abranger o maior número possível de indivíduos. Resgatava em seu cerne o mito de iracemismo cearense, mito de obediência e adaptação. Esta ideia é demonstrada pela maneira que é usada, e sua repetição, no discurso de abertura do ano de 2004 da Assembleia Legislativa do Ceará pelo governador Lúcio Alcântara” (NOVAES, 2008, p.07)

Fica claro o objetivo de iconizar a forma do cearense ser e viver, dando assim corpo ao

conceito de cearensidade. Apesar da discussão sobre raças e etnias como elementos

fundadores do conceito de cearensidade, não podemos deixar de citar um novo

significado que surgiu com o tempo e foi agregado ao conceito. A cearensidade foi

tomando um sentido extra ao representar um elemento forte no comportamento típico de

quem é do Ceará: o humor. No artigo “O Ceará moleque sobe aos palcos: cearensidade

e os shows humorísticos de Fortaleza”, Francisco Secundo da Silva Neto (2010) cita o

romance de Araripe Júnior “O Cajueiro do Fagundes” como fundador do mito do

cearense como um povo moleque. Para isso ele faz uso do termo cearensidade como

forma de definir essa veia irreverente como identidade de quem nasce no Ceará. A ideia segundo a qual certa “irreverência inata” se associa ao “povo cearense” desde tempos antigos aparece colada à denominação em foco no romance de Araripe Júnior. N’O Cajueiro do Fagundes é, pode-se dizer, fundada a criação do mito de que “todo cearense é moleque, gaiato por natureza”. Porém, não quero demonstrar com isso quão falsa ou inverossímil soa essa mitificação. Trata-se, na verdade, de uma interpretação sobre o que faz ser cearense. Uma interpretação

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que foi e é retomada por muitos daqueles que pretendem (ou tentam) descrever uma cearensidade ou uma identidade cultural do Ceará. (SILVA NETO, 2010, p.5)

Atualmente o termo cearensidade tem sido usado popularmente como forma de

substantivação do humor e gaiatice típicos do cearense, deixando de lado em certos

momentos a ideia de identidade cultural propriamente dita. Não excluindo o humor

como elemento de identificação, mas elevando isso como algo latente e acima dos

outros conceitos e ideias que estão relacionadas à palavra, a representação da tal

“cearensidade” acabou mudando a significação com o passar dos anos. Essa nova ideia

de significado para o termo deve-se principalmente a maneira como a mídia tem feito

uso da palavra. Devido ao sucesso de cearenses em concursos televisivos de humor esse

“estigma” se torna cada vez mais forte, ainda que seja levantada a questão da falsa ideia

de que no Ceará todo mundo é “moleque” ou mesmo “humorista”, o que não

corresponde à realidade geral. [...] as narrativas literárias, os relatos memorialísticos, os discursos intelectuais, os programas televisivos e as ações e falas governamentais com relação aos humoristas descrevem e prescrevem uma “cearensidade” fundada na ideia de um Ceará moleque. Tais narrativas, ações e discursos sobre o humor do Ceará tecem uma teia de significados que constituem a cultura cearense e fazem ver e crer que no Ceará é assim mesmo: todo mundo é moleque. (SILVA, 2013, p. 216)

Para analise de nosso objeto de estudo, será feito o uso do termo cearensidade, porém

tomando por conceito tanto seus elementos de linguagem que preconizam uma

identidade regional quanto pelo humor gerado pela utilização desta linguagem.

3. O Cearencês: uma linguagem baseada no cotidiano e no humor

Em seu processo de colonização, desenvolvimento estrutural, social e econômico, o

Ceará sofreu influências fortes de europeus, entre eles franceses, espanhóis e

portugueses. Porém, são partes integrantes e de grande influência cultural neste

processo os índios e os negros, responsáveis pela criação da identidade cultural do

estado e do seu povo, no que concerne inclusive à língua falada no Ceará. Ao lado da pluralidade sociolinguística e cultural, as dimensões territoriais do Brasil e as próprias relações socioeconômicas contribuíram para o desenvolvimento de falares diferentes. Este fenômeno chamado de “variação linguística” é objeto de uma

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infinidade de estudos linguísticos sob diversos enfoques científicos em todo o país. (CARVALHO, 2003, p. 286)

Identificado como “cearês”, “cearencês” ou simplesmente dialeto próprio, o português

falado no Ceará tem características peculiares, expressões e palavras até então usadas e

criadas nessa região. Sobre esses “termos”, há desde a segunda metade do século XIX

registros de estudos de seleção e significação dessas palavras que fazem parte do

vocabulário do cearense, como mostra o estudo “Vocabulário Indígena em uso na

Província do Ceara” de Paulino Nogueira (1887). O autor lista palavras usadas na antiga

província do Império de Portugal, que teriam origem no vocabulário dos índios que

habitavam o atual estado do Ceará. Além de Paulino Nogueira, Florival Seraine é outro

nome de importância no estudo do “cearencês”. Seraine reforça a ideia da importância

da linguagem dos índios nativos na formação do português falado atualmente no estado. Devemos, porém, frisar que se a contribuição tupi foi a mais considerável naquilo que houve permanecido em nossa linguagem de raiz aborígene, outros idiomas indígenas devem ter exercido alguma actuação sobre o português que falamos pois o Ceará foi abrigo de avultado número de membros das famílias tapuia e cariri. (SERAINE, 1950, p. 5)

Outra referência sobre a linguagem regional quando trata das populações que viviam no

sertão cearense, está na obra “Terra de Sol”, publicada por Gustavo Barroso em 1912,

onde são observadas as formas de falar do povo “rude”, ainda que no linguajar haja uma

permanência de vocábulos do que é considerada a língua culta: Mas, de quando a quando, rebrilha no meio das suas frases toscas uma expressão antiquíssima, espanhola, ou uma palavra clássica, como que perdida a algaravia má à maneira de verde copa de juazeiro no meio da selva garranchenta e preta: “entonces”; “para todas las bandas”; está doente, “acamado”; canta um “acalanto”. (BARROSO, 2003, p.196)

Entretanto, quando se trata do “cearencês” a origem de alguns de seus termos vai além

da influência de dialetos indígenas, de origem africana ou europeia. Algumas palavras

utilizadas tem origem em episódios engraçados que fazem parte da história do estado e

às vezes desconhecida da maioria das pessoas, inclusive dos próprios cearenses. Como

exemplo, temos termo “ispilicute”, usada inclusive pelo personagem “Suricate Seboso”

em algumas de suas tirinhas. Gadelha (1999) indica que a palavra tem origem na

expressão da língua inglesa “She's pretty cute!”, ou seja, engraçadinha, pimentinha,

normalmente utilizada para crianças do sexo feminino.

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Além das palavras, suas origens e significados, outra marca do cearencês e das tirinhas

do personagem “Suricate Seboso” é a forma como o cearense pronuncia algumas

palavras, ou seja, o sotaque. Nas tirinhas o personagem transcreve as palavras

exatamente como são pronunciadas povo comum da periferia de Fortaleza, capital do

estado do Ceará. Florival Seraine (1950) cita as alterações “prosódicas dos fonemas

portugueses” graças à influência do tupi, língua indígena falada inclusive por algumas

tribos de índios que habitavam o estado, e posteriormente por alguns colonizadores.

Sobre esse fenômeno, Seraine (1950) cita a “pronúncia brevíssima ou elisão de

consoantes finais” onde algumas palavras recebem a seguinte pronúncia: fazemos

(fazemo), demos (demo), viajem (viaje) e etc. Outro exemplo é a queda do “d” na

pronúncia de algumas palavras como falando (falano), vendo (veno), saindo (saino) e

etc; que se aplica tanto à fala do cearense do interior como das periferias da capital.

Reforçando a presença das línguas de origem indígena na formação do “cearencês”,

Seraine (1950) apresenta a “vocalização do grupo lh em i, por não existir o mesmo no

tupi-guarani” observando-se: mulher (muié), filho (fio), espelho (espêio) e etc. Essa

forma inculta de pronúncia é a mesma que Diego Jovino, criador do “Suricate Seboso”,

usa para transcrever as falas dos personagens em suas tirinhas.

Mais do que palavras de uso e origem regionais ou um sotaque forte e característico dos

cearenses, o cearencês bebe de outras fontes, como o humor típico de quem nasce no

estado do Ceará, sua veia natural para a graça e outras tantas relações entre o cearense e

o riso, seriam de forte influência para a perpetuação e disseminação do cearencês. [...] estimulados pelo sucesso de humoristas do Ceará e pelo que consideram ser uma característica, dos cearenses: a “mangação”, o “boceno”, a “molecagem”, enfim a “irreverência”, a “veia humorística”. Esse “jeito cearense”, conforme revelam os dicionários, teria relação direta com um “jeito de falar cearense”. (CARVALHO, 2003, p. 289)

O personagem “Suricate Seboso” tem feito uso da rede social Facebook para,

diretamente ou não, expor essa linguagem regional e outros aspectos culturais do Ceará.

Seja fazendo piada com o Sol que castiga o cearense, ou com a dificuldade em subir em

ônibus lotado, ou abusando da “gaiatice” ao debochar daqueles que são preconceituosos

com seus conterrâneos, o objeto aqui analisado evoca uma forma de fazer humor típico

dos cearenses, ao fazer graça dos próprios infortúnios, sendo cruel às vezes, como

explica Montenegro (2001). As piadas retratando situações cotidianas são um costume

antigo entre grandes nomes do Ceará, Lima (2013) cita Paula Ney, Quintino Cunha e

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Leonardo Mota como personagens do Ceará, que assim como o “Suricate Seboso”

utilizavam de fatos do cotidiano para fazer graça.

4. “Suricate Seboso” e a valorização da linguagem regional

Através dos processos de comunicação que se compartilham ideais, sentimentos e

impressões sobre a vida cotidiana. Ao pesquisar os elementos que constituem hoje uma

comunicação popular revela-se uma percepção na qual os processos se realizam de

forma ampla, podendo ir além do meio comunicativo em si, pois é a dinâmica social que

vai lhe dar significados. Compreendemos o sistema de comunicação popular como o

conjunto de agentes, meios, métodos e técnicas de que se valem os grupos

marginalizados da sociedade (BELTRÃO, 2004). Neste contexto, quatro são as formas

de apresentação de comunicação popular destacadas por Joseph Luyten (1988): oral,

escrita, gestual e plástica. Temos no nosso estudo a relação da forma oral com a escrita,

onde se observa a utilização de anedotas, provérbios e contos para tematizar as tirinhas

produzidas.

Nestas formas pelas quais o povo se expressa a respeito de determinados assuntos, ou

seja, se comunicam, são formulados processos de interação que se fazem através da

troca de ideias e experiências, informações, utilizando linguagens verbais e não verbais,

canais naturais e artificiais para obtenção de conhecimentos, que por consequência se

desdobra em elaboração e difusão de mensagens, e participação e integração social pela

comunicação. É com essa perspectiva de difusão de conteúdos populares através de

meios midiáticos que levou Luiz Beltrão a desenvolver o conceito de folkcomunicação,

procurando esclarecer as estratégias e mecanismos adotados pelos agentes

folkcomunicacionais no sentido de tornar compreensíveis fatos (informações), ideias

(opiniões) e diversões (MELO, 2008).

Se o personagem “Suricato Seboso” ao utilizar-se de linguajar popular, e pelo próprio

contexto de vida de seu criador, encontra-se no campo da comunicação popular,

percebe-se a relevância da observação de Beltrão na qual considera a categoria do povo

também como classe marginalizada e desapropriada de recursos comunicativos formais. Como se informavam as populações rudes e tardias do interior de nosso país continental? Por que meios, por quais veículos manifestavam o seu pensamentos, a sua opinião? Que espécie de jornalismo, que forma - ou formas - atenderia à sua necessidade vital de comunicação? Teria essa espécie de intercâmbio de informações e

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idéias algo em comum com o jornalismo, que passei a classificar de “ortodoxo”? (BELTRÃO, 2001, p.74)

Partindo destes elementos inerentes aos conceitos da folkcomunicação, passamos a

descrever o personagem “Suricate Seboso” e sua forma de expressão através das

postagens no Facebook, para que compreendamos as relações estabelecidas com a

necessidade de se criar uma “voz” de expressão popular em um contexto das novas

tecnologias de informação. Criado em 12 de dezembro de 2012, pelo fortalezense Diego

Jovino, a página “Suricate Seboso”4 é destaque no Facebook através de suas tirinhas em

que representa de forma bem humorada, o humor e a cultura do povo cearense,

atualmente a página acumula 5.808.916 curtidas. De acordo com a própria publicação

do autor, ele explica que: O Suricate Seboso foi criado pelo fortalezense "Diego Jovino", a página mostra de uma forma bem humorada os costumes, cotidiano, tradições, lendas, paisagens, comidas típicas, frutas da região e muitas outras coisas do Nordeste brasileiro. A página preza muito por um linguajar bem puxado mesmo do Nordestino, com tirinhas que muitas vezes são incompreensivas pra quem não é nordestino, por conter palavras que são somente de nosso entendimento. Hoje em dia já se tornou mais que entretenimento, virou também uma empresa com produtos e serviços! (SURICATE SEBOSO, 2014)

Em suas publicações a página retrata de forma divertida episódios do cotidiano

cearense, piadas, causos, personagens da cultura do Ceará e outros aspectos típicos do

cotidiano de quem nasceu no estado. Através de tirinhas, usando sempre o rosto do

roedor comum nas savanas africanas, o suricato, são projetadas essas situações

cotidianas do cearenses. Segundo Diego Jovino, criador do personagem, a escolha do

suricate se deu pelo fato de ser um animal com grande diversidade de imagens

disponíveis na web, como ele próprio explicou em entrevista para o site Tribuna do

Ceará. Após acessar páginas regionais no Facebook, resolveu criar o Suricate Seboso. ‘Suricate’ porque é um animal que possui grande diversidade de imagens disponíveis na internet. “Tem foto de todo tipo. Umas parecem que ele está sorrindo, outras chorando. Pequenininho, grande, feio e bonito. É muito caricato”, conta. Escolheu ‘Seboso’ porque o cearense gosta de chamar o outro já “frescando”, como ele próprio explica. (TRIBUNA DO CEARÁ, 2013)

4 https://www.facebook.com/suricateseboso.

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É importante citar que o “Suricate Seboso” não é a única página no facebook dedicada a

fazer humor usando características regionais de estados do nordeste brasileiro.

Semelhante a ela existem também as páginas do “Bode Gaiato”5, criada em 2013 por

um jovem da cidade do Recife, e também as páginas paraibanas Esquilo Lombroso6 e

Calango Mancoso7, que inclusive foram a inspiração para a criação do “Suricate

Seboso”. A ideia começou a surgir depois que o jovem cearense conheceu as páginas Esquilo Lombroso e Calango Mancoso, ambas da Paraíba. A proposta era a mesma: Pegar um animal, colocar um adjetivo engraçado e usar diálogos típicos dos nordestinos. “A diferença é que as expressões deles eram mais direcionadas àquele Estado. Eu queria algo do Ceará”, conta Diego. (PORTAL O DIA, 2013)

Atualmente além da página no Facebook, o personagem também possui uma conta na

rede social Instagram8, onde também compartilha suas tirinhas, um canal no Youtube9,

onde são postadas sátiras de músicas brasileiras com letras que falam do cotidiano e

problemas do povo cearense, além de animações inspiradas no personagem, um perfil

no Twitter10 e o site oficial do “Suricate Seboso”11.

Figura 1 - Página Suricate Seboso no Facebook (Acessado em 3 de maio de 2017).

5 https://www.facebook.com/ObodeGaiato. 6 https://www.facebook.com/EsquiloLombroso. 7 https://www.facebook.com/CalangoMancoso. 8 http://instagram.com/suricatesebosooficial. 9 https://www.youtube.com/user/SuricateOficial. 10 https://twitter.com/suricateseboso. 11 http://suricateseboso.com.br.

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Esta apropriação das tecnologias da informação para a elaboração e difusão de

conteúdos tem se consolidado nos últimos anos com o advento da internet e

posteriormente a criação de chats e fóruns de discussão. Assim surge uma nova forma

de fazer comunicação, através de novas ferramentas ou comunidades virtuais que agem

como ponto de partida para uma nova forma de fazer o que chamamos de sociedade,

como afirma Costa (2008). Isso é observado através das formas de interação social,

possível graças a esses mecanismos. Logo em seguida surgem as redes sociais,

integrantes da Web 2.0, que dão início às redes colaborativas, onde esse processo de

comunicar é feito através da adição e troca de informações e arquivos, como textos,

fotos e vídeos. Santaella usa a abreviação RSIs para definir o que ela chama de Redes

Sociais da Internet.

As RSIs são plataformas-rebentos da Web 2.0, que inaugurou a era das redes colaborativas, tais como wikipédias, blogs, podcasts, o Youtube, o Second Life, o uso de tags (etiquetas) para compartilhamento e intercâmbio de arquivos como no Del.icio.us e de fotos como no Flickr e as RSIs, entre elas o Orkut, My Space, Goowy, Facebook e Twitter [...]. (SANTAELLA, 2010, p.7)

Seja através das páginas ou através dos perfis, o Facebook surge como uma ferramenta

de divulgação e disseminação de informações, pontos de vista e, claro, aspectos

culturais. Costa (2008) comenta sobre a necessidade de comunicação do indivíduo

inserido dentro dessas redes e como esse processo se dá. Todo mundo faz comunicação. Há os que querem dizer muitas coisas, e há os que desejam se encontrar com esse pessoal falante. Muitos querem ouvir música, outros desejam copiar imagens. Um número imenso de seres humanos tem injustiças a denunciar e sofrimentos a expressar. Em toda esquina, gente quer contar uma história, oferecer um conselho. Sempre há perguntas e pedidos de todo tipo, e algumas vezes temos experiências para tocar. Em meio a esse alvoroço, está em curso uma mutação profunda nas formas de comunicação, no modo como as mensagens são construídas e medidas. Essa mutação é parte da revolução digital que vivemos há mais de uma década. (COSTA, 2008, p. 81)

O que no começo era apenas uma diversão acabou se tornando uma fonte de renda para

o criador da página. Diego Jovino, que trabalhava como atendente em uma loja de

informática, deixou o emprego, em que ganhava menos de um salário mínimo, para se

dedicar exclusivamente à página do “Suricate Seboso”. Atualmente é com o dinheiro

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que ganha através do personagem que Diego custeia seu Curso de Publicidade e

Propaganda em uma instituição de ensino superior. É interessante perceber a internet e

as redes sociais como fonte de renda para os jovens, como é o caso citado acima.

Todo o destaque que a página recebeu alcançando notoriedade no mercado publicitário

se deve ao sucesso que ela teve na internet. Em entrevista para o portal G1, Diego

afirma que algumas das tirinhas publicadas na página chegaram a ter mais de 50 mil

compartilhamentos. Segundo o próprio criador, o fato das pessoas se identificarem com

as situações retratadas nas publicações e com a linguagem utilizada pelo personagem foi

o que fez o “Suricate Seboso” ser uma página de sucesso e de peso regional e nacional. “Faz tanto sucesso porque antes não havia algo que o pessoal (cearenses) se identificasse. O que se via eram expressões de fora. O Suricate traz o jeito do cearense falar, as coisas que vivemos, a realidades das escolas. O pessoal tem orgulho do nosso jeito. Eu não via isso muito na internet”, explica. Diego também afirma que vê o jeito Suricate Seboso na "boca" dos cearenses. Entre as expressões popularizadas com o perfil, estão “armaria nam”, que vem do “ave, Maria” para demonstrar negação, e “uri cumpadi”, uma exclamação que indica espanto. A forma de escrever das postagens é como é dita nas ruas. “A gente escreve do jeito que fala propositalmente. A ideia é escrever o jeito que a gente fala”, diz. Além das memórias, Diego Jovino conta com a contribuição dos internautas que enviam diariamente sugestões de postagens. Por dia, ele recebe mais de 100 mensagens com situações e expressões vistas no Ceará. (G1, 2013)

Através de uma análise rápida das tirinhas do “Suricate Seboso”, é notório que o

aspecto regional mais visível nas publicações é justamente a linguagem, o sotaque e a

forma como isso é representado por ele. A escrita das palavras exatamente como boa

parte dos cearenses as pronunciam é mais um elemento que reforça o personagem como

um representante da cultura cearense dentro das redes sociais.

Neste artigo exemplificamos o tipo de postagem através de duas características

observadas de acordo com o contexto nas quais foram publicadas. No primeiro

exemplo, a imagem foi postada seis dias depois do primeiro turno da eleição para

presidente em 2014. Na época, então presidenta do Brasil Dilma Rousseff (PT) foi para

o segundo turno com o candidato pelo PSDB, Aécio Neves. O país passava por um

momento político importante e estava “dividido” entre aqueles que queriam uma nova

presidência para o país e os que preferiam manter a atual presidenta no poder,

conjuntura essa vista nas ruas e nas conversas entre amigos.

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Figura 2 - Politica e as relações sociais (Acessado em 11 de Outubro de 2014).

Na tirinha houve uma tentativa de representar com humor essa divisão entre os eleitores,

na imagem o episódio se passa na Praça do Ferreira, ponto histórico de Fortaleza, e

mostra o encontro a princípio amigável entre dois eleitores com escolhas políticas

opostas. Na última tirinha algumas expressões regionais chamam a atenção, como é o

caso de “mah” que na verdade é abreviação de “macho” ou “macho véi” que segundo

Pascoal (2006, p. 96) é um uma forma de “tratamento dispensada a amigo ou velho

conhecido”, depois de alguns xingamentos como “praga burra”, é importante observar o

momento em que as relações pessoais na vida real se entrelaçam com o virtual, quando

o suricato da direita afirma que irá “excluir do face” (abreviação de Facebook) o

“colega” de visão política diferente.

No segundo caso, a tirinha destaca a preconceito contra os nordestinos, onde o criador

da imagem resolveu representar a paisagem do semiárido e, para isso, fez uso do

mandacaru, planta símbolo do sertão. Outro aspecto importante é o fato de que nessa

tirinha não há o uso da grafia de acordo com a pronúncia, a escrita das palavras nesse

caso está de acordo com as normas do português. Seria essa uma tentativa de se

transmitir um pouco mais de seriedade com o assunto tratado?

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Figura 3 - Preconceito com os Nordestinos (Acessado em 08 de Outubro de 2014).

Usando da ironia, ele pede ao leitor que foi vítima de preconceito, apesar de não

expressar a que tipo de preconceito se refere, seja ele racial, sexual, ou outro qualquer,

que seja educado e que “mande” o sujeito preconceituoso “se lascar”. Mais uma vez a

expressão é utilizada em uma das publicações, e sempre ligada ao discurso de protesto

contra o preconceito. Não por coincidência, essa imagem foi postada no dia 08 de

outubro, data em que se comemora o dia do nordestino, porém em vez de enaltecer

alguma característica da região ou do seu povo, ou simplesmente parabenizar aos

nordestinos pelo dia, optou-se por posicionar-se contra o preconceito regional.

Essa reflexão do uso das redes sociais como ferramenta de comunicação é importante e

se aplica diretamente ao nosso objeto de estudo. Durante a pesquisa, discutimos sobre a

formação da imagem do Ceará, cultura, linguagem, e no tópico seguinte apresentaremos

algumas da tirinhas do “Suricate Seboso” que exemplificam toda a discussão teórica

apresentada até o momento.

5. Considerações finais

É importante reconhecer a influência exercida pela página na disseminação da cultura

cearense além dos limites da região Nordeste. Foram considerados alguns pontos

importantes para a construção do personagem, como o humor, o sotaque, representado

pela escrita semelhante ao modo de falar e de se expressar do cearense, além das gírias e

expressões regionais. Consideramos que nenhuma mensagem é neutra, intencionalmente

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ou não, ela é carregada de sentidos e, nesse contexto, entra a pesquisa, justamente para

entender como essa cultura local vem sendo difundida no Facebook e respectivamente

no ciberespaço, através da página do “Suricate Seboso”. No caso do objeto, trata-se da

junção de imagens e texto na formação e reforço do sentido, como aborda Guimarães

(2013).

A pesquisa procurou observar como o personagem tem retratado a forma do cearense

falar, seus costumes, e feito humor através disso, recuperando e trazendo à tona alguns

questionamentos que envolvem o objeto de pesquisa, tanto de um ponto de vista social

quanto linguístico. Se olharmos por um prisma amplo, numa sociedade extremamente

globalizada e conectada, as tecnologias digitais e redes sociais tendem a reduzir as

fronteiras culturais, dessa maneira diversas outras culturas estão ao nosso alcance com

um clique do mouse. O personagem pesquisado vai na contramão de tudo isso ao

potencializar o que já é daqui, valorizando o regional, o que é do Ceará.

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