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A ELABORAÇÃO DOS CONCEITOS DE DEFICIÊNCIA E INCLUSÃO ESCOLAR NA
FORMAÇÃO INICIAL DE DOCENTES PARA A EDUCAÇÃO INCLUSIVA: UM ESTUDO DE
CASO
Luísa Miranda Jorge – [email protected] Henrique do Amaral
Maria Inês Bacellar MonteiroUniversidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP
Eixo 6: A formação de professores na perspectiva da inclusão
Considerações iniciais
O número de alunos com necessidades educativas especiais (NEE) matriculados na
rede de educação básica regular brasileira teve, nos últimos anos, um aumento
considerável. De acordo com dados do Ministério da Educação (MEC), entre os anos de
1998 e 2014, houve um crescimento de 93% no número de alunos com deficiência
matriculados em classes de escolas públicas ditas “comuns”.
O número que girava em torno de 26 mil alunos com deficiência matriculados em
1998 passou, no ano de 2014, para exatos 698.768 alunos com necessidades educativas
especiais nas escolas públicas, de acordo com o último Censo (MEC, 2015)¹.
Esse crescimento, fruto, principalmente, da gama de diretrizes básicas formuladas a
partir da Declaração de Salamanca, assinada em 1994 por meio de uma série de debates
sobre a inclusão dos alunos com algum tipo de deficiência no sistema regular de ensino, tem
demandado profissionais capacitados para atuar no ambiente escolar com esses alunos,
principalmente em sala de aula, a fim de que seja possível a concretização do acesso ao
conhecimento para todos.
Na prática, no entanto, observamos a dificuldade dos professores para atuar com
esses alunos e as concepções de Deficiência fortemente calcadas na incapacidade e na
limitação física e/ou cognitiva, o que tem impossibilitado que o trabalho pedagógico se
efetive. Nesse sentido, diversos estudos têm destacado os problemas enfrentados pelos
professores no cotidiano escolar, apontando as dificuldades enfrentadas e algumas
possibilidades para superá-las.
Monteiro, Freitas e Camargo (2014), por exemplo, discutem acerca do bloqueio dos
professores ante ao aluno diagnosticado com deficiência, decorrente de concepções
negativas sobre a deficiência e que negligenciam as possibilidades de desenvolvimento
desses alunos. Matos e Mendes (2015) destacam as demandas apontadas pelos próprios
professores em relação à formação profissional, tais como a falta de diálogo entre
professores, cuidadores, intérpretes, professores especializados e famílias, a ausência de
conhecimentos sobre os alunos com necessidades educativas especiais e sobre os
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processos envolvidos na aprendizagem, no desenvolvimento e no ensino desses alunos.
Silveira, Enumo e Rosa (2012), a partir de um levantamento bibliográfico de estudos sobre
as concepções de professores, divulgados entre os anos 2000 e 2010, sugerem a
necessidade de pesquisas sobre a saúde do professor e suas concepções sobre Inclusão
Escolar que levem a intervenções escolares baseadas na problematização dos
determinantes históricos e sociais relacionados às deficiências e ao “mal-estar” docente.
Costa (2015) ressalta a importância da formação teórica dos professores para que
estes ganhem autonomia política e investigativa na tomada de decisões e na elaboração e
execução do planejamento pedagógico.
Além dos apontamentos contidos nesses estudos citados acima, entre agosto e
novembro de 2014, no desenvolvimento de uma pesquisa voltada para a formação
continuada de professores na relação com os alunos com deficiência em sala de aula,
realizamos um levantamento, a partir de questionários enviados para as escolas de um
munícipio de interior do estado de São Paulo², acerca das concepções dos professores e da
prática docente ante aos alunos com deficiência em sala de aula e notamos que uma
extensa parcela dos questionários respondidos pelos professores aponta para questões
relacionadas apenas à limitação dos alunos com deficiência, assim como Silveira, Enumo e
Rosa (2012) verificaram no levantamento bibliográfico sobre estudos de concepções de
professores sobre Inclusão Escolar e Deficiência.
Identificamos, também, por meio dos questionários respondidos e da participação em
aulas e em algumas reuniões com os professores de uma escola pública do interior paulista,
entre maio e novembro de 2015, que muitos professores relatam não saber avaliar esses
alunos e priorizam muito mais uma suposta “socialização” desses discentes do que o
acesso ao conhecimento.
No período em que estivemos na escola, trabalhando com a formação continuada
dos docentes na interação com o aluno com deficiência em sala de aula, identificamos que
muitos desses professores, a maioria com cerca de 20 anos de atuação, não tiveram na
formação inicial disciplinas específicas sobre educação inclusiva, uma vez que na época em
que cursaram a licenciatura não havia leis específicas que estabeleciam a necessidade de
disciplinas desse cunho, até mesmo porque não havia uma forte demanda para isso e nem
orientações.
Nesse contexto, o presente estudo parte da preocupação com a formação inicial dos
professores no trabalho com os alunos com deficiência, buscando compreender, a partir de
um estudo de caso, de que maneira a disciplina teórica Educação Inclusiva em quatro
cursos de licenciatura de uma universidade privada do interior do estado de São Paulo tem
possibilitado que os alunos dos cursos de licenciatura reflitam acerca dos conceitos de
Deficiência e Inclusão Escolar.
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Para tanto, inicialmente, traçaremos uma discussão discorrendo sobre a
implementação de algumas diretrizes (MEC, 1994; BRASIL, 2002) que sugerem a inserção
de conteúdos nos cursos de licenciatura que abordem questões relacionadas à inclusão
escolar do aluno com deficiência. Após isso, verificaremos, na prática, por meio do estudo
de caso aqui proposto, em duas diferentes turmas formadas por alunos de quatro diferentes
cursos de licenciatura, de que maneira essa disciplina teórica tem proporcionado aos alunos
universitários uma reflexão sobre os conceitos de Deficiência e Inclusão Escolar dos alunos
com necessidades educativas especiais, para enfim, trazer considerações acerca da
possível colaboração dessa disciplina para a elaboração desses dois conceitos.
A formação docente para a educação inclusiva
No Brasil foi incluído no texto da Lei de Diretrizes e Bases (BRASIL,1996) questões
referentes a política inclusiva, entretanto, pouco da legislação avançou quanto a formação
dos professores. A principal dessas mudanças ocorreu através da Portaria nº 1.793
(MEC,1994) em que “recomenda a inclusão da disciplina ‘Aspectos ético-político-
educacionais da normalização e integração da pessoa portadora de necessidades
especiais’, prioritariamente, nos cursos de Pedagogia, Psicologia e em todas as
licenciaturas”. A outra mudança ocorrida foi com a lei 10.436 (BRASIL, 2002) em que é
obrigatório o ensino da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) nas licenciaturas e na
Pedagogia. Muitas vezes nos cursos de licenciaturas e pedagogia que existia a disciplina de
Educação Inclusiva, essa teve de ser dividida com o ensino da LIBRAS, o que diminuiu
ainda mais o conteúdo de Educação Inclusiva.
Baumel (2004), Michels (2006), Greguol, Gobbi e Carraro (2013), Garcia (2013)
também apontam que as diretrizes e portarias tratam a inserção de disciplinas e/ou
conteúdos apenas como uma recomendação e não uma obrigatoriedade. Rinald, Reali e Da
Costa (2007) relatam que muitos cursos de formação docente no Brasil ainda não tem uma
disciplina e nem sequer conteúdos nessa temática. Por isso, Greguol, Gobbi e Carraro
(2013) destacam a necessidade de diretrizes mais claras quanto à inserção de disciplinas de
Educação Inclusiva nos cursos de licenciaturas e pedagogia.
Greguol, Gobbi e Carraro (2013) defendem que para sucesso da prática de inclusão
é necessário “capacitação adequada de recursos humanos para a atuação com a
diversidade” (GREGUOL, GOBBI, CARRARO; 2013, p. 308). Os autores apontam ainda
que, embora existam medidas para a formação continuada dos professores, são poucas as
relacionadas com a formação inicial nesta temática.
As principais mudanças na legislação relacionadas à Inclusão só foram realizadas
após Declaração de Salamanca (1994) e Convenção de Guatemala (2001). Para os autores,
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a mudança na legislação “repercurtiu diretamente na forma como se pensava a capacitação
de professores, que, até aquele momento, era focada, sobretudo na especialização de
docentes interessados em trabalhar no segmento da educação especial.” (GREGUOL,
GOBBI, CARRARO; 2013, p. 311). Esses autores apontam que foi necessário repensar os
cursos de formação inicial e continuada e que ainda assim os avanços quanto a formação
foram mínimos.
Tal princípio remete para uma discussão já bastante desenvolvida nocampo, segundo a qual a simples inserção de disciplinas e/ou conteúdosespecíficos não atribui à formação docente uma perspectiva orgânicaacerca da educação dos sujeitos da educação especial, quer seja no cursode pedagogia ou nas demais licenciaturas (GARCIA, 2013, p.103).
Baumel (2004) em pesquisa realizada sobre artigos referentes à formação inicial e
inclusão revela que um dos consensos encontrados entre vários autores é que “as
propostas oficiais educacionais apontam discussões necessárias e urgentes sobre a
formação inicial e em serviço (continuada) na direção do preparo para trabalhar em
meios/ambientes pedagógicos visando à inclusão” (BAUMEL, 2004, p.8). Vitaliano (2007)
também destaca que já existem diversas pesquisas que constatam que a formação docente
não está sendo suficiente para a preparação dos professores com relação à inclusão. Tanto
no Brasil como em países como Reino Unido, Estados Unidos e Austrália as pesquisas já
evidenciam a necessidade de maior qualificação desses professores.
Vitaliano (2002) em entrevistas com professores universitários acredita que os alunos
não se formam com conhecimento suficiente para incluir os alunos com necessidades
educacionais especiais - NEE. A autora elencou os principais motivos para tal constatação
a oferta, no curso de Pedagogia, de uma única disciplina referente àEducação Especial, com pequena carga horária; a ausência de estágiocurricular em escolas especiais, em classes especiais, ou em classe comumdo ensino regular com alunos que apresentassem NEE; e até mesmo o fatode os próprios professores universitários não se sentirem preparados paradiscutir ou abordar temas relacionados à educação de pessoas queapresentam NEE. (VITALIANO, 2002, p.404).
A autora constatou nos trabalhos desenvolvidos com professores universitários que a
maioria dos professores atuantes nos cursos de licenciaturas que aceitaram participar do
estudo não tinha conhecimento para trabalhar na graduação com os alunos com NEE. Isso
reflete também na formação dos docentes, já que são os professores universitários que
preparam para a atuação os futuros docentes.
Michels (2006), ao discutir sobre a reforma educacional no Brasil, destaca que o
modelo médico-pedagógico é que norteia a formação inicial, bem como a continuada. Para
ela, não romper com essa visão hegemônica significa “colocar” nos alunos o fracasso
escolar e não nos aspectos sociais que norteiam a comunidade.
Este modelo chega mesmo a ser confundido com o conhecimento daeducação especial e passa a organizar o currículo do curso de formação deseus professores, a indicar o trabalho a ser desenvolvido com os alunos
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considerados deficientes, a influenciar as políticas públicas voltadas àeducação especial, entre outras ações que envolvem a área. (MICHELS,2006, p.12).
A autora afirma que “a formação de professores proposta hoje pela política
educacional brasileira não possibilita a superação da exclusão.” (MICHELS, 2006, p.12). Ela
também destaca que essa exclusão se refere ao processo de aprendizagem dentro da
escola, uma vez que os alunos com deficiência encontram-se agora dentro da escola e não
mais fora dela.
Caracterização do corpus e procedimentos para coleta e análise de dados
O corpus de análise da nossa pesquisa consiste em duas produções, feitas na
disciplina Educação Inclusiva pelos alunos de licenciatura dos cursos de Filosofia, História,
Letras Inglês e Letras Língua Portuguesa de uma universidade privada do interior do estado
de São Paulo, que adota a disciplina teórica sobre inclusão escolar em alguns cursos de
licenciatura desde o ano de 2003.
Atualmente, essa disciplina, nesses quatro cursos de licenciatura, tem dois créditos,
com uma hora e vinte minutos de aula por semana, no período noturno.
A disciplina tem o intuito de trazer os principais fundamentos de educação especial,
refletindo sobre as políticas públicas e a educação especial no contexto educacional
inclusivo, a partir da perspectiva histórico-cultural. Os principais objetivos da disciplina são: i)
caracterizar a história da educação especial no mundo e no Brasil; ii) caracterizar as
necessidades educativas especiais compreendidas como decorrência de deficiência mental,
física e neuro/motora, múltipla, cegueira, surdez, condutas típicas de síndromes e quadros
psicológicos, e superdotação ou altas habilidades; e iii) caracterizar modalidades de
atendimento (escolarização) para aluno com necessidade educativa especial.
As turmas, aqui analisadas, são formadas pelos alunos que cursaram o quarto
semestre de licenciatura em Filosofia, História, Letras Inglês e Letras Língua Portuguesa no
segundo semestre do ano de 2015. Na disciplina Educação Inclusiva, os alunos desses
cursos foram divididos em duas turmas, uma com os alunos do curso de Filosofia e História
e outra com os alunos de Letras Inglês e Letras Língua Portuguesa.
Com o intuito de observar como foram assimilados os conceitos de Deficiência e
Inclusão Escolar por esses alunos durante a disciplina, optamos por analisar a incidência
das palavras utilizadas quando os alunos falam sobre esses conceitos. Para isso,
transcrevemos as respostas dos alunos nas questões sobre deficiência e inclusão escolar e
utilizamos o programa online Word Frequency Counter³, a fim de verificar as palavras mais
utilizadas por eles quando dissertam sobre esses conceitos, viabilizando compreender, por
meio das palavras mais utilizadas nessas respostas, se a ideia sobre esses conceitos foram
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modificadas durante o período no qual os alunos cursaram a disciplina e que possíveis
contribuições uma disciplina teórica sobre inclusão escolar trouxe para esses alunos
refletirem sobre Inclusão Escolar e Deficiência.
Durante todo o segundo semestre de 2015, essas duas turmas, formadas para a
disciplina Educação Inclusiva, responderam um questionário, dado no primeiro dia de aula, a
fim de compreender o que esses alunos entendiam sobre Inclusão Escolar e Deficiência,
duas avaliações escritas e uma atividade extraclasse, na qual os alunos analisaram a
representação da pessoa com deficiência em um filme escolhido por eles sobre a temática.
Analisamos, nesse estudo, a primeira produção, que é o questionário sobre os
conhecimentos iniciais deles, e a avaliação escrita final, aplicada na penúltima semana de
aula da disciplina.
As respostas das questões transcritas do questionário inicial foram a das perguntas
“O que você considera que seja uma pessoa com deficiência?” e “O que você entende por
educação inclusiva?”, já da avaliação final foram “O que você considera que seja uma
pessoa com deficiência?” e “Comente a orientação geral, atual, da legislação brasileira para
a educação do aluno com deficiência”.
Durante o semestre, além dessas atividades descritas acima, as avaliações e a
atividade com os filmes, foi previsto na disciplina que os alunos lessem os textos teórico de
Banks-Leite e Galvão (2000)4, Goés (2002)5, Batista e Monteiro (2014)6, Freitas, Monteiro,
Camargo e Dainez (2014)7, Kassar (2012)8 e Laplane (2014)9. Os alunos tiveram, também,
contato com uma aluna doutoranda com deficiência visual, que realizava estágio docência
na disciplina e ministrou algumas aulas.
Resultados e discussões
O questionário aplicado no primeiro dia de aula foi respondido por 63 alunos, 34 da
turma de Filosofia e História e 29 da turma dos alunos de Letras. Uma das questões desse
questionário inicial era se esses alunos já tiveram contato com pessoas com deficiência.
Cerca de 92% dos alunos, isto é, 58 dos 63 alunos que responderam o questionário, já
tiveram algum contato com uma pessoa com deficiência, um dado que pode ser visto de
modo positivo, mostrando que nos últimos anos esses cidadãos tem estado em diversos
meios sociais, menos reclusos.
Quanto às questões analisadas nesse estudo, a resposta da questão “O que você
considera que seja uma pessoa com deficiência?”, respondida pelos 63 alunos que
responderam o questionário no primeiro dia de aula, teve um total de 1847 palavras, uma
média de 29 palavras por aluno. Foram consideradas as palavras mais utilizadas por esses
alunos nas respostas, desconsiderando as palavras chamadas de determinantes, como
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alguns artigos e pronomes, e conectoras, como preposições e conjunções, privilegiando o
uso de nomes, como substantivos e adjetivos, e alguns verbos que denotem as ideias que
os alunos têm sobre deficiência. As palavras mais utilizadas nas respostas dos alunos
foram: i) pessoa (72) e pessoas (22); ii) deficiência (44), deficiente (5), deficiências (3) e
deficientes (1); iii) algum (22) e alguma (14); iv) física (21) e físicas (5); v) mental (18),
mentais (6) e intelectual (5); vi) aquela (14), aquelas (2) e aqueles (1); vii) considero (12);
viii) limitação (11), limitações (6) e limite (1); ix) tipo (10); e x) sociedade (10), social (2) e
sociais (1).
Na avaliação final, realizada por um total de 74 alunos, na mesma questão sobre
deficiência, as respostas tiveram um total de 3251 palavras, uma média de 44 palavras para
cada aluno. Houve, dessa forma, um perceptível aumento de palavras utilizadas pelos
alunos quando discorrem sobre a deficiência, que possivelmente denota uma ampliação
para falar sobre o conceito, que deriva provavelmente do contato com a disciplina ao
decorrer do semestre. As palavras mais utilizadas nessas respostas foram: i) pessoa (101) e
pessoas (22); ii) deficiência (88), deficiente (28), deficientes (9) e deficiências (2); iii) física
(26) e físicas (9); iv) alguma (25) e algum (24); v) aquela (23), aquele (10), aquelas (4) e
aqueles (3); vi) possui (19), possuem (2) e possua (2); v) considero (18); vii) sociedade (15),
social (5), socializar (1) e sociais (1); viii) limitações (15), limitação (9) e limites (2); ix)
dificuldade (15) e dificuldades (4); e x) mental (14), intelectual (13) e mentais (7).
A partir das palavras mais utilizadas nessas duas produções, percebemos que a
ideia do conceito de Deficiência não teve mudanças significativas, as palavras mais
utilizadas são praticamente as mesmas, a única que aparece entre as mais utilizadas na
avaliação final e que não aparece entre os dez termos mais utilizadas dos questionários é
“possui”, que apesar de não estar entre as dez mais utilizadas dos questionários, foi
utilizada nove vezes. O conceito de deficiência dos alunos ainda está ligado a questão de
limitações e fatores biológicos, fato que pode ser observado a partir do uso dos termos
relacionados à deficiência e limitações físicas e mentais. Outro ponto a ser destacado é o
uso de termos relacionados à sociedade, que tiveram um aumento na avaliação final, apesar
de ainda pouco utilizados. O uso desses termos denota uma visão da deficiência como algo
definido, também, a partir do social, que é um dos focos da disciplina, apontar que a
deficiência é construída, também, a partir das interações sociais.
Nas repostas sobre Educação Inclusiva, no primeiro questionário, houve um total de
1622 palavras utilizadas, uma média de 26 palavras utilizadas por cada um dos 63 alunos
das duas turmas que responderam esse questionário. Entre os dez termos mais utilizados,
destacam-se: i) educação (64) e educacional (6); ii) inclusiva (33), incluir (7), inclusão (6),
incluído (3), inclui (3), inclua (3), inclusivos (1), incluídos (1) e incluídas (1); iii) deficiência
(27), deficiente (7), deficientes (4) e deficiências (2); iv) todos (19), todas (5), todo (3) e toda
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(1); v) pessoas (19) e pessoa (6); vi) aluno (15) e alunos (12); vii) ensino (12); viii) escolar
(11), escola (6) e escolas (3); ix) necessidades (9); e x) forma (7).
Já na avaliação final, na questão sobre as orientações legais sobre a inclusão
escolar, houve um total de 4989 palavras utilizadas nas respostas dos 74 alunos que fizeram
a avaliação, o que corresponde a uma média de 64 palavras utilizadas por cada um desses
alunos. Comparado ao questionário inicial, houve um aumento de 38 palavras na média por
alunos para falar sobre a Educação Inclusiva, mais do dobro de palavras utilizadas para
falar sobre o assunto no questionário inicial, o que inicialmente pode ser visto como um
ponto favorável. Dentre os termos mais utilizados, encontram-se: i) deficiência (93),
deficientes (17), deficiente (13) e deficiências (7); ii) alunos (85), aluno (72); iii) educação
(51), educativos (2), educacionais (2), educativas (1) e educacional (1); iv) legislação (49),
leis (18), lei (14), legislativa (1), legislações (1) e legal (1); v) ensino (47) e ensinos (1); vi)
escolas (44), escola (43), escolar (5) e escolares (3); vii) inclusão (43), incluído (6), incluir
(4), inclusivo (2), inclusiva (2), incluso (1) e incluídos (1); viii) direito (33), direitos (12) e
diretrizes (3); ix) brasileira (33), Brasil (7) e brasileiras (2); e x) todos (29) e todas (8).
Diferente do que aconteceu com o conceito de Deficiência, que entre o questionário
e a avaliação final não mostrou mudanças expressivas, o conceito de Inclusão Escolar teve
uma mudança significativa, que pode ser notada a partir da mudança de alguns dos termos
mais utilizados na avaliação final.
O aparecimento de palavras como “legislação”, “leis”, “direito” e “diretrizes”, que não
aparecem no primeiro questionário, denotam o conhecimento de que existem leis que
garantem o direito à educação da pessoa com deficiência. Interessante, também, notar o
uso das palavras “recursos” e “recurso” que aparecem três vezes no questionário inicial e,
apesar de não estar entre os dez termos mais utilizados, aparece 24 vezes na avaliação
final, o que nos faz refletir que os alunos dessas turmas começaram a pensar na educação
inclusiva como algo que é concretizado a partir de recursos que auxiliem o desenvolvimento
de determinado aluno. O próprio termo “desenvolvimento”, que no questionário inicial
aparece 7 vezes, na avaliação final aparece 18. Esse termo apresentou um acréscimo
também na questão sobre Deficiência, de 4 no questionário para 17 na avaliação final, o que
pode indicar que os alunos começaram a pensar em questões relacionadas ao
desenvolvimento desse aluno no âmbito escolar como algo que pode ser concretizado.
Por fim, um termo que apareceu na avaliação final, na questão sobre Inclusão
Escolar, foi “Salamanca”, que aparece 10 vezes, e no questionário inicial nenhuma. Vimos
isso como um ponto positivo, pois denota o conhecimento dos alunos sobre a Declaração de
Salamanca, assinada em 1994, que assinala a responsabilidade de nações e governos em
relação à educação das pessoas com necessidades especiais. Inclusive o ano de 1994
aparece 7 vezes nas respostas da questão sobre Inclusão Escolar da avaliação final,
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enfatizando o conhecimento dos alunos sobre essa Declaração. Ainda sobre a Declaração
de Salamanca, observamos que o conhecimento sobre ela teve um efeito maior para a
turma de alunos dos cursos de Letras Inglês e Língua Portuguesa, já que apenas um aluno,
identificado como T. E. V. P., da turma de História e Filosofia citou a Declaração assinada em
1994.
Conclusões finais
Nas últimas décadas, devido ao grande movimento de inclusão dos alunos com
deficiência, a educação tem demandando profissionais capacitados para lidar com a
heterogeneidade de alunos presentes em âmbito educacional. Sendo assim, como vimos,
muitos documentos têm orientado (BRASIL 1994, 2002) a profissionalização docente na
formação inicial, a partir de conteúdos e/ou disciplinas especificas, para trabalhar com esses
alunos em sala de aula.
Acreditamos, assim como defende Costa (2015), por exemplo, que a formação
teórica é de suma importância, uma vez que o conceito sobre determinada realidade, reflete
nas práticas adotadas. Assim, o conceito formulado pelo professor acerca do aluno com
deficiência e a inclusão escolar refletirão na tomada de decisões e elaboração e execução
do planejamento pedagógico, que pode valorizar ou não as condições e recursos para
desenvolvimento dos alunos.
Acerca do estudo realizado, observamos que a disciplina teórica Educação Inclusiva,
em uma universidade do interior do estado de São Paulo, contribuiu positivamente em
relação à legislação, parece que houve um resultado positivo nos alunos, que até então não
tinham conhecimento sobre os direitos dos alunos com deficiência à educação. Alguns
alunos desses cursos de licenciatura, no final da disciplina, como vimos, referem-se a
Declaração de Salamanca, que até então não era de conhecimento deles, que atesta a
responsabilidade do governo com a educação das pessoas com deficiência.
Por outro lado, as ideias sobre deficiência ainda parecem fortemente calcadas no
ideal da limitação biológico, houve pouco avanço em relação a uma visão mais social para a
deficiência, de que a deficiência além de determinada fisicamente e biologicamente, é
determinada, também, e fortemente a partir das interações sociais. Podemos compreender
que, provavelmente, isso acontece devido à limitação de contato dos alunos, em sua
formação inicial, com conteúdos voltados para a reflexão sobre a educação dos alunos com
deficiência, o que possibilitaria que esse conceito pudesse ser amplamente mais refletido e
desenvolvido.
Consideramos que este estudo possibilita refletir sobre caminhos para o
planejamento da disciplina de educação inclusiva de forma a garantir conteúdos que
339
enfatizem mais a importância do social para o desenvolvimento de todos os alunos, inclusive
e, principalmente, dos alunos com deficiência, colaborando assim para uma formação
profissional que saia da visão do senso comum sobre a educação do aluno com deficiência
e leve o professor a realizar criticamente e com autonomia seu papel na educação desses
alunos.
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Faculdade de Filosofia e Ciências, Marília. 2002.
Notas
¹ Informação retirada em <http://www.brasil.gov.br/educacao/2015/03/dados-do-censo-
indicam-aumento-de-matriculas-de-alunos-com-deficiencia>. Data de acesso: 15 de
novembro de 2015.
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² A discussão sobre esses questionários está presente no relatório final de pesquisa do
projeto “Deficiência e Linguagem Cinematográfica: contribuições para a formação do
professor”, fomentado pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica
(PIBIC/CNPq), desenvolvido pelo discente Mateus Henrique do Amaral e orientado pela
Professora Dra. Maria Inês Bacellar Monteiro, entre o período de agosto de 2014 e julho de
2015.
³ http://www.writewords.org.uk/word_count.asp
4 BANKS-LEITE, L.; GALVÃO, I. Uma introdução à história de Victor do Aveyron e suas
repercussões. In: BANKS-LEITE, L.; GALVÃO, I. (orgs.) A Educação de um selvagem: as
experiências pedagógicas de Jean Itard. Luci Banks-Leite, Izabel Galvão (orgs.) – São
Paulo: Cortez, 2000, p. 11-23.
5 GÓES, M. C. R. de. Relações entre desenvolvimento humano, deficiência e educação:
Contribuições da abordagem histórico-cultural. In: OLIVEIRA, M. K; SOUZA, D. T. R; REGO,
T. C. (org.). Psicologia, Educação e as temáticas da vida contemporânea. São Paulo:
Moderna, 2002, p. 95 – 114.
6 BATISTA, R. D.; MONTEIRO, M. I. B. O Braille e o material digitalizado no processo de
ensino-aprendizagem da leitura e da escrita de alunos cegos. In: MONTEIRO, M. I. B.;
FREITAS, A. P.; CAMARGO, E. A. A. (orgs.). Relações de ensino da perspectiva
inclusiva: alunos e professores no contexto escolar. Araraquara: Junqueira&Marin, 2014,
p.249-268.
7 FREITAS, A. P.; MONTEIRO, M. I. B.; CAMARGO, E. A. A.; DAINEZ, D. O olhar do outro
na constituição de uma aluna deficiente intelectual: imagens de educadores e colegas.
Comunicações, Piracicaba, ano 21, n. 2, p. 67-81, jul-dez 2014.
8 KASSAR, M. C. M. Educação especial no Brasil: desigualdades e desafios no
reconhecimento da diversidade. Educ. Soc., Campinas, v. 33, n. 120, p. 833-849, jul.-set.
2012.
9 LAPLANE, A. L. F. Condições para o ingresso e permanência de alunos com deficiência na
escola. Cad. Cedes, Campinas, v. 34, n. 93, maio-ago. 2014, p. 191-205.