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PAULO BRETAS VILARINHO JUNIOR A FORMAÇÃO DA CLASSE OPERÁRIA NA ERA DA EMPREGABILIDADE: AS EXPERIÊNCIAS DO COLÉGIO METALÚRGICO RJ (A FORMAÇÃO PROFISSIONAL EM TEMPOS DE NEOLIBERALISMO, NOVA LDB E REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA) Dissertação apresentada ao Mestrado em Educação da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação. ORIENTADOR: PROFª. DRA. SONIA MARIA RUMMERT Niterói 2004

A Formação da Classe Operária na Era da Empregabilidade: As Experiências do Colégio Metalúrgico – RJ (A Formação Profissional em Tempos de Neoliberalismo, Nova LDB e Reestruturação

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O objetivo desta Dissertação é analisar o funcionamento atual do Colégio Metalúrgico Elpídio Evaristo dos Santos (CMEES). Os procedimentos metodológicos utilizados articularam três movimentos simultâneos que possibilitaram uma maior apreensão da totalidade estudada: A - Revisão de literatura visando estruturar uma base de análise da realidade atual, nas suas dimensões conjunturais e estruturais, abordando os seguintes temas: “Globalização” e neoliberalismo; Papel do Banco Mundial na definição das políticas educacionais no Brasil; Nova LDB e a Educação Profissional e, o Decreto 2.208/97; A terceira revolução industrial e a reestruturação produtiva e gerencial; Os desafios do Movimento Sindical nos anos neoliberais; Os condicionantes históricos das mudanças de rumo do Movimento Sindical na década de 1990; A diminuição da indústria no Rio de Janeiro; A nova direção do Sindicato dos Metalúrgicos do Rio de Janeiro; Conceituação do Colégio Metalúrgico Elpídio Evaristo dos Santos: histórico, Proposta Pedagógica, situação atual. B - Levantamento de fontes primárias acerca do tema no acervo do Sindicato: programa das chapas eleitas, resoluções dos congressos da categoria, jornais e boletins. C - Realização de entrevistas semi-estruturadas com a Equipe Técnico-Pedagógica, funcionários, professores do CMEES e Diretores do Sindicato dos Metalúrgicos do período 1996-2002, a fim de obter mais dados sobre a política implementada pelas Diretorias no período e levantamento através de questionários, com alunos que já exercem funções técnicas na sua prática cotidiana de trabalho, visando conhecer a percepção acerca da relação teoria-prática dos conteúdos ministrados no Colégio. Concluí que as políticas implementadas pelas Diretorias do Sindicato no período 1996-2002 não contribuíram para o esvaziamento do CMEES, muito pelo contrário. As entrevistas foram unânimes em revelar que, em que pesem as deficiências no processo, sem o apoio dado até aqui pelo Sindicato, o CMEES provavelmente já teria sido fechado. O quadro atual de crise é fruto da combinação dos vários condicionantes estudados ao longo deste trabalho.

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  • PAULO BRETAS VILARINHO JUNIOR

    A FORMAO DA CLASSE OPERRIA NA ERA DA

    EMPREGABILIDADE: AS EXPERINCIAS DO COLGIO

    METALRGICO RJ

    (A FORMAO PROFISSIONAL EM TEMPOS DE

    NEOLIBERALISMO, NOVA LDB E REESTRUTURAO

    PRODUTIVA)

    Dissertao apresentada ao Mestrado

    em Educao da Universidade Federal

    Fluminense, como requisito parcial para

    obteno do ttulo de Mestre em Educao.

    ORIENTADOR: PROF. DRA. SONIA MARIA RUMMERT

    Niteri

    2004

  • 2

    PAULO BRETAS VILARINHO JUNIOR

    A FORMAO DA CLASSE OPERRIA NA ERA DA

    EMPREGABILIDADE: AS EXPERINCIAS DO COLGIO

    METALRGICO RJ

    (A FORMAO PROFISSIONAL EM TEMPOS DE

    NEOLIBERALISMO, NOVA LDB E REESTRUTURAO

    PRODUTIVA)

    Dissertao apresentada ao Mestrado em Educao

    da Universidade Federal Fluminense, como requisito

    parcial para obteno do ttulo de Mestre em Educao.

    Aprovada em 01/03/2004

    Banca Examinadora

    ______________________________________________________________

    Prof. Dra. Sonia Maria Rummert Orientadora

    _____________________________________________________________

    Prof. Dr. Gaudncio Frigotto - UFF

    _____________________________________________________________

    Prof. Dr. Paulo Srgio Tumolo - UFSC

    Niteri

    2004

  • 3

    Ao Movimento Popular e Sindical

    do Rio de Janeiro e do Brasil,

    em especial ao Movimento Estudantil, onde tudo comeou,

    que me ensinou que o mundo redondo,

    mas no o meu umbigo.

  • 4

    O conhecimento dialtico da realidade

    no deixa intactos os conceitos no ulterior caminho do conhecer;

    no uma sistematizao dos conceitos que procede por soma,

    sistematizao essa fundada sbre uma base imutvel

    e encontrada uma vez por tdas:

    um processo em espiral de mtua compenetrao e elucidao dos conceitos,

    no qual a abstratividade (unilateralidade e isolamento)

    dos aspectos superada em uma correlao dialtica,

    quantitativo-qualitativa, regressivo-progressiva.

    A compreenso dialtica da totalidade

    significa no s que as partes se encontram em relao

    de interna interao e conexo entre si e com o todo,

    mas tambm que o todo no pode ser petrificado

    na abstrao situada por cima das partes,

    visto que o todo se cria a si mesmo na interao das partes.

    Karel Kosik Dialtica do Concreto

  • 5

    AGRADECIMENTOS

    Encaminho meus agradecimentos a todos, e a cada um que, direta ou indiretamente se

    envolveram na construo desta Dissertao. E em especial:

    minha me, a quem devo as possibilidades que me permitiram vir a ser tudo que sou;

    minha esposa Rita: amor-companheira-camarada, pelo carinho, apoio e pacincia;

    minha filha Helena, pelas horas roubadas ao seu convvio;

    Professora Sonia Maria Rummert, minha orientadora, por suas crticas e orientaes,

    todas de grande valor e por ter sobrevivido ao meu ritmo pessoal/poltico/sindical, nem

    sempre adequado ao necessrios prazos acadmicos;

    Aos Professores Gaudncio Frigotto e Paulo Srgio Tumolo, por participarem da banca

    examinadora, contribuindo para as reformulaes necessrias;

    Aos professores e alunos do Curso de Mestrado, pela colaborao e discusso de muitas

    das idias aqui contidas, em especial a minha turma: Adriane, Alexandre, Antnio, Carla,

    Ceclia, Helder e Luciane;

    Ao Colgio Metalrgico Elpdio Evaristo dos Santos, seus funcionrios, professores e

    alunos, por ser meu campo de pesquisa, mas fundamentalmente por ser mais um dos meus

    campos de experincia ... de vida;

    Ao Sindicato dos Metalrgicos do Rio de Janeiro, seus Diretores, em especial aos

    camaradas da Corrente Sindical Classista, pelo acolhimento e confiana com que

    forneceram os dados solicitados, inclusive o manuseio de fontes histricas do Sindicato, e

    participaram das entrevistas, todos de fundamental importncia. Suas vozes ajudaram a

    reconstruir esse perodo da histria. Portanto, agradeo a vocs pela co-autoria;

  • 6

    Lia Tiriba e Marcos Antnio Ribeiro da Costa, que antes de mim, trilharam esse

    caminho, deixando pegadas a serem seguidas;

    Editora Anita Garibaldi, por publicar as revistas Princpios e Debate Sindical, fontes

    bibliogrficas imprescindveis construo da anlise da realidade;

    Meus sinceros agradecimentos.

  • 7

    Resumo

    O objetivo desta Dissertao analisar o funcionamento atual do Colgio

    Metalrgico Elpdio Evaristo dos Santos (CMEES). Os procedimentos metodolgicos

    utilizados articularam trs movimentos simultneos que possibilitaram uma maior

    apreenso da totalidade estudada: A - Reviso de literatura visando estruturar uma base de

    anlise da realidade atual, nas suas dimenses conjunturais e estruturais, abordando os

    seguintes temas: Globalizao e neoliberalismo; Papel do Banco Mundial na definio

    das polticas educacionais no Brasil; Nova LDB e a Educao Profissional e, o Decreto

    2.208/97; A terceira revoluo industrial e a reestruturao produtiva e gerencial; Os

    desafios do Movimento Sindical nos anos neoliberais; Os condicionantes histricos das

    mudanas de rumo do Movimento Sindical na dcada de 1990; A diminuio da indstria

    no Rio de Janeiro; A nova direo do Sindicato dos Metalrgicos do Rio de Janeiro;

    Conceituao do Colgio Metalrgico Elpdio Evaristo dos Santos: histrico, Proposta

    Pedaggica, situao atual. B - Levantamento de fontes primrias acerca do tema no

    acervo do Sindicato: programa das chapas eleitas, resolues dos congressos da categoria,

    jornais e boletins. C - Realizao de entrevistas semi-estruturadas com a Equipe Tcnico-

    Pedaggica, funcionrios, professores do CMEES e Diretores do Sindicato dos

    Metalrgicos do perodo 1996-2002, a fim de obter mais dados sobre a poltica

    implementada pelas Diretorias no perodo e levantamento atravs de questionrios, com

    alunos que j exercem funes tcnicas na sua prtica cotidiana de trabalho, visando

    conhecer a percepo acerca da relao teoria-prtica dos contedos ministrados no

    Colgio. Conclu que as polticas implementadas pelas Diretorias do Sindicato no perodo

    1996-2002 no contriburam para o esvaziamento do CMEES, muito pelo contrrio. As

    entrevistas foram unnimes em revelar que, em que pesem as deficincias no processo,

    sem o apoio dado at aqui pelo Sindicato, o CMEES provavelmente j teria sido fechado.

    O quadro atual de crise fruto da combinao dos vrios condicionantes estudados ao

    longo deste trabalho.

  • 8

    Abstract

    The objective of this Dissertation is to analyze current functioning of the

    Colgio Metalrgico Elpdio Evaristo dos Santos (CMEES). The used methodological

    procedures had articulated three simultaneous movements that make possible a bigger

    apprehension of the studied totality: A - Revision of literature aiming at to structuralize a

    base of analysis of the current reality, in its conjunctural and structural dimensions,

    approaching the following subjects: Globalization e neoliberalism; Responsability of the

    World Bank in the definition of the educational politics in Brazil; New LDB and the

    Professional Education and Decree 2.208/97; The third industrial revolution and the

    productive and managemental reorganization; The challenges of the Syndical Movement in

    the neoliberalist years; The historical conditions of the changes of route of the Syndical

    Movement in the decade of 1990; The reduction of the industry in Rio de Janeiro; The new

    direction of the Union of the Metallurgist of Rio de Janeiro; Conceptualization of the

    Colgio Metalrgico Elpdio Evaristo dos Santos: pedagogical description, proposal,

    current situation. B - Survey of primary sources concerning the subject in the quantity of

    the Union: program of elect plates, resolutions of the congresses of the category,

    periodicals and bulletins. C - Accomplishment of interviews half-structuralized with the

    Technical-Pedagogical Team, employees, professors of the CMEES and directors of the

    union of the Metallurgist of period 1996-2002, in order to get more given on the politics

    implemented for the Directions in the period and survey through questionnaires, with

    students who already exert functions techniques in daily practical its of work, aiming at to

    know its perception concerning the theory-practical relation of the contents given in the

    CMEES. I conclude quite to the contrary that the politics implemented for the directions of

    the Union in period 1996-2002 had not contributed for the emptiness of the CMEES. The

    interviews had been unanimous in disclosing that, where they weigh the deficiencies in the

    process, without the support given until here for the Union, the CMEES probably already

    would have been closed. The current crisis is caused by the combination of the some

    conditions studied to the long one of this Dissertation.

  • 9

    SUMRIO

    LISTA DE TABELAS........................................................................................................12

    LISTA DAS SIGLAS UTILIZADAS...............................................................................13

    INTRODUO..................................................................................................................20

    1 - SITUANDO O NOSSO RIO: AS MARGENS QUE NOS OPRIMEM...................32

    1.1 - A IDEOLOGIA DA GLOBALIZAO.............................................................34

    1.1.1 - A Esfinge Moderna...................................................................................................34

    1.1.2 - Neoliberalismo: De Teoria Marginal Poltica Marginalizadora.............................42

    1.2 - BANCO MUNDIAL: ESPECIALISTA EM EDUCAO?!?!?!?!?!...................48

    1.2.1 - De Mecenas a Cavalo de Tria.................................................................................49

    1.2.2 - E o Brasil Fez o Seu Dever de Casa..........................................................................55

    1.3 - NOVA LDB E A EDUCAO PROFISSIONAL..................................................58

    1.3.1 - Pequeno Histrico da Educao Profissional no Brasil............................................59

    1.3.2 - Nova LDB: Da Luta Popular ao Golpe Palaciano....................................................64

    1.3.3 - Decreto 2.208: Da Educao Profissional Certificao.........................................67

    1.4 - TERCEIRA REVOLUO INDUSTRIAL E REESTRUTURAO

    PRODUTIVA......................................................................................................................74

    1.4.1 - O Que Fazer e Como Fazer: Dois Movimentos que se Interpenetram.....................76

    1.4.2 - Taylor e o Homem Boi..............................................................................................80

    1.4.3 - Ascenso e Queda do Fordismo................................................................................83

    1.4.4 - E Tudo Comeou Com Uma Vlvula ... ..................................................................93

    1.4.5 - Vamos Vestir a Camisa da Empresa... Mas Quem vai Vestir a Nossa?.................101

    1.4.6 - Dialogando Com a Realidade. Ou Penso, Logo Resisto!.......................................112

  • 10

    2 - O MOVIMENTO SINDICAL NAVEGANDO EM CORREDEIRAS..................122

    2.1 OS DESAFIOS DO MOVIMENTO SINDICAL NOS ANOS

    NEOLIBERAIS................................................................................................................125

    2.2 MUDANAS DE RUMO.......................................................................................139

    2.2.1 - Imperialismo e Aristocracia Operria.....................................................................145

    2.2.2 - Um Breve Fio de Histria.......................................................................................149

    2.2.3 - A Social-Democracia Tardia...................................................................................154

    2.3 DIMINUIO DA INDSTRIA NO RIO DE JANEIRO..................................160

    2.4 NOVA DIREO NO SINDICATO DOS METALRGICOS.........................166

    3 - O COLGIO METALRGICO ELPDIO EVARISTO DOS SANTOS.............173

    3.1 - HISTRICO DO COLGIO METALRGICO.................................................173

    3.2 - PROPOSTA PEDAGGICA.................................................................................185

    3.2.1 Justificativa.............................................................................................................185

    3.2.2 Fundamentando os Objetivos.................................................................................187

    3.2.2.1 Objetivo Geral.....................................................................................................187

    3.2.2.2 Objetivos Especficos..........................................................................................188

    3.2.3 Fundamentao da Proposta...................................................................................189

    3.2.3.1 Uma Educao Democrtica...............................................................................189

    3.2.3.2 Uma Formao Geral..........................................................................................191

    3.2.3.3 - Uma Construo Social do Conhecimento..........................................................191

    3.2.4 Linha Crtico-Social dos Contedos.......................................................................193

    3.2.4.1 Caractersticas Bsicas........................................................................................193

    3.2.4.2 Relao Aluno-Professor.....................................................................................193

    3.2.4.3 Relao Ensino-Aprendizagem...........................................................................194

  • 11

    3.2.5 Orientaes, de Acordo com a Proposta Pedaggica Para.....................................194

    3.2.5.1 O Planejamento...................................................................................................194

    3.2.5.2 O Plano de Ensino...............................................................................................195

    3.2.5.3 A Avaliao.........................................................................................................195

    3.3 - ENTRE O DISCURSO E A PRTICA.................................................................197

    3.3.1 - Caractersticas do Colgio......................................................................................198

    3.3.2 - Integrao Entre o Colgio e o Sindicato................................................................206

    3.3.3 - As Polticas Implementadas Pelas Gestes 1996-2002 e a Crise do CMEES........211

    3.3.4 - Perspectivas Sobre o Futuro do CMEES................................................................214

    CONCLUSO..................................................................................................................217

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS...........................................................................224

  • 12

    LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 Tabela 1 Presidentes, Tesoureiros e Diretores/Secretrios de Formao do

    Sindicato dos Metalrgicos do Rio de Janeiro no perodo 1996-2002.........26

    Tabela 2 Esquema das trs revolues industriais do capitalismo..............................73

    Tabela 3 Taxas de Desemprego Aberto no Brasil, no Estado do Rio e na Indstria no

    Estado do Rio 1996-2002........................................................................150

    Tabela 4 Total de Admisses e Desligamentos na Regio Metropolitana do Rio de

    Janeiro 1997-2002 - Grande Setor de Atividade Econmica segundo o

    IBGE (6 categorias) Indstria..................................................................152

    Tabela 5 Total de Admisses e Desligamentos na Regio Metropolitana do Rio de

    Janeiro 1997-2002 - Sub-setor de Atividade Econmica segundo o IBGE

    (26 categorias) Indstria Metalrgica......................................................152

    Tabela 6 Total de Admisses e Desligamentos na Regio Metropolitana do Rio de

    Janeiro 1997-2002 - Sub-setor de Atividade Econmica segundo o IBGE

    (26 categorias) Indstria Mecnica..........................................................153

    Tabela 7 Total de Admisses e Desligamentos na Regio Metropolitana do Rio de

    Janeiro 1997-2002 - Sub-setor de Atividade Econmica segundo o IBGE

    (26 categorias) Material Eltrico e Comunicaes..................................153

    Tabela 8 Taxa de crescimento anual da indstria extrativa mineral e de

    transformao, segundo as classes e gneros - Estado do Rio de Janeiro -

    1996-2001...................................................................................................154

    Tabela 9 Indicadores conjunturais da indstria, segundo as classes e gneros

    Pessoal ocupado na produo - Estado do Rio de Janeiro - 1997-2000.....154

    Tabela 10 Estabelecimentos industriais, por classes - Indstria de transformao -

    Segundo as Regies de Governo e municpios - Estado do Rio de Janeiro -

    1998-2000...................................................................................................155

    Tabela 11 Distribuio das turmas do CMEES conforme o turno, o curso e a

    modalidade de ensino - 1999......................................................................172

  • 13

    LISTA DAS SIGLAS MENCIONADAS

    5S Cdigo comportamental baseado em cinco palavras japonesas que

    comeam com a letra S: Seiri Organizao; Seiton Arrumao;

    Seiso Limpeza; Seiketsu Sade e Higiene; Shitsuke

    Autodisciplina

    ABC/ABCD Regio do Estado de So Paulo que compreende os municpios de

    Santo Andr, So Bernardo do Campo, So Caetano e Diadema

    AC Acre

    ACO Ao Operria Catlica

    AEPET Associao dos Engenheiros da Petrobrs

    AFL-CIO American Federation of Labor - Congress of Industrial

    Unions/Federao Sindical Americana - Congresso de Organizaes

    Industriais

    AGIN Agncia de Garantia de Investimentos

    AI Ato Institucional

    AID Associao Internacional de Desenvolvimento

    ANPEd Associao Nacional de Ps-Graduao e Pesquisa em Educao

    ANPUR Associao Nacional de Ps-Graduao e Pesquisa em Planejamento

    Urbano e Regional

    AP Ao Popular

    AP-ML Ao Popular Marxista-Leninista do Brasil

    ArtSind Articulao Sindical

    BA Bahia

    BID Banco Interamericano de Desenvolvimento

    BIRD Banco Internacional para a Reconstruo e o Desenvolvimento

    BM Banco Mundial

    BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social

    BRADESCO Banco Brasileiro de Descontos S. A.

    CAD/CAM Computer Aided Design/Computer Aided Manufacturing Projeto

    Assistido por Computador/Manufatura Assistida por Computador

    CAGED Cadastro Geral de Empregados e Desempregados

  • 14

    CAPINA Cooperao e Apoio a Projetos de Inspirao Alternativa

    CATs Comunicaes de Acidentes de Trabalho

    CBE Conferncia Brasileira de Educao

    CCQ Crculos de Controle da Qualidade

    CD ROM Compact Disc Read Only Memory/Disco Compacto Somente de

    Leitura

    CDAPH-IFAN Centro de Documentao e Apoio Pesquisa em Histria da

    Educao Instituto Franciscano de Antropologia da Universidade

    So Francisco

    CE Cear

    CEB Cmara de Educao Bsica do Conselho Nacional de Educao

    CEDAE Companhia Estadual de guas e Esgotos do Rio de Janeiro

    CEDES Centro de Estudos Educao e Sociedade

    CEDI-NETS Ncleo de Estudos sobre Trabalho e Sociedade do Centro

    Ecumnico de Documentao e Informao

    CEFET/RJ Centro Federal de Educao Tecnolgica Celso Suckow da Fonseca

    CEFETs Centros Federais de Educao Tecnolgica

    CEHOG Centro de Estudos Honestino Guimares

    CES Centro de Estudos Sindicais

    CESIT Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da

    UNICAMP

    CFI Corporao Financeira Internacional

    CGT Confederao Geral dos Trabalhadores

    CIDE Centro de Informaes e Dados do Rio de Janeiro

    CIOSL Confederao Internacional de Organizaes Sindicais Livres

    CIPA Comisso Interna de Preveno de Acidentes

    CIRD Centro Internacional Para a Resoluo de Disputas sobre

    Investimentos

    CLACSO Conselho Latino Americano de Cincias Sociais

    CLPs Controladores Lgicos Programveis

    CLT Consolidao das Leis do Trabalho

    CMEES Colgio Metalrgico Elpdio Evaristo dos Santos

  • 15

    CNC Comando Numrico Computadorizado

    CNE Conselho Nacional de Educao

    CNEC Campanha Nacional de Escolas da Comunidade

    CNI Confederao Nacional da Indstria

    CNM/CUT Confederao Nacional dos Metalrgicos da CUT

    COMLURB Companhia Municipal de Limpeza Urbana do Rio de Janeiro

    CONCUT Congresso Nacional da Central nica dos Trabalhadores

    COPPE/UFRJ Instituto Alberto Luiz Coimbra de Ps-Graduao e Pesquisa em

    Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro

    CQI Continuous Quality Improvement/Melhoria Contnua da Qualidade

    CRP-05 Conselho Regional de Psicologia - 5 Regio

    CSC Corrente Sindical Classista

    CUT Central nica dos Trabalhadores

    CVRD Companhia Vale do Rio Doce

    DECEC Departamento de Capitais Estrangeiros e Cmbio do Banco Central

    do Brasil

    DES Departamento de Emprego e Salrio do Ministrio do Trabalho e

    Emprego

    DF Distrito Federal

    DIEESE Departamento Intersindical de Estatsticas e Estudos Scio-

    Econmicos

    DIFEL Difuso Editorial S. A.

    DORT Distrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho

    Ed. Editora

    EdUFF Editora da Universidade Federal Fluminense

    EISA Estaleiro Ilha S. A.

    EJA Educao de Jovens e Adultos

    EMBRAER Empresa Brasileira de Aeronutica S. A.

    ENIAC Eletronic Numeric Integrator And Calculator

    ETP Equipe Tcnico-Pedaggica

    EUA Estados Unidos da Amrica

    FAETEC Fundao de Apoio Escola Tcnica do Estado do Rio de Janeiro

  • 16

    FAPERJ Fundao Carlos Chagas Filho de Amparo Pesquisa do Estado do

    Rio de Janeiro

    FAPESP Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de So Paulo

    FASE Federao de rgos Para Assistncia Social e Educacional

    FAT Fundo de Amparo ao Trabalhador

    FENAPSI Federao Nacional dos Psiclogos

    FGV Fundao Getlio Vargas

    FHC Fernando Henrique Cardoso

    FIAT Fabbrica Italiana Automobili Torino

    FIRJAN Federao das Indstrias do Estado do Rio de Janeiro

    FMI Fundo Monetrio Internacional

    FNDE Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educao

    FNT Frente Nacional do Trabalho

    FS Central Fora Sindical

    G-8 Grupo dos sete pases capitalistas mais desenvolvidos do mundo

    (Alemanha, Canad, EUA, Frana, Inglaterra, Itlia, Japo) mais a

    Rssia

    HSBC Hong Kong and Shangai Banking Corporation

    IBASE Instituto Brasileiro de Anlises Sociais e Econmicas

    IBGE Fundao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    INAE Instituto Nacional de Altos Estudos

    INPC ndice Nacional de Preos ao Consumidor

    INSS Instituto Nacional do Seguro Social

    IPA/OG ndice de Preos por Atacado/Oferta Global

    ISHIBRS Ishikwajima do Brasil Estaleiro S. A.

    JOC Juventude Operria Catlica

    JUC Juventude Universitria Catlica

    LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional

    LER Leses por Esforo Repetitivo

    LPP-UERJ Laboratrio de Polticas Pblicas da Universidade do Estado do Rio

    de Janeiro

    LRF Lei de Responsabilidade Fiscal

  • 17

    MEC Ministrio da Educao

    MG Minas Gerais

    MIT Massachussets Institute of Technology/Instituto de Tecnologia de

    Massachussets

    MP Medida Provisria

    MTb Ministrio do Trabalho

    MUT Movimento de Unificao dos Trabalhadores

    N. Nmero

    NEDDATE Ncleo de Estudos, Documentao e Dados sobre Trabalho e

    Educao da Faculdade de Educao da UFF

    NETE Ncleo de Estudos sobre Trabalho e Educao da Faculdade de

    Educao da UFMG

    O. N. Organizao e Normas do Trabalho

    OCDE Organizao para a Cooperao e o Desenvolvimento Econmico

    OIT Organizao Internacional do Trabalho

    ONGs Organizaes No-Governamentais

    ONU Organizao das Naes Unidas

    Org./Orgs. Organizador(a)/Organizadores

    OSM Oposio Sindical Metalrgica

    OTAN Organizao do Tratado do Atlntico Norte

    PC do B Partido Comunista do Brasil

    PCB Partido Comunista Brasileiro

    PCP Planejamento e Controle da Produo

    PCUS Partido Comunista da Unio Sovitica

    PDT Partido Democrtico Trabalhista

    PE Pernambuco

    PEA Populao Economicamente Ativa

    PEC Proposta de Emenda Constitucional

    PETROBRS Petrleo Brasileiro S. A.

    PFL Partido da Frente Liberal

    PIB Produto Interno Bruto

    PIPMO Plano Intensivo de Preparao de Mo-de-Obra

  • 18

    PL Projeto de Lei

    PLR Participao nos Lucros e Resultados

    PMDB Partido do Movimento Democrtico Brasileiro

    PNAD Pesquisa Nacional de Amostragem de Domiclio

    PR Paran

    PROEP Programa de Expanso da Educao Profissional

    PROMEC Programa de Extenso e Melhoria do Ensino Mdio

    PSB Partido Socialista Brasileiro

    PSDB Partido da Social-Democracia Brasileira

    PT Partido dos Trabalhadores

    PTB Partido Trabalhista Brasileiro

    PUC-SP Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo

    R$ Real

    RAIS Relao Anual de Informaes Sociais

    REDUC Refinaria Duque de Caxias

    RGPS Regime Geral de Previdncia Social

    RJ Rio de Janeiro

    S/d. Sem data

    SEADE Fundao Sistema Estadual de Anlise de Dados de So Paulo

    SEFOR Secretaria de Formao e Desenvolvimento Profissional do

    Ministrio do Trabalho e Emprego

    SENAC Servio Nacional de Aprendizagem Comercial

    SENAI Servio Nacional de Aprendizagem Industrial

    SENAR Servio Nacional de Aprendizagem Rural

    SENAT Servio Nacional de Aprendizagem do Transporte

    SENEB Secretaria Nacional de Educao Bsica do Ministrio da Educao

    SESC Servio Social do Comrcio

    SESI Servio Social da Indstria

    SEST Servio Social do Transporte

    SETRAS Secretaria de Estado de Trabalho e Ao Social do Rio de Janeiro

    SINDIPETRO-RJ Sindicato dos Trabalhadores na Indstria do Petrleo do Rio de

    Janeiro

  • 19

    SINTERGIA/RJ Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas de Energia do Rio de

    Janeiro e Regio

    SINTSAMA-RJ Sindicato dos Trabalhadores em Saneamento Bsico e Meio

    Ambiente do Rio de Janeiro e Regio

    SIVAM Sistema de Vigilncia da Amaznia

    SMED Single Minute Echange Die/Troca Rpida de Ferramental

    SP So Paulo

    TELEBRS Telecomunicaes Brasileiras S/A

    TQC Total Quality Control/Controle Total da Qualidade

    UBES Unio Brasileira dos Estudantes Secundaristas

    UCAM Universidade Candido Mendes

    UCG Universidade Catlica de Gois

    UECE Universidade Estadual do Cear

    UERJ Universidade do Estado do Rio de Janeiro

    UFF Universidade Federal Fluminense

    UFG Universidade Federal de Gois

    UFMG Universidade Federal de Minas Gerais

    UFRGS Universidade Federal do Rio Grande do Sul

    UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro

    UFSC Universidade Federal de Santa Catarina

    UNB Universidade de Braslia

    UNE Unio Nacional dos Estudantes

    UNESP Universidade Estadual Paulista

    UNICAMP Universidade Estadual de Campinas

    UNIOESTE Universidade Estadual do Oeste do Paran

    UNITRABALHO Rede Interuniversitria de Estudos e Pesquisas sobre o Trabalho

    US$ Dlar

  • 20

    O materialismo dialtico uma filosofia radical porque no se detm nos produtos humanos

    como numa verdade de ltima instncia, mas penetra at as razes da realidade social,

    isto , at o homem como sujeito objetivo,

    ao homem como ser que cria a realidade social. Karel Kosik Dialtica do Concreto

    INTRODUO

    A poca em que vivemos apresenta uma srie de desafios e novidades, que se

    impem ao nosso cotidiano e atravessam os modos de ser, produzir e (re)produzir nossa

    existncia (material, social, emocional, educacional, espiritual, afetiva, sexual, ...).

    Aprendemos desde a mais tenra idade que vivemos numa aldeia global, onde

    tudo e todos esto interligados. Tudo acontece e pode ser acompanhado por ns em tempo

    real: as guerras, as catstrofes, os crimes, a violncia urbana; as vitrias, as derrotas; o

    que crnico e banal, as excees que so apregoadas como regra; as agruras e amores de

    pessoas comuns confinadas em um paraso ecolgico ou dentro de uma casa ...

    a vida sem causa e sem conseqncia. Tudo porque . O futuro assistir ao

    programa de televiso da noite ou da semana seguinte.

    Vivemos aquilo que FRIGOTTO (2002: 1) denominou de espcie de

    sndrome do fim: fim da histria, fim das classes sociais, fim do proletariado e o

    surgimento do cognitariado1, fim das grandes utopias, fim das ideologias, fim da razo,

    fim do emprego, fim do conflito. Fim das respostas, mas no das perguntas. Agora tudo

    novo. Tudo novidade.

    As novidades no explicam a realidade que mostra DREIFUSS (1996: 12-13):

    (...) mais de trs milhes de pessoas morrem por ano de doenas evitveis, como tuberculose, disenteria ou malria. Nos pases menos

    1 Que se origina, segundo FRIGOTTO (2001a: 35) a partir da (...) tese da sociedade do conhecimento de Toffler e a partir dela o fim das classes e, sobretudo, do proletariado, sendo este substitudo pelo

    cognitariado (...) Toffler deduz o fim da diviso do trabalho e das prprias classes sociais, em decorrncia

    das mudanas do contedo e reorganizao do processo de trabalho (...).

  • 21

    desenvolvidos, mais de 95 milhes de crianas menores de 15 anos trabalham

    para ajudar seus familiares; mais de um milho de crianas (...) obrigadas a

    prostituir-se; cerca de um milho e meio foram mortas em guerras, e perto de cinco milhes esto vivendo em campos de refugiados ou similares. Quase cem

    milhes so consideradas crianas de rua, das quais doze milhes no tem famlia nem lar, e a cada minuto nascem 47 bebs na pobreza. Cerca de 120

    milhes se encontravam oficialmente desempregadas em 1995, enquanto os refugiados polticos e vtimas de conflitos tnicos que eram oito milhes na dcada de 70 chegavam a vinte milhes somente dez anos depois.

    Realidades (...) de um planeta onde, segundo dados da ONU de 1994, o quinto superior da populao mundial percebia em 1960, setenta por

    cento dos ingressos, passando a 83% em 1989, enquanto que o quinto inferior

    caa no mesmo perodo, de 2,3% a 1,4%. A populao em extrema pobreza (ou

    desesperadamente pobre) chegava, segundo informe das Naes Unidas, a um bilho e trezentos milhes de pessoas em 1995 (dos quais dois teros so

    mulheres), quadruplicando as j dramticas cifras de 1990. A maioria vive em

    48 pases menos desenvolvidos: no sul da sia se concentram 21% do total de pessoas em extrema pobreza; a frica responde por 16% dos miserveis, dos

    quais 60% vivem em reas rurais dos pases subsaarianos. Uma em cada cinco

    pessoas sofre de pobreza extenuante e sobrevive com menos de um dlar dirio; mais de um bilho de pessoas carecem de servios bsicos; uma em

    cada 100 pessoas imigrante ou refugiada, e em cada quatro adultos se conta

    um analfabeto. (...) a cada dia um quinto da populao no tem o que comer,

    enquanto que oitocentos bilhes de dlares equivalentes renda da metade da populao mundial so gastos anualmente em programas militares.

    No nosso Pas, vivemos a sndrome da desconstruo. Tudo deve ser destrudo

    em nome da modernidade, do progresso, da insero do Brasil no primeiro mundo.

    A educao um campo de experimentao privilegiado, onde as boas novas

    do mundo desenvolvido podem se tornar acessveis. Mergulhado nessa realidade adversa

    est o Colgio Metalrgico Elpdio Evaristo dos Santos (CMEES).

    O objetivo do presente trabalho analisar o seu funcionamento atual.

    A escolha do CMEES como campo para a realizao desta pesquisa justificou-

    se pelas especificidades de seus objetivos educacionais, principalmente, conforme TIRIBA

    (1989: 175): o de contribuir para a formao da conscincia de classe do operrio-

    estudante, estimulando sua organizao poltico-sindical.

    Auxilia tambm a compreender a sua pertinncia, a singularidade da situao

    atual: as particularidades da organizao poltico-sindical do proletariado, fruto dos efeitos

    da implantao do neoliberalismo no Brasil na ltima dcada; as profundas mudanas no

  • 22

    mundo do trabalho; na organizao da educao brasileira em geral e da Educao

    Profissional em particular e a situao de virtual fechamento de uma experincia de

    educao vinculada a um dos mais antigos Sindicatos da rea fabril do Brasil.

    Tais fatores esto aliados a minha trajetria poltica: a militncia no

    Movimento Estudantil Secundarista e Universitrio; a participao nas instncias internas

    da Universidade: Departamento, Colegiado de Curso, Conselho Universitrio; a atuao no

    Movimento Sindical e Popular; no Conselho Profissional (Conselho Regional de

    Psicologia - 5 Regio - CRP-05) e desde 1987 como militante e dirigente de Partido

    Poltico.

    Tomei conhecimento da experincia pedaggica que estava sendo desenvolvida

    no CMEES atravs do artigo de TIRIBA (1988)2, que inclusive utilizei durante a minha

    experincia na monitoria da disciplina de Didtica em 1990 na Universidade Federal

    Fluminense (UFF). Aprofundei a minha relao com o Colgio atravs da participao de

    atividades l promovidas e aproximao com integrantes da Equipe Tcnico-Pedaggica

    (ETP). Em 1999, fui contratado como professor, para ministrar a disciplina de Organizao

    e Normas do Trabalho, experincia extremamente enriquecedora e particularmente

    prazerosa. No mesmo ano, concomitantemente, cursei o Curso de Especializao em

    Administrao Escolar e Docncia Superior, tendo apresentado a Monografia: Colgio

    Metalrgico: O futuro de um projeto.

    A realizao do Mestrado se apresentou como uma oportunidade de

    aprofundamento da temtica do CMEES, que no havia sido suficientemente desenvolvida

    na Especializao.

    A hiptese de trabalho partiu de trs premissas bsicas:

    1. As mudanas crescentes verificadas na base tcnica da produo, oriundas dos reflexos

    da terceira revoluo tcnico-cientifca e do advento dos novos mtodos de

    gerenciamento da produo, alteraram profundamente as exigncias do perfil dos

    2 TIRIBA, Lia Vargas. A Formao Profissional dos Trabalhadores. Revista Princpios, So Paulo: Ed.

    Anita Garibaldi, (15): 45-48, maio, 1988.

  • 23

    operrios do setor industrial, em especial do setor metalrgico e as formas para sua

    formao;

    2. As alteraes introduzidas pelo Decreto 2.208/97 na forma de organizao da

    Educao Profissional pulverizaram a perspectiva de oferta de cursos e iniciativas

    educacionais em diferentes Entidades da sociedade;

    3. O enfraquecimento poltico das Entidades Sindicais causado pela implantao do

    neoliberalismo no Brasil a partir de 1990, combinado com a diminuio da categoria

    metalrgica na base do Sindicato dos Metalrgicos do Rio de Janeiro (falncia do setor

    naval; fechamento das indstrias pela crise econmica ou por mudana para outras

    regies do Pas, fruto da guerra fiscal; diminuio dos postos de trabalho pela

    reestruturao produtiva e gerencial), que levou ao enfraquecimento material,

    ocasionaram a crise financeira crnica do Sindicato, tornando-o incapaz de continuar a

    cumprir a sua funo de Entidade Mantenedora.

    A partir da, parti da hiptese de que a perspectiva de escolarizao que restou

    ao proletariado em geral e classe operria em particular aps a proibio da oferta

    concomitante dos Ensinos Mdio e Profissional no turno da noite, os cursos seqenciais,

    para quem j possui o Ensino Mdio, ou, cursar a Educao de Jovens e Adultos (EJA) em

    dois anos e depois o curso seqencial em um ano e seis meses, colocam o CMEES em

    desvantagem na competio com outras escolas congneres, alm das centenas de

    alternativas que surgem a partir da mudana da legislao. A falta de uma fonte de

    financiamento permanente que garanta a manuteno do nvel do ensino antes oferecido,

    levou o Colgio a se posicionar na disputa do mercado de educao de uma forma

    absolutamente desfavorvel e a se defrontar como uma dupla contradio: o preo de suas

    mensalidades o tornaram proibitivo sua clientela principal e esta passou a contar com

    alternativas de escolaridade que mais se adequam as expectativas e necessidades atuais:

    exames supletivos, cursos nas empresas, opes de Educao Profissional de Nvel Bsico.

    Os objetivos da pesquisa foram:

    Averiguar em que medida a poltica implementada pelas Diretorias do Sindicato no

    perodo 1996-2002 contribuiu para o quadro atual de esvaziamento do CMEES;

  • 24

    Analisar as possibilidades de manuteno de um Colgio de formao de Tcnicos

    Industriais como o CMEES por uma Entidade Sindical, considerando-se as

    modificaes por qual passa o mundo do trabalho nos dias atuais.

    O perodo de abrangncia da pesquisa foi determinado, tendo em vista a

    existncia dos estudos anteriores acerca da experincia pedaggica do CMEES feitos por

    TIRIBA (1989) e COSTA (1995) e por ser o perodo de incio da hegemonia poltica da

    Corrente Sindical Classista - CSC na direo do Sindicato.

    Os procedimentos metodolgicos utilizados articularam trs movimentos

    simultneos que possibilitaram uma maior apreenso da totalidade3 estudada:

    1. Reviso de literatura visando estruturar uma base de anlise da realidade atual, nas suas

    dimenses conjunturais e estruturais, abordando os seguintes temas:

    Globalizao e neoliberalismo;

    Papel do Banco Mundial (BM)4 na definio das polticas educacionais no Brasil;

    A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDB) e a Educao

    Profissional e o Decreto 2.208/97;

    A terceira revoluo industrial e a reestruturao produtiva e gerencial;

    Os desafios do Movimento Sindical nos anos neoliberais;

    Os condicionantes histricos das mudanas de rumo do Movimento Sindical na dcada

    de 1990;

    A diminuio da indstria no Rio de Janeiro;

    A nova direo do Sindicato dos Metalrgicos do Rio de Janeiro;

    3 Nesta pesquisa foi utilizado o conceito de totalidade como foi definido por KOSIK (1976). Na sntese feita por KUENZER (2002: 310): Nesta concepo, evidencia-se que conhecer a totalidade no dominar todos os fatos, mas as relaes entre eles, sempre reconstrudas no movimento da histria.. 4 Isso se deve ao fato do BM ser na atualidade, segundo FRIGOTTO (2002: 1): (...) o intelectual coletivo (no sentido gramsciano) da nova pedagogia do capital globalizado e dos mecanismos de ajuste nova

    (des)ordem mundial..

  • 25

    Conceituao do Colgio Metalrgico Elpdio Evaristo dos Santos: histrico, Proposta

    Pedaggica, situao atual.

    Os movimentos iniciais de apreenso do real visam, nas palavras de KOSIK

    (1976: 12): Captar o fenmeno de determinada coisa (...) descrever como a coisa em si se

    manifesta naquele fenmeno, e como ao mesmo tempo nle se esconde. (...) atingir a

    essncia..

    Cada momento deve representar um salto qualitativo em relao

    compreenso dos fenmenos estudados. Buscar refletir os objetos de investigao atravs

    da compreenso de suas relaes internas, numa perspectiva dialtica de partir do emprico

    para o abstrato e da para o concreto pensado. Procurar a todo momento sintetizar os

    elementos fundamentais que daro o norte para a compreenso do novo modo de regulao

    da formao profissional nas suas determinaes histrico-concretas. Conforme KOSIK

    (1976: 30):

    Para que o pensamento possa progredir do abstrato ao concreto, tem de mover-se no seu prprio elemento, isto , no plano abstrato, que

    negao da imediatidade, da evidncia e da concreticidade sensvel. A ascenso do abstrato ao concreto um movimento para o qual todo incio

    abstrato e cuja dialtica consiste na superao desta abstratividade. O

    progresso da abstratividade concreticidade , por conseguinte, em geral movimento da parte para o todo e do todo para a parte; do fenmeno para a

    essncia e da essncia para o fenmeno; da totalidade para a contradio e da

    contradio para a totalidade; do objeto para o sujeito e do sujeito para o objeto. O processo do abstrato ao concreto, como mtodo materialista do

    conhecimento da realidade, a dialtica da totalidade concreta, na qual se

    reproduz idealmente a realidade em todos os seus planos e dimenses.

    2. Levantamento de fontes primrias acerca do tema no acervo do Sindicato: programa

    das chapas eleitas, resolues dos congressos da categoria, jornais e boletins.

    Foram utilizados como fontes primrias documentos do Sindicato que

    abrangessem o perodo estudado: quatro nmeros do jornal de campanha da chapa 1 (um

    de 1999 e trs de 2002), seis nmeros do Jornal META, rgo Oficial do Sindicato (um de

    1996, dois de 2001, trs de 2002) e um boletim Informe META de 2002.

    Nos jornais de campanha da chapa 1 (gestes 1999-2002 e 2002-2005) no h

    nenhuma referncia ao Colgio Metalrgico, embora tenha sido tema recorrente nas portas

  • 26

    das fbricas nas duas campanhas, alm da campanha da chapa 2 (gesto 1996-1999), das

    quais participei como ativista sindical.

    Nos seis nmeros do Jornal META e no boletim Informe META, a meno ao

    CMEES aparece em quatro deles. Em trs na forma de propaganda das atividades do

    Colgio. No jornal de 1996, O CMEES citado como mais um exemplo do estado de

    completo abandono que a gesto anterior (1993-1996) deixou o Sindicato e como mais um

    item do projeto de reconstruir o Sindicato na luta. Conforme SINDICATO DOS

    METALRGICOS DO RIO DE JANEIRO (1996: 1): O nosso colgio, que funciona em

    estado precrio, ter suas salas renovadas e aparelhadas, capazes de oferecer o conforto

    necessrio aos alunos e professores..

    Tentei consultar as resolues dos dois Congressos do Sindicato que ocorreram

    no perodo, um por mandato (gestes 1996-1999 e 1999-2002). O 4 Congresso foi

    realizado em 1997. O 5 Congresso ocorreu entre os dias 24 e 26 de agosto de 2001. As

    resolues aprovadas ainda no foram publicadas. Em conversas informais, Diretores do

    Sindicato informaram que no 5 Congresso foi aprovada uma resoluo especfica em

    defesa da manuteno do CMEES. Porm, no foi possvel ter acesso aos textos, mesmo

    que sob a forma de rascunho.

    3. Realizao de entrevistas semi-estruturadas com a Equipe Tcnico-Pedaggica,

    funcionrios, professores do CMEES e Diretores do Sindicato dos Metalrgicos do

    perodo 1996-2002, a fim de obter mais dados sobre a poltica implementada pelas

    Diretorias no perodo e levantamento atravs de questionrios, com trs alunos que j

    exercem funes tcnicas na sua prtica cotidiana de trabalho, visando conhecer a sua

    percepo acerca da relao teoria-prtica dos contedos ministrados no CMEES.

    Foram realizadas doze entrevistas semi-estruturadas: com a Diretora do

    CMEES, a ex-Assessora Pedaggica, dois funcionrios e trs professores que trabalham no

    Colgio desde 1996 e com cinco Diretores do Sindicato dos Metalrgicos do perodo 1996-

    2002, ativistas da CSC (majoritria na Diretoria no perodo), para obter mais dados sobre a

    poltica implementada pelas Diretorias no perodo.

    Os Diretores entrevistados foram os Presidentes, Tesoureiros e responsveis

    pelo Departamento/Secretaria de Formao. A escolha se deu em funo de serem os que

  • 27

    estatutariamente so responsveis pelo ordenamento das despesas (no caso dos dois

    primeiros) e pelo acompanhamento do CMEES (o terceiro).

    A Tabela 1 apresenta os Diretores do Sindicato que exerceram as funes que

    interessavam pesquisa. De oito possveis entrevistas, foram realizadas cinco. Porm, tal

    fato no representou perda de informaes relevantes, j que foram entrevistados os que

    estiveram efetivamente frente das funes e por mais tempo, conforme as trs

    observaes ao final da tabela. Alm disso, o Presidente de 1996 a 2002, tambm foi

    Diretor de Formao nas gestes 1990-1993 e 1993-1996, que embora estejam fora do

    perodo estudado, trouxeram informaes que ajudam a entend-lo.

    Tabela 1 Presidentes, Tesoureiros e Diretores/Secretrios de Formao do Sindicato dos Metalrgicos do Rio de Janeiro no perodo 1996-2002

    Cargo Gesto

    1996-1999 1999-2002 2002-2005

    Presidente Luiz Alberto Albuquerque Chaves

    Luiz Alberto Albuquerque

    Chaves

    Maurcio de

    Mendona Ramos

    Tesoureiro Admir de Souza Amorim Admir de Souza Amorim Jlio Cosme Castilho Teixeira

    Diretor/Secretrio

    de Formao

    Edson de Souza

    Wallace Paz de Arago (1)

    Mnica Cristina da Silva

    Custdio Wallace Paz de Arago (2)

    Rosngela Paiva (3)

    (1) - Na gesto 1996-1999 o Diretor Executivo oficial do Departamento era Edson de Souza, que assumiu

    durante um tempo a Tesouraria. Por divergncias polticas, o roque com o Tesoureiro foi desfeito e Edson de

    Souza voltou para o Departamento de Formao, ficando aproximadamente seis meses. Com o agravamento

    da situao poltica e sua conseqente sada da CSC, ele terminou por ser afastado da Executiva do Sindicato

    e quem assumiu o Departamento de Formao foi Wallace Paz de Arago.

    (2) - Na gesto 1999-2002 o Departamento de Formao foi transformado em Secretaria de Formao e a

    nova Secretaria foi dividida em duas: Formao Sindical e Formao Profissional e Cultural. O Colgio ficou ligado a Secretaria de Formao Profissional, cujo Diretor era Mnica Cristina da Silva Custdio. No incio

    de 2000, Mnica foi eleita para a Direo Nacional da Central nica dos Trabalhadores (CUT) e Wallace Paz

    de Arago assumiu a Secretaria de Formao Profissional. A Diretora de Formao Sindical era Rosngela

    Paiva.

    (3) - Na gesto 2002-2005, a Secretaria de Formao foi reunificada e a Diretora Executiva da Secretaria

    Rosngela Paiva. Porm, ela no tem nenhum envolvimento com o CMEES. Quem cuida na prtica das

    questes relacionadas ao Colgio o Presidente e o Diretor Executivo da Secretaria de Comunicao

    Wallace Paz de Arago.

    A exposio da pesquisa foi organizada em trs captulos.

    O primeiro captulo SITUANDO O NOSSO RIO: AS MARGENS QUE

    NOS OPRIMEM, trata da caracterizao da conjuntura atual nos aspectos que

    condicionam a anlise: globalizao e neoliberalismo; as polticas do Banco Mundial

    para a educao no Brasil; a Educao Profissional no Brasil, a nova LDB e o Decreto

  • 28

    2.208/97; as mudanas na base tcnica e gerencial da produo que produzem as

    modificaes no mundo do trabalho. Est dividido em quatro partes:

    1.1 - A ideologia da globalizao, faz a caracterizao da chamada

    globalizao e o que o conceito realmente esconde: o neoliberalismo. Est subdividido

    em dois sub-itens:

    1.1.1 - A esfinge moderna - Explicitao dos motivos pelos quais o termo

    considerado uma construo ideolgica (no sentido de conjunto de idias que uma classe

    social se utiliza para explicar a realidade) e portanto ser sempre utilizado no trabalho entre

    aspas. Ser chamado de ideologia da globalizao;

    1.1.2 - Neoliberalismo: De teoria marginal poltica marginalizadora -

    Histrico do surgimento das teses neoliberais, de sua implantao como poltica de Estado

    dominante em dois teros do planeta e discusso acerca de seus efeitos em nossa realidade.

    1.2 - Banco Mundial: Especialista em educao?!?!?!?!?!, apresenta como o

    Banco Mundial se transformou de financiador do crescimento econmico em agncia

    internacional de formulao de polticas pblicas. Est subdividido em dois sub-itens:

    1.2.1 - De mecenas a cavalo de Tria - Histrico da criao do Banco Mundial,

    as mudanas na sua estratgia poltica ao longo do tempo e sua transformao em agncia

    de formulao de polticas pblicas para a sade e a educao para os pases dependentes;

    1.2.2 - E o Brasil fez o seu dever de casa - Discusso sobre as medidas tomadas

    pelo governo brasileiro para se adequar as receitas preconizadas pelo Banco Mundial.

    1.3 - Nova LDB e a Educao Profissional, discute a Educao Profissional

    no Brasil, a nova LDB e o Decreto 2.208/97. Est subdividido em trs sub-itens:

    1.3.1 - Pequeno histrico da Educao Profissional no Brasil -

    Contextualizao do surgimento da Educao Profissional no Brasil;

    1.3.2 - Nova LDB: Da luta popular ao golpe palaciano - Trajetria da

    aprovao da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional: lutas, vicissitudes,

    acordos e golpes;

  • 29

    1.3.3 - Decreto 2.208: Da Educao Profissional certificao - Explicitao

    do contedo e anlise dos desdobramentos e resultados do Decreto.

    1.4 - Terceira revoluo industrial e reestruturao produtiva, faz um

    histrico das mudanas na base tcnica e gerencial da produo e de como elas se

    relacionam com as transformaes no mundo do trabalho que influem diretamente na

    Educao Profissional. Est subdividido em seis sub-itens:

    1.4.1 - O que fazer e como fazer: Dois movimentos que se interpenetram

    Caracterizao das mudanas implementadas na base tcnica da produo pelo capitalismo

    no curso de seu desenvolvimento;

    1.4.2 - Taylor e o homem boi Conceituao dos estudos acerca da

    organizao cientfica do trabalho fabril, do engenheiro Frederick Winslow Taylor, pai

    da chamada Administrao Cientfica;

    1.4.3 - Ascenso e queda do Fordismo Discusso acerca do sistema de

    produo e gesto que Henry Ford implantou, baseado no princpio da linha de montagem;

    1.4.4 - E tudo comeou com uma vlvula ... Trajetria das mudanas na base

    material que possibilitaram a mudana do paradigma produtivo;

    1.4.5 - Vamos vestir a camisa da empresa... mas quem vai vestir a nossa?

    Como o toyotismo/ohnismo se transformou de soluo criativa para a mudana da

    organizao da produo e adaptada realidade japonesa em modelo para o mundo;

    1.4.6 - Dialogando com a realidade. Ou penso, logo resisto! Quais foram os

    desdobramentos da importao do novo paradigma produtivo na nossa realidade.

    O segundo captulo O MOVIMENTO SINDICAL NAVEGANDO EM

    CORREDEIRAS, trata da contextualizao do Movimento Sindical a partir da relao

    Sindicalismo/Sindicato dos Metalrgicos/Conjuntura. Est dividido em quatro partes:

    2.1 - Os desafios do Movimento Sindical nos anos neoliberais, conceitua a

    crise do Movimento Sindical na dcada de 1990, em especial no perodo de 1994 a 2002.

  • 30

    2.2 - Mudanas de rumo, apresenta o debate poltico e ideolgico que o

    sindicalismo cutista viveu no perodo, e a guinada que a corrente majoritria da CUT

    empreendeu. Est subdividido em trs sub-itens:

    2.2.1 - Imperialismo e aristocracia operria Apresenta os dois conceitos,

    derivados da obra de Lnin;

    2.2.2 - Um breve fio de histria Apresenta um pequeno histrico do

    Movimento Sindical no Brasil at o final da dcada de 1970;

    2.2.3 - A social-democracia tardia Descreve as condies histricas de

    formao da corrente social-democrata de esquerda no Pas e sua relao com a guinada

    poltica da CUT.

    2.3 - Diminuio da indstria no Rio de Janeiro, apresenta o reflexo das

    polticas industriais implementadas entre 1996 e 2002 pelos governos Federal e Estadual,

    na economia do Estado do Rio de Janeiro.

    2.4 - Nova direo no Sindicato dos Metalrgicos, faz um histrico do

    retorno dos sindicalistas Classistas direo do Sindicato dos Metalrgicos do Rio de

    Janeiro at sua consolidao como Corrente Poltica hegemnica.

    O terceiro captulo O COLGIO METALRGICO ELPDIO EVARISTO

    DOS SANTOS, trata de como a relao explicitada no captulo anterior repercute e

    direciona a prtica educativa do CMEES e do prprio Sindicato. Est dividido em trs

    partes:

    3.1 - Histrico do Colgio Metalrgico, traz o histrico da criao do

    CMEES at a crise atual. As contradies da relao Sindicato-Escola e a contextualizao

    do perodo estudado (1996/2002).

    3.2 - Proposta Pedaggica, apresenta a Proposta Poltico-Pedaggica do

    CMEES.

  • 31

    3.3 - Entre o discurso e a prtica, traz a articulao e os desdobramentos dos

    cruzamentos das informaes entre as entrevistas, as propostas e resolues contidas nos

    documentos e a prtica verificada. Est subdividido em quatro sub-itens:

    3.3.1 - Caractersticas do Colgio;

    3.3.2 - Integrao entre o Colgio e o Sindicato;

    3.3.3 - As polticas implementadas pelas gestes 1996-2002 e a crise do

    CMEES;

    3.3.4 - Perspectivas sobre o futuro do CMEES.

    3.3 - Entre o discurso e a prtica, traz a articulao e os desdobramentos dos

    cruzamentos das informaes entre as entrevistas, as propostas e resolues contidas nos

    documentos e a prtica verificada. Est subdividido em quatro sub-itens:

    3.3.1 - Caractersticas do Colgio;

    3.3.2 - Integrao entre o Colgio e o Sindicato;

    3.3.3 - As polticas implementadas pelas gestes 1996-2002 e a crise do

    CMEES;

    3.3.4 - Perspectivas sobre o futuro do CMEES.

  • 32

    A rvore que no d frutos xingada de estril.

    Quem examina o solo? O galho que quebra

    xingado de podre, mas

    No haveria neve sobre ele?

    Do rio que tudo arrasta Se diz que violento,

    Ningum diz violentas

    As margens que o cerceiam. Bertold Brecht

    1 SITUANDO O NOSSO RIO: AS MARGENS QUE NOS OPRIMEM

    No primeiro captulo, iremos nos familiarizar com os aspectos da realidade que

    iro condicionar o objeto de estudo:

    Explicitao dos motivos pelos quais o termo globalizao considerado uma

    construo ideolgica (no sentido de conjunto de idias que uma classe social se

    utiliza para explicar a realidade) e portanto ser sempre utilizado no trabalho entre

    aspas. Ser chamado de ideologia da globalizao;

    Histrico do surgimento das teses neoliberais, de sua implantao como poltica de

    Estado dominante em dois teros do planeta e discusso acerca de seus efeitos em

    nossa realidade;

    Anlise de como o Banco Mundial se transformou de financiador do crescimento

    econmico em agncia internacional de formulao de polticas pblicas: histrico de

    sua criao, as mudanas na sua estratgia poltica ao longo do tempo, sua

    transformao em agncia de formulao de polticas pblicas para a sade e a

    educao para os pases dependentes e, discusso acerca das medidas tomadas pelo

    governo brasileiro para se adequar as receitas preconizadas pelo BM;

    Contextualizao do surgimento da Educao Profissional no Brasil;

  • 33

    Trajetria da aprovao da nova LDB e a explicitao do contedo, anlise dos

    desdobramentos e resultados do Decreto 2.208/97;

    Caracterizao das mudanas implementadas na base tcnica e gerencial da produo

    pelo capitalismo no curso de seu desenvolvimento e de como elas se relacionam com

    as transformaes no mundo do trabalho que influem diretamente na Educao

    Profissional. Em especial dos estudos acerca da organizao cientfica do trabalho

    fabril, de Taylor; do sistema de produo e gesto que Henry Ford implantou, baseado

    no princpio da linha de montagem; a trajetria das mudanas na base material que

    possibilitaram a mudana do paradigma produtivo; a transformao do

    toyotismo/ohnismo em modelo para o mundo e quais foram os desdobramentos da

    importao do novo paradigma produtivo na nossa realidade.

  • 34

    Este mundo globalizado, visto como fbula, erige como verdade um certo nmero de fantasias,

    cuja repetio, entretanto, acaba por se tornar uma base aparentemente slida de sua interpretao.

    Maria da Conceio Tavares Destruio No Criadora

    1.1 - A IDEOLOGIA DA GLOBALIZAO

    1.1.1 - A ESFINGE MODERNA

    A globalizao se tornou um termo impreciso que pretende exprimir muita

    coisa, mas que acaba no dizendo nada. A atualidade da discusso merece que se faa um

    pequeno detour para explicitar os motivos pelos quais tal termo no passa de uma

    construo ideolgica (no sentido de conjunto de idias que uma classe social se utiliza

    para explicar a realidade) e portanto ser sempre utilizado neste trabalho entre aspas. Irei

    cham-lo de ideologia da globalizao.

    Segundo BATISTA JUNIOR (1997: 7), a ideologia da globalizao cumpre

    duas funes bsicas: (1) divulgar a idia de que existe um processo em curso de forma

    natural e inexorvel na economia mundial e (2) que nada mais resta sociedade,

    Sindicatos, Partidos, Estados nacionais que no se adaptar a esse movimento comandado

    pelo grande capital atravs das corporaes transnacionais.

    CASTRO (2003) acrescenta:

    Assim, a louvao da globalizao funciona como anestesiante ideolgico para desarmar qualquer resistncia ao absolutismo do mercado

    (leia-se: capital) e impedir-nos de enxergar a natureza real (a rigor, nada

    original) da ofensiva do capital contra os trabalhadores - sobretudo contra os

    trabalhadores dos pases perifricos que so os mais flexibilizados (precarizados) economicamente e os mais desprotegidos, social e

    politicamente.

    SANTOS et al. (1997: 19) completa:

    Hoje, o que federativo ao nvel mundial no uma vontade de

  • 35

    liberdade, mas de dominao, no o desejo de cooperao mas de

    competio, tudo isso exigindo um rgido esquema de organizao que

    atravessa todos os rinces da vida humana. Com tais desgnios, o que globaliza falsifica, corrompe, desequilibra, destri.

    Por que se utilizar do termo globalizao? A experincia demonstra que a

    palavra traz em si conotaes positivas. Como professor da disciplina de Organizao e

    Normas do Trabalho do Colgio Metalrgico Elpdio Evaristo dos Santos, abordava o tema

    no programa do curso. O primeiro item era sobre globalizao e neo liberalismo. No

    incio da aula fazia um inventrio com os alunos dos significados que eles atribuam ao

    termo, pensando apenas no sentido etimolgico da palavra e os resultados eram sempre

    muito parecidos: unio, fim das barreiras, fim das fronteiras, confraternizao, diminuio

    das distncias e assemelhados. apenas um pequeno exemplo da potncia positiva que o

    termo carrega. Tambm por tal motivo to explorado pelos apologistas da suposta

    novidade.

    Mas o quo novo o processo de globalizao? J se enraizou no senso

    comum a idia de que um fenmeno associado diminuio das distncias entre os

    pases em virtude do avano das tecnologias de produo, comunicao e informao, ou

    seja, algo que filho direto da terceira Revoluo Tcnico-Cientfica. A inveno do chip e

    o advento da microinformtica e da robtica so a base material para a profunda revoluo

    na maneira do homem dominar a natureza e se utilizar dos seus recursos.

    Porm, se globalizao significar aumento do mundo conhecido, diminuio

    ou alargamento das fronteiras nacionais, e principalmente, a formao de um mercado

    mundial, tal movimento no se inicia na dcada de 70 do Sculo XX, mas nas chamadas

    grandes navegaes empreendidas pelo povos da Pennsula Ibrica nos Sculos XV e XVI.

    Ou at se quisermos retroceder mais alguns sculos, na poltica expansionista do Imprio

    Romano ou de outros povos da Antigidade Clssica. Portanto, a globalizao no tem

    nada de novidade, muito pelo contrrio, pode inclusive ser considerada como algo inerente

    ao movimento dos grupos humanos sobre o planeta.

    A idia corrente de que estaramos vivendo hoje uma poca sem precedentes de

    integrao do mercado mundial no resiste avaliao de nenhum dos indicadores que

    poderiam comprovar tal tendncia: a integrao internacional das economias

  • 36

    (participao do comrcio exterior na produo mundial); ndices de investimentos

    internacionais; a migrao internacional.

    Com relao a este particular, chama a ateno que os ndices de

    movimentao de mo-de-obra entre os pases eram muito mais favorveis no final do

    Sculo XIX e incio do Sculo XX do que atualmente, onde supostamente estaramos

    vivendo uma poca de integrao, de fim das fronteiras. Na verdade o que houve foi

    um refluxo5. Os pases desenvolvidos no querem nem ouvir falar em receber imigrantes

    dos pases da Amrica Latina, sia e frica. Os Estados Unidos da Amrica do Norte,

    antes terra das oportunidades, onde a Esttua da Liberdade colocada na entrada da Baa de

    Nova Iorque virou sinnimo de boas vindas aos visitantes, hoje os recebe a tiros no muro

    da vergonha da fronteira com o Mxico.

    MORAES (2001: 34) nos traz a dimenso da tragdia:

    O democrata global Clinton encontrou soluo ainda mais eficaz para defender o nvel de emprego na matriz imperial. Sob o rtulo

    prevention through deterrence, mandou reforar e completar uma barreira de 3.140 quilmetros cobrindo a fronteira dos Estados Unidos com o Mxico.

    Muros blindados, patrulhas permanentes, algumas formadas por fazendeiros

    armados (que se divertem, nos fins de semana, caando chicanos que lograram atravessar vivos a fronteira), foram responsveis, somente nos trs primeiros anos de aplicao do plano Clinton (94/97) pela morte de pelo menos

    1.185 mexicanos. Vinte e cinco vezes mais, em mdia anual, do que os mortos

    no Muro de Berlim.

    Na Europa, os imigrantes se tornaram os bodes expiatrios do aumento do

    desemprego e surgem com fora movimentos racistas e neonazistas que perseguem e

    assassinam imigrantes.

    Os dados e ndices que comprovam tais tendncias esto publicados, so de

    domnio pblico, de acesso relativamente fcil, mas raramente chegam ao conhecimento da

    opinio pblica, da sociedade em seu conjunto. Porm, segundo CASTRO (2003): (...) os

    fatos e os nmeros no falam; eles permanecem mudos at serem corretamente

    5 Para citar apenas um dos exemplos utilizados por BATISTA JUNIOR (1997: 9): Recentemente, o governo dos Estados Unidos divulgou o resultado de um censo da populao nascida no exterior e residente naquele

    pas. Em maro de 1996, um pouco menos de 10% da populao dos EUA era nascido no exterior, de pais

    no-americanos. Em 1910, a proporo era de 14,7% de moradores nascidos no exterior..

  • 37

    interrogados (ordenados e analisados) com auxlio de uma teoria consistente com o

    conjunto da realidade social capitalista..

    O conceito de globalizao como novidade, como uma etapa indita de

    desenvolvimento na histria humana aparece ento como o que realmente : uma

    sistemtica manipulao da realidade que visa escond-la, embora esteja vista de todos.

    Outra verdade que se quer construir, a noo de que a expanso das

    atividades internacionais, capitaneada pelas empresas multinacionais, agora apelidadas de

    transnacionais, levaria ao fim das fronteiras e dos estados nacionais. Apesar da expanso

    ter aumentado enormemente nos ltimos vinte anos, o peso dos mercados internos continua

    sendo preponderante. Novamente, BATISTA JUNIOR (1997: 10) vem demonstrar:

    aproximadamente 80% do produzido na economia mundial se destina ao consumo dos

    mercados internos dos pases onde ocorre a produo. A gerao de empregos para atender

    a demanda interna responde por 90% do mercado mundial e 95% dos investimentos so

    financiados com poupana interna. Tais dados no deixam muito espao para dvidas

    sobre o contedo meramente ideolgico das formulaes que sustentam que j estaramos

    vivendo uma poca da vigncia de um mercado global fortemente integrado, onde a fora e

    a participao dos mercados internos e Estados nacionais seriam irrelevantes.

    Sobre o mercado global, SANTOS (2000: 41), ainda acrescenta:

    O fato que apenas trs praas, Nova Iorque, Londres e Tquio, concentram mais da metade de todas as transaes e aes; as empresas

    transnacionais so responsveis pela maior parte do comrcio dito mundial; os

    47 pases menos avanados representam juntos apenas 0,3% do comrcio

    mundial, em lugar dos 2,3% em 1960.

    Os investimentos estrangeiros diretos, to festejados em nosso pas como

    indispensveis e nicos alavancadores do nosso desenvolvimento, embora tenham crescido

    nos pases dependentes nos anos 90, representam apenas 4% da formao bruta de capital

    fixo na economia mundial, segundo dados de rgo da Organizao das Naes Unidas

    (ONU) sediado em Genebra. Mesmo no conjunto dos pases dependentes, a relao entre a

    participao dos investimentos diretos estrangeiros e a formao bruta de capital fixo

    correspondeu a apenas 7,5%. Seja sob que perspectiva que se queira analisar, os ndices

  • 38

    provam que o investimento nacional o principal motor de crescimento da economia da

    maioria dos pases6.

    Mesmo se considerarmos as transaes de comrcio exterior, como ndice de

    um suposto aumento da integrao entre os pases, ela acontece somente entre os pases

    ricos. HOBSBAWM (2001: 550) colabora com dados incontestveis:

    No se percebe em geral que todos os pases desenvolvidos, com exceo dos EUA, mandavam uma parte menor de suas exportaes para o

    Terceiro Mundo na dcada de 1990 que em 1938. Os ocidentais (incluindo os

    EUA) mandaram para l menos de um quinto de suas exportaes em 1990.

    Ainda sobre os investimentos estrangeiros diretos, CHESNAIS (1996: 63)

    destaca que eles vem cada vez mais se concentrando entre Estados Unidos, Europa e Japo

    e demais pases da OCDE7. As aquisies e fuses de empresas existentes representaram a

    modalidade predominante de investimento entre os pases da OCDE.

    Outro forte mito associado ideologia da globalizao o de que os Estados

    nacionais estariam perdendo sua fora e razo de ser, o que os levaria a estarem

    encolhendo em todos os pases do mundo. Nos pases dependentes pode at ser, mas nos

    pases desenvolvidos ocorreu justamente o oposto. Os dados da OCDE8 de 1996, portanto

    do auge da aplicao do receiturio neoliberal no mundo, inclusive nos pases ricos,

    demonstra que na comparao entre os perodos de 1978-1982 (incio da hegemonia

    neoliberal) e 1991-1995, os gastos pblicos como proporo do Produto Interno Bruto

    (PIB), a carga tributria, o dficit pblico e a participao do emprego pblico como

    proporo do emprego total aumentaram no ltimo perodo nos pases membros do Grupo

    dos sete grandes (G-8)9. A poltica econmica brasileira tem se adaptado no s

    tendncias da economia mundial, mas a uma srie de mitos que transitam nos crculos de

    poder dos pases centrais, sendo consumidos por nossas classes dominantes como plulas

    6 Citado por BATISTA JUNIOR (1997: 10). Segundo FERNANDES (1998: 81): O valor dos fluxos externos de capital dos principais pases investidores, (...) no ultrapassam, hoje, 2% do valor dos seus

    PIBs reunidos, contra uma mdia de 4 a 6% no incio do sculo (com a Inglaterra atingindo o pico de 9% nessa poca).. 7 Organizao para a Cooperao e o Desenvolvimento Econmico. Rene os 26 pases mais desenvolvidos

    do mundo. 8 Citados por BATISTA JUNIOR (1997: 11). 9 O grupo dos sete pases capitalistas mais desenvolvidos do mundo (Alemanha, Canad, Estados Unidos da

    Amrica (EUA), Frana, Inglaterra, Itlia, Japo) passou a ser chamado de G-8 por conta da participao da

    Rssia, mas notrio que isso s acontece pelo poderio militar que (ainda) lhe resta.

  • 39

    mgicas que iro salv-las de suas prprias atitudes de subservincia frente ao grande

    capital.

    Cabe ainda uma nota acerca do mito das empresas transnacionais. Tal

    construo se articula fortemente com o mito do declnio dos Estados nacionais. Se esses

    deixam de ter papel relevante na cena econmica internacional, as empresas deixam

    tambm de possuir uma estreita vinculao com suas bases ou origens nacionais, tornando-

    se empresas transnacionais. Somente algumas poucas empresas poderiam se encaixar em

    tal denominao por serem de pases desenvolvidos muito pequenos, como Blgica,

    Holanda e Sua, tecnicamente adiantados, mas com um mercado interno limitado. Em tais

    casos encontram-se algumas grandes corporaes que geram uma elevada proporo de

    empregos e vendas nas filiais do exterior e/ou que mantm um percentual elevado de seus

    ativos fora do pas de origem. Os dados disponveis10

    demonstram que as grandes

    corporaes multinacionais continuam sendo empresas nacionais, que mantm pesadas

    restries presena de estrangeiros em seus conselhos de administrao (ou seja, o centro

    decisrio encontra-se vinculado origem nacional) e estreitos laos com os governos de

    seus pases na busca de subsdios e na disputa de mercados. Por exemplo, a Nestl, uma

    das empresas mais transnacionalizadas do mundo, que tem somente 5% dos seus ativos e

    empregados na Sua, limita os direitos de voto de estrangeiros no conselho de

    administrao a apenas 3% do total.

    BOITO JUNIOR (1999: 48-49) vem confirmar tais afirmaes:

    Estudos de economistas e historiadores ingleses e franceses mostram que as chamadas empresas globais, que teriam investimento, pesquisa, produo e consumo difundidos indistintamente por diversos pases so, acima de tudo, um mito criado pela teoria da globalizao. As firmas ditas globais concentram pesquisa, produo, consumo, lucros e venda de aes nos pases desenvolvidos e possuem um enraizamento nacional.

    Exemplos recentes de disputa de mercado, como a presso direta exercida pelo

    governo dos EUA para que os pases dependentes aprovassem Legislao sobre patentes

    que interessavam diretamente as grandes empresas monopolistas estadunidenses; o

    10 Citados por BATISTA JUNIOR (1997: 12). Ainda: Em 1991, apenas 2% dos membros dos conselhos de administrao de grandes empresas americanas eram estrangeiros. Segundo a revista inglesa The Economist, diretores estrangeiros nas companhias japonesas so to raros quanto lutadores britnicos de sum..

  • 40

    envolvimento dos governos e servios secretos para que as empresas de seus pases,

    Estados Unidos (Raytheon) e Frana (Thompson), ganhassem a concorrncia para fornecer

    os equipamentos para o Sistema de Vigilncia da Amaznia SIVAM ou o

    comportamento do governo do Canad no caso da Empresa Brasileira de Aeronutica

    (EMBRAER) x Bombardier, que se transformou em retaliao comercial louca contra o

    Brasil, demonstram que o alardeado distanciamento das grandes empresas com a questo

    nacional s existe nos manuais de propaganda ideolgica para os pases dependentes.

    A bela sntese descrita por SANTOS (2000: 18-19), de um realismo quase

    potico, auxilia a remover o vu:

    Este mundo globalizado, visto como fbula, erige como verdade um certo nmero de fantasias, cuja repetio, entretanto, acaba por se tornar

    uma base aparentemente slida de sua interpretao.

    A mquina ideolgica que sustenta as aes preponderantes da atualidade feita de peas que se alimentam mutuamente e pem em

    movimentos os elementos essenciais continuidade do sistema. Damos aqui

    alguns exemplos. Fala-se por exemplo, em aldeia global para fazer crer que a difuso instantnea de notcias realmente informa as pessoas. A partir desse

    mito e do encurtamento das distncias para aqueles que realmente podem viajar tambm se difunde a noo de tempo e espao contrados. como se o mundo se houvesse tornado, para todos, ao alcance da mo. Um mercado avassalador dito global apresentado como capaz de homogeneizar o planeta

    quando, na verdade, as diferenas locais so aprofundadas. H uma busca de

    uniformidade, ao servio dos atores hegemnicos, mas o mundo se torna menos unido, tornando mais distante o sonho de uma cidadania verdadeiramente

    universal. Enquanto isso, o culto ao consumo estimulado.

    Fala-se, igualmente, com insistncia, na morte do Estado, mas o

    que estamos vendo seu fortalecimento para atender aos reclamos da finana e de outros grandes interesses internacionais, em detrimento dos cuidados com

    as populaes cuja vida se torna mais difcil.

    Esses poucos exemplos, recolhidos numa lista interminvel, permitem indagar se, no lugar do fim da ideologia proclamado pelos que

    sustentam a bondade dos presentes processos de globalizao, no estaramos,

    de fato, diante da presena de uma ideologizao macia, segundo a qual a realizao do mundo atual exige como condio essencial o exerccio de

    fabulaes.

    A explicitao da ideologia da globalizao deixa claro que um termo

    encharcado de conotaes ideolgicas. MORAES (2001: 35) nos ajuda a compreender o

    porque da sua difuso como verdade pelos quatro cantos do planeta:

    Como uma to grotesca e odiosa impostura ideolgica logrou obter tanto xito? O marxismo oferece o princpio de explicao: as idias

    dominantes so, normalmente, e sobretudo em perodos de refluxo das esperanas revolucionrias como o atual, as idias das classes dominantes. A

  • 41

    verdade sempre revolucionria, mas a fora de uma idia depende muito da

    fora dos que a sustentam. A fragilidade dos dados pseudocientficos em que se

    fundamentava a idia hitleriana da superioridade racial dos povos arianos no a impediu de receber apoio macio na Alemanha civilizada. A idia de globalizao, at por no se apoiar em doutrinas intrinsecamente odiosas como o nazismo, difundiu-se com mais facilidade. Mas em termos de poderio

    militar, de capacidade de destruio e de amplitude territorial, o Eixo nazi-fascista pouca coisa se comparado mquina blica da OTAN.

    A sua repetio exausto, como sendo o somatrio de uma srie de novidades

    inerentes ao mundo moderno, encobre na verdade outro termo que no goza de muito

    prestgio e que evitado at por aqueles que aplicam suas orientaes: neoliberalismo.

  • 42

    O sistema burgus tornou-se demasiado estreito para conter as riquezas criadas em seu seio.

    De que maneira consegue a burguesia vencer essas crises? De um lado, pela destruio violenta de grande quantidade de foras produtivas;

    de outro lado pela conquista de novos mercados

    e pela explorao mais intensa dos antigos.

    A que leva isso? Ao preparo de crises mais extensas e mais destruidoras e diminuio dos meios de evit-las.

    Karl Marx e Friedrich Engels Manifesto do Partido Comunista

    1.1.2 - NEOLIBERALISMO: DE TEORIA MARGINAL POLTICA

    MARGINALIZADORA

    O neoliberalismo nasce depois da II Guerra Mundial, na Europa e Amrica do

    Norte. Foi uma reao terica e poltica implementao das teses keynesianas11

    , que

    preconizavam a maior interveno do Estado da economia de modo a regular as disputas

    de mercado, atenuando os efeitos da desigualdade social inerente a dinmica da disputa

    monopolista no sistema capitalista de produo. Seu idelogo principal o austraco

    Friedrich A. Hayek, que em 1944 escreveu: O caminho da servido,12

    com objetivo de

    isolar o nazismo e o socialismo (que ele tenta de forma abertamente ideolgica identificar

    como iguais), combater a interveno do Estado na economia e defender a liberdade sem

    limites para o capital. Foi um dos continuadores da Escola Austraca, cujos fundamentos

    tericos se baseiam no subjetivismo e no individualismo metodolgico. No prefcio da

    edio inglesa de 1944, Hayek diz claramente que O caminho da servido um livro

    poltico. Nem tenta esconder, sob o manto de um falso cientificismo, suas posies.

    Em 1947, Hayek fundou a Sociedade de Mont Plerin, em conjunto com

    Milton Friedman13

    , Karl Popper, Lionel Robbins, Ludwig Von Mises, Walter Lipman,

    11 Nome dado ao conjunto de polticas macroeconmicas inspiradas nas idias de John Maynard Keynes. A

    base central de tais polticas a ativa interveno do Estado, tanto na regulao das atividades econmicas,

    como na formulao e garantia de execuo de polticas pblicas de proteo e seguridade social. 12 O histrico sobre Friedrich Hayek e suas posies polticas e ideolgicas baseia-se no trabalho de

    ARANTES (2001a, b e c). 13 Segundo ARANTES (2001a): Friedrich Hayek e Milton Friedman so considerados os dois maiores representantes da corrente de pensamento neoliberal. (...) Friedman dedicou seus trabalhos importncia

    da poltica monetria. totalmente contra qualquer medida governamental de natureza fiscal ou monetria

    para contrabalanar os ciclos econmicos. (...) O sentido geral de sua obra, assim como a de Hayek um

    retorno ao liberalismo do laissez-faire..

  • 43

    Michael Polanyi, Salvador Madriaga entre outras personalidades de diversos pases que

    compartilhavam de sua orientao ideolgica. Durante vinte e cinco anos as atividades da

    Sociedade, apesar da sua dedicao e organizao, inclusive com reunies internacionais a

    cada dois anos, no passaram de pregao ideolgica marginal. Suas idias ficaram

    confinadas ao meio acadmico, vistas com desdm, consideradas como uma coisa meio

    extica, embora durante esse perodo tenham travado vrias polmicas contra o

    keynesianismo e o marxismo. A idia central a de que qualquer limitao dos

    mecanismos de mercado por parte do Estado, se tornaria ameaa liberdade econmica.

    Para os neoliberais a esfera do mercado a da liberdade e a esfera do Estado a da coao.

    A interveno do Estado na economia e a regulao social eram os temas que eram objetos

    de seu mais ferrenho combate. Qualquer tipo de planejamento da economia classificado

    como totalitarismo, porque ao levar em conta os interesses da coletividade, entra em

    conflito com os interesses individuais, que so os nicos que realmente existem e

    interessam.

    Tal viso identifica os interesses coletivos como o mero somatrio de

    interesses individuais idnticos de muitos indivduos. Por esta razo, o Estado somente

    pode atuar numa esfera em que no limite a liberdade individual, ou seja, a garantia da

    propriedade privada e do livre mercado, o que leva a concluso inevitvel que somente

    no capitalismo possvel a liberdade. A liberdade colocada no campo essencialmente

    econmico e no poltico. Hayek defendia que o novo igualitarismo promovido pelo

    Estados de Bem-Estar Social, destruiria a liberdade dos cidados e a vitalidade da

    concorrncia, fato que logo viria a abalar a sade econmica da sociedade. Afirmava que a

    desigualdade era um valor positivo e at imprescindvel, sem o qual o desenvolvimento do

    esprito empreendedor dos indivduos ficaria comprometido e viria a refletir no

    desenvolvimento econmico. A produo de desigualdades pelo Estado de Direito no

    seriam criadas intencionalmente, pois no visariam atingir a uma pessoa determinada. No

    caberia ao Estado promover uma igualdade substantiva, material, apenas a igualdade

    formal, porque isto afetaria o Estado de Direito e a liberdade individual.

    Com os elementos de crise econmica que comeam a germinar e vo

    anunciando o fim dos trinta gloriosos anos do capitalismo (1945-1975), as idias

  • 44

    neoliberais vo tomando a cena poltica e conseguem reunir fora material para se

    transformarem em polticas de governo.

    Na base dessa crise econmica, est a crise do padro de acumulao fordista,

    com o enfraquecimento da produtividade, por um lado, e o crescente aumento da

    composio orgnica do capital, por outro, levando a uma diminuio constante da taxa

    mdia de lucro e, conseqentemente, a crise de rentabilidade do sistema como um todo.

    Nos pases mais desenvolvidos, pressionados pelo crescente dficit fiscal,

    conjugado com os dois choques do petrleo (1973 e 1979), cresce a presso econmica,

    ideolgica e poltica para a implementao de solues alternativas ao keynesianismo.

    Porm, a primeira experincia a cu aberto, o primeiro laboratrio de

    implantao das teses neoliberais, aconteceu no Chile. Em 1973, com o golpe militar

    liderado por Pinochet, aparecem as condies polticas ideais para tal. Foram chamados

    para assumir o controle da economia chilena, economistas da Universidade de Chicago, os

    Chicago Boys, sob a direo do prprio Milton Friedman. A especificidade da

    experincia Chilena que alm do ineditismo, foi possvel tambm comprovar na prtica

    as convices de Hayek, que achava que a liberdade e a democracia poderiam se tornar

    incompatveis com o desenvolvimento econmico, se a maioria democrtica decidisse

    interferir com os direitos incondicionais de cada agente econmico de dispor de sua renda

    e de sua propriedade como quisesse. Dito de outra forma: a democracia pode ser o melhor

    regime poltico para que o projeto neoliberal se desenvolva, mas se no for possvel ... far-

    se- da mesma maneira.

    A partir da chegada ao poder de Margareth Thatcher (de quem Hayek foi

    conselheiro), na Inglaterra, em 1979 e de Ronald Reagan nos Estados Unidos, em 1980, o

    mundo desenvolvido vai conhecer o remdio amargo que advm da aplicao do projeto

    econmico neoliberal. A responsabilidade pela crise do modelo keynesiano de

    desenvolvimento, foi atribuda pelos neoliberais s reivindicaes do Movimento Sindical,

    que ao serem atendidas geraram desequilbrios com gastos maiores que as receitas, levando

    os estados capitalistas a viverem uma dramtica crise fiscal. A partir da, o neoliberalismo

    ganha fora poltica para se transformar em credo social, que comea a se espalhar pelo

    mundo. Depois dos pases desenvolvidos, comea a tomar conta dos pases dependentes, e

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    ajudado pela debacl do chamado campo socialista na Europa Oriental e Unio Sovitica,

    hoje se tornou a orientao dominante em dois teros do mundo, embora no sem

    resistncias e combates. Tal razo de natureza poltica foi fundamental para a consolidao

    do neoliberalismo como ideologia poltica e programa econmico dominante: no existiria

    mais o risco do comunismo e a burguesia no necessitava mais se preocupar em atender

    as reivindicaes do proletariado. Voltava ordem do dia a possibilidade de um

    capitalismo sem controle, como na Primeira Revoluo Industrial.

    Segundo JOFFILY (1999: 11-13), o neoliberalismo uma ofensiva geral do

    grande capital, especialmente norte-americano, num clima de crise econmica. Ofensiva,

    porque com a derrota momentnea da experincia socialista sovitica, o capitalismo que

    est no ataque com toda agressividade, obrigando o Movimento Sindical a adotar uma

    estratgia defensiva, de resistncia. Geral, porque atinge o planeta inteiro e porque

    transborda do campo econmico, para o poltico, militar, diplomtico, ideolgico, artstico,

    cultural, educacional. Do grande capital, porque o neoliberalismo tem um claro sentido de

    classe, burgus. Norte-americano, pois nem todas as burguesias tem o mesmo interesse no

    projeto neoliberal, que um mecanismo para os Estados Unidos se tornarem o grande

    globalizador, no s dos pases dependentes, mas avanando sobre as demais metrpoles

    capitalistas. Crise, pois o neoliberalismo, alm de socialmente perverso fracassou

    economicamente, em especial nos pases dependentes como o Brasil.

    CASTRO (2003) acrescenta:

    (...) remercantilizao das relaes capitalistas de trabalho uma decorrncia lgica da ofensiva poltica neoliberal e tambm o principal

    trao social do novo tipo de desenvolvimento capitalista: acumulao concentradora sob o comando do capital financeiro mundializado.

    Subordinao mais completa do trabalho ao capital significa, obviamente,

    controle pleno do capital sobre os processos (diretos e indiretos) de produo e distribuio de riqueza e, igualmente, perda daquele grau de relativa

    autonomia social e poltica que a classe operria tinha conquistado no ltimo

    meio sculo de luta de classes.

    Porm, os prprios arautos do capitalismo, por vezes deixam escapar

    comentrios acerca da sua verdadeira essncia. HOBSBAWM (2001: 552) cita um

    editorial do Financial Times de 24 de dezembro de 1993:

    Continua sendo, no entanto, uma fora imperfeita (...) Cerca de dois teros da populao mundial ganharam pouca ou nenhuma vantagem com

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    o rpido crescimento econmico. No mundo desenvolvido, o mais baixo quartil

    de assalariados testemunhou mais um respingar para cima que um respingar

    para baixo.

    Novamente JOFFILY (1999: 13-15), vem nos ajudar a explicitar os efeitos da

    aplicao de tal poltica nos pases dependentes, onde a implementao do projeto

    neoliberal se articula a partir de uma frmula-padro: desproteo, desregulamentao,

    desestatizao, desnacionalizao e desemprego.

    A desproteo atinge em especial as relaes trabalhistas. No tempo em que

    existia o campo socialista como uma alternativa, a economia crescia e o Movimento

    Sindical tambm, a burguesia assustada concordou em entregar alguns anis. Hoje nenhum

    dos trs fatores existe e os anis esto sendo tomados de volta com juros. O mercado deve

    decidir tudo, a nova verdade do momento. O resultado: terceirizao, contrato

    temporrio, desregulamentao de direitos, inchao do mercado informal, livre

    negociao...

    A desregulamentao significa total liberdade para o capital estrangeiro pilhar

    os pases. Os Estados nacionais deixam de exercer a funo de defenderem suas

    economias. Reservas de mercado ou Leis de proteo indstria nacional viraram tabus.

    No Brasil, a prpria distino entre empresa nacional e estrangeira foi cortada da

    Constituio. Sem qualquer tipo de barreira ou proteo para a economia nacional, a

    abertura indiscriminada das importaes destruiu ramos industriais inteiros.

    A desestatizao a transferncia do patrimnio pblico para os capitais

    privados. Alm dos ganhos financeiros, por tabela se manieta a capacidad