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A LONGEVIDADE E SUAS CONSEQÜÊNCIAS PARA O MUNDO DO
TRABALHO Sinais Sociais, 10, Serviço Social do Comércio, maio-agosto (2009).
Lucia França1
O considerável aumento da expectativa de vida não é apenas um privilégio, mas uma
conquista da modernidade. O desafio é, e será cada vez mais, manter os padrões de saúde e
a independência para os cidadãos idosos, embora o processo de envelhecimento não seja
igual para todos. É preciso que uma série de aspectos estejam alinhados a fim de que esta
longevidade não represente apenas adicionar anos à vida, mas qualidade para estes anos.
Embora algumas políticas e diretrizes já tenham sido tomadas por órgãos da sociedade,
muito pouco tem sido discutido sobre a longevidade no mundo do trabalho. O presente
artigo analisa as conseqüências do envelhecimento para as organizações, alertando para
algumas medidas que o governo, organizações, e os próprios trabalhadores devem adotar
para enfrentar este desafio. Entre as medidas sugeridas ganham ênfase a quebra de
preconceitos contra a idade, a atualização dos trabalhadores mais velhos, a integração de
equipes intergeracionais, e a preparação para a aposentadoria. O texto sugere ainda
aspectos metodológicos relacionados aos Programas de Preparação para a Aposentadoria
(PPAs).
LONGEVITY AND ITS CONSEQUENCES FOR THE ORGANIZATIONAL
WORLD
The considerable increase in life expectancy is not only a privilege but also an
achievement of modernity. The challenge is and increasingly will be to keep the
independence and good health conditions of older citizens, even though the ageing process
is not equal for all. Some aspects must be aligned in order to not only add years to life but
also add quality to those years. Although some measures have been already addressed by
some sectors of Brazilian society, very little has been discussed about this issue into the
1 LUCIA HELENA FRANÇA, é psicóloga, PhD em Psicologia Social pela Universidade de Auckland (NZ), em 2004. Realizou seu mestrado em Psicologia Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, em 1989, e especialização em Gerontologia pelo Instituto Sedes Sapientiae/SBGG-SP, em 1989. Trabalhou no Departamento Nacional do SESC, entre 1979 a 1995, onde coordenou o Trabalho Social com Idosos. Atualmente, é professor titular do Mestrado em Psicologia da Universidade Salgado de Oliveira - UNIVERSO, onde coordena projetos e pesquisas, na área do envelhecimento, em especial sobre atitudes e educação para a aposentadoria e intergeracionalidade. É autora de diversas publicações entre as quais destaca-se O desafio da aposentadoria, lançado pela editora Rocco em 2008. Realiza, há mais de 20 anos, consultorias para organizações em Programas de Preparação para a Aposentadoria (PPA) [email protected]
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business world. This article analyses the ageing consequences for the businesses,
addressing some measures that government, organisations, and the workers themselves
should take to face this challenge. Amongst these suggested measures it is emphasised the
breaking of ageing prejudices – ageism, the updating process for older workers, the
integration of intergenerational teams and retirement preparation. The text also suggests
some methodological aspects related to Retirement Preparation Programs (RPP).
O AUMENTO DA EXPECTATIVA DE VIDA E SUAS CONSEQUÊNCIAS
Há cerca de meio século, a expectativa de vida para os brasileiros era em torno dos
50 anos. Hoje, as pessoas com essa idade são consideradas ainda jovens, e com grandes
perspectivas de serem chamadas de ‘centenárias’. Com efeito, em 2007 a esperança de
vida ao nascer para os brasileiros alcançou 73 anos, sendo de 69 anos para os homens e 76
anos para as mulheres, e as projeções do IBGE (2008) para 2050 apontam que a
expectativa atingirá 81 anos. Esta longevidade é, sem dúvida, algo para ser celebrado,
mas também alerta para uma série de medidas que o governo, as empresas, universidades,
e os próprios cidadãos terão que tomar para viver melhor este acréscimo de vida.
Diante do fenômeno do envelhecimento, a Organização das Nações Unidas - ONU,
a Organização Mundial de Saúde - OMS, e outras organizações governamentais e não
governamentais de quase todos os países realizaram dois eventos com a finalidade de
propor políticas e diretrizes para fazer frente a este desafio: a Assembléia Mundial de
Envelhecimento de Viena, em 1982, e a Assembléia Mundial de Envelhecimento de
Madri, em 2002. Neste último evento, o conceito de “envelhecimento ativo” (WHO, 2002)
foi lançado e difundido pela mídia no mundo inteiro.
O ‘Envelhecimento Ativo’ é uma visão (individual e coletiva) que busca garantir
qualidade de vida à medida que a população envelhece, considerando a otimização dos
aspectos de saúde, participação e seguridade, visando a independência, dignidade e direito
às oportunidades. Dentro do quadro de envelhecimento ativo está o direito à seguridade a
todos os trabalhadores que dedicaram um tempo de vida ao trabalho, contribuíram para um
sistema de previdência, e esperam contar com este recurso na época da aposentadoria.
Entretanto, é preciso ressaltar que pelo fato dos padrões de envelhecimento serem
diferenciados, muitos trabalhadores com condições sacrificantes, associadas ou não com
uma condição de saúde, poderão antecipar a aposentadoria.
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Assim, a “mobilidade e seguridade” devem ser asseguradas por uma pensão que
permita a sobrevivência digna e o atendimento na rede de saúde pública, quando
necessário. A “participação social’ também deve ser estimulada dentro do contexto
famíliar, no contato com a comunidade, ou na freqüência aos serviços sociais, de lazer e de
educação que precisam estar disponíveis para todos os idosos.
No Brasil, instituições sociais como o SESC e as Universidades Abertas da
Terceira Idade contribuiram enormemente para o desenvolvimento de serviços, projetos e
pesquisas voltados para o bem-estar das pessoas idosas. Em 1994, surge a Lei 8842 que
dispõe sobre a Política Nacional do Idoso, e cria a Conselho Nacional do Idoso, sendo
regulamentada pelo Decreto 1948/96. Com relação especificamente ao mundo do trabalho,
esta legislação estabelece em seu artigo 10, a competência dos orgãos e entidades públicas
na área do trabalho e previdência em “criar e estimular a manutenção de programas de
preparação para aposentadoria nos setores público e privado com antecedência mínima
de dois anos antes do afastamento”(Brasil, 1994).
Em 2003, foi criada a Lei 10741 (Ministério da Saúde, 2003) que regula o direito
assegurado para as pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, e o Estatuto do Idoso. A
lei dispõe claramente quanto à proibição da discriminação de idade na contratação de
empregados, dando preferência, inclusive, em caso de empate, a quem for mais velho.
Entretanto, ainda há muito a fazer para que esssas e outras leis sejam cumpridas, e para
que a redução do ageismo – preconceito contra idade - banido legalmente em diversos
países, possa de fato acontecer.
Não apenas o governo deve estabelecer políticas que garantam o acesso aos
serviços de educação, saúde e lazer para a população de idosos, mas as organizações
devem abrir espaço para projetos destinados a seus trabalhadores mais velhos, visando a
continuidade na organização através da atualização e educação permanente, ou o apoio na
saída – programa de preparação para a aposentadoria. Esses projetos devem ressaltar o
bem-estar das pessoas no futuro, e seria desejável que em alguns momentos os programas
misturessem faixas etárias, em propostas de qualidade de vida para todos, independente da
idade.
AS APOSENTADORIAS ANTECIPADAS E SUAS CONSEQÜÊNCIAS
O padrão do envelhecimento brasileiro não é apenas diferenciado por gênero, mas
por níveis de educação, saúde e renda, que se perpetuam num círculo vicioso à espera de
uma equidade social. Tomemos, por exemplo, a aposentadoria e o fator previdenciário.
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Como corrigir as distorções para a concessão da aposentadoria entre os residentes de uma
cidade rica no Rio Grande do Sul – com expectativa de vida de 75 anos - e os residentes
de uma cidade pobre em Alagoas – com expectativa de vida é de 67 anos? No segundo
caso, a aposentadoria, enquanto um período merecido de descanso, liberdade e lazer após
anos de trabalho, pode ser uma utopia.
Essas e outras contradições põem em cheque o conceito de aposentadoria no Brasil,
e foram reforçadas quando, a partir de 1990, ocorreu o ‘boom’ das demissões voluntárias
ou incentivadas. As empresas, compelidas pelo processo de globalização, fusão ou
privatização, estimulavam a aposentadoria antecipada para que seus quadros de pessoal
fossem renovados ou reduzidos. Vale asssinalar que as aposentadorias antecipadas quando
forçadas são ainda mais drásticas. A saúde após a aposentadoria irá depender da
capacidade do pré-aposentado em decidir se irá ou não continuar a trabalhar ou se irá
aposentar mais cedo.
Henretta, Chan e O’Rand (1992), e Shultz, Morton e Weckerle (1998) apontaram
que a aposentadoria compulsória traz uma diminuição dos níveis de saúde e de satisfação
com a vida. Payne, Robbins e Dougherty (1991) também encontraram um efeito negativo
significativo na mortalidade provocada pela aposentadoria antecipada forçada, e pela perda
de atividade na aposentadoria.
Apesar das críticas acerca das aposentadorias antecipadas, alguns trabalhadores,
principalmente aqueles insatisfeitos com o trabalho ou com a organização, admitem que os
incentivos por vezes oferecidos representam também uma oportunidade de saída da
organização. Entretanto, apesar da carência de pesquisas nesta área, é possível supor duas
conseqüências com a saída de um grande contingente de trabalhadores experientes nos
planos de demissão incentivadas, como a perda do conhecimento e da memória
organizacional; e a dificuldade de os trabalhadores mais velhos retornarem ao mercado,
principalmente aqueles que sentem necessidade de continuar trabalhando na aposentadoria.
Se por um lado, as aposentadorias antecipadas poderiam revelar um
comportamento discriminatório por parte de algumas organizações ao descartarem seus
trabalhadores mais velhos, substituindo-os por mais jovens, conforme apontaram
Appelbaum, Patton, e Shapiro (2003). Por outro lado, muitos dos trabalhadores que antes
concordaram com a saída antecipada, após poucos anos de aposentadoria, podem sentir
uma ambivalência quanto a decisão ter sido ou não ‘voluntária’ (Solinge, 2007). Além
disso, a aposentadoria incentivada provocou, para os trabalhadores que a sobreviveram,
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uma sombra de medo, um sentimento de estranheza e desconfiança em relação à
organização.
Hoje, reduzidas as aposentadorias incentivadas e as fusões nas organizações,
algumas empresas, principalmente aquelas que têm entre seus principais colaboradores,
trabalhadores altamente especializados, não desejam antecipar a saída deles. Muito pelo
contrário, estão cada vez mais e preocupadas em retê-los. Uma das formas para esta
retenção, é exatamente mantê-los atualizados e satisfeitos, mesmo que isto implique em
uma redefinição do trabalho, seja através da mudança dos métodos, ambiente ou da
flexibilização de horário. Henretta (2000) lembra que a redefinição do trabalho poderá
conter a saída dos trabalhadores mais velhos, e assim, equilibrar a demanda de
trabalhadores especializados num futuro próximo, e propõe o aumento de empregos
temporários, por prazo determinado ou com horários reduzidos.
Contudo, Kim e Feldman (1998) alertam para o fato de que quanto mais os
trabalhadores se engajarem em empregos temporários (bridge employment), menor será a
possibilidade de desenvolverem atividades de lazer. Como o lazer e o voluntariado
provaram estar significantemente correlacionados à aposentadoria e à satisfação com a
vida (Ellis, 1994; Kim & Feldman, 2000), o desafio para os trabalhadores mais velhos
será, então, buscar um novo contrato que possa permitir o tempo livre para atender seus
interesses e necessidades pessoais.
Assim, há uma demanda para que os Programas de Preparação para a
Aposentadoria assumam um novo formato, pautados na livre escolha do trabalhador, que
desenvolvam não apenas os seminários informativos, mas oportunize espaços para as
reflexões e discussões com os participantes, sobre a qualidade de vida atual e o estilo de
vida que desejam para o futuro (França, 2002, 2008). Nesta nova ótica de preparar para a
aposentadoria, ganham força os projetos de vida, a continuidade ou a busca de um trabalho
mais prazeroso, que complemente a renda ou que atenda a necessidade de uma poupança
maior para o futuro.
APOSENTADORIA – SAÍDA DO MERCADO DE TRABALHO?
O trabalho para muitos pode estar intimamente relacionado a sua identidade e a
aposentadoria não deve representar o fim deste (Ashforth, 2001). Entretanto, há
trabalhadores que gostariam de mudar de estilo de vida, e fazer de seu trabalho um
instrumento de ajuda ao próximo ou a sociedade. Há aqueles que desejam dedicar mais
tempo aos amigos, famílias, aos estudos, ao lazer, ou mesmo ter tempo para o ócio.
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Stepansky & França (2008) apontam para a atenção especial e cuidado que os profissionais
de Recursos Humanos devem ter com trabalhadores obcecados pelo trabalho, a tal ponto
que, quando estão prestes a assumir o controle do tempo na aposentadoria, sentem-se
incapazes e com uma sensação de falta de propósito.
Assim, a idéia tradicional da aposentadoria como êxito final está obsoleta (Moen,
Kim & Hofmeister, 2001). A aposentadoria e trabalho podem não ser tão antagônicos
quanto parecem, e não apenas para reter os trabalhadores no mercado ou para permitir que
os aposentados se envolvam numa atividade laborativa pós-carreira, é fundamental a
atualização permanente dos trabalhadores, e discutir os preconceitos (cognitivos e sociais)
que são normalmente estabeledidas na organização.
Holzmann (2002) enfatiza que o conhecimento e as habilidades são os fatores
chave para o desenvolvimento da economia, e cruciais para que os trabalhadores mais
velhos permaneçam competitivos no mercado de trabalho. A educação ao longo da vida
(LLL – Life Long Learning) se estende da infância até a pós-aposentadoria, permitindo o
acesso das pessoas à aprendizagem, ao desenvolvimento pessoal, independente da idade.
A educação ao longo da vida pode ser uma das formas para reinserir trabalhadores
de qualquer idade no mercado de trabalho, como uma estratégia para os trabalhadores mais
velhos que queiram se atualizar, e adquirir novas metodologias e habilidades. Além disso,
é um espaço para conhecer pessoas e estabelecer novas parcerias.
Reter bons trabalhadores implica em oferecer treinamentos e atualizações
constantes, numa perspectiva de desenvolvimento integral (França & Stepansky, 2005).
Este é o papel das organizações, que também dependerá do próprio trabalhador, e do
investimento que ele deve fazer na sua educação. Governos e empresas precisam
considerar ainda a necessidade de uma campanha de sensibilização junto a sociedade,
frente ao ageismo e as possibilidades que não devem se limitar por conta da idade.
É preciso ainda considerar um debate entre os setores da sociedade, de forma que
sejam implementadas novas opções de contratos de trabalho, em horários reduzidos. Nesta
discussão, devem entrar em consideração o desperdício no descarte de especialistas no
auge de sua formação profissional, a modificação da legislação trabalhista e a redução de
impostos que facilitem alternativas para trabalho parcial, temporário ou de meio-período.
Estas alternativas acomodariam não só a necessidade do aposentado que deseja continuar
no mercado, do estudante que precisa sustentar seus estudos, e da mulher e homem que
tem sob sua responsabilidade o cuidado e a criação dos filhos pequenos.
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Estamos vivendo uma revolução nos conceitos e nas práticas organizacionais com
relação ao envelhecimento dos trabalhadores, onde a prioridade é reforçar a atualização, o
desenvolvimento pessoal, e o bem estar, tanto daqueles que desejam continuar no
mercado, como para aqueles que desejam se aposentar. É importante ressaltar que a
inserção e participação social das pessoas mais velhas não se restringem apenas ao seu
engajamento formal ou informal no mercado de trabalho, mas na sua atuação quer na
família ou na comunidade.
Para que as organizações sejam parceiras do processo de crescimento e mudança
social do país, é fundamental que dêem o exemplo, e cuidem da sua família
organizacional. Isto inclui as oportunidades das equipes intergeracionais, tanto para
aqueles que recém-ingressam na empresa, e representam o futuro, quanto aqueles que
estão saindo, e que são os guardiãs da memória organizacional.
A crescente extensão na amplitude das faixas etárias nas equipes de trabalho trouxe
ainda uma inquietação quanto às possibilidades de conflitos intergeracionais, sobretudo
quanto à otimização da produtividade e a manutenção do clima motivacional entre os
componentes das equipes (França, 2008). Se por um lado, a organização estava imbuída
com o desenvolvimento e especialização de seus jovens colaboradores, hoje ela também
têm consciência da importância em oferecer condições para que os trabalhadores mais
velhos se mantenham atualizados, e assim permanecerem no mercado.
Consequentemente, torna-se mais visível a formação de equipes com trainees de 20
anos e seniors de 65 anos ou mais de trabalhadores, cada um com sua
função/responsabilidade/tarefa, mas envolvidos num mesmo projeto. Entretanto, é preciso
que estes encontros sejam facilitados e reduzidos os eventuais conflitos que possam surgir.
As equipes intergeracionais são bastante motivadoras pela troca que proporcionam, e
podem formar uma ponte de conhecimento e apoio mútuo entre aqueles que detêm a
experiência, a memória da organização, o conhecimento e o contexto do trabalho; e os
mais jovens que aprenderam as novidades tecnológicas, insumos metodológicos, e que
podem facilitar as práticas de trabalho.
De forma a facilitar o desenvolvimento e a capacitação das equipes compostas por
duas ou mais gerações, sugere-se a adoção de dinâmicas de trabalho, com temas
escolhidos pelos próprios trabalhadores. Além de facilitar o entrosamento entre as
equipes, estas técnicas poderão proporcionar o intercâmbio de conhecimentos e da
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experiência entre os trabalhadores mais velhos e os mais jovens, estimular a solidariedade
e reduzir possíveis conflitos entre as gerações.
Um dos papéis dos gerentes de Recursos Humanos, e dos gestores de pessoas –
aqueles que lideram equipes – é favorecer o processo do resgate e registro da memória
institucional e do trabalho. Os gestores podem identificar aqueles que desejam e tem
condições de saúde para continuar trabalhando para a organização, de acordo com os
critérios estabelecidos pelas políticas da organização. Os gestores deverão apoiar os
aposentáveis engajados em projetos pós-carreira, ao mesmo tempo facilitar a troca de
habilidades dos mais velhos aos mais jovens; e o repasse das novas práticas e tecnologias
dos mais jovens para os mais velhos. Trabalhadores mais velhos, se estimulados, ajudam a
criar um sistema de "pertencer" que é muito importante para a integração das equipes.
ATITUDES FRENTE À APOSENTADORIA – O PONTO DE VISTA DOS TRABALHADORES
O conceito de aposentadoria está mudando, e apesar de todos os membros da
sociedade serem convocados para contribuir para o bem-estar dos aposentados, o futuro
depende também das atitudes individuais diante da própria vida. As atitudes são um
conjunto de crenças, valores, conceitos, avaliações positivas ou negativas frente a uma
dada situação. As atitudes predispõem as pessoas a agir (comportamento), mas podem ser
modificadas por um fato, incentivo ou pelo próprio desejo. Estudar a aposentadoria é
analisar as atitudes dos trabalhadores, dos governos e das organizações, considerando os
aspectos que podem determinar o bem estar no futuro, e assim antecipar as tendências.
Para França (2004; 2008) as atitudes frente à aposentadoria dependem da
perspectiva individual, social, familiar, da perspectiva econômica e socio-política e
ambiental da coletividade onde os aposentados estão inseridos. Para medir estas atitudes
frente à aposentadoria, foram construídas duas escalas: uma pautada na importância dos
ganhos percebidos na aposentadoria (EPGR), outra que reflete a importância das perdas
percebidas na aposentadoria (EPLR). Estas escalas foram aplicadas em 517 executivos
(França, 2004; França & Vaughan, 2008), e os resultados da análise fatorial das
respectivas escalas são relatados a seguir.
A escala de ganhos foi composta por cinco dimensões: i) liberdade do trabalho
(não ter mais que representar a empresa, não ter mais que gerenciar uma equipe, não ter
mais responsabilidade pelo trabalho, que trabalhar sob pressão, compromisso de tempo, e
ter maior liberdade para criar); ii) ter mais tempo para os relacionamentos (ter mais
tempo para o relacionamento com os parceiros, com os filhos, com os pais, com os
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parentes e com os amigos); iii) novo começo (mais tempo para o trabalho voluntário, para
a educação, participar na política, e a chance de realizar um trabalho diferente); iv) ter
mais tempo para atividades culturais e de lazer (viajar (de férias), praticar esportes e
atividades culturais, e participar em clubes e associações); v) ter mais tempo para os
investimentos (ítem homônimo).
A escala de perdas foi subdividida em quatro dimensões: i) aspectos emocionais do
trabalho (perda dos desafios do trabalho, responsabilidade do cargo, senso de ter um
trabalho competitivo, liderança, poder de decisão, criatividade do trabalho, senso de
pertencer à empresa); ii) aspectos tangíveis do trabalho (perda dos eventos e festas do
trabalho, de ter uma secretária, status do cargo, do ambiente no trabalho, das
oportunidades das viagens a trabalho; do senso de estar ocupado, reuniões e contatos
comos clientes, e da própria rotina; iii) relacionamentos do trabalho (com a equipe, e com
os colegas de trabalho); iv) salários e benefícios (plano de assistência médica , e da
compensação do cargo).
Tanto os ganhos quanto as perdas esperadas com a saída do trabalho podem ser
percebidos por qualquer trabalhador. Entretanto, a importância que cada um imprime as
dimensões é que representam as atitudes positivas ou negativas frente ao evento. Algumas
perdas podem ser vivenciadas também pela família, e justificam a importância desta
participar do programa de preparação para a aposentadoria. O reforço dos ganhos e a
substituição das perdas por outros ganhos são fundamentais para o preparo para esta nova
fase.
França (2008) indicou ainda que os preditores mais importantes para as atitudes
positivas frente à aposentadoria foram a diversidade nas atividades na alocação do tempo
(SOD), e a influência da família e dos amigos (FFIRD) na decisão. Ou seja: estes dois
preditores são capazes de influenciar positivamente os executivos em relação à
aposentadoria, especialmente quanto à importância do tempo que eles poderão ter pela
frente, seja para intensificar seus relacionamentos, realizar atividades culturais e de lazer,
além das expectativas frente a um novo começo. Assim, como apontado por França
(2009), o engajamento às atividades diversificadas e o relacionamento social e familiar
devem ser estimulados nos programas de preparação para a aposentadoria.
A IMPORTÂNCIA DO PROGRAMA DE PREPARAÇÃO PARA A APOSENTADORIA - PPA
A cultura brasileira tem cultuado muito mais o dia-a-dia e o imediatismo, e há
quase que uma ausência de reflexão para o futuro. Atividades de planejamento e de
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resolução de problemas deveriam ser estimuladas nas crianças por meio do curriculo
escolar, desenvolvidas na universidade, na comunidade, e estendidas no ambiente do
trabalho. As pesquisas têm demonstrado que aqueles que têm oportunidade para planejar,
se aposentam mais tranquilos, e podem transformar esta fase numa oportunidade de
avaliação de possibilidades e otimização da vida.
A preparação para a aposentadoria deve estar inserida à filosofia de educação ao
longo da vida, podendo atingir tanto os interesses daqueles que desejam se atualizar para
continuar no mercado de trabalho formal ou informal, quanto para o desenvolvimento
social, cultural e individual. Assim, um PPA além de abordar temas que promovam o bem-
estar, deve estimular a atualização e o desenvolvimento das pessoas, o insumo de novas
metodologias; a inserção digital; e ainda aspectos de transformação social, como a quebra
dos preconceitos contra o envelhecimento; e a integração entre os mais velhos e mais
jovens.
O Programa de Preparação para a Aposentadoria - PPA deve considerar tanto os
fatores de risco (econômicos e de saúde), como os aspectos que favoreçam o bem-estar
(relacionamentos familiares e sociais, lazer, voluntariado, projetos pessoais), e mesmo o
ócio pode figurar entre as necessidades dos aposentáveis. Como resultado, o bem estar dos
aposentados representará um saldo positivo para toda a sociedade, pois não só afasta as
possibilidades de doença, como se reverte numa economia para os serviços de saúde, quer
públicos ou privados.
O PPA, numa perspectiva de novo começo, poderá prever até mesmo uma
reorientação profissional para aqueles que desejam experimentar uma atividade
provisória, consultoria, ou voluntariado. É aconselhável, contudo, que as atividades que
envolvam conteúdos laborativos sejam realizadas sempre em horários reduzidos, de forma
que o aposentado tenha tempo para dedicar-se a seus outros interesses.
A aposentadoria deve ser um período de maior liberdade, onde o indivíduo decide
e aprede a como utilizar o seu tempo, mesmo que ele dedique algumas horas à atividade
laborativa. Em alguns casos, o aposentável necessita reaprender a utilizar o tempo livre
em prol dele mesmo. É um momento de aproveitar a vida, com todas as variedades e
possibilidades de situações que antes ele não havia tempo para desfrutar. O trabalho,
voluntário ou remunerado, pode estar incluído nesta nova distribuição, desde que tenha
uma carga horária reduzida.
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Slowik (1991) demonstrou que existe uma relação entre o envolvimento dos
trabalhadores em programas de preparação para a aposentdoria e a percepção de bem-
estar, bem como entre as intervenções de apoio emocional antes da aposentadoria e a
redução do nível de estresse provocado pela antecipação do fim do trabalho (Nuttman-
Shwartz, 2004). Gall e Evans (2000) ressaltaram que o estresse da aposentadoria estava
associado ao aspecto financeiro, ao relacionamento social e ao fato do futuro aposentado
se imaginar entediado e sem motivação, sendo difícil o ajustamento à mudança. Assim, a
adoção de programas de pós-aposentadoria poderia ajudar os aposentados a manterem-se
saudáveis, reforçando as suas atitudes positivas.
França (2002) acredita que o efeito do planejamento da aposentadoria torna-se
mais eficaz, quando os trabalhadores têm a oportunidade e participar do PPA com
antecedência. O ideal é que algumas palestras e workshops (por exemplo que envolvam o
risco financeiro e de saúde) sejam iniciados assim que o trabalhador ingressa na
organização e desenvolvido ao longo da sua carreira. Assim, a transição trabalho-
aposentadoria que normalmente traz uma certa ansiedade, poderia fluir de maneira mais
tranquila, oferecendo condições para que o aposentável possa usufruir melhor seu tempo
na nova fase da vida.
O papel da organização é o de estimular a responsabilidade individual e o
planejamento dos trabalhadores frente à aposentadoria. Os aposentáveis precisam receber
informações sobre o processo, as variáveis que envolvem o risco - saúde e aspectos
financeiros, e o bem-estar na aposentadoria - família, amigos, afetividade e sexualidade,
lazer, desenvolvimento intelectual, participação social (França, 2002). De posse dessas
informações, eles poderão estar mais seguros para planejar como desejam viver seus
próximos anos e a organizar seus projetos de vida.
A adoção dos PPAs é reconhecida como relevante para o bem-estar na
aposentadoria: uma pesquisa realizada com 320 altos executivos brasileiros apontou que
apenas 18% das suas organizações realizavam tais programas (França, 2004, 2008).
Contudo, mesmo nas organizações que adotam estes programas, não têm em sua equipe
profissionais com o preparo necessário sobre os aspectos psicológicos e sociológicos da
transição trabalhao - aposentadoria, bem como conhecimento de pesquisas empíricas que
destacam as variáveis que podem influenciar o bem-estar nesta transição.
Da mesma forma, é preciso haver uma preocupação quanto ao diagnóstico prévio à
implantação do programa, de forma que sejam reveladas as atitudes destes futuros
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aposentáveis frente à aposentadoria e as suas expectativas frente a um programa. A
organização ao oferecer um programa que propicie o bem-estar aos seus empregados,
acaba por agregar valor ao seu produto. Arriscamos hipotetizar que há uma relação entre i)
a credibilidade na organização iii) o comprometimento dos trabalhadores jovens e mais
velhos; iii) o cuidado da organização quanto ao bem estar de seus colaboradores, da
admissão até a sua saída.
Mesmo para os futuros aposentados que contribuem para os fundos de pensão, e
desfrutam de maior equilíbrio financeiro, é necessário a aquisição de informações atuais de
forma a saberem gerir seus recursos. Sem dúvida, há pessoas que tem maior ou menor
habilidade para planejar e a lidar com dinheiro, e nem sempre a segurança financeira está
relacionada ao salário. Apesar disto, a informação precisa estar disponível e o trabalhador
tem que ter a oportunidade de simular o quanto é necessário economizar para que possa ter
a condição de vida desejável.
A perda financeira é a mais relevante e os conteúdos relacionados às finanças e
investimentos devem ser oferecidos através de workshops. Devem ser estimulados ainda a
discussão entre os participantes do estilo de vida que desejam adotar na aposentadoria,
quanto esperam gastar, quais recursos dispõem, quanto normalmente gastam, quantas
pessoas sustentam, quanto economizaram e quanto esperam re-investir para o futuro. O
aposentado deve levar em consideração a vida com qualidade, a longevidade, e o que ele
precisa re-investir para que a sua sobrevivência seja uma realidade.
Além da tranqüilidade financeira, outros aspectos figuram na transição e as
necessidades dos aposentados como: a preservação da saúde física e mental; a busca da
criatividade e do equilíbrio nas relações entre os indivíduos; a afetividade e o prazer; o
lazer e as manifestações culturais; o ócio ou mesmo o retorno a uma atividade
remunerada.
Para Butler (2002) existem cinco aspectos relacionados ao bem-estar: O primeiro é
o financeiro, seguido da rede de relacionamentos sociais, a intimidade (relacionamento
mais próximo), o físico (dietas e exercícios) , e por fim, um senso de propósito. Para ele, o
senso de propósito pode inclui um trabalho formal, uma segunda carreira, o voluntariado
ou um projeto pessoal, atividade esportiva, um tipo de aprendizado, ou algo que dê sentido
a vida.
Bossé, Aldwin, Levenson e Workman-Daniels (1991) e Ekerdt e Bossé (1982)
apontam que apesar da aposentadoria trazer ansiedade, a educação e o aconselhamento
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França (2004, 2008) ressalta que um programa deve reforçar as percepções positivas e
minimizar a importância dada às perdas. Deste modo, o programa deve incluir a discussão
sobre os ganhos percebidos, sejam eles relativos a liberdade do trabalho, ao novo começo,
ao tempo para os relacionamentos, atividades culturais e de lazer, e para os investimentos.
O PPA deve ainda oferecer condições para que os aposentáveis busquem alternativas para
compensar as perdas percebidas e asprendam como superá-las, sejam elas relacionadas
aos aspectos emocionais do trabalho, aos aspectos tangíveis, aos relacionamentos do
trabalho, ou a perda dos salários e benefícios.
O PPA é uma oportunidade não só para receber informações, mas para a adoção de
práticas e estilos de vida mais saudáveis. É também o momento para re-construir o projeto
de vida, a curto, médio e longo prazo, priorizando os interesses e as atitudes que precisam
ser consideradas para realização dos projetos pessoais e familiares.
Os programas de preparação para a aposentadoria devem proporcionar a maior
participação, mobilidade e bem estar dos aposentados. O programa de preparação para a
aposentadoria, deve ser proposto pelas organizações, com o apoio do governo,
universidades e sociedade.
ASPECTOS OPERACIONAIS DE UM PPA
A transição da aposentadoria se inicia antes do desligamento do trabalhador e se
estende até alguns anos depois da aposentadoria em si (Atchley, 1989). O planejamento
deve ser iniciado, idealmente, cinco anos antes da decisão. Contudo o planejamento
econômico precisa ser garantido assim que a pessoa ingressa no mercado de trabalho. É a
poupança para o futuro, independentemente de outros planos de vida, como o casamento,
aquisição de automóvel, casa própria, nascimento e educação dos filhos.
Diagnóstico
O diagnóstico é o ponto de partida do PPA, para que a demanda seja traduzida, e
revele o desenho próprio para a organização. O PPA pode ser realizado de diversas formas,
e em várias etapas, a depender do prazo de quem está solicitando. Contudo, o diagnóstico
precisa levar em conta, prioritariamente, os interesses dos futuros aposentados, suas
atitudes frente à aposentadoria e os conteúdos a serem oferecidos nos módulos.
Outras análises complementares ao diagnóstico poderão ser realizadas pelas
organizações. Por exemplo, a identificação das políticas de Recursos Humanos e a opinião
das gerências frente à longevidade da organização. Uma terceira análise poderá considerar
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o número dos trabalhadores que a organização prevê aposentar. Assim, uma entrevista com
estes prováveis aposentados, ou aqueles que estão mais próximos ao evento, poderia ser a
oportunidade para detalhar os interesses e no quanto eles esperam ser atendidos pelo
Programa. Uma quarta análise complementar seria entrevistar os aposentados da
organização nos últimos cinco anos, focalizando os aspectos positivos e negativos da sua
aposentadoria, especialmente no que diz respeito a sua qualidade de vida, os preconceitos
percebidos e quais seriam os aspectos mais importantes para um planejamento na opinião
deles. A análise deste referencial poderá ajudar a equipe a montar uma proposta de PPA
que atenda aos requisitos da organização.
Conteúdos dos PPAs
O PPA deve ser pautado no sucesso do planejamento, e por sua vez deve envolver
a antecipação de aspectos de riscos (saúde e aspectos financeiros) e de bem-estar na
aposentadoria (família, amigos, afetividade e sexualidade, lazer, desenvolvimento
intelectual, participação social). Deverá incluir conteúdos informativos e "formativos", que
são propostos através de módulos (França, 2002). No módulo informativo, encontram-se
as informações sobre a transição, e os aposentáveis são estimulados a reflitir sobre como
esperam viver seus próximos anos. Devem ser realizadas palestras com profissionais que
trabalham com temas de interesse, identificados no diagnóstico prévio com os
trabalhadores.
Além de palestras, o módulo informativo pode incluir a exibição de vídeos,
entrevistas com aposentados bem-sucedidos e empreendedores; aspectos relevantes para a
promoção da saúde; nutrição e atividade física. Entre os temas mais selecionados pelos
trabalhadores para serem abordados nos workshops estão: a criatividade, investimentos
financeiros, inserção digital, empreendedorismo e hábitos saudáveis. Estas temáticas
podem fazer parte de um cadastro contendo contatos de psicólogos, economistas,
dermatologistas, nutricionistas, médicos geriatras e instituições locais. Os módulos podem
também seguir eixos temáticos, tais como saúde, família, comunidade, segunda carreira,
intergeracionalidade. O módulo informativo deve ser oferecido para todos os
trabalhadores, embora priorizada a participação daqueles que estejam próximos à
aposentadoria.
O módulo informativo é essencial e se constitui num manancial básico para ajudar
o trabalhador a coletar informações para a tomada de decisão, que não é obrigatória. O
módulo informativo representa o início de uma preparação, mas não necessariamente irá
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tocar no projeto de vida dos futuros aposentados, que deve ser abordado no módulo
formativo ou vivencial.
O segundo módulo, ou módulo formativo ou vivencial, deverá incluir a discussão
do projeto de vida. No projeto de vida o trabalhador poderá experimentar novas situações,
desenvolver habilidades, aptidões e mesmo descobrir novos interesses. O trabalho, como
atividade remunerada ou voluntária deve ter um espaço reduzido, para que outros
contextos sejam inseridas numa divisão de tempo mais equilibrada.
O módulo do projeto de vida poderá ser iniciado a partir das discussões sobre as
percepções de perdas e de ganhos frente à aposentadoria, e como elas poderão ser
reforçadas e melhoradas. A organização deverá promover encontros sistemáticos entre
aqueles que irão se aposentar, convidando um psicólogo para facilitar as reflexões e
discussões, e reforçar os pontos em comum. Nesses encontros, os aposentáveis irão
avaliar o que foi alcançado no prazo que eles estabeleceram, as dificuldades face à metas
estabelecidas, bem como as estratégias e as alternativas que devem utilizar para alcançar o
que desejam.
A tendência atual da aposentadoria é ser um evento do casal, já que homens e
mulheres estão participando ativamente do mercado de trabalho. Apesar disto, eles reajem
e se adaptam de forma diferente como conseqüência das trajetórias e das expectativas de
gênero (Moen, Kim & Hofmeister 2001; Quick & Moen 1998; Smith & Moen, 1998;
Szinovacz, DeViney, & Davey, 2001).
Para facilitar o processo de adaptação a estas diferenças, o programa deve
considerar a participação dos parceiros em algumas das atividades para os aposentáveis. O
projeto de vida deverá oferecer a oportunidade para refletir sobre a qualidade do
relacionamento familiar e do casal. Algumas crises podem ocorrer no início da transição.
Contudo, se o casal tiver um nível satisfatório de intimidade e entendimento, com mágoas
já resolvidas, será mais fácil que as adversidades sejam superadas nesta fase.
A organização deverá designar um facilitador para o segundo módulo, cuja tarefa
básica é estimular o aposentável a focar o seu projeto de vida. Isto inclui o reforço do que
foi alcançado, sugerindo estratégias, em função das dimensões priorizadas pelos próprios
aposentáveis, sejam elas familiares, sociais, econômicos, comunitários, afetivos,
laborativos, intelectuais, de saúde, espirituais, culturais ou de lazer. Para Soares (2002) a
reorientação pode ajudar a buscar os sonhos adormecidos, a realização de projetos
deixados para traz por motivos familiares e profissionais.
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O projeto de vida difere dos sonhos. Nos sonhos as pessoas trabalham com a
fantasia, que pode ser impossível ou irealistica. O projeto precisa ser paupável, viável, e
baseado nos interesses, nas necessidades, e no que se quer fazer ou viver. Deverão
participar do módulo formativo ou vivencial aqueles que já se decidiram pela
aposentadoria, e estão comprometidos em experienciar uma outra forma de divisão de
tempo, onde os interesses poderão ser descobertos e re-inventados. Para esta nova
experiência de divisão de tempo, é recomendável que seja reduzida a carga horária (ou no
horário de entrada ou no de saída) para que este grupo possa ter ao seu dispor pelo menos
duas horas diárias, seis meses antes da aposentadoria.
Tal como num projeto, o cronograma deverá incluir o detalhamento das etapas, de
acordo com o prazo desejável para cada dimensão ou aspecto a ser desenvolvido. É preciso
que sejam escalados os degraus necessários para o alcance do topo da montanha. Cada
aposentável deve definir as formas para gerenciar e controlar o seu projeto de vida a curto,
médio e longo prazo. Recomenda-se a inclusão de um gráfico de intenções (o que foi
investido e do que pretende investir), que pode auxilar o processo de acompanhamento. O
acompanhamento deve ser pautado na análise do que já foi investido, e do que é preciso
investir, numa abordagem multidimensional. Ou seja: o que foi planejado realizar, o que
efetivamente foi realizado num intervalo de tempo x, e o que é preciso fazer para que as
metas propostas sejam atingidas.
Acompanhamento e avaliação do PPA
Para que a organização confirme a importância dos Programas de Preparação para
Aposentadoria e se eles atingiram os interesses dos aposentáveis são necessárias
avaliações períódicas, mesmo depois após a aposentadoria. Este será o ‘feed-back’
necessário ao aperfeiçoamento dos módulos, tanto em função das temáticas quanto da
metodologia do programa.
Nos dois primeiros anos a aposentadoria ainda representa uma lua-de-mel, mas a
ausência do trabalho e dos relacionamentos nos anos subseqüentes pode ser problemática.
O acompanhamento deve ser períodico, e preferencialmente se extender até cinco anos
após a saída do trabalhador da organização. Devem ser avaliados os resultados dentro do
que foi abordado no programa, para que ele seja realimentado, e serem introduzidas as
modificações de acordo com os pontos positivos e negativos avaliados.
As associações dos aposentados devem ser convidadas a participar e/ou colaborar
com o PPA desde o seu início. Algumas atividades ou palestras poderiam ser realizadas
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em conjunto, bem como cursos de atualização, inserção digital, projetos de voluntariado,e
outros que fossem identificados no diagnóstico.
CONCLUSÕES
A aposentadoria se apresenta como um período de incertezas, apesar das
sofisticadas projeções econômicas e atuárias tão em voga no mundo de hoje. Há, sem
dúvida, uma carência de estudos e pesquisas diante desta realidade, bem como são
desconhecidos e imprevisíveis os comportamentos dos trabalhadores e das empresas frente
ao aumento da expectativa de vida.
Sob o prisma econômico, se a expectativa de vida está aumentando será inviável
que a Previdência tenha recursos para pagar um contingente cada vez mais numeroso de
aposentados. Este fato por si gera uma nova contradição, principalmente se nos determos
nas desigualdades sociais do Brasil, onde muitos trabalhadores aos 50 anos já estão sem
condições físicas para continuar a trabalhar, exercendo funções extremamente penosas e
sacrificantes. Considerando a saúde e o desejo daqueles que desejam continuar
trabalhando, e o investimento em tempo e recurso para que tivessem se tornado
especialistas, é imprescindível uma mudança de mentalidade no aproveitamento desta
mão de obra.
Esta mudança de comportamento, em parte justificada pela busca do crescimento
econômico, e pela eliminação das diferenças entre a produção de bens e serviços entre os
países periféricos e os ricos, é hoje motivo de agenda dos governos e organizações. Ë
preciso garantir a participação e o envolvimento de todos, jovens e velhos trabalhadores,
em função da melhoria do bem estar comum. Por conseguinte, observa-se uma
proliferação de equipes intergeracionais e, em alguns casos, a escala hierárquica é
inversamente proporcional à pirâmide etária.
Apesar das organizações estarem despertando para a importância da retenção dos
trabalhadores no mercado e da atualização dos seus trabalhadores mais velhos, é preciso
que elas também sejam sensibilizadas quanto aos benefícios da integração das equipes
intergeracionais. Saber gerenciar equipes com faixas etárias diferenciadas, possibilitar as
trocas e mantê-las motivadas, harmônicas e produtivas é o novo desafio para a gestão de
pessoas. Da mesma forma, apoiar e acompanhar o trabalhador que decidiu se aposentar é
o papel das gerências.
A cada dia se faz presente a proliferação de um programa de educação
desenvolvido pelas empresas, universidades e pelo governo, voltado para o apoio ao
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trabalhador tanto na sua decisão quanto no planejamento, desde que seja garantida a livre-
escolha daquele que decide se aposentar. O modo como as gerências irão se comportar
diante dos subordinados em vias de se aposentar irá se refletir na harmonia da equipe e no
bem estar daqueles que sairão da organização. Consequentemente, estarão contribuindo
para perpetuar a filosofia da organização na sociedade, e a promoção da sua imagem
organizacional e de seus produtos.
O Programa deverá apoiar o aposentável na administração do seu tempo de
trabalho e tempo livre para suas necessidades e interesses (França, 2002). Viver mais não
significa viver melhor, e existem diversos fatores que podem contribuir para um viver mais
saudável, de forma a ser obtido o equilíbrio entre tempo de vida e trabalho. A falta deste
equilíbrio tem sido um dos problemas mais sérios que o aposentado brasileiro enfrenta, até
porque o trabalho é supervalorizado neste país, bem como o tempo dedicado a ele.
Tendo passado a maior parte da vida dentro de um escritório, muitas vezes o
trabalhador não sabe o que fazer com o seu tempo livre. O PPA deve estimular uma
avaliação dos investimentos realizados e a serem desenvolvidos pelos trabalhadores, frente
ao relacionamento familiar, afetivo e social, à educação, às realizações pessoais, à cultura,
lazer, saúde, finanças, voluntariado, e mesmo à segunda carreira. Estes e outros conteúdos
poderão estar inseridos no projeto de vida do trabalhador, e seguir uma escala de
prioridades em função dos seus interesses, numa perspectiva de curto, médio e longo
prazo.
Assim, mais do que dispor da liberdade de escolha, é preciso que os trabalhadores
mais velhos tenham subsídios e elementos necessários para decidir sua aposentadoria, bem
como para gerenciar o seu projeto de vida, administrando as perdas e reforçando os
ganhos, em função dos desejos e possibilidades.
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