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brasileiros que estão acabando e disponibiliza todo o material na Internet. Conhecedor do assunto, o entrevistado da noite ainda discorreu sobre características parecidas entre alguns ritmos, que, no caso da música brasileira, têm em comum a base do baião. Alguns mais fortes, outros nem tanto, uns com muitos tambores ou apenas pontilhados por violas. A questão é que esses ritmos deixam de existir porque ninguém dá continuidade ou porque evoluem para um novo ritmo. Por exemplo, o samba vem do lundu, mas hoje é samba reggae, samba funk, e por aí vai. Fecha parênteses. Tal pensamento pode de alguma forma ser transportado para a realidade de várias vertentes musicais, inclusive da agora em pauta música eletrônica. Afinal, fazendo uma conta rápida e resumida da época da Warehouse, o house não parou de se transformar. O ritmo, ou estilo, como é costume chamar, alcançou os mais variados sobrenomes e, provavelmente, algumas batidas COMPORTAMENTO POR CAROLINA SCHUBERT A favor da música De acordo com o dicionário Aurélio, música é uma “organização de sons com intenções estéticas, artísticas ou lúdicas, variáveis de acordo com o autor, com a zona geográfica, com a época, etc”. Portanto, perder tempo falando mal do alheio está completamente fora de moda e jamais vai trazer algum benefício próprio ou para o grupo. Independente de vertentes, ritmos e estilos, seja a favor da música, apenas da sua música. A maioria das pessoas que curte música eletrônica alguma vez na vida viu e, provavelmente, citou “Pump Up the Volume”. De acordo com o documentário, a house music surgiu na época da Warehouse, famoso club de Chicago que bombava nos anos 80. Resumindo a história, os frequentadores da casa passaram a abreviar o que estavam curtindo e nasceu o house. De lá para cá, e até mesmo antes disso, entre a América e a Europa a evolução da música eletrônica foi tomando novas direções. A difusão do estilo cresceu e cresceu, até chegar ao formato astronômico atual. Abre parênteses. Assim como a música eletrônica mudou, muitos estilos sofreram com as marcas do tempo e outros até foram extintos. Em entrevista para o programa Agora é Tarde, da Rede Bandeirantes, o pesquisador e neto de Luiz Gonzaga, Daniel Gonzaga falou sobre um projeto chamado Biblioteca de Ritmos (bibliotecaderitmos. com.br). A iniciativa procura por ritmos e bases hoje acabaram até esquecidas. Com a era digital e a facilidade de plug-ins, timbres e sons disponíveis na Internet, nem se fala. A era dos palpites No meio de tudo isso, como não poderia ser diferente, também foram surgindo os críticos de plantão, que tudo sabem, tudo opinam e tudo criticam. Pitaco é o que não falta. Aquele que nunca destilou um veneninho contra o que julga ruim que atire a primeira pedra. O problema não é opinar. Já dizia Voltaire: “Posso não concordar com nenhuma das palavras que você diz, mas defenderei até a morte o direito de você proferi- las.” O X da questão é: a cada dia que passa, torna- se mais comum o surgimento de grupos, de todos os lados, que perdem boa parte do tempo analisando e desenvolvendo teorias sobre aquilo que não gostam. Como assim? 44 // WWW.HOUSEMAG.COM.BR

A FAVOR DA MÚSICA

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Publicada na ed. 33 da House Mag.

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Page 1: A FAVOR DA MÚSICA

brasileiros que estão acabando e disponibiliza todo o material na Internet. Conhecedor do assunto, o entrevistado da noite ainda discorreu sobre características parecidas entre alguns ritmos, que, no caso da música brasileira, têm em comum a base do baião. Alguns mais fortes, outros nem tanto, uns com muitos tambores ou apenas pontilhados por violas. A questão é que esses ritmos deixam de existir porque ninguém dá continuidade ou porque evoluem para um novo ritmo. Por exemplo, o samba vem do lundu, mas hoje é samba reggae, samba funk, e por aí vai. Fecha parênteses.

Tal pensamento pode de alguma forma ser transportado para a realidade de várias vertentes musicais, inclusive da agora em pauta música eletrônica. Afinal, fazendo uma conta rápida e resumida da época da warehouse, o house não parou de se transformar. o ritmo, ou estilo, como é costume chamar, alcançou os mais variados sobrenomes e, provavelmente, algumas batidas

COMPORTAMENTO

POR CaRoliNa SChubeRt

A favor da músicaDe acordo com o dicionário Aurélio, música é uma “organização de sons com intenções estéticas, artísticas ou lúdicas, variáveis de acordo com o autor, com a zona geográfica, com a época, etc”. Portanto, perder tempo falando mal do alheio está completamente fora de moda e jamais vai trazer algum benefício próprio ou para o grupo. independente de vertentes, ritmos e estilos, seja a favor da música, apenas da sua música.

A maioria das pessoas que curte música eletrônica alguma vez na vida já viu e, provavelmente, citou “Pump Up the Volume”. De acordo com o documentário, a house music surgiu na época da warehouse, famoso club de Chicago que bombava nos anos 80. Resumindo a história, os frequentadores da casa passaram a abreviar o que estavam curtindo e nasceu o house. De lá para cá, e até mesmo antes disso, entre a América e a Europa a evolução da música eletrônica foi tomando novas direções. A difusão do estilo cresceu e cresceu, até chegar ao formato astronômico atual.

Abre parênteses. Assim como a música eletrônica mudou, muitos estilos sofreram com as marcas do tempo e outros até foram extintos. Em entrevista para o programa Agora é Tarde, da Rede Bandeirantes, o pesquisador e neto de Luiz Gonzaga, Daniel Gonzaga falou sobre um projeto chamado Biblioteca de Ritmos (bibliotecaderitmos.com.br). A iniciativa procura por ritmos

e bases hoje acabaram até esquecidas. Com a era digital e a facilidade de plug-ins, timbres e sons disponíveis na Internet, nem se fala.

A era dos palpites

No meio de tudo isso, como não poderia ser diferente, também foram surgindo os críticos de plantão, que tudo sabem, tudo opinam e tudo criticam. Pitaco é o que não falta. Aquele que nunca destilou um veneninho contra o que julga ruim que atire a primeira pedra. o problema não é opinar. Já dizia Voltaire: “Posso não concordar com nenhuma das palavras que você diz, mas defenderei até a morte o direito de você proferi-las.”

o x da questão é: a cada dia que passa, torna-se mais comum o surgimento de grupos, de todos os lados, que perdem boa parte do tempo analisando e desenvolvendo teorias sobre aquilo que não gostam. Como assim?

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Rodrigo Itaboray fala das redes sociais,

onde reina o famoso ‘fale bem ou fale mal, mas fale de

mim’, que acaba gerando mídia espontânea para aquilo que não

se gosta.

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Vale citar um vídeo protagonizado pelo produtor musical Rodrigo Itaboray, de Juiz de Fora (MG). Em seu canal no youTube, ele fala a respeito do tema e expõe uma opinião bastante plausível, nas palavras dele, a chamada mídia espontânea. ou seja, principalmente nas redes sociais, o número de comentários divulgando coisas que não se gosta é muito grande. é o famoso “fale bem ou fale mal, mas fale de mim”, que gera mídia espontânea para aquilo que se desgosta. Dessa forma, aquele artista taxado de “ruim” acaba chamando ainda mais atenção e continua tomando o espaço daquilo que realmente interessaria para o determinado grupo que perdeu tempo pixando o alheio.

Em um segundo vídeo, o produtor mineiro ainda relata uma entrevista que concedeu à Transamérica, em que o músico Lobão falou sobre a divulgação do seu livro “50 Anos a Mil“, e para isso usou o artíficio de falar mal de alguns ídolos pop atuais. Aquele áudio acabou caindo até no youTube, gerando milhares de views e, por consequência, mídia expontânea para um livro que talvez não chamasse tanta atenção de outra forma, afinal, brigas, discussões e todo esse burburinho chamam muito atenção, e até pessoas que não sabem do que se trata acabam entrando na onda. Na mesma tangente estão vídeos, links e conteúdos gerais de música eletrônica que diversas pessoas não gostam, mas insistem em perder tempo falando mal.

Ainda seguindo a linha de raciocínio de Itaborai: chega-se ao ponto de que as pessoas também reclamam que as rádios só tocam “porcaria”. Mas por que então ouvir aquela estação? é só girar o botão e escolher outra rádio. Quantas rádios online existem hoje em dia? Quantas lojas de música podem ser acessadas? Pare de dar Ibope para o que julga ruim. é muito simples: não ouça!

é muito melhor ouvir, ler e debater temas construtivos. Independente da camisa que se veste, torcer pelo time e não contra o time dos outros. Louvável é o debate, e não a discussão. No atual cenário da música eletrônica é gratificante saber que muitos grupos, inclusive nas redes sociais, lutam por uma cultura. Por outro lado, é triste ver tanto blábláblá desnecessário sendo publicado. Um constante underground x mainstream, “de verdade” x “de mentira”, bom x ruim. Definitivamente, sem fim nem finalidade.

Resumindo, ficar enterrado dentro do casulo é um retrocesso. Mais vale voar e expor aquilo que realmente faz parte da própria personalidade e construir novas opiniões a partir de descobertas que estão dentro de um contexto positivo. Afinal, ao que tudo indica, pesquisar pelo estilo preferido, buscar a raiz e a essência do que considera de fato música, tomar iniciativas em prol do próprio gosto são medidas muito mais frutíferas do que esbravejar por que a grama da família de suecos que mora ao lado está mais verde ou mais azul (com o perdão do trocadilho, sem a intenção de levantar bandeiras). Afinal, perder tempo se preocupando em cuidar das preferências alheias não leva ninguém a lugar algum, gera propaganda espontânea e ainda pode colaborar com a futura extinção daquele ritmo que arrepia você de verdade.

a PSiCoaNaliSta letíCia toRReS, foRmaDa Pela uNiVeRSiDaDe feDeRal Do Rio gRaNDe Do Sul (ufRgS), fala SobRe o ComPoRtameNto agReSSiVo muitaS VezeS ViSlumbRaDo Na mÚSiCa

“Todo ser humano, desde seus primórdios, busca alguma forma de reconhecimento. Isso é o que faz o bebê, ao produzir os primeiros sons, inventar as primeiras gracinhas, na tentativa de chamar a atenção, de buscar o olhar ou olhares daqueles que dele cuidam, seja a mãe, o pai, a babá ou os familiares. Supomos assim que a criatividade e a inventividade surgem nos nossos primeiros tempos de vida, justamente nesta tentativa de testemunho do próprio valor.

Ao longo da vida, na escolha da trajetória que cada um seguirá, podemos ir aprimorando, lapidando e até musicalizando nossas produções. Contudo, na sociedade atual, por razões históricas e culturais, a competitividade, que é a disputa de lugar, tem se mostrado com muita força. Logo, na tentativa de desviar os holofotes em sua direção, nem que pelo fugaz instante de ocupar o palco de celebridade momentânea, assistimos posicionamentos e atitudes bastante questionáveis. observa-se o aumento dos comportamentos destrutivos, tomando muitas vezes contornos agressivos. Desde o mal falar, e criticas infundadas até cenas de uma violência maior que a mídia cotidianamente nos informa, trazem marcas muitas vezes dolorosas.

Talvez, tenhamos que dar mais voz às palavras generosas que alguns poetas nos ofereceram. Raul, faz tempo, nos disse: ‘Prefiro ser essa metamorfose ambulante do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo’. Cabe pois, a cada um, a escolha de permanecer sempre lagarta ou permitir a borboleta.”

Muitos reclamam que as rádios só tocam ‘porcaria’. Mas por que então ouvir aquela estação? É só girar o botão e escolher outra rádio.

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