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I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015 A Expansão da Organização para a Cooperação de Xangai (OCX): Uma Coalizão Anti-Hegemônica? Erik Herejk Ribeiro 1 Resumo Este estudo tem por objetivo discutir os aspectos securitários da expansão da Organização para a Cooperação de Xangai (OCX), decorrentes da inclusão de Índia e Paquistão em julho de 2015. Argumenta-se que este movimento representa uma nova fase da Organização, com o aprofundamento da coalizão entre China e Rússia contra a hegemonia dos EUA no Sistema Internacional. A proposta de inclusão de Índia e Paquistão na OCX promove e traz complexidade à integração regional e à regionalização da segurança, estimulando a coordenação multilateral para questões envolvendo o Afeganistão e o restante da massa continental eurasiana. Além disso, a OCX promove o conteúdo ético do Espírito de Xangai para a ordem internacional, que se coloca como alternativa normativa ao Neoconservadorismo Unilateral dos EUA. Destaca-se o respeito à soberania e construção de capacidades estatais. O estudo analisa os fundamentos da hegemonia americana, a contestação desta ordem, a proposta e o funcionamento da OCX e os desafios securitários enfrentados em suas diferentes fases. Palavras-chave: Organização para a Cooperação de Xangai; Hegemonia; Segurança Regional; Relações Internacionais da Ásia. Introdução Este estudo apresenta uma análise sobre a Organização para a Cooperação de Xangai (OCX) e sobre sua importância para a Segurança Internacional. Argumenta-se que o aprofundamento da coalizão 2 e a inclusão de novos membros (Índia e Paquistão, em julho de 2015) ocorre como uma reação à hegemonia dos Estados Unidos e representa uma nova fase institucional da OCX. Esta hegemonia, que será objeto de análise na seção seguinte, é baseada em aspectos materiais e ideológicos. Os EUA buscam a primazia militar e a manutenção da capacidade de intervenção decisiva na massa continental eurasiana. No entanto, observa-se que a emergência de capacidades militares assimétricas dos demais países desafia o planejamento de guerra dos EUA. A ausência de uma Grande Estratégia 3 que se adapte a esta realidade tem se mostrado problemática, pois tem sido substituída por conceitos técnico-operacionais preemptivos na esfera 1 Mestre e Doutorando em Estudos Estratégicos Internacionais/UFRGS. E-mail: [email protected]. Bolsista CAPES. 2 Considera-se que a OCX representa uma coalizão e não uma aliança, pois é baseada em objetivos específicos como o combate a ameaças não tradicionais, não prevê um tratado abrangente de defesa mútua entre seus membros e não é direcionada contra nenhum país ou bloco de países. 3 Grande Estratégia é a conjunção de todos os fatores de poder nacional (sociais, econômicos, institucionais e militares) de um país para atingir objetivos da esfera da Estratégia, que compreende a relação entre a política e a guerra.

A Expansão da Organização para a Cooperação de Xangai (OCX) · Xangai para a ordem internacional, ... que promove uma filosofia diferente na condução da ordem ... acentuou

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I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

A Expansão da Organização para a Cooperação de Xangai (OCX):

Uma Coalizão Anti-Hegemônica?

Erik Herejk Ribeiro1

Resumo

Este estudo tem por objetivo discutir os aspectos securitários da expansão da Organização para a Cooperação de Xangai

(OCX), decorrentes da inclusão de Índia e Paquistão em julho de 2015. Argumenta-se que este movimento representa

uma nova fase da Organização, com o aprofundamento da coalizão entre China e Rússia contra a hegemonia dos EUA

no Sistema Internacional. A proposta de inclusão de Índia e Paquistão na OCX promove e traz complexidade à

integração regional e à regionalização da segurança, estimulando a coordenação multilateral para questões envolvendo o

Afeganistão e o restante da massa continental eurasiana. Além disso, a OCX promove o conteúdo ético do Espírito de

Xangai para a ordem internacional, que se coloca como alternativa normativa ao Neoconservadorismo Unilateral dos

EUA. Destaca-se o respeito à soberania e construção de capacidades estatais. O estudo analisa os fundamentos da

hegemonia americana, a contestação desta ordem, a proposta e o funcionamento da OCX e os desafios securitários

enfrentados em suas diferentes fases. Palavras-chave: Organização para a Cooperação de Xangai; Hegemonia; Segurança Regional; Relações Internacionais

da Ásia.

Introdução

Este estudo apresenta uma análise sobre a Organização para a Cooperação de Xangai (OCX)

e sobre sua importância para a Segurança Internacional. Argumenta-se que o aprofundamento da

coalizão2 e a inclusão de novos membros (Índia e Paquistão, em julho de 2015) ocorre como uma

reação à hegemonia dos Estados Unidos e representa uma nova fase institucional da OCX.

Esta hegemonia, que será objeto de análise na seção seguinte, é baseada em aspectos

materiais e ideológicos. Os EUA buscam a primazia militar e a manutenção da capacidade de

intervenção decisiva na massa continental eurasiana. No entanto, observa-se que a emergência de

capacidades militares assimétricas dos demais países desafia o planejamento de guerra dos EUA. A

ausência de uma Grande Estratégia3 – que se adapte a esta realidade – tem se mostrado

problemática, pois tem sido substituída por conceitos técnico-operacionais preemptivos na esfera

1 Mestre e Doutorando em Estudos Estratégicos Internacionais/UFRGS. E-mail: [email protected]. Bolsista

CAPES. 2 Considera-se que a OCX representa uma coalizão e não uma aliança, pois é baseada em objetivos específicos como o

combate a ameaças não tradicionais, não prevê um tratado abrangente de defesa mútua entre seus membros e não é

direcionada contra nenhum país ou bloco de países. 3 Grande Estratégia é a conjunção de todos os fatores de poder nacional (sociais, econômicos, institucionais e militares)

de um país para atingir objetivos da esfera da Estratégia, que compreende a relação entre a política e a guerra.

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militar e pelo Imperialismo (Liberal ou Neoconservador) na esfera ideológica. Em relação ao

Imperialismo, os estadunidenses apostaram no efeito físico e psicológico das Guerras de

Demonstração e das guerras encobertas para promover a democracia e o capitalismo liberal nos

países periféricos. Especificamente, a ascensão do Neoconservadorismo Unilateral4 (a partir de

2001) aprofundou a desestabilização do Afeganistão e do Iraque, aumentando a insegurança

regional e o papel da insurgência islâmica.

Em resposta ao Neoconservadorismo Unilateral, a Carta da OCX (2002) traz um conteúdo

ético conhecido como Espírito de Xangai, que promove uma filosofia diferente na condução da

ordem internacional. Este conteúdo ético procura reforçar a construção dos Estados locais, a

consolidação da soberania e a busca pelo consenso multilateral e pela integração econômica (sob a

liderança dos países de maior expressão). Argumenta-se que, no longo prazo, a promoção do

Espírito de Xangai tem potencial para proporcionar uma alternativa normativa para as relações

interestatais e para a condução dos assuntos de Segurança Internacional.

Num primeiro momento, China e Rússia procuraram distender suas relações no pós-Guerra

Fria, criando um espaço de influência conjunta na Ásia Central. Posteriormente, a Guerra ao Terror

acentuou os processos regionais de securitização e a expansão de redes extremistas. Além disso, a

invasão do Iraque em 2003 demonstrou o interesse dos EUA na remodelação (ou, nos termos de

Mearsheimer, engenharia social) de Estados frágeis considerados como não democráticos.

A partir de então, a OCX é melhor instrumentalizada para promover a estabilização dos

Estados membros e a coordenação militar contra ameaças não convencionais. Os interesses de seus

membros convergem em pontos específicos, nomeadamente a estabilidade securitária regional, o

combate a ameaças não-tradicionais, a cooperação econômica e um conteúdo ético que valoriza

(entre outros fatores) a soberania e a não intervenção.

Atualmente, num contexto de retirada dos EUA no Afeganistão, a Organização expande seu

escopo de atividades para lidar de forma mais decisiva com a instabilidade afegã. A iniciativa de

aceitar Índia e Paquistão como países membros tem como uma de suas finalidades o gerenciamento

da situação no Afeganistão, que não pode ser resolvida sem a aquiescência dos serviços

paquistaneses e o apoio indiano. Além disso, a distensão das relações indo-paquistanesas, mediada

informalmente pela OCX, traria benefícios para todos os países da região. A perspectiva de

4 Embora não haja consenso sobre suas características, pode-se citar: intervenção militar unilateral, promoção coercitiva

da mudança de regime, imposição do liberalismo político e econômico, crença na universalidade dos valores

Ocidentais, visão de mundo sob a ótica de conflitos civilizacionais.

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distensão é reforçada pela intenção em reunir – em torno da OCX – os projetos de integração

regional promovidos pela China (Rota da Seda) e pela Rússia (União Eurasiana). Por conta da

magnitude destes fatores, argumenta-se que a Organização entra em uma nova fase, marcada pela

promoção de novas normas de interação securitária (o Espírito de Xangai), pela integração

econômica regional e pela regionalização da segurança através do gerenciamento dos dois maiores

focos de instabilidade na porção central da massa eurasiana.

As seções seguintes trazem as seguintes análises: Em primeiro lugar, discute-se a percepção

estadunidense sobre os fundamentos de sua hegemonia, nomeadamente a busca pela primazia

militar e a capacidade de intervir na massa Eurasiana a partir de suas extremidades (Europa, Oceano

Índico e Oceano Pacífico). Posteriormente, contextualiza-se a mudança de postura dos EUA em

direção ao Neoconservadorismo Unilateral e a reação dos países periféricos e semiperiféricos,

dentre as quais se destaca a OCX na esfera securitária. As três seções sobre a OCX abordam

respectivamente: o conteúdo ético e normativo da Organização; a proposta de atuação e a resposta

da OCX aos desafios securitários regionais e, por último, o significado da inclusão de Índia e

Paquistão como membros plenos.

A hegemonia dos Estados Unidos no pós-Guerra Fria

O argumento elaborado nesta seção aponta que a hegemonia5 estadunidense, conquistada

após a derrocada da União Soviética6, passa por um momento de forte contestação. Ressaltam-se

dois motivos principais na esfera político-securitária: a emergência de Estados capazes de colocar

em dúvida o sucesso da projeção de força dos EUA e o fracasso do neoconservadorismo unilateral.

Esta seção traz três discussões relacionadas à hegemonia dos Estados Unidos a partir da

década de 1990. A primeira procura compreender a percepção estadunidense sobre as fundações de

sua hegemonia, quais sejam: A busca pela superioridade militar decisiva (primazia) e a capacidade

de intervenção em todas as regiões da Eurásia. A segunda versa sobre a natureza cambiante desta

5 Adota-se aqui como base o conceito gramsciano de hegemonia: coerção e consenso. A coerção seria a faceta ou

manifestação material da hegemonia através da violência ou ameaça de uso da força. O consenso seria a capacidade de

introduzir em outros países um conjunto de valores, crenças e projeções simbólicas que conformam uma determinada

ética de conduta (FARIA, 2013). Embora seja totalmente reconhecida a importância de aspectos econômicos,

tecnológicos e financeiros da hegemonia, a proposta atual limita-se a analisar as faces securitária e ideológica. 6 A derrocada da URSS é vista como um marco para o início da hegemonia americana por proporcionar, pela primeira

vez, três vitórias de nível verdadeiramente global: a superioridade militar incontestável, a vitória ideológica e a adesão

global às instituições mundiais criadas com a liderança dos Estados Unidos após a Segunda Guerra Mundial.

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ordem hegemônica, que passou do liberalismo multilateral ao neoconservadorismo unilateral a

partir de 2001. Por fim, serão elencados os elementos que indicam uma contestação crescente à

hegemonia americana nas esferas militar e política.

No plano estratégico, os Estados Unidos buscam a primazia nuclear, que é definida pela

capacidade de destruição completa do arsenal nuclear inimigo sem que haja capacidade de contra-

ataque (LIEBER; PRESS, 2006). Eliminando a possibilidade de dissuasão7, os estadunidenses

teriam não somente a capacidade de vencer guerras, mas de assegurar sua inviolabilidade, de

promover seus interesses e de moldar a ordem internacional (HUNTINGTON, 1993, p. 70). Apesar

de contarem com grande arsenal nuclear, os Estados Unidos esbarram nas capacidades de contra-

ataque (ou segundo ataque) de China e Rússia8. Os EUA optaram, então, pela construção de

Sistemas de Mísseis Balísticos de Defesa (BMD) nos países da Organização do Tratado do

Atlântico Norte (OTAN) e no Japão (PICCOLLI, 2012; RIQIANG, 2013). Conforme alertam

Martins e Cepik (2014, p. 16), o eventual comissionamento pelos Estados Unidos de mísseis

hipersônicos antibalísticos9 colocaria em cheque a capacidade retaliatória de China e Rússia, pois

impediria que os mísseis lançados atingissem ativos ou o próprio solo americano (ou aliado).

No entanto, mesmo que os EUA obtenham futuramente a primazia nuclear (a pesados custos

econômicos10

), a observação de aspectos puramente técnicos negligencia a própria subordinação da

guerra à política e evidencia a ausência de uma Grande Estratégia clara dos Estados Unidos para o

Século XXI. Por trás do discurso defensivo do BMD, encontra-se uma lógica de guerra

preemptiva11

(ou mesmo preventiva), onde os EUA se propõem a neutralizar uma ameaça antes que

7 Dissuasão significa o uso da ameaça de retaliação para convencer a outra parte a não tomar a iniciativa militar.

8 Estes dois países possuem mísseis de longo alcance em bases fixas e móveis, configurando a chamada tríade nuclear

de lançadores em terra, mar (submarinos) e ar (bombardeiros). Suas capacidades incluem os Mísseis de Reentrada

Múltipla Independentemente Direcionados (MIRV), que potencializam sua tríade nuclear. 9 As armas hipersônicas são mais velozes (acima de cinco vezes a velocidade do som) e sua trajetória alcança camadas

exteriores da atmosfera. Sua principal vantagem é a possibilidade de alterar sua trajetória final, sendo menos vulnerável

à interceptação. O programa estadaunidense Prompt Global Strike (2003) deu origem à pesquisa e ao desenvolvimento

destas armas, sob a justificativa da necessidade em construir um sistema baseado em solo estadunidense que pudesse

penetrar qualquer defesa e atingir qualquer alvo em menos de uma hora. 10

É importante notar as críticas de Drezner (2013) e de Martins e Cepik (2014) acerca dos custos excessivos da

primazia militar. Estes autores apontam que, do ponto de vista econômico e político, a busca pela primazia se mostra

contraproducente. 11

Segundo Colin Gray (2007), a preempção ocorre quando um Estado ataca primeiro na iminência ou durante a

condução de um ataque inimigo. A guerra preventiva (como foi o caso do ataque ao Iraque em 2003) ocorre quando um

Estado ataca primeiro, pois teme que a correlação de forças se altere de forma desfavorável no futuro. O autor aponta

que, embora não seja um equívoco considerar a utilização destes instrumentos, o governo George Bush (2001-2008)

substituiu conceitos estratégicos como contenção e dissuasão para adotar um conceito que é meramente operacional,

utilizado apenas ocasionalmente conforme a necessidade estratégica.

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ela reúna condições (ou iniciativa) para ataca-lo. No caso da Ásia-Pacífico, esta lógica é

materializada pelo conceito de Batalha Aeronaval (Air-Sea Battle12

), que prevê ataques em

profundidade para destruir as redes eletrônicas, capacidades retaliatórias e bases adversárias,

prostrando o adversário. A questão é que há altos custos humanos em uma guerra nuclear e chance

de reconstrução e de retaliação futura pelo inimigo. Além disso, não há como garantir sucesso na

esfera das operações ao invadir China ou Rússia, por exemplo (CEPIK; ÁVILA; MARTINS, 2009;

MARTINS; CEPIK, 2014).

Se a obtenção da primazia nuclear não é suficiente para sustentar o pilar securitário da

hegemonia estadunidense, recorre-se à geopolítica como elemento explicativo. Embora não caiba

um esforço abrangente para abordar as alternativas de Grande Estratégia para os EUA13

, é

necessário analisar os elementos geopolíticos que sustentam a ordem internacional hegemônica.

Barry Posen (2003) coloca no centro da hegemonia americana o conceito de Comando dos Comuns

(comando do mar, do espaço e do ar). Segundo Posen, o elemento fundamental para a manutenção

da hegemonia é a superioridade militar dos EUA no acesso e na negação do acesso de terceiros às

áreas comuns. O comando dos mares habilita a projeção de força para todos os continentes, o

comando do espaço dá consciência de situação para atuar nas massas terrestres e no mar, o

comando do ar possibilita ataques de precisão e de profundidade nos territórios adversários.

Acompanhando a lógica do Comando dos Comuns, Brzezinski (1997, p. 23) afirma que a

hegemonia americana é a primeira de cunho verdadeiramente global, calcada na sua capacidade

ímpar de projeção de força nas extremidades da Eurásia (Europa e Pacífico) e no Golfo Pérsico

(Oceano Índico). Segundo Brzezinski (1997, 2012) a chave para a hegemonia global é o tabuleiro

da Eurásia. Embora pareça um relativo contrassenso, os Estados Unidos dependem do

gerenciamento de um espaço geograficamente distante, do qual não fazem parte. Portanto, o que

mantém a hegemonia americana é sua capacidade de intervir em todas as regiões da Eurásia e,

principalmente, de impedir que haja a confluência entre Grandes Potências que possa ameaçar seu

acesso extracontinental, seja a partir da Europa, do Oceano Índico, ou do Pacífico (BRZEZINSKI,

1997, p. 35).

12

Em 2015, o conceito foi renomeado para Joint Concept for Access and Maneuver in the Global Commons (JAM-

GC). Supostamente, o novo conceito deve promover maior inclusão das forças terrestres nas operações. 13

Para um debate sobre a Grande Estratégia dos EUA, ver Posen e Ross (1996) e Brown et al (2000). Em geral, os

argumentos se dividem entre “engajamento seletivo” (POSEN, 2014) e a primazia (BROOKS; IKENBERRY;

WOHLFORTH, 2013).

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Passando para o segundo enfoque, a hegemonia americana passou por transformações

políticas desde a década de 1990, influenciando as percepções dos outros países e, por

consequência, afetando suas bases ideológicas. Com o fim da Guerra Fria, a política externa dos

Estados Unidos prezou pela promoção da democracia liberal e dos valores ocidentais, buscando

planificar e padronizar governos estrangeiros e normas internacionais. Os EUA se promoveram

como a superpotência benigna capaz de garantir a estabilidade global, a cooperação institucional e a

funcionalidade das economias e dos mercados. Por trás deste discurso, havia a intenção de controlar

– através das instituições globais, das mudanças de regime político e do liberalismo econômico – os

países sujeitos à ordem liderada pelos estadunidenses.

Como bem observa Mearsheimer (2011), esta “Grande Estratégia” já é imperial no seu

núcleo: segundo seus proponentes, os Estados Unidos teriam o direito e a responsabilidade de

interferir na política interna dos países. A mudança dos anos 1990 para os anos 2000 não diz

respeito a uma mudança de mentalidade, senão de postura. Os “imperialistas liberais” acreditam que

as “engenharias sociais” no exterior podem ser feitas pela conjunção entre aliados, instituições

internacionais e pela ação militar. Já os neoconservadores – em ascensão a partir do governo

George W. Bush (2001-2008) – acreditam muito mais na força militar e no unilateralismo, pois os

Estados Unidos possuem poder incomparável e irrestrito, logo, não há necessidade em

comprometer-se com aliados e instituições que drenam os esforços estadunidenses

(MEARSHEIMER, 2011, p. 19).

O neoconservadorismo unilateral do governo W. Bush teve como principais elementos o

lançamento da Guerra ao Terror e a escolha de países párias pertencentes ao “eixo do mal” (Coreia

do Norte, Irã, Iraque, Mianmar, Síria), que teriam em comum a tirania e uma suposta

irracionalidade, que impediria a simples dissuasão por parte do Ocidente (NASSER; TEIXEIRA,

2010). Após o 11 de Setembro, o Afeganistão foi o primeiro escolhido para a ação militar exemplar,

seguido em 2003 pelo Iraque de Saddam Hussein. A ocupação estadunidense nestes dois países

aumentou o antiamericanismo e escancarou a debilidade da mudança de regimes à força

(MEARSHEIMER, 2011, p. 21-22).

Os Estados Unidos também não deixaram de lado seus dois principais competidores

estratégicos: China e Rússia. No caso russo, o principal desenvolvimento foi a expansão da OTAN

para o Leste Europeu, assediando Estados pós-soviéticos como a Geórgia e a Ucrânia. Ao mesmo

tempo, as chamadas Revoluções Coloridas (mudança de regime) invadiram o espaço pós-soviético

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na Ásia Central e Leste Europeu, Mianmar (Revolução do Açafrão em 2007) e Taiwan (Revolução

dos Girassóis em 2014). O próprio Mearsheimer (2014) reconhece que não é segredo o apoio da

CIA e de agências americanas a grupos pró-democracia em países escolhidos para a engenharia

social. As revoltas árabes de 2011 fizeram parte deste mesmo processo (MONIZ BANDEIRA,

2013). Por isso não surpreende a revelação de documentos do Departamento de Defesa dos EUA

que analisam o Estado Islâmico – nascido dos escombros da Guerra Civil Síria – como um possível

“ativo estratégico”, ainda em 2012 (BHADRAKUMAR, 2015).

Dado que o neoconservadorismo é essencialmente uma estratégia imperialista, é necessário

recorrer a duas análises críticas sobre o imperialismo americano. Em primeiro lugar, pode-se fazer

uma analogia com a abordagem de Mike Davis (1985) sobre a Guerra Fria, chantagem nuclear e a

“Nova Direita” (neoconservadores). Segundo o autor, a centralidade do conflito bipolar não dizia

respeito à Europa – onde já havia divisão das esferas de influência – mas sim ao Terceiro Mundo.

Hoje, é a periferia do Sistema Capitalista que está em disputa. Logicamente, não pode haver ordem

internacional sem seguidores e sem adesão à hegemonia estadunidense. Em um mundo cada vez

mais complexo, globalizado e avançado tecnologicamente, a ascensão dos países do Sul coloca a

ordem atual em questão.

Devido à falta de impeditivos ou restrições à ação militar estadunidense, a chantagem

nuclear e o guarda chuva nuclear para apoiar as contrarrevoluções no Terceiro Mundo foram

substituídos pela Guerra de Demonstração. Na análise de Ellen Wood e Larry Patriquin (2012), o

Imperialismo estadunidense assumiu a real forma do Capitalismo: não há mais conquista colonial e

sim dominação econômica extraterritorial. Aqueles que não se submeterem à ordem econômica

liberal ou tiverem caminhos de desenvolvimento próprios estarão sujeitos à intervenção. Assim, os

EUA realizam papel de polícia mundial e garantem um império sem fronteiras através do poder

psicológico (interno e externo) e do “terror exemplar”. O problema central, no entanto, é a falta de

objetivo estratégico, negligenciando a subordinação da guerra à política (WOOD; PATRIQUIN,

2012, p. 256-260).

Ao longo dos anos 2000, emergiram elementos de contestação à continuidade da hegemonia

estadunidense. Argumenta-se que há mudanças na dinâmica internacional, traduzidas em maior

distribuição de capacidades militares, na reação da periferia e semiperiferia ao neoconservadorismo

e no retorno das identidades nacionais.

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Ao longo dos anos 2000, enquanto os Estados Unidos estavam imersos nas duas guerras

mais longas de sua história, emergiam competidores políticos e securitários. Embora os EUA ainda

tenham o Comando dos Comuns, Grandes Potências como China e Rússia e Potências Regionais

como o Irã já são capazes de, na esfera das operações, criar Zonas Contestadas, onde a vitória

estadunidense passou a ser incerta (POSEN, 2003). Sua intenção não era competir com o vasto

poder americano, mas criar estratégias assimétricas de autodefesa, capazes de inviabilizar os custos

de uma invasão e colocar seu sucesso em questão. Posteriormente, as estratégias assimétricas

ficaram conhecidas como Negação de Área e Antiacesso14

(A2/AD).

A digitalização da guerra também se constitui num fenômeno central para a horizontalidade

de capacidades militares, pois o processo de assimilação tecnológica colocou principalmente China

e Rússia em condições de empregar a guerra informatizada (ÁVILA; CEPIK; MARTINS, 2009). A

Índia também se aproxima da autonomia militar e tecnológica, ao empregar sistemas de satélites

indígenas, ao iniciar a operação de sua tríade nuclear e ao modernizar suas capacidades

convencionais. Portanto, mesmo que não seja de seu interesse contestar a hegemonia americana de

forma frontal, a Índia tem cada vez mais capacidade de ação autônoma na esfera securitária.

As instituições multilaterais15

foram seletivamente ignoradas pelos estadunidenses nas

últimas décadas. Por consequência, os países emergentes da periferia e semiperiferia buscaram não

somente democratizar a ordem internacional vigente, mas também criar e reforçar suas próprias

pontes regionais e inter-regionais, desconcentrando a governança global (CEPIK, 2013, p. 314).

Estava em curso um movimento cada vez maior de contestação de uma ordem hegemônica

unilateral, baseada no conteúdo ético do neoconservadorismo (intervenção militar, mudança de

regime, imposição do liberalismo político e econômico, a universalidade dos valores Ocidentais,

conflitos civilizacionais).

As Guerras de Demonstração, apesar de inicialmente terem algum sucesso, logo

evidenciaram a fragilidade do projeto de mudança de regime pela força externa. Da mesma forma,

as Revoluções Coloridas fracassaram e trouxeram maior instabilidade política. Ao final de contas,

14

De forma resumida, as operações A2/AD em terra são feitas por artilharia, foguetes e mísseis de curto ou médio

alcance. No mar, há o emprego de mísseis antinavio (cruzadores ou balísticos) e de submarinos dotados com torpedos

ou mísseis cruzadores. Mais próximo à costa, há o emprego de minas marítimas, de submarinos de menor alcance, de

pequenos navios torpedeiros e de lanchas de ataque rápido. Pelo ar, aviões caça, bombardeiros e helicópteros podem

possuir mísseis antinavio e antissubmarino (KREPINEVICH, 2010, p. 10). 15

Pode-se citar, por exemplo, o Conselho de Segurança da ONU e regimes comerciais, ambientais, de controle de

armas e de energia nuclear.

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percebeu-se que o Império causava mais terror do que prosperidade. Como o próprio Brzezinski

(2012, p. 64) reconhece, a “América deveria repensar seriamente se explorou de forma inteligente a

oportunidade extraordinária do fim pacífico e geopoliticamente favorável da Guerra Fria”.

Nota-se que houve uma mudança nas identidades dos países do BRICS (Brasil, Rússia,

Índia, China e África do Sul) justamente a partir da desilusão com o modelo estadunidense e com o

ressurgimento de seus poderes e valores nacionais (MIELNICZUK, 2013). Todos os novos

agrupamentos liderados por países do Sul (BRICS, G20, IBAS) apontam para o desejo de

multipolaridade e de um Sistema Internacional mais justo nas esferas econômica e política. É neste

contexto que a OCX, formalizada em 2001, representa uma rejeição ao neoconservadorismo e à

ordem hegemônica unilateral.

Contestando a hegemonia: O conteúdo ético da Organização para a Cooperação de Xangai

A questão da ética é um elemento essencial da política internacional contemporânea. Em

jogo estão disputas ideológicas e políticas sobre os rumos das sociedades e sobre o papel do

conjunto sobre as unidades. Seguindo a interpretação weberiana16

, o neoconservadorismo

representaria a ética das finalidades. Ou seja, os meios duvidosos da guerra aberta e encoberta

contra Estados considerados como não democráticos tem o objetivo de levar a “verdadeira”

democracia a estas sociedades. Esta lógica baseou-se na interpretação extremamente equivocada

presente na obra “O Fim da História”, de Francis Fukuyama. Ali foi fabricada a ideia de que o

futuro seria de inevitável progresso e que todas as sociedades atingiriam prosperidade e estabilidade

ao seguirem os princípios da democracia liberal e do livre mercado. Os neoconservadores tomaram

para si a missão de cumprir o destino vislumbrado por Fukuyama, negligenciando qualquer

experiência histórica, cultural e política de outros modelos de sociedade.

O conteúdo ético da OCX vai de encontro à hegemonia estadunidense exatamente por adotar

uma visão balanceada entre meios e fins. Não é possível adotar um modelo de ação com sucesso

que desconsidere a experiência histórica, seja no viés das Relações Internacionais ou da Sociologia.

16

Weber distingue dois tipos de ética: a “ética das últimas finalidades” – absoluta, com ênfase em princípios e nos

meios empregados – e a “ética da responsabilidade”, que recai sobre os resultados finais. No entanto, emergem

paradoxos nos dois casos: como criar uma ética moralmente pura em seus meios, se a violência é recorrente nas

relações humanas e sociais? O que seria uma finalidade “boa” e quando esta justificaria o emprego de meios duvidosos?

O ideal, portanto, seria o uso complementar da ética dos fins e dos meios, não considerando parâmetros pré-

estabelecidos ou se apegando puramente a princípios (NEGRI, 2003, p. 83-85).

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A grande falha do neoconservadorismo foi aceitar que vivemos num mundo plano, totalmente

globalizado e que é facilmente adaptável institucional e economicamente a modelos importados.

Outra falha de igual proporção foi acreditar que governos sem o monopólio da força e sem

legitimidade interna poderiam assumir a tarefa de construção do Estado. Assim, a ética da OCX se

coloca como uma alternativa filosófica à unipolaridade ideológica propagada pelos EUA.

China e Rússia, os dois pilares da Organização, publicaram pelo menos três documentos

conjuntos (1997, 2001 e 2005) enfatizando a promoção da multipolaridade; o respeito à diversidade

cultural, econômica e política; o direito à escolha do próprio caminho de desenvolvimento; a

igualdade de soberania e o respeito à lei internacional. Por sua vez, a Carta da OCX (2002)

apresenta seus princípios no Artigo 2º. Em síntese, há o respeito mútuo à soberania e à integridade

territorial; não interferência em assuntos internos; igualdade de todos os Estados membros;

resolução pacífica de conflitos; não utilização da OCX contra outros Estados ou Organizações e

prevenção de atos ilegítimos contra membros da OCX.

Por trás das normas compartilhadas por seus membros, a OCX proporciona uma via de

fortalecimento das elites nacionais, assistindo no seu processo de construção do Estado, no

desenvolvimento econômico conjunto e na manutenção da integridade territorial (ARIS, 2009). O

“Espírito de Xangai”, como é chamado este conjunto de normas e princípios, se tornou um modelo

a ser seguido pelos países da Ásia e da periferia em geral. A Rússia, por exemplo, já expressou seu

desejo em transformar a plataforma da OCX num mecanismo de resolução de conflitos

internacionais. Parte do projeto de inclusão de Índia e Paquistão passaria, portanto, pela adoção do

Espírito de Xangai de respeito mútuo e de coexistência pacífica (LU, 2015).

Os críticos norte-americanos e europeus à Organização apontam que seus mecanismos

acabam por reforçar intencionalmente regimes políticos e práticas ditatoriais. O elemento que

escapa à análise destes críticos é justamente a fragilidade da coesão social, econômica e política de

sociedades que ainda lutam para chegar à modernidade. Samuel Huntington (1968) já argumentava,

há quase 50 anos, que não existe sistema político eficiente (democrático ou não) sem que haja

ordem e estabilidade. Ainda, se observarmos a própria sociologia histórica da formação dos Estados

europeus, veremos que o conflito interestatal, as guerras entre vizinhos e a busca pela sobrevivência

foram suas prioridades por centenas de anos (TILLY, 1990). A comunidade de segurança e o

compartilhamento de soberania se consolidaram apenas na década de 1990. Como aponta Ayoob

(2002, p. 40), o desafio dos Estados do Terceiro Mundo não é transcender o Estado Westfaliano,

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mas fortalecer sua eficiência e legitimidade para que haja ordens políticas domésticas estáveis e

uma participação positiva no Sistema Internacional.

Portanto, o conteúdo ético da OCX (o Espírito de Xangai) se opõe à forma como a

hegemonia estadunidense vem sendo conduzida após o término da Guerra Fria. Primeiramente,

através da promoção de diferentes normas e princípios entre seus membros e, concomitantemente,

no discurso externo de promoção da igualdade de soberania, da multipolaridade e da rejeição ao uso

unilateral da força. Além disso, através do documento “SCO Strategy Towards 2025”, a

Organização se opõe à competição estratégica entre Grandes Potências, caracterizada pela

militarização do espaço e pela construção de sistemas unilaterais de defesa antimíssil. Sua noção de

direitos humanos também foi esclarecida neste documento, contrapondo a noção de universalidade

e enfatizando o direito ao desenvolvimento. Os países declararam que respeitarão diversidades

nacionais e que lutarão contra a politização dos fóruns sobre direitos humanos (KUCERA, 2015).

Outra questão mais profunda, que demanda maior investigação, é a capacidade de liderança

e de promoção do Espírito de Xangai, principalmente por parte de China e Rússia. Assim como na

esfera material, onde estes países já possuem protagonismo regional e são capazes de contestar a

hegemonia estadunidense, haverá também um encontro de projetos na esfera ideológica. Assim

como na Guerra Fria, provavelmente a competição se dará na periferia do Sistema. Resta saber,

neste caso, se o Espírito de Xangai valerá de forma seletiva ou se atuará como uma nova plataforma

de relações interestatais.

Aqui nos é caro o conceito de liderança pela autoridade humana, de Yan Xuetong (2011).

Yan aponta que os EUA são o único país capaz de exercer liderança global. No entanto, esta

liderança tem ocorrido por meio de hegemonia, utilizando padrões duplos ao favorecer aliados e ao

contrariar inimigos. Entre 2001 e 2008, a liderança dos EUA teve aspectos de tirania ao desrespeitar

suas próprias normas. A liderança pela autoridade humana, por outro lado, ocorre através “[...] do

exemplo e da adesão. É o poder por meio da virtude, da prática e da transmissão de valores aceitos

como superiores, do ponto de vista moral” (PITT, 2014, p. 63). A solução para a China, em longo

prazo, seria ter capacidade de liderança pela autoridade humana, se transformando internamente

para adotar um sistema de princípios e de valores passível de adesão pelos demais Estados. Este

modelo pressupõe, ao mesmo tempo, que haja algum grau de hierarquia internacional, onde os

países mais fortes assumem mais responsabilidades do que os mais fracos (PITT, 2014, p. 63). Ou

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seja, por exemplo, caberia às Grandes Potências as tarefas de prover bens públicos e de estabilizar

focos de conflito militar através de soluções aceitas pelos demais.

Neste caso, a atuação no gerenciamento da segurança regional (especialmente do

Afeganistão) e na inclusão possivelmente turbulenta de novos membros na OCX (Índia e Paquistão)

são dois desafios à capacidade de liderança chinesa e também russa.

Desafios político-securitários e a resposta da OCX

Esta seção analisará a resposta da OCX às ameaças não tradicionais e à tentativa dos EUA

em alterar o panorama estratégico do mundo muçulmano, desde o Oriente Médio até a Ásia Central.

Inicialmente, o objetivo da OCX era a busca por maior cooperação e estabilidade regional,

combatendo os três males: terrorismo, separatismo e extremismo. No entanto, a projeção dos

interesses dos Estados Unidos para a Ásia Central alterou seu significado (VISENTINI, 2013, p.

210).

Para além dos atentados de 11 de setembro, a nova Estratégia de Segurança Nacional

(setembro de 2002) dos Estados Unidos enfatizava a existência de um “Arco de Instabilidade”, que

abrangia desde o Oriente Médio até o Nordeste da Ásia, tendo a Ásia Central como eixo. A partir de

então, houve maior engajamento militar e de inteligência dos Estados Unidos e o estabelecimento

de bases de operações em quase todos os países desta região (BURGHART, 2007, p. 10).

Pode-se observar que a invasão do Afeganistão e a Guerra ao Terror acabaram por legitimar

a luta antiamericana e pan-islamista dos extremistas islâmicos. Suas ações reverberaram não

somente no Afeganistão-Paquistão (Af-Pak) ou na Ásia Central, mas nas próprias periferias de

China, Índia e Rússia (Xinjiang, Caxemira e Chechênia, respectivamente). No plano da mudança de

regime através da subversão, destacaram-se as Revoluções no Quirguistão, Uzbequistão e no Leste

Europeu/Cáucaso. Quanto às intervenções militares, observa-se a instrumentalização das revoltas

árabes para derrubar regimes na Líbia e na Síria. Como resultado, houve a aproximação dos

interesses de China, Índia e Rússia, de modo que o separatismo e as mudanças de regime por via

externa se tornaram temas securitários centrais, figurando em discursos do alto escalão político e

em documentos oficiais (SONG, 2015; ANTONOV, 2015; RAGHAVAN, 2014, p. 68-69).

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Segundo Marcel de Haas (2007, p. 07-10), a evolução institucional da OCX17

pode ser

dividida em três períodos: 1) Medidas de construção de confiança e de segurança (1996-2001) –

redução dos contingentes de fronteira e das tensões herdadas do conflito sino-soviético; 2)

Segurança regional contra os três males (2001-2004) – Estabelecimento de secretariado permanente,

exercícios conjuntos antiterrorismo e criação da Estrutura Regional Antiterrorista (do inglês,

RATS); 3) Organização internacional abrangente (2004-presente) – busca por reconhecimento

internacional e por interação com outras organizações, admissão de Estados observadores

(Mongólia, Índia, Paquistão e Irã), exercícios militares anuais.

De forma efetiva, a cooperação dentro da OCX se dá por intermédio dos mecanismos de

fortalecimento da coordenação securitária interagências; fornecimento de armas e recursos

militares; estímulo ao crescimento econômico por meio de ajuda, investimentos e projetos de

infraestrutura. A primeira observação diz respeito à abordagem holística da OCX. Ao evitar o

envolvimento externo em conflitos internos, os países membros retiram elementos de legitimidade

dos grupos insurgentes. Da mesma forma, a busca pela superação do atraso econômico auxilia na

consolidação do Estado central. Além disso, as relações próximas da China com o Paquistão e a

crescente aproximação da Rússia com o Sul da Ásia visam a diminuir o papel passivo e ativo

paquistanês nas ações terroristas (NEVES, PICCOLLI, 2012, p. 113-114).

O desafio de estabilização do Afeganistão é um exemplo da oposição entre o projeto

hegemônico estadunidense (calcado no intervencionismo estrangeiro) e a regionalização da

segurança (NEVES, PICCOLLI, 2012). É necessário mencionar que, de imediato, todos os países

próximos ao Afeganistão demonstraram certa aquiescência da necessidade em responder aos

atentados do 11 de Setembro com uma invasão militar. Por outro lado, logo ficou claro que o

objetivo não era apenas derrotar a Al Qaeda e o Talibã. Em 2002, o Irã foi colocado na lista do Eixo

do Mal e, no ano seguinte, o Iraque foi invadido. Devido à incerteza sobre os objetivos

estadunidenses e à falta de vontade dos EUA em criar uma iniciativa regional para o Af-Pak, países

como China, Índia, Irã e Rússia adotaram uma abordagem de aguardar os resultados e de evitar

maior envolvimento (CHANDRA, 2015, p. 183-185).

A partir do governo Obama (2009-presente), os Estados Unidos começaram a reduzir sua

presença militar no país, diante da dificuldade em manter o custeio de operações e em assegurar o

17

Em 1996 formou-se o grupo Cinco de Xangai (China, Rússia, Cazaquistão, Quirguistão e Tadjiquistão). Apenas em

2001, com a adesão do Uzbequistão, o grupo transformou-se na OCX.

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controle do governo local sobre o território afegão. No entanto, os EUA não abandonaram o projeto

imperial (seja liberal ou neoconservador) no Oriente Médio, mesmo que haja certo interesse em

dividir os custos da ocupação com Europa, China, Índia e Rússia. É possível que o recente acordo

nuclear assinado pelo Irã seja o ponto de partida para uma estratégia de balança de poder regional

(FRIEDMAN, 2015), possibilitando o direcionamento para a Ásia-Pacífico e o engajamento

seletivo. Ainda assim, por mais que o governo Obama tenha interesse no Pivô para a Ásia, existem

setores muito fortes no lobby pró-Imperial, a exemplo de Robert Kaplan (2015).

De qualquer modo, China, Rússia e o próprio conjunto da OCX já sinalizaram que a

estabilização do Afeganistão será a prioridade securitária regional nos próximos anos. Com a

retirada das tropas americanas, a OCX está disposta a desempenhar um papel mais ativo no

Afeganistão, embora ainda não esteja claro de que forma isto ocorrerá. Em termos conjunturais,

destacam-se as iniciativas da China ao promover a conciliação entre elementos moderados do

Talibã e o governo de Kabul.

Reeves (2014) realiza um esforço de identificação de futuras ameaças e do possível papel da

OCX num contexto pós-ocupação dos EUA. O autor observa que o ressurgimento do radicalismo

poderia reviver projetos de unificação do Vale do Fergana sob um Estado Islâmico, abarcando os

países da Ásia Central e o Afeganistão. Em primeiro lugar, o arcabouço da OCX possibilita a

redução dos refúgios separatistas e extremistas em países vizinhos que não seriam alvo destes

grupos em específico. Também poderia haver maior coordenação no combate ao narcotráfico.

Em contrapartida, devido às ações prévias da Organização, é improvável que ela intervenha

diretamente nos assuntos internos do Afeganistão. Ainda no ano de 2000, mesmo com o

transbordamento das ações do Talibã para a vizinhança, o Grupo de Xangai decidiu não intervir.

Mesmo em países membros, a OCX falhou em mobilizar recursos para intervir na crise interna do

Quirguistão (2010), apesar do pedido de ajuda. Ainda cabe mencionar as intervenções da Rússia na

Geórgia (2008) e na Ucrânia (2014), que foram recebidas com cautela e apreensão pelos outros

membros18

(REEVES, 2014, p. 9-10).

O Afeganistão, apesar de não ser um país tão grande em população ou território, carrega um

caráter simbólico e geopolítico central para a Eurásia. Em primeiro lugar, foi uma das principais

passagens da Rota da Seda, um caminho de conexão logística terrestre entre a Europa e a Ásia.

18

Cabe mencionar, no entanto, que a Índia foi um dos primeiros países a reconhecer a legitimidade dos interesses

russos na Crimeia. O governo indiano também se opôs a qualquer tipo de retaliação econômica ou política à Rússia.

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Durante o Século XIX, desenvolveu-se o Grande Jogo de diplomacia, incursões e espionagem entre

o Império Britânico e o Império Russo. O Afeganistão foi o ponto de choque entre impérios,

tornando-se um tampão após a Convenção Anglo-Russa (1907). Atualmente, a China retoma a

visão da Rota da Seda através do projeto “One Belt, One Road” (OBOR), buscando retomar as rotas

terrestres para a Europa e concretizar o sonho moderno de uma Eurásia interconectada e

interdependente (KHANNA, 2008, p. 65-70).

Neste sentido, a segunda resposta da OCX aos desafios político-securitários ocorre na esfera

econômica. Diferentemente do período do Grande Jogo, os projetos das atuais potências

continentais da Ásia parecem estar progressivamente se alinhando. Como mencionado

anteriormente, a China tem destinado cada vez mais recursos ao OBOR, inclusive por intermédio da

OCX, para os países da Ásia Central. Os projetos visam realizar o potencial energético, logístico, de

recursos naturais e de serviços destes países. A Rússia aposta na União Econômica Eurasiana,

composta por Armênia, Bielorrússia, Cazaquistão e Quirguistão. Ambos os projetos têm

apresentado sinergia e algum grau de coordenação (KARAGANOV, 2015).

Neste contexto, também é necessário mencionar os planos futuros da OCX. Durante a 15ª

Cúpula da OCX, em julho de 2015, China e Rússia concordaram em alinhar progressivamente a

Rota da Seda/OBOR e a União Econômica Eurasiana. Existe a noção de que qualquer arranjo

securitário entre os membros deve ser ancorado pelo desenvolvimento econômico comum19

(LU,

2015). Houve também uma discussão sobre a criação de um banco de desenvolvimento da OCX.

No entanto, o grande acontecimento da Cúpula foi o início do processo de adesão da Índia e do

Paquistão como membros plenos. Ainda, foram aceitos como parceiros de diálogo: Armênia,

Azerbaijão, Camboja e Nepal. Argumenta-se que a OCX pode estar entrando em uma nova fase,

caracterizada pela sua incorporação de novos membros e pela expansão de seus objetivos

econômicos, políticos e securitários.

Uma nova fase para a OCX: Índia e Paquistão como membros plenos

Nesta seção será feita uma análise mais conjuntural, alicerçada nos elementos conceituais e

históricos apresentados nas seções anteriores. Buscar-se-á responder quais os possíveis interesses

19

Em contraste, ao longo dos últimos anos, os Estados Unidos têm desenvolvido uma verdadeira guerra comercial

contra a Índia – que supostamente seria um dos grandes parceiros no Pivô para a Ásia – em assuntos relacionados a

propriedade intelectual.

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dos membros da OCX ao aceitarem dois novos membros de grande magnitude regional. Ainda,

serão analisadas possíveis implicações da expansão desta Organização para a Segurança

Internacional, em especial para a Ásia. Como resultado, pode-se observar que a OCX embarca em

uma nova fase distinta das anteriores. Os dois novos elementos determinantes desta fase seriam: 1)

A busca pela integração continental na Ásia; 2) tentativa de estabilização de dois temas centrais

para a segurança regional – a guerra civil no Afeganistão e a rivalidade Índia-Paquistão.

Embora os elementos trazidos nesta seção sejam historicamente recentes e, portanto, sujeitos

a reviravoltas ou reinterpretações, analisa-los não significa tentar predizer o futuro. Pelo contrário,

aqui são retomadas as ideias da hegemonia estadunidense – exercida por intermédio do

Imperialismo – e do conteúdo ético da OCX (ou Espírito de Xangai) como elementos explicativos

para o fenômeno em questão.

Em primeiro lugar, conforme exposto, os Estados Unidos não possuem mais a garantia de

sucesso na projeção de força para todas as regiões, condição da qual usufruíra no início deste

século. Logo, sua capacidade de moldar os eventos em regiões distantes como os oceanos Índico e

Pacífico está reduzindo e, cada vez mais, é sujeita à interferência de potências militares regionais,

como China, Índia e Rússia. Seguindo nesta linha, seu comportamento deve ser progressivamente

moderado pelos interesses das potências regionais.

A Índia é frequentemente citada como um aliado natural dos Estados Unidos devido a sua

rivalidade com a China. Apesar de existir uma parceria estratégica Indo-Americana, é equivocado

assinalar um alinhamento automático entre as partes. A Índia é um país pós-colonial

subdesenvolvido, que partilha de valores asiáticos e tem um histórico de não alinhamento e de

autonomia estratégica. Na mesma linha do Espírito de Xangai, a Índia deseja um mundo

policêntrico (multipolar), numa ordem que não seja hierárquica e nem baseada em valores

universais. Mesmo sendo democrática, a Índia não é promotora da democracia em suas relações

externas (CHACKO; DAVIS, 2015, p. 6-14).

A elevação da Índia a Grande Potência no âmbito militar não é um sinal de que ela agirá

como as Grandes Potências europeias do Século XX, repetindo a rivalidade Franco-Alemã contra a

China. Pelo contrário, exatamente pelo histórico colonial e pela disparidade socioeconômica entre a

Ásia e o Ocidente, indianos e chineses têm sido cada vez mais pragmáticos em suas relações

bilaterais. Embora nenhum dos dois países mais populosos do mundo descarte um cenário de

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confrontação, é sabido que, por hora, ele é altamente indesejável20

. Além disso, ambos claramente

defendem a regionalização da segurança, em contraposição ao intervencionismo externo.

Levando em consideração certo grau de estabilidade estratégica nas relações entre China e

Índia, a dinâmica que ambos os Estados não conseguem controlar é justamente o “Arco de Crises”

que abarca boa parte do mundo muçulmano e parte destes dois países. A ascensão recente do Estado

Islâmico e sua expansão (até mesmo para o Afeganistão) também é elemento de preocupação

conjunta. A dinâmica afegã é retroalimentada pela fragilidade estatal e pela ambiguidade do

Paquistão, onde setores da burocracia flertam com a radicalização política, a despeito da relativa

laicidade do Exército e das elites políticas civis. Além disso, o cenário de guerra interestatal mais

provável da região seria justamente entre Índia e Paquistão, que enfrentam crises periodicamente.

A Rússia, por sua vez, sente que vem perdendo espaço para a China em sua esfera de

influência tradicional. Assim, a inclusão de membros da grandeza de Índia e Paquistão seria uma

forma de equilibrar os interesses regionais. Não se pode negligenciar, tampouco, que a Rússia tem

sido pressionada pelo Ocidente a tomar atitudes indesejáveis no Leste Europeu. A crise da Ucrânia

reforçou ainda mais a noção de que as oportunidades diplomáticas e econômicas para os russos se

encontram na Ásia. A OCX confere à Rússia uma capacidade de liderança internacional que

dificilmente teria ao agir de forma isolada. Vladimir Putin não surpreende quando afirma que deseja

tornar a OCX numa plataforma internacional de resolução de conflitos para além de seus membros.

Principalmente no caso da China, a inclusão de Índia e Paquistão está condicionada à adesão

destes aos projetos da Rota da Seda. Em abril de 2015, a China anunciou investimentos da ordem de

US$ 45 bilhões em energia e infraestrutura para o Paquistão. No mês seguinte, assinou

investimentos num total de US$ 22 bilhões para a Índia. Ao contrário dos paquistaneses, a Índia

ainda não está segura se irá participar de forma plena do projeto de integração regional da China.

Ainda existe um debate interno sobre as vantagens e desvantagens em aceitar a maior inserção

econômica da China no Oceano Índico (MOHAN, 2014). Ao aderir à OCX, entende-se que a Índia

ao menos se propõe a participar do debate sobre a integração econômica deste espaço. Isto, por si

só, já merece destaque. Para o Paquistão, participar de um projeto de integração com a presença de

20

Se colocarmos em termos da teoria realista e da balança de poder, também haveria nexo neste comportamento:

teríamos aqui uma contradição entre a balança regional – onde China e Índia estariam em lados opostos – e a balança

global, onde a Índia estaria em uma posição de bandwagoning evoluindo para o soft-balancing em relação aos Estados

Unidos.

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China e Rússia acaba por diluir o receio de subordinar-se a uma ordem hegemônica indiana no sul

da Ásia.

O segundo eixo de atuação – a estabilização do Afeganistão e a distensão do conflito Indo-

Paquistanês – é um desafio de ainda maior magnitude. O Paquistão é o epicentro de ambos e,

portanto, sua entrada na OCX é um evento emblemático. Logo nos primeiros anos de sua existência,

o Paquistão embarcou numa aliança com os Estados Unidos, participando de um cinturão de

contenção à URSS. Ainda no final da década de 1970, Estados Unidos e Arábia Saudita proveram

todo tipo de ajuda para os paquistaneses treinarem guerrilhas mujahidins e formarem o Talibã para

resistir à invasão soviética (1979-1989). Como resultado, o próprio Talibã, com apoio paquistanês,

assumiu o governo afegão na década de 1990, em meio a uma prolongada guerra civil.

Após o 11 de setembro, os EUA compeliram os paquistaneses a unirem esforços na Guerra

ao Terror, apesar de sua relutância em abandonar os antigos aliados. Ao longo dos anos, ficou cada

vez mais claro que o Estado paquistanês se encontrava dividido entre elementos que desejavam

liderar o mundo islâmico – adquirindo assim profundidade estratégica para enfrentar a ameaça

indiana – e elementos que desejavam estabilizar e modernizar o Paquistão (FAIR, 2011).

Percebendo que a solução do conflito no Afeganistão passaria necessariamente pelo combate aos

refúgios no noroeste paquistanês, os Estados Unidos iniciaram uma série de ataques a esta região,

muitas vezes sem consentimento do governo local. Neste sentido, a ocupação estadunidense e o

advento da guerra feita por robôs (drones) têm efeitos político-estratégicos negativos em longo

prazo: o governo paquistanês entra em crise de legitimidade, aumenta o sentimento antiamericano e

mais radicais são recrutados (RASHID, 2012; AHMAD, 2014).

A rivalidade Indo-Paquistanesa, por sua vez, é baseada numa disputa civilizacional e de

identidade. Os dois Estados surgiram de uma violenta partilha do Raj Britânico e enfrentam muita

dificuldade para consolidarem sua legitimidade, seja por questões socioeconômicas ou pelos grupos

insurgentes regionais. A questão da Caxemira é central para a manutenção de ambas as ordens

sociais. Desde a Guerra Sino-Indiana (1962), formaram-se relações triangulares entre a Índia e a

parceria China-Paquistão (RIBEIRO, 2015, p. 47-52).

A China tem se mostrado cada vez mais incomodada com as dificuldades em lidar com o

Paquistão. A ingovernabilidade de certas regiões tem afetado os negócios chineses e colocado em

risco seus projetos logísticos no país. Além disso, a China tem promovido a aproximação com a

Índia, mas os indianos desconfiam de suas históricas relações especiais com os paquistaneses.

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Mesmo assim, a cooperação é possível porque as duas potências temem que o Paquistão se

radicalize. Este cenário dificultaria qualquer distensão com a Índia e abriria espaço para a expansão

de redes Uigures (população nativa do Xinjiang) ou mesmo do novo Estado Islâmico da Síria e do

Iraque.

Outra questão fundamental foi a reaproximação do Paquistão com a Arábia Saudita nos

últimos anos, com rumores de que os paquistaneses estavam compartilhando tecnologia militar

sensível, inclusive armas nucleares. Percebendo o risco desta movimentação, China e Rússia

tomaram atitudes na mesma direção: os Russos retiraram o embargo à venda de armas para o

Paquistão e os Chineses compeliram os paquistaneses (nos bastidores) a não enviarem tropas para

combater na Guerra Civil do Iêmen. Em relação ao Afeganistão, observa-se que chineses e russos

têm favorecido a aproximação entre o governo central (agora liderado por Ashraf Ghani), o Talibã e

a inteligência paquistanesa (Intelligence Services Directorate).

Tendo esses fatores em mente, a entrada do Paquistão na OCX tem como objetivo fortalecer

os setores que favorecem a normalização das relações exteriores do país, seja em relação à Índia ou

ao radicalismo islâmico. Observando os elementos fundamentais da Organização, o Paquistão

deveria seguir uma postura de redução do apoio a grupos insurgentes na Caxemira, por exemplo. A

Índia, por sua vez, também realiza operações encobertas, a exemplo de 1971, quando auxiliou os

bengalis na libertação de Bangladesh. Atualmente, acredita-se que a inteligência indiana esteja em

contato com a etnia balúchi, que habita o sul do Paquistão. A mitigação da desconfiança mútua

poderia ser auxiliada por um arcabouço multilateral dentro da própria OCX.

A exemplo do Fórum Regional da ASEAN21

, onde as duas Coreias encontraram um

mecanismo de diálogo informal, a OCX poderá prover um espaço de diálogo e resolução de

conflitos interessado primeiramente na diplomacia e na estabilidade. Ainda, dentro das condições

institucionais atuais, Índia e Paquistão terão oficiais trabalhando em conjunto na Estrutura Regional

Antiterrorista (o RATS) e, possivelmente, participarão de exercícios multilaterais e de outras formas

de comunicação entre elites militares. Na questão da legitimidade, a não interferência direta dilui a

retórica nacionalista ou pan-islâmica dos insurgentes. A possível distensão Indo-Paquistanesa

poderia abrir os canais de comércio regionais, colocando o Paquistão na encruzilhada logística entre

Índia, China e Ásia Central.

21

Associação das Nações do Sudeste Asiático. Seu fórum regional conta com os dez países da região e todos os

principais países da Ásia-Pacífico.

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Obviamente, há de se ressalvar a complexidade das geometrias de poder variável que

acometem uma Ásia em rápida transformação. Aqui foi traçado um dos perfis de coalizão regional

através da OCX, que tem combinado visões de estabilização securitária e de integração econômica.

Se observarmos os interesses de cada país individualmente, possivelmente nenhum estará disposto a

assinar uma aliança militar duradoura com qualquer de seus parceiros dentro da Organização. Sendo

assim, a coalizão da OCX serve para explicar um alinhamento temporário em torno de temas de

interesse comum, que possui, ao mesmo tempo, elementos de longa duração, como a integração

regional e a regionalização da segurança.

A questão central desta explanação é justamente atentar para a convergência de interesses na

estabilização do continente asiático e de suas imediações. Países como China, Índia e Rússia

desejam a multipolaridade não somente porque acreditam em sua estatura individual ou porque

desejam reconhecimento de seu status, mas também porque discordam da forma como a hegemonia

estadunidense foi conduzida nas últimas décadas. Ao contrário do que muitos esperavam, os EUA

não foram uma potência benevolente, e sim agiram de forma auto-interessada e seletiva. A coalizão

da OCX responde filosoficamente e praticamente a questões que a hegemonia estadunidense não foi

capaz de produzir resposta adequada. Em muitos casos, inclusive, os problemas existentes foram

acentuados. A emergência do Estado Islâmico é um exemplo claro deste ponto.

Por fim, não podemos esquecer que o sinal verde para a entrada de Índia e Paquistão na

OCX veio de China e Rússia. Os dois países do sul da Ásia já haviam se candidatado há alguns

anos, mas sua entrada não era aceita. Em termos estratégicos, cabe refletir se a entrada destes países

na OCX não é uma resposta da China à possibilidade de uma doutrina militar ofensiva dos EUA no

Pacífico (baseada no conceito de Batalha Aeronaval) e da Rússia à tentativa de expansão da OTAN

para a Ucrânia. A coalizão da OCX e seu aprofundamento também são decorrência prática da falta

de flexibilidade diplomática dos EUA nestas duas questões.

Conclusão

Nesta seção, serão retomados os argumentos principais da análise e a correlação entre a

hegemonia dos EUA e a proposta de atuação da OCX. Em primeiro lugar, parece claro que a

hegemonia estadunidense passa por um momento de incertezas, seja em termos materiais

(capacidades militares) ou ideológicos (capacidade de liderança). Neste sentido, a contestação à

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ordem hegemônica depende, por um lado, da capacidade estratégica e operacional em dissuadir a

ação unilateral dos EUA na massa eurasiana. Sem o lastro militar e a criação das Zonas

Contestadas, o fundamento da hegemonia estadunidense permanece, mesmo que não haja a

aquiescência de boa parte dos outros países. Por esse motivo, o próprio estudo das Relações

Internacionais e da Segurança Internacional deve estar em constante diálogo com os Estudos

Estratégicos. O ponto de vista político e ideológico, por sua vez, também é indispensável por prover

modelos alternativos de governança do Sistema Internacional, sem os quais teríamos uma discussão

estéril.

Conforme visto anteriormente, a forma pela qual os Estados Unidos exercem sua hegemonia

alimenta a instabilidade securitária de diversas regiões, especialmente na Eurásia. Em parte, o

comportamento imperialista (seja neoconservador ou liberal) poderia ser explicado pela ausência de

desafiantes capazes de dissuadir a potência hegemônica e pela transformação do poder militar em

poder psicológico-ideológico (o “terror exemplar”). Este comportamento é baseado no conteúdo

ético do Neoconservadorismo, que coloca os fins (democracia, liberalismo econômico) acima dos

meios (intervenção militar e guerra encoberta). Todos estes fatores são produto da falta de uma

Grande Estratégia dos EUA para o Século XXI. Por isso, a ascensão de competidores (China e

Rússia) tem suscitado respostas de caráter potencialmente ofensivo e preemptivo por parte dos

Estados Unidos. A postura assertiva dos EUA em relação a seus competidores e a incapacidade em

assimilar diferentes interesses tem fortalecido a coalizão China-Rússia.

A OCX pode ser considerada como o principal produto desta coalizão, que adaptou sua

atuação e suas expectativas conforme China e Rússia sentiam a necessidade em promover

estabilidade por meio da regionalização da segurança. Ao mesmo tempo, os dois países utilizam a

Organização para avançar em seus projetos de integração econômica regional, que também se

constitui num pilar de mitigação de conflitos entre países vizinhos.

A decisão em expandir a OCX pode ser considerada como uma nova fase da Organização e

também um ponto de inflexão na coalizão entre estes dois países. A partir da análise feita na seção

anterior, conclui-se que China e Rússia compreendem que o problema da governança na Ásia

Central depende essencialmente da estabilização do Sul da Ásia. Na esteira da questão securitária,

ambos os países estão alinhando também seus projetos de integração econômica regional. Além

disso, existe claramente uma ambição de mudança do ordenamento global em dois sentidos: 1) Por

meio do gerenciamento de conflitos sensíveis ao Sistema Internacional (guerra civil no Afeganistão

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e tensões entre Índia e Paquistão); 2) Proporcionando uma visão de mundo alternativa e o poder do

exemplo ao gerenciar conflitos que a hegemonia estadunidense não foi capaz de solucionar.

Em termos geopolíticos, a confluência de interesses e a coalizão entre China, Índia e Rússia

tem sérias implicações para os Estados Unidos, que podem prosseguir com seu perfil atual ou

responder de forma elaborada e consciente à contestação destas Grandes Potências. Nenhuma das

três potências se opõe à participação securitária dos EUA em suas regiões próximas. No entanto, há

forte contestação a sua filosofia de atuação, que carece de perspectiva estratégica viável e erode

qualquer expectativa de estabilidade em uma ordem hegemônica unipolar.

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