A e s t é t i c A m u s i c A l d A

BossA NovATuri Collura

C omo quase toda história, a da Bossa Nova guarda curiosidades interessantes. O movimento musical, que hoje tem seguidores no mundo inteiro, não surgiu de um dia para ou-tro. Seu nascimento oficial registrado como sen-do em 1958, por ocasião do lançamento do disco de Elizeth Cardoso "Canção do amor demais", com músicas de dois compositores já conheci-dos: Tom Jobim e Vinicius de Moraes. Apesar dos dois nomes importantes, o maior “aconte-cimento” do disco foi a “batida” da bossa nova inventada, no violão, por João Gilberto.

(Foto da capa do disco "Canção do amor demais")

Ao contrário do que se pode imaginar, o disco não despertou, na época, nenhum interesse par-ticular, aliás, vendeu pouco. Para falar a verdade, a bossa nova era considerada, por muitos, algo pouco interessante e pouco vendável. Afinal, ela rompia com alguns cânones estéticos tradicio-nais: seus cantores não tinham voz cheia, ao contrário, cantavam baixinho. Junte-se a isso as letras descompromissadas, livres de referências

sociais ou políticas, que só falavam em sol, mar, amor e coisas lindas, eis que a jovem corrente musical parecia algo efêmero e nada duradouro, algo que certamente não daria certo, tanto do ponto de vista artístico bem como do ponto de vista comercial.É interessante observar que as tendências mu-sicais e alguns dos personagens principais que fariam parte do movimento da Bossa Nova, já estavam trabalhando há alguns anos para che-gar à cristalização definitiva desse estilo musi-cal. De fato, nos anos 50, a cidade do Rio de Janeiro era cenário de situações, personagens e lugares para que “a mágica” desse fenômeno musical acontecesse.

Podemos distinguir dois tipos de fundadores da Bossa Nova: de um lado há uma geração de músicos já atuantes na cena musical carioca tais como Johnny Alf, João Gilberto, Tom Jobim, João Donato, Newton Mendonça, Billy Blanco, Lúcio Alves, Vinicius de Moraes entre outros. De outro lado há uma geração mais jovem, à qual pertenciam, por exemplo, Roberto Menescal, Ronaldo Bôscoli, Carlos Lyra, músicos abertos às novidades, receptivos e de grande talento musical.

(Tom e Vinicius)

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(Carlos Lyra)

Os elementos musicais da Bossa NovaNormalmente, ao pensarmos na Bossa Nova, pensamos em dois elementos que a caracteri-zam: as harmonias rebuscadas (vindas do jazz e da música europeia) e as peculiaridades rítmi-cas, vindas do samba. Mas as harmonias rebus-cadas faziam já parte de certo repertório musi-cal da década de 1950, oriundas tanto do jazz norte-americano (dos discos de Frank Sinatra e das big bands), bem como da música culta eu-ropeia, em especial modo da de Debussy e da música impressionista. Canções como “Falseta”, de Johnny Alf, e “De cigarro em Cigarro”, de Luiz Bonfá, seriam muito citadas como “já sendo Bos-sa Nova” por via de seus caminhos harmônicos. Todavia, o que lhes faltava ainda era a famosa “batida” de João Gilberto. O pianista Johnny Alf tinha já composto canções como “Céu e mar”, “O que é amar”, “Estamos sós” e “É só olhar”, que podem ser consideradas as irmãs mais velhas da futura Bossa Nova.

Os elementos rítmicos da Bossa Nova, por sua vez, vieram da tradição musical do samba. De fato, a “batida” do violão de Gilberto, é uma adaptação, ao violão, de um desenho típico de samba do tamborim.

Dentro do mundo do samba, na década de 30 havia surgido o samba-canção, um gênero de canção lenta, misturada com elementos do cho-ro (no começo se dizia samba-canção ou choro-canção). Comparado ao bolero, pela exaltação do tema amor-romântico ou pelo sofrimento de um amor não realizado, foi chamado também de dor-de-cotovelo ou fossa. Algumas cantoras, como, por exemplo, Elizeth Cardoso, Maysa Ma-tarazzo, Nora Ney, Ângela Maria e Dolores Du-ran, cantavam samba-canção antes de migrar para a bossa nova.

(Fotos de cima: dois discos de Roberto Menescal; foto de baixo: Nara Leao).

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