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Castelo Branco Científica - Ano I - julho/dezembro de 2015 - www.castelobrancocientifica.com.br V - Nº 08 1 Faculdade Castelo Branco ISSN 2316-4255 A ENCÍCLICA ECOLÓGICA DO PAPA FRANCISCO GIOVANI MARINOT VEDOATO RESUMO O presente artigo visa, de forma panorâmica, apresentar a Carta Encíclica do Papa Francisco Laudato Si. Uma reflexão sobre o cuidado da casa comum, ou seja, o planeta terra. Palavras-chave: Ecologia. Encíclica. Francisco. Papa. ABSTRACT This article aims to present a panoramic way the Pope's Encyclical Letter Francisco Laudato Si. A reflection on the care of common home, that is, the planet earth. Keywords: Ecology. Encyclical. Francisco. Pope. Publicada em Roma, no dia 24 de Maio de 2015, solenidade de Pentecostes, o terceiro ano de pontificado do Papa Francisco, a Carta Encíclica Laudato Si (LS), ou a Encíclica ecológica como muitos vêm chamando, pode ser entendida como uma continuidade da Exortação Apostólica Envangelii Gaudium, sobre o anúncio do Evangelho no mundo atual. Essa ideia aparece claramente no corpo do documento quando diz: Pe. Dr. Giovani Marinot Vedoato é professor de Filosofia e Ética na Faculdade Castelo Branco, em Colatina – ES. LS 3.

A ENCÍCLICA ECOLÓGICA DO PAPA FRANCISCOcastelobrancocientifica.com.br/img.content/artigos/artigo138.pdf · constituição sobre a Igreja e a segunda, sobre a Igreja no mundo de

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Castelo Branco Científi ca - Ano I - julho/dezembro de 2015 - www.castelobrancocientifi ca.com.br V - Nº 08 �1

Faculdade Castelo Branco ISSN 2316-4255

A ENCÍCLICA ECOLÓGICA DO PAPA FRANCISCO

GIOVANI MARINOT VEDOATO

RESUMO

O presente artigo visa, de forma panorâmica, apresentar a Carta Encíclica do Papa Francisco Laudato

Si. Uma reflexão sobre o cuidado da casa comum, ou seja, o planeta terra.

Palavras-chave: Ecologia. Encíclica. Francisco. Papa.

ABSTRACT

This article aims to present a panoramic way the Pope's Encyclical Letter Francisco Laudato Si. A

reflection on the care of common home, that is, the planet earth.

Keywords: Ecology. Encyclical. Francisco. Pope.

Publicada em Roma, no dia 24 de Maio de 2015, solenidade de Pentecostes, o terceiro ano de

pontificado do Papa Francisco, a Carta Encíclica Laudato Si (LS), ou a Encíclica ecológica como

muitos vêm chamando, pode ser entendida como uma continuidade da Exortação Apostólica

Envangelii Gaudium, sobre o anúncio do Evangelho no mundo atual. Essa ideia aparece claramente no

corpo do documento quando diz:

�Pe. Dr. Giovani Marinot Vedoato é professor de Filosofia e Ética na Faculdade Castelo Branco, em Colatina – ES.

�LS 3.

Faculdade Castelo Branco ISSN 2316-4255

“Na minha exortação Evangelii Gaudium, escrevi aos membros da Igreja, a fim de

mobilizá-los para um processo de reforma missionária ainda pendente. Nesta

Encíclica, pretendo especialmente entrar em diálogo com todos acerca da casa

comum”�.

Essa dinâmica já foi muito utilizada na vida da Igreja por ocasião do Concílio Vaticano II através da

Constituição Dogmática Lumen Gentium e da Constituição Pastoral Gaudium et Spes. A primeira

constituição sobre a Igreja e a segunda, sobre a Igreja no mundo de hoje, portanto, uma reflexão da

práxis da Igreja sobre sua realidade ad intra e ad extra.

Na Laudato Si, o convite do Papa centra-se no horizonte de termos um convívio mais harmonioso com

o nosso planeta Terra. Dela vem nosso sustento. É nossa irmã e mãe�. Portanto, deve ser vista como

sacramento de comunhão�.

Infelizmente nosso estilo de vida e nossas formas de produção e consumo não indicam para essa

convivência harmoniosa. Cada vez mais estamos destruindo nossa casa comum, submetendo-a a uma

cruel destruição.

“Crescemos pensando que éramos seus proprietários e dominadores, autorizados a

saqueá-la”�.

Para uma devida compreensão da Encíclica, o artigo foi dividido em três grandes trechos. O primeiro

versa sobre a responsabilidade da humanidade perante a casa comum como carícia de Deus; o segundo

indica a necessidade de se passar de um paradigma antropológico para um paradigma ecológico; o

terceiro segue o caminho de sugestionar novos estilos de vida.

PRIMEIRO EIXO: A humanidade responsável diante da carícia de Deus

“Nunca maltratamos e ferimos a nossa casa comum como nos últimos dois

séculos. Mas somos chamados a tornar-nos os instrumentos de Deus para que o

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nosso planeta seja o que Ele sonhou ao criá-lo e corresponda ao seu projeto de

paz, beleza e plenitude”�.

As rápidas e profundas mudanças que se impuseram sobre o nosso planeta, nos últimos dois séculos,

não podem ser compreendidas sobre um todo harmônico. De um lado está o progresso criativo, motivo

de alegria o qual potencializa os dons que Deus nos deu.

“Somos herdeiros de dois séculos de ondas de enormes mudanças: a máquina a

vapor, a ferrovia, o telégrafo, a eletricidade, o automóvel, as indústrias

químicas, a medicina moderna, a informática e, mais recentemente, a revolução

digital, a robótica, as biotecnologias e as nanotecnologias”�.

Do ponto de vista da técnica são avanços fabulosos. Por outro lado, não se pode negar a criatividade

maléfica que coloca o planeta às portas da destrutividade. Exemplo disso é só acompanhar os jornais e

observar o quadro alarmante que envolvem as questões climáticas�, a questão da água�, a perda da

biodiversidade��, a deterioração da qualidade de vida�� e a desigualdade planetária��.

Perante esse alarmante quadro é que surge a convocação do Papa para uma humanidade responsável.

“O urgente desafio de proteger a nossa casa comum incluiu a preocupação de

unir toda família humana na busca de um desenvolvimento sustentável e

integral, pois sabemos que as coisas podem mudar. O criador não nos

abandona, nunca recua no seu projeto de amor, nem se arrepende de nos ter

criado. A humanidade possui ainda a capacidade de colaborar na construção de

nossa casa comum”��.

A pergunta que se coloca nesse momento é como desenvolver uma humanidade responsável frente ao

�LS 53.

�LS 102.

�LS 20-26.

�LS 27-31.

��LS 32-42.

��LS 43- 47.

��LS 48-51.

��LS 13.

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planeta como casa comum? Segundo o Papa, a resposta encontra-se em evocar uma nova postura

perante a terra.

“Não somos Deus. A terra existe antes de nós e foi-nos dada (...) Cada

comunidade pode tomar da bondade da terra aquilo de que necessita para

sua sobrevivência, mas tem também o dever de protegê-la e garantir a

continuidade da sua fertilidade para as gerações futuras”��.

Na verdade, a Encíclica propõe a passagem de uma visão antropocêntrica da Bíblia para uma visão

mais interessada por todas as criaturas como centro��. Logo, repaginar nossa visão de criação

submetida ao domínio humano, para uma leitura onde a criação é vista como carícia de Deus;

comunhão do divino com toda realidade criada.

“Todo o universo material é uma linguagem do amor de Deus, do seu carinho

sem medida por nós. O solo, a água, as montanhas: tudo é carícia de Deus”��.

SEGUNDO EIXO: Do antropocentrismo moderno ao paradigma ecológico

Como avançar na direção de um paradigma que privilegie o planeta como casa comum? A resposta do

Papa é enfática:

“Nos tempos modernos, verificou-se um notável excesso antropocêntrico, que

hoje, com outra roupagem, continua a minar toda referência a algo de

comum”��.

De fato, esse paradigma, que se sustentou ao longo da modernidade, precisa ser superado por um

paradigma que veja o ser humano como um nó de relações e não como centro, ou seja, a comunidade de

todas as criaturas está acima como valor vital, e não, simplesmente, o humano. Daí, a insistência do

escrito.

��LS 68.

��LS 76-83.

��LS 84.

��LS 116.

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“Quando o ser humano se coloca no centro, acaba por dar prioridade absoluta aos seus interesses

contingentes, e tudo o mais se torna relativo”��.

Na esfera religiosa o problema se coloca na mesma perspectiva.

“Se o ser humano se declara autônomo da realidade e se constitui

dominador absoluto, desmorona-se a própria base da sua existência,

porque em vez de realizar o seu papel de colaborador de Deus na obra da

criação, o homem substitui-se a Deus”��.

O despertar para uma ecologia integral é um caminho irrenunciável a ser percorrido hoje. Uma tarefa

para o presente�� e para o futuro��.

“Uma ecologia integral exige que se dedique algum tempo para recuperar a

harmonia serena com a criação, refletir sobre nosso estilo de vida e os nossos

ideais, contemplar o Criador, que vive entre nós, e naquilo que nos rodeia com

sua presença não precisa ser criada, mas descoberta, desvendada”��.

Em termos de sentimento e práxis planetária, significa assumir o planeta como casa comum.

“É necessário voltar a sentir que precisamos uns dos outros, que temos uma

responsabilidade para como os outros e o mundo, que vale a pena sermos bons

e honestos”��.

Comportamento capaz de gerar uma nova cotidianidade.

“Ecologia integral é feita também de simples gestos cotidianos, pelos quais

quebramos a lógica da violência, da exploração, do egoísmo”��.

��LS 122.

��LS 117.

��LS 143-158.

��LS 159-162.

��LS 225.

��LS 128.

��LS 230..

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TERCEIRO EIXO: Um novo estilo de vida

Para inaugurar esse terceiro eixo faz-se importante voltar a um belíssimo texto da Carta da Terra citado

pelo Papa.

“Como nunca na história, o destino comum obriga-nos a procurar um novo

início (...) que o nosso seja o tempo que se recorde pelo despertar de uma nova

reverência perante a vida, pela firme resolução de alcançar sustentabilidade,

pela intensificação da luta em prol da justiça e da paz e pela jubilosa celebração

da vida”��.

Para que esse novo início ocorra, a Encíclica propõe alguns caminhos: o diálogo sobre o meio ambiente

na política internacional��; o diálogo para as novas políticas nacionais e locais��; o diálogo e a

transparências nos processos decisórios��; política e economia em diálogo para a plenitude da vida�� e

as religiões no diálogo com as ciências��.

Ainda sobre um novo estilo de vida, chamam atenção no texto alguns pontos:

a) A necessidade de uma mudança da consciência.

“Falta a consciência de uma origem comum, de uma recíproca pertença e de

um futuro compartilhado por todos. Essa consciência basilar permitiria o

desenvolvimento de novas convicções, atitudes e estilos de vida”��.

b) O papel da educação.

“É muito nobre assumir o dever de cuidar da criação com pequenas ações

diárias, e é maravilhoso que a educação seja capaz motivá-las até dar forma a

um estilo de vida”��.

��LS 207.

��LS 164-175.

��LS 176-182.

��LS 182-188.

��LS 189-198.

��LS 199-201.

��LS 202.

��LS 211.

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c) A conversão ecológica.

“Os desertos exteriores se multiplicam no mundo, porque os desertos interiores

se tornam tão amplos. A crise ecológica é um apelo a uma profunda conversão

interior”��.

d) A fraternidade universal.

“O cuidado da natureza faz parte de um estilo de vida que implica capacidade

de viver juntos e em comunhão”��.

e) Uma nova espiritualidade.

“Quando alguém reconhece a vocação de Deus para intervir juntamente com

outros nessas dinâmicas sociais, deve lembrar-se que isso faz parte de sua

espiritualidade, é exercício de caridade e, deste modo, amadurece e se

santifica”��.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Trata-se de um escrito útil e necessário para o tempo presente. Além de apresentar o tema da criação

divina em chave ecológica e, por conseguinte, o papel do ser humano frente a uma ecologia integral, a

Encíclica do Papa Francisco indica também possíveis comportamentos para que o planeta, como casa

comum, possa ter sua sacramentariedade respeitada e preservada.

Um pequeno trecho da belíssima oração cristã sobre a criação posta no final da Encíclica serve como

conclusão desse artigo.

“Nós vos louvamos, Pai

Com todas as criaturas,

��LS 217.

��LS 228.

��LS 230.

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Que saíram da vossa mão poderosa.

São vossas e estão repletas de vossa presença

E da vossa ternura.

Louvado Sejais!”��

Referência Bibliográfica

PAPA FRANCISCO, Carta Encíclica Laudato Si, São Paulo: Paulinas, 2015.

��LS pg 195.