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1
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO – MESTRADO
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO EM DIREITOS SOCIAIS E POLÍTICA S PÚBLICAS
Leonardo Muraro
A EXTRAFISCALIDADE TRIBUTÁRIA NO BRASIL COMO IMPLEM ENTADORA
DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O MEIO AMBIENTE
Santa Cruz do Sul, fevereiro de 2006.
1
Leonardo Muraro
A EXTRAFISCALIDADE TRIBUTÁRIA NO BRASIL COMO IMPLEM ENTADORA
DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O MEIO AMBIENTE
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em
Direito – Mestrado, da Universidade de Santa Cruz do Sul –
UNISC, para a obtenção do título de Mestre em Direito.
Orientador: Professor Dr. Hugo Thamir Rodrigues
Santa Cruz do Sul, fevereiro de 2006.
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Leonardo Muraro
A EXTRAFISCALIDADE TRIBUTÁRIA NO BRASIL COMO IMPLEM ENTADORA
DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O MEIO AMBIENTE
Esta Dissertação foi submetida ao Programa de Pós-
Graduação em Direito – Mestrado, na Área de Concentração
em Direitos Sociais e Políticas Públicas, da Universidade de
Santa Cruz do Sul – UNISC, como requisito parcial para
obtenção do título de Mestre em Direito.
Dr. Hugo Thamir Rodrigues
Professor Orientador
Dr. João Telmo Vieira
Dr. Ubaldo César Balthazar
3
Para minha família, em especial,
para minha esposa Mônica
e minha Irmã Eliane “in memoriam”.
4
AGRADECIMENTOS
Inicio agradecendo a Deus pela oportunidade; aos meus pais pela educação e
pelo referencial ético. À minha esposa Mônica, pelo inestimável apoio, amor e pela
dedicação permanente, nas horas fáceis e, principalmente, nas difíceis.
De igual modo, agradeço aos meus irmãos e sobrinhos, em especial, a minha
irmã Cristina pelo apoio e acolhimento durante o Curso de Mestrado.
Da mesma forma, é fundamental destacar o apoio e referencial a ser seguido
do advogado Gilmar Stelo e, outrossim, agradeço pela sua amizade e solidariedade,
no tocante ao tempo que despendi no Mestrado. Agradeço, também, aos meus
colegas de escritório, André, Pedro e Dipp, que por muitas vezes cobriram o meu
espaço e o trabalho com imensa eficácia e sabedoria.
Destaco, também, a eficiência do Mestrado em Direito da UNISC, na pessoa do
seu Coordenador, Professor Dr. Jorge Renato dos Reis, e também no período do
Professor Dr. Rogério Gesta Leal, lembrando a competência e amizade da
Secretária, Rosana Maria Fabra.
Fundamental e indispensável é agradecer ao Professor Dr. Hugo Thamir
Rodrigues que de forma incansável e com sabedoria jurídica foi determinante com
suas importantes orientações para a realização deste trabalho.
5
Os limites da minha linguagem significam
os limites do meu mundo.
(Ludwig Wittgenstein)
6
RESUMO
A presente dissertação pretende demonstrar, a partir de uma análise da evolução dos modelos de Estados ao longo da história moderna no Ocidente, de que maneira ele pode interferir na ordem econômica através da indução das relações de produção e suas dimensões fiscais e extra-fiscais, servindo como real fator de estímulo a determinados centros temáticos de produção de riqueza, valendo-se dos incentivos fiscais ou ditos benefícios fiscais dinâmicos, tais como subsídios e créditos presumidos. Tal comportamento estatal, quer evidenciar a pesquisa, fomentar a utilização da extrafiscalidade tributária, de maneira que venha a se criar uma política de tributação ambiental. Aborda-se e demonstra-se a utilização da extrafiscalidade, sua adoção na política ambiental, de modo a viabilizar, na prática, uma política de tributação ambiental, tendo como objeto os impostos indiretos como, por exemplo, o IPI e o ICMS, os quais, aliados ao princípio da prevenção do direito ambiental, poderão criar uma política tributária que seja alavancadora de um desenvolvimento econômico. Por fim, enfatiza-se que o Estado não perderá em arrecadação fiscal e estará em conformidade com a preservação do meio ambiente, ou seja, com o objetivo de que seja alcançado o desejado “desenvolvimento sustentável” preconizado pelo Texto Constitucional
Palavras-chave: extrafiscalidade - meio ambiente - tributação ambiental – incentivos
fiscais.
7
ABSTRACT
The present dissertation it intends to demonstrate, starting from an analysis of the
evolution of the models of States along the modern history in the Occident, in what
way it can interfere in the economical order through the induction of the production
relationships and its fiscal and extra-fiscal dimensions, serving as real stimulus factor
to certain thematic centers of wealth production, taking advantage of the fiscal
incentives or the so called dynamic fiscal benefits, such as subsidies and
presumptive credits. Such a state behavior wants to evidence the research, to foment
the use of the tributary extrafiscality, so that a policy of environmental taxation be
created. It is approached and demonstrated the use of the extrafiscality, its adoption
in the environmental policy, in such a way to make possible, in practice, a policy of
environmental taxation, having as object the indirect taxes as, for instance, the IPI (a
tax concerning to industrialized products) and ICMS (a tax concerning to the
circulation of goods and services), which together with the principle of the prevention
of the environmental right, can create a tributary policy that is a dispositive for an
economical development. Finally, it is emphasized that the State will not lose in fiscal
collection and it will be in accordance with the preservation of the environment, in
other words, with the objective of reaching the desired "maintainable development"
praised by the Constitutional Text
Key-words: extrafiscality - environment - environmental taxation - fiscal incentives.
.
8
LISTAS DE ABREVIATURAS
ADIn Ação Direta de Inconstitucionalidade
Art Artigo
CF/88 Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988
CIDE Contribuição de Intervenção sobre do Domínio Econômico
CTN Código Tributário Nacional
EUA Estados Unidos da América
FMI Fundo Monetário Internacional
ICM Imposto sobre Circulação de Mercadorias
ICMS Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e
sobre Prestações de Serviços de Transportes Interestadual e
Intermunicipal e de Comunicações, ainda que as Operações e as
Prestações de iniciem no exterior
IPI Imposto sobre Produtos Industrializados
IVC Imposto sobre as vendas e consignações
OCDE Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico
OMC Organização Mundial do Comércio
PPP Princípio do Poluidor-Pagador
RPPN Reservas Particulares do Patrimônio Natural
STF Supremo Tribunal Federal
STJ Superior Tribunal de Justiça
TCFA Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental
TIPI Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados
9
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 10
1 O ESTADO CONTEMPORÂNEO E SUA FUNÇÃO SOCIAL ................................... 13
1.1 Origem e evolução do Estado ............................................................................... 13
1.1.1 O Estado Liberal ................................................................................................. 13
1.1.2 O Estado Social .................................................................................................. 20
1.1.3 O Estado Neoliberal ........................................................................................... 24
1.2 O Estado Brasileiro Contemporâneo e sua função social ..................................... 32
2 A INTERVENÇÃO DO ESTADO POR MEIO DE POLÍTICAS PÚBLICAS ............... 40
2.1 A intervenção econômica por indução .................................................................. 40
2.2 Políticas tributárias e meio ambiente ..................................................................... 45
2.3 Instrumentos para a tributação ambiental ............................................................. 48
2.3.1 Tributos ambientais ............................................................................................ 55
2.3.2 Subsídio ............................................................................................................. 61
2.3.3 Crédito presumido .............................................................................................. 64
3 A EXTRAFISCALIDADE AMBIENTAL .................................................................... 68
3.1 A extrafiscalidade .................................................................................................. 69
3.1.1 A extrafiscalidade ambiental no Brasil ................................................................ 71
3.2 Impostos indiretos utilizados para proteção ambiental .......................................... 75
3.2.1 IPI ....................................................................................................................... 82
3.2.2 ICMS .................................................................................................................. 94
3.2.2.1 ICMS Ecológico ...............................................................................................108
CONCLUSÃO ............................................................................................................... 115
REFERÊNCIAS ............................................................................................................ 121
10
INTRODUÇÃO
A presente dissertação busca, por meio da utilização da extrafiscalidade
tributária, implementar uma política pública de proteção ao meio ambiente, com o
escopo de que o Estado venha a intervir na ordem econômica através da
denominada “intervenção por indução”, tendo como objeto os incentivos fiscais, mais
especificamente os que atuam na esfera da despesa pública, como por exemplo, as
subvenções e os créditos presumidos, com a finalidade de alcançar um
desenvolvimento sustentado, conciliando desenvolvimento econômico e preservação
de recursos ambientais.
Desse modo, parte-se da hipótese de que, através da extrafiscalidade
tributária e valendo-se dos incentivos fiscais, utilizará a característica seletiva dos
impostos indiretos (IPI e ICMS), podendo alavancar processos produtivos e consumo
de bens e serviços sustentáveis e, ao mesmo tempo, desestimular o emprego de
tecnologia de produção e consumo de bens e serviços nefastos à preservação
ambiental. Assim, este trabalho busca dar resposta à seguinte questão: como
implementar políticas públicas para o meio ambiente, utilizando-se do instrumento da
extrafiscalidade tributária, sem ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal e os princípios
vetores do Direito Tributário, sem reduzir a arrecadação fiscal da União e dos
Estados?
Procura-se justificar a questão enfrentada através da demonstração de como
a extrafiscalidade tributária poderá implementar uma política de tributação ambiental,
utilizando-se da intervenção sobre o domínio econômico, valendo-se dos incentivos
fiscais, tendo como objeto os impostos indiretos (IPI e ICMS). E, vislumbrando que
os mesmos, por possuírem como característica o princípio da seletividade, servem
para a implantação de uma tributação ambiental sem transgredir princípios
11
constitucionais tributários, sem configurar renúncia fiscal e, principalmente,
permitindo conciliar desenvolvimento econômico com proteção ao meio ambiente.
Dessa forma, no primeiro capítulo, faz-se um estudo sobre o Estado
Contemporâneo e sua função social, origem, evolução, passando pelo Estado
Liberal, Social e Neoliberal, mostrando suas características e, ao final, o estágio do
Estado Brasileiro e sua função social.
No segundo capítulo, efetua-se estudo no tocante à intervenção do Estado
por meio de Políticas Tributárias. No primeiro passo, aborda-se a intervenção sobre
o domínio econômico por indução, tendo como foco o pensamento de Eros Roberto
Grau. Posteriormente, passa-se à análise das Políticas Tributárias relacionadas ao
Meio Ambiente, discorrendo sobre o pensamento de alguns doutrinadores pátrios
que abordam a utilidade que os incentivos fiscais possuem para a adoção e o
estímulo de uma política de tributação ambiental.
Pela sua importância, o terceiro e último capítulo terá a parcela mais extensa
da dissertação. Contudo, entende-se indispensável uma análise pormenorizada
dele, por ser o cerne da dissertação, mesmo resultando na desproporcionalidade
entre os capítulos. Nesse capítulo, discorre-se sobre a extrafiscalidade ambiental,
abordando sua utilização nos impostos indiretos; posteriormente, demonstra-se a
importância dos impostos indiretos como instrumento para a adoção de uma política
de tributação ambiental que venha ao encontro do desenvolvimento sustentável.
Toma-se como exemplo o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), enfatizando
sua utilidade para a adoção de uma política pública de tributação ambiental.
Da mesma forma, é realizado um estudo com o Imposto incidente sobre
Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de
Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS). E, diga-se aqui,
que foi abordado no tocante à sua utilização para a implementação de uma política
pública de tributação ambiental, uma vez que não é objeto deste trabalho perquirir a
respeito de suas características e de seus pressupostos constitucionais e
infraconstitucionais, sendo este abordado com o intuito de situar o leitor no tema
enfrentado. Será demonstrado que o mesmo pode servir como instrumento para
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incentivar o desenvolvimento econômico, sem descuidar-se da defesa do meio
ambiente, e que a adoção dessa política pública é possível sem resultar em
transgressão ao art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Por fim, é abordado o ICMS Ecológico, sua relevância e forma de utilização,
de modo que venha a servir como incentivador para a implementação de uma
política pública de tributação ambiental por parte dos Municípios, com o escopo de
desenvolvê-los economicamente, estando o mesmo aliado à preocupação com o
combate à poluição e defesa do meio ambiente para as presentes e futuras
gerações.
São essas as contribuições almejadas com o presente trabalho de pesquisa,
cuja metodologia encontra-se assentada no método hipotético-dedutivo, utilizando-
se como técnica a pesquisa doutrinária e legislativa e exemplos práticos,
principalmente no que concerne aos impostos indiretos (ICMS e IPI). Algumas
questões merecem um estudo mais aprofundado, o que se entende pertinente ao
longo de um programa de Doutorado, com destaque para a questão dos
pressupostos constitucionais e infraconstitucionais do ICMS e como se opera na
prática a denominada “guerra fiscal”.
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1 O ESTADO CONTEMPORÂNEO E SUA FUNÇÃO SOCIAL
Neste primeiro capítulo, analisar-se-á a origem e evolução do Estado até
chegar-se ao Estado Contemporâneo e a função social, estabelecida na
Constituição da República Federativa, verificando-se, na prática, se ela é seguida
pelo Brasil. Essa função social está estabelecida nos títulos I, II e VII da CF/88,
onde, mais adiante, será abordado com riqueza de detalhes, as quais irão evidenciar
o que fora adotado na teoria e o que está sendo vivenciado na realidade brasileira.
1.1 Origem e Evolução do Estado
Inicia-se pelo Estado Liberal, que acabou consagrando os direitos do homem
e começou a dar lugar ao Estado Social, em decorrência da queda da burguesia. O
Estado Social, na verdade, existiu apenas na teoria, pois, na prática, o conteúdo
estabelecido na CF/88, acabou sendo interpretado através de uma leitura de cunho
Liberal e, como último estágio do Estado chega-se ao atual, que possui
características eminentemente Neoliberais, gerando conseqüências nocivas para a
população, o que será melhor analisado adiante.
1.1.1 O Estado Liberal
O Idealismo Liberal não surgiu com a formulação inglesa de Locke ou com a
Revolução Francesa, pois a base do pensamento é anterior, podendo ser pensada a
partir da reivindicação de direitos religiosos, políticos e econômicos e na tentativa de
ter o controle do poder político no final do século XVII.
14
Desse modo, pode-se dizer que o liberalismo foi se definindo em sentido
contrário ao absolutismo, com o crescimento do individualismo que começa a tomar
forma desde os embates pela liberdade religiosa.
Procurando trazer um dado histórico Merquior (1991, p.45) afirma
[...] podemos referir que o termo liberal como identificação política emerge na primeira década do séc. XIX em Espanha, no momento em que as Cortes lutavam contra o absolutismo, embora sua origem remonte à luta política travada na Inglaterra (Revolução Gloriosa – final do século XVII), onde se buscava tolerância religiosa e governo constitucional.
A burguesia teve influência fundamental na transição do Estado Absoluto ao
Estado Constitucional, o qual teve como expoente inicial o liberalismo, tornando as
raízes da ascensão política da burguesia até se tornar classe dominante. Verifica-se
que o fenômeno não se pode desmembrar das guerras de religião e das
competições econômicas, que dificultavam de certa maneira a chamada política do
equilíbrio europeu. Dessa política se faziam órgãos as dinastias reinantes, as quais
oscilavam entre a paz e a beligerância, entre a diplomacia e as armas, entre a
segurança e a instabilidade.
Mas foi no cerne desses conflitos que se fez paulatinamente a ascensão da
classe burguesa, até o dia em que, levando a cabo por via revolucionária o desafio
ao Absolutismo, pôde ela decretar o fim da sociedade de privilégios ainda presentes
por corolário da herança feudal no corpo da Monarquia absoluta. Foi aí que a
Bastilha caiu, recebendo o Estado Moderno sua nova identidade institucional.
Conforme Paulo Bonavides (2002) a Queda da Bastilha simbolizava, por
conseguinte, o fim imediato de uma era, o colapso da velha ordem moral e social
erguida sobre a injustiça, a desigualdade e o privilégio, debaixo da égide do
absolutismo; simbolizava também, o começo da redenção das classes sociais em
termos de emancipação política e civil, bem como o momento em que a burguesia,
sentindo-se oprimida, corta os laços de submissão passiva ao monarca absoluto e
se inclina ao elemento popular numa aliança selada com as armas e o pensamento
da revolução; simboliza, por derradeiro, a ocasião única em que nasce o poder do
povo e da Nação em sua legitimidade incontrastável.
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Para Bonavides (2004), Montesquieu e Rousseau, com o Espírito das Leis e o
Contrato Social, a par da Enciclopédia de Diderot e D´Alembert, haviam feito já a
emancipação interior das consciências, sem a qual não havia possibilidade de
combater o Absolutismo e proclamar, sobre o sangue derramado em nome da razão,
uma nova soberania, uma nova legitimidade, um novo Estado.
Assim, a premissa capital do Estado Moderno é a conversão do Estado
Absoluto em Estado Constitucional, ou seja, o poder não é de pessoas, mas de leis.
São as leis, e não as personalidades, que governam o ordenamento social e político.
Segundo Bonavides (2004, p. 37),
[...] de sua inauguração até os tempos correntes, o Estado constitucional ostenta três distintas modalidades essenciais. A primeira é o Estado constitucional da separação de Poderes (Estado Liberal), a segunda, o Estado constitucional dos direitos fundamentais (Estado Social), a terceira, o Estado constitucional da Democracia participativa (Estado Democrático-Participativo). Não há propriamente ruptura no tempo tocante ao teor dessas três formas imperantes de organização estatal, senão metamorfose, que é aperfeiçoamento e enriquecimento e acréscimo, ilustrados pela expansão crescente dos direitos fundamentais bem como pela criação de novos direitos.
Esse é o caso da noção de separação de poderes baseada em Montesquieu
e consagrada no constitucionalismo liberal, concebida inicialmente como meio para
limitar o poder do Estado, haja vista que o Estado veio de encontro aos
pressupostos do Estado absolutista, que tinha na concentração do poder nas mãos
do monarca a característica basilar.
Salienta-se, de acordo com Hermany (1999), que essa teoria serviu para os
interesses da nova ordem política instituída, tanto que o dogma da separação dos
poderes constituiu-se em fator da limitação à atuação do Estado. Pois é justamente
a ausência do Estado na sociedade que interessava à nova classe política
emergente, demonstrando nítido comprometimento do Constitucionalismo com a
doutrina do liberalismo econômico e político.
Bobbio (1995), ao tratar das causas determinantes do advento da escola
exegese que, consoante verificará, constitui movimento de legitimação do modelo
16
burguês, ilustra de forma clara a relação entre a doutrina da separação dos poderes
e a manutenção do status quo.
[...] doutrina da separação dos poderes, que constitui o fundamento ideológico da estrutura do Estado moderno (fundada na distribuição de competências, portanto na atribuição das três funções fundamentais do Estado ─ a legislativa, a executiva e a judiciária ─ a três órgãos constitucionais distintos). Com base nesta teoria, o juiz não podia criar o direito, caso contrário invadiria a esfera de competência do poder legislativo, mas devia, de acordo com a imagem de Montesquieu, ser somente a boca através da qual fala a lei [...].
O Constitucionalismo Liberal consagra também as chamadas liberdades
negativas, outrossim, chamados de direitos fundamentais de primeira geração (ou
dimensão).
Hesse (1998) menciona alguns desses direitos, também considerados
fundamentais individuais, em sua concepção atual, tendo em vista que muitos deles
não existiam na França Revolucionária. Para o constitucionalista alemão, integram
essa categoria os seguintes direitos: o direito à vida e integridade corporal,
traduzindo-se na liberdade da pessoa; a liberdade de circulação; a inviolabilidade do
domicílio, segredo de correspondência, postal e de telecomunicação; a liberdade de
fé, etc.
Trata-se da consolidação das denominadas liberdades negativas, que
conforme Leal (1997, p.79), representam a “[...] expressão formal de necessidades
individuais que exigem a obtenção do Estado para seu pleno exercício [...]”.
Dessa maneira, afirma Bonavides (2004), o Estado burguês de Direito, da
primeira fase, estava, por conseguinte, plenamente vitorioso. E os resultados de seu
formalismo e de seu êxito se traduzem numa técnica fundamental que resguarda os
direitos da liberdade, compreendida esta como liberdade da burguesia. Essa liberdade
lhe era indispensável para manter o domínio do poder político e, só por generalização
nominal, se estendia às demais classes. Desse modo, permitia à burguesia falar
ilusoriamente em nome de toda a sociedade, com os direitos que ela proclamara, os
quais, em seu conjunto, se apresentavam do ponto de vista teórico, válidos para toda a
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comunidade humana, embora, na realidade, tivesse bom número deles vigência tão-
somente parcial, e em proveito da classe que efetivamente os podia fruir.
Assim, segundo Bonavides (2004, p.45-46),
[...] com a divisão de poderes vislumbraram os teóricos da primeira idade do constitucionalismo a solução do problema de limitação da soberania. A filosofia política do liberalismo, preconizada por Locke, Montesquieu e Kant, cuidava que, decompondo a soberania na pluralidade dos poderes, salvaria a liberdade. Fazia-se mister contrapor à onipotência do rei um sistema infalível de garantias [...]. A teoria tripartida dos poderes, como princípio de organização do Estado constitucional, é uma contribuição de Locke e Montesquieu. Este se apóia naquele, e equivocadamente, no que supõe ser a realidade constitucional inglesa: “um Estado onde os três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) estariam modelarmente separados e mutuamente contidos, de acordo com a idéia de que “O poder detém o poder [...].
O marco do Estado Liberal é a relevância que possui o “indivíduo” para o
conteúdo do liberalismo clássico, no fato de que o valor da personalidade era
concebido como ilimitado e anterior ao Estado, direitos de primeira geração (ou
dimensão) e, com esse pensamento, surgem as primeiras Constituições escritas, as
cartas americana e francesa, cujas teses adquiriam para a democracia liberal o valor
de uma profissão de fé religiosa e mística.
Na visão de Bonavides (2004) a primeira modalidade de Estado
Constitucional, por seu compromisso inquebrantável com a liberdade e, por via de
conseqüência com os direitos políticos e civis, que formam a grande camada dos
direitos fundamentais da primeira dimensão, denominou-se também Estado Liberal,
e com esse nome e significado tem percorrido as distintas fases do
Constitucionalismo, não obstante já lhe terem passado mais de uma vez a certidão
de óbito.
Assim, prossegue o autor, no tocante às relações de trabalho, o Estado
Liberal é de cunho eminentemente capitalista, em que o poder está nas mãos da
classe burguesa que prega o individualismo a não-intervenção do Estado, o que
propiciava o modelo econômico implantado. E mais, a burguesia acordava o povo
que então despertou para a consciência de suas liberdades políticas, o que com a
18
queda da Bastilha culminou com a ascensão da burguesia ao poder. E diga-se aqui,
a revolução francesa, por seu caráter preciso de revolução da burguesia, levara à
consumação de uma ordem social, em que pontificava, nos textos constitucionais, o
triunfo total do liberalismo. Do liberalismo, apenas, e não da democracia.
O capitalismo foi o modelo econômico adotado pela burguesia que tinha como
fundamentos princípios liberais (propriedade privada, liberdade, não-intervenção do
Estado), visão essa muito bem retratada por Bonavides (2004, p 44), pois para ele
Essa liberdade lhe era indispensável para manter o domínio do poder político, e só por generalização nominal, conforme já vimos, se estendia às demais classes.Disso não advinha para a burguesia dano algum, senão muita vantagem demagógica, dada a completa ausência de condições materiais que permitissem às massas transpor as restrições do sufrágio e, assim, concorrer ostensivamente, por via democrática, à formação da vontade estatal [...].
A liberdade, segundo ele, praticada pelo Estado Liberal expunha no domínio
econômico os fracos à sanha dos poderosos. O triste capítulo da primeira fase da
Revolução Industrial, de que foi palco o Ocidente, evidencia, com a liberdade do
contrato, a desumana espoliação do trabalho, o doloroso emprego de métodos
brutais de exploração econômica, a que nem a servidão medieval se poderia, com
justiça, equiparar.
Acrescenta, ainda, Bonavides (2004) que na verdade, o liberalismo pregava
um culto à liberdade, no sentido da exaltação do indivíduo e de sua personalidade,
mas com a preconizada ausência e até mesmo com o desprezo da coação estatal.
Mas, para VIERKANDT apud BONAVIDES (1921, p.101)
[...] no tocante à igualdade no liberalismo é apenas formal, e encobre, na realidade, sob seu manto de abstração, um mundo de desigualdades de fato econômicas, sociais, políticas e pessoais -, termina a apregoada liberdade, como Bismark já o notara, numa real liberdade de oprimir os fracos, restando a estes, afinal de contas, tão-somente a liberdade de morrer de fome.
19
No tocante ao Estado Liberal, mencionam-se os traços marcantes abaixo:
a) O século XIX foi das Constituições Liberais.
b) As Constituições, na ordem concreta, dividiram-se entre as derivadas de
Assembléias Constituintes e as outorgadas.
c) Nas primeiras avultava em termos de legitimidade o poder constituinte,
exercitado em nome da Nação ou do Povo. Nas outorgadas, de mais baixa
legitimidade, a vontade do monarca se afigurava decisiva em determinar os
conteúdos constitucionais.
d) O Estado Liberal impregnava de seus valores as Constituições, em geral
de cunho marcadamente individualista.
e) O mais freqüente era a passagem do regime da Monarquia Absoluta ao de
Monarquia Constitucional, tendo por base um compromisso político, um pacto
firmado entre o rei e a Nação.
f) A dissolução de Assembléias Constituintes, mediante golpes de Estado, se
fazia ato demonstrativo de que os monarcas guardavam ainda, na realidade –
conquanto de maneira dissimulada - uma parcela remanescente de poder absoluto.
Segundo Bonavides (2004, p.41-42),
[...] as formas de governo são muito importantes, mas muito mais importantes são, na realidade, em qualquer sistema ou regime, a competência, o comportamento, a lealdade, a devoção, a ética do homem público, a par do civismo, da participação, da democratização, da ilustração política, da liberdade, da justiça reinante nas esferas sociais – fatores que imprimem fé nos governados e legitimidade nos governantes. Sem isso não se concretizam direitos fundamentais, nem auferem estabilidade as Constituições e os governos.
O Estado Liberal, argumenta Bonavides (2004), por ser permeado pelo cunho
da liberdade, a qual estava consubstanciada de caráter individualista e de uma
igualdade apenas formal, não tinha o intuito de diminuir ou acabar com as
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desigualdades econômicas e o sofrimento que o povo vinha enfrentando desde o
anterior Estado Absolutista que adotava o modelo feudalista. Desse modo, a
passagem do Estado Liberal para o social estava marcada pela preocupação ao
atendimento dos direitos de cunho social (educação, saúde, etc.) que deveriam ser
propiciados pelo Estado com o escopo de dar ênfase ao valor da justiça, de vez que
esta ainda estava distante de ser concretizada.
Por conseguinte, se demonstra a passagem do Estado Liberal para o Estado
Social, o que infra é enfatizado.
1.1.2 O Estado Social
Como já foi referido, o Estado Constitucional Liberal foi a origem do Estado,
pois o Estado Constitucional é um projeto do liberalismo burguês para dar conta do
Estado Liberal, ou seja, para garantir as conquistas burguesas adquiridas ao longo
do tempo. A contenção do Estado inspirou a idéia dos direitos fundamentais e da
divisão de poderes. Á medida, porém, que o Estado burguês se enfraquece, passa
ele a ser o Estado de todas as classes, o Estado fator de conciliação, o Estado
mitigador de conflitos sociais e pacificador necessário entre o trabalho e o capital.
Segundo Hermany (1999), o modelo liberal de Estado, estudado
anteriormente, caracterizou-se pela implementação do programa político, social e
econômico da classe burguesa, consagrando as liberdades negativas,
representadas por um non facere do Estado, ou seja, pelo absenteísmo estatal. Em
decorrência, como já demonstrado, as relações socioeconômicas estavam reguladas
pelas leis de mercado, baseadas substancialmente na relação entre a oferta e a
procura.
Para Bonavides (2004, p. 184-185):
Nesse momento em que se busca superar a contradição entre a igualdade política e a desigualdade social, ocorre, sob distintos regimes políticos, importante transformação, bem ainda de caráter superestrutural. Nasce aí a noção contemporânea do Estado social. O Estado social representa efetivamente uma transformação superestrutural por que passou o antigo Estado liberal. Seus matizes são riquíssimos e diversos. Mas algo, no
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Ocidente, o distingue, desde as bases, do Estado proletário, que o socialismo marxista intenta implantar; é que lê conserva sua adesão à ordem capitalista, princípio cardeal a que não renuncia [...].
Desse modo, segundo o autor, o Estado Constitucional Social é marcado por
preocupações distintas do Estado Liberal, porque a liberdade já se tinha por
adquirida e preconizada nos ordenamentos constitucionais, ao passo que a justiça,
como anseio e valor social superior, está distante de alcançar a mesma grande
positividade e concreção.
Quando se analisa a substância dessa segunda forma de Estado
Constitucional Social, é fácil certificar-se que ela não gira em redor de formalismos,
seu ponto de apoio e sua base de identidade são o tecido social dos direitos
fundamentais. Sua legitimidade se faz e cresce na exata medida em que tais direitos
se concretizam.
Nesse diapasão, enfatiza Gordillo (1984) que a atuação do Estado não se
restringe à ação assistencial, no sentido de minimizar as desigualdades ou na garantia
de direitos trabalhistas. Também envolve uma atuação no tocante às relações
econômicas, em que o Estado intervém na política de preços, tanto que assume
destaque a disciplina do direito econômico, com a publicização de institutos que
recentemente integravam o campo do direito privado.
Conforme Bonavides (2004, p.44-45),
[...] quando prevaleciam por única constante na caracterização do estado Moderno os direitos da primeira geração, a lei era tudo. Quando se inaugurou, porém, a nova idade constitucional dos direitos sociais, como direitos da segunda geração, a legitimidade – e não a lei – se fez paradigma dos estatutos Fundamentais. No constitucionalismo contemporâneo a Teoria da Norma Constitucional passou a ter, a nosso ver, a legitimidade por fundamento. A legitimidade é o direito fundamental, o direito fundamental é o princípio, e o princípio é a Constituição na essência, é sobretudo sua normatividade. Ou colocado em outros termos: a legalidade é a observância das leis e das regras; a legitimidade, a observância dos valores e dos princípios [...]. Abria-se a ordem constitucional ao universo normativo dos valores cristalizados em princípios. Nessa caminhada principiológica de juridicidade, o princípio se pode talvez definir como aquele valor vinculante mais alto que, positivado na Constituição, é suscetível de irradiar normatividade a todos os conteúdos constitucionais.
22
Como se denota, o Estado Constitucional Social se caracteriza por ser um
estado de liberdades positivas, pois através da força principiológica procura
estabelecer ao cidadão os direitos de segunda geração (ou dimensão), direitos
esses que precisam ser garantidos pelo Estado, tais como: saúde, educação, lazer,
por isso chamado, também, de Estado do Bem-Estar Social.
Na opinião de Hermany (1999) o cerne estatal desloca-se do individual para o
social, alterando o modelo jurídico que, ao incorporar novos direitos sociais, e
tornando o aparato legal-racional inócuo para a resolução desses novos conflitos,
envolve interesses diluídos em grupos amplos em toda a sociedade.
Ademais, o Estado Social, por sua própria natureza, é um Estado
intervencionista que requer sempre a presença militante do poder político nas
esferas sociais, onde cresceu a dependência do indivíduo, pela impossibilidade em
que este se acha, perante fatores alheios à sua vontade, de prover certas
necessidades existenciais mínimas.
Salienta-se que o Estado Social significa intervencionismo. Não se pode
confundir o Estado Social da democracia com o Estado Social dos sistemas
totalitários por oferecer, concomitantemente, na sua feição jurídico-constitucional, a
garantia tutelar dos direitos da personalidade.
Segundo Garcia-Pelayo (1982, p.56-64),
[...] o Estado acolhe os valores jurídico-políticos clássicos; porém, de acordo com o sentido que vem tomando através do curso histórico e com as demandas e condições da sociedade do presente [...]. Por conseguinte, não somente inclui direitos para limitar o Estado, senão também, direitos as prestações do Estado [...]. O Estado, por conseguinte, não somente deve omitir tudo o que seja contrário ao Direito, i.e, a legalidade inspirada em uma idéia de Direito, senão que deve exercer uma ação constante através da legislação e da administração que realize a idéia social de Direito. Dessa forma, o Estado social de Direito significa um Estado sujeito à lei legitimamente estabelecida com o respeito ao texto e às práticas constitucionais, indiferentemente de seu caráter formal ou material, abstrato ou concreto, constitutivo ou ativo, à qual, de qualquer maneira, não pode colidir com os preceitos sociais estabelecidos pela Constituição e reconhecidos pela práxis constitucional como normatização de valores por e para os quais se constitui o Estado social e que, portanto, fundamentam a sua legalidade.
23
Dessa forma, se vê que o Estado Social de Direito foi marcado pela
introdução dos direitos de 2ª geração (ou segunda dimensão) e pela preconização
da força principiológica.
Frisa-se, de acordo com Hermany (1999), que o novo paradigma que se
inaugurava não rompia com os princípios capitalistas, sendo principalmente uma
válvula de escape que impedia uma drástica ruptura do aparelho estatal, apesar da
inserção formal de direitos sociais no ordenamento jurídico positivado.
O Estado Social no Brasil foi disposto, na teoria, tardiamente, contemplado
em vários artigos da Constituição Federal de 1988, a qual leva muito em conta o
coletivo, o social, os direitos básicos que devem ser alcançados ao povo brasileiro;
mas, os mesmos estão calcados em uma sociedade de cunho liberal, em que a
economia cada vez mais ganha espaço e substitui o espaço público na tomada de
decisões políticas do País.
Ademais, a Constituição Federal do Brasil de 1988 possui muitos direitos
sociais estabelecidos, mas muitos deles não estão possuindo eficácia, tais como, o
art. 7°, inciso IV 1, art. 1962, dentre outros. Grande parte dessa falta de concretização
dá-se por culpa do Poder Executivo que está interpretando o texto constitucional de
modo a deixar de concretizar os direitos estabelecidos, fazendo uma verdadeira
interpretação liberal dos direitos assegurados na Carta Magna de 1988.
O problema do Estado Social preconizado pela Constituição Federal de 1988
foi de estar anos sob os fundamentos dos princípios liberais, ou seja, toda uma
geração que aprendeu e conviveu com os princípios liberais, de repente se viu
regida por uma Constituição de caráter comunitário, contendo elementos e
1 Art. 7º IV - salário mínimo , fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim.(Constituição da República Federativa do Brasil. 35ª edição. Editora Saraiva. 2005, p.14 2 Art.196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. (Constituição da República Federativa do Brasil. 35ª edição. Editora Saraiva. 2005, p.141).
24
fundamentos em valores compartilhados, estabelecendo princípios a serem seguidos
pelo Estado, direitos a serem garantidos, os quais em muitos casos eram lidos e
interpretados de forma liberal, isto é, sob o prisma do pensamento liberal.
Com efeito, não se vivencia o Estado Social, já fora ultrapassada esta fase do
constitucionalismo. A dúvida aqui no Brasil persiste se realmente se havia chegado a
vivenciar e a usufruir todos os direitos sociais estabelecidos e preconizados pelas
Constituições. Nessa visão faltaram inúmeros, os quais apenas foram estabelecidos
no papel, não chegando a ser concretizados na prática.
1.1.3 O Estado Neoliberal
Primeiramente, não se pode confundir liberalismo com o neoliberalismo, pois
este deriva do liberalismo, uma vez que é baseado em princípios originários daquele,
tais como: propriedade privada, livre iniciativa, porém extrapola o limite do liberalismo,
de vez que o neoliberalismo se define como a política econômica de abertura
indiscriminada do mercado nacional ao internacional, o que gera uma dependência
econômica daquele para com este. No liberalismo existe a conjunção de dois aspectos
da vida em sociedade na liberdade. Um deles é a pequena presença do Estado no
plano pessoal. O outro é a pequena presença estatal no plano econômico. Porém, no
liberalismo, o estado nacional não está a depender de fatores externos ou subordinados
às decisões do mercado internacional como no neoliberalismo.
E, outra diferença entre ambos, é quanto à não-intervenção do Estado, haja vista
que no liberalismo se prega a não-intervenção do Estado com fundamento na liberdade
negativa, ou seja, tendo como base a liberdade individual no sentido apenas de impedir
a violação da liberdade e dos direitos individuais. Já no Neoliberalismo, o Estado é
interventor, de vez que no momento em que se privatizam os serviços vitais a qualquer
nação prestados pelo setor público se está na verdade o Estado intervindo em prol da
iniciativa privada, procedimento adotado, por exemplo, nos setores de telefonia, energia
elétrica, etc.
O neoliberalismo avançou tendo como expoente teórico Frederick Hayek,
cientista político direitista, guru do Chile do general Pinochet, e orientador espiritual de
25
Margaret Thatcher, pela falta de alternativa apresentada pela nova esquerda, após o
fracasso da esquerda no Leste Europeu. Nesse diapasão é o pensamento Wainwright
(1994, p.24):
A queda de Mikhail Gorbachev provavelmente simbolizou o golpe final na grande influência desses críticos mesmo quando suas críticas eram dirigidas a ele e/ou à antiga liderança. Isso tem importância para a teoria e a linguagem com as quais a nova esquerda ocidental pode responder ao desafio colocado pelo apelo generalizado, ainda que contraditório, do neoliberalismo. Significa que apesar de ser provável que elementos de uma alternativa mesmo o que muitos ocidentais perceberiam como uma alternativa socialista - se desenvolvessem no Leste Europeu, eles não podem ser construídos e generalizados com uma ênfase absoluta no contexto teórico existente do socialismo. Em vez disso, a nova esquerda ocidental precisa, no diálogo com aqueles movimentos do Leste, teorizar novas práticas através de uma crítica direta aos fundamentos do neoliberalismo, em particular do influente trabalho de Frederick Hayek [...].
Segundo Wainwright (1994, p.48-49), para Frederick Hayek
[...] o resultado da atividade humana é casual e de que a ordem social que subsiste - sobretudo o mercado privado - é produto de um processo de evolução no qual não se deve interferir. Eis por que ele defende um Estado forte, protetor do livre mercado [...]. Aquela escreveu a obra já referida (Uma resposta ao Neoliberalismo), onde critica a teoria de Frederick Hayek, mais precisamente, na obra ‘O Caminho da Servidão’, concluindo que ‘podemos observar dois problemas de consistência nas implicações lógicas da teoria sobre a produção e distribuição de conhecimento de Hayek e suas prescrições políticas e econômicas posteriores. Por um lado, ele vê todos os monopólios ou tentativas de concentração do poder como uma ameaça à ordem espontânea. A condição econômica sob a qual tal ordem pode florescer é a ‘concorrência’, que significa ‘planejamento descentralizado feito por pessoas isoladas’ [...]. O problema de sua teoria, porém, é que os monopólios desenvolveram-se a partir do mercado capitalista. Em um certo sentido, os monopólios ou oligopólios nos negócios poderiam ser compreendidos como evoluções naturais da concorrência capitalista; no entanto, também se tornam fonte de poder para levar a cabo projetos econômicos conscientes e calculados, que afetam o resto da economia. Nesse caso, a ordem espontânea carrega consigo as sementes da própria destruição.
E cita WAINWRIGHT (1994, p. 52-53) como resposta ao neoliberalismo pregado
por Hayek a política econômica adotada pelo Japão nos anos 90, em que
[...] as principais empresas e o Estado criaram uma instituição econômica central, funcionando em sistema de rede, para a elite econômica, uma parte do Ministério da Indústria e Tecnologia que facilita o intercâmbio de planos, informações sobre mercados internacionais e áreas de interesse mútuo tais como relações trabalhistas e desenvolvimento tecnológico. Os participantes desse processo criaram redes informais adicionais que dão continuidade à troca de informações. Essas densas redes de conhecimento ligando a elite do Japão são um ingrediente vital no sucesso da competitividade de sua
26
economia. Mas ninguém poderia chamá-las de espontâneas. Com certeza trouxeram muitos benefícios não intencionais à gerência das corporações japonesas e ao Estado (e sem dúvida contribuíram para a natureza corrupta da política japonesa) , mas não há dúvida de que foram intenções de intervir no mercado que impulsionaram o processo [...].
Não obstante a atual Constituição da República Federativa do Brasil possuir
caráter liberal, na realidade o Estado está tomado pelas características neoliberais, ou
seja, o estágio do Estado brasileiro é de cunho Neoliberal que possui atributo de um
estado mínimo, pois a maior parte dos direitos sociais enunciados na Constituição de
1988 possuem conotação programática, interpretando-os de acordo com os princípios
liberais. De outra banda, os setores essenciais para a economia estão sendo
privatizados, tais como: telefonia, energia elétrica, rodovias.
O Estado Neoliberal não deixa de ser interventor, pois no momento em que
entrega determinadas atividades que são de vital importância para o país à iniciativa
privada está intervindo na economia, uma vez que as privatizações são formas de
intervenção. Esse modelo neoliberal está debilitando a soberania estatal, pois o
neoliberalismo adveio tendo como cerne a globalização, já que essa surgiu da
massificação da produção e do comércio mundial. Foram brotando as alianças
políticas seguidas por outras de caráter econômico e juntas conformaram novas
ordens regionais e posteriormente globais. Exemplo disso são a União Européia, a
Organização Mundial do Comércio (OMC), o Fundo Monetário Internacional (FMI), o
Banco Mundial.
O Estado globalizado é um instrumento político da hipomodernidade, tendo
como modelo o neoliberalismo, que se caracteriza por um processo de globalização,
com liberalismo econômico, fluidez mediática e hiperconsumo, que coexistem com o
nível dos Estados integrados que associam suas influências políticas, econômicas e
culturais, assim como os planos de luta contra adversidades comuns.
O modelo neoliberal surgiu como decorrência da globalização, que passou a
existir através da expansão das fronteiras científicas e culturais, sociais e
geográficas, em um processo paulatino e constante que foi permitindo estender-se à
maioria dos países do globo. Esse processo possui certas características,
principalmente, com uma vontade de disseminar crenças, idéias e valores em
27
alianças de progresso material, ambos corolários da confiança ilimitada, na
capacidade do homem para superar as condições que lhe foram dadas.
Essa nova ordem pode ser considerada como um processo econômico – que
modifica substancialmente as bases do comércio de produção e dos mercados – e
político – que transcende a fronteira dos Estados com ingerência nos governos
correspondentes. A globalização acaba afetando as condições de vida de todos os
habitantes do planeta, mais precisamente a cultura, os mercados econômicos, as
leis e a política, superando assim as fronteiras nacionais.
Salienta-se que o modelo neoliberal, sem instrumentos de freio e contrapeso,
é o modelo perfeito para os grandes grupos mundiais estabelecerem suas idéias e
seus interesses, encontrando no fenômeno da “globalização” sua alavanca
propulsora geradora de um aumento da desigualdade social.
Para Sarmento (2002, p. 66):
[...] a aceleração do processo de globalização econômica experimentada neste final de século vem pondo em risco algumas conquistas históricas no campo dos direitos humanos. A mundialização da economia, regida exclusivamente pelas leis do mercado, redifica o ser humano, tornando-o um mero instrumento – eventualmente descartável – para a maximização dos resultados dos agentes econômicos transnacionais, enquanto se assiste ao esfacelamento do estado-providência. Paralelamente a isto, desenvolve-se com algum vigor, certa corrente de pensamento dita “pós-moderna”, caracterizada pelo desprezo aos valores emancipatórios universais cristalizados a partir do Iluminismo – liberdade, igualdade, fraternidade -, apoiando-se numa filosofia sem sujeito, onde a categoria ´pessoa humana´ perde a centralidade [...].
Cabe, no entanto, conforme Roberto Dromi (2005, p. 28-29)
[...] distinguir a globalização da internacionalização, que importa uma cooperação entre Estados soberanos, pois uma das características da globalização tem sido a erosão da soberania estatal devido ao desenvolvimento e expansão de redes mundiais de comunicação e informação, que têm levado a economia e tecnologia a escaparem do controle dos Estados.
28
Além disso, a globalização está gerando uma internacionalização financeira e
econômica de capitais, ocasionando uma desregulação econômica, fazendo com
que valores migrem dos países numa velocidade assustadora, enfraquecendo
economias de países em desenvolvimento como o Brasil.
A globalização desenfreada, sem instrumentos de controle ocasiona o
enfraquecimento econômico-financeiro do Brasil, deteriorando até mesmo as normas
legais que servem de instrumento para a proteção da economia do país.
Segundo Faria (1999), no âmbito específico do Estado-nação, as instituições
jurídicas acabaram sendo progressivamente reduzidas, no que se refere ao número
de pessoas e diplomas legais, e tornadas mais ágeis e flexíveis, em termos
processuais. Evidentemente, o Estado continuou legislando, inclusive em matéria
econômica, financeira, monetária, tributária, previdenciária, trabalhista, civil e
comercial. Mas, passou a fazê-lo agora, e esse é o fato novo digno de nota,
diminuído em seu poder de intervenção e, muitas vezes, constrangido a compartilhar
sua titularidade de iniciativa legislativa com diferentes forças que transcendem o
nível nacional, ou seja, limitado em suas políticas fiscais, em seus instrumentos de
direção e em suas estratégias de planejamento; obrigado a levar em conta antes o
contexto econômico-financeiro internacional do que as próprias pressões, os
anseios, as expectativas e as reivindicações nacionais; e restrito ao papel de
articulador e controlador da auto-regulação, tendo por função (a) preservar a
complexidade das diferentes racionalidades dos setores e agentes produtivos e (b)
induzir processos de mútuo entendimento entre eles.
Como se observa, o Brasil, em face de não possuir um efetivo adorno de
controle dos efeitos perversos que a globalização contém, está perdendo a
capacidade de gerir sua política econômica sem abrir mão da direção traçada
através de metas a serem alcançadas, porquanto cada vez mais o contexto
econômico financeiro mundial está ditando as regras e acabando por atrapalhar
aqueles países que não possuem sistemas de proteção contra o poder econômico
dos grandes grupos mundiais, caso do Brasil. Exemplo disso é a meta de inflação
(política ditada pelo FMI) adotada pelo Brasil.
29
Nesse sentido enfatiza Faria (1999, p. 232):
[...] no âmbito da ´economia-mundo` as organizações financeiras e empresariais transnacionais, agindo com base na premissa de que as decisões relativas aos sucessivos estágios das atividades produtivas não podem ser tomadas separadamente, por etapas, mas de forma simultânea e global, ampliaram expontaneamente a produção de suas próprias regras, sob a forma de sistemas de organização e métodos, manuais de produção, regulamentos disciplinares, códigos deontológicos de conduta e, principalmente, contratos padronizados com alcance mundial. Como no âmbito de uma cadeia produtiva cada conexão é um conjunto de relações dinâmicas e como as diferentes conexões interagem entre si, as organizações financeiras e empresariais transnacionais nelas inseridas precisaram criar e adensar sua normatividade e sua ´oficialidade` para maximizar a administração dos blocos de relações segmentadas e as estratégias de sinergia entre fornecedores de matérias-primas, montadores, distribuidores e prestadores de serviços, o que as levou a gerar uma ´jurisprudência` ad hoc paralelamente ao ordenamento jurídico de cada território em que atuam.
O gradativo esvaziamento da autonomia decisória das instituições político-
legislativas nacionais e o subseqüente deslocamento das decisões fundamentais
para o âmbito de um sistema econômico transnacional estão acarretando uma forte
redução no leque de opções e alternativas do eleitorado, pois está-se constatando
claramente a predominância do poder econômico em detrimento do poder político,
independente de posição política e ideológica.
A globalização econômica está provando que, na ausência de um sistema
que a controle, pode implicar a desintegração social, pois a globalização está
levando à emergência de novas profissões e especializações para as quais não
existe um sistema técnico-educacional adequado, acelerando a mobilidade do
trabalho e a flexibilização de sua estrutura ocupacional entre setores, regiões e
empresas, provocando a redução dos salários, ampliando os níveis de concentração
de renda, relativizando o peso do trabalho direto nas grandes unidades produtivas,
aumentando o desemprego dos trabalhadores menos qualificados. Exemplo disso
são as empresas multinacionais do setor automotivo que migram de país quando lhe
são oferecidos incentivos fiscais, acarretando desemprego para aquele país no qual
houve a perda da empresa. As novas profissões ligadas às áreas de tecnologia,
computação, finanças, possuem um aprendizado mais técnico nos países mais
desenvolvidos, isso sem falar no deslocamento de moeda que, em questão de
segundos, se deslocam dos países periféricos para os países desenvolvidos, os
30
quais, na maioria dos casos, são detentores das sedes dos grandes conglomerados
econômicos. Exemplo disso são as grandes fábricas de automóveis (Ford, General
Motors, etc.) que se deslocam para países desenvolvidos que têm condições de
oferecer benefícios fiscais, considerando também a solidez da política econômica
adotada pelo país (Estados Unidos da América-EUA, Alemanha, etc.)
Essas transformações estão diminuindo a proteção dos trabalhadores,
afetando diretamente a estrutura do poder político do país, deslocando o poder de
decisão das mãos do executivo para as mãos do poder econômico, fugindo ao
controle do país que fica cada vez mais de mãos amarradas assistindo ao aumento
da desigualdade social, do desemprego, sem ter força de reação.
Além disso, conforme Singer (1996), as novas tecnologias exercem um
impacto decisivo na descentralização, heterogeneização e fragmentação do mundo
do trabalho, seja por permitir a transferência dos custos da ociosidade produtiva das
grandes para as pequenas e médias empresas, seja por substituir o tradicional
contrato de prestação de serviços e de compra e venda da força de trabalho por um
contrato de fornecimento de mercadorias, seja por abrir caminho para a sua
regulação em termos cada vez mais individualistas, promocionais e meritocráticos,
graças ao pagamento de bônus por assiduidade, gratificações por produtividade e
prêmios relativos à qualidade – portanto, colidindo com as formas coletivas
padronizadas até então prevalecentes.
As conclusões de Perry Anderson (1995, p.23)3, em texto no qual faz um
balanço do neoliberalismo, são expressivas:
Economicamente, o neoliberalismo fracassou, não conseguindo nenhuma revitalização básica do capitalismo avançado. Socialmente, ao contrário, o neoliberalismo conseguiu muitos dos seus objetivos, criando sociedades marcadamente mais desiguais, embora não tão desestatizadas como queria. Política e ideologicamente, todavia, o neoliberalismo alcançou êxito num grau com o qual seus fundadores provavelmente jamais sonharam, disseminando a simples idéia de que não há alternativas para os seus princípios, que todos, seja confessando ou negando, têm de adaptar-se a suas normas.
3 ANDERSON, Perry. Balanço do neo-liberalismo. In: SANDER, Emir; GENTILI, Pablo (Org.). São
Paulo: Paz e Terra, 1ª reimpressão, 1995, p. 23.
31
Para Pastore4, apud Faria (2005), a manipulação na velocidade das máquinas
e dos equipamentos produtivos estão levando à crescente aceleração do ritmo de
trabalho. Elas também afetam o nível de crescimento da oferta de emprego, na
medida em que permitem a agregação de diferentes funções para cada trabalhador
(caso em que um único homem controla um conjunto articulado de máquinas) e a
rotação por distintas tarefas e funções (como, por exemplo, na experiência de
equipes que se responsabilizam por toda uma seqüência da etapa produtiva),
tornando desnecessária a contratação de pessoal para as tarefas rotineiras e
repetitivas. Essas podem ser facilmente executadas por robôs que, na linguagem
bastante irônica de um analista, além de não fazer greves nem reclamar seus
direitos judicialmente, ainda trabalham no calor e no frio, no claro e no escuro, no ar
poluído e em locais insalubres, dispensando iluminação, refrigeração, aquecimento e
purificadores de ar e atuando tanto nos fins de semana quanto nos feriados com o
mesmo entusiasmo dos dias úteis.
Ademais, segundo Grau (2001), o modo de produção social globalizado
dominante conduz, não apenas à perda de importância dos conceitos de “país” e
“nação”, mas também ao comprometimento da noção de Estado.
A globalização, afirma Ralf Dahrendorf (1995), ameaça a sociedade civil, na
medida em que (I) está associada a novos tipos de exclusão social, gerando um
subproletariado, em parte constituído por marginalizados em função da raça,
nacionalidade, religião ou de outro sinal distintivo; (II) instala uma contínua e
crescente competição entre os indivíduos; (III) conduz à destruição dos serviços
públicos (destruição do espaço público e declínio dos valores do serviço por ele
veiculado). Enfim, a globalização na fusão de competição global e de desintegração
social compromete a liberdade.
Portanto, o Brasil não adotou instrumentos com o escopo de frear os efeitos
perversos da globalização econômica, ficando submetido ao poder econômico dos
grandes grupos mundiais, do capital estrangeiro, perdendo sua força, fazendo com
que as leis e a Constituição Federal sejam interpretadas ao crivo do poder
4 In “dumping da robótica”, Jornal da Tarde, edição de 6 de abril de 1994.
32
econômico, reduzindo o poder político das instituições e, principalmente, diminuindo a
força e o poder no cenário interno dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
1. 2 O Estado Brasileiro Contemporâneo e sua função social
Rodrigues (2003) ressalta, inicialmente, que o Estado brasileiro está atrelado
aos princípios fundamentais estabelecidos pela Constituição Federal em seu Título
01. Para Rodrigues, suas ações devem ser norteadas, dentre outros, pelo princípio
da dignidade da pessoa humana, devendo ter por objetivos, dentro da sua esfera de
competências, a busca da construção de uma sociedade livre, justa e solidária, e a
promoção do bem-estar de seu povo, além de ter de possuir uma ação
necessariamente conectada com os Direitos e as Garantias Fundamentais, esses
constantes no Título II da mesma Constituição.
A enumeração contida no art. 3° da Constituição Fed eral de 19885, segundo
Bulos (2002), evidencia os fins do Estado brasileiro. Ela não é taxativa, mas
exemplificativa, uma vez que não exaure os objetivos a que se destina a República
Federativa do Brasil.
Ao se analisar os art. 1°, inciso IV, 3°, inciso III, 5°, inciso, XXII e 1 70, inciso
IV da Carta Magna de 19886, conclui-se que o Brasil preceitua na Constituição o
modelo capitalista. Porém, com limitações, pois, além dos objetivos acima referidos,
a ordem econômica está fundada na valorização do trabalho humano e na livre
5 Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. 6 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...] IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; [...] Art. 3º [...] III – Cf. nota de rodapé 5, desta página. Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] XXII - é garantido o direito de propriedade; [...] Art. 170. IV - livre concorrência;
33
iniciativa, tendo por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da
justiça social, possuindo como base os seguintes princípios: soberania nacional,
propriedade privada, função social da propriedade, defesa do consumidor, defesa do
meio ambiente, redução das desigualdades regionais e sociais, busca do pleno
emprego e tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas
sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.
(BRASIL.Constituição, 1988).
Nessa esteira, Grau (2001, p.58) preconiza que:
[...] a ordem econômica capitalista, ainda que se qualifique como intervencionista, está comprometida com a finalidade de preservação do capitalismo. Daí a feição social, que lhe é atribuída, a qual, longe de desnudar-se como mera concessão a um modismo, assume, nitidamente, conteúdo ideológico.
Nesse mesmo diapasão é o entendimento de Silva (1993, p. 666):
[...] a ordem econômica consubstanciada na Constituição não é senão uma forma econômica capitalista, porque ela se apóia inteiramente na apropriação privada dos meios de produção e na iniciativa privada (art. 170). Isso caracteriza o modo de produção capitalista, que não deixa de ser tal por eventual ingerência do estado na economia nem por circunstancial exploração direta de atividade econômica pelo estado e possível monopolização de alguma área econômica, porque essa atuação estatal ainda se insere no princípio básico do capitalismo, que é apropriação exclusiva por uma classe dos meios de produção, e, como é essa mesma classe que domina o aparelho estatal, a participação deste na economia atende a interesses da classe dominante.
A política adotada pelos Governos pelo Brasil desde a CF/88, está sendo
seguida de forma parcial pelo Brasil, encontrando-se destoada dos princípios
preconizados pela Carta Política de 1988, uma vez que essa possui como função
social um “capitalismo com limitações”; já o modelo adotado pelo Governo possui
cunho “neoliberal” ou seja, adota o capitalismo sem, na prática, possuir limitações,
principalmente para impor o cunho social enfatizado na Carta Magna de 1988.
Destarte, os princípios constitucionais preconizados expressamente na Constituição
Federal não estão sendo seguidos. Salienta-se que não é a Constituição Federal
que deve ser alterada, mas sim os Governos que devem adotar o modelo previsto na
Carta Magna de 1988.
34
O Governo tem de ter sempre como meta a função social a ser alcançada,
que está expressamente prevista na Constituição Federal, não de forma taxativa,
mas exemplificativa, conforme alguns artigos mencionados anteriormente (art.1°, 4°
e 170)7. O Brasil está adotando um modelo de capitalismo de cunho eminentemente
“neoliberal”, ou seja, apto a prestar apenas o “mínimo” necessário para a população,
privatizando os principais setores ou delegando através de concessões para o setor
privado, ficando o Governo ao talante daquele setor, sem mecanismos que visam
garantir regras que objetivem a eficiência na sua prestação com tarifas módicas, de
modo a propiciar acesso a um maior número possível de pessoas. Pois, segundo
Petter (2005, p. 20), “ [..] nosso país fez uma inegável opção pelo sistema capitalista
de produção com temperamentos sociais[...]”.
7 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: I - independência nacional; II - prevalência dos direitos humanos; III - autodeterminação dos povos; IV - não-intervenção; V - igualdade entre os Estados; VI - defesa da paz; VII - solução pacífica dos conflitos; VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo; IX - cooperação entre os povos para o progresso da humanidade; X - concessão de asilo político. Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações. Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade; IV - livre concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; VIII - busca do pleno emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.
35
O art. 170 da Constituição Federal de 1988 estabelece os princípios
constitucionais da ordem econômica que está fundada na valorização do trabalho
humano e na livre iniciativa, tendo por fim assegurar a todos existência digna
conforme os ditames da justiça social.
Os princípios gerais da atividade econômica são núcleos condensadores de
diretrizes, ligados à apropriação privada dos meios de produção e à livre iniciativa,
as quais consubstanciam a ordem capitalista. Pela retórica do constituinte, tais
princípios serviriam para sistematizar a esfera de atividades criadoras e lucrativas,
com vistas à redução das desigualdades sociais. Consignariam, em última análise,
um bojo de providências constitucionais efetivadoras da cognominada “justiça
social”.
Todavia, segundo Bulos (2002, p.1139-1140),
[...] o reconhecimento da justiça social, por intermédio dos instrumentos de tutela dos hipossuficientes, quais sejam, os direitos sociais (art.6°), não tem tido, até o momento, a eficácia social necessária para equilibrar a posição de miséria e pobreza que lhes impede o efetivo exercício das garantias outorgadas. Soma-se a isso a política neoliberal, emergente com a queda do muro de Berlim e a derrocada dos regimes socialistas europeus, em cujo esteio a liberdade ficou perdida, num clima de globalização desenfreada. Privilegiando a economia privada, o espírito do neoliberalismo não conseguiu estacar as desigualdades sociais, criadas e produzidas pela iníqua distribuição de rendas.
Como observa Marilda Vilella Ianomoto (2001) quando a ordem econômica se
diz “fundada na valorização do trabalho humano” sobreleva o aspecto do trabalho
livre, do direito ao trabalho em si, e não às particularidades da relação empregatícia,
mais afeta ao direito laboral, mas que também com o econômico se conectam.
Impõe-se a valorização do trabalho humano. Valorizar o trabalho, então, equivale a
valorizar a pessoa humana, e o exercício de uma profissão pode e deve conduzir à
realização de uma vocação do homem. Paradoxalmente, acrescenta Ricardo Antônio
Lucas Camargo (1993), mesmo o mercado, modernamente marcado por ideologias
indisfarçadamente liberais – no sentido mais pobre do termo -, em cuja lógica o
36
trabalho humano é apenas um fator de produção, a ser matematicamente
equacionado na diagramação dos custos e dos lucros tão-somente, não pode
prescindir das conseqüências da valorização do trabalho humano.
Ademais, a liberdade de trabalho se manifesta também na livre escolha do
lugar em que se deseja exercer uma profissão e a sua valorização diz respeito,
ainda, à atuação estatal/privada de reinserção no mercado de trabalho do apenado
que haja cumprido sua condenação. Para José Afonso da Silva (1995), a ordem
econômica, embora capitalista, dá prioridade ao valor do trabalho humano sobre
todos os demais valores da economia de mercado. Essa assertiva fica mais bem
esclarecida quando tomada em consideração a finalidade da ordem econômica, que
deve estar direcionada à potencialização do homem, seja em sua dignidade
existencial, seja na substantivação das qualidades que o singularizam – humanidade –,
mais bem percebida no quadrante solidarista e fraternal da justiça social.
Salienta-se que o Estado Contemporâneo Brasileiro, que possui como modelo
o capitalismo com limitações, tem como princípio também relevante e embasador de
sua ordem econômica a livre iniciativa que, para Reale (1998, p. A-3),
[...] não é senão a projeção da liberdade individual no plano da produção, circulação e distribuição das riquezas, assegurando não apenas a livre escolha das profissões e das atividades econômicas, mas também a autônoma eleição dos processos ou meios julgados mais adequados à consecução dos fins visados. Liberdade de fins e de meios informa o princípio da livre iniciativa, conferindo-lhe um valor primordial, como resulta da interpretação conjugada dos citados arts. 1° e 1 70.
De acordo com João Bosco Leopoldino da Fonseca (1995) no mercado, por
outro lado, constata-se que em muitos segmentos há a ocorrência do fenômeno da
concentração do poder econômico, que fica, por assim dizer, assenhoreado nas
mãos de uns poucos, com ofensa à livre iniciativa, invocando a necessidade de
tutela e intervenção do Estado, sob pena de aquela, literalmente, sucumbir. Então,
ao contrário do que se poderia imaginar, a intervenção do Estado no domínio
37
econômico (CF, art. 174)8, muito antes de limitar a iniciativa e a liberdade do
particular, tem por fim, mesmo, preservá-la. Para Bastos (1996), a livre iniciativa não
só consubstancia alicerce e fundamento da ordem econômica, como também deita
raízes nos direitos fundamentais da ordem econômica, aos quais se faz ínsita uma
especial e dedicada proteção. Se o caput do art. 5º se encarregou de garantir o direito à
liberdade, no viés econômico ela ganha contornos mais precisos, justamente na livre
iniciativa. Pois, conforme Bastos e Ives Gandra Martins (2000), se é livre o exercício de
qualquer trabalho, ofício ou profissão (CF, art. 5°, XIII)9, essa liberdade compreende
também a liberdade de se lançar na atividade econômica, sendo então assegurado a
todos o livre exercício de qualquer atividade econômica (CF, art. 170, parágrafo único).
Dispõe ainda a Constituição Federal de 1988 no parágrafo único do art. 170
que “[...] é assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica,
independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos
em lei [...]”. Trata-se do princípio da livre iniciativa econômica que, para Ferreira
(1998), constitui a marca e o aspecto dinâmico do modo de produção capitalista.
Consiste no poder reconhecido aos particulares de desenvolverem uma atividade
econômica. É mesmo uma fonte axiológica de liberdade do particular perante o
Estado e até perante os demais indivíduos, um atributo essencial da pessoa humana
em termos de realização direta de sua capacidade, suas realizações e seu destino.
Peter (2005, p.168) frisa, ainda, que:
[...] o princípio da liberdade de iniciativa econômica há de compreender a liberdade de acesso ao mercado e a liberdade de permanência deste mercado. Estas duas liberdades implicam, por sua vê, uma infinidade de condicionantes constatáveis na cena econômica e numa adequação institucional pertinente, e podem se desdobrar em outras tantas liberdades.
Dentre os princípios da ordem econômica, tem-se o da proteção ao meio
ambiente (art.170, inciso VI da CF/88)10 que corrobora como um limite ao exercício
8 Art.174 - Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. 9 Art. 5º. XIII - É livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer. 10 Art. 170 [...] VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação.
38
da livre iniciativa e da livre concorrência; por isso, sendo um dos princípios
constitucionais regentes da ordem econômica. Segundo Silva (2003, p. 26-27),
[...] a compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico, a conciliação dos dois valores consiste, na promoção do chamado desenvolvimento sustentável, que consiste na exploração equilibrada dos recursos naturais, nos limites da satisfação das necessidades e do bem-estar da presente geração, assim como de sua conservação no interesse das gerações futuras.
A Constituição Federal de 1988 estabelece que a função social do Estado
Brasileiro é alcançar o bem comum, cujo conteúdo será discutido no 3° capítulo,
(art.3º)11 que, por sua vez, visa assegurar os direitos fundamentais12 (art.5°- caput).
Torres (1999, p.10) esclarece:
[...] a expressão direitos fundamentais empregam-na principalmente os autores alemães, na esteira da Constituição de Bonn, que dedica o capítulo inicial aos Grundrechte, mas a advertência de parte significativa da doutrina é a de que não existe diferença entre esses direitos fundamentais e os direitos da liberdade ou os direitos humanos. Ingressou no Brasil no texto de 1988 (Título II: Dos Direitos e Garantias Fundamentais.
E dentre os direitos fundamentais está a defesa do meio ambiente eleita em
verdadeiro direito fundamental. Segundo Milaré (2000, p.53-58),
11 Art. 3º - Ver nota de rodapé da pág. 32. 12 “[...] só existem direitos fundamentais quando os direitos “naturais” e “inalienáveis” do indivíduo estão incorporados na ordem positiva e são colocados no lugar cimeiro das fontes do direito, ou seja, quando recebem o status de normas constitucionais.” (CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7. ed. Coimbra: Portugual: Almedina, 2003, p.377).
“[...] os direitos fundamentais são aqueles que representam a constitucionalização dos direitos humanos que gozaram de alto grau de justificação ao longo da história dos discursos morais, que são, portanto, reconhecidos como condições para a construção e o exercício dos demais direitos.” (GALUPPO, Marcelo Campos. O que são direitos fundamentais: In: SAMPAIO, José Adércio Leite (org.). Jurisdição constitucional e direito fundamentais. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 233.)
“[...] são direitos inerentes à própria noção de pessoa, como direitos básicos da pessoa, como os direitos que constituem a base jurídica da vida humana no seu nível actual de dignidade.” (MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional: direitos fundamentais. Coimbra: Coimbra Ed., 1988. t.4, p.9.)
Em relação ao ordenamento jurídico brasileiro, tem-se que vários Direitos Humanos foram incorporados em diversos artigos, ao passo que muitos outros são reconhecidos como direitos fundamentais implícitos que, apesar de positivados, não possuem a efetividade que deveriam ter. Diante deste panorama, fica cristalino que um dos maiores problemas enfrentados pelo ordenamento jurídico e por aqueles que o estudam é a falta de eficácia social dos direitos fundamentais, uma vez que, apesar de estes estarem expressamente positivados, não conseguem sair do papel e mudar o mundo exterior, o que traz conseqüências diretas na vida dos cidadãos. (NAKASHIMA, Adriano de Pádua. Hermenêutica filosófica e direitos fundamentais. Revista de Direito Pùblico n. 10 out/nov e dez/2005. Brasília: Ed. IOB/Thomson e Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), p.113.)
39
Se o fim da ordem econômica é assegurar a todos uma existência digna, da mesma forma o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (CF, art. 225), essencial à sadia qualidade de vida, está centrado na pessoa humana e, pois, segundo autorizada doutrina consiste mesmo em verdadeiro direito fundamental, a par de não constar topologicamente no Capítulo I do Título II da Constituição Federal, o que é de todo irrelevante.
Nesse sentido, também, adverte Derani (1996, p.141):
A economia ambiental está assentada na política e através dela se realiza. Por isso, um caminho a ser apresentado para reconciliação da economia com a natureza localiza-se longe da monetarização do ambiente que é dependente da modificação vinculada a práticas políticas. Esta dualidade economia e ecologia (transformação de valor e de matéria) resulta num sistema de reação positiva (maior a atividade econômica, maior a transformação da natureza), que deve ser modificado de modo a encontrar-se uma produção humana- movimento da e para a existência humana.[...].
Desse modo, o meio ambiente também está inserido no rol dos direitos
fundamentais consagrados pela Constituição Federal de 1988, o qual contribui para
que seja alcançado o bem comum que nada mais é do que proporcionar e garantir
os direitos fundamentais a cada pessoa. Somente isso fará com que a função social
consagrada pela Carta Magna de 1988, a qual está moldada tendo como cerne o
modelo capitalista (art. 3°, III, da CF/88) 13, seja alcançada não apenas na teoria,
mas, especialmente, na prática.
Com efeito, como se pode observar, o Brasil adotou expressamente na
Constituição Federal de 1988 um modelo capitalista com limitações, pode-se dizer
com temperamentos sociais, pois, concatenando os artigos 1°, 3°, 4° e 170 14 assim
se vislumbra, mas na prática a política que possui na realidade cunho neoliberal
destoa dos objetivos e princípios pregados pela Carta Política de 1988.
13 Art. 3°. III - Erradicar a pobreza e a marginaliza ção e reduzir as desigualdades sociais e regionais. 14 Arts. 1º , 3°, 4° e 170 – Ver notas de rodapé das págs. 32 e 34 .
40
2 A INTERVENÇÃO DO ESTADO POR MEIO DE POLÍTICAS TRI BUTÁRIAS
Será abordado como o Estado poderá intervir na ordem econômica por meio
de políticas tributárias, de modo que possa implementar políticas públicas de
tributação ambiental que estejam de acordo com os princípios constitucionais
estabelecidos na CF/88, procurando alcançar como finalidade última, o
desenvolvimento sustentável.
2.1 A intervenção econômica por indução
Antes de entrar no tema da extrafiscalidade tributária e do meio ambiente,
procura-se demonstrar como o Estado pode, através da economia, induzir ações
voltadas às políticas tributárias de proteção ao meio ambiente.
Faz-se relevante diferenciarmos a classificação das formas de atuação do
Estado no tocante ao processo econômico, em que a diferença que aparta o campo
dos serviços públicos (área de atuação estatal) do campo da denominada atividade
econômica (área de atuação do setor privado), principalmente tendo como cerne os
ensinamentos de Eros Roberto Grau.
Desse modo, para Grau (2001) verifica-se que o Estado não pratica
intervenção quando presta serviço público ou regula prestação de serviço público.
Atua, no caso, em área de sua própria titularidade, na esfera pública. Por isso
mesmo dir-se-á que o vocábulo intervenção é, no contexto, mais correto do que a
expressão atuação estatal: intervenção expressa atuação estatal em área de
titularidade do setor privado; atuação estatal indica, simplesmente, ação do Estado
tanto na área de titularidade própria quanto em área de titularidade do setor privado.
41
Em outro aspecto, tem-se que intervenção conota atuação estatal no campo da
atividade econômica em sentido estrito; atuação estatal, ação do estado no campo
da atividade econômica em sentido amplo.
Segundo Grau (2001, p.133),
[...] a Constituição de 1988 aparta, a ambos conferindo tratamento peculiar, atividade econômica e serviços público. No art. 173 enuncia as hipóteses e que é permitida a exploração direta de “atividade econômica” pelo estado, além de, no §1° deste mesmo art. 173, indicar regim e jurídico a que se sujeitam empresa pública, sociedade de economia mista e suas subsidiárias que explorem “atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços”. No art. 175 define incumbir ao Poder Público a prestação de “serviços públicos”. Além disso, o art. 174 dispõe sobre a atuação do Estado como agente normativo e regulador da “atividade econômica”. A necessidade de distinguirmos atividade econômica e serviço público é assim, no quadro da Constituição de 1988, inquestionável.
Salienta-se que, para Grau (2001, p.134-135)
[...] a atividade econômica – compreende duas espécies: o serviço público e a atividade econômica, propondo atividade econômica em sentindo amplo como gênero; atividade econômica em sentido estrito, a espécie”. No art. 173 e seu §1°, a expressão conota atividade econômi ca em sentido estrito, pois indica o texto constitucional, no referido artigo (173) caput, as hipóteses nas quais é permitida ao estado a exploração direta de atividade econômica (trata-se de atuação do Estado União, Estado, Distrito Federal e Município) em área da titularidade do setor privado. E, diga-se aqui mais uma vez, que a atividade econômica em sentido amplo é território dividido em dois campos: o do serviço público e o da atividade econômica em sentido estrito. As hipóteses indicadas no art. 173 tratam-se de atividade econômica em sentido estrito.
Já no art. 174, complementa Grau (2001), a expressão atividade econômica é
utilizada no sentido amplo. Respeita a globalidade da atuação estatal como agente
normativo e regulador. A atuação reguladora há de impor a Constituição,
compreender o exercício das funções de incentivo e planejamento, mas não apenas
isso, de vez que atuação reguladora reclama também fiscalização. Como se denota,
caracteriza-se verdadeira atividade econômica em sentido amplo, pois atua no
regulamento, no planejamento e na fiscalização; tanto é assim, que o preceito
determina ser ele – o planejamento – determinante para o setor público e indicativo
42
para o setor privado. Assim, os arts. 170 caput e 17415 reportam-se nitidamente,
nessas condições, à atividade econômica em sentido amplo.
Cabe mencionar que a intervenção é atuação na área da atividade econômica
em sentido estrito; exploração de atividade econômica em sentido estrito e prestação
de serviço público estão sujeitas a diferentes regimes jurídicos (arts. 173 e 175 da
Constituição Federal de 1988)16.
Destarte, o critério acima referido há de ajudar o intérprete no exercício de
visualização desta ou daquela parcela da atividade econômica (em sentido amplo)
como modalidade de serviço público ou de atividade econômica em sentido estrito.
Ademais, conforme enfatiza Grau (2001, p. 147),
[...] cumpre distinguir, desde logo, os serviços públicos privativos dos serviços
públicos não privativos. Entre os primeiros, aqueles cuja prestação é privativa do
Estado (União, Estado-membro ou Município), ainda que admitida a possibilidade de
entidades do setor privado desenvolvê-los, apenas e tão-somente, contudo, em
regime de concessão ou permissão (art. 175 da CF/88). Entre os restantes –
serviços públicos não privativos – aqueles que têm por substrato atividade
econômica que tanto pode ser desenvolvida pelo Estado, enquanto serviço público,
quanto pelo setor privado, caracterizando-se tal desenvolvimento, então, como
modalidade de atividade econômica em sentido estrito. Exemplos típicos de serviços
públicos não privativos temos nas hipóteses de prestação dos serviços de educação
e saúde. Quando sejam eles prestados pelo setor privado – arts. 209 e 199 da
Constituição de 1988 – atuará este exercendo atividade econômica em sentido
estrito. De outra parte, tanto a União quanto os Estados-membros e os Municípios
poderão (deverão) prestá-los, exercendo, então, atividade de serviço público.
15 Arts. 170 caput e 174 – Ver notas de rodapé das págs. 34 e 37, respectivamente.. 16 Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.
43
Desse modo, acrescenta Celso Antonio Bandeira de Mello (1973, p.21-22):
[...] as atividades econômicas em sentido estrito, embora de titularidade do setor privado, podem, não obstante, ser exploradas pelo Estado. Isso poderá ocorrer tanto nas hipóteses enunciadas pelo art. 173 da Constituição – isto é, se a exploração direta, pelo Estado, for necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo – quanto nos casos nos quais tal tenha sido determinado pela própria Constituição. Por isso mesmo é que o aludido art. 173 dispõe: ‘Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta [...].
Ressalta-se que, para diferenciarmos atividade econômica em sentido amplo
e serviço público da atividade econômica em sentido estrito, tem-se que aquele
(serviço público), segundo Grau (2001, p. 152-153), “[...] é atividade indispensável à
consecução da coesão social. Mais: o que determina a caracterização de
determinada parcela da atividade econômica em sentido amplo como serviço público
é a sua vinculação ao interesse social [...]”.
Conforme já frisado, é bom não pairar dúvida que a expressão atuação estatal
conota significado mais amplo que o vocábulo intervenção, que conota atuação
estatal no campo da atividade econômica em sentido estrito, isto é, indica atuação
em área de outrem, na esfera do privado. Já, atuação estatal é a ação do Estado no
campo da atividade econômica em sentido amplo.
Dessa forma, demonstradas as diferenças dos termos e analisados os modos
de atuação do Estado no processo econômico, vai-se ao cerne de nosso tópico: as
formas de atuação do Estado em relação ao processo econômico desenrolado na
esfera do privado, ou seja, no campo da atividade econômica em sentido estrito e,
principalmente, a intervenção por indução, a que mais nos interessa.
Segundo a classificação adotada por Grau (2001, p. 168-169), “[...] o Estado
intervém no domínio econômico, no campo da atividade econômica em sentido
estrito. Desenvolve ação como agente econômico [...]”.
44
Ou seja, prossegue Grau (2001, p. 168-169):
Intervirá, então, por absorção ou participação. Quando o faz por absorção, o Estado assume integralmente o controle dos meios de produção e/ou troca em determinado setor da atividade econômica em sentido estrito; atua em regime de monopólio. Quando o faz por participação, o Estado assume o controle de parcela dos meios de produção e/ou troca em determinado setor da atividade econômica em sentido estrito; atua em regime de competição com empresas privadas que permanecem a exercitar suas atividades nesse mesmo setor. No segundo e no terceiro casos, o Estado intervirá sobre o domínio econômico, isto é, sobre o campo da atividade econômica em sentido estrito. Desenvolve ação, então, como regulador dessa atividade. Intervirá por direção ou por indução. Quando o faz por direção, o Estado exerce pressão sobre a economia, estabelecendo mecanismos e normas de comportamento compulsório para os sujeitos da atividade econômica em sentido estrito. Quando o faz por indução, o Estado manipula os instrumentos de intervenção em consonância e na conformidade das leis que regem o funcionamento dos mercados.
Ainda, segundo Grau (2001, p. 169-170),
[...] no caso das normas de intervenção por direção estamos diante de comandos imperativos, dotados de cogência, impositivos de certos comportamentos a serem necessariamente cumpridos pelos agentes que atuam no campo da atividade econômica em sentido estrito – inclusive pelas próprias empresas estatais que a exploram. Norma típica de intervenção por direção é a que instrumenta controle de preços, para tabelá-los ou congelá-los.No caso das normas de intervenção por indução defrontamo-nos com preceitos que, embora prescritivos, não são dotados da mesma carga de cogência que afeta as normas de intervenção por direção. Trata-se de normas dispositivas.
Para Rubens Gomes de Souza (1980) as normas de intervenção por indução
são incitações dos estímulos, dos incentivos de toda ordem oferecidos pela lei a
quem participe de determinada atividade de interesse geral e patrocinada, ou não,
pelo Estado. Desta forma, Bobbio (1977 coloca que, ao destinatário da norma resta
aberta a alternativa de não se deixar por ela seduzir, deixando de aderir à prescrição
nela veiculada. Se adesão a ela manifestar, no entanto, resultará juridicamente
vinculado por prescrições que correspondem aos benefícios usufruídos em
decorrência dessa adesão. Adentra-se, aí, no universo do direito premial.
Na opinião de Modesto Carvalhosa (1971) a sedução à adesão ao
comportamento sugerido é, todavia, extremamente vigorosa, dado que os agentes
45
econômicos por ela não tangidos passam a ocupar posição desprivilegiada nos
mercados. Seus concorrentes gozam, porque aderiram a esse comportamento, de
uma situação de donatário de determinado bem (redução ou isenção de tributo,
preferência à obtenção de crédito, subsídio), o que lhes confere melhores condições
de participação naqueles mesmos mercados.
Pode-se dizer que a indução nem sempre se manifesta de modo positivo,
porquanto pode aparecer em caráter negativo, por exemplo, quando vem a onerar
por imposto majorado o exercício de determinado comportamento, tal como
importação de determinados bens.
Como se verifica através da extrafiscalidade tributária, pode-se induzir
determinados comportamentos de determinados setores com o intento de levar os
agentes econômicos a condutas que visam atender à proteção ao meio ambiente
sem perder sua importância econômica, o que se considera uma intervenção
econômica em sentido estrito por indução.
Agora, ver-se-á como planejar e estabelecer políticas tributárias com o
objetivo de alavancar a implementação de políticas públicas que visem a proteção
do meio ambiente sem perder de vista o desenvolvimento econômico.
2.2 Políticas tributárias e meio ambiente
É muito recente e embrionário o emprego de políticas tributárias que venham
a induzir comportamentos tanto das pessoas jurídicas como das pessoas físicas, de
maneira a proteger o meio ambiente que, como preceitua o art. 225 da Constituição
da República Federativa do Brasil,17 é direito e dever de todos.
O entrelaçamento desses dois termos, direito tributário e meio ambiente,
denomina-se “tributação ambiental” que, se diga aqui, é recente no Brasil. Esse
17 Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do
povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
46
termo, explica Regina Helena Costa (2005, p. 312), “[...] está a demonstrar a
importância que vem ganhando a identificação da relação existente entre a
tributação e a preservação do meio ambiente, de modo a direcionar aquela atividade
estatal para o implemento deste objetivo [...]”.
Cabe referir que esse tema é objeto de pouquíssimos estudos no Brasil, muito
provável em virtude de o direito ambiental ter demorado a se constituir em disciplina
autônoma, didaticamente, cujo desenvolvimento aos poucos está adquirindo
contornos mais compreensivos no Brasil. Esse tema vem adquirindo destaque, ao
fundamento de que os instrumentos tributários podem revelar-se poderosas
ferramentas para o desejo de se alcançar a tão preconizada proteção ambiental.
Importante salientar, de acordo com Antônio López Dias (1997), que a
evolução do papel do Estado, inicialmente revestido de uma postura liberal, para a
assunção de uma atuação intervencionista voltada à consecução de múltiplos
objetivos estatuídos no ordenamento jurídico, em especial na Constituição, fez
manifestar a dupla faceta dos tributos, em princípio considerados apenas meios de
geração de receita, para revelarem-se, também, instrumentos eficientes para a
persecução dessas mesmas finalidades.
Assim, inúmeros são os expedientes passíveis de serem aplicados para o
alcance desse objetivo. Dar-se-á destaque aos impostos indiretos, Imposto sobre
Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de
Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) e Imposto sobre
Produtos Industrializados (IPI), respectivamente, aplicando aos mesmos o
mecanismo da extrafiscalidade, cujas técnicas utilizadas podem ser a concessão de
incentivos fiscais, como, por exemplo, as deduções, os créditos presumidos, etc.
Em países mais desenvolvidos, tais como França, Alemanha e Estados
Unidos da América, a experiência tem demonstrado que a introdução de um eficiente
sistema de tributos ambientais é duplamente vantajosa: de um lado, estimula o
comportamento individual que, espontaneamente, se orienta de modo “ecológico”,
para evitar tributação mais gravosa, e, de outro lado, não é custoso nem pouco
47
eficaz, como a fiscalização inerente ao exercício do poder de polícia. (INTERNA-
TIONAL FISCAL ASSOCIATION, 1993).
A relevância da implementação de uma política de tributação ambiental no
contexto mundial restou demonstrada na conferência da Organização das Nações
Unidas realizada no Rio de Janeiro (ECO-92) e, ao término dos trabalhos, foi
elaborada uma declaração final, segundo a qual um eficiente tributo ambiental deve
obedecer a quatro critérios, assim apontados por Costa (2005, p.315):
a) Eficiência ambiental: vale dizer que a imposição tributária efetivamente
conduza a resultados positivos do ponto de vista ambiental, mediante a
instituição de tributo assim orientado ou imprimindo-se a tributo já existente
esse caráter;
b) Eficiência econômica, isto é, que ostente baixo custo, que seja um tributo de
baixo impacto econômico, embora conducente àqueles dois objetivos:
geração de recursos ambientais e/ou orientação do comportamento do
contribuinte a adotar uma conduta ecologicamente correta;
c) Administração barata e simples, significando que a sua exigência não deva
onerar a máquina administrativa, porque senão ter-se-á o mesmo problema
existente com o exercício do poder de polícia;
d) Ausência de efeitos nocivos ao comércio e à competitividade internacionais,
ou seja, que o tributo ambiental não venha a provocar efeitos danosos no
ciclo de consumo, não acarretando repercussão negativa do ponto de vista
econômico. (INTERNATIONAL FISCAL ASSOCIATION, 1993).
Dessa forma, Luiz Eduardo Schoeuri (2005) preconiza a utilização de uma
política tributária aliada e visando à proteção do meio ambiente, que é dever de
todos,18 utilizando como ferramenta a extrafiscalidade tributária através do emprego
das normas tributárias indutoras (crédito presumido, subsídios, entre outros) pode
18 Art. 225. – Ver nota de rodapé da pág. 45.
48
ser um instrumento eficaz para se alcançar objetivos propostos pela Ordem
Econômica. O §1° do artigo 225 do texto constitucio nal arrola uma série de missões
conferidas ao Poder Público para assegurar a efetividade do direito de todos ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado, como a preservação e restauração de
processos ecológicos essenciais, o provimento do manejo ecológico das espécies e
dos ecossistemas, a preservação da diversidade e integridade do patrimônio
genético do País.
Desse modo, abordar-se-á no presente trabalho uma política tributária
ambiental, denominada de tributação ambiental, tendo como ferramenta a utilização
de instrumentos tributários com efeitos indutores, de modo que o contribuinte não
seja visto como alguém que “paga para poluir”, como no caso da monetarização do
direito ambiental, que se utiliza de instrumentos tributários de cunho negativo, ou
seja, elevação de alíquotas, imposição de multas, o que faz com que o contribuinte
venha a “comprar cotas de poluição”. Procura-se demonstrar que é mais efetiva a
utilização de normas tributárias indutoras que objetivem a não-geração de dano pelo
contribuinte, utilizando-se dos princípios da prevenção do direito ambiental, aliados
aos incentivos fiscais, os quais, em conjunto, poderão alavancar uma política
tributária que venha a prevenir os danos ambientais, alcançando assim, o tão
desejado desenvolvimento sustentável.
Portanto, no próximo ponto discorrer-se-á sobre os instrumentos utilizados
para a implementação de uma Tributação Ambiental.
2.3 Instrumentos para a tributação ambiental
A redação enfatizada pelo artigo 170 caput19 da Constituição Federal de 1988
evidencia uma preeminência do legislador constituinte por ordem econômica
fundada na “valorização do trabalho humano e na livre iniciativa”, tendo por fim
“assegurar a todos a existência digna, conforme os ditames da justiça social”.
Inserida nesse objetivo se encontra a defesa do meio ambiente20.
19 Art. 170. Ver nota de rodapé da pág. 34. 20 Art. 170. [...] VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação. [...].
49
Discute-se o emprego de instrumentos tributários diretamente vinculados a
atuações prejudiciais ao meio ambiente, como, por exemplo, colocar os custos
ecológicos no mecanismo de preços do mercado. Baseando-se nessa premissa,
adotar-se-á a monetarização do direito ambiental, aplicando-se sanções de caráter
negativo, o que pode levar o contribuinte a não ser mais visto como alguém que gera
danos, mas como alguém que paga a conta e por isso está legitimado a usar ou
consumir bens de natureza ambiental. A conseqüência é, a médio prazo, redução de
sua propensão a evitar a prática danosa ao meio ambiente, além da própria perda
de consciência ambiental.
Conforme Alonso Gonzales (1995), quando o Estado legitimamente exerce
seu poder de tributar, de acordo com uma determinada carga média aplicada
indistintamente a toda a coletividade, atua, “fiscalmente”. Por outro lado, quando
essa atividade é reduzida setorialmente, visando-se estimular especificamente
determinada atividade, grupo ou valor juridicamente protegido, como a cultura ou o
meio-ambiente, convencionou-se denominar de função “extrafiscal” ou
“extrafiscalidade”.
É nessa seara, segundo Marcos André Vinhas Catão (2004), que se constrói
a teoria dos incentivos fiscais. Para tanto, desde já assentamos que os incentivos
fiscais, não obstante a necessidade de atendimento aos requisitos formais e
principiológicos para a sua concessão, se estruturam a partir de norma expedida
pelo próprio ente político competente à instituição do tributo que lhe foi outorgado na
atribuição de competências.
Os incentivos fiscais seriam, assim, as denominadas “sanções premiais” ou
“sanções positivas”, normas que têm como base o princípio da prevenção e,
subsidiariamente, o princípio do poluidor-pagador no tocante ao direito ambiental.
Bobbio (1999) enfrentou esse tema a partir do seu Teoria do Ordenamento
Jurídico, abandonando senão a absoluta relevância da sanção, mas uma diferente
configuração desta, a partir do que se convencionou chamar de “sanções positivas”.
E o fez para identificá-la dentro do que denomina de normas de “promoção”, nas
50
quais a sanção não mais será apenas “ameaça”, mas também “promessa”. Para
Catão (2004) inicia-se, assim, uma fase prospectiva distinta para uma teoria do
Direito, mesmo sob uma análise positivista, em que a existência absoluta do controle
coativo através da norma passa a dar lugar ao estímulo a uma conduta desejada
pelo Estado, mas não obrigatória.
Desse modo, os benefícios fiscais e incentivos fiscais seriam instrumentos a
serem usados de maneira a contemplar a tributação ambiental que possibilita o
incentivo a determinados setores da atividade econômica, preconizados pela
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Os benefícios fiscais
aplicados como instrumento de uma política extrafiscal podem direcionar os setores
produtivos, principalmente primário e secundário, a desenvolverem atividades que
consigam um nível de competitividade elevado, com alicerce na política de defesa do
Meio Ambiente, ou seja, sem esquecer que a natureza deve ser explorada de forma
equilibrada, preservando a mesma para as futuras gerações.
Ademais, o emprego das normas tributárias indutoras (incentivos fiscais) pode
ser um instrumento para alcançar objetivos propostos pela Ordem Econômica21. O
§1° do artigo 225 22 do texto constitucional arrola uma série de missões conferidas ao
Poder Público para assegurar a efetividade do direito de todos ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, como a preservação e restauração de processos
ecológicos essenciais, etc.
21 CF/88 - Art. 170. – Ver nota de rodapé da pág. 34. 22 Art. 225. § 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
51
As expressões ”benefícios fiscais” e “incentivos fiscais”, segundo alguns
doutrinadores, possuem diferença de significado. Para Pedro Herrera Molina (1990),
todavia, incentivos e benefícios configuram situações distintas criadas pelo
legislador:
O benefício fiscal é aquela isenção fundada em princípios alheios a capacidade contributiva: com ele se busca outorgar uma vantagem econômica [...] Incentivos Tributários, são aquelas isenções configuradas de tal modo que estimulam a realização de determinada conduta.
Adotar-se-á o conceito estipulado por José Casalta Nabais (1998) como
medida de caráter excepcional instituída para tutela de interesses públicos
extrafiscais relevantes e que seja superior aos da própria tributação que impedem.
Por essa forma, de acordo com Fichera, apud Nabais (1998), os benefícios fiscais se
constituem em ferramentas para a implantação de uma tributação ambiental,
caracterizando-se pela conjugação de três hipóteses: a) integram uma disciplina
derrogatória da disciplina ordinária do imposto; b) mais favorável para o contribuinte
do que a consubstanciada no seu tratamento ordinário; e c) com uma função
promocional.
Como se verifica, os benefícios fiscais que estão inseridos na extrafiscalidade
tributária visam, principalmente, incentivar determinados setores da atividade
econômica com a finalidade de alcançar objetivos estipulados de ordem econômica
e/ou social, que sejam de relevância superior à arrecadação fiscal que se deixará de
obter. Esses benefícios premiam aqueles que se utilizam dos mesmos com a
finalidade de alcançar os fins buscados pela lei que os instituíram.
Nabais (1998, p. 648-649) diferencia os benefícios fiscais stricto sensu, ditos
benefícios fiscais estáticos, dos incentivos ou estímulos fiscais, ditos benefícios
fiscais dinâmicos. Segundo o autor:
[...] os primeiros dirigem-se, em termos estáticos, a situações que, ou porque já se verificaram (já estão consumadas), ou porque ainda que se não tenham verificado ou na parte em que se não tenham verificado, não visam, ao menos diretamente, fomentar ou incentivar, mas tão-só beneficiar por superiores razões de política geral de defesa externa, econômica, social, cultural, religiosa, etc. Por seu turno, os segundos (benefícios fiscais dinâmicos) visam estimular ou incentivar determinadas atividades estabelecendo, para efeito uma relação entre as vantagens atribuídas e as atividades estimuladas em termos de causa e efeito. Enquanto naqueles a
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causa do benefício é a situação ou atividade em si mesma, nestes a causa é a adoção (futura) do comportamento beneficiado ou o exercício (futuro) da atividade fomentada.
Desse modo, o entrelaçamento já referido está perfectibilizado, pois através
de uma intervenção econômica sobre o domínio econômico, isto é, sobre o campo
da atividade econômica em sentido estrito por indução23 (Constituição Econômica)
na ordem econômica aliada ao princípio da prevenção (Direito Ambiental), princípio
este que é basilar do direito ambiental24, juntamente com uma política tributária
extrafiscal (Direito Tributário) baseada em incentivos fiscais, ditos benefícios fiscais
dinâmicos, pode-se adotar uma tributação ambiental que esteja voltada para o
desenvolvimento sustentável.
Conforme Schoueri (2005), as normas indutoras, referidas aqui, como os
incentivos fiscais ou benefícios fiscais dinâmicos, submetem-se tanto aos princípios
próprios da Ordem Econômica (enquanto instrumento de intervenção do Estado
sobre o Domínio Econômico por Indução) como àqueles da esfera tributária. Ao
mesmo tempo, deve-se reconhecer que os princípios tributários sofrem influência
daqueles próprios da Ordem Econômica. É assim que se constata que uns e outros
princípios influem na norma tributária, qual vetores em direções diversas, de cuja
somatória (ponderação) se extrai o direcionamento exigido pelo ordenamento
constitucional para a definição do regime jurídico dos benefícios fiscais dinâmicos.
Os benefícios fiscais dinâmicos servem de ferramenta para o Poder Público
fomentar setores produtivos de maneira a estimular o emprego de tecnologias, as
quais, ao mesmo tempo em que impulsionam a produção, ajudam a melhorar a
qualidade de vida da população. Cada vez mais se fala em desenvolvimento
sustentável; os países estão procurando estimular o desenvolvimento econômico,
aliando-o à defesa do meio ambiente, pois são pólos que podem e devem caminhar
23 Dá-se a intervenção por indução quando o estado manipula os instrumentos de intervenção em consonância e na conformidade das leis que regem o funcionamento dos mercados. (GRAU, 1997, p. 362). 24 Princípio da Precaução: é aquele que determina que não se produzam intervenções no meio ambiente antes de ter a certeza de que estas não serão adversas pra o meio ambiente. (ANTUNES, 2002, p.35).
53
juntos para se alcançar o desejável “desenvolvimento sustentável”. A Lei n° 6.938,
de 31.08.198125, já havia enfrentado o tema, pondo corretamente como principal
objetivo a ser conseguido pela Política Nacional do Meio Ambiente a
compatibilização do desenvolvimento econômico-social, com a preservação da
qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico.
Dessa maneira, o Poder Público usa de uma Política de Intervenção por
Indução sobre o domínio no qual o Estado age como agente normativo e regulador,
sendo este determinante para o setor público26, aliado a uma extrafiscalidade
tributária, que elege como protagonista os benefícios fiscais dinâmicos, ditos
incentivos fiscais, sem desbordar dos parâmetros constitucionais, isto é, observando
os princípios tributários da legalidade, tipicidade tributária, igualdade, capacidade
contributiva e não-confisco, aplicáveis à espécie, e também os princípios vetores
expressamente consagrados na constituição econômica, art. 170 (já citado
anteriormente), que são tão importantes quanto os princípios do direito tributário. E
para fechar esse trinômio, a aplicação dos princípios da prevenção, verdadeiro
princípio vetor do direito ambiental, tem como aliado subsidiariamente o princípio do
poluidor-pagador, que aqui, conjuntamente com os anteriores induzirão os agentes
econômicos a trilharem o caminho do desenvolvimento econômico com preservação
Princípio da Prevenção: O princípio da prevenção aplica-se a impactos ambientais já conhecidos e que tenham uma história de informações sobre eles. É o princípio da prevenção que informa tanto o licenciamento ambiental como os próprios estudos de impacto ambiental. (ANTUNES, 2002, p. 36). 25 Art 1º - Esta Lei, com fundamento no art. 8º, item XVII, alíneas c, h e i , da Constituição Federal, estabelece a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, constitui o Sistema Nacional do Meio Ambiente, cria o Conselho Nacional do Meio Ambiente e institui o Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumentos de Defesa Ambiental. Art 4º - A Política Nacional do Meio Ambiente visará: I - à compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico; II - à definição de áreas prioritárias de ação governamental relativa à qualidade e ao equilíbrio ecológico, atendendo aos interesses da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios; III - ao estabelecimento de critérios e padrões de qualidade ambiental e de normas relativas ao uso e manejo de recursos ambientais; IV - ao desenvolvimento de pesquisas e de tecnologias nacionais orientadas para o uso racional de recursos ambientais; V - à difusão de tecnologias de manejo do meio ambiente, à divulgação de dados e informações ambientais e à formação de uma consciência pública sobre a necessidade de preservação da qualidade ambiental e do equilíbrio ecológico; VI - à preservação e restauração dos recursos ambientais com vistas à sua utilização racional e disponibilidade permanente, concorrendo para a manutenção do equilíbrio ecológico propício à vida; VII - à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos. 26 CF/1988 - Art. 174.- Ver nota de rodapé da pág. 37.
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ao meio ambiente, ou seja, de maneira a alcançar o ambicionado “desenvolvimento
sustentável”.
Frisa-se que a Constituição Federal de 1988 estabeleceu no art. 170, incisos III
e IV, combinado com o art. 174 e o art. 22527, a busca pelo já referido
“desenvolvimento sustentável”. Assim, como instrumento indeclinável de atuação
estatal, “o direito tributário aliado ao direito econômico e ambiental devem, através dos
incentivos fiscais (benefícios fiscais dinâmicos), influir no comportamento dos entes
econômicos, de sorte a incentivar iniciativas positivas e a desestimular as nocivas ao
Bem Comum.
Para César Luiz Pasold (2003, p. 153-154)
[...] entende não ser simplesmente a soma dos bens individuais ou dos desejos isolados, mas aceitando a idéia de que seja o resultado dos elementos de que se vale o Estado com o objetivo de realizar o bem-estar de toda a coletividade, consolidando o patrimônio social e se mostrando como o objetivo maior desse [...].
Com relação a estrutura e conteúdo, conforme Mello (1997, p.87) frisa-se que
“[...] é imprescindível perceber que a noção de Bem Comum implica um
ordenamento de crenças, valores e informações[...]”, sendo que a forma como esses
se integram em uma sociedade é o que o autor em questão denomina de estrutura
do Bem Comum, “[...] e o significado dinâmico desses componentes é o que confere
o conteúdo à noção do Bem Comum em certo momento histórico de determinada
sociedade [...] ”.
Nessa esteira, José Marcos Domingues de Oliveira (2003, p.40) enfatiza que
[...] no caso dos incentivos fiscais empregados como instrumentos econômicos de promoção da defesa do meio ambiente, entende-se que a rejeição por uns do estímulo fiscal (escolha de continuar poluindo) implica em pagar mais imposto, em cotejo com a opção de outros de evoluir
27 Art. 170. III - função social da propriedade; IV - livre concorrência. Art. 174. – Ver nota de rodapé da pág. 37. Art. 225. – Ver nota de rodapé da pág. 50.
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tecnologicamente e, não poluindo, pagar menos imposto ou não pagar imposto.
Para Alejandro Altamirano (1994, p.118)
[...] é melhor incentivar que penalizar o investimento no controle da contaminação do que sancionar com penalidades cuja exigência tem por efeito asfixiar a atividade industrial, quando não criam elas um clima de incerteza sobre as conseqüências da sua execução.
Desse modo, elege como principais ferramentas os benefícios fiscais
dinâmicos, ditos incentivos fiscais, os quais nada mais são do que “Prêmios Fiscais”
concedidos pelo Poder Público, como por exemplo redução de alíquotas de
impostos, de modo a incentivar que os setores favorecidos desenvolvam projetos,
tecnologias, atividades que venham a contribuir para o desenvolvimento econômico
e ao mesmo tempo venham a ajudar na defesa do meio ambiente para as presentes
e futuras gerações. Vê-se, assim, que a tributação serve de instrumento para se
alcançar um objetivo de cunho econômico-social relevante, que pode gerar frutos
não somente agora, mas principalmente para o futuro.
2.3.1 Tributos ambientais
O início do século XXI acena para a relevância das questões ambientais
voltadas para a conservação da natureza. Impõe-se uma mudança das políticas
governamentais que doravante devem assumir o compromisso com a
sustentabilidade do desenvolvimento a partir de critérios outros que o
exclusivamente econômico-financeiro.
A tributação ambiental, valendo-se da aplicação da técnica da extrafiscalidade
tributária, possibilita a utilização do tributo como instrumento de proteção ambiental,
uma vez que, conforme José Reinaldo de Lima (2000, p. 245)
[...] o sistema tributário contemporâneo tem funções próprias, fundamentadas na concepção do Estado dentro de uma sociedade capitalista e de mercado. Geralmente fala-se nas funções fiscais, que significam a arrecadação para a manutenção de serviços públicos universais e gerais. Fala-se também nas funções extrafiscais, de orientação econômica geral (função promocional): de estímulo e desestímulo ao mercado.
56
Denota-se a importância do caráter extrafiscal do tributo, em que o
intervencionismo fiscal serve de instrumento eficaz para a reforma ou a educação
socioambiental, pois, de acordo com Alfredo Augusto Becker (1998, p.529-534).
A Constituição brasileira por sua vez, atuando de forma a regular o exercício da atividade econômica, consoante previsto no seu artigo 170, assegura que ao lado da livre-iniciativa e da valorização do trabalho humano, a defesa do meio ambiente seja um dos pressupostos a serem perseguidos no desenvolvimento das atividades produtivas.
Dessa forma, o emprego dos tributos com fins extrafiscais ou regulatórios
constitui uma relevante ferramenta para a proteção e preservação do meio ambiente.
Importante frisar que a tributação ambiental não visa a criar um adicional à carga
tributária já existente. Ela deve orientar-se pela diminuição e/ou substituição dos
impostos vigentes. Para Túlio Rosemburj (1995), a internalização do custo social,
seja para o produtor, para o comerciante ou para o consumidor, deve significar a
diminuição ou supressão de outros impostos, procurando uma aplicação finalística
da tributação.
Assim, ao se referir à tributação ambiental, podem-se destacar dois aspectos:
um de natureza arrecadatória ou fiscal e outro de caráter extrafiscal ou regulatório,
que tem como objetivo conduzir o comportamento dos contribuintes, incentivando-os
a adotar condutas que estejam em sintonia com a idéia de preservação ambiental. A
Constituição Federal é minuciosa ao estabelecer sobre o Sistema Tributário
Nacional. Referido Sistema demonstra os artigos pertinentes que limitam as ações
de ordem econômica. Isso porque, entre os tributos previstos no sistema, nenhum
prevê qualquer forma de tributação mais expressiva sobre atividades destruidoras do
meio ambiente ou agressivas aos recursos naturais não-renováveis.
Nesse ponto, repara-se que alguns tributos têm incidência aleatória sobre
situações que podem ensejar o desenvolvimento de atividades econômicas com
conseqüências ambientais. Desse modo, a seletividade de alíquota nos tributos
sobre circulação, produção e consumo deveria ser não somente em função de sua
57
essencialidade, mas, também, conforme os artigos ambientalistas28, em razão da
degradação do meio ambiente, da retirada de recursos não-renováveis ou mesmo do
tempo de duração do produto.
Para Fernando Magalhães Modé (2003, p.123),
[...] a tributação ambiental diferencia-se do caráter sancionatório por não se aplicar às atividades ilícitas. A tributação ambiental aplica-se tão-somente a atividades lícitas, assim consideradas pelo legislador porque necessárias, em que pese o impacto causado no meio ambiente. A tributação ambiental diferencia-se ainda do caráter sancionatório por aplicar-se antes da ocorrência do fato danoso ao meio ambiente, ou de modo que o potencial danoso tenha sido reduzido [...].
Nessa ótica, a tributação ambiental que será demonstrada no presente
trabalho é de cunho positivo, através da introdução de incentivos fiscais (prêmio
Fiscais) que têm como objeto alguns dos impostos indiretos existentes no sistema
tributário brasileiro (ICMS e IPI). As normas que regem a tributação ambiental terão
como cenário o entrelaçamento entre direito econômico, ambiental, tributário e
constitucional, através da aplicação da intervenção sobre o domínio econômico por
indução que tem como fundamento o princípio da propriedade privada, função social
da propriedade, defesa do meio ambiente e livre iniciativa econômica, preconizados
pela ordem constitucional econômica, arts. 170, incisos II, III e VI e parágrafo único,
respectivamente.
Esses princípios devem estar aliados aos princípios do direito ambiental, isto
é, da prevenção e do poluidor-pagador, podendo este último atuar subsidiariamente,
estando ambos unidos aos princípios tributários, tais como: da legalidade, tipicidade
tributária, igualdade e do não-confisco e capacidade contributiva do direito tributário,
28 CF/1988 - Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar. Art. 170. [...] VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação. [...] Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.
58
de maneira a construir uma política pública de tributação ambiental que venha
alcançar o desenvolvimento sustentável enfatizado no art. 225 “caput” da
Constituição Federal de 1988.
Ademais, conforme Modé (2003), a implementação de uma política de
tributação ambiental não deve prescindir da análise de alguns aspectos importantes.
A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) tem
publicado estudos nos quais vem analisando essas questões, seja do ponto de vista
jurídico, seja em relação às implicações econômicas e das relações internacionais29.
Entre os aspectos importantes, pelos estudos da OCDE, encontram-se a
neutralidade, a afetação das receitas e a eqüidade, em um primeiro momento, e,
agregando-se a esses, o modo de intervenção na economia, a competitividade
internacional, os subsídios e a mensuração das externalidades.
Segundo Modé (2003), a intervenção por via tributária deve ainda ser clara o
suficiente para que provoque nos agentes econômicos o efeito esperado. Eventual
falha na conexão do objetivo almejado e do instrumento utilizado podem suscitar
junto aos agentes econômicos o acirramento da rejeição quanto ao tributo
implementado e/ou a não-compreensão das correlações ambientais propostas. A
rejeição à imposição tributária é natural, qualquer que seja a imposição tributária;
entretanto, no caso da tributação ambiental, o ideal de proteção ao meio ambiente
poderá resultar prejudicado, caso não se tenha clareza de propósitos e
transparência.
Em matéria de tributos ambientais, o Brasil é um País onde se possui uma
enorme gama de possibilidades de se introduzir uma política de tributação
ambiental. Desse modo, discorrer-se-á sobre algumas possibilidades de introdução
de uma política tributária ambiental através da utilização de diferentes tipos de
tributos.
29 Dentre eles; OECD: Environmental Taxes and Green Tax Reofrm, 1997; OECD: Getting the Signals Right: Tax Reform to Protect the Environment and the Economy, 1997; OECD Implementation Strategies for Environmental Taxes, 1996.
59
Os impostos oferecem o mais fértil campo de eleição extrafiscal,
principalmente os indiretos, incidentes sobre a produção e o consumo. Podem ser
vastamente utilizados como instrumentos de tributação no campo ambiental, por
meio de mecanismos de graduações de alíquotas, reduções de base de cálculo e
seletividade, isenções e restituições, dependendo da natureza dos produtos, visando
a incrementar ou desestimular a produção dos que sejam poluidores ou cujo
processo produtivo afete negativamente o ambiente.
Para Lídia Maria Lopes Rodrigues Ribas (2005), a Conferência da
Organização das Nações Unidas realizada no Rio de Janeiro - ECO 92 - tratou o
problema da tributação ambiental e em declaração final dispôs sobre o tributo
ambiental – ecotax – como devendo sua criação observar:
a) eficiência ambiental;
b) baixo custo;
c) administrativamente barato e simples;
d) não provocar o mínimo de efeitos no comércio internacional.
Como visto, se trata de um imposto ecológico, cuja finalidade diz respeito ao
objetivo de realização de receitas para financiar a ação de organismos estatais em
favor do ambiente e a internalização dos custos ambientais. Como efeito negativo
existe a necessidade da criação desse imposto, pois será mais um no rol dos já
inúmeros tributos existentes no sistema tributário brasileiro.
Já as taxas, segundo Ribas (2005, p 699-700), podem revestir-se de outras
características:
[...] - taxas sobre a poluição: incidentes sobre a emissão de poluentes no meio ambiente; passíveis de utilização contra a poluição da água, na diminuição dos ruídos, na gestão dos resíduos sólidos: como contraprestação pelo serviço de limpeza ou recuperação ambiental; - taxas de utilização: direcionadas para os custos da construção de centrais de tratamento de resíduos; - taxas administrativas: ligadas às atividades de autorização e controle da produção e comercialização dos produtos autorizados, como novos compostos químicos, inspeção de veículos.
60
Para a taxa é considerada um idôneo instrumento de extrafiscalidade pela extraordinária lassidão de seu regime e notável amplitude de seu campo de aplicação [...].
Salienta-se que as taxas são tributos vinculados à atuação estatal específica
relativa ao contribuinte, consistente no exercício do poder de polícia ou na prestação
de serviço compulsoriamente realizado pelo Estado30. Os limites das taxas são
constitucionalmente estabelecidos, como a cobrança limitada aos montantes
correspondentes ao custo da atividade estatal de fiscalização ou de prestação de
serviços.
Já a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico - CIDE é um
instrumento de atuação no campo econômico, não havendo indicação expressa pelo
Constituinte quanto ao fato social que o legislador escolha como aspecto material da
regra-matriz de incidência tributária; mas a competência para instituir esse tipo de
contribuição foi atribuída à União Federal31 e está vinculada a uma finalidade, qual
seja, a regulação da economia.
Conforme Ribas (2005, p.701),
[...] tratando-se de tributo de utilização exclusivamente extrafiscal, de atuação na atividade econômica, logo se destaca sua importância na implementação de políticas ligadas ao ambiente. Assim, a instituição e exigência da CIDE busca alcançar valores prestigiados pelo ordenamento constitucional, entre os quais está a preservação do ambiente, e para tanto deverá ser graduada de maneira a incidir de forma mais gravosa para contribuintes que estiverem mais distantes desse objetivo (empresas poluidoras), e menos gravosa sobre os contribuintes cuja atividade esteja de acordo com esse objetivo.
30 CF/1988 - Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: [...] II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição. [...] 31 CF/1988 - Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo.
61
Assim, conforme disposto nos artigos 149, 170, VI e 225, V da Constituição
Federal de 1988,32 pode ensejar a criação de um tributo (CIDE) para financiar
despesas referentes à consecução de uma política de conservação ambiental, que
tenham como objeto, por exemplo, empresas do setor madeireiro de maneira a
financiar programas específicos de reflorestamento ambiental.
Com efeito, a necessidade de criar mais um tributo dentre vários já existentes
provocaria uma rejeição pela sociedade na sua criação, enfraquecendo sua
aceitação e utilização para preservação do meio ambiente. Seria mais eficaz e de
maior valia a utilização de instrumentos tributários de caráter extrafiscal tendo objeto
impostos indiretos já existentes, tais como; IPI e ICMS, o que será melhor analisado
e comentado mais adiante.
2.3.2 Subsídios
A doutrina e jurisprudência interessam-se mais pelos incentivos fiscais, ditos
benefícios fiscais dinâmicos, que atuam na vertente da receita pública (isenção,
anistia) do que por aqueles que atuam no sistema da despesa pública, tais como:
subvenções, subsídios, créditos presumidos, etc. Serão abordados os incentivos
fiscais que atuam na esfera da despesa pública por terem ligação direta com o tema
proposto e, também, por se acreditar que sejam mais úteis e eficazes para a
tributação ambiental do que os que atuam na esfera da receita pública.
Segundo Catão (2004, p.60),
[...] o controle dos incentivos fiscais sobre a despesa pública como a subvenção e os subsídios fiscais devem ser tão controlados como os que atuam na órbita da receita, assim como os demais incentivos ainda que denominados ou estruturados como incentivos financeiros ou extratributários, os quais tenham por base subjacente uma relação jurídico-tributária com o beneficiário.
32 Art. 149, conforme nota de rodapé anterior. Art. 170. VI- defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação. Art. 225. V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente.
62
Após situar o cenário em que está inserido o subsídio (benefício fiscal
dinâmico ou incentivo fiscal que atua na órbita da despesa pública), passa-se a
discorrer especificamente a respeito do mesmo.
Para Catão (2004, p.73),
[...] os subsídios podem ser considerados como incentivos fiscais destinados a promover determinada atividade econômica, com o fim de equalizar preços e permitir, durante período transitório, o estímulo ou até mesmo a proteção de um setor produtivo [...].
Conforme Ricardo Lobo Torres (1995, p.296), “os subsídios podem ser
incluídos no conceito mais abrangente de subvenção [...]”. Já para Adilson Adilson
Rodrigues Pires (2001, p.201):
[...] entende-se como subsídio toda ajuda oficial de governo, com o fim de estimular a produtividade de indústrias instaladas no país. O subsídio tem por objetivo promover o desenvolvimento de setores estratégicos sob o ponto de vista econômico, ou de regiões mais atrasadas, além de servir como instrumento de incentivo às exportações, sobretudo em países em desenvolvimento.
Como se percebe, sob o vocábulo “subsídios” encontram-se na doutrina,
genericamente, tanto medidas de cunho fiscal (benefícios fiscais, depreciação
acelerada de bens, etc), como medidas financeiras – empréstimos a juros abaixo
dos patamares de mercado, a prestação de garantias a financiamentos para a
compra e instalação de equipamentos de tratamento de resíduos etc.
Segundo Modé (2003), a Organização para a Cooperação e o
Desenvolvimento Econômico (OCDE) é resistente à aplicação de subsídios, de vez
que contrariam o princípio do poluidor-pagador. Na recomendação de 1974 sobre a
aplicação do princípio do poluidor-pagador (PPP), reconhece a OCDE, como regra
geral, que os Estados-membros não deveriam auxiliar os poluidores a suportarem os
custos do controle da poluição, tanto através de subsídios, como de outras medidas.
A prerrogativa de quaisquer desses auxílios ao controle da poluição deve ser
limitada e se conformar com cada uma das seguintes condições:
63
a) ser seletiva e restritiva àquelas partes da economia, como indústrias, áreas
ou fábricas, onde, de outro modo, ocorreriam dificuldades sérias;
b) com antecedência e adequados aos problemas socioeconômicos
específicos associados à execução do programa ambiental de um país;
c) não criar distorções significativas no comércio e em investimentos inter-
nacionais. Se um Estado-membro, em casos de excepcional dificuldade,
conceder auxílios a novas fábricas, as condições devem ser ainda mais
restritas que as aplicáveis às fábricas existentes, e devem ser
desenvolvidos critérios para essa diferenciação.
Prossegue ainda Modé (2003), ressaltando que a aplicação de subsídios,
qualquer que seja a modalidade, em si, não representa prejuízo ao meio ambiente,
que não deixa de ser tutelado. A relação que se estabelece, a partir da concessão
do subsídio, é a contrariedade ao princípio do poluidor-pagador que carrega em si o
ideal de eqüidade, ou seja, que os maiores poluidores sejam os maiores
contribuintes para despoluição.
Discorda-se em parte com o autor mencionado, pois a aplicação dos
incentivos fiscais pode ter como embasamento o princípio da prevenção do direito
ambiental, atuando quando necessário o princípio do poluidor-pagador de forma
subsidiária, de vez que se busca a alteração do modo de produção e atuação das
indústrias com o escopo de obter a redução da poluição. Pois, caso o cerne seja o
princípio do poluidor-pagador, o mesmo fará com que o setor produtivo venha a
comprar cotas de poluição, de maneira que não reformularão seu modo de produção
e assumirão os riscos desse procedimento e nenhuma redução e modificação na
maneira de produzir irá ser realizada, principalmente, no tocante ao setor
industriário, o qual vem causando malefícios imensuráveis ao meio ambiente.
Ressalta-se que se aplica o princípio da prevenção e não o da precaução,
porquanto, para Paulo de Bessa Antunes (2002, p.35) este “[...] é um princípio muito
próximo do princípio da precaução, embora não se confunda com aquele. O
princípio da prevenção aplica-se a impactos ambientais já conhecidos e que tenham
64
uma história de informações sobre eles [...]”. Para utilizar-se dos incentivos fiscais,
ou ditos benefícios fiscais dinâmicos, tem de se conhecer o ambiente onde serão
aplicados, ou seja, ter conhecimento dos efeitos negativos que serão combatidos
com uma política de incentivos fiscais. Assim, aplica-se no direito ambiental com
prioridade o princípio da prevenção, já que o da precaução para Antunes (2002, p.
36) “[...] é aquele que determina que não se produzam intervenções no meio
ambiente antes de ter a certeza de que estas não serão adversas para o meio
ambiente.[...]”. Não se pode formular uma política de incentivos fiscais sem saber o
que será visado com ela e o que será combatido, e como se está falando de política
de tributação ambiental, é necessário que se conheçam previamente os malefícios
ambientais que serão atacados.
Dessa maneira, os subsídios se tornam instrumentos relevantes no sentido de
incentivarem a adoção e implementação de política de tributação ambiental, tendo
como cenário a despesa pública, de maneira a propiciar uma mudança no modo de
produção e atuação dos setores produtivos em determinadas regiões do Brasil, com
a finalidade de alcançar o tão sonhado desenvolvimento sustentável33.
2.3.3 Créditos presumidos
Não é o melhor caminho tributar os custos das externalidades negativas34 por
meio do total das despesas com a limpeza ou readaptação do meio degradado, ou
seja, dar prevalência ao princípio do poluidor-pagador no combate aos danos
ambientais causados pelo setor produtivo.
Para Clêucio Santos Nunes (2005, p.161-162),
[...] diante da cultura brasileira de alvidez no exercício da atividade tributária, certamente a tributação ativa passará o custo do tributo ao mercado sem muitos critérios, somente em razão do argumento ideológico de que é necessário preservar. Nesse caso, o mercado produtor passará a ser o algoz da degradação e, por isso mesmo, vítima da voracidade fiscal. É impossível lograrem-se resultados profícuos com esse tipo de intervenção e mentalidade política.
33 Desenvolvimento sustentável significa ”qualificar o crescimento e reconciliar o desenvolvimento econômico com a necessidade de se preservar o meio ambiente.” (BINSWANGER, Hans Chrisoph, 1999. p.41). 34 Externalidades negativas são os efeitos sociais danosos decorrentes da produção privada (ARAGÃO, Maria Alexandra de Souza, apud Arthour C. Pigou e Roland H. Coase).
65
No Estado contemporâneo, como assevera Bobbio (1980, p. 367),
[...] é cada vez mais freqüente o uso de técnicas de estímulo de comportamentos, de tal sorte que junto à concepção tradicional do Direito como ordenamento protetivo-repressivo, forma-se uma nova concepção do ordenamento jurídico, como ordenamento com função promocional [...].
Desse modo, esse outro tipo de incentivo fiscal ou benefício fiscal dinâmico
atua também sobre a despesa pública, assim como o subsídio, tratando-se de
créditos presumidos que, segundo Catão (2004, p.71),
[...] antes de se constituírem em figura desonerativa típica, o crédito presumido é em verdade uma técnica legislativa financeira para adequação do montante a ser tributado. Não se cuidou de sua definição o Código Tributário Nacional e tão pouco o legislador constitucional. Nesse contexto o crédito presumido pode assumir natureza jurídica diversa, sendo por vezes um subsídio, uma subvenção(nota de rodapé- significa doação modal, decorrência do étimo subventio que significa auxiliar, ajudar, socorrer.) ou mera redução da base de cálculo.
Os créditos presumidos são na verdade créditos fictícios, criados com o
objetivo de incentivar determinado ramo de atividade especificamente localizado em
determinada região, de maneira a alavancar o desenvolvimento econômico da
região. Dessa forma, pode ser utilizado na tributação ambiental visando implementar
determinado segmento de mercado sem descuidar-se da proteção ao meio
ambiente, ou melhor, utilizando como instrumento de um desenvolvimento
econômico sustentável.
Para Maria Lúcia Américo dos Reis e José Cassiano Borges (1999, p.173),
trata-se de “[...] uma forma indireta de exoneração fiscal, através da qual a legislação
concede ao contribuinte do IPI um crédito fictício (presumido) destinado a ressarcir o
ônus do imposto sobre determinadas operações[...]” .
Salienta-se que os créditos presumidos, por gerarem créditos fictícios, atuam
nos impostos indiretos, tais como IPI e ICMS, onde podem ser apurados
mensalmente de modo a reduzir o quantum do imposto, atuando como verdadeiro
incentivo fiscal.
66
Os incentivos fiscais possuem autorização constitucional para atuarem no
cenário da tributação ambiental, conforme preconiza a Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988 nos arts. 43, caput, §2, inciso III, 146-A, 150, inciso VI,
§6.35 Embasam a adoção de uma política tributária de incentivo fiscal que vá ao
encontro do desenvolvimento econômico, mas sem deixar de lado a proteção ao
meio ambiente. O instrumento do crédito presumido serve como ferramenta a ser
utilizada de maneira a se alcançar o tão sonhado desenvolvimento sustentável.
Os créditos presumidos poderão atuar como alavancadores do
desenvolvimento econômico de determinadas regiões, concomitantemente com
procedimentos adotados, de maneira que objetivem a proteção ao meio ambiente.
Exemplo disso pode ser a introdução de dispositivos como o art. 1° da Lei n° 9.363,
de 13 de dezembro de 199636.
Procedimento similar poderá ser adotado no que concerne às indústrias que
trabalham com produtos oriundos da madeira, nas quais poderia ser adotado o
incentivo fiscal através do crédito presumido, condicionado à plantação de áreas
verdes, estabelecendo o percentual de incentivo de acordo com a extensão da área
que seria plantada, tendo limites de concessão estabelecidos. Também poderá ser
adotado o crédito presumido na implementação do ICMS ecológico, tema a ser
abordado posteriormente.
Como se percebe, há uma gama de opções em que se podem adotar
incentivos fiscais, denominados créditos presumidos que, além de incentivarem o
35 Art.43- Para efeitos administrativos, a União poderá articular sua ação em um mesmo complexo geoeconômico e social, visando a seu desenvolvimento e à redução das desigualdades regionais; §2°- Os incentivos regionais compreenderão, além de outros, na forma da lei: [...] III- isenções, reduções ou diferimento temporário de tributos federais devidos por pessoas físicas ou jurídicas. Art.146 -A - Lei Complementar poderá estabelecer critérios especiais de tributação, com o objetivo de prevenir desequilíbrios da concorrência, sem prejuízo da competência de a União, por lei, estabelecer normas de igual objetivo. Art.150, inciso VI, § 6°- Qualquer subsídio ou isen ção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, §2°, XII, g. 36 Dispõem que as empresas produtoras e exportadoras de mercadorias nacionais farão jus a créditos presumidos como ressarcimento as contribuições que tratam as Leis Complementares n° 07/70, 08/70 e 70/91, incidentes sobre as respectivas aquisições, no mercado interno, de matérias-primas, produtos intermediários e material de embalagem, para utilização no processo produtivo.
67
desenvolvimento de determinado setor ou região, poderão, outrossim, atuar em
conjunto com os objetivos de proteção ao meio ambiente equilibrado e sadio,
conforme proclama o art. 225 da Carta Magna de 1988.
68
3 A EXTRAFISCALIDADE AMBIENTAL
Conforme Nabais (1998), a extrafiscalidade em sentido próprio engloba as
normas jurídico-fiscais de tributação e de não-tributação (benefícios fiscais), cujo
objetivo principal não é a obtenção de receitas, mas a prossecução de objetivos
econômico-sociais.
Nessa seara, para Heron José Santana (2004), a extrafiscalidade ambiental
age com o intuito de premiar através de seletividade de alíquotas, no que concerne
aos impostos, como por exemplo, IPI e ICMS, incidentes sobre bens e serviços,
aqueles que desenvolvem atividades econômicas não degradantes, ou que adotam
medidas efetivas de preservação ambiental, ou que consumam produtos
ecologicamente sustentáveis.
Essa visão também é compartilhada por Nunes (2005),
No caso do meio ambiente, a imposição de tributos com finalidade extrafiscal exerce um papel pedagógico importantíssimo na mudança de comportamento dos indivíduos, efeito que dificilmente a imposição de tipos penais ou a reparação do dano cível são capazes de alcançar sem graves perturbações na ordem social [...].
Nesse desiderato, verifica-se que a extrafiscalidade serve como fio condutor
para a implementação de uma política pública de tributação ambiental.
69
3.1 Extrafiscalidade
Desde a Idade Média, os tributos repercutem na redistribuição do capital e da
renda, bem como na formação das classes sociais, conforme Becker (1998). Isso se
deve ao fato de que o tributo é arrecadado do setor produtivo e encaminhado aos
cofres públicos, devendo o Poder Público dar-lhe destinação que atenda aos fins
primordiais do Estado, os quais, segundo Nunes (2005, p.104), “podem ser
resumidos em: manutenção da estrutura burocrática do Poder, prestação de serviços
públicos, exercício do Poder de Polícia e, mais recentemente, intervenção no
domínio econômico”.
É papel do Estado, pois, conter o avanço do dano social, provocado, na
maioria das vezes, por ações individuais. Nesse sentido, precisa intervir na ordem
social atingindo diretamente determinadas pessoas, com o intuito de alterar seus
comportamentos para a obtenção dos fins sociais colimados.
A extrafiscalidade traduz-se no conjunto de normas que, embora formalmente
integrem o direito tributário, têm por finalidade principal ou dominante a consecução
de determinados resultados econômicos ou sociais, através da utilização do
instrumento tributário, não visando à obtenção de receitas para fazer face às
despesas públicas.
Segundo Nabais (1998, p.629),
[...] trata-se assim de normas (fiscais) que, ao preverem uma tributação, isto é, uma ablação ou amputação pecuniária (impostos), ou uma não tributação ou uma tributação menor à requerida pelo critério da capacidade contributiva, isto é, uma ablação ou amputação (benefícios fiscais), estão dominadas pelo intuito de actuar directamente sobre os comportamentos econômicos e sociais dos seus destinatários, desincentivando-os, neutralizando-os nos seus efeitos econômicos e sociais ou fomentando-os, ou seja, de normas que contêm medidas de política econômica e social. [...].
A extrafiscalidade ou tributação extrafiscal é aquela dirigida para objetivos
outros que não a captação de dinheiro para o Erário, tais como a redistribuição da
renda e da terra, a defesa da indústria nacional, a promoção do desenvolvimento
regional ou setorial. O Direito Tributário pode e deve, através da extrafiscalidade,
70
influenciar o comportamento dos entes econômicos, de maneira a estimular
iniciativas positivas para o interesse público.
Para Nunes (2005, p.105),
A extrafiscalidade é uma forma de revolução social por meio do Direito, porque a intenção é obrigar ao pagamento de tributos para mudar o modo-de-ser da sociedade. Tal revolução social, que começara na segunda metade do século XIX, somente no século XX ganhou o impulso suficiente para figurar nos ordenamentos jurídicos de modo eficiente [...].
Conforme Becker (1998, p.588), partindo dessa visão, a finalidade dos
tributos, a partir desse período:
Não será a de um instrumento de arrecadação de recursos para o custeio das despesas públicas, mas a de um instrumento de intervenção estatal no meio social e na economia privada. Na construção de cada tributo não mais será ignorado o finalismo extrafiscal, nem será esquecido o fiscal. Ambos coexistirão, agora de um modo consciente e desejado; apenas haverá maior ou menor prevalência deste ou daquele finalismo.
Para Raimundo Bezerra Falcão (1981, p.196), “[...] a extrafiscalidade é
atividade financeira que o Estado exercita sem o fim precípuo de obter recursos para
o seu erário, para o fisco, mas sim com vistas a ordenar ou re-ordenar a economia e
as relações sociais. [...]”.
A extrafiscalidade, assim, pode ser implementada mediante a instituição e a
graduação de tributos e a concessão de incentivos fiscais, como a possibilidade de
dedução de despesas efetuadas pelos contribuintes referentes a recursos
empregados na preservação do meio ambiente. Na visão de Costa (2005, p.322),
convivem a atuação extrafiscal e a observância do postulado da capacidade contributiva, informador dos impostos e insculpido no art. 145, §1°, da Constituição. (nota de rodapé) Isto porque, em razão da extrafiscalidade, autorizada está a prescindibilidade da graduação dos impostos consoante a capacidade econômica do contribuinte, para que se atinjam finalidades outras, que não a mera obtenção de recursos, homenageadas pela ordem constitucional, como, por exemplo, a função social da propriedade, a proteção ao meio ambiente, o incentivo à cultura etc. Vale dizer, o Poder Público pode instituir tributos progressivos ou regressivos sem ater-se à pertinência que os mesmos deveriam guardar com a riqueza do sujeito passivo.
71
Havendo integral submissão ao regime jurídico constitucional tributário,
qualquer espécie de tributo se presta, de certa forma, a alguma finalidade extrafiscal.
A extrafiscalidade é uma ferramenta poderosa na criação de instrumento que visa a
construir uma política tributária ambiental que associe direito tributário e ambiental,
cuja extrafiscalidade ambiental se torna imprescindível, o que será melhor
demonstrado a seguir.
3.1.1 A extrafiscalidade ambiental no Brasil
Como é cediço, a extrafiscalidade não se constitui em regime especial,
apenas se orienta para alcançar outros interesses sociais, políticos ou econômicos,
pelo direcionamento da atividade impositiva tributária. O emprego dessas fórmulas
jurídico-tributárias para a obtenção das metas desejadas, seja para correção de
situações sociais, seja na condução da economia, via estímulo ou desestímulo de
certas atividades, há de se dar no regime próprio das exações tributárias.
No dizer de Paulo de Barros Carvalho (2003),
[...] ao construir suas pretensões extrafiscais, deverá o legislador pautar-se inteiramente, dentro dos parâmetros constitucionais, observando as limitações de sua competência impositiva e os princípios superiores que regem a matéria, assim os expressos que os implícitos.
Para Ribas (2005, p. 690-691),
[...] não é o tributo que é extrafiscal. Concretiza-se a extrafiscalidade com uma série de medidas que influenciam o comportamento humano, visando a determinados objetivos. O legislador, levando em conta esses fins, caracteriza os critérios definidores do tributo, alterando o sistema de alíquotas, base de cálculo, outorgando outros benefícios fiscais.
Existem, atualmente, dois grandes grupos de soluções tributárias, utilizadas
com a finalidade de auxiliar na redução das emissões de carbono: a imposição de
tributos ambientais e a criação de incentivos à produção sustentável.
72
A imposição de tributos ambientais se constitui em solução do tipo “comando
e controle”, ou seja, soluções que estabelecem um padrão de conduta e sanções
fiscais pelo seu descumprimento.
A criação de incentivos à produção sustentável caracteriza-se como sendo
um tipo positivo, ou seja, “incentivo-premiação”, que pretende induzir a tomada de
decisões ecologicamente sustentáveis pela indicação de benefícios.
Tomando-se em consideração esse contexto, o questionamento do presente
trabalho é sobre as vantagens da adoção de mecanismos lastreados em políticas
fiscais, produzindo efeitos positivos qualitativamente superiores à mera adoção de
novos “tributos ecológicos”.
A tributação ecológica deve ter por finalidade ser um elemento de aumento
geral de eficiência do sistema e não um obstáculo ao desenvolvimento. Deve-se
procurar, dessa forma, um equilíbrio fino entre desenvolvimento e proteção
ambiental, o qual pode ser sintetizado na fórmula “desenvolvimento auto-
sustentável”.
Desse modo, a intervenção no domínio econômico por meio da
extrafiscalidade é um eficiente instrumento na prevenção e no combate à
degradação do meio ambiente, uma vez que, via tributação, o Estado estimula
comportamentos não-poluidores, desestimulando os poluidores, tributando menos
quem não polui ou polui pouco, o que justifica, por exemplo, a aplicação dos
incentivos fiscais sem afrontar o princípio da igualdade.
Como o mercado não corrige tais atitudes, é o Estado quem deve fazê-lo para
garantir o meio ambiente ecologicamente equilibrado, consoante o artigo 225, §1°,
inciso V da Constituição Federal37.
Salienta-se que a utilização de tributos para a preservação e proteção
ambiental no Brasil ainda é incipiente. Dentre as espécies tributárias existentes no
37 Art.225. [...] §1 [...] V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente.
73
sistema tributário nacional, o imposto se tem revelado como a modalidade mais
empregada com vista à proteção ambiental. As experiências existentes nesse
sentido apontam para o uso do imposto no seu aspecto extrafiscal. Segundo
Anderson Orestes Cavalcante e Gilson César Borges de Almeida (2005, p. 635)
[..] o Imposto de renda e proventos de qualquer natureza, o Imposto sobre Produtos Industrializados, o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços e o Imposto sobre Propriedade Territorial Urbana oferecem maior possibilidade de emprego da tributação extrafiscal com características que muito as aproxima dos tributos de natureza ambiental.
No que tange ao meio ambiente, a possibilidade de se utilizar o tributo como
instrumento da sua proteção está diretamente ligada à aplicação da técnica da
extrafiscalidade tributária, posto que, conforme José Raimundo Lopes (2000, p.245),
“[...] o sistema tributário contemporâneo tem funções próprias, fundamentadas na
concepção do Estado dentro de uma sociedade capitalista e de mercado [...]”.
Para Becker (2002), verifica-se a relevância do caráter extrafiscal do tributo,
em que o intervencionismo fiscal serve de instrumento eficaz para a reforma ou a
educação socioambiental. A Constituição Federal de 1988, por sua vez, atuando de
forma a regular o exercício da atividade econômica, conforme previsto no artigo
17038, assegura que ao lado da livre iniciativa e da valorização do trabalho humano,
a defesa do meio ambiente seja um dos pressupostos a serem alcançados no
desenvolvimento das atividades produtivas.
Dessa maneira, o emprego dos tributos com fins extrafiscais constitui
importante instrumento para a proteção e preservação do meio ambiente. Pode-se
dizer que a preservação de normas viabilizadoras de um equilíbrio ecológico
encontra nas normas constitucionais de natureza extrafiscal a possibilidade de
consolidar o desenvolvimento sustentável.
A extrafiscalidade ambiental no Brasil, pouco utilizada para a preservação do
meio ambiente, está disposta em alguns Estados (Paraná, Rio Grande do Sul, Mato
Grosso, dentre outros) no chamado ICMS ecológico, estando também contida na
38 Art. 170. – Ver nota de rodapé da pág. 34.
74
chamada Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental – TCFA – Lei nº 10.165, de
27/12/2000, que acrescentou a alínea “B” no art. 17 da Lei n° 6.938/81- que dispõe
sobre a Política Nacional de Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação
e aplicação, e dá outras providências39. Aliás, a extrafiscalidade tem um campo fértil
para avançar no país, pois vários tributos, mais precisamente impostos, podem
adotar normas de cunho tributário-ambiental objetivando uma mudança no modo
operandi do setor produtivo, fazendo com que este desenvolva atividades que, indo
ao encontro do desenvolvimento econômico, não percam de vista a proteção ao
meio ambiente.
Nesse caso, afirma Nunes (2005), tal propósito vem ao encontro da pretensão
ambientalista do desenvolvimento sustentável. Isso, porquanto, abdicando de
tributar ou reduzindo a tributação de atividades “limpas”, o resultado é a
continuidade do desenvolvimento do sistema, porém em fases razoáveis de
exploração de recursos naturais e aproveitamento adequado dos produtos
transformados.
É necessário lembrar que a identidade entre a proteção do meio ambiente
(Direito Ambiental) e o sistema de cobrança de tributos (Direito Tributário), para a
manutenção do Estado e o exercício de suas finalidades, repousa sobre a atividade
econômica. Dessa forma, o ideal de um sistema tributário seria a exigência de
tributos somente da atividade econômica, caso o mercado produtor fosse equilibrado
nos parâmetros do Ótimo de Pareto40. Por conseguinte, o sistema tributário brasileiro
não possui somente a função de estabelecer regras arrecadatórias geradoras de
receitas e mantenedoras da Administração Pública, mas, outrossim, carrega em si a
expectativa de estar apto a lançar seus instrumentos balizadores da economia,
39 [...] Art. 17-B. Fica instituída a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental – TCFA, cujo fato gerador é o exercício regular do poder de polícia conferido ao Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – Ibama para controle e fiscalização das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais [...]. 40 Ótimo de Pareto é um conceito de economia desenvolvido pelo italiano Vilfredo Pareto. Uma situação económica é óptima no sentido de Pareto se não for possível melhorar a situação, ou mais genericamente a utilidade, de um agente sem degradar a situação ou utilidade de qualquer outro agente económico. Numa estrutura ou modelo económio podem coexistir diversos óptimos de Pareto. Um óptimo de Pareto não tem necessariamente um aspecto socialmente benéfico ou aceitável. Por exemplo, a concentração de rendimento ou recursos num único agente pode ser óptima no sentido de Pareto.(DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. 2. ed. São Paulo: Max Limonad, 1996, pág. 135).
75
sendo a atuação extrafiscal uma delas. Daí porque é inerente ao sistema de
tributação a adoção de medidas extrafiscais, independentemente de previsão
expressa na Constituição Federal de 1988.
Assim, a interpretação que deve ser feita ao texto constitucional diante da
necessidade de se impor tributos extrafiscais é necessariamente sistemática, pois
“decorre dos fins da atividade tributária do Estado a busca da harmonia entre
tributação e orçamento público (art.145 a 169) com a atuação social do Estado (CF,
arts. 193 a 232), com vistas a alcançar o desenvolvimento econômico sustentável
(CF, arts. 170 a 192)”.
3.2 Impostos indiretos utilizados para proteção amb iental
A partir da premissa de que a tributação ambiental tem como cerne a
extrafiscalidade tributária que, aplicada juntamente com o princípio da prevenção do
direito ambiental, estimulada por sanções premiais, adotadas através de política
pública denominada de “intervenção sobre o domínio econômico por indução41,
busca conciliar a proteção ambiental com o desenvolvimento econômico que, diga-
se aqui, difere do conceito de crescimento econômico42, com o escopo de superar as
condições precárias de vida da maioria da população brasileira, sem deixar de lado a
preservação de recursos naturais necessários à sobrevivência das gerações futuras.
Desse modo, segundo Ana Maria de Oliveira Nusdeo (2005, p.146-147),
A idéia de desenvolvimento sustentável, assim, implica a necessidade de conciliação entre a economia e a preservação do meio ambiente. [...] para tanto, exigem-se discussões a partir de temas concretos no qual se vejam envolvidas possibilidades de desenvolvimento econômico e necessidade de
41 Intervenção sobre o domínio econômico por indução se dá quando, o Estado manipula os instrumentos de intervenção em consonância e na conformidade das leis que regem o funcionamento dos mercados. (GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição Federal de 1988. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2001, pág. 169). 42 Crescimento econômico: O processo de desenvolvimento deve levar a um salto, de uma estrutura social para outra, acompanhado da elevação do nível econômico e do nível cultural-intelectual comunitário. Daí porque, importando a consumação de mudanças de ordem não apenas quantitativa, mas também qualitativa, não pode o desenvolvimento ser confundido com a idéia de crescimento. Este, meramente quantitativo, compreende uma parcela da noção de desenvolvimento. (GRAU, Eros Roberto, A Ordem Econômica na Constituição Federal de 1988. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2001, pág. 252-253).
76
preservação ambiental, mais a necessidade de implementação de técnicas de exploração ambientalmente sadias, ou pelo menos de menor danosidade em comparação com os paradigmas predominantes.
O debate no tocante ao tema do desenvolvimento econômico aponta, de
acordo com Ricardo Bielschowsky (1996), um consenso no sentido da necessidade
de políticas econômicas especialmente dirigidas à consecução dessa, finalidade
impossível de ser atingida simplesmente pelo livre mercado.
Para Paulo Rosemblatt (2004), a implementação de uma tributação ambiental
que possa conciliar desenvolvimento econômico com preservação do meio ambiente
se aproveita melhor com a utilização de “sanções premiais”, ditos incentivos fiscais,
de vez que induzem o administrado a adotar medidas menos danosas ao meio
ambiente natural, incidindo indiretamente sobre a atividade do agente contaminador,
de modo que esse busque alternativas menos poluentes, mais economicamente
viáveis.
Ademais, conforme Hugo de Brito Machado (2003), a intervenção por indução
é estimuladora da atividade que entende conveniente e desestimuladora da que
entende indesejável. O imposto é um instrumento fartamente utilizado pelo Estado
na intervenção por indução, quer para estimular, com tratamento tributário
favorecido, quer para desestimular, com tratamento tributário mais oneroso.
Nesse sentido, conforme Machado (2003, p. 253), “[...] o imposto é visto pelos
mais ilustres mestres da Ciência das Finanças e da política fiscal como um
instrumento de intervenção do Estado na economia e especialmente como um
instrumento de redistribuição da riqueza [...]”.
Na adoção da tributação ambiental, pode-se utilizar a intervenção por indução,
estimulando a extrafiscalidade tributária, tendo como objeto os impostos indiretos43
IPI e ICMS.
43 Impostos Indiretos: os que são ou podem ser transferidos por aquele contribuinte para outra pessoa que por sua vez os transferirá ou suportará em definitivo. (SOUZA, Rubens Gomes de. 1975, p. 170).
77
Salienta-se que a classificação adotada de impostos diretos44 e indiretos é
meramente didática, pois, para Becker (2002, p. 537), “[...] alguns autores admitem-
na, alegando razões didáticas ou conveniência orientadora para administração pública,
embora todos esses autores continuem a dar tal classificação, sob qualquer critério,
imperfeita, artificial e sem fundamento científico. [...]”.
Nesse prisma, os impostos indiretos dispostos no sistema constitucional
brasileiro (ICMS e IPI) podem ser usados como incentivadores do desenvolvimento
econômico sem descuidar-se da proteção do meio ambiente, através da adoção de
uma tributação ambiental.
No mesmo diapasão, enfatiza Nabais (2005, p. 635):
[...] não há dúvidas ou imperativos de praticabilidade jurídica, os tributos ecológicos estão, por via de regra, condenados a materializar-se em impostos. Vários argumentos apontam nesse sentido. Em primeiro lugar, os tributos ambientais, em sentido próprio, justamente por que constituem tributos extrafiscais, em que está ausente uma predominante função colectora ou arrecadadora, não visando, por isso, em primeira linha a obter receitas, proporcionam uma receita que, em princípio, diminui na razão inversa da eficácia desses instrumentos de política ambiental.
Como assinala Breyer, apud Nabais (1982), a verdadeira virtude de um imposto
radica em sua capacidade de proporcionar incentivos para conduzir o
comportamento em prol de uma direção socialmente desejada, sem paralisar a
tecnologia atual e preservando UM GRADO DE ELECCIÓN INDIVIDUAL.
Os impostos indiretos têm condições de utilizar com eficácia a extrafiscalidade
tributária, de maneira que venham a estimular a proteção ambiental sem deixar de
lado o desenvolvimento econômico. Utilizam-se como instrumento os incentivos
fiscais (sanções premiais), tendo como base o princípio da prevenção que poderá
atuar em conjunto com o princípio do poluidor pagador, ou seja, reduz a alíquota, por
exemplo, do ICMS de determinado produto com o escopo de estimular o
comportamento das empresas, fazendo com que seja benéfico às mesmas a
44 Impostos Diretos – são os suportados em definitivo pelo contribuinte obrigado por lei ao seu pagamento. (SOUZA, Rubens Gomes de. Compêndio de Legislação Tributária - Edição Póstuma.
78
alteração proposta. Concomitante a isso, se majora a alíquota no mesmo caso, para
que efetivamente faça diferença econômica a mudança de comportamento realizada
pela empresa e, outrossim, o aumento sirva para que não fique configurada a prática
da renúncia de receita pela Administração Pública, como refere o art. 14 da Lei nº
101/200045, denominada Lei de Responsabilidade Fiscal.
Segundo Anderson Orestes Cavalcante Lobato e Gilson César Borges de
Almeida (2005, p. 634-635),
[...] Dentre as espécies tributárias existentes no Sistema Tributário Nacional, o imposto se tem revelado como a modalidade mais empregada com vista à proteção ambiental. As experiências existentes nesse sentido apontam para o uso do imposto no seu aspecto extrafiscal. [...] O Imposto sobre Produtos Industrializados, [...] o Imposto Sobre Circulação de Mercadoria e Serviços [...] oferecem maior possibilidade de emprego de tributação extrafiscal, com características que muito as aproxima dos tributos de natureza ambiental.
Os impostos indiretos podem ser utilizados como instrumento da
extrafiscalidade tributária, verdadeiros alavancadores da tributação ambiental;
porém, esses incentivos fiscais têm de ser analisados sob o prisma da Lei de
Responsabilidade Fiscal.
Conforme Carlos Valder do Nascimento (2001, p.11),
Versa a ementa da lei de Responsabilidade Fiscal sobre normas de finanças públicas, tendo como alvo primordial a austeridade nas contas das três esferas de governo. Busca coibir a malversação de recursos estatais, delineando regra de planejamento, caracterizada pela atividade financeira, orçamentária e creditícia [...]. [...] A lei tem por escopo sedimentar o regime de gestão fiscal responsável, mediante a implementação de mecanismos legais que deverão nortear os rumos da Administração Pública. Constitui, pois, um código de consulta gerencial a ser observado, doravante, na condição da coisa pública. Traça limites, estabelece controle e oferece elementos balizadores acerca dos gastos públicos, bem como sobre o fluxo de recursos financeiros necessários a sua efetiva realização. [...].
Coordenação; IBET – Instituto Brasileiro de Estudos Tributários. São Paulo: Resenha Tributária Ltda. 1975.1975, p.170) 45 Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições: [...]
79
Os maiores problemas consistem na análise e no enquadramento da política de
tributação ambiental baseada em impostos indiretos com a Lei de Responsabilidade
Fiscal, mais precisamente o artigo 1446 da referida lei.
A respeito do artigo 14, enfatiza Nascimento (2001, p.103),
[...] a concessão ou ampliação de incentivo de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar [...] II - acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação da alíquota, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.
Prossegue, ainda, Nascimento (2001, p. 103):
Se é certo que à renúncia fiscal se pode recorrer com o objetivo de estimular as atividades de compensações racionais, não menos verdade é que deve ser permeada de compensações racionais, a não causar prejuízos ao conjunto da economia e aos interesses da sociedade pagadora de tributos.
Para a maioria da doutrina, vários artigos da Lei de Responsabilidade Fiscal
estão eivados de inconstitucionalidade, principalmente o artigo 14.
Betina Treigger Grupenmacher (2001, p. 23), ao comentar o artigo 14, assim
preconiza:
[...] mais uma vez, aqui temos um dispositivo imprestável juridicamente. A afirmação que ora se faz tem como supedâneo a inconstitucionalidade de que está eivado o citado dispositivo por afronta ao princípio federativo e ao preceito contido no artigo 14 do Texto Supremo. Sendo certo que a autonomia das pessoas políticas de direito público é decorrência necessária do Princípio Federativo, a vedação de renúncia de receita e a imposição de medidas de compensação estabelecidos pelo art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal consubstanciam-se em medidas inconstitucionais pois que lhes limitam a prerrogativa de autogovernabilidade. Dentre as prerrogativas inerentes à autogovernabilidade das pessoas políticas de direito público, está a plena autonomia arrecadatória e de gerência financeira, o que abrange a faculdade de conceder isenções, incentivos e benefícios fiscais [...].
46 Art. 14 – Ver nota de rodapé anterior.
80
Segundo Edvaldo Brito (2001, p. 116-117),
[...] a Lei de Responsabilidade Fiscal, apesar de ser lei complementar e, então, formalmente não estar viciada, tem, materialmente a eiva de inconstitucionalidade, ao cuidar de matéria deferida, constitucionalmente, à lei complementar de normas gerais de direito tributário. [...] Ora, mesmo que se possa admitir a incursão da Lei de Responsabilidade Fiscal no campo da arrecadação, impossível é aceitar-se, juridicamente, que ela trate, de modo específico, sobre a atividade tributária dos entes federados, por definição, autônomos. Assim, lhe é defeso disciplinar, com tipos específicos, a competência tributária de cada qual dos entes federados cujo conteúdo comporta a renúncia de receita [...].
Analisando sob um ângulo diverso, José Souto Maior Borges (2000, p.99),
menciona que as medidas compensatórias contidas no artigo 14 não podem ser
taxativas, sob pena de estarem maculadas pelo vício da inconstitucionalidade.
Não assim, porém, quando prescreve um remédio que pode até matar o doente: medidas compensatórias consistentes em elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração do tributo ou contribuição (sic no artigo 14, [...]: Sobretudo se vier a prevalecer entendimento no sentido de que esse dispositivo seria taxativo, mas admitindo outras “medidas compensatórias”, como preponderantemente observou, em crítica à tese do numerus clausus: melhoria do controle e fiscalização dos impostos, dinamização da arrecadação da dívida ativa, etc.[...].
Salienta-se ainda que, para Grupenmacher (2001, p.9), “[...] é necessário
pontuar-se que o mencionado diploma legal reproduz quase a fidelidade do modelo
neozelandês de responsabilidade fiscal o que, por si só, explica as inúmeras
incompatibilidades que apresenta com nosso Sistema Constitucional [...]”.
Nessa seara, também corrobora o pensamento de Torres (2002, p.42):
De efeito, pelo menos três orientações passariam a se superpor: a americana (até 1967/69) e a alemã (1988) e, agora, a neozelandesa. A recepção do Responsability Fiscal Act da Nova Zelândia, a se sobrepor aos modelos que já nos trouxeram inúmeros modelos de adaptação, pode provocar sensíveis contradições com a normatividade vigente na temática do orçamento e da gestão financeira, despertando forte suspeita de inconstitucionalidade de diversos de seus dispositivos.
Ressalta-se, porém, que a aplicação de uma tributação ambiental, tendo
como base a extrafiscalidade tributária baseada na instituição de incentivos fiscais,
81
ditos benefícios fiscais dinâmicos, tendo como instrumentos os impostos indiretos
(ICMS e IPI), não afetará o artigo 14 da referida lei ao reduzir a alíquota de
determinado setor produtivo com o intento de estimular a mudança de
comportamento, de maneira que venham a alavancar o desenvolvimento econômico
sem descuidar-se da proteção do meio ambiente.
Assim, aplicar-se-á o princípio da prevenção ambiental de modo direto, sendo a
compensação mencionada pelo art. 14, II, da Lei Complementar n° 101/2000,
aplicada através do aumento de alíquota para as mesmas atividades em que não
ocorra a mudança de comportamento (modo de predição ou exploração), aplicando-
se o princípio do poluidor pagador de maneira subsidiária, como forma de
compensar a instituição do incentivo fiscal.
Com efeito, não se pode esquecer que as medidas de compensação referidas
no artigo 14, inciso II da Lei da Responsabilidade Fiscal, podem se valer da melhoria
do controle, da fiscalização dos impostos, da dinamização da arrecadação da dívida
ativa, cuja interpretação não pode ser limitada, sob pena de se estar criando
obstáculos inviabilizadores da referida compensação.
3.2.1 IPI
De acordo com Sacha Calmon Navarro Coelho (2004, p. 361) conceitua-se
produto industrializado como “toda operação física, química, mecânica ou técnica
que modifique a natureza da ‘coisa’ ou sua finalidade, ou que a aperfeiçoe para o
consumo”.
As alíquotas são baixas ou altas (selecionadas) em função da essencialidade
dos produtos. O imposto pago em operações anteriores é creditado do contribuinte
adquirente, que o abaterá no momento de calcular o montante do IPI a pagar (não-
cumulatividade).
82
Coelho (2004, p.361) preconiza que
A não-cumulatividade caracteriza-se como técnica de deduzir do imposto devido pelo produto acabado (o output) o imposto incidente sobre o imputs, arcado pelo industrial quando da aquisição dos mesmos. O IPI, assim como o ICMS, tende a ser imposto sobre o valor acrescido por cada contribuinte ao longo da cadeia de circulação, pois são ambos impostos plurifásicos (pouco importando a técnica de apuração desses impostos), com a diferença de o ICMS abranger também a etapa de comercialização, o que só raramente ocorre com o IPI, mais fechado no ciclo da produção industrial.
Adota o imposto, por imperativo constitucional, o princípio da seletividade das
alíquotas em razão da essencialidade dos produtos. Desse modo, a tabela do IPI
(TIPI) contempla várias alíquotas a serem aplicadas sobre o valor da operação, que
é justamente a sua base de cálculo.
Segundo Coelho (2004, p.531),
[...] o princípio da seletividade visa, em princípio, o consumidor final. É para ele a ‘essencialidade’ do produto posto ao consumo. Remédios, por exemplo, devem ter alíquotas menores que bebidas, cigarros e refrigerantes. Daí se conclui que o legislador e o administrador não são livres para dizer que o produto é ou não essencial. Devem, com razoabilidade, atentar para a Constituição. Quem fixa a base de cálculo é o legislador, mas as alíquotas do imposto são fixadas pelo executivo, dentro dos limites fixados em lei, por atos administrativos [...].
Dessa forma, traduz-se ser útil e eficaz para a implementação e aplicação de
uma política pública de tributação ambiental no Brasil, haja vista que esse tema é
ainda muito reduzido. Pode-se utilizar o IPI, principalmente, em decorrência de poder
trabalhar com a característica da seletividade e, também, com o fato de que o
executivo federal tem a faculdade de alterar sua alíquota conforme art. 150, VI, §1°
da CF/8847, em virtude da política industrial adotada, o que, outrossim, poderá incluir
uma política de tributação ambiental.
47 Art.150. VI - § 1º A vedação do inciso III, b, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, IV e V; e 154, II; e a vedação do inciso III, c, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, III e V; e 154, II, nem à fixação da base de cálculo dos impostos previstos nos arts. 155, III, e 156, I.
83
Para Ribas (2005, p. 686):
Há previsão constitucional para tributação diferenciada sobre produtos essenciais, pela seletividade de alíquota. Neste sentido, e tendo em vista as orientações dos arts. 170, VI e 225 da Constituição Federal de 1988, pode o legislador, em caráter extrafiscal, desestimular as atividades inconvenientes ao bem-estar social. A majoração de alíquotas incidentes sobre produtos ecologicamente incorretos permite a transferência dos custos sociais provocados pelo dano para as indústrias poluentes.
Dessa forma, é possível utilizar sanções premiais de maneira a incentivar o
desenvolvimento de atividades mais concernentes com o incremento sustentável e,
no mesmo passo, aumentar as alíquotas com o objetivo de penalizar aqueles
setores produtivos que não adotarem métodos de produção que venham
efetivamente a reduzir a poluição do meio ambiente. Essa possibilidade existe em
face da característica da seletividade, que está impregnada no IPI.
Nesse sentido, de acordo com Luiz Cláudio Guimarães (1997, p. 355),
[...] as metas econômicas visadas pelo Estado, onde se inclui sua política ambiental de um desenvolvimento sustentável, podem ser atingidas com maior eficácia por meio das sanções premiais às unidades de produção, estimulando-as via empréstimos favorecidos, bem como por meio da técnica da extrafiscalidade dos tributos – por exemplo, com incentivos às novas indústrias não-poluidoras ou àquelas que utilizem tecnologia de produção com uso de materiais recicláveis ou que diminuam o emprego de recursos não-renováveis.
Segundo Torres (2000, p. 326-327),
O IPI se subordina ao princípio da seletividade, que é um dos subprincípios da capacidade contributiva, a significar que o tributo deve incidir progressivamente na razão inversa da essencialidade dos produtos: quanto menor a utilidade do produto tanto maior deverá ser a alíquota e vice-versa.
Exemplo de aplicação da extrafiscalidade tributária em matéria de direito
ambiental no Brasil, que no IPI utiliza a seletividade de modo a graduar
diferentemente os bens e serviços sob o ponto de vista da proteção do meio
ambiente, visando a incentivar atividade, processo produtivo e consumo
84
ecologicamente sustentável, tem-se a utilização de alíquota diferenciada para
veículos a álcool48.
Dessa maneira, possibilita reduzir a alíquota do IPI incidente nos veículos a álcool
para o percentual de 10%, o que acabará estimulando a produção de veículos com esse
tipo de combustível, sem contar o incentivo à plantação de cana-de-açúcar, o que
alavancará a produção de combustível a álcool, melhor ecologicamente que os movidos à
gasolina, contribuindo para alcançar o objetivo estabelecido no art. 3°, inciso II 49 da Carta
Política de 1988. Essa política pública de tributação ambiental impulsiona a proteção à
saúde – art. 196 caput da CF/88,50 indo ao encontro de um dos fundamentos da Carta
Política de 1988, qual seja, a proteção da dignidade da pessoa humana - art. 1°, inciso III 51,
o que gerará uma melhor qualidade de vida da população, preconizada pelo art. 225,
caput da CF/8852.
Tal alternativa não se configura como renúncia fiscal - art.14 da Lei n°
101/200053, de vez que a adoção desse incentivo fiscal incrementará a produção e
48 Decreto-Federal nº 755/93, de 19 de fevereiro de 1993. - Art.1° Ficam reduzidas para os percentuais indicados no Anexo I as alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados IPI incidentes sobre os veículos automotores nele relacionados, de acordo com sua classificação na Tabela de Incidência TIPI aprovada pelo Decreto n° 97.410, de 23 de dezembro de 1988, com as alterações decorrentes das modificações introduzidas na Nomenclatura Brasileira de Mercadorias NBM/SH pela Resolução n° 77, de 15 de dezembro de 1 988, do Comitê Brasileiro de Nomenclatura. Art. 2º Ficam reduzidas para os percentuais indicados no Anexo II as alíquotas do IPI incidentes sobre os veículos automotores nele relacionados, desdobrados, sob a forma de destaques (“ex”), dos respectivos códigos de classificação na TIPI.[...]. 49 Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: II - garantir o desenvolvimento nacional. 50 Art. 196. – Ver nota de rodapé pág. 23. 51 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...] III - a dignidade da pessoa humana; 52 Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. 53 Lei nº 101/2000 – Art. 14 – A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições: I- demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias; II- estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição III- §1 A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução
85
venda de veículos a álcool que, por conseqüência, garantirá um rendimento maior
do que se comparado quando a alíquota estava elevada.
Salienta-se ainda, que o art. 64 do Decreto n° 4.54 4/200254, responsável pela
regulamentação do IPI, estabelece a redução e majoração de alíquotas, quando se
tornar necessário atingir os objetivos da política econômica governamental,
observado o princípio da seletividade. Aqui, na prática, é a adoção da
extrafiscalidade tributária que é aplicada levando-se em consideração as
características do imposto incidente, como, por exemplo, o princípio da seletividade.
A título de exemplo, o art.65 do mesmo Decreto prevê que
[...] haverá redução: [...] II - de cinqüenta por cento da alíquota do imposto, prevista na TIPI, incidente sobre equipamentos, máquinas, aparelhos e instrumentos, bem assim sobre os acessórios sobressalentes e ferramentas que acompanhem esses bens, destinados à pesquisa e ao desenvolvimento tecnológico, quando adquiridos por empresas industriais e agropecuárias nacionais que executarem PDTI e PDTA [...].
Pode-se alterar o inciso II ou acrescentar um outro inciso prevendo “a redução
de alíquota incidente sobre: equipamentos, máquinas, aparelhos e instrumentos,
bem como sobre acessórios sobressalentes e ferramentas que acompanhem esses
bens, destinados à pesquisa e ao desenvolvimento tecnológico que contribuíssem
para a redução da poluição, como também os que contemplassem o surgimento de
produtos com eficácia comprovada e que não fossem poluentes ou nocivos para o
meio ambiente ou que reduzissem significativamente a capacidade de poluir dos
anteriormente produzidos por empresas industriais e agropecuárias nacionais”
Essa previsão legal incentivaria o surgimento de produtos e materiais
ecologicamente mais “limpos”, ou seja, que viessem a reduzir o patamar de poluição
existente hoje no Brasil, e também no mundo, indo ao encontro dos aspectos
defendidos aqui no trabalho, de uma política pública de tributação ambiental que não
discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado [...]. 54 Decreto nº 4.544/2002 – Art. 64 – Quando se tornar necessário atingir os objetivos da política econômica governamental, mantida a seletividade em função da essencialidade do produto, ou, ainda, para corrigir distorções, poderão as alíquotas ser reduzidas até zero ou majoradas até trinta unidades percentuais.
86
venha a onerar ainda mais a carga tributária brasileira55, aliando o desenvolvimento
econômico com a proteção do meio ambiente, com o intuito de proporcionar uma
melhor qualidade de vida à população brasileira.
Após exemplificar como pode ser implementada a tributação ambiental, tendo
como objeto IPI, passa-se agora a analisar se a utilização da extrafiscalidade
tributária, no intento de construir tal política pública, encontra óbices nos princípios
constitucionais tributários preconizados na Constituição de 1988. Em vista disso,
analisar-se-á, primeiramente, sob a ótica do princípio da legalidade tributária.
No estudo da legalidade, segundo Schoueri (2005), constata-se o conflito de
um lado, entre o rígido regime imposto pelo princípio da legalidade em matéria
tributária e, de outro, a necessidade de a administração contar com instrumento ágil
para a intervenção sobre o domínio econômico. Assim, abre-se espaço para a
inserção de cláusulas gerais56 e conceitos indeterminados57 com que o legislador
pode contar para, dobrando-se ao referido princípio, permitir que o texto legal se
curve às peculiaridades do caso concreto.
De acordo com Modé (2004), frisa-se que o princípio da legalidade na esfera
tributária encontra origem, seguindo a maioria dos doutrinadores, pelas expressões
nullum tributum sina lege e está expresso em nossa Constituição Federal no art.
150, inciso I 58.
55 Portal Tributário e comparação com o PIB. 56 Cláusulas Gerais: Configuram-se descrições amplas da hipótese de incidência, que acabam por permitir ao aplicador da lei atender às peculiaridades do caso concreto. (ENGISCH, Karl, apud SCHOUERI, 2005). 57 Conceito indeterminado: são produto da impossibilidade de precisar com maior exatidão os vocábulos empregados pela lei, porque as realidades que os mesmos se referem não admitem outro tipo de determinação. (ENGISCH, Karl, apud SCHOUERI, 2005).
87
Ainda, segundo Modé (2004, p. 78),
Ao lado do princípio da legalidade tributária, encontra-se em nosso ordenamento jurídico o princípio da tipicidade, a exigir que a lei seja rigorosa na descrição da imposição tributária. A lei tributária deve conter como elementos estruturais que compõem qualquer tributo: a definição do fato gerador da obrigação tributária principal; o sujeito passivo; a fixação da alíquota do tributo e da sua base de cálculo; a hipótese de exclusão, suspensão e extinção de créditos tributários ou de dispensa ou redução de penalidades e infração.59
A utilização da extrafiscalidade tributária, tendo como objeto o IPI, possui
como cerne o princípio da seletividade, o qual possibilita o aumento de alíquotas
para os produtos não essenciais: cigarros, bebidas, etc, e a redução para os
produtos essenciais, como, por exemplo, os alimentos. Dessa maneira, podem-se
utilizar os incentivos fiscais com o objetivo de estimular a mudança de
comportamento dos meios produtivos de modo que os mesmos venham a investir
em tecnologia e educação ambiental com o escopo de reduzir a poluição e os danos
ao meio ambiente, aliando desenvolvimento econômico com proteção ambiental.
A aplicação das “sanções premiais” tem de observar o art. 150, §6° da Carta
Política de 198860. Esta preconiza que, somente através de lei, as atividades terão
as alíquotas reduzidas para aqueles setores que empregarem tecnologia que
objetive a redução do impacto da poluição no meio ambiente, por conseqüência,
58 CF/88 - Art. 150. I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça. 59 CTN - Art. 97. Somente a lei pode estabelecer: I - a instituição de tributos, ou a sua extinção; II - a majoração de tributos, ou sua redução, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39, 57 e 65; III - a definição do fato gerador da obrigação tributária principal, ressalvado o disposto no inciso I do § 3º do artigo 52, e do seu sujeito passivo; IV - a fixação de alíquota do tributo e da sua base de cálculo, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39, 57 e 65; V - a cominação de penalidades para as ações ou omissões contrárias a seus dispositivos, ou para outras infrações nela definidas; VI - as hipóteses de exclusão, suspensão e extinção de créditos tributários, ou de dispensa ou redução de penalidades. § 1º Equipara-se à majoração do tributo a modificação da sua base de cálculo, que importe em torná-lo mais oneroso. § 2º Não constitui majoração de tributo, para os fins do disposto no inciso II deste artigo, a atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo. 60 Art. 150 [...] § 6.º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima
88
majoradas as mesmas para aqueles setores que não mudarem o comportamento.
Ressalta-se, ainda, que o IPI está excepcionado no tocante ao aumento e à redução
de alíquotas do princípio da anterioridade e da legalidade61, conforme menciona o
art. 150, §1° da CF/88 62.
Não se diga aqui que as cláusulas gerais e os conceitos indeterminados
levam conferir à administração a possibilidade de exercício discricionário do poder
de tributar, menciona Schoueri (2005). Conforme Grau (1988, p.123), o qual
distingue discricionariedade e aplicação de conceitos indeterminados: “No exercício
da discricionariedade o sujeito cuida da emissão de juízos de oportunidade, na
eleição entre indiferentes jurídicos; na aplicação de conceitos indeterminados, o
sujeito cuida de emissão de juízos de legalidade.”
José Marcos Domingues de Oliveira (2003), em sua obra Direito Tributário e
Meio Ambiente: Proporcionalidade, Tipicidade aberta e Afetação de receita, entende
que o princípio da tipicidade tributária, no que tange à aplicação da tributação
ambiental, deve sofrer uma mitigação em atenção ao princípio da proporcionalidade,
uma vez que, por constituir-se instrumento de política econômica, deve atender à
defesa do meio ambiente (valor maior a ser buscado), não podendo encontrar óbice
na tipicidade cerrada. Ainda, segundo Oliveira (2003, p. 116-117):
[...] não empregar a tributação ambiental, não explorar o seu potencial no combate à poluição e em defesa do meio ambiente sob a alegação de dificuldades de sua conciliação com o princípio da legalidade, por exemplo, é conseqüência de uma visão curta e conservadora da fenomenologia tributária que precisa ser superada, porque fere o espírito constitucional.
Nesse diapasão é o entendimento de Alberto Xavier, apud Oliveira (1988),
Todavia, é o próprio Xavier que admite, embora excepcionalmente, o emprego de conceitos indeterminados tais como ‘despesas razoáveis’ ou ‘lucro arbitrado’, como de resto não encontradiços na legislação pátria do imposto de renda ‘gastos incompatíveis’, ‘despesas necessárias à
enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g. 61 Art. 150. III - cobrar tributos: b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou. Art. 150. I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça. 62 § 1º A vedação do inciso III, b, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, IV e V; e 154, II; e a vedação do inciso III, c, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, III e V; e 154, II, nem à fixação da base de cálculo dos impostos previstos nos arts. 155, III, e 156, I.
89
manutenção da fonte’, conceituadas como ligadas a ‘operações exigidas pela atividade da empresa’, ‘bens imprestáveis’ (e por que não, aduzimos, ‘tecnologia imprestável ou obsoleta ou poluidora’). A lei complementar do imposto sobre serviços também contempla na respectiva lista de incidências conceitos indeterminados ao se referir a ‘serviços congêneres’ e ‘serviços correlatos’. O mesmo se diga da legislação sobre incentivos fiscais subordinados a exame administrativo do mérito de projetos ‘de interesse’ (ou de ‘relevante interesse’) para o ‘desenvolvimento’, econômico, da cultura etc. [...].
Para Oliveira (1999), a existência de cláusulas gerais e conceitos indeterminados
esclarece que no campo ambiental é a regra, não a exceção, citando exemplos de
incentivos fiscais, como “servir de base à conservação do solo e dos regimes das
águas” ou “contribuírem para a conservação da natureza” através do florestamento e
do reflorestamento (Lei n° 5.106/66 e Decreto n° 79 .046/76).
No que concerne ao princípio da igualdade, segundo Mello (2004), a idéia da
razoabilidade e proporcionalidade, por sua vez, leva-nos à aplicação de outro
princípio constitucional relevante para o tema tributário: a igualdade.
Na opinião de José Maurício Conti (1996, p.73),
Afinal, será este o princípio que exigirá que se dê igual tratamento a situações equivalentes (igualdade horizontal), exigindo, ao mesmo tempo, que se distinguem situações diferentes, conferindo-lhes tratamento diverso, na medida da própria diferença (igualdade vertical).
Segundo Schoueri (2005, p. 246), constituem-se em parâmetros aceitos para
discriminação como, por exemplo, a capacidade contributiva63, a essencialidade64, o
uso da propriedade segundo sua função social65.
63 CF/88 - Art. 145. I - impostos; 64 CF/88 - Art. 153. §3º, I - será seletivo, em função da essencialidade do produto. CF/88 - Art.156. §3º, II - excluir da sua incidência exportações de serviços para o exterior. 65 CF/88 - Art. 170. III – função social da propriedade. Art. 182. § 4º, II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo.
90
Prossegue Schoueri (2005, p.246):
[...] não só na ordem tributária é que se encontram parâmetros consagrados constitucionalmente para a comparação. Àqueles se agregam os provenientes da ordem econômica e, aqui, se encontrará a proteção ao meio ambiente como valor suficiente para uma discriminação legal.
Ademais, na ordem econômica outros fatores serão acrescentados, e aqui se
encontrará, ao lado da proteção da livre concorrência (que exigirá rígido controle dos
benefícios concedidos), função social da propriedade, a proteção do Meio Ambiente
e outros. Para Schoueri (2005), no lugar de se afastar o emprego de normas
tributárias indutoras em matéria tributária, considera-se serem estes legítimos,
alertando-se, entretanto, para o fato de que esse critério de discrímen atuará
justamente com outros tantos, da mesma ordem econômica ou provenientes da
ordem tributária (em que assume realce a capacidade contributiva). Qualquer
tratamento discriminatório deverá passar pelo teste de razoabilidade e
proporcionalidade, por meio do qual o aplicador da lei indagará se as diferenças
entre as atuações são suficientes para justificar um tratamento discriminado em tal
proporção.
Salienta-se que a extrafiscalidade tributária aliada ao princípio da seletividade,
tendo como objeto o IPI, propicia a redução de alíquotas utilizando-se dos incentivos
fiscais para estimular o emprego em tecnologia que venha a reduzir a poluição do
meio ambiente; indo ao encontro do princípio da prevenção do direito ambiental e,
podendo, outrossim, majorar alíquotas do IPI para aquelas que não mudarem o
comportamento, isto é, que não investirem em tecnologia, atuando, aqui, o princípio
do poluidor-pagador concomitantemente.
Demonstra-se com isso, Modé (2004), que a razão motivadora da tributação
ambiental não é a mesma sobre a qual se fundam as sanções. A aplicação da
tributação ambiental não tem por objetivo punir o descumprimento de um comando
normativo (proibitivo), ao contrário, a partir do reconhecimento de que uma tal
atividade econômica é necessária à sociedade (seja por fornecer produtos
indispensáveis à vida social ou por outra razão qualquer), busca ajustá-la a uma
91
forma de realização mais adequada do ponto de vista ambiental, estimulando
comportamentos que vão ao encontro da defesa do meio ambiente.
Sustenta Modé (2004, 84-85):
[...] enquanto a tributação ambiental garante ao agente econômico uma margem de manobra para adequação de sua atividade, a regra de comando (proibitiva) lhe nega qualquer possibilidade de ajuste. O caráter inflexível das normas de comando e controle acaba por valorizar a opção pela via tributária por consistir em um incentivo permanente ao agente econômico, para que busque, segundo sua maior conveniência, o meio mais adequado para a redução do potencial poluidor de sua atividade.
O foco da política de tributação aqui referida são as normas indutoras
(sanções premiais), através da intervenção sobre a ordem econômica por indução,
podendo atuar a sanção negativa de forma subsidiária, dando-se, assim, preferência
ao princípio da prevenção (direito ambiental), com o objetivo de se alcançar o
desenvolvimento sustentável.
Dessa forma, é possível utilizar como objeto de uma política de tributação
ambiental o imposto sobre produtos industrializados, da forma como enfatizado
acima, o qual não irá contrariar o princípio do não-confisco.
Por último, analisa-se a limitação ao poder de tributar imposta pelo princípio
da capacidade contributiva66. Segundo Modé, (2004, p.85):
A doutrina brasileira, geralmente, trata capacidade econômica e capacidade contributiva sem distinção. Roque Antônio Carraza, Bernardo Ribeiro de Moraes e Ruy Barbosa Nogueira dentre outros, não verificam qualquer distinção entre o princípio da capacidade econômica e o princípio da capacidade contributiva [...].
E não nos interessa aqui fazer a análise da distinção ou não, tratando-as
assim como expressões sinônimas. Conforme Modé (2004) o princípio da
66 CF/88 - Art. 145. §1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.
92
capacidade econômica ou contributiva é decorrência do princípio da igualdade67 e do
ideal republicano68.
E assim continua Modé (2004, p.87)
A ordem econômica preconizada pela Carta Magna de 1988 elege outros valores além do ideal republicano a serem alcançados, dentre os quais, encontra-se a defesa do meio ambiente69. A questão que se coloca nesse ponto é a de saber ser ou não afastável o princípio da capacidade contributiva da tributação extrafiscal.
Para Helenilson Cunha Pontes (1999), O exercício da competência impositiva com motivos extrafiscais deve sempre observância ao princípio da capacidade contributiva , em sua otimização concretamente possível, apreciada segundo o princípio da proporcionalidade. Mesmo quando o fundamento constitucional da tributação extrafiscal assumir, diante do caso concreto, maior peso que aquele decorrente das exigências clássicas do princípio da capacidade contributiva (verificação das características econômicas mínimas do pressuposto de fato da regra tributária), o “núcleo essencial” do princípio da capacidade contributiva – que na ordem jurídica brasileira pode ser encontrado na justiça e solidariedade sociais70, fim e fundamento de toda a república brasileira deve ser observado.
Entretanto, tendo como objeto o IPI na adoção de uma política de tributação
ambiental, a aplicação do princípio da capacidade contributiva se torna imperfeita.
Conforme Coelho (2005, p.56),
Nos impostos que percutem (chamados de indiretos ou de mercados) entre em cena o contribuinte de fato, diferente do “de jure”, e a capacidade contributiva realiza-se imperfeitamente. É o caso das alíquotas menos gravosas de IPI e ICMS. Supõe-se que os de menor renda (contribuinte de fato) consomem artigos necessários tão somente a uma existência sofrida, e, por isso, as alíquotas são reduzidas, ou mesmo isenções são dadas.
67 CF/88 - Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...]. 68 CF/88 – Art. 3º, I - construir uma sociedade livre, justa e solidária. 69 CF/88 – Ar. 170. VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação. 70 CF/88 - Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
93
Ocorre que tanto compra feijão Jose da Silva quanto Ermínio de Moraes, com o rico industrial se beneficiando dos favores pensados para José. Em compensação, José não consome champanha ou caviar, cujas alíquotas são alta [...].
Modé (2004) considera impossível a aplicação em sua plenitude, no caso de
ser aplicado o princípio nos denominados tributos indiretos (IPI e ICMS), pois quem
suporta a carga fiscal não é o contribuinte (comerciante/industrial), mas sim o
consumidor final da mercadoria. Desse modo, tal carga é idêntica para o consumidor
final, qualquer que seja sua capacidade contributiva, ricos ou pobres. Assim,
operacionalizar a cobrança de IPI e ICMS, tendo em conta a capacidade contributiva
individual dos diversos consumidores em um mercado de consumo de massa, torna-
se inviável.
Na tributação ambiental, o princípio da capacidade contributiva se torna
mitigado, em face do valor estabelecido nessa política pública de tributação, em que
se dá primazia à defesa e proteção do meio ambiente71. Nessa via, toma-se como
exemplo o Decreto n° 755, de 19 de fevereiro de 199 3, que estabeleceu diferentes
alíquotas do “imposto sobre produtos industrializados” - IPI para certos veículos
movidos à gasolina (25% ou 30%), conforme as especificações, e para veículos
movidos a álcool (20% ou 25%). Esse mecanismo veio contribuir para o decréscimo
geral nos níveis de poluição do ar nas cidades, transmutando-se em incentivo ao
consumo de combustíveis “limpos” ou menos poluentes. Esse exemplo poderia ser
aplicado com uma diferença mais acentuada entre as alíquotas, com o objetivo de
valorar “a proteção do meio ambiente”, indo ao encontro do princípio da prevenção,
podendo atuar o princípio do poluidor-pagador de maneira subsidiária, pois aqueles
que não adotarem uma política de desenvolvimento sustentável irão pagar um preço
mais elevado pelo combustível fóssil, sendo penalizados economicamente.
Como se percebe, o princípio da capacidade contributiva se torna de pouca
valia e praticamente inviável a sua aplicação, pois será beneficiado pela medida
quem possuir veículo a álcool, sem levar em consideração se for industrial como
Ermínio de Moraes ou um trabalhador assalariado.
71 CF/88 – Art.170. VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação.
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Com efeito, o imposto sobre produtos industrializados pode se tornar um
importante instrumento para uma política pública de tributação ambiental, uma vez
que possui características (seletividade, não-cumulatividade) que propiciam a
aplicação da extrafiscalidade tributária, conciliando desenvolvimento econômico com
proteção do meio ambiente, e o que é mais importante, sem aumentar o já elevado
número de tributos existentes no sistema tributário brasileiro.
3.2.2 ICMS
Conforme Coelho (2004), desde a Emenda n° 18/65 à Constituição de 1946,
após o movimento militar de 1964, quando se intentou, simultaneamente, a
racionalização do sistema tributário e a codificação do direito tributário (CTN), que o
ICM, agora ICMS, vem se apresentando como um imposto problemático, tomado de
enfermidades descaracterizantes.
Segundo Coelho (2004, p.384),
[...] à época do movimento militar de 1964, receptivo às críticas dos juristas e economistas que viam no imposto sobre vendas e consignações dos Estados (IVC) um tributo avelhantado, “em cascata”, propiciador de inflação, verticalizador da atividade econômica, impeditivo do desenvolvimento da Federação e tecnicamente incorreto, resolveu-se substituí-lo por um imposto “não cumulativo”, que tivesse como fatos jurígenos não mais “negócios jurídicos”, mas a realidade econômica das operações promotoras da circulação de mercadorias e serviços, no país, como um todo. Destarte, surge o ICM não cumulativo, em lugar do IVC cumulativo [...].
Para Aliomar Baleeiro (1999, p. 368-369), “Há mais de três décadas o Brasil
aderiu aos sistemas tributários mais modernos, procurando eliminar a tributação em
cascata, tanto nos impostos sobre a produção industrial (IPI), como sobre a
comercialização (ICM) [...]”. Na Constituição de 1988, o imposto sobre operações de
circulação de mercadorias e serviços de transporte interestadual e intermunicipal e
de comunicação (ICMS) foi posto na competência dos Estados-membros72 e, de
acordo com Baleeiro (1999, p. 368-369),
72 CF/88 - Art. 155. II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.
95
[...] representa a adição ao ICM anterior, dos antigos impostos únicos federais sobre energia elétrica, combustíveis, lubrificantes e minerais do país e, também, dos impostos federais sobre transportes de pessoas e cargas que não fossem estritamente municipais e sobre comunicações.
É da essência do Estado Federal a repartição de competência de maneira
que cada ordem jurídica parcial, que somente vale dentro do âmbito territorial de
cada ente descentralizado, possa nascer de Poder Legislativo próprio (Assembléias
Legislativas). Dentro dessa repartição de competências, compete à União Federal,
por meio de Lei Complementar73 sendo esta hierarquicamente inferior à
Constituição, entretanto, sobrepor-se às ordens jurídicas parciais da própria União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios74.
Desse modo, segundo Baleeiro (1999), foi adotada a lei complementar n°
24/75, posteriormente modificada pela Lei Complementar n° 87, de 13.09.1996, em
cumprimento desses ditames constitucionais, aqueles genéricos do art. 146 e
aqueles específicos, constantes do art.155. Ademais, na Constituição de 1988, o
veículo das normas gerais de Direito Tributário não são apenas as leis
complementares, mas ainda as resoluções do Senado Federal75.
73 CF/88 - Art. 146. Cabe à lei complementar: I - dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. 74 AgRg no REsp - Agravo Regimental no Recurso Especial 748531/PR (do STJ) – rel. Min. Luiz Fux – data do Julgamento 11/10/2005, Data da Publicação/Fonte DJ 24.10.2005, p. 212 – www.stj.gov.br - acesso em 02/03/2006 – [...] 10. Destarte, matéria semelhante a dos autos (relacionada às sociedades civis), vem sendo discutida pelas Primeira e Segunda Turmas desta Corte Superior, que, com fulcro no Princípio da Hierarquia das Leis, têm-se posicionado no sentido de que Lei Ordinária não pode revogar determinação de Lei Complementar, pelo que ilegítima seria a revogação instituída pela Lei n° 9.430/96 da isenção conferida pela LC n ° 70/91 às sociedades civis prestadoras de serviços, entendimento, hodiernamente, sufragado pela Seção do Direito Pùblico. Isto porque é direito do contribuinte ver revogada a suposta isenção pela mesma lei que o isentou, máxime quando a vontade política nela encartada revela quorum qualificado. Sob esse enfoque, a Eg. Primeira Seção no REsp 616.219-MG. 75 CF/88 – Art. 155. VII - em relação às operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final localizado em outro Estado, adotar-se-á: a) a alíquota interestadual, quando o destinatário for contribuinte do imposto; b) a alíquota interna, quando o destinatário não for contribuinte dele; Art. 155. § 6º O imposto previsto no inciso III: I - terá alíquotas mínimas fixadas pelo Senado Federal.
96
Para Coelho (2004, p. 387),
O fato gerador do ICMS em sentido genérico é a realização de operações relativas à circulação de mercadorias e serviços de comunicações e transportes, de natureza não estritamente municipais por produtores, extratores, indústrias, comerciantes e prestadores. O ICMS é imposto qualificado por relações jurídicas entre sujeitos econômicos, ainda que pessoas físicas, mormente em caso de importação de mercadorias.
Após breve relato histórico do ICMS, das normas que disciplinam o imposto e
de seu fato gerador, passa-se ao objeto específico que é a utilidade que o referido
imposto pode ter para a proteção do meio ambiente.
A Lei Complementar n° 87/96 foi modificada pelas de n°s 92/97, 99/99 e n°
102/2000, está última alterou o art. 20, §5, acrescentando o I 76, instituindo uma
regra de aproveitamento/depreciação, que deve ocorrer em um prazo fechado de 48
meses, sem contemplar a possibilidade do crédito/depreciação de forma integral e
imediata para os bens do ativo imobilizado.
O ICMS é um imposto em que é facultado utilizar o princípio da seletividade
em função da essencialidade do produto – art. 155, §2°, III 77. Desse modo, constitui
princípio constitucional a ser rigorosamente obedecido no âmbito do IPI e de modo
permitido no caso do ICMS.
76 Lei Complementar n° 87/96 – Art. 20. Para a compen sação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação [...] §5. Para efeito do disposto no caput deste artigo, relativamente aos créditos decorrentes de entrada de mercadorias no estabelecimento destinadas ao ativo permanente, deverá ser observado: I – a apropriação será feita à razão de um quarenta e oito avos por mês, devendo a primeira fração ser apropriada no mês em que ocorrer a entrada no estabelecimento [...] 77 Art. 155. §2°, III . poderá ser seletivo, em funçã o da essencialidade das mercadorias e dos serviços.
97
Esta é a posição de Coelho (2005, pág. 512-513):
A seletividade no ICMS é facultativa. No IPI é obrigatória. No ICMS a seletividade não poderá ser muito ampla. Espera-se que duas alíquotas sejam suficientes. Uma para as mercadorias supérfluas e outra para o grosso das mercadorias de grande consumo popular, como se costuma dizer. Todavia, o conceito de mercadoria supérflua não fica ao alvedrio exclusivo do legislador. Adotada que seja a seletividade, tem o contribuinte de provocar o judiciário para que declare, à luz de critérios técnicos e dos aspectos sociais da Nação, se esta ou aquela mercadoria é supérflua. Assim, o automóvel, em si, não é bem supérfluo, embora um carro Mercedes possa sê-lo [...].
Paulo de Barros Carvalho (1970, p.75/85) já enfatizava:
Impondo que as alíquotas do imposto sejam estipuladas seletivamente, em função do grau de essencialidade dos produtos, serviu-se, para tanto, da divisão dos produtos em três categorias: a) necessários à subsistência (alíquotas suaves); b) úteis, mas não necessários (alíquotas moderadas) e c) os produtos de luxo (alíquotas significativas) [...].
O mesmo entendimento do acima exposto possuem Balleiro e Cruz. Para Balleiro
(1984, p. 206),
[...] a seletividade significa discriminação ou sistema de alíquotas diferenciadas por espécies de mercadorias, como adequação do produto à vida do maior número de habitantes do país. As mercadorias essenciais à existência civilizada deles devem ser reservadas aos produtos de consumo restrito, isto é, o supérfluo das classes de maior poder aquisitivo [...].
Antonio Maurício Cruz (1984, p. 66), concorda afirmando que
[...] a própria ordem econômica social, a proteção à família, a valorização do trabalho humano, a função social da propriedade, a harmonia entre as categorias sociais da produção e a expansão da oportunidade de empregos produtivos constituem valores prestigiados pela Constituição, razão pela qual deve ocorrer gradação de alíquotas do IPI, de forma a reduzir ou eliminar os respectivos ônus dos produtos essenciais [...].
Para José Eduardo Soares de Melo (2003), enquanto a facultatividade
constituir o elemento alavancador do ICMS seletivo, não poderá ocorrer critério de
conveniência e oportunidade, estabelecendo alíquotas mais elevadas com o
propósito apenas de incrementar a arrecadação do ICMS, uma vez que o princípio
da seletividade deve ser observado de acordo com a essencialidade das
98
mercadorias e dos serviços, com o escopo de alcançar a dignidade da pessoa
humana - o art. 1°, III, da CF/88 78, o desenvolvimento nacional - art. 3°, II da CF/88 e
a erradicação da pobreza, da marginalização e redução das desigualdades sociais –
art. 3°, III da CF/88 79.
A extrafiscalidade poderá se valer do princípio da seletividade, característica
que é facultada ao ICMS utilizar com o intuito de implementar uma política pública de
tributação ambiental que será impulsionada pela adoção de benefícios fiscais
dinâmicos, classificação adotada por Nabais (2005), ditos incentivos fiscais.
Este é, outrossim, o pensamento de Roque Antonio Carraza (1997, p.443):
[...] Salientam cogitar-se de determinado tratamento (regime jurídico especial) situado no campo da extrafiscalidade, com o emprego dos instrumentos tributários para fins não-fiscais, mas ordinatórios (isto é, para condicionar comportamentos de virtuais contribuintes), e não, propriamente, para abastecer os cofres públicos.
Dessa forma, ocorrendo a adesão espontânea do contribuinte ao plexo de
incentivos, Yonne Diolácio de Oliveira (1980, p.153) afirma que “[...] será favorecido
com vantagens fiscais que funcionam como sanções premiais, no objetivo de
estimulá-lo a, voluntariamente, participar das atividades prestigiadas de acordo com
o planejamento estatal [...]”.
Cumpre observar que a possibilidade da instituição de benefícios fiscais com
a finalidade de estimular a implantação de uma política pública de tributação
ambiental passa pela análise do art. 155, XII, alínea “g” da Carta Política de 198880.
Partindo-se da premissa imposta pela Carta Magna de 1988 nos arts. 150,
§6° e 155, XII, “g”, os quais enunciam que os benef ícios fiscais instituídos devem
78 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III - a dignidade da pessoa humana. 79 Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais. 80 Art. 155. XII - cabe à lei complementar: g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.
99
obedecer aos pressupostos constitucionais, passa-se analisar o conteúdo desses
artigos.
Não pode haver a concessão unilateral de benefícios fiscais pelos Estados e
pelo Distrito Federal em matéria de ICMS. Consoante estabelece a Constituição
Federal de 1988, a forma de deliberação interestadual para a concessão de
incentivos fiscais, em matéria de ICMS, é firmada através de convênio. Dessa
maneira, os Estados Federados e o Distrito Federal, querendo conceder benefícios
fiscais de ICMS, devem, previamente, firmar entre si convênios, conforme
estabelece o art. 155, §2º, XII, “g” da CF/88.
Segundo Carraza (2000, p.149),
Tais Convênios são celebrados no Conselho Nacional de Política Fazendária - CONFAZ. Nele tem assento representantes de cada Estado e do Distrito Federal, indicados pelo respectivo Chefe do Executivo. Normalmente, tal indicação recai sobre o Secretário da Fazenda, que, longe de ser o representante do povo de sua unidade federativa, não passa de um preposto do Governador. Assentadas estas premissas, fica fácil proclamar que convênio não é lei, nem o CONFAZ órgão legislativo. Assim, os funcionários do Poder Executivo que o integram não podem, a pretexto de dispor sobre isenções, “legislar” a respeito. É o Poder Legislativo de cada Estado e do Distrito Federal – onde têm assento os representantes do povo local – que, ratificando o convênio, as concederá [...].
Nessa perspectiva, enfatiza Carraza (2000) que os Estados e o Distrito
Federal devem, para conceder incentivos fiscais a título de ICMS, firmar entre si
convênios. Não são eles, porém, que os criam; apenas integram o processo
legislativo necessário à concessão desses benefícios fiscais, pois eles surgem – ou
deveriam surgir - do Decreto Legislativo ratificador do convênio interestadual,
entendimento que não é compartilhado por Nelson Jobim – Ministro do STF na Ação
Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) 3.462-6/PA81.
81 AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE (ADIn) n° 3.46 2-6/PA- (Medida Cautelar)- Explicação do Voto – Então, uma coisa é uma lei estadual autônoma que concede subsídio – se atendidos os requisitos, tudo bem –; outra, são os subsídios concedidos pelo Poder Executivo com base nos convênios tomados pela unanimidade dos Estados. Para esses, não há necessidade de lei, pois estão autorizados pelo Governo.
100
Nesse diapasão é a lição de Alcides Jorge Costa (1979, p.130): “Os
convênios são uma fase peculiar do processo legislativo, em matéria de isenções de
ICMS. Fase que limita a competência das Assembléias Legislativas, mas que não
pode eliminá-la.”
Para Carraza (2000) é imperioso que todos os Estados e o Distrito Federal
ratifiquem o convênio interestadual, para que os benefícios fiscais de ICMS venham
a surgir. Ademais, a Constituição Federal exige que eles se coloquem de acordo,
para que tal benefício passe a ter existência jurídica. Assim, é para evitar a “guerra
fiscal” entre as diversas regiões do País, cujos efeitos são nocivos, que esse
entendimento é perfilhado na ADIn 902/SP pelo Supremo Tribunal Federal82.
E, Carrazza (2000, p.149-150) prossegue enfatizando
[...] observamos, ainda, que a lei complementar prevista no art. 155, §2°, XII, “g”, da CF/88, não poderá estabelecer o conteúdo dos convênios, mas, apenas, os mecanismos jurídicos que nortearão sua celebração. Tal lei complementar deverá, pois, limitar-se a dar operatividade técnica ao sistema de celebração, nem, muito menos, estipular seu conteúdo. Tem, pois, caráter meramente formal, devendo evidentemente respeitar os princípios e normas constitucionais [...].
Percebe-se que a lei complementar não disporá sobre o conteúdo dos
convênios, mas irá dar o contorno formal a eles. O que acaba ocorrendo é que os
Estados estipularem os benefícios fiscais sem passar pelo crivo do CONFAZ, com
base exclusivamente em lei formal estadual.
82 ADIn 902/SP-Min. Marco Aurélio- [...] Dispõe o artigo 155, §2°, inc. XII, alínea “g”, da Constituição Federal, que à lei complementar cabe regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados. A norma é de abrangência maior, no que cogita não apenas de isenções, mas também de incentivos e benefícios fiscais. Não se trata de inovação da Carta de 1988, razão pela qual, ao menos de início, deixo de evocar o que se contém no art. 34, §, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, ressaltando, no entanto, que o preceito respectivo também cuida de convênio a ser celebrado pelos Estados. Na espécie, o que se nota e que, mediante decreto, o Estado de São Paulo introduziu benefício fiscal que tem inegável repercussão na política de incentivo de outros Estados, objetivando a manutenção e o alargamento do próprio parque industrial. [...] Quanto à relevância do tema, constata-se que se relegou a plano secundário a necessidade de o benefício estar disciplinado, no tocante às linhas gerais, e nestas situa-se o convênio, à lei complementar. O risco decorre da desigualdade estabelecida e, portanto, da possibilidade de prejuízo para o Estado do Paraná, relativamente à extensão do respectivo parque industrial [...].
101
O STF já se manifestou a respeito na Ação Direta de Inconstitucionalidade-
ADIN n° 1.247-9-PA-TP-Rel. Min. Celso de Mello-DJU 08.09.199583., julgando
inconstitucional o incentivo fiscal que não observasse os pressupostos
constitucionais estabelecidos na Constituição Federal de 1988.
Em matéria de “Guerra Fiscal”, Melo (2003) pondera que os benefícios fiscais
concebidos pelos Estados ao arrepio de convênios, favorecem indevidamente
determinados empreendimentos estabelecidos numa determinada unidade
federativa. Menciona que os Estados e o Distrito Federal que se sentem
prejudicados – em razão da fuga de empresas para outras regiões do país –
possuem substancial fundamento para pleitear a invalidação dos incentivos
outorgados unilateralmente. Nesse entendimento, cita as seguintes decisões do
Supremo Tribunal Federal (STF); ADIn n° 2.352-7 – M edida Liminar – SP - rel. Min.
83 AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE-INEXISTÊNCIA DE PRAZO DECADENCIAL – ICMS – CONCESSÃO DE ISENÇÃO E DE OUTROS BENEFÍCIOS FISCAIS, INDEPENDEN-TEMENTE DE PRÉVIA DELIBERAÇÃO DOS DEMAIS ESTADOS-MEMBROS E DO DISTRITO FEDERAL – LIMITAÇÕES CONSTITUCIONAIS AO PODER DO ESTADO-MEMBRO EM TEMA DE ICMS (CF, ART. 155, §2°, XII, G) – NORMA LEGAL QUE VEICULA INADMISSÍVEL DELEGAÇÃO LEGISLATIVA EXTERNA AO GOVERNADOR DO ESTADO – PRECEDENTES DO STF – MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA EM PARTE – AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE E PRAZO DECADENCIAL-[...] ICMS E REPULSA CONSTITUCIONAL À GUERRA TRIBUTÁRIA ENTRE OS ESTADOS-MEMBROS – O legislador constituinte republicano, com o propósito de impedir a “guerra tributária” entre os Estados-membros, enunciou postulados e prescreveu diretrizes gerais de caráter subordinante destinados a compor o estatuto constitucional do ICMS. Os princípios fundamentais consagrados pela Constituição da República, em tema de ICMS, (a) realçam o perfil nacional de que se reveste esse tributo, (b) legitimam a instituição, pelo poder central, de regramento normativo unitário destinando a disciplinar, de modo uniforme, essa espécie tributária, notadamente em face de seu caráter não-cumulativo, (c) justificam a edição de lei complementar nacional vocacionada a regular o modo e a forma como os Estados-membros e o Distrito Federal, sempre após deliberação conjunta, poderão por ato próprio, conceder e/ou revogar isenções, incentivos e benefícios fiscais. CONVÊNIOS E CONCESSÃO DE ISENÇÃO, INCENTIVO E BENEFÍCIO FISCAL EM TEMA DE ICMS – A celebração dos convênios interestaduais constitui pressuposto essencial à válida concessão, pelos Estados-membros ou Distrito Federal, de isenções, incentivos ou benefícios fiscais em tema de ICMS. Esses convênios – enquanto instrumentos de exteriorização formal do prévio consenso institucional entre as unidades federadas investidas de competência tributária em matéria de ICMS – destinam-se a compor os conflitos de interesses que necessariamente resultariam, uma vez ausente essa deliberação intergovernamental, da concessão, pelos Estados-membros ou Distrito Federal, de isenções, incentivos e benefícios fiscais pertinentes ao imposto em questão. O pacto federativo, sustentando-se na harmonia que deve presidir relações institucionais entre as comunidades políticas que compõem o Estado Federal, legitima as restrições de ordem constitucional que afetam o exercício, pelos Estados-membros e Distrito Federal, de sua competência normativa em tema de exoneração tributária pertinente ao ICMS. MATÉRIA TRIBUTÁRIA E DELEGAÇÃO LEGISLATIVA – A outorga de qualquer subsídio, isenção ou crédito presumido, a redução da base de cálculo e a concessão de anistia ou remissão em matéria tributária só podem ser deferidas mediante lei específica, sendo vedado ao Poder Legislativo conferir ao Chefe do Executivo a prerrogativa extraordinária de dispor, normativamente, sobre tais categorias temáticas, sob pena de ofensa ao postulado nuclear da separação de poderes e de transgressão ao princípio da reserva constitucional de competência legislativa. Precedente: ADIn 1.296/PE, Rel. Min. CELSO DE MELLO.
102
Sepúlveda Pertence - j. 19.12.2000-DJU 1-E de 9.3.2001, p.102; ADIn n° 1.577-0 –
Medida Liminar–RJ–Pleno-Rel. Min. Néri da Silveira -j. 17.4.97-DJU1-E de
31.8.2001, p.35.
No que concerne à “Guerra Fiscal”, no entendimento de Rodrigues (2003), a
Carta Magna de 1988 possui princípio Constitucional implícito que a veda. Trata-se
do princípio implícito da Harmonização Solidária das Políticas Tributárias Municipais,
o qual, se pode aplicar no tocante à “guerra fiscal” entre os Estados Federados.
Esse princípio é a concretização de um mandamento constitucional retirado de seu
contexto interno, cuja necessidade se originou de um fato social concreto, a guerra
fiscal entre Municípios, que pode ser aplicado na existente entre os Estados relativo
ao ICMS, partindo-se dos objetivos traçados pelo Preâmbulo Constitucional que
ajudaram a densificação84 de outras normas constitucionais, quais sejam: a
dignidade da pessoa humana, a solidariedade social, a cooperação e coordenação
da federação pela União.
Dessa forma, Rodrigues entende que o princípio da Harmonização Solidária
das Políticas Tributárias Municipais85, princípio este que é geral, implícito,
84 Densificar uma norma significa preencher, complementar e precisar o espaço normativo de um preceito constitucional, especialmente carecido de concretização, a fim de tornar possível a solução, por esse preceito, dos problemas concretos. (CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2000, p.1160). 85 Harmonização Solidária das Políticas Tributárias Municipais: um princípio constitucional, geral, implícito, delimitador das ações tendentes ao cumprimento da função social dos Municípios, pág. 250. “[...] Tem-se então que a CF/88 obriga que as relações entre Municípios sejam harmoniosas e amigáveis, devendo o direito à dignidade ser assegurado a todos os brasileiros, exigindo-se aqui que cada um respeite a dignidade dos demais e que não satisfaça as suas às custas das de outras pessoas, solidária portanto, percebendo-se a sociedade nacional como interdependente e com objetivos comuns. Esses objetivos somente são possíveis a partir da coordenação e da harmonização de tais relações pela União, mediante sua intervenção, a qual, aos moldes do que se prega em nível internacional, deve ter na cooperação sua viga mestra para o atingimento da função social do Estado, o Bem Comum. Esse visto como a efetivação de uma vida digna para todos os brasileiros. Quanto ao princípio da igualdade, não foi o mesmo esquecido, mostrando-se de fundamental importância. Importância essa que reside, primeiramente, no fato de dever a União perceber todos os brasileiros como iguais em dignidade. Sob esse fundamento, a União, juntamente com os demais entes federados, ao compilar um planejamento de desenvolvimento nacional, dadas as diferenças e peculiaridades regionais existentes, deve prever, de forma absolutamente planejada e coerente, a possibilidade de incentivos tributários para determinados Municípios, ou seja, deve de alguma forma, não prejudicando quaisquer Municípios, buscar a redução de desigualdades. Quanto ao campo de aplicação do princípio concretizado, tem-se que o mesmo deve ser aplicado para coibir qualquer política tributária que seja manifestamente contrária à solidariedade entre Municípios e ao respeito à dignidade dos munícipes de outra unidade federada.[...] Cabe, quanto a tais manifestações, lembrar que as características da federação brasileira, bem como os limites da autonomia dos entes federados, têm de ser tirados do próprio texto constitucional, dentro de um contexto histórico, tendo-se por inaceitável a hierarquização das normas constitucionais.
103
delimitador das ações tendentes ao cumprimento da função social dos Municípios,
tem o condão de impedir a existência da “guerra fiscal” entre Municípios com relação
aos impostos municipais. O mesmo princípio pode ser aplicado para impedir a
guerra fiscal entre os Estados a respeito do ICMS, pois o mesmo serve como
delimitador das ações tendentes ao cumprimento da função social dos Estados.
Após digressão a respeito dos pressupostos a serem observados na
formulação e adoção de uma política pública de tributação ambiental, através da
utilização de benefícios fiscais dinâmicos, ou ditos incentivos fiscais, os quais se
valerão da faculdade instituída pela Carta Magna de 1988 do princípio da
seletividade – art. 155, §2°, III da CF/88 86 –, em matéria de ICMS, parte-se para o
exemplo prático com o objetivo de visualizar e demonstrar a implementação de uma
política pública de tributação que caminhe ao encontro do desenvolvimento
sustentável.
Utiliza-se como exemplo a possibilidade da adoção de créditos presumidos
para as empresas que venham a adquirir veículos a álcool, bem como, veículos
bicombustíveis, podendo-se estabelecer percentuais diferentes, como, por exemplo,
9% para os a álcool e 7% para os bicombustíveis. Diga-se aqui que este será
realizado independentemente do crédito relativo à entrada do bem. Antes da
alteração do art. 20, §5° da Lei Complementar n° 87 /96, o crédito na entrada do bem
se dava de forma imediata e integral; após o acréscimo do inciso I, pela Lei
Complementar n° 102/2000 87, o crédito passou a ser na proporção de 1/48, ou seja,
na medida de sua depreciação.
Assim, a proibição de guerra fiscal e a imposição de um planejamento de desenvolvimento nacional, por conviverem harmoniosamente com o princípio federativo, sendo densificadores desse princípio, não permitem vislumbrar, em conseqüência, qualquer inconstitucionalidade na aplicação do princípio proposto, o mesmo ocorrendo em relação a outras normas, constitucionais ou infraconstitucionais, bem como em decisões judiciais, que venham exigir o seu cumprimento ou, de forma expressa, venham de alguma forma discipliná-lo. [...]” 86 Art. 155. § 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: III - poderá ser seletivo, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços. 87 Lei Complementar n° 102/2000 – Ver nota de rodapé 7 4 da pág. 96.
104
Tal observação é referida por Carraza (2005, p.301):
Nada impede, todavia, que, respeitadas as diretrizes do princípio da não-cumulatividade, a legislação faculte ao contribuinte recolher o ICMS a seu cargo, utilizando-se, em substituição à forma convencional acima sumariada, do chamado sistema de créditos presumidos. Este sistema consiste em outorgar ao contribuinte um crédito fiscal que não corresponde ao resultante das efetivas entradas, em seu estabelecimento, de mercadorias, matérias-primas e outros insumos. Tal crédito fiscal, por força da legislação de regência, passa a ser utilizado como medida de pagamento do ICMS. Convém que se frise, no entanto, que desta utilização não podem decorrer nem a restrição do alcance do princípio da não-cumulatividade do ICMS nem, tampouco, conseqüências detrimentosas para o contribuinte. Logo, do crédito presumido só podem advir maiores vantagens para o contribuinte que as que teria pelo sistema convencional de crédito-débito.
Nessa esteira, cabe mencionar que a adição do sistema de crédito/débito não
poderá resultar em qualquer restrição ao princípio da não-cumulatividade, que é
expressamente estabelecida pelo art. 155, §2°, I da CF/88.
Ademais, está em voga a crise do petróleo que, segundo dados jornalísticos,
pode terminar em 50 anos88 e, também, a crise dos efeitos nocivos que o mesmo
traz para o planeta no chamado “efeito estufa” – conceito: O Efeito Estufa consiste,
basicamente, na ação do dióxido de carbono e outros gases sobre os raios
infravermelhos refletidos pela superfície da terra, reenviando-os para ela, mantendo
assim uma temperatura estável no planeta. Ao irradiarem a Terra, parte dos raios
luminosos oriundos do Sol são absorvidos e transformados em calor, outros são
refletidos para o espaço, mas só parte destes chega a deixar a Terra, em
conseqüência da ação refletora que os chamados "Gases de Efeito Estufa"89 têm
sobre tal radiação reenviando-a para a superfície terrestre na forma de raios
infravermelhos.
Além disso, a eficiência do combustível feito a partir de cana-de-açúcar é um
dos motivos que atrai a atenção do mundo pelo álcool brasileiro. Cada unidade de
energia gasta para processar um litro de álcool é multiplicada por oito com a queima
88 “[...] Além disso, o álcool e o biodiesel ganham espaço na agenda mundial à medida que pesquisadores se convencem do fim das reservas de petróleo nas próximas décadas. O diretor do centro de estudo do Petróleo (Cepetro) da Unicamp, Saul Sislick, afirma que a disponibilidade do produto deve durar somente mais 50 anos [...]’ (SANTI, Alexandre de. Reportagem de Zero Hora. Porto Alegre, 12/02/2006, pag. 26).
105
do combustível. Ou seja, a transformação da cana em etanol resulta, na prática, em
mais energia para a sociedade e tem menor custo90.
Impende salientar, ainda, que as pesquisas realizadas no Brasil resultaram
em uma concepção tecnológica superior à norte-americana. Enquanto nos Estados
Unidos da América - EUA os veículos “flex fuel” foram derivados dos veículos à
gasolina, no Brasil aproveitou-se a vasta experiência com os veículos a álcool, que
são equiparados com motores de taxa de compressão mais elevada. Dessa forma, o
conceito “flex fuel” nacional se mostra melhor em termos de desempenho e
economia de combustível, além de possibilitar o uso de até 100% de álcool, o que
não ocorre nos (EUA), onde o conteúdo máximo de álcool é 85%91.
Em face da relevância que o álcool possui no cenário nacional como
biocombustível92 e por ser considerado combustível mais “limpo” que a gasolina, por
conseqüência acaba poluindo em menor quantidade o meio ambiente.
Assim, propõe-se que seja estabelecido esse benefício fiscal dinâmico ou o
incentivo fiscal através de convênio, com o escopo de que seja possível a utilização
do sistema de crédito presumido conforme supra-indicado para aquelas empresas,
sejam comerciais ou industriais, que vierem a adquirir veículos a álcool e, também,
para os bicombustíveis, uma vez que esses contemplam a utilização de gasolina e
álcool, mas com diferença de percentual a ser aproveitado, de maneira a estimular
de forma mais efetiva os veículos que utilizam exclusivamente o álcool.
Essa política pública de tributação ambiental fará com que seja impulsionada
a venda dos veículos a álcool e bicombustíveis, os quais são mais propícios para o
meio ambiente, ou seja, são mais “limpos” que os veículos movidos à gasolina.
No caso específico, não há contrariedade ao art. 14 da Lei de
Responsabilidade Fiscal93, pois não será configurada nenhuma renúncia fiscal, de vez
89 Dióxido de carbono, metano, clorofluorcarbonetos - CFCs- e óxidos de azoto. 90 Conforme reportagem de Alexandre Santi, publicada no Jornal Zero Hora, do dia 12/02/2006, p.26. 91 Matéria publicada na Gazeta Mercantil / Página A3 – Colunistas. Terça-feira, 15 de abril de 2003, por Alfred Szwarc- Diretor da ADS Tecnologia e Desenvolvimento Sustentável e membro do Conselho Diretor da Associação Brasileira de Engenharia Automotiva.
106
que, apesar da possibilidade de utilizar o crédito de modo mais rápido, o que gerará
um valor maior a título de crédito de ICMS, entretanto não reduzirá o valor recolhido
mensalmente, porque as vendas dos veículos contemplados pela adoção do benefício
fiscal aumentarão, fazendo com que seja maior a arrecadação a título de ICMS.
Frisa-se que, para Carraza (2005), o convênio tem que ser ratificado através
de decreto legislativo em cada Estado Federado, com a finalidade de vigorar no
mesmo - art. 150, §6° e art. 155, §2°, XII “g” da C F/8894.
Se propõe essa forma de benefício fiscal dinâmico (crédito presumido),
porquanto o sistema crédito/débito foi proposto pela Lei Complementar n° 102/00
que alterou o art. 20, §5°, acrescentando o inciso I95. Alguns doutrinadores, como
Carraza (2005), Melo (2003), posições que serão mais adiante citadas, consideram
inconstitucional, de vez que a Lei Complementar que venha a tolher a possibilidade
de a empresa utilizar-se do creditamento de bens do ativo fixo de forma integral e
imediata, como era preconizado pelo art. 20 da Lei Complementar n° 87/96, que
seguia o art. 155, §2°, I da Carta Política de 1988 , está maculada pelo vício da
inconstitucionalidade material.
Nesse diapasão é a posição de Coelho (2005, p. 514-516):
A Constituição de 1988 não delegou à lei complementar estatuir o perfil da não-cumulatividade; a ela apenas conferiu o disciplinamento adjetivo do regime de compensação do ICMS. O art. 155, §2°, I, prescreve que o ICMS será não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal. Assim sendo, o montante suportado pelos agentes da circulação no exercício de suas atividades, como contribuintes de fato do ICMS (aquisição de bens para uso ou consumo e bens do ativo fixo), autoriza o adquirente e o tomador de serviços, na qualidade de contribuintes de jure, situados num ponto qualquer da cadeia de circulação, a se
92 São combustíveis elaborados a partir de vegetais ou compostos de origem animal, como gordura. 93 Art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal – Ver nota de rodapé da pág.84. 94 Art. 150, §6. Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, §2°, XII, g. Art. 155. § 2º XII - cabe à lei complementar: g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados. 95 Lei Complementar n° 102/00 – Ver nota de rodapé 7 6 da pág. 96.
107
creditarem do imposto sem qualquer distinção, e deduzi-lo de suas operações tributadas, pois tudo é custo operacional, como exatamente ocorre com os IVAS europeus e latino-americanos[...]. Não obstante, leis complementares posteriores à de n° 87/96 continuaram a regrar o crédito decorrente da aquisição de bens do ativo fixo (parcelando-o) e de uso e consumo (postergando-o), ao meu sentir, sem poder fazê-lo
Essa posição também é compartilhada por Melo96 entendendo que a Lei
Complementar n° 102/2000, a qual alterou o art. 20, §5°, acrescentando o inciso I à
Lei Kandir (87/96), nesse tópico é inconstitucional, em face de contrariar preceito
constitucional - art. 155, §2°, I da Constituição F ederal de 1988, que prescreve a
não-cumulatividade, princípio que seria aplicado de forma imediata e integral, não
podendo ser restringido seu alcance através de norma infraconstitucional, estando
viciado pela inconstitucionalidade material.
Portanto, é possível construir e implementar uma política de tributação
ambiental, usando a extrafiscalidade tributária e as características dos impostos
existentes, como por exemplo, o princípio da seletividade, que pode ser aplicado ao
IPI e ao ICMS, com o objetivo de alavancar o consumo e a produção de bens que
propiciem desenvolvimento econômico com um menor custo para o meio ambiente e
para as gerações presentes e, principalmente, para as futuras, as quais possam
desfrutar de um ambiente mais sadio e com melhor qualidade de vida em nosso
planeta.
96 “[...] A CF confere competência à Lei Complementar para “disciplinar o regime de compensação do imposto” (art. 155, XII, c), o que jamais pode implicar restrição ou limitação ao direito de abatimento do ICMS incidente nas operações e prestações anteriores. Fundamentado nos léxicos, fora apurado que “disciplinar” não é alterar, não é retirar direitos, não é conceder privilégios, não é suprimir, não é adulterar, não é violar direitos, não é transigir ´pro domo sua´. Assim, “disciplinar a não-cumulatividade” apenas consiste na fixação de elementos necessários à operacionalização do regime de abatimento dos valores tributários, mediante a consideração de documentos periódicos de apuração, alocação a estabelecimentos do contribuinte, sistemática de transferências, etc. No ato de disciplinar, não pode o legislador complementar determinar, ou especificar os bens, produtos, mercadorias e serviços que permitem (ou não) o crédito do imposto; nem também fracionar esse direito a período de tempo ou utilização. O legislador infraconstitucional não é o dono do ICMS,
108
3.2.2.1 ICMS ecológico
Cumpre aqui fazer referência ao ICMS Ecológico, o qual pode ser utilizado
pelos municípios brasileiros com a finalidade de implementar uma política pública de
tributação, embora o trabalho seja mais voltado à adoção de alternativas para
incrementar e fazer com que o setor privado venha a aderir e propiciar um
desenvolvimento econômico que não esteja dissociado da preocupação da proteção
do meio ambiente. Não se pode, porém, deixar de mencionar a alternativa que pode
ser de grande valia para o Brasil. A possibilidade de o Estado estabelecer uma
diretriz para a atividade econômica que contemple o supramencionado está
expressamente consagrada no art. 174 caput da Constituição Federal de 198897.
Esse é o entendimento de João Bosco Leopoldino da Fonseca (2005, p. 139):
[...] o artigo 174 da Constituição Federal vem delinear qual será o papel do Estado dentro do contexto da Nova Ordem Jurídico-Econômica. Aí está preceituado que a atuação do Estado se dará como AGENTE NORMATIVO E REGULADOR da atividade econômica. Dentro dessa sua nova configuração, terá ele, precipuamente, três funções: FISCALIZAR, INCENTIVAR e PLANEJAR. A partir da Constituição Federal de 1988, as atividades ditas essenciais do Estado são aquelas discriminadas no Título VIII da Lei maior, ou seja, a seguridade social, saúde, educação e demais problemas correlatos. No âmbito da economia, o Estado assume importante função, qual seja a de zelar superiormente e garantir, através da fiscalização, incentivo e planejamento, a eficácia dos princípios traçados no artigo 170 CF [...].
E através desse planejamento, o qual é determinante para o setor público
buscar a eficácia dos princípios estabelecidos no artigo 170 da Constituição Federal
de 1988, o qual está inserindo a defesa do meio ambiente - art.170, VI, é que se
está adotando nos Estados a política da tributação ambiental denominada de “ICMS
Ecológico”.
pois deve obediência às diretrizes constitucionais e aos superiores princípios nelas constantes, não podendo subverter a ordem jurídica e os postulados econômicos [...]. (Melo, 2003, p. 217). 97 Art. 174- Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.
109
Nesse cotejo, em face da repartição tributária estatuída especificamente no
art. 158, inciso II, parágrafo único98 da Carta Magna de 1988, surgiu o ICMS
ecológico. Conforme Lobato e Almeida (2005), o Estado do Paraná foi o pioneiro,
criando-o através da Lei Complementar Estadual n° 5 9/91, a qual, diga-se aqui, não
representa uma nova modalidade de tributo, uma vez que não houve modificação do
seu fato gerador. A sua caracterização, enquanto imposto ambiental, está localizada
na forma de sua destinação, quanto à repartição tributária entre os Municípios.
Para Lobato e Almeida (2005, p. 637),
[...] o ICMS ecológico introduz um novo critério na redistribuição da receita tributária, trata-se do critério ambiental. Dessa forma, a constituição federal de 1988 estabelece, no seu art. 158, IV, que 25% do ICMS devam ser repassados aos Municípios; 75% dos 25% constituem a parcela determinada através de rígida aferição decorrente da participação dos próprios Municípios na arrecadação do ICMS. O percentual restante e correspondente a 25% poderá ser distribuído de acordo com o que dispuser a lei estadual. Nesse percentual, situa-se a possibilidade do emprego do critério ambiental desde que devidamente estabelecido na lei.
O ICMS ecológico serve como um instrumento econômico por indução
extrafiscal, com o objetivo constitucional de preservação do meio ambiente,
promovendo justiça fiscal de maneira que venha a influenciar na ação voluntária dos
Municípios que visam ao aumento de receita na busca de melhor qualidade de vida
para suas populações.
Segundo Fernando Facury Scaff e Lise Vieira da Costa Tupiassu (2005, p.
735), “[...] a política do ICMS ecológico representa uma clara intervenção positiva do
Estado, como um fator de regulação não coercitiva, através da utilização de uma
forma de subsídio fiscal [...]”.
98 Art.158. Pertencem aos municípios: II - cinqüenta por cento do produto da arrecadação do imposto da União sobre a propriedade territorial rural, relativamente aos imóveis neles situados, cabendo a totalidade na hipótese da opção a que se refere o art. 153, § 4º, III. Parágrafo único. As parcelas de receita pertencentes aos Municípios, mencionadas no inciso IV, serão creditadas conforme os seguintes critérios: I - três quartos, no mínimo, na proporção do valor adicionado nas operações relativas à circulação de mercadorias e nas prestações de serviços, realizadas em seus territórios; II - até um quarto, de acordo com o que dispuser lei estadual ou, no caso dos Territórios, lei federal.
110
Lobato e Almeida (2005) salientam que o ICMS ecológico surgiu com o
objetivo de compensação, isto é, e pretendia ser um instrumento de recompensa
para os Municípios que possuíam no seu território áreas protegidas, constituídas
através de unidades de conservação ou mananciais de abastecimento de água, que
não podiam ser utilizadas e eram analisadas como um bloqueio ao desenvolvimento
econômico.
Assim, o ICMS ecológico torna-se uma importante peça que pode servir para
uma política pública de tributação ambiental, pois a utilização da extrafiscalidade
tributária transforma esse imposto e o impulsiona no escopo de alcançar o desejado
desenvolvimento sustentável. Para Lobato e Almeida (2005, p. 638),
O ICMS ecológico transforma-se em um instrumento de incentivo de maneira que os Municípios viram-se estimulados a adotar medidas tendentes à conservação ambiental e ao desenvolvimento sustentável. Ocorreu na realidade uma indução para a criação de unidades de conservação ou para a manutenção dos já existentes, incorporando novas tecnologias na promoção do equilíbrio ecológico, o que trouxe como conseqüência um maior desenvolvimento econômico.
Hoje, além do Estado do Paraná que foi o pioneiro (1991), já se encontra
implantado o ICMS ecológico em Minas Gerais, Rondônia, São Paulo, Mato Grosso
do Sul, Mato Grosso, Rio Grande do Sul, Tocantis e Pernambuco. Outros Estados
possuem projetos tramitando nas Assembléias Legislativas, como, por exemplo,
Pará, Rio de janeiro, Santa Catarina e Ceará.
No entendimento de Scaff e Tupiassu (2005, p. 736), “[...] cada um dos
Estados que se utilizam do sistema estabelece diferentes montantes a serem
repartidos segundo a apreciação de diferentes aspectos ecológicos sociais [...]”. O
que é relevante nessa adoção de política pública de tributação ambiental é que não
há elevação da carga tributária que já é enorme, pois não se cria tributo novo, não
aumenta o ônus financeiro para o Estado, de vez que se trata da adoção de
parâmetros ambientalmente relevantes para a repartição das receitas arrecadadas,
confirmam os dois autores.
111
Como experiência prática da implementação do ICMS Ecológico nos estados
brasileiros tem-se o Estado do Paraná, que em 1890 possuía 83,41% de seu
território com cobertura vegetal, conforme Maak (1968), passando em 1930 para
64,12% e em 1965 para 23,92%, de acordo com Gubert Filho (1990)99.
Conforme Santana (2004), a Lei Complementar Estadual nº 59/91100 que foi
pioneira na implantação de uma política pública de tributação ambiental, através do
uso da extrafiscalidade tributária criou o ICMS ecológico a partir do estabelecimento
de critérios ecológicos para a participação dos Municípios em 1% da arrecadação
total do ICMS (1991) e no ano de 1999 já constatou um aumento total da superfície
ocupada por unidades de conservação na ordem de 142,82%, principalmente
através da criação de reservas particulares do patrimônio natural (RPPNs) e de
parques estaduais.
Santana (2004, p. 25) enfatiza que
Em São Paulo o ICMS ecológico foi estabelecido inicialmente pela Lei Estadual n° 8.510/93, que destinou 0,5% da receita do imposto para os Municípios em função dos espaços legalmente protegidos existentes em relação ao total existente no Estado, segundo coeficientes de ponderação que conferem peso 1,0 às estações ecológicas, 1,0 às reservas biológicas, 0,8 aos parques estaduais, 0,5 às zonas de vida silvestre em áreas de proteção ambiental, 0,2 às reservas florestais, 0,1 às áreas de proteção ambiental e 0,1 às áreas naturais tombadas e 0,5% para os Municípios que abriguem reservatórios de água destinados à geração de energia elétrica.
Ademais, prossegue Santana (2004), a Lei Estadual n° 9.146/95 revogou a lei
n° 8.510/93 criando novos mecanismos de compensação financeira para Municípios
que contivessem espaços territorialmente protegidos e condicionando novos
critérios, de acordo com o tipo de unidade de conservação: estações ecológicas,
reservas biológicas, parques estaduais, zonas de vida silvestre, reservas florestais,
áreas de proteção ambiental, áreas naturais tombadas e áreas de proteção aos
99 Disponível em: www.ambientebrasil.com.br/composer.php3?base=./snuc/index. htmlconteudo=. /snuc/artigos/icms.html).ISSO - Artigo de LOUREIRO, Wilson. 100 Lei complementar Estadual do Paraná nº 59/91: Dispõe sobre a repartição de 5% do ICMS, a que alude o art. 2º da Lei nº 9.491/90, aos municípios com mananciais de abastecimento e unidades de conservação ambiental, assim como adota outras providências (ICMS Ecológico). (Instituto Ambiental do Paraná. Disponível em: http://www.pr.gov.br/meioambiente/iap/bio_icms_legis.shtml. Acesso em 30/01/2006.
112
mananciais declarados por lei estadual. Também a Lei Estadual n° 10.544, de
27/04/2000, institui novos critérios para o repasse do imposto do Estado para os
Municípios que contiverem áreas de proteção de mananciais, cursos e reservatórios
de água em seu território, bem como restrições ao uso do solo para fins industriais e
habitacionais.
Scaff e Tupiassu (2005) afirmam que muitas áreas do Estado de São Paulo
foram beneficiadas, como, por exemplo, a região do Vale da Ribeira, onde as
possibilidades de desenvolvimento produtivo se mostravam bastante limitadas em
função das proibições de pesca e extrativismo.
Conforme Leo Pompeo de Rezende Campos (2006, www.mma.gov.br/port/sds/
/index.cfm.)
Com o ICMS ecológico, os Municípios localizados nesta área de Mata Atlântica já se sentem mais recompensados, buscando alternativas para o seu desenvolvimento, aplicando vultosos recursos em projetos de ecoturismo. Aliás, com a implantação do novo sistema de eco-repartição financeira, verificou-se um sensível aumento de receita em cerca de 23,56% dos Municípios de São Paulo[...].
Os Municípios passaram a ter, pelos critérios do ICMS ecológico, maior
parcela de seus recursos, representando fundamental avanço em prol do
desenvolvimento. A título de exemplo, contesta Carlos José Caetano Bacha e Pery
Francisco Assis Shikida (1999), veja-se o caso de Iporanga, cujo percentual de 77%
de todo o repasse de ICMS a que faz jus é proveniente dos critérios ecológicos.
Como se verifica, a transferência, segundo parâmetros ecológicos, da parcela
do ICMS pertencente aos Municípios representa um redimensionamento de valores,
porquanto modifica o valor de verbas orçamentárias a ser recebido por Município,
beneficiando aqueles que venham a contribuir com a proteção do meio ambiente.
Scaff e Tupiassu (2005) ressaltam que o ICMS ecológico não vai de encontro
à renúncia fiscal enfatizada no art. 14 da Lei n° 1 01, de 04.05.2000, de vez que não
se faz necessário haver renúncia fiscal. Caberá aos Tribunais de Contas dos
Estados (no exercício de suas funções constitucionalmente definidas no art. 71 da
113
CF/88101), o acompanhamento e a fiscalização dos repasses financeiros, da
utilização dos valores recebidos e da busca pelo seu incremento, bem como o
exame da veracidade das informações prestadas, que basearam a distribuição.
Da mesma forma que o imposto sobre produtos industrializados, o ICMS
ecológico tem de estar consentâneo com os princípios constitucionais tributários
consagrados na Carta Política de 1988, tais como: princípios da legalidade, da
igualdade, do não-confisco e da capacidade contributiva. Assim, sendo
constitucionalmente assegurado a participação dos Municípios em 25% do ICMS
101 CF/88 - Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete: I - apreciar as contas prestadas anualmente pelo Presidente da República, mediante parecer prévio que deverá ser elaborado em sessenta dias a contar de seu recebimento; II - julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público; III - apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal, a qualquer título, na administração direta e indireta, incluídas as fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, excetuadas as nomeações para cargo de provimento em comissão, bem como a das concessões de aposentadorias, reformas e pensões, ressalvadas as melhorias posteriores que não alterem o fundamento legal do ato concessório; IV - realizar, por iniciativa própria, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, de Comissão técnica ou de inquérito, inspeções e auditorias de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, nas unidades administrativas dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, e demais entidades referidas no inciso II; V - fiscalizar as contas nacionais das empresas supranacionais de cujo capital social a União participe, de forma direta ou indireta, nos termos do tratado constitutivo; VI - fiscalizar a aplicação de quaisquer recursos repassados pela União mediante convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos congêneres, a Estado, ao Distrito Federal ou a Município; VII - prestar as informações solicitadas pelo Congresso Nacional, por qualquer de suas Casas, ou por qualquer das respectivas Comissões, sobre a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial e sobre resultados de auditorias e inspeções realizadas; VIII - aplicar aos responsáveis, em caso de ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, as sanções previstas em lei, que estabelecerá, entre outras cominações, multa proporcional ao dano causado ao erário; IX - assinar prazo para que o órgão ou entidade adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, se verificada ilegalidade; X - sustar, se não atendido, a execução do ato impugnado, comunicando a decisão à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal; XI - representar ao Poder competente sobre irregularidades ou abusos apurados. § 1º - No caso de contrato, o ato de sustação será adotado diretamente pelo Congresso Nacional, que solicitará, de imediato, ao Poder Executivo as medidas cabíveis. § 2º - Se o Congresso Nacional ou o Poder Executivo, no prazo de noventa dias, não efetivar as medidas previstas no parágrafo anterior, o Tribunal decidirá a respeito. § 3º - As decisões do Tribunal de que resulte imputação de débito ou multa terão eficácia de título executivo. § 4º - O Tribunal encaminhará ao Congresso Nacional, trimestral e anualmente, relatório de suas atividades.
114
arrecadado pelos Estados - art. 158, IV, da CF88102, é possível torna-se possível os
Municípios implementarem uma política pública de tributação ambiental, a qual
desde que observe o disposto na CF/88, por conseqüência, não estará
transgredindo os princípios constitucionais acima referidos. A principal diferença
entre o IPI e o ICMS é que, para aquele o princípio da seletividade é obrigatório,
sendo para este facultativo.
Frisa-se ainda que o ICMS ecológico tem, outrossim, como princípio fundamental e
relevante o da prevenção na esfera do direito ambiental.
Com efeito, o ICMS ecológico é um importante instrumento que pode ser
utilizado nos Estados como instrumento de política pública que concilie Tributação e
Preservação do Meio Ambiente, contribuindo para a imposição de um conteúdo
verdadeiramente substancial à tributação, e o que é mais importante, sem criar,
necessariamente, um novo tributo.
102 Art. 158. Pertencem aos Municípios: [...] IV - vinte e cinco por cento do produto da arrecadação do
imposto do Estado sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação.
115
CONCLUSÃO
Verificou-se, inicialmente, que o Estado Liberal possui sua base de
pensamento em momento anterior à formulação inglesa de Locke ou com a
revolução francesa, surgindo a partir da reivindicação de direitos políticos no final do
século XVII.
A burguesia teve relevância no processo de transição do absolutismo para o
Estado liberal, simbolizada através da Queda da Bastilha. Assim, com o surgimento
do Estado Liberal, tem-se o marco do Estado Moderno, ou seja, o poder não é de
pessoas, mas de leis. Salienta-se que um dos dogmas do Estado Liberal era a
ausência do Estado na sociedade, demonstrando comprometimento do
Constitucionalismo com a doutrina do liberalismo econômico.
O Estado Liberal estabeleceu os direitos de primeira geração (ou dimensão)
tais como: direito à vida, à liberdade, dentre outros. Teve como marco a impotência
que possui o “indivíduo” para o conteúdo do liberalismo clássico, no fato de que o
valor da personalidade era concebido como ilimitado e anterior ao Estado. O
capitalismo foi o modelo econômico adotado pela burguesia que tinha como
fundamentos princípios liberais (propriedade privada), liberdade, não-intervenção do
estado.
O Estado Liberal, que estava consubstanciado por um caráter individualista e
por igualdade apenas formal, não tinha o objetivo de terminar ou diminuir as
desigualdades econômicas e o sofrimento do povo, que vinha desde a época do
absolutismo.
116
Nesse passo, a passagem do Estado Liberal para o Social estava marcada
pela preocupação ao atendimento dos direitos de cunho social, tais como, educação,
saúde, que deveriam ser propiciados pelo Estado. Dessa maneira, o Estado
Constitucional Social se caracteriza por ser um Estado de liberdades positivas, com
a finalidade de estabelecer os direitos de segunda geração (ou dimensão), direitos
esses que precisam ser garantidos pelo Estado, como, por exemplo, saúde,
educação, lazer.
O cerne estatal desloca-se do individual para o social, alterando o modelo
jurídico, tendo como característica principal ser intervencionista, pela impossibilidade
que o indivíduo possui para prover certas necessidades existenciais mínimas.
Ressalta-se que o Estado Social não rompia com os princípios capitalistas,
sendo principalmente uma válvula de escape que impedia uma drástica ruptura do
aparelho estatal, apesar da inclusão formal de direitos sociais no ordenamento
jurídico positivado.
O Estado Social no Brasil surgiu tardiamente, calcado em uma sociedade de
cunho liberal, em que muitos dos direitos sociais estabelecidos não estão possuindo
eficácia. Na realidade, não se vivencia mais o Estado Social e dúvida existe se na
prática realmente se chegou a se estabelecer o Estado Social, pois inúmeros dos
direitos sociais apenas foram dispostos no papel, não chegando a ser concretizados.
Hodiernamente, está se vivenciando o Estado Neoliberal que se define como
a política econômica de abertura indiscriminada do mercado nacional ao
internacional. Frisa-se, ainda, que o neoliberalismo se caracteriza por ser um Estado
interventor, o qual prega a privatização de serviços vitais como: telefonia, energia,
dentre outros, em prol da iniciativa privada. O modelo Neoliberal surgiu como
decorrência da globalização que se assinala por um processo econômico que
modifica substancialmente as bases do comércio de produção e dos mercados que
transcendem a fronteira dos Estados, com ingerência nos Governos
correspondentes.
117
O modelo Neoliberal, sem conter instrumentos de freio e contrapeso, é o
modelo ideal para os grandes grupos mundiais estabelecerem suas idéias e seus
interesses, tendo a globalização como alavanca de seus interesses, o que acaba
ocasionando o enfraquecimento econômico-financeiro do Brasil, deteriorando até
mesmo as normas legais que servem de instrumento para a proteção da economia
do país.
Nesse passo, o Brasil não adotou instrumentos com o objetivo de conter os
efeitos nefastos da globalização, ficando submetido ao poder econômico dos
grandes grupos mundiais, fazendo com que as Leis e a Constituição Federal sejam
interpretadas ao crivo do poder econômico, reduzindo, assim, a força e o poder no
cenário interno dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
Quanto à função do Estado Brasileiro Contemporâneo, pode-se dizer que a
Constituição Federal de 1988 adotou o modelo capitalista com limitações, pois,
conforme os objetivos traçados nos arts. 1°, inciso IV, 3°, inciso III, 5°, inciso XXII e
170, inciso IV, da CF/88, está a ordem econômica fundada na valorização do
trabalho humano e na livre iniciativa, tendo, por fim, de assegurar a todos existência
digna, conforme os ditames da Justiça Social, possuindo como base a soberania
nacional, a propriedade privada, a defesa do meio ambiente, entre outros.
Ademais, a CF/88 dispõe que a função social do Estado Brasileiro é alcançar
o bem comum que, por sua vez, visa assegurar os direitos fundamentais e, dentre
esses, está inserida a defesa do meio ambiente. Como se percebe, o Brasil adotou
expressamente na Constituição Federal de 1988 um modelo capitalista com
temperamentos sociais, mas, na prática, o modelo liberal está impregnado,
destoando dos objetivos e princípios dispostos na Carta Política de 1988.
Quanto à questão das Políticas Tributárias, constata-se que o Estado pode
intervir por meio de políticas públicas tributárias, com a finalidade de implementar a
Tributação Ambiental, de maneira a conduzir o país ao “desenvolvimento
sustentável”.
118
Nesse diapasão, o primeiro passo inicia-se pela intervenção por indução,
consagrada por Grau, que são estímulos, incentivos de toda ordem, oferecidos pela
Lei a quem participe de determinada atividade de interesse geral, sendo
patrocinada, ou não, pelo Estado. A indução nem sempre se manifesta de modo
positivo porque pode aparecer em caráter negativo, quando vem a onerar, por
imposto majorado, o exercício de determinado comportamento, tal como importação
de determinados bens.
Dessa maneira, através da extrafiscalidade tributária, podem-se utilizar as
“sanções premiais” com o escopo de induzir os agentes econômicos a condutas que
visam à proteção do meio ambiente, sem perder de vista o desenvolvimento
econômico. O entrelaçamento desses termos, “direito tributário” e “meio ambiente”,
denomina-se “tributação ambiental”, o que é pouco discutido no Brasil.
Na presente dissertação, aborda-se a política pública de Tributação
Ambiental, tendo como instrumento a utilização da intervenção por indução, através
das “sanções premais”, com o intuito de estimular e conciliar desenvolvimento
econômico com preservação do meio ambiente. Os benefícios fiscais são
instrumentos usados com a finalidade de direcionar os setores produtivos a
desenvolverem atividades que consigam um nível de competitividade elevado, com
alicerce na política de defesa do meio ambiente; servem para alcançar os objetivos
propostos pelo caput do art. 170 - da Ordem Econômica - estipulada pela CF/88.
Adota-se o conceito consagrado por José Casalta Nabais no tocante aos
benefícios fiscais. Para ele, diferenciam-se benefícios fiscais “stricto sensu”, ditos
benefícios fiscais estáticos, dos incentivos ou estímulos fiscais, ditos benefícios
fiscais dinâmicos. Segundo o autor, os primeiros dirigem-se às situações que já
estão consumadas, que não visam, ao menos diretamente, fomentar, mas tão-
somente beneficiar, por superiores razões de política econômica, social, cultural. Já
os benefícios fiscais dinâmicos, visam incentivar determinadas atividades,
estabelecendo vantagens atribuídas às mesmas em termos de causa e efeito, isto é,
a causa é adoção (futura) do comportamento beneficiado da atividade incentivada.
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Nesta dissertação trabalha-se com os incentivos ou estímulos fiscais, ditos
benefícios fiscais dinâmicos. Estes submetem-se tanto aos princípios da ordem
econômica como aos da esfera tributária. Salienta-se que o direito tributário, aliado
aos direitos econômico e ambiental, deve, através dos incentivos fiscais, influir no
comportamento, de sorte a incentivar iniciativas positivas e desestimular as nocivas,
tendo como objeto tributos ambientais.
Dessa forma, o emprego dos tributos com fins extrafiscais ou regulatórios
constitui uma relevante ferramenta para a proteção e preservação do meio ambiente.
A Tributação Ambiental defendida no trabalho é de cunho positivo, através da
introdução de incentivos fiscais que têm como objeto os impostos indiretos
existentes na tributação brasileira (ICMS e IPI), contrariando assim o entendimento
de alguns doutrinadores, como Roberto Ferraz, que propunham a criação de uma
CIDE.
Ademais, os impostos oferecem um fértil campo extrafiscal, podendo ser
vastamente utilizados como instrumentos de tributação na esfera ambiental por meio
de mecanismos de graduação de alíquotas, reduções de base de cálculo, adoção de
créditos presumidos, visando desestimular processos produtivos que afetem
negativamente o meio ambiente. Exemplifica-se na dissertação a utilização dos
incentivos fiscais, ditos benefícios fiscais dinâmicos, tais como: subsídios e créditos
presumidos, ambos atuando no campo da despesa pública, conforme classificação
aqui adotada do autor Marcos Vinhas Catão.
Logo, para a adoção de uma política pública de Tributação Ambiental é
imprescindível a utilização da extrafiscalidade, pois ela tem por finalidade a
consecução de determinados resultados econômicos ou sociais, valendo-se do
direito tributário. Desse modo, a intervenção no domínio econômico através da
extrafiscalidade é um eficiente instrumento na adoção de uma política pública que
contemple a preservação do meio ambiente, de maneira que venha a estimular
comportamentos não-poluidores, tributando menos quem não polui. Contudo, no
Brasil, é incipiente ainda a utilização da extrafiscalidade com o intuito de preservar e
proteger o meio ambiente.
120
Nesse prisma, adotam-se os impostos indiretos dispostos no sistema
Constitucional (ICMS e IPI), como cerne de uma política pública de tributação
ambiental. Assim, na presente dissertação, exemplifica-se na prática a adoção da
extrafiscalidade, incentivada pelos benefícios fiscais dinâmicos, tendo como cenário
o fomento à produção de veículos a álcool.
Desse modo, fora demonstrado tanto na incidência do IPI como na do ICMS,
como esses impostos podem contribuir para o desenvolvimento econômico, sem
deixar de lado a defesa do meio ambiente para as presentes e futuras gerações.
Cabe ressaltar, ainda, que a adoção desses impostos como objeto de uma política
pública de Tributação Ambiental não vem transgredir o art. 14 da Lei de
Responsabilidade Fiscal e, também, os princípios constitucionais tributários
consagrados na CF/88.
Por fim, abordou-se o ICMS Ecológico, confirmando como esse imposto pode
ser útil e eficaz para a implementação de uma política pública por parte dos
Municípios que venham a fomentar o desejado “desenvolvimento sustentável”.
121
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