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RAC, Edição Especial 2004: 203-227 203 A Dimensão Estratégica das Redes Horizontais de PMEs: Teorizações e Evidências Alsones Balestrin Lilia Maria Vargas RESUMO No presente artigo é feita uma reflexão sobre o tema redes interorganizacionais, envolvendo aspectos teóricos e conceituais das tipologias de redes interorganizacionais e de redes horizontais de pequenas e médias empresas (PMEs), conduzindo o debate para uma tese central: a configuração em rede como recurso estratégico para a competitividade das PMEs. Na seqüência do artigo, são apresentados os aspectos metodológicos e os resultados de um estudo de caso realizado em uma rede horizontal de cooperação formada por 44 PMEs da indústria de confecções, localizada na Região Sul do Brasil. As evidências teóricas e empíricas sinalizam que a configuração em rede permite às PMEs alcançarem os seguintes benefícios: maiores trocas de informações e conhecimentos entre as empresas, participação e vendas de produtos em feiras, lobbying, melhorias nos processos empresariais, participação de palestras e de cursos de formação, barganha de preço junto aos fornecedores, marketing conjunto, acesso a novos representantes, maiores garantias no fornecimento de crédito aos clientes, maior facilidade de comercialização de insumos entre as empresas e ganhos de economias de escala, de escopo e de especialização. Palavras-chaves: redes; cooperação; pequenas e médias empresas; estratégia. ABSTRACT The present article reflects upon the interorganizational networks topic, dealing with theoretical and conceptual aspects of the typologies of interorganizational networks and horizontal networks of small and medium organizations (SMOs), leading the debate to the central thesis: the network configuration as a strategic resource for competitiveness of the SMOs. Next, the methodological aspects are presented, as well as the results of a case study developed with a horizontal network of cooperation comprised by 44 SMOs of the clothing industry, located in the South Region of Brazil. Theoretical and empirical evidences indicate that the network configuration allows the SMOs to achieve benefits such as: greater information and knowledge exchange between companies, participation and sales of products in expositions, lobbying, improvement of enterprise processes, participation in conferences and training courses, price bargaining with suppliers, joint marketing, access to new representatives, greater guarantees in providing credit to customers, facilitated sales of inputs between companies, and gains in economies of scale, scope and specialization. Key words: networks; cooperation; small and medium organizations; strategies.

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RAC, Edição Especial 2004: 203-227 203

A Dimensão Estratégica das Redes Horizontais de PMEs:Teorizações e Evidências

Alsones BalestrinLilia Maria Vargas

RESUMO

No presente artigo é feita uma reflexão sobre o tema redes interorganizacionais, envolvendo aspectosteóricos e conceituais das tipologias de redes interorganizacionais e de redes horizontais de pequenase médias empresas (PMEs), conduzindo o debate para uma tese central: a configuração em redecomo recurso estratégico para a competitividade das PMEs. Na seqüência do artigo, são apresentadosos aspectos metodológicos e os resultados de um estudo de caso realizado em uma rede horizontalde cooperação formada por 44 PMEs da indústria de confecções, localizada na Região Sul doBrasil. As evidências teóricas e empíricas sinalizam que a configuração em rede permite às PMEsalcançarem os seguintes benefícios: maiores trocas de informações e conhecimentos entre asempresas, participação e vendas de produtos em feiras, lobbying, melhorias nos processosempresariais, participação de palestras e de cursos de formação, barganha de preço junto aosfornecedores, marketing conjunto, acesso a novos representantes, maiores garantias no fornecimentode crédito aos clientes, maior facilidade de comercialização de insumos entre as empresas e ganhosde economias de escala, de escopo e de especialização.

Palavras-chaves: redes; cooperação; pequenas e médias empresas; estratégia.

ABSTRACT

The present article reflects upon the interorganizational networks topic, dealing with theoreticaland conceptual aspects of the typologies of interorganizational networks and horizontal networksof small and medium organizations (SMOs), leading the debate to the central thesis: the networkconfiguration as a strategic resource for competitiveness of the SMOs. Next, the methodologicalaspects are presented, as well as the results of a case study developed with a horizontal network ofcooperation comprised by 44 SMOs of the clothing industry, located in the South Region of Brazil.Theoretical and empirical evidences indicate that the network configuration allows the SMOs toachieve benefits such as: greater information and knowledge exchange between companies,participation and sales of products in expositions, lobbying, improvement of enterprise processes,participation in conferences and training courses, price bargaining with suppliers, joint marketing,access to new representatives, greater guarantees in providing credit to customers, facilitated salesof inputs between companies, and gains in economies of scale, scope and specialization.

Key words: networks; cooperation; small and medium organizations; strategies.

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INTRODUÇÃO

A reconhecida importância no campo organizacional e social tem demandadocrescente interesse nas pesquisas sobre o fenômeno das redes interorganizacionaisnas mais variadas áreas do conhecimento, como a economia, a sociologia, aciência política e a administração. A idéia subjacente aos interesses de estudo éde que a configuração em rede promove ambiente favorável ao compartilhamentode informações, de conhecimentos, de habilidades e de recursos essenciais paraos processos de inovação. A configuração em rede consiste, então, em formaeficaz para as empresas alcançarem competitividade nos mercados por meio decomplexo ordenamento de relacionamentos, em que as firmas estabelecem inter-relações.

O interesse por tal temática vem sendo motivado pela reflexão de alguns autoresestrangeiros, como Perrow (1992) e Human e Provan (1997), que associaram atipologia das redes de cooperação ao desempenho das pequenas e médiasempresas (PMEs), ou pelos trabalhos desenvolvidos por autores brasileiros, comoCasarotto e Pires (1999), ao estudarem o comportamento das PMEs do Norte daItália, e Amato Neto (2000), ao apresentar exemplos de redes interorganizacionaisnos países da América do Sul. A revisão analítica da literatura sobre essa temáticapermitiu a compreensão da relevância estratégica das redes em ambientescompetitivos, sobretudo por facilitar a sinergia de esforços entre PMEs na direçãode objetivos comuns. No presente artigo, serão aprofundadas algumas teorizaçõessobre as redes horizontais de cooperação, apresentando-se como objetivo centrala identificação de evidências teóricas e empíricas sobre a possibilidade delasservirem como recurso estratégico para melhorar o desempenho competitivodas PMEs.

Para alcançar o objetivo proposto, o artigo está estruturado da seguinte forma:(1) reflexão sobre o tema redes interorganizacionais, abordando-se algumasdefinições conceituais e as principais correntes teóricas utilizadas no seu estudo;(2) apresentação das diferentes tipologias de redes, encaminhando-se o debatepara as características específicas das redes de PMEs; (3) desenvolvimento dealgumas teorizações sobre a temática central, ou seja, os aspectos estratégicosdas redes horizontais para a competitividade das PMEs; (4) síntese da metodologiautilizada na pesquisa e na análise dos principais resultados de um estudo de casorealizado em uma rede horizontal de cooperação, formada por 44 PMEs daindústria de confecções, localizada na Região Sul do Brasil; e (5) consideraçõesrelativas às implicações e limitações do estudo.

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REDES INTERORGANIZACIONAIS

O termo rede não é novo e apresenta diversos significados e aplicações nosmais variados contextos, há algum tempo. Originalmente, ele se reportava a umapequena armadilha para capturar pássaros, formada por um conjunto de linhasentrelaçadas, cujos nós eram formados pelas intersecções das linhas (Marcon eMoinet, 2000). No século XIX, esse termo adquiriu sentido mais abstrato,denominando todo o conjunto de pontos com mútua comunicação. Autores comoFombrun (1997) e Castells (1999) definem rede como um conjunto de nósinterconectados, possibilitando que esse conceito amplo seja utilizado em diversasáreas do conhecimento. No campo de estudos das ciências sociais, o termo rededesigna um conjunto de pessoas ou organizações interligadas direta ouindiretamente (Marcon e Moinet, 2000).

Para Castells (1999) a intensidade e a freqüência da interação dos atores sociaissão maiores se esses atores forem nós de uma rede do que se não pertencerem àela. Observa-se que as redes intensificam a interação, promovendo reduçãoespaciotemporal nas inter-relações dos seus atores, como fatores altamenteestratégicos para a competitividade das organizações do século XXI (Fayard, 2000).

No campo organizacional, a noção de rede é aplicada a uma ampla variedadede formas de relações entre firmas, como, por exemplo, no caso de joint ventures,alianças estratégicas, relações de terceirização e subcontratação, distritosindustriais, consórcios, redes sociais, redes de cooperação entre pequenas e médiasempresas, entre outras (Powell, 1987; Oliver, 1990; Grandori e Soda, 1995).Isso ocorre pelo fato de a noção de rede ser suficientemente abstrata. Para Fombrun(1997) o conceito de rede tem sido empregado para caracterizar um conjunto defluxos, por exemplo, recursos e informações, entre um conjunto de nós, porexemplo, indivíduos, grupos, organizações e sistemas de informações.

O amplo escopo conceitual do termo rede proporcionou seu interesse por crescentenúmero de pesquisadores na área de ciências sociais. Segundo levantamentorealizado por Oliver e Ebers (1998) no período de 1980 a 1996, em quatro dasprincipais publicações sobre estudos organizacionais, havia um total de 158 artigosque tratavam explicitamente sobre o tema redes interorganizacionais. As publicaçõesestavam assim distribuídas: American Sociological Review (26 artigos),Administrative Science Quarterly (55 artigos), Academy of Management Journal(34 artigos) e Organizations Studies (43 artigos). Esses dados indicam a crescentepreocupação com uma melhor compreensão do fenômeno de redes, tanto no campoorganizacional quanto no campo social.

Para Nohria e Eccles (1992) existem três razões principais para o aumento do

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interesse no tema sobre redes nos estudos organizacionais: (1) a emergência danova competição, como a que está ocorrendo nos distritos industriais italianos edo Vale do Silício. Se o velho modelo de organização era a grande firma hierárquica,o modelo da organização considerada característica da nova competição é a redede inter-relações laterais intra e interfirmas; (2) o surgimento das tecnologias deinformação e de comunicação (TICs) tornaram possível uma maior capacidade deinter-relações de firmas dispersas; e (3) a consolidação da análise de redes comodisciplina acadêmica, não restrita somente a alguns grupos de sociólogos, masexpandida para ampla interdisciplinaridade dos estudos organizacionais.

Observa-se que o reconhecimento do ponto de vista teórico ocorre pelo fato deas redes poderem ser, e na verdade são, estudadas a partir de diferentes abordagensteóricas. Os estudos sobre redes oferecem preciosa base de interesses comuns eum potencial diálogo entre os vários ramos da ciência social. Isso se torna evidentea partir dos estudos de Caglio (1998) e Oliver e Ebers (1998), ao identificarem queas investigações sobre redes interorganizacionais foram conduzidas com base nasseguintes correntes teóricas: (1) economia industrial – identificou diferentes classesde custos de produção, como economias de escala, de escopo, de especialização ede experiência, como variáveis explicativas da eficiência das redes (Teece, 1980;Eccles, 1981; Turati, 1990); (2) estratégias interorganizacionais – destacaram aconfiguração em rede como fator estratégico para o alcance e a manutenção devantagens competitivas (Jarillo, 1988; Fayard, 2000; Marcon e Moinet, 2000); (3)dependência de recursos – salientou que um dos fortes condicionantes na formaçãodas redes interorganizacionais é a necessidade da empresa de buscar recursoscomplementares, sejam eles tangíveis (tecnologia, matéria-prima etc.) ou intangíveis(informação, conhecimento, habilidades etc.) (Pfeffer e Salancik, 1978); (4) redessociais (social networks) – evidenciaram que a posição dos atores em uma redeinfluencia a organização de seus membros e apresenta forte influência nas inter-relações junto à rede (Burt, 1992; Powell, 1996); (5) custos de transação –consideraram as redes como ótimas formas para reduzir a incerteza, o risco e aineficiência nas transações da empresa com seu ambiente econômico, reduzindo,assim, seus custos nas transações econômicas (Powell, 1987; Jarillo, 1988); (6)teoria institucional – constatou que as organizações buscam ganhar legitimidadejunto ao seu ambiente institucional no momento de se estruturarem em rede(Dimaggio e Powell, 1983; Grabher, 1993); e (7) teorias críticas e radicais –questionaram o argumento da eficiência na formação das redes e destacaram queestas são formadas por representarem poderosos instrumentos na formação de elitese classes dominantes, bem como o exercício do poder e da dominação (Perucci ePotter, 1989; Salancik, 1995).

É importante salientar que, mesmo não sendo uma unanimidade no campocientífico, essas diversidades teóricas e paradigmáticas não devem ser vistas

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como excludentes, e sim como complementares para o estudo das redes. Olivere Ebers (1998) assinalam a necessidade de utilizar múltiplas lentes teóricas eparadigmáticas com o objetivo de fazer uma leitura mais completa dacomplexidade das redes. Esse debate sugere a reflexão da necessidade de opesquisador libertar-se da vinculação a uma única maneira de enfocar a realidade,buscando utilizar, em suas pesquisas, teorias e metodologias complementaresem amplas formas de triangulação.

Tipologias de Redes Interorganizacionais

A diversidade de tipologias de redes interorganizacionais provocou certaambigüidade no próprio entendimento do termo. Essa questão foi objeto da análisede Castells (1999), com base no argumento de que as redes interorganizacionaisaparecem sob diferentes formas, em diferentes contextos e a partir de expressõesculturais diversas. Exemplo disso são as redes familiares nas sociedades chinesas;as redes de empresários oriundos de ricas fontes tecnológicas dos meios deinovação, como no Vale do Silício; as redes hierárquicas comunais do tipo keiretsujaponês; as redes organizacionais de unidades empresariais descentralizadas deantigas empresas verticalmente integradas e forçadas a se adaptarem às realidadesatuais; as redes horizontais de cooperação, como as existentes no norte da Itália,e as redes internacionais resultantes de alianças estratégicas entre grandesempresas que operam em diversos países.

Na tentativa de oferecer melhor compreensão da diversidade de tipologias deredes interorganizacionais, Marcon e Moinet (2000) criaram um gráfico denominadomapa de orientação conceitual, indicando, a partir de quatro quadrantes, as principaisdimensões sobre as quais as redes são estruturadas (vide Figura 1).

Figura 1: Mapa de Orientação Conceitual

Fonte: adaptado pelos autores do modelo de Marcon e Moinet (2000).

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Segundo as orientações desse mapa conceitual, pode-se observar que o eixovertical se relaciona com a natureza dos elos gerenciais estabelecidos entre osatores da rede. Tais elos podem representar uma atividade de cooperação, nocaso de uma rede horizontal, como as redes de cooperação entre PMEs; ou graude ligação hierárquico, no caso de uma rede vertical, como uma rede do tipomatriz/filial. Já o eixo horizontal representa o grau de formalização estabelecidonas relações entre os atores. Esse grau pode mover-se de uma conveniência in-formal entre os atores, no caso de relações de amizade, afinidade e parentesco,tais como ocorrem nas associações, nos clubes, nas redes de amigos, até rela-ções formalmente estabelecidas por contratos entre as partes, no caso de contra-tos jurídicos, como ocorre na formação de joint-ventures.

Deve-se destacar que, em cada um dos diversos pontos do quadrante, poderáser encontrado um tipo particular de configuração de rede, elucidando, assim, aampla diversidade de tipologias de redes interorganizacionais existentes. Logo,de acordo com as orientações do mapa conceitual (vide Figura 1) e com as evi-dências de outros estudos, as redes podem ser amplamente classificadas, comose explica a seguir.

. Redes verticais: a dimensão da hierarquia. Certas redes têm clara estruturahierárquica. Segundo Marcon e Moinet (2000), essa configuração é utilizada,por exemplo, pelas grandes redes de distribuição que adotam a estratégia deredes verticais para estarem mais próximas do cliente, como as grandes redesde distribuição integradas, distribuição alimentar e bancos. Em geral, essasrelações são semelhantes às estabelecidas entre matriz/filial, em que as filiaispossuem pouca autonomia jurídica e administrativa. A essa dimensão hierár-quica subjaz a noção de empresa em rede, com a qual são designadas asempresas cuja organização adota a configuração de rede em razão da disper-são espacial.

. Redes horizontais: a dimensão da cooperação. As redes de cooperaçãointerfirmas são constituídas por empresas que guardam cada uma sua indepen-dência, mas que optam por coordenar certas atividades específicas de formaconjunta, com os seguintes objetivos: criação de novos mercados, suporte decustos e riscos em pesquisas e desenvolvimento de novos produtos, gestão dainformação e de tecnologias, definição de marcas de qualidade, defesa de inte-resses, ações de marketing, entre outros. Essas redes constituem-se sob a di-mensão da cooperação de seus membros, que escolhem a formalização flexí-vel para melhor adaptar a natureza de suas relações. Nesse modelo de coopera-ção interorganizacional, existe grande heterogeneidade de formas, como osconsórcios de compra, as associações profissionais, as redes de lobbying e asalianças tecnológicas (Marcon e Moinet, 2000). Em termos de estratégia em

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rede, as relações interfirmas formam ambiente de aprendizagem por meio dacooperação. Essas relações são complexas, junto às quais os atores concorren-tes escolhem cooperar dentro de certo domínio. Assim, as redes favorecem aconcentração de esforços, sem privar a liberdade de ação estratégica de seusmembros.

. Redes formais: a dimensão contratual. Knorringa e Meyer-Stamer (1999)defendem que algumas redes são formalizadas por meio de termos contratuais,que estabelecem regras de conduta entre os atores. Redes como as aliançasestratégicas, os consórcios de exportação, as joint-ventures e as franquias sãoexemplos de redes fortemente formalizadas.

. Redes informais: a dimensão da conivência. As redes de conivência permi-tem os encontros informais entre os atores econômicos (empresas, organiza-ções profissionais, instituições, universidades, associações etc.), portadoresde preocupações semelhantes. Esses encontros permitem a troca de experiên-cia e de informação sobre as bases da livre participação. As redes de conivên-cia também permitem criar uma cultura de cooperação e de auxílio ao estabe-lecimento de relações interempresariais mais freqüentes e estruturadas (Marcone Moinet, 2000). Nessa dimensão, as redes são formadas sem qualquer tipo decontrato formal que estabeleça regras; elas agem em conformidade com osinteresses mútuos de cooperação, baseados, sobretudo, na confiança entre osatores.

De acordo com as teorizações apresentadas, observa-se que dificilmente exis-tirão duas redes estruturadas de maneira idêntica. Assim, o esforço de tentarabranger todas as possibilidades de redes interorganizacionais em algumas de-zenas de tipologias pré-definidas, não deixa de ser uma simplificação forçada daampla diversidade de tipologias de redes.

Mesmo com essa múltipla diversidade, conforme observado no modelo apre-sentado por Marcon e Moinet (2000), o que fica evidente na análise da literatura,nesse campo de estudo específico, é o fato de que a grande maioria das pesqui-sas, principalmente aquelas realizadas por autores anglo-saxões, privilegiou ar-ranjos como joint-ventures e alianças estratégicas entre grandes empresas. Ou-tras configurações não menos importantes, como as redes horizontais de PMEs,tiveram pouco espaço para reflexão nos estudos sobre redes interorganizacionais.

Redes de Pequenas e Médias Empresas

São várias as justificativas apresentadas para o estudo das PMEs, sendo queSouza (1995) destaca as seguintes: (1) estímulo à livre iniciativa e à capacidade

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empreendedora; (2) relações capital/trabalho mais harmoniosas; (3) possívelcontribuição para a geração de novos empregos e absorção de mão-de-obra, sejapelo crescimento de PMEs já existentes, seja pelo surgimento de novas; (4) efei-to amortecedor dos impactos do desemprego; (5) efeito amortecedor dasflutuações na atividade econômica; (6) manutenção de certo nível de atividadeeconômica em determinadas regiões; (7) contribuição para a descentralizaçãoda atividade econômica, em especial na função de complementação das grandesempresas; e (8) potencial de assimilação, adaptação, introdução e, algumas ve-zes, geração de novas tecnologias de produto e de processo.

No entanto, inseridas em ambiente hipercompetitivo, as PMEs, na maioria dasvezes, apresentam certas dificuldades, tais como obter melhores preços e vanta-gens na compra de matérias primas e componentes, custos de participação emfeiras, custos de campanhas publicitárias, custos de reciclagem e treinamento damão-de-obra, atualização tecnológica, acesso a linhas de crédito e financiamen-to, custos de aluguel, custos envolvidos na exportação de produtos etc. Essesproblemas dificilmente desaparecerão; contudo podem ter seus efeitos neutrali-zados ou amenizados pela ação coletiva das PMEs.

A partir da consciência da necessidade de atuação conjunta e de cooperaçãoentre PMEs, almejando tornarem-se eficientes e competitivas, surge a lógica daconfiguração em rede. No entanto, mesmo com a reconhecida capacidade deeficiência coletiva pela ação em rede, poucos autores dedicaram-se ao estudo daconfiguração de redes de PMEs. Human e Provan (1997) destacam a existênciade apenas alguns estudos isolados, como é o caso do elaborado por Inzerilli(1990), que usou a perspectiva de custos de transação para descrever como umabase de confiança em um contexto social facilita o sucesso das PMEs do norteda Itália. Lorenzoni e Ornati (1988) e Brusco e Righi (1989) e confirmaram aimportância de fatores ambientais para o crescimento de PMEs por meio deredes. Em seu trabalho, Saxenian (1994) descreveu a emergência de uma infra-estrutura nos Estados Unidos para apoiar o estilo europeu de sistemas coopera-tivos.

Para Perrow (1992) o fenômeno das redes de PMEs tem sido pouco estudadotanto pelas teorias clássicas quanto pelas teorias marxistas. Entretanto a formade produção representada pela grande firma integrada, defendida originalmentepor Chandler, tornou-se um modelo declinante em face das necessidadescontemporâneas de flexibilização. O problema da teoria de Chandler foinegligenciar completamente o papel atribuído à confiança e à cooperação nosmodelos econômicos (Perrow, 1992). Já as teorias marxistas lançam forte críticaao modelo capitalista, sendo o foco maior de preocupação a exploração dostrabalhadores nas firmas; porém tais teorias pouco falam sobre o tamanho da

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A Dimensão Estratégica das Redes Horizontais de PMEs: Teorizações e Evidências

firma, as redes interfirmas, o redesenho da produção, as associações de negócios,a competição, a eficiência e a infra-estrutura que tornam as redes viáveis. SegundoPerrow (1992), as teorias clássicas e marxistas precisam ser questionadas, poisambas negligenciaram o poder econômico de três fatores que ajudam a explicaro sucesso das redes de PMEs: as economias de escala por meio de redes, aconfiança e a cooperação que coexistem com a competição e o estado de bem-estar social causado pelo aumento da eficiência coletiva de setores industriaisregionais.

A dimensão da confiança e da cooperação possivelmente representa papelcentral no sucesso alcançado pelas redes de PMEs, o qual dificilmente seráalcançado por outras formas de redes entre grandes empresas e muito menospelas grandes empresas integradas. Tal fato foi evidenciado por Sabel (1991),que destaca que a confiança nunca poderá ser intencionalmente criada, e simgerada a partir de uma estrutura ou de um contexto adequados. Diante dessaevidência, Perrow (1992) argumenta que, embora a confiança não possa ser criada,ela poderá ser encorajada por uma estrutura ou por um contexto criadosdeliberadamente.

Desse modo, existem algumas características no contexto das redes de PMEsque formam ambiente profícuo na geração de confiança entre as firmas; porexemplo: (1) as firmas compartilham e discutem informação sobre mercados,tecnologias e lucratividade; (2) existe suficiente similaridade entre processo etécnicas das firmas e, assim, cada uma poderá entender e julgar o comportamentodas outras; (3) as relações são estabelecidas a longo prazo; (4) existe poucadiferença entre tamanho, poder ou posição estratégica das firmas; (5) ocorreperiódica rotação de lideranças para representar o conjunto de firmas; (6) ocorresimilar recompensa financeira para as firmas e empregados dentro delas; e (7)há alcance de vantagem econômica pela experiência coletiva das firmas, peloaumento das vendas e pelos ganhos marginais. A possibilidade da confiançaaumenta onde existem essas condições, sendo que as redes de PMEs maximizama possibilidade de tais condições em relação ao modelo da firma integrada.

Para melhor entendimento das especificidades das redes de PMEs, faz-senecessária uma distinção entre outros arranjos, como joint-ventures e aliançasestratégicas. Nesse sentido, Human e Provan (1997) salientam que as redes dePMEs diferem das joint-ventures e de outras formas de alianças estratégicasentre grandes empresas em razão de três dimensões principais:

. as redes de PMEs são geralmente criadas para fornecer um fórum direto deatividades e relações entre os seus membros, que permanecem independentes,mesmo trabalhando em atividades conjuntas. Os atores dessas redes perseguem

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objetivos comuns por meio de interações coordenadas de dez, vinte ou maisfirmas individuais, enquanto as joint-ventures são geralmente formadas porduas grandes empresas.

. as redes de PMEs promovem complexas e recíprocas interdependências, emque os seus membros fornecem inputs e recebem outputs uns dos outros. Essasinter-relações são usualmente coordenadas pelas próprias firmas da rede, e osmecanismos de coordenação são geralmente pouco formais e facilitados pelaprópria dinâmica de interação dos membros. Já nas joint-ventures, acoordenação é exercida por meio de contratos formais.

. o critério de participação em uma rede de PMEs enfatiza a proximidadegeográfica pela qual as firmas-membros combinam competências centrais parao alcance de objetivos organizacionais comuns que não alcançariam de formaindividual. Já para as joint-ventures, não existe a necessidade de proximidadegeográfica.

Outro fator relacionado à configuração de redes de PMEs foi apresentado porPerrow (1992), destacando que essas tipologias de redes geralmente se inseremem ambiente institucional que é essencial para sua sobrevivência e para suaeconomia, o qual abrange incentivos de governos locais e regionais, serviçoseducacionais, associações comerciais que fornecem informação econômica,treinamento e serviços de marketing. Esse ambiente, comumente encontradonos distritos industriais italianos, apresenta forte contribuição para odesenvolvimento de regiões e para o próprio progresso das PMEs.

Convém salientar que existem várias tipologias de redes de PMEs que poderiamestar localizadas em diversos pontos do mapa conceitual apresentado Marcon eMoinet (2000), conforme a Figura 1. Algumas já foram profundamente estudadas,como é o caso das redes verticais de subcontratação, em que as PMEs fornecemserviços e produtos para outras empresas. No entanto as reflexões apresentadasneste item dizem respeito às redes horizontais de cooperação, em que as PMEsse unem, com a finalidade de somar esforços para o alcance de determinadosobjetivos comuns.

Segundo as evidências compiladas a partir da revisão do campo de estudos,uma rede horizontal de PMEs apresenta as seguintes características: (1) é formadapor um grupo de PMEs; (2) as PMEs situam-se geograficamente próximas; (3)as PMEs operam em segmento específico de mercado; (4) as relações entre asPMEs são horizontais e cooperativas, prevalecendo mútua confiança; (5) a redeé formada por indeterminado período de tempo; e (6) a coordenação da rede éexercida a partir de mínimos instrumentos contratuais que garantam regras básicasde governança.

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A Dimensão Estratégica das Redes Horizontais de PMEs: Teorizações e Evidências

Configuração em Rede como Estratégia de Competitividade para asPMEs

Em uma perspectiva estratégica, pode-se considerar a configuração em redecomo meio para alcançar um fim. Desse modo, ao participar de uma rede, aempresa busca alcançar certos objetivos que dificilmente seriam alcançados deforma individualizada. Nesse sentido, Marcon e Moinet (2000) apresentam algunsatributos que fazem das redes a configuração organizacional adequada paradeterminados objetivos organizacionais estratégicos.

. Fluidez. Significa a capacidade de flexibilidade e adaptabilidade das redes. Asredes adaptam-se melhor às novas dimensões do ambiente. Essa propriedadefundamental permite-lhes efetuar quatro tipos de inter-relações: (1) no espaço,a rede permite colocar em relação subconjuntos ou unidades geograficamentedispersas; (2) no tempo, a rede assegura a permanência das ligações entre atores;(3) do ponto de vista social, a rede permite colocar em relação atores emcondições diferentes, sem implicar a mudança dessa condição; e (4) do pontode vista organizacional, a rede pode tornar-se alternativa à forma rígida deorganização.

. Finalidade. É a razão de ser da rede, seja política, religiosa, filosófica, científica,econômica, cultural e/ou social. Essa finalidade encontra-se por vezesincorporada nos membros da rede e orienta, habitualmente, as escolhas éticas,em que a rede evolui e inspira seus projetos.

. Capacidade de realizar economias relacionais. A rede reduz a dispersão deesforços e permite ganho de tempo. A interconexão dos atores significaagilidade.

. Capacidade de aprendizagem. A aprendizagem não é exclusividade das redes,mas as condições de aprendizagem no contexto específico das redes sãoparticulares. A aprendizagem coletiva apresenta a lógica do ciclo deaprendizagem, ou seja, cada um evolui em função do outro.

Esses atributos das redes, como flexibilidade e adaptabilidade, podem serconsiderados como valiosos em face da atual dinâmica da economia mundial.Ebers e Jarillo (1998) destacam que, por meio de redes interorganizacionais,uma empresa poderá alcançar e sustentar vantagem competitiva a partir dasseguintes origens: (1) aprendizado mútuo, que levará a empresa a suportar melhoro desenvolvimento de produtos; (2) coespecialidade, em que as firmasparticipantes se tornam lucrativas em novos nichos de produtos e mercados; (3)melhor fluxo de informação, facilitando a coordenação do fluxo de recursos

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entre as empresas e reduzindo a incerteza nas relações, uma das principais fontesde custos de transação; e (4) economias de escala, resultado de investimentosconjuntos, como, por exemplo, em P&D.

No universo das PMEs, a estratégia em rede poderá representar meio eficazpara o desempenho competitivo, porquanto, organizadas em redes, essas empresassomam esforços para competir com as grandes. A partir de pesquisas realizadasjunto a redes de PMEs, Human e Provan (1997) identificaram quatro grupos deprincipais finalidades estratégicas alcançadas pelas empresas, em seguidaexplicitados.

. Trocas interfirmas. Referem-se às transações diretas entre as firmas da rede.As principais inter-relações foram de negócios (compra e venda de produtosentre as empresas da rede); de informação (informações tecnológicas, demercado, de produtos, de soluções de problemas); de amizade (existência deambiente de trabalho amistoso e de confiança entre os membros da rede); e decompetências (existência de ambiente de compartilhamento de melhorespráticas entre os atores).

. Credibilidade organizacional. Diz respeito ao ganho de legitimidade externapelo fato de as empresas estarem associadas à rede.

. Acesso a recursos. Refere-se ao papel das redes no sentido de facilitar paraseus membros o acesso a novos mercados, tecnologias e suprimentos.

. Desempenho financeiro. Algumas firmas descreveram os benefícioseconômicos que alcançaram, em curto espaço de tempo, após se organizaremem rede.

Como se pode observar, as motivações estratégicas que levam à formação dasredes interorganizacionais podem ser amplas e variadas. No entanto umafundamentação econômica que merece destaque é o fato de as configurações emrede terem demonstrado eficiente forma de governança e coordenação das relaçõeseconômicas (Powell, 1987). Tradicionalmente, duas outras formas institucionaisde governança foram distinguidas com freqüência nas redes: o mercado e ahierarquia.

Williamson (1979), a partir de Coase (1937), foi quem definiu o mercado e ahierarquia como os dois modos alternativos de organização da atividadeeconômica. Ele considera que uma firma contempla diferentes curvas de custosna produção de cada um dos subcomponentes que constituem o produto final.Caso existam algumas firmas no mercado produzindo o mesmo bem, a priori amais eficiente forma de organizar a produção consistirá em uma firma

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especializada na produção de cada um dos subcomponentes do produto. Assim,a firma especializada apresentará curva decrescente de custos e fornecerá a outrasfirmas, que terão menor custo em relação à produção desses componentes pormeio da sua integração vertical. Porém o que se pode observar é que ocomportamento das organizações geralmente não ocorre dessa maneira.

A explicação para tal fato, segundo Williamson (1979), é que nas relaçõeseconômicas interfirmas existem custos de transação que tornam mais caro osubcomponente em relação à produção pela própria firma. Esses custos sãooriginados pelas ineficientes transações de determinada organização com o seumercado, ocorrendo sobretudo pelas seguintes razões: racionalidade limitadado tomador de decisões, incerteza sobre o futuro e possibilidade decomportamento oportunista por parte de determinados atores econômicos.Logo, a falta de confiança nas relações da empresa com o seu ambiente e apossibilidade de comportamento oportunista por parte de alguns agentesrepresentam questões centrais na geração dos custos de transação. Segundo apresente reflexão, na ausência de custos de transação, as firmas não integrariamsuas funções. Contudo, se existem custos de transação, as firmas integram asatividades que poderiam ser feitas por subcontratados.

Jarillo (1988), em seu clássico artigo, afirma que existe uma questão que nãofoi discutida por Williamson (1979), a saber: os custos de transação podem serafetados pela ação consciente de um empresário, sendo esta uma das principaisfundamentações econômicas para a estratégia em rede. A confiança nas inter-relações dos atores é um dos fatores que promove a redução dos custos detransação e torna a existência das redes economicamente viáveis (Jarillo, 1988).Em atmosfera de confiança, os problemas são resolvidos com maior eficiência,porque a informação e o know-how são trocados mais livremente (Boss, 1978).

Outra sustentação estratégica da viabilidade econômica das redes é quanto àproblemática da inovação, entendida, segundo a concepção de Schumpeter, comoruptura do equilíbrio estacionário e abrangendo modificações nas empresas, taiscomo: (1) introdução de novo bem ou de nova qualidade de certo bem; (2)introdução de novo método de produção; (3) abertura de novo mercado parauma indústria; (4) nova fonte de matéria prima ou produto semi-acabado; (5)estabelecimento de uma nova organização em determinada indústria (Napoleoni,1963).

Esse processo de inovação e transferência de conhecimento não é um processosimples e unidirecional, que ocorre em determinado tempo. Pelo contrário,segundo Mowery e Rosenberg (1989), é um processo complexo e interativo,pois o fluxo de informações ocorre em duas vias e é concebido como atividade

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contínua de pesquisa, formada e estruturada pelas forças econômicas, peloconhecimento tecnológico e pela demanda dos consumidores por diferentescategorias de produtos e serviços.

Para Rothwell (1995), nos últimos 40 anos, a percepção do modelo de inovaçãodominante e, por extensão, as práticas inovadoras têm passado por algumasmudanças, que podem ser identificadas por diferentes gerações do processoinovador. Segundo o autor, atualmente o processo inovador passa a ser um sistemaintegrado e em rede. A inovação é uma ação conjunta e cooperada de diversosatores internos e externos da organização, como empresas, fornecedores, clientes,além de outras instituições de caráter público ou privado. Assim, a colaboraçãono seio de uma rede poderá facilitar a reunião de complementaridade dehabilidades de diferentes firmas (Richardson, 1972). Em geral, as tecnologiasdemandam o uso simultâneo de diferentes conjuntos de habilidades e bases deconhecimentos em um processo de inovação, o que poderia estar limitado a umaempresa individual (Powell, Koput e Smith-Doerr, 1996). Outro efeito dasrelações diretas colaborativas emergem das economias de escala, sobretudo nocaso de grandes projetos de pesquisas.

Portanto a estrutura em rede funciona como canal de comunicação, em quecada firma conectada poderá tanto receber quanto transmitir informação (Rogerse Kincaid, 1981). O papel das redes interfirmas como mecanismo difusor deinformação e facilitador de compartilhamento de conhecimento pode sersignificativo no contexto tecnológico (Powell, Koput e Smith-Doerr, 1996), poisa inovação é freqüentemente uma atividade intensiva em informação econhecimento externo à empresa. As interconexões dos atores podem ser relaçõescontratuais – parceria de P&D e joint-ventures – ou informais – envolvendo aparticipação em uma comunidade técnica. Ambos os ambientes são propíciospara a transferência de conhecimentos necessários aos processos de inovação(Powell, 1998).

A partir dessas evidências teóricas, é possível constatar que a configuração emrede poderá facilitar o alcance de objetivos estratégicos que dificilmente seriamalcançados, caso essas empresas trabalhassem de modo individual. No entanto,mesmo com a existência dessas evidências, pode-se observar que o valorestratégico das redes para as organizações foi pouco explorado. Tal fato podeapresentar duas justificativas: a primeira refere-se ao recente surgimento do temaredes nos estudos organizacionais; a segunda, e a mais provável, refere-se aofato de que a perspectiva de redes interorganizacionais colide frontalmente comalguns postulados clássicos utilizados pela corrente dominante no campo deestratégia, arraigados no comportamento de competição. Um exemplo a ser citado,bastante utilizado nos textos sobre estratégia, é o princípio da exclusão competitiva

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de Gause: segundo esse professor da universidade de Moscou, considerado o paida biologia matemática, duas espécies que conseguem seu sustento de maneiraidêntica não podem coexistir (Henderson, 1998). Entretanto deve-se salientarque, diferentemente das variadas espécies de bactérias em competição porsustento, as organizações poderão coexistir em um mesmo ambiente, cooperandoracionalmente, a fim de alcançarem objetivos comuns. Este é o princípio quenutre o desenvolvimento das redes.

Ao apresentar a fundamentação teórica, buscou-se melhor compreender asredes horizontais e sua contribuição para o desenvolvimento das PMEs. Naseqüência do artigo, serão apresentados os aspectos metodológicos e osresultados de um estudo de caso que está sendo conduzido, inicialmente, emrede de PMEs da Região Sul do Brasil, buscando evidências empíricas à tesecentral do debate.

METODOLOGIA DA PESQUISA

A presente pesquisa usou como método o estudo de caso. O caso selecionadopara ser analisado foi a rede AGIVEST (Associação Gaúcha de Indústrias doVestuário), formada por 44 pequenas indústrias do vestuário, localizadas naRegião Sul do Brasil. A AGIVEST faz parte do projeto Redes de Cooperaçãodo Governo do Estado do Rio Grande do Sul e foi constituída em setembro de2001 com os seguintes objetivos: ampliação de mercado, melhorias tecnológicase alcance de maior competitividade para as pequenas empresas associadas,conforme dados fornecidos pela rede AGIVEST, em agosto de 2002. A escolhada rede AGIVEST como objeto de estudo deveu-se às seguintes motivações:(1) é uma rede de PMEs, formada há um ano e que já apresenta resultadosalcançados; (2) é uma rede de PMEs industriais que busca a inovação em seusprodutos, para melhor competir em mercados nacionais, o que pode sercomprovado pelo lançamento de uma coleção de produtos em uma FeiraNacional; e (3) pelo interesse da Secretaria de Desenvolvimento e AssuntosInternacionais (SEDAI) do Governo do Estado do Rio Grande do Sul em estudartal rede, ensejando contatos do pesquisador com o consultor, o presidente e osempresários da rede.

A operacionalização da pesquisa decorreu da sistematização dos construtosteóricos e das variáveis a serem observadas no estudo de campo, conforme oQuadro 1.

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Quadro 1: Operacionalização dos ConstrutosTeóricos e Variáveis Observadas

As evidências empíricas foram coletadas a partir de sete entrevistas, realizadascom os seguintes atores: cinco entrevistas com dirigentes de PMEs da redeAGIVEST, escolhidos de forma aleatória; uma entrevista com o consultor darede AGIVEST e uma entrevista com o presidente da rede. Cada entrevista teveduração de aproximadamente 60 minutos e foi realizada pelo próprio pesquisador.O pesquisador utilizou um roteiro de entrevista, elaborado com base nas variáveisde pesquisa constantes no Quadro 1, com o objetivo de apresentar uma seqüêncialógica nos questionamentos aos entrevistados. As entrevistas foram gravadas e,posteriormente, submetidas a uma análise de conteúdo. Com o intuito de melhorentender a dinâmica de coordenação e do processo decisório da rede, opesquisador utilizou, como meio complementar, a técnica de observaçãoparticipante em uma assembléia da rede AGIVEST.

RESULTADOS DO ESTUDO DE CASO

Sensibilizado com o papel de fortalecer o desenvolvimento local e regional eestimulado pelo desempenho dos sistemas locais de produção em nível mundial,o Governo do Estado do Rio Grande do Sul lançou em dezembro de 2000 oprojeto Redes de Cooperação, cujo objetivo visou à promoçao e ao fortalecimentoda cooperação entre PMEs. Dois anos após o seu lançamento, já foram constituídas33 redes de PMEs nos mais diversos segmentos econômicos, abrangendo 733

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empresas e um total de 5.000 empregados. O projeto conta com a participaçãode seis universidades, que disponibilizam 42 consultores que prestam auxílio àformação e à gestão da rede. Existem também outras ações que fortalecem eviabilizam o desenvolvimento das redes, como o acesso facilitado ao crédito, odesenvolvimento de um programa de capacitação gerencial e o atendimento dedemandas específicas das redes, como, por exemplo, o incentivo à participaçãoem feiras e eventos, conforme dados divulgados pela SEDAI em 2002.

Foi possível observar que a rede AGIVEST apresenta as seguintescaracterísticas: (1) é formada essencialmente por pequenas empresas, comnúmero médio aproximado de seis funcionários; (2) as empresas situam-segeograficamente próximas, abrangendo um raio de 180 km; (3) as empresasoperam no segmento de confecções; (4) a rede é autogerenciada por seusmembros por meio de estrutura de coordenação, formada por um presidente evice-presidente, supervisionados pelo conselho de administração, conselho deética e conselho fiscal; (5) as decisões estratégicas da rede são deliberadas pormeio de assembléia geral; (6) as questões controversas podem ser resolvidaspor meio da aplicação de alguns instrumentos legais – estatuto da rede, códigode ética e regimento interno – que permitem melhor estrutura de governançada rede; e (7) as empresas da rede trabalham com duas marcas – a marcaAGIVEST para os produtos comercializados por meio da rede e uma marcaparticular de cada empresa para os produtos comercializados individualmentepelas empresas.

Segundo essas características e as orientações de Perrow (1992), Human eProvan (1997) e Marcon e Moinet (2000), a AGIVEST pode ser classificadacomo uma rede horizontal de cooperação. Diferentemente de outras tipologiasde redes de PMEs, como as redes verticais de subcontratação, as redes horizontaisde cooperação são formadas por PMEs, com a finalidade de trabalhar de formacoletiva para alcançar certos objetivos estratégicos que dificilmente alcançariamde forma individualizada. A horizontalidade é decorrência dos seguintes fatores:(1) a rede é formada somente por pequenas e médias empresas; (2) as decisõessão tomadas em processo participativo, em que cada empresário utiliza o seupoder de voto para as escolhas estratégicas da rede; e (3) a simetria de podereconômico e político entre as PMEs associadas está presente.

Mesmo sendo constituída há apenas um ano, ou seja, ainda está em fase deorganização e formação, a análise das entrevistas possibilitou identificar algunsbenefícios estratégicos da rede para o desenvolvimento e desempenho das PMEsassociadas. No Quadro 2, são apresentados alguns desses benefícios, a partir dasevidências empíricas observadas.

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Quadro 2: Benefícios Estratégicos e Evidências Empíricas da Pesquisa

Uma das respostas unânimes obtidas na pesquisa foi a de que o maior ganhopor meio da formação da rede consistiu no compartilhamento de informações ede conhecimentos entre as empresas participantes. As informações compartilhadasque mais trouxeram benefícios para a rede versam sobre processos de produção,fornecedores, insumos, tecnologias e mercado. Tais informações foram

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compartilhadas em intensa inter-relação social que ocorre de maneira formal einformal entre os empresários da rede. O ambiente de interação proporciona umprocesso de coevolução para as empresas, isto é, conforme Nonaka, Toyama eKonno (2001) cada empresa evolui a partir do conhecimento e das experiênciasde outras.

A aprendizagem coletiva ocorre na rede tanto pela interação das empresasquanto pela participação em cursos, palestras e serviços de consultoria. Outroexemplo que demonstra novas possibilidades de aprendizagem para osempresários da rede foi a realização de 120 horas de curso de formação gerencial,proporcionado pelo governo do Estado e apresentado com o objetivo dedesenvolver os conceitos de gestão junto aos empresários. Segundo Marcon eMoinet (2000), observa-se que o aprendizado entre as empresas da rede épotenciado pelo ambiente de forte interação entre os empresários participantes.

Ao participar como observador em uma assembléia da rede, que apresentavacomo objetivo deliberar sobre algumas decisões estratégicas, como, por exemplo,a participação ou não da rede em uma ferira estadual, o pesquisador pôde perceberque a decisão foi tomada em meio a um intenso processo de aprendizado, emque várias alternativas e sugestões eram apreciadas em clima tenso, porémconstrutivo. Além disso, as decisões ocorrem em processo de discussões,frustrações, questionamentos e dúvidas; mas no final persiste a sensação de queas decisões mais satisfatórias foram tomadas. Esse ambiente participativo noprocesso decisório permite uma coordenação transparente dos interesses de cadaum dos atores que fazem parte da rede. Essa transparência permite maior confiançaque, segundo Jarillo (1988), é fundamental para a existência de cooperação.

Seguindo a análise, observa-se freqüentemente que as PMEs, no momento decompetir em mercados maiores, encontram problemas de baixo volume deprodução. No caso da rede AGIVEST, esse problema foi atenuadoconsideravelmente, pois a sua capacidade de produção foi multiplicada pelacapacidade de cada empresa associada. Assim, contrariando alguns princípioseconômicos de produção, a rede AGIVEST consegue economias de escala, pelovolume de produção; economias de especialização, pelo fato de cada empresaespecializar-se na produção de algumas peças que farão parte da coleção oupedido do cliente; e economias de escopo, pelo portfólio diversificado na produçãoda rede. A partir desses efeitos de produção, a rede consegue vantagens de custoe de diferenciação, estratégia que dificilmente poderia ser alcançada por umaPME que trabalhasse de forma individual.

Já alguns dos benefícios que até então eram somente privilégios de grandesempresas, como os serviços especializados de garantia de crédito nas vendas,foram estendidos também às PMEs. Nesse sentido, viabilizou-se a assinatura de

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contrato entre a rede AGIVEST e uma consultoria de crédito para a prestação deserviços a todas as PMEs da rede. Esse exemplo demonstra que as empresastiveram acesso a recursos não-disponíveis anteriormente à formação da rede,indo ao encontro das evidências teóricas apresentadas por Human e Provan (1997).

A barganha junto a fornecedores apresentou bons resultados para a rede. Porcomprar insumos diretamente de fábrica (por exemplo, a compra de tecido emvolumes maiores), as empresas têm alcançado em média uma redução de 25%do preço em relação às aquisições em pequenos lotes de forma individual. Oacesso a novos representantes também foi facilitado pela rede, sobretudo pelatroca de informações entre as empresas.

Chamou a atenção a manifestação de uma empresária sobre os resultados daparticipação em uma feira nacional. Para tal empresária, o que restava para asPMEs era participar em feiras somente como compradores e o fato de estaremorganizadas em rede possibilitou irem às feiras para vender seus próprios produtos.Tal participação conta com incentivos públicos, obtidos em parte por meio delobbying junto aos governos. Outros benefícios observados foram as transaçõesentre as empresas de produtos físicos: matérias primas, produtos prontos,máquinas e demais insumos. Certamente, essas transações ocorrem com menorcusto em relação às transações realizadas diretamente no mercado. Atividadesde marketing conjunto também podem ser observadas, bem como o aumento daconfiança e do otimismo que a formação da rede proporcionou aos empresáriosparticipantes.

Quanto ao processo de inovação, observou-se que algumas melhoriasincrementais foram realizadas, em especial nos processos de produção. Umempresário exemplificou que, a partir de algumas simples modificações nosistema de produção e orientado por uma consultoria, aumentou em 40% aprodução, sem qualquer investimento adicional em máquinas ou mão-de-obra.Esse processo de melhoria dos processos, mesmo não sendo considerado umainovação radical, demonstra que a partilha de informações e conhecimentosno âmbito de uma rede poderá facilitar a reunião de complementaridade dehabilidades de diferentes firmas, conforme evidenciado por Richardson (1972).A busca de assessoria de um reconhecido estilista de moda da região paradesenhar a coleção de produtos a serem comercializados na Fenit 2002, foioutro exemplo de como as PMEs poderão ter acesso a conhecimentos externos,fundamentais para os processos de inovação, conforme evidenciado por Powell,Koput e Smith-Doerr (1996).

A rede AGIVEST conta ainda com ambiente de densas relações institucionais,comprometidas com o desenvolvimento das PMEs e da região. Assim, os governos

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municipais, prefeituras dos municípios em que as PMEs estão localizadas, osgovernos estaduais, por meio da SEDAI, as universidades, como a Universidadede Ijuí (UNIJUÍ), e as instituições de apoio às PMEs, como o Serviço Brasileirode Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), oferecem forte apoio aodesenvolvimento da rede.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho compilou diferentes reflexões teóricas sobre o potencialde contribuição da configuração em rede como recurso que os gestores poderãoutilizar para obter vantagens competitivas. Buscou-se apresentar algumasevidências empíricas de uma pesquisa que está sendo conduzida na redeAGIVEST. Os resultados demonstram forte otimismo por parte dos empresáriossobre os benefícios que a rede já produziu e, sobretudo, pela expectativa com osresultados futuros que as PMEs poderão alcançar.

Entre os impactos observados pela formação da rede para as PMEs, destacam-se os econômicos, os comportamentais e os de aprendizagem. Os impactoseconômicos são decorrentes de atividades como a participação e comercializaçãode produtos em feiras, a melhoria de processos produtivos, a barganha de preçosjunto a clientes, o acesso a novos representantes, a garantia de fornecimento decrédito, a comercialização de produtos entre as empresas e a obtenção deeconomias de escala, escopo e especialização. Já o impacto na aprendizagempode ser resultado de forte interação das empresas e do acesso a cursos e palestrasde desenvolvimento empresarial. Por último, o impacto no comportamento éobservado pela existência de espírito coletivo entre os empresários, fundamentalpara a existência de cooperação.

Desse modo, embora os resultados empíricos deste artigo apresentem algumaslimitações de verticalidade e extensão, uma vez que dizem respeito a um estudoexploratório na rede AGIVEST, suas evidências empíricas reforçam a tese centralda pesquisa: a de que as PMEs poderão utilizar a configuração em rede horizontalde cooperação como recurso estratégico de competitividade. No entanto, parauma sólida comprovação dessa tese, os autores estão aprofundando suas pesquisas,tanto no contexto da rede AGIVEST, quanto em outros contextos de redes dePMEs no Brasil e no exterior, mais especificamente na França, onde um dosautores está desenvolvendo parte da pesquisa.

Para finalizar, deve-se destacar que o tema redes interorganizacionais estádespertando crescente interesse de acadêmicos, empresários e governantes,

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sobretudo pela possibilidade de sustentar o desenvolvimento e a competitividadede PMEs e regiões. Nesse sentido, abre-se um leque de necessidades eoportunidades de pesquisas e estudos com o objetivo de permitir melhorcompreesão da estrutura e do desempenho das redes horizontias de PMEs.

Artigo recebido em 22.07.2003. Aprovado em 12.12.2003.

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